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UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO
A CÉLULA – UNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DOS SERES VIVOS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM: MATEMÁTICA E CIÊNCIAS DA NATUREZA
MARIA CRISTINA FERREIRA TEIXEIRA
Vila Real, 2008
UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO
A CÉLULA – UNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DOS SERES VIVOS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM
MATEMÁTICA E CIÊNCIAS DA NATUREZA
MARIA CRISTINA FERREIRA TEIXEIRA
Orientadores: Professor Doutor Jorge Ventura Ferreira Cardoso
Professor Doutor Dario Loureiro dos Santos
Vila Real, 2008
“Nenhum ser vivo é igual a outro.
Mas, todos eles possuem algo em
comum”.
Evans, Ifer
i
AGRADECIMENTOS
Meus agradecimentos especiais:
Esta dissertação é dedicada aos meus Pais – Alcino e Rosa e ao meu
marido Sérgio pela confiança e apoio e por toda a compreensão dada e tornar
menos árdua esta longa caminhada.
Aos meus orientadores, Professor Doutor Jorge Ventura e Professor
Doutor Dario Santos, pelo incentivo e apoio no decorrer da orientação,
confiança, dedicação, amizade e disponibilidade mostrada em todos os
momentos.
Aos meus irmãos pelo constante incentivo e motivação.
À minha amiga Cláudia pela amizade, ajuda e apoio nos momentos mais
difíceis ao longo desta e de outras caminhadas.
A todas as pessoas envolvidas na realização desta dissertação, em
particular todo o grupo de trabalho dos Laboratórios do DEBA, pela
disponibilidade e cooperação, sem as quais não poderia ter concretizado este
trabalho.
A todos, o meu muito OBRIGADA.
ii
RESUMO
A célula representa a menor porção de matéria viva dotada da capacidade
de auto-duplicação independente. São as unidades estruturais e funcionais dos
organismos vivos. Podem ser comparadas aos tijolos de uma casa. Cada tijolo
seria como uma célula. Alguns organismos, tais como as bactérias, são
unicelulares (consistem em uma única célula). Outros organismos, tais como os
seres humanos, são multicelulares.
A teoria da célula, desenvolvida primeiramente em 1839 por Matthias
Jakob Schleiden e por Theodor Schwann, indica que todos os organismos são
compostos por uma ou mais células. Todas as células provêm de células
preexistentes. As funções vitais de um organismo ocorrem dentro das células, e
todas elas contêm informação genética necessária para funções de regulação e
transmissão da informação para a geração seguinte.
Com a elaboração desta tese de dissertação pretendeu-se aprender um
pouco mais sobre a célula e a sua importância na constituição de todos os seres
vivos. Procurou-se numa parte inicial, reunir de forma sintética e selectiva
informação sobre a célula a nível estrutural e funcional. Numa parte intermédia,
dedicada ao estudo da microscopia, fez-se uma breve abordagem da sua
história e descreveu-se de forma mais detalhada a constituição e funcionamento
do microscópio óptico comum, dado ser o utilizado nos laboratórios das Escolas
Preparatórias em Portugal e ao qual os professores de Ciências da Natureza
recorrem nas aulas dedicadas à unidade didáctica sobre a célula. No final foram
reunidos alguns protocolos práticos de simples realização e adequados a este
nível de ensino, de modo a que as aulas práticas da disciplina de Ciências da
Natureza possam gerar um maior interesse e motivação, tanto para os alunos
como para o professor.
iii
ABSTRACT
The cell represents the lower portion of living matter given the ability of
independent self-duplication. They are the structural and functional units of living
organisms. They can be compared to the bricks of a house. Each brick would be
like a cell. Some organisms, such as bacteria, are unicellular (consisting of a
single cell). Other organisms, such as humans, are multicellular.
The theory of the cell, first developed in 1839 by Jakob Matthias Schleiden
and Theodor Schwann, indicates that all organisms are composed of one or
more cells. All cells come from existing cells. The vital functions of an organism
happen within the cells and they all contain genetic information required for
functions of regulation and transmission of information to the next generation.
It was the purpose of this dissertation to learn a little more about the cell
and its importance in the formation of all living beings. In a first step, there has
been an effort to briefly and selectively gather information about the structure and
function of the cell. In an intermediate stage, dedicated to the study of
microscopy, it was made a brief approach on its history and also a detailed
description of the optical common microscope’s constitution and functioning,
once it is the one being used at the Portuguese Schools’ laboratories and the one
which teachers of Science use in class when teaching about the cell.
Finally, some practical protocols of simple achievement and appropriate
for this level of education were gathered, so that the practical Science lessons
can generate greater interest and motivation, both for students and for the
teacher.
iv
ÍNDICE GERAL AGRADECIMENTOS i
RESUMO ii
ABSTRACT iii I – ENQUADRAMENTO PEDAGÓGICO 1
1.1 – Introdução geral 2 1.2 – A ciência como agente de mudança 3 1.3 – Objectivos do estudo 4
1.4 – Contextualização da célula no ensino preparatório 5
1.5 – Importância do estudo 7
II – A CÉLULA – UNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DOS SERES VIVOS 8
2.1 – A célula – Unidade na constituição dos seres vivos 9
2.2 – Células Procarióticas e Eucarióticas 10
2.3 - Uma visão panorâmica de Células Eucarióticas 14
O núcleo – a livraria genética da célula. 17 Ribossomas – fábrica de proteínas na célula. 19 Retículo Endoplasmático 21
v
Complexo de Golgi 23 Lisossomas 25 Cloroplastos e Mitocôndrias 26 Vacúolos 30 Peroxissomas 32 Citosqueleto 33 Parede Celular 34
III – A MICROSCOPIA 35
3.1 – Um pouco de história 36
3.2 – O microscópio 38
3.3 – Tipos de microscópios 38
Microscópio fotónico 38
Microscópio electrónico 38
Microscópio protónico 38
3.4 – Constituição do microscópio óptico comum 42
Parte mecânica 42
Parte óptica 43
3.5 – Ampliação do microscópio 44 3.6 – Funcionamento do microscópio óptico 45
Cuidados a ter com o microscópio 45
Recomendações a seguir depois da utilização
do microscópio 45
vi
IV – EXPERIÊNCIAS LABORATORIAIS 46
4.1 – Importância das experiências laboratoriais 47
4.2 – Lista de material de laboratório mais usual 48
4.3 – Protocolos experimentais 49
Protocolo I – Observação de células da epiderme do bolbo da cebola 49
Protocolo II – Observação de células do parênquima da polpa de tomate 52
Protocolo III – Observação de células do tubérculo da batateira 54
Protocolo IV – Observação de cloroplastos 57
Protocolo V – Observação de seres vivos de uma infusão 58
Protocolo VI – Observação de um esfregaço sanguíneo humano 61
V – CONCLUSÃO 64
VI – BIBLIOGRAFIA 66
______________________________ I ______________________________
ENQUADRAMENTO PEDAGÓGICO
1.1 – Introdução geral
1.2 – A ciência como agente de
mudança
1.3 – Objectivos do estudo
1.4 – Contextualização da célula no
ensino preparatório
1.5 – Importância do estudo
Capítulo 1 – Enquadramento Pedagógico
2
1.1 – INTRODUÇÃO GERAL
Na actualidade sabe-se que as células são as unidades básicas de
construção e funcionamento de todos os seres vivos. Contudo, o seu
conhecimento é relativamente recente na história da ciência.
Desde a Antiguidade numerosos investigadores naturalistas, entre eles
o célebre Aristóteles, dedicaram-se à colheita, observação e classificação
baseada na morfologia dos diversos organismos. Existem documentos
contendo descrições razoavelmente precisas da morfologia externa e interna
(de aparelhos, órgãos, etc.) dos seres vivos, mostrando já um certo
conhecimento sobre eles.
A partir do século XVII diversos acontecimentos vieram alterar
substancialmente esta realidade, nomeadamente uma corrente de opinião
conhecida por “Revolução Científica”, que ao contrário das tendências
passivas até aí existentes, de descrição e classificação dos fenómenos,
dinamizou a vontade de aprofundar os conhecimentos humanos em todos os
domínios, aumentando o interesse pela criação e aperfeiçoamento de
instrumentos de pesquisa. Particularmente na área da óptica, foi incrementado
o aperfeiçoamento dos sistemas ampliadores de imagem – lentes e sistemas
de lentes, com o consequente aumento da capacidade de observação
humana.
Boa parte da investigação actual é dedicada ao estudo celular. As
esperanças depositadas nesta investigação são enormes. A cura de grande
número de doenças, a solução das deficiências genéticas, a produção de
novos alimentos e a erradicação da fome no mundo, tudo isso parece ao
nosso alcance, à medida que se vai avançando no conhecimento da célula.
Investigar a célula é investigar o próprio cerne da vida. Não se trata
apenas de obter a solução para muitos problemas que a Humanidade
enfrenta. Conhecer a célula é um passo necessário para nos conhecermos a
nós próprios.
Toda a informação teórica e prática referida ao longo desta tese teve
como suporte uma pesquisa bibliográfica cientificamente credibilizada citada
no final da mesma.
Capítulo 1 – Enquadramento Pedagógico
3
1.2 – A CIÊNCIA COMO AGENTE DE MUDANÇA
Na idade da escolaridade primária, a criança é extraordinariamente
receptiva às ciências da natureza: o seu ensino desenvolve a personalidade, a
inteligência, o espírito crítico e a relação com o mundo. Para aprender, a
criança não pode contentar-se com o observar e manipular, deve ser guiada
pelo professor e pelas suas perguntas.
A ciência desempenha um papel essencial nas sociedades
contemporâneas. Transforma as nossas maneiras de viver. Tem, por vezes,
efeitos perversos, especialmente quando destrói tecidos sociais ancestrais ou
destabiliza fracções importantes da sociedade que a vêem então como uma
ameaça. Sobretudo, deixa indiferentes sectores inteiros da população que se
contentam com o desfrutar das suas contribuições no domínio do conforto
material, da saúde, do número e diversidade dos prazeres aos quais permite
aceder.
Ao entrarmos num novo século, torna-se cada vez mais evidente a
nossa dependência dos avanços da ciência e da tecnologia, a que
constantemente recorremos para tomar decisões, quer individuais, quer
colectivas. A ciência e a tecnologia deixaram de fazer parte do discurso
académico de alguns, para serem vistos como uma “coisa pública”, de
construção social, que deve fazer parte dos conhecimentos básicos de todos
os cidadãos.
Se, por um lado, a ciência é elucidativa, enriquecedora, libertadora do
espírito, por outro, comporta potencialidades de subjugação, numa
ambivalência que tem de ser compreendida e estudada. Paradoxalmente, a
ciência é por si uma fonte de poder e é também ela própria dominada pelos
outros poderes, o que lhe confere uma profunda ambiguidade. Porém, estas
realidades só podem ser geridas e analisadas por um público cada vez mais
alfabetizado cientificamente, e onde a escola será chamada a desempenhar
um papel indiscutível.
São estas ideias consensuais que inspiram e enquadram a grande
maioria dos trabalhos de investigação. Durante várias décadas muitos foram
os cientistas que tentaram descobrir o cerne da vida.
