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Formação ou “canudo”: qual a importância de um curso como sinal
para o mercado de trabalho?
Tiago Pereira Santos
Mestre em Economia com Especialização em Economia Financeira pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
Adaptado de Trabalho de Projecto realizado no âmbito do mestrado em Economia na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, sob orientação do Senhor Professor Doutor Pedro Nogueira Ramos
1. Introdução
A crise económica que se abate actualmente sobre Portugal tem como uma das suas
expressões mais nefastas o elevado crescimento do desemprego atingido ao longo dos últimos
anos e que segundo o Instituto Nacional de Estatística, ultrapassou os 10% da população activa
em 2010. Este facto criou um espaço de discussão interna acerca de quais são as causas e as
consequências de tal nível de desemprego. Devido às diferentes sensibilidades que o tema
provoca, por vezes, as paixões e a ideologia podem sobrepor-se aos dados e à análise científica.
Assim, tornou-se um dos lugares comuns do debate social a hipótese de que os portadores de
formação superior encontram actualmente, dificuldades de inserção no mercado de trabalho,
superiores aos indivíduos com níveis de formação mais baixos. Portugal (2004:1) afirma que
“sendo o desemprego dos licenciados um acontecimento relativamente invulgar, este fenómeno
tende a atrair uma atenção desproporcionada da comunicação social”. No entanto, desde 2004
várias foram as mudanças ocorridas na economia portuguesa, na legislação laboral ou no
cenário económico e macroeconómico. Daí que o desemprego dos licenciados possa ter passado
de “acontecimento relativamente invulgar” para a categoria de acontecimento vulgar e
recorrente. Este trabalho pretende responder a esta dúvida que grande parte da sociedade
expressa: existe ou não um elevado desemprego dos indivíduos com formação superior?
Esta percepção social contrasta com uma outra também largamente enraizada que se prende
com a ideia de que os indivíduos obtêm formação superior tendo em vista a obtenção do
chamado “canudo” ou seja, tendo em vista apenas o “status” social1 que a posse de formação
superior permite e não a formação em si, que é, segundo a concepção mais tradicional, o
verdadeiro objectivo de quem tira um curso superior. Esta constatação leva-nos a perguntar qual
o verdadeiro valor de um curso superior para o seu detentor. Um curso superior tem valor na
medida em que apetrecha o seu detentor com ferramentas que permitem um melhor desempenho
no trabalho, melhorando assim a sua produtividade, ou será que podem existir outras
motivações e vantagens advindas de um diploma de formação superior?
De facto, dentro da própria ciência económica podemos encontrar modelos teóricos
diferentes da visão mais convencional que nos permitem ir para lá do dilema entre formação e
“canudo” no debate acerca da entrada no mercado de trabalho dos recém-formados no ensino
superior.
No seio da economia da informação surgiram, ao longo das últimas décadas, teorias que nos
permitem enquadrar de forma diferente o debate. Akerlof (1970) lança o mote para a existência
de mercados com assimetrias de informação onde podem não existir equilíbrios, no sentido
walrasiano, e onde as forças do mercado podem ditar a inexistência do próprio mercado. No
1 Esta visão é recorrente na sociologia onde autores como Wright (2005) definem a existência de classes sociais onde a posse de formação superior é um elemento fundamental da diferenciação entre classes.
seguimento, Spence (1973) aborda a forma como mercados com assimetrias de informação se
comportam de forma a minimizar essas imperfeições informacionais. O exemplo prende-se com
o mercado de trabalho e a hipótese de a obtenção de um curso superior poder ter como objectivo
a sinalização da aptidão e posterior bom desempenho do indivíduo no trabalho.
Assim, este trabalho terá a mesma estrutura que teve esta evolução da economia da informação
e que a levou a olhar para a educação superior como a transmissão de informação no mercado
de trabalho. Na secção 2 será apresentada a área da economia da informação imperfeita,
partindo dos trabalhos de Akerlof (1970) e com o auxílio de Stiglitz (2000; 2002) com um
enquadramento do aparecimento da teoria e exemplos da sua aplicação prática. Na secção 3 será
apresentado o modelo simples de sinalização com apresentação de conceitos e discussão dos
principais resultados do modelo. Na secção 4 será feita uma análise estatística da realidade do
mercado de trabalho em Portugal, especialmente do desemprego de indivíduos com formação
superior. Por fim, serão apresentadas as conclusões.
2. O desemprego como um problema informacional
A introdução de assimetrias e imperfeições de informação nos modelos económicos
permitiu chegar a novas conclusões e abrir novos campos dentro da ciência económica, a tal
ponto que Stiglitz considere a economia da informação como uma revolução intelectual
(Stiglitz, 2000) ou mesmo, uma mudança paradigmática na ciência económica (Stiglitz, 2002).
Sê-lo-á na medida em que apresenta razões para a intervenção estatal e explicações
convincentes para várias ineficiências detectadas na economia de mercado. São os casos da
existência de desemprego em equilíbrio, existência de instituições atípicas, mercados
incompletos ou inexistentes, entre outras.
Stiglitz (2000) divide os problemas informacionais em dois tipos: problemas de selecção e
problemas de incentivos. Os problemas de selecção estão fundados no facto de que a actuação
de um agente e as suas escolhas num mercado transportarem em si próprias informação
relevante para os outros agentes no mercado num processo denominado de auto-selecção. Um
dos trabalhos pioneiros no âmbito dos problemas de selecção surge em Akerlof (1970). Neste
artigo, o autor aborda a existência de assimetrias de informação em relação à qualidade no
mercado de automóveis, traçando dessa forma conclusões distintas da teoria com informação
perfeita e que, de seguida transpõe para diferentes mercados como o dos seguros de saúde,
mercado de trabalho ou do crédito.
Seguindo Akerlof (1970), consideremos a existência de apenas quatro tipos de automóveis –
novos ou usados e bons ou maus (“lemons”). Na compra de um carro novo, um indivíduo
desconhece a sua qualidade, sabendo apenas com que probabilidade se trata de um bom ou de
um mau carro. Após a compra e utilização durante um período de tempo o comprador passa a
dispor de maior informação sobre a qualidade do automóvel comprado. Na venda deste
automóvel usado emerge uma assimetria de informação. O vendedor dispõe de maior
informação sobre a qualidade do que o comprador. No entanto, o preço de um bom ou de um
mau automóvel deve ser o mesmo já que é impossível para o comprador distinguir a sua
qualidade. Por outro lado, o preço de um automóvel usado não pode ser o mesmo que o de um
automóvel novo já que desse modo “seria vantajoso vender um mau automóvel ao preço de um
automóvel novo e comprar outro automóvel novo com uma maior probabilidade de ser um bom
automóvel” (Akerlof, 1970: 489). Também o detentor de um bom automóvel não pretenderá
vendê-lo já que na troca por um automóvel novo existe a probabilidade de obter um “lemon”.
