dialética
Post on 05-Jan-2016
213 Views
Preview:
DESCRIPTION
TRANSCRIPT
Dialética
Docente: Erick Calheiros de Lima
Discente: Rogério Gonçalves Graças. Matrícula: 140051040
Primeiro estudo dirigido
A concepção de dialética hegeliana, tendo-se por referência a Ciência da
lógica¹, perpassa, para sua efetivação, por análises do pensamento filosófico legado pela
tradição. Nesse empreendimento, são tomados como objetos de especial destaque a
ontologia grega, com seus fundamentos na filosofia de Parmênides de Eleia; o empirismo
moderno, sobretudo o formulado pelo David Hume; e a filosofia crítica, de Immanuel
Kant. A noção hegeliana de dialética se constitui, por seu turno, através da radicalização
desta última - como uma crítica da crítica. Para esse fim, faz-se necessária a superação da
dualidade sujeito/objeto, para, enfim, o sujeito guiar-se, no processo de conhecimento,
pelo reconhecimento de si, no absolutamente outro.
A atitude inicial (ontologia grega), diz Hegel, é a conduta ingênua da antiga
metafísica, que detém o credo de que através da reflexão é apreendida a verdade, uma vez
que ela revela ao pensamento o que os objetos são efetivamente. Diante disso, o
pensamento acessa os objetos diretamente e neles se compraz, se contenta, como tendo
alcançado a verdade.
Esse conhecimento, por conseguinte, concebia as deliberações do
pensamento enquanto as determinações substanciais das coisas. A abstração dessas
determinações era tida como legítima por si, e capaz portanto de constituir-se como
predicado do que é verdadeiro. Desse modo, este conhecimento – a antiga metafísica –
inferia, sumariamente, que a compreensão da verdade de um objeto, isto é, de sua
essência, era obtida pelo fato de ser possível conferir-lhe predicados: porém, por um lado,
era acrítica quanto às prescrições de entendimento conforme seu âmago e relevância
próprios; por outro, não examinava sequer o seu respectivo método, o de determinar o
verdadeiro – o absoluto - pela atribuição de predicados.
A conjectura eleata era, por conseguinte, o credo ingênuo: de que o mero
pensamento apreendia o em-si das coisas. Assim, as coisas só são o que são, em sua
essência, a saber, verdadeiramente, na qualidade de pensadas:
¹ Primeiro dos três volumes da obra Enciclopédia das ciências filosóficas em compêndio (1830), de G.W.F. Hegel.
“Ora, no que toca mais precisamente ao
procedimento daquela antiga metafísica,
deve-se notar a esse respeito que ela não
ultrapassa o pensar meramente do
entendimento. Ela acolhia de modo
imediato as determinações de
pensamento abstratas, e lhes dava o valor
de serem predicados do
verdadeiro” (HEGEL, 1997, 91).
Interessava, assim, aos antigos conhecer os predicados a serem conferidos ao
seu objeto, a saber, 'o que é'. Todavia, ressalta Hegel, quaisquer predicados que possam
eventualmente ser empregados para tal finalidade não passam de deliberações
circunscritas do pensar, que se restringem a proferir um limite, porém não o verdadeiro.
Contudo, este processo é uma ponderação externa acerca do objeto, uma vez que as
determinações através das quais se estabelecem caminhos para o 'conhecer' se encontram
na representação do sujeito, e são atribuídas somente exteriormente ao objeto. Ao invés
disso, entretanto - defende Hegel veementemente -, a real apreensão de um objeto deve
ser da condição que se determina de si mesma, que se demonstra a partir da manifestação
do próprio objeto, e não recebe de fora, a saber, de uma fonte exterior, seus predicados.
Por conseguinte, infere Hegel que, desse modo,
“Essa metafísica não era um pensar livre
e objetivo, pois não deixava o objeto
determinar-se livremente a partir de si
mesmo, mas o pressupunha como já
pronto” (HEGEL, 1997, 94).
