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RELACIONAMENTO INTERPESSOAL Olhares Diversos AGNALDO GARCIA (ORG.) VITÓRIA - 2005

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Page 1: Agnaldo Garcia Livro Relacionamento Interpessoal Olhares Diversos

RELACIONAMENTOINTERPESSOAL

Olhares Diversos

AGNALDO GARCIA(ORG.)

VITÓRIA - 2005

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CAPA e EDITORAÇÃO ELETRÔNICAEdson Maltez Heringer

[email protected] | 27 8113-1826

REVISÃOO autor

IMPRESSÃOGM Gráfica & Editora

[email protected] | 27 3323-2900

Relacionamento interpessoal - olhares diversos / Agnaldo Garcia (org.). –Vitória : UFES, Programa de Pós-Graduação em Psicologia ; Vitória- ES, 2005.

116 p. : 21cm

Inclui bibliografia.ISBN -

1. Relacionamento Interpessoal. 2. Psicologia cognitiva. 3. Psicologiaeducacional. I. Garcia, Agnaldo.

CDU 149.922

1ª Edição – 2005

É proibida a reprodução total ou parcial desta publicação, para qualquer finalidade, sem autorização porescrito dos editores. Reservados todos os direitos de publicação em língua portuguesa à UFES e Unilinhares.

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)(Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, RJ, Brasil)

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SUMÁRIO

Apresentação .................................................................................. 5

1. Relacionamento InterpessoalUma Área de Investigação ......................................................... 7Agnaldo Garcia

2. Relacionamento e BiologiaUma abordagem evolucionista das relaçõespais-filhos e padrastos-enteados .............................................. 29Rosana Suemi Tokumaru e Margareth Pereira Bergamin

3. Relacionamento e AntropologiaAmizade – Tão perto, tão longe .............................................. 41Geovanna Tabachi Silva

4. Relacionamento e AdministraçãoA confiança como elemento das relaçõesinterpessoais no ambiente organizacional ............................... 51Marilene Olivier

5. Relacionamento e MedicinaRelacionamento Interpessoal e Saúde - Avanços recentesnos estudos sobre o relacionamento médico-paciente ............. 73Agnaldo Garcia

6. A Amizade da Infância à Terceira IdadeOlhares Diversos ..................................................................... 93Isis Fiorio Albertassi, Lorena Queiroz Merizio,Maria Tereza Bragança Boreli,Rodrigo dos Santos Scarabelli e Agnaldo Garcia

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APRESENTAÇÃO

A realização do Mini Congresso da International Association for Relati-onship Research (Associação Internacional para a Pesquisa do Relaciona-mento), em Vitória, no ano de 2005, representou um marco histórico para apesquisa sobre o relacionamento interpessoal em nosso país. Este livro, quetraz textos de participantes do evento, mostra um pouco da riqueza do tema,quanto à diversidade de áreas que lidam com relações interpessoais.

O objetivo deste livro é apresentar a natureza interdisciplinar das pes-quisas na área, as diferentes perspectivas ou os modos diversos de olharpara as relações entre as pessoas. Os capítulos procuram mostrar a contri-buição de várias disciplinas, que se somam para a compreensão das relaçõesinterpessoais. O primeiro capítulo apresenta um panorama da área de estu-dos sobre relacionamento interpessoal, de acordo com as principais publi-cações seriadas (periódicos especializados) da própria sociedade internaci-onal (IARR). Neste capítulo, Garcia procura organizar, do ponto de vistateórico, os tipos de relacionamento mais estudados, os processos investiga-dos e o seu contexto. Representa, assim, uma amostra da pesquisa sobrerelacionamento interpessoal no sentido mais restrito. A contribuição das ci-ências naturais e sociais é abordada em dois capítulos. Em um deles, Toku-maru e Bergamin revelam como as ciências biológicas têm influenciado apesquisa sobre o relacionamento, discutindo a abordagem evolucionista dasrelações entre pais e filhos e entre padrastos e enteados. No capítulo seguin-te, Tabachi aborda o relacionamento interpessoal, particularmente as rela-ções de amizade, do ponto de vista da Antropologia. Os dois capítulos se-guintes mostram como as ciências sociais aplicadas e as ciências da saúde

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lidam com aspectos desse amplo campo de investigações. Olivier apresentauma contribuição do ponto de vista da administração, discutindo a confian-ça como elemento das relações interpessoais no ambiente organizacional.Em relação à área da saúde, Garcia discute os avanços recentes na pesquisasobre o relacionamento entre médico e paciente. No último capítulo, Alber-tassi, Merizio, Boreli, Scarabelli e Garcia apresentam uma síntese de dadosde pesquisas sobre a amizade na infância e na terceira idade, realizadas noNúcleo Interdisciplinar para o Estudo do Relacionamento Interpessoal, daUFES.

Esperamos que este livro, além de informar, também desperte o interes-se de estudantes e profissionais de diferentes áreas, como Psicologia, Ciên-cias Sociais, Biologia, Administração, Medicina, Enfermagem, entre outras,para as relações interpessoais.

Agnaldo Garcia

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1RELACIONAMENTO INTERPESSOAL:

UMA ÁREA DE INVESTIGAÇÃO

Agnaldo Garcia

A pesquisa sobre relacionamento interpessoal apresentou um desen-volvimento expressivo nas últimas três décadas, resultado da contribuiçãode autores de diferentes disciplinas e orientações teóricas. Mesmo entreseus precursores, esta diversidade esteve presente, como é o caso de HarrySullivan (psiquiatra) e Fritz Heider (psicólogo da Gestalt), entre outros.Não obstante os avanços da área, seu vasto campo de estudo ainda apre-senta lacunas importantes, do ponto de vista empírico e teórico. De modogeral, a área está em franco desenvolvimento, ainda que este não seja ho-mogêneo, nem do ponto de vista conceitual, nem do ponto de vista geo-gráfico. Alguns temas recebem uma maior atenção e grande parte das pes-quisas se concentra na América do Norte e Europa.

Dois autores se destacam na história mais recente da ciência do relaci-onamento interpessoal: Steve Duck e Robert Hinde. Cada um contribuiucom a área de uma maneira distinta. Robert Hinde escreveu três livros denatureza teórica que contribuíram para a organização da área (especial-mente Hinde, 1997). Steve Duck, além de uma vasta produção escrita so-bre o tema, ainda esteve à frente da organização de sociedades e da publi-cação de periódicos científicos da área. Historicamente, Steve Duck teveuma participação importante na organização da International Society forthe Study of Personal Relationships (ISSPR) e do primeiro periódico es-pecializado em relacionamento interpessoal, o Journal of Personal and

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

Social Relationships. Em 2002, a ISSPR fundiu-se com outra sociedadeinternacional dando origem à International Association for RelationshipResearch (IARR) que, hoje, representa a maior sociedade científica inter-nacional sobre o tema, responsável pela publicação de dois importantesperiódicos. Este livro também representa um produto da atividade da IARR,uma vez que reúne textos de autores brasileiros que participaram do pri-meiro congresso oficial da sociedade na América do Sul, realizado emVitória, em 2005.

As possibilidades de pesquisa sobre o relacionamento interpessoalsão inúmeras. Este capítulo procura apresentar, ainda que de forma es-quemática, algumas tendências da literatura recente desta área de inves-tigação, quanto aos temas e conceitos investigados. O presente esboçose baseia em aproximadamente 100 artigos publicados nos dois princi-pais periódicos internacionais, específicos sobre relacionamento inter-pessoal, o Journal of Social and Personal Relationships (2004) e a Per-sonal Relationships (2003 e 2004), ambos publicados pela IARR.

A partir de um levantamento inicial do material bibliográfico, forampropostas algumas categorias de análise. Os artigos foram reunidos emquatro grupos quanto ao tipo ou natureza do relacionamento estudado (re-lacionamentos em geral, românticos, familiares e de amizade). Poucos tex-tos tratavam de outras formas de relacionamento, como o com vizinhos(Thomese, van Tilburg & Knipscheer, 2003) ou com personagens favori-tos da televisão (Cohen, 2004). Dentro de cada um destes grupos de estu-dos, foram destacados três aspectos: as propriedades dos participantes, asdimensões do relacionamento e o contexto. Ainda podem ser menciona-dos alguns trabalhos sobre metodologia (Hess, 2003; Mills, Clark, Ford &Johnson, 2004), não discutidos neste capítulo. Este pequeno roteiro oumapa dos estudos sobre o relacionamento interpessoal visa não apenasapresentar um panorama dos estudos da área, mas também incentivar no-vos pesquisadores para que venham a se interessar e contribuir com inves-tigações sobre este tema fascinante.

1. Relacionamentos em Geral

Um primeiro aspecto que chama a atenção no conjunto das referênciasselecionadas é o nível de especificidade a que se referem. Enquanto umgrupo de trabalhos limita-se a discutir algum aspecto de um determinadotipo de relacionamento (romântico, familiar e amizade, especificamente),outros, a priori, não se restringem a um tipo específico de relação interpes-

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Relacionamento Interpessoal: Uma Área de Investigação

soal. Este grupo de artigos foi reunido neste item. Uma vez identificados osdiferentes grupos, procurou-se uma forma que permitisse uma caracteriza-ção clara do conteúdo desses trabalhos. Após diversas leituras, três aspectosse destacaram como elementos que poderiam representar o conteúdo dessesestudos, uma vez que, de forma mais ou menos explícita, estavam presentesem todos os textos investigados. Estes três aspectos se referiam aos partici-pantes, às dimensões do relacionamento e ao contexto. As consideraçõesseguintes procuram mostrar a diversidade de cada um destes aspectos.

1) Os Participantes - Os participantes de um relacionamento apresentamcaracterísticas individuais que o afetam diretamente. Estas características po-dem ser físicas ou psicológicas, mais ou menos estáveis. Entre as principaispropriedades dos participantes estão a idade, o gênero, a etnia e certos aspec-tos psicológicos, que ocupam um papel central em vários dos textos revisa-dos. Entre as características demográficas, as mais comumente integradas aosestudos são as relativas a gênero (Suh, Moskowitz, Fournier & Zuroff, 2004)e idade (Aartsen, Tilburg, Smits & Knipscheer, 2004). Particularmente, nocaso da variável idade, esta poderia ser considerada como uma ‘síndrome’,uma vez que a ela estão associadas diversas outras características físicas (comoperda de certas possibilidades físicas) e psicológicas (cognitivas e emocio-nais). De modo geral, as publicações analisadas concentram-se nos adultos,com um menor número de investigações sobre crianças, adolescentes ou ido-sos. As características individuais de natureza psicológica e social tambéminterferem no relacionamento, como a auto-estima (Abe, 2004), a timidez (Ward& Tracey, 2004) e a memória (Frye & Karney, 2004).

Independentemente de sua natureza física ou psicológica, as proprieda-des individuais podem ser mais ou menos estáveis. Mesmo alterações decurta duração nas características dos participantes de um relacionamento,como a manifestação de emoção intensa, podem ter efeitos avassaladoressobre a relação com o outro. Entre os atributos pessoais e individuais dosparticipantes, há fatores físicos e psicossociais, alguns mais estáveis e ou-tros mais instáveis ou flexíveis. Um exemplo de características que desem-penham um papel mais ou menos estável são as condições de saúde do par-ticipante, que afetam o relacionamento e são afetadas por ele. Apesar dosestudos sobre relacionamento e saúde incluírem as condições físicas de seusparticipantes, estes serão tratados junto com outras dimensões do relaciona-mento, uma vez que saúde e relacionamento interpessoal se influenciammutuamente.

2) As Dimensões do Relacionamento – Herdamos, juntamente comnossa tradição cultural, um repertório de termos e expressões para nos refe-

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

rir aos relacionamentos os quais, freqüentemente, são incorporados aos es-tudos sobre relações interpessoais. Há uma série imensa de termos e expres-sões que caracterizam um relacionamento, ou um de seus aspectos. Na lite-ratura referente aos relacionamentos em geral, várias dimensões têm sidoinvestigadas, como o compromisso (Le & Agnew, 2003), o perdão (Youn-ger, Piferi, Jobe & Lawler, 2004), a similaridade (Fraley & Aron, 2004), apercepção interpessoal (Solomon & Knobloch, 2004) e o apoio social eemocional (Magdol & Bessel, 2003; Burleson, 2003). É comum, contudo,que diversas dimensões sejam analisadas concomitantemente. Um exemploé a discussão da colaboração, reciprocidade e preferência por similaridadenos relacionamentos próximos (Cole & Teboul, 2004). Algumas dimensõesrecebem uma atenção maior, como é o caso da comunicação, do apego e, deforma sintética, o lado escuro dos relacionamentos.

A comunicação é, ao mesmo tempo, uma das dimensões mais amplas einvestigadas dos relacionamentos em geral e também com uma elaboraçãoteórica mais expressiva. A comunicação é tão importante para esta área deinvestigação que os próprios relacionamentos têm sido considerados comodiálogos (Baxter, 2004). A comunicação afeta o curso do desenvolvimentode uma relação (Sunnafrank & Ramirez, 2004; Dindia, Timmerman, Lan-gan, Sahlstein & Quandt, 2004; Afifi, Dillow & Morse, 2004) e influenciaoutras dimensões do relacionamento, como intimidade e satisfação (Em-mers-Sommer, 2004), além de outros aspectos (Young, 2004).

O apego é outra dimensão que se destaca nos relacionamentos em geral.Os estudos sobre o apego apresentam duas características: uma maior ela-boração teórica e a tentativa de aglutinar outras dimensões e condições decontexto em seu entorno. Comumente são investigados estilos, modelos oudimensões do apego. O apego interfere na cognição social, em particular,sobre o processamento de informações (Rowe & Carnelley, 2003) ou emprocessos de atribuição (Sumer & Cozzarelli, 2004), está relacionado amotivos sexuais (Schachner & Shaver, 2004), atua na composição de redessociais (Doherty & Feeney, 2004), relaciona-se com auto-estima e tratamen-to parental (Luke, Maio & Carnelley, 2004), assim como com depressão eagorafobia (Strodl & Noller, 2003). O destaque teórico para o apego foi umdos pontos mais expressivos das pesquisas apresentadas na Conferência In-ternacional da Associação Internacional para a Pesquisa do Relacionamento(IARR), realizada em Madison, Wisconsin em 2004. De certa forma, o ape-go teve um desenvolvimento expressivo a partir dos estudos realizados porBowlby e Ainsworth, a partir dos anos quarenta, com uma série de novosavanços nas últimas décadas.

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Relacionamento Interpessoal: Uma Área de Investigação

A designação “lado escuro dos relacionamentos”, de uso corrente na área,reúne dimensões de natureza diferente com um ponto em comum: represen-tam o lado mais difícil, danoso para os participantes, ou negativo para o rela-cionamento. Reflete uma certa tendência maniqueísta de ver os relacionamen-tos como positivos (light side) ou negativos (dark side). Neste grupo, inclu-em-se diferentes dimensões que prejudicam, ou podem mesmo por fim a umrelacionamento. Entre os aspectos negativos investigados, estão a agressão e aviolência (Beach, Kim, Cercone-Keeney, Gupta, Arias & Brody, 2004, Klein,2004), as ameaças ao relacionamento (Brase, Caprar & Voracek, 2004) e asuspeita (Ickes, Dugosh, Simpson & Wilson, 2003). Violência e agressão, in-felizmente, são um tema comum, com destaque para a influência do gênero doagressor e da vítima (Beach, Kim, Cercone-Keeney, Gupta, Arias & Brody,2004, Klein, 2004). Estes não prejudicam apenas as relações entre as pessoas,mas também a integridade física e psicológica dos participantes, com conse-qüências como sintomas depressivos (Beach, Kim, Cercone-Keeney, Gupta,Arias & Brody, 2004). Quanto à saúde propriamente dita, se, por um lado oestado de saúde afeta o relacionamento, este também afeta as condições desaúde de seus participantes (Lewis, Butterfield, Darbes & Johnston-Brooks,2004; Drew, Heesacker, Frost & Oelke, 2004).

3) O Contexto – O terceiro elemento cuja presença é marcante nos estu-dos sobre os relacionamentos em geral é o contexto. Este é representado porfatores ambientais, geográficos, ecológicos, sociais, culturais, econômicos,tecnológicos, entre outros. O contexto e suas influências assumem um papelde destaque em vários estudos sobre o relacionamento, justificando, por exem-plo, a edição de um fascículo dedicado exclusivamente ao tema (Surra & Perl-man, 2003). Há uma gama imensa de fatores contextuais, como os sociais,históricos e culturais (Realo, Kästik & Allik, 2004; Goodwin & Gaines, 2004)que influenciam a própria natureza das relações entre as pessoas.

2. Relacionamento Romântico e Sexual

No senso comum, o termo relacionamento, quando utilizado separada-mente, parece referir-se a algum tipo de relação romântica. O relacionamen-to romântico e sexual (incluindo o casamento) foi, dentro da amostra seleci-onada, o tipo mais investigado. Um grupo de estudos dentro deste tópico seconcentra no casamento.

1) Relacionamento Romântico e Sexual - Os estudos sobre o relaciona-mento romântico e sexual em geral também envolvem características dos

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participantes, dimensões dos relacionamentos e aspectos do contexto. Quantoaos participantes, os aspectos pessoais ou individuais considerados vão des-de características demográficas (como idade, gênero e etnia) até caracterís-ticas pessoais (como a auto-estima) e sua influência no relacionamento ro-mântico (Bellavia & Murray, 2003), ou como este pode afetar o crescimentopessoal (Tashiro & Frazier, 2003). Apesar da maioria dos autores trataremde relacionamentos heterossexuais, há algumas referências sobre casais ho-mossexuais (Elizur & Mintzer, 2003).

As dimensões analisadas no relacionamento romântico e sexual, comoum todo, podem ser agrupadas em quatro categorias: a) processos gerais; b)apego; c) ciúme e infidelidade; e, d) saúde e violência (os itens c e d poderi-am, eventualmente, ser reunidos em uma categoria mais abrangente ligadaao lado escuro dos relacionamentos). Entre os processos gerais, há estudossobre comunicação (Kaplar & Gordon, 2004) e percepção interpessoal (Mak& Marshall, 2004). A comunicação pode incluir diferentes aspectos, comoas mentiras (Kaplar & Gordon, 2004) e os scripts (Conley & Rabinowitz,2004). Outras dimensões gerais incluem a qualidade da interação e do rela-cionamento (Galliher, Welsh, Rostosky & Kawaguchi, 2004) e a interde-pendência (Knobloch & Solomon, 2004).

O apego é um fator que recebe uma atenção particular neste tipo derelação interpessoal, exercendo influência sobre outras dimensões do rela-cionamento, como o compromisso (Tolmacz, 2004) e experiências sexuais(Gentzler & Kerns, 2004). Em alguns casos, é denominado de apego român-tico (Schmitt et al., 2003).

O ciúme e a infidelidade são dois aspectos comumente presentes no rela-cionamento romântico e sexual. As investigações abordam o ciúme (Sagarin& Guadagno, 2004; Rydell, McConnell & Bringle, 2004), a infidelidade(Becker, Sagarin, Guadagno, Millevoi & Nicastle, 2004) ou a ocorrênciasimultânea de ambos (Buunk & Dijkstra, 2004). A infidelidade apresentadois lados distintos: a emocional e a sexual (Buunk & Dijkstra, 2004; Be-cker, Sagarin, Guadagno, Millevoi & Nicastle, 2004), com resultados dife-rentes para a relação. Os estudos sobre ciúme e infidelidade também pri-mam por levarem em conta as diferenças de gênero (Buunk & Dijkstra, 2004;Sagarin & Guadagno, 2004). Em relação ao ciúme, vários aspectos têm sidoanalisados, como sua natureza extrema (Sagarin & Guadagno, 2004), suarelação com outras dimensões do relacionamento, como o compromisso(Rydell, McConnell & Bringle, 2004). No caso da infidelidade, as dimen-sões investigadas envolvem sua natureza (Cann & Baucom, 2004), a influ-ência do gênero (Becker, Sagarin, Guadagno, Millevoi & Nicastle, 2004;

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Cann & Baucom, 2004), e a relação com outras dimensões do relaciona-mento romântico, como o compromisso (Cann & Baucom, 2004), o sofri-mento e o perdão (Cann & Baucom, 2004). De forma geral, tem sido co-mum aos estudos sobre ciúme e infidelidade as considerações sobre suanatureza, a influência do gênero e suas relações com o compromisso.

O relacionamento romântico também apresenta um lado obscuro, englo-bando problemas de saúde e com violência (além do ciúme e da infidelidade).O relacionamento romântico pode ter efeitos negativos para a saúde, estandoassociado com sintomas depressivos (Davila, Steinberg, Kachadourian, Cobb& Fincham, 2004; Segrin, Powell, Givertz & Brackin, 2003) e solidão (Se-grin, Powell, Givertz & Brackin, 2003). O lado obscuro dos relacionamentosromânticos ainda conta com o comportamento violento, especialmente partin-do da figura masculina (Wood, 2004).

Os diversos aspectos do contexto (como o geográfico, social e cultural)interferem no relacionamento romântico. Do ponto de vista físico ou geo-gráfico, a distância, por exemplo, afeta diretamente o relacionamento (Sahls-tein, 2004). Do ponto de vista cultural, mesmo os feriados, como o ‘Dia dosNamorados’, podem afetar o relacionamento romântico (Morse & Neuberg,2004). Ainda fazem parte do contexto cultural, as normas subjetivas (Etche-verry & Agnew, 2004) e as crenças românticas (Weaver & Ganong, 2004) eas relações entre cultura e história pessoal (Yum, 2004).

2) Casamento - Há uma significativa produção sobre o relacionamentoconjugal, desde os aspectos metodológicos (Karney, Kreitz & Sweeney,2004; Kurdek, 2003a) até questões teóricas. As dimensões investigadasno casamento incluem processos gerais como, por exemplo, as relaçõessexuais (Hinchliff & Gott, 2004). Contudo, neste item, se destacam as di-ficuldades no casamento, incluindo a questão da saúde e questões étnicas(Leslie & Letiecq, 2004).

As dificuldades conjugais oferecem um amplo campo de investigação,incluindo saúde e enfermidade. A enfermidade é parte integrante do casa-mento, e esposo e esposa atuam de forma e prevenir e enfrentar doenças,gerando narrativas e scripts relacionados a ela (Walker & Dickson, 2004)ou exercendo controle e apresentando comportamentos voltados para asaúde e o bem-estar (Helgeson, Novak, Lepore & Eton, 2004), sofrendo ainfluência do gênero (Badr, 2004). O parceiro influencia nas tomadas dedecisão sobre comportamentos voltados para a saúde (Rempel & Rempel,2004) e os cônjuges efetuam trocas que promovem a saúde (Franks, Wen-dorf, Gonzalez e Ketterer, 2004).

Ao lado dos problemas de saúde física, os cônjuges ainda podem enfren-

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tar problemas psicológicos e sociais nos casamentos. Algumas dificuldadesestão ligadas ao estresse e suas conseqüências (Cano, O’leary & Heinz, 2004),como os sintomas depressivos (Cranford, 2004). Dificuldades emocionaispodem resultar de eventos dolorosos (Feeney, 2004) e gerar sofrimentomarital (Kurdek, 2003b). Entre as dificuldades enfrentadas no casamentoestão os diferentes tipos de conflito (Holman & Jarvis, 2003) e a infidelida-de (Previti & Amato, 2004). Relacionados às dificuldades, estão o diálogo ea busca de solução para os problemas no casamento (Sanford, 2003).

O contexto físico, social, geográfico, econômico, histórico ou culturalexerce uma influência importante sobre o casamento (Levinger e Levinger,2003). Também fazem parte do contexto, a vizinhança e as pressões finan-ceiras que o casal sofre (Cutrona, Russell, Abraham, Gardner, Melby, Bryant& Conger, 2003). Quanto ao contexto físico, mesmo os objetos na habitaçãodo casal podem refletir a história do relacionamento (Lohmann, Arriaga &Goodfriend, 2003).

Além do casamento, um número menor de pesquisas trata do divórcio(Terhell, van Groenou & van Tilburg, 2004). Em alguns casos, as relaçõesentre casais são comparadas com as relações entre colegas de quarto (San-ford & Rowatt, 2004), namorados (Kachadourian, Fincham & Davila, 2004)e dos que vivem juntos (Stafford, Kline & Rankin, 2004).

3. Relacionamento na Família

A família extensa abre inúmeras possibilidades de contatos sociais, en-volvendo pais, filhos, irmãos, primos, tios, avós, cunhados, noras, genros,sogros, sobrinhos, entre outros. Dentre os diversos relacionamentos famili-ares, os mais investigados são entre esposo e esposa (já discutidos comorelacionamento romântico) e entre pais e filhos (participantes), ou seja aênfase recai sobre a família nuclear e suas relações. Recentemente, novassituações também têm surgido, como a relação de pais e mães homossexuaiscom seus filhos (Hequembourg, 2004).

A comunicação é uma das dimensões mais investigadas entre pais e filhos,comumente se referindo a problemas de comunicação entre as gerações, sobretemas específicos, como no caso do uso de álcool e outras drogas (Caughlin eMalis, 2004; Miller-Day & Dodd, 2004), quanto à disposição para a doaçãode órgãos (Morgan, 2004) ou dificuldades na comunicação entre filhos adoti-vos e seus pais (Baxter, Braithwaite, Bryant & Wagner, 2004). O apego éoutra importante dimensão investigada, em relação ao papel paterno (Feeney,

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Alexander, Noller & Hohaus, 2003) ou quanto à relação entre mãe e filhaadulta (Obegi, Morrison & Shaver, 2004). Outro aspecto investigado é o apoiosocial (Riggio, 2004). No caso da saúde, há uma inter-relação entre relaciona-mentos na família e a condição de saúde de seus membros (Bylund & Duck,2004), com influências recíprocas. A presença de uma enfermidade como ocâncer apresenta conseqüências para as interações familiares (Beach & Good,2004). Por outro lado, a família também influencia no cuidado com a saúde(Petronio, Sargent, Andea, Reganis & Cichocki, 2004).

A família ainda representa um contexto importante para o desenvolvi-mento de características ligadas ao relacionamento, como é o caso do com-promisso (Weigel, Bennett & Ballard-Reisch, 2003) e de valores (Knafo,2003; Yang & Rettig, 2003). Mesmo as situações de conflito entre os paisafetam as relações com os filhos (Riggio, 2004).

