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maiores empresas supermercadistas em atuação no Brasil, quatro têm capital estrangei-ro. As três primeiras, Carrefour, Pão de Açúcar/ Casino e Wal-Mart, respondem por quase 40% de todo o faturamento do setor, somando juntas R$ 53 bilhões em 2007. O cenário do último ano, desenhado pelo Ranking Abras, é bem diferente do encontrado uma década antes. Em 1996, o Carrefour era a única transnacional presente en-tre as cinco líderes: então, Companhia Brasileira de Distribuição (Pão de Açúcar), Bompreço, Sendas e Paes Mendonça figuravam do segun-do ao quinto lugar – e ainda eram controladas por capital brasileiro. O faturamento das três primeiras ficava em torno de R$ 11 bilhões, em valores da época.
Até o início da década de 1990, o Brasil não apresentava grande atratividade aos investidores estrangeiros. A fama de país caloteiro, a inflação
das cinco
egócios aqui, donos lá fora
sempre alta e fechamento do mercado dificulta-vam a entrada das multinacionais. “Entre 1982 e 1994, o fluxo de investimento direto estrangeiro no Brasil era muito baixo, quase zero. Quando a dívida externa foi renegociada, em 1994, houve mudança de perspectiva, aliada ao maior controle da inflação. A partir daí houve a retomada dos investimentos, que ocorreram em vários setores, incluindo varejo em geral e supermercados”, explica o economista Marcelo Portugal.
O país do futuro
Segundo dados do Banco Central, o in-vestimento direto estrangeiro no Brasil, que em 1990 ficou em torno de US$ 1 bilhão, superou os US$ 30 bilhões em 2000. A se-gunda metade dos anos 90 foi marcada pelo ingresso de grandes players internacionais
no supermercadismo brasileiro: Wal-Mart, Royal Ahold, Jerôni-mo Martins e Casino entraram no país entre 1995 e 1999.
“Além da abertura eco-nômica, é importante lembrar que o Brasil estava ‘para cima’: houve a estabilização da moe-da, a paridade com o dólar, a inflação despencou. O país se
O setor supermercadista
sofreu mudanças radicais
ao longo da última década.
Seguindo a tendência
mundial, o mercado
brasileiro tem hoje na
liderança grandes players
internacionais
N
Classificação
As 5 Maiores no Brasil
1996 2008
Carrefour
Pão de Açúcar/Casino
Wal-Mart
GBarbosa/Cencosud
Cia. Zaffari
1
2
3
4
5
Fonte: Ranking Abras
Carrefour
Pão de Açúcar
Casas Sendas
Bompreço
Paes Mendonça
1999
Carrefour
Pão de Açúcar/Casino
Sonae
Bompreço/Ahold
Casas Sendas
Svendla Chaves
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A década terminou com um novo pano-rama no ranking brasileiro: em 1999, das sete primeiras colocadas, seis tinham participação internacional, e as três líderes somavam um faturamento de R$ 18 bilhões. A concentra-ção, no entanto, ainda não era tão grande: a primeira colocada faturava aproximada-mente três vezes mais que a quinta; hoje, o faturamento do Carrefour (1o) é mais de dez vezes maior que o do Zaffari (5o).
As redes vão às compras
Boa parte das mudanças do setor aconteceu por meio de fusões e aquisições, fluxos presentes no Brasil e no exterior. Conforme relatório da Co-missão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) sobre investimento estrangeiro no Brasil, a partir de 1995 “várias empresas enfrentaram difi-culdades, gerando condições propícias para fusões e aquisições e para a expansão regional de grandes grupos já estabelecidos. Do ponto de vista das em-presas estrangeiras, o momento representava uma
mostrava muito promissor para o futuro. Onde os estrangeiros iriam aplicar seu di-nheiro, se seus próprios mercados estavam saturados? Dos cinco maiores supermercados da França, país que tem grande tecnologia no setor, quatro deles estão espalhados pelo mundo”, salienta o consultor de varejo An-tonio Carlos Ascar.
A estabilização de preços foi um im-portante fator para a mudança de cenário. Se de alguma forma enfraqueceu os opera-dores nacionais, já habituados a administrar lucros com a situação, de outra parte tornou a gestão menos árdua para os estrangeiros. Marcelo Portugal lembra que é muito mais difícil operar uma empresa com taxas de inflação de 40% ao mês: “O término da inflação não só facilitou a gerência finan-ceira como também aumentou a renda dos consumidores, o que é fundamental para o setor supermercadista. Cresceu o crédito, cresceu a renda, as pessoas tiveram mais poder de consumo”.
oportunidade”. Ainda de acordo com o relatório, “é interessante observar que as primeiras redes varejistas que entraram no mer-cado brasileiro foram as cadeias européias, já que entre as classes média e alta no Brasil – pelo menos até os anos 80 – predo-minavam características mais européias de consumo”.
