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CAPÍTULO VI ADESTRAMENTO DE UM CÃO PARA GUARDA Na dúvida, melhor recuar um passo do que avançar um quilômetro. (ensinamento taoísta) 001 - OBJETIVOS DO CAPÍTULO: Antes de tudo, recomendamos ao leitor que leia, por pelo menos uma vez, este capítulo até o final antes de iniciar qualquer trabalho prático a respeito de seu conteúdo. Muitas coisas referidas no início do capítulo só serão perfeitamente compreendidas após avançarmos mais em sua leitura. Várias vezes temos citar matéria que ainda não foi conceituada ou sequer explicada. Sempre que o fazemos, damos também onde encontrar essa matéria de forma fácil para poder seguir o entendimento assunto após consulta caso seja necessário. Mesmo assim, é recomendada uma segunda leitura para um bom entendimento deste capítulo. Todo o trabalho deste capítulo visa trazer conhecimento teórico e prático para donos, adestradores e figurantes terem condições de despertar no cão coragem, autoconfiança, além de técnicas de proteção. Mais importante que as técnicas aqui descritas, é o entendimento da maneira de como o cão percebe e entende o que o rodeia, e, principalmente, dos mecanismos psicológicos do cão. Quando chegarmos bem compreender essas áreas, pouco importará os métodos que venhamos a utilizar, pois teremos conhecimento suficiente para chegarmos, inclusive, a criar métodos novos e específicos para um dado animal, conforme sua necessidade específica. Os assuntos, salvo exceções explicitadas, são distribuídos pelos tópicos de forma a que fiquem seqüenciados de acordo com a ordem que devem ser apresentados ao cão. O autor procura passar o que tem aprendido em muitos anos dedicados a esta paixão um método trivial, mas um tanto quanto original em relação ao até agora publicado, mas como sugestão do que como doutrina. Até o momento, tem sido o método que demonstrou maior eficácia, tanto do ponto de vista de rapidez de aprendizado, como de manutenção do mesmo. Não temos nenhuma razão para crer que o método não se coloca com mais eficiência para qualquer raça ou personalidade de cão, uma vez que é flexível, interativo e obedece aos entendimentos da etologia canina e não a uma metodologia rígida e limitada ante as adversidades encontradas em cada exemplar da maravilhosa espécie canina. Um método inicial foi criado para adestramento de cães com respostas psíquicas diversas das dos cães das raças tradicionais de guarda, quase todas alemães. Esse novo método foi muito bem sucedido em bull and terriers e em raças com sua ascendência. Em outras palavras, uma metodologia apropriada para cães com equilíbrios de impulsos diferentes do equilíbrio encontrado na maioria dos cães das raças de guarda tradicionais. Com o tempo, o autor começou a perceber as diferenças entre o método por ele desenvolvido e os métodos tradicionais. Procurou, então, encontrar o por quê. Foi exatamente no estudo dos diferentes equilíbrios de impulsos – os drives – que encontrou todas as diferenças mais relevantes.

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CAPÍTULO VI ADESTRAMENTO DE UM CÃO PARA GUARDA

Na dúvida, melhor recuar um passo do que avançar um quilômetro. (ensinamento taoísta) 001 - OBJETIVOS DO CAPÍTULO: Antes de tudo, recomendamos ao leitor que leia, por pelo menos uma vez, este capítulo até o final antes de iniciar qualquer trabalho prático a respeito de seu conteúdo. Muitas coisas referidas no início do capítulo só serão perfeitamente compreendidas após avançarmos mais em sua leitura. Várias vezes temos citar matéria que ainda não foi conceituada ou sequer explicada. Sempre que o fazemos, damos também onde encontrar essa matéria de forma fácil para poder seguir o entendimento assunto após consulta caso seja necessário. Mesmo assim, é recomendada uma segunda leitura para um bom entendimento deste capítulo. Todo o trabalho deste capítulo visa trazer conhecimento teórico e prático para donos, adestradores e figurantes terem condições de despertar no cão coragem, autoconfiança, além de técnicas de proteção. Mais importante que as técnicas aqui descritas, é o entendimento da maneira de como o cão percebe e entende o que o rodeia, e, principalmente, dos mecanismos psicológicos do cão. Quando chegarmos bem compreender essas áreas, pouco importará os métodos que venhamos a utilizar, pois teremos conhecimento suficiente para chegarmos, inclusive, a criar métodos novos e específicos para um dado animal, conforme sua necessidade específica. Os assuntos, salvo exceções explicitadas, são distribuídos pelos tópicos de forma a que fiquem seqüenciados de acordo com a ordem que devem ser apresentados ao cão. O autor procura passar o que tem aprendido em muitos anos dedicados a esta paixão um método trivial, mas um tanto quanto original em relação ao até agora publicado, mas como sugestão do que como doutrina. Até o momento, tem sido o método que demonstrou maior eficácia, tanto do ponto de vista de rapidez de aprendizado, como de manutenção do mesmo. Não temos nenhuma razão para crer que o método não se coloca com mais eficiência para qualquer raça ou personalidade de cão, uma vez que é flexível, interativo e obedece aos entendimentos da etologia canina e não a uma metodologia rígida e limitada ante as adversidades encontradas em cada exemplar da maravilhosa espécie canina. Um método inicial foi criado para adestramento de cães com respostas psíquicas diversas das dos cães das raças tradicionais de guarda, quase todas alemães. Esse novo método foi muito bem sucedido em bull and terriers e em raças com sua ascendência. Em outras palavras, uma metodologia apropriada para cães com equilíbrios de impulsos diferentes do equilíbrio encontrado na maioria dos cães das raças de guarda tradicionais. Com o tempo, o autor começou a perceber as diferenças entre o método por ele desenvolvido e os métodos tradicionais. Procurou, então, encontrar o por quê. Foi exatamente no estudo dos diferentes equilíbrios de impulsos – os drives – que encontrou todas as diferenças mais relevantes.

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Através de uma análise minuciosa desses drives, uma verdadeira ‘dissecação’ de cada um dos drives de proteção, pode-se entender com muito mais clareza onde pode estar cada dificuldade e cada solução. Foi pensado, por conseguinte, em criar um único método que atendesse a todas as raças, bem como a todos os cães independentemente de suas raças. Um método que interagisse com as respostas de cada exemplar e se adaptasse a elas, ao mesmo tempo em que modulasse tais respostas ao treinamento e objetivos. Por ser flexível, adapta-se a qualquer cão. Isso não significa que possa solucionar todos os problemas de qualquer cão. Mas, significa que os detectará e que solucionará, em princípio, tudo o que puder ser solucionado, na medida que deverá explicitar onde estará cada dificuldade e qual ela é. Se a dificuldade for sanável, e quase sempre o é, o método efetivo a solucionará. Não significa que possa transformar qualquer cão de três anos, sem qualquer treinamento anterior, ser comparado a um outro cão, selecionado e altamente treinado desde a tenra idade. Mas, significa que, bem aplicado, poderá levar qualquer cão até seu potencial máximo, partindo da condição na qual o cão se encontra antes do início do treinamento. Em outras palavras, um método flexível, fácil e inteligente a ser aplicado, bastando por parte do adestrador e do figurante um mínimo de discernimento para perceber as respostas caninas e aplicar o método em função destas. Embora, o texto traga explicações sobre noções básicas de fisiologia, elas não são fundamentais para sua compreensão e estão colocadas apenas para os que desejarem se aprofundar mais sobre o assunto, bem como os que quiserem ter um entendimento completo do que é dito e de seus por quês. Se o leitor não quiser se alongar em detalhes explicativos, bastará aceitar suas conclusões. Mas, se quiser entender o por quê do porquê, terá que ler todas as explicações e, até, buscar bibliografia paralela. Mas, o conteúdo deste livro pretende trazer tudo o que é necessário sobre o bom entendimento cinotécnico do método. Uma característica importante desta metodologia, se bem utilizada, é que até agora nenhum cão foi perdido para guarda em função de sua aplicação. Não queremos dizer que esse método venha a nos assegurar cem por cento de sucesso, pois isso seria utópico, mas sim que os poucos insucessos ocorridos não se devem à metodologia aplicada, ou que, pelo menos, não temos nenhuma razão aparente para responsabilizá-la. A valorização do cão como indivíduo e membro da família, sem dúvida, é a viga mestra de todo o trabalho. Essa já é uma grande diferença entre o método aplicado neste livro e os tradicionais, nos quais um cão de guarda deve ser criado no canil ou no quintal. Isso se deve que o método efetivo prioriza a capacidade real de guarda do cão e a convivência do cão com as pessoas da casa. Não é essa a função dos nossos cães de guarda familiar, guarda e companhia? Mas, o método efetivo serve tão somente à formação de cães de guarda familiares? Absolutamente, não. Serve para a formação de qualquer tipo de cão de guarda. Essa é outra vantagem do método, ele tem a capacidade de dosar as variáveis em questão até conduzir o cão ao ponto exato em que gostaríamos que ele ficasse no que se refere aos drives e ao controle do cão e, conseqüentemente, ao tipo exato de guarda que queremos. A segurança e a auto-estima são os pontos de partida, e nada melhor do que o reconhecimento e o apego familiar para assegurá-las. Outros fatores valorizados são os instintos naturais de predador, onde o cão poderá aprender a

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como ter respostas rápidas a cada situação, ao invés de ser bitolado por treinamentos mais formatados. Neste capítulo, seqüencialmente, procuraremos mostrar todas as etapas do treinamento de um cão para guarda. Para tanto, vamos supor ser esse animal um filhote. Se analisarmos as raças de guarda de um modo geral, muitos cães de onze meses, ou às vezes menos, já estão perdidos para o trabalho por não haverem recebido os cuidados necessários para tal. Na maioria das vezes, nas raças desenvolvidas para tal mister, o treinamento é bem sucedido quando iniciado até os quatorze meses de idade, mas muitos cães podem vir a não mais se adequarem à finalidade de guarda caso o treinamento específico não se inicie desde a mais tenra idade. O ideal é começar o treinamento o mais cedo quanto possível. Mais cedo quanto possível significa o mais precocemente que cada animal tenha condições de responder favoravelmente ao treinamento e não uma idade específica para todos os cães. Saber esperar o momento certo para iniciar tudo e para evoluir os treinos é de suma importância. Muito embora o método preconize ser ele aplicado precocemente, nada impede que seja aplicado em cães de qualquer idade. É claro que deve ser adaptado à idade do cão em questão o que tange a seu início. Pode ser que um cão de 18 meses não tenha mais impulso de seguir uma bolinha, por exemplo e outro tipo de estímulo tenha que ser aplicado. O leitor poderá ter uma boa idéia da seqüência ideal das etapas simplesmente acompanhando a seqüência exposta neste capítulo, que já foi elaborado com tal finalidade, para facilitar o entendimento e a aplicação do aqui exposto. No entanto, a partir do tópico "Estímulos Paralelos sobre os Drives de Rapina e de Defesa", há uma outra seqüência que começa na mais tenra idade e que pode ser usada conjuntamente com a já exposta sem prejuízo desta. Muito pelo contrário, os trabalhos irão se potencializar na direção de formar, dentro do potencial de cada espécime, um excelente cão de guarda. Sobre seleção de cães para trabalho, é indispensável leitura do Capítulo V, “Escolha de um Filhote”. 002 - HERANÇA E VARIABILIDADE GENÉTICAS – Em todos os seres vivos há algo que se chama “variabilidade genética”. Isso é extremamente desejável, pois viabiliza a sobrevivência das espécies em situações adversas. Muitas coisas que nos diferenciam de outros membros da nossa espécie advêm da variabilidade gênica que existe entre os indivíduos. Isso determina tanto nossos corpos quanto nossa personalidade. Determina também a fisiologia de cada um de nós e os diferentes processos metabólicos. Determina por que alguns seres de mesma espécie não adoecem quando expostos às mesmas doenças de outros que perecem pela evolução dessas doenças, bem como por que as mesmas drogas podem ter efeitos diversos em indivíduos diversos. Se não fosse pela variabilidade genética, um vírus eliminaria todos os indivíduos de uma mesma espécie, uma vez que propagado em seu ambiente. Isso não acontece porque temos sistemas imunes diferenciados. Da mesma forma, se todos os lobos tivessem uma herança psíquica exatamente igual, a alcatéia sobreviveria com maior dificuldade, pois ela necessita de elementos de personalidades

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diferenciadas para suas diferentes necessidades. O mais covarde geralmente é o mais vigilante e será o primeiro a avisar do perigo. O mais valente será o que primeiro ousará atacar as presas mais fortes e afugentar concorrentes do grupo (no caso dos lobos e dos cães, geralmente não é o líder, mas o beta). Um terá condições de trazer a vitória para o grupo, e o outro, fugindo ao combate, será o que preservará viva a família, caso o inimigo seja mais poderoso. Talvez, por isso, os cães, assim como os homens têm diferentes personalidades e reagem de maneira diferente a cada situação. No entanto, os indivíduos tendem a passar para seus descendentes suas qualidades. As qualidades que, de uma forma ou de outra, os mantiveram vivos até o momento da reprodução. Essas qualidades são herdadas por seus filhos e netos para que possam sobreviver assim como seus pais e avós. Mas, a natureza é tão sábia e tão prudente que não mantém apenas as qualidades que selecionaram os indivíduos. Mantém também as opostas, ainda que de forma menos intensa. Processos realizados durante a gênese de cada indivíduo permutam gens e os modificam. Mutações ocorrem na tentativa (cega?) de aperfeiçoar a espécie, ainda que à custa de inúmeros indivíduos inviáveis para cada pequeno aperfeiçoamento. Genes não revelados, por vezes se mantêm ocultos no genoma para reaparecerem após várias gerações. Mantendo quanto mais diversidade de qualidades, maior será a chance de sobrevivência da espécie, pois o ambiente que seleciona hoje pode não ser exatamente o mesmo que selecionará amanhã. Por essas razões, mesmo nas raças e linhagens mais seletas de cães sempre haverá exemplares com características diversas das selecionadas. É evidente que quanto maior for a seleção, tanto em critérios quanto em número de gerações, menor será tal possibilidade. Mas sempre deverá ocorrer, cedo ou tarde características diversas e até opostas das selecionadas. Diferentemente dos lobos que necessitam de variados tipos de indivíduos, cada raça de cão doméstico deveria obedecer um paradigma de seleção. Mesmo assim, em qualquer raça, em qualquer linhagem sempre poderão nascer indivíduos que não correspondam às expectativas. Sabemos que na prática os paradigmas raciais não são preservados, pois criadores de personalidades diversas selecionam cães de formas diversas. Isso, sem dúvida exponencializa as chances de que haja exemplares totalmente inaptos para as finalidades para as quais cada raça foi criada. Foi comentado sobre isso no Capítulo “A Cinofilia e o Mito Masculino” no tópico “PARADIGMA EFETIVO COMO FATOR DE MANUTENÇÃO DAS QUALIDADES RACIAIS” (I-005). A variabilidade genética influi de forma proporcional na diversidade de temperamento que encontramos na espécie canina. Embora menores entre os indivíduos de cada raça existem variabilidades genéticas intra-raciais consideráveis. Tudo isso tem que ser levado em conta quando se adestra um cão, pois a herança e a variabilidade genética influem decisivamente no temperamento de cada exemplar. Se por um lado a herança e a seleção tendem a fazer com que os indivíduos sejam parecidos com seus parentes, a variabilidade, tanto do genótipo quanto do fenótipo, se mantém mesmo em parentes próximos. A apenas relativa margem de previsibilidade temperamental que temos mesmo em relação a exemplares de mesma raça e até de mesma linhagem demanda que qualquer método de adestramento, para ser eficaz, possa prever e se adaptar a cada indivíduo e com ele ser interativo.

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003 - SOBRE DRIVES: O que é drive? Qual a origem e significado de tal palavra? Vamos usar o escrito no “Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos”: “DRIVE - Refere-se às aptidões intrínsecas dos diversos componentes temperamentais para realização das diversas modalidades de trabalho. Relaciona-se à vontade, à disposição, à tendência, bem como a capacidade psíquica de cada cão para as qualificações inerentes ao trabalho. “Drive” é uma palavra inglesa que, entre outros significados, compreende “guiar”, “conduzir”, mas também “impulso”. É utilizada na cinofilia porque os drives são os elementos mais importantes na capacidade de guarda de um cão. Podem ser modulados através do treinamento, muito embora a tendência genética seja variável de importância fundamental.” O citado dicionário continua ao definir e conceituar os principais drives: “Os drives subdividem-se em: 1 - DRIVE DE CAÇA: não se refere, como pode aparentar à primeira vista, à caça de animais, mas à disposição de ir até o figurante ou objetos de treino, em persegui-los, bem como de perseguir e apresar objetos de treinamento como bolas, etc. DRIVE DE RAPINA: o mesmo que DRIVE DE CAÇA. O termo, ás vezes, é usado em substituição ao termo “drive de caça” para evitar que leigos confundam com disposição de caçar animais. Em verdade, o drive de caça dirigido ao homem e a disposição para caçar animais estão intimamente relacionados na psique canina, mas, de forma alguma, têm mesmo significado. 2 - DRIVE DE DEFESA: disposição que tem o cão de defender seu território, seu dono e a si mesmo da aproximação de terceiros (via de regra, estranhos). Pode se subdividir em: Defesa do Território, defesa do dono, defesa de familiar, defesa própria, defesa de objeto, defesa do alimento, defesa da prole. 3 - DRIVE DE FARO: relaciona-se à disposição em localizar animais, pessoas ou substâncias através do faro. 4 - DRIVE DE DOMINÂNCIA: tendência do cão a exercer Dominância. Na Cinofilia Efetiva, é visto como uma característica negativa. Tal Drive divide-se em: dominância sobre outros machos, dominância sobre cães em geral, dominância sobre familiares – não incluindo o dono e dominância sobre familiares – incluindo o dono. A ordem de importância e negatividade é crescente na ordem aqui colocada. O drive de dominância sobre o dono ou outras pessoas da casa pode ser monitorado – no caso diminuído – através do aumento do "Drive de Obediência", onde o dono e as pessoas da família devem comandar o cão. 5 - DRIVE DE OBEDIÊNCIA: A obediência não é conceitualmente um drive, podendo ser definida como um paradrive. Disposição e capacidade do cão em obedecer ao dono ou adestrador. Em verdade, obediência não é um impulso, mas, em algumas situações, será antagônica ao impulso, ou seja, a capacidade de dominar um impulso. Por isso, pode ser considerada e manipulada de forma análoga aos drives. Em casos de a obediência ser obtida através da formatação de condicionamentos conseguidos por estímulos positivos, pode haver realmente impulso do cão de obedecer, o que não conceitua, no entanto, a obediência como um drive. 6 – DRIVE POR ISCA: disposição do cão em buscar ou comer pequenas iscas ofertadas ou escondidas para seu treinamento. Tais iscas podem ser usadas como premiação, isto é, como Estímulo Positivo, para imprimir certo padrão de comportamento ou, ainda, escondidas para o treinamento de faro baixo. PRONÚNCIA: dráive. Vide: AGRESSIVIDADE,

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CONDICIONAMENTO, DOMINÂNCIA, ESTÍMULO POSITIVO e FARO BAIXO.” Obviamente, que o dicionário coloca os drives dispostos em ordem alfabética. Tentemos aqui colocá-los de forma que facilite melhor o entendimento. É claro que os drives não dependem tão somente do treinamento e do ambiente, grande parte já vem de herança genética, estando presente e sendo visível mesmo sem nenhum treinamento em muitos exemplares, principalmente nas raças selecionadas para tal mister. Tais heranças genéticas podem ser barreiras insuperáveis para um cão ser apto para a guarda, caso elas apresentem baixos drives, principalmente os de defesa e rapina. Sem a herança genética propícia, nenhum cão será guarda. Todos predadores, inclusive os cães em seu estado selvagem, atacam por duas principais razões: fome e defesa. O “drive de proteção” seria o conjunto dos drives de rapina e de defesa. Existem outras razões, como a disputa por fêmeas, que estaria mais associada ao drive de dominância; o extermínio de filhotes para que as fêmeas entrem no cio (leões machos quando expulsam os rivais matam os filhos destes); a matança de carnívoros rivais (leões costumam matar guepardos e outros carnívoros) e até de filhotes da mesma espécie para evitar a futura concorrência (ursos), etc. Mas, essas outras razões não estão presentes em todas as espécies de carnívoros, nem têm grande importância no estudo dos drives no que se refere à proteção. 004 - DRIVE DE RAPINA. Mais conhecido como drive de caça, este drive está associado ao estímulo do animal de caçar e abater suas presas. No entanto, diferentemente de animais mais primitivos como répteis, peixes, etc., os mamíferos predadores, salvo algumas exceções, criaram rituais os quais praticam na infância com seus irmãos e outros filhotes, conforme organização social de cada espécie, para pleno desenvolvimento do que chamamos “drive de rapina”. A esses rituais parecem e são brincadeiras. Neles, os filhotes lutam entre si, perseguem indivíduos de espécies mais fracas mesmo sem intenção de matar e comer. Nesses rituais, são treinados os reflexos nervosos e as reações instintivas de luta, fuga e perseguição. Tais procedimentos, embora prazerosos, muito mais que diversão, facilitam o aprendizado tanto em nível de conhecimento como em nível de transmissores e de receptores neuronais para adequá-los a tais atividades. A Natureza já fez com essas brincadeiras fossem prazerosas como forma de que os animais as pratiquem. O animal que não tem prazer na brincadeira, não brinca, não aprimora o drive, não tem boa capacidade de caçar, não sobrevive, não passa adiante o gen indesejado. Como esse aprendizado só tem sentido evolutivo na infância, pois um animal adulto na natureza não deve desperdiçar energia brincado, esse aprendizado, tanto em nível psíquico como neuronal, torna-se mais refratário conforme o cão fica mais velho. Por essa razão, é que muito do aprendizado do cão, principalmente para guarda e mais especificamente ainda nos que são associados ao drive de rapina, devem ser iniciados preferencialmente até a mesma idade na qual os cães, em seu estado selvagem, brincam e praticam simulações de luta, fuga e perseguição. Diferentemente do lobo, o cão foi modulado não só pela natureza, mas passou por milênios de seleção pelas mãos do homem. Por isso, cães caçam mesmo sem necessidade de alimento, desperdiçam energia e arriscam a vida atacando presas que não irão devorar. Por isso, também, os cães mantêm-se sempre dispostos a brincar e a manter o drive de

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rapina se este for estimulado na idade adequada até que o peso da idade avançada os retire, ainda, que muitas vezes, apenas parcialmente. E por essas razões que os cães são excelentes animais de guarda, pois atacam mesmo sem sentir fome e mesmo sem se sentirem ameaçados. Porque na seleção para a guarda e para a caça o homem preferia colocar na reprodução os que mantinham seus drives de rapina mais elevados. O estímulo inicial do drive de rapina nada mais é do que o estímulo dirigido das brincadeiras à atividade de guarda. Preferimos a palavra “rapina” invés da palavra “caça” pela freqüente confusão que a segunda cria nos leigos ao imaginarem que drive de caça se refere à caça de animais. 005 - DRIVE DE DEFESA: As duas formas básicas de um animal se defender são lutar ou fugir. Existem outras, como se fingir de morto, usar carapaças, espinhos, etc., mas não se aplicam aos caninos e não se configuram exatamente em uma estratégia do indivíduo, mas da espécie. O instinto de defesa é sempre despertado pela sensação de haver uma ameaça. Não necessariamente pelo sentimento do medo. Antes de a defesa atuar, é preciso que a mente seja alertada sobre o perigo e a ameaça. Portanto, o Drive de Defesa, para ser estimulado, necessita de alguma ação a ser interpretada como ameaça ao cão. Existe, em muitas pessoas da área, a idéia errônea de que um cão somente entra em defesa se sentir medo. Uma leoa que ataca um animal mais fraco que ameaça seus filhotes está agindo em defesa e não deve estar sentindo medo. Sentir uma ameaça é sentir a percepção de um perigo. Esse perigo não provocará medo se o indivíduo souber que pode ser rechaçado com facilidade bastando para isso a ação de defesa. Obviamente, que entre as formas de defesa, somente interessa para guarda o ataque. Desnecessário dizer que quando falamos em estimular drive de defesa, nos referimos tão somente ao estimulo de reação ofensiva em resposta aos estímulos que o cão supostamente entenda como ameaçadores a ele, ao dono, ao território, etc. Também é interessante que o cão entenda que o perigo será rechaçado se ele utilizar a defesa. Aí, teremos uma defesa de maior qualidade. Conforme for estimulado o drive de defesa, a percepção e interpretação, pelo cão, dos diversos estímulos como ameaças aumentam, bem como sua capacidade de reagir ofensivamente a eles. Por exemplo, um cão que tome como ameaça uma pessoa estranha cutucá-lo com uma vara, poderá aumentar sua interpretação de ameaça por esta mesma pessoa ou mesmo outra pessoa vibrar uma vara em sua direção, seguindo-se de perceber como ameaça o fato de qualquer pessoa estranha simplesmente segurar uma vara. Por fim, a mera presença de pessoa estranha é tida como ameaça. Aumentar essa percepção de suposta ameaça, bem como a disposição de atacar a partir de tal percepção, significa incrementar o drive de defesa. O colocado acima não é dos melhores exemplos de adestramento para um cão de guarda nos moldes dos treinamentos atuais. Tem caráter puramente ilustrativo. Pode ser usado, entretanto, para guardas territoriais e sumários, como veremos adiante. O drive de defesa só é demonstrado dentro do território do cão ou em defesa do dono, familiar, filhotes, etc. Nenhum cão faz um ataque lançado à distância fora de seu território sob a égide do drive de defesa. Isso só pode ocorrer sob atuação do drive de rapina.