As relações familiares de natureza interpessoal acompanham as trans-formações da sociedade e uma série de tópicos seriam de interesse para apesquisa, como as relações entre os familiares após o divórcio, na constitui-ção de famílias já resultantes de separação, ou as relações entre três gera-ções, diante do aumento da expectativa de vida, de transformações no mun-do do trabalho, com a presença crescente da mulher demandando novasrelações familiares, a maior evidência de relacionamentos homossexuais.Também pouco se sabe sobre relacionamento entre irmãos ou pais e filhosadultos, entre outros. Há um extenso campo de investigação ultrapassandoos limites do casal e seus filhos.

4. Amizade

Diferentemente das relações familiares, que existem independente-menteda vontade dos indivíduos, a amizade é considerada um relacionamento comum maior grau de liberdade, na escolha de amigos e na sua continuidade. Há,proporcionalmente, um menor número de estudos sobre a amizade quandocomparado ao relacionamento romântico ou familiar, sendo as dimensões es-tudadas na amizade, na literatura considerada, mais restritas.

Os estudos envolvem amizades no ambiente escolar, no ambiente de tra-balho e mesmo entre pessoas que já mantiveram uma relação amorosa. Des-ta forma, participam destes estudos estudantes, companheiros de trabalho eex-namorados. Vários relatam o desenvolvimento histórico da amizade, comoas transformações nas amizades de alunos do segundo grau em sua transiçãopara a universidade (Oswald & Clark, 2003), as relações de amizade após a

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dissolução de um relacionamento romântico (Busboom, Collins, Givertz &Levin, 2002) e a deterioração de amizades no local de trabalho (Sias, Heath,Perry, Silva & Fix, 2004). Nestes casos, o contexto parece ser um elementoimportante, como é o caso do ambiente universitário ou o ambiente de tra-balho. Entre as dimensões consideradas estão o controle e a satisfação (Morry,2003), a influência das amizades sobre a saúde (Petronio, Sargent, Andea,Reganis & Cichocki, 2004) e questões de apego (McElwain & Volling, 2004).

Quanto ao contexto, as influências culturais associadas a regiões geo-gráficas também afetam a amizade, gerando características particulares emdiferentes países ou regiões (Adams & Plaut, 2003). A tecnologia é outrainfluência, especialmente no campo da informática e das comunicações. Oacesso cada vez mais amplo à Internet, por exemplo, gera amizades online,cujas propriedades, assim como sua relação com as amizades face-a-face,ainda precisam ser investigadas em maior profundidade (Chan & Cheng,2004). Outras formas de relacionamento, de certa forma próximas às amiza-des, são pouco investigadas, como a relação entre pares, incluindo temascomo aceitação e rejeição pelos colegas (Bellmore & Cillessen, 2003) ou asrelações com vizinhos (Thomese, van Tilburg & Knipscheer, 2003).

As relações de amizade constituem um tema de pesquisa com uma im-portância crescente, face às mudanças que a sociedade vem sofrendo. Algu-mas transformações históricas, culturais e tecnológicas possivelmente po-dem estar na origem de novos padrões de amizades. Entre as mudanças his-tóricas e sociais com influência potencial sobre as relações de amizade estáa redução histórica no tamanho da família (com um menor número de fi-lhos) resultando em uma rede de relações mais restrita. A urbanização au-menta as possibilidades de contato entre as pessoas, abrindo espaço para osurgimento de amizades. Os avanços tecnológicos permitem uma amplifica-ção dos contatos sociais. Avanços nos serviços de telefonia e informática,com o crescimento das comunidades virtuais, por exemplo, propicia umnúmero, intensidade e freqüência de contatos cada vez maior. O acesso cadavez mais cedo à escola expõe a criança a seus pares em uma fase mais pre-coce de sua vida que em gerações passadas. O tempo cada vez mais longono sistema escolar, incluindo a universidade, também aumenta o tempo deexposição aos colegas e amigos em potencial. O crescimento dos grupos deconvivência de idosos tem aumentado a possibilidade de encontros e o de-senvolvimento de amizades Estes, entre outros fatores, possivelmente pro-vocam transformações nas relações de amizade em todas as faixas etárias.As transformações qualitativas e quantitativas face aos novos meios de co-municação e novas formas de organização da sociedade contemporânea cer-

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tamente exercem uma pressão constate nas relações de amizade, possivel-mente no sentido de relações mais numerosas e mais intensas. Pode-se dizerque o ideal de uma sociedade democrática e igualitária seria abrigar rela-ções entre semelhantes, de caráter recíproco, como é o caso das amizades.

5. Conclusão

A literatura analisada, apesar de sua composição heterogênea, abordan-do diferentes temas sobre o relacionamento e de sua orientação em funçãode uma corrente de investigadores (ambas a publicações são da IARR), for-nece elementos para se construir um esboço das tendências da investigaçãosobre relacionamento interpessoal. A partir dos estudos analisados, cada qualcom um nível de especificidade, procurou-se identificar e propor algumascaracterísticas da área. Tal esboço, necessariamente, não faz jus a áreas es-pecíficas, como a amizade ou o relacionamento romântico. Procura ser, narealidade, um esboço das características da área mais ampla do relaciona-mento interpessoal.

Primeiramente, a literatura tem abordado os relacionamentos como umtodo ou então se dedica a um tipo específico. Nos casos em que um tipo éexplicitado, três formas de relacionamento se destacam como as mais intensa-mente investigadas: o relacionamento romântico (incluído relações no casa-mento e divórcio), o familiar (excetuando as relações românticas, com ênfasenos pais e filhos) e a amizade. Casos menos investigados incluem o relaciona-mento com pares ou colegas e com vizinhos, por exemplo. No caso dos rela-cionamentos românticos e sexuais, os estudos cobrem fases distintas, desde abusca e escolha de um companheiro, o namoro e o casamento em diferentesestágios (com diferentes períodos de duração). Os dados indicam a predomi-nância de estudos sobre relações românticas e sexuais sobre outras relaçõesfamiliares, com um expressivo número de investigações sobre o casamento. Omaterial analisado incluiu poucas publicações sobre outras formas de relacio-namento, como entre colegas de trabalho ou entre profissionais e seus clien-tes. A integração entre estes estudos enfocando os relacionamentos familiaresou informais (como a amizade) e os relacionamentos mais formais, determi-nados pela estrutura social e econômica, permitira um avanço significativo naárea, permitindo uma visão mais ampla dos relacionamentos.

Tomando-se o conjunto dos textos analisados, três aspectos se destacarampor sua presença constante. Estes elementos que compõem um relacionamentose referem aos participantes, às dimensões do relacionamento e ao contexto.

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a) Participantes dos Relacionamentos. Um relacionamento consta,basicamente, das pessoas que dele participam, das dimensões do relaciona-mento propriamente dito e do contexto no qual esse relacionamento se dá.Do ponto de vista individual, diferentes propriedades dos indivíduos sãorelevantes para os relacionamentos, desde aquelas mais estáveis (como ida-de, gênero e etnia) até as mais instáveis (como aspectos psicológicos, soci-ais e condições de saúde), que sofrem modificações com maior facilidade,como no caso de transformações físicas e psicológicas trazidas pelas enfer-midades. Outras propriedades de natureza psicológica e social, mais flexí-veis, têm sido incluídas nos estudos sobre o relacionamento, como a auto-estima, o estresse, a timidez, entre outras.

b) Dimensões do Relacionamento. Os estudos sobre o relacionamentogeralmente giram em torno de uma ou mais de uma de suas dimensões. Es-tas, em grande parte, representam dimensões do senso comum que vem sen-do empregadas para caracterizar, descrever ou explicar os relacionamentoshá longo tempo, com características históricas ou culturais. Estas são incor-poradas aos estudos sobre o relacionamento como dimensões. Outras já tra-zem uma maior influência da própria ciência, como é o caso do apego e dacomunicação. Quanto à sua natureza, estas dimensões são complexas e he-terogêneas, de abrangência diferenciada, incluindo, de maneira distinta, as-pectos processuais ou de estado, de caráter moral, ético, emocional, cogni-tivo, entre outros. Por vezes, diferentes dimensões são investigadas em dife-rentes tipos de relacionamentos. A infidelidade, por exemplo, é típica dosestudos das relações românticas. Outras dimensões são mais amplas, comoé o caso da comunicação. Hinde (1997) apresenta uma série dessas dimen-sões, que descrevem os relacionamentos e sua dinâmica. Entre estas, podemser citadas o compromisso, a confiança, a agressão, o ciúme, o respeito, aproximidade, a intimidade, o perdão, o apoio social, a comunicação inter-pessoal e o apego, entre outras. Usualmente, os estudos sobre o relaciona-mento se estruturam em torno de uma (ou mais) destas dimensões.

A utilização de noções provenientes do senso comum, por um lado, permi-te manter uma boa comunicação com a sociedade em geral, mas, por outro,também favorece a fragmentação teórica, uma vez que, comumente, estas di-mensões não se inserem em perspectivas teóricas mais abrangentes, mas re-presentam dimensões independentes. Elas podem ter uma história mais oumenos ligada ao pensamento científico. Algumas são seculares, como a confi-ança, o ciúme e o perdão, e trazem uma imensa carga de significados culturaise de valor. Ainda assim, são dimensões específicas cuja integração com outrasdimensões nem sempre é facilmente conseguido. Estas também representam

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um desafio para sua investigação, partindo da própria conceituação e delimi-tação do seu significado. Várias vezes, envolvem uma complexa rede de influ-ências, incluindo as religiosas, éticas e culturais, entre outras.

Outras dimensões já revelam uma natureza mais integrada à ciência,apresentando uma maior elaboração teórica, tendo se tornado dimensõesmais técnicas, como é o caso da noção de apego e seus derivados, investiga-do sob diversos aspectos. Outra dimensão ampla, a comunicação, reúne di-ferentes processos e também apresenta uma elaboração teórica expressiva.Estas dimensões de caráter mais teórico e científico também revelam ummaior potencial de hegemonia sobre o campo teórico da área e, por vezes,tendem a ocupar um papel central nas tentativas explicativas. Quando setrata do relacionamento como um diálogo, por exemplo, abre-se uma viapara se aplicar princípios teóricos da comunicação em sua explicação.

As diversas dimensões investigadas no relacionamento interpessoal tam-bém não são integradas em um sistema teórico comum. Não há uma únicaorientação teórica nestes estudos e diferentes explicações concorrem para ex-plicar aspectos ligados ao relacionamento interpessoal. Também não existe,até o presente, um conceito central que tenha condições de aglutinar, em tornode si, todas as contribuições teóricas para a área. Isto se torna ainda mas com-plicado com as contribuições provenientes de diferentes áreas do conheci-mento, que vêm se somando na construção de uma ciência do relacionamento.Mesmo a definição destas dimensões não é algo simples e imediato.

A área, contudo, apresenta algumas tendências para agrupar seus da-dos. Uma tendência presente é a orientação dualista, agrupando as dimen-sões do ponto de vista de seus aspectos positivos e negativos. Esta tendên-cia que, possivelmente tem sua origem no próprio senso comum e no tra-balho de aconselhamento, marca sua presença, por exemplo, na conside-ração de um lado escuro dos relacionamentos (dark side) e de um ladoclaro dos mesmos (light side). Neste sentido, tentativas de organização daárea, seja do ponto de vista das relações entre as dimensões empregadas,seja na busca de princípios explicativos em diferentes níveis, são necessá-rias, assim como a construção, ainda que provisória, de modelos teóricos,desde os mais restritos até os mais genéricos. Em suma, há carência tantodo ponto de vista empírico, com dados restritos sobre muitas das dimen-sões envolvidas, quanto do ponto de vista teórico, com uma carência desistemas teóricos que possam contribuir para a construção de uma ciênciado relacionamento interpessoal.

c) O Contexto do Relacionamento. O contexto representa os diversosaspectos do ambiente no qual os relacionamentos se dão. Inclui o ambiente

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físico, ecológico, geográfico, histórico, social, cultural e econômico, entreoutros, relevantes para o relacionamento. Visando uma maior sistematiza-ção, essas condições podem ser tratadas como macro ou micro-contexto. Omacro-contexto estaria relacionado ao ambiente mais amplo, como as con-dições históricas e geográficas de um país, continente ou região e suas ca-racterísticas físicas, sociais, culturais e econômicas. O micro-contexto re-presentaria essas dimensões de forma mais próxima do indivíduo, como ascondições históricas e geográficas de seu local de habitação e suas caracte-rísticas físicas, sociais, culturais e econômicas. As relações entre os partici-pantes, as dimensões do relacionamento e o contexto, são dialéticas, no sen-tido de que cada uma delas interfere sobre a outra.

Os relacionamentos apresentam uma natureza específica, envolvendodiferentes dimensões e participantes com propriedades específicas e se dáem um contexto complexo. Os indivíduos, as dimensões e o contexto exer-cem influência uns sobre os outros. O avanço de uma ciência do relaciona-mento interpessoal, como proposta por Hinde (1997), depende não apenasde estudos empíricos, que possam aumentar o conhecimento sobre os dife-rentes tipos de relacionamento em sua complexidade, assim como de estu-dos teóricos que possam integrar os inúmeros aspectos da pesquisa sobre orelacionamento interpessoal, criando sistemas teóricos cada vez mais abran-gentes. Talvez por vivermos os relacionamentos interpessoais de modo tãopróximo e intenso em nosso dia-a-dia, sua teorização se torna uma tarefadas mais difíceis e complexas.

Entre as possibilidades de avanço teórico para o futuro dos estudos so-bre o relacionamento, está a tentativa de integração, de forma mais efetiva,dos princípios explicativos empregados nos relacionamentos familiares eespontâneos com aqueles empregados nas relações determinadas pelas no-vas condições sociais e econômicas. Um ser humano mantém contatos diá-rios com outras pessoas durante toda a sua vida. Estes contatos não envol-vem apenas familiares e amigos, mas muitas outras pessoas, com as quaispode apenas interagir momentaneamente, como estranhos, ou pode manterum relacionamento de longo prazo, como com outros colegas de trabalho,com prestadores de serviço em diferentes modalidades. Uma ciência do re-lacionamento interpessoal, em sentido amplo, deveria levar em conta essadiversidade de relacionamentos, procurando integrar as contribuições dediferentes áreas para as quais as relações humanas são relevantes, como aeducação, a enfermagem, a administração, a medicina, o direito, entre ou-tras. Muito foi feito nas últimas décadas no campo do relacionamento inter-pessoal, mas muito ainda resta a realizar.

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2UMA ABORDAGEM EVOLUCIONISTA DAS

RELAÇÕES PAIS-FILHOS E PADRASTOS-ENTEADOS

Rosana Suemi TokumaruMargareth Pereira Bergamin

O bebê humano nasce completamente dependente dos adultos que o cer-cam. No entanto, a influência dos adultos sobre o desenvolvimento da crian-ça não é homogênea. Desde Bowlby, muito se tem investigado a respeito daformação de laços particularizados entre adultos e crianças, principalmenteentre mães e filhos (Hrdy, no prelo).

As mães têm sido as principais cuidadoras de seus filhos, apesar da vari-abilidade individual e diferenças sócio-histórico-culturais (Hrdy, 2001). Ofornecimento de cuidado à criança pode ser entendido como a realização de“qualquer comportamento que aumente a aptidão” dela (Cluton-Brock, 1991).O termo “aptidão” refere-se ao aumento na sobrevida e taxa de reproduçãoadvindo do cuidado recebido. A partir dessa definição podemos considerarque os cuidados maternos iniciam-se antes do nascimento do bebê já quedurante a gravidez a mãe nutre e abriga o feto em desenvolvimento.

O fornecimento de cuidados não é isento de custos. Sabe-se que a gesta-ção e a lactação envolvem custos energéticos altos (Prentice & Prentice, 1995,Prentice & Goldberg, 2000) e tem-se encontrado correlação positiva entre onúmero de gravidezes e a diminuição do período de vida (Thomas et al., 2000).Tanto o alto custo energético direto, com a produção de leite e modificaçõesfisiológicas, como também o custo indireto, com o dispêndio de tempo e arealocação de tarefas, além do estado altricial do bebê ao nascer e consequen-

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temente o longo período necessário para seu desenvolvimento até a maturida-de, fazem do cuidador humano um investidor de longo prazo.

De acordo com a teoria do investimento parental de Trivers (Cluton-Brock, 1991), os pais investem em seus filhos como forma de aumentar seusucesso reprodutivo. A partir dessa teoria, duas previsões podem ser feitas.A primeira é que os pais serão os principais interessados em fornecer cuida-dos aos seus filhos. No entanto, não na mesma medida. A mãe humana temcerteza da maternidade e, portanto, pode garantir seu sucesso reprodutivoao investir em seu bebê. O pai, dada a fecundação interna, não tem certezada paternidade, e pode condicionar o fornecimento de cuidado à diminuiçãodesta incerteza.

A outra previsão é que o investimento no cuidado com a criança variaráem diferentes contextos de acordo com os custos envolvidos. Daí a relaçãoíntima entre o investimento em cuidados e o contexto no qual ocorre. Estaprevisão tem sido confirmada. Em culturas baseadas na caça e na coleta, asmães levam os bebês consigo durante o forrageio. Há relatos de infanticídioquando ocorre nascimento de gêmeos. Nestas condições, a presença de doisbebês tornaria impossível a coleta de alimentos pela mãe e o infanticídiotem sido interpretado como uma solução adaptativa para a manutenção dosucesso reprodutivo das mulheres nestas culturas. O infanticídio tambémtem sido observado em culturas indígenas em casos de desconfiança de pa-ternidade e intervalos muito curtos entre partos consecutivos. Também aqui,interpreta-se o infanticídio como uma solução para a ausência de cuidadopaterno, no primeiro caso, e a dificuldade de fornecer cuidados suficientespara ambas as crianças, no segundo (Daly & Wilson, 1994a; Hrdy, 1994,Gosso & Otta, 2005).

O infanticídio parece ser uma solução extrema e, efetivamente, apareceraramente (Hrdy, 1994). Uma outra forma de lidar com a presença de altoscustos no fornecimento de cuidados parece ser o abandono. Mães em condi-ções de extrema pobreza ou cujo status social poderia ser abalado pela pre-sença de um filho, podem optar pelo abandono como forma de garantir asobrevivência do bebê (Hrdy, 1994; vom Sall, 1994). O abandono, do pontode vista evolutivo, só faz sentido se houver outros cuidadores disponíveis. Aadoção de crianças abandonadas por pessoas aparentadas pode ser explica-da, em termos de sucesso reprodutivo, a partir do ganho de aptidão abran-gente, ou seja, o investimento em uma criança aparentada propicia, para oindivíduo que fornece os cuidados, meios de propagar os genes que compar-tilha com ela (Hrdy, no prelo, Hawkes et al., 1998, Geary & Flynn, 2001).

No entanto, não apenas pessoas aparentadas adotam crianças ou forne-

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cem cuidados complementares aos fornecidos pelos pais. Pessoas não apa-rentadas também se tornam cuidadoras. Estas pessoas não obtêm aumentode seu sucesso reprodutivo ou ganhos em termos de aptidão abrangente, noentanto, supõe-se que podem formar vínculos e alianças que poderão trazerganhos futuros sob a forma de trocas recíprocas. Alguns estudos que compa-ram os cuidados oferecidos às crianças adotadas aos oferecidos aos filhosbiológicos indicam que crianças adotadas podem receber mais investimen-tos (Gibson, 2004; Bussab & Oliveira, 2005)

A reciprocidade nos relacionamentos humanos tem sido bastante inves-tigada. Supõe-se que mecanismos psicológicos tenham evoluído com a fina-lidade de manter vigilância sobre o comportamento dos outros indivíduos esobre a disposição que demonstram em cooperar em troca de cooperação(Pinker, 2004; Dennet, 1998). O reconhecimento individual, a memória fac-tual e o desenvolvimento de sentimentos, como a culpa e o amor, têm sidovistos como compondo um mecanismo psicológico desenvolvido para umtipo de interação social baseada em reciprocidade (Key & Aiello, 1999).

Uma relação particular entre cuidador e criança ocorre quando os paisbiológicos formam novos vínculos com adultos não aparentados. Atual-mente, mudanças significativas na estrutura familiar têm ocorrido em todoo mundo. Estatísticas oficiais mostram que na Austrália, nos Estados Uni-dos e na maior parte dos países europeus tem ocorrido um grande númerode divórcios e é crescente a quantidade de casais que passam a morarjunto sem oficializarem a união (Tomison, 1996). Também há um númerocada vez maior de pais solteiros. No Brasil, segundo informações do IBGE(2004), o número de separações judiciais e divórcios vêm aumentandogradativamente. De 1993 a 2003, o volume de separações aumentou em17,8% e o de divórcios em 44%. Em 2003, na separação judicial não-consensual, a proporção de mulheres requerentes (72%) foi superior a dehomens (28%). No entanto, nas ações de divórcio não-consensual, as dife-renças entre homens e mulheres foram menores: 46,6% foram requeridospelos homens e 53,4%, pelas mulheres. Os analistas do IBGE supõem queo crescimento da porcentagem de homens que requerem o divórcio não-consensual esteja associado ao fato de eles recasarem em maiores propor-ções do que as mulheres. A proporção de casais com filhos menores deidade nas separações judiciais (61,9%) foi mais alta do que nos divórcios(45,3%). Em sua grande maioria, a responsabilidade da guarda dos filhosmenores ficou com as mães (91,4%). Somente em 3,5% das separações e4,2% dos divórcios, ambos os pais ficaram responsáveis pela guarda defilhos menores.

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Essas mudanças têm trazido preocupações quanto aos efeitos das dife-rentes estruturas familiares nos comportamentos dos pais e dos filhos (To-mison, 1996). Pesquisas realizadas no Canadá, Grã-Bretanha e EstadosUnidos mostram que crianças que moram com um pai biológico e um nãobiológico correm mais riscos de morte e maus tratos que crianças que moramcom ambos os pais biológicos (Daly & Wilson, 1994b, 1996, 1998). Ou-tros estudos não encontraram resultados semelhantes aos de Daly e Wil-son (Temrin et a.l, 2000, 2004) que, em réplica a estes autores (Daly &Wilson, 2001), apontaram a existência de problemas metodológicos queteriam impedido o aparecimento do chamado “Efeito Cinderela” nestesestudos. No entanto, apesar do debate a respeito da universalidade do “Efei-to Cinderela”, outros estudos mostram diferenças entre os cuidados rece-bidos por crianças que moram com ambos os pais genéticos e crianças quemoram com um pai genético e outro não aparentado.

Anderson et al. (1999a e b) propõe que a questão do investimento pa-terno humano não esteja relacionada diretamente com a co-residência en-tre pai/padrasto e criança ou mesmo, apenas, com a certeza de paternida-de. Os autores partem de um desdobramento da Teoria do InvestimentoParental de Trivers que discrimina entre ‘esforço parental’ e ‘esforço re-produtivo’ como forças competitivas que compõe o investimento parental.As fêmeas da maior parte das espécies de mamíferos, dado o maior inves-timento prévio na produção de gametas, gestação e amamentação, tendema investir mais em esforço parental. Os machos, com maior potencial re-produtivo, tendem a investir mais em esforço reprodutivo. No caso huma-no, discutem os autores, o esforço reprodutivo não envolve apenas a buscade parceiro, mas também, a manutenção da relação com a nova parceira.Segundo eles, em uma espécie como a nossa, na qual ambos os sexos po-dem prover cuidados, demonstrações de habilidade ou desejo de fornecercuidados às crianças podem ser atrativos para o estabelecimento e manu-tenção de novas relações.

Um ponto na argumentação destes autores merece destaque. Eles apon-tam que o aumento no sucesso reprodutivo não explica completamente oestabelecimento de novas relações amorosas já que em muitas delas não hádescendência. Dizem eles que “…apesar dos biólogos evolucionistas enfo-carem primariamente os resultados obviamente relacionados ao aumento deaptidão tais como a fertilidade e fecundidade, as relações humanas são mo-tivadas por mais que somente considerações reprodutivas.” (1999a, pág.409). Os autores parecem contrapor a explicação funcional para o estabele-cimento de novas relações amorosas, ou seja, o aumento no sucesso repro-

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dutivo, à explicação causal, que segundo eles, leva em conta “...considera-ções econômicas tais como a reciprocidade” e “...os prazeres da companhiae do sexo...”. O que os autores parecem não levar em conta é que os senti-mentos de reciprocidade, prazer e companheirismo podem ser característi-cas humanas selecionadas ao longo da evolução justamente por terem leva-do à formação de vínculos entre homens e mulheres tendo como resultado oaumento de seu sucesso reprodutivo. Vale lembrar aqui que as explicaçõesfuncionais e causais não se contrapõem, mas sim, se complementam.

O ponto central da teoria destes autores - de que o investimento paternodepende do relacionamento amoroso - é demonstrado a partir dos dadosobtidos em uma população da cidade de Albuquerque no Novo México,USA (Anderson et al., 1999a). Os autores compararam homens que estavamem relacionamento amoroso com as mães de seus filhos biológicos comhomens que estavam envolvidos com outras mulheres que tinham filhos deparceiros anteriores. Os autores compararam quantos dos filhos em cadasituação tinham a probabilidade de freqüentar a universidade e receber bol-sa de estudos, quanto dinheiro era gasto com as crianças e jovens e o tempoque os homens passavam com as crianças de 5 a 12 anos de idade em cadasituação. Constatou-se que os homens que estavam em um relacionamentocom as mães de seus filhos biológicos eram os que mais investiam nestascrianças. No entanto, os homens que tinham um enteado no atual relaciona-mento diferiram pouco de homens que tinham filhos biológicos de um rela-cionamento anterior quanto ao investimento, dando mais dinheiro para osenteados do relacionamento atual de 18 a 24 anos e passando mais tempocom os enteados de 5 a 12 anos que com os filhos biológicos de relaciona-mentos anteriores. Os enteados de relacionamentos anteriores foram os quereceberam menos investimentos masculinos. Estes resultados foram obtidostambém com uma população Xhosa residente em Cape Town, África do Sul(Anderson et al., 1999b).