A primeira estrangeira a entrar no Brasil foi o francês Carrefour, em 1975. “O primei-ro hipermercado, na marginal Pinheiros, em São Paulo, pas-sou meio despercebido. Mas o Carrefour cresceu e se tornou o maior competidor do Pão de Açúcar. Na década de 90, virou o número um”, lembra o consul-tor Ascar. A empresa adquiriu, entre 1995 e 1999, as redes Eldorado (SP), Planaltão (DF), Roncetti (ES), Mineirão (MG) e as cariocas Rainha, Dallas e Continente, além de arrematar os supermercados das Lojas Americanas. Em 2006, comprou o Atacadão, o que elevou novamente sua posição no Ranking Abras.
No final dos anos 80, o grupo português So-nae criou em Porto Alegre, com a Josapar, a Cia. Real de Distribuição. O boom de crescimento veio no final da década seguinte: com a aquisição das paranaenses Mercadorama, Coletão e Muffatão, das gaúchas Exxtra Econômico e Nacional, além de participação de 85% na Cândia Mercantil Norte Sul (SP), a empresa passou a figurar entre as cinco maiores do país. Em 2005, vendeu suas operações
CarrefourNo mundo: Criada na França, em 1960, hoje a
rede opera mais de 14 mil estabelecimentos
em 30 países, empregando aproximadamente
450 mil funcionários. É a maior varejista da
Europa e a segunda maior no mundo.
No Brasil: Primeira transnacional
supermercadista a se instalar aqui,
o Carrefour escolheu o país para
implantar sua primeira loja no con-
tinente americano, em 1975. Teve
em 2007 faturamento superior a
R$ 19 bilhões, empregando 59 mil
funcionários em 510 lojas. Arrema-
tou, ao longo da última década, uma
dezena de empresas, o que ajudou
a recolocá-lo no topo do ranking no
ano passado.
Divulgação/Carrefour
Concentração
Embora tenha quase a metade de seu mercado nas mãos das dez maiores redes de varejo, o Brasil ainda está longe de exibir um alto índice de concentração quando comparado a outros países. Abaixo, o percentual de par-ticipação das cinco maiores redes sobre a venda total dos supermercados em cada país (estudo feito pela Ascar & Associados sobre dados de 2006).
Suiça
Reino Unido
Chile
França
EUA
México
Brasil
Índice de países selecionados em 2006 (%)
86,377,9
6864,7
5138,4
26,42,8China
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no Brasil ao Wal-Mart, que, no ano anterior, já havia adquirido o Bompreço.
Para Ascar, o Sonae não soube administrar bem seus negócios no país, que devem ser recu-perados pela rede norte-americana: “O Wal-Mart tem uma visão mais centralizada, em um formato só. A intenção, quando entrou no Brasil, era construir sua pró-pria rede, com características próprias. Em quatro ou cinco anos, no entanto, começou a comprar outras. Essa é uma forma mais rápida e fácil de crescer”.
É mais fácil comprar
A dificuldade de adaptação ao mercado local é outro fator que favorece fusões e aquisições em detrimento da criação de novos espaços. “Quando chegam, as redes têm dificuldade para entrar
GBarbosa/CencosudNo mundo: A chilena Cencosud vem apresentando desempenho
considerável entre as empresas latino-americanas. Está entre as 60
maiores transnacionais com negócios na região e é a terceira maior
varejista com capital local. A empresa surgiu na década de 50, em
Temuco, e hoje atua na Argentina (perdendo apenas para o Carrefour),
no Peru, onde comprou a maior rede varejista em 2007, e na Colômbia,
trabalhando em parceria com a Casino.
No Brasil: A GBarbosa, que havia sido incorporada ao grupo
Bompreço pela holandesa Ahold, teve de ser vendida separadamente,
em função de questões antitruste. Em 2007, a rede, que opera
na região Nordeste e foi fundada em 1955, empregava 10 mil
funcionários, com faturamento de R$ 1,9 bilhões.
no mercado brasileiro, pois cada país tem suas características, hábitos de compra e condições sociais. Muitas empresas acham que, por terem sucesso em de-terminado país, o mesmo vai se passar no Brasil”, afirma Ascar.
No entanto, nem todas se dão bem por aqui. Dois exem-plos de insucesso são a holandesa Ahold e a portuguesa Jerônimo Martins – coincidentemente, parceiras em Portugal. A pri-meira ingressou na região Nor-deste do Brasil, com a compra dos supermercados Bompreço e GBarbosa – essa, hoje a quarta no ranking, foi vendida em 2007 para a chilena Cencosud. O gru-po holandês, que já foi um dos dez mais poderosos do varejo global, encerrou seus negócios no Brasil após uma crise con-tábil que afetou suas operações internacionais. Já a Jerônimo Martins, que em 1997 comprou
os supermercados Sé, Batajão e Santo An-tônio (SP), desistiu de investir nos negócios brasileiros e deixou o país em 2002.