Capítulo 1 – Enquadramento Pedagógico
4
O mundo das células foi ignorado até meados do século XVIII, época
em que os “espíritos” curiosos começaram a utilizar o microscópio.
Entre os pioneiros na observação de células ao microscópio óptico
destaca-se Robert Hooke (1637 – 1703), astrónomo, físico e naturalista inglês.
Os trabalhos de Hooke no estudo da célula encorajaram outros cientistas na
observação de material biológico muito variado.
A ideia de que todos os seres vivos são constituídos por células e de
que cada célula provém da divisão de uma célula preexistente é relativamente
recente e foi somente apresentada na segunda metade do século XIX.
O aperfeiçoamento dos microscópios e a constante evolução de
técnicas de preparação do material a observar permitiram um notável
progresso no conhecimento da célula.
1.3 – OBJECTIVOS DO ESTUDO
Numa primeira etapa, o presente estudo aborda os principais aspectos
relacionados com os constituintes da célula, tanto em células procarióticas
como em células eucarióticas. As células eucarióticas são maiores e mais
complexas; o seu genoma é maior e possuem mecanismos muito mais
elaborados de regulação da expressão genética. O ADN das células
eucarióticas encontra-se confinado num compartimento próprio, delimitado por
membranas, o núcleo. No citoplasma existem também vários compartimentos
(organelos) delimitados por membranas e especializados em funções
específicas. Dois destes organelos, as mitocôndrias (especializadas na
produção de energia) e os cloroplastos (especializados na fotossíntese), são,
muito provavelmente, descendentes de organismos procarióticos ancestrais
que se estabeleceram como simbiontes de células maiores, anaeróbicas.
Outra característica das células eucarióticas é a presença, no citoplasma, de
redes filamentosas (citosqueleto) que servem tanto de apoio estrutural como
desempenham funções de trilhos e motores responsáveis pelos movimentos
celulares.
Capítulo 1 – Enquadramento Pedagógico
5
Neste contexto, esta importante distinção entre os dois tipos de células
vai permitir uma análise mais precisa dos seus componentes e das funções
desempenhadas pelos mesmos.
Por último, a componente prática centra a sua atenção na realização de
protocolos de fácil execução e adaptados ao desenvolvimento intelectual da
faixa etária correspondente ao 2º ciclo do Ensino Básico. Deste modo, a
concretização destes protocolos permitirão a observação dos diferentes
constituintes de células de distintos seres vivos e por em prática os
conhecimentos adquiridos sobre o tema em questão.
Com base nos pressupostos mencionados, desenvolveu-se um trabalho
de pesquisa orientado pelos seguintes objectivos:
Actualização científica relativa aos conteúdos descritos.
Definição de protocolos experimentais que tratem o tema
abordado.
1.4 – CONTEXTUALIZAÇÃO DA CÉLULA NO ENSINO PREPARATÓRIO
O tema da célula insere-se no programa da disciplina de Ciências da
Natureza – 5º ano de escolaridade.
Unidade III – Unidade na diversidade dos seres vivos
1 – A célula – Unidade na constituição dos seres vivos.
- Constituintes, forma e dimensões da célula.
- Seres unicelulares e seres pluricelulares.
2 – Classificação dos seres vivos
- Importância da classificação.
- Como classificar os seres vivos.
Numa análise concisa a vários manuais de 5º ano de escolaridade
facilmente se comprova que o tema da célula é exposto de forma sucinta e
com recurso a poucas actividades experimentais, sendo estas constantemente
repetitivas.
Capítulo 1 – Enquadramento Pedagógico
6
Assim, esta tese visa ser uma mais valia para o ensino e aprendizagem
das ciências apresentando inicialmente uma revisão teórica dos conteúdos
inerentes ao conhecimento do conceito de célula e seguidamente são
apresentados protocolos experimentais que visam a aquisição de novos
conhecimentos.
A componente experimental nesta área (o estudo da célula) é um pouco
restrita nas escolas do 2º ciclo, o que se traduz, na maior parte dos casos, em
protocolos experimentais a nível das células vegetais. Contudo, estes
apresentam um cariz laboratorial/experimental apresentando vários objectivos
a serem alcançados pelos alunos, tais como:
1 – Identificar os constituintes fundamentais da célula.
2 – Fazer esquemas de observações efectuadas no microscópio óptico.
3 – Reconhecer a diversidade da forma e dimensão das células.
4 – Reconhecer a existência de uma estrutura básica nos seres vivos.
5 – Distinguir seres unicelulares de seres pluricelulares.
6 – Dar exemplos de seres unicelulares de seres pluricelulares.
7 – Identificar a importância do microscópio no estudo dos seres vivos.
8 – Identificar as partes constituintes do microscópio óptico.
9 – Promover uma sólida formação de base, no domínio tecnológico
/científico.
10 – Desenvolver as capacidades, competências e atitudes do aluno.
Na elaboração dos protocolos experimentais foi tido em conta a
adequação dos mesmos aos laboratórios escolares do 2º ciclo. Assim, foram
sugeridos materiais de baixo custo ou mesmo materiais que se utilizam no
nosso quotidiano. Estes protocolos permitirão tornar as aulas mais apelativas
para os alunos, motivando-os para a unidade em questão.
Foram ainda elaborados alguns protocolos que não se adequam ao 2º
ciclo devido à sua complexidade. Estes poderão ser utilizados em acções de
formação de professores de ciências do 1º e 2º ciclos, onde poderão contactar
com novas técnicas e metodologias do trabalho de investigação.
Capítulo 1 – Enquadramento Pedagógico
7
1.5 – IMPORTÂNCIA DO ESTUDO
Qualquer estudo que tenha por objectivo explorar e conhecer o
fenómeno da vida, realizado na disciplina de Ciências da Natureza exige um
conhecimento adequado e mais ou menos profundo de acordo com o grau de
ensino, das características básicas e específicas da célula. Em complemento,
quem se aventure neste estudo beneficia com um conhecimento da
metodologia adequada para a visualizar. Este trabalho visa a familiarização
com o conceito de célula, assim como os seus componentes, e a aprender
sobre os instrumentos e experiências que permitam compreender detalhes
subcelulares.
Não obstante as limitações inerentes a uma investigação conducente
ao tema proposto, este estudo é um importante instrumento para professor e
aluno tomarem contacto com uma realidade pouco divulgada no âmbito do
grau escolar a que se pretende aplicar. O conjunto de protocolos
experimentais apresentados são, também eles, um instrumento de trabalho
que permitirá ao professor tornar as aulas mais motivantes ao leccionar a
referida unidade.
______________________________ II ______________________________
A CÉLULA – UNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DOS SERES VIVOS
2.1 – A célula – unidade na
constituição dos seres vivos.
2.2 – Células Procarióticas e
Eucarióticas
2.3 – Uma visão panorâmica da
Célula Eucariótica
O núcleo – a livraria
genética da célula.
Ribossomas – fábrica de
proteínas na célula.
Retículo Endoplasmático
Complexo de Golgi
Lisossomas
Cloroplastos e Mitocôndrias
Vacúolos
Peroxissomas
Citosqueleto
Parede Celular
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
9
2.1 – A CÉLULA – UNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DOS SERES VIVOS Em Biologia, a Célula é definida como unidade básica dos Seres Vivos.
A célula é tão fundamental para a Biologia como o átomo é para a Química.
Mas o que actualmente se sabe sobre esta estrutura biológica é produto de
trabalho essencialmente dos últimos duzentos anos.
Em 1824, Dutrochet começou a comparar sistematicamente tecidos
animais e vegetais, tendo chegado à conclusão de
que a célula é de facto uma unidade básica na
construção de todos os organismos vivos. No
entanto, a sua obra teve dificuldades em se impor
devido ao seu conteúdo “revolucionário”. A aceitação
desta hipótese criou um novo campo de
investigação, pois as células eram individualizadas e
havia que descobrir a importância biológica dos conteúdos celulares.
Schleiden e Schwann, em 1838, estabeleceram
claramente a ideia de que as células são a unidades
estruturais básicas dos seres vivos, desde os unicelulares até
aos pluricelulares mais complexos.
Esta generalização bastante importante passou a
constituir uma teoria que é a pedra basilar da Biologia –
teoria celular: cada animal representa o somatório de unidades vitais, cada
uma das quais reúne por completo todas as propriedades da vida.
Esta teoria foi adquirindo progressivamente significados mais amplos à
medida que os investigadores chegavam a novas conclusões sobre os
fenómenos que se processam a nível da célula. Em 1958 Rudolf Virchow
postulou que a célula não só é a unidade estrutural dos seres vivos mas
também a unidade fisiológica. Mais tarde este investigador faz outra
generalização ao afirmar que as células têm sempre origem noutras pré-existentes. Mais recentemente foi acrescentada à teoria celular uma outra
generalização – as células contêm material hereditário através do qual as
características específicas passam de uma célula mãe para outras células –
células filhas.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
10
Actualmente sabemos que cada célula possui uma organização
molecular que lhe permite desempenhar as funções que caracterizam a vida:
crescer, reproduzir-se e adaptar-se ao meio exterior.
A vida a nível celular emana da ordem estrutural, reforçando a ideia de
que existe uma correlação entre estrutura e função. Por exemplo, o movimento
de uma célula animal depende de uma inter-relação entre as estruturas que
constituem um esqueleto celular.
Um outro tema recorrente na Biologia é a interacção do organismo com
o seu meio ambiente. As células sentem e respondem ao ambiente que as
rodeia. Contudo, as células podem diferir substancialmente uma das outras,
mas partilham algumas características em comum. Todas as células possuem
organização interna comum, baseada no princípio da compartimentação
funcional. Tal como nas sociedades humanas, nas células ocorre uma divisão
de tarefas, e cada tarefa ou função é suportada por uma determinada estrutura.
2.2 – CÉLULAS PROCARIÓTICAS E EUCARIÓTICAS Os organismos encontrados na Terra são constituídos por um dos dois
tipos de células – procarióticas ou eucarióticas (Tabela 1). Os organismos
denominados Bactéria e Archaea são constituídos por células procarióticas.
Por outro lado, os Protistas, Fungos, Animais e Plantas apresentam células
eucarióticas na sua constituição.
As células procarióticas e eucarióticas apresentam várias características
básicas comuns: uma membrana plasmática, cromossomas, assim como
possuem ribossomas, pequenos organelos que fazem com que as proteínas
obedeçam às instruções dos genes.
As diferenças entre ambas as células são observáveis ao nível ultra-
-estrutural. Como se pode observar na Tabela 1, a principal diferença entre as
células procarióticas e eucarióticas diz respeito ao facto de nas primeiras não
existirem organelos membranosos individualizados. No quadro seguinte
referem-se as principais diferenças entre células eucarióticas e procarióticas.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
11
Tabela 1. Comparação entre célula procariótica e eucariótica (Adaptado de Campbell e Reece,
2005).
CÉLULA PROCARIÓTICA CÉLULA EUCARIÓTICA
O material genético não está
envolvido por membrana nuclear.
Cromossomas constituídos por ADN.