Flynn et al, 1999, também encontraram diferenças entre crianças queresidiam com padrastos e crianças que residiam com os pais biológicos.Meninas de 0 a 10 anos e meninos de 10 a 20 anos que residiam com padras-tos apresentaram menor peso que crianças de mesma idade, incluindo seusmeios-irmãos co-residentes. O peso dos recém nascidos nestes dois gruposde crianças não era diferente. Um resultado interessante é que as criançasque residiam com padrastos apresentaram menor índice de assimetria flutu-ante. Têm-se encontrado correlação positiva entre este índice e a ocorrênciade parasitoses, subnutrição, doenças e estresse em várias espécies (Hrdy,2001). A hipótese dos autores, de que crianças que moram com pais biológi-

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cos apresentariam índices menores de assimetria, não foi confirmada.Dentre os Hazda, uma população de caçadores-coletores da Tanzânia,

observou-se que os pais brincaram, conversaram e cuidaram (carregar, pe-gar no colo, alimentar, limpar e pacificar) mais de seus filhos biológicos quede seus enteados (Marlowe, 1999). Os homens que residiam apenas comfilhos biológicos trouxeram mais alimentos para casa que aqueles que resi-diam com pelo menos um enteado, além de seus próprios filhos biológicos.O autor nota que durante entrevistas realizadas com os Hadza, todos diziamque se esperava que os padrastos cuidassem de seus enteados da mesmamaneira que os pais biológicos. No entanto, quando se perguntava se elesrealmente não diferiam, apenas 54,3% reafirmou que não havia diferençaenquanto 47,5% disse que os homens se sentiam mais próximos de seuspróprios filhos. O autor interpreta seus resultados como demonstrando queo fornecimento de cuidado paterno representa, principalmente, esforço pa-rental e não apenas esforço reprodutivo, já que é direcionado principalmen-te para a própria prole. No entanto, não comparou homens em diferentescontextos de envolvimento amoroso como fizeram Anderson e colaborado-res, citados acima.

Diferenças entre os cuidados recebidos de mães e madrastas foram iden-tificadas no estudo de Case e Paxson, 2000. As autoras mostraram que cri-anças Norte-Americanas que moravam com as madrastas apresentaram sig-nificativamente menor probabilidade, que crianças que moravam com asmães biológicas, de: fazer visitas de rotina ao dentista e médico, ter localusual para receber cuidado médico, usar cinto de segurança e conviver comnão-fumante. As autoras concluem que as mães biológicas são as principaisresponsáveis pelo cuidado com a saúde de seus filhos e que as madrastasnão são substitutas maternas nesse domínio.

A parte das discussões sobre o significado funcional do fornecimento decuidado masculino e considerando as implicações de uma nova relação amo-rosa no fornecimento de cuidado dos pais e mães biológicos, nosso própriotrabalho realizado com uma amostra da população da Grande Vitória, ES,Brasil, também indicou diferenças entre pais biológicos e não biológicos. Oobjetivo de nosso estudo foi avaliar a freqüência do tipo de cuidado forneci-do por pais, mães, padrastos e madrastas às crianças que moram com eles.Nós distribuímos questionários aos responsáveis por crianças de 0 a 12 anosde idade matriculadas em 32 escolas da Grande Vitória. As questões eramsobre composição familiar e a freqüência (muitas vezes, às vezes, poucasvezes, nunca) com a qual o respondente realizava cada uma das seguintesatividades com a criança: conversar com a criança, levá-la para passear,

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dar presentes, levá-la ao médico, brincar com a criança, levá-la a escola,ajudar nas atividades escolares, cuidar da alimentação, cuidar da higiene,corrigir atitudes inadequadas (adaptado a partir de Ades, 1998). Foramobtidos 1155 questionários respondidos. Destes, 89,4% das crianças mora-vam com o pai e mãe biológicos, 8,66% com a mãe e o padrasto e 1,9%moravam com o pai e a madrasta.

As mães, independentemente de viverem com o pai biológico ou o pa-drasto de seus filhos, foram as principais respondentes (77% e 85%, respec-tivamente) e madrastas responderam mais freqüentemente (45,4%) que pa-drastos (6%). Este resultado pode indicar a maior responsabilidade femini-na pela supervisão das atividades escolares das crianças nas famílias da Gran-de Vitória.

Tanto os pais (40,9%) quanto as mães (85%) que viviam com os parcei-ros que não eram os pais biológicos de seus filhos responderam o questioná-rio mais freqüentemente que aqueles vivendo com os pais biológicos deseus filhos (15,3% dos pais vivendo com mães e 76,96% das mães vivendocom pais). Podemos inferir que pais e mães que vivem com parceiros quenão são pais biológicos de seus filhos têm responsabilidade aumentada nasupervisão das atividades escolares de seus filhos. No entanto, quando so-mamos a porcentagem de pais e mães biológicos vivendo juntos que respon-deram o questionário (92,3%) e comparamos com a soma da porcentagemde mães vivendo com padrastos (91%) e pais com madrastas (86,4%) ve-mos que pais e madrastas e mães e padrastos juntos responderam menos quepais e mães biológicos juntos. Ou seja, parece-nos que ainda que os pais quemoram com os padrastos e madrastas de seus filhos tenham responsabilida-de aumentada, eles não atingem, em conjunto, o mesmo nível de responsabi-lidade que a de pais biológicos vivendo juntos.

Em famílias constituídas por mães e pais biológicos, houve maior por-centagem de mães que disse realizar com muita freqüência as atividades de:levar a criança para passear (40% das mães e 25% dos pais marcaram“muitas vezes”), levar ao médico (50,7% das mães e 34% dos pais), cuidarda alimentação (mães, 91,9%, pais, 70,2%) e cuidar da higiene (mães,91,8%, pais, 71,5%). Nas atividades conversar com a criança, dar presen-tes, levá-la a escola, ajudar nas atividades escolares e corrigir atitudesinadequadas, a diferença entre pais e mães foi menor que 15%, com maiorpercentagem para as mães. A única atividade na qual os pais marcaram mais“muitas vezes” foi brincar com a criança (pais, 45,6%, mães, 38,6%). Mãesque moram com o pai da criança parecem ser mais responsáveis por cuidarda saúde da criança, alimentá-la e cuidar da higiene. Atividades relaciona-

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das com educação e lazer são divididas com o pai biológico.Em famílias constituídas por mães e padrastos, as mães foram as princi-

pais responsáveis por cuidar da alimentação (69,41%) e cuidar da higiene(81,18%, padrastos, 33,3% em ambas as categorias), e por brincar com acriança (mães, 28,8%, padrastos, 0%), ajudar nas atividades escolares (mães,69,4%, padrastos, 33,3%) e corrigir atitudes inadequadas (mães, 83,5%,padrastos, 66,6%). Padrastos diferiram das mães biológicas em menos de15% na freqüência de levar a criança para passear, dar presentes, levar aomédico e levar à escola. Nestas últimas três atividades, os padrastos mostra-ram porcentagens maiores que as mães ao marcar “muitas vezes”. As mãesque vivem com um parceiro que não é o pai biológico da criança parecemser mais responsáveis por um número maior de atividades que as mães quevivem com os pais biológicos das crianças. No entanto, apesar do maiornúmero de atividades pelas quais são as principais responsáveis, a porcenta-gem com que marcaram “muitas vezes” em cada uma delas diminuiu, emmédia, 19% em relação às mães que moram com os pais de seus filhos. Estesresultados indicam que as mães que vivem com os padrastos de seus filhosdividem menos tarefas com o parceiro que as mães que vivem com os paisbiológicos de seus filhos. Entretanto, apresentam menos freqüentemente cadauma das categorias de cuidado que as mães que vivem com os pais biológi-cos de seus filhos.

Os padrastos estiveram menos freqüentemente envolvidos com a criançaque os pais biológicos. Houve uma diminuição de 41,8%, em média, na fre-qüência com que os padrastos marcaram a opção “muitas vezes” em relaçãoaos pais biológicos. Os padrastos parecem restringir a sua relação com o ente-ado a atividades relacionadas ao transporte da criança, como levá-la à escolae ao médico e a dar presentes. Uma diferença que nos chamou atenção entrepais e padrastos ocorreu na atividade de brincar. Em nossa amostra, os paisque moram com as mães de seus filhos assinalaram mais vezes que as mães aopção “muitas vezes” enquanto nenhum dos padrastos o fez. Cinqüenta porcento dos padrastos disse brincar “às vezes” com seus enteados.

Nas famílias constituídas por pais biológicos e madrastas, as madrastasmarcaram mais freqüentemente que os pais a opção “muitas vezes” nas ati-vidades de: levar a criança para passear (madrastas, 50%, pais, 11,1%),levar ao médico (madrastas, 40%, pais, 0%), e ajudar nas atividades esco-lares (madrastas, 70%, pais, 44,4%). Nas atividades de: conversar com acriança, dar presentes, brincar, levá-la a escola, cuidar da alimentação,cuidar da higiene e corrigir atitudes inadequadas, pais biológicos e ma-drastas parecem dividir a responsabilidade, diferindo em menos de 15%.

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Apesar de esta diferença ser pequena, os pais tiveram maior porcentagemque as madrastas na maioria das atividades, ao contrário de pais que vivemcom a mãe biológica da criança, que apresentaram maior percentagem ape-nas em brincar com a criança. Parece que os pais que vivem com as ma-drastas dividem mais a responsabilidade pelos cuidados com a criança queaqueles que vivem com as mães biológicas. Apesar dos pais terem apresen-tado um aumento na freqüência com que realizavam algumas atividades, afreqüência total diminuiu, em média, em 3% em relação aos pais que vivemcom as mães biológicas das crianças.

As madrastas mostraram uma diminuição de 5,3% na freqüência totalcom que marcaram a opção “muitas vezes” em relação às mães biológicasque vivem com os pais das crianças, e tiveram um aumento de 5,35% emrelação às mães biológicas que vivem com pais não biológicos das crianças.O aumento foi nas atividades: levar para passear, levar para a escola, aju-dar nas atividades escolares e corrigir atitudes inadequadas. A diminuiçãona freqüência média de fornecimento de cuidados pela madrasta em relaçãoà mãe biológica que mora com o pai da criança foi relativamente pequenaquando comparada a diminuição do fornecimento de cuidado que o padras-to apresenta em relação ao pai que mora com a mãe de seus filhos. A ma-drasta parece assumir maior responsabilidade pelos enteados que o padrastoe se envolver em um maior número de atividades de cuidado.

Quando comparadas às mães que moram com padrastos, as madrastasapresentam mais freqüentemente alguns dos cuidados avaliados. O envolvi-mento das mães em uma nova relação amorosa parece levá-las a investirmais em outras atividades além das de cuidado aos seus filhos. Se estesresultados forem confirmados em outros estudos, uma investigação maisprofunda é necessária para identificar estas atividades.

De modo geral, estes resultados mostram que os relacionamentos dospais biológicos com os filhos diferem do relacionamento de pais não bioló-gicos na direção esperada, quando considerada a teoria do investimento pa-rental: crianças vivendo com um pai biológico e um não biológico recebemmais cuidado do pai biológico. No entanto, as crianças que moram com umpai biológico e outro não biológico recebem menos cuidado total de ambosos pais que as crianças que vivem com ambos os pais biológicos.

Muitas questões devem ainda ser respondidas para compreendermos asdiferenças entre o relacionamento de pais e filhos e padrasto/madrastas eenteados. As análises aqui apresentadas tratam de diferenças entre estrutu-ras familiares, entretanto, dada a variabilidade das relações humanas espe-ramos encontrar também diferenças entre famílias com uma mesma estrutu-

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ra. Estas diferenças podem estar relacionadas às características individuaisdos pais, padrastos e crianças envolvidas.

Restam ainda questões cruciais quanto às diferenças intra-familiares nofornecimento de cuidados e aos efeitos dos cuidados recebidos de pais epadrastos no desenvolvimento das crianças com as quais convivem. Nomomento atual em que vivemos a obtenção de respostas a estas questõespodem nos levar, por um lado, a compreender melhor a dinâmica das rela-ções entre crianças e seus cuidadores e, de outro lado, a estabelecer critériosde avaliação do impacto destas relações ao longo da vida da criança.

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3AMIZADE: TÃO PERTO, TÃO LONGE

Geovana Tabachi Silva

Inicio com o seguinte questionamento teórico: como podemos identifi-car o significado das palavras liberdade, respeito à vida, solidariedade, ami-zade, sem considerarmos que elas não representam verdades atemporais?

Tarefa impossível? Talvez para os metafísicos modernos sim. Mas, paraa perspectiva relacional que será adotada aqui, essa tarefa se expõe não sópossível como condição heurística para a descrição do tema proposto, qualseja: a analogia indivíduo e sociedade pensada a partir das relações inter-pessoais de amizade em camadas pobres moradoras da favela1 da Manguei-ra, no Rio de Janeiro.

Como as definições de amizade não são fixas, porém objeto de negocia-ção, elas possuem conteúdos distintos de acordo com os contextos em que sesituam. Amizade aqui é considerada uma categoria que designa a capacidadedos indivíduos estabelecerem laços de circulação de informações entre si, queexprimem seus interesses, seus gostos, suas opiniões, seus segredos e paixões,formando com isso, uma rede de sociabilidade.

1 Enquanto categoria sociológica, as favelas têm sido tradicionalmente vistas como uma zonageo-ecológica “especial” da cidade, visualmente identificáveis por apresentarem formas deorganização sócio-espaciais próprias, diferenciadas entre si e internamente (Velho, G. &Machado, L.A . Anuário Antropológico 1976 .Organização Social do Meio Urbano. Rio deJaneiro: Brasileiro,1977.

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2 Ortega, F. (1999). Amizade e Estética da Existência em Foucault. RJ: Ed. Graal, p.155.

Essas redes podem se estabelecer espontaneamente entre os indivíduos,como é o caso das amizades. Também podem ser organizadas conforme aconvivência cotidiana de parentesco e de vizinhança ou organizadas em espa-ços sociais com determinados fins e propósitos, formais ou informais, comono trabalho, nos clubes ou associações de moradores.

Com a intenção de dilatar a percepção das relações interpessoais dascamadas populares, busco também investigar como os espaços compartilha-dos pelos indivíduos, tanto de liberdade como de risco, se desenham nafavela, uma vez que não se pode negar que seus moradores vivem sobreconstante tensão fruto do domínio dos traficantes.

Para compreender a dinâmica da política local, é relevante saber que nafavela a lei que regula a vida dos moradores e visitantes é imposta pelos“bandidos”. Mesmo que na favela da Mangueira haja “livre” circulação dosmoradores e não moradores, é primeiramente a lei do tráfico que organiza avida social. Como se houvesse uma “tensão introjetada” nas relações.

Embora meus interlocutores digam que vivem normalmente suas vidas“sem” intervenção dos traficantes, pude constatar a posteriori, pois aindahoje mantenho contatos com o morro, que essa é uma maneira de relativizaro problema e conviver com a venda de drogas e a violência que tudo issogera, já que as condições sócio-materiais que vivem não permite alteraçãonessa estrutura.

A concepção do ser humano como indivíduo moderno implica no reco-nhecimento de uma ampla liberdade de escolha. Porém são as “marcas soci-ais” que irão delimitar o campo de possibilidades dos indivíduos, acarretan-do em experiências, eventos e em circunstâncias distintas. Que marcas sãoessas? Gênero, geração, classe social, família, origem. Todas categorias for-necem um processo de modelação da subjetividade, dando sentidos diver-sos para o “eu” que precisam ser explorados.

Ulrich Beck caracteriza a sociedade moderna mediante uma individuali-zação tripla: a) deslocamento das formas sociais historicamente prescritascomo a família, o matrimônio, a profissão; b) a perda da segurança obtidamediante normas, crenças e conhecimento da ação; c) estabelecimento denovos vínculos na forma de dependência do mercado de trabalho, do consu-mo e da mídia2.

Com isso, faz-se necessário que os indivíduos passem a configurar suasvidas de forma condizente com as novas condições de existência. É preciso

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que o próprio indivíduo seja o arquiteto da sua rede de relações sociais.Assim, é importante produzir outras formas de pensar, sentir e agir já queparte dos conceitos que organizavam a dinâmica da sociedade industrialforam dissolvidos. Como alternativa capaz de produzir outras subjetivida-des, as relações de amizade podem ser condizentes com a complexidade denosso tempo.

Nesse sentido, a amizade em sua dimensão sociopolítica pode apresen-tar-se como uma alternativa. Uma relação de amizade enquanto crítica soci-al, enquanto “transversal à ordem da instituição, sem ser revolucionária fun-cionando como espaço para o desvio, sendo uma forma de se esquivar dasconvenções sociais”. As reflexões de Foucault localizam na amizade umelemento transgressivo, pois para ele, falar de amizade é falar de multiplici-dade, intensidade, experimentação, desterritorialização3.

Se essa pesquisa fosse proposta em outro contexto histórico, talvez elanão tivesse a relevância que procuro lhe dar. Refiro-me ao momento históri-co em que temas sobre favelas não deixam de ser notícia e habitarem oimaginário coletivo, principalmente por se caracterizarem por um universotomado pela violência e medo, devido à “guerra” vivida entre os traficantesde drogas, a polícia e o asfalto. Porém, mesmo diante dessa tensão e das“faltas” materiais e simbólicas, o morador da favela não deixa de viver suapoética.

Chamo de poética o desdobramento do cotidiano, a vida habitual de pes-soas comuns, cuidando de seus afazeres domésticos, levando os filhos àescola, ao balé, ao futebol, conversando com os vizinhos nas portas de suascasas, cuidando dos próprios cabelos ou massageando o da vizinha, indotrabalhar dentro ou fora da comunidade, fazendo festas (muita festa!) e esta-belecendo ou desestabelecendo seus vínculos sociais e amistosos. O aspec-to prosaico do dia-a-dia.

Nesse contexto pode-se observar a teoria de Mauss (1974), e a necessi-dade ou não de novos enfoques sobre dar, receber e compartilhar. Assim,para Marcel Mauss, ainda que a dádiva seja um princípio “primitivo”, vale-ria a pena buscar entender “se” e “de que maneira” esse princípio operariamesmo hoje dentro da chamada sociedade Ocidental4.

Assim, tem-se a idéia na qual a amizade é pensada enquanto um fenôme-no social integrado que envolve um conjunto complexo de atos de recipro-

3 Ibidem, p.157.4 Mauss, M. (1974). Sociologia e Antropologia. São Paulo: EPU, v. 1.

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cidade, no qual os atores participam trocando falas, gestos, olhares, silênci-os, enfim, todo tipo de mensagem que se possa produzir para a realizaçãopermanente da sociedade.

Como coloca Mauss, o que é trocado sob a forma de dádivas não sãoapenas bens econômicos, “trata-se, antes de tudo, de gentilezas, banquetes,ritos, serviços militares, mulheres, crianças, danças, festas, feiras em que omercado é apenas um dos momentos e onde a circulação de riquezas consti-tui apenas um termo do contrato muito mais geral e muito permanente”(p. 45). Assim as amizades podem ser pensadas como dádivas, na medidaem que com elas circulam, enquanto signos, valores e competências cultu-rais que permitem a manutenção dos vínculos sociais estabelecidos nesseespaço de sociabilidade.

Nesse intenso espaço de sociabilidade da favela, os participantes com-partilham mais do que símbolos e valores, compartilham códigos e regrassocialmente produzidos e negociados diariamente no sentido de orientar emanter as relações sociais que se estabelecem no cotidiano das interações.Assim, o valor das coisas trocadas está principalmente nos vínculos sociaisque se estabelecem entre os sujeitos.

Tal abordagem remete à possibilidade de conceber os processos comofenômenos de reciprocidade num local que considero ser exotizado peloEstado, pela mídia, pelos cidadãos, estrangeiros, pesquisadores, tanto peloaspecto prosaico quanto por sua negatividade.

Em outras palavras, tudo se passa como se os morros ou as favelas secaracterizassem pela dicotomia “bom” “mal”. Como se por um lado só hou-vesse tiroteio, venda de drogas, invasão da polícia, e meninas e meninosrebeldes e viciados indicando todo seu lado “ruim”, perigoso, sujo, e poroutro, seu lado “bom”, do samba, dos projetos de dança, teatro, hip-hop que“deram certo” e retiraram as pessoas da situação de miséria, material ousimbólica, em que viviam. Essa maneira de se produzir o universo “favela”,acaba por manter encoberto um conjunto de práticas que conformam todauma dinâmica de existência dos moradores escapando a esta dicotomia ocotidiano de pessoas comuns.

Não quero me expressar de forma romântica e negar toda a violênciaurbana da qual somos vítimas diariamente, mas criar estereótipos e tomá-loscomo verdade também levam a violência de outra espécie – a violência sim-bólica. Muito embora aqui não trato da violência física ou simbólica comocategorias centrais de meu estudo, que os moradores da favela vivem e vêemmuito próximas, elas se inserem no corpus do proposto estudo etnográfico.

Procurei demonstrar na pesquisa do mestrado de que modo, em uma

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favela, a amizade figura como elemento simbólico, ao mesmo tempo que“regula” trocas e o comportamento das pessoas e, conseqüentemente, o con-texto no qual estão inseridos. Assim, considero que quando falo de amizadeestou fazendo alusão à emoção, sensibilidades e performances, palco ativoda “vivência” ou “experiência” dos sujeitos.

As amizades na cultura contemporânea ocidental emergem com outraresponsabilidade, já que os vínculos amistosos encontram-se num lugar detransição ou regulação na morfologia social, porque elas passaram a ser a“via alternativa” nas quais as relações sociais se desdobraram. Assim comoa família e as relações sexuais, as relações de amizade foram tocadas pelaconcepção individualista do sujeito. Outrora, ensejavam laços permanentes,baseados na honra e ultrapassando o tempo e o espaço, bem como as fron-teiras políticas, onde o ideal era a valorização da lealdade; esse ideal deamizade se alterou sensivelmente e não se trata mais de uma categoria natu-ralizada e nunca problematizada.

O ideal moderno ocidental de amizade está associado á relações “voluntá-rias”, íntimas e informais, em que os compromissos são “abertos” e baseadosem “escolhas”, sendo pautados na vontade e no desejo, ao invés de compro-missos estabelecidos via contrato explícito, ou constituídas de atributos insti-tucionais, tais como o casamento e as relações trabalhistas, pautados nas tro-cas racionais e na divisão formal de trabalho.

Embora a amizade se constitua num primeiro momento, de um idealmoral pautado na “escolha”, na intimidade e na pessoalidade, nem sempreessa “escolha” se dá por questões somente subjetivas. O que procuro apon-tar refere-se ao fato de que mesmo se em outras circunstâncias não se esco-lhesse relacionar com essas pessoas, a convivência as coloca num grau deintimidade, de informalidade, que nem sempre remete a uma amizade. Por-que mesmo que os moradores da favela – parentes, vizinhos ou os conheci-dos – não mantenham um vínculo amistoso e apenas se relacionem cordial-mente, penso que não é possível negar a cumplicidade de se co-habitar emmoradias tão próximas.

Num lugar onde se tem porta com porta, parede com parede, janela comjanela, a intimidade acaba sendo partilhada de maneira compulsória, mesmoque seja velada. Porém, torna-se um questionamento saber se a relação deconvivência remete ao amigo em alguns momentos e, em outros, o que setem é a cumplicidade cotidiana. Ou seja, as características tradicionais doamigo implicam em afinidade, confiança, cumplicidade, lealdade, sinceri-dade, porém essas categorias podem aparecer sem que o vínculo amistosotradicional seja condição.

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Os limites impostos pelo próprio processo de difusão do ideário moder-no na sociedade ocidental são marcados, por vezes, por descontinuidadesou mesmo rupturas entre sua configuração hegemônica de valor, o individu-alismo, e a configuração de valor hierárquica. Nesse sentido, nota-se que aprodução interiorizada de pessoa, não atravessa todos os espaços sociais damesma forma.

Segundo estudos, é uma tendência que as classes populares sejam mar-cadas por ideologia personalista e hierárquica do mundo em contraposiçãoàs classes médias, marcadas por ideário individualista e igualitário5. Assim,os segmentos sociais pobres produzem estilos de vida diversos se distin-guindo principalmente pelas condições de acesso a eles. Como essas carac-terizações não cobrem a intensidade dos vínculos sociais é importante am-pliar a discussão, buscando etnograficamente outros modelos mais próxi-mos do contexto a ser observado.

O fato de nas classes populares as pessoas serem pobres, algumas exclu-ídas do processo de produção, as coloca em situação sócio-material despri-vilegiada em relação às camadas médias. Em relação a si própria, as classespopulares, também não são homogêneas. O fato de ser pobre não necessari-amente o isola de ser parte integrante do todo, embora sofram a ação dessaintegração.

Contudo, como aponta Silver (1989), uma vez excluídos do processoprodutivo de trabalho, das trocas de mercado e transações burocráticas –onde muitos trabalham, mas não têm condições de ter uma vida diferente –estão quase totalmente voltados para a manutenção de atividades essenciais,cumprindo os compromissos básicos da vida diária, onde se inserem as rela-ções pessoais e afetivas6.

Desse modo, a amizade pode ser vista como uma dádiva. Aquilo quecircula na sociedade em prol do laço social, que mescla, ao mesmo tempo,liberdade e obrigação, interesse e desinteresse, uma vez que além do inte-resse, há obrigação, espontaneidade e prazer.

Conceituar ou definir amizade não é tarefa fácil, mesmo quando se pen-sa o termo etnograficamente. Em princípio é um conceito familiar, porémbasta uma pequena reflexão para se constatar sua complexidade e observarque é possível encontrar mais de uma definição satisfatória para a palavra

5 Duarte, L. F. (1988). Da vida nervosa nas classes trabalhadoras urbanas. Rio de Janeiro:Zahar.

6 Silver, A (1989). Amizade e confiança como ideais morais: uma abordagem histórica.Tradução: Rodrigo Aga. Archives Européenes de Sociologie, 30 (2), 274-297.

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amizade. Basta para isso tomá-la em contextos específicos e em distintoscenários da história.

Se consultarmos a definição de amizade num dicionário, ela se apresen-tará como um “substantivo feminino abstrato que indica afeição, estima,dedicação recíproca entre pessoas do mesmo sexo ou de sexos diferentes”(Koogan/Houaiss,1993). Porém, se formos buscar na história em épocasdiferentes esse entendimento apresentará conteúdos e significados distintos.

Na concepção ocidental moderna, a noção de pessoa está voltada para oindivíduo autônomo capaz de escolher sem interferências externas. Amiza-de é concebida enquanto uma relação expressiva, uma revelação mútua dosdesejos expressos na relação, do “eu”, da intimidade e da confiança, onde asnormas da relação são elaboradas e negociadas entre amigos. Seria o refú-gio da vida pública e de todas as suas obrigações de maneira que fiquemassegurados os aspectos privado e pessoal, afetivo, voluntário e igualitárioda amizade7.

A noção nativa de amizade que encontrei, enquanto sinônimo dos ter-mos confiar, ajudar, colaborar, compreender, compartilhar, resolver, entre-gar, dividir, oferecer apresenta-se como discurso que “deve ser compreen-dido enquanto atos pragmáticos e performances comunicativas não ape-nas sobre sentimentos, mas também sobre questões tão diversas quantoconflitos sociais e relações de gênero” 8. Dito de outro modo, a amizade étomada como uma palavra que designa um modo de ação, onde importatanto o que é dito quanto o contexto no qual se insere.

