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Amaral Morais Raimundo Graduando do curso de Licenciatura em Geografia da UFRJ e integrante do Programa de Educação Tutorial em Geografia – PET [email protected] A feira Nordestina de Duque de Caxias: espacialidades e territorialidades.

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Amaral Morais Raimundo

Graduando do curso de Licenciatura em Geografia da UFRJ e integrante do Programa de Educação Tutorial em Geografia – PET

[email protected]

A feira Nordestina de Duque de Caxias: espacialidades e territorialidades.

INTRODUÇÃO

A pesar do impasse sobre a origem da feira livre de Duque de Caxias, acredita-se que a

mesma tenha surgido no início dos anos vinte, em conseqüência da instalação da

Estação Ferroviária de Meriti, em 1913.

Após os anos 30 o nome “Meriti” começa a ser visto pelos moradores como algo

estagnado, incompatível com os novos tempos. Neste mesmo período a localidade

começa a receber investimento em infra- estrutura, como bicas d’água, calçamento de

ruas... Em prol de um maior desenvolvimento da cidade. A partir de então, o embarque

e o desembarque de passageiros dos trens passam a ser a garantia de um potencial

comercial local.

Hoje a feira livre que ocorre aos domingos no centro de Caxias tornou uma projeção da

cultura nordestina na Baixada Fluminense devido à grande quantidade de migrantes que

vieram para a metrópole carioca, no início do século XX, em busca de melhores

condições de vida e se instalaram no município de Duque de Caxias.

Contudo, o mercado periódico caxiense nos oferece desde animais exóticos, que são

abastecidos pelo tráfico ilegal de animais silvestres, até flores variadas, alimentos

múltiplos, grande variedade de vestuários e utensílios domésticos.

OBJETIVOS

Este trabalho teve como objetivo avaliar a devida feira como palco de relações de poder,

destacando seu alcance espacial Máximo e Mínimo em analogia aos fluxos de pessoa e

mercadorias. Além, de destacar como está disposto seu arranjo espacial e como ele

contribui para entendermos a territorialidade interna do mercado periódico.

JUSTIFICATIVA

Nota-se que as feiras ocorrem em diferentes tamanhos e funções e refletem as

expressões da centralidade urbana sob uma multiplicidade de escalas e alcances

espaciais.

A especificidade do uso altera a organização do espaço, contudo, a feira será

“recortada” em diferentes zonas, de acordo com suas especificidades para melhor

entender sua dinâmica.

METODOLOGIA

Quanto à metodologia utilizada, a primeiro momento, foi realizado um pré-

campo para que pudéssemos nos aproximar da realidade vivida em Caxias, pois o

contato com os diferentes fenômenos apresentados nos espaços nos conduz a busca de

sua essência. A partir deste momento, achou-se por bem, em prol de uma melhor

compreensão da territorialidade, dividir a feira em quatro zonas distintas, porém,

pertencentes à mesma lógica dos mercados periódicos.

Sendo assim, a feira foi desmembrada em Zona 1, denominada zona dos animais; a

Zona 2, é composta pelos alimentos ; a Zona 3 , destinada aos vestuários, e por fim,

destacou-se a Zona 4 , pertencente ao utensílios . No

segundo momento, foram planejadas e desenvolvidas outras idas a campo, já com o

material bibliográfico e sua leitura definida, como pode ser demonstrado com a menção

de alguns autores como Corrêa (2010), Raffestin (1993), Souza (2011), Haesbaert

(2007), Moreira (2007), entre outros articuladores; o que contribuiu para a alteração do

nosso olhar sobre o objeto de estudo e na construção de nossa base teórica

metodológica.

Na coleta de dados, foram elaboradas entrevistas semi-estruturadas com questões

abertas e fechadas a partir de questionários que foram aplicados tanto aos moradores

residentes na cidade, quanto aos transeuntes de outras cidades e que também freqüentam

a feira (são os denominados freqüentadores), além dos feirantes que trabalham no local

(são os denominados comerciantes). A amostra utilizada na pesquisa será uma amostra

estratificada do tipo intersticial dos sujeitos envolvidos na pesquisa, ou seja, os

questionários foram divididos em duas camadas (os freqüentadores e os comerciantes),

para que haja um entendimento dos diferentes papeis destes atores no contexto espacial

da feira livre caxiense.