Não possuem cloroplastos, mesmo
quando realizam a fotossíntese, mas sim
vesículas fotossintéticas.
Não possuem mitocôndrias, mas sim
invaginações da membrana plasmática, com
uma função equivalente à mitocôndria –
mesossoma.
Não possuem aparelho de Golgi, nem
retículo endoplasmático.
No processo mitótico não se forma
fuso acromático.
Os organelos envolvidos na
mobilidade são em menor número e mais
simples.
O material genético está envolvido por
uma membrana nuclear.
Cromossomas constituídos por ADN e
histonas (proteínas).
Possuem sistemas membranosos
intracelulares.
- Cloroplastos
- Mitocôndrias
- Aparelho de Golgi
- Retículo endoplasmático
No processo mitótico forma-se o fuso
cromático.
Os organelos envolvidos na mobilidade
são geralmente numerosos e mais complexos.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
12
Nas células eucarióticas observa-se internamente, o citoplasma,
caracterizado por um meio opticamente inerte, no seio do qual se podem
observar dispersas algumas estruturas internas da célula. Destas estruturas
internas é particularmente evidente uma formação globulosa – o núcleo.
No interior deste é muitas vezes visível uma outra estrutura
sensivelmente esférica de pequenas dimensões – o nucléolo. Na célula
eucariótica, os cromossomas constituídos pelos genes encontram-se no
núcleo, enquanto numa célula procariótica localizam-se numa região chamada
nucleóide, sendo estas células designadas por células anucleadas (Tabela1).
Toda a região entre o núcleo e a membrana plasmática é chamada de
citoplasma, termo também utilizado para definir o interior de uma célula
procariótica. Enquanto o citoplasma de uma célula eucariótica tem uma grande
variedade de membranas rodeando organelos com formas e funções
especializadas, estes estão ausentes em células procarióticas. A verdade, é
que a presença ou ausência de um verdadeiro núcleo é só um exemplo da
disparidade na complexa estrutura entre os dois tipos de células.
Fig.1 – A célula procariótica (Campbell e Reece, 2005).
Complementarmente, nas células eucarióticas vegetais observam-se
diversas estruturas de contorno arredondado ou elíptico, apresentando
diversas colorações – os plastos. Nestas células observa-se ainda a presença
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
13
de cavidades no citoplasma limitadas por uma membrana, por vezes de
dimensões consideráveis – os vacúolos. Através do microscópio é possível verificar a presença de diversos tipos
de estruturas na célula animal e vegetal. Na periferia das células nota-se a
existência de uma membrana limitante – membrana plasmática (Fig.2.). Na
célula vegetal a periferia é muito mais espessa, em virtude de exteriormente à
membrana plasmática existir uma parede celular de natureza celulósica.
A função da membrana plasmática é de funcionar como barreira
selectiva que permite a passagem suficiente de oxigénio, nutrientes e resíduos
para manter todo o volume da célula.
Fig.2 – Membrana plasmática (Campbell e Reece, 2005).
A velocidade das trocas de substâncias entre o interior da célula
(citoplasma) e o seu exterior, em que participa a membrana plasmática, é tanto
mais reduzida quanto mais pequena for a superfície exterior. As trocas com o
meio extra-celular podem ser particularmente inadequadas para manter uma
célula que apresenta um citoplasma de grande volume. A necessidade de uma
área suficientemente grande para acomodar o volume ajuda a explicar o
tamanho microscópico da maior parte das células. Uma razão suficientemente
elevada de área superficial/volume é especialmente importante nas células que
trocam material com o seu meio envolvente, tais como as células intestinais.
Essas células podem ter muitas projecções extensas e finas da sua superfície,
chamadas microvilosidades, que aumentam a área superficial sem alteração
significativa do volume.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
14
Os requerimentos metabólicos impõem limites teóricos para o tamanho
de uma única célula. À medida que um objecto com uma forma particular
aumenta de tamanho, o seu volume aumenta de forma proporcional à sua área
superficial (a área é proporcional a uma dimensão linear quadrada, enquanto
que o volume é proporcional a uma dimensão linear cúbica). No entanto,
quanto mais pequeno for o objecto, maior é a razão entre a área superficial e o
volume (Fig.3).
Fig.3 – Relação geométrica entre área superficial e volume (Campbell e Reece, 2005).
2.3 – UMA VISÃO PANORÂMICA DE CÉLULAS EUCARIÓTICAS As células eucarióticas existem, quer como organismos unicelulares,
quer como constituintes de organismos multicelulares. Os seres unicelulares
eucarióticos mais simples são as leveduras, enquanto os protozoários são
organismos unicelulares extremamente complexos que desenvolveram
inúmeras especializações funcionais. Provavelmente, foi o desenvolvimento de
características predadoras por parte das células eucarióticas que tornou
possível a captura de células procarióticas e sua subsequente “domesticação”
dando origem a organelos tais como as mitocôndrias e os cloroplastos. Uma
célula eucariótica tem extensos e elaborados arranjos inter-membranares, que
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
15
dividem a célula em compartimentos – os organelos membranares
mencionados anteriormente. Entre as células eucarióticas de maior importância destacam-se as de
origem animal e vegetal.
Na célula animal (Fig 4), o mais proeminente organelo é normalmente o
núcleo.
Fig.4 – A célula animal (Campbell e Reece, 2005).
Por seu lado, a célula vegetal (Fig.5) apresenta um conjunto de
organelos designados por plastídeos. O mais importante tipo de plastídeos é o
cloroplasto no seio do qual se realiza a fotossíntese.
Muitas células vegetais apresentam um grande vacúolo central; algumas
podem ter um ou mais vacúolos pequenos. Do lado de fora da membrana
plasmática das células vegetais existe uma espessa parede celular perfurada
por canais chamados de plasmodesmata.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
16
Em qualquer um deste tipo de células, a informação genética está
armazenada no núcleo e transportada para o exterior deste através de
ribossomas.
Fig.5 – A célula vegetal (Campbell e Reece, 2005).
Num primeiro momento iremos abordar dois dos organelos envolvidos
no controle genético da célula: o núcleo que contém a maior parte do ADN das
células, e os ribossomas, que utilizam a informação do ADN para a síntese de
proteínas.
Posteriormente, num segundo momento, serão abordados os outros
organelos, não menos importantes, observáveis numa célula.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
17
2.3.1 – O NÚCLEO – A LIVRARIA GENÉTICA DA CÉLULA
O estudo da ultra-estrutura e funções dos vários organelos
citoplasmáticos evidencia claramente que as actividades celulares estão
compartimentadas em várias estruturas que realizam funções específicas e
muito complexas, mas extraordinariamente organizadas.
Ao considerarmos a célula como um sistema de elevada complexidade
estrutural e funcional, imediatamente somos conduzidos a pensar que esta tem
de dispor de um sistema coordenador, ou melhor dizendo, um centro de
controlo da sua actividade. Tal centro contém instruções que especificam a
estrutura celular e comandam as suas funções.
Nas células eucarióticas o centro de controlo onde se localiza a
informação genética é o organelo designado por núcleo (Fig.6).
O núcleo contém a maior parte dos genes das células eucarióticas
(alguns genes estão localizados nas mitocôndrias e cloroplastos). Nele
encontramos o património genético da célula, sob a forma de moléculas de
ADN. Sendo o núcleo uma esfera com aproximadamente10 µm de diâmetro, o
ADN só poderá lá caber enrolado, uma vez que mede cerca de 2 m de
comprimento. Na verdade, o ADN é “empacotado” com a ajuda de um conjunto
de proteínas denominadas histonas. O ADN e histonas formam a cromatina,
que se espalha pelo interior do núcleo. Estudos revelam que a cromatina é
constituída por longos e finíssimos filamentos enovelados – as fibras
cromatídicas ou nucleofilamentos – constituídas quimicamente por ADN e
proteínas. Como são muito longas, finas e se encontram enoveladas, estas
fibras não dão a impressão de serem entidades individuais.
Na realidade, elas estão individualizadas formando uma entidade
designada cromossoma, que se torna claramente visível durante a mitose.
Para além da cromatina, identifica-se no núcleo uma outra estrutura,
denominada nucléolo. Os nucléolos são densos, com forma mais ou menos
esférica e constituídos por grandes quantidades de ARN do tipo ribossómico e
proteínas.
Esses nucléolos são estruturas dinâmicas. Numa zona específica
designada região organizadora do nucléolo, normalmente associada à
cromatina, produzem continuamente ARNr (ribossómico) que é transportado
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
18
para o citoplasma e se destina à formação de ribossomas, participando na
síntese de proteínas.
Fig.6 – Núcleo (Campbell e Reece, 2005).
O núcleo encontra-se separado do citoplasma por um sistema
membranar denominado invólucro nuclear. Esta membrana é a estrutura que
separa os componentes nucleares dos citoplasmáticos, conferindo
individualidade ao núcleo como organelo celular. Deste modo, os fenómenos
da expressão genética, para além de separação temporal, passam a estar
segregados espacilamente. O invólucro nuclear tem uma organização
estrutural complexa que sofre modificações ao longo do ciclo celular. É
formado por duas membranas, ambas de natureza lipoproteica semelhante ao
plasmalema. Entre as duas membranas existe um espaço perinuclear.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
19
Do ponto de vida funcional o invólucro nuclear está, inequivocamente,
envolvido no transporte núcleo-citoplasmático, sendo-lhe ainda atribuídas
funções na organização espacial da cromatina e na replicação de ADN.
O núcleo é assim o centro que assegura a transmissão do material
hereditário, sendo no hialoplasma que são recebidas e executadas as
informações emanadas do núcleo, que se traduzem em reacções das quais
dependem estruturas, formas e funções particulares, conforme os diferentes
modelos dessas informações.
2.3.2 – RIBOSSOMAS – FÁBRICA DE PROTEÍNAS NA CÉLULA
No citoplasma são sintetizadas todas as moléculas que permitem à
célula crescer, multiplicar-se, diferenciar-se e comunicar com as outras células
de um organismo pluricelular. Estas moléculas são maioritariamente proteínas,
cuja estrutura (e, consequentemente, função) é determinada pela sequência de
pares de bases do respectivo gene. Cada gene que codifica uma proteína é
inicialmente copiado no núcleo por um mecanismo denominado transcrição,
dando origem a uma molécula de ARN mensageiro (ARNm). As moléculas de
ARNm são transportadas para o citoplasma, onde se associam a ribossomas.
Com o auxílio de moléculas adaptadoras, denominadas ARN de transferência
(ARNt), a sequência de nucleótidos de cada ARNm é traduzida numa
sequência de aminoácidos, ou seja, numa proteína.
As proteínas desempenham um papel fundamental na
compartimentação funcional das células eucarióticas. São proteínas as
enzimas que catalisam as reacções específicas de cada organelo, e são
proteínas as moléculas que controlam o transporte de componentes entre os
vários compartimentos. Numa célula humana existem cerca de dez mil tipos
distintos de proteínas, rigorosamente distribuídas pelos diversos
compartimentos onde exercem as suas funções.