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Adiante, falaremos bem mais detalhadamente sobre os níveis do drive de defesa. 006 - DRIVE DE DEFESA E DRIVE DE RAPINA – CONSIDERAÇÕES FISIOLÓGICAS: O treinamento moderno de cães de guarda visa ser iniciado utilizando-se o drive de rapina para o ataque, bem como muito mais estímulos positivos do que negativos para obediência. Se analisarmos com profundidade, veremos que o drive de rapina associa-se a estímulos positivos (brincadeiras, situação de caçador, de superioridade) e o Drive de Defesa a estímulos negativos (sentir-se ameaçado, medo, insegurança). O entendimento da fisiologia dos acontecimentos que envolvem os drives de proteção não é indispensável. Estão neste trabalho como ilustração e para os que se interessem em se aprofundar no assunto. Portanto, o leitor que não quiser neles se deter pode apenas se preocupar com o entendimento geral da matéria, pois este não será prejudicado. O aprendizado efetuado pelas instâncias psíquicas e o aprendizado subordinado às vias neuronais acontecem pela vivência de situações que estimulem as vias psíquicas e nervosas. Isso depende inclusive de uma produção mais capacitada de neurotransmissores – que são substâncias secretadas pelo neurônio transmissor e que passam a informação nervosa ao neurônio seguinte. Dependem também da atuação mais competente dos receptores neuronais no neurônio receptor do estímulo nervoso – que são as microestruturas que captam a informação contida nos neurotransmissores. Por fim, da maior agilidade e competência dos neurônios nas sinapses (fendas entre dois neurônios onde ocorre a neurotransmissão) e circuitos nervosos do sistema nervoso central. Os neurotransmissores mais envolvidos no processo do medo são a serotonina e a noradrenalina. A noradrenalina é o neurotransmissor que provavelmente mais atua como resposta a uma suposta ameaça, ou seja, provavelmente é o neurotransmissor mais importante na atuação do drive de defesa. Além de neurotransmissor, a noradrenalina, juntamente com a adrenalina, tem função hormonal quando secretada pela medula adrenal em resposta aos estímulos psíquicos e nervosos. Neste caso, o que as secreta é o sistema nervoso simpático. O sistema nervoso simpático e o sistema nervoso parassimpático são involuntários e, juntos, formam o sistema nervoso autonômico. A adrenalina, a noradrenalina e, também, a dopamina são três das cinco catecolaminas, sendo que esta última atua apenas como neurotransmissor, assim como a serotonina, que não é uma catecolamina. Esse conhecimento não é fundamental para conhecer cinofilia, mas ajudará em certos entendimentos para aqueles que melhor quiserem se aprofundar. A adrenalina não é liberada pelo cérebro, mas pelas glândulas supra-renais. A adrenalina não é um neurotransmissor como o são a noradrenalina, a serotonina e a dopamina. É um hormônio, assim como a noradrenalina, que tem dupla função, de hormônio e de neurotransmissor. Entre os efeitos das catecolaminas no sistema nervoso simpático, temos: direcionamento do sangue das vísceras para os músculos esqueléticos (preparar os músculos para luta, fuga, e, conseqüente inibição dos processos digestivos e de quase todas as glândulas, que dependem da irrigação sangüínea), dilatação das pupilas (aumentar o campo visual e a visão noturna), arrepio dos pêlos (assustar o oponente, aumentando a silhueta), aceleração cardíaca (para suprir maior demanda de oxigênio pelos músculos), etc. Esse é o efeito de um aumento das catecolaminas numa reação normal de defesa. Esse efeito é necessário e eficaz. Por outro lado, a exacerbação da secreção de catecolaminas leva à aceleração exagerada do

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coração, do aumento da temperatura, de tremores musculares e de outras manifestações que esgotam em pouco tempo o indivíduo. Podem fechar um ciclo vicioso com o descontrole emocional e nervoso, na medida em que as manifestações orgânicas de excitação nervosa induzem o psiquismo a promover mais manifestações de tal ordem. O medo e o pânico podem tomar conta do indivíduo. Esse efeito é extremamente prejudicial a uma boa defesa. Levam a uma defesa de péssima qualidade em termos de drive de proteção e provavelmente levarão à fuga ou o que é pior, a uma paralisação total da capacidade de agir e até de se mover. Essa situação e a situação descrita no parágrafo anterior provêm de um mesmo processo. Apenas uma é bem modulada e a outra não. Essa modulação pode ser natural, mas pode sempre ser melhorada pelo treinamento das vias psíquicas e neuronais que agirão tão intimamente que impossível é discernir o que é psíquico do que é neuronal, o que é corpo e o que é atividade mental. A genética tem enorme importância tanto na boa modulação espontânea como na capacidade de aprendizado dessas mesmas vias. As situações de fuga, luta ou perseguição, tanto reais como suas simulações através de brincadeiras, constituem parte valiosa do aprendizado psíquico, nervoso e, até, endócrino. A parte psíquica deste aprendizado decorre da segurança que a repetição de diversas situações traz sobre o desfecho destas, desde que, obviamente, seja gratificante para o indivíduo. Nos seres humanos, foi recentemente comprovado (vide em: Psicofarmacologia – Stahl – 3ª Edição - 2010) que grande parte das sinapses são destruidas pelo próprio organismo ao fim da adolescência. Provavelmente são eliminadas aquelas que não foram utilizadas e desenvolvidas até o fim desse período, pois a natureza age sob o processo de economia, eliminando sempre o que não é utilizado. Esse período é aquele onde se encerra a formação da personalidade, que depende de fatores genéticos e, também, das vivências ocorridas antes da fase adulta da vida. Nos cães, também. É, em função disso, o período até onde podem ser formatados os imprintings de comportamento. Por isso que os drives podem ser muito melhor estimulados até o fim dessa fase e quanto antes se puder iniciar tal desenvolvimento, melhor. Esse aprendizado não é só psíquico, é de todo o sistema nervoso central, inclusive sobre o equilíbrio, destreza, etc. Imaginemos tentar aprender a andar de skate quando criança e após os 20 anos de idade que teremos uma noção do processo e da enorme diferença entre as dificuldades do mesmo aprendizado em fases diferentes da vida. O aprendizado neuronal decorre de dois fatores. O primeiro subjugado ao aprendizado psíquico, pois uma mente segura tem melhor controle sobre as descargas de neurotransmissores. O segundo advém da facilitação, através do uso funcional das vias neuronais, de transmitir e receber informações nervosas. Como todo elemento de um organismo, as vias nervosas dependem de seu uso para melhorar sua eficiência. Além disso, a própria função endócrina de liberação hormonal depende da segurança psíquica que um bom aprendizado incrementa. Conforme dito acima, a transmissão e recepção nervosa, bem como a liberação de catecolaminas, dependem de controle do encéfalo, que se associa e se confunde com as instâncias psíquicas. O psiquismo, por sua vez, é severamente influenciado pelas vivências do indivíduo, os traumas que sofreu e as situações gratificantes que vivenciou. Por outro lado, o psiquismo também é influenciado pela liberação exacerbada das catecolaminas, interagindo com as condições de insegurança que motivaram sua elevação. Se por um lado, as situações gratificantes, como auto-estima, reconhecimento de seu valor pelo grupo, júbilo pela vitória, agrados diversos, etc., trazem segurança ao indivíduo, por outro, as

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situações traumáticas e negativas trazem insegurança. Seriam estas opostas às primeiras, e podemos citar: falta de aceitação pelo grupo, xingamentos, sentimento de rejeição, sentimento de derrota, sem falar, é claro, dos traumas de ordem física e os grandes sustos. A insegurança, por sua vez, traz descontrole emocional, e este mais insegurança. Em outras palavras, inseguranças podem trazer reações não desejadas ante ao perigo e que escapem ao próprio controle e desejo do indivíduo. Fugas ante o perigo e ataques indesejados ante supostos perigos são potencializados, tendo em vista que o descontrole emocional deturpa e deforma as informações recebidas e analisadas pela mente, bem como suas reações. Portanto, parece claro que o treinamento advindo de estímulos positivos, de modo geral, é bem mais eficiente no ponto de vista de evitar o descontrole emocional em razão de melhorar e não diminuir o nível de segurança do indivíduo. Por um lado, as situações traumáticas e negativas trazem insegurança e exacerbam os níveis de noradrenalina e adrenalina e de descontrole emocional. Por outro lado, o aprendizado feito com base em estímulos positivos gera confiança e controle emocional e, conseqüentemente, neuronal e endócrino, sendo bem mais eficiente. Tal eficiência se reflete tanto do ponto de vista da firmeza do ataque quanto da resposta aos comandos, uma vez que a mente não sofrerá influência deletéria dos estímulos negativos: insegurança, medo, descontrole emocional, falta de atenção, dificuldade de aprendizado e deformação psíquica das informações. Para os que quiserem saber mais: Noradrenalina (ou noraepinefrina): aumenta a pressão sistêmica diastólica e o pulso, aumenta a resistência periférica total, diminui a circulação sangüínea nos músculos esqueléticos e no coração. Adrenalina (ou epinefrina): a adrenalina é lançada na corrente sangüínea quando prevalece o sentimento de medo. Aumenta a freqüência dos batimentos cardíacos (pulso) e o débito cardíaco, eleva o nível de açúcar no sangue, diminui o fluxo sangüíneo para as vísceras e aumenta para os músculos voluntários, faz diluir a gordura das células adiposas e faz com que o corpo esteja preparado para uma reação (lutar ou fugir). Como é uma substância liberada a partir do medo, está associada a ele, causando insegurança no ponto de vista psíquico. Dopamina: tem efeito paradoxal dose-pendente. (1) Em doses baixas, produz vasodilatação mesentérica e renal, aumentando o volume urinário. (2) Em doses moderadas, libera noradrenalina, o que faz aumentar a contractilidade do miocárdio e o débito cardíaco; Aumenta a pressão arterial sistólica, aumentando discretamente ou em nada a pressão arterial diastólica. A resistência arterial periférica não se incrementa. (3) Em doses elevadas (o que não é o caso) aumentaria a resistência arterial periférica e causaria vasoconstrição renal. Aumentaria as pressões arteriais diastólica e sistólica. A dopamina no ponto de vista psíquico está associada à sensação de prazer. Seu aumento causa euforia. O que tentamos mostrar é, em resumo, que o drive de rapina é, sem dúvida, o mais indicado para iniciação dos trabalhos de guarda propriamente ditos, por estimular minimamente a adrenalina e a noradrenalina, sendo mais baseado na estimulação da dopamina e, conseqüentemente, o prazer sentido pelo indivíduo sem o sentimento de medo e com aumento da segurança pelo indivíduo.

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Mas, a defesa deve e precisa ser estimulada se quisermos um cão realmente efetivo na guarda. Embora a viga mestra do trabalho de proteção sempre deve ser o drive de rapina, para um cão de guarda territorial, a defesa é fundamental, pois o drive de rapina tem um tempo de excitação muito, mas muito mais, curto do que o de defesa. Este último é que impede que o cão acabe por se acostumar com um malfeitor que tente cativar o cão ou alguém experiente que desloque a rapina do cão para outro foco e possa roubar a casa inteira e, até, o próprio cão. Mas, o drive de defesa necessariamente aumenta a noradrenalina e a adrenalina? Em princípio, sim. Isso, no entanto, não implica necessariamente em um aumento exacerbado, como vimos anteriormente. Um aumento moderado e adequado da noradrenadina e da adrenalina é necessário para o bom trabalho de guarda e conduzirá a um bom drive de defesa. Isso é que veremos mais adiante quando comentarmos sobre as subdivisões desse drive, quando falarmos, entre outras coisas, na defesa resoluta, na defesa simples, na pré-fuga e em todos os tipos de fuga. Talvez, agora, o leitor entenda por que comentamos sobre a fisiologia associada aos drives. Ela não é essencial ao entendimento deles, mas seu conhecimento ajuda bastante nisso. Quanto aos estímulos positivos, também é recomendado que a obediência, na medida do possível, deve ser calcada nesses estímulos, tendo os negativos apenas como reforços nos imprintings comportamentais. Sobre imprinting: IMPRINTING – Palavra inglesa que significa a consolidação de um comportamento de um cão através do seu condicionamento por estímulos negativos, positivos ou passivos nas fases não-adultas. Sabemos que: Temperamento = Herança Psíquica + Experiências Infantis + Resultante de Traumas. Pois bem, o Imprinting é a parcela das Experiências Infantis consolidada pelo adestramento. PRONÚNCIA: imprinting. (“Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos”). Muito bem. Até aqui, quase todos que têm noções básicas sobre cinofilia concordam. A partir deste ponto, há discordâncias sobre os métodos de seqüenciamento da condução da formação do cão de guarda. Pode ser advogado que o cão deve ser conduzido desta forma sempre com baixas secreções de catecolaminas para garantir maior confiabilidade emocional e maior resistência ao trabalho, na medida em que as catecolaminas (principalmente a adrenalina e a noradrenalina) são agentes desgastantes para a mente e o físico do animal. Também pode ser argumentado que a secreção das catecolaminas (no caso, adrenalina e noradrenalina) está associada à raiva, a uma maior defesa e a uma mordida bem mais forte. Pode-se dizer também que tais agentes moderadamente elevados aumentam significativamente a resistência ao castigo imposto aos cães, pela bem maior resistência à dor (se elevados em excesso, ninguém discorda dos efeitos deletérios sobre o estado psíquico). Aparentemente, há uma ausência de paradigma entre os entendimentos dos dois entendimentos. Em verdade, o que há é uma falta de visão cinológica mais ampla. Uma miopia que leva a enxergar a cinofilia por um apenas um ângulo. Evidentemente que não há ausência de paradigma (na medida em que falta de paradigma implicaria em falta de consenso no meio científico dos assuntos que

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amparam e antecedem aos cinotécnicos), mas desconhecimento por parte de pessoas sem estudo sobre a matéria. O que realmente há é discordância sobre métodos e intransigência em relação a necessidades e entendimentos alheios, sem que os princípios etológicos e cinotécnicos sejam colocados em dúvida, tendo em vista não haver substrato científico para tanto. O que podemos dizer é que quem pensa de uma ou de outra forma está certo ao defender suas posições, mas totalmente errado ao condenar quem diferentemente lida com a matéria. Isso porque o tipo de guarda e de ataque deve variar conforme necessidade e interesse do dono de cada cão. Vide item “Cinofilia Esportiva e Cinofilia Efetiva”. Cães usados para provas esportivas longas não devem realizar ataque com altos níveis de noradrenalina ou adrenalina. Daí, o schutzhund penalizar ataques que demonstrem tal fato, como é o caso da punição imposta às mordidas nas quais os cães sacolejem. Nesse mesmo sentido, cães que têm propensão a manter altos níveis dessas catecolaminas são inapropriados para trabalhos de faro e afins. Isso já não ocorre com cães que mantenham altos níveis de dopamina, pois esta aumenta a resistência de trabalho do cão. Lembremos que a noradrenalina está associada ao drive de defesa e que a dopamina está associada ao drive de rapina. Mas, é preciso ter cuidado ao tirar conclusões, pois, paradoxalmente, o drive de defesa tem sua atuação muito mais longa do que o drive de rapina. Mas, isso advém de questões evolutivas, onde a caça é realizada em momentos escolhidos e a defesa sempre precisa estar pronta a qualquer momento, tendo em vista a imprevisibilidade de sua necessidade. A dopamina aumenta em volume, mas também em tempo, a capacidade do drive de rapina. Já a noradrenalina tem efeito paradoxal. Doses moderadamente altas deste neurotransmissor elevam em tempo e em volume o drive de defesa. Mas, doses altas estão associadas a um tipo de defesa diferente do desejado na cinofilia e desgastar rapidamente a capacidade do indivíduo. Cães usados para guarda residencial ou pessoal não necessitam de grande resistência psíquica ao trabalho, sendo mais útil uma reação de ataque mais violenta e decisiva, bem como uma maior resistência à dor em caso de reação importante do oponente. Mordidas que chacoalhem também são bem mais preferíveis nesse caso, para não dizer, essenciais. Sobre mordidas que chacoalhem, o que temos a ponderar é que um cão com maiores níveis de noradrenalina liberada terá maiores dificuldades de ser ensinado a morder sem chacoalhar - como de qualquer outro aprendizado. Por isso, o aumento da noradrenalina e o drive de defesa estão associados a uma diminuição sobre o controle. Mas, é certo que um cão muito equilibrado poderá morder chacoalhando, pois esse é o comportamento normal de luta dos carnívoros, e esta deverá ser sua mordida normal se não for ensinado a não o fazer, desde que entenda que está em uma situação de luta. Veremos mais sobre luta logo adiante. Muito embora não haja consenso entre as formas de pensar, existe paradigma científico sobre a atuação das catecolaminas no indivíduo. Não parece haver dúvidas sobre as prováveis atuações dos neurotransmissores nos drives dos carnívoros. Digo prováveis, pois embora quase que óbvias para quem conhece bem o assunto, não foram ainda estudadas por método científico especificamente nesses animais. Mas, não há nenhum motivo para crer que devam ser diferentes das atuações desses neurotransmissores nos seres humanos. Todos os modernos trabalhos de neuroimagem funcional, com o uso da ressonância magnética funcional, vêm a comprovar a enorme semelhança dos processos cerebrais entre o homem e outros mamíferos, tendo em vista as áreas do cérebro que atuam quando os indivíduos são expostos a situações semelhantes ou

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equivalentes serem exatamente as mesmas. Dizer, por exemplo, que animal não tem sentimento é algo, em termos atuais, totalmente ultrapassado. Os processos emocionais entre homens e outros mamíferos são praticamente idênticos, conforme comprova a ciência. A grande diferença entre os homens e esses animais está no maior desenvolvimento no homem do córtex pré-frontal, área que tem grande associação com os processos executivos, mas pouca associação com os processos emocionais. Grande ignorância foi pensar diversamente durante séculos, pois as emoções e os sentimentos têm uma enorme importância na evolução das espécies, principalmente entre os animais que vivem em grupos. Os instintos não explicariam toda a gama de comportamentos que podemos perceber nos animais, principalmente nos cães. E o que é um sentimento? Não seria o refinamento de um instinto? Onde termina um e onde começa o outro? Mas, uma pergunta não se cala: não seriam cães que elevam seus níveis de catecolaminas inseguros, descontrolados e até perigosos? O que temos a dizer é que há uma sutil confusão, mas que é de enorme importância. Para desfazê-la, primeiramente, vamos considerar que há dois tipos de cães que elevam suas catecolaminas: os que fazem sem controle psíquico, e os que agem sob controle da psique. Muito embora as catecolaminas sejam secretadas de forma involuntária, assim como os hormônios secretados pelo sistema nervoso autonômico simpático, isso não significa que a mente não exerça, quando treinada, certo controle sobre tais descargas em nível de neurotransmissor e até hormonal, tendo em vista controlar as emoções que os comandam. Isso pode ser comprovados em muitos lutadores humanos que são pessoas tranqüilas fora dos ringues, e que, quando em luta, mantêm essa mesma serenidade e controle da situação em que se encontram. Esse lutador provavelmente, durante o combate, consegue elevar seus níveis de dopamina, pelo menos, se o fizer, terá melhor resistência e maior disposição para o combate. Com certeza, saberá também conter suas descargas noradrenérgicas e adrenérgicas a fim de que elas não se exacerbem, evitando o esgotamento e o pânico. Pode ser risível, à primeira vista, crer que um cão possa exercer conscientemente tal controle por sua vontade e consciência. Obviamente que seria risível dizer isso. Mas, através de imprintings podemos conduzir o cão a baixar e elevar os níveis dos citados agentes conforme circunstância. Lutadores humanos também não necessitam ter conhecimento sobre a matéria para controlar esses níveis. Em verdade, o conhecimento teórico sobre o assunto de pouco ajudaria. Esse controle é de nível muito mais primitivo e profundo, não podendo ser dominado pelo ego, mas pode ser formatado pelo aprendizado através da exposição progressiva do indivíduo às diversas situações. É nesse conhecimento sobre o assunto que se ampara as bases da psicologia comportamental. Podemos dizer que as mais competentes e refinadas técnicas de trabalho para cães de guarda precisam desse conhecimento, ainda que prático e sem o entendimento teórico da questão. Nós, humanos, também elevamos nossas catecolaminas e hormônios da mesma forma que os cães sem nos darmos conta que o fazemos. Importante também é lembrar que tal aprendizado pode ser seletivo. Podemos ensinar um cão a inconscientemente ter um controle seletivo do tipo de neurotransmissores e hormônios que irá produzir em cada situação. Na verdade, não ensinamos nada. Apenas deixamos despertar naturalmente o que é normal na criação de qualquer predador. Por isso, que formatações muito diferentes do que é o comportamento normal de um cão, geralmente não são as ideais para treino efetivo de guarda.

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Há cães que vêm da cruza entre raças oriundas de lutas entre cães cruzadas com raças de cães de guarda. Os bull and terriers, raças mais comuns nas lutas entre cães, foram selecionados funcionalmente a terem equilíbrio perfeito sobre suas descargas neuronais e endócrinas, tanto no sentido de elevá-las quanto de baixá-las. Por vezes, vemos exemplares descontrolados e atípicos, mas que não representam suas raças ou que foram influenciados negativamente pela ação do ambiente e pela mão do homem. Como sabemos que o excesso de adrenalina e noradrenalina é desgastante, como poderia um cão de luta mantê-las muito elevadas por horas? Simplesmente seria impossível. Os cães que tivessem tal comportamento fisiológico seriam eliminados, e as raças selecionadas em sentido inverso. Mas, sabemos, todos, que um único cão descontrolado faz fama por mais de mil equilibrados. O resto da fama fica por conta da invejável capacidade física desses cães. Portanto, bull boxers e bandogues, por ter ascendência de bull & terriers, cães com especial propensão a ter efetivo controle, caso recebam competente treinamento, a baixar e elevar suas descargas adrenérgicas, conforme ocasião. Por isso, raças com ascendência em cães de luta podem trazer cães de excelentes qualidades quando misturadas a raças de guarda. Ensinar cães a controlarem suas descargas adrenérgicas, conforme situação é um dos objetivos deste trabalho e está implicitamente contida em todo seu corpo, que serve para treinamento de qualquer raça de guarda ou com potencial para guarda muito embora muito pouco mais venha a se comentar sobre as funções psiconeuronais. Drives são impulsos distintos. Falar em misturar drives era, até pouco tempo atrás motivo de risos por alguns treinadores. Isso porque o drive de rapina vem do instinto de predador, e o de defesa, como o nome diz, do instinto de defesa, própria, em relação aos filhotes, à comida, às fêmeas, etc., que são coisas entendidas em princípio, até não muito tempo atrás, como não-associáveis. Isso, pois, se advogava que são coisas que não são feitas a um só tempo, pois ou se defende ou se caça. A prática e a observação nos mostram que tal premissa é errônea. Pode-se, ardilosamente, transitar do drive de rapina para o drive de defesa e vice-versa. E mais, no bom trabalho de guarda efetiva, os dois drives raramente estão absolutamente isolados. O cão é um animal que aprendeu com o homem muitas coisas e foi por este selecionado de forma diversa de como um animal selvagem é selecionado. Tentar utilizar cegamente alguns paradigmas etológicos aplicáveis a predadores selvagens em cães domésticos pode ser um erro grotesco. Vejamos mais em “Os cães Domésticos têm Drives Iguais aos Lobos e a Outros Carnívoros?”. E, como veremos adiante, mesmo os carnívoros selvagens também, em algumas ocasiões, trabalham com rapina e defesa associadas. Cabe ainda colocar algo importante e comprovado recentemente pela ciência e citado na obra de Stahl retro citada. Existe algo que Stahl chama de “aprendizado diabólico” que em outras palavras significa que o neurônio e a sinapse nervosa acostumam-se a um funcionamento “maligno”. Por exemplo, uma pessoa que não trata sua depressão por muito tempo, acostumará seu sistema nervoso a funcionar nesse estado. Isso fará que o tratamento da depressão nessa pessoa fique cada vez mais difícil à medida que o tempo passe e ela continue sem se tratar. O mesmo vale para outras anormalidades de funcionamento. O sistema nervoso de um cão que durante muito tempo foi submetido a maus-tratos ou a treinamentos estressantes, que elevaram exageradamente seus níveis de noradrenalina e de adrenalina, tenderá a se acostumar a trabalhar em tais níveis. Em termos etológicos, isso significa que trabalhará com uma defesa associada mais ao medo do que à

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capacidade de reagir, ou seja, mais em pré-fuga do que em defesa resoluta. Seu funcionamento neuroendócrino irá consolidar a ser sempre sensível ao stress e isso pode se desenvolver até que o stress ocorra mesmo na ausência de estressores. Ou seja, será um cão de difícil recuperação para o trabalho de guarda, poderá vir a ser também um cão perigoso, um mordedor por medo que ataque quem menos se espera e quando menos se espera ou poderá ser uma criatura totalmente tímida e disfuncional. Além disso, o funcionamento neuroendócrino associado ao stress, psíquico e nervoso, sobrecarrega os neurônios do sistema nervoso central, pelo aumento excessivo do íon cálcio para o interior do neurônio, e tende a diminuir a vida útil do neurônio que morrerá e não será substituído, exceto em poucas áreas cerebrais, mais precisamente no bulbo olfatório e no hipocampo. Isso significa deterioração mental. Além de tudo o aumento das catecolaminas mantido e exagerado sobrecarrega todo o sistema cardiovascular, aumenta em muito a possibilidade de infarto cardíaco, de acidente vascular cerebral e prejudica todo o organismo. Em contrapartida, se o sistema neuropsíquico acostumar a funcionar associado a uma defesa segura, a qual chamamos de resoluta, tal sistema se acostumará a levantar dessa forma sua defesa quando exigida ela é. O desafio era como levantar a defesa positivamente em um cão imaturo sem traumatizá-lo? Ou seja, como levantar a defesa em bom nível em um cão antes de elevar sua rapina? A triangularização da defesa, como veremos adiante, foi a solução por nós encontrada. Para quem conseguiu ler este item até o fim, parabéns. Ele exige muito do leitor. Fiquem tranqüilos, pois o resto do capítulo não trata a matéria dessa mesma forma. 007 - RAPINA PARA A LUTA E O DRIVE DEFESA: Primeiramente, vamos conceituar o que é luta e o que é Drive de Luta. “LUTA - ... (2) É a interação entre caça e defesa. O cão atinge o estado de luta quando tem a disposição de atacar dada pelo Drive de Rapina e algumas reações típicas de um bom Drive de Defesa.” (Dicionário de Cinofilia e de Termos Correlatos). “DRIVE DE LUTA – Termo muito usado pela escola americana de adestramento, definido por alguns como a união dos Drives de Rapina e Defesa. No Drive de Luta o animal tem a disposição e o impulso de atacar movido pelo Drive de Rapina, mas usa características de Defesa em seu ataque, objetivando mais ferir do que segurar a presa. Equivale, no predador, à sua disposição de atacar presas que revidarão e lutarão com energia.” (Dicionário de Cinofilia e de Termos Correlatos) Só para adiantar e facilitar o entendimento, o drive de defesa não se consiste em uma só entidade. Há níveis muito mais diferenciados e muito mais difíceis de serem entendidos do que os diversos níveis do drive de rapina. Este trabalho pode ser útil para incrementar maior drive de defesa em um cão que apresenta bom drive de rapina. Um bom cão de guarda deve ter seus drives em harmonia com a tarefa que realiza. Muito fácil de fazer: estimular o cão na perseguição e quando este abocanhar o bite, manga ou afim, seguir, gradualmente, aumentando o toque de bastão. O que não precisa nem deve ser feito a um só treino. É um processo que deve ser mais ou menos insidioso, conforme cada cão. Equivaleria, na natureza, às respostas do predador a uma reação de combate feita por presas cada

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vez mais competentes em se defender. Se no primeiro ataque, o predador encontrar uma presa muito forte e combativa, ele poderá ter dificuldades de reiniciar um novo ataque mesmo a presas mais fracas, poderá ficar como um gato que queima o focinho no leite quente. O cão chegando à luta tem em sua mordida mais propensão a ferir do que a aprisionar. Na guarda efetiva, os cães devem possuir o drive correspondente à luta para maior eficiência de ataque. Além disso, o drive de defesa é fundamental para qualquer cão que faça guarda territorial. Na natureza, seria o caso do predador saber que precisa ferir e abater a presa, pois seria impossível subjugá-la de outra forma. Nem em todo cão isso é alcançável plenamente. A partir de certo ponto, a capacitação será proporcional à capacidade latente de defesa – sem falar, é claro, na capacidade de rapina que levou até o ataque. Deve ser incrementada a passagem da rapina para a luta (ou, em outras palavras, a associação da defesa à rapina) em níveis elevados de rapina. Insidiosamente ou não, conforme rigor do castigo, o cão se irritará, e acrescentará à atitude de rapina uma dose de defesa. A esse nível, autores como Ed Frawley, chamam de luta. Citamos Frawley por ser ele o autor, entre os mais conhecidos, que mais costuma citar e valorizar tal drive. Em verdade, outros autores, como Helmut Raiser (autor do famoso livro Der Schutzhund), também citam a luta em seus textos. Mas, foi Frawley quem mais valorizou a luta e repetidamente a citou como um drive independente (ou uma composição de drives?). Após o cão chegar ao estado de luta pleno, não se deve continuar aumentando muito a pressão exercida. Isso pode testar o cão tão somente, mas, não trará nenhum benefício em sua capacidade, tendo em vista que mais nenhum progresso poderá ser obtido. No entanto, pode fazer o cão passar pela defesa resoluta, algo que não poderemos identificar em tal situação, e, depois, baixar o nível da defesa para a pré-fuga e para a fuga. Em outras palavras, ser quebrado. Quando um determinado processo não traz mais progressos, há muitas chances de se obter fracassos caso nele insistamos. Adiante, trataremos dos subdrives de defesa ora citados. Em nível de neurotransmissores, aumentará seus níveis de noradrenalina, já estando com os níveis de dopamina elevados. Se os níveis de noradrenalina e de adrenalina elevarem-se demais, o estado psíquico também estará se alterando, podendo o medo, o pavor e o pânico tomarem conta do animal, e ele entrar em fuga. Reabilitar depois pode não ser tarefa das mais simples ou mesmo possível. O cão tenderá a baixar seus drives de proteção, inclusive (e muito) o drive de rapina. A resistência do cão ao castigo é algo paradoxal nesse contexto. Por um lado, cães com enorme resistência ao castigo podem suportá-lo maios, mas com mais dificuldade de chegar à luta. É o caso de alguns pit bulls mais afeitos ao game dog. No extremo oposto, uma baixa resistência ao castigo pode fazer com que o cão desista do ataque, e o drive de rapina existente seja seriamente comprometido. O comprometimento deste drive será proporcional à baixa capacidade de resistir à dor e inversamente proporcional à amplitude do próprio drive. No início deste parágrafo, dissemos que cães com enorme resistência ao castigo podem ter dificuldade de chegarem à luta. Por que? A razão é que esses cães não entram em defesa com o aumento do rigor do bastão, seus níveis de adrenérgicos (de adrenalina) não se elevam, a excitação fica só por conta da dopamina e de uma rapina altíssima. Tão alta que se mantém, e o cão não entra em luta. Isso é bom ou ruim? Difícil essa resposta. Se for perguntado a um cinófilo afeito exclusivamente ao esporte, ele dirá que é excelente. Realmente, de fato é excelente por um lado, pois esse cão terá resistência ao castigo como nenhum outro tipo de cão pode ter, tenderá a manter a mordida segura como nenhum outro. Mas, não irá retalhar e ferir a presa tão bem quanto um cão que morde em luta. Esse assunto é exaustivamente exposto em “037 - LUTA. CONDIÇÃO INTERATIVA ENTRE RAPINA E

