breves apontamentos sobre uma política criminal de (re)valorização da vítima

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O presente estudo aborda sinteticamente o movimento político-criminal de revalorização da vítima para as ciências criminais, oriundo da organização de grupos inconformados com a histórica neutralização de seu papel no processo. Exploram-se abordagens criminológicas e dogmáticas que conferem ao ofendido novas funções e novos direitos, ampliando sua participação ativa na persecução penal e integrando seus interesses subjetivos na aplicação de sanções de índole criminal. Em paralelo a esta progressiva atenção aos sujeitos vitimizados, coloca-se a relativização e o abandono dos princípios clássicos do Direito Penal, evidenciando que deve-se evitar que a compatibilização dos interesses privados com os fins primordiais da pena acabem convertendo o processo penal num instrumento oficial de vingança à disposição das vítimas.

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  • DOUTRINAPENAL

    BREVES APONTAMENTOS SOBRE UMA POLTICACRIMINAL DE (RE)VALORIZAO DA VTIMA

    BRIEF NOTES ON THE CRIMINAL POLICY OF(RE)VALUATION OF THE VICTIM

    CARLO VELHO MAS!

    Mestre em Cincias Criminais pela PUCRS, Especialista em Direito Penale Poltica Criminal pela UFRGS, Advogado Criminal em Porto AlegrejRS.

    RESUMO: O presente estudo aborda sinteticamente o movi-mento poltico-criminal de revalorizao da vtima para ascincias criminais, oriundo da organizao de grupos incon-formados com a histrica neutralizao de seu papel no pro-cesso. Exploram-se abordagens criminolgicas e dogmticasque conferem ao ofendido novas funes e novos direitos, am-pliando sua participao ativa na persecuo penal e integran-do seus interesses subjetivos na aplicao de sanes de ndolecriminal. Em paralelo a esta progressiva ateno aos sujeitosvitimizados, coloca-se a relativizao e o abandono dos princ-pios clssicos do Direito Penal, evidenciando que deve-se evi-tar que a compatibilizao dos interesses privados com os finsprimordiais da pena acabem convertendo o processo penal emum instrumento oficial de vingana disposio das vtimas.

    PALAVRAS-CHAVE: Vtima; vitimologia; vitimodogmtica;gestores da moral coletiva; poltica criminal.

    ABSTRACT: This study briefly discusses the criminal politicmovement of revaluation of the victim to the criminal sciences,which arises from the organization of groups unsatisfied withthe neutralization of their role in the procedure. It exploresthe criminological and dogmatic approaches that assign theoffended new functions and new rights, increasing their acti-ve participation in criminal prosecution and integrating theirsubjective interests in the application of criminal sanctions.In parallel with this increased attention to victimized indivi-

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    duals, there is the relativism and the abandonment of the classicalprincipIes of criminal law, demonstrating that the compatibility ofprivate interests with the primary purpose of the criminal sanctionsshould not end up converting the criminal proceedings into an offi-cial instrument of revenge to the victims.

    KEYWORDS: Victim; victimology; dogmatic of the victim; mana-gers of public moral; criminal policy.

    A histria do Direito Penal revela que a vtima j protagonizou pes-soalmente a punio do delinquente na chamada /I fase da vingana privada",na qual a retribuio do delito partia do prprio ofendido ou de pessoas aele vinculadas. No sistema privatista da antiguidade, a vtima possua umapostura ativa frente ofensa sofrida, visando, sobretudo, retomada da har-monia comunitria'.

    Uma das conquistas do Iluminismo foi justamente a /I neutralizao"da figura da vtima, com o Estado assumindo o monoplio do jus puniendi eadquirindo a prerrogativa legtima de instrumentalizar a pacificao social,por intermdio de seu aparato tcnico-burocrtico, de modo a censurar aque-les que transgredissem os precedidos normativos. O ofendido passou a parti-cipar como elemento informador de eventuais leses a bens jurdicos sofridos(objeto material do delito)? e a ao estatal passou a ter um reflexo meramentesimblico no apaziguamento das angstias deste sujeito.

