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9JORNAL DA UNICAMPCampinas, 6 a 12 de outubro de 2008

LUIZ SUGIMOTO

sugimoto@reitoria.unicamp.br

esde 1996, a professo-ra Dagmar RuthStach-Machado coor-dena pesquisas visan-do produzir anticor-

pos policlonais e monoclonais, e es-tabelecer testes para diagnósticos dedoenças em plantas como citros, ba-tata e soja, no Instituto de Biologia(IB) da Unicamp. A docente e seus ori-entados trabalham na expectativa deajudar a suprir a demanda de anticorposno Brasil, que é totalmente dependen-te da importação destes insumos.

“Muitas doenças podem induzirsintomas comuns ou muito seme-lhantes como folhas amareladas oudistorcidas. Podemos fazer uma com-paração com a febre nos humanos,que é um sintoma geral mas não per-mite identificar a doença de imedia-to. Temos que fazer exames mais pre-cisos para diagnosticá-la”, exem-plifica Dagmar Stach-Machado, queresponde pelo Laboratório de Imu-nologia Aplicada do IB.

A purificação de um antígeno (oagente infeccioso, que pode ser ví-rus, bactéria ou fungo) é o primeiroe mais trabalhoso passo nesta linhade pesquisa. Segundo a professora,normalmente, o grau de pureza exi-gido implica trabalho em nível demestrado ou doutorado. “Este antí-geno é inoculado em um animal delaboratório (coelhos, ratos, camun-dongos), que vai reagir ao corpo es-tranho produzindo uma proteína dedefesa, o anticorpo”.

Na fase seguinte, acrescenta apesquisadora, após a obtenção doantisoro e sua purificação, o mesmoé testado para estabelecimento dodiagnóstico. “Testado inicialmente emensaios imunoenzimáticos como oElisa, podemos verificar a sua espe-cificidade e a sensibilidade de detecção– isto é, se o soro obtido é específicopara aquele determinado antígeno ounão, se apresenta reação cruzada aoutros patógenos, por exemplo”.

Dagmar Stach-Machado explicaque a obtenção de anticorpos especí-ficos para o reconhecimento de deter-minados patógenos exige a purifica-ção ou isolamento deste patógeno. E,como regra geral, ele deve ser o maispuro possível, isto é, livre de outroscontaminantes, como proteínas daprópria planta. “Se o patógeno estivercontaminado com outras partículas oumoléculas, o soro obtido poderá serde baixa qualidade. Não raro, traba-lhamos muito sem chegar ao que de-sejamos. É preciso paciência oriental”.

O que se persegue para o estabe-

lecimento de imunodiagnóstico emplantas, portanto, são anticorpospoliclonais e monoclonais, com ele-vada especificidade e sensibilidadepara determinado patógeno; quantomais específico for o anticorpo, maispreciso o resultado. A professora doIB informa ainda que o grupo, agora,procura associar os ensaios imuno-lógicos com ensaios moleculares,como a Imuno-PCR, que potencia-lizam a capacidade de detecção.

DoençasNo primeiro projeto financiado

pela Finep, em 1996, a professoraDagmar Stach-Machado estabeleceuanticorpos policlonais e monoclonaispara uma doença denominada vírusda tristeza dos citros (CTV), que pra-ticamente dizimou os pomares pau-listas na década de 1940. Tendo comomaior vetor o pulgão preto dos citros(Toxoptera citricida), o vírus da tris-teza infecta praticamente todas as es-pécies de citros. “Nossos anticorposnão estão à venda, mas são ampla-mente utilizados na comunidade ci-entífica. “

A mencionada associação com osensaios moleculares envolveu o“amarelinho”, ou clorose variegadados citros (CVC), doença causadapela bactéria Xylella fastidiosa e queatinge todas as variedades de citroscomerciais. A bactéria provoca o en-tupimento dos vasos responsáveis porlevar água e nutrientes da raiz para acopa da planta e a perda de peso dofruto chega a 75%.

No último projeto financiado pelaFinep, iniciado em 2005 e cujo rela-tório final será entregue em dezem-bro próximo, o grupo do IB prometeestabelecer um imunodiagnósticopara a morte súbita dos citros (MSC),que também representa uma ameaçapotencial para a citricultura paulistae nacional. Ela afeta todas as varie-dades comerciais de laranja doce,tangerinas e ponkans.

Dagmar Stach-Machado coorde-nou neste mesmo projeto as pesqui-sas para obtenção de anticorposmonoclonais que permitem a diferen-

Em busca de anticorpos para plantas

DPesquisadores

do Instituto

de Biologia

trabalham parasuprir ademanda deinsumos no país

ciação das principais estirpes do ví-rus Y da batata (PVY). “É um pro-blema sério, uma vez que a nossabataticultura é totalmente dependen-te da importação da batata-semente,que representa uma parcela conside-rável do custo de produção. No Bra-sil, as doenças causadas por vírusconstituem-se numa das principais li-mitações ao incremento da produçãoe, nesta última década, sofremos per-das significativas devido ao aumen-to da incidência de viroses, provo-cadas principalmente pelo vírus Y”.