Assim, no mercado de automóveis usados apenas são transaccionados os de menor qualidade
ocorrendo assim um problema de selecção adversa que resulta do facto de, com assimetrias de
informação, a própria entrada no mercado disponibilizar informação sobre a qualidade do
automóvel. Transpondo a conclusão para um mercado com diferenciação contínua dos bens,
“torna-se possível ter o mau expulsando o “não-tão-mau, que expulsa o médio que, por sua vez
expulsa o “não-tão-bom” e que expulsa o bom” numa sequência de eventos tal que deixaria de
haver mercado de todo” (Akerlof, 1970:490).
A aplicação do conceito ao caso particular dos seguros de saúde explica, por exemplo,
porque têm os indivíduos com mais de 65 anos de idade uma grande dificuldade em aceder aos
referidos seguros já que num mercado com informação perfeita o preço do seguro subiria para
compensar o risco advindo da maior idade. No entanto, tendo os indivíduos uma maior
informação acerca do seu estado de saúde ou risco de doença do que as companhias de seguro,
apenas os indivíduos com um elevado risco de doença aceitariam pagar mais por um seguro, o
que causa um problema de selecção adversa. O preço torna-se muito alto para aqueles que têm
um baixo risco de doença pelo que estes deixam de comprar o seguro. Apenas com clientes de
risco elevado, o preço do seguro torna-se também ele tão elevado para compensar o risco que a
compra de seguro de saúde deixa de ser vantajosa, acabando por não existir verdadeiramente um
mercado.
A existência de problemas de selecção leva à criação de instituições com vista a minorar
esta falha de mercado. No mercado de automóveis por exemplo, surgem as garantias como
forma de transmitir informação acerca da qualidade entre o agente informado e o agente não-
informado. Surge também espaço para a actuação do Estado com vista a obter melhorias de
eficiência nestes mercados, por exemplo, através de regulação ou impostos.
O segundo problema central da Economia de Informação é um problema de incentivos,
geralmente designado de risco moral. O problema surge da existência de contratos incompletos
e está relacionado com o facto de um contrato poder gerar incentivos para que os indivíduos
ajam de forma ineficiente e contrariamente ao esperado. Por exemplo, no caso de um seguro
contra incêndio decorre que a existência do seguro pode levar o comprador a tomar atitudes,
mesmo que passivas, que aumentem a probabilidade de ocorrência de incêndio. No mercado de
trabalho observamos também a existência de mercados incompletos. Neste mercado, os
contratos não conseguem estipular o esforço ou empenho do trabalhador na prossecução do seu
trabalho pelo que existe também aqui a possibilidade da ocorrência de risco moral. Para
contrariar os efeitos do risco moral surgem também diversas instituições com o objectivo de
voltar a restabelecer o esquema de incentivos dos agentes, tais como a monitorização ou o
pagamento por objectivos no mercado de trabalho. Apesar de contrariarem os incentivos
inadequados causadores de risco moral, estes arranjos institucionais são ineficientes podendo
causar selecção adversa. Por exemplo, um seguro que não cobre na totalidade o valor do objecto
segurado resolve em parte o problema de risco moral transferindo parte dos incentivos para a
preservação do objecto para o agente comprador do seguro. No entanto, este esquema de seguro
corresponde a um aumento no preço do seguro e consequentemente a um movimento de
expulsão do mercado dos agentes com melhor qualidade, isto é, com menor probabilidade de
sinistro.
A teoria dos salários de eficiência apresentada por Akerlof (1984) é um exemplo de como
funcionam os mecanismos de selecção adversa e risco moral. Os salários de eficiência surgem
de um problema informacional que consiste na hipótese da eficiência dos trabalhadores estar
relacionada com o seu nível de salário. Daqui se obtém que as empresas podem ter incentivos a
pagar salários mais elevados do que os praticados em concorrência pura e perfeita – para atrair
os trabalhadores mais eficientes ou induzir um maior esforço e compromisso dos seus
trabalhadores – abrindo assim a possibilidade da ocorrência de um equilíbrio com desemprego
onde, ao preço de mercado, a oferta de trabalho exceda a procura sem que o mecanismo de
preços tenda a fazer desaparecer tal desigualdade.
No contexto dos problemas de selecção adversa surgiram dois modelos fundamentais, os
modelos de screening (triagem) e os modelos de sinalização (signaling). A diferença entre
ambos os modelos está relacionada com especificidades no que concerne a qual dos agentes
actua primeiramente. No caso dos modelos de sinalização está em causa a hipótese de que é a
parte informada que se move primeiramente, ou seja, que transmite informação que depois será
interpretada e utilizada como forma de colmatar o problema de selecção adversa. Nos modelos
de screening é a parte sem informação que move primeiro, estabelecendo dessa forma como
será feita a selecção e portanto, influenciando primeiramente a acção do agente informado.
Spence (1973) introduz o conceito de sinalização como atributos pessoais observáveis que
se encontram sujeitos à manipulação pelo próprio indivíduo e que transmitem uma informação
aos outros agentes no mercado. Este conceito surge como forma de colmatar as assimetrias de
informação relacionadas com problemas de selecção adversa, explicando assim a existência de
instituições como as garantias no mercado de automóveis, ou a função dos cursos superiores no
mercado de trabalho (Spence, 1973). Os modelos de sinalização são usualmente aplicados à
importância da educação no mercado de trabalho devido à natureza da opção por obter formação
superior que tal como expresso em Stiglitz (2000), parte de um quadro de hipóteses que
discriminará os indivíduos entre os seus detentores e não-detentores, ao invés do modelo de
screening onde os indivíduos se moveriam em resposta à acção anterior de um outro agente não
informado.