    Mas h quem questione o carter evolutivo desta mudana de paradig-ma, uma vez que a delegao da real titularidade do direito de punir acabouafastando a construo de solues de acordo com os interesses pessoais dasvtimas. O ofendido acabou se tornando um mero /I objeto" (coisijicao), oagente passivo, ou simples meio de prova para se alcanar o autor do delito".Com isso, esvaiu-se qualquer pretenso subjetiva. O interesse estatal no cum-primento da norma, com a condenao do delinquente, acabou sobrepondoo interesse individual por trs da punio. Assim, desconsideraram-se as ne-cessidades e os anseios de justia das vtimas".

    1 OLIVEIRA, Cristina Rego de. Reforma do cdigo de processo penal e tutela ressarcitriada vtima: apontamentos ao Projeto de Lei n" 8.045/2010. Revista SNTESE de Direito Penal eProcesso Penal. Porto Alegre: Sntese, v. 14, n. 83, p. 79, dez./jan. 2014.

    2 HASSEMER, Winfried. Fundamentos de direito penal. Barcelona: Bosch, 1982. p. 92-93.3 CERVINI, Ral. Os processos de descriminalizao. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais,

    2002. p. 249-250.4 DUARTE, Caetano. Justia Restaurativa. Sub Judice - Justia e Sociedade, Lisboa: Ideias, n. 37,

    p. 47, out./ dez. 2006.

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    Este" esquecimento" perdurou por aproximadamente trs sculos, atque a humanidade se deparou com o "holocausto", a partir do qual operou-seuma reavaliao da importncia dos direitos humanos. O genocdio ocorri-do na 2a Guerra Mundial deu origem a uma nova abordagem criminolgica,denominada "vitimologia", que passou a estudar o papel desempenhandopelas vtimas na ocorrncia do fato tpico, bem como a questo da assistnciajudicial, moral, psicolgica e teraputica para os vitimizados.

    A restaurao da vigncia da norma jurdica violada pela aplicao deuma sano penal deixou de ser suficiente para satisfazer o desejo de repa-rao. Surgiu a necessidade da construo de mecanismos de proteo mate-riais e processuais.

    Em pouco tempo, a sociedade passou a congregar mltiplas formas devitimizao, tais como catstrofes, crises e erupes de violncia, medo e p-nico coletivo face ao crime. Os movimentos sociais trouxeram reivindicaesimportantes neste sentido. A criminologia rompeu com o modelo positivistade orientao unidimensional, voltada ao crime e ao delinquente, e passou aadotar uma perspectiva interacionista (labelling approach), cuja principal ca-racterstica era demonstrar que as instncias de controle social podiam exer-cer um papel fulcral na seleo, estigmatizao e vitimizao". A lei penalconverteu-se na "magna carta da vtima", superando a clssica noo de ser,antes de tudo, a "magna carta do delinquente'".

    O crescimento dos movimentos de vtimas (gestores da moral coletiva),entre eles as associaes de ecologistas, feministas, consumidores, vizinhos,pacifistas, defensores da no discriminao contra as minorias, organizaesno governamentais (ONGs) que defendem direitos humanos, etc., nadamais do que uma resposta ao crescimento de uma sociedade altamente in-dustrializada e automatizada (sociedade do risco).

    As vtimas haviam sido excludas do controle formal executado pelasagncias estatais. Porm, determinados grupos no aceitaram essa situaoe se organizaram para enfrentar a situao e reivindicar mais poder, adqui-rindo enorme fora nos ltimos anos, particularmente porque seus discursospassaram a ser encampados por polticos que fazem da "lei e ordem" sua

    5 ANDRADE, Manuel da Costa. A vtima e o problema criminal. Coimbra: Coimbra Editora,1980.p. 60.

    6 SILVA SNCHEZ, [ess-Maria. La expansin del derecho penal: aspectos de Ia polticacriminal en Ias sociedades postindustriales. 1. ed. Madrid: Civitas, 1999.p. 36-43.

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    principal plataforma eleitoral. a construo de uma poltica criminal de (re)valorizao da vtima, que encontra ampla aceitao a nvel mundial.