Parte das proteínas celulares é sintetizada por ribossomas (Fig.7)
localizados no citosol, enquanto outras são sintetizadas por ribossomas
associados ao retículo endoplasmático. As proteínas de localização nas
membranas celulares, bem como as proteínas destinadas aos lisossomas e as
proteínas de secreção são todas sintetizadas com uma sequência-sinal que
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
20
indica que devem ser conduzidas para o retículo endoplasmático. As restantes
proteínas, desprovidas deste sinal, são sintetizadas por ribossomas e
polissomas (conjunto de vários ribossomas que, num determinado momento,
se encontram a traduzir a mesma molécula de ARNm) livres no citosol.
Fig.7 – Ribossomas (Campbell e Reece, 2005).
Cada ribossoma é composto por duas subunidades, cada uma das quais
é constituída por moléculas de ARN ribossomal (ARNr) associadas a proteínas.
A subunidade maior contém uma molécula de RNAr maior, e a subunidade
menor contém uma molécula de ARNr mais pequena. As subunidades
ribossomais, bem como as moléculas de ARNr que as constituem, são
normalmente identificadas em termos de coeficiente de sedimentação medido
em unidades de Svedberg (S). Os tamanhos das moléculas de ARNr, a
quantidade de proteínas em cada subunidade e, consequentemente, os
tamanhos das subunidades, são diferentes entre as células eucarióticas e
procarióticas.
Uma consequência importante desta diferença é que certos compostos
de natureza química (fármacos…) interagem especificamente com os
ribossomas procarióticos, sem interferir com os ribossomas eucarióticos.
Muitos dos antibióticos usados em medicina actuam por este mecanismo. No
entanto, os ribossomas das mitocôndrias e dos cloroplastos, cujas
características são semelhantes aos ribossomas procarióticos, podem ser
sensíveis a estes fármacos. Por esta razão alguns antibióticos, ao penetrar nas
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
21
mitocôndrias ou cloroplastos, podem causar efeitos tóxicos graves sobre as
células eucarióticas.
2.3.3 – RETÍCULO ENDOPLASMÁTICO
O retículo endoplasmático (Fig.8) é constituído por um labirinto
intracelular de cisternas, delimitadas por membranas. Parte destas cisternas
estão revestidas por ribossomas e denomina-se retículo endoplasmático rugoso. Outra parte não se associa a ribossomas e denomina-se retículo endoplasmático liso.
O retículo endoplasmático rugoso é responsável pela síntese de
todas as proteínas secretadas para o exterior da célula., bem como de todas as
proteínas transmembranares e das enzimas lisossómicas. Na verdade, a
síntese destas proteínas inicia-se em ribossomas localizados no citosol. No
entanto, estas proteínas distinguem-se das restantes por possuírem uma
molécula-sinal que consiste numa sequência específica de aminoácidos.
No citosol existe um complexo macromolecular denominado SRP (Sinal
de Reconhecimento de Partículas) que se liga especificamente a estes
aminoácidos, bloqueando a tradução do resto da proteína.
O bloqueio só termina quando o conjunto ribossoma-ARNm-proteína
nascente-SRP encontra uma cisterna do retículo endoplasmático rugoso. Aí, a
SRP interage com um receptor específico localizado na membrana do retículo
e desliga-se da cadeia de aminoácidos. Deste modo, a tradução reinicia-se, ao
mesmo tempo que a proteína é transportada para o interior da cisterna (lúmen).
No lúmen do retículo endoplasmático as proteínas recebem um conjunto de
açúcares (glúcidos), transformando-se em glicoproteínas.
Ao contrário do retículo endoplasmático rugoso, o retículo endoplasmático liso é escasso na maioria das células. No entanto, este
compartimento encontra-se particularmente desenvolvido em certos tipos
especializados de células. É o caso das células do fígado, células musculares e
células produtoras de hormonas esteróides. Nas células do fígado, o retículo
liso acumula, por um lado, as enzimas que degradam fármacos e compostos
tóxicos para o organismo. O retículo é também o local de acumulação das
enzimas responsáveis pela síntese de hormonas esteróides a partir do
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
22
colesterol e, por isso, encontra-se muito desenvolvido nas células produtoras
deste tipo de hormonas. Finalmente, o retículo liso contém proteínas de
transporte e armazenamento de cálcio e, por isso, é muito abundante nas
células musculares.
Fig.8 – Retículo endoplasmático (Campbell e Reece, 2005).
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
23
2.3.4 – COMPLEXO DE GOLGI
O complexo de Golgi (Fig.9) localiza-se, geralmente, perto do núcleo e é
constituído por uma série de cisternas empilhadas, rodeadas por inúmeras
vesículas. Em cada pilha de cisternas distingue-se uma face cis (ou face de
entrada), mais próxima do núcleo e uma face trans (ou face de saída), mais
afastada do núcleo. Junto à face cis, as vesículas representam um sistema de
vaivém entre o Golgi e o retículo endoplasmático rugoso: das cisternas do
retículo destacam-se, continuamente, vesículas que se fundem com as
cisternas do complexo de Golgi, transportando as proteínas destinadas à via de
secreção. Em sentido inverso, destacam-se vesículas das cisternas do
complexo de Golgi que retornam ao retículo transportando proteínas que não
entram na via de secreção (denominadas proteínas residentes no retículo). Da
face trans destacam-se vesículas destinadas ou à via de secreção ou aos
lisossomas. Ao atravessar o complexo de Golgi as proteínas sofrem uma série
de modificações que incluem a remoção de alguns açúcares (geralmente
resíduos de manose), a adição de outros (por exemplo, galactose, e ácido
siálico). O complexo de Golgi é, portanto, o local da célula onde se produzem
as glicoproteínas e os proteoglicanos.
Fig.9 – Aparelho de Golgi (Campbell e Reece, 2005).
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
24
Da face trans do complexo de Golgi destacam-se, permanentemente,
vesículas que acabam por fundir com a membrana plasmática num processo
denominado de exocitose. Em consequência, as proteínas transportadas no
lúmen da vesícula são lançadas para o meio extracelular, enquanto as
proteínas transportadas na membrana da vesícula ficam localizadas na
membrana plasmática. Para além desta via (denominada via de secreção
constitutiva), algumas células especializadas possuem, adicionalmente, um
mecanismo de secreção regulada que permite o armazenamento das proteínas
de secreção em vesículas ou grânulos de secreção, cuja exocitose ocorre
apenas por resposta a um sinal vindo do exterior.
Para compensar o aumento de superfície decorrente da exocitose, a
membrana plasmática sofre, continuamente, um processo de internalização
através de invaginações que acabam por dar origem a vesículas de endocitose.
Mediante este processo as células ingerem passivamente pequenos volumes
do fluído e solutos presentes no meio extracelular. Adicionalmente, as células
possuem meios de internalizar preferencialmente determinadas moléculas do
meio extracelular. Este mecanismo denominado de endocitose mediada por
receptores, baseia-se na existência de receptores específicos na membrana
plasmática. Um exemplo bem conhecido é o da internalização de colesterol
transportado no sangue e meio extracelular sob a forma de lipoproteínas (LDL).
Na membrana plasmática existem receptores proteicos específicos para as
LDL. Os receptores são proteínas transmembranares que interagem, no interior
da célula, com uma proteína denominada clatrina. A ligação de LDL ao receptor
desencadeia neste uma modificação que facilita a associação de várias
moléculas de clatrina entre si. Em consequência, forma-se um revestimento de
clatrina que favorece a internalização da membrana, dando origem a uma
vesícula.
No interior do citoplasma, a vesícula perde o revestimento de clatrina e
adquire transportadores transmembranares de protões, transformando-se num
endossoma. Com o transporte de protões para o interior do endossoma e
consequente acidificação do meio interno, as LDL desligam-se dos receptores.
Os receptores livres concentram-se numa pequena zona da membrana do
endossoma que se destaca sob a forma de uma pequena vesícula e que acaba
por se fundir com a membrana plasmática. Entretanto, o endossoma funde-se
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
25
com um lisossoma onde as LDL são digeridas e o colesterol é libertado para
ser usado como nutriente pela célula.
2.3.5 – LISOSSOMAS
Os lisossomas (Fig.10) são vesículas intracelulares delimitados por uma
membrana e contendo enzimas hidrolíticas, capazes de digerir todas as
macromoléculas da célula. Conhecem-se cerca de 40 tipos de enzimas
lisossómicas, que incluem proteases, nucleases, glicosidases, lipases,
fosfatases e sulfatases. Todas estas enzimas têm uma particularidade: são
preferencialmente activas em meio ácido e, para acidificar o seu meio interno,
os lisossomas possuem na membrana uma bomba de protões. Por outro lado,
a membrana impede o acesso das enzimas ao citoplasma. E, no caso de
eventual fuga, as enzimas não são activas a um pH neutro do citoplasma.
Fig.10 – Lisosoma (Campbell e Reece, 2005).
Na célula, os lisossomas exercem fundamentalmente três funções:
1. Os lisossomas digerem macromoléculas provenientes do exterior
pela via da endocitose, fornecendo nutrientes para o metabolismo da célula. É
o caso, por exemplo, das partículas de lipoproteínas que são internalizadas por
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
26
endocitose mediada por receptores e incorporadas em endossomas que se
fundem com os lisossomas. No lisossoma as lipoproteínas são digeridas,
libertando o colesterol que é utilizado pela célula na biosíntese de membranas.
2. Os lisossomas desempenham, adicionalmente, um papel
fundamental na destruição de componentes celulares obsoletos. Neste
processo, denominado autofagia, os organelos que atingiram o limite do seu
tempo de vida ou que deixaram de ser necessários à célula, são incorporados
em vesículas (autofagossomas) que se fundem com os lisossomas.
3. Finalmente, os lisossomas participam na degradação de
microrganismos ou partículas nocivas à célula através do mecanismo de
fagocitose. As células humanas especializadas neste mecanismo são os
macrófagos e os neutrófilos. Os corpos reconhecidos como estranhos são
fagocitados pela célula e incorporados em fagossomas que se fundem com
lisossomas.
Todas as hidrolases ácidas destinadas aos lisossomas são sintetizadas
no retículo endoplasmático e transportadas para o complexo de Golgi. Aí
recebem um sinal específico, que consiste numa manose fosforilada na
posição 6 (M-6-P). Ao atingirem a face trans do Golgi, estas enzimas são
incorporadas em vesículas, que possuem na membrana receptores para M-6-P
e que se fundem, especificamente, com lisossomas pré-existentes. Deste
modo, as enzimas hidrolíticas marcadas pelo sinal M-6-P separam-se, à saída
do complexo de Golgi, das proteínas destinadas à via da secreção.
2.3.6 – CLOROPLASTOS E MITOCÔNDRIAS
As mitocôndrias e os cloroplastos são constituintes essenciais das
células eucarióticas, pois são estes organelos que fornecem à célula a energia
necessária para todas as reacções do metabolismo.