Já a parte técnica-metodológica empregada para a confecção da pesquisa foram

utilizados softwares e programas como Arc Gis e Google Earth na elaboração e na

seleção dos recursos imagéticos e dos mapas referentes ao trabalho, além, da utilização

de materiais audiovisuais em complacência com as gravações e as fotografias tiradas em

campo.

LOCALIDADE DA PESQUISA

Muito diferente das feiras de antigamente, a maioria dos mercados periódicos de hoje se

caracterizam por apresentarem uma enorme complexidade. E a Feira Livre de Duque de

Caxias não é diferente, pois está situada em uma metrópole, mais precisamente na

Baixada fluminense, no município de Duque de Caxias; componente da Região

Metropolitana do Rio de Janeiro.

A Feira Nordestina de Duque de Caxias inicia-se na Avenida Duque de Caxias, na

esquina com a Rua Cardoso Bessa, e continua pela Avenida Presidente Vargas até a

altura da Rua Paulo Lins. Depois prossegue pela Rua Prefeito José Carlos Lacerda

(antiga Gastão Cruls), até o seu final.

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

O TERRITÓRIO DA FEIRA DE DUQUE DE CAXIAS

A Feira Livre de duque de Caxias é um território flexível, construída por e a partir de

relações sociais em que durante os dias úteis e no sábado tem a função de uma via de

circulação de automóveis e pedestres e que no domingo, dia de feira, tem sua função

alterada, tornando-se um território propício ao comércio e relações sociais e culturais.

Segundo Souza (2002), o conceito de território “é um espaço definido e delimitado por

e a partir de relações de poder... É essencialmente um instrumento de exercício de

poder” (SOUZA, 2002; pp78.).

E justamente por ser um território flexível é que a feira de Caxias é de nominada um

mercado periódico – que são pequenos núcleos que se transformam em localidades

centrais – atraindo uma grande quantidade de pessoas e mercadorias.

No entanto, por ser uma feira controlada pelo poder público, há uma tentativa de

estabilização de seus limites. Mas, não é assim que ocorre, pois, existem trabalhadores

não cadastrados na prefeitura e que atuam na feira. Além do mais, ao caminhar pela

feira é notória a divisão entres as diferentes seções da feira, mas não se tem a noção

exata de onde termina uma seção e onde começa a outra.

A figura abaixo demonstra a territorialidade da feira de Caxias e sua divisão em

diferentes zonas.

Zoneamento Da feira de Caxias realizado em 2013

Fonte: Pesquisa de campo 2013. Organização: Amaral

Entrevistados na feira de Caxias em 2013

Fonte: Pesquisa de campo 2013. Organização: Amaral

ESTRUTURA E ARRANJO ESPACIAL DA FEIRA DE CAXIAS

As sociedades em geral encontram-se territorialmente ordenada, no sentido de certa

ordem de direção, ou seja, as sociedades arrumam- se na forma de um arranjo espacial,

que direcionam seus movimentos para uma finalidade predeterminada, onde o arranjo

organiza e orienta a sociedade em busca desta finalidade.

Segundo Moreira (2007):

“O ordenamento não é, pois, a estrutura espacial, mas a forma como esta estrutura espacial territorialmente se autorregula no todo das contradições da sociedade, de modo a manter a sociedade funcionando segundo sua realidade societária.” (MOREIRA, 2007; pp77.).

Os arranjos espaciais são as formas como observamos na paisagem a distribuição das

localizações, daí pode-se falar em uma organização espacial da sociedade. No caso de

Caxias, tendo como já incorporadas as redes ou vias de fluxo de mercadorias e pessoas,

a formação de seu arranjo espacial começa na madrugada de domingo, onde a maior

parte dos “banqueiros” - os montadores - está apostos, montando as barracas e

distribuindo as mercadorias pelo tabuleiro. Ao alvorecer o dia, chegavam os primeiros

fregueses, os que preferem produtos frescos, mesmo a preços mais caros que os

aplicados ao meio dia.