Atualmente, a análise de fitossani-dade e a indexação viral da batata-semente destinada à multiplicaçãocomercial no país são efetuadas atra-vés da combinação da utilização deplantas indicadoras e por testessorológicos – que representam cus-tos adicionais à cadeia produtiva, jáque dependemos da importação.

DependênciaAssim, considerando a relevância

do estabelecimento de testes de di-agnóstico nacionais, a pesquisadoraassegura que os anticorpos produzi-dos no Laboratório de ImunologiaAplicada do IB são de ótima quali-dade e muito superiores aos impor-tados, além de mais baratos. “A idéiaé disponibilizar insumos nacionais,pois os utilizados atualmente apre-sentam baixa concentração, necessi-tando-se de grandes quantidades paraalcançar resultados positivos. E pro-dutores e pesquisadores ainda ficam su-jeitos à cotação do dólar e às dificulda-des burocráticas para importação”.

Dagmar Stach-Machado afirmaque a Finep tem a preocupação decolocar estes soros no mercado, jáhavendo empresas interessadas emadquiri-los, o que ainda dependeria detestes em campo para ver sua funcio-nalidade se produzidos em escala.“Seria muito interessante nos tornar-mos independentes em relação a mui-tos patógenos, mas construir esta pon-te até o mercado ultrapassa a minhacompetência, não sei como fazê-lo”.

De acordo com a professora doIB, os soros produzidos por seu gru-po são emprestados a pesquisadoresda Embrapa e do IAC, sendo muitousados na rotina dos laboratórios. Elainforma que a Embrapa também pro-duz anticorpos para uso próprio, semcomercializá-los. “Temos cooperadobastante com outros grupos, tanto queno ano passado produzimos cerca detrinta soros diferentes. Eles chegamcom a proteína, nós desenvolvemoso anticorpo e entramos como co-au-tores no paper, que é a moeda de tro-ca dos pesquisadores. Quanto maisconhecidos ficarmos, melhor”.

Laranjal no interior deSão Paulo: doença dodragão amarelo aflige

citricultores do país

A professora Dagmar Ruth Stach-Machado ainda prepara o relatório finaldo projeto financiado pela Finep, mas já está colaborando com um projetotemático da Fapesp e com o quadro universal de pesquisadores do CNPq paraenfrentamento do mais novo fantasma que assombra citricultores do mundotodo e particularmente do Brasil: é a doença do dragão amarelo – huanglongbingem chinês ou, para simplificar, greening. É de aflição o tom da propaganda norádio, na televisão e em outdoors alertando os produtores sobre a ameaça.

Segundo a docente do IB, a doença surgiu na China (como a própria laran-ja), propagou-se pelo planeta e já causa estragos no Brasil. Pesquisadores maistemerosos vêem no greening um potencial para dizimar a citricultura brasilei-ra. “Sou mais otimista, embora seja esperado um grande dano, já que o Brasilé o maior exportador mundial de suco de laranja. Sabe-se que é uma bactéria,que ninguém ainda conseguiu isolar. Estamos tentando produzir um anticorpoe concentrar sua quantidade, a fim de permitir todos os demais estudos debactéria, uma vez que até o momento ela não é cultivável in vitro”.

Dagmar Stach-Machado ressalta que a pesquisa aplicada, como o desen-volvimento de anticorpos, é um trabalho muito menor diante do esforço mun-dial para conter a doença do dragão. A bactéria é a Candidatus liberibacter,transmitida por um inseto pequeno chamado Diaphorina citri, mas cuja parce-ria provoca a mudança na coloração das folhas da planta, o desfolhamento dosramos e a redução do tamanho, deformação e queda dos frutos. A moléstia afetapraticamente todas as variedades de citros, como laranja, limão e tangerina.

De acordo com os dados da Fundecitrus, o greening chegou em 2003 aoEstado de São Paulo, que responde por 90% do fornecimento nacional de la-ranjas e por 55% da produção mundial de suco concentrado, empregando maisde 400 mil pessoas e contribuindo para a entrada anual de divisas da ordem deUS$ 2 bilhões. Calcula-se que a doença já esteja em 120 municípios paulistas.

Contudo, a mesma Fundecitrus informa sobre estudos que, se de um ladoindicam que a doença do dragão é capaz de tornar um pomar economicamentemorto em apenas seis anos, por outro, mostra que a vigilância e o controlelevam ao comprometimento de menos de 1% do pomar.

A ameaça do dragão amarelo

A professora Dagmar RuthStach-Machado, do IB:

“Muitas doenças podem induzirsintomas comuns ou muitosemelhantes como folhas

amareladas ou distorcidas”

Foto: Antonio Scarpinetti

Foto: Antoninho Perri

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