Os cloroplastos (Fig.11) existem nas células fotossintéticas (células
vegetais), sendo o seu número muito variável nas plantas superiores. Em corte,
apresentam a forma de discos lenticulares de cor verde com 3-10 µm de
diâmetro e 1-2 µm de espessura. As clorofilas a e b e os carotenóides
(carotenos e xantofilas) são os pigmentos mais importantes.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
27
Do ponto de vista ultrastrutural, os cloroplastos possuem invólucros
constituídos por uma membrana externa e uma membrana interna, as quais
delimitam o espaço intermembranar. Em alguns casos, como por exemplo no
milho, a membrana interna invagina-se e origina uma rede complexa de
túbulos, o retículo periférico.
Fig.11 – Cloroplasto (Campbell e Reece, 2005).
O invólucro delimita o estroma no seio do qual se encontram os
tilacóides. Estes são sáculos achatados de natureza membranosa que, regra
geral, se dispõem segundo o eixo maior do cloroplasto. Os tilacóides podem
agrupar-se, constituindo empilhamento de discos achatados uns sobre os
outros, designam-se, neste caso, tilacóides dos grana. Os tilacóides do
estroma são sáculos polimórficos não empilhados que aparecem, muitas
vezes, a ligarem entre si tilacóides de grana diferentes.
O estroma é constituído por uma substância, fundamentalmente
granular, onde se encontram glóbulos osmiófilos ou plastoglóbulos,
ribossomas, grãos de amido e ADN cloroplastidial formando nucleóides. De
todos os constituintes do estroma só os grãos de amido são observáveis ao
microscópio óptico, surgindo como estruturas refringentes quando corados com
soluto de lugol.
Na fase inicial da diferenciação dos cloroplastos, a membrana interna do
invólucro do proplasto invagina-se, formando vesículas e lamelas que, mais
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
28
tarde, originarão os tilacóides. No decurso da ontogenia cloroplastidial, as
invaginações da membrana interna podem originar vesículas que se acumulam
em locais definidos do proplasto, formando o corpo prolamelar. Nalguns casos,
o corpo prolamelar forma arranjos cristalinos. Se a planta for mantida em
condições de iluminação adequada, o corpo prolamelar e/ou as lamelas
formadas a partir da membrana interna organizam-se para formar um sistema
tilacoidal funcional (fotossintetizante). Ao mesmo tempo que se diferenciam as
membranas tilacoides, tem lugar a conversão do protoclorofilídeo em
clorofilídeo e este em clorofila.
As mitocôndrias (Fig.12) são organelos celulares presentes na maioria
das células eucarióticas e responsáveis, em condições aeróbias, pela obtenção
de energia necessária às células que as possuem. Têm aspecto morfológico
muito variável, podendo ocorrer, contrariamente ao que o seu nome indica
(“grânulo fusiforme”), sob diversas formas, como redonda, oval e em bastonete
ou filamento, e apresentando variações no seu tamanho, número e distribuição,
não só segundo os diferentes tipos de células como também durante o ciclo de
vida de uma mesma célula. Uma célula humana contém, em média, cerca de
3000 a 5000 destes organelos citoplasmáticos.
Fig.12 – Cloroplasto (Campbell e Reece, 2005).
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
29
O termo mitocôndria, introduzido em finais do século XIX por Benda,
deriva das palavras gregas “mitos” e “chondros”. Até essa altura, esses
organelos subcelulares foram designados por diversos nomes, ficando o de
bioblastos como o mais conhecido. Altman, em finais do séc. XIX, considerava
que as mitocôndrias eram as unidades básicas da actividade celular e,
baseando-se nas semelhanças de forma e tamanho que encontrou entre
bioblastos e bactérias, sugeriu que aqueles organelos deveriam ser capazes de
existência independente e que as células eucarióticas que as possuíam
adquiriram, por isso, capacidade de vida. É interessante notar que essas ideias
tornaram a surgir, embora sob diferente forma, na actual teoria endossimbiótica
da origem evolutiva da mitocôndria. Ainda em finais do século XIX, Michaelis
desenvolveu uma técnica para corar selectivamente mitocôndrias. Este facto foi
de grande importância pois, além de ter sido a primeira indicação de que a
mitocôndria tem a capacidade de reduzir um corante, forneceu um critério
definitivo para a sua identificação citológica.
Em 1940, tinha-se progredido o suficiente para formular um esboço da
cadeia de transporte de electrões. Antes disso, tinham já sido descritas as
reacções enzimáticas do ciclo do ácido cítrico, tendo-se também demonstrado
que a oxidação de vários intermediários do ciclo estava ligada à formação de
ATP. Na década seguinte (1940 – 1950), as mitocôndrias foram identificadas
como locais de metabolismo energético. Nos anos 50, o melhoramento de
técnicas de microscopia permitiu uma descrição das principais características
morfológicas da mitocôndria. Também nessa altura os investigadores
(particularmente Hatefi e colaboradores) tiveram sucesso no isolamento de
porções da cadeia respiratória enzimaticamente activas. Em 1961, Mitchell
propôs a hipótese quimiosmótica para explicar a produção de energia na forma
de ATP, em que basicamente sugere que, durante a transferência de electrões,
é formado um gradiente de iões hidrogénio através da membrana interna,
posteriormente utilizado para a síntese de ATP.
Várias descobertas, como a de que as mitocôndrias possuem uma
maquinaria para sintetizar algumas proteínas, dirigiram a investigação para o
problema da biogénese mitocondrial. Os estudos de genética mitocondrial
também evoluíram bastante desde que Ephrussi descobriu uma mutação não
cromossomal (citoplasmática), que causava deficiências respiratórias em
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
30
leveduras e Schatz, em 1964, descreveu a existência de ADN mitocondrial
nesse organismo.
Mais recentemente, tem vindo a ser descrita a associação entre defeitos
mitocondriais e uma grande variedade de doenças humanas. São doenças
ainda raras que se podem manifestar com diversos sintomas, mais ou menos
severos, que incluem: problemas de crescimento e aprendizagem, problemas
respiratórios, neurológicos, cardíacos, visuais e/ou auditivos, enfraquecimento
muscular, e outros. As doenças afectam particularmente órgãos com maiores
necessidades energéticas, como o cérebro, coração e músculos, e estão a ser
alvo de investigação intensa.
2.3.7 – VACÚOLOS
Nas células vegetais diferenciadas, uma parte significativa do seu
volume é ocupado pelo vacúolo (Fig.13). Este aparece como um espaço
delimitado por uma membrana denominada tonoplasto. O tonoplasto tem a
capacidade de manter constante o pH ácido do fluido vacuolar. Dependendo do
tipo de célula, o volume ocupado pelo vacúolo ou conjunto de vacúolos –
Vacuôma – varia entre 5 e 95%.
A biogénese do vacúolo é assunto de relativa controvérsia. Os vacúolos
podem formar-se nas células meristemáticas por dilatação de túbulos do
retículo endoplasmático ou por fusão de vesículas derivadas, quer do retículo
endoplasmático, quer dos dictiossomas. Nestas células, o vacuoma é formado
por pequenos e numerosos vacúolos globulares ou filamentosos. Durante a
diferenciação celular, os vacúolos são, de entre os organelos celulares, os que
apresentam alterações mais notórias.
Os vacúolos das células vegetais podem assemelhar-se aos lisossomas
das células animais por armazenarem grande número de enzimas hidrolíticas.
Na célula vegetal desempenham, porém, funções muito diversas. O vacúolo
funciona, predominantemente, como uma estrutura de hidratação da célula
com a consequente ocupação de espaço e manutenção da forma celular. A
formação de células de grandes dimensões, como é o caso das células
vegetais definitivas, preenchidas unicamente por citoplasma, exigiria grande
dispêndio de energia, quer em termos de síntese inicial, quer em termos de
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
31
manutenção. Embora num processo de diferenciação normal as células
renovem os seus conteúdos citoplasmáticos e produzam algum citoplasma
adicional, o facto é que a diferenciação se traduz, na maioria dos casos, na
acumulação de água em pequenos vacúolos que progressivamente coalescem,
originando o vacúolo único, de grandes dimensões, das células definitivas.
Fig.13 – Vacúolo (Campbell e Reece, 2005).
O vacúolo pode ainda armazenar compostos de natureza diversa, muitos
dos quais são tóxicos para a célula se acumulados no citoplasma. Entre os
produtos armazenados no vacúolo encontram-se alguns de utilização
metabólica imediata. Tal é o caso das plantas que fixam o dióxido de carbono
durante a noite e o convertem em malato, que é armazenado no vacúolo até
ser utilizado na síntese de açúcares, síntese esta que ocorre na presença de
luz. Muitos dos compostos acumulados no vacúolo têm papel importante na
interacção animal/planta, nomeadamente as antocianinas das pétalas, que são
importantes na atracção de polinizadores. No entanto, nem todos os compostos
têm papel tão inofensivo.
Muitas plantas acumulam, no vacúolo, alcalóides extremamente tóxicos,
que impedem os herbívoros de as utilizar na sua dieta. O vacúolo pode ainda
acumular proteínas, como acontece com as sementes das gramíneas, que são
mobilizadas durante a germinação.
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
32
2.3.8 – PEROXISSOMAS Os peroxissomas (Fig.14) foram descritos, pela primeira vez, por
Rodhin, em 1954, no citoplasma das células dos tubos contornados proximais
do rim de ratinho e designados com o nome de “microcorpos”. Em 1960, De
Duve e colaboradores, caracterizaram-nos bioquimicamente e, em 1966, De
Duve e Baudhuin introduziram a designação de peroxissoma para definir o
organelo que continha uma oxidase que formava peróxido de hidrogénio
(H2O2), e catalase que decompunha esta substância. Mais tarde, os
peroxissomas foram observados em numerosas células animais e vegetais e
designados por peroxissomas, microperoxissomas, microcorpos e glixissomas.
Estes termos assinalam diferenças estruturais e funcionais do organelo
peroxissoma nas várias espécies animais e vegetais e até entre os órgãos e
tecidos da mesma espécie.
Fig.14 – Peroxissoma (Campbell e Reece, 2005).
Os peroxissomas são organelos citoplasmáticos rodeados de membrana
simples com matriz moderadamente densa, por vezes com uma estrutura
cristalina no seu interior. Observam-se em quase todas as células animais
(exceptuam-se os eritrócitos) em numerosas células vegetais e até em
protozoários, leveduras e algumas bactérias. Contêm numerosas enzimas que
catalisam reacções importantes para o metabolismo celular, intervêm na
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
33
produção e degradação de H2O2, na oxidação dos ácidos gordos de cadeia
muito longa, prostaglandinas, purinas e poliaminas, na biossíntese dos ácidos
biliares e plasmalogénios, no catabolismo dos ácidos fitânicos, pipecólico e
glioxílico e desempenham importantes funções metabólicas e de regulação
hormonal. Recentemente começaram a caracterizar-se doenças – doenças peroxissómicas (ou peroxissomais) – originadas por deficiência de uma ou
mais funções peroxissómicas, consequência da ausência de uma ou outra
enzima habitualmente presentes nestes organelos.
2.3.9 – CITOSQUELETO As células eucarióticas possuem uma extraordinária plasticidade,
flexibilidade e mobilidade, e a estrutura responsável por tais propriedades é o
citosqueleto.