A ideia de que um curso superior é um sinal da qualidade do seu detentor pode levar a
conclusões radicais. Se assim é, a formação proporcionada pelo curso será irrelevante. O que é
importante é a dificuldade do curso que constitui um desafio só superado pelos trabalhadores
com melhor qualidade ou produtividade. Um bom curso superior será um curso selectivo, mas
não precisamente um curso em que a matéria leccionada é útil. No entanto, a teoria da
sinalização pode também ser vista, numa leitura mais moderada, somente como um
complemento à teoria tradicional segundo a qual, a educação actua aumentando o capital
humano do trabalhador que, dessa forma, verá aumentar a sua produtividade e o seu salário de
forma correspondente.
3. A Educação como sinal da aptidão do trabalhador
Como já referido, Spence (1973) nota que aquando da contratação de um novo trabalhador o
empregador não tem informação completa acerca da sua produtividade. Este facto pode resultar
num problema de selecção adversa no mercado de trabalho como explicitado na secção anterior,
o que conduz a resultados ineficientes neste mercado. A existência de assimetrias de informação
no mercado exige a existência de formas de os agentes transmitirem informação relevante entre
si. Spence (1973) aplica o conceito de sinalização ao investimento em educação, ou seja, a
educação como forma do trabalhador sinalizar a sua produtividade no mercado de trabalho em
complemento de a entender como mecanismo incrementador da própria produtividade. Na
verdade, a hipótese de que a produtividade não varia em função da educação é apenas uma
hipótese simplificadora, tal como expresso em Spence (2002) onde a inserção do factor capital
humano mantém as principais conclusões do modelo de sinalização. A existência de sinalização
não contraria o efeito de incremento da produtividade apontado pela teoria do capital humano
mas antes aponta a existência de um efeito de sinalização relevante para o mercado e cujas
conclusões permitem obter uma melhor representação do mercado de trabalho.
Para que a educação seja um mecanismo sinalizador da produtividade do indivíduo é
necessário que a produtividade esteja relacionada com a estrutura de custos da sinalização ou
seja, quanto menor a produtividade maior terá de ser o custo do investimento em educação
surgindo desta forma uma relação positiva entre o nível de educação do indivíduo e a sua
produtividade.
Formalmente, estamos na presença de um mercado de trabalho com assimetrias de
informação existindo, por simplificação, dois grupos de trabalhadores, I e II, com produtividade
1 e 2 respectivamente. A informação acerca da produtividade de cada indivíduo isolado é
desconhecida pelo empregador que apenas conhece a proporção de trabalhadores em cada um
dos grupos, ou seja, a probabilidade de um dado trabalhador ter uma produtividade de 1 ou de 2.
Neste quadro de informação imperfeita e sem mecanismos de sinalização da produtividade dos
trabalhadores, o salário praticado pelo empregador seria a média dessa mesma produtividade,
portanto ppp 22)1(1 , sendo p a proporção dos trabalhadores pertencentes ao
grupo I. Surge então o problema de selecção adversa já descrito anteriormente já que os
trabalhadores do grupo II obteriam um salário inferior à sua produtividade ao invés do caso dos
“maus” trabalhadores do grupo I que receberiam um salário superior à sua produtividade,
cifrando-se esse excesso em pp 11)2( . Os empregadores são assim confrontados com
uma “expulsão” dos trabalhadores mais produtivos do mercado que, podem decidir não
trabalhar ou, tendo já um emprego, não têm incentivos para voltar ao mercado e encontrar um
novo emprego.
Consideremos a hipótese de que, para resolver o problema, os empregadores se decidissem
por pagar um salário igual a 2. Desta forma conseguiriam contratar os “bons” trabalhadores mas
os trabalhadores pouco produtivos veriam o seu salário ser claramente superior à sua
produtividade o que resultava numa solução ineficiente para a empresa que pretende maximizar
o seu lucro.
No entanto, após a contratação o empregador observa o trabalhador obtendo assim
conhecimento sobre as diversas características deste. O empregador passa a conhecer a
produtividade do trabalhador e a conseguir relacioná-la com outros factores distintivos do
trabalhador. Assim, o empregador cria um mapa com as suas expectativas condicionadas pelos
sinais e, desta forma, toma as suas decisões sobre os salários a oferecer no mercado baseado nos
sinais que, condicionados pelas suas expectativas, serão o mais próximo possível dos salários
oferecidos no caso de informação perfeita.
A hipótese apresentada por Spence (1973) surge então sob a forma de um mecanismo que
permite ao empregador conhecer previamente a produtividade do trabalhador a contratar, ou
seja, consiste na existência de um atributo variável do trabalhador que sinalize qual será
provavelmente, a sua produtividade. Consideremos então a existência do sinal educação,
denotado por E como informação visível que sinaliza para o empregador a informação
desconhecida acerca da produtividade do trabalhador. Para ser um sinal eficaz os custos da sua
obtenção, chamados custos de sinalização, devem diferir entre os dois grupos de trabalhadores
sendo superiores para o grupo I. Definimos então os custos de sinalização como os custos de
obter um sinal, por exemplo, a obtenção de um curso superior, atribuindo o custo E ao grupo I e
E/2 ao grupo II. Das expectativas do empregador surge a possibilidade de existência de um nível
de educação E*, que actua como sinal da produtividade do trabalhador. Segundo tais
expectativas, o empregador espera que um indivíduo cujo investimento em educação é inferior a
E* terá uma produtividade de apenas 1 enquanto um indivíduo com um nível de escolaridade
igual ou superior a E* terá uma produtividade de 2. Para este sinal ser eficaz a estrutura de
incentivos com que os agentes se defrontam deve resultar numa diferenciação dos trabalhadores
por educação consistente com a diferenciação por produtividade e portanto, os indivíduos do
Grupo I devem investir *1 EE enquanto os trabalhadores do Grupo II devem investir um
valor *2 EE . Os trabalhadores do Grupo I vão investir *1 EE se
1*)2( E (3.1)
Se não se verificasse esta condição, os trabalhadores do Grupo I tirariam benefício do
investimento de E* em educação, usufruindo assim de um salário líquido dos custos de
educação *2 E superior ao salário 1 correspondente ao seu nível de produtividade. Os
trabalhadores do Grupo II por sua vez, vão investir no sinal se
1)2/*2( E (3.2)
ou seja, se o salário 2 deduzido dos custos de sinalização 2/*E for superior ao salário obtido
caso tivessem optado por não investir no sinal. Desta forma, resolvendo ambas as inequações
podemos limitar o valor de *E ao intervalo ]1,2[, sendo esta a condição necessária de
consistência para que a educação funcione como um sinal. O equilíbrio de sinalização consiste
então numa relação entre uma tabela salarial em relação com o nível de educação (conhecido a
priori pelo empregador) ao invés de uma relação com a produtividade (desconhecida a priori
pelo empregador).
