alice ainda mora aqui: narrativa juvenil contemporânea

14
31 Alice ainda mora aqui: narrativa juvenil contemporânea Alice Áurea Penteado Martha Em meio à incerteza e muitos tipos de medo, ameaçados pela perda, pela mudança e pelo brotar da dor dentro e fora, para a qual não se pode oferecer conforto, os leitores sabem pelo menos que há, aqui e acolá, uns poucos lugares seguros, tão reais quanto o papel e tão xos quanto a tinta, para nos conceder teto e comida em nossa passagem pelo bosque escuro e sem nome. Alberto Manguel Narrativa juvenil e identidade O mercado editorial brasileiro, no que se refere à publicação de narra- tivas para jovens, tem-se mostrado bastante produtivo tanto no quesito da quantidade quanto no que tange à qualidade dos textos. Escritores consa- grados e novos narradores dinamizam o campo da literatura destinada a jovens leitores como podemos observar, sem o estabelecimento de um qua- dro exaustivo, por pequeno rol de autores e obras. Ao lado de Aula de inglês (2006a), Sapato de salto (2006b) e Querida (2009), de Lygia Bojunga; Bicho solto (2005), de Ivan Sant´Anna; Ciumento de carteirinha (2006), de Moacyr Scliar; O barbeiro e o judeu da prestação contra o sargento da motocicleta, de Joel Runo dos Santos (2007); Mensagem para você (2008), de Ana Maria Machado; O olho de vidro de meu avô (2004), de Bartolomeu Campos Queirós, ressalta- mos novas vozes narrativas em: Eles não são anjos como eu (2004), de Márcia Kupstas; No longe dos gerais (2004), de Nélson Cruz; Lis no peito: um livro que pede perdão (2005), de Jorge Miguel Marinho; Pena de ganso (2005), de Nilma Lacerda; Heroísmo de Quixote (2005), de Paula Mastroberti; O dia em que Fe- lipe sumiu (2005), de Milu Leite; Alice no espelho (2005), de Laura Bergallo; O rapaz que não era de Liverpool (Edições SM, 2006); Meu pai não mora mais aqui (2008), ambos de Caio Riter; Hermes, o motoboy (2006), de Ilan Brenman e Fernando Vilela; O melhor time do mundo (2006), de Jorge Viveiros de Castro; Todos contra D@nte (2008); A distância das coisas (2008); O fazedor de velhos (2008), de Rodrigo Lacerda. Entretanto, em razão das dimensões deste tex- to, optamos pela leitura de Alice no espelho (2005), de Laura Bergallo e A maldição do olhar (2008), de Jorge Miguel Marinho. O enfoque pretendido neste artigo, a abordagem de questões relativas ao tema da identidade no corpus da literatura juvenil brasileira contempo-

Upload: luciana-alves-de-jesus

Post on 17-Aug-2015

217 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

Artigo

TRANSCRIPT

31Alice ainda mora aqui:narrativa juvenil contemporneaAlice urea Penteado MarthaEm meio incerteza e muitos tipos de medo, ameaados pela perda, pela mudana e pelo brotar da dor dentro e fora, para a qual no se pode oferecer conforto, os leitores sabem pelo menos que h, aqui e acol, uns poucos lugares seguros, to reais quanto o papel e to xos quanto a tinta, para nos conceder teto e comida em nossa passagem pelo bosque escuro e sem nome.Alberto ManguelNarrativa juvenil e identidadeO mercado editorial brasileiro, no que se refere publicao de narra-tivas para jovens, tem-se mostrado bastante produtivo tanto no quesito da quantidade quanto no que tange qualidade dos textos. Escritores consa-gradosenovosnarradoresdinamizamocampodaliteraturadestinadaa jovens leitores como podemos observar, sem o estabelecimento de um qua-dro exaustivo, por pequeno rol de autores e obras. Ao lado de Aula de ingls (2006a), Sapato de salto (2006b) e Querida (2009), de Lygia Bojunga; Bicho solto (2005), de Ivan SantAnna; Ciumento de carteirinha (2006), de Moacyr Scliar; O barbeiro e o judeu da prestao contra o sargento da motocicleta, de Joel Runo dosSantos(2007);Mensagemparavoc(2008),deAnaMariaMachado;O olhodevidrodemeuav(2004),deBartolomeuCamposQueirs,ressalta-mos novas vozes narrativas em: Eles no so anjos como eu (2004), de Mrcia Kupstas; No longe dos gerais (2004), de Nlson Cruz; Lis no peito: um livro que pede perdo (2005), de Jorge Miguel Marinho; Pena de ganso (2005), de Nilma Lacerda; Herosmo de Quixote (2005), de Paula Mastroberti; O dia em que Fe-lipe sumiu (2005), de Milu Leite; Alice no espelho (2005), de Laura Bergallo; O rapaz que no era de Liverpool (Edies SM, 2006); Meu pai no mora mais aqui (2008), ambos de Caio Riter;Hermes, o motoboy (2006), de Ilan Brenman e Fernando Vilela; O melhor time do mundo (2006), de Jorge Viveiros de Castro; TodoscontraD@nte(2008);Adistnciadascoisas(2008);Ofazedordevelhos (2008), de Rodrigo Lacerda. Entretanto, em razo das dimenses deste