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DEFESA? MORDIDAS ASSOCIADAS AOS NÍVEIS DE DRIVES”. Uma exacerbação do drive de rapina, em um ataque não-lançado, pode ser confundida com um drive de defesa por neófitos. Isso porque certos cães ficam excessivamente excitados e acabam por vir a ter algum descontrole pelo fato de estarem limitados por uma guia ou uma grade. Nota-se nitidamente em cães que estão sendo contidos antes do ataque a cauda baixa, mesmo esses cães estando em alto nível de rapina. A razão disso é a contrariedade por não ser solto e não medo. Já se o cão for solto em direção ao figurante – principalmente, se este estiver a uma boa distância, o drive em questão se revelará facilmente (defesa ou rapina). Mas, pequenas sutilezas, como o arrepio dos pêlos na cernelha, na postura, no tom do ladrar, etc., podem ser percebidas mesmo no cão contido. Não podemos, no entanto, confundir demonstrações de medo com drive de defesa. Será esclarecido mais sobre o assunto no item “038 - DEFESA E FUGA”. O figurante precisa ter a sensibilidade de perceber como e quanto pode usar o bastão, em intensidade e tempo de uso, do contrário corre o risco de piorar ao invés de melhorar a capacidade do cão. A tendência é que a própria elevação do drive de rapina aumente a capacidade de resistência, dependendo do nível deste drive alcançado, como veremos mais adiante. A sensibilidade de perceber se o cão melhora ou piora com o treinamento e com o aumento de seu rigor é fundamental, bem como de entender e saber o limite de cada cão. Indispensável dizer que o rigor deve regredir caso se note qualquer maior desconforto por parte do cão em relação a como ele estava anteriormente ao aumento da intensidade do uso do bastão. ou qualquer outro tipo de pressão decorrente do treinamento É o conhecimento desses e outros fatores que diferenciam um figurante de um cobaia. Não devemos também confundir no drive de rapina, o fair fight, com o fair play. Ou seja, a capacidade de manter a rapina mesmo sofrendo pressão física, como suportar o rigor do bastão, com a capacidade se manter em brincadeiras de correr atrás de bolinhas, etc., embora sejam coisas associáveis. Há o caso de poodles treinados para morderem mangas e acostumados ao som de batidas do bastão no chão ou mesmo a leves toques sobre eles, mas que não resistiriam um toque sequer moderado de bastão. Há cães treinados assim somente para espetáculos. Não se trata só de cães de companhia e de raças que não são de guarda. Há muitos cães ditos de guarda e que passam por fracos testes obrigatórios, mas que não estão muito longe dos citados poodles. A diferença entre rapina em nível entre fair play, fair game e fair fight está exatamente na capacidade do cão suportar algum nível considerado satisfatório de esforço ou de castigo para manter a “presa”. Mas, o que é nível satisfatório? Poderíamos definir a passagem do fair play para o fair game como o nível no qual o cão começa a realizar um esforço que resultaria em desconforto caso não fossem as associações límbicas entre esforço físico e captura da presa. E quanto à transposição do fair game para o fair fight como o nível em que o cão entenderia como castigo físico caso não existissem essas mesmas associações entre o que seria dor (caso o cão não estivesse nesse nível de drive) e a captura da “presa”. Vejam o tópico “Sistema Límbico. O que é Isso?”. Mas, e a passagem do fair fight para a luta, com a incorporação da defesa? Poderia ser quando as associações límbicas entre captura da presa e a dor do combate não fossem suficientemente fortes para sustentar a sensação de euforia e até de prazer ao cão por um castigo mais severo? O ponto a

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partir do qual as injúrias sofridas fizessem com que o cão reagisse de forma também defensiva sem perder a rapina? Ou seria quando houvesse uma ambigüidade de emoções, o prazer do ataque em contraposição ao castigo severo, resultando no prazer da luta? Ou tudo isso junto? Esta última hipótese parece-me bem mais viável. Será que, na prática, mesmo entre animais selvagens, são momentos sempre dissociáveis? Será que sempre podemos saber onde se estabelece o fim de um impulso e o começo de outro? Creio que, muitas vezes, não. Veremos adiante em "Luta. Condição Interativa entre Rapina de Defesa? - Mordidas Associadas". Fica realmente difícil explicar para iniciantes em adestramento como na luta o cão ultrapassa o fair fight e incorpora à rapina a defesa, mantendo, é claro, a rapina em um nível não inferior ao do fair fight. Ou seria apenas ao amadurecimento e à evolução do drive de rapina a um nível ainda mais alto da rapina? Se raciocinarmos que os níveis da rapina estão associados à capacidade de suportar a pressão e que essa mesma capacidade também terá um limite, veremos que após a luta, se a pressão continuar aumentando indefinidamente em tempo e em intensidade, o cão perderá a rapina e passará a estados de defesa com níveis de drive decrescentes até chegar à fuga franca. Portanto, não parece que luta seja simplesmente a evolução pura e simples do drive de rapina. Se por um lado, com o aumento da pressão, podemos passar da rapina para a luta, se esse aumento da pressão continuar progressivamente, ele levará o cão à fuga. O cão em fair fight está mais longe da fuga do que o cão em luta, o que não significa, no entanto, que o cão em luta esteja perto da fuga. Os cães que mantêm a rapina, mesmo com um aumento substancial da pressão são cães mais difíceis que entrem em fuga. A razão disso é que um cão que entra em luta poderá ter sentido psiquicamente mais o castigo do que um cão que se mantém na rapina pura em alto nível e intensidade. Mas, melhor é dizer que um cão em luta está “menos longe” da fuga do que mais perto dela, pois ele poderá ter a capacidade de lutar até a morte se for um bom cão. O que vence um bom cão de guarda ou de luta, o que vence um bom lutador humano, não é o medo nem a dor, o que os vence quase sempre é o cansaço. Portanto, estar em fair play ou em luta não fará muita diferença, exceto quando o animal não for de alta qualidade (em genética ou em treinamento adequado) e a luta apresentada for frágil na intensidade dos drives que a formam. Observem que no parágrafo anterior está escrito: “poderá ter sentido psiquicamente mais o castigo”. Foi dito “poderá”, apenas isso. Pois não é apenas o castigo que leva um cão à luta, mas algo esquecido pela cinofilia, algo que se chama afronta, e que veremos mais adiante nesse trabalho. Um cão que evolui para a luta em virtude de perceber a afronta e reagir ela tenderá a ter uma luta muito mais consistente do que outro que evoluiu para ela em razão de haver sentido a pressão física ou psicológica. Em uma situação de reação violenta da presa (ou do figurante), o predador (ou o cão), poderão passar da rapina para a defesa. Mas, como conceituar isso e definir esse momento? Conhecer isso através das reações do cão também é objetivo do nosso trabalho, pois não se pode adestrar cães sequer razoavelmente sem ter tal percepção. Não só é necessário saber que entrou em defesa, mas qual tipo de defesa? Manteve ainda assim a rapina ou não, ou seja, a defesa foi associada à rapina ou a substituiu? Voltando ao prático, a utilidade de conduzirmos, através de usar o drive de rapina para o levantamento da defesa, seria a de dar drive de defesa a um cão que a tem em baixo nível, não será

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somente para que esse cão incorpore o drive de luta, mas, também, para que passe a ter mais desconfiança em relação a estranhos e mais eficácia no ataque, isto é, mordidas mais lesivas. Sobre isso, veremos adiante em “037 - LUTA. CONDIÇÃO INTERATIVA ENTRE RAPINA E DEFESA? - MORDIDAS ASSOCIADAS”. Quanto à desconfiança com estranhos, não há necessidade de fluir da rapina para defesa, pois podemos dispor de meios mais simples para tanto. Não precisamos necessariamente chegar usar do bastão nem da pressão física. Pode ser eficiente a simples ameaça de o figurante sem precisar insultar fisicamente o cão durante os treinamentos. A pressão psicológica que tem uma elasticidade muito maior, isto é, mais fácil é de se adaptar a ela sem tantas qualidades genéticas, pode ser suficiente. Em verdade, nem será o figurante a pessoa mais indicada para deixar o cão desconfiado, mas pessoas estranhas que apenas ameacem o cão. Isso deve ser feito com critério para evitar que o cão torne-se neurótico. E cabe também lembrar qual será a utilidade futura do cão. Partir da rapina para a defesa através da condição de luta é uma excelente metodologia, talvez a melhor, desde que possa ser aplicada. Mas, devemos lembrar que não são todos os cães que suportariam tal passagem. Cães com baixos drives de rapina podem vir a ter insucessos devastadores. Se o nosso cão é o nosso cão, o nosso companheiro, e dele não quisermos nos desfazer, mas queremos que, na medida do possível, faça alguma guarda, ainda que não seja a mais maravilhosa do mundo, daremos a ele apenas o que ele possa suportar para que fique o melhor que ele pode ficar. Dar mais do que ele agüenta irá piorá-lo ao invés de melhorá-lo. A evolução da rapina até a luta é o fator usado para fortalecer o ataque. A incorporação da defesa traz maior gana ao cão, tendo em vista junto a ela haver uma forte dose de raiva. Para cães esportivos, a luta não é o objetivo a ser atingido, pois a raiva diminui o controle já diminuído pela própria exacerbação da rapina. Mas, levar à luta é o melhor caminho para cães de guarda efetivos, isto é aqueles que realmente irão fazer guarda real e objetiva em quintais, em residências. Não é, no entanto, um bom trabalho para cães de polícia que devam mais segurar do que dilacerar, mas pode ser interessante em cães de assalto, conforme objetivo do trabalho (prender ou dilacerar?). Para cães de proteção individual a opção deverá seguir a rotina da pessoa. Para um cão que tenha que acompanhar o dono em locais movimentados, o tipo de mordida de luta pode não ser a melhor escolha, até porque tal mordida é associada a um maior drive de defesa, menos sujeito ao controle do que o de rapina. Vejam mais sobre em “028 - TIPOS DE GUARDAS E FUNÇÕES”. Comentando sobre a passagem da rapina para a defesa, em nível etológico, podemos dizer que ela equivale ao revide da presa ao predador, e a necessidade deste em se defender sua vida. Se na luta, o caso seria do predador saber que precisa ferir e abater a presa para poder contê-la, na passagem da rapina para a defesa, o caso seria do predador, mais do que saber que precisa lutar para abater a presa, seria saber que terá que lutar para defender a vida, pois a reação da presa lhe dá a percepção de perigo. Lembrem que a fuga pode ser uma das alternativas viáveis, e isso pode acontecer não só na natureza como com o seu cão caso sejam ultrapassados os limites invisíveis para os leigos e até para muitos adestradores e figurantes experientes. Por isso, o treinamento deve ser com cautela e insidioso para que o cão se acostume à sua lida. Cães com baixa capacidade de suportar a dor provavelmente refuguem e venham a se colocar em fuga, caso não tenhamos a sensibilidade de não aumentar o nível de pressão, de parar o treino e até de regredir a intensidades menores de pressão no momento preciso. É necessário explicar que quando há a passagem da luta para a defesa, referimos, em princípio, ao

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nível de defesa resoluta. O assunto será mais explicado adiante em “Defesa e Fuga” e em “039 - FAIR FIGHT E DEFESA RESOLUTA. ALTOS DRIVES DE PROTEÇÃO LEVAM À LUTA”. Se a intensidade da pressão for além da intensidade que o cão pode suportar, essa passagem pode se dar a um nível de defesa inferior, que colocará o cão em fuga, ou seja, como se diz na gíria cinófila, quebrado. Durante um ataque em luta, com o aumento da intensidade da pressão, poderá haver a passagem para a defesa resoluta, algo que não pode ser percebido na maioria das situações, e, a seguir, a passagem desta para a pré-fuga seguida da fuga. Ao primeiro sinal demonstrado de pré-fuga, devemos imediatamente baixar a intensidade para nível ainda menor do que utilizado antes do primeiro sinal de pré-fuga. Jamais devemos permitir que a pressão aumente até que o cão entre em fuga ou mesmo chega perto dela. Isso será bem visto mais adiante. Relembrando, a evolução do drive de luta equivaleria, nesse mesmo prisma, ao predador que já ataca consciente da reação que enfrentará e, mesmo assim, tem gosto de atacar a presa sabendo do perigo e determinado em não perdê-la. O cão em luta ataca o figurante, ainda que de forma inconsciente, presumindo que este revidará. O sutil ponto de parada da evolução do treinamento está apenas em perceber qual é o ponto onde o castigo começa a ser psiquicamente sentido. Isso vale tanto para a pressão física quanto para a psicológica. Se notarmos que o cão começa a sentir dor, desconforto, medo, sem que esteja pronto para superá-los, está na hora de moderar o treinamento. Se percebermos que a maior preocupação do cão é não perder a presa, tendo em vista a ameaça não ser encarada com tanta importância e a dor sequer ser percebida ante a gana de abater a presa, tudo está indo bem. O fair fight ainda é pura rapina. Na luta, o cão não se fixa mais no figurante como uma simples caça indefesa, vê nele algum perigo, mas luta, fixado tão somente na vitória, sem perder, em momento algum, a rapina, a gana de lutar. Se separado for do figurante, mesmo em grandes distâncias, correrá em seu encontro mesmo sabendo que este continuará revidando. Poderíamos comparar tal estado emocional com o de dois cães de luta em combate franco. Esse também é o estado ideal para um cão de guarda não esportivo, se nosso objetivo for a eficácia de seu ataque. O que graduará essas situações não é exatamente o nível de pressão a ser percebida pelo cão no momento do treino tão somente, mas mais ainda a intensidade da pressão sentida e suportada anteriormente durante todo o treinamento que lhe trará condicionamentos de ataque que manterá sem que isso venha a significar que a pressão que originou a evolução para a luta seja ainda sentida ou lembrada. A tarefa do figurante e do adestrador é exatamente maximizar a condição de luta, roçando a condição de defesa, mas sem nela se aprofundar. Por isso, indicadores como pêlos arrepiados, rosnados, cauda baixa, durante o ataque são sinais claros de que se foi mais longe do que se devia. Nos casos destes indicadores, o cão estará já abandonando a defesa resoluta para a condição de pré-fuga, após perder a rapina. Poderíamos definir que o drive de defesa é aquele quando o cão ataca para defender a si próprio, seu dono ou familiar ou a seu território. Neste caso, só se chegaria à defesa através da caça quando o cão perceber, em algum momento, no figurante alguma ameaça contra sua integridade ou um causador de desconforto ao cão. Mas por que, nessas ocasiões, o cão não interrompe o ataque ao invés de continuar a atacar, mesmo que o treino não seja no território do cão ou o figurante não o encurrale e até mesmo demonstre fugir do cão? Ou seja, por que, mesmo após perceber que as situações que o fizeram incorporar a defesa possam ser evitadas, continua buscando o ataque ainda que tenha chance de não fazê-lo e sair ileso dessa situação? A razão é que o drive de rapina continua

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atuando fortemente. Podemos também afirmar que todo cão que ataca quando alguém invade seu território como pura motivação da defesa? E nas situações em que o invasor foge além do território do cão, e este continua a persegui-lo com todo o ímpeto e prazer em fazê-lo? Já não seria isso rapina? A rapina tão somente pode ser também de grande valia na guarda territorial, só que nesse caso ela deve ser ainda mais elevada. O ideal para o cão de guarda territorial é ter bons drives de rapina e de defesa. A interação entre esses dois drives, ou seja, o considerado drive de luta, que não é um drive um drive simples, mas um drive composto é , ao nosso ver, a melhor condição de ataque para um cão de guarda não esportiva. Vejam bem, não é um meio termo ou uma soma – o que seria bizarro imaginar - mas uma integração entre esses dois drives. E como estaria o comportamento das associações límbicas durante a luta? Talvez oscilante entre a euforia e a ansiedade, conforme momento e as situações de vantagem e desvantagem. Ou talvez o cão fique tão focado na disputa que lute com prazer o tempo todo. O importante, durante os treinamentos, é que jamais deixemos os cães terem um balanço negativo entre prazer e desprazer. Essa é a viga mestra de um bom cão de proteção. A vantagem do incremento da defesa através da rapina é a de se levantar a defesa do cão e transformar a atividade de proteção de desagradável e insegura para o animal para uma situação gratificante, que traga segurança ao cão e o deixe disposto ao treinamento. A desvantagem seria o risco de quebrar o temperamento do animal em mãos pouco experientes ou com pouca sensibilidade para perceber até onde se pode forçar o uso do bastão de acordo com a evolução do animal. Mesmo assim, a maneira mais difícil de quebrar um cão para levá-lo à defesa é através do levante da rapina e da posterior incorporação da defesa a ela. Outra vantagem de incorporar a defesa à rapina é o aumento significativo da vontade do cão em trabalhar. Conforme usamos o bastão, tanto para levar ao fair fight como para a luta o interesse e foco do cão aumentam significativamente sobre o figurante. Em verdade, no caminho para se chegar à luta, se ganha muito também em rapina. E qual é a desvantagem da incorporação do drive de rapina e do drive de luta em relação ao drive de rapina? Ela existe? Sim, ela existe e é a diminuição do controle do cão durante o ataque – e somente durante o ataque. Isso é a dificuldade de fazê-lo parar um ataque com o comando verbal. É óbvio que se levar um cão à luta só trouxesse vantagens todos o fariam. Em verdade, não há vantagem absoluta alguma em manter um cão em um fair fight de não tanta intensidade (em intensidades muito altas, o controle também é muito prejudicado) ou em levá-lo à luta. O que traz vantagem de um lado, tira vantagem de outro. Escolhe-se entre controle e eficácia. Se o cão é esportivo, isso depende do tipo de prova que fará e as provas tradicionais exigem mais controle do que intensidade. Se o cão não é esportivo, depende do tipo de guarda que deverá fazer. Se essa guarda exige maior controle, tendo em vista o cão ter que realizar seu trabalho em locais movimentados, com certeza, o controle deve ser mais bem observado. Há ainda o caso dos cães de polícia cujo trabalho é capturar sem ferir o suspeito, que necessitam não só de grande controle, como não interessam mordidas dilacerantes. Se essa guarda é na residência, em empresas ou em locais mais ermos, o controle não será tão necessário, e a maior eficácia da luta e da maior intensidade da rapina devem prevalecer, como é a imensa maioria do trabalho dos cães de guarda.

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Lembremo-nos, também, que a diminuição do controle ocorre somente para parar os ataques, caso sejam necessários ataques. Em nada irá influir o controle sobre o cão nas situações do dia a dia. Afirmações do tipo “controle é tudo” ou opostas não fazem o menor sentido antes de saber para que o cão será usado, que tipo de guarda fará. Ed Frawley foi citado neste item. Ed Frawley não tem seu valor reconhecido pela cinofilia de forma mais justa pelo fato de escrever sobre o que muitos não querem saber, por valorizar demais a defesa e o drive de luta, o que, em verdade, é valorizar a efetividade e demonstrar sua importância no encontro do cão de guarda no sentido mais estrito deste termo. Ao fazer isso, se demonstra que, por exemplo, um cão somente esportivo não é um cão completo para a guarda, coisa para a qual muitos preferem tapar os ouvidos. 008 - SISTEMA LÍMBICO. O QUE E ISSO? O sistema límbico é parte do sistema nervoso onde ocorrem as associações psíquicas. Para melhor compreender o significado do funcionamento do sistema límbico podemos dar alguns exemplos: O primeiro seria a diferente sensação que temos ao sentir o toque de alguém por quem nos sentimos atraídos ou estamos envolvidos com o mesmo tipo de toque de alguém com quem não temos tal atração. Embora o sentido do tato seja o mesmo, o sistema límbico, que atua em nível cerebral, pode levar a psique ao prazer, a nenhuma emoção ou a até mesmo ao nojo. Algum nível de dor pode ser agradável quando uma pessoa se sente massageada com fim terapêutico, mas esse mesmo nível seria desagradável em outras situações. Isso porque o sistema límbico associa a dor da massagem ao carinho, aos cuidados de outrem para com o indivíduo e à sensação de se sentir apoiado, cuidado, tratado. A pessoa que faz a massagem também poderá influenciar de forma importante na emoção final resultante, independente de seu procedimento manual e físico. O sistema límbico é o sistema onde os sentidos e as sensações sofrem associações com lembranças, sentimentos, afetos e diversas outras variáveis mentais. Dependendo do conteúdo psíquico de cada indivíduo, o vetor final das associações límbicas, para uma mesma situação, pode ser totalmente diferente entre os vários indivíduos de uma mesma espécie, uma vez que o conteúdo psíquico de cada indivíduo é diferente em virtude do temperamento, do caráter, dos afetos e das lembranças de cada indivíduo serem únicas. Em última análise, no sistema límbico está a instância psíquica final responsável pelas emoções ante os acontecimentos. Transferindo aos cães, a sensação de ser acariciado pelo dono e por um estranho é totalmente diferente para um cão que tem alta defesa. Já para um cão que não tenha tal qualidade, isso pode fazer pouca ou nenhuma, diferença. Por outro lado, muitos cães que não suportam carinhos de estranhos, não necessariamente os atacam quando estes o tentam os acariciar, o que significaria que tais cães são arredios com estranhos, mas que não têm bons drives de defesa. Obviamente, que é mais fácil levantar o drive de defesa de cães assim, desde que eles tenham a necessária coragem para o ataque.

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As associações do sistema límbico podem ter como resultado final gratificação ou desprazer para uma mesma situação externa. O diferencial, portanto, está na situação interna, isto é, na personalidade e memória de cada indivíduo, seja este um homem ou um cão. Sendo assim, o treinamento de um cão, tanto no que se refere à obediência quanto à proteção deve ser com base em situações que posteriormente sejam associadas positivamente pelo sistema límbico, ou seja, nos estímulos positivos e na euforia da rapina. Desta forma, em um treinamento bem sucedido, o sistema límbico associará até mesmo o castigo sofrido durante as provas e testes com lembranças e sentimentos de conteúdo emocional positivo. A violência aparente das provas até mesmo em nível elevado de pressão não trará nenhum tipo de sofrimento ao cão. Muito pelo contrário, será gratificante e prazerosa. Esse “nível elevado” irá depender de cão para cão, dependendo do seu temperamento e das experiências vivenciadas até então. Bull & terriers, bull boxers, bandogues e buldogues tendem a ter tal nível bem mais elevado do que as demais raças e maior capacidade, principalmente em nível físico, de não perceber ou superar a pressão. 009 - DEFESA PARA RAPINA: Para isso é necessário que o cão tenha um bom drive de defesa, mas não apresente bom drive de rapina. Mais difícil do que partir da rapina para a defesa. O treinamento consiste em desafiar ou provocar o cão e, em seguida, fugir deste em cada investida dada por ele. A limitação da obtenção do resultado será o baixo drive latente de rapina do animal. Muitos cães, após assistirem a fuga do figurante se dão por satisfeitos, e a capacidade deste em estimular o cão a persegui-lo estará limitada à disposição do cão em fazê-lo. O caminho, nesse caso, é continuar em provocações e fugas, de forma que o cão continue a investir seguidamente, até que a sucessão de investidas se torne uma perseguição. Vamos também ter que torcer para que o cão acabe por gostar do jogo e a rapina latente venha a aparecer. Para isso ela precisará existir. No entanto, ela está limitada à idade em que o cão começa o treinamento e à herança genética que o cão carrega consigo. Às vezes, a perseguição só é conseguida após despertar um verdadeiro ódio por parte do animal, o que, embora seja uma perseguição, não pode ser vista como um impulso de caça, mas como um aumento no impulso de defesa, pois decorre de uma situação anterior de defesa. Só se conseguirá tal intento com mais tempo, transformando em atividade prazerosa e não estressante a perseguição do cão ao figurante. Portanto, extrema habilidade deve-se ter para obter o comportamento de perseguição do cão ao mesmo tempo em que se consegue diminuir o nível de provocação (em última análise, o nível de estímulos negativos que devem acabar se tornando positivos). Para isso, devem ser aumentados os níveis de dopamina, como já vimos e veremos mais adiante. Na passagem da defesa para a rapina não existe praticamente uma fase mais ou menos nebulosa como na passagem da rapina para a defesa. Assim como uma rapina muito elevada pode até atrapalhar a instalação da defesa pelo fato do cão não sentir qualquer desconforto ou ameaça na pressão exercida sobre ele, conforme foi visto no item “007 - RAPINA PARA A LUTA E O DRIVE DEFESA”, a defesa tem que existir, mas se abrandar muito rapidamente para que a rapina se instale, e isso talvez seja a causa da maior dificuldade da transformação. Isso porque os