A figura 3.1 representa a forma como se relacionam os salários dos dois grupos de
trabalhadores (eixo vertical) com o investimento em educação (eixo horizontal) e respectivos
custos. A recta crescente com maior declive corresponde à recta de custos de sinalização por
parte dos trabalhadores do Grupo I. A recta E/2 corresponde aos custos de sinalização dos
trabalhadores do Grupo II. As duas rectas horizontais correspondentem ao valor do salário
auferido pelos trabalhadores consoante o seu investimento em educação. Neste diagrama
observamos que os custos de sinalização dos trabalhadores do Grupo I (a ordenada em E* da
recta de maior declive) se tornam excessivamente altos caso se pretenda investir em E*
educação sendo assim um incentivo a que os indivíduos deste grupo optem por um nível de
educação inferior a E*.
Figura 3.1: Equilíbrio de sinalização com dois grupos
Retirado de: Spence (2002)
Mais algumas conclusões podem ser retiradas deste modelo simples de sinalização. Em
primeiro lugar, concluímos pela necessidade de existência de um mecanismo de sinalização
num mercado com informação imperfeita. Outra conclusão importante prende-se com a forma
como são criadas as expectativas dos empregadores. Neste âmbito podemos relevar diversos
aspectos. Alós-Ferrer e Prat (2008) abordam a forma como o mecanismo e a importância da
sinalização difere em trabalhos onde o conhecimento da produtividade do trabalhador por parte
do empregador é mais ou menos rápido. Alós-Ferrer e Prat (2008) concluem que quanto menor
o tempo de aprendizagem por parte do empregador, menor a importância da sinalização. Daí
que a disciplina de Gestão de Empresas possa também ser relevante para compreender como se
processa a sinalização dentro das empresas. Connelly et al (2011) faz uma revisão da literatura
acerca da sinalização em publicações de gestão. A importância do conceito para a gestão é
comprovada pelo crescente número de publicações de gestão que citam os termos signaling ou
signaling theory. Na Gestão surge como especialmente relevante o facto de os gestores usarem
também sinais como forma de transmitir informação ao mercado, como por exemplo, a
distribuição de dividendos como sinal de boa situação financeira da empresa.
Sendo a sinalização dependente das percepções criadas pelos empresários acerca da
produtividade dos trabalhadores e sua relação com as demais características dos mesmos, existe
espaço para uma variação no “poder” do sinal. Em certos períodos poder-se-á observar uma
maior importância da sinalização no mercado de trabalho. Machado et al (2010) aponta a
hipótese de a sinalização ser mais relevante em períodos de crise económica.
Em terceiro lugar, importa sublinhar que o mecanismo de sinalização não é eficiente se
comparado com o caso de informação perfeita. Existe um desperdício de recursos não
produtivos em sinalização ou seja, no modelo apresentado, existe um excesso de investimento
em educação não relacionado com um possível aumento da produtividade daí advindo. Hopkins
(2010) conclui, através de um modelo de sinalização com diferenciação em relação à qualidade
dos trabalhadores e das empresas, que a ineficiência pode ser superior havendo também um
incentivo ao sub-investimento em educação por parte dos trabalhadores menos produtivos. Esta
conclusão é de extrema importância e leva Hopkins (2010) a expandir a noção de sinalização a
uma possível explicação do conceito de consumo ostentatório apresentado primeiramente por
Veblen (1899), que apresenta o conceito como uma forma dos indivíduos comunicarem qual a
sua posição social. Relacionar os conceitos de consumo ostentatório e sinalização leva-nos a um
melhor entendimento da natureza da sinalização, por exemplo, no seu âmbito sociológico,
podendo o nível de educação ser considerado um símbolo de status e dessa forma estar
relacionado com o background cultural e científico familiar e assim, indirectamente, associado à
produtividade dos indivíduos que, dessa forma, encontrarão vantagens no mercado de trabalho.
Ainda Hopkins (2010) mostra como a actuação do Estado pode ser importante para tornar o
mercado mais eficiente, principalmente no caso em que a educação induz também um
incremento na produtividade, taxando progressivamente o investimento em educação de forma a
penalizar o sobre-investimento dos trabalhadores mais produtivos e a induzir um aumento no
investimento por parte dos trabalhadores menos produtivos, com vista a atingir um nível mais
eficiente socialmente.
Uma quarta conclusão prende-se com a existência de outros potenciais sinais, positivos ou
negativos, no mercado de trabalho. Akerlof (1970) aborda o problema do desemprego nas
minorias de uma forma que pode ser entendida como um problema de sinalização. Citando
Akerlof (1970: 494) “For race may serve as a good statistic for the applicant’s social
background, quality of schooling, and general job capabilities” (itálico no original). Não
podendo o conceito de raça ser considerado um sinal no sentido expresso por Spence (1973), já
que não se trata de um factor controlável pelo indivíduo, as conclusões mantêm-se inalteradas.
Na incapacidade de observar factores como a aptidão, o empregador serve-se das suas
expectativas criadas, não só no mercado de trabalho, mas socialmente, através do mesmo
mecanismo de criação de expectativas apresentado anteriormente.
4. Análise do desemprego de diplomados pelo ensino superior em Portugal
Esta secção prossegue uma análise estatística descritiva do desemprego em Portugal, com
particular foco nos indivíduos que possuam um diploma de ensino superior, com o objectivo de
encontrar algumas pistas acerca da importância de um curso superior na inserção no mercado de
trabalho.
Através da análise do modelo de sinalização, concluímos que um curso superior pode
funcionar como um sinal, num contexto de informação imperfeita, como forma de transmitir
informação acerca da produtividade dos trabalhadores. Segundo este modelo é expectável que
um curso superior tenha por esse mecanismo, um efeito positivo na empregabilidade dos seus
detentores, sendo tal especialmente importante nos estratos mais jovens da população que
procuram o seu primeiro emprego, já que é nesta fase que a incerteza quanto à produtividade
dos indivíduos é mais evidente.
Os dados em análise provêm de duas fontes principais. Em primeiro lugar, do Inquérito ao
Emprego realizado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) trimestralmente e em segundo
lugar, dos relatórios sobre emprego dos diplomados realizados pelo Gabinete de Planeamento,
Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais (GPEARI) do Ministério da Educação e Ensino
Superior.