Embora a igualdade não seja um conceito universal e não seja condiçãopara que o vínculo amistoso se estabeleça, sua valorização é relevante, alémdisso, a identidade entre amigos também é outro aspecto comum na consti-tuição da amizade. Entretanto, numa relação de igualdade ou de desigualda-de o que vai regular as trocas é a confiança, que indicará uma simetria res-peitável de sentimentos e serviços. Por isso, faz-se necessário saber quaisformas de relacionamento, igual ou desigual, serão consideradas como cri-térios para se estabelecer tal afetividade.9

Assim, emerge tanto relações “pessoais” como relações “impessoais”. O“pessoal” remete esfera do privado e o “impessoal” ao domínio público e

7 Rezende, C.B. (2002). Os significados da amizade: duas visões de pessoa e sociedade. Riode Janeiro: FGV.

8 ibidem, p.26.9 Silver, A (1989). Amizade e confiança como ideais morais: uma abordagem histórica.

Tradução: Rodrigo Aga. Archives Européenes de Sociologie, 39 (2).

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contratual. Entretanto, na sociedade moderna a relação de amizade irá seestabelecer à medida em que for “mais voluntária possível”, considerandoo contexto envolvido. Ou seja, a cultura contemporânea permite, como afir-ma Simmel, que a “impessoalidade” tome outro sentido. O fato da relaçãode amizade ser constitutiva apenas de elementos desejáveis a liberta de com-promissos “instrumentais”, dando-lhe caráter “voluntário” e “pessoal”. Dessemodo, permite-se dizer que as relações entre amigos assumam característi-cas tanto iguais, quanto desiguais, pessoais, quanto impessoais.

Como as amizades são constituídas de modo diferenciado, de acordocom a relação estabelecida e seus pilares sejam a confiança, o tempo e aintimidade, outras categorias como sinceridade, inveja, tempo, igualdade,(im)pessoalidade, gênero e sexo, também são elementos constitutivos dasubjetividade formadora da relação e se apresentam de maneira situacional,onde ações as contingenciam e por elas são contingenciadas.

Sendo assim, a melhor maneira de conhecer o outro, ter credibilidade morale ser íntimo é através da confiança. Pelas vias da confiança se amenizam asincertezas e inseguranças trazidas pela modernidade, podendo-se circular tan-to em contextos institucionais quanto domésticos, á medida que a categoriaconfiança ‘horizontaliza’ as trocas entre amigos, e pode ser observada tantoem discursos de camadas médias quanto de camadas populares.10

Estabelecer limite entre essas duas esferas seria reprimir as potenciali-dades dos laços entre os amigos, haja vista que o ideal de amizade pode serentendido como um padrão pelo qual se avaliam os comportamentos, nãoefetivamente como se dão na prática. Torna-se mais relevante aqui ás inten-ções, a solidariedade com o problema do outro, o desejo e a vontade deajuda mútua.

Foi nesse sentido que, como em Buffault (1996), precisei “distinguir aamizade da sociabilidade e do convívio, que não a resumem” 11. O que en-contrei em campo foram fragmentos singulares de amizade, que me permiti-ram entender o quão complexa ela é e o quanto de cuidado ela exige de umaanálise, o qual me dedicarei em tê-la.

Talvez, e provavelmente, quando eu retornar ao local da pesquisa, al-guns dos laços de amizade estarão desfeitos, outros realizados. Reafirman-do que o perto corpóreo da convivência diária massificante também é o

10 Rezende, C.B. (2002). Os significados da amizade: duas visões de pessoa e sociedade. Riode Janeiro: FGV.

11 Vicent-Buffault, A. (1996). Da amizade: uma história do exercício da amizade nos séculosXVIII e XIX. Rio de Janeiro: Zahar , p.230.

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longe das “afinidades”, reconfigurando um outro desenho do diagrama quese constitui o espaço de alta densidade demográfica que é a Mangueira. Tãoperto, tão longe.

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4A CONFIANÇA COMO ELEMENTO DAS RELAÇÕES

INTERPESSOAIS NO AMBIENTEORGANIZACIONAL

Marilene Olivier

1. Introdução

A história revela grandes conquistas e perdas incomensuráveis, tendocomo mola propulsora a confiança ou seu reverso. Eventos ocorreram por-que os homens confiaram uns nos outros e grandes catástrofes também sefizeram presentes pela desconfiança. O ser humano é um ser social que car-rega consigo o paradoxo da necessidade de conviver com outras pessoas e,ao mesmo tempo, as dificuldades de manter essas relações de forma harmo-niosa, equilibrada.

A sociedade é constituída de pessoas que se agruparam, se organizarame construíram redes complexas de relacionamentos. Tanto o funcionamentoquanto as relações existentes nessas redes são determinadas por valores enormas de natureza: pessoal, jurídica e social. Em qualquer dimensão estu-dada existe um elemento que se evidencia como básico, fundamental, para aqualidade desses relacionamentos, que é a confiança.

O tema vem sendo abordado por diversos ângulos já faz mais de duasdécadas, mas ainda não se chegou a um consenso sobre seu significado enão existem estudos no sentido de um mapeado do que já existe produzido.

No caso da administração a confiança vem sendo tratada dentro do para-digma funcionalista, por meio de propostas da economia de mercado e dos

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interesses do capital, no sentido de atrelar dois focos, quais sejam: moderaro risco envolvido e garantir benefícios futuros. Assim, foi tratada enquantorelações entre blocos econômicos, países, governos (setor público), cadeiasprodutivas, arranjos produtivos, empresas e consumidores.

No levantamento realizado, observou-se que existem poucos trabalhoscom foco no indivíduo e nas relações interpessoais, no âmbito organizacio-nal. Dessa forma, foram identificados os conceitos de confiança nas pesqui-sas já encetadas para, então, discutir o tema considerando-se as relaçõesinterpessoais nesse ambiente.

2. Conceituação

Toda discussão requer que se faça ex-ante, uma definição dos principaisconceitos que a envolvem. No entanto, ao se tratar da confiança a propostatorna-se difícil, pois apesar de ser uma expressão amplamente referenciadano cotidiano das pessoas, não existe um consenso entre os autores sobreuma definição única (Hosmer, 1995). Confiança é um construto complexo,de difícil entendimento. Autores tendem a ver a confiança no contexto desuas respectivas áreas de atuação acadêmica, o que gera diferentes defini-ções e, algumas vezes, contribui para a confusão a respeito do conceito e decomo ela ocorre.

Na década de 1990 Hosmer (1995) e Rousseau, Sitkin, Burt e Camerer(1998) já afirmavam que o termo estava sendo usado com sentidos diversosresultando em uma variedade de definições que dificulta o mapeamento deseus significados. Esses autores deixam o leitor com a impressão de quepouco pode ser feito para entender a origem da confiança organizacional ouos níveis de influência da confiança entre indivíduos (Mayer, Davis & Schoo-man, 1995).

Devido a essa variedade, o termo confiança é freqüentemente aplicadode forma inconsistente e inapropriada, gerando dificuldade mesmo entrepesquisadores no momento de decidir sobre seu significado e quando eleocorre. Devido a essa particularidade, de acordo com Mello e Teixeira (2004)a confiança é um construto em construção.

Muitas definições focam a tendência do indivíduo para correr risco tor-nando-o vulnerável e ao mesmo tempo aberto a receber um benefício ou umprejuízo, pois o risco está implícito no processo. Isso vem sendo interpreta-do de acordo com área na qual o pesquisador está inserido. A vertente maisrecente está relacionada aos valores, sobretudo os coletivistas.

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Romano (2003) buscou identificar as principais características da confi-ança, em termos de construto, quais sejam: natureza, componentes e dimen-sões. Quanto à natureza a confiança pode ser atitudinal, social, adaptativa efuncional. Esse tratamento ajuda a compreender um pouco o que ela é e oque não é. Os componentes da confiança, por seu lado, definem os senti-mentos a ela inerentes, que são: hipotético; conseqüencial e motivacional.Em termos da dimensão, contempla os julgamentos que os níveis de confi-ança provocam, podendo a confiança ser: simétrica, incremental e condici-onal. O trabalho abrange boa parte do conteúdo tratado por outros autores,como se pode perceber ao comparar a classificação com o resumo do Qua-dro 01 no qual se pode ver que os conceitos envolvem sentimentos, atitudes,comportamentos e valores.

Conceito

Comportamento

Crença

Estado psicológico representadopor uma pré-disposição

Expectativa sobre a conduta dooutro

Credibilidade

Lealdade

Confidência

Cooperação e colaboração

Risco e vulnerabilidade

Atitude

Autores

Deutsch (1958); Curral e Judge (1995)

Giffin (1967); Holmes e Zanna (1985);Schlenker, Helm e Tedeschi (1973)

Cook e Wall (1980); Mayer, Davis eSchoorman (1995); Mcallister (1995); Mishra(1996); Doney, Cannon e Mullen (1998);Williams (2001) Rotter (1967) Whitener,Brout, Korgaurd, Werner (1998)

Rotter, 1967; Frost, Stimpson e Maughan(1978); Rempel, Holmes e Zanna (1985);Curral e Judge (1995); Mayer, Davis eSchoorman (1995)Lewicki McAllister e Bies(1998, p. 439)

Butler (1999)

Rich (1997)

McAllister (1995)

Burt e Knez (1996); Powell, (1996); Mayer,Davis e Schoorman (1996)

Sheppard e Sherman (1998); Doney, Cannon eMullen (1998); Giddens (1991); Johnson,George e Swap (1982); Mayer, Davis eSchoorman (1995); Elangovan e Shapiro (1988)

Rotter (1967); Scott (1980); Costa, Roe eTaillieu (2001); Jones e George (1998);Rousseau et al (1998)

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Autores

Luhmann (1988); Mayer, Davis e Schoorman(1995)

Kee e Knox (1970)

Clark e Payne (1997); Cummings e Bromiley(1996); McKnight, Cummings e Chervany(1998); Whitner, Brodt, Korsgaard e Werner(1998)

Doney, Cannon e Mullen (1998); Harris eDibben (1999); Mayer, Davis e Schoorman(1995); Whitener, Brout, Korgaurd, Werner(1998)Jones e George (1998)

Whitener, Brout, Korgaurd, Werner (1998);Harris e Dibben (1999); Doney, Cannon eMullen (1998); Whitener, Brout, Korgaurd,Werner (1998)

Ganesan (1994)

Misztral (1996)

Tocqueville (2000)

Tonnies (2002)

Parsons (1974)

Conceito

Forma de manifestação

Fenômenos subjetivos definidospor experiências psicológicas

Pensamentos, sentimentos eintenções comportamentais,intuição (cognitiva, afetiva,comportamental)

Função dos valores pessoais,experiência de vida,personalidade (dimensãopsicológica)

Função dos valores culturais

Credibilidade e benevolëncia

Bem comum (valor social)

Princípio moral, Capacidade decomprometer-se com padrõessociais

Virtude

Mecanismo de integração social(atitudinal)

Quadro 1: Focos de Estudo sobre a Confiança

Para estudar a confiança no âmbito das relações interpessoais, é precisoanalisa-la enquanto um fenômeno subjetivo, definido pelas experiênciaspsicológicas do indivíduo, que culminam em atitudes, podendo então sercaracterizada em termos de pensamentos, sentimentos, intuição e intençõescomportamentais. Dessa forma, interliga três componentes: sentimentos denatureza cognitiva, afetiva e comportamental. Porém é importante registrarque, enquanto comportamento a classificação sofre críticas, porque é possí-vel encontrar cooperação entre as pessoas, sem que necessariamente umcomportamento de confiança seja observado. Essa cooperação poderia serfruto, por exemplo, de normas e regras estabelecidas, ou até mesmo de am-bientes nos quais o dual coerção-submissão é o imperativo.

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Relacionamento e Administração: A confiança como elemento das relações interpessoais no ambiente organizacional

Dentro de uma perspectiva psicológica a confiança pode ser tratada tam-bém como um traço pessoal, característico de cada indivíduo. Os estudosabordam aspectos das diferenças individuais de personalidade e o efeito quepossuem sobre o desenvolvimento da confiança. Nesse sentido abre diver-sas possibilidades em termos do grau de predisposição a confiar em umoutro, com base na sua experiência de vida, em contextos e situações simila-res. Deve-se então levar em consideração duas outras características pesso-ais de quem confia, como elementos influenciadores das relações de confi-ança: a auto-eficácia de quem confia e seus valores.

Considerando então que a confiança seja uma função dos valores pesso-ais, que guiam comportamentos e crenças, acredita-se que eles possam serelementos facilitadores ou de retardamento da construção inicial da confi-ança, do processo de formação da confiança adotado e do tipo de relaçãoque se estabelece. Esses valores culturais segundo a concepção de Schwartzpodem ser classificados em duas dimensões, a individualista e a coletivista,que serviram de base para o trabalho de Gouveia, Martinez, Meira e Milfont(2001) e Hofstede (2001) e Triandis et al.(1988). Estes últimos identificarmdimensões de valores culturais que incluem: distância do poder, aversão àincerteza, machismo versus feminismo, orientação de curto prazo versusorientação de longo prazo e o dual individualismo-coletivismo, pode serentendido segundo três fatores, quais sejam: competição, preocupação comos demais e distância do grupo, o que permite trabalhar com contínuos deescala tipo Likert em pesquisas de natureza quantitativa.

A base para estruturação dos valores coletivistas é o grupo, que define asnormas sob as quais as pessoas adotarão seu comportamento, de forma indi-vidual. Há uma submissão ou uma congruência entre os interesses do indiví-duo e do grupo, o que parece gerar mais harmonia, reduzidos níveis de com-petição e insegurança, resultando na presença de um número menor de fato-res estressores. Essa interdependência pode ser assimilada como um devermoral, uma vez que indivíduos cuja orientação seja coletiva tendem a inte-ragir de forma cooperativa e interdependente, com alta lealdade para comos demais e para com a organização, pois o grupo se torna mais importantedo que o indivíduo. Assim, confiança é importante para a construção deblocos de comportamentos coletivos bem como para a operacionalizaçãodas organizações sociais e das instituições (Triandis & Hui, 1990; Triandiset. al, 1988, Doney, Cannon & Mullen, 1998; Gouveia, Martinez, Meira &Milfont, 2001) .

Para os individualistas o foco está nas preferências de cada um e naanálise de custo-benefício. Indivíduos com essa orientação tendem a intera-

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

gir de forma competitiva, com baixa lealdade para com os outros e para coma organização (Doney, Cannon & Mullen, 1998), dificultando a formaçãode relações de confiança. A Interdependência assume um caráter utilitaristaem termos de trocas sociais (Triandis & Hui, 1990). Essa orientação é ego-cêntrica, pois, conforme Gouveia, Martinez, Meira e Milfont (2001), colocao indivíduo acima dos grupos em todos os aspectos. Isso conduz à possibi-lidades de relacionamentos freqüentes, porém, sem a garantia de estabilida-de. São chamados relacionamentos contratuais, nos quais a confiança pes-soal parece intimamente ligada aos padrões de comportamento descritospelo utilitarismo racional.

A racionalidade individual surge quando o potencial de ganhar é maiordo que de perder e a confiança nas relações tem como base a garantia dassanções negativas. No caso das relações interpessoais essa dimensão nãoexiste, pois está fora do contexto legal e formal. Por outro lado, se o cálculoracional dos objetivos e realizações não for capaz de reduzir os fatores derisco ao mínimo, ou ator não conseguir perceber os fatores de incerteza,excedendo sua capacidade racional, então a confiança pode ser vista comoum recurso psicológico, podendo até se transformar em uma obrigação mo-ral para com seu parceiro. Ainda dentro dessa construção, a confiança pes-soal pode, também, ser mútua quando funciona como capital social e servepara a regulação e para a predição de relações. Ela torna-se então um recur-so essencial na integração social e a base atitudinal para as relações solidá-rias entre os indivíduos e as instituições que fazem parte deste sistema (Par-sons, 1974).

3. Confiança e ambiente organizacional

Para compreender melhor a confiança nas relações interpessoais, faz-senecessário resgatar as idéias centrais de Bowlby (1994) (apud Bowlby &Dutra, 2004) e, também de Abreu (2005) que traçaram sua origem a partirda infância. Em suas discussões sobre os estágios de desenvolvimento, elesmostram que a criança aprende a confiar bem cedo e exploram o desenvol-vimento da confiança para indivíduos ao longo de um contínuo, com a con-fiança em um extremo e a desconfiança em outro. As pessoas têm dificulda-de em seus relacionamentos até se sentirem seguras de que podem confiarnaqueles que deles fazem parte. A Teoria do Apego torna-se então relevantepara a compreensão do papel da confiança nos relacionamentos.

Dentro dessa linha a definição desenvolvida por Lewicki, McAllister e

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Relacionamento e Administração: A confiança como elemento das relações interpessoais no ambiente organizacional

Bies (1998) trata a confiança como uma expectativa positiva sobre a condu-ta do outro, com quem o sujeito se relaciona, o que abre a possibilidade detornar-se vulnerável, uma predisposição natural a confiar, que influencia oquanto a pessoa será capaz de se entregar à outra, antes de obter informa-ções adicionais que permitam avaliar melhor em quem se está confiando.Nesse sentido, implica em assumir o risco inerente da relação, o que remeteao pressuposto de que quem confia tem algo a perder. No entanto, a confian-ça pode assumir também um caráter de gratuidade, de doação, de solidarie-dade, a partir do qual o risco, a perda, deixa de existir. Nem todos os autoresconcordam com a existência da dicotomia confiança-desconfiança.

Estudos das relações interpessoais de confiança no contexto organizaci-onal tendem a concentrar-se nos gestores, ignorando o potencial social dosbenefícios que podem emergir entre os colaboradores. Ao se investigar ainfluência da confiança entre os colegas de trabalho sobre o ambiente orga-nizacional e suas atitudes pode-se dizer que a confiança revelou-se um pre-ditor significativo da percepção do suporte organizacional e do grau de com-prometimento emocional. Há, portanto, a possibilidade de as organizaçõesmelhorarem as relações afetivas entre os indivíduos em seu ambiente com odesenvolvimento de relações interpessoais que incluam a confiança comoelemento central. Um dos caminhos percorridos foi o da aprendizagem edesempenho organizacional (Zand, 1972; Adams, 2004), mas nota-se clara-mente que essa escolha para estudo sofreu a influência do paradigma fordis-ta e do foco funcionalista de gestão predominante no meio empresarial. Osautores afirmam a importância de entender melhor a confiança organizacio-nal, porque a sobrevivência das organizações na economia globalizada de-pende em parte dos indivíduos que a compõem. Essa influência chega a talponto, que até os dias atuais o conceito é mal interpretado, ignorado em suaessência ou utilizado como ferramenta para otimização dos recursos, sem apreocupação com as pessoas. Entende-se que a confiança deva ser tratadacomo um elemento natural das relações e não usada como elemento de pro-dutividade no curto prazo.

Pesquisadores afirmam que a confiança interpessoal entre os empregadosconstitui-se no lubrificante do desenvolvimento do capital social nas organi-zações (Spagnolo, 1999). Porém, ao se tomar o conceito de capital socialcomo o valor inerente encontrado nas relações humanas construtivas e nasconexões dentro do local de trabalho como um fator de sustentação da vanta-gem competitiva (Barney, 1991; Nahapiet & Ghoshal, 1998), como um ele-mento de redução do custo das transações (Barney & Hanson, 1994), comofator motivacional da aprendizagem organizacional (Bouty, 2000), como esti-

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

mulador para se compartilhar do conhecimento, como estímulo à inovação(Cooke & Wills, 1999) e facilitador de melhores desempenhos financeiros(Waddock & Graves, 1997), vê-se, mais uma vez, uma concepção utilitaristapara a confiança, baseada nos resultados funcionais que dela advêm. Commais ênfase isso aparece em trabalhos que incorporaram uma dimensão eco-nômica ao conceito, como no caso de Wicks, Berman e Jones (1999) e Jonese George (1998) que acreditam que as organizações deveriam adotar a confi-ança como uma boa estratégia para retorno dos investimentos, uma vez que aatitude da pessoa que confia é funcionalista por natureza. Este elemento con-duz a aos extremos racionais de confiar ou desconfiar. Porém, dado a naturezasubjetiva da experiência relacionada à confiança, de acordo com Kee e Knox(1970) (apud Romano, 2003) não é aconselhável defini-la na perspectiva deum recurso, muito embora as atitudes daquele que confia tendam a seguircaminhos de seus próprios interesses. Ou seja, quando um indivíduo confia noseu colega de trabalho, ele fará um julgamento favorável das suas atitudes, demodo geral, sendo o inverso também verdadeiro, ou seja, quando não existe aconfiança, elementos desfavoráveis permearão as relações entre os sujeitosenvolvidos.

Assim, a confiança é considerada funcional quando a atitude a ela refe-rente, em qualquer nível, produz, necessariamente, resultados esperados poraquele que confia. Segundo Zand (1972) essa funcionalidade dá à confiançae aquele que dela faz uso, um caráter de controle, no sentido de manejar ascoisas de acordo com seu interesse. Para Das e Teng (1998) alguns autoresadmitem a existência de uma relação linear entre a confiança e o controle,mas isso pode ser um equívoco. Há possibilidade de que ao existir a confi-ança exista também um certo grau de influência sobre o outro, ou sobre asituação, por meio da confidência. Parece lógico que indivíduos que nãoconfiam em seus colegas de trabalho também possuem um baixo grau deconfidência em relação a eles, diminuindo o nível de confiança entre ambos.Entretanto, uma relação linear entre confiança e controle não é suficientepara explicar a natureza funcional da confiança em todos as situações.

Em termos gerenciais autores como Creed e Miles (1996) (apud Adams,2004) afirmam que os custos decorrentes da falta de confiança são maioresdo que os investimentos que nela se faz. Davenport e Pruzak (1998) (apudAdams, 2004) encorajam os líderes a tornarem a confiança visível e clara ea adotarem um modelo de confiança no ambiente organizacional, pois afalta da confiança pode reduzir a amplitude das relações interpessoais notrabalho dificultando o compartilhamento de informações, idéias e o senti-mento de pertencer à organização. Esses argumentos estão alinhados com

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práticas gerencias relacionadas às pessoas, que se configuram como domi-nadoras e reguladoras.

A partir desse raciocínio, no contexto gerencial, a confiança significa en-tão, segurança de procedimento. Mas em termos de relacionamentos, trata-sedo quanto se pode contar com o outro, considerando seus valores pessoais, ouseja, crer na honradez daquele com quem se mantém um relacionamento. Comoas pessoas temem o que desconhecem, a confiança nasce do cumprimento dosacordos, da manutenção da palavra empenhada, da garantia de se apoiar ooutro, e isso leva tempo. Ainda é utópica a idéia da tendência de se confiar nooutro por intuição ou de forma natural, sem conhecimento prévio daquele quese encontra pela primeira vez em uma relação. A crença de que o ser humanotem boa índole, é cooperativo por natureza, confiável, ético, solidário, tole-rante ainda não está constituída. Diante do mundo globalizado, no qual não hámais espaço para a estabilidade e longevidade do vínculo empregatício, otempo de permanência das pessoas nas organizações tem diminuído a cadadia. Além disso, por decorrência da estrutura do mercado de trabalho no to-cante a oferta de mão-de-obra e disponibilidade de vagas, passou a existiruma competição acirrada entre as pessoas não só fora como no ambiente orga-nizacional. As exigências por produtividade, qualidade e demais procedimen-tos tem levado os trabalhadores e as empresas a se tornarem mais preocupa-dos consigo mesmos, com seus objetivos. A qualidade das relações se resumeao cumprimento das obrigações contratuais e, não raro, à submissão dos em-pregados às condições determinadas por processos de produção que invadema esfera da privacidade das pessoas, alterando suas relações familiares e soci-ais de forma negativa. Dessa maneira, parece haver no ambiente de trabalhouma certa dificuldade em se manter a qualidade das relações interpessoais,devido à redução nos níveis de confiança, que transcende os aspectos mera-mente legais.

Ao se considerar as teorias de gestão mais recentes, observa-se, pelo me-nos no discurso, que os controles tradicionais baseados na autoridade e nopoder parecem ceder lugar ao auto-gerenciamento e auto-controle, à descen-tralização das decisões e ao compartilhamento de informações. Isso requerum comportamento cooperativo e de confiança entre os indivíduos, grupos eelementos que representam as organizações na cadeia e nos arranjos produti-vos. No entanto, essa confiança adquire um tom de garantia da competência eda execução, ganhando um ar de artificialidade que não atende aos reclamesdas relações interpessoais, ficando apenas na esfera da formalidade. Por outrolado, um grande número de empresas tem, também, implementado programasde qualidade total, cujas regras e funcionamento mostram claramente a falta

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de confiança nas pessoas e em seu desempenho, uma vez que o nível de con-trole é muito alto e intensos são os imperativos das auditorias. De modo geral,os gestores desempenham um papel crucial no desenvolvimento da confiançadesde que eles controlem o fluxo da informação quer seja compartilhando ounão essa informação, o que é coerente com as observações de Albrecht e Tra-vaglione (2003); Laschinger, Finegan, Shamian, e Casier (2000) de que osestudos sobre a confiança nas relações interpessoais tendem a se concentrarna confiança dos gestores ou na reciprocidade da confiança inerente ao subor-dinado a que a confiança organizacional se refere. Esse foco é compreensívelconsiderando-se o impacto da confiança do gestor sob diferentes relatos defatores de desempenho. Entretanto as pesquisas sobre a confiança no gestor,de modo geral, ignoraram as relações de confiança em nível dos empregados.Apesar disso, na opinião de Chattopadhyay e George (2001); McAllister (1995);Cook e Wall (1980), o problema dos seus efeitos ainda não tem recebido umaatenção sistematizada. O que se pode perceber, apesar de tudo, é que o grau deconfiança nas organizações depende da filosofia gerencial, das ações organi-zacionais, da estrutura e da expectativa de reciprocidade dos empregados.