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mecanismos para a luta ou fuga – inclusive elevação de noradrenalina e adrenalina - não podem estar presentes de forma importante para que se desperte o drive de rapina e esses níveis, uma vez existentes, não diminuem rapidamente. Lembremos que essas catecolaminas inibem os mecanismos digestivos, inclusive a fome, e a adrenalina e a noradrenalina podem inibir o desejo de caça e até mesmo as suas simulações. A defesa, associada ao instinto de sobrevivência mais urgente, tende a inibir outros instintos. E a rapina parte do pressuposto de ausência ou quase ausência de medo ou qualquer tensão emocional negativa. No caso oposto, na passagem da rapina para defesa, estimula-se até o nível desejado – e com habilidade podemos controlar tal nível - modulando o castigo e a conseqüente exacerbação adrenérgica. É claro que um cão que já tenha praticado a rapina, não terá dificuldade alguma de passar da defesa para a rapina ou até a uma situação a qual não possamos bem definir. Mas não é a isso que estamos nos referindo. Sim, de despertar drives de rapina não revelados através de um drive alto de defesa. Tarefa difícil para bons adestradores e quase impossível para principiantes. Pode ser surpreendentemente fácil, caso exista um bom drive de rapina latente ainda não despertado, coisa pouco comum em um cão que já tenha uma boa defesa, o mais provável é que nesse cão a rapina já houvesse emergido. Mas, devemos tentar, muitas vezes conseguimos e o instrumento técnico mais eficaz é o chamado círculo de pressão e alívio, como veremos adiante. Do ponto de vista etológico, equivaleria à improvável situação da caça perceber ser mais forte que o predador e fazer deste sua presa. Nosso cão, neste caso, equivale à presa que contra-ataca, e a situação de presa é sempre uma situação desfavorável e assustadora. Por isso, a pressão sobre a defesa deve ser tênue para que não sejam liberadas grandes quantidades de noradrenalina e de adrenalina e a defesa obtida não seja de muita intensidade, nem mesmo moderada, mas de baixa intensidade. Na natureza, embora rara situação em mamíferos, uma vez ocorrida (de o atacante ser mais fraco), é de mais difícil de ocorrer, pois o instinto predador está mais ligado à fome e à alimentação, que por mais vitais que sejam, sempre serão numa medida de menor prioridade do que fugir de um ataque potencialmente mortal e iminente. Portanto, deve haver a distinção entre levantar a defesa, mas não provocar o medo ou o desconforto em nível considerável. A vantagem do círculo de pressão e alívio, que veremos posteriormente, é poder modular praticamente no mesmo momento os estímulos de defesa e de rapina. Lembramos, apenas por curiosidade, que o sistema simpático, responsável pela descarga das supracitadas catecolaminas no organismo, só existe nos vertebrados, bem como o sistema parassimpático. Mas, a defesa não existe somente na situação de se considerar presa. Ela existe também na situação de defesa de terceiros (filhotes, dono, território, etc.), e um cão com boa defesa é aquele que se coloca em alta defesa sem sentir medo ou mesmo ameaça contra si. Em cães que realmente tenham um alto drive de defesa, incrementar o drive de rapina não é tão difícil. Já na situação de pré-fuga (da defesa em nível de pré-fuga) isso será praticamente impossível no curto prazo e dependerá dos drives latentes de proteção (defesa e rapina). Quando iniciamos a elevação do drive de rapina de um filhote, não podemos nos esquecer que trabalhamos com o instinto ainda inicial de desenvolvimento deste drive, ou seja, na fase dos jogos e simulações que visam o aprimoramento da atividade predatória e não com ela em si, bem mais forte e diretamente relacionada à sobrevivência. Portanto, levantar a rapina através da defesa não

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é o caminho natural percorrido pelos mamíferos carnívoros e que tal tentativa preferencialmente só deve ser aplicada caso os demais recursos já tenham se esgotado. Até pode ser aplicada, sim, mas por profissionais com alta experiência através do círculo de pressão e alívio e, de preferência, com estímulo indireto (ou triangularizado) da defesa, matéria para vermos bem mais adiante. Lembramos, mais uma vez, que mesmo que o cão não apresente nenhum drive de rapina, este deverá existir com relativa intensidade, ainda que não demonstrado, na forma latente para que possa se revelar e ser desenvolvido. Do contrário, a tarefa será impossível em qualquer hipótese. Veja a comprovação prática sobre este assunto em “060 - LINGÜIÇA, COMO DEVE SER, COMO USÁ-LA E DIRECIONAR O CÃO PARA ELA”. 010 - RAPINA OU DEFESA? Um bom meio de diferenciar drive de rapina de drive de defesa é a expressão do cão. Há quem não consiga perceber pela expressão o estado emocional de um cão. Cremos que devemos aprimorar tal percepção antes de continuar qualquer trabalho como adestrador ou figurante. A fisionomia compenetrada ou alegre, abanar de cauda, manter a cauda elevada, baixar a silhueta antes do ataque, latidos mais agudos que os habituais (quando o cão está contido e querendo atacar) indicam atuação do drive de rapina. Fisionomia mais fechada e grave ou expressão de ódio, pupilas dilatadas, pêlos arrepiados, postura mais ereta com silhueta mais alta, latidos mais graves do os habituais indicam drive de defesa. A ausência de latidos não é indicador de nada, mas é mais comum na rapina do que defesa. Na situação de pré-fuga, o que, muitas vezes, é conceitualmente confundida com o cão ter um elevado drive de defesa, na medida em que muitos cães de guarda, quando acuados, mostram uma defesa insegura que precede à fuga, quase sempre, o porte da cauda torna-se baixo. Tais demonstrações, no entanto, não devem, de forma alguma, serem confundidas com um elevado drive de defesa. Vide mais sobre tal assunto no item “038 – DEFESA E FUGA”. Embora tenha sido dito que a rapina deva ser o principal drive a ser trabalhado, não devemos, de forma alguma, menosprezar a existência do drive de defesa. Sem um conveniente drive de defesa, um eficiente cão de assalto e de guarda pessoal poderá ser furtado por estranhos que se mostrem amigos. O que foi dito, é que o drive de rapina sempre deve preferencialmente ser o primeiro a ser trabalhado, mas que não é necessariamente o mais importante. Foi dito também que o drive de defesa não deve chegar ao ponto de que o cão demonstre de forma pronunciada alguns sinais de defesa que podem prenunciar uma fuga, como latidos graves, rosnados, pêlos muito arrepiados, pois esta situação já se aproxima da situação de fuga. A cauda baixa, no entanto, pronunciadamente ou não já é um indicador de pré-fuga. Como o levantamento do drive de defesa causa maior ação em neurotransmissores e hormônios de controle mais difíceis, esse só deve ser incrementado quando o cão já estiver mais seguro em relação ao ataque. Mas, é a pitada de defesa (e de raiva) incorporada a um ataque que foi moldado sobre o drive de caça que o torna mais eficiente, pois aumenta, por ação das catecolaminas, a força da mordida e sua capacidade efetiva. Muito embora drives sejam oriundos de instintos diversos e impossíveis de associar em sua essência, um mesmo comportamento ou ação pode ser estimulado com bases moldadas e imprintings formatados pelos dois principais drives, rapina e defesa.

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011 - OS CÃES DOMÉSTICOS TÊM DRIVES IGUAIS AOS LOBOS E OUTROS CARNÍVOROS? Acreditamos que não. O que significa um cão ladrar? Por que um cão ladra? Por que os cães ladram e os lobos não? Hoje se sabe que cães e lobos são uma mesma espécie animal, pois os produtos entre cães e lobos tendem sempre a originar descendentes férteis, o que os define como membros da mesma espécie. O cão foi domesticado pelo homem e selecionado morfologicamente e em comportamento de acordo com as diversas seleções que o homem fez. Nem sempre o homem agiu nesse trabalho de forma consciente, mas selecionou os cães de acordo com suas necessidades. Essas necessidades nem sempre buscaram a utilidade prática. Muitas vezes, obedeceram critérios estéticos ou que facilitassem o uso com cão como mero animal de companhia, como é o caso dos cães miniaturas. Mas, o que é certo é que o homem selecionou o cão de acordo com suas necessidades materiais ou psicológicas. Voltando a uma das perguntas do início deste item: por que os cães ladram? Esse comportamento de fazer alarde não é encontrado em nenhum outro carnívoro. Vai contra o senso prático um predador ser ruidoso. Isso espantaria as potenciais presas e atrairia para si outros predadores mais poderosos, pelo porte ou quantidade. Seria para chamar outros cães? Cremos que não. Do contrário, lobos teriam o mesmo comportamento para chamar outros lobos. A resposta, que nos parece óbvia, é que os cães latem para chamar seu aliado humano ou assustar seus inimigos com a possível presença humana. Isso beneficiaria o cão de várias formas. A primeira seria causar pavor em suas presas e em seus inimigos, pois – gerações a gerações, os animais aprenderam que onde escutasse latidos de cães, o homem estaria por perto e aprenderam também que o homem é o mais terrível predador, pois usa armas, redes, etc. Qualquer outro carnívoro, exceto em situação de extrema necessidade, irá fugir ao ouvir latidos. Isso protege os cães. É um aviso como o chacoalhar da cauda da cascavel. Um aviso que evita perigosos confrontos. Pelo lado do homem, isso também é benéfico. Pois outra utilidade do ladrar é chamar o homem para onde está a caça ou mostrar a ele onde estão seus inimigos. Em meio à mata, é mais rápido seguir sons do que rastros. A caça encurralada poderá ser abatida pelo homem se o cão já não o tiver feito. Caças grandes seriam difíceis de serem abatidas rapidamente por dentes de cães. Isso poderia ser demorado, desgastante ou, até, impossível. Com isso, cães e homens comem as mesmas presas que juntos caçaram. Ambos se beneficiam, pois o homem não teria velocidade nem faro para alcançar as presas. Seria facilmente emboscado por outros carnívoros sem os seus cães a seu lado para avisarem de presenças ameaçadoras e lhe darem o alarme latindo. Talvez, o homem tenha perdido muito de seu faro durante os últimos milênios por não precisar dele, por ter junto de si o mais eficiente faro dos cães, e este faro ajudou em muito ao homem a localizar inimigos e presas. Com o tempo, o cão aprendeu a latir quando percebia a presença de homens estranhos e avisar seus parceiros humanos. Aprendeu também a atacar homens estranhos. Cães e homens firmaram alianças mais sólidas do que homens com homens e do que cães com cães. Ambos combatiam, lado a lado, os de suas próprias espécies. Assim, nasceram os primeiros cães de guarda e os primeiros cães de guerra. Aonde queremos chegar ao perguntar por que os cães latem? A resposta parecerá óbvia depois de respondida. A razão dessa pergunta é deixar claro que cães têm comportamento muito

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modificado em função de sua convivência com o homem. Talvez muito mais do que muitos imaginem ao comparar drives de animais selvagens a drives de cães domésticos. Embora os impulsos originais sejam os mesmos, cães fazem o que mais nenhum outro carnívoro faz: trabalho de guarda, o que não pode ser confundido simplesmente com defesa pura e simples nem com rapina pura e simples. Na guarda, rapina e defesa se confundem em um bom cão. Apenas um cão temeroso trabalhará estritamente em defesa, e somente um cão muito inocente trabalhará estritamente em caça. Isso porque um bom cão tem prazer em realizar a proteção, e isso lhe traz desejo de caça, ou seja, lhe fará despertar o drive de rapina. E também porque um cão bem treinado não perseguirá a presa sem esperar revide, e isso lhe despertará o drive de defesa. Só atacará sem demonstrar nenhuma defesa um cão que nunca tenha sentido o rigor do bastão ou da vara. Ou seja, um cão não bem testado e em quem não podemos cegamente confiar. Note que colocamos na frase anterior “em quem”. Claro, pois como disse um iminente filósofo e político da história recente do Brasil: “O cão é uma pessoa como qualquer outra”. E eu lhe dou plena razão. Tal frase não foi dita em rebate às acusações de ter usado carro público para levar sua cadela ao veterinário? E o carro oficial não era de representação e estava a serviço da família? E a cadela não fazia parte da família? O que há de errado afinal além do preconceito? Muitas vezes, o problema a ser tratado está na mente e na hipocrisia de quem os acha. Essa é a regra geral na vida. Quanto à frase, ela foi perfeita. Voltando ao assunto, pode-se, sim, perceber, como veremos adiante, qual drive é o dominante (e o drive de luta significa simplesmente é a situação em isso não pode ser estabelecido). Mas, dizer que drive de rapina e de defesa não se misturam seria tentar colocar cães como animais selvagens. Apenas se defendem ou caçam. Situações totalmente diferentes e orientadas por estímulos totalmente diversos. Animais selvagens não foram selecionados pelo homem para fazerem guarda. Cães o foram. Adiante, veremos que mesmo animais selvagens também, em muitas ocasiões, podem sobrepor drives, Vide: “037 - LUTA. CONDIÇÃO INTERATIVA ENTRE RAPINA E DEFESA? MORDIDAS ASSOCIADAS AOS NÍVEIS DE DRIVES” e em “060 - LINGÜIÇA, COMO DEVE SER, COMO USÁ-LA E DIRECIONAR O CÃO PARA ELA”. 012 - DRIVE ATUAL, DRIVE LATENTE E DRIVE POTENCIAL – ELASTICIDADE DE DRIVE: Em todos os drives, que existam ou que possamos imaginar, há o quanto um cão pode demonstrar em determinado momento e a quanto esse mesmo drive pode chegar, dado os métodos, o empenho e a competência de treinamento. Ao drive que o cão apresenta em determinado momento chamaremos de “drive atual” e ao quanto um cão poderá chegar, tendo em vista competência e empenho máximos, chamaremos de “drive potencial”. É óbvio, que no que diz respeito ao drive potencial, em verdade, é só uma projeção de quanto um cão poderá chegar ou poderia ter chegado em um determinado drive. É algo que só podemos mensurar de forma hipotética. Mas, isso não significa que não possamos realizar previsões aproximadas – satisfatórias ou não – sobre o potencial de um cão ter a capacidade de aumentar um determinado drive. Por parte de quem realiza tal previsão, o necessário é sensibilidade ao analisar o cão; experiência em outros casos, e conhecimento sobre a raça, a linhagem e sobre o melhor método a ser aplicado. Existem alguns testes, como o de Volhard, que visam ter uma aproximação do que poderá vir a ser um determinado cão no futuro. Criadores e adestradores experientes têm tal visão mesmo sem

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aplicar nenhum teste objetivo, apenas observando o filhote em seu ambiente. Em relação ao que já foi feito, o drive atual e o drive potencial dependem da raça, da linhagem e do exemplar em si, no que tange à sua carga genética, e às experiências de filhotes - incluindo os imprintings formatados pelo adestramento e traumas sofridos para definir aquilo que chamamos temperamento do cão. Além disso, das experiências vivenciadas pelo cão adulto no que diz respeito a seu caráter. As condições de saúde, passadas e presentes, a alimentação, o preparo físico também são variáveis que influem no drive existente e no drive potencial de um cão. É óbvio que o drive potencial tem dependência em relação ao atual, isto é, ao que se apresenta no momento presente. Exemplificando, muitas vezes, não se pode esperar o mesmo drive potencial de um cão que passou por uma importante experiência traumática em relação a esse mesmo cão caso não tivesse passado por esse mesmo trauma. Traumas psíquicos tendem a baixar tanto o drive atual quanto o drive potencial. E o quanto um determinado acontecimento traumático irá influir em um determinado drive, irá variar de acordo com as demais experiências passadas e com a genética do cão, em outras palavras, também irá depender dos drives subordinados à genética. Paradoxalmente, o que pode vir a diminuir um dado tipo de drive em um cão, pode vir até a incrementar esse mesmo tipo de drive em outro cão, dependendo de diversos fatores genéticos e das experiências ambientais passadas, incluindo entre elas o treinamento já realizado. O que pode vir a ser um trauma para um cão despreparado pode (ou não) vir a ser um incentivo para outro cão com prévio treinamento. Só para clarificar, “tipo de drive” referido neste parágrafo diz respeito a se é drive de rapina, drive de defesa, etc. Em relação ao futuro, a elevação de um drive até o ponto máximo em que isso é possível (que é a definição de drive potencial) depende das condições futuras nas quais se manterá o cão, de saúde e alimentação; do modo como o cão é tratado pelos seus donos; da competência do adestrador de escolher e planejar o melhor caminho para tal elevação e da competência de lida do adestrador e do figurante. Um fator importante que muitas vezes é negligenciado é o preparo físico. Um cão com boa capacidade aeróbica, por exemplo, suporta muito mais um treinamento e se cansa muito menos, e o fator cansaço, sem qualquer dúvida, limita a capacidade de um cão durante os treinos e, conseqüentemente, a evolução de seus drives. Um cão que se cansa nos treinos não tem prazer em realizá-lo, e a atividade prazerosa deve ser a viga mestra de um bom treinamento. O drive potencial é o máximo a que um cão pode chegar a partir do drive atual. Se um cão for conduzido com competência máxima, podemos dizer que o drive futuro será o mesmo que o drive potencial. Em outras palavras, o drive potencial ao longo do tempo pode se manter – no caso do treinamento e as condições sejam os melhores possíveis – ou declinar a cada oportunidade desperdiçada, a cada erro no treinamento ao longo do tempo, a cada piora das condições de manutenção do animal. Resumindo, drive potencial que podemos prever para um cão depende de sua raça, da sua linhagem e das peculiaridades temperamentais de cada exemplar e dos fatores ambientais aos quais cada exemplar está sujeito, bem como dos traumas e outras experiências já vivenciadas pelo cão, quer positivas, quer negativas. Depende também do drive atual. Pode não parecer relevante, mas é muito importante o conhecimento do potencial de aumento dos drives de um cão. Isso jamais pode ser tentado sem ver e analisar cada exemplar ou, pelo menos,

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ter uma descrição detalhada sobre seu comportamento e genética. O conhecimento da potencialidade de um determinado cão é fator que pode ajudar na escolha do método a ser adotado e é fator para saber se vale a pena, ou não, investir em um determinado treinamento para esse cão. Como nosso método é interativo, não fará tanta diferença no momento exato dos treinos em si, mas fará alguma diferença sobre a decisão de tentar seguir mais rapidamente ou esperar mais antes de tentar uma progressão na pressão por exemplo. Embora sempre devamos ter a consciência de que cada exemplar é um exemplar, a raça e a linhagem do cão são parâmetros que ajudam muito para fazer uma previsão razoável, pois indicam, em última análise, como os ancestrais do exemplar foram selecionados até chegar a ele. Assim sendo, é válido dizer que certas raças têm maior potencial para aumentar um determinado drive do que outra. De um modo geral, isso é claro. Por exemplo, alguns cães ainda virgens em treinamento têm um drive razoável de defesa ou de rapina, mas por mais que se faça não se conseguirá que tais cães aumentem muito tais drives. Outros têm esse drive quase inexistente, mas têm potencial enorme de incrementá-lo, podendo ultrapassar e muito, cães que apresentam maiores drives, mesmo que estes ainda estejam sendo trabalhados com máxima eficiência. Podemos dizer que muitas raças apresentam drive de defesa muito variável, de indivíduo para indivíduo, antes de o cão ser trabalhado para proteção. Em indivíduos diferentes, tal variação pode ser muito mais dependente da criação que recebeu até o momento no qual que se analisa o exemplar do que da genética. Tal fato ocorre quão mais ambiente-dependente for uma determinada raça ou linhagem ou, ainda, cada exemplar. Essa característica de elasticidade dos drives de proteção é muito comum em cães que descendam de bull and terriers, como o dogue brasileiro, os bandogues e outras raças de guarda que tiveram bull and terriers em sua formação. A razão disso é a facilidade de deslocar para a guarda impulsos utilizados na caça e na luta entre cães. A essa característica de poder aumentar um drive, chamamos de elasticidade de drive. Ao fato do drive de um cão ser dependente da sua criação pode-se chamar de criação-dependente, dono-dependente, treinamento-dependente, ambiente-dependente, etc. É inerente, que cães mais ambiente-dependentes, para certo drive, têm maior elasticidade neste mesmo drive. Via de regra, o drive de defesa é muito mais elástico do que o de rapina. Além disso, a elasticidade do drive de rapina tende a baixar muito em relação à idade, principalmente da infância até a fase adulta e quando o cão chega à velhice. Diminui bem mais lentamente durante a fase adulta. A elasticidade, além de estar ligada à raça, à linhagem e ao exemplar, bem como aos traumas sofridos, está altamente ligada à idade do cão. Traumas e idade mais avançada são fatores sempre negativos na elasticidade de um drive, principalmente no que se refere ao drive de rapina. O drive de defesa está bem menos sujeito à idade do cão do que o de rapina. Por isso que em cães mais velhos, por vezes, iniciar pela defesa o trabalho de guarda é a única alternativa viável, embora saibamos que não seja a melhor. A elasticidade diminui conforme a idade aumenta. Principalmente na fase que engloba a infância e a juventude e na fase da senilidade. Períodos que coincidentemente ocorrem perdas de sinapses e de neurônios respectivamente em humanos. Não há motivos para crer que em cães seja diferente.

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Relembramos o que dissemos anteriormente, dia a dia, pesquisa a pesquisa, a ciência demonstra que não há diferenças neuronais tão importantes, como alguns imaginavam, entre os mamíferos. Alguns outros conceitos sobre drives que empregamos na cinofilia de proteção pertinentes ao assunto, todos cedidos pelo Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos: DRIVE LATENTE - É qualquer intensidade ou nível de um determinado drive que ainda não se manifestou, mas que é possível de vir a se manifestar (drive atual + drive latente = drive potencial). DRIVE PROXIMAL - É qualquer drive que possa vir a se manifestar em um cão a partir de uma determinada etapa de sua evolução. Faz parte do Drive Latente. DRIVE MARGINAL – É a parte do drive latente que poderá se manifestar ao mínimo estímulo, no momento seguinte ao qual estamos. DRIVE POTENCIAL - É a referência máxima a que um cão no presente pode chegar a um determinado momento no futuro a um determinado drive (rapina, defesa, etc.). Depende da genética e das experiências dos indivíduos (traumas, estímulos anteriores, etc.), ou seja, depende do drive atual ou, mais precisamente, do drive latente e do tempo disponível para que o desenvolvimento possa ocorrer. O drive potencial tende a baixar, caso não seja estimulado no tempo certo ou caso o cão sofra traumas ou treinamentos inadequados. Nunca irá aumentar com a idade, sempre deverá se manter ou diminuir. Um cão bem treinado, no momento máximo de sua evolução, terá o drive atual e o drive potencial quando do início do treinamento bem próximos. DRIVE POTENCIAL ABSOLUTO - É o ponto máximo que pode chegar um determinado drive durante toda a vida de um cão. Isto é, se desde o início de seu desenvolvimento, o meio-ambiente colaborar maximamente com o incremento de tal drive. Só pode ser projetado hipoteticamente para um cão que acabou de ser gerado, tendo em vista que a partir da concepção já ocorrem influências do meio-ambiente. Dada uma determinada herança genética, seria o nível utópico a ser conseguido, a partir da concepção se tudo no ambiente, inclusive o treinamento for maximizado favoravelmente. O drive potencial relativo é o ponto máximo a que um cão pode chegar em cada fase de seu desenvolvimento futuro, dado o drive atual, significa o mesmo que drive proximal. De qualquer forma, o drive potencial depende da melhor aplicação possível do treinamento e de outros fatores ambientais a virem a ser aplicadas. Já o drive latente se refere ao conjunto de um determinado drive que já existe, mas que ainda não foi manifestado (drive atual + drive latente = drive potencial). Poder-se-ia dizer que o drive marginal é aquele que se demonstrará excitado por um único estímulo adicional, de imediato. Como exemplo, podemos citar um cão que nunca demonstre qualquer instinto de proteção, mas que após uma mínima provocação passe a atacar de imediato e que, a partir daí, mantenha essa atitude. Outro exemplo seria o do cão que, após alguns treinos sem grandes resultados repentinamente tem um determinado drive demonstrado. Outro exemplo ainda, seria o do cão que está em progressivo incremento de seus drives e que em um determinado momento continua sua progressão. Em resumo, drive marginal é qualquer aumento que está prestes a ocorrer em um determinado drive, ou pelo aumento da intensidade em um determinado nível deste drive ou pela progressão de um nível para outro superior no mesmo drive. 013 - APTIDÃO PARA GUARDA - RAÇA: Infelizmente, haverá sempre casos, principalmente em função das degenerações que muitas raças têm sofrido, de animais que já nascem totalmente

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inaptos para tal tarefa de guarda. As causas e conseqüências são analisadas em outros capítulos. Raças novas, como o Dogue Brasileiro, o Donovan Pinscher e o Canis Panther, estão, sem nenhuma dúvida, entre as de maior aproveitamento dentre as bem mais de mil existentes, tanto registradas pela FCI, quanto ainda sem tal registro. Por um lado, as raças novas ainda não conseguiram o grau de evolução ainda a ser atingido (desde que se mantenha o paradigma efetivo). Por outro lado, também na foram expostas (cabe orar e vigiar para que não sejam) às degenerações decorativas. Algumas raças mais antigas como o Afrikan Boerboel conseguem manter sua efetividade de guarda, ainda que mais sujeitas a degenerações por criadores decorativos e comerciais que utilizam os tradicionais nomes dessas raças para fins de comércio ou de fútil promoção pessoal. A FCI já ingeriu negativamente sobre o temperamento desses cães, considerados “brabos demais” por algumas dondocas. Parece que ficar fora da funesta ‘cinofilia oficial’ é a única forma, atualmente, de manter qualidades efetivas das raças de guarda. O sucesso de novas raças que se formaram com a cruza de bull and terriers com raças de guarda tradicionais está no alto drive potencial de rapina dos bull and terriers, além de sua coragem intrínseca e disposição para a luta (drive de luta). No caso do dogue brasileiro, é esclarecida a proposta de efetividade a cada adquirente destas raças e ocorre a negação de venda por parte de muitos criadores para adquirentes que não usem a raça cumulativamente para guarda e companhia. Tal esclarecimento é fundamental para a manutenção do que chamamos de paradigma funcional e deveria ser realizado em todas as raças cujos criadores desejem manter a funcionalidade. Vejamos sobre paradigma funcional no Dicionário de Cinologia e Termos Correlatos: PARADIGMA FUNCIONAL – Refere um grupo, uma raça, uma linhagem, uma família ou um agrupamento de cães ser criado, selecionado e treinado, na grande maioria de seus membros, para uma mesma função ou atividade, bem como buscando um mesmo tipo de temperamento, caráter e comportamento. Impossível manter uniformidade satisfatória em um conjunto de cães sem que haja respeito a um Paradigma Funcional em sua seleção e treinamento. De um modo geral, os preceitos de adestramento para todas as raças são os mesmos, embora, é claro, algumas tenham qualidades inatas específicas muito superiores a outras. Em algumas raças, poderemos encontrar maior coragem, em outras, maior obediência, etc. O que podemos notar é que existem raças mais contidas, introvertidas se preferirmos o termo, como os mastins, o rottweiler, o fila brasileiro, enquanto que outras, como os bull & terriers, o dobermann, o pastor alemão, os pastores belgas, temos uma personalidade mais extrovertida. Dessas, algumas, como os bull & terriers e o pastor de Malinois, têm um maior gameness*. Embora as técnicas de adestramento possam ser as mesmas, em alguns cães teremos maior necessidade de enfatizar mais certos aprendizados do que com outros. Isso é fundamental, mas esquecido por muitos adestradores. Para entender tais diferenças com mais profundidade é preciso primeiramente que seja compreendido o conceito de drive (o que é feito exaustivamente nesse trabalho), bem como, e principalmente, entendido que cada cão é um cão, uma criatura viva e única que não pode ser rotulada ou estereotipada pela raça a qual pertence. Nosso método adapta-se automaticamente às peculiaridades de cada cão, mas é preciso que enxerguemos tais peculiaridades. * Gameness, palavra inglesa sem tradução ideal para o português, que no caso significaria disposição, poder físico e determinação psíquica, poder de explosão, etc. Os cães como bandogs, bull boxers, etc., que têm bull and terriers e raças tradicionais de guarda em sua genética, os enquadraríamos como intermediários entre estes dois grupos e