tex-to,optamospelaleituradeAlicenoespelho(2005),deLauraBergalloeA maldio do olhar (2008), de Jorge Miguel Marinho. O enfoque pretendido neste artigo, a abordagem de questes relativas ao tema da identidade no corpus da literatura juvenil brasileira contempo-32rnea,pedeoaclaramentodenoescomasquaisnosconfrontamosna compreenso das narrativas selecionadas identidade e alteridade, ju-ventude e simbologia do espelho , considerado este ltimo tpico em sua ntima conexo com os dois anteriores, uma vez que os textos nos ofe-recem tais vertentes de leitura.Noquesereferesquestessobreidentidades,entendemoshojeque so culturais e no se apresentam rgidas e imutveis, resultando de pro-cessostransitriosdeidenticao,e,comoarmaBoaventuradeSousa Santos, so identicaes em curso. Desse modo, as negociaes de sentido revelam-se necessrias mesmo para o reconhecimento de identidades apa-rentementermadas,comohomem,mulher,europeu,africano, latino-americano, jovem e criana. Alm disso, segundo ainda San-tos,aquestodaidentidade(...)semictciaeseminecessria.Para quemaformula,apresenta-sesemprecomoumaconecessria. Se a resposta obtida, o seu xito mede-se pela intensidade da cons-cincia de que a questo fora, desde o incio, uma necessidade ct-cia. , pois, crucial conhecer quem pergunta pela identidade, em que condies, contra quem, com que propsitos e com que resultados. (Santos, 1997, p. 135)Stuart Hall (2003, p. 7-22), tambm voltado ao estudo do tema, prope trs modalidades de sujeitos e, portanto, de identidades: do iluminismo, do sociolgico e do ps-moderno. O primeiro, segundo Hall, um sujeito cen-trado,estabilizado;osociolgicoforma-senaconunciacomosdemais sujeitos; o ps-moderno constitui-se pela mobilidade e instabilidade, aspec-tos que traduzem estgios em que se encontram personagens e leitores dos textos que pretendemos abordar.A concepo de identidade somente se completa com a cooperao de seuduploouavessoaalteridade,cujosignicadosefundamentano pressupostodeque,emsociedade,interagimosesomosinterdependen-tes de outros indivduos. Sob tal prisma, apenas mediante o contato com o outro, o eu individual pode existir. Essa existncia est, portanto, deter-minada pela viso do outro, pela diferena, complementada pelo olhar do prprioindivduo.Laplantine(2000),emsuasconsideraessobreocon-ceito, observa que a elaborao da experincia da alteridade permite que o indivduo reconhea que mesmo seus mais insignicantes traos compor-tamentais nada tm de natural e que seu eu individual torna-se pleno a partir do conhecimento do outro.Noqueserefererededesignicadosparaespelho,asimbologia desseobjetoindicaquetantopodenosconduzirmesmice,emrazoda Alice urea Penteado Martha 33repetio da imagem, como ao seu oposto, a alteridade. Neste caso, h um acrscimo da complexidade e, naturalmente, do fascnio pela imagem espe-cular. A funo do espelho no de reetir meramente a imagem, segun-do Chevalier e Gheerbrant (1988, p. 396); como reexo da alma do sujeito, podepropiciarsuatransformao,queserealizanaconguraoentreo sujeito contemplado e o espelho que o contempla.Uma das vertentes interessantes da signicao simblica do espelho a da sensibilidade, uma vez que sua propriedade elementar, a reproduo de imagens, percebida pela viso, inegavelmente, o elemento primordial da sensibilidade humana, como observa Pedro de Andrade: imagem est associada idealmente o conceito de beleza. O mito, e osmbolodeNarciso,damitologiagrega,demonstraapositivida-de, mas tambm a perigosidade, dessa caracterstica, especialmente se associada ao espelho. O espelho permite a autorreexo, ora das ideias ora do corpo do sujeito. Se o corpo ou as ideias possuem uma beleza intrnseca, essa vantagem pode transformar-se no seu inverso, avaidadeoualuxria.Narcisoconstituioparadigmadohomem que se deixa aprisionar pela sua prpria imagem, bela mas tambm assassina, ou mesmo suicidria. O espelho enquanto smbolo da vai-dade e da volpia surge igualmente em pinturas da Idade Mdia e da Renascena. (Andrade, 2000)Alm da sensiblidade, outro polo essencial da simbologia do espelho , segundoaindaAndrade,aconfrontaoinacabadoEucomoseuduplo, entre identidade e alteridade, par simblico extremamente complexo.A complexidade de semelhantes noes torna-se latente quando dirigi-mos o foco signicao de juventude, uma vez que o conceito cons-trudoapartirdemltiplosolhares,notadamentedascinciasmdicase humanas, do mesmo modo que as concepes de identidade e alteridade. Para o socilogo Groppo, na sociedade capitalista industrial, juventude podeserconsideradaumaetapamarcadapeladisciplinarizaoesocia-lizaodosujeito,mas,aomesmotempo,umdireitoconcebidopelamo-dernidade, pois