A confiança já foi tratada também sob uma vertente humanista, que hojese encaixa no conceito da gestão holística em relação ao ser humano. ParaCook e Wall (1980, p. 39) a confiança é “a extensão com alguém mostraboas intenções para com o outro por meio de confidências em suas palavrase ações”. Guibert e McDonough (1986, p. 175) já afirmavam que “confian-ça é relevante se ou não um indivíduo é capaz de valorizar o que o outro é edemonstrar respeito por ele particularmente quando esse indivíduo necessi-ta e quando outras pessoas consideram aquela ação momentaneamente com-petitiva”. Carnavale e Wechsler (1992, p. 473) descrevem a confiança comouma expectativa da “ética, da clareza e do comportamento que não intimidae causa ansiedade, tensão para com os direitos do outro”. Segundo Mishra(1996, p. 265) (apud Tschannen-Moran & Hoy, 2004) a confiança é “a cum-plicidade de alguém a ponto de se tornar vulnerável ao outro baseado nacrença de que a outra parte é competente, aberta, cautelosa e confiável.” Asdefinições oferecidas por Currall e Judge (1995); Mayer e Davis (1999);Albrecht e Travaglione (2003) defendem essa proposição afirmando que a“confidência para agir” é uma das características da confiança. Por fim, adefinição dada por McAllistar (1995, p. 25), embora anterior a algumas,consolida as idéias da confiança enquanto identificação interpessoal ao afir-mar que é “a extensão do quanto alguém se faz confidente a outro e estápronto para agir em termos de palavras, ações e decisões desse outro”. Aqueleque confia faz um investimento emocional na relação, demonstrando um

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Relacionamento e Administração: A confiança como elemento das relações interpessoais no ambiente organizacional

cuidado e uma certa preocupação a respeito da outra parte envolvida, quan-do ela não apresenta os elementos necessários para garantir uma relaçãosatisfatória.

Barnard (1974), Whitener, Brout, Korgaurd, Werner (1998) já afirmavaque uma das responsabilidades fundamentais do líder é incentivar a coopera-ção entre empregados e grupos dentro das organizações que só sobreviverão,crescerão e permanecerão no mercado se a integridade e a confiança estive-rem presentes entre seus valores. Para eles existem cinco categorias que ca-racterizam esse processo: consistência comportamental (integridade), com-partilhamento, descentralização do controle, comunicação e demonstração decuidado (proteção). Essas cinco categorias aparecem também no trabalho deShockley-Zalabak, Ellis e Winograd (2000) como os fatores da confiança noambiente organizacional. Acredita-se, portanto, que os pesquisadores aindaestejam aprendendo sobre a confiança nas organizações, considerando-se osefeitos dos dispositivos de confiança nas atitudes das pessoas.

Ao se observar os trabalhos de Gurtman (1992), Sorrentino, Holmes,Hanna e Sharp (1995), percebe-se que já existia a vertente que acreditava nainclinação natural das pessoas para confiarem no outro. Mais recentemente,estudos feitos por Tan e Tan (2000) e Laschinger, Finegan, Shamian, e Casi-er (2000) sugerem que a confiança influencia emocional e continuamente ocomprometimento. Andersson e Bateman (1997), Butler (1999), e Rous-seau e Tijoriwala (1999) registram que as atitudes tendem a mudar quandonão há confiança entre as pessoas. Em termos mais amplos, a confiançapode ser ainda um conjunto de pensamentos para operacionalizar comporta-mentos de cidadania (Robinson; Morrison, 1995), satisfação no trabalho(Cunningham; MacGregor, 2000) e reduzir aquilo que não traz satisfação(Cook; Wall, 1980).

Numa outra dimensão para o ser humano, Sheppard (1998) enfatiza queexiste um contrato psicológico de confiança entre a empresa e seus empre-gados, que se quebrado, pode desestabilizar ambos os lados envolvidos narelação, aparecendo emoções fortes que podem ser traduzidas em raiva efrustração. Na mesma via, Bies e Tipp (1996) (apud Adams, 2004) afirmamque a mentira, o roubo e o abuso de autoridade são elementos que podemcausar a quebra da confiança e, ao mesmo tempo, gerar sentimentos de vin-gança e violência.

Como se vê, existe uma necessidade de se clarificar o conceito, devido àsua importância para as relações de trabalho. Embora vasta, observou-seuma certa deficiência na bibliografia disponível, pois os pesquisadores nãotêm conseguido explorar (identificar e analisar) as origens da confiança or-

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ganizacional por meio da análise das relações entre adultos e da propensãoà confiar que trazem individualmente para o ambiente de trabalho. Essa pro-pensão à confiança é a base da confiança interpessoal desenvolvida entrecrianças e aqueles que dispensam os primeiros cuidados (usualmente a mãe)(Bowlby & Dutra, 2004, Abreu, 2005; Collins & Read, 1990; Hinde, 1998;Klohnen & Bera, 1998). As primeiras relações entre as crianças, modifica-das por experiências, de vida têm mostrado substancial influência nas rela-ções íntimas entre adultos, como reportam Bartholomew (1990), Hazan eShaver (1987), Johnson (1981) e outros pesquisadores.

É lamentável que o apego (sentimento) nas relações de adultos e a con-fiança interpessoal tenham sido ignoradas ou tratadas superficialmente nosestudos de administração, em que pese amplamente demonstrada a dimen-são de sua importância para as pessoas enquanto seres humanos, fora dasorganizações, sobretudo no ambiente familiar. Os gestores não têm dado adevida atenção a elementos como amizade e confiança nas relações dentrodo contexto laboral. De acordo com Pistole (1993), Wheeless e Grotz (1976)a formação de amigos no ambiente de trabalho é facilitada pela aberturaemocional de cada um (emotional self-disclosure – ESD). Isso significa quea troca de informação emocional nessas relações é de natureza recíproca.Acredita-se, portanto, que a ESD possa desempenhar um papel importantena equipe de trabalho nas organizações no sentido de desenvolver um ambi-ente de confiança não artificial, mas surgido naturalmente das relações in-terpessoais. Infelizmente tanto gestores quanto pesquisadores da área deadministração têm ignorado a ESD no ambiente de trabalho e as possibilida-des afetivas entre adultos como elementos de coesão organizacional, de con-sistência e veracidade das interações entre as pessoas, não como homensfragmentados, mas como seres holísticos.

Embora as relações interpessoais assumam papel de destaque no ambienteorganizacional, pouco tem sido trabalhado nos últimos anos em torno dessefator. É difícil compreender tal situação quando se observa um número ex-pressivo de pesquisas em torno de comprometimento e equipes de alto desem-penho. É difícil conceber o estudo desses temas sem os elementos que o com-põem, tais como: confiança, amizade, tolerância, desprendimento, coopera-ção, solidariedade, valores, justiça, equilíbrio, medo, emoções. Eles têm sidoexcluídos do contexto de trabalho por serem considerados elementos que aele não pertencem, por não se caracterizarem como mecanismos de ação cu-jos resultados sejam facilmente identificáveis. Dentro dessa lógica os gestoresnão concordam com essas aberturas, porque os benefícios desse tipo de ges-tão ainda são desconhecidos, ou seja, não foram objeto de pesquisas de rela-

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Relacionamento e Administração: A confiança como elemento das relações interpessoais no ambiente organizacional

ção de causa e efeito, garantindo o retorno do investimento realizado. As di-versas citações deste trabalho já mostraram que pesquisadores têm argumen-tado que elevar os níveis de confiança no ambiente organizacional pode faci-litar e melhorar as equipes de trabalho e a consecução dos objetivos organiza-cionais (Kurstedt, 2002; Zand, 1972), porém, de acordo com Wicks, Bermane Jones (1999) há também aqueles que argumentam que despender recursoscom projetos cujos resultados são desconhecidos é um risco muito alto. Maisrecentemente, Adams (2004) afirma que em suas experiências nas organiza-ções tem encontrado que os custos de condução de intervenções sobre confi-ança são preferíveis e são mais importantes como benefícios. O autor destacaainda a importância de se estudar como as relações de apego (afetividade)entre adultos e a ESD influenciam a confiança organizacional. Porém, ao lon-go da pesquisa realizada, Ganesan (1994) foi o único autor encontrado quedescreveu a confiança em duas dimensões mais humanísticas que são: credi-bilidade e benevolência, o que fortalece o argumento de que o foco que oassunto vem sendo tratado é o da lógica do retorno.

O Quadro 2 apresenta um resumo dos olhares e leituras de diversosautores.

Conceito

Elemento fundamental para amotivação, para a produtivida-de, para os relacionamentos efunciona como uma vantagemcompetitiva para os negócios.

Elemento facilitador decooperação e colaboração

Exercício de cidadania

Elemento de solução de conflito

Atitudes que conduzem àsatisfação no trabalho

Comprometimentoorganizacional

Comprometimento organizacio-nal e critérios de medida como apercepção de justiça

Autores

Braddach e Eccles (1989); Creed e Miles(1996); Ring e Van de Vem (1994); Wicks,Berman, e Jones (1999)

Dodgeson (1993); Zucker, Darby, Brewer, ePeng (1996)

Deluga (1995); Konovsky e Pugh, (1994);McAllister (1995)

Parks, Henager e Scamahorn (1996)

Andeleeb (1996) e Rich (1997)

Yamagishi, Cook, e Watabe (1998) Brockner,Siegel, Daly, Tyler e Martin (1997)

Brockner, Siegel, Daly, Tyler, e Martin(1997)

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

Conceito

Satisfação do consumidor

Fator crítico na descentralizaçãoe compartilhamento deinformações

Elemento que promovecooperação entre indivíduos,grupos e organizações

Elemento de redução daincerteza e complexidadeorganizacional

Elemento gerador decomprometimento no grupo ediminuidor do estresse

Elemento para aprendizagemorganizacional

Perfis de gestores

Classificação geral (natureza,componentes, dimensões)

Relações entre valores econfiança

Níveis de confiança (guanxi exinren)

Moderar riscos e garantirbenefícios futurosRiscos e incerteza

Credibilidade e benevolência

Resultado da interação

Atitudinal

Autores

Chow e Holden (1997); Swan, Bowers, eRichardson (1999)

Mishra (1996)

Jones e George (1996)Adams (2004)

Hummels e Roosendaal (2001)

Costa, Roe e Taillieu (2001)

Adams (2004)

Mello e Teixeira (2004)

Romano (2003)

Harris e Dibben (1999)

Kriz e Fang (2004)

Chow e Holden (1997)Bradach e Eccles (1989)Moorman, Zaltaman e Deshpande (1992)

Ganesan (1994)

Rotter (1967, 1980); Johnson-George eSwap (1982); Scott (1980); Couch, Adams eJones (1996); Sheppard e Sherman (1998)

Maioria

Quadro 2: Confiança nas Organizações

Não se pode negar que a situação do mercado de trabalho tem levado osempregados a uma relação de extrema dependência da empresa. De acordocom Teixeira, Popadiuk e Zebinato, (2004, p. 1), “[...] eles têm receio deserem enganados, de terem sua auto-estima e os seus destinos profissionaisafetados por líderes não confiáveis”. Assim, para se sentirem mais seguros,

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vivem em permanente estado de alerta na tentativa de identificar se as pes-soas com quem convivem falam a verdade, ou seja, desejam ser percebidoscomo merecedores de confiança e buscam uma relação de interdependên-cia. Na pesquisa por eles realizada foram identificadas três dimensões con-sideradas importantes pelos liderados em termos de relações confiáveis: res-peito, honestidade e crédito no empregado. Embora esse trabalho já tragaalgum avanço sobre o tema, o objeto da confiança, continua não muito cla-ro, devido a inconsistências que existem nas definições a respeito dos trêsfatores sociais que estão relacionados à confiança: aquele que confia, o ob-jeto (sujeito) da confiança e o contexto no qual ela se dá. É importante en-tão, resgatar o conceito proposto por Rotter (1967, 1980) e Jones e George(1998) de que a confiança pode ser definida como uma evolução dos valo-res de quem confia, associado aos de Johnson-George e Swap (1982) e Bu-tler (1999) que consideram para sua definição os atributos do objeto ousujeito de confiança e de Scott (1980) e Sheppard e Sherman (1998) queincluem a estrutura do contexto.

Mello e Teixeira (2004) identificaram perfis de gestores de acordo como dual individualismo-coletivismo, que são: gestor pai, gestor amigo e ges-tor competidor. Gestores do tipo pai tendem a adotar posturas justas e bene-volentes para com seus subordinados, acreditando no próximo, buscandoestabelecer relacionamentos de aceitação e confiança. Preferem estabelecerrelacionamentos caracterizados por dependência profunda, onde a outra parteestá subordinada ao seu controle e orientação, podendo também se envolverem relacionamentos de interdependência desde que esta seja superficial.Gestores amigos também são orientados ao coletivo, mas preferem se man-ter junto aos grupos dos quais participam. Inicia novos relacionamentos con-fiando no outro (com menor desconfiança inicial) favorecendo ambientesque levem a uma confiança mútua. Por acreditar e ter fé no empregado,preferem relacionamentos baseados em interdependência profunda, ondesuas atividades e resultados estão em relação direta com o comportamentodos demais membros da equipe. Por fim, o gestor competidor coloca osobjetivos pessoais acima de tudo. Valorizam pouco as relações de compa-nheirismo e amizade, mantendo-se distantes do grupo. Para eles confiançasó se constrói com o tempo, mediante comprovações do comportamentodos envolvidos. Suas relações iniciais são de desconfiança e tendem a acei-tar menos falhas e erros de seus subordinados, mostrando assim, menos to-lerância e menor grau de benevolência. O perfil parece incluir o que Chow eHolden (1997) já afirmavam, ou seja, que a confiança está atrelada a mode-rar o risco envolvido e garantir benefícios futuros.

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Por fim, é importante ressaltar ainda o estudo de Kriz e Fang (2004) que,embora tenham enfocado as relações interpessoais no sentido comercial (re-lações comerciais com chineses) apresenta uma construção teórica que me-rece uma análise quanto ao dia a dia nas organizações, trata-se dos conceitosde guanxi e xinren. De acordo com Davies et al (1992) há registros de quefazer negócio na China é particularmente difícil e que a chave que diferen-cia os chineses e os negócios ocidentais está na prática da desonestidade.Para os chineses a honestidade possui importância muito grande nas rela-ções interpessoais.

Conforme afirma Fukuyama (1995) os chineses tradicionalmente tempassado para a família e para os amigos mais próximos como construir rela-ções interpessoais. Knipis (1997) (apud Ridings; Gefen; Arinze, 2004) rela-ta que o conceito de guanxi envolve desde a família, o clã, até o vilarejo, noque diz respeito às relações de trabalho. As pessoas de negócio na Chinatêm expandido esse conceito para além da família e de seus parentes (gingi)incluindo-o nas relações de negócio por meio da aplicação do que os beha-vioristas agora chamam “tit for tat” e reciprocidade (Ridley, 1996 apud Ri-lling et al. 2002). Para os sociólogos guanxi quer dizer “relacionamento”,enquanto para o mundo dos negócios ele tem um significado mais abrangen-te, ou seja, conexão. De acordo com Bian (1997) guanxi literalmente signi-fica “relacionamentos” ou “relações”, mas para Hwang (1987), em se tra-tando de negócios o conceito vai além: trata-se de um conjunto de conexõesinterpessoais que facilitam a troca de favores entre as pessoas.

Xinren é definida como confiança profunda nas relações interpessoais,na China. No mundo ocidental o que se chama confiança, para os chineses éo guanxi. Com o avanço dos estudos, foram identificados níveis profundosde confiança que é exatamente o que diferencia o conceito quando compara-do com o mundo ocidental. Ao se analisar as respostas obtidas nas pesquisase tirando-se uma generalização, a confiança profunda existente nas relaçõesinterpessoais entre chineses pode ainda ter associação com um nível de shen-gan, ou seja, sentimentos emocionais profundos. O xinren é construído apartir de um contanto inicial, mas só se completa por meio da proximidadeabsoluta. A confiança profunda ou xinren não é baseada na ajuda unilateral,mas nos sentimentos e emoções que envolvem as duas partes.

4. À Guisa de Conclusões

Como se vê a confiança é ainda um objeto de estudo a ser explorado,sobretudo quanto a ser um construto único que pode ser aplicado consisten-

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temente em contextos diversos. Existem ainda muitas situações para as quaisnão se tem resposta. Não se sabe, por exemplo se a confiança é tratada den-tro de construtos variados quando diz respeito a pessoas com as quais se temrelações de afeto diferentes, como no caso da família e do trabalho. Issovale também para o ambiente organizacional, pois não se conhece a formapela qual a confiança é construída em termos de chefia e subordinados.

Os valores dos gestores podem ser considerados elementos responsáveispor promover comportamentos confiáveis. Ao que parece, gestores que pos-suem valores universais como compreensão, entendimento e proteção ao bem-estar dos outros, têm maior probabilidade de se engajarem em comportamen-tos confiáveis. A demonstração de preocupação com seus empregados parecegerar mais confiança do que elementos de controle, dominação e poder. Ges-tores que valorizam a benevolência criam ambientes relacionais mais propíci-os a que as pessoas falem a verdade e mantenham suas promessas, facilitandoo estabelecimento da confiança, ao contrário dos que valorizam o hedonismo,por exemplo. As empresas engajadas no princípio da Economia de Comunhãoou Economia Solidária, diferentemente daquelas com características exclusi-vamente capitalista, têm demonstrado que é possível conciliar a estabilidadeno mercado, os lucros e a confiança interpessoal durante os processos de pro-dução, as relações de trabalho e fora dele. Esses gestores têm dado demons-tração de que é possível tratar o homem enquanto elemento integrado a todasas suas dimensões: física, cognitiva, espiritual. Não há como interagir com ooutro, se a confiança não estiver presente.

Desta forma, percebe-se uma relação intrínseca entre os valores cultu-rais e a importância que se dá à confiança quanto a cooperar ou não com osdemais. A presença da confiança e da visão do homem como um ser integra-do tem se mostrado como uma nova forma de gerenciar, que também possuiseu espaço no mercado e, aos poucos vai dando sinais da relação entre essamaneira de agir e os valores que permeiam o viver, o sentir, o inter-relacio-nar-se, o ser.

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5RELACIONAMENTO INTERPESSOAL E SAÚDE -AVANÇOS RECENTES NOS ESTUDOS SOBRE O

RELACIONAMENTO MÉDICO-PACIENTE

Agnaldo Garcia

A diversificação de serviços disponíveis à população em uma sociedadecada vez mais complexa amplia as possibilidades de encontros também di-versificados dentro de uma rede social e profissional. Ao lado dos relacio-namentos com nossos familiares e amigos, interagimos com um número cres-cente de pessoas desempenhando diferentes papéis profissionais na presta-ção de serviços. Uma das relações mais investigadas entre cliente e presta-dor de serviço é a existente entre médico e paciente. Como outros relaciona-mentos profissionais, ele também está cercado por considerações técnicas eéticas. O objetivo deste capítulo, contudo, é discutir aspectos da literaturasobre o relacionamento médico–paciente do ponto de vista da ciência dorelacionamento interpessoal.

As condições nas quais o profissional médico interage ou se relacionacom um paciente são muito variáveis. A tendência atual é que este encontrosofra uma influência crescente das empresas de saúde, dos planos de saúdeou de agências do governo que controlam a prestação destes serviços. Oencontro pode se dar entre o médico e seu paciente no consultório, mastambém em situação hospitalar, em visitas domiciliares, entre outros. Háuma série de estudos sobre esta forma particular de relacionamento que, demodo geral, é estudado em situação de consultório, com ênfase no processo

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

de comunicação, seja na fase de levantamento de dados e diagnóstico, sejana fase de passar instruções sobre o tratamento para o cliente. Nos parágra-fos abaixo, são apontados diversos aspectos que vêm sendo estudados, comoconfiança, adesão ao tratamento e comunicação, entre outros.

1. Relacionamento Médico-Paciente – Uma Introdução

O PubMed, registra quase 1000 trabalhos sobre o relacionamento médi-co-paciente, desde os anos 50. O presente capítulo tem como base uma sele-ção de artigos publicados entre 2000 e 2005, com conteúdo voltado paraquestões de relacionamento interpessoal. Apesar do uso corrente da expres-são “relacionamento médico-paciente”, sua utilização tem sido contestadapor alguns autores, face às condições atuais desta relação. Em vários arti-gos, os autores empregam o termo “encontro”. Potter e McKinlay (2005)consideram a possibilidade de hoje não mais existir um “relacionamento”,mas apenas um encontro, sendo a utilização do primeiro termo inapropria-da. Diante das transformações históricas, os autores propõem um modelopara o relacionamento médico-paciente no século XXI. Argumentam que ospacientes deveriam continuar a ser educados sobre como usar seu tempocom médicos efetivamente e os médicos deveriam continuar a melhorar suacomunicação com pacientes. Argumentam que não é o médico ou o pacienteque precisam mudar, mas as pressões e limitações do contexto organizacio-nal no qual este encontro ocorre. Diversos temas são abordados dentro des-tas relações profissionais. Walker, Arnold, Miller-Day, Webb (2002), porexemplo, identificaram cinco temas centrais para a construção deste relaci-onamento: controle, negociação de papéis, confiança, compromisso com ocuidado da saúde e questões de tempo e dinheiro.

Em nosso país, a literatura sobre o tema ainda é escassa. Em pesquisarecente, de natureza ampla, Franco, Bastos e Alves (2005) investigaram arelação médico-paciente no Programa Saúde da Família, procurando articu-lar a abordagem da vigilância da saúde com o modelo ecológico do desen-volvimento humano, enfatizando o papel do contexto. A partir de observa-ções de consultas de médicos de saúde da família, encontraram diferençasentre a implementação do Programa Saúde da Família em três municípiosda Bahia. Quanto à orientação das práticas, a vigilância da saúde não foiincorporada pelos médicos observados e os problemas de saúde freqüente-mente não eram tratados de modo contextualizado. Os autores consideramque a abordagem da vigilância da saúde mostra-se eficiente para avaliar e

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Relacionamento e Medicina: Avanços recentes nos estudos sobre o relacionamento médico-paciente

aperfeiçoar o Programa Saúde da Família, com potencial para implementara relação entre o médico e o paciente.

A qualidade da relação entre médico e paciente está diretamente relaci-onada com os resultados obtidos com a prática médica, tratando-se, portan-to, de uma questão central. Assim como nos relacionamentos em geral, estepode ser avaliado do ponto de vista da qualidade percebida sob diversospontos de vista. Em uma época em que a qualidade de vida se destaca comovalor social, a alta qualidade dos serviços disponíveis à população, inclusi-ve no atendimento médico, representa um alvo a ser atingido.

Alguns autores têm verificado alterações históricas nos índices de per-cepção de qualidade do relacionamento por parte dos pacientes. Murphy,Chang, Montgomery, Rogers e Safran (2001), investigando a percepção daqualidade no período entre 1996 e 1999, em cuidados primários, face amudanças no ambiente de cuidado médico, encontraram declínios significa-tivos em três das quatro escalas de qualidade do relacionamento: comunica-ção, tratamento interpessoal e confiança. Houve melhoria somente no co-nhecimento do paciente por parte do médico. Os autores consideram essesdados preocupantes, especialmente se significarem uma tendência.

Há uma preocupação justificada de que a qualidade do relacionamentomédico-paciente tenha como conseqüência o prejuízo dos resultados espe-rados com o atendimento médico. Giron, Bevia, Medina e Talero (2002)apontaram a relação percebida pelos médicos entre a escassez de recursos(como pouco tempo com cada paciente, sobrecarga de trabalho e falta detreinamento) e a baixa qualidade dos serviços. Problemas relacionados afatores psicossociais no encontro clínico (como no caso da comunicaçãodurante a entrevista clínica) agiram como fatores intermediários entre a es-cassez de recursos e a qualidade dos serviços. Os pacientes, por sua vez,perceberam uma relação entre consultas curtas, sobrecarga de trabalho porparte do médico, problemas de comunicação do paciente e erro, assim comoconflito, no encontro clínico. Os autores argumentam que há relação entre aatitude humanista do médico e um melhor resultado quanto à solução deproblemas de saúde e sugerem que os processos envolvidos no relaciona-mento com o paciente desempenham um papel mediador entre os recursosde cuidado à saúde (geralmente escassos) e os resultados dos encontros clí-nicos. Também indicam que melhorar o cuidado e o relacionamento requeruma abordagem multi-dimensional, além dos fatores individuais ligados aomédico e ao paciente.

Ainda considerando aspectos mais amplos do relacionamento médico-paciente, alguns estudos têm investigado as dimensões demográficas dessa

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relação, em particular a questão da similaridade étnica e de gênero. A quali-dade do relacionamento sofre a influência de condições externas e internasao próprio relacionamento. Ferguson e Candib (2002) encontraram, em re-visão da literatura, evidência de que raça, etnia e linguagem influenciam aqualidade da relação entre médico e paciente. Pacientes pertencentes a mi-norias, especialmente com dificuldades de idioma, têm menor probabilida-de de gerar respostas empáticas dos médicos, estabelecer relação com eles,receber informação suficiente e ser encorajados a participar do processo dedecisão médica. A literatura sugere maior diversidade étnica dos médicospossibilitando aos pacientes das minorias escolher profissionais de seu pró-prio grupo social. A literatura ainda recomenda que estes pacientes deveri-am ter seu nível de satisfação aumentado através de um melhor uso da lin-guagem e sentirem-se mais conectados e envolvidos em tomada de decisãocom médicos da mesma etnia. Os autores sugerem aos médicos a necessida-de de se tornarem mais efetivos em desenvolver relacionamentos e em secomunicar com pacientes de minorias étnicas e raciais.

Além da influência de características étnicas, a idade e o gênero do paci-ente também interferem no relacionamento (Honegger, Scheuer e Budde-berg, 2001). Estereótipos similares de gênero apareceram nas descriçõesapresentadas por médicas e médicos do paciente idoso típico masculino efeminino. Um aspecto particular deste relacionamento é a questão da parti-cipação em pesquisa clínica. Para Chen, Miller e Rosenstein (2003), osmédicos deveriam estar preparados para discutir a participação em pesquisaclínica com os pacientes, com vantagens para o seu relacionamento com ospacientes e para os alvos gerais da medicina.

Alguns aspectos, em especial, têm recebido maior atenção na literatura,como é o caso da confiança, adesão ao tratamento, comunicação e satisfação.

2. Confiança

A confiança é uma das dimensões investigadas nos relacionamentos emgeral, na esfera familiar, nas díades românticas e nas amizades. Mas presen-ça de confiança também é um elemento essencial nos relacionamentos comprofissionais. No caso da prática médica, a confiança tem sido um dos temasmais investigados e representa uma pedra angular para essa atividade. Aconfiança do paciente em seu médico pode afetar sua satisfação e os resulta-dos com a saúde.