Dessa maneira, essa metafísica apreendia os objetos da razão em
determinações do entendimento abstratas, e ao invés de alcançar o conhecimento
concreto, persistia, assim, em abstração.
Esta é, resumidamente, a “primeira posição do pensamento a respeito da
objetividade metafísica”. Doravante, segue Hegel sua incursão filosófica à “segunda
posição”, situada historicamente no período moderno, a saber, o empirismo.
A carência de um cerne concreto diante das teses abstratas do conhecimento,
que por si não foi capaz de proceder de seu âmbito universal para a particularização, foi
uma causa primordial do empirismo. Entretanto, por outro lado, vale lembrar também da
privação, neste processo, de um sólido fundamento defronte a eventualidade de poder
realizar demonstrações no âmbito das determinações finitas, quais sejam, das
deliberações do pensar que se apresentam de maneira imediata. O empirismo, em suma,
frente a essas delimitações, ao invés de buscar o que é verdadeiro no pensar, como faziam
os antigos, orientou-se, quando de uma perspectiva sem precedentes, pela experiência.
Para ratificar suas definições, o empirismo partilha com a metafísica antiga
a representação como fonte em comum, isto é, o conteúdo que primeiro procede da
experiência. No entanto, o empirismo, por sua vez, promove o seu conteúdo à condição
de representações, leis, proposições universais, etc (HEGEL, 1997, 103). O domínio
empírico dispõe, assim, de sólido ponto de apoio, conforme o prisma subjetivo, no fato
de que a consciência possui na percepção (compreensão sobre o ser apreendido
imediatamente pelos sentidos) sua própria certeza.
A percepção, por seu turno, é efêmera, pois apreende os objetos
imediatamente pelos sentidos. Entretanto, o conhecimento não se restringe a esse âmbito,
do provisório e contingente, mas intenta, no universal que foi percebido, o imutável,
permanente. Essa é, segundo Hegel, sumariamente, a sucessão da simples percepção para
a experiência.
Todavia, o empirismo, ao indagar acerca dos objetos, acaba por transformar
o concreto em abstrato. Ainda que a adoção do concreto como ponto de partida para o
conhecimento dos objetos possua vantagem sobre o pensamento abstrato da antiga
metafísica, ao estabelecer diferenças entre atributos de objetos distintos, por exemplo,
retorna-se, pelo processo analítico empírico, à pressuposição da velha metafísica, a saber,
da identidade entre 'ser' e 'pensar': as diferenças mesmas, a título de exemplo, por seu
turno, não passam de determinações abstratas do pensamento. Assim, essas observações,
ao serem da mesma qualidade dos objetos, qual seja, a de serem em-si, conjecturam a
asserção de que no pensar reside o verdadeiro das coisas. Diz Hegel, em resumo, que
“A ilusão básica no empirismo científico
é sempre esta: utilizar as categorias
metafísicas de matéria, força e também
uno, múltiplo, universalidade , infinito,
etc.; e não saber que em tudo, ele mesmo,
assim inclui e pratica metafísica; e usa
essas categorias, e suas ligações, de uma
maneira completamente acrítica e
inconsciente” (HEGEL, 1997, 104).
Após analisar essa posição, a empirista, representada basicamente por David
Hume, qual seja, a segunda posição a respeito da objetividade metafísica, Hegel dá
continuação a seu incurso. Para isso, toma, em seguida, como objeto de análise, os escritos
de Immanuel Kant, os quais, historicamente, sucedem o empirismo de Hume.
A filosofia kantiana partilha com o empirismo humiano, por sua vez, da
concepção de que a experiência é o domínio ao qual se limita o conhecimento. Assim, a
filosofia crítica apura, antes de mais nada, a valia do pensamento grego, isto é, dos
conceitos do entendimento auferidos na metafísica antiga.
O programa da velha metafísica, como se sabe, não era um livre pensar, pois
presumia suas deliberações, de que as coisas só são o que são, em sua essência, a saber,
verdadeiramente, na qualidade de pensadas, como algo preexistente: algo que, todavia, a
reflexão não tinha, por seu turno, examinado.