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entendemos estarem entre os melhores, senão os melhores, para a atividade de guarda efetiva, quando fatores como resistência à dor, drives elevados, etc. devam estar presentes. Embora não possamos contar sempre com isso, muitos casos já aconteceram de cães destas raças se tornaram bons guardiões mesmo tendo se iniciado o trabalho para tal após os três anos de idade ou mesmo sem trabalho algum. Ano a ano, pela seleção e técnicas de manejo, a tendência é continuar a conseguir filhotes com maior propensão a terem bons drives de defesa e de rapina, tanto do ponto de vista genético quando de desenvolvimento dos drives pela maior aptidão em dos criadores lidarem com eles. Uma cadela da raça dogue brasileiro, que sem nenhum treinamento inicial, após trocar de dono, obteve classificação máxima no ataque, já aos nove anos de idade, mas, é claro, que não podemos contar com isso para a maioria dos cães, desta ou de qualquer outra raça. Deve-se salientar que um cão que não tenha conhecido brutalidades e tenha sido bem tratado e com uma boa herança genética, não será, em momento algum, difícil iniciar seu treinamento até os quatro, cinco anos de idade. No entanto, dificilmente obteremos deste animal algo tão bom quanto o que ele mesmo seria se o treinamento se iniciasse na época correta. A razão disso é a diminuição permanente dos drives potenciais, caso os drives não sejam trabalhados ao longo do tempo. No passado, insucessos em muitas raças foram constatados no treinamento de cães de alta intensidade de rapina por adestradores experientes com raças cujo trabalho de guarda baseava-se mais no trabalho de defesa, sobretudo aqueles que insistiam nos preceitos tradicionais e mantinham uma visão míope da psique canina e treinavam qualquer cão com o mesmo método inflexível voltados a cães com mais baixos drives de caça. Hoje em dia, quase qualquer adestrador sabe como lidar com cães de maior rapina e os preferem aos demais. Treinar um bandogue, por exemplo, para a guarda efetiva é algo relativamente fácil desde que se use um método próprio ou, preferencialmente, um método único, mas flexível e inteligente, como é a proposição deste livro. Não advogamos, de modo algum, um treinamento especial para nenhuma raça ou tipo de cão. Quando começamos,lá por mil novecentos e antigamente, tentamos realizar um treinamento específico para cães de alta intensidade de rapina. Depois, percebemos que não podemos prever os drives de nenhum cão baseado na sua raça. Por fim, comparando métodos, percebemos da necessidade da existência de um único método adaptável a qualquer tipo de cão, baseado nos conceitos básicos de etologia canina e na condução racional dos diferentes drives, independente da raça de cada canino. Um treinamento único que possa ser empregado para qualquer raça de cão, bem como às peculiaridades de cada exemplar. Pois é, já escrevíamos sobre nossos métodos de adestramento de cães de elevada rapina, o que só era feito mirando a cinofilia esportiva, quando percebemos que qualquer método é incompleto se não for elaborado para todos os tipos de cães que almejem a condição de guarda, para qualquer tipo de guarda ou de esporte. Sempre haverá aquele que o método específico empregado irá penalizar e que poderia vir a ser um cão de qualidade. Um bull and terrier provavelmente deverá ser treinado de modo diferente de um pastor alemão, por exemplo. Mas, isso não se deve em função simplesmente de serem de raças diferentes, mas em função das diferenças raciais, oriundas, sobretudo de diferentes seleções temperamentais, provavelmente conduzirem a equilíbrios diversos entre os drives dos dois cães. A aplicação correta do método não leva em conta a raça do animal. O que é provável que aconteça é que cães de raças diferentes tenham maiores chances de terem equilíbrio de drives diferentes e, conseqüentemente,

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respostas e conseqüentes aplicações mais variadas pelo mesmo método do que cães da mesma raça. Mas, há numerosas exceções. Muitos cães de boa qualidade, em função de terem equilíbrio de drives diverso da maioria dos demais animais de sua raça, são treinados de forma equivocada e considerados de má qualidade e descartados, quando, em verdade, não tiveram um treinamento que se adéqua-se a eles. Em verdade, o problema muitas vezes se deve à falta de percepção por parte do adestrador ou do figurante ou falta de capacidade ou falta de vontade desses em variar o método. Por isso, criamos um método que automaticamente interage com as qualidades de qualquer cão. Se o cão tiver um mínimo de capacidade poderá evoluir. Compreendê-lo, no entanto, exige o uso da capacidade intelectual do aprendiz. Mas, depois de compreendido, será muito mais fácil adestrar qualquer cão. A aptidão de poder vir a adestrar qualquer cão adestrável para uma determinada função, independente da raça ou tipo de personalidade específica de cada exemplar, baseia-se na visão mais abrangente e única da psique canina em relação ao trabalho de guarda. Permitir que indivíduos com características diversas em relação às índoles de suas raças tenham seus treinamentos realizados naturalmente da forma correta e específica, uma vez que um bom método não incorpora pré-julgamentos sobre as condições e potenciais do cão, mas automaticamente encontra o melhor caminho para adestrar cada cão. O começo é sempre o mesmo: incrementando a rapina com brincadeiras em nível de fair play; procurando já despertar um drive de defesa de qualidade através da triangularização da defesa, técnica exclusiva da escola efetiva já comentada anteriormente; dando os limites. Bem, veremos depois sobre tudo isso. 014 - APTIDÃO PARA GUARDA – MANEJO DOS FILHOTES FORA DOS TREINAMENTOS: Outra razão que pode vir inviabilizar um cão para guarda é o exagero das repreensões por parte do dono ou qualquer outra pessoa da casa, em relação às travessuras do animal quando filhote. É preferível, nos momentos de impaciência, nos afastar de nossos cães quando estamos de mau humor, pois na sua educação devemos colocar muito mais amor do que energia e toda energia necessária deve ser serena. Certamente, um filhote não irá compreender que alguma violência cometida contra ele deve-se apenas a uma pequena crise nervosa de seu dono que logo irá passar... Traumas adquiridos quando filhote dificilmente serão superados por toda a vida do cão. Até certa idade, o cão não discrimina bem os de casa dos demais, se sofrer, nesse período, algum castigo exagerado provavelmente aprenderá a temer todo ser humano, tornando-se, então, no futuro, inútil para a guarda ou ficar muito aquém do que poderia. Filhotes que deverão ser futuros guardas deverão ser colocados onde possam ver pessoas estranhas, de preferência a uma distância de mais de sete metros para que se acostumem e não se assustem com estranhos, mas que, ao mesmo tempo, não interajam amistosamente com pessoas que não façam parte de suas relações. O método aplicado na cinofilia efetiva para levantar a defesa dos filhotes é quando esses possam ficar, de preferência, com a mãe ou com uma outra cadela. Ele foi batizado de “triangularização da defesa” e, se bem aplicado, não incorrerá em risco de criar uma defesa de má qualidade, mesmo implantado precocemente. É o único método capaz disso. Sobre ele, pode-se ler em “121 - COMO

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DESENVOLVER O POTENCIAL DE PROTEÇÃO”. Mas, o filhote poderá estar sem a companhia de cão adulto (leiam no item supra citado sobre o grande perigo de fazer antes de realizar). Pode ser, também, que queiramos ver como demonstra só como está seu incipiente drive de defesa. Nesse caso, alguma provocação realizada à distância, de forma branda, é aconselhável. Tal provocação não deverá ser feita no sentido de desenvolver precocemente a defesa antes da caça estar bem desenvolvida, mas sim, justamente, de incrementar a caça e, por isso, é precisa ser feita à distância. Portanto, procedimentos realizados próximos do filhote, como batidas com pé no chão, batidas com bastão no chão ou na grade, ameaças de um modo geral, deverão ser evitados. O que poderá ser feito nesse sentido será o olhar fixo nos olhos do cão como forma de desafiá-lo sem assustá-lo, por pessoa, que de forma alguma, manipule ou agrade o filhote, antes ou depois de tal procedimento. Mas, esse tipo de provocação deverá ser suspendida de imediato caso percebamos não trazer qualquer efeito ao animal, pois provavelmente ainda o cão não está pronto para tal tipo de provocação e não deverá se acostumar a ela sem que esteja apto a reagir. Aliás, nenhuma provocação deve ser aplicada com insistência caso ainda não seja o momento. Isso banalizaria o estímulo antes mesmo que pudesse ser usado. Insistir só irá trazer um efeito inverso ao desejado, pois, ao invés de excitar o animal, irá acostumá-lo a ser provocado sem que reaja. Já, para despertar a caça, bastará que os estranhos sempre mantenham o olhar nos filhotes, e se estes estiverem em grupo, melhor, com os dedos crispados, sem nunca se movimentar em direção ao cão, mas sempre perpendicularmente à linha reta imaginária que une tais pessoas ao cão. A distância mínima inicial deve ser de uns quatro metros e não deve ultrapassar a um metro e meio. Esconderem-se para atiçar desse modo o instinto de caça, dar pequenas corridas estereotipadas, como personagens de desenho animado, são estímulos positivos que irão aguçar o interesse dos filhotes por estranhos no sentido de levantar sobre eles seus drives de rapina. Mas, sempre só após que percebamos reação positiva do filhote logo de início. Do contrário, suspendamos tudo e afastemos de imediato o estranho de perto do filhote. 015 - SOCIALIZAÇÃO: Sobre esse item citemos novamente o “Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos”: SOCIALIZAÇÃO – (1) É o ato de acostumar cães a conviver com outros animais, outros cães ou pessoas. É desejável a todos os tipos de cães, nas raças de trabalho, à exceção dos Guardiões, socializar os cães com pessoas, ainda que, por outro lado, possam ser ensinados para que, se necessário for, defendam o dono contra elas. Sempre é interessante, mesmo para os Guardiões, no nosso ponto de vista, que os cães sejam socializados com outros cães e outros animais. (2) Na cinofilia, o termo “socialização” é empregado geralmente sem o sentido de aproximação social, formação de amizade ou aceitação, conforme o significado do item (1) deste verbete, o que pode ou não, ocorrer. Refere-se simplesmente a acostumar o cão com todas as acontecimentos, pessoas, animais e coisas que poderá encontrar, conforme ambientes e situações em que o cão deverá ser empregado, a fim de que não se torne inseguro ou temeroso em relação a elas no futuro. Todos os cães precisam de tal “socialização”, mesmo os guardiões mais radicais. Socializar, nesse sentido é acostumar o cão à presença de estranhos, ainda que o estimulando ao ataque. É acostumar o cão com veículos; animais; barulho de trânsito, de arma de fogo, etc. A Socialização, neste sentido, deverá ser realizada de acordo com as necessidades e emprego de cada exemplar. Para efeito de

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não gerar confusões na terminologia, o ideal é que utilizemos, em lugar de SOCIALIZAÇÃO (2), o termo HABITUAÇÃO. Vide: AMBIENTALIZAÇÃO. Observe que o significado do item (1) do verbete recém citado poderá estar incluso no significado mais amplo do item (2) desse mesmo verbete. Afinal, existem várias formas de acostumar cães com pessoas, que podem variar entre ser amigável com elas, ser indiferente a elas ou até atacá-las, ou mesmo fazer tanto uma coisa como outra, dependendo da situação e do comportamento destas, bem como do comando do dono. Este é o comportamento correto de um cão protetor e as variações mais interessantes ficam a critério do gosto do dono, da personalidade do cão e dos ambientes onde o cão freqüentará. Como veremos mais adiante na classificação dos tipos de cães de guarda, conforme funcionalidade específica, um cão protetor de pessoas precisa acompanhá-las a locais onde transitem outras pessoas estranhas e precisará aprender tanto a ser indiferente a estas como a atacá-las se necessário. Já um cão que exerça função de guardião de propriedade, de preferência, não deverá tolerar estranhos. Outros, adiante definidos como guardiões-protetores, deverão ser socializados no sentido de tolerarem estranhos apenas na presença e concordância de pessoa da casa, mas se manterem muito reservados em relação a eles. Um cão protetor, ou guarda-costas, que vá acompanhar seu dono em ambientes urbanos, precisará estar acostumado à presença de veículos de aglomerações de pessoas, à presença de outros cães, etc. Este mesmo cão, caso precise acompanhar seu dono à zona rural, necessitará de se socializar com cães, vacas, cavalos, galinhas, ovelhas, etc. A falta de um trabalho de habituação (preferimos esse termo, é mais específico), neste sentido, poderá fazer com que o cão ataque, de forma indesejada, outro animal, outro cão ou pessoa, bem como poderá fazer com que se apavore e perca o controle ao ver um cavalo, um veículo ou até mesmo uma pessoa estranha. Poderá também se apavorar ao ouvir um som estranho, um jato d’água, fumaça, alterações no piso, etc. Para habitualizar um cão a qualquer elemento, seja objeto, pessoa, animal, som ou situação, deve seu dono ou seu adestrador conduzi-lo de forma insidiosa sem jamais forçar demais qualquer aproximação. No caso de uma estrada, por exemplo, deverá ficar despreocupadamente ao lado do cão sem demonstrar qualquer atenção a tal estrada. Ficar inicialmente a uma distância relativamente grande até que o cão se acostume com o barulho dos veículos e, gradativamente, diminuir tal distância. O mesmo deverá fazer em relação a qualquer insegurança que perceba sentir no cão em relação a qualquer outro fator, sempre começar a uma distância maior, com um som menor, ou seja, sempre acostumar, aos poucos, o animal ao fator que este mostra medo ou agressividade. Outra conduta importante é procurar, o condutor, não mostrar atenção a tal fator. Em relação a sons, como estampidos, bombas, rojões existem até gravações que vão aumentando gradativamente a intensidade do som, específicas para esse trabalho. Pode-se, no caso de bombas, explodir bombas a distância maiores e ir, gradativamente, diminuindo tal distância e, conseqüentemente, aumentar gradativamente o som das explosões que chega aos ouvidos dos cães.

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Acostumar gradativamente cães desde cedo em relação a futuros estressores é a técnica correta. Pode-se como reforço ainda alimentar, proceder a ações que provoquem reações positivas ao animal. Mas, nunca deve se mostrar atenção ao agente nem dar atenção excessiva ao cão quando ele se mostrar assustado, isso pode reforçar tal atitude. 016 - CONVIVÊNCIA E TERRITORIEDADE: Nunca é demais repetir, que um cão de guarda nunca deverá passar por castigos exagerados e constrangimentos em momento algum e, principalmente, quando filhote. Outra precaução é que limitemos sua convivência apenas com as pessoas da casa, principalmente quando dentro de casa. O cão deve sentir nas pessoas estranhas algo, como o nome o diz, realmente estranho. Ao contrário, uma boa convivência com pessoas da família é conveniente. Estúpida a idéia que um cão para ser brabo deve ser isolado de todos e até ficar na corrente. A corrente, como qualquer outra tortura, torna o cão desesperado e não valente. Deixará tênue e frágil os controles psíquico, nervoso e hormonal. Poderá, em alguns casos – muito dificilmente em um bull and terrier, tornar o cão mais “brabo”. E o que os leigos entendem como “brabeza” pode não se referir à elevação de drives, mas sim à agressividade. O cão de guarda deve ser inteligente e perambular nos locais que deve guardar e neles estabelecer seus domínios. O animal afastado da convivência humana não aprenderá a conhecer o comportamento humano e, assim, discernir as situações necessárias, ou não, de defender seus donos e sua casa. Assim sendo, poderá tornar-se ineficiente ou até perigoso. Além disso, não saberá como se comportar e acabará por se tornar uma criatura inconveniente dentro de casa ou na rua. Se o filhote não for acostumado a conosco conviver desde cedo e não se acostumar desde cedo com nossos hábitos, poderá ser difícil conviver com ele quando adulto. Será, portanto, estabelecido um ciclo vicioso. Assim sendo, interessante será que o cão conviva conosco desde a mais tenra idade, fazendo realmente parte integrante da nossa família. Por que enfatizamos tanto a importância da convivência se estamos considerando apenas um animal de guarda? Por várias razões: primeira, a felicidade maior do cão está na companhia de seus donos e seus donos também devem gostar de estar com ele, desde que o cão seja bem educado. Segunda, o cão deve estar acostumado com os modos e jeitos das pessoas e da casa para saber como defendê-las e como receber comandos, estabelecendo a área de seu território. Terceira, o cão deve amar seus donos para que realmente sinta-se membro do grupo e esteja disposto a defendê-lo, para tanto, deve conviver com o grupo. A terceira razão é, de longe, a mais importante. A quarta razão decorre da terceira, um cão que ame seus donos terá um drive de defesa resoluta (ou destemida) muito maior em relação a eles, seu ataque em defesa a essas pessoas será muito mais vigoroso e eficiente. O cão que ama seus donos dará a vida para defendê-los, e, para tal, deve se sentir amado e querido. A mola que impulsiona o cão a atacar para defender, para ser eficiente, deve estar baseada, além de em drives bem formados, no amor e não no medo ou na irritabilidade. Os estranhos devem ser atacados quando invadirem o território do cão sem estarem acompanhados por seu dono, pois o cão não verá neles apenas uma ameaça para ele, cão, e para seu território, mas principalmente para seus familiares humanos. Um animal atado cruelmente a uma corrente, a quem não se dedica amor e carinho, não tem condições psicológicas, além de não estar fisicamente preparado, pela falta de exercícios, de

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exercer a função de guarda. Atacará, se for o caso, por estar nervoso e, talvez, com medo, e não o fará com inteligência e segurança, tornando-se, inclusive, por estar limitado pela corrente, pouco eficaz e alvo fácil para malfeitores. Uma vez solto da corrente, estando acostumado a ficar preso, não saberá bem o que fazer, pois não está acostumado a ficar solto. Além de tudo, se tornará emocionalmente carente, e é bem possível até que não ataque o intruso por buscar nele o carinho que não encontra em quem deveria lhe dar. Um intruso que tenha habilidade de lidar com cães terá enorme facilidade de conquistá-lo, aproveitando-se se tal fragilidade. O isolamento pode em alguns cães diminuir o drive de defesa em nível e intensidade invés de aumentá-lo. No caso específico de bull and terriers e de seus descendentes, quanto mais carinho damos ao cão, mais podemos contar com ele como cão de guarda, pois estas raças, embora extremamente valentes, são por demais afetivas não devendo, de forma alguma, para que se tenha um bom animal de guarda, ficarem privados de carinho. Aliás, nenhum cão deve sofrer tal privação. 017 - PEQUENO RESUMO DO QUE JÁ FOI DITO: A primeira coisa dita até esta parte do capítulo, e talvez a mais importante, é que a técnica não é o fator mais importante em um treinamento bem sucedido, mas a percepção dos mecanismos psicológicos de cada exemplar. Suas percepções e reações, bem como, a interatividade entre cão e adestrador. Em outras palavras, a observação e a percepção são tão ou mais importantes quanto a ação. Um método que não permita um bom nível de flexibilização, por melhor que seja em outros recursos, não será bom para todos os cães e provavelmente levará à não maximização do potencial de quase todos os cães. As elevações da auto-estima e da segurança do cão foram citadas como outros fatores básicos de sucesso. Foi dito que a base de todo adestramento é o elo positivo e afetivo entre cão e adestrador e entre cão e dono. Também foi explicado que o método é flexível e interativo e se ajusta às necessidades e qualidades de cada cão. Veremos depois que, gradativamente o cão se ajustará ao método ou, mais precisamente, o método deverá se ajustar ao cão. Então, ajusta-se o método ao cão para depois ajustar o cão ao método com o mínimo de esforço e o mínimo de conflito. Foram expostas noções teóricas rudimentares sobre neurologia e psicologia que amparam as teorias sobre os drives de proteção. Foi dada uma noção do que são drives, ou seja, que os drives são impulsos básicos advindos dos instintos. Foi discorrido sobre os principais drives usados no trabalho de guarda: de rapina e de defesa; que o drive de rapina advém do instinto de predador, e o drive de defesa do instinto de defesa, seja da necessidade de defesa própria ou da ninhada, da fêmea, da liderança, do alimento abatido, do território, do dono, etc. Foi citado que a defesa é a necessidade mais urgente do que a caça para sobrevivência do indivíduo, e que exige uma resposta fisiológica mais intensa no sentido de produção e secreção de hormônios. Intensidade, essa, que pode sobrecarregar as vias nervosas e todo o organismo, e, principalmente quando associada ao medo pode levar o indivíduo a respostas diversas das desejadas, como perda do controle emocional. Sendo a defesa uma atividade mais premente, uma vez instalada, inibe os impulsos de rapina.

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Foi dito que a defesa advém de estímulos negativos e a rapina de estímulos positivos, e que um cão treinado com base na rapina é mais confiante, feliz e confiável. Porém, foi dito também da necessidade de um cão de guarda efetivo ter um bom drive de defesa, principalmente, se for um guardião territorial. Foi acrescentado que muito embora, haja necessidade de levante do drive de defesa, até para proteção do cão contra roubo, o treinamento inicial sempre deve preferencialmente ser baseado na rapina. Também foi comentado, o que ainda não foi percebido por todo o meio cinófilo, que um mesmo comportamento pode ser impresso com base em mais de um drive, muito embora os drives basicamente se baseiem em instintos não-associáveis pela antiga teoria. Foi comentado sobre o sistema límbico e sobre as associações positivas entre as instâncias psíquicas que regem o trabalho de guarda e que permitem que o castigo inerente a tal trabalho possa ser suportado com facilidade. Para isso, o treinamento deve ser saudável com base na rapina e nos estímulos positivos, em clima descontraído e alegre. O trabalho com bastão faz aumentar o drive de defesa, mas a condição básica do treinamento deve ser baseada na rapina. Como os métodos baseados na rapina estão inicialmente calcados não na verdadeira atividade de caça, mas nos treinamentos que os carnívoros realizam como brincadeiras quando filhotes. Seu início após certa idade, que varia de cão para cão, pode ser infrutífero, pois o cão vai perdendo o ímpeto de começar a brincar, de caçar, de correr atrás de algo com o passar do tempo. No entanto, se o cão aprendeu até a idade viável gostar de tais atividades, tenderá a manter tal disposição quase até o fim de sua vida. Por outro lado, há cães cujas linhagens foram tão degeneradas pela mão humana que não possuem qualquer instinto de caça, o que torna bem mais difícil seu treinamento. Mais ainda aconteceu com relação ao drive de defesa. Foi dito e explicado que se deve ao máximo evitar expor cães, principalmente filhotes, a traumas (relembrem o que foi dito no item 006 deste capítulo referente ao aprendizado neuronal poder ser irreversível), pois isso os pode inutilizar como futuros guardas. Que os filhotes jamais devem receber repreensões exageradas por suas travessuras e que devem ser afastados de estranhos, mas não impedidos de vê-los a alguma distância. Que os filhotes podem receber pequenos estímulos provocativos como excitação por parte de terceiros, mas que tais estímulos não devem ser excessivos, para que despertem tão somente a caça e não exacerbem a defesa na tenra idade (exceto pelo método triangularizado) pelo risco de aumentar demais a noradrenalina e adrenalina, o que traria o aprendizado de um nível de defesa de pior qualidade. Também tais estímulos não devem ser exagerados, nem se deve insistir com qualquer estímulo ao qual o filhote não reaja positivamente a ele, sob pena de banalizá-lo. Foi lembrado que todo imprinting comportamental deve ser preferencialmente talhado através de estímulos positivos e, acrescentamos agora, que os estímulos negativos devem ser usados apenas como pequenos reforços no condicionamento. Foi lembrada a necessidade de o cão ser “socializado”, e que tal palavra em cinofilia, na maioria das vezes, tem um sentido apenas de acostumar o cão a coisas e situações estranhas o que não necessariamente signifique “socializar” no sentido de interagir amigavelmente com estranhos. Daí, a criação do termo “habitualizar” para melhor especificidade. Também que a forma de proceder a tal habitualização deve obedecer aos objetivos futuros que temos para o animal.

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Também foi comentado sobre a elasticidade de drive, o potencial de um cão aumentar determinado drive. E que esta tende a diminuir severamente com a idade, principalmente, nas fases entre a infância e a juventude, bem como na senilidade. Foi dito que a elasticidade depende, além da idade, da raça, linhagem e exemplar em particular. Depende da herança genética e no incorporado à personalidade do cão até o momento em que este se apresenta. Citou-se que o drive de defesa é bem mais elástico do que o de rapina e que decai muito menos com a idade. Um cão maduro tem mais chance de desenvolver defesa do que rapina. Por isso, em cães maduros, muitas vezes, só temos como recurso de treinamento de guarda elevar a defesa e fazer provocações diretamente em cima deste drive, o que não é, de forma alguma, o ideal. Por fim, foi também lembrado, que um bom cão de guarda precisa de conviver com as pessoas da família, gostar delas, conhecer suas peculiaridades; conhecer bem a propriedade que guarda, portanto, não ser mantido a maior parte do tempo preso. Que a antiga noção de que bom cão de guarda não deve receber “paparicos“ nem carinhos é totalmente divorciada da realidade. Que a amizade de seus donos e a auto-estima de um cão são os principais pré-requisitos para um bom cão de guarda. Na verdade, ainda não começamos a descrever o treinamento propriamente dito, pois estamos primeiramente ocupados, o que é muito mais importante, com a formação da personalidade do cão e com os requisitos básicos que deve ter um adestrador antes de conhecer as técnicas práticas. 018 - DEGENERAÇÕES TEMPERAMENTAIS: Geralmente queremos que um cão seja corajoso, equilibrado, não tema os humanos, nem os ataque sem necessidade, mas que seja desconfiado com estranhos e que ame e confie nos seus donos. O treinamento visa despertar no cão as qualidades que ele já possui, mas que estão adormecidas e há um tempo até o qual podemos fazer isso, pois sem que se desperte essas qualidades até um determinado tempo, elas tenderão a desaparecer. Treinar um cão que não tenha estas qualidades temperamentais latentes é como malhar em ferro frio. Quem experimento treinar lobos não teve resultados positivos, pois os lobos não foram selecionados para tanto ainda que sejam da mesma espécie que o cão. Os lobos não possuem qualidades genéticas para serem animais de guarda. Essas características são inerentes a todas as raças de guarda, que não tenham sido degeneradas geneticamente e cujo espécime não tenha sofrido traumas nem seja um infeliz fruto da variabilidade genética que por vezes a natureza produz. O enfraquecimento de tais características atingiu quase todo o universo de tais raças, o que é analisado em outros capítulos, pois a grande maioria das raças foi, através de mecanismos sociais e psicológicos da sociedade humana, mal – para não dizer pessimamente - selecionada para reprodução durante a segunda metade do século XX e assim continua sendo até agora. Quanto mais um indivíduo tiver perdido as características de guarda presentes em seus ancestrais, e isto está mais presente em certas raças do que em outras, menos instintos terá para realizar tal função e mais vulnerável estará aos traumas sofridos em seu desenvolvimento. Nas raças oriundas da Ásia Central, Europa Oriental e América do Sul, as qualidades de guarda são muito superiores do que as dos cães europeus ocidentais da atualidade. Isso não ocorreu por acaso, mas pela matriarcalização dos países da Europa Ocidental e certo desdém geral quanto aos valores efetivos dentro e fora da cinofilia, que levou a objetivos decorativos e a quebra de paradigmas de criação efetiva.