Algumas precauções são exigidas na análise destes dados estatísticos. Em primeiro lugar, os
dados trimestrais do desemprego do Instituto Nacional de Estatística estão sujeitos a um
problema de sazonalidade que é especialmente relevante no caso dos recém-diplomados. O
término do ano lectivo no final do segundo trimestre de cada ano leva a que o desemprego de
diplomados tenha um carácter fortemente sazonal, com um pico em cada terceiro trimestre. Pela
natureza do mercado de trabalho é normal obterem-se taxas de desemprego de diplomados
superiores no terceiro trimestre de cada ano, num fenómeno designado de desemprego friccional
que apenas denota o facto natural de que demora algum tempo a ocorrer o encontro entre oferta
e procura no mercado de trabalho. Esse desemprego friccional, também qualificado como
“natural”, não é o interesse deste estudo. O verdadeiro desemprego que denota dificuldade de
inserção no mercado de trabalho é o que persiste para além deste período de desemprego que
advém das naturais fricções do mercado. É pois do interesse deste estudo reduzir ao seu mínimo
o impacto na análise do desemprego friccional ao invés de um simples remoção da sazonalidade
através de médias anuais.
Pelo que foi dito, entendemos que a forma mais eficaz de reduzir a importância do
desemprego friccional ao seu mínimo na nossa análise será utilizar dados referentes ao segundo
trimestre de cada ano quando nos referimos a desemprego de diplomados. Uma subida nesta
taxa de desemprego entre dois períodos, ou seja, dois segundos trimestres de dois anos será
assim entendida como representativa de uma maior dificuldade de inserção no mercado de
trabalho por parte dos diplomados, deduzidas as fricções naturais do mercado.
Em segundo lugar, a escolha dos dados do desemprego retirados do Inquérito ao Emprego
do INE apenas até ao ano de 2010 prende-se com o início de uma nova série de dados no
primeiro trimestre de 2011, decorrente da alteração do método de recolha dos dados relativos a
esta publicação. Esta nova série não é ainda suficientemente longa para suportar a nossa análise,
pelo que os dados analisados pertencem à série anterior (Série 1998) que se prolonga desde o
primeiro trimestre de 1998 até ao último trimestre de 2010.
Em terceiro lugar, no que concerne à análise da inserção dos diplomados no mercado de
trabalho, pretende-se comparar as taxas de desemprego entre diplomados e não diplomados na
sua fase inicial de inserção no mercado de trabalho. No entanto, é sabido que a formação
superior exige um investimento temporal por parte dos indivíduos. Tal dispêndio de tempo leva
a que quem opte por obter formação superior entre no mercado de trabalho com uma idade
superior à da entrada dos indivíduos com menor formação. Este facto leva a que no grupo etário
inferior da divisão etária operada no Inquérito ao Emprego do INE (15-24 anos) a comparação
entre indivíduos com e sem formação superior possa ser ineficaz, devido à diminuta quantidade
de diplomados com idade inferior a 24 anos, que corresponde, por exemplo no segundo
trimestre de 2010 a apenas 9,1% do total de população activa neste grupo etário. Convém notar
ainda que, na prática, estamos na presença de dois grupos etários diferentes (um período mais
curto para diplomados e um período mais longo para não diplomados) que se revelam em
tempos de inserção no mercado também diferentes. A solução possível, neste caso, é a de
expandir o grupo etário em análise para 15-34 anos (que denominaremos de “jovens”) de forma
a obter dois conjuntos que possam ser comparáveis em termos de período de inserção no
mercado e com uma quantidade estatisticamente significativa de diplomados, que neste grupo
etário correspondem já a 22,1% do total da população activa nesta faixa etária no segundo
trimestre de 2010.
Observando a figura 4.1, observamos que ao longo do período 1998-2010 a proporção da
população activa com ensino superior completo passou de 8,8% em 1998 para 16% em 2010,
com uma subida especialmente acentuada entre os anos 2002 e 2004 de aproximadamente 3
pontos percentuais. Nesta situação, assiste-se a uma massificação do ensino superior, estando
este aberto a cada vez mais pessoas, possibilitando assim um papel mais inclusivo do ensino
superior, mas que, por outro lado, pode penalizar a formação superior enquanto mecanismo
diferenciador dos trabalhadores no mercado de trabalho. Efectivamente, quanto maior o número
de indivíduos a procurar o “sinal” formação superior, menor importância terá o sinal no
mercado de trabalho. Deste modo, é expectável que os indivíduos tendam a procurar outras
formas de sinalizar a sua produtividade e aptidão no mercado, por exemplo, através de estágios.
Figura 4.1: Proporção da população activa (%) com nível de escolaridade superior completo, média anual (1998 – 2010)
Fonte: INE – Inquérito ao Emprego
A evolução do desemprego, por seu lado, é pautada por uma tendência de forte crescimento
ao longo da última década. Na figura 4.2 observamos que ao longo dos últimos anos a taxa de
desemprego anual de Portugal teve uma subida acentuada. No ano 2000 foi atingido o valor de
3,9% da população activa que no entanto chegou em 2010 ao valor de 10,8%. Esta evolução é
demonstrativa do mau desempenho económico do país ao longo da última década onde depois
de 2000, apenas num ano se assistiu a uma diminuição do valor da taxa de desemprego (2008).
Figura 4.2: Taxa de desemprego anual (1998 – 2010)
Fonte: INE – Inquérito ao emprego (Série 1998)
A figura 4.3 compara a evolução da taxa de desemprego total e da taxa de desemprego dos
jovens. Daqui se retém que a taxa de desemprego atinge níveis claramente superiores nos jovens
bem como uma tendência de subida mais acentuada neste grupo etário do que no total da
população activa. Tal resultado não é, por si só, preocupante. É normal e expectável que o
desemprego afecte sobretudo os mais jovens numa fase precoce da inserção no mercado de
trabalho. Neste grupo etário o desemprego não é, em certo sentido, tão preocupante como nos
grupos etários mais idosos, podendo os indivíduos jovens optar por alternativas como o
prolongamento dos estudos, tendo maior facilidade em melhorar a sua formação, e tendo
também a possibilidade de recorrer ao apoio familiar até uma idade relativamente avançada. A
tendência de maior subida por parte do desemprego jovem, mais do que o nível desse
desemprego, pode implicar um fenómeno preocupante de progressiva perda de independência
por parte dos jovens, de adiamento de projectos de vida e também de fricção social entre os
diferentes grupos etários.