A confiança está relacionada com a própria utilização da medicina cientí-

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fica. Franco e Pecci (2003) relacionaram confiança e o uso de terapias alterna-tivas complementares. Segundo os autores, a confiança no médico interfere nabusca de terapias alternativas (como homeopatia e ervas), que podem interfe-rir ou interagir negativamente com o tratamento. O uso dessas terapias estavacorrelacionado com a insatisfação com o modo pelo qual a causa da doençahavia sido investigada e como o diagnóstico e o tratamento haviam sido co-municados, componentes do relacionamento médico-paciente. Os autores en-fatizam a importância da educação médica para lidar com a relação com paci-entes e a habilidade para transmitir confiança em procedimentos e tratamen-tos médicos.

A confiança no médico, contudo está sujeita a mudanças no contextohistórico. Segundo Chaitin, Stiller, Jacobs, Hershl, Grogen e Weinberg(2003), as mudanças no sistema de saúde têm contribuído para a deterio-ração da confiança que os pacientes depositavam nos médicos. Relatam ocaso de unidades de tratamento intensivo, caracterizadas pela tecnologiacrescente e a integração de múltiplas especialidades. Entre os fatores res-ponsáveis por esta deterioração indicam a presença de vários sub-especi-alistas encarregados do cuidado do paciente em diferentes fases de avali-ação e tratamento. Devido à natureza passageira destas interações entremédico e paciente, não se estabelece um forte laço entre eles antes dedecisões críticas terem de ser tomadas, referentes ao cuidado com o paci-ente. Como resultado, especialistas diversos (como oncologistas e médi-cos de unidades de terapia intensiva) podem confrontar-se com discussõessobre a situação terminal do paciente que, no passado, era responsabilida-de do médico primário, gerando conflitos de comunicação. Para melhoraressa situação, os autores procuraram estimular o diálogo e melhorar a co-municação para evitar mal-entendidos e reduzir a ansiedade entre mem-bros das equipes participantes.

A confiança está alicerçada em fatores ligados aos pacientes, aos médi-cos, e às condições culturais, ambientais e estruturais. Pesquisas recentestêm evidenciado que fatores como maior religiosidade, menor desejo porautonomia e relacionamentos de maior duração entre o médico e o pacienteestão associados com maior confiança (Tarn, Meredith, Kagawa-Singer,Matsumura, Bito, Oye, Liu, Kahn, Fukuhara e Wenger, 2005), no caso dejaponeses e americanos japoneses. Neste estudo, entre os americanos japo-neses, os mais aculturados relataram maior confiança nos médicos, especi-almente se estes eram japoneses (similaridade étnica). A forma como o mé-dico se comporta e se comunica com o paciente também afeta os níveis deconfiança deste (Fiscella, Meldrum, Franks, Shields, Duberstein, McDaniel

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e Epstein, 2004). O comportamento ou a comunicação centrada no paciente,explorando sua experiência da doença, estavam associados com maior con-fiança no médico. Cada minuto adicional gasto com a visita também estavaassociado com aumento na confiança do paciente.

Uma inovação no relacionamento entre o médico e o paciente que interfe-re diretamente na questão da confiança é a introdução de um terceiro (umapessoa de confiança), como uma nova possibilidade no atendimento médico,prevista por lei em alguns locais (Manaouil, Moutel, Callies, Duchange Gra-ser, Jarde e Herve, 2004). A pessoa de confiança acompanha o paciente emseu tratamento e auxilia em decisões médicas ou em decisões sobre participa-ção em pesquisa biomédica. Nos locais onde a lei o permite, essa pessoa podeinterferir nos cuidados recebidos pelo paciente no hospital, em casa ou noconsultório médico. A pessoa de confiança pode ser um parente, um amigo oumesmo o médico. Ela pode ser de auxílio, por exemplo, em atividades médi-cas de rotina, quando os pacientes precisam ser acompanhados, e também emcasos de diagnóstico ou prognose sérios ou quando o paciente é incapaz de seexpressar.

A confiança no médico pode ser observada em situações pouco comuns.Ogbogu, Fleischer, Brodell, Bhalla, Draelos e Feldman (2001), por exem-plo, verificaram a influência da confiança no médico na aquisição de produ-tos dermatológicos no próprio consultório. Os médicos entrevistados relata-ram que os pacientes compram esses produtos devido à confiança que depo-sitam neles, enquanto os pacientes enfatizaram que o fazem devido ao co-nhecimento médico.

Como em outros casos, as mudanças estruturais históricas nos sistemasde saúde, como a especialização crescente e o avanço da tecnologia, têmafetado as relações de confiança. Esta contudo, ainda representa um doselementos básicos no relacionamento médico-paciente. Entre as tendênci-as recentes, está inserção da figura de uma ‘pessoa de confiança’ pararepresentar o paciente, transferindo a confiança devida ao médico, ou aosmédicos, para uma pessoa em particular. Essa prática, de certa forma, re-presenta uma tentativa de concentrar a confiança em uma única pessoa(como no passado, no médico da família), responsável por assegurar que otratamento seja conduzido de forma adequada.

3. Adesão ao Tratamento

O relacionamento entre médico e paciente exerce efeitos diretos sobre ocomportamento do paciente em termos de sua adesão ao tratamento. Alguns

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estudos recentes investigaram esse aspecto importante para o sucesso dotratamento e sua associação com o relacionamento médico-paciente. A ade-são ao tratamento dá uma indicação da medida na qual o comportamentopessoal coincide com a orientação médica. A adesão à medicação é críticapara o sucesso do tratamento, prevenção de doenças e promoção da saúde.

Entre os atributos do relacionamento médico-paciente investigados porKerse, Buetow, Mainous, Young, Coster e Arroll (2004), apenas a confi-ança e a concordância entre ambos estavam significativamente relaciona-dos à adesão ao tratamento (no caso, tomar a medicação). Consultas comníveis superiores de concordância médico-paciente (relatada pelo pacien-te) estavam associadas com maior adesão à medicação (aumento de umterço). Os autores sugerem que uma maior compreensão e a busca de mai-or acordo entre médico e paciente podem melhorar a adesão ao tratamen-to. No caso de cirurgias de transplante, a adesão do paciente ao tratamentoé, segundo Pumilia (2002), um dos critérios psicossociais básicos para asua realização. Segundo o autor, a habilidade para prever e facilitar a ade-são do paciente é um desafio para médicos de todas as áreas. Como aacuidade dessa previsão depende de informação do paciente, de pessoalmédico e de familiares, com base em dados subjetivos, o autor ainda apontaa necessidade de pesquisas para prover medidas objetivas para se prever aadesão ao tratamento.

Melhorar a adesão ao tratamento é uma preocupação constante na práti-ca médica. No caso da Pediatria, Winnick, Lucas, Hartman e Toll (2005)encontraram um alto índice de falta de adesão na terapia com medicamen-tos. Segundo os autores, pelo menos um terço dos pacientes não completamregimes de tratamento de prazo relativamente curto. Para os autores, a ade-são poderia ser melhorada com um aperfeiçoamento da comunicação, de-corrente de um relacionamento pessoa-a-pessoa entre médico e paciente (ouacompanhante).

Associada à adesão ao tratamento, está a intenção de tratamento. Gol-dring, Taylor, Kemeny e Anton (2002) investigaram o impacto do relaciona-mento médico-paciente nas intenções de tratamento (tomada de decisão notratamento de doenças crônicas), em particular, quanto a tomar um medica-mento. Para pacientes mais sintomáticos, custos e benefícios prediziam es-sas intenções, contudo, para pacientes menos sintomáticos, custos desempe-nharam um papel mais importante. A intenção de seguir o tratamento reco-mendado pelo médico estava associada principalmente à tomada de decisãocompartilhada entre médico e paciente. Os dados obtidos sugerem que umaconsideração integrada de fatores de relacionamento, crenças sobre saúde e

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condição física pode ajudar a compreender as intenções de tratamento entreos doentes crônicos.

A adesão ao tratamento é uma necessidade para a prática médica e aspesquisas indicam que o nível de concordância e compreensão e a qualidadeda comunicação na relação entre médico e paciente afetam a adesão, demodo que, conhecer este aspecto do relacionamento, é importante para au-mentar a probabilidade de sucesso do tratamento. De certa forma, a adesãoao tratamento está relacionada com o conceito de compromisso, que é estu-dado nos relacionamentos em geral.

4. Comunicação

A comunicação entre médico e paciente é um dos aspectos mais investiga-dos no seu relacionamento. Vários dos trabalhos publicados estão voltadospara questões de comunicação quando o paciente se encontra em estado ter-minal (como em alguns casos de câncer) enquanto outros abordam a dinâmicada comunicação no relacionamento.

A Dinâmica da Comunicação - Um estudo empírico da dinâmica da co-municação empreendido por Rhodes, Vieth, He, Miller, Howes, Bailey, Wal-ter, Frankel e Levinson (2004) revelou diversos pontos de interesse na comu-nicação entre médico e paciente, em um centro de emergência médica. Entreos dados obtidos, constataram que o tempo gasto na introdução, levantamentodo histórico médico e exame físico era, em média, de 7 minutos e 31 segun-dos. Os residentes se apresentaram em apenas 2/3 dos encontros, raramente(8%) indicando seu status profissional. Apesar da tendência do médico emcomeçar com uma questão aberta (63% dos casos), somente 20% dos pacien-tes completaram sua queixa sem interrupção (geralmente uma questão fecha-da). A discussão de pontos referentes ao diagnóstico, ao curso esperado dadoença, ao uso de medicamentos, ao acompanhamento e sintomas que deveri-am levar ao retorno, ocupou menos de 65% do tempo total disponível. Empoucos casos (somente 16%), os atendentes perguntaram aos pacientes se elestinham alguma questão e o provedor dos serviços de saúde nunca checou como paciente se este havia compreendido a informação. Segundo os autores, osdados indicam falhas importantes na comunicação entre médico e paciente,tendo o encontro entre eles sido caracterizado por sua brevidade e pela carên-cia de informações importantes para a saúde do paciente.

Outro estudo da dinâmica da comunicação, realizado no Japão (Ishikawa,Takayama, Yamazaki, Seki e Katsumata, 2002), investigou a comunicação

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entre médico e paciente e a satisfação deste em consultas, no caso de câncer.Os pacientes se mostraram mais satisfeitos com as consultas nas quais o médi-co usava mais questões abertas. Por outro lado, o direcionamento pelo médicoestava negativamente associado à satisfação do paciente. Pacientes que fazi-am mais perguntas estavam menos satisfeitos com a consulta. A dinâmica dacomunicação médico-paciente também foi investigada por Wilson e Kaplan(2000), nos casos de HIV positivo. Apesar de estudos prévios indicarem que aqualidade superior da comunicação médico-paciente está associada a melho-res resultados para a saúde, tais efeitos são pouco conhecidos para pacientescom HIV. Conforme os autores, alguns fatores estavam associados a um me-lhor nível de comunicação. Entre estes estavam visitas mais longas (especial-mente para os homens) e um relacionamento médico-paciente mais longo. Acomunicação também se mostrou superior quando o paciente era do gênerofeminino. O fato de a doença estar em um estágio menos avançado tambémestava associado a uma melhor comunicação. Médicas e médicos homossexu-ais se comunicaram melhor.

Outras pesquisas investigaram o resultado de programas específicos detreinamento de habilidades de comunicação para médicos e pacientes (Sliwa,Makoul e Betts, 2002), visando melhorar seu relacionamento. As percep-ções dos pacientes antes e depois do treino foram registradas, fornecendoevidência de que 14, das 18 dimensões investigadas, haviam apresentadouma melhoria, indicando a relevância de tais programas.

Outras pesquisas investigaram temas mais específicos, como o controlena comunicação médico-paciente. Street Jr, Krupat, Bell, Kravitz e Haidet(2003) investigaram o controle no relacionamento entre médico e paciente eseu efeito sobre a comunicação em encontros médicos. Pacientes que prefe-riam controle compartilhado eram participantes mais ativos (expressavammais opiniões, preocupações e questões) do que pacientes que preferiam ocontrole do médico. A participação ativa do paciente e a busca de parceirapor parte do médico se influenciaram mutuamente. A participação ativa dopaciente estimulava a busca de parceria por parte do médico e vice-versa.Em outros casos, a teoria dos jogos e a economia da informação foram uti-lizadas para levantar hipóteses sobre os processos envolvidos em decisõesde tratamento (De Jaegher e Jegers, 2001), como um jogo de transmissão deinformação estratégica.

A Comunicação em Situações Difíceis - Estas situações geralmente sereferem à gravidade da doença ou ao risco de morte do paciente. Em algunscasos, contudo, a dificuldade também pode estar relacionada a outros pon-tos, como a necessidade do médico comunicar ao paciente as restrições que

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sofre para solicitar procedimentos caros. Levinson, Kao, Kuby e Thisted(2005) relatam que muitos médicos recebem incentivos financeiros para li-mitar pedidos de testes e procedimentos caros. A dificuldade, neste caso,está em como transmitir esta informação ao paciente sem minar a sua confi-ança. As estratégias de revelação que obtiveram os melhores resultados ape-lavam para as emoções e para a “negociação”, enquanto a estratégia do “ini-migo comum” e “negar influências” foram as percebidos mais negativamen-te. Esta informação passada aos pacientes aumenta a confiança e fortalece orelacionamento entre médico e paciente.

Geralmente, as dificuldades de comunicação estão vinculadas à gravida-de da enfermidade. Vários estudos estão relacionados ao câncer. Hawighorst,Schoenefuss, Fusshoeller, Franz, Seufert, Kelleher, Vaupel, Knapstein eKoelbl (2004) investigaram o relacionamento médico-paciente no caso detratamento do câncer genital. Mulheres com um alto nível de ansiedade sequeixavam de falta de informação, o que estava associado à insatisfação norelacionamento com o médico. Conforme os autores, nestes casos, há a ne-cessidade de se aplicar estratégias de informação antes da cirurgia para re-duzir ansiedade, antecipando futuros problemas na qualidade de vida, e paramelhorar a interação com o médico antes de opções de tratamento estressan-tes. Em outro caso de câncer, o problema investigado foi o desenvolvimentode falso otimismo sobre recuperação na comunicação do médico com paci-entes com câncer de pulmão (The, Hak, Koeter e van der Wal, 2001). Ofalso otimismo geralmente se desenvolveu durante a primeira utilização dequimioterapia e tendia a desaparecer quando o tumor reaparecia e foi resul-tado de uma associação entre ativismo médico e adesão do paciente ao tra-tamento e ao plano de recuperação. Conforme indicado pelos autores, solu-ções para esse problema requerem uma abordagem ativa. Entre as soluçõespossíveis, estão os “agentes de tratamento”, que estariam fora do relaciona-mento médico-paciente.

Ainda com relação ao câncer, Baile e Aaron (2005) revisaram a litera-tura sobre a comunicação médico-paciente em oncologia. Os autores apon-tam que a oncologia contemporânea reconhece a importância da parceriacom o paciente e a família ao lidar com a doença. Os pacientes tambémavaliam seus médicos como importantes fontes de apoio ao informaremsobre a doença, discutirem opções de tratamento e as preocupações dopaciente, assim como pelo encorajamento recebido. Por esta razão, temcrescido o reconhecimento de que a qualidade da relação entre médico epaciente está diretamente associada com os resultados obtidos no trata-mento do câncer. Segundo os autores, há evidências de que a comunicação

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efetiva e empática com o paciente de câncer e a família pode influenciarresultados desejáveis no cuidado com o câncer, que afetam a qualidade devida do paciente, a satisfação com os cuidados recebidos e os resultadosmédicos. Também há evidência de que habilidades de comunicação e in-terpessoais podem ser ensinadas e aprendidas. Os autores consideram ashabilidades de comunicação como básicas no cuidado ampliado contra ocâncer, as quais poderiam ampliar o papel de apoio do oncologista, espe-cialmente em momentos decisivos, como no diagnóstico, na recorrência ena transição para cuidado paliativo.

De forma geral, Moss (2001) enfatizou a necessidade de melhorar a co-municação entre médicos e pacientes e famílias em situação terminal. Oautor argumenta que tal melhoria atende o desejo dos pacientes e famíliaspara obter mais informação, fortalece o relacionamento médico-paciente,representa um modo compassivo de engajar o paciente e a família em umprocesso de tomada de decisão compartilhada, estimula a colaboração entreo médico, o paciente e a família, e permite aos pacientes e famílias lidar coma realidade da situação e planejar apropriadamente o futuro.

5. Empatia

A empatia, entendida como a habilidade para compreender a situaçãode outra pessoa, é um elemento importante para a comunicação efetiva.Heidenreich (2001) revisou a literatura sobre a empatia no relacionamen-to médico-paciente. Segundo o autor, a empatia é uma qualidade buscadapor pacientes e um ideal buscado por médicos e pela educação médica.Esta, contudo, deve ser distinguida de conceitos relacionados, como sim-patia e compaixão. Nossa capacidade de empatia está baseada em habili-dades emocionais e intelectuais. Empatia é basicamente um modo de com-preensão que pode ser expresso por meio de comunicação e refere-se àatitude fundamental do médico em relação ao paciente. É considerada fun-damental na medicina e pode ser vista como uma virtude na prática médi-ca. Bylund e Makoul (2005) examinaram as oportunidades criadas pelospacientes para os médicos se comunicarem empaticamente e como os mé-dicos respondem a tais oportunidades no encontro médico. Nas oportuni-dades empáticas, os médicos freqüentemente responderam reconhecendo,dando prosseguimento ou confirmando as afirmações do paciente. As se-qüências tendiam a ser mais longas em duração quando o médico usavauma resposta mais empática.

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6. Satisfação

Satisfação é um aspecto investigado em uma ampla gama de relaciona-mentos interpessoais. A satisfação do paciente com o relacionamento comseu médico sofre a influência de diferentes fatores, desde o estilo do médicoaté o tempo gasto com consultas.

A insatisfação com os serviços médicos não é algo recente, mas remontaaos séculos passados. Louis-Courvoisier e Mauron (2002) encontraram sen-timentos de frustração e insatisfação semelhantes aos atuais já no séculoXVIII, conforme indicado em cartas de pacientes. Propõem que os proble-mas persistentes são devidos à dissonância básica entre os modos comunsde percepção do paciente e o modo sistemático de perceber a realidade domédico. Estes diferentes modos de perceber refletem a inevitável separaçãoentre a natureza privada e singular da experiência da doença e a instânciageral e anônima da teoria médica, um traço permanente do relacionamentomédico-paciente. Em sintonia com o atual movimento das humanidadesmédicas, os autores crêem que o envolvimento de médicos com a literaturae as artes os ajudaria a explorar a divisão entre a experiência do paciente e oconhecimento sistemático impessoal da medicina.

Os estilos de interação do médico, assim como a duração das visitas,afetam a satisfação dos pacientes com o cuidado recebido. Flocke, Miller eCrabtree (2002) encontraram quatro estilos de interação entre médico e pa-ciente: o estilo focado na pessoa, o biopsicossocial, o biomédico, e o estilocom alto controle pelo médico. Os médicos com o estilo focado na pessoativeram os melhores escores em quatro de cinco medidas de qualidade dorelacionamento e satisfação do paciente. Em contraste, médicos com o esti-lo de alto controle tiveram os escores mais baixos. Médicos com um estilofocado na pessoa faziam as visitas mais longas, enquanto médicos com altocontrole apresentaram as visitas mais curtas. O estilo de interação focado napessoa parece ser o mais congruente com a qualidade de cuidado primáriorelatado pelo paciente. Adams, Smith e Ruffin (2001) observaram os efeitosdo estilo participativo do médico (envolvendo os pacientes no processo detomada de decisão de tratamento) nos resultados com o tratamento da asmae satisfação do paciente. Médicos com estilo participativo faziam visitasclínicas mais longas, geravam maior satisfação no paciente e apresentavamuma relação mais longa com o paciente. Os escores mais altos foram encon-trados para visitas com mais de 20 minutos e quando o paciente tinha umrelacionamento com duração superior a seis meses com um médico em par-ticular. Estes escores também estavam associados à posse de um plano de

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ação escrito para lidar com a asma e a preferências por autonomia nas deci-sões de controle da asma.

Mudanças na tecnologia nos modernos serviços de atendimento à saúdenão indicaram redução na satisfação dos pacientes. Garrison, Bernard e Ras-mussen (2002) investigaram o efeito do uso de computadores sobre a satisfa-ção do paciente com o atendimento médico concluindo que a maioria dos 304pacientes (74.6%) avaliou positivamente o impacto do computador na quali-dade do atendimento. Neste aspecto, as habilidades computacionais do médi-co também esteavam associadas à satisfação dos pacientes com a visita.

Em estudo realizado no Brasil, Pereira e Azevedo (2005), avaliaram, emuma Unidade de Saúde de Rio Branco, o nível de satisfação dos pacientescom o relacionamento médico-paciente. Entre os resultados obtidos, 64% dospacientes consideraram que a relação com o médico interfere diretamente naevolução do caso e, com relação à comunicação, 70% dos pacientes não con-sideraram suficientes as informações oferecidas pelos médicos. No geral, 70%dos pacientes consideraram-se satisfeitos com sua relação com o médico, cujaavaliação estava associada ao modo de comunicação entre eles.

A satisfação por parte dos médicos também tem sido investigada. Se-gundo Bascunan (2005), nas últimas décadas, a deterioração no relaciona-mento médico-paciente (com aumento da desconfiança) influenciou o graude satisfação de médicos com sua prática, levando à frustração e desencan-tamento com a profissão. Os pacientes estão progressivamente assumindoas decisões de cuidado com a saúde. Segundo os autores, a reconstrução dolaço entre pacientes e médicos dentro do novo cenário é indispensável paramelhorar o grau de satisfação de ambos, pacientes e profissionais.

7. Dificuldades e Conflitos

Várias dificuldades no relacionamento médico-paciente têm sido abor-dadas na literatura. Estas podem ser devidas à natureza do paciente (comoter pacientes difíceis, ou ter um médico como paciente), podem ser devidasàs condições de atendimento (como as limitações no atendimento em insti-tuição hospitalar), podem ser impostas pela própria enfermidade ou, ainda,por conflitos de interesse entre médico e paciente.

O fato de o paciente ser médico gera dificuldades de relacionamento.Segundo Tyssen (2001), o médico que presta serviço a outro médico podeser vítima de sentimentos de competência profissional inferior, super-iden-tificação e apresentar uma sociabilidade demasiada com o paciente. A pró-

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pria organização pode dificultar este relacionamento, como no caso das “con-sultas de corredor”. Os médicos, freqüentemente, são tratados de forma di-ferenciada. Como pacientes, tendem a negar seus sintomas e sentem-se en-vergonhados e relutantes em aceitar o papel de paciente. Contudo, confor-me o autor acima, pacientes médicos deveriam ser tratados como pacientescomuns. Em outros casos, a origem da dificuldade no relacionamento seorigina da própria natureza da enfermidade. No caso da esclerose lateralamiotrófica, uma doença progressiva com prognóstico negativo, por exem-plo, Pasetti e Zanini (2000) sugerem que o relacionamento com o pacientenão deveria ser somente informativo, científico e interpretativo-deliberati-vo, mas basear-se em uma sólida aliança terapêutica visando buscar os inte-resses do paciente, respeitando sua autonomia (valores pessoais) e seu bem-estar físico. Para os autores, este é o único modo de enfrentar os conflitos(especialmente em estágios avançados da doença) sem os riscos associadoscom o desejo de fuga ou adotar soluções extremas (como eutanásia). Comoem qualquer outra atividade profissional, existem pacientes ‘difíceis’. Con-forme Hahn (2001), essa dificuldade do médico no relacionamento com opaciente está associada a algumas características: psicopatologia do pacien-te, estilos interpessoais abrasivos, múltiplos sintomas físicos e diferençasentre paciente e médico nas expectativas sobre o tratamento.

O ambiente de trabalho também pode dificultar as relações entre médicoe paciente, como é o caso do ambiente hospitalar. No hospital, conformeWeiberg (2002), entre as dificuldades, estão as tensões causadas pelo pater-nalismo versus autonomia, especialmente quando os pacientes estão em con-tato com mais de uma pessoa pertencente à equipe da instituição. Outradificuldade de origem institucional é a contenção de custos à qual os médi-cos podem ser submetidos. Gorawara-Bhat, Gallagher, Levinson (2003) in-vestigaram como os médicos percebem os conflitos de interesse entre paci-ente e provedor de serviços de saúde, concluindo que os conflitos de inte-resse financeiro prejudicam os encontros entre médicos e pacientes. Nestescasos, sugerem a utilização de estratégias de comunicação para responder aestas preocupações e discutir conflitos de interesse. Segundo os autores, asemoções dos pacientes devem ser consideradas e a negociação deve identi-ficar um alvo comum para médico e paciente.

8. Autonomia

Um dos princípios norteadores do mundo moderno é a busca de autono-mia e a ênfase na liberdade. No atendimento de saúde, a autonomia do paci-

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ente se opõe à atitude paternalista do médico. O conflito entre paternalismoe autonomia do paciente é algo antigo. Ainda que a tarefa da medicina nãoseja banir o paternalismo, ela deve preservar o respeito pelo paciente comouma pessoa (Bruhn, 2001). A autonomia na relação entre médico e pacienteestá associada a características do médico, do paciente e às condições exter-nas (inclusive históricas). Do ponto de vista do médico (em relação à idadee à especialidade), Falkum e Forde (2001) observaram que os índices depaternalismo aumentaram com a idade e os psiquiatras apresentaram os ín-dices mais baixos de paternalismo (entre médicos noruegueses), enquantoas especialidades somáticas apresentaram os índices mais altos. Por outrolado, os psiquiatras apresentaram os mais altos índices de consideração pelaautonomia do paciente, enquanto os cirurgiões apresentaram o menor. Mé-dicos de laboratório e cirurgiões pertenciam mais ao tipo paternalista do queos clínicos gerais, e os médicos se mostraram mais paternalistas que as mé-dicas. Entre os que defendiam a autonomia, havia mais mulheres e maismédicos na faixa dos 40 anos do que na faixa dos 60 anos. Do ponto de vistado paciente, Bruhn (2001), revisando a literatura sobre os limites da autono-mia no relacionamento médico-paciente, constataram a preferência dos pa-cientes por ter controle decisório sobre os resultados do tratamento, masdeixar decisões técnicas sobre como atingir estes resultados para os médi-cos. Do ponto de vista das condições externas, Woodward (2001) apontapara novas direções que o conflito paternalismo x autonomia têm tomadonos últimos anos, com a administração do paciente sendo transferida dosmédicos para os planos de saúde e empregadores, resultando em perda daautonomia tanto por parte do médico quanto do paciente.