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019 - AGRESSIVIDADE E DRIVE DE DEFESA: Inúmeras são as razões que podem fazer um indivíduo “racional” atacar, como inveja, vaidade, ganância, etc. Mas os animais ditos irracionais atacam somente por medo, fome, instinto de proteção própria ou ao grupo (filhotes, fêmeas, etc. - no caso do cão, também, o dono), e, às vezes, tratando de filhotes, para aprenderem a caçar. Tudo isso, é claro, está relacionado aos conceitos de drives vistos anteriormente O cão ataca também, e isso é muito comum, por ciúmes. Este é um tipo de ataque que não deixa de ser uma derivação da defesa, ainda que com outros componentes psicológicos envolvidos. Se analisarmos o ciúme em sua essência veremos que ele é uma forma de proteger a continuidade do gen: ele protege a continuidade do gen ao impedir que outros machos copulem com a fêmea; ele protege a continuidade do gen ao impedir que o filhote seja tirado de perto da mãe; ele protege a continuidade do gen ao impedir que o dono divida a atenção com outros cães e a comida possa faltar, e, por aí, vai. Isso não significa que defendamos que os animais têm apenas instintos. No, homem, inconscientemente, também é assim que acontece, muito embora no homem haja componentes sociais no ciúme e em outros sentimentos. Por exemplo, na natureza as fêmeas não têm ciúmes pelo macho, pois não é o macho que lhe supre a sobrevivência de seu gen, pois o fator limitante na propagação das espécies não são os espermatozóides, mas os óvulos. Já na sociedade humana, as fêmeas costumam ter ciúmes pelo companheiro. Mas, na sociedade humana esse tipo de ciúme, em verdade, pode não ser um ciúme verdadeiro, mas um componente da vaidade, pois ser traído pelo cônjuge traz desprestígio social, mesmo quando não é o macho que sustenta a fêmea. Outro fator que explica o ciúme dissociado dos fatores estritamente biológicos e de sobrevivência do gen são as transferências psíquicas. Pode-se ter ciúme de um objeto por transferir a este objeto materiais psíquicos relativos a outro objeto. Com certeza, isso é mais comum em pessoas do que em animais, cujas mentes são bem mais simples, por alguns pontos de vista, mais racionais. Mas, no cão, os ataques movidos pelo ciúme seriam derivações de drives de proteção? Cremos que não. Primeiro, há o drive de dominância em jogo, que não é um drive de proteção. Segundo, nem todo o impulso de ataque pode ser considerado drive. A proteção inconsciente do gen que ocorre no ciúme dos cães não está subordinada diretamente à alimentação ou à defesa, embora indiretamente o esteja. É um instinto, talvez um sentimento, mas não um drive, até por não servir como instrumento de trabalho de proteção. Pelo contrário, pode, sim, tornar o animal perigoso. Cabe diferenciar o que é ataque para proteger o dono de ataque por ciúme pelo dono. Este pode ocorrer sobre familiares que agem inocentemente, sobre outros cães da casa, aquele não. Em tal sentido, o ataque por ciúme não constitui defesa, nem cabe ser relacionado com o drive de defesa, muito menos com o de rapina. Mas, se o ataque ocorre, como chamar esse tipo de ataque que não tem em seu bojo o impulso de um drive? Chamamos de agressão. Usa-se na cinofilia o termo “agressão” para definir qualquer tipo de ataque, o que não condiz com a língua portuguesa. Vejam, “agressão”, “agressivo”, “agressividade” em português são palavras de conotação muito negativas. Não condizem com os drives de proteção, nem com os ataques impulsionados por eles. O problema historicamente está que nos cursos ministrados em outras línguas, adestradores aprendem a palavra na língua em que o curso foi ministrado, quase sempre inglês ou alemão. Depois, ao repassarem o que aprenderam em outros cursos ou seminários onde darão aulas não tem o cuidado de escolher palavras, na língua portuguesa, que tenham conotação mais próxima a da palavra na língua original. Isso cria inúmeras

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confusões e dificuldades conceituais. Agressivo é o cara que bate na mãe, chuta o cachorro, xinga o vizinho e - cedo ou tarde, acaba apanhando - não o lutador de ringue gentil e educado. Este precisa de bons drives também para ser um bom lutador, precisa de coragem e de equilíbrio. Outro móvel para ataque seria o ataque motivado pelo medo, que é perigoso, pois não podemos prever com muita certeza quando acontecerá, uma vez que não podemos saber sempre quando o cão poderá vir a ter medo, já que tal sentimento é subjetivo. Nem mesmo se acontecerá o ataque, pois uma reação mais violenta do opositor provavelmente fará o cão recuar, uma vez que quem tem medo está sempre propenso a fugir. O medo, ao contrário do ciúme, está relacionado mais diretamente ao drive de defesa, mas ao de baixa qualidade, ao qual chamamos de pré-fuga. Mesmo assim, um ataque motivado pelo medo fora das condições almejadas no treinamento não pode ser vista como um drive de proteção, mas como uma agressão. Drive de proteção é o impulso dirigido para um determinado tipo de guarda, nada mais. O exagero dos estímulos para levante do drive de defesa pode trazer sentimento de medo ao animal. Isso acontecerá quando uma situação de provocação passa a uma situação de acuamento, e o cão passe a atacar por não encontrar outra saída, já que a fuga lhe é impedida. Esta é a maneira errada de se tentar incrementar drive de defesa. Um cão, cujo treinamento seja calcado no medo, poderá gravar em seu comportamento um ataque de péssima qualidade e a estar sempre pronto a fugir em caso de reação do inimigo ou do figurante. A égide de tal ataque deverá ser exclusivamente o drive de defesa no nível de pré-fuga. Poderá jamais fazer um ataque lançado, por exemplo. Se o nível de pressão for ainda maior, é provável que não ataque em qualquer hipótese. Desta forma, o que deveria ser um drive de defesa pode vir a ser agressividade. Indivíduos agressivos, tanto humanos quanto animais, geralmente estão sujeitos a atacar de forma imotivada ou desproporcional à provocação. Paradoxalmente, atacam de forma insegura, e o ataque pode se transformar facilmente em fuga, caso a criatura atacada reaja. Sobre agressividade e drive de defesa, citemos novamente o mesmo dicionário: “AGRESSIVIDADE – Termo empregado muitas vezes de modo impreciso e que não deve ser confundido com drive de defesa muito menos com drive de rapina (ou caça). Um cão que, por exemplo, não permite a aproximação de estranhos, mas que nunca demonstra intenção de atacar seus familiares não é um cão agressivo, mas provavelmente tem bom drive de defesa. Já um cão que até pode tolerar a aproximação de um estranho, mas que, sem razão justificável, ataca essa pessoa, é um cão agressivo. Agressividade não pode ser confundida com disposição para trabalho de guarda. Drives elevados de guarda são sempre características positivas, enquanto que agressividade é sempre uma característica negativa. A agressividade não é fruto de um bom trabalho de proteção racional, mas do descontrole emocional que pode ser de origem herdada ou adquirida. Vide: CARÁTER, COMPORTAMENTO, DRIVE e TEMPERAMENTO.” 020 - INSTINTO DE PREDAÇÃO, FOME, DRIVE DE RAPINA E DRIVE POR ISCA: Estimular ataque pela fome, no sentido do cão aprender a abater para comer como fazem os animais selvagens, no caso de cães de guarda, seria totalmente inviável e absurdo pensar em tal treinamento, além de ser extremamente cruel e não servir para o trabalho, pois o cão só iria atacar quando com fome. Só alguém totalmente insano poderia pensar seriamente em criar cães

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antropófagos. Se nos referimos a tal absurdo, é tão somente para que esgotemos as possibilidades teóricas sobre o assunto. Nesse caso bizarro, estaríamos usando o real e puro estímulo de predador. Para sentir fome ao ponto de atacar em função disso, o cão precisaria ficar vários dias sem alimento (mesmo assim teria que haver uma predisposição genética, tendo em vista a enorme maioria dos morreria de fome antes de atacar um ser humano por tal motivo) ou já estar habituado a abater presas humanas. Isso porque o hábito de atacar para saciar a fome iria se modular até que o cão nem precisasse estar com muita fome. Mas, e quando não estivesse com fome? Deixaria de ser guarda ou não? E quando estivesse com fome, não poderia ser tornar perigoso para pessoas a quem não devesse atacar? Mesmo os predadores selvagens não ensinam seus filhotes a atacar através da fome, mas auxiliando-os a desenvolverem algo bem próximo do drive de rapina dos cães (aí, vem o nome “drive de caça”). O drive de rapina, como já foi dito anteriormente, difere-se do instinto de predador já desenvolvido, pois se baseia muito mais nas brincadeiras e simulações de luta e caça do que no instinto de caça propriamente dito do animal adulto que, via de regra, só ataca a presa quando tem fome. No entanto, há quem utilize a fome como meio de estimular o cão a atacar, colocando iscas na roupa e na manga do figurante. Obviamente, que esse será um ataque baseado em drive por isca e não no drive de rapina, muito menos no de defesa. Por tal motivo, tenderá, pelo menos inicialmente, a ser fraco. Com o tempo, poderia que o drive de rapina acabe por despertar. A utilidade prática que pode trazer é o direcionamento do ataque para pontos estratégicos do figurante. Veremos isso logo adiante. Para que fosse estimulado o real instinto de predador com o intuito de levantar o drive de rapina, isso teria que ser feito desde filhote com ataques grupais com participação de adultos, a suposta presa lutar e, por fim, entregar-se, simulando morte e largar aos cães gordos nacos de carne, colocados estrategicamente, que soltariam de seu bite, por meio de vigorosas mordidas, para que os cães se alimentassem. Exigiria um nível de fome e de regularidade na sua freqüência. Obviamente, tarefa muito complicada de planejar, organizar e realizar. Mais difícil ainda, de encontrar figurantes com tal disposição. Outro fator que falaria contra tal prática absurda seria que os cães teriam um estímulos influenciados demais pela fome e que flutuariam muito em função desta, não sendo o ideal para o trabalho de guarda. Se o fosse, lobos treinados dariam os melhores guardiões, só que lobos não servem para a guarda. Em termos práticos, algo quase inviável, trabalhoso, nojento e com pouca garantia de real eficiência. Entretanto, é bem diferente a utilização de iscas em locais próprios em um bite para que o cão adquira um condicionamento de buscar primeiramente tal local no corpo do oponente. Isso pode ser feito sem utilização de qualquer drive exceto o por iscas ou, então, pelo simples apetite. Embora os paradigmas da cinofilia efetiva sejam totalmente contrários a ensinar um cão a atacar mangas ou bites vestidos pelo dono, familiar ou amigo da família, tal treinamento pode e deve ser realizado com o uso de pessoa com a qual o cão tenha algum convívio, mas de preferência nunca com o seu dono ou familiar. Petiscos presos ao equivalente à região genital do bite podem direcionar o cão a procurar tal região por exemplo. No momento do ataque através da caça e, posteriormente, também da defesa – quando não se deve usar, de forma alguma, tais iscas, muito menos o ataque deva utilizar pessoas conhecidas pelo animal, é de se esperar que, por condicionamento, o cão busque tal região no bite que deve estar preparado para isso. Neste caso, a isca não foi usada para estimular

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o ataque, apenas para direcionar o local da mordida. No momento do ataque com o uso de figurante, isto é, de pessoa estranha e com uso moderado de bastão, não devem de forma alguma ser oferecidas iscas, traria conflito entre objetivos do cão e entre os sistemas nervosos simpático e parassimpático. Pode-se, como reforço de direcionamento, em momentos diversos dos de ataque, continuar a repetir os treinos de direcionamento com iscas. Cabe diferenciação teórica entre fome e drive por isca. Embora ambos os impulsos estejam intimamente ligados à necessidade de alimento, a fome advém unicamente da necessidade de se alimentar, enquanto que o drive por isca implica também na disposição em procurar a isca, que pode ocorrer mesmo não estando o animal faminto. Na procura da isca há também uma interação do cão com seu dono. Embora, é claro, a fome seja fator primário do drive por isca e o influencie positivamente, muitos cães famintos podem ter menor disposição de buscar iscas do que outros com menos fome ou até sem nenhuma fome. Teoricamente, poderíamos dizer que a fome é um instinto e que o drive por isca demanda da pulsão. O drive por isca também está associado e muito ao drive de rapina, pois vem do impulso de caçar, de perseguir a presa. Freud definiu como pulsão a energia psíquica que se acumula no interior do indivíduo e que vários comportamentos visam descarregar essas pulsões, tendo em vista elas trazerem desconforto quando acumuladas. A origem das pulsões é obscura, mas é certo que elas têm derivação nos instintos, mas não são exatamente instintos, estão além deles. Uma das mais famosas pulsões que atinge principalmente o animal homem é a pulsão sexual. O homem com pulsão sexual mesmo saciado sexualmente, isto é, com seu instinto satisfeito, estará disposto a relacionar-se com novas parceiras como forma de alívio dessa pulsão. É mais ou menos isso que ocorre quando um animal sem fome busca uma isca. Também é mais ou menos isso que ocorre quando o drive de rapina se instala e o cão busca o ataque mesmo distante da fome. Quando selecionamos cães com drive de rapina mais altos, não selecionamos cães que têm mais fome, selecionamos cães que têm maior pulsão pelo ataque e que se sentem bem fazendo isso. Em certo sentido, o drive por isca se confunde com o drive de caça - embora sem a disposição violenta deste - principalmente, quando o cão saciado procura a isca por puro condicionamento, para agradar o dono, ou pela simples alegria (motivada pela pulsão) de achá-la. Às vezes, a come por puro condicionamento de fazê-lo. No outro extremo, teremos um cão com relativa fome, mas que não tem muita disposição de lutar ou procurar pelo alimento. Vejam como o Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos define pulsão: “PULSÃO – É um impulso que germina no inconsciente e que não vem diretamente do instinto. Uma pulsão orienta o indivíduo a afetos e comportamentos, e isso vale tanto para o homem como para animais evoluídos. As pulsões podem ser em parte recalcadas pelo superego do cão, que, em última análise, sofre influência do Paradrive de Obediência, que por sua vez, é condicionado pelo Adestramento. A pulsão pode ser provocada, em contrapartida, pelo Adestramento. Brincar com uma bola, por exemplo, pode se transformar em uma pulsão, caso o cão associe a brincadeira ao amor e carinho que tem pelo dono e que recebe deste durante o brincar. Os métodos modernos de Adestramento, por vezes, criam pulsões para incrementar drives e paradrives. Alguém pode julgar incoerente afirmar que o cão tem superego. Pois bem, se não o tivesse dificilmente seria permeável à obediência”.

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021 - DRIVE POR ISCA, DRIVE DE FARO E DRIVE DE CAÇA: A utilização de iscas não visa tão somente direcionar ataques. Aliás, é pouco utilizada nesse sentido pela maioria dos treinadores. Geralmente, iscas são colocadas sob a grama de tantos em tantos decímetros para que o cão aprenda a buscá-las e desta forma desenvolver seu faro e sua disposição em farejar, o Drive de Faro. Com a evolução do treinamento e da capacidade do cão, as iscas, antes dispostas umas das outras em decímetros passam para metros e, por fim, decâmetros, quando o cão aprenderá a seguir o rastro da pessoa que colocou as iscas, objetivo final do treinamento para faro baixo. Cães com altos drives de isca podem não se tornar bons farejadores, não só pelo baixo olfato como também pelo baixo interesse de procura de algo que não seja comestível. Daí dizermos que o cão tem bom drive de isca, mas baixo drive de faro. Muitas vezes, os drives de isca e de faro se equivalem em intensidade, na medida em que estão associados, como associados também estariam, em nível teórico, ao drive de rapina, se bem que de forma bem mais tênue. Isso porque, rapina, faro e busca por iscas são atividades, todas, empregadas na caça propriamente dita. No entanto, no que tange ao drive de rapina, nem sempre está presente em muitos farejadores e fissurados em iscas, pois o drive de rapina exige disposição de ataque que muitos cães com excelentes drives de faro e de isca não têm. É o caso de muitos cães de caça, como retrievers, etc., utilizados para busca de substâncias com a utilização do faro. Na mesma medida, muitos cães com excelente disposição para ataque através da rapina, não têm nenhuma disposição em farejar e pouca afinidade por iscas. Talvez, a explicação para não haver, na prática, uma associação tão forte como seria de esperar entre rapina, por um lado, e drive de faro e drive por isca, por outro, é que nem toda busca pela presa baseia-se no faro. Muitos usam mais a visão. Em contrapartida, muitos caninos selvagens usam o faro muito mais para buscar carniça do que presas vivas, o que provavelmente também ocorria com muitos ascendentes dos nossos cães. Mas, a explicação mais plausível, ao nosso ver, é que a convivência com o homem e a seleção que este deu aos cães em diversas funcionalidades alterou de forma importante os drives dos cães e as associações entre eles. Mais sobre isso em “011 - Os Cães Domésticos Têm Drives Iguais aos Lobos e Outros Carnívoros?”. 022 - SOBREVIVÊNCIA: A palavra “sobrevivência”, em um sentido geral, tem o significado do esforço para continuar vivo ou para manter a continuidade da espécie. Para sobrevivência do indivíduo, estariam implicados os drives de defesa (para enfrentar seus inimigos) e o drive de rapina (para obtenção do alimento, no caso dos carnívoros). Para a sobrevivência da espécie, além da sobrevivência do próprio indivíduo, se somaria os instintos sexual e maternal (também paternal, conforme espécie). Já na cinofilia a palavra “sobrevivência” pode ter também um significado de avidez por comida. Um filhote que tenha avidez por comida, via de regras, tem alto drive por isca, o que facilita grande parte do aprendizado baseado no drive de caça.

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Deixar comida demais ao alcance do cão fora de hora é fator que afeta a “sobrevivência” de um cão, diminui seu drive por isca e, até, em parte, o drive de caça. A diminuição da caça tanto advém da forma direta, na qual o cão perde o interesse por caçar e se torna indolente. Indiretamente, também o excesso de saciedade atrapalhará o trabalho com rapina e até na obediência, pois a perda do drive por isca, precioso instrumento de reforço para os estímulos nos quais devem se alicerçar tanto os impulsos (inclusive os drives) quanto a obediência. 023 - ISCAS E A BOLINHA PARA DIRECIONAMENTO E CONDICIONAMENTO DOS LOCAIS DE MORDIDA: Como dissemos anteriormente, não recomendamos colocar iscas nos treinamentos de ataque, mas, sim, apenas para imprimir um condicionamento através da colocação de iscas em locais estratégicos nos bites para direcionar o cão a eles. Como também já foi dito, no momento do ataque, as iscas não devem estar presentes. Há o fair play, o fair game e o fair fight. E as iscas só devem ser usadas até a parte bem inicial do fair game. Isto é, na fase que o fair game ainda não chegar sequer a ter intensidade moderada. O cão deverá ser solto e comer iscas presas, após adaptações para tanto, no bite suite. Nunca é demais repetir que, de forma alguma, isso deverá ocorrer junto com o ataque. As iscas só devem ser utilizadas para formatar o drive de isca e para o direcionamento da mordida em nível de fair play ou de fair game de intensidade. Nada mais. Para tanto, tal procedimento deve ser feito em fase anterior a do início dos ataques propriamente ditos, principalmente, se com uso de bite. A pessoa que vestir o bite, quando se usa o bite para colocar iscas, deve ser de relacionamento do cão, mas de preferência não seu dono ou familiar. De preferência ter um nível de relacionamento mais afastado. Deve-se, por várias sessões, repetir tal procedimento, sempre no mesmo ou nos mesmos locais a serem mordidos. Quanto maior for o número de locais escolhidos, maior deve ser o número de sessões necessárias para o condicionamento. Pode-se, até, criar um tipo de comando diferente que seja dado antes do animal buscar a isca, para cada local do bite. O condicionamento estará formatado quando já há algumas sessões o cão buscar automaticamente tais locais. Tal tipo de treino, sendo realizado em momentos em que o cão tem fome, auxiliará em muito a disposição do animal em trabalhar. O grande perigo nesse treinamento é o do cão associar o bite tão somente às iscas e vir posteriormente ter dificuldades de elevar os drives de rapina e defesa na presença do bite. Por essa razão, é que pessoas estranhas não devem vestir o bite quando do uso de iscas. Da mesma forma, é recomendável que estranhos provoquem o cão utilizando o bite e não utilizando o bite, mas em ocasiões distintas das que são usadas iscas nestes, para que se evite do cão associar o bite somente às iscas e ao alimento. Nunca a mesma pessoa que veste o bite para o direcionamento deve ser a mesma que o veste para provocação. Não se deve deixar o cão morder o bite enquanto não houver sido completado o condicionamento de direcionamento do ataque. O cão quando do uso da isca no bite deve estar com bastante apetite para maior drive por isca. Quando do uso do bite no ataque deve estar com o apetite baixo, mas, por outro lado, jamais deve ter se alimentado há menos de três horas nem mesmo ter bebido água em excesso. Aliás, jamais se faz bite ou qualquer ataque logo após a alimentação. Há o grande risco de torção gástrica que é fatal em quase totalidade dos casos. Vide Capítulo IX, itens 054 e 055.

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O complemento deste tópico é encontrado em "Ataque ao Bite". Os locais escolhidos dependem da finalidade do ataque. Quem deseje um cão direcionado para o antebraço, obviamente, não precisará de tal técnica ou mesmo de bite. É só usar a manga. O ataque ao antebraço é o melhor se for com a finalidade de desarmar agressores. Para tanto, deverá o cão ser direcionado apenas para atacar o antebraço que portar a arma. Isso só poderá ser feito com o uso de manga civil (manga oculta sob a roupa, mas que não protege a mão). Como a manga civil não dá proteção à mão e é muito dura, causando impacto muito grande sobre os dentes do cão, técnicas de schutzhund deverão ser empregadas para que o cão somente morda a parte média do antebraço antes que se iniciem os trabalhos com manga civil. Tais técnicas incluem o uso progressivo de mangas de menor para maior dureza, a fim de educar o cão a morder cada vez mais com menor impacto e maior pegada e também usando a “boca cheia”, com o uso de maior número de dentes possíveis. Tal procedimento deve ser realizado até que a dureza da manga utilizada se aproxime da dureza da manga civil. Incluem também, após o cão já estar condicionado a morder com menor impacto e com maior firmeza, o uso de manga com artefatos internos de metal que inviabilizem a pegada fora da parte média do antebraço (o que também só deve ser feito após o cão aprender a morder com menor impacto, pois em caso de erro de local, um cão que morda de forma impactante deverá se traumatizar física e psiquicamente). Somente após a mordida ocorrer sempre invariavelmente no local desejado, poderemos passar para o uso de manga civil. Do contrário estaremos colocando em risco a integridade física do figurante. Outro fator a ser considerado é que o uso de mangas duras acostuma o cão a morder sem impacto e com pouca capacidade efetiva de ferir o agressor. Fica discutível, em verdade, até que ponto uma mordida assim – sem impacto - irá desarmar a pessoa armada que poderá passar a arma para a outra mão. Outro fator a ser questionado é que a maioria dos treinamentos se dirigem ao braço esquerdo, enquanto que a maioria das pessoas porta a arma na mão direita... Bull and terriers não são cães indicados para tal tarefa, que necessita de um cão mais alto e mais longo. Entre as raças mais recomendadas e mais conhecidas, encontramos o pastor belga de Malinois, o pastor alemão, o rottweiler e o dobermann, desde que se encontrem exemplares de boa qualidade. Pode-se contra-argumentar ao dizer que bull and terriers são excelentes saltadores. Mas, como tréplica, podemos dizer que um cão quando salta tem sua trajetória determinada e prevista pelo inimigo humano, que poderá facilmente tirar o antebraço do alcance da mordida do cão. No caso do ataque a ser direcionado tenha como fim a obtenção de um cão que vise defender a família, devemos lembrar que este cão estará em situação muito diversa de um cão policial que tem em sua retaguarda um policial armado e que deve se limitar a auxiliar prisões. Um cão para uso militar também deve procurar ferir o máximo possível o inimigo e não apenas retê-lo até sua suposta prisão seja efetuada. Portanto, tanto o uso militar como o uso civil são muito diferentes do uso policial. A atividade policial de assalto e de tropas de elite também diverge da atividade policial ostensiva, aproximando-se bem mais das atividades militares ou das atividades ditas civis. Um cão que proteja uma casa onde esteja sozinha uma criança que não sabe manejar armas é a última defesa para que esta criança não esteja exposta às piores crueldades. Portanto, seu ataque deve ser o mais eficiente possível, ferir com maior gravidade possível, para que preserve a vida do

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próprio cão e a vida de quem ele protege. Pensar, em situações como essa, em ataques menos letais, “politicamente corretos”, é dar enorme chance ao azar. É ser, sobretudo, hipócrita ou alienado. O invasor, se não ferido com gravidade, poderá reagir, matar o cão e ficar à vontade para cometer qualquer crime que lhe venha à cabeça. Devemos também lembrar que o criminoso mais cruel, sádico e perigoso contra pessoas fracas não é o bandido profissional, mas aquele covarde fraco, contra o qual um cão pode perfeitamente obter sucesso desde que bem preparado para isso. Lembramos que ter um cão com maior capacidade destrutiva pode ser uma terrível dor de cabeça e um potencial tiro pela culatra se não for treinado convenientemente, com um bom direcionamento de drives e razoável nível de controle e obediência. Nada difícil, no entanto, conseguir estas outras qualidades, desde que se siga um método racional de treinamento. O treinamento deve estar associado às necessidades de guarda, e o local onde o cão ficará deve influir também no tipo de treino. Uma moradia com muros impossíveis de serem galgados pelo cão, com a obrigatoriedade de se vencer mais de um portão até se chegar à via pública e que não receba estranhos com freqüência não terá a mesma necessidade de se apurar tanto o controle do cão quanto outra que não sejam mantidas em tais condições. Um cão que não acompanhe as pessoas à rua não precisa também ser tão apurado na obediência quanto outro que acompanhe. Para direcionar um cão que ataque com eficiência, devemos ter em mente três preocupações: quais seriam as partes do corpo humano mais vulneráveis a serem atacadas? Qual seria o nível de facilidade do cão atacar tais locais? Quais seriam as chances do malfeitor reagir eficientemente se atacado em cada um desses locais? Locais mais vulneráveis: garganta, nuca, órgãos genitais (no caso do agressor ser masculino) e panturrilha. Em segundo lugar, a parte interior do braço (não do antebraço) e, finalmente, os ombros. Analisemos cada um deles a seguir. Garganta: o mais vulnerável de todos os locais (vulnerabilidade altíssima). Se bem pega, e se a mordida for bem sacudida, forte e com preponderância do uso dos caninos, poucas chances de reação, pois será muito letal e de rápido efeito. A grande desvantagem é que um malfeitor bem treinado provavelmente abaixará o queixo e protegerá a garganta, e o cão terá que ultrapassar a barreira de defesa dos braços do indivíduo. Por outro lado, muitos indivíduos terão como primeiro reflexo evitar a mordida no rosto, levantando para isso o queixo e se expondo à mordida na garganta. Um bom local para treinar cães de guarda de uma maneira geral, mas de porte relativamente grande. Para raças mais baixas, ainda que possam ter maior força, tal local só deve ser indicado em exemplares maiores. Os de menor porte não devem ser orientados para ataque tão alto. Em indivíduos humanos muito altos, também, tal ataque perde a eficiência, pois o acesso é difícil. Nota 7. Nuca: não tem estruturas tão vulneráveis quanto as da garganta, mas é de mais fácil alcance, desde que o cão consiga ser mais rápido do que o malfeitor se voltar para defesa abaixando a cabeça para frente. Do contrário, será difícil que o cão consiga, em situação real, atacar a nuca, exceto se não for notado até que o ataque seja desferido. Fora isso, a nuca fica mais vulnerável somente quando o indivíduo procura defender o rosto e a garganta e tenda a se acocar. Vulnerabilidade alta. Nota 4. Órgãos genitais: facílimos de serem alcançados, de alta vulnerabilidade. O ponto fraco deste