O citosqueleto desempenha, simultaneamente, o papel de “ossos” e
“músculos” da célula, e representa um passo fundamental na evolução das
células procarióticas e eucarióticas.
As várias propriedades do citosqueleto devem-se à existência de três
grandes tipos de estruturas proteicas com propriedades distintas: os filamentos
intermediários, os microfilamentos de actina e os microtúbulos.
Os filamentos intermediários (com cerca de 10 nm de diâmetro) são
constituídos por agregados de proteínas filamentosas que variam consoante o
tipo de célula. Por exemplo, nas células epiteliais as proteínas constituintes dos
filamentos intermediários denominam-se ceratinas e desempenham um papel
fundamental na coesão intercelular.
Os microfilamentos de actina têm um diâmetro individual de cerca de
7nm e associam-se geralmente em feixes ou redes de localização
submembranar. Estes feixes ou redes são responsáveis pela forma e
plasticidade da membrana plasmática.
Os microtúbulos são constituídos por cilindros ocos de 25 nm de
diâmetro, cujas paredes são formadas por agregados de proteínas globulares
denominadas tubulinas. Nas células em interfase, os microtúbulos emanam de
uma estrutura perinuclear denominada centrossoma. Daqui os microtúbulos
espalham-se por todo o citoplasma onde servem de “trilhos” para o movimento
Capítulo 2 –A Célula: Unidade na constituição dos Seres Vivos
34
de vários organelos. Por exemplo, o transporte de vesículas envolvidas quer na
via de secreção, quer na via de endocitose, ocorre ao longo dos microtúbulos.
Estes são, também, os principais constituintes dos cílios e flagelos,
contribuindo assim para o movimento celular. Durante a divisão celular, os
microtúbulos desempenham ainda um papel fundamental, pois são os
responsáveis pela separação equitativa dos cromatídeos pelas duas células-
-filhas.
2.3.10 – PAREDE CELULAR A diferença entre animais e plantas não está nos processos moleculares
fundamentais, como a replicação de ADN, síntese proteica ou mesmo na
arquitectura molecular das membranas protoplasmáticas. A diferença mais
significativa entre estes dois grupos de seres vivos reside nas plantas
possuírem uma parede celular rígida, que confere às células características
peculiares, e de fixarem o dióxido de carbono atmosférico durante a
fotossíntese.
A parede celular é uma estrutura fundamental para o desenvolvimento
das plantas. Nas zonas da planta onde o crescimento é mais intenso, a parede
celular desempenha um papel preponderante na regulação do alongamento
celular e na definição da forma final das células. O grau de especialização da
parede, que é uma consequência do processo de maturação celular, contribui
para a definição da função específica da célula no tecido e no órgão. Enquanto
algumas das células definitivas mantêm a sua parede celular primária, por
vezes consideravelmente espessa, como é o caso das células do colênquima,
outras há que desenvolvem parede celular secundária, formada por novas
camadas de parede de composição diversa.
A parede celular é uma estrutura particular de matriz extracelular da
célula vegetal, intimamente associada à face exoplásmica do plasmalema.
Embora esta estrutura desempenhe muitas das funções atribuídas à matriz
extracelular das células animais, ela é normalmente mais espessa, mais
organizada e mais rígida, sendo constituída por macromoléculas
completamente diferentes das que constituem a matriz extracelular das células
animais.
_____________________________ III _____________________________
A MICROSCOPIA
3.1 – Um pouco de história 3.2 – O microscópio 3.3 – Tipos de microscópios
Microscópio fotónico
Microscópio electrónico
Microscópio protónico 3.4 – Constituição do microscópio óptico comum
Parte mecânica
Parte óptica 3.5 – Ampliação do microscópio 3.6 – Funcionamento do microscópio óptico
Cuidados a ter com o microscópio
Recomendações a seguir
depois da utilização do microscópio
Capítulo 3 –A Microscopia
36
3.1 – UM POUCO DE HISTÓRIA
Antes da época de Cristo, a propriedade de pedaços esféricos de vidro
aumentarem imagens já era conhecida pelos Assírios. Esta propriedade só
passou a ser efectivamente explorada por volta de 1300, quando começaram
a ser utilizadas lentes para melhorar a visão.
No início do século XVII, microscópios compostos produzidos por
fabricantes de lentes italianos e ingleses passaram a ser comuns na Europa.
Este tipo de microscópio, constituído por duas ou mais lentes associadas,
denomina-se microscópio composto, enquanto aquele em que apenas uma
lente é usada denomina-se microscópio simples.
Os primeiros microscópios compostos produziam aumentos maiores do
que os microscópios simples. Todavia, a imagem que forneciam era de
péssima qualidade, devido às anomalias cromáticas. As lentes utilizadas
naquela época causavam a decomposição da luz branca nas cores
constituintes, aparecendo o objecto em estudo no campo de visão envolvido
por linhas coloridas. Assim, muitos indivíduos preferiam utilizar microscópios
simples que, quando constituídos com lentes cuidadosamente polidas,
forneciam aumentos razoáveis, sem o problema de anomalias cromáticas. Um
desses indivíduos foi Antonie Van Leeuwenhoek, um excelente fabricante de
lentes que viveu na Holanda entre 1632 e 1723. As suas lentes manualmente
polidas forneciam aumentos da ordem das 40 a 270x.
Leeuwenhoek é tido como o descobridor dos seres microscópicos,
tendo sido ele quem primeiro observou as bactérias e os protozoários. Outras
contribuições dadas por Leeuwenhoek foram a descrição dos capilares que
ligam as artérias e veias dos vertebrados, a descrição microscópica dos
músculos, dentes e outros órgãos e a confirmação de que os espermatozóides
estão presentes no líquido seminal de machos de mamíferos.
Robert Hooke (1635 – 1703), um outro grande cientista, estudou entre
outras coisas a estrutura das penas das aves, das patas das moscas e da
cortiça. Em 1665, Hooke descreveu as suas observações sobre um pedaço de
cortiça como sendo todo perfurado e poroso, assemelhando-se muito, quanto
a isto, a um favo de mel, e que além disso, esses poros, ou células, não eram
Capítulo 3 –A Microscopia
37
Ocular
Tubo
Objectiva
Porta-objecto
Fonte de luz
Globo condensador
Fig.15 – Microscópio utilizado por Hooke e desenhos da estrutura microscópica da corti a em dois planos de corte perpendiculares entre si. (Adaptado de http://images.google.pt/images?q=primeiro+microscopio&ndsp=18&um=1&hl=pt-PT& tart=0&sa=N)
ç s
muito fundos, e sim constituídos por um grande número de pequenas caixas.
Pode-se assinalar que foi perante esta descrição que Hooke cunhou o termo
célula (pequena cela) para designar as pequenas cavidades que ele observou
na cortiça.
Após essas primeiras descobertas, os estudos microscópicos
avançaram muito pouco. Nenhuma descoberta importante foi feita no decorrer
dos 200 anos que se seguiram à descoberta da célula, por Robert Hooke. O
agente limitante, neste caso, foi sem dúvida a qualidade dos microscópios,
dado continuarem a apresentar anomalias cromáticas.
Finalmente, a partir de 1830 começaram a ser produzidas as
chamadas lentes acromáticas, as quais não produziam anomalias. Esta
inovação resultou num enorme progresso da indústria de microscópios, que
culminou com a invenção, pelo físico Ernest Abbé, do microscópio acromático com condensador, praticamente idêntico aos utilizados
actualmente. Essas inovações tecnológicas abriram uma nova era para as
Ciências Biológicas.
Capítulo 3 –A Microscopia
38
3.2 – O MICROSCÓPIO O microscópio é um instrumento que se destina a observar objectos de
reduzidas dimensões, impossíveis de observar à vista desarmada. É um
instrumento auxiliar de observação que permite aumentar o poder de
separação linear do globo ocular, facultando a observação de pontos, que
divergem entre si por valores muito reduzidos, como dois pontos distintos. Em
suma, é um aparelho amplificador que produz uma imagem ampliada do
objecto em estudo.
3.3 – TIPOS DE MICROSCÓPIOS
Existem dois tipos de microscópios:
Microscópio simples – contém uma lente simples ou um sistema
de lentes centradas, não permitindo uma ampliação dos objectos superior a
50x. Ex. Lupa.
Microscópio composto – é constituído por mais do que um
sistema de lentes. A formação da imagem é determinada, em grande parte,
pelo comprimento de onda da luz utilizada na iluminação da amostra e pelas
propriedades físicas desta. Com base no tipo de iluminação, podemos
considerar os seguintes tipos:
Microscópio fotónico (óptico) – a imagem é transmitida por um
feixe de fotões (luz visível ou ultravioleta).
Microscópio electrónico (de varrimento e de transmissão) – a
imagem é transportada por um feixe de electrões.
Microscópio protónico – a imagem é transportada por protões.
Capítulo 3 –A Microscopia
39
De entre os microscópios fotónicos, podemos ainda considerar os
seguintes sub-tipos:
Microscópio comum
Utilizado para ampliar, com uma série de lentes,
estruturas pequenas impossíveis de visualizar a olho
nu. É constituído por um componente mecânico que
suporta e permite controlar um componente óptico que
amplia as imagens.
(http://pt.wikipedia.org)
Microscópio ultravioleta
A radiação utilizada é o ultravioleta que tem um
comprimento de onda (λ) perto de 0,2 a 0,3 μm, inferior
aos valores de λ para a luz visível, o que permite
melhorar o limite de resolução comparativamente ao
microscópio de campo luminoso/claro. A óptica é
constituída por lentes de quartzo, já que o vidro não
transmite este tipo de radiação.
(http://docentes.esa.ipcb.pt)
Microscópio de fluorescência
Permite observar microrganismos capazes de fixar
substâncias fluorescentes (fluorocromos). A luz UV, ao
incidir nessas partículas, provoca a emissão de luz
visível e observa-se os microrganismos a brilhar em
fundo escuro.
(http://pt.wikipedia.org)
Capítulo 3 –A Microscopia
40
Microscópio de campo escuro
Os corpúsculos a examinar são fortemente iluminados
por feixes luminosos que penetram lateralmente, o que
é conseguido com condensadores especiais. Deste
modo, a única luz que penetra na objectiva é a
difractada pelas partículas presentes na preparação,
pelo que passam a ser visíveis em fundo escuro.
(http://pt.wikipedia.org)
Microscópio de contraste de fase
Permite a observação de microrganismos vivos, sem
coloração, através do contraste devido à diferença de
fase dos raios luminosos que atravessam o fundo
relativamente à fase da luz que atravessa os
microrganismos.
(http://pt.wikipedia.org)
Microscópio de polarização
O microscópio de polarização possui dois prismas: um
polarizador e outro analisador. A luz ao penetrar em
estruturas como músculo, ossos, celulose, fibras,
cabelos, etc., desdobra-se em dois feixes. O prisma
deixa passar uma das vibrações luminosas mas não a
outra, de modo que as estruturas que forem isotrópicas
serão anuladas e no seu lugar surgirá uma imagem
escura. As estruturas birrefringentes (anisotrópicas) produzirão um tipo de
vibração luminosa que será emitida, ficando brilhante. Somente as estruturas
birrefringentes aparecerão brilhantes, ficando o restante material escuro.