9. Continuidade e Mudanças

A continuidade no tratamento com um mesmo médico é uma caracterís-tica que traz maior satisfação para o paciente. As condições atuais do aten-dimento médico, contudo, nem sempre permitem que isto aconteça. Dife-rentes dimensões da continuidade de cuidado têm sido identificadas. Saultz(2003) identificou três dimensões: continuidade informacional, longitudinale interpessoal (de interesse particular para os cuidados primários). Para oautor, futuras pesquisas deveriam procurar compreender melhor a dimensãointerpessoal da continuidade do cuidado. A continuidade é um aspecto fun-damental no caso de doenças crônicas. No caso da asma, por exemplo, ospacientes associaram continuidade de cuidado e qualidade de sua interação

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com o médico (Love, Mainous, Talbert e Hager, 2000). Por causa disso,mudanças nos sistemas de cuidado à saúde que promovem descontinuidadecom médicos individuais podem ser particularmente prejudiciais para paci-entes com doenças crônicas. Finalmente, Facchini (2004), investigando asmudanças de comportamento em tratamentos de longo prazo (doenças crô-nicas), concluiu que o paciente deve ser um participante ativo e respeitado,exercendo um papel fundamental no processo de mudança. De acordo como autor, os médicos deveriam capacitar e estimular seus pacientes para queestes venham a encontrar suas próprias soluções e motivações e se tornemresponsáveis por sua saúde. Intervenções de longo prazo, bem sucedidas eefetivas, requerem um tratamento centrado na adesão e no auto-cuidado.

Relacionamentos em geral são fenômenos históricos que apresentam iní-cio, desenvolvimento e, possivelmente, um fim. O relacionamento em ques-tão também se apresenta como algo que se mantém no tempo e a continuida-de ou mudanças nessa relação podem afetar diretamente os resultados que otratamento médico pode atingir.

10. Conclusão

O relacionamento médico-paciente ocorre dentro de uma estrutura deatendimento à saúde que está em constante modificação, criando ou delimi-tando as possibilidades deste relacionamento. Dos aspectos deste relaciona-mento acima discutidos, vários podem afetar positivamente o curso do trata-mento e da recuperação do paciente ou gerar um maior índice de satisfação.Desta forma, seja pelos resultados objetivos obtidos, seja pela satisfaçãodos clientes com o serviço oferecido, o relacionamento é uma dimensãorelevante dos serviços de saúde oferecidos à população.

A investigação do relacionamento entre médico e paciente tem ocupadouma posição de destaque entre os estudos sobre as relações entre prestado-res de serviços e seus clientes, podendo contribuir efetivamente para umateoria geral dos relacionamentos. Algumas particularidades quanto a pontosespecíficos desse relacionamento são evidentes nestes estudos, como é ocaso do interesse pelos efeitos do relacionamento na adesão ao tratamento.A falta de adesão ao tratamento, por exemplo, pode comprometer os resulta-dos que poderiam ser alcançados com novas formas de tratamento e novosmedicamentos. Neste caso, um bom relacionamento entre médico e pacien-te pode significar a própria inserção e o acesso, por parte dos pacientes, anovas formas de tratamento, resultado, por vezes, de anos de pesquisa médi-ca com altos investimentos.

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Um diálogo maior entre a ciência do relacionamento interpessoal e ocampo específico dos estudos sobre este relacionamento poderia trazer be-nefícios para as duas áreas de investigação. De modo geral, deve-se apontarque tal relacionamento não se encerra nas determinações éticas da práticaprofissional, em questões em torno de confidencialidade, entre outros te-mas. Trata-se de um relacionamento complexo por sua própria natureza,onde o paciente é, ao mesmo tempo, um objeto de investigação (um conjun-to de processos fisiológicos que podem apresentar problemas) e o sujeitoque contribuirá ou não com as medidas necessárias para o seu próprio trata-mento e cura. Todas as conquistas da medicina podem ser prejudicadas porfalhas no relacionamento médico-paciente, como no caso da falta de adesãoao tratamento, na falta de confiança no relacionamento com o médico, ou nadificuldade de comunicação entre o médico e o paciente.

Do ponto de vista teórico, a investigação deste relacionamento pode for-necer dados para se avançar na compreensão de outros relacionamentos pro-fissionais, em outros campos do saber. Do ponto de vista prático, as propri-edades deste relacionamento afetam diretamente os resultados do tratamen-to. Levando-se em conta uma visão mais empresarial da medicina, as di-mensões do relacionamento médico-paciente estão diretamente relaciona-das com a qualidade do atendimento. Em um mercado competitivo, os di-versos aspectos aqui abordados, como confiança, adesão ao tratamento, co-municação, empatia, satisfação, dificuldades e conflitos, autonomia, conti-nuidade no tratamento, contribuem para que estes serviços apresentam dife-rentes níveis de qualidade. Um bom relacionamento entre médico e pacientepode contribuir para a obtenção de resultados favoráveis no tratamento dopaciente. Um relacionamento precário, por outro lado, pode resultar em umatendimento de qualidade inferior, com prejuízo nos resultados para o paci-ente, mesmo diante dos avanços no conhecimento médico. Desta forma, asituação ideal para a prática médica seria aliar os avanços no conhecimentomédico e nos recursos tecnológicos disponíveis a uma melhoria progressivana qualidade das relações humanas envolvidas.

Referências

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Baile, W. F. & Aaron, J. (2005). Patient-physician communication in oncology: past,present, and future. Current Opinion in Oncology, 17 (4), 331-335.

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6A AMIZADE DA INFÂNCIA À

TERCEIRA IDADE – OLHARES DIVERSOS

Isis Fiorio AlbertassiLorena Queiroz Merizio

Maria Tereza Bragança BoreliRodrigo dos Santos Scarabelli

Agnaldo Garcia

O objetivo deste capítulo é apresentar parte dos resultados que vêm sen-do obtidos em pesquisas realizadas por membros do “Núcleo Interdiscipli-nar para o Estudo do Relacionamento Interpessoal” (NIERI), da Universi-dade Federal do Espírito Santo. Os dados e discussões apresentadas a seguirsão uma síntese de quatro pesquisas realizadas por alunos do Curso de Psi-cologia da UFES, sob a orientação do último autor, as quais foram apresen-tadas na Mini Conferência da International Association for RelationshipResearch, realizada em Vitória, em 2005.

Três dos estudos relatados abordam a amizade na infância. As relaçõesde amizade representam uma área de pesquisa em franco desenvolvimento,principalmente nos últimos 20 anos, acompanhando a consolidação dos es-tudos sobre relacionamento interpessoal na literatura internacional. Apesardas relações de amizade já terem sido discutidas por Aristóteles, em suaÉtica a Nicômaco, o interesse da Psicologia pela amizade e, particularmen-te, pela amizade na infância, ainda é recente. Ainda assim, tal temática épouco explorada e quase inexistente na produção científica nacional. A ami-zade desempenha um papel relevante na vida social da criança, em seus

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aspectos emocionais, sociais e cognitivos, proporcionando oportunidade parao desenvolvimento emocional, a socialização, o desenvolvimento de valo-res éticos e morais, além de representar um dos relacionamentos que maiorsatisfação traz à vida da criança.

A literatura sobre a amizade na infância é diversificada. Estudos clássi-cos sobre a amizade infantil têm revelado diferentes propriedades dessa for-ma de relação social (Freeman & Kasari, 2002; Garcia, 2002; Garcia, 2005b;Ray, Cohen & Secrist, 1995; Schneider, Wiener & Murphy, 1994; Wiener &Schneider, 2002; Gottman, Gonso & Rasmussen, 1975, Rubin, 1980; Erwin,1993; Bukowski, Newcomb & Hartup, 1996, entre outros). Entre os aspec-tos psicológicos da amizade na infância investigados estão: a agressividade(Brendgen, Vitaro, Turgeon & Poulin, 2002), o conflito (Hartup, French,Laursen, Johnston et al., 1993; Schneider, Fonzi, Tomada & Tani, 2000), arejeição (Brendgen, Little & Krappmann, 2000), os preditores de amizades(Dunn, Cutting e Fisher, 2002), amizades em crianças com necessidadesespeciais ou deficiência física (Freeman & Kasari, 2002; Wiener & Schnei-der, 2002; Mulderij, 1997), amizades entre crianças de idade pré-escolar(Garcia-Werebe & Baudonniere, 1988), a dinâmica temporal da amizade(Berndt, Hawkins & Hoyle, 1986; Parker & Seal, 1996), amizade na infân-cia e desenvolvimento emocional (Salisch, 2001) e amizade e aceitação pe-los colegas (Schneider, Wiener & Murphy, 1994). O conhecimento disponí-vel sobre os aspectos psicológicos da amizade na infância é devido, basica-mente, ao material fornecido por pesquisas realizadas no exterior, em paísesdesenvolvidos.

Garcia (2005a), em uma revisão crítica da literatura recente sobre osaspectos psicológicos da amizade na infância, propôs doze grupos temáti-cos ou tópicos que vêm sendo investigados: aspectos metodológicos; con-ceitos clássicos (como similaridade e simetria, entre outros); amigos e re-des de amigos, colegas e popularidade; amizade e família; cooperação ecompetição, compartilhar e comportamento pró-social; rejeição, negligên-cia, abuso, depressão e solidão; aspectos cognitivos (percepção, expecta-tivas e conceito), afetivos (emoções) e culturais na amizade; deficiênciafísica e mental; estabelecimento, estabilidade e mudança da amizade; apoiosocial; conflito e agressividade; e escola, ajustamento e competência soci-al. A partir da análise dessa literatura destacou os seguintes pontos da lite-ratura sobre a amizade na infância nos últimos dez anos: a) a presença deorientações teóricas diferentes; b) a presença de estratégias metodológi-cas diversificadas; c) a falta de uma abordagem teórica da amizade; d) opredomínio do estudo de dimensões da amizade, em detrimento da amiza-

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de como um todo; e) a carência de investigações em culturas e países emdesenvolvimento; f) a carência de estudos de natureza mais amplamentesocial e cultural. O autor ainda propôs algumas possíveis orientações depesquisa empírica e teórica visando a organização de uma estrutura teóri-ca para os estudos da psicologia da amizade na infância, como uma subá-rea de uma ‘ciência do relacionamento interpessoal’, conforme propostapor Robert Hinde (1997).

O primeiro estudo cujas conclusões são aqui sintetizadas diz respeito aorelacionamento entre a criança e seu animal de estimação, particularmente ocão. Crianças estabelecem relações duradouras e intensas com esses ani-mais, que também afetam seu desenvolvimento. A relação entre a espéciehumana e os animais de estimação é antiga. Konrad Lorenz (1997), PrêmioNobel de Medicina ou Fisiologia de 1973, em seu livro sobre as relaçõesentre o homem e o cão (publicado originalmente em 1950), descreveu algu-mas das propriedades desse relacionamento. A relação estabelecida entre ocão e o seu dono constitui uma rede complexa de emoções. Segundo o autor,possuir um cão com uma personalidade que espelha a nossa confere-nos umsentimento de equilíbrio e de tranqüilidade interior. O tipo de cão que umapessoa escolhe revela dados acerca dela mesma. Assim como ocorre nasrelações humanas, as semelhanças conduzem à satisfação de ambos os la-dos. De acordo com Lorenz (1997), pode-se perceber semelhanças no com-portamento do dono e do cão que convivem por um longo tempo. Ainda deacordo com o autor, o cão deixou de ser apenas um animal destinado à vigi-lância da residência, passando a ocupar um lugar na instituição social e fa-miliar.

O relacionamento entre as crianças e os animais de estimação tem mos-trado aspectos relevantes para a saúde e a socialização da criança, com pos-sibilidades terapêuticas (Garcia, 2000) ou indicando problemas comporta-mentais futuros, como é o caso da crueldade infantil contra animais (Garcia,1999). Ainda possibilita o desenvolvimento da capacidade para lidar comaspectos não-verbais do relacionamento social e o desenvolvimento emoci-onal (Garcia, 2001). A literatura sobre o tema geralmente aborda as relaçõesentre a criança e os animais em termos de atitudes ou comportamento social(e.g., Ascione, 1992; DeViney, Dickert & Lockwood, 1983; Gage & Marg-nuson-Martinson, 1988).

A presente pesquisa buscou abordar a relação entre a criança e o animalde estimação da perspectiva dos estudos sobre o relacionamento interpesso-al, particularmente dos estudos sobre a amizade na infância, procurandoinvestigar as semelhanças e diferenças entre esta forma de relacionamento e

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uma amizade típica com outra criança. Os animais, em especial os cães,despertam a atenção e o afeto das crianças desde a mais tenra idade. Emdiversos âmbitos da vida social, afetiva e intelectual da criança, o relaciona-mento que estabelece com um cão é benéfico, uma vez que promove, entreoutros aspectos, uma maior capacidade para se relacionar afetivamente comoutras pessoas, favorecendo a aprendizagem de fatos fundamentais da vida,como o nascimento, a procriação e a morte. Ainda possibilita o despertar daconsciência e da responsabilidade das crianças em termos ecológicos e éti-cos, perante a natureza e os seres vivos, o que auxilia o desenvolvimento depráticas humanitárias, visto que o animal é um ser vivo. Sob esse aspecto, ainteração criança-animal possui um alto valor terapêutico, seja no tratamen-to de problemas físicos ou psicológicos.

O segundo trabalho cujos resultados são brevemente apresentados aquise refere a um levantamento de aspectos gerais da amizade entre alunos deuma escola pública com idade entre sete e doze anos. Esta investigação deuseqüência a estudos realizados com crianças matriculadas no ensino funda-mental da rede particular de ensino (Garcia, 2004). A presente investigação,de caráter exploratório e descritivo, procurou apresentar novas informaçõessobre as relações de amizade de crianças da rede pública de ensino.

O terceiro trabalho, cujos resultados são brevemente discutidos nestecapítulo, trata da amizade entre crianças com necessidades especiais e seuscolegas, tema de pesquisa recente e praticamente inexplorado em nosso país.As amizades são uma importante fonte de motivação e de satisfação para ascrianças e conhecer os fatores envolvidos nas amizades entre crianças comnecessidades especiais e seus pares pode ajudar a promover sua integraçãosocial em um ambiente positivo e apoiador, contribuindo para sua qualidadede vida e bem-estar social (Tavares & Garcia, 2003; Coelho & Garcia, 2003).

Estudos sobre amizade em crianças portadoras de deficiência incluemcasos de deficiência física (Tamm & Prellwitz, 2001; Mulderij, 1997); cri-anças com deficiências de aprendizagem (Wiener & Schneider, 2002; Wei-serbs & Gottlieb, 2000; Siperstein, Leffert & Wenz-Gross, 1997); portado-ras de Síndrome de Down (Freeman & Kasari, 2002) e autismo (Bauminger& Kasari, 2000; Danko & Buysse, 2002) ou com deficiências de desenvol-vimento (Freeman & Kasari, 1998). De forma mais ampla, Garcia (2002)realizou uma revisão sobre amizade, enfermidade e deficiência na infância ena adolescência. De modo geral, estes estudos apontam para duas direções:o reconhecimento das relações de amizade entre as crianças portadoras denecessidades especiais (o que nem sempre foi reconhecido) e a discussão daespecificidade ou de propriedades diferenciadas para essas relações de ami-

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zade, que seriam, em última instância, parcialmente diferentes das amizadesentre duas crianças típicas. Quanto ao primeiro ponto, mesmo nos casos emque as interações sociais são bastante prejudicadas por algum tipo de defici-ência, como é o caso do autismo, os autores têm identificado e descritorelações de amizade (ao menos em casos de crianças autistas com alto de-sempenho), como é o caso de Bauminger e Kasari (2000) e Danko e Buysse(2002). Quanto ao segundo ponto, usualmente as relações de amizade en-volvendo crianças com algum tipo de deficiência apresentam qualidadesparticulares, como uma tendência à assimetria, ou preferência por criançasmais jovens, ou são consideradas amizades emergentes (Freeman & Kasari,2002).

Finalmente, o quarto trabalho aqui relatado investigou aspectos da amiza-de na terceira idade. Diversos pesquisadores, apontados por Findlay (2003),evidenciam a relação entre a qualidade dos relacionamentos sociais, entre elesa amizade, e a saúde e o bem-estar do idoso. O aumento do isolamento socialentre pessoas acima de 65 anos está diretamente relacionado ao crescimentode taxas de mortalidade, hipertensão arterial, depressão, aumento do risco desenilidade e até suicídio. Assim, a manutenção dos vínculos com familiares eamigos é importante para a saúde e o bem-estar do idoso. Todavia, existemdificuldades para o idoso manter uma amizade, pois suas relações mais próxi-mas, íntimas e apoiadoras tendem a se restringir aos familiares (Stevens, 2001),que dificilmente podem suprir todas as características positivas e a satisfaçãodos relacionamentos com amigos. Os idosos ainda preferem pedir auxílio paraamigos e vizinhos que para seus familiares quanto aos problemas diários (Got-tlieb, 1985). Os amigos podem ser fontes de apoio em circunstâncias estres-santes, como no período de aposentadoria, perda do cônjuge, mudança paraum asilo, entre outras (Stevens, 2001). Além disso, relações recíprocas, comvínculo afetivo e pouca pressão social, como as com amigos, são mais rele-vantes para a auto-estima e para o bem-estar psicológico do que as com osfamiliares (Antonucci & Akiyama, 1995). Segundo Litwak (1985), tratandode idosos, amigos são mais confiáveis do que familiares para compartilharassuntos mais pessoais e desempenham papel significativo para introduzir oidoso na sociedade. De acordo com Adams e Bliesner (1995), com amigosnão se tem temor de que segredos e intimidades sejam disseminados, comoaqueles confiados a familiares. Assim, as relações de amizade são de grandeimportância para o idoso. Além disso, segundo Shea, Thompson e Bliesner(1988), os idosos preferem amizades já existentes em detrimento de amizadesnovas. Segundo Hartup e Stevens (1997), amigos antigos são especialmentevaliosos para sustentar valores, pensamentos e outros códigos de comporta-

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mento estimados pelo idoso em um mundo em constante processo de mudan-ças, permitindo que eles dividam experiências e interpretações de eventospassados e presentes. Entretanto, o idoso encontra dificuldades para manterseu círculo de amizades e, mais ainda, para fazer novos amigos, de maneiraque o risco de isolamento social ou do sentimento de solidão pode aumentargradativamente com a idade. Esse sentimento de solidão dificilmente se reduzsignificativamente, ou isso ocorre com muito esforço, mesmo com a promo-ção de programas que privilegiam o encontro entre os idosos (Stevens, 2001).Somente colocar idosos em contato para conhecer novas pessoas não é sufici-ente para que amizades efetivamente sejam feitas ou que se reduza o isola-mento social ou o sentimento de solidão, pois tais lugares não são pontos deencontro naturais, baseados em interesses mútuos em se relacionar com al-guém (Stevens, 2001).

Trabalhos de cunho mais teórico em relação à amizade na terceira idadeincluem a aplicação da teoria de continuidade (Finchum & Weber, 2000) e aconsideração da continuidade e mudanças nessas amizades (Filed, 1999).Segundo Carstensen (1991), as pessoas selecionam companheiros de acor-do com suas percepções sobre os custos (energia despendida, experiênciasemocionais negativas) e os benefícios (suporte social, experiências positi-vas) envolvidos. Com o envelhecimento, há uma tendência a preferir-semanter os relacionamentos já estabelecidos e mais íntimos, com seus me-lhores amigos e familiares, com quem já se tem experiências positivas hámuitos anos. Há uma tendência para interagir menos freqüentemente comamigos mais casuais e colegas, pela energia requerida e pelos benefíciosmenores e menos certos. Por isso, é possível que a redução de contato comoutrem não signifique a perda das amizades mais importantes e íntimas esta-belecidas, mas apenas quanto a relacionamentos mais superficiais e periféri-cos (Ferraro & Farmer, 1995). Adams e Torr (1998) e Adams e Bliesner(1995) sugerem como possíveis focos de análise a estrutura da amizade e osprocessos nela envolvidos. Estrutura relaciona-se ao tamanho da rede derelações, sua densidade e homogeneidade ou heterogeneidade (nível de se-melhança entre os amigos quanto ao sexo, raça, classe social, grupo religio-so, idade, entre outros fatores). Os processos envolvidos incluem aspectoscognitivos (lealdade ou compromisso, confiança, interesses ou valores emcomum, aceitação, empatia, apreço, respeito, entre outros.); afetivos (com-patibilidade, atenção, preocupação com o outro) e comportamentos (socia-bilidade, auto-revelação, assistência, atividades feitas em conjunto, entreoutros) envolvidos no relacionamento (Adams, Bliezner & Vries, 2000). Énecessário conhecer a qualidade das amizades e a dinâmica de funciona-

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mento e não somente reconhecer sua existência (Adams e Blieszner, 1995).Várias diferenças entre gêneros também são apontadas nas amizades entreidosos (Adams, Blieszner & Vries, 2000). Enquanto a amizade entre asmulheres é face-a-face, devido à tendência de repartirem experiências demaior conteúdo emocional, aquela entre homens é lado-a-lado, devido àsatividades em conjunto. As mulheres têm mais oportunidades para estabele-cer, manter e expressar vínculos afetivos, o que se relaciona com os diferen-tes processos de socialização de homens e mulheres. Por fim, é possível queos vínculos entre amigos na terceira idade sejam preservados, resgatados eaté fortalecidos pelos idosos. Neste período de vida, em que não precisammais cuidar dos filhos, as reduzidas obrigações e tarefas diárias podem terum efeito positivo nas oportunidades para fazer, manter e melhorar relaçõesde amizades (Adams, Blieszner e Vries, 2000). Ademais, complementamestes autores, quanto maior o período de vida, maior terá sido, provavel-mente, a vivência de relacionamentos íntimos, gerando uma grande experi-ência e conhecimento adquirido quanto à dinâmica dos relacionamentos deamizade.

A amizade na terceira idade apresenta relevância social e científica,apesar da falta de informações e elaborações teóricas sobre o tema. Empaíses como o Brasil, com uma população de idosos em crescimento, mai-ores informações sobre suas amizades podem auxiliar na elaboração depolíticas públicas para o bem-estar, a saúde e a integração social do idoso.

1. A Amizade entre Crianças e Animais

O objetivo deste trabalho foi investigar e descrever o relacionamentoentre crianças de 7 a 10 anos com seus cães de estimação (10 meninos e 10meninas) e comparar aspectos desse relacionamento com as relações deamizade com outras crianças, a partir da literatura. Para isto, foram obtidosos relatos das crianças, dos pais, além da observação do comportamento dascrianças em companhia dos cães. O estudo do relacionamento entre pessoase seus animais de estimação pode fornecer informações valiosas sobre oindivíduo e seus relacionamentos com outras pessoas.

Entre os cães dos vinte entrevistados, havia doze Poodles, dois da raçaLhasa Apso, dois sem raça definida, um York Shire, um Pincher, um HuskySiberiano e um labrador. A predominância dos poodles possivelmente es-teja relacionada ao espaço disponível, com várias famílias residindo emapartamentos. Também são consideradas raças mais dóceis, sociáveis e

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passíveis de adestramento os escolhidos por famílias que querem que osfilhos estabeleçam vínculos com aos animais, sem a preocupação de umcomportamento mais agressivo por parte do cão. O tipo de cão que umadada pessoa escolhe revela dados acerca da mesma. Assim como ocorrenas relações humanas, características ou comportamentos semelhantesconduzem à satisfação de ambos os lados. De acordo com Lorenz, “numdono e no seu cão, quando já estão juntos há algum tempo, semelhançasde conduta são facilmente perceptíveis” (Lorenz, 1997, p. 101).

Os dados obtidos pela presente pesquisa indicam que ter um cão comocompanheiro é similar a ter um amigo. A companhia dos cães, contudo, cos-tuma restringir-se ao espaço doméstico (a criança raramente sai para passe-ar com o cão, quando ela assume um papel assimétrico). Desempenhar ativi-dades em comum é outra marca do relacionamento entre a criança e o ani-mal. A atividade mais freqüente entre a criança e o cão foi o brincar, geral-mente com objetos do cão, além de correr. O brincar em conjunto é umponto de similaridade com as amizades. As brincadeiras, contudo, podemser mais assimétricas (buscar objeto) ou simétricas (correr e perseguir, comalternância de papéis). O brincar com o cão é, aparentemente, uma atividademais assimétrica do que o brincar com outra criança (o que, contudo, podeocorrer na interação com crianças mais novas). Conversar é uma das princi-pais atividades com os amigos. Apesar das crianças também “conversa-rem” com seus cães, a comunicação apresenta propriedades diferentes daconversa com outra criança. Por outro lado, a comunicação não-verbaltambém é muito importante. De qualquer forma, há uma comunicação in-tensa entre a criança e seu animal de estimação, ainda que esta apresenteuma natureza diferente da comunicação com outra criança. Do ponto devista do relacionamento entre criança e cão, o fato da criança participar decuidados relativos ao cão indica outro ponto de assimetria no relaciona-mento. Esta assimetria, contudo, também pode ser observada entre irmãos,quando a criança participa dos cuidados de um irmão menor.

Existem interações agressivas entre as crianças e seus cães de estimação.Usualmente, estas interações são vistas como justificadas e causadas por ummotivo claro. A agressividade se dá dos dois lados: a criança e o cão. Aexistência de episódios de conflito ou de agressividade não impede que umarelação seja considerada como amizade. As relações de dominância, quesão muito comuns entre homens e cães, apontam para um relacionamentoassimétrico, em que um deles exerce poder sobre o outro, que obedece. Dare receber ordens, do ponto de vista do relacionamento interpessoal, indicaum relacionamento assimétrico, o que não seria típico de uma relação de

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amizade, ainda que amizades entre crianças de idades diferentes possamapresentar elementos assimétricos.

O comportamento amistoso, na forma de acariciar, possivelmente é maisintenso com relação aos cães de estimação do que com relação a um amigo.Algumas posturas adotadas pelos cães nas interações físicas, como de ven-tre para cima, indicam uma postura de submissão (novamente assimétrica).Contudo, há um intenso relacionamento afetivo e o gostar do cão é similarao gostar de um amigo. O lamber também faz parte do comportamento docão em relação a seu filhote. Novamente, parece haver uma adaptação dorepertório da espécie, que se estende para o convívio com o ser humano que,por sua vez, interpreta esses comportamentos de acordo com seus relaciona-mentos com outros seres humanos.