Já no domingo de manhã, a feira está distribuída pelas principais vias do centro da

cidade, onde semanalmente há trafego de veículos e pedestres. Além do funcionamento

de um comércio fixo, nos dias úteis, por boa parte do território onde ocorre a feira.

Principalmente na Zona 3 ( dos vestuários) e na Zona 4 ( dos utensílios).

A feira caxiense, como a maioria das feiras, caracteriza-se por apresentar as barracas ou

“tabuleiros” dispostos ao ar livre, com produtos de enormes variedades e quantidades,

muitas das vezes arrumados até no chão. Além de, dispor de uma enorme quantidade de

freqüentadores locais e visitantes. A quantidade de produtos, consumidores e total de

entrevistados por zona serão representadas no gráfico abaixo.

Total de moradores e visitantes entrevistados por zona em 2013

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

MERCADOS PERIÓDICOS E REDES DE LOCALIDADES CENTRAIS

“... A questão das localidades centrais é definida como um fenômeno historicamente determinado e submetido às transformações por que se passa a sociedade capitalista. A rede de localidades centrais constitui-se em uma estrutura territorial cuja analise possibilita a compreensão do sistema urbano de países não industrializados ou onde a industrialização se verifica espacialmente concentrada.” (Corrêa, 2010. Pp32-35).

Em se tratando dos países subdesenvolvidos, as redes de localidades centrais são

caracterizadas por três modos de organização: a rede dendrítica de localidades centrais;

os mercados periódicos, no qual temos sumo interesse como representação estrutural-

espacial da feira Nordestina de Duque de Caxias; e, por fim, o desdobramento da rede

em dois circuitos da economia (superior e inferior).

Segundo Corrêa:

“Os mercados periódicos constituem um dos modos como está estruturada a rede de localidades centrais nos países subdesenvolvidos.” “... Os mercados periódicos são definidos como aqueles núcleos de povoamento, pequenos, que via de regra, que periodicamente se transformam em localidades centrais: uma ou duas vezes por semana, de cinco em cinco dias, durante o período de safra, ou de acordo com outra possibilidade.” (CORRÊA, 2010, pp 50).

De acordo com o mesmo autor estes núcleos oscilam quanto a sua centralidade, ou seja,

fora dos períodos de intenso movimento, eles voltam a serem pacatos núcleos rurais,

com maior parte da população engajada em atividades primárias. Mas, no que se refere

à feira Nordestina de Duque de Caxias, podemos constatar que o espaço onde a feira é

realizada mantém-se urbano, alterando somente sua forma e função em decorrência dos

dias de feira. Nos dias em que não há feira este espaço é uma via de circulação de

veículos e pedestres, já nos dias de feira, o mesmo espaço torna-se um lugar de

comércio e de serviço.

ALCANCE ESPACIAL MÁXIMO E MÍNIMO

De acordo Lobato Corrêa (2010) os conceitos de alcance espacial Máximo e Mínimo se

diferenciam, como pode ser visto a seguir:

O Alcance espacial Máximo seria:

...“a área determinada por um raio a partir de uma localidade central, onde os consumidores deslocam-se para a localidade central, visando a obtenção de bens e serviços.” (CORRÊA, 2010, pp57.).

Já o Alcance espacial Mínimo é definido pela:

...“área em torno de uma localidade central que engloba o mínimo de consumidores suficiente para que um dado comerciante nela se instale.” (CORRÊA, 2001, pp58.).

Sendo assim, no que se refere ao Alcance espacial Maximo e Mínimo da Feira

Nordestina de Duque de Caxias, foi feito, a partir das entrevistas, um mapa que

representa tal situação, como pode ser visto mais a frente.