os direitos do homem conguram o que se conhece como justia do imaginrio na sociedade democrtica: a juventude, suas res-pectivasatribuiesecuidadosseriamumdireitodetodososindivduos que se encontram neste perodo do desenvolvimento humano. Um direito que seria de todos, no importando a classe social (Groppo, 2000, p. 72). Entretanto,nasrelaessociaisconcretas,asociedadeformalmenteigua-litriadesigualecompe-sedeestruturaseestraticaessociaisbem comodeoutrasmodalidadesdediferenciaoqueimpedemarealizao do direito infncia e juventude. Na sociedade moderna, predomina o ca-Alice ainda mora aqui34rter de evoluo nos estgios pelos quais passa o indivduo, no existem cortes, mas continuidade em sua evoluo (id., p. 274), enquanto que, na tribal, a passagem de uma congurao social a outra marcada pelo rito de passagem, divisor entre um ciclo que se completa e outro iniciado. Desse modo, os ritos de iniciao procuram no construir um indivduo autno-mo, uma identidade individual ou uma vontade particular. Eles buscam a construo de uma identidade tribal (id., ibid.). Assimcomoadiscussodetaisconceitoscomplexaenopodemos esgot-la em poucas linhas, tambm a manifestao literria de tais assun-tos, considerados temas de fronteira, notadamente aqueles que tratam de etapas da evoluo humana, no tarefa fcil. Exige sensibilidade apurada dos narradores e/ou poetas para que no atentem contra a dignidade dos leitores,comaexploraodesentimentoseemoes,sombradamoral eseusressentimentos.precisofugirdelugarescomuns,trabalharalin-guagememtodassuasnuancesepossibilidadesdesentido,valorizando, entre outros, os recursos sonoros, semnticos e sintticos, para expressar o mundo em sua totalidade. Jogo especular e construo de identidadesDentre as vrias possibilidades de apresentar o processo de construo da identidade juvenil nas obras selecionadas, optamos por vericar como elementosfundamentaisdaestruturanarrativa,narrador/focalizadore personagens,podemserresponsabilizadospelatarefa,sempreemcon-sonnciacomosrecursoslingusticosempregados.Asproposiessobre esseselementosdanarrativamostram-seimportantesumavezque,por seustraos,podemosobservarograudeproximidadeestabelecidocom os leitores e, a partir da, acompanhar a instaurao do processo de iden-ticao entre jovens leitores e os seres do mundo ccional, processo que lhesoferece,inclusive,apossibilidadedereetirsobresuacondioede elaborar suas imagens enquanto seres-no-mundo.Assim, considerando o pressuposto de que a literatura, como uma das formas de conscincia social, reete, transgura e, ao mesmo tempo, pro-pe discusses sobre o mundo e sobre experincias humanas, pretendemos observar o processo de reexo especular empreendido pelas personagens adolescentes, responsvel pelo nonsense na construo do mundo narra-do, a partir da ntima conexo com Alice atravs do espelho, de Lewis Carroll (2002), criao que tem suscitado releituras por todo mundo ocidental, des-de simples aluses a referncias explcitas e intertextos mais renados. No caso da Literatura Brasileira, mais precisamente aquela destinada infncia Alice urea Penteado Martha 35e juventude, desde que Monteiro Lobato relatou a visita que Alice do pas dasmaravilhasfezaoStiodoPicapauAmarelo,ameninatemsidoob-servada com frequncia em nossa literatura, em formas e gneros bastante diversicados. O processo de reexo especular ser observado em Alice no espelho, de Laura Bergallo, e A maldio do olhar, de Jorge Miguel Marinho, narrativas que relatam o desabrochar sentimental, a aprendizagem huma-na dos protagonistas, jovens que buscam o conhecimento de si mesmos e dos outros, participando gradativamente da aventura da existncia.O livro de Laura Bergallo recebeu o Prmio Jabuti em 2007 na categoria LiteraturaJuvenil,premiaoconcedidapelaCmaraBrasileiradoLivro (CBL), e integra a Coleo Muriqui (SM), cujas histrias tratam de questes cotidianas para o jovem, e tem ttulos publicados como A lha do rei, de Tel-ma Guimares Castro Andrade, No bem assim, de Mrcia Leite, O tesouro de Ana, de Mirna Pinsky, e O tempo das surpresas, de Caio Riter. J o autor de A maldio do olhar recebeu, entre muitos outros, tambm o Jabuti, em 2006, com Lis no peito: um livro que pede perdo (Biruta).Asobrasempautaapresentamprojetosgrcoseeditoriaisbastante atraentes, direcionados ao pblico jovem. As ilustraes de Alice no espelho, feitas por Edith Derdyk, so pequenas, em branco e preto, e contm, como o texto verbal, inmeras referncias Alice de Carroll. O livro constitudo por vrios paratextos que conrmam os objetivos da Coleo: no Eplogo, esto o depoimento de uma jovem em tratamento por problemas com buli-mia