Do ponto de vista social, os pais consideraram o cão como amigo dofilho. Entre os motivos alegados, está o fato do cão ser boa companhia, porbrincarem juntos ou apresentarem boa interação, pelo cão demonstrar gos-tar da criança e por ser carinhoso. Outros motivos incluem o fato da criançae o cão gostarem de ficar juntos, por um não ficar sem o outro (forte laçoentre ambos), pelo cão sentir falta da criança e pelo cão auxiliar na seguran-ça da casa.

O contato entre a criança e o cão, em comparação com as relações deamizade com outras crianças, mostra algumas semelhanças notáveis. Umdos pontos mais significativos das amizades infantis é o papel da atividadecomum como mediador das relações de amizade, especificamente o brincar.Desta forma, quando a criança manifesta sua ‘amizade’ pelo cão, pode-sedestacar que, ao brincar com seu animal de estimação, ela está desempe-nhando a principal atividade que desempenharia com um amigo humano(ainda que o brincar com o cão exiba padrões particulares de atividades). Ofato do cão e da criança participarem conjuntamente de brincadeiras co-muns, como perseguir, caçar, ir à busca de uma presa, ou brincar com ooutro como se fosse uma presa, também pode ser observada entre filhotes decães (entre filhotes de carnívoros em geral). Possivelmente, o cão brincacom a criança de forma semelhante a como brincaria com outro cão. Poroutro lado, as crianças também participam de brincadeiras que envolvemperseguição, com comportamentos similares aos empregados no contextode caça. Desta forma, o cão e a criança conseguem brincar em conjunto pelasimilaridade do seu repertório geral de brincadeiras. Isto é uma indicação deque os laços entre a criança e seu animal de estimação, principalmente cãesé, pelo menos, semelhante aos laços de amizade que unem duas crianças.Outra dificuldade, de natureza teórica, é que o arcabouço conceitual para

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explicar o comportamento social dos animais é de natureza diversa daqueleutilizado para interpretar as relações humanas. Isto é, em parte, resolvidocom a aproximação dos estudos sobre o comportamento animal e os estudosde Psicologia Social, como empreendidos por Robert Hinde(1979,1987,1997).

As respostas dadas pelas crianças quanto a como se relacionam comseus cães, os sentimentos e motivações envolvidos, também são semelhan-tes àqueles que apresentam em relação a outras crianças que consideramcomo amigos. Gostar, buscar a companhia, chamar, conversar aparecem nasduas situações. Já algumas formas de agir, como cuidar da higiene do cão,acabam por ficar a cargo dos pais. Este comportamento está mais relaciona-do a cuidados parentais de modo que, enquanto para a criança o cão ocupa olugar de um amigo (e mesmo de um irmão), para os pais ele ocupa a posiçãode alguém que necessita de cuidados, como uma criança. Isto não impedeque os adultos, eventualmente, também brinquem com seus cães, da mesmaforma que brincam com seus filhos.

Os estudos sobre o relacionamento interpessoal geralmente envolvempessoas, de ambos os lados. Os estudos de relacionamento entre seres hu-manos e outros animais tornam-se muito mais complexos, pelas diferen-ças entre as espécies. Nesta investigação, procuramos interpretar o relaci-onamento entre a criança e seu animal de estimação (no caso, cães) comouma amizade. Há uma série de pontos de aproximação entre as amizadestípicas entre duas crianças e o relacionamento com o cão de estimação,especialmente em atividades compartilhadas, como o brincar. Por outrolado, o relacionamento envolve alguns cuidados ou relações de dominân-cia e outras formas de assimetria que não seriam típicos de relações deamizades (o que não significa que não existam assimetrias em amizadestípicas). Ainda assim, poderíamos denominar o relacionamento entre cri-ança e seu cão de estimação como uma relação particular de ‘amizade’,com alguns pontos em comum com a relação de amizade com outras crian-ças e alguns pontos diferenciados. Possivelmente, outras espécies de ani-mais de estimação mostrarão uma inserção diferente na família ou na soci-edade. O próprio cão, como animal de estimação, possivelmente apresen-ta relações diferenciadas com diferentes membros da família, o que, aindapoderá sofrer a influência da própria raça do cão, assim como da estruturafamiliar na qual está inserido.

Segundo Lorenz, “todo o encanto do cão reside na profunda amizade ena força dos laços (...) que o ligam ao homem” (Lorenz, 1997, p. 12). Emquase a totalidade das respostas e observações, nota-se esse encanto pelo

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cão que chega a ocupar, por vezes, o lugar de um irmão, de um filho. Nasociedade atual, com a redução do número de filhos por casal, o animal deestimação passa a ser uma companhia importante para a criança. É com ocão que a criança poderá contar nos mais diversos momentos, seja para ‘de-sabafar’ ou para se distrair. A relação entre a criança e o cão traz alegria,além de ser instrutiva, do ponto de vista social. Mesmo quando a criançapossui um outro irmão, é no cão que ela encontra uma companhia fiel, sem-pre disposta a brincar: Segundo uma das crianças entrevistadas: “eu tenhoela pra brincar. Antes, só tinha meu irmão. A gente brinca com ela. Ela me-lhorou lá em casa”. Questões que não seriam contadas para outras pessoas,são contadas para os cães, e as crianças, na maioria das vezes, afirmam queo cão entende o que está acontecendo. Os pais confiam na relação estabele-cida entre os filhos e os cães, certos de que um alegrará o outro. Os cuidadosmais voltados à alimentação e higiene cabem à mãe, enquanto as ordens,geralmente, são dadas pelos pais. O cão é uma importante presença no seioda família, na medida em que todos se envolvem com ele, chegando a con-siderá-lo como um membro da família.

O relacionamento entre a criança e seu animal de estimação reflete umadiversidade de influências. Transformações do ambiente físico, como mu-danças nos locais de habitação, influenciam a disponibilidade de espaço efazem surgir novas formas de comportamento entre criança e cão. Mudan-ças sociais, como aquelas atingindo a estrutura familiar, com famílias meno-res e pais com mais atividades fora de casa, abrem novos espaços para osanimais de estimação, especialmente na classe média, no meio urbano. Cãespequenos, que podem viver em ambientes restritos e conviver com as crian-ças, são característicos de nossa sociedade urbana contemporânea. Mesmomudanças culturais (incluindo a valorização dos animais, sua presença cons-tante nos meios de comunicação, incluindo o cinema e a literatura) e econô-micas (expansão da indústria e comércio voltado para esses animais) influ-enciam o modo como as pessoas reagem aos animais.

2. Relações de Amizade em CriançasPortadoras de Necessidades Especiais

O objetivo do presente trabalho foi investigar as amizades entre criançasportadoras de necessidades especiais e seus pares, procurando descrever arede de amigos e as propriedades da amizade a partir de entrevistas e obser-vações em seu ambiente social, levando em conta, também, a percepção dos

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pais e professores. A presente pesquisa procurou obter dados a partir dediferentes fontes, visando a reunir o maior número de informações possível,tendo em vista que métodos tradicionais, como entrevistas com o partici-pante, nem sempre resultam em dados satisfatórios, especialmente quandose trata de pesquisa envolvendo crianças com necessidades especiais.

Das crianças que participaram da pesquisa, três apresentavam Síndromede Down. Os outros três incluíam casos de autismo, hiperatividade e Sín-drome de Willis. O primeiro ponto a destacar, a partir dos dados obtidos, foia identificação da presença de relações de amizade em todos os casos obser-vados, com exceção do menino com autismo. Assim, pode-se inferir que acapacidade de comunicação é um dos fatores básicos para possibilitar umaamizade.

Fazendo uma análise comparativa entre os participantes, poucos casosde amizade foram recíprocos, sendo a maioria, unilateral, partindo da cri-ança com necessidades especiais, baseado em algum interesse na ativida-de da outra criança. A atividade de brincar desempenhou um papel funda-mental nas relações de amizade com crianças típicas, mostrando-se comoum veículo mediador tanto nos casos de amizade unilateral, quanto nasamizades recíprocas. As brincadeiras preferidas pelos participantes foramas mesmas de outras crianças, o que pôde contribuir para o estabelecimen-to de amizades. Estas, na infância, são em grande parte, baseadas na parti-cipação nas mesmas atividades (especialmente brincar). Também foramobservadas diferenças importantes em situação de sala de aula e situaçãode recreio, quanto às interações sociais com outras crianças. No recreio,as interações acontecem mais vezes, enquanto na sala de aula, geralmente,as crianças com necessidades especiais não acompanham as mesmas ativi-dades que os colegas. Este fato observado indica, novamente, a importân-cia da brincadeira para a integração dessas crianças. Possivelmente, o queocorre é que, ao brincarem juntas, as semelhanças entre as crianças, e nãoas diferenças, são ressaltadas.

As crianças com necessidades especiais geralmente indicaram criançastípicas como amigas (na maioria dos casos de forma não recíproca). Este éum importante ponto de discussão, uma vez que a similaridade é considera-da um fator central nas relações de amizade. As crianças indicadas comoamigas pelos participantes usualmente não os indicaram espontaneamentecomo amigos, mas, diante de uma questão direta, alguns reconheciam estascrianças como amigos, o que não ocorreu em todos os casos. O reconheci-mento das crianças com necessidades especiais como amigos pelas criançastípicas parece decorrer do interesse destas em relação a eles. Assim, as cri-

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anças típicas consideram como amigos as crianças com necessidades espe-ciais que os procuram para brincar ou que demonstram gostar delas.

Os pais, em sua maioria, indicaram como amigos de seus filhos criançasde outros ambientes, que não a escola (como vizinhos), e consideraram asrelações de amizade de seus filhos superficiais, em decorrência da deficiên-cia, com exceção dos pais de um menino com Síndrome de Down e de umamenina com Síndrome de Willis. Os pais parecem ver mais dificuldades derelacionamento dos filhos com deficiências do que professoras e colegas daescola. Para a maioria dos colegas, a restrição em relação às crianças comnecessidades especiais parece estar não na deficiência em si, mas no tipo decomportamento e preferências que estas têm. Dentre os quatro tipos de defici-ência observados, os casos de Síndrome de Down e de Willis foram o quemenos apresentaram restrições nas relações de amizade, conforme professo-res e pais. O menino hiperativo, embora tenha sido considerado por pais eprofessores como tendo relações de amizade prejudicadas, ao ser observado,comportou-se com os amigos de modo similar às outras crianças (típicas).

As relações de amizade são importantes para o bem-estar social e psi-cológico de crianças típicas e com necessidades especiais. A busca poramigos por parte destas crianças, observada nesta pesquisa, indica queelas também valorizam a amizade. Cabe às famílias e às instituições deensino facilitarem essas amizades, levando em consideração as caracterís-ticas destas crianças e a natureza da amizade na infância.

3. Psicologia da Amizade na Infância –Um Estudo na Escola Pública

O objetivo da presente pesquisa foi investigar e descrever aspectos psi-cológicos da amizade na infância entre crianças brasileiras, residentes naGrande Vitória, freqüentando o ensino fundamental em escola pública mu-nicipal de Vitória. Foram investigados os seguintes aspectos da amizade: (a)a rede de amigos; (b) o ciclo da amizade; (c) cooperação e competição; (d)atividades com amigos; (e) o melhor amigo, (f) amizade na família, (g) ami-zade na escola; (h) emoções e amizade; e, (i) avaliação da amizade. Os da-dos obtidos apresentam um panorama geral e descritivo das relações deamizade construído a partir de entrevistas com 40 crianças de 7 a 12 anos,alunos da primeira à quarta série. Dentro de cada um destes itens, a partirdos dados obtidos, alguns pontos podem ser destacados.

(a) Quanto à rede de amigos, a maior parte deles pertence ao mesmo

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gênero e, geralmente, freqüentam os mesmos locais (escola e vizinhança).As idades das crianças entrevistadas e dos amigos mencionados são bastan-te próximas. A proximidade e a semelhança surgem como fatores importan-tes no estabelecimento de relações de amizade. Apesar dos adultos teremraramente sido citados em um primeiro momento, a maioria das criançasinformou ter amigos adultos, idosos e também um animal de estimação comoamigo, diante de uma questão direta. A existência de um melhor amigo foiindicada pela maioria dos participantes. A rede de amigos é composta pri-meiramente por outras crianças, mas, possivelmente, poder-se-ia indicar umarede de amigos de ‘segunda ordem’, incluindo adultos, idosos e mesmo ani-mais. (b) O ciclo da amizade envolve todas as fases, desde o primeiro con-tato até o possível término da mesma. No estabelecimento de amizades, osparticipantes geralmente informam fazer amizades facilmente. Por outro lado,a maioria não relatou nenhum término de amizade. (c) A cooperação e acompetição foram reconhecidas na amizade. A maioria reconheceu a ajudapor parte de seus amigos, enquanto apenas uma parte indicou competir comos amigos. (d) A atividade mais citada em companhia dos amigos foi o brin-car (com o melhor amigo, também foi citado o conversar). (e) O melhoramigo pode ser uma única pessoa ou várias, geralmente do mesmo gênero ede idade próxima à da criança. Algumas vezes, o melhor amigo é um parente(irmão ou irmã, primo ou prima, e mesmo a avó). Dois participantes citaramtodos os amigos como melhores amigos. Na maioria dos casos, os partici-pantes conhecem o melhor amigo há bastante tempo (desde a creche ondeestudaram, antes da escola atual). A maioria conhece o melhor amigo hápelo menos quatro anos. (f) A amizade na família, usualmente, considera-setendo início no ato do nascimento. Na família, o pai e, especialmente a mãe,foram considerados como amigos pelos participantes, assim como os irmãos,além de outros membros da família, como primos, tios e avós. (g) Os locaismais importantes e freqüentes de encontro são a escola, a rua (perto de casa)e a casa do amigo ou a própria casa. Na escola, durante as aulas, os amigosparticipam das atividades escolares e também conversam e brincam. Duran-te o recreio, basicamente, os amigos brincam (pique, bola), se encontrampara lancharem juntos. A minoria sabe a data do aniversário do melhor ami-go (geralmente, as meninas). Entretanto, a maioria dos participantes conhe-ce os pais do melhor amigo e costuma freqüentar a sua casa. As conversassão sobre as próprias brincadeiras e sobre os assuntos de escola. (h) Asemoções estão intimamente relacionadas à amizade. Raiva, medo, tristeza ealegria estiveram presentes. A alegria foi o sentimento mais freqüentementeassociado à amizade. As meninas sentem mais medo e mais raiva. Esta pare-

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ce ser apenas uma diferença de gênero e não de idade. (i) Quase todos osparticipantes consideraram importante e desejavam ter mais amigos. As qua-lidades dos amigos estão relacionadas à sua sociabilidade (ser educado esaber respeitar os colegas) e ao tipo de atividades realizadas em comum(como brincadeiras interessantes). Por outro lado, a maioria dos participan-tes não percebe defeitos em seus amigos. Os defeitos mais citados foram aimplicância com os colegas e o costume de bater nos colegas. O brincar nasrelações de amizade foi a atividade mais citada entre os amigos. Os fatoresresponsáveis pelo término da amizade foram, os mais freqüentes, brigas ementira. Estes dados, em seu conjunto, dão uma visão ampla, ainda quepreliminar, dos principais aspectos da amizade entre crianças de 7 a 12 anos,alunos de uma escola pública de Vitória.

Em suma, pode-se concluir que as amizades representam uma importan-te forma de relacionamento social na faixa etária investigada, especialmentecom os pares, mas também se mostrando como fator de socialização comadultos. São relações muitas vezes duradouras, baseadas em cooperação egirando em torno do brincar como atividade mediadora. Escola e vizinhan-ça são os locais principais para as amizades que ainda representam umaimportante parte da vida emocional da criança. Conforme Hinde (1979, 1987,1997), a amizade, como um relacionamento interpessoal, sofre a influênciada estrutura sócio-cultural (se dá dentro de um contexto social complexo) edo meio ambiente físico (depende do espaço e suas características), além deenvolverem diferentes níveis de complexidade, desde a criança como indi-víduo, a influência dos grupos (como a família), até a sociedade como umtodo.

4. As Amizades dos Idosos em AmbienteFamiliar e nas Instituições

O objetivo geral da presente pesquisa foi investigar as relações de ami-zade de idosos vivendo em instituições e em ambiente familiar (residência).No decorrer da investigação, procurou-se identificar e descrever a rede deamigos, o conteúdo e a qualidade da amizade, a partir de entrevistas, com-parando-se os as amizades nos dois ambientes, considerando, ainda, as dife-renças de gênero.

Quanto à rede de amigos, houve uma diferença significativa entre osidosos morando em ambiente familiar e os que vivem em situação de asilo.Os primeiros parecem dispor de uma rede social mais ampla e diversificada,

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interagindo com pessoas da família e de fora, mantendo maior contato comamigos, com os quais podem se relacionar em diferentes ambientes (emcasa, na igreja, na vizinhança, em centros de convivência, entre outros). Arede de amigos dos idosos vivendo em instituições parece ser sensivelmentemais restrita. Estes idosos ainda se referem aos amigos de fora da institui-ção, mesmo que tenham perdido contato com eles após passarem a residirno asilo, situação relatada por praticamente todos os entrevistados. As ido-sas, inclusive, tentam evitar contato com outras senhoras da instituição, difi-cultando ainda mais o desenvolvimento de uma relação de amizade. Ambosos gêneros ainda se ressentem da falta de visitas dos amigos que deixarampara trás, alguns apontando não entender o motivo.

Para os idosos que vivem em casa, houve uma tendência para privile-giar-se os relacionamentos de amizade mais antigos, considerados melho-res, com maior grau de intimidade e trazendo maior satisfação. A prefe-rência dos idosos por relacionamentos mais antigos, em detrimento dosmais recentes, já havia sido observada por Shea, Thompson e Bliesner(1998). Estes participantes, mesmo afirmando estarem abertos a novosrelacionamentos, demonstraram pouco empenho em buscá-los. Eles se di-zem satisfeitos com suas atuais amizades, sentindo pouca necessidade defazer novos amigos. Apenas duas mulheres estabeleceram amizades maisrecentes (de dois e quatro anos). Para praticamente todos os moradores doasilo, a internação significou o distanciamento ou perda das amizadespreviamente estabelecidas, afetando negativamente seu bem-estar devidoà perda de importante fonte de trocas de experiências, valores, memórias ehistórias em comum (Hartup & Stevens, 1997). Os que citam parentescomo amigos continuam a receber suas visitas, mas o caráter esporádicodestas talvez não garanta que as funções dessas amizades estejam sendocumpridas satisfatoriamente. Mesmo que esses idosos tenham relatado oinício de novos relacionamentos com internos e visitantes, após a mudan-ça para o asilo, possivelmente tais amizades não sejam suficientes e quali-tativamente interessantes, pois só sua existência não garante serem satis-fatórias para o idoso (Adams e Blieszner, 1995).

A análise do conteúdo e dos processos envolvidos na amizade dos ido-sos desses dois grupos sugere que as amizades mais novas, estabelecidasapós a internação no asilo, embora relevantes, mostram-se mais superficiaise insatisfatórias. Essa importância se revela pela carga afetiva com que fa-lam de seus amigos e pela relevância que estes parecem ter no contexto deinternamento, o que é indicado pelos benefícios que recebem da relação deamizade. Além disso, a maneira como expressaram essa importância sugere

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uma maior dependência e carência afetiva, comparados com os idosos quevivem em casa, o que também pode ser notado quando realçam os benefíci-os que poderiam proporcionar aos amigos, e por apreciarem na amizade, ofato de serem ouvidos e saberem que os amigos se importam com eles. To-davia, os idosos em situação de asilo tendem a dialogar sobre assuntos me-nos pessoais e, por vezes, percebem as conversas de forma negativa (não hámais nada para fazer ou conversam para o tempo passar), não obstante osque têm preferência por manter relacionamento com visitantes falem dessaatividade de maneira mais positiva. Por outro lado, todos os idosos que vi-vem em casa demonstraram maior satisfação em conversar com seus ami-gos, atividade que envolve uma variedade maior de assuntos e graus dife-rentes de intimidade, ocorrendo em múltiplas situações e locais. Isso se con-trapõe à descrição da rotina maçante no asilo pelo outro grupo, talvez con-tribuindo para que até o conversar torne-se mais desgastado e monótono.Ademais, os idosos que vivem em casa também podem realizar um lequemaior de atividades em diferentes locais juntamente com seus amigos, faci-litando a inserção do idoso na sociedade, considerada uma das funções daamizade na terceira idade (Litwak, 1985). Estes apreciam e valorizam a con-fiança conquistada nesses relacionamentos, algo que parece não se encon-trar suficientemente estabelecido entre os participantes do asilo e seus no-vos amigos. Se este grupo tende a apontar os benefícios que seus amigosteriam ao se relacionarem com eles, os participantes que vivem em casa, poroutro lado, falam de suas características pessoais e benefícios do relaciona-mento em si para a amizade, sugerindo estarem mais convictos de seu valorpara a relação, indicando um nível mais elevado de auto-estima.

A internação no asilo parece levar à perda de vínculo com amigos anti-gos e menor grau de confiança e profundidade nos novos relacionamentosformados, embora haja grande dependência deles, inclusive emocional. Nemsempre, se mostram satisfeitos com o conteúdo desses relacionamentos. Osdados referentes ao sentimento de solidão e satisfação com as amizadescontribuem ainda mais para esclarecer as diferenças. A despeito da satisfa-ção percebida, há uma insuficiência desses relacionamentos para afastar sen-timentos de solidão, bastante presentes (75% dos participantes do asilo sen-tem-se moderadamente ou muito sozinhos). Essa insuficiência é apontadanão só pelo pequeno número de amigos e por não serem plenamente confi-áveis, como também pela impossibilidade de suprir a falta de relacionamen-to com familiares, principal motivo conectado à solidão experimentada. Osfamiliares podem ser, nesse contexto, as únicas fontes disponíveis de valo-res, histórias, lembranças e fatos a serem partilhados com esses idosos, já

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que as antigas amizades, em sua maioria, se perderam. Os idosos que vivemem casa mostraram-se satisfeitos com suas atuais amizades, não sentindonecessidade de fazer novos amigos. Dos oito participantes desse grupo, cin-co declararam não se sentir sozinhos e dois, pouco sozinhos.

Os relacionamentos de coleguismo e o estabelecimento de novas ami-zades também apresentam diferenças significativas entre os dois grupos.Os idosos vivendo em ambiente familiar, embora não empenhados em fa-zer efetivamente novos amigos, mostraram-se abertos ao estabelecimentoe manutenção de relacionamentos com outras pessoas nos diferentes espa-ços que participam (igrejas, centros de vivência, entre outros), divergindoda afirmação de Carstensen (1991) de que há uma tendência para os ido-sos interagirem menos freqüentemente com amigos mais casuais e cole-gas. Quanto ao grupo de participantes que vivem no asilo, há pouca rela-ção com outros internos, sendo que os motivos divergem segundo o gêne-ro. Para as mulheres, há uma tentativa deliberada de se afastarem umasdas outras, evitando maiores contatos, pois há uma grande desconfiançaentre elas, além de conflitos e temores de serem vítimas de comentários efofocas. Por isso, restringem suas amizades a uma ou duas internas, alémdaquelas com visitantes. Parece que, para elas, conviverem cotidianamen-te na mesma instituição produz efeitos semelhantes a certos aspectos dorelacionamento familiar, como a menor exposição para revelar assuntosde maior intimidade dada a preocupação de que sejam motivos de comen-tários entre os familiares (Litwak, 1985). Os homens trazem queixas dife-rentes. Mostraram-se abertos a estabelecer novos relacionamentos no asi-lo, mas revelaram que boa parte dos outros internos não está em condiçõesde saúde para manterem diálogo.

Os idosos citaram mais outros internos como amigos do que as idosas,que preferem estabelecer vínculos mais próximos com visitantes ou comapenas uma ou duas internas. Relatos de desafetos e desconfianças não apa-receram entre os homens sobre os outros moradores do asilo. Se, neste am-biente, as mulheres evitam novos contatos e relacionamentos, essa situaçãonão se repete para o grupo que vive fora dele. Pelo contrário, a abertura pararelações casuais e com colegas chama atenção entre as mulheres, além derelatarem terem estabelecido amigos mais recentes (menos de 15 anos, algu-mas com amizade de dois e quatro anos) após terem ficado viúvas. Estabe-lecer ou reforçar laços de amizade parece ser uma das estratégias adotadaspor essas mulheres para lidar com a situação de viuvez, abrindo portas parao estabelecimento de novas amizades.

Concluindo, os dados sugerem que as relações de amizade dos idosos

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diferem quando residem em sua própria residência (com ou sem os familia-res) e quando moram em uma instituição. Os dados ainda apontam paradiferenças de gênero entre as amizades de idosos e idosas. Apesar das dife-renças, as amizades representam, para os dois grupos, uma importante fontede bem-estar social e psicológico, contribuindo para o enfrentamento desituações difíceis (como superar a solidão advinda com a perda de um côn-juge), situações de enfermidade, momentos de maior afastamento de filhose outros parentes, gerados pela vida em instituição.

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Relacionamento Interpessoal – Olhares Diversos

OS AUTORES

AGNALDO GARCIA - Doutor em Psicologia pela USP. Professor doDepartamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento da UFES e doPrograma de Pós-Graduação em Psicologia da UFES. Bolsista de Produti-vidade em Pesquisa do CNPq.

GEOVANA TABACCHI SILVA – Mestre em Antropologia pelo Pro-grama de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política da Universi-dade Federal Fluminense. Professora da FAESA.

ISIS FIORIO ALBERTASSI – Aluna de Graduação da UFES. Partici-pante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC).

LORENA QUEIROZ MERIZIO - Aluna de Graduação da UFES. Parti-cipante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PI-BIC).

MARGARETH PEREIRA BERGAMIN – Aluna de Graduação da UFES.Participante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica(PIBIC).

MARIA TEREZA BRAGANÇA BORELI - Aluna de Graduação daUFES. Participante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Cien-tífica (PIBIC).

MARILENE OLIVIER - Doutora em Administração. Professora doDepartamento de Administração da UFES e do Programa de Pós-Gradua-ção em Administração da UFES.

RODRIGO DOS SANTOS SCARABELLI - Aluno de Graduação daUFES. Participante do Programa Institucional de Voluntários de IniciaçãoCientífica (PIVIC).

ROSANA SUEMI TOKUMARU - Doutora em Psicologia pela USP.Professora do Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento daUFES e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFES.

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EDITORAÇÃO

Edson Maltez Heringer27 3339-1815 - 8113-1826 - [email protected]

IMPRESSÃO

27 3323-2900 - [email protected]