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ataque, é que se o cão não for muito rápido em chacoalhar e dilacerar o local, permitirá fácil revide do malfeitor, caso este esteja armado. Nota 10. Panturrilhas: facílimas de serem alcançadas, de revide difícil. Mas, de vulnerabilidade média. Nota: 8. Parte anterior do braço: nível médio de alcance dependente do tipo de reação e postura do inimigo. Vulnerabilidade média para baixa. Difícil revide apenas se o ataque for por trás. Se for pela frente, de fácil revide. Nota 6. Ombros: nível de alcance dependente da altura do malfeitor e da altura do cão. Baixa para média vulnerabilidade. Capacidade de reação, como no braço, dependente de ser o ataque pela frente ou por trás. Nota 4. Antebraço: bom nível de alcance, mas baixa vulnerabilidade e alto poder de reação do oponente. Nota 2. Tronco: de fácil alcance para o cão pela frente; de capacidade de revide relativa, difícil pela frente e difícil por trás, mas o cão não terá como morder com profundidade pela espessura do local. Nota 2. Sem nenhuma dúvida, escolhemos os genitais e as panturrilhas como melhores locais para direcionar o ataque. Lembramos que no ataque aos genitais devemos colocar proteção adicional no bite, o de protetor escrotal vestido internamente. Outro artefato que pode ser utilizado no treinamento inicial é do bite pillow. Tal artefato consiste em uma pequena almofada com duas alças para que o figurante o segure à frente de seus genitais. É mais para ensinar mordida do que para direcionamento, mas é seguro em posição próxima a dos genitais. A colocação de iscas é fácil, desde que se façam as modificações adequadas ao bite. Quanto ao treinamento de ataque propriamente dito, veremos no decorrer deste capítulo. Recomendamos a quem tenha mais de um cão, não direcione seus cães para o mesmo lugar. A diversidade de locais de ataque deixará os malfeitores mais vulneráveis e perplexos. É óbvio que dois cães podem ser direcionados ao mesmo tempo para as panturrilhas, mas fica difícil que mordam a um só tempo os genitais do oponente simplesmente por faltar espaço para suas mordidas. Podem até um atrapalhar o outro na disputa pelo espaço. Se houver condições para um treinamento mais completo, o ideal é que cada cão não tenha apenas um local visado. Uma alternativa, no mínimo, é interessante, pois, por qualquer razão, pode ser difícil atacar o local preferencial, e não é desejável que o cão fique circulando procurando um único lugar, devendo logo realizar o ataque, procurando entre os locais mais recomendáveis, o que melhor se apresentar no momento, sem vacilar. Pessoalmente, indicaria panturrilha e genitais. No entanto, caso não haja condições de treinamento mais completo, é preferível um bom ataque direcionado a um único lugar do que um cão um tanto quanto indeciso quanto a qual local irá morder. Se formos ensinar o cão a atacar mais de um local não é bom que iniciemos o treinamento da

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próxima opção depois de o cão já estar por demais focado na primeira. Será mais difícil. Começa-se com um tipo de ataque em um treino, passa-se para outro no treino seguinte, volta-se ao primeiro, sempre com um local por treino. Permutaremos até que os dois tipos de ataque estejam bem apurados. Depois, dos dois tipos de ataques estarem apurados, pode-se alternar no mesmo treino os locais de ataque. Finalmente, após confirmar que o cão mantém a eficiência, pode-se colocar as dois atrativos (bolinhas ou iscas) ao mesmo tempo e deixar que o cão morda o local mais conveniente conforme a disposição do “combate”. Começa-se sempre facilitando o trabalho do cão. Depois, inicia-se algum nível de dificuldade, ensinando o cão a se empenhar por encontrar com rapidez, astúcia e eficiência os locais direcionados. Uma bolinha aqui pode nos ser de inestimável utilidade para direcionarmos o ataque para os genitais. Neste caso, enquanto mantemos o filhote preso, lançaremos a bolinha até a pessoa das relações do cão que usa o bite e esta coloca a bolinha presa entre suas coxas, próxima à genitália. Então, daremos o comando de "PEGA" indo o cão pegar a bolinha no local descrito. Observem que deixamos o uso do drive por iscas e estamos já numa situação de fair play, quase de fair game. Com o tempo, a pessoa irá dificultar a pegada do objeto, mover-se, apertá-lo mais para dificultar sua extração, caminhar normalmente fingindo indiferença ao cão, etc. Poderemos também tapar os olhos do cão e lançarmos a bolinha para que a pessoa a coloque no local correto, para, depois, comandar o "PEGA" e estimularmos o cão a encontrar a bolinha no mesmo local onde o cão via o figurante colocá-la. Quando o cão for ao local de costume sem ver a bolinha ser colocada lá é porque já está relativamente condicionado a encontrar o local. Mais adiante, coloca-se através de velcro ou de outro recurso, lingüiças presas a tais locais. Veremos isso em “098 - Ataque ao Bite” e em “060 – Lingüiça, como Deve Ser, como Usá-la e Direcionar o Cão pra Ela”. “O melhor ataque deve ser sempre previsível quanto às circunstâncias, mas imprevisível na forma” (o autor). 024 - O INSTINTO NATURAL, A CAÇA SIMULADA E O DRIVE DE CAÇA: O drive de caça dos cães domésticos em relação aos dos predadores selvagens é que o primeiro sempre foi estimulado e selecionado pelo homem. Nos cães, o instinto natural desenvolvido a partir da necessidade dos filhotes de mamíferos carnívoros aprenderem a caçar foi, durante milênios, incentivado pelos humanos que ensinaram tais animais a caçarem sem sentirem fome. É cruel, mas temos que admitir que o homem, durante milênios, perverteu e ensinou os cães a atacarem, e até matarem, por prazer. É o que acontece quando nossos cães massacram pobres ovelhas ou inocentes gatinhos e não os comem. No caso de gatos, que também são carnívoros e disputam caças com os cães, é comum o massacre de filhotes de espécies diversas mesmo na natureza. Mas, o mesmo não se pode dizer em relação a herbívoros adultos serem massacrados por carnívoros que sem finalidade de alimentação. Até porque empreender esforço inutilmente e, ainda, para destruir o alimento futuro estaria contra às leis da evolução. À exceção de filhotes de carnívoros de outras espécies (e, em alguns casos na mesma espécie como leões e ursos), o massacre é incomum na natureza, carnívoros não caçam ou matam sem visar o alimento. Via de regra, não acontecem, no mundo selvagem, ataques despropositados, pois um carnívoro não irá se expor aos riscos de uma caçada gratuita, quando um simples coice poderá provocar uma fratura que pode impossibilitá-lo para a caça e poderá lhe trazer morte certa por inanição. Apenas os cães adquiriram tais impulsos, e o homem, sem qualquer dúvida, foi o seu

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mestre. Esse instinto de atacar animais pode perfeitamente ser desviado para que o cão persiga e ataque qualquer inimigo. Isto aconteceu na captura de escravos e prisioneiros, bem como nos cães agregados aos exércitos, durante quase toda a história da humanidade. O instinto de caça dos animais foi o precursor do drive de caça. O homem selecionou os cães até que seu instinto se tornasse uma pulsão. Se o instinto obedece a fatores evolutivos, a pulsão segue fatores psicológicos que se confundiram na própria evolução tendo em vista a seleção ter sido feita em favor da pulsão. A diferença é que não foi uma seleção natural, mas a feita pela mão do homem. Uma das razões de sua eficiência do drive de caça é que ele não traz o mesmo desgaste para o cão, na medida em que o cão o faz sem pressão psicológica e, conseqüentemente, com bem menores taxas de adrenalina e noradrenalina, como já vimos anteriormente. Além do mais, como vem servir ao alívio de uma pulsão, traz também prazer, o que diminui ainda mais o seu desgaste. Na nossa metodologia de treinamento, como veremos a seguir, utilizaremos parte deste método. Não só o que os filhotes aprendem uns com os outros, mas, também, o ensinado pelas mães aos seus filhotes, enquanto o animal for muito jovem, pois isto lhe despertará os instintos de caça e defesa, lhe darão alegria e segurança básica e necessária ao bom trabalho de guarda. Podem perguntar como a defesa traria alegria? Ele por si só não traz alegria, mas no nosso trabalho ela visa ser incorporada à rapina para formar o drive de luta, que, em verdade, não é um único drive, mas um nome dado à união dos dois drives de proteção. Durante tal período, o filhote preferencialmente deve ser restrito à órbita familiar e apenas presenciar estranhos a título de habituação, como comentamos anteriormente. Após uma primeira fase, aos poucos, poderemos, ou não, acostumar o cão à convivência, pacífica ou não, com outras pessoas, conforme o tipo de guarda que queiramos que ele se torne. 025 - DRIVE E DEFESA E O REFORÇO FAMILIAR: No desenvolvimento do drive de defesa, bem como na sua manutenção, um ambiente familiar saudável é fator importante. Um bom ambiente, onde haja aceitação, respeito e carinho para com o cão, despertará com maior vigor os instintos de proteção grupal e territorial, o que já é inerente à espécie canina, para com os humanos e animais com quem conviva. Esse é o motivo dado à importância que damos à convivência cão-dono no que tange à guarda. Além disso, as pessoas da casa se acostumarão mais ao cão, e este também confiará mais nas pessoas da casa. Um ciclo “virtuoso” de amizade e confiança mútua aparecerá. Nesse ciclo, poderemos vivenciar uma das coisas mais nobres que podemos obter no Planeta: a amizade de um fiel cão de guarda. Cabe, no entanto, alertar que cães que convivam juntos com outros cães não devem ser por demais bajulados e acariciados por seus familiares humanos, uns na presença de outros. A disputa pelo carinho do dono, na maioria das vezes, é o maior móvel para disputas que podem levar a sérias brigas. Cães de guarda que trabalhem juntos devem ser criados em espaços maiores, e os donos devem evitar excesso de carinho, principalmente quando estão os cães juntos. Vejam mais no item

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“Convivência entre Cães de Guarda”. 026 - DEFESA DO TERRITÓRIO: Os cães que naturalmente atacam mais voltados à segurança do território são aqueles que possuem maior drive de defesa. Esta é uma premissa básica da cinofilia, pois uma das subdivisões do drive de defesa é o drive de defesa territorial. É claro que o cão que tem drive de defesa alto, geralmente não a tem para apenas uma das subdivisões do drive de defesa, a não ser que seja pelo mero produto de condicionamento. Isto é, pode-se moldar um cão a ter defesa alta apenas em relação a uma só situação, pessoa, local, etc. Sobre o dito no parágrafo anterior, podemos ponderar que embora defesa de território não seja ligada ao drive de caça, pode-se direcionar este drive para a defesa do território. Se for um território grande que o cão deva proteger, é provável que um cão com mais alta rapina seja mais eficiente do que um cão de alta defesa. Pois o instinto puro de defesa não abrange áreas muito grandes. Isto é, além daquelas nas quais um cão normalmente delimita seu território. Cabe lembrar que um drive de rapina muito alto fará com que o cão ataque qualquer estranho que perceba, independente da distância. Isso pode ser por demais perigoso se o território não estiver bem fechado. O pior é que o cão nesse caso não estará se defendendo nem defendendo nada, estará caçando, literalmente caçando, e disposto a percorrer grandes distâncias atrás de sua presa. Na prática, isso, felizmente, não ocorre ou é extremamente raro, até porque cães criados em espaços abertos acumulam menos pulsões, menos descargas emocionais a liberar, e seus drives quando levantados tendem a ser equilibrados. 027 - RAÇAS E DRIVES: O termo oriundo da língua inglesa "drive” denota algo sobre o qual se pode exercer algum controle ou alteração, pois uma das suas traduções é “dirigir” (a outra é “impulso”). Embora tenha um fortíssimo componente genético associado aos impulsos básicos, sobre os drives podemos exercer controle ou alteração. Exemplares tradicionais típicos de raças como o rottweiler e o fila brasileiro já nascem com predisposição genética a possuírem drive de defesa relativamente mais alto do que o drive de caça, seriam, como veremos adiante, mais propensas a serem cães guardiões, guardas territoriais. Pelo menos isso era o esperado na maioria dos exemplares antes da expansão dos processos decorativos que se abateu quase todas as raças ditas de guarda. Tipos de cães, como os bull and terriers, têm uma tendência a possuírem um maior drive de rapina (ou "drive de caça" - como preferem alguns), são mais propensos ao ataque lançado e ao assalto. Pastores alemães, pastores belgas (principalmente de malinois) e o dobermann antigo seriam cães indicados tanto para o schutzhund, como esporte, como para o ataque. O dobermann era o cão de assalto por excelência. Isso em tese, já que o espírito decorativo americano e europeu ocidental atual trouxe severas degenerações para quase todas essas raças. O grande dobermann, companheiro das tropas de elite da SS nazista e talvez o mais completo cão de guarda já criado, veio aos poucos se transformando em um cão de desfile. É reflexo do tempo em que muitos homens se renderam aos valores matriarcais e efeminados (diferente de “afeminado”) em detrimento da efetividade e da funcionalidade. O dobermann, até os anos 1970, era um cão completo, com virtudes de guardião e de protetor

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pessoal marcantes e bem equilibradas. Não há ainda uma comprovação efetiva que o aumento de um drive através do treinamento venha implicar na diminuição do outro (desde que nos refiramos ao drive de defesa em nível resoluto), tudo indicando que não. Do ponto de vista da herança genética, o que sabemos é que cães com mais capacidade de exercer um alto nível de rapina chega com facilidade à defesa resoluta. Sabemos também que o treinamento para fair fight e defesa resoluta convergem para a luta e que o incremento de um drive de proteção, aumenta também o outro quando se trata de níveis elevados em função dos treinamentos. No entanto, no que tange às propensões genéticas, via de regra, cães com um tipo mais forte de drive, possuem o outro menos marcante. Aí estava a grande qualidade psíquica do dobermann antigo, que foi soberbamente selecionado para que tivesse altos ambos os drives de proteção. Muitas raças selecionadas com a adição de bull and terriers, tinham elevado nível de rapina, mas baixos níveis de defesa. Foram necessárias décadas de seleção para que a defesa natural dessas raças fosse incrementada mesmo do ponto de vista genético em cães sem qualquer treinamento. A explicação para que exista essa suposta tendência de que cães não tenham, via de regra, na herança genética de um mesmo exemplar, drives de rapina e de defesa bem elevados talvez seja que a personalidade de um cão, assim como a de uma pessoa, ou é extrovertida ou é introvertida*. Em outras palavras, quem é extrovertido, gosta de mais do risco, da aventura; está mais associado à caça, como drive. Tem uma confiança em si, talvez maior do que devesse. Não teme o desconhecido, e este, ao invés de temor, lhe causa fascínio. Não há dúvidas do o que vale para homens quase sempre vale para cães (e vice-versa). Notamos mais as diferenças, mas, com certeza, temos muito mais semelhanças. Por outro lado, as personalidades introvertidas não suportam o risco, as coisas novas as ameaçam e irritam. Têm uma visão diminuída de sua capacidade real. Não é preciso muita perspicácia para perceber que as personalidades extrovertidas se associam ao drive de rapina, e as personalidades introvertidas associam-se ao drive de defesa. Obviamente, que extroversão e introversão não podem conviver em uma mesma personalidade - ao mesmo tempo, pelo menos – pois constituem um par de opostos. Como o antigo dobermann conseguia ter ambas as qualidades na maioria dos seus exemplares, talvez fosse explicado pela seleção genética na qual os cães tivessem uma personalidade mais ambígua e adaptável aos fatos que se sucedessem, o que é altamente discutível em termos cinológicos e psicológicos. Tal tipo de seleção está sendo, hoje, feita com sucesso na América do Sul com o dogue brasileiro e na América do Norte com o Donovan pinscher e com o canis panther. As misturas de raças introvertidas e extrovertidas selecionadas para manterem ambos os drives altos têm muito mais chance, dada às variabilidades genéticas que incorporam, do que tal seleção realizada em uma raça introvertida ou em uma raça extrovertida. Devemos lembrar que uma caça exacerbada pode se confundir, em certas situações, com defesa resoluta, na medida em que a caça se apresentará assim que o cão perceber alguém, como também pode se manifestar tal nível de defesa. Se o cão estiver em seu território e demonstrar caça ao ver a aproximação de um estranho e atacar em luta, será tecnicamente impossível saber se o ataque ocorreu em luta ou em nível resoluto de defesa. Em verdade, veremos adiante que o fair fight tende à luta, e que a defesa resoluta se confunde com ela. Ver mais em “037 – Luta , Condição Interativa entre Rapina e Defesa? Mordidas Associadas”. Já adiantando, visualmente, a única diferença que podemos notar seria fora do território e havendo distância entre o cão e o figurante. Na luta, o cão

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tende a ir até o figurante. Na defesa resoluta, não. Em curtas distâncias, (é relativo dizer o que é curta distância nesse caso, pois depende de conhecimento a ser dado posteriormente sobre círculo de pressão) será impossível estabelecer a diferença, pois o cão atacará da mesma forma e mostrando os mesmos sinais em ambas as situações. É claro que 50 metros (fora do território) significam longa distância e que cinco metros significam curta distância. Mas, impossível na prática dizer com relativa precisão onde uma distância deixa de ser curta e passa a ser longa. O mais complicado é que não dá nem para arbitrar, pois dependerá de variáveis subjetivas de cada cão. Para se ter uma idéia da complexidade da questão, curta distância no caso é aquela onde o cão sente a pressão da ameaça para atuação de sua defesa. Paradoxalmente, quanto mais elevada for a intensidade da defesa, maior será essa distância, aproximando-se ela da distância de atuação da rapina. Veremos adiante, também, que essa é uma comprovação que drives elevados de rapina e de boa defesa acabam se confundindo. Para não restar dúvidas, pede-se ao figurante que vá a uma distância que não haja dúvida que seja longa, diríamos, uns 50 metros. Se atacar, estará em luta, pois há rapina impulsionando o ataque. * Os conceitos de personalidades extrovertida e introvertida, aqui utilizados, não têm a complexidade dos conceitos sobre extroversão e introversão, utilizados por Carl Gustav Jung, bem mais complexos. Este item usou os conceitos corriqueiros sobre tais termos. 028 - TIPOS DE GUARDAS E FUNÇÕES: Podemos dividir os cães de guarda em inúmeros grupos, independentemente ou não das diversas raças, de acordo com a finalidade específica que deles esperamos ou pelas características que cada exemplar apresentar. O exemplar correto para cada função será aquele cuja característica se combinar com a finalidade demandada. Por exemplo, o schnauzer teria no passado como principal finalidade proteger o cavalo de seu dono contra roubos, pois a raça foi selecionada com cães que tivessem esta aptidão. Mas podemos perfeitamente treinar um cão de outra raça para tal fim. O Pastor Alemão, por exemplo, era, como o nome bem o diz, um cão específico de pastoreio e foi, aos poucos, deslocado para a finalidade de guarda como atividade principal. O treinamento, outrossim, pode ser genérico ou específico a uma determinada função. De um modo geral, podemos dividir tais animais em dois grandes grupos: os guardiões, radicais ou não, e os cães de proteção. Teremos outro grupo de cão de guarda que não se enquadram bem em nenhuma das duas grandes classificações que são os cães de assalto. Teremos ainda os cães de rastreamento, que poderão fazer, conforme suas demais características, parte de um ou outro desses três grupos. Rastrear, no entanto, não é atividade de guarda, embora esteja, em alguns casos, associada. No caso deste livro, nos focaremos mais no treinamento de um cão que proteja a propriedade e a pessoa, além de uma noção básica de um cão de rastreamento e outras atividades afins. De um modo geral, podemos dizer que os guardiões seriam mais dedicados a proteger o território e os protetores as pessoas. Estes dois grandes subconjuntos podem não estar tão delimitados, muito embora a maioria dos cães de guarda possa ser bem definida nesta óptica. Entre os guardiões, para efeito de ilustração, definiríamos como guardiões radicais, ou cães sumários, feras que respeitariam poucas pessoas e viriam a tentar exterminar indistintamente qualquer intruso. Tais cães seriam utilizados nos presídios, onde sua simples presença e o terror

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associado a ela minimizariam tentativas de fuga Foram utilizados nas grandes propriedades dos nobres europeus e nos palácios de reis de toda Eurásia e norte da África. A mitologia greco-romana cita o fabuloso Cérbero, o guardião do inferno, que lambia as mãos dos que entravam e devorava os que tentavam sair. Ainda hoje, empresas, principalmente nos EUA, possuem cães assim das mais diversas raças, como dobermanns, pastores alemães, rottweilers, pit bulls e mestiços, de temperamento diametralmente oposto daqueles que circulam nas exposições da AKC. Tais empresas se especializaram em prestar serviços alocando tais animais em locais que necessitariam de sua proteção, como depósitos, armazéns, etc. Uma das vantagens de tal tipo de cão seria que para esta atividade simples, um animal de temperamento e treinamento tão extremado, não perderia valiosos segundos, ao avaliar a situação, antes de qualquer ataque, expondo-se menos às agressões, incluindo tiros, dos malfeitores. A outra, a principal, seria de tal animal é muito mais difícil de ser subornado com petiscos ou agrados. Alguns são verdadeiras feras e têm que ser conduzidos por homens com bites ou dentro de jaulas. As desvantagens deste tipo de animal seriam muitas por outro lado. Primeiramente, o perigo que podem representar caso venham a fugir, e, em alguns casos, até para com as pessoas que o tratam. Outra grande desvantagem, é que este tipo de cão, embora um grande guardião da propriedade, pouca utilidade teria para proteger a pessoa, uma vez que teria sempre que ser preso na chegada de pessoas estranhas, que nem sempre demonstram suas más intenções. Não podem, por razões óbvias, acompanhar seu dono e protegê-lo fora do seu território. Muito embora, na prática, muitos cães extremamente ferozes em seu território tornam-se totalmente mansos fora dele, ou por não terem mais a atuação da defesa que é basicamente territorial ou por ficarem perplexos pela falta de habituação com ambientes estranhos. O treinamento para um cão sumário, na verdade, é muito fácil, pois se baseia unicamente que o animal não suporte a presença de nenhuma pessoa estranha e ataque com toda a ferocidade possível, mas não recomendamos, exceto em casos especiais, que alguém venha a possuir um cão assim. Usar-se-ia técnicas de levante de drive de rapina associadas a um extremo levante do drive de defesa. Começar-se-ia pela elevação máxima da rapina socializando o cão com pouquíssimas pessoas fora das situações de ataque. Depois, se incrementaria ao máximo a defesa. Ou apenas se pega cães com tal tendência genética e que são descartados de outras atividades por serem ferozes demais. Essa é a mais simpática, pois dá função a um cão que poderá vir a ser sacrificado. Já, como guardiões não-radicais, podemos descrever um cão, que embora venha a possuir ojeriza a estranhos, não permitindo sequer a aproximação destes, tenha boa e segura postura ante aqueles a quem se habituou, como membros da família e seus agregados. Muitos proprietários, devido às suas limitações pessoais, não têm condições de treinar um guardião-protetor (veremos adiante sobre) em condições de efetivamente realizar bem tal tarefa. Neste caso, muito melhor seria possuir um guardião não-radical eficaz, de muito mais fácil treinamento. Os bull and terriers e seus descendentes não têm características ideais para se fazer dele um cão sumário, tendo em vista a herança vinda dos próprios bull and terriers de não serem cães de um só homem (o bull terrier é sempre assim definido pela literatura) a despeito dos grandes guardiões possam ser. O grupo dos guardiões não radicais é geralmente composto por cães de alto drive de defesa. Os guardiões radicais, ou cães sumários, têm como diferença não somente ter um alto drive de defesa, mas um altíssimo e exacerbado drive de defesa. Em verdade, os guardiões-radicais pertencem ao grupo dos guardiões. A diferença está na

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intensidade da defesa e não no tipo de guarda. A diferença prática está nos guardiões, dentro de algum tempo, acabarem se acostumando com alguém que se incorpore à casa. Os radicais dificilmente abrem tal exceção. Outra é que os sumários aceitam quase sempre uma só pessoa e, às vezes, somente se esta observar cuidados mínimos ao lidar com o animal. Em outros casos, não aceitam ninguém. Muitos cães que não teriam drives tão altos são usados para a atividade sumária, simplesmente por que se tornaram agressivos ou por terem o temperamento histérico. São cães que foram doados por famílias que não puderam ficar com eles em virtude da personalidade deles, pelas quais quase sempre, foram as maiores responsáveis. Em mãos hábeis, na maioria das vezes, conseguem reverter o quadro pelo menos parcialmente. Por vezes, são cães que, se forem atacar, podem vir a fazer um péssimo ataque. Mas, assustam, espantam, e podem ferir e, estando em vantagem, matar o invasor. Além dos guardiões, outros cães de guarda são os cães protetores, os cães de assalto e os rastreadores. O que diferenciaria este grande grupo do primeiro, além da função, seria que os cães guardiões devem ter uma maior defesa, enquanto os demais necessitariam mais de uma boa rapina, à exceção dos rastreadores, que nem sempre são cães de guarda. A genética herdada, a personalidade adquirida pelo cão e o treinamento são os fatores que dariam as características de cada exemplar . A raça do animal em si não deve trazer nenhum estigma, mas, sem dúvida, traz em tese, uma profunda propensão genética. Cada tipo de guarda tem sua superioridade relativa. Os cães guardiões têm total ojeriza a estranhos, o que em tese lhes dá um ganho essencial à sua função por serem de difícil suborno. Em tese, tendem a apresentar menor vacilo, mas, nem sempre, maior violência no ataque, quando dentro da propriedade. Porém, tais animais tornam-se inúteis em diversas situações, principalmente no caso dos radicais, uma vez que não se deve conduzi-los em público, nem mesmo mantê-los presentes quando da presença de estranhos na propriedade. Assim protegem bem a propriedade, mas não têm como proteger pessoalmente seus donos. Muitos cães se tornam guardiões pela elevação de seu drive de rapina a ponto de ver em todo estranho uma caça. Estes são os mais eficientes e rápidos no ataque, tanto dentro quanto fora do território. No entanto, podem trazer um enorme perigo se essa característica for tão maximizada a ponto de fazerem isso fora do território, o que pode ser um terror, caso um cão com tais características, de alguma forma, conseguir driblar a segurança e sair à rua. Podem também serem subornados com mais facilidade do que cães com base na defesa. Muito embora durante a atividade de ataque o drive de rapina tenha muito mais resistência do que o de defesa resoluta, que se esgota mais rapidamente em virtude da elevação da adrenalina e da noradrenalina (relembrem item 006 deste capítulo), a atuação geral da defesa é mais persistente e mais estável, ela não descansa praticamente, outra razão por que serve melhor para a tarefa de guarda de território, ou de guardião. Os protetores e os cães de assalto devem ter como drive principal a rapina, mais exacerbada nos cães de assalto, é claro. Uma defesa muito intensa nos protetores pode lhes prejudicar na medida em que devem circular com seus donos sem tomarem atitudes hostis a pessoas que deles se aproximam sem agredi-los. O drive de rapina de um protetor deve ser alto, mas não tão alto que prejudique seu controle. Em verdade, deverá ter um drive moderado a moderadamente alto, conforme função específica. Os cães de assalto, sim, devem ter a rapina muito alta. Sua defesa pode ser alta, embora quase sempre não o seja. Mas, também a defesa não deve ser alta demais, pois cães de assalto quase sempre trabalham junto com outros policiais ou soldados e não devem

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atacá-los quando eles se aproximarem do cão ou do seu condutor. Como dá para se perceber, há grandes vantagens e desvantagens tanto para os guardiões como para os protetores. O melhor cão, portanto, é aquele que se ajusta melhor às nossas necessidades. O que veremos, no decorrer deste trabalho, é que, na prática, deve se buscar o drive de luta, onde defesa e rapina atuam concomitantemente. A exceção seria em cães de policia ostensiva que devam mais prender, segurar, e menos sacudir, rasgar. Nesses, o drive de rapina em nível de fair fight com uma intensidade moderada é o mais indicado. Muito mais fácil estimular o drive de defesa a partir de um alto drive de rapina do que estimular o drive de rapina a partir do drive de defesa. Também fácil é fazer com que um cão de alto nível de rapina a use dentro do território, a qualquer invasão deste, desde que com treinamento específico, porém fácil. Isso poderia fazer crer que é mais fácil tornar um cão guardião do que protetor. Pode ser, ou não, o que varia de raça para raça e de exemplar para exemplar. Vamos analisar com mais profundidade a questão: Vejamos. Um cão com alta caça tem grande tendência a atacar sob comando indivíduos próximos ou distantes e menor tendência a atacar sem ser por comando ou por estímulo previamente condicionado de outra forma, estranhos, em qualquer lugar, dentro ou fora da propriedade. Um cão com alta defesa tem enorme tendência a atacar, mesmo sem comando ou condicionamento, dentro do que considera seu território, bem como, pessoas que se aproximem dele e de seu dono em qualquer lugar mesmo sem comando. Por outro lado, tem menor tendência a atacar indivíduos que não estejam próximos do próprio cão e de seu dono, ainda que comandado ou condicionado de outra forma. Embora com treinamento é possível a elevação de ambos os drives, rapina e defesa, raros são os casos em que naturalmente ambos os drives são elevados como foi explicado antes “027 – Raças e Drives”. No caso da defesa pessoal, qualquer um deles reagirá bem, desde que recebam treinamentos próprios para atacarem, bem como para inibir ataques quando isso não for desejável, pois na defesa pessoal, o inimigo irá se aproximar do dono do cão. A diferença está em que um cão com alta defesa terá que ser mais condicionado a não atacar sem justificativa. E aí vem a máxima: e o que é justificável para um cão? No caso de guarda da propriedade, o cão de mais alta defesa terá uma tendência espontânea maior a impedir a entrada de estranhos do que um cão de mais alta caça. No entanto, a caça pode ser trabalhada dentro da propriedade condicionando facilmente o cão atacar qualquer intruso que ultrapasse seus limites. Neste caso, tanto o cão com alto drive de rapina quanto o com alto drive de defesa protegerão bem seu território. Caso a área a ser protegida seja grande e ultrapasse o território que o cão delimita instintivamente, o animal com mais alta rapina, se treinado, levará vantagem. No caso do território não ser muito grande, ou seja, na maioria dos casos, o cão de alta defesa terá vantagem por dois fatores: primeiro, a defesa tem estímulos de atuação muito mais longa do que a caça, digamos, quase infinitos; segundo, em decorrência disso, um cão com alta defesa é de muito mais difícil socialização com algum estranho que tenha paciência de cativar o cão, portanto, um cão de alta defesa é bem mais difícil de ser subornado.