Origem dos produtos comercializados na feira de Caxias durante o trabalho de campo de 2013

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

Alcance espacial dos freqüentadores da feira de Caxias em 2013

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

Alcance espacial dos comerciantes da feira de Caxias em 2013

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

Dos freqüentadores entrevistados na feira de Caxias em 2013. Zonas da feira

Moradores de Caxias

Freqüentadores de outra

localidade

Z1 - animais

3,75%

21,25%

Z2 - alimentos

16,25%

8,75%

Z3 - vestuários

10%

15%

Z4 - utensílios

7,5%

17,5%

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

Dos comerciantes entrevistados na feira de Caxias em 2013. Zonas da feira

Comerciantes que residem

em Caxias

Comerciantes que residem

em outras localidades

Z1 – animais

16,25%

8,75%

Z2 – alimentos

15%

10%

Z3 – vestuários 16,25% 8,75%

Z4 – utensílios

18,75%

6,25%

Fonte: trabalho de campo 2013. Organização: Amaral

CONSIDERAÇÕES FINAIS Podemos concluir que a feira está distribuída no espaço de maneira bem peculiar,

devido à diversidade de produtos que a mesma comporta. Apresentando áreas que

admitem animais em gerais; alimentos como hortaliças, legumes e frutas; vestuário

infantil e adulto, masculino e feminino; e utensílios dos mais variados, como: panela,

alicate, martelo, etc.

Hoje, a organização espacial da sociedade ou seu arranjo espacial corresponde, em sua

forma, ao modo de produção capitalista. O que era diferente no passado, em se tratando

da feira de Caxias, em que havia um sistema de comércio baseado na troca de produtos.

O alcance espacial da feira extrapola a rede intra-urbana. Tendo no comércio ilegal de

animais um grande atrativo para as pessoas que vêm de longe, devido a sua raridade.

A feira é uma localidade central, devido o grande número de freqüentadores e dos

diferentes tipos de serviços disponíveis. Estando ligada á centralidade da cidade de

Duque de Caxias, que atrai um grande número de pessoas e mercadorias.

Por fim, os mercados periódicos resistem até hoje pelas vantagens comparativas em

relação aos mercados fixos e à sua acessibilidade, que geralmente é facilitada.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

• CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias Geográficas. 4. ed. Rio de Janeiro:

Bertrand Brasil, 2010. 304 p.

• CORRÊA, Roberto Lobato. Interações Espaciais. In: CORRÊA, Roberto Lobato; CASTRO, Iná Elias de; GOMES, Paulo César da Costa. Explorações Geográficas. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. Cap. 8, p. 279- 318.

• CORRÊA, Roberto Lobato. Estudos sobre a Rede Urbana. Rio de Janeiro:

Bertrand Brasil, 2006. 336 p.

• CORRÊA. Roberto Lobato (1989). A rede urbana. São Paulo: Ártica, Capítulos

2 e 3, pp. 09-83 .

• HAESBAERT, Rogério. Territórios Alternativos. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2012. 186 p.

• MEDEIROS, Jorge França Da Silva. As feiras livres em Belém (PA):

Dimensão Geográfica e Existência Cotidiana. 2010. 119 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Geografia, Departamento de Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, UFPa, Pará, 2010.

• MOREIRA, Ruy et al. O espaço e o contra espaço: as demissões territoriais da

sociedade civil e do Estado, do privado e do público na ordem espacial burguesa. In: SANTOS, Milton et al. Território, territórios: ensaio sobre o ordenamento territorial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2011. Cap. 4, p. 72-108.

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Circuitos da economia urbana: arranjos espaciais e dinâmica das feiras livres em Natal-RN. Sociedade e Território, Natal, v. 24, n. 1, p.115-133, jun. 2012.

• RAFFESTIN, Claude. Por uma Geografia do Poder. Tradução de Maria

Cecília França – São Paulo: Editora Ártica, 1993; (Temas) v. 29,269 p.

• SANTOS, Milton. Manual de Geografia Urbana. Tradução de Antônia Dea Erdens; Maria Auxiliadora da Silva – São Paulo: Hucitec, 1981; pp203.

• SOUZA, Marcelo José Lopes de. ABC do Desenvolvimento Urbano.6. ed. Rio

de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011. 192 p.

• SOUZA, Marcelo José Lopes de. O TERRITÓRIO: SOBRE O ESPAÇO E O PODER, AUTONOMIA E DESENVOLVIMENTO. In: CASTRO, Iná Elias de; GOMES, Paulo César da Costa; CORRÊA, Roberto Lobato. Geografia: Conceitos e Temas. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. Cap. 3, p. 77-116.