e anorexia, informaes sobre a doena e textos que enfocam questes relativas ditadura da esttica, entre outros. O projeto grco de A maldio do olhar, por sua vez, com ilustraes de Gustavo Piqueira e Samia Jacintho, investe em formas e em cores, especialmente lils e preto, no fundo branco da pgina. Ora so folhas brancas com pequenas bolas lilases, ora pginas em lils, fundo para duas garrafas negras; outras vezes, grades em formas e dimenses variadas compem o fundo branco ou lils do papel. No h qualquer prefcio ou texto informativo; nas orelhas do livro, apenas alguns dados sobre o escritor e os ilustradores.Em Alice no espelho, Bergallo enfoca a ditadura a modelos estticos a que se submetem as adolescentes, que custa de sacrifcios de toda ordem se sentem obrigadas ao enquadramento a padres fsicos e comportamentais, consideradosadequadosparaaintegraoaomeiosocial.Alice,aperso-nagem, vtima de transtornos alimentares bulimia gerados pela insa-tisfaocomaprpriaimagemepelodesejodecorresponderaopadro preestabelecido de beleza, sem a ousadia da diferena. Com o agravamento dos sintomas, a anorexia inevitvel.Almdottulo,outrasrefernciasremetemosleitoresnarrativade Alice ainda mora aqui36Carroll e so, de antemo, esclarecidas pela voz narradora, como podemos ler na epgrafe do captulo inicial, composta pelos versos que abrem a his-tria primeira:Alice ainda se lembra do pai recitando esses versos, que cam bem no comeo do livro Aliceatravsdoespelho.Parasersincera,nosei se ela se lembra das palavras exatas (ou mais ou menos exatas) ou se gostaria de lembrar. (Bergallo, 2005, p. 9) Entretanto, no h necessidade de estabelecermos relaes pontuais en-tre os elementos que estruturam a narrativa de Carroll e os textos contem-porneos citados, para compreendermos suas ligaes de sentido. Grande parte das conexes que outras narrativas estabelecem com Alice atravs do espelho no se refere exatamente obra e sim a um conjunto amplo de livros que determinam a cultura em dado momento, o que a congura como bi-blioteca coletiva, denominao de Pierre Bayard: a biblioteca coletiva] que verdadeiramente conta, pois seu dom-nioqueestemjogonosdiscursosapropsitodelivros.Masesse domnio um domnio de relaes, no deste ou daquele elemento isolado,eseadaptaperfeitamenteignornciadegrandepartedo conjunto. (Bayard, 2007, p. 32)A narrativa, dividida em duas partes, apresenta-nos Alice, uma adoles-cente de quinze anos que enfrenta cotidianamente problemas semelhantes aos de qualquer jovem. Ficamos sabendo que a menina recebeu esse nome em homenagem a Alice do pas das maravilhas, a grande paixo do pai, agora ausente:Mas no tem mais histrias de Alice, risadas altas, a barba crescida do pai roando seu rosto num carinho meio spero. Alice procura es-quecer. Mas tambm procura lembrar. Lembrar-se do pai car mais umpoucojuntodele.MastambmfazAliceviverdenovoaquele abandono,quenoparecemuitojustocomela.(Bergallo,2005,p. 11) O relacionamento com a me, sempre ocupada em malhar na academia, no ajuda a garota a superar a lacuna criada pelo afastamento paterno: Em algumlugardesuahistria,Aliceprocuraumaculpaqueexpliqueessa ausncia. E j no acredita no pas das maravilhas (id., p. 12). Aps breve ash back narrativo, vamos encontrar Alice com 15 anos e h muito tempo sem notcias do pai, que ia se tornando to irreal quanto um coelho que fala (id., p.13). Temos a o conito delineado no que se refere situao familiar: a au-sncia do pai, apontada como traio pela me e pela av, que o criticam o Alice urea Penteado Martha 37tempo todo. Quanto s aspiraes e desejos mais ntimos, so exatamente osmesmosdeumageraoencantadapormodelosmagrrimas:Felici-dade,oquemesmo?Serlinda,jovememagra,eisoque(id.,p.20). Seafelicidadeestnaleveza,precisobusc-laatodocusto;osregimes alimentares tornam-se frequentes e crescem as desconanas em casa, prin-cipalmente por parte da av, sempre mais atenta aos problemas da garota. No est fcil driblar a vigilncia: Mas e o jantar, como que vai ser? No est disposta a sair da dieta que est fazendo, mas a av no pode, de jeito nenhum, saber que ela est de regime outra vez (id., p. 21).AsangstiasdeAlicenotomamformaparaameeparaaav,al-mas diferentes. Apenas o espelho, espao de convergncia para o interior, reeteosofrimentodagarota:Dumaolhadinhanoespelhoefazuma careta horrvel: est gorda, gorda, gorda! (id., p. 26). A crise de identidade ganha vulto na adolescncia e a imagem que Alice v no espelho a de seu desequilbrio emocional. Obrigada a comer, resolve o problema no banhei-ro com a ajuda do cabo da escova de dentes, mas a av est atenta: Acho que est doente. J reparou