A última grande transnacional a inves-tir foi a francesa Casino. Desde 1999, vem gradualmente assumindo o controle do Pão de Açúcar – que arrebatou boa fatia das pequenas e médias. Para Antonio Carlos
Pão de Açúcar/CasinoNo mundo: A rede Casino está entre as 30 varejistas mais
poderosas do globo, embora estruture boa parte de seus
negócios da França, onde foi fundada, no século 19, e tem mais
de 8 mil lojas. Na América do Sul, também está presente na
Argentina, Uruguai, Venezuela e Colômbia. O Brasil é o segundo
país em número de lojas, perdendo apenas para a França.
No Brasil: A Companhia Brasileira de Distribuição (grupo Pão de
Açúcar) foi fundada em São Paulo em 1948 por Valentim dos
Santos Diniz, pai do atual presidente, Abílio Diniz. Com 66 mil
empregados em 13 estados brasileiros, opera com as bandeiras
Pão de Açúcar, Sendas, CompreBem e Extra. Apresentou grande
crescimento na última década, principalmente pela aquisição ou
união a redes
como Barateiro,
Peralta, Paes Men-
donça, ABC, Sé e
Sendas. Em 2007,
adquiriu a rede
atacadista Assai,
que apresentava
faturamento supe-
rior a R$ 1 bilhão.
Divulgação/Pão de Açúcar
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Wal-MartNo mundo: Fundada em 1962 pelo norte-
americano Sam Walton, o Wal-Mart é a maior
empresa do varejo global. Segundo relatório
da Deloitte, “sozinho, o Wal-Mart representa
a soma do segundo, terceiro, quarto e quinto
varejistas juntos”. São 7 mil lojas, quase dois
bilhões de funcionários e um faturamento de
US$ 374 bilhões em 14 países.
No Brasil: Depois de estruturar uma rede
própria no centro do país, o grupo adquiriu
as operações do Bompreço, no Nordeste
brasileiro, e do Sonae, no Sul. Com 68 mil
colaboradores e 313 lojas, a empresa ficou em
terceiro lugar no último Ranking Abras.
GBarbosa/CencosudNo mundo: A chilena Cencosud vem apresentando desempenho
considerável entre as empresas latino-americanas. Está entre as 60
maiores transnacionais com negócios na região e é a terceira maior
varejista com capital local. A empresa surgiu na década de 50, em
Temuco, e hoje atua na Argentina (perdendo apenas para o Carrefour),
no Peru, onde comprou a maior rede varejista em 2007, e na Colômbia,
trabalhando em parceria com a Casino.
No Brasil: A GBarbosa, que havia sido incorporada ao grupo
Bompreço pela holandesa Ahold, teve de ser vendida separadamente,
em função de questões antitruste. Em 2007, a rede, que opera
na região Nordeste e foi fundada em 1955, empregava 10 mil
funcionários, com faturamento de R$ 1,9 bilhões.
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lgaç
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Barb
osa
Ascar, que atuou por mais de 30 anos na rede paulista, o Pão de Açúcar já é do grupo Casino: “São os franceses que mandam na rede hoje, mesmo com a presença do Abílio Diniz. Eu não tenho dúvida: em dois ou três anos, a operação toda vai ser deles”.
Positivo e negativo
Apesar de afetar as empresas e fornecedores nacionais, essa dança das cadeiras traz alguma vantagem para o país? O economista Marcelo Portugal acredita que sim: “Às vezes se la-menta quando o controle de uma empresa sai do país, pois as decisões estratégias ficam na
mão de estrangeiros. Isso é uma perda. Mas, por outro lado, o dinheiro que entra
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art
com a venda das empresas normalmente é reaplicado em novos empreendimentos aqui.” Ou seja: mantém-se os empregos e as finanças das primeiras girando no país e ainda se abrem novas oportunidades. “Também há vantagens do ponto de vista organizacional, pois as empresas estrangeiras trazem uma tecnologia gerencial mais avançada, que acaba contagiando todo o mercado”, lembra Portugal.
Em tempos de estabilidade, para cada nova companhia que entra no mercado, alguma, mais antiga, é obrigada a deixar o setor. “As mais defasadas vão desaparecendo. Há muitos casos na história brasileira, como as redes Disco, Casa da Banha, Pegue e Pague, todas desapareceram. Eram grandes, conhecidas e fortes, mas pararam no tempo. Quem não se atualiza perde espaço”, avisa Antonio Carlos Ascar. O consultor acredita,
contudo, que ainda há espaço para as redes nacionais: “As brasilei-ras estão se tornando pequenas e médias. Mas o mercado está mudando, as grandes lojas estão perdendo espaço, pois têm mais dificuldade de adaptação a merca-dos específicos. Isso abre espaço para as redes menores e mais fle-xíveis, que, se tiverem dinheiro, sucessão e profissionalismo, vão se manter por meio da especiali-zação de seus serviços”.
73(agosto 2008) Revista AGAS