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Portanto, a desvantagem do cão de defesa baixa para tal mister será a de literalmente ficar amigo do ladrão. Assim, por mais alto que seja o drive de rapina é necessário que seja incrementado drive de defesa para um cão guardião. De quanto deverá ser tal incremento dependerá do drive inicialmente apresentado e de cada necessidade específica de guarda. O mínimo exigido, cremos que seja de o cão não fazer amizades com pessoas estranhas desacompanhadas de seu dono ou familiar. No caso dos outros trabalhos dos protetores que não a guarda pessoal, como assalto e rastreamento, os cães com mais alto drive de rapina levarão nítida e expressiva vantagem sobre os demais. Isto porque os cães de personalidade extrovertida têm maior tendência a se lançar nessas tarefas além dos seus limites e indo à frente de seus condutores. Em resumo, se treinados ambos os grupos, os cães com mais alto drive de rapina levarão mais vantagem por conseguirem abranger quase todo tipo de tarefa. Em caso de os cães não serem treinados – o que é quase utopia esperar isso de um cão, os cães com maior drive de defesa levarão mais vantagem, exceto nos trabalhos de assalto e rastreamento, que não interessam a civis não-policiais. Na proteção não esportiva do dono fora do território, o ideal é um bom balanço de drives, embora a rapina, pelo menos em um nível razoável, seja necessária e tanto uma defesa como uma rapina exacerbada não sejam em nada interessantes. Quando falamos ser quase utópico crer em um bom cão de guarda sem treinamento não nos referimos a cães que simplesmente ataquem, mas que ataquem de forma responsável e mantenham esse ataque mesmo sob reação violenta do atacado. Seria utópico contar com isso. Mas, existem cães assim. Às vezes, é difícil fazer um dono acreditar que seu cão não é um cão de guarda confiável tanto como ele pensa, pois vê o cão se lançar feito um louco sobre uma grade à simples presença de um estranho. Mas, o façam imaginar um estranho forte, grande e bem disposto, entrando inesperadamente na propriedade, vestindo um bite, gritando, batendo galões* e atacando o cão solitário com severos golpes de bastão de schutzhund. É triste, mas são pouquíssimos cães que enfrentariam tal situação caso não sejam bem treinados e que tenham também muito boa predisposição genética. * Batendo galões: usa-se dois galões sem líquido, repletos de pedra brita e bate-se um contra o outro ou sobre o cão. Prova de pressão difícil de ser vencida por um cão não acostumado gradativamente a ela. Resumidamente, podemos dividir os cães de guarda, em: Guardiões Radicais, ou Cães Sumários, ou Cães de Paiol: Não suportam a presença de estranhos de nenhuma maneira dentro do território, muitas vezes, não aceitam em nenhum lugar. Alguns se limitam a aceitar apenas uma ou duas pessoas no seu trato. Alguns não aceitam ninguém. Indicado apenas para empresas prestadoras de serviços e especializadas em cães de guarda ou serviço militar, em casos muito especiais. Treinamento indicado: ring efetivo, se possível. Muitas vezes, não necessitam de treinamento algum, mas isso precisa ser comprovado. Apenas ver o cão se babar e se lançar contra as grades pode não dizer muita coisa.

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Guardiões Não-radicais: Não suportam a presença de estranhos de maneira alguma no seu território. Na maioria dos casos, tolera a presença de estranhos fora dele. Convive bem com todas as pessoas que habitem ou circulem habitualmente pela casa. Recomendado para proprietários que não dispõem de recursos humanos ou materiais para possuírem um cão protetor ou que não precisam de um cão assim. É essencial que sejam mantidos em locais com muita segurança. Treinamento indicado: ring efetivo. Cães de Proteção Propriamente Ditos: Suportam a presença de estranhos até dentro de seu território. Na maioria dos casos, apenas se autorizada pelo dono. No entanto, atacam sem hesitar sob comando ou no revide de agressões ou ameaças em qualquer lugar. Ideal para quem precisa de um animal que o proteja em todos os lugares, que seja companheiro de todas as horas ou que venha a receber em casa pessoas de não total confiança. Treinamento indicado: K9, qualquer tipo de ring, schutzhund. Guardiões-Protetores: Não suportam de maneira alguma a presença de estranhos dentro de seu território, mas convivem amistosamente ou indiferentes com pessoas desconhecidas fora dele. No entanto, em qualquer local, atacam sob comando ou no revide de agressões ou ameaças. Alternativa interessante, desde que não haja necessidade de se receber estranhos nos quais não se possa inteiramente confiar, e haja boas condições de segurança para manutenção do cão. Treinamento indicado: K9 ou qualquer tipo de ring. Cães de Assalto: excelente para forças policiais e militares especiais, embora não-indicado sequer para o policiamento ostensivo. É o animal que será lançado para dispersar multidões enfurecidas, sem a preocupação dos danos que irá causar a quem ataque. Utilizado para causar o maior dano possível ao inimigo em situações de combate ou na lida de bandidos de altíssima periculosidade. De forma alguma indicado para nenhum outro setor, exceto por proprietários muito experientes e com boas condições de manutenção (local seguro, etc.). Treinamento indicado: ring efetivo ou qualquer outro tipo de ring. Cães Policiais*: grupo que inclui os protetores e os guardiões-protetores, mas treinados no trabalho policial básico e sem causar, pelo tipo de ataque condicionado, danos de grande ordem aos oponentes, diferentemente dos cães de assalto. O schutzhund é o esporte básico de treinamento para esse tipo de cão. Pode-se usar opcionalmente qualquer tipo de ring. Cães Efetivos de Rastreamento: Rastreará pessoas fugitivas e as encurralará ou atacará, conforme treinamento. Apenas indicado para as forças militares ou policiais de elite. Poderá, ou não, acumular funções de guardião ou de protetor. Treinamento indicado: treinamento de faro baixo + faro alto + (schutzhund, ring ou K9), dependendo do desfecho desejado. Se for somente para atacar o perseguido, ring efetivo é o ideal. * Não confundir “cão policial” com o nome dado erroneamente, em alguns locais, ao pastor alemão e alguns de seus mestiços e assemelhados. Devemos levar em conta que as divisões acima expostas têm mais um caráter elucidativo, não devendo servir para toscas rotulações dos membros da espécie canina, e que cada indivíduo deve ser visto e tratado em particular, dentro do enorme universo de sua personalidade. Outro aspecto a

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levarmos em consideração, é que quase nada é definitivo dentro do assunto acima, e que a personalidade e, principalmente, a conduta de um cão pode muito bem, em quase todos os casos, ser alterada em função do treinamento, manejo e outros fatores a ele dispensados, além do avanço da idade do animal. A cinofilia de trabalho é algo tão apaixonante que, por muitas vezes, leva as pessoas a radicalismos e intolerâncias. Por exemplo, muitos cinófilos não concebem cães de trabalho diferentes do clichê ao qual se apaixonaram. Contestar a existência de qualquer um dos tipos definidos acima, de certa forma, além de antidemocrático, denota uma visão míope da cinofilia ante ao conjunto das necessidades da sociedade humana como um todo. Isso porque, cada um destes tipos tem função própria diante das necessidades dos proprietários. Até o, por alguns, condenável, cão sumário, em determinadas situações, pode ser o único recomendável. Por exemplo, imaginemos uma base militar, ou algum estabelecimento que lide com materiais perigosos, como urânio enriquecido, explosivos, etc., e que possa vir a ser alvos de ações terroristas. Um inimigo poderá ser infiltrado e, aos poucos, ganhar a confiança dos cães que não possuam as características sumárias, e, com isso, alcançar furtivamente os locais de acesso mais restrito. Neste caso, milhões de vidas humanas podem estar expostas porque alguém, com idéias intolerantes, discorda da existência de cães assim. Tabela sobre Comportamento e Segurança Necessária à Manutenção de Cães de Guarda Civis: Atacam fora

do território

sem

comando?

Atacam no

território sem

comando

mesmo em

presença do

dono?

Atacam no

território sem

comando sem

a presença do

dono?

Atacam sob

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qualquer

lugar?

Podem não

aceitar todas

as pessoas da

casa?

Mesmo com

muito tempo,

dificilmente

se acostumam

a pessoas

novas?

Grau de

necessidade d ede de

segurança na

manutenção.

SUMÁRIOS D S S D D S AA

GUARDIÕES D S S D N N A

GUARIDÕES-

PROTETORES

N D S S N N A

PROTETORES N N D S N N M

S: sim; N: não; D: depende; A: nível de segurança necessário alto; AA: nível de segurança necessário altíssimo; M: nível necessário de segurança médio.

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O autor, dentre os cães que possui, prefere diversificar e, à exceção de cães sumários, detém de todos outros tipos, pois, assim, melhor poderá dispor deles, de acordo com as eventuais necessidades. Pessoalmente, no caso de termos de optar somente por um ou dois cães, preferimos os guardiões-protetores e, em segunda opção, tanto podem ser os protetores como os guardiões, tendo em vista as necessidades do nosso cotidiano. Por exemplo, alguém cuja maior necessidade seja simplesmente proteger seu quintal tem como segunda ou primeira melhor indicação um guardião, pois este tende a vacilar menos antes do ataque, não perdendo preciosos segundos em avaliar a situação e por ser de mais fácil treinamento. Na tabela anterior, pode-se ver que entre os guardiões-protetores e os protetores, há uma faixa nebulosa no que tange em atacar no território quando da presença do dono e quando da ausência do dono (isso pode ser evidenciado pelos “depende”). Em seu território, os guardiões-protetores sempre atacarão estranhos sem a presença do dono ou de alguém da casa. Os protetores nunca atacarão estranhos na presença do dono ou de alguém da casa. A faixa imprecisa ocorre porque alguns guardiões-protetores poderão não atacar na presença de familiar e alguns protetores poderão atacar sem tal presença. Em tese, o que diferenciaria dos dois grupos, é que, por exemplo, um guardião-protetor, ainda que, em seu território, não ataque pessoa estranha na presença de seu dono, sempre manterá uma postura desconfiada em relação ao estranho. Já um protetor tenderá a ficar descontraído mesmo na presença de estranhos juntamente com o dono em seu território. Mas, isso é muito relativo e subjetivo. Sabemos que pessoas estranhas diferentes despertam reações diferentes dos cães. Mas, quando se trata de cães bem treinados, a atitude comportamental deve prevalecer. Conforme o condicionamento aumenta em virtude de treinamento, as reações do cão tendem a ser mais previsíveis e mais padronizadas. Vejamos o que diz nosso citado Dicionário sobre a palavra "atitude": "ATITUDE - Chama-se Atitude à manutenção de determinado comportamento ou reação ante um acontecimento, independente das características específicas do agente causador ou das demais ocorrências periféricas, bem como, dos estados psíquicos momentâneos do indivíduo. Exemplo seria um cão que atacará estranho que entre em seu território, independente de seu porte físico e de sua habilidade em lidar com cães; independente de chover, estar trovoando ou haver tempo bom; independente do cão estar faminto ou saciado, eufórico ou deprimido. Vide: COMPORTAMENTO." 029 - TREINAMENTO ULTRA-SIMPLES PARA GUARDIÕES: No caso de querer que nosso cão seja um guardião, e, portanto, não tolere pessoas estranhas, um truque muito utilizado é o de uma pessoa desconhecida o chame carinhosamente, procurando ganhar sua confiança. Se o animal começar a “amolecer”, tocá-lo, de surpresa, com uma vara que mantinha escondida nas costas, o que deve ser feito com certa moderação para que não haja risco de um efeito paradoxal inverso. A graduação do toque com a vara deve ser de acordo com o nível de treinamento anterior do cão. Dar um forte toque em um cão que nunca teve qualquer treinamento poderá até estragar

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definitivamente este cão para a guarda. O ideal é apenas um pequeno susto ou ameaça após o cão já ter pelo menos, em parte, sua rapina levantada. Caso isso não seja producente, devemos retornar ao dito em “Rapina para Defesa” e em outros tópicos antes de insistirmos mais no erro. Pode parecer paranóia, mas soubemos de casos de grandes cães protetores roubados dentro de suas casas pela excessiva falta de malícia em relação a intenção de estranhos. Em verdade, um cão estritamente protetor não é, de forma alguma, recomendável para guarda territorial pelo motivo ora exposto. Soubemos de um cão que sob comando atacou três gatunos que roubavam um amigo de seu dono, pegando um deles e causando feridas importantes, enquanto os demais fugiam. Este mesmo cão foi posteriormente roubado de sua casa. Isso deve ter ocorrido pelo fato desse cão sempre, durante, toda sua vida anterior, haver tido sempre sensações gratificantes quando da presença de estranhos. 030 - PROVA DE ATAQUE OU PROVA DE DEFESA? A ESCRAVIDÃO PELO POLITICAMENTE CORRETO: Muito comum, também, é certa reprovação que algumas pessoas, dentro da cinofilia, têm ao termo “prova de ataque”, preferindo sempre “prova de defesa”. Concordo, perfeitamente, que o segundo politicamente é bem mais correto quando desejamos atingir o público leigo. Mas, em verdade, trata-se de um eufemismo, tendo em vista que a única maneira de um cão defender é atacando, ou a possibilidade de fazê-lo. Aliás, muito embora nem sempre seja a melhor defesa, em muitos casos, o ataque, é a única maneira de se defender. Citamos isto, em função de que muitas pessoas, inclusive na cinofilia, às vezes, não têm a devida coragem para expor e defender seus pontos de vista, ainda que totalmente corretos. Isto dá, assim, aos leigos, a impressão de que fazem algo errado e tais cinófilos ficam, pois, vulneráveis aos ataques contra suas posições, ainda que tais ataques sejam infundados e sem nenhum conteúdo real, se analisarmos a questão com um pouco mais de profundidade. Vamos diretamente ao assunto: muitos cinófilos de trabalho ocultam, ou até parecem ter vergonha, desta condição, impressionados pela opinião de pessoas mal-intencionadas ou completamente ignorantes no assunto, de que um cão de trabalho é um animal perigoso, quando bem sabem, tais cinófilos, que isto é uma inverdade. Conhecem bem o assunto e têm a convicção que um cão de guarda, dentro de uma posse responsável, é grande elemento de segurança e não de insegurança, evitando muitas violências. Violências estas que, na maioria das vezes, quando evitadas, nem ficamos sabendo, mas que foram evitadas pela ação ou mera presença do cão. Além do mais, a prova de ataque, ou de defesa, é uma constatação da coragem e equilíbrio desse animal e nos dará a certeza de que ele atacará para nossa defesa e que não atacará quando não o for. Devemos, pois, expor com transparência aquilo em que acreditamos para que possamos mostrar às pessoas em geral que o que fazemos é certo e não errado. Quando, muitas vezes, fugimos ao assunto causamos a impressão de que estamos mal-intencionados, ainda que estejamos cobertos de razão. Concordo, perfeitamente, que, em certos momentos, até será preferível, para evitar polêmica com ignorantes, realizarmos as provas de temperamento em locais longe dos olhos dos leigos, mas sempre deveremos lidar com isso de uma maneira franca. Se, por um lado, não é, de forma alguma, conveniente que saiamos por aí contando bravatas a respeito da coragem e capacidade de ataque dos nossos cães, por outro, não devemos esconder a mão que segura suas

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guias, se delas temos orgulho. 031 - CONTROLE DO BINÔMIO TEMPERAMENTO/CARÁTER NA ASCENDÊNCIA DO CÃO: Se ainda não possuímos nenhum cão e queremos um para ter a finalidade de guarda ou que acumule esta função à de companhia, devemos nos preocupar, além de com a raça do animal, com o efetivo temperamento de seus pais e avós. Portanto, devemos procurar conhecer de perto esses exemplares, ou, pelo menos, verificar se em seus pedigrees consta alguma menção a sucesso em provas de trabalho. Infelizmente, por razões já explanadas em capítulos anteriores, isto só é possível para poucas raças. A cinofilia decorativa diligenciou para que a maioria das raças ditas de guarda não tenham registros de campeonatos de temperamento nos pedigrees para ocultar os fiascos de muitas criações e de muitos criadores não compromissados com a efetividade. Quem deseje adquirir um cão verdadeiramente efetivo deve evitar raças em cujos pedigrees não disponham as qualidades efetivas dos ascendentes dos cães. Algumas raças têm pedigrees emitidos por mais de uma entidade para suprir tal descaso, um exemplo é o dogue brasileiro, no qual há uma entidade responsável pelo seu desenvolvimento que emite pedigrees que incluem os campeonatos dos ascendentes de cada filhote. 032 - HERANÇA, TEMPERAMENTO E CARÁTER – OBJETIVO DAS PROVAS E PARADIGMA FUNCIONAL: Define-se herança psíquica como a parte da personalidade herdada geneticamente. Além da herança, a vida intra-uterina, as vivências infantis e os traumas são definidos como a têmpera que irá atuar sobre a herança. A herança e as demais variáveis citadas é que irão determinar o temperamento. O temperamento é aquela parte já temperada (em uma similaridade ao aço) da personalidade e que dificilmente muda no indivíduo. O caráter é a parte da personalidade que o indivíduo adquire do meio ambiente a partir do ponto em que a estrutura psíquica já está forjada. Por isso, é mais maleável e mais sujeita a mudanças. Tal definição não incorpora somente a capacidade e as características voltadas para cães ou para a guarda, mas todo o conjunto da personalidade de qualquer indivíduo do reino animal que tenha um sistema nervoso central com complexidade suficiente para que se possa fazer tal avaliação. Isso inclui todos os mamíferos. Quando avaliamos um cão no que se refere à sua personalidade, inclusive quanto à sua capacidade de guarda, não podemos avaliar tão somente o temperamento nem tão somente o caráter, uma vez que tais parâmetros não são dissociáveis na prática. No entanto, podemos fazer provas que avaliem teoricamente mais o temperamento ou mais o caráter. As provas realizadas no animal mais jovem, com menos tempo para ser treinado, tendem a incidir mais sobre o temperamento, que carrega consigo um mais forte componente genético. Outras, muito complexas, por vezes, avaliam mais a capacidade do adestrador e o tempo disponível para treino, do que a personalidade em si de um modo geral, principalmente no que tange ao temperamento. É claro, que um adestramento não se faz somente com o adestrador, precisa de um cão que tenha capacidade de assimilá-lo, tanto por ter um bom temperamento como por ter um bom caráter. Mas, existem provas simples que medem, da mesma forma, a capacidade de aprendizado do cão,

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no que e refere à obediência e ao ataque, minimizando até certo ponto o efeito imposto pela competência do adestrador em relação a outro, até certo ponto, menos capacitado. Afinal, o que se pretende selecionar em um cão é o seu temperamento, principalmente no que tange à sua genética, não o tempo que foi adestrado ou a competência de seu adestramento. Não que desprezemos a importância de um belo trabalho de adestramento e a importância para cinofilia da existência de profissionais altamente capacitados Mas, nem sempre tais profissionais estão disponíveis em toda parte, assim como nem todos os proprietários têm recursos para pagar profissionais de alto nível por longo tempo. Fica difícil criar uma raça de cães, em nível nacional, que tenha prova de trabalho obrigatória, sem a existência de provas simples a não ser que tenhamos a participação de profissionais altamente qualificados. Poucos países dispõem de tal tipo de profissionais em abundância, e um percentual de proprietários muito pequeno estaria em condições ou com disposição de pagá-los como merecem. O resultado disso é o que ocorre em quase todas as raças caninas: nem cinco por cento dos exemplares realizam as provas ou as fazem, muitas vezes sob a “vista grossa” dos árbitros, pois não seria viável ser de outra forma. Por fim, o que acontece é que não há um efetivo paradigma funcional. Uns poucos criam de acordo com as exigências funcionais, outros crêem – de forma equivocada – que cão treinado para defender a casa irá morder as crianças e não os treinam; outros que um cão assim irá afastar seus amigos – esquecendo-se que, com competência pode-se treinar um cão do jeito que melhor atenda às necessidades do seu dono, sem tirar dele a função de guarda; outros não treinam para guarda por medo que rosne para o árbitro de exposição de beleza; outros, ainda, por total desprezo e até repúdio a atividade funcional da raça que escolheram, sabendo, desde o início, que se tratava de uma raça de guarda. Ainda há os que têm boa-vontade e respeito à raça que elegeram, mas não têm profissionais habilitados nas localidades onde moram ou recursos financeiros para subsidiar um treinamento de dezoito, vinte quatro meses, cujos resultados, além de tudo, podem não ser os ideais. Define-se como paradigma funcional pelo o nosso já citado dicionário: “PARADIGMA FUNCIONAL – Refere-se a um grupo, raça, linhagem, família ou agrupamento de cães serem criados, selecionados e treinados, na grande maioria de seus membros, para uma mesma função ou atividade, bem como buscando um mesmo tipo de temperamento, caráter e comportamento. Impossível manter uniformidade satisfatória em um conjunto de cães sem que haja respeito a um paradigma funcional em sua seleção e treinamento.” Portanto, como manter uma uniformidade razoável da personalidade de uma raça quando menos de cinco por cento de seus membros são avaliados seriamente? Obviamente, que o grau de complicação das provas é inversamente proporcional ao percentual de cães avaliados e selecionados, de tal forma, para reprodução, pois menos proprietários estarão dispostos a realizá-las em função dos gastos e da complexidade exigida. Além do mais, por mais simples que seja uma prova, e mesmo que o treinamento para ela possa ser realizado até por amadores, um profissional competente sempre irá se destacar entre os demais,

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pois adestrar é muito mais do que estabelecer condicionamentos formatados. É, antes de tudo, capacidade de perceber as necessidades de cada cão e como contorná-las. Muito mais do que aprender conceitos quase inúteis de como usar a mão para segurar o enforcador, é entender a etologia canina em sua essência. É, acima de tudo, ter a mente aberta e a visão ampla. Para a categoria profissional dos adestradores, nosso recado é que com provas mais simples o número de clientes e de cães aumentaria exponencialmente. Muito embora, o treinamento pudesse ser completado em menos tempo, e cada cliente acabasse por pagar menos por ele, o número de clientes e a margem de lucro por cão adestrado (uma vez que ficaria mais fácil aos donos pagarem, e se poderia cobrar proporcionalmente mais pelo tempo dispensado) determinariam uma muito melhor e mais estável remuneração para os profissionais da área. 033 - PROVAS SIMPLES, MAS DURAS. CRITÉRIO DE PREMATURIDADE PARA SELEÇÃO MAIS VOLTADA AO TEMPERAMENTO DO QUE AO CARÁTER: A criação de provas simples e de baixa complexidade, mas que avaliem de forma objetiva e competente a personalidade dos cães deve ser a estratégia de seleção das raças efetivas. Tais provas devem ser incrementadas, tanto na esfera da obediência como da guarda, a qual inclui rapina, defesa, resistência à dor, objetividade, eficiência da mordida, capacidade de reação ao imprevisto, etc. Devem procurar medir também o equilíbrio psíquico, procurando sempre ser seletivas. Isto é, os cães devem passar por uma prova dura, mas simples, e que os qualifiquem conforme as qualidades específicas. Uma única prova básica e obrigatória deveria ser implementada para que cães de raças de guarda possam conquistar outros títulos, tanto de temperamento quanto de morfologia. Muito embora, como já foi citado, seja impossível dissociar temperamento e caráter, na teoria entende-se qual o significado de cada um desses parâmetros. Embora, também, não se tenha realizado nenhum trabalho epidemiológico para provar a hipótese teórica, é de se imaginar, por uma questão de bom senso, que a idade e o tempo são fatores que contribuem para incrementar o caráter, enquanto o temperamento conceitualmente é fixo, já que se determina antes do início da vida adulta. Um cão de oito, nove meses de vida teve pouco tempo de adquirir muitas qualidades se comparado a um cão de três ou quatro anos, ou mesmo a um cão de ano e meio de idade. Portanto, é teoricamente compreensível que, numa média bem expressiva, um cão mais jovem tenha proporcionalmente, em sua personalidade, componentes genéticos com muito maiores pesos do que um cão adulto. A nossa sugestão seria para que tais provas tenham duas premiações: uma para até certa idade – dependendo da prova, e outra para o mesmo resultado a partir desta idade. Com isso, se seleciona, com razoável grau de certeza, tratando-se de um universo de muitos cães, o grupo que tem temperamento mais adequado, o que será expresso na prematuridade. “PREMATURIDADE – Qualidade de um cão ter alguma distinção em idade inferior à média dos indivíduos de sua raça ou espécie. Qualidade de uma raça ter alguma distinção em idade inferior à média dos indivíduos de sua espécie. Animais que demonstrem prematuridade em algum fator têm maior tendência de que estas estejam mais associadas ao seu temperamento e à sua genética – do que a seu caráter. Portanto, através da prematuridade, podemos ter um parâmetro de seleção melhor para distinguir as qualidades individuais herdadas e estipular uma melhor seleção racial. É provável também que animais que apresentem uma qualidade mais precocemente possam repassar com mais

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ênfase tal qualidade.” (Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos”). À exceção da prova de estrutura, cuja classificação varia tão somente com o que é apresentado, e as provas longas de ring, em todas as demais provas, os cães deveriam ser classificados em dois grupos em relação à idade com que a obtiveram. Assim seria para o campeonato básico de ataque, no qual os cães deveriam receber títulos específicos de acordo com a idade em que conseguem obtê-los. Cada raça deveria ter a sua especificidade, mas uma boa sugestão seriam os 10 meses de vida como marco divisório. Isso de forma alguma significa que um cão que obteve um título antes de completar a idade determinada fosse melhor do que o que conseguiu um título antes dela, mas, com certeza, aponta os primeiros como os que têm maior potencial teórico de transmitir uma boa genética para o ataque. Assim deveria ocorrer também com a prova de obediência, havendo títulos diferentes para cães que fossem aprovados numa mesma prova em idades diferentes. Para seleção temperamental, as provas de obediência não precisam ser complicadas, basta que se avalie, dentro do que é de mais básico, o quanto um cão tem capacidade de obedecer. Um cão que até certa idade permaneça sentado por um minuto sem se mover, mesmo com estímulos diversos sendo criados ao seu redor demonstra muito mais confiabilidade, no que tange a imprimir em seus descendentes qualidades de obediência passiva do que outro que bem mais velho aprende coisas mais complexas, fruto de enormes esforços por parte do adestramento. E o que é também igualmente importante: