altar e a orientação da liturgia

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Altar e a orientação da Liturgia – motivações do “Arranjo Beneditino” Categorias: Liturgia , O Novus Ordo Missæ - Forma de Paulo VI e João Paulo II do Rito Romano , Uncategorized por dsbonafe Introdução ao Espírito da Liturgia, Joseph Ratzinger, Cardinal, 2001 A descrição da transformação da Sinagoga em função da celebração cristã feita até agora, deixa reconhecer nitidamente também ao nível arquitetônico, a continuidade e a novidade na relação entre o Antigo e o Novo Testamento. Assim, foi criada uma expressão de espaço para a celebração da Palavra que lhe é atribuída. É evidente que outras evoluções se tornaram não só possíveis como também necessárias. O batismo tinha de encontrar o espaço que lhe foi atribuído. O percurso evolutivo do Sacramento da Penitência foi muito longo

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Explica ao ritual católico beneditino

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Altar e a orientao da Liturgia motivaes do Arranjo Beneditino

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Liturgia, O Novus Ordo Miss - Forma de Paulo VI e Joo Paulo II do Rito Romano, Uncategorizedpor dsbonafe

Introduo ao Esprito da Liturgia, Joseph Ratzinger, Cardinal, 2001

A descrio da transformao da Sinagoga em funo da celebrao crist feita at agora, deixa reconhecer nitidamente tambm ao nvel arquitetnico, a continuidade e a novidade na relao entre o Antigo e o Novo Testamento. Assim, foi criada uma expresso de espao para a celebrao da Palavra que lhe atribuda. evidente que outras evolues se tornaram no s possveis como tambm necessrias. O batismo tinha de encontrar o espao que lhe foi atribudo. O percurso evolutivo do Sacramento da Penitncia foi muito longo e o seu resultado tinha de ser includo na forma de construo das igrejas. Necessariamente, no espao da celebrao tambm se tornavam manifestas as vrias formas de religiosidade do povo. A questo das imagens e da msica sacra tinha de ser esclarecida e inserida na estrutura do espao da igreja. Tambm as normas arquitetnicas da celebrao da palavra e do sacramento, que ficamos a conhecer, no eram fixas; certamente, todas as evolues e remodelaes contm a seguinte questo: o que que corresponde natureza da celebrao e o que que nos afasta dela?Nesta questo, as normas da configurao do espao nas celebraes, estabelecidas pela Cristandade de lngua e pensamento simtricos que acabamos de contemplar, no podem ser ignoradas. H uma evidncia comum para toda a Cristandade,que prevaleceu a todas as variaes at ao segundo milnio tardio: a orientao da orao para o Oriente tradio desde o incio, a expresso fundamental da sntese crist do Cosmos, da Histria, da consolidao dentro da singularidade da Histria da salvao [um pedacinho aqui no foi impresso direito]. Nela,refletem-se, de forma igual, a boa f no que j foi oferecido como tambm a dinmica da continuao.

Os Homens de hoje no tem muita compreenso para essa orientao.Enquanto a orao, em direo ao lugar central da revelao a Deus que se nos revelou, e como e onde se revelou continua a ser evidente para o Judasmo e para o Islo, o mundo ocidental comeou a ser dominado por um pensamento abstrato que, de certo modo, talvez at seja fruto da evoluo crist. Deus espiritual e Deus existe em todo o lado: tal pensamento no significa que a orao no seja comprometida com nenhum lugar e nenhuma direo? Na realidade, ns podemos rezar em qualquer lado, Deus atingvel em todo o lado. Tal universalidade de pensamento sobre Deus a consequncia da universalidade crist, do olhar cristo para Deus,acima de todos os outros deuses; Deus que abrange o Cosmos e que nos mais ntimo do que ns somos ans prprios.Mas este conhecimento da universalidade , no fundo, fruto do Apocalipse: Deus revelou-se-nos. por isso que o conhecemos, s assim podemos ser confiantes e rezar em todo o lado. E, precisamente por esta razo, continua a ser conveniente que a orao crist sedirija para Deus que se nos revelou.E, tal como Deus encarnou e entrou no Espao e Tempo, tal conveniente para a orao pelo menos na Missa que nosso falar com Deus seja encarnador e cristolgico e que,mediante aquele que encarnou, se dirija a Deus trino.O smbolo csmico do Sol nascente a expresso da universalidade que superior a todo o lugar, afirmando, ao mesmo tempo, o concreto da revelao de Deus. A nossa orao insere-se assim na peregrinao dos povos rumo a Deus.

Mas o que acontece com o altar? Em que direo oramos ns na liturgia eucarstica? Enquanto na construo da igreja bizantina se manteve a estrutura acima descrita, em Roma, o desenvolvimento do ordenamento de espao foi algo diferente.A cadeira do Bispo deslocada para o meio da abside (parede oriental); em consequncia disso, o altar colocado na nave da igreja. Assim parece ter sido nas igrejas de S. Joo de Latro e de Santa Maria Maior, pelo menos at ao sculo IX. Contudo, no tempo de Gregrio Magno (590-604), o altar mudado para o lado da cadeira do Bispo, provavelmente pela simples razo de assim se encontrar quase por cima do tmulo de So Pedro [subPetro].A nossa celebrao do sacrifcio do Senhor na comunidade dos Santos, que abrange todos os tempos, adquiriu assim uma expresso evidente. O hbito de erigir o altar por cima de tmulos de mrtires remonta provavelmente a tempos antigos e corresponde ao mesmo motivo: os mrtires perpetuam a entrega do Cristo ao longo da Histria, eles so o altar vivo da Igreja e esse altar no construdo por uma pedra, mas sim por homens que se tornaram membros do corpo de Cristo,dando assim expresso ao novo culto: o sacrifcio a Humanidade a tornar-se amor com Cristo.Parece que a seguir, o ordenamento do espao da Baslica de So Pedro foi imitado por muitas outras igrejas locais romanas.

Os detalhes controversos desses processos no so de importncia para as nossas deliberaes. A disputa do nosso sculo foi causada por uma outra inovao. As condies topogrficas conduzira a que a Baslica de So Pedro tenha ficado voltada para o Ocidente. Ora, se o sacerdote celebrante quisesse olhar em direo a Oriente como exige a tradio da orao crist ento ele encontrar-se-ia atrs do povo, olhando assim por conseguinte para o povo.Seja qual for a razo, o ordenamento do espao na construo de vrias igrejas revela a direta influncia da Baslica da So Pedro. A inovao da liturgia deste sculo pegou nesta forma presumida, desenvolvendo a partir dela uma ideia para uma nova configurao da missa: a Eucaristia teria de ser celebrada versus populum(em direo ao povo), o altar como se pode ver na forma normativa de So Pedro deveria ser colocado de modo a que o sacerdote e o povo se pudessem olhar mutuamente, formando conjuntamente o crculo de celebrantes. S assim que a liturgia crist seria conforme, corresponderia ao encargo da participao ativa. S assim que se responderia imagem final da ltima Ceia. Por fim, essas concluses pareciam to convincentes que, depois do Conclio (que em si no fala nada da orientao para o povo) foram erigidos altares novos por todo o lado; a direo da celebrao versus populum, surge hoje praticamente como o autntico fruto da inovao litrgica, em concordncia com o Vaticano II. Na realidade ela consequncia mais visvel da reestruturao que no implica apenas o ordenamento exterior dos lugares litrgicos, mas sobretudo uma nova compreenso da natureza da liturgia como ceia.

Mas o sentido da baslica romana e da sua colocao do altar assim mal entendido, como tambm a ideia da ltima ceia de Jesus no bem exata.Vamos ouvir Louis Bouyer a esse respeito: A ideia nomeadamente a da ltima ceia de que a celebrao versus populum tenha sido a forma original da ltima Ceia, baseia-se simplesmente no conceito incorreto de um banquete cristo ou no cristo na Antiguidade. Nos primeiros tempos cristos, nunca o dirigente de um banquete teria tomado lugar diante dos outros participantes. Todos estavam sentados ou deitados no lado convexo de uma mesa em forma de sigma ou de ferradura. Em tempos da Antiguidade crist nunca teria surgido a ideia de que o dirigente de um banquete devesse tomar o seu lugar versus populum.O carter de convivncia de um banquete era realado precisamente pela ordenao oposta de lugares, isto , todos os participantes estavam sentados do mesmo lado da mesa.