O pensamento crítico kantiano, pelo contrário, se incumbiu da tarefa de
indagar até que ponto as formas do pensar são plausíveis, no sentido de serem ou não
capazes de facultar o conhecimento da verdade. Entretanto, o próprio empreendimento
crítico, ao agir para com seu esforço de lidar criticamente com a forma do pensar
metafísico, já pressupõe, propriamente, conhecimento: é necessário, e fundamental, por
outro lado, diz Hegel, examinar a forma, a faculdade de conhecimento, antes mesmo do
ato de conhecer. Ele diz:
“Ora, nisso [na filosofia crítica] há de
concreto que as próprias formas do
pensar devem ser tomadas como objeto
do conhecimento; só que logo se insinua,
também, o equívoco que consiste em
querer conhecer já antes do
conhecimento, ou em não querer entrar
n'água antes de ter aprendido a
nadar” (HEGEL, 1997, 109).
Nesse sentido, é possível inferir, sumariamente, o esforço hegeliano de
tentar radicalizar a noção kantiana de crítica: isso porque ela não critica seu próprio ponto
de partida, a saber, a distinção categórica entre forma e conteúdo. Este empreendimento,
por sua vez, ressalta Hegel, resulta consequentemente numa separação, uma distinção
categórica, entre crítica e conhecimento.
As formas do pensar, contudo, não devem ser utilizadas sem exame: mas esse
próprio exame é já um conhecimento. É preciso, assim, que estejam reunidas no
conhecimento a atividade das formas de pensamento, acrescida de sua crítica. É nesse
momento, doravante, que é introduzida a dialética: como método, em suma, de crítica da
crítica.
“É isso, pois, aquela atividade do pensar;
que, logo, como dialética, será levada a
um estudo particular; sobre ela, aqui
apenas se tem a notar, por enquanto, que
não se aplica, como de fora, às
determinações de pensamento; mas,
antes, deve ser considerada como
imanente a essas mesmas determinações”
(HEGEL, 1997, 109).
O pensamento de Hegel pode ser visto, por conseguinte, enquanto uma
tentativa de suplantar, por meio de uma crítica da filosofia crítica, o ponto de partida da
filosofia kantiana, a saber, o dualismo sujeito/objeto. Desse modo, objetiva superar, por
um lado, a primeira posição a respeito da objetividade metafísica, qual seja, a metafísica
antiga, que delineava seu esforço filosófico na relação identitária entre pensamento e ser;
e, por outro lado, a subjetividade da modernidade – a corrente empirista humiana -, assim
como a 'revolução copernicana' de Kant.
Finalmente, para Hegel, o conhecimento acaba por residir no entrelaçamento
entre o sujeito e o objeto. Porém, não na dualidade, propriamente, uma vez que o sujeito
conhece a si, mas só o faz, sobretudo, na medida em que conhece o objeto. Assim, é
possível considerar que o sujeito hegeliano não está configurado como um expectador do
objeto, isso porque ele considera, além de sua intenção de conhecer o objeto, o real.
Em conclusão, Hegel consegue atingir seu objetivo de superar o dualismo
sujeito-objeto através da dialética: através de uma crítica da crítica, na consideração de
que há um Espírito absoluto, o qual suprime a dicotomia sujeito-objeto, visto que esse
mesmo Espírito está na própria relação entre eles. Por conseguinte, não há mais um sujeito
que conhece um objeto por si mesmo, mas um sujeito que conhece o objeto através dos
objetos, num reconhecer-se no objeto que se quer conhecer. Assim, conhecer, através da
dialética, é reconhecer-se a si, no absolutamente outro.
Referências
HEGEL, G.W.F. Enciclopédia das ciências filosóficas em compêndio: volume 1:
A ciência da lógica. Tradução de Paulo Meneses e José Machado. Edições Loyola, 1997.
BEISER, F.C. (ed.) The Cambridge Companion to Hegel. Cambridge: CUP, 1993.
top related