que ela vai sempre ao banheiro logo depois das refeies?Eaindacaumtempoldentro,comaquelesomligadoaos berros? (id., p. 28).Asegundapartedanarrativainicia-secomodesmaiodeAlice,logo apsumasessodecomilanadesenfreada.Apartirdeento,omundo narrado construdo pelo processo do nonsense, marcado pelo jogo de sentidopropostopelaambiguidadeentreidentidadeealteridade.Como a Alice de Carroll, a personagem transporta-se para o mundo do espelho, ondevreetidaaimagemqueseuolhardoenteelaboradesimesma,a gorda Ecila, seu avesso:Levanta do cho e ca em p na frente do espelho emoldurado. Nele v uma garota gordona olhando para ela feito pateta (quem seria?). Atrs dela, um quarto igualzinho, s que com tudo em posio inver-tida. (Bergallo, 2005, p. 52)Nesseespaoespecular,reexodeseuinterioremcrise,cujoacesso permitido pelo estado de coma, pelo choque anorxico, Alice depara com elementos e questes s aparentemente diferentes do mundo alm do espe-lho, porque fatos e pessoas so projees de seu ntimo: a nova amiga, Ecila, tambm possui fortes laos com o pai ausente; os habitantes desse lado so modelos de beleza desejados pela garota, como o corpo de Mirna Lee e o garoto Tiago, por quem pensa estar apaixonada.Segarotagordaooutro,oladoopostodeAlice,justamenteapar-tir da perspectiva da alteridade que a menina poder reconhecer-se como individualidade.Inicia-se,assim,pelamodeEcila,oprocessoderee-xo, que desencadeia a retomada da conscincia e o reconhecimento de sua Alice ainda mora aqui38identidade.Emboracercadadamesmice,demodelosestticossonhados por Alice, Ecila aprecia a diferena, como seu pai, leitor de Alice no pas das maravilhas, e no quer fazer a transformao, processo que a tornar linda ejovemparasempre,comoosprottiposdeindivduosdisposiodos habitantes do mundo especular, cujo verdadeiro objetivo a conformao:oqueimportamesmoquetodomundoqueigual.Noquerem gente diferente, no querem gente que pense diferente.(...) Alteram os nossos genes fala a gorda para Alice, com expresso horrorizada Viramos uma espcie de... gente transgnica. E a vio-lncia no para por a: cortam, repuxam, sugam e costuram a gente toda, at car igual ao modelo escolhido. (id., p. 76)ApsacirurgiaforadadeEcila,aonotarqueaex-gorda,encantada com a prpria imagem e reconhecendo que ser bonita como os modelos disposio e no envelhecer tudo de bom, Alice resolve entregar-lhe o exemplar de Alice no pas das maravilhas, aita por imaginar que a leitura possa causar em Ecila o mesmo efeito que causou no pai: mudar a cabea (Bergallo,2005,p.146).Entretanto,comoaoutraoseuavesso,imagem que faz de si mesma, a leitura do livro se torna o passaporte para o retorno conscincia e o reencontro com o pai. A importncia da resposta obtida por Alice nesse processo de busca da identidade no est no carter armativo da narrativa, mas na compreenso de que apenas uma etapa da evoluo foi vencida e que a personagem, como todo ser humano, deve passar por muitas outras: Quer dizer... tem uma coisa que eu sei sim... O que ? Sei que estou precisando de ajuda. Quero parar de sentir raiva do meu corpo, mas no sei como. Eu no controlo a coisa, voc entende? E no quero morrer disso. (id., p. 152)Amaldiodoolhar,deJorgeMiguelMarinho,relataahistriadoen-contro marcado por intensa sensualidade entre Alexandre, o Al, e Alice, agarotadopasdasmaravilhas,presanoespelhodoguarda-roupado quarto do jovem vampiro, enquanto ao redor deles ocorre o extermnio das criaturasmarcadaspeladiferena.Nesseclimademedo,Alvivecomo pai, Jos Rgio, doente e meio corcunda de tanto colar estampilha, bater carimbo,grampearpilhasepilhasdepapis(Marinho,2008,p.15),ea madrasta Elza, mais jovem e muito bonita, cujo rosto sofrido tem olheiras de tanto trabalhar as noites num motel de estrada vendendo preservativos, cigarros e bombons (id., ibid.).Alice urea Penteado Martha 39AsinopsedaeditoraapresentaanarrativadeJorgeMiguelMarinho como uma histria de amor impossvel e muito bem conduzida por uma sucesso de crimes to surpreendente que a prxima vtima pode ser at o prprio leitor. Entretanto, o estilo lrico do autor, o embricamento de ele-mentos do real e do maravilhoso na estrutura do narrado, como a presena de Alice, presa no espelho por anos e anos, e da famlia de vampiros, apesar das diferenas, to semelhante s outras da cidade grande, possibilitam ao leitor outras leituras. possvel encontrarmos caminhos diferenciados no emaranhado bosque do mundo narrado e nos deixarmos levar pela vigoro-sa fora da narrativa (Manguel, 2000, p. 20).Desse modo, para alm de uma histria de suspense ou de crimes sur-preendentes, como anuncia o pequeno texto veiculado