A esta anlise da forma do banquete deve acrescentar-se, que seria certamente insuficiente realizar uma descrio completa da eucaristia crist apenas com base na ceia. Apesar do Senhor ter oferecido a novidade do culto cristo no sentido de uma ceia judaica (Pascha),ele no ordenou a reiterao da ceia sem si, mas sim do novoque ela constitua. Por isso e que o novo muito rapidamente se separou do contexto velho, encontrando a sua prpria forma que lhe era conforme e que j era preconcebida pelo fato da Eucaristia remeter para a cruz e, por conseguinte, para a transformao do sacrifcio do templo para a celebrao segundo Logos. Assim aconteceu que, atravs da memria da morte e da ressurreio de Cristo, a Liturgia da Palavra da Sinagoga, inovada e aprofundada em esprito cristo, se tenha fundido na Eucaristia,realizando-se precisamente assim a incumbncia de fazei isto.Essa nova forma global no era, em si, derivada da ceia; ela tinha de ser definida pela relao entre templo e Sinagoga, Palavra e Sacramento, dimenso csmica e histria. Ela manifesta-se,precisamente, na forma que encontramos na estrutura litrgica das primeiras igrejas da Cristandade simtrica. natural que tenha permanecido fundamental tambm para Roma. A propsito disso, volta a citar Boyler: No existe nenhuma indicao de que antes daquela altura (isto , antes do sculo XV)e em lado algum tivesse sido levantada a questo do lugar do sacerdote (com o povo diante ou por trs de si) durante a celebrao e que lhe fosse atribuda alguma importncia ou ateno. O professor Cyrille Vogel provou: se alguma vez se fez caso de algo, ento foi que o sacerdote tinha de dirigir tanto a orao eucarstica como todas as outras oraes para Oriente. Mesmo se a orientao do altar da igreja permitia ao sacerdote dirigir a orao ao povo, no nos podemos esquecer que, no apenas o sacerdote, mas tambm toda a assemblia se dirija para Oriente.

Com efeito, tanto na construo de igrejas como na concretizao da liturgia, estes contextos ou foram ofuscados ou desapareceram por completo da conscincia. S assim se pode explicar que, doravante,a direo da orao comum do sacerdote e do povo tenha sido rotulada como celebrar para a parede ou viras as costas ao povo o que, obviamente, parecia ser completamente absurdo e inadmissvel. S assim se pode explicar que a ceia ainda por cima pensada em imagens de tempos modernos se tenha tomado a ideia normativa para a celebrao litrgica dos cristos. Na realidade, isso levou a uma clericalizao jamais vista. O sacerdote ou melhor, agora o chamado presidente da celebrao torna-se o ponto de referncia do todo. Tudo depende dele. necessrio v-lo, participar na sua ao,responder-lhe; tudo assenta na sua criatividade. compreensvel que, desde logo, se comece a diminuir esse papel ainda h pouco tempo criado, distribuindo atividades variadas a outros e confiando a preparao criativa de uma parte da missa a grupos de preparao,que querem e devem apresentar sobretudo as suas prprias idias. Cada vez menos Deus que se encontra em destaque,cada vez mais importncia ganha tudo o que as pessoas aqui reunidas fazem e que em nada se querem submeter a um esquema prescrito.O sacerdote que se volta para a comunidade forma, juntamente com ela,um crculo fechado em si. A sua forma deixa ou de ser aberta para cima e para frente;ela encerra-se em si prpria. Voltar-se em conjunto para o Oriente,no era uma celebrao da parede e no significava do sacerdote virar as costas ao povo: no fundo, isso no tinha muita importncia. Porque da mesma maneira como as pessoas na Sinagoga se voltavam para Jerusalm, elas voltavam-se aqui em conjunto para o Senhor. Tratava-se como foi expresso por um dos presbteros que elaboraram a Constituio Litrgica do Vaticano II [a Sacrosanctum Concillium],J. A. Jungmann de uma orientao comum do sacerdote e do povo,que se entendiam unidos na caminhada para o Senhor. Eles no se fecham no crculo, no se olham uns aos outros; so um povo que se pe a caminho para Oriens, rumo a Cristo vindouro que se aproxima de ns.

Mas tudo isso no ser romantismo e nostalgia? Pode a forma primitiva da orao cristo ter ainda algum significado para ns hoje, no ser que temos simplesmente de encontrar a nossa prpria forma, a forma para os nossos tempos? Naturalmente, no se deve simplesmente querer imitar o passado. Cada tempo deve encontrar o seu essencial e manifest-lo. O importante distinguir o essencial entre as aparies inconstantes. Seria com certeza errado reprovar categoricamente as formas novas deste sculo. A aproximao do altar ao povo tinha a sua justificao, pois muitas vezes ele era demasiadamente afastado dos fiis, embora no nos possamos esquecer que, nas catedrais, podia recorrer-se aos altares no cruzeiro, que tradicionalmente se encontravam entre o presbitrio e a nave. Foi tambm importante distinguir claramente o lugar da Celebrao da Palavra do lugar da prpria Celebrao Eucarstica, porque aqui trata-se mesmo da interpelao e da resposta, sendo conveniente os proclamadores e os ouvintes estarem uns diante dos outros, para os ltimos poderem elaborar o que ouviram no Salmo, absorv-lo e transform-lo em orao , a fim de ela se tornar resposta. Contudo, essencial voltar-se em conjunto para o Oriente na orao eucarstica. Aqui, no se trata de algo casual, mas sim substancial. No que o olhar para o sacerdote seja de importncia, o olhar comum para o Senhor. No o dilogo que est agora em causa, mas a adorao comum, a partida para o futuro. No o crculo fechado que corresponde ao que est a acontecer, mas sim a partida em conjunto, que se manifesta pela direo comum a todos.