    O legislador confere vtima um papel novo", de acordo com o qualuma determinada ilicitude pode constituir um delito ou um mero conflito,conforme o grau de interveno do ofendido na disputa. Ademais, atribuem--se aspectos jusprivatistas a este novo Direito Penal, agregando uma terceiravia de sano, qual seja, a da reparao da vtima, que passa a se somar pena e medida de segurana.

    A poltica de incluso da vtima ganha cada vez mais espao, propug-nando sua efetiva interveno no processo", na busca por um ressarcimento",

    7 No Brasil, reformas pontuais da legislao penal iniciaram-se com a composio civil dosdanos (art. 74 da Lei n" 9.099/1995), a reparao do dano como condio para suspensocondicional do processo (art. 89, 1, r, da Lei n" 9.099/1995), a multa reparatria noscrimes de trnsito (art. 297 da Lei n" 9.503/1997) e as medidas assistenciais da "Lei Mariada Penha". Em 2008, a Lei n" 11.690reformulou o Captulo V ("Do Ofendido") do TtuloVII ("Da Prova") no Cdigo de Processo Penal conferindo alguns direitos s vtimas, comoa comunicao dos atos processuais relativos ao ingresso e sada do acusado da priso, designao de data para audincia e sentena e respectivos acrdos que a mantenhamou modifiquem; a reserva de um espao separado antes do incio e durante a realizaode audincias; o encaminhamento, a critrio do juiz, para atendimento multidisciplinar,especialmente nas reas psicossocial, de assistncia jurdica e de sade, a expensas doofensor ou do Estado; a preservao da intimidade; vida privada, honra e imagem doofendido, podendo o juiz, inclusive, determinar o segredo de justia em relao aos dados,depoimentos e outras informaes constantes dos autos a seu respeito para evitar suaexposio aos meios de comunicao Hoje, o projeto de novo Cdigo Penal brasileiro (PL8.045/2010, originado do PLS156/2009) prev a criao de um ttulo especfico para tratardos direitos da vtima (arts. 90 a 92).

    8 Veja-se o caso Ximenez Lopez vs. Brasil em que o pas foi condenado pela CorteInteramericana de Direito Humanos por violao da garantia da durao razovel doprocesso, reconhecida no Pacto de San Jos da Costa Rica, do qual o Brasil signatrio, emdetrimento do direito da vtima de ver condenado, em prazo adequado, o autor da agressocontra si (CORTEInteramericana de Direitos Humanos. Caso Ximenes Lopes vs. Brasil:exceespreliminares, mrito, reparaes e custas. Disponvel em: . Acesso em: 15 out. 2012). A propsito,o Cdigo de Processo Penal brasileiro menciona o "ofendido" em 53 oportunidades, e a"vtima" em outras 6. H um ttulo especfico que trata da ao civil de reparao do dano(exdelicto), sendo que um dos elementos que a sentena penal condenatria dever fixar o"valor mnimo para reparao dos danos causados pela infrao, considerando os prejuzossofridos pelo ofendido" (art. 387, IV, do CPP).

    9 HASSEMER, Winfried. Perspectivas del derecho penal futuro. Revista Penal, Huelva-Salamanca-Castilla-La Mancha, Prxis, v. 1, p. 41,jan. 1998.Diga-se de passagem que a ideiade ressarcimento econmico do ofendido remete antiguidade. Manuel da Costa Andradee Jorge de Figueiredo Dias (Criminologia: o homem delinquente e a sociedade crimingena.Coimbra: Coimbra, 1997.p. 51 e 53) afirmam que, desde o Cdigo de Hamurabi, quando a

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    Para tanto, necessrio que o processo penal seja orientado para a composi-o civil, aplicao de pena no privativa de liberdade, mediao e reconcilia-o entre as pessoas envolvidas, logrando, assim, maiores possibilidades desucesso frente ideia exclusivamente retribucionista ao delito.