Figura 4.3: Evolução da taxa de desemprego por grupo etário 15-34 anos e total (1998 – 2010)
Fonte: INE – Inquérito ao Emprego (Série 1998)
Dos dados anteriores podemos encontrar um padrão de sucessiva melhoria das qualificações
da população activa portuguesa ao mesmo tempo que uma deterioração dos níveis de
desemprego, com especial expressão após o início da crise internacional no ano de 2008.
Observamos também que os jovens são os mais penalizados pelo desemprego e pelo seu
crescimento nos últimos anos – veja-se a figura anterior - denotando a existência de dificuldades
de inserção dos jovens no mercado de trabalho. Sendo os jovens naturalmente mais penalizados
pelo desemprego, importa compreender as diferenças entre indivíduos com e sem formação
superior no que diz respeito às taxas de desemprego, estando assim em condições de analisar até
que ponto um curso superior conta no processo de inserção no mercado de trabalho.
Na figura 4.4 podemos observar que a taxa de desemprego da população activa com ensino
superior completo (medida agora no segundo trimestre da cada ano) se situa sistematicamente
abaixo da taxa de desemprego da população activa total e com uma tendência de crescimento
menos acentuada, resultado claramente contrário à percepção construída na sociedade de que o
desemprego afecta de forma mais acentuada os detentores de formação superior. A divergência
ocorrida desde o ano de 2008 é particularmente relevante já que apesar do contexto de crise
económica e do grande aumento do desemprego a esta associado, observa-se claramente que os
detentores de formação superior encontram vantagens no mercado de trabalho. Tal facto poderá
estar ligado quer a uma maior segurança no emprego (para os indivíduos de grupos etários
superiores), quer à mais fácil inserção no mercado (para os jovens) que podemos analisar com
mais pormenor.
Figura 4.4: Taxa de desemprego total e taxa de desemprego dos indivíduos com formação
superior, 2º trimestre de cada ano (1998:2 – 2010:2)
Fonte: INE – Inquérito ao Emprego (Série 1998)
Para avaliar a inserção dos jovens no mercado de trabalho importa avaliar a tendência
registada pelas taxas de desemprego de indivíduos com formação superior e do total da
população activa neste grupo etário. Tais taxas de desemprego têm uma evolução semelhante às
anteriores, tal como expresso na figura 4.5. A comparação entre formados com ensino superior e
o total dos indivíduos deste grupo etário leva-nos também a encontrar um cenário de menor
desemprego para os detentores de formação superior, mais uma vez, com o intervalo a crescer
acentuadamente desde o ano de 2008.
Figura 4.5: Taxa de desemprego total e taxa de desemprego dos indivíduos com formação
superior, grupo etário 15-34 anos, 2º trimestre de cada ano (1998:2 – 2010:2)
Fonte: INE – Inquérito ao Emprego (Série 1998)
A comparação das taxas de desemprego de detentores de formação superior e de detentores
de ensino secundário completo, efectuada na figura 4.6, leva-nos mais uma vez, às mesmas
conclusões, com a ressalva de uma aparente maior proximidade entre os valores das duas taxas
de desemprego, visível, por exemplo, no segundo trimestre de 2003 onde a taxa de desemprego
dos detentores de formação superior excede a taxa de desemprego correspondente à formação
secundária.
Figura 4.6: Taxa de desemprego de indivíduos com formação superior e com formação secundária, grupo etário 15-34 anos, 2º trimestre de cada ano (1998:2 – 2010:2)
Fonte: INE – Inquérito ao Emprego (Série 1998)
Daqui se retira que a posição dos detentores de formação superior no mercado de trabalho
parece ser claramente vantajosa no que concerne à entrada no mercado de trabalho, contrariando
a visão veículada na sociedade portuguesa que aponta para dificuldades superiores de inserção
no mercado por parte dos indivíduos com formação superior.
Analisar de que forma o desemprego se distribui pelas diferentes áreas de estudos permite-
nos observar de que forma o mercado avalia os cursos superiores dependendo da área de
formação. Se a formação superior for essencialmente um sinal no mercado de trabalho, não
serão de esperar diferenças relevantes no desemprego entre diferentes áreas de estudo. Seguindo
a teoria da sinalização, qualquer curso, desde que igualmente exigente para o seu detentor,
sinaliza um bom trabalhador e então, incidências de desemprego idênticas para diferentes áreas
de formação são um indício de que o papel de um curso superior pode ser, em grande medida, o
de funcionar como um sinal.
No quadro 4.1 encontramos os valores do número de desempregados, registados no Instituto
de Emprego e Formação Profissional no segundo trimestre de 2011, com formação superior
adquirida nos anos 2001 a 2011, bem como o número total de diplomados no mesmo período,
por área de estudo. Na última coluna encontramos o rácio entre o número de desempregados e o
número de diplomados para tal período.
Quadro 4.1: rácio desempregados/diplomados, 2001 – 2011 por área de estudo
Área de estudo
Desempregados Diplomados Desempregados /Diplomados (%)
2001 – 2011 2001 – 2010
N.º (A) % N.º (B) % (A) / (B) 14 – Formação de
professores/formadores e ciências da educação
3 161 10,6% 94 778 13,4% 3,3%
21 – Artes 2 005 6,7% 34 781 4,9% 5,8%
22 – Humanidades 1 239 4,2% 25 951 3,7% 4,8%
31 – Ciências sociais e do comportamento
3 500 11,8% 58 433 8,3% 6,0%
32 – Informação e jornalismo 1 111 3,7% 14 974 2,1% 7,4%
34 – Ciências empresariais 4 851 16,3% 103 814 14,7% 4,7%
38 – Direito 933 3,1% 25 900 3,7% 3,6%
42 – Ciências da vida 520 1,7% 15 133 2,1% 3,4%
44 – Ciências físicas 484 1,6% 12 456 1,8% 3,9%
46 – Matemática e estatística 149 0,5% 6 859 1,0% 2,2%
48 – Informática 335 1,1% 10 966 1,6% 3,1%
52 – Engenharia e técnicas afins
1 950 6,6% 67 113 9,5% 2,9%
54 – Indústrias transformadoras
541 1,8% 8 969 1,3% 6,0%
58 – Arquitectura e construção
2 298 7,7% 38 893 5,5% 5,9%
62 – Agricultura, silvicultura e pescas
534 1,8% 11 042 1,6% 4,8%
64 – Ciências veterinárias 152 0,5% 3 123 0,4% 4,9%
72 – Saúde 2 424 8,2% 113 459 16,1% 2,1%
76 – Serviços sociais 1 728 5,8% 18 447 2,6% 9,4%
81 – Serviços pessoais 1 133 3,8% 25 599 3,6% 4,4%
84 – Serviços de transporte 12 0,0% 662 0,1% 1,8%
85 – Protecção do ambiente 598 2,0% 9 943 1,4% 6,0%
86 – Serviços de segurança 73 0,2% 4 001 0,6% 1,8%
TOTAL 29 731 100,0% 705 296 100,0% 4,2% Fonte: GPEARI
Como podemos observar, o rácio de desempregados por diplomados atinge os maiores
valores em áreas como Serviços Sociais (9,4%), Informação e Jornalismo (7,4%) e empatados,
as Ciências Sociais e do Comportamento, Indústrias Transformadoras e Protecção do ambiente
(6%). Os valores mais baixos encontram-se nas áreas de Serviços de Segurança e Serviços de
Transporte (1,8%), Saúde (2,1%) e Matemática e Estatística (2,2).