Estas opinies, que h tempos expus, foram contraditadas por A.Hussling. A primeira acabei de abordar. Elas seriam romantismo e saudades inteis do passado. Seria estranho eu falar apenas da Antiguidade Crist, ignorando todos os sculos seguintes. Essa objeo provinda de um investigador de liturgia notvel, porque na minha opinio, uma grande parte da problemtica do conhecimento da liturgia moderna consiste em s querer reconhecer o antigo como normativo e em conformidade com as origens, considerando como ftil toda a evoluo que se seguiu, tanto na Idade Mdia como aps Trento. Tal atitude causa reconstrues do antigo,questionveis e normativas inconsistentes, originando assim propostas de modificao sempre novas, dissolvendo, por fim, a liturgia que cresceu numa evoluo viva. Contrariamente a isso, importante e necessrio ver que nem o antigo, em e por si, pode, partida, servir de padro, nem o que a seguir evoluiu pode ser classificado como afastado das razes. evidente que pode haver uma evoluo viva, em que as sementes da origem amaduream e deem fruto. Logo a seguir, teremos de voltar a desenrolar este pensamento.Contudo, no nosso caso, no se trata mesmo de um refgio romntico para o antigo, mas sim de uma nova descoberta do substancial,onde a liturgia crist manifesta a sua orientao perene. Na opinio de Hussling, a orientao para o Oriente, para o Sol nascente, j no pode ser reintroduzida na liturgia dos nossos dias. Ser que no pode mesmo? Ser que hoje o Cosmos j no nos diz nada? Ser que estamos to perdidamente encerrados no nosso prprio crculo? Ser que a orao com toda a Criao no tem precisamente hoje um grande significado? Ser que no ,precisamente hoje, importante dar espao dimenso do futuro, esperana do Senhor vindouro e o reconhecer de novo a dinmica da Criao como a forma substancial de viver a liturgia?

Uma outra objeo a de j no ser mais necessrio olhar para o Oriente, nem para a cruz, declarando o olhar mtuo entre o sacerdote e os fiis como o olhar para a imagem de Deus atravs do Homem. Estar voltado um para o outro seria a orientao correta da orao. Quase no consigo acreditar que esta rplica tenha sido pronunciada por este crtico to afamado, visto que no assim to fcil ver a imagem de Deus no Homem. A imagem de Deus no Homem no algo que se possa fotografar ou ver com o olhar de fotgrafo. , contudo, certamente possvel v-la unicamente mediante o novo olhar da f. possvel v-la,tanto quanto seja possvel ver a bondade do Homem, a sua retido, a sua veracidade interior, a sua humildade, o seu amor aquilo que o assemelha a Deus. Mas para ver o novo preciso aprend-lo ea funo da Eucaristia ensin-lo.

H uma objeo ainda mais importante ao nvel prtico. Havemos de voltar a remodelar tudo? Nada to prejudicial para a liturgia como o permanente mexer, mesmo quando se trata de inovaes aparentemente essenciais. Vejo uma soluo, na indicao que referi no anexo s opinies de Erik Peterson. Como j ouvimos, a direo para Oriente relacionava-se com o sinal do Filho do Homem, como a cruz que anuncia o retorno do Senhor. Assim, desde muito cedo, o Oriente relacionava-se com a cruz. Onde no possvel voltar-se coletivamente para o Oriente, pede a cruz servir como o Oriente interior da f. Ela deveria encontrar-se nomeio do altar, sendo o ponto de vista comum para o sacerdote e para a comunidade orante. Assim, seguimos a antiga exclamao de orao no limiar da Eucaristia Conversi ad Dominum -voltai-vos para o Senhor. Desta maneira olhamos juntos para Aquele cuja morte rasgou o vu para o que est diante do Pai por ns e que nos abraa, fazendo de ns templos vivos. Considero as inovaes mais absurdas das ltimas dcadas aquelas que pem de lado a cruz, a fim de libertar a vista dos fiis para o sacerdote. Ser que a cruz incomoda a Eucaristia? Ser que o sacerdote mais importante que o Senhor? Este erro deveria ser corrigido o mais depressa possvel, no sendo precisas para isso nenhumas reconstrues. O Senhor o ponto de referncia. Ele o Sol nascente da Histria. A cruz pode ser a da paixo,que presencia Jesus que por ns deixou transpassar seu lado, donde derramou sangue e gua eucaristia e batismo tal como pode ser a cruz triunfal, que reflete a ideia do regresso, guiando o nosso olhar para Ele. Pois sempre o mesmo Senhor Jesus Cristo, sempre o mesmo ontem, hoje e por toda a eternidade (Hb 13,8).