    Sabe-se que, na relao criminosa, a vtima interage com o agente ecom o ambiente, e pode, desta forma, s vezes, ter colaborado para o eventocriminoso". Por "vtima" passou-se a denominar o sujeito que sofre as conse-quncias (diretas e indiretas, mediatas e imediatas) do crime. No se confun-de, pois, com o "sujeito passivo" ou o "titular do bem jurdico", at porquetodo e qualquer delito, mesmo os uniofensivos, repercutem no s ao titulardo bem lesionado, mas tambm ao Estado, enquanto sociedade poltica e, porconseguinte, prpria sociedade".

    O Direito Penal no se serve da proteo da vtima, ou seja, de todosaqueles que sofrem os efeitos do delito. O Direito Penal se presta tutela dosbens jurdicos que, com seus titulares, guardem uma relao de dependncia.A licena para a utilizao do Direito Penal como forma de gesto dos danosauferidos pela vtima implica em um mpeto de otimizao dessa gesto, jque se tero diversas vtimas para uma mesma ofensa ao bem jurdico. ocaso particular, por exemplo, dos abusos sexuais reais e simulados de crian-as e adolescentes. Mesmo sendo a dignidade sexual infante-juvenil o bemviolado, os consectrios desta leso so sofridos pela cultura familiar, comoos pais da criana vitimizada. Este conceito abrangente de vtima permite avisualizao de uma sociedade majoritariamente amedrontada (sociedade domedos",

    A partir da necessidade de se abandonar a viso simplista do crime,em que, de um lado, teramos uma pessoa totalmente inocente (vtima), e deoutro, uma pessoa totalmente culpada (criminoso), surge o campo da "viti-

    vtima tinha prejuzos, a cidade tinha o dever de ressarci-los e, em casos de homicdio, osdescendentes tinham direito a uma indenizao.

    10 GRECO,Alessandra Orcesi Pedra. A autocolocao da vtima em risco. So Paulo: Revista dosTribunais, 2004,p. 39.

    11 interessante verificar a amplitude do conceito de "vtima" que o art. 90 do projeto denovo Cdigo de Processo Penal brasileiro (PLn" 8.045/2010) adota: "Considera-se vtima apessoa que suporta os efeitos da ao criminosa, consumada ou tentada, dolosa ou culposa,vindo a sofrer, conforme a natureza e as circunstncias do crime, ameaas ou danos fsicos,psicolgicos, morais ou patrimoniais, ou quaisquer outras violaes de seus direitosfundamentais" .

    12 GRECO,Alessandra Orcesi Pedro. Op. cit., p. 15-38.

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    modogmtica", que investiga a contribuio da vtima para a ocorrncia dodelito" e a repercusso desta na fixao da pena do autor, variando de umatotal iseno a uma simples atenuao".

    Refere-se, hoje, cada vez com maior insistncia, como uma nova e aut-noma finalidade da pena o propsito de com ela se operar a possvel concer-tao entre o agente e a vtima por meio da reparao dos danos - no apenasnecessariamente patrimoniais, mas tambm morais - causados pelo crime".

    Trata-se da posio da vtima nos mbitos da tipicidade, ilicitude e cul-pabilidade, com a imputao objetiva, a auto e a heterocolocao em perigo eo consentimento do ofendido.

    Na concepo de Bernd Schnemann, a "vitimodogmtica" umaregra para eliminar a penalizao quando a vtima, com sua conduta, nomerece e no necessita de proteo. Desenvolve-se, assim, o princpio da au-torresponsabilidade da vtima, mediante o qual o ofendido deve responderpor seu prprio comportamento, a fim de evitar que este seja a causa ou oantecedente do ato que o afete. Significa dizer que a vtima deve tomar asprecaues necessrias para evitar a afetao de seus bens jurdicos, caso con-trrio, estes ficaro excludos da tutela estatal, acarretando a atipicidadc".

    Segundo Manuel Cancio Meli, a questo central das aproximaesvitimodogmticas a de determinar se a corresponsabilidade da vtima nofato delituoso pode ter influncia sobre a valorao jurdica penal do com-

    13 digno de nota que, no projeto de novo Cdigo Penal brasileiro (PLS 236/2012), oart. 73, que trata das circunstncias judiciais para fixao da pena-base, faz expressameno fi eventual contribuio da vtima para o fato", e no mais simplesmente aofi comportamento da vtima", como hoje consta do art. 59 do CP. Alm disso, no 10 destemesmo artigo, h previso de que: "Na anlise das consequncias do crime, o juiz observarespecialmente os danos suportados pela vtima e seus familiares, se previsveis". J noart. 74 do projeto, fala-se na obrigatoriedade de fixao de alimentos aos dependentes davtima de homicdio dolos o ou culposo, na forma da lei civil, na prolao de sentena penalcondenatria.

    14 OLIVEIRA, Ana Sofia Schmidt de. A vtima e o direito penal: uma abordagem do movimentovitimolgico e de seu impacto no direito penal. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 13l.

    15 DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral. So Paulo: Revista dos Tribunais, t. 1,2007. p. 58.

    16 SCHNEMANN, Bernd. Temas actuales y permanentes deZ derecho penal despus del milnio.Madrid: Tecnos, 2002.p. 116. O exemplo recorrente para explicitar esta linha de pensamento o daquele sujeito que estaciona seu automvel em via pblica em local onde notrio ofurto de veculo e deixa a chave na ignio.

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    portamento do autor". Assim, a "vitimodogmtica" visa excluso do crimedado o comportamento da vtima, por meio da reduo teleolgica dos tipospenais fundamentada na reconduo a uma interveno mnima do DireitoPenal como corolrio da ultimaraiio.

    Ao passo que aprimora-se este movimento de ateno s vtimas, tan-to no Direito, quanto no Processo Penal, observa-se a reduo das garantiasdos acusados e o recrudescimento do sistema penal. Porm, em que pese asobreposio que se evidencia, nos ltimos tempos, da figura da vtima aosbens jurdicos alvos de tutela, no pode essa inverso implicar a relativizaoou o completo abandono dos princpios constitucionais-penais limitadoresclssicos (tais como a interveno mnima, a subsidiariedade e a fragmentarie-dade). Isso porque, como bem aponta o criminlogo noruegus Nils Christieao tratar do poder adquirido pela vtima na esfera penal,

    percebemos um fortalecimento do poder da vtima no interior do sistemado direito penal em suas mais variadas fases. A vtima , por vezes, con-vidada pelo acusador formal, informada sobre planos e estratgias daacusao, pode contribuir com suas observaes para o promotor, compa-rece s audincias do acusado e, em alguns sistemas, pode se manifestar aojuiz sobre a aplicao da pena. Muitas vezes, as vtimas tambm ganhamo direito de serem representadas por seus prprios advogados. E se tudoterminar com uma sentena condenatria, especialmente a pena privativade liberdade, dado vtima o direito de ser informada sobre as condi-es do crcere, sobre eventual progresso de regime e sobre a concessode livramento condicional do acusado condenado. O poder est nas mose na boca da vtima. um desenvolvimento que fatalmente conduzir amais encarceramentos e recrudescimento das condies nas instituiespenais.l"

    Entendemos que vivel uma convivncia harmnica entre os fins pri-mordiais do Direito Penal e do Processo Penal e o papel de relevo que vem sen-do conferido vtima, mormente no que se refere s respostas punitivas e suacompatibilidade com o sentimento de justia desta e da prpria sociedade".

    17 MELI, Manuel Cancio. Reflexiones sobre Ia "victimodogmtica" en Ia teori del delicto.Revista Brasileira de Cincias Criminais, So Paulo, v. 25, 1999.p. 25.

    18 CHRISTIE, Nils. Dilema do movimento de vtima. Discursos Sediciosos: Crime, Direito eSociedade, Rio de Janeiro, Revan, a. 17, n. 19/20, p. 369-370,2012.

    19 FERRElRA, Pedro Paulo da Cunha. Um estudo acerca das relaes entre a poltica criminalda sociedade de risco e a mdia. Revista Liberdades, So Paulo: IBCCrim, n. 10, p. 99-100,maio/ ago. 2012.

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    Sem dvida, as vtimas merecem o devido respeito e reparao e de-vem ser escutadas; contudo, preciso ter em conta que suas vozes no po-dem simplesmente suplantar a voz que (ainda) a mais fraca do processo: avoz do ru. Se o processo penal serve, em ltima anlise, para impedir o ar-btrio do Estado na aplicao da pena, por meio de mecanismos formais quedevero ser observados pelas partes, preciso que se evite transform-I O emum instrumento oficial de vingana disposio das oitimae", Do contrrio, estar--se-ia regredindo a um Estado natural (pr-social), no qual, na concepo deHobbes, imperaria a guerra de todos contra todos e cada um seria governadopor sua prpria razo" .

    . REFERNCIAS

    ANDRADE, Manuel da Costa. A vtima e o problema criminal. Coimbra: CoimbraEditora, 1980.

    ___ ; DIAS, Jorge de Figueiredo. Criminologia: o homem delinquente e a sociedadecrimingena. Coimbra: Coimbra, 1997.

    CERVINI, Ral. Os processos de descriminalizao. 2. ed. So Paulo: Revista dosTribunais, 2002.

    CHRISTIE, Nils. Dilema do movimento de vtima. Discursos Sediciosos: Crime, Direitoe Sociedade, Rio de Janeiro, Revan, a. 17, n. 19/20, p. 367-377,2012.

    CORTE Interamericana de Direitos Humanos. Caso Ximenes Lopes vs. Brasil:excees preliminares, mrito, reparaes e custas: Disponvel em: . Acesso em: 15 out. 2012.DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral. So Paulo: Revista dosTribunais, 1. I, 2007.

    DUARTE, Caetano. Justia Restaurativa. Sub Judice - Justia e Sociedade, Lisboa:Ideias, n. 37, p. 47-52, out.j/ dez. 2006.

    FERREIRA, Pedro Paulo da Cunha. Um estudo acerca das relaes entre a polticacriminal da sociedade de risco e a mdia. Revista Liberdades, So Paulo: IBCCrim,n. 10, p. 87-115, maio/age. 2012.

    GRECO, Alessandra Orcesi Pedro. A autocolocao da vtima em risco. So Paulo:Revista dos Tribunais, 2004.

    20 Veja-se, por exemplo, o caso de conflitos familiares que potencialmente caracterizamviolncia domstica.

    21 HOBBES,Thomas. Leviat: ou a matria, forma e poder de um Estado eclesistico e civil.Trad. Rosina D'Angina. So Paulo: cone, 2000.

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    HASSEMER, Winfried. Fundamentos de direito penal. Barcelona: Bosch, 1982.

    ___ o Perspectivas deI derecho penal futuro. Revista Penal, Huelva-Salamanca-Castilla-La Mancha, Prxis, V. 1, p. 37-41, jan. 1998.

    MELI, Manuel Cancio. Reflexiones sobre Ia "victimodogmtica" en Ia teori deIdelicto. Revista Brasileira de Cincias Criminais, So Paulo, V. 25, 1999.

    OLIVEIRA, Ana Sofia Schmidt de. A vtima e o direito penal: uma abordagem domovimento vitimolgico e de seu impacto no direito penal. So Paulo: Revista dosTribunais, 1999.

    OLIVEIRA, Cristina Rego de. Reforma do cdigo de processo penal e tutelaressarcitria da vtima: apontamentos ao Projeto de Lei n" 8.045/2010. RevistaSNTESE de Direito Penal e Processo Penal. Porto Alegre: Sntese, V. 14, n. 83, p. 78-97,dez'; jan. 2014.

    SCHNEMANN, Bernd. Temas actuaZes y permanentes deZderecho penal despus deZmilnio. Madrid: Tecnos, 2002.

    SILVA SNCHEZ, Jess-Maria. La expansin deI derecho penal: aspectos de Iapoltica criminal en Ias sociedades postindustriales. 1. ed. Madrid: Civitas, 1999.

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    REpOSITRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDNCIASupremo Tribunal Federal: 03/85Superior Tribunal de Justia: 09/90

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