(Adaptado de http://monografias.brasilescola.com)
Capítulo 3 –A Microscopia
41
Relativamente aos microscópios electrónicos podemos considerar os
seguintes sub-tipos:
Microscópio electrónico de varrimento (SEM)
Cria uma imagem ampliada da superfície do
objecto. Não é necessário cortar o objecto para
se observar; este pode ser colocado no
microscópio sem grandes preparativos. Pode
ampliar os objectos 100 mil vezes ou mais,
sendo muito útil dado que permite obter
imagens tridimensionais da superfície do
objecto. (Adaptado de http://www.geocites.com)
Microscópio electrónico de transmissão (TEM)
Dirige o feixe de electrões para o objecto, cuja
imagem se deseja aumentar. Uma parte dos
electrões atravessa o objecto, formando uma
imagem aumentada. Exige uma cuidada
preparação do objecto, que necessita ser
cortado em camadas muito finas. Permite
ampliações do objecto até um milhão de vezes. (Adaptado de
http://www.geocites.com)
De todos os microscópios referidos anteriormente, apenas será
referenciado com maior relevância o microscópio óptimo comum, uma vez
tratar-se do microscópio utilizado nas aulas práticas de Ciências da Natureza
no 2º ciclo do Ensino Básico.
Capítulo 3 –A Microscopia
42
3.4 – CONSTITUIÇÃO DO MICROSCÓPIO ÓPTICO COMUM
Um microscópio óptico compõe-se essencialmente em duas partes
(Silva e Valente, 2003):
Parte mecânica
Parte óptica
Fig.16 – Esquema da constituição do microscópio óptico comum (http://campus.fornecity.com).
Parte Mecânica É constituído por uma série de peças que variam na forma e no
tamanho consoante o tipo de microscópio.
Pé/Base – Assegura a estabilidade do objecto de observação sobre
a mesa.
Capítulo 3 –A Microscopia
43
Coluna/Braço – Peça que se levanta verticalmente do pé. Pode ser
rígida ou articulada, rectilínea ou dobrada. É a região que suporta o tubo ou
canhão do microscópio e destina-se ao transporte deste instrumento de
observação.
Tubo ou canhão – Tubo cilíndrico que suporta nas suas
extremidades a lente ocular e a lente objectiva. Na extremidade inferior
encontra-se um revolver que suporta as várias objectivas e que por rotação
permite a rápida troca de lentes.
Platina ou mesa – Placa com forma variada (quadrangular ou
circular) fixa ou rotativa. É horizontal e está fixa a meio da coluna ou articulada
com esta. Destina-se a suportar a preparação do objecto a observar
apresentando duas pinças para fixar o objecto. No centro tem a janela através
da qual passam os raios luminosos que vão incidir no objecto.
Revólver – Dispositivo que permite a rápida substituição de uma
objectiva por outra.
O parafuso macrométrico é utilizado na pré-focagem para
movimentos de grande amplitude.
O parafuso micrométrico é utilizado na focagem de pequena
amplitude. Estes movimentos podem ser transmitidos ao canhão ou platina.
Parte Óptica É o sistema funcional do microscópio, tendo como funções iluminar o
objecto e fornecer deste uma imagem ampliada.
Fonte luminosa – Feixe de raios luminosos fornecido pelo filamento
incandescente de uma lâmpada, existente num suporte ajustado à base do
microscópio.
Condensador – A sua função essencial é projectar no plano da
preparação a imagem da fonte luminosa.
Capítulo 3 –A Microscopia
44
Diafragma – O diafragma limita o feixe de raios que passa pelo
sistema óptico. Situa-se acima do foco inferior do condensador e permite a
variação da incidência da luz que chega à preparação e passa pelo
condensador. Permite a observação do campo iluminado e do campo
observado.
Objectiva – Uma objectiva é um sistema de lentes centradas. Esse
recebe a luz do objecto e projecta uma imagem deste que é fornecida à ocular
– imagem intermédia – real, ampliada e invertida.
Ocular – O sistema ocular é suspenso pela extremidade superior do
tubo e é constituído pela lente ocular propriamente dita (situada superiormente
junto do globo ocular do observador) e pela lente colectora (situada próximo
do objecto). A lente ocular é a única deste sistema responsável pela
ampliação da imagem, enquanto a lente colectora conduz a imagem até ao
plano focal da lente ocular.
3.5 – AMPLIAÇÃO DO MICROSCÓPIO
Somente duas das lentes que fazem parte do sistema de ampliação
têm funções de ampliação (Silva e Valente, 2003):
Lente frontal da objectiva
Lente ocular da ocular
A ampliação total do microscópio é igual ao produto da ampliação da
ocular pela ampliação da objectiva.
Ampliação = Ampl. ocular x Ampl. Objectiva
Ocular Objectiva Ampliação
10x
10x
10x
10x
4x
10x
40x
100x
10x4=40x
10x10=100x
10x40=400x
10x100=1000x
Capítulo 3 –A Microscopia
45
3.6 – FUNCIONAMENTO DO MICROSCÓPIO ÓPTICO
O microscópio é um aparelho muito útil mas caro, pelo que deve ser
usado com grande cuidado.
Cuidados a ter com o microscópio
Manuseá-lo com o máximo cuidado. Qualquer movimento que
seja efectuado com ele deve ser sempre com uma mão a segurar a coluna e a
outra a base.
Nunca o colocar nas extremidades de qualquer superfície, para
não cair.
Mantê-lo sempre limpo de poeiras e de outras sujidades.
Nunca tentar desmontar qualquer uma das partes constituintes.
Não colocar os dedos nas lentes (condensador, objectiva e
ocular) nem deixar que estes toquem na lâmina ou lamela da preparação.
Limpar as lentes cuidadosamente com material próprio, de uma
forma circular, sem esfregar.
Recomendações a seguir depois da utilização do microscópio
Baixar a platina.
Colocar a objectiva de menor ampliação no prolongamento do
tubo.
Retirar a preparação e arrumá-la no lugar que lhe é destinado.
Abrir o diafragma e subir o condensador.
Verificar se a platina e as lentes ficaram limpas.
Apagar a luz do microscópio.
Cobrir o microscópio com a protecção e guardá-lo na respectiva
caixa e local.
_____________________________ IV _____________________________
EXPERIÊNCIAS LABORATORIAIS
4.1 – Importância das experiências
laboratoriais
4.2 – Lista de material de laboratório
mais usual
4.3 – Protocolos experimentais
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
47
4.1 – IMPORTÂNCIA DAS EXPERIÊNCIAS LABORATORIAIS
As actividades laboratoriais têm como uma das tarefas principais a
realização de um protocolo experimental que permita colocar em prática e
alargar os conhecimentos assimilados no decorrer das aulas, tornando-se
mais motivador para quem ensina e para quem aprende. São um meio
privilegiado para o desenvolvimento pessoal e interpessoal. Envolvem a
compreensão de factos, princípios e teorias, e asseguram a aquisição de
práticas de manipulação. É no laboratório que se pode manipular material,
aprender técnicas e experimentar a sensação de ver como as coisas
acontecem (Pinto et al., 1996).
A importância da realização de experiências no contexto do ensino
actual é bastante significativa. Actualmente, em todos os níveis de ensino
valoriza-se a pesquisa e a produção de trabalhos neste âmbito. Este tipo de
trabalho vai estimular o raciocínio lógico e a pesquisa de informação,
permitindo aos alunos desenvolver capacidades de manipulação de material,
de planificação do trabalho, de interpretação de dados e formulação de novos
problemas.
Na realização deste tipo de actividade prática laboratorial cabe ao
docente um papel de “guia”, orientando os alunos segundo as regras e
conteúdos da disciplina de Ciências da Natureza. No entanto, sem privar os
alunos do máximo de margem de manobra para que o seu raciocínio possa
ser conciliado com os próprios interesses, deve tanto quanto possível zelar
para que não ocorram alguns erros frequentes, tais como a leitura excessiva e
não orientada da bibliografia e uma atitude precipitada para a recolha de
dados e aplicação desadequada das técnicas.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
48
4.2 – LISTA DE MATERIAL DE LABORATÓRIO (MAIS USUAL NO 2º CICLO)
A inexistência de muito do material necessário às actividades
experimentais nos Laboratórios de Ciências da Natureza do 2º ciclo, leva a
que a maior parte das vezes as aulas práticas não sejam cumpridas.
MATERIAL DE DISSECÇÃO
• Agulha de ponta fina
• Bisturi
• Pinça de pontas finas
• Tesoura de pontas finas
• Tina de dissecção
MATERIAL DE VIDRO o Balão de vidro
o Balão volumétrico
o Bureta
o Caixa de Petri
o Copo de pé (graduado)
o Balão de Erlenmeyer
o Funil
o Gobelé
o Lâmina e lamela de vidro
o Pipeta
o Proveta
o Termómetro
o Tina de vidro
o Tubos de ensaio
o Vareta
o Vidro de relógio
OUTRO MATERIAL Almofariz
Balança
Esguicho
Espátulas
Lamparina de álcool
Pinças de tubos de ensaio
Placa eléctrica
Rolhas
Seringa
Suporte para tubos de ensaio
Suporte universal
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
49
4.3 – PROTOCOLOS EXPERIMENTAIS PROTOCOLO I – OBSERVAÇÃO DE CÉLULAS DA EPIDERME DO BOLBO DA CEBOLA
MATERIAL 1-Microscópio
2-Pinça
3-Agulhas de dissecação
4-Bisturi
5-Vidro de relógio
6-Lâminas e lamelas
7-Papel de filtro
8-Solução de azul-de-
9-Solução de vermelho neutro a
0,5 gr/l
10-Bolbo da cebola
PROCEDIMENTO
nudas que formam o bolbo, e com a
cobre a parte côncava que ficou a
agmento da epiderme num vidro de
ssível o enrolamento e procurando
uda de duas agulhas de dissecação.
metileno
1 – Cortar o bolbo da cebola em quatro partes.
2 – Separar duas das escamas car
ajuda da pinça retirar da epiderme que re
descoberto.
3 – Introduzir rapidamente o fr
relógio com água, evitando tanto quanto po
distendê-lo o mais que puder com a aj
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
50
4 – Cortar com a tesoura um fragmento dessa película epidérmica e
montá-lo entre a lâmina e lamela, utilizando a água como meio de montagem.
5 – Observar ao microscópio a preparação que acabou de montar,
primeiro com a objectiva de menor ampliação e depois com a de maior
ampliação.
6 – Deitar uma a duas gotas de solução de azul-de-metileno ao longo
de uma das margens da lamela e aspirar, na margem oposta, com papel de
filtro, até o corante ter penetrado entre a lâmina e lamela.
7 – Observar novamente a preparação ao microscópio. Registar o que
se observou e fazer um esquema.
8 – Deitar algumas gotas de solução de vermelho neutro na água do
vidro do relógio. Introduzir um fragmento da epiderme das escamas da cebola
nesse soluto durante alguns segundos.
9 – Retirar o fragmento e montá-lo entre a lâmina e lamela, numa gota
de água.
10 – Observar novamente a preparação ao microscópio e registar o que
se observou num esquema.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
51
OBSERVAÇÕES EFECTUADAS O bolbo da cebola é constituído por várias folhas carnudas e imbricadas
– túnicas. Cada túnica é recoberta por duas epidermes uma na face côncava
e outra na face convexa, sendo cada uma delas formada por uma única
camada de células. Cada célula é limitada por uma parede celular incolor
constituída por celulose.
Nas observações efectuadas foi possível observar o núcleo (a), o
citoplasma (b) e a parede celular (c).
Observação de células
vegetais obtidas do bolbo da
cebola utilizando a água como
meio de montagem (Aobj – 20x).
Observação de células
vegetais obtidas do bolbo da
cebola utilizando o corante
vermelho neutro (Aobj – 20x).
Observação de células
vegetais obtidas do bolbo da
cebola utilizando o corante azul-
-de-metileno (Aobj – 40x).
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
52
PROTOCOLO II – OBSERVAÇÃO DE CÉLULAS DO PARÊNQUIMA DA POLPA DE
TOMATE
MATERIAL 1 – Microscópio
2 – Bisturi
3 – Lâminas e lamelas
4 – Tomate
5 – Agulha de dissecç
6 – Vidro de relógio
PROCEDIMENTO
1 – Cortar transversalmente um tomate e com o auxílio do bisturi retirar
uma pequena porção da polpa carnuda.
2 – Colocar o fragmento da polpa sobre uma lâmina e esmague-o com
o auxílio do bisturi.
3 – Cobrir com a lamela e observar ao microscópio utilizando, como
usualmente, primeiro a objectiva de menor ampliação e, seguidamente, a de
maior ampliação.
4 – Fazer um esquema legendado da sua observação.
ão
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
53
OBSERVAÇÕES EFECTUADAS
O mento do tomate é um fruto, uma vez que é o produto do desenvolvi
ovário e do óvulo da flor, formando o pericarpo e as sementes,
respectivamente, após a fecundação.
Foi possível observar cromoplastos, isto é, constituintes celulares ricos
em pigmentos (carotenóides) vermelhos, amarelos ou cor-de-laranja.
Devido à fraca qualidade das imagens obtidas durante a obs
ados da actividade experimental, foi necessário recorrer aos
colares para obtenção dessas imagens com uma certa qualidade.
ervação
dos result
manuais es
Células da polpa de tomate – x125 (Adaptado de Pinto et al., 1996)
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
54
PROTOCOLO III – OBSERVAÇÃO DE CÉLULAS DO TUBÉRCULO DA BATATEIRA MATERIAL
1 – Microscópio
2 – Bisturi
3 – Lâminas e lamelas
4 – Batata
6 – Água destilada
7– Água iodada ou soluto de
Lugol
PROCEDIMENTO
1– Cortar a batata em duas metades.
2 – Com o auxílio de um bisturi rasgar uma pequena porção da polpa
da batata.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
55
3 – Montar a raspagem numa gota de água destilada. 4 – Observar a preparação ao microscópio e elaborar um esquema do
da batata e montá-la em soluto
6 – Observar ao microscópio a preparação e esquematizar o que se
observou.
que se observou.
5 – Fazer uma nova raspagem da polpa
de Lugol.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
56
OBSERVAÇÕES EFECTUADAS
A batata é um tubérculo subterrâneo da batateira, muito empregue na
alimentação. As células que o constituem formam um tecido – o parênquima
amiláceo – com forma arredondada em que o citoplasma (a) apresenta
inúmeros corpúsculos ovóides ou elípticos: os amiloplastos (b). Estes
organelos têm como principal função o armazenamento de uma substância de
reserva, o amido, sob a forma de grãos de amido (c). Foi também possível
observar a parede celular (d).
Observação de células do
tubérculo da batateira utilizando
água destilada como meio de
montagem (Aobj – 40x).
Observação de células do
tubérculo da batateira utilizando
soluto de Lugol como meio de
montagem (Aobj – 40x).
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
57
PROTOCOLO IV – OBSERVAÇÃO DE CLOROPLASTOS
MATERIAL 1- Ramo de Elodea
2- Microscópio óptico composto
3- Pinça
4- Agulhas de dissecação
5- Água destilada
PROCEDIMENTO
1 – Destacar, com o auxílio de uma pinça, uma folha de Elodea e
montá-la, entre lâmina e lamela, numa gota de água destilada.
2 – Observar ao microscópio a preparação e esquematizar o que se
observou.
ealização desta actividade
l descrevê-la, devido à importância
– os quais apresentam cor verde
a clorofila, essencial à realização da
Cloroplastos da Elodea (http://azolla.fc.ul.pt/aulas/images/Aloe1_001.jpg)
OBSERVAÇÕES EFECTUADAS
Embora não se tivesse procedido à r
experimental, achou-se indispensáve
destes organelos – os cloroplastos (a) devido à existência de um pigmento,
fotossíntese.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
58
PROTOCOLO V – OBSERVAÇÃO DE SERES VIVOS DE UMA INFUSÃO
MATERIAL 1-Microscópio óptico c
2-Lâminas e lamelas
3-Agulhas de dissecação
4-Pipeta
5-Infusão
PROCEDIMENTO
A – Preparação da infusão 1. Numa tina de vidro deitar 730 cm³ de água da torneira e 25 cm³ de água
do charco. Colocar, à superfície da água, uma mão cheia de feno, deixando
um espaço de cerca de 4 cm até aos bordos da tina.
2. Tapar a tina com uma placa de vidro e deixar num local iluminado à
temperatura ambiente, para ser observado periodicamente.
B – Observação da infusão Fazer preparações extemporâneas em diferentes fases da infusão – ao 5º,
10º e 20º dias. Para cada uma delas realizar as seguintes operações:
omposto
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
59
1. Com uma pipeta, retirar uma gota sempre à mesma profundidade.
2. Colocar a gota numa lâmina e cobrir com uma lamela.
3. Observar a preparação ao microscópio.
4. Elaborar um relatório referindo os microrganismos observados durante
imagens obtidas durante a observação
uma vez que os manuais apresentam
imagens. Nesse sentido, optou-
(protozoários) mais frequentes em
Paramecium aurelia (http://en.wikipedia.org/wiki/Paramecium)
as três fases da experiência.
OBSERVAÇÕES EFECTUADAS
Devido à fraca qualidade das
dos resultados da actividade experimental, foi necessário recorrer a imagens
divulgadas na internet,
fundamentalmente esquemas e muito poucas
-se por seleccionar os seres vivos
observações de uma infusão.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
60
Euglena sp. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Euglena)
Vorticella
(http://en.wikipedia.org/wiki/Vorticella)
Amoeba (http://en.wikipedia.org/wiki/Amoeba)
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
61
PROTOCOLO VI – OBSERVAÇÃO DE UM ESFREGAÇO SANGUÍNEO HUMANO
Como se considera inconveniente a utilização de sangue humano nas
aulas, é possível utilizar sangue de um qualquer animal para realizar um
esfregaço sanguíneo e aplicar as técnicas de coloração adequadas. Neste
caso particular, foi utilizado sangue humano previamente recolhido por uma
técnica de análises clínicas.
MATERIAL Microscópio óptico composto
Sangue Humano
Lâminas e lamelas
Caixas de Petri
Pipeta
Água destilada
Corante de Giemsa
Corante de May-Grünwald
PROCEDIMENTO 1. Colocar na extremidade de uma lâmina uma gota de sangue,
seguidamente fazer deslocar outra lâmina sobre a anterior de forma a espalhar
bem o sangue.
2. Deixar secar a lâmina agitando-a.
3. Colocá-la numa caixa de Petri.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
62
4. Cobrir a lâmina com 20 gotas de corante de May-Grünwald e aguardar
cerca de 5 minutos. Durante este tempo misturar 20 gotas de Giemsa com
20ml de água destilada e deitar numa caixa de Petri.
5. Deitar 20 gotas de água destilada no esfregaço e aguardar 1 minuto.
6. Lavar com água destilada.
7. Colocar a lâmina com o esfregaço para baixo na caixa de Petri que
contém o corante de Giemsa e aguardar 5 minutos.
8. Lavar com água destilada e deixar secar.
9. Observar ao microscópio.
10. Procurar identificar as células sanguíneas.
Capítulo 4 – Experiências Laboratoriais
63
OBSERVAÇÕES EFECTUADAS
O sangue é um tecido conjuntivo líquido que circula pelo sistema
vascular sanguíneo dos animais vertebrados. O sangue é produzido na medula
óssea e tem como função a manutenção da vida do organismo, assegurando a
realização das trocas gasosas (hemácias, eritrócitos ou glóbulos vermelhos),
de processos imunitários (leucócitos ou glóbulos brancos) e do mecanismo de
coagulação sanguínea (plaquetas ou trombócitos).
Observação de células
sanguíneas – leucócitos (a) e
hemácias (b) (Aobj – 40x).
Observação de células
sanguíneas – leucócito (a),
hemácias (b), plaquetas (c) e
plasma (d) (Aobj – 100x).
Observação de células
sanguíneas – hemácias (b),
plaquetas (c) e plasma (d) (Aobj
– 100x).
_____________________________ V _____________________________
CONCLUSÃO
Capítulo 6 – Bibliografia
65
Ao longo dos últimos anos tem sido consensual a ideia de que há uma
disparidade crescente entre a educação nas nossas escolas e as
necessidades e interesses dos alunos. A Ciência transformou não só o
ambiente natural, mas também o modo como pensamos sobre nós próprios e
sobre o mundo no qual habitamos.
Aprender a ensinar é uma tarefa para a vida toda de um professor. Com
base neste lema e sendo eu uma professora em início de carreira, ao observar
a realidade do meu trabalho constatei que ao nível das Ciências da Natureza,
nomeadamente nos domínios da Citologia e da Microscopia, não reunia os
conhecimentos essenciais para ensinar aos meus alunos qualquer conteúdo
no qual as actividades experimentais estivessem patentes.
Assim sendo, o trabalho desenvolvido nesta dissertação serviu para
aumentar os meus conhecimentos sobre a célula a nível estrutural e funcional,
e a entrar em contacto com um “mundo” totalmente diferente do contexto sala
de aula que é o laboratório. Aprendi a manipular o material, a manusear o
microscópio, a fazer preparações para observação microscópica e a efectuar
as próprias observações e registos. Tudo isto contribuiu para que me sinta
hoje mais capaz de exercer a função de professora e mais preparada para
leccionar os conteúdos que se enquadram no programa de Ciências da
Natureza e que foram objecto de estudo desta dissertação.
O conhecimento científico não se adquire simplesmente pela vivência
de situações quotidianas. Há necessidade de uma intervenção planeada do
professor, a quem cabe a responsabilidade de sistematizar o conhecimento,
de acordo com o nível etário dos alunos e dos contextos escolares. Foi nessa
perspectiva que parti para esta aprendizagem, segura de que agora reúno
mais condições para poder ensinar, mas sempre consciente que ainda tenho
muito para descobrir e aprender…
_____________________________ VI _____________________________
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