Áreas como Saúde ou Serviços de Segurança estão ligadas a sectores altamente regulados
com uma grande proponderância do sector público o que desvirtua a existência de um
verdadeiro mercado de trabalho para os indivíduos formados nesta área. Outro problema nestes
dados é que o número de diplomados não nos dá o número exacto de indivíduos que se
formaram no período em análise já que, em primeiro lugar, podemos contar com a existência de
indivíduos que ao terminarem a formação não requereram o respectivo diploma não sendo assim
contabilizados na base de dados do GPEARI. Exige também cautela o facto de o número de
diplomados poder contabilizar múltiplas vezes indivíduos com mais que um diploma (por
exemplo, licenciatura e mestrado).
Tendo em conta os pontos apresentados, os valores não são claros numa diferenciação entre
áreas no que diz respeito à inserção no mercado de trabalho. Por um lado, parece haver uma
tendência para valores mais baixos no rácio desemprego/diplomados nas áreas técnicas, por
exemplo, ciências físicas, engenharias ou informática, e valores mais elevados para áreas como
as ciências sociais e do comportamento, arquitectura e construção ou protecção do ambiente. No
entanto, outras áreas onde seria talvez de esperar valores díspares, como exemplo, Artes (5,8%)
e indústrias transformadoras (6,0%) ou Ciências Empresariais (4,7%) e Humanidades (4,8%), a
existência de valores próximos denota que a área, nestes casos, não parece sinalizar os
trabalhadores na inserção no mercado de trabalho, sendo mais relevante a posse, por si só, de
um curso superior.
Outro sinal potencialmente diferenciador dos trabalhadores é o local de formação, mais
especificamente, a natureza da instituição de ensino superior onde completaram o seu grau
académico. Por subsistema de Ensino Superior encontramos diferenças relevantes entre Ensino
Público e Ensino Privado. A primeira coluna do quadro 4.2 dá-nos o número total de
desempregados registados no IEFP no segundo trimestre de 2011 que se diplomaram no período
de 2007 até 2010. A segunda coluna dá-nos o total de diplomados ao longo do período 2007-
2010. Na terceira coluna temos o valor do rácio desempregados/diplomados. Podemos observar
que o rácio desempregados/diplomados é claramente superior no Ensino Privado, 7,08% contra
5,42% no Ensino Público. Esta diferença deve-se principalmente ao Ensino Universitário onde a
diferença entre Público e Privado é mais acentuada, com 4,24% para o Ensino Público e 7,54%
para o Ensino Privado. No entanto, no Ensino Politécnico é o sector privado que leva a melhor,
ainda que com uma pequena diferença (6,47% contra 7,28%). O mercado parece sinalizar de
forma negativa a formação superior em instituições privadas e instituições de ensino superior
politécnico penalizando os indivíduos com formação nestas instituições.
Quadro 4.2: Rácio desempregados/diplomados, 2007 – 2010 por subsistema de ensino superior
Subsistema de ensino superior
Desempregados 2007 – 2010
Diplomados 2007 – 2010
Desempregados / Diplomados (%)
Ensino público
Universitário 6 250 147 577 4,24%
Politécnico 6 881 94 474 7,28%
Total 13 131 242 051 5,42%
Ensino privado
Universitário 3 453 45 770 7,54%
Politécnico 2 242 34 640 6,47%
Total 5 695 80 410 7,08% TOTAL 18 826 322 461 5,84%
Fonte: GPEARI
O próprio facto de o ensino politécnico ter uma maior taxa de desemprego que o ensino
universitário pode ser também encarado como um indício de que importa mais o sinal
transmitido pelo curso superior do que o conteúdo da formação em si. De facto, pelo menos
atendendo ao espírito com que foi criado o ensino politécnico em Portugal, este deveria consistir
num ensino mais prático e mais voltado para o mercado de trabalho que, dessa forma, deveria
assegurar uma maior empregabilidade. A maior dificuldade de inserção no mercado de trabalho
por parte dos indivíduos diplomados pelo ensino politécnico pode pois significar que o mercado
atribui maior importância ao estatuto conferido pela universidade que à formação prática
fornecida pelo ensino politécnico. Contudo, a verdadeira razão para tal disparidade da
incidência do desemprego pode ser que o ensino politécnico tenha falhado naqueles que eram os
seus propósitos tendo-se desviado de um ensino prático mais profissionalizante.
Concluímos assim que a inserção no mercado de trabalho não varia de forma clara com a
área de formação dos indivíduos mas parece depender de forma bastante acentuada com o
subsistema de ensino superior onde foi obtido o curso. No entanto, encontrámos fragilidades
nestes dados que impossibilitam uma leitura clara das conclusões por eles transmitidas.
Restringindo os dados em análise às instituições de ensino superior público universitário e aos
diplomas de licenciatura ou mestrado integrado podemos corrigir em grande medida os
problemas apontados anteriormente aos dados estatísticos do GPEARI.
Por último, uma análise comparativa entre as diversas instituições de ensino superior
público universitário pode também revelar pontos importantes acerca da sinalização e da
importância do ensino superior na inserção no mercado de trabalho. O quadro 4.3 apresenta o
rácio de desempregados/diplomados construído com o número de desempregados residentes em
Portugal Continental inscritos no IEFP no segundo trimestre de 2010, com nível de escolaridade
de licenciatura ou mestrado integrado adquirido nos anos lectivos 2007-2008 a 2009-2010 e
com o número total de diplomados no mesmo período por instituição de ensino superior público
universitário2.
Quadro 4.3: Rácio desempregados/diplomados (licenciatura e mestrado integrado), 2008 –
2010, por Universidade Pública
Universidade Diplomados 2008 – 2010
Desempregados 2008 – Junho 2011
Desempregados / Diplomados (%)
Universidade do Algarve 1587 172 10,84% Universidade de Aveiro 4741 284 5,99% Universidade da Beira Interior 3016 279 9,25% Universidade de Coimbra 9446 530 5,61% Universidade de Évora 2717 259 9,53% Universidade de Lisboa 8492 312 3,67% Universidade Técnica de Lisboa 10259 391 3,81% Universidade Nova de Lisboa 5919 223 3,77% Universidade do Minho 9057 675 7,45% Universidade do Porto 16005 772 4,82% Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
3082 465 15,09%
2 Os dados do GPEARI apenas referem os desempregados inscritos no IEFP residentes em Portugal Continental, sendo que dessa forma, os valores do rácio desempregados/diplomados referentes às Universidades dos Açores e da Madeira não têm significado estatístico, havendo respectivamente, apenas 14 e 2 desempregados inscritos no IEFP em Junho de 2011 com diploma de licenciatura ou mestrado integrado adquirido nestas universidades. Devido a este facto, as universidades dos Açores e da Madeira foram retiradas desta análise.
Universidade Aberta 1263 34 2,69% ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa
2427 107 4,41%
TOTAL 76748 4469 7,02% Fonte: GPEARI e cálculos do autor
Quanto à Universidade Aberta, é expectável que a sua natureza como instituição de Ensino
Superior à distância atraia em grande medida, estudantes já inseridos no mercado de trabalho,
pelo que é natural o baixo rácio de desempregados/licenciados aí registado.
Existe um padrão geográfico claro nestes dados estando os rácios
desempregados/licenciados mais baixos nas instituições da cidade de Lisboa (entre 3,67% e
4,41%), seguidas da Universidade do Porto com 4,82% e pelas restantes universidades do litoral
norte e centro do país (entre 5,61% da Universidade de Coimbra e 7,45% da Universidade do
Minho), tendo as restantes universidades valores superiores, entre 9,53% para a Universidade de
Évora até aos 15,09% da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Esta diferenciação
regional é provavelmente devida às diferentes dinâmicas económicas das diferentes regiões que
parecem determinar as oportunidades de emprego dos licenciados nestas universidades. No
entanto, comparando universidades presentes na mesma região, por exemplo, Universidade de
Coimbra e Universidade de Aveiro, observamos que os valores são semelhantes. Para a região
de Lisboa observamos também valores semelhantes entre as 4 instituições aí presentes. Regiões
semelhantes como Évora e Beira Interior também obtêm valores claramente idênticos. Estas
semelhanças voltam a ser um sinal da importância da educação como sinal, ainda que
dependente da envolvente económica.
5. Conclusão
A análise estatística descritiva apresentada demonstra inequivocamente uma vantagem dos
detentores de formação superior na inserção no mercado de trabalho em relação aos indivíduos
com menor nível de formação. Os dados apresentados mostram menor desemprego para os
indivíduos com formação superior no total da população activa o que demonstra uma maior
segurança no trabalho, bem como valores mais baixos nos grupos etários jovens, denotando uma
mais fácil inserção no mercado para os detentores de cursos superiores. Desde o ano de 2008,
ano em que começam a notar-se em Portugal os efeitos da crise internacional iniciada em 2007,
a situação do desemprego agravou-se para o total da população activa portuguesa mas,
afectando de forma claramente superior os indivíduos sem formação superior.
Sendo vantajoso, em média, obter formação superior, evidencia-se também neste estudo que
não existe um padrão claro de diferença na inserção no mercado de trabalho entre diferentes
áreas de formação. Este resultado pode ser um indício de um efeito de sinalização dos cursos
superiores no mercado de trabalho. Os cursos superiores parecem valer, por si só, no mercado,
diferenciando positivamente os seus detentores em relação aos demais indivíduos presentes no
mercado de trabalho. Por outro lado, foram encontradas diferenças substanciais entre formação
universitária e politécnica, bem como formação obtida em instituições públicas ou privadas. Os
indivíduos formados em instituições de ensino superior público universitário parecem ter maior
facilidade na inserção no mercado em relação aos restantes subsistemas de ensino superior,
denotando uma maior importância do estatuto conferido por um diploma do ensino público
universitário do que, por exemplo, do ensino supostamente profissionalizante do ensino
politécnico, o que pode ser visto como mais um indício de existência de sinalização no mercado.
Apesar do bom desempenho dos indivíduos com formação superior no mercado de trabalho,
alguns pontos importantes devem ser notados. Em primeiro lugar, a forte subida do desemprego
pode, como apontam Shapiro e Stiglitz (1984) ser um mecanismo de pressão para aumentar o
esforço dos trabalhadores e assim, podemos acrescentar, pressão para que estes aceitem menores
condições de trabalho ou tenham menos oportunidade de escolha. Desta forma, temos de aceitar
a hipótese de que grande parte dos indivíduos com formação superior empregados esteja hoje,
ao contrário do que aconteceria há anos atrás, com contratos cada vez mais precários e em áreas
não condizentes com o grau académico obtido, nem com a área da sua formação. Ainda existe a
possibilidade de um aumento acentuado da emigração para fora do país, que é actualmente de
díficil contabilização já que as migrações dentro do espaço da União Europeia não têm qualquer
controlo por parte das autoridades. Naquilo que seria um exemplo claro de selecção adversa,
será possível, embora não esteja provado nem este trabalho possa fazê-lo, que o país esteja a
assistir a uma fuga, em maior medida, de jovens com formação superior (os mais produtivos),
na procura de melhores remunerações e maior segurança no trabalho. No entanto, neste âmbito,
nada nos indica que os indivíduos com formação superior se defrontem com piores condições de
trabalho e de inserção no mercado que os indivíduos menos qualificados pelo que nos parece
plausível concluir que obter formação superior compensa, é vantajoso no mercado de trabalho,
com especial expressão no actual período de crise económica, sendo este facto compatível com
a existência de um efeito de sinalização da aptidão e produtividade do trabalhador por parte da
formação superior.
Referências:
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