pela editora, A mal-dio do olhar pode ser vista como a busca e o reconhecimento da identidade pelojovemvampiro,apartirdeumainstigante,sensualequestionadora viagem interior, pois os conitos ocorrem com muito mais fora e evidncia no ntimo da personagem; a viagem especular, empreendida por Al e seu outro,Alice,revelamaiorviolnciapsicolgicaqueoscrimescometidos contraosvampiros;osassassinatos,porsuavez,podemaindasignicar outras perdas que no simplesmente a morte das vtimas.Em estreita sintonia com Chevalier e Gheerbrant (1988, p. 936) no que se refere simbologia do vampiro, podemos conceber a presena dessa -gura na estrutura da narrativa como uma grande metfora do processo de reconhecimentodoindivduosobresimesmo.Comoaimagemsugereo insacivel apetite de viver, uma forma de autodestruio, enquanto durar osentimentodeinadaptaoasimesmo,aosoutroseaomeiosocial,o vampiroexistir;quando,aocontrrio,estiverplenamentesatisfeito,as-sumindosuasresponsabilidades,desaparecer,comoacontececomAle Elza, ao contrrio do pai que, cada vez mais frustrado, morre. Esses seres fantsticos, como Al, o pai e a madrasta, traduzem signicao mais am-pla no mundo narrado e so entendidos como indivduos com diculdades de relacionamento na sociedade e no meio familiar. Enquanto permanece insatisfeito consigo mesmo e deriva em relao aoconhecimentodesuaidentidade,Alnotemaimagemreetidano espelho,comoasseguraamitologiadosvampiros.Somentenomomento em que o lete da tinta vermelha, com a qual o jovem escreve, escorre e se encontra com o lquido transparente de Alice, que escapa do guarda-roupa, que ele se reconhece no outro, j que se v na imagem de Alice:Colou o rosto a ele buscando uma identidade muito pouco familiar. Em seguida recuou dois passos para se ver melhor. Estranhou a falta de barba, o tamanho dos cabelos e sobretudo os pequenos seios de Alice que provocavam nele um desejo irresistvel de se tocar. (...).Alice ainda mora aqui40Saiu imediatamente do quarto supondo que fugia da imagem de seu retrato mais ntimo ou de seu corpo astral. (Marinho, 2008, p. 62) A construo perspectivstica, responsvel por muitas caminhadas dos leitores por entre as dobras do texto, permite que, alm da tica do narra-dor, possamos dispor, de igual modo nesta narrativa, de outras perspecti-vas que nos conduzam ao conito interior de Al. Uma delas a do prprio jovem que registra, no dirio, dvidas e angstias quanto a sua identidade:Hoje mesmo os jornais deram que mais um vampiro apareceu morto e esquartejado na Estao da Luz. Deve ser por isso tudo que eu gos-to tanto do lme do Nosferatu. como se ele fosse eu. Ao contrrio, claro. Ele sofre de um jeito, eu peno de outro. No meu caso, eu tenho dois caninos no ponto e nunca sei o que devo morder.No sei direito quem sou eu. (id., p. 14)Ao procurar sua imagem no espelho, no a v, pois, insatisfeito e incom-pleto,ovampironoareete;somenteoencontrocomooutro,projeo deseusquestionamentosntimos,permite-lhevisualizarseustraos,em estreita ligao com a forma feminina reetida pelo espelho:Al vislumbrou seu rosto nos olhos de Alice, agora por trs dos cu-los. E ela, quase sem foras, se viu cadavrica no olhar do vampiro que se iluminou ainda mais. Os dois se estranharam muito. Ele, por-que desconou da sua prpria imagem, diminuda e assustada, den-tro de um rosto que no era o seu. Ela, porque no se olhava havia muito tempo e mal reconhecia a antiga menina curiosa na sionomia meio dbil de uma garota to doente, com cara de mulher. (Marinho, 2008, p. 7)Osleitorestmtambmdisposiooolhardaspessoasquecercam Al, que notam a perplexidade causada pelo esforo em busca da armao de sua identidade: Para espanto da famlia e de uma faxineira que limpava a casa duas vezes por ms, ele deu de jogar uma cabeleira invisvel por trs dos ombros e fechar a camisa at o pescoo, igual a uma virgem cheia de pudor (id., p. 62). O pai, convicto de que a atitude diferente do rapaz era provenientedoexcessodeleituras,sepsadestruiroslivrosdolho (id., p. 63). Perspectividade e interaoO processo de reexo empreendido tanto por Alice como por Al, per-sonagensdasnarrativasenfocadas,ocorreapartirdaperspectividadein-terna do texto, com o ponto de vista em movimento, um dos atos de apreen-Alice urea Penteado Martha 41so do texto elencados por Wolfang Iser (1999), ou seja, vises diferencia-dasquetematizamdemodosensvelquestesrelativasidentidadees apreenses de emoes dos jovens no mundo narrado. Omododenarrar,oembatedeperspectivasdiferentes,aexperincia de acontecimentos ambguos, vividos pelos protagonistas, como projees de suas conscincias, conrmam a catarse, uma vez que a vivncia de fatos avessos os libera da submisso a modelos a que foram submetidos em seu meio social e familiar. Os leitores, a partir dessa dinmica, procuram enten-der os meandros do narrado, acompanhando perspectivas dos narradores, daspersonagensprincipaisesecundrias.NocasodeAlicenoespelho,os fatos so apresentados a partir da tica da prpria Alice e de personagens como a me, o pai, Ecila e sua famlia; em A maldio do olhar, acompanha-mos os acontecimentos pelos olhares de Al e de Alice, bem como das de-mais personagens, principalmente Jos Rgio e Elza.Ojogoempreendidopelaperspectividade,reveladordaevoluodo processo de construo da identidade das personagens Alice e Al, mostra-se fundamental para a interao entre leitores e textos. A reao provocada pelas diferentes perspectivas pode ser considerada, a partir das categorias de recepo (Jauss, 1974), elemento fundamental para aqueles que se preo-cupam com as relaes entre o texto literrio e seus potenciais receptores, neste caso, jovens leitores. A atuao das personagens provoca duas moda-lidades de identicao, principalmente: a catrtica, prpria da tragdia, e a irnica, que se manifesta com reaes antagnicas do leitor, de apro-ximao e de rejeio. Tanto a reexo nal da personagem de Bergallo, observada no excerto transcrito anteriormente, como a atitude de Al de quebrar todos os espe-lhosdopas,comoordenaAlice(Marinho,2008,p.117),paraquetodos possam observar-se de modo diferenciado, podem exemplicar o cumpri-mento da funo catrtica, referida por Jauss. No que se refere ao resul-tadodaaodeAl,comoeleeAlicecolaramnovamenteosestilhaos dosespelhosemtodasaspassagensvisveisdesteoutropas,forada priso especular, as pessoas, por onde passassem, eram obrigadas a se ver, a assumir suas identidades. Ao se dissiparem as angstias que assaltam as personagens, a partir da reexo sobre suas experincias, os leitores podem reconhecer as emoes que experimentam no cotidiano das relaes huma-nas, promovendo, ao mesmo tempo, a liberao de temores que os assaltam e angustiam:E no viam o prprio rosto, at ento desconhecido. Pela disposio dosespelhos,enxergavamocorpo,aespessuradanuca,ossinais mais agradveis e tambm os aleijes. Muitos fugiram da cidade, al-Alice ainda mora aqui42gunsmorreramemcasaenasruas,amaiorpartepermaneceuali, feliz ou infeliz. (id., ibid.)No caso da funo irnica, contraditria por natureza, a identicao ocorre, justamente, pelo reconhecimento de que as dvidas e angstias das personagenssocomunsaosleitores;odistanciamentopermitequeeles, tambm homens partidos, marcados pela mobilidade e instabilidade do su-jeito ps-moderno, possam reetir sobre sua prpria situao, rejeitando-a ou no.Em sntese, a partir dos pressupostos de Iser, observamos que as prin-cipaisperspectivasnotextodeBergalloedeMarinhonarradoreper-sonagem so perspectivizadas, congurando-se o processo de mltiplos olhares,quepromoverelaesdiferentesentretextoserealidade,e,em consequncia, nenhuma delas pode representar integralmente o objeto es-ttico.Estesomenteseconstituigraassrelaesestabelecidasentreas diferentes perspectivas. O que parece fundamental na construo narrativa de Alice no espelho e A maldio do olhar o modo como o narrador instaura, naestruturaeorganizaodomundonarrado,ojogoentreidentidadee alteridade, pois, a partir dessa estratgia, atitudes e sentimentos dos prota-gonistasedasdemaispersonagens,notadamente,as gurasdeAlice,em Marinho, e de Ecila, em Bergallo, enredam-se e, constituindo a constelao de perspectivas da narrativa, possibilitam a emerso do objeto esttico, que surge,comopropeIser,dainteraodessasperspectivasinternasdo texto; ele um objeto esttico medida que o leitor tem de produzi-lo por meio da orientao que a constelao dos diversos pontos de vista oferece (Iser, 1999, p. 180). Referncias bibliogrcasANDRADE, Pedro (2000). O espelho: objeto reetor do sujeito da reexo. In: Discursos e prticas alqumicas. Colquio Internacional. Lisboa. v. 2.BAYARD, Pierre (2007). Como falar dos livros que no lemos? Trad. Rejane Jano-witzer. Rio de Janeiro: Objetiva.BERGALLO, Laura (2005). Alice no espelho. So Paulo: Edies SM.BOJUNGA, Lygia (2006a). Aula de ingls. Rio de Janeiro: Casa de Lygia Bojunga.________ (2006b). Sapato de salto. Rio de Janeiro: Casa de Lygia Bojunga.________ (2009). Querida. Rio de Janeiro: Casa de Lygia Bojunga.BRENMAN,IlaneVILELA,Fernando(2006).Hermes,omotoboy.SoPaulo: Cia das Letras.CARROLL, Lewis (2002). Alice: edio comentada. Aventuras de Alice no Pas das Maravilhas & Atravs do Espelho. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar.Alice urea Penteado Martha 43CASTRO, Jorge Viveiros de (2006). O melhor time do mundo. So Paulo: Co-sac Naify.CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain (1988). Dicionrio de smbolos. Trad. Vera da Costa e Silva, Raul de S Barbosa, Angela Melim, Lcia Melim. Rio de Janeiro: Jos Olympio.GROPPO, Lus Antonio (2000). Juventude: ensaios sobre Sociologia e Histria das juventudes modernas. Rio de Janeiro: DIFEL.HALL, Stuart (2003). A identidade cultural na ps-modernidade. Trad. Tomaz Ta-deu da Silva e Guaracira Lopes Louro. 7. ed. Rio de Janeiro: DP&A.ISER, Wolfang (1999). O ato da leitura. Trad. Johannes Kretschmer. So Paulo: Editora 34. v. 2.JAUSS, Hans Robert (1974). Levels of identication of hero and audience. New literary history. Charlotte Ville: Virgnia. v. 5. n. 2.KUPSTAS, Mrcia (2004). Eles no so anjos como eu. So Paulo: Moderna.LACERDA, Nilma (2005). Pena de ganso. So Paulo: DCL.LACERDA, Rodrigo (2008a). Todos contra D@ante. So Paulo: Cia das Letras.________ (2008b). A distncia das coisas. So Paulo: SM.________ (2008c). O fazedor de velhos. So Paulo: Cosac Naify.LAPLANTINE, Franois (2000). Aprender antropologia. So Paulo: Brasiliense.LEITE, Milu (2005). O dia em que Felipe sumiu. So Paulo: Cosac Naify.MACHADO, Ana Maria (2008). Mensagem para voc. So Paulo: tica.MANGUEL, Alberto (2000). No bosque do espelho. Trad. Pedro Maia Soares. So Paulo: Companhia das Letras.MARINHO, Jorge M. (2005). Lis no peito: um livro que pede perdo. So Paulo: Biruta. ________ (2008). A maldio do olhar. So Paulo: Biruta.MASTROBERTI, Paula (2005). Herosmo de Quixote. Rio de Janeiro: Rocco.NELSON, Cruz (2004). No longe dos gerais. So Paulo: Cosac Naify.QUEIRS, Bartolomeu Campos (2004). O olho de vidro de meu av. So Paulo: Moderna.RITER, Caio (2006). O rapaz que no era de Liverpool. So Paulo: SM.________ (2008). Meu pai no mora mais aqui. So Paulo: Biruta. SANTANNA, Ivan (2005). Bicho solto. Rio de Janeiro: Objetiva.SANTOS, Boaventura Sousa (1997). Pela mo de Alice: o social e o poltico na ps-modernidade. 4. ed. So Paulo: Cortez.SANTOS, Joel Runo (2007). O barbeiro e o judeu da prestao contra o sargento da motocicleta. So Paulo: Moderna.SCLIAR, Moacyr (2006). Ciumento de carteirinha. So Paulo: tica.Recebido em janeiro de 2010.Aprovado para publicao em maio de 2010.Alice ainda mora aqui44resumo/abstractAlice ainda mora aqui: narrativa juvenil contemporneaAlice urea Penteado MarthaAcompreensodequeresidenapossibilidadedereconhecernostextosque lemosaquiloqueexperimentamosnarealidade,expressar,traduziredarforma semoeseaossentimentosquenosatormentamoualegram,leva-nos abordagem do tema da identidade, que conduz a escolhas, relacionamentos, enm, a situaes limites, que congurem, no plano ccional, etapas da evoluo vividas pelo ser humano e que possam traduzir, ao mesmo tempo, modos de preservao daidentidadeculturaledeparticipaodoprocessodeuniversalizao.Tais aspectosserofocalizadosemnarrativasdaliteraturajuvenilcontempornea brasileira, Alice no espelho, de Laura Bergallo, e A maldio do olhar, de Jorge Miguel Marinho, considerando, especialmente, a diversidade das vises oferecidas pelas perspectivas internas dos textos, cuja interao possibilita a emergncia do objeto esttico, na perspectiva de Wolfgang Iser. Palavras-chave: literatura brasileira, narrativa juvenil, identidade cultural, Laura Bergallo, Jorge Miguel Marinho Alice still lives here: contemporary juvenile narrativeAlice urea Penteado MarthaThe understanding that lies in the possibility of recognizing in the texts we read what we experience in real life, express, translate and nourish our emotions and feelingsofpainorhappiness,makingusapproachtheidentityofthesubject-matterleadingustowardschoices,relationshipsandextremesituations.It typies on the ction plan, evolution stages experienced by humans, and which maytranslate,atthesametime,waysofpreservingtheculturalidentityand participateintheprocessofuniversalization.Suchaspectsshallbeemphasized injuvenilenarrativesselectedfromthecontemporaryBrazilianliterature,such asLauraBergallosAlicenoespelho[AliceintheMirror]andJorgeMiguel MarinhosAmaldiodoolhar[TheCurseoftheGaze].This,ifwemainly consider the diversity of views offered by the internal perspective of the texts, the interaction of which allows the aesthetic object to emerge, according to Wolfgang Iser.Keywords:brazilianliterature,juvenilenarrative,culturalidentity,Laura Bergallo, Jorge Miguel MarinhoAlice urea Penteado Martha Alice ainda mora aqui: narrativa juvenil contempornea. Estudos de Literatura Brasileira Contempornea, n. 36. Braslia, julho-dezembro de 2010, p. 31-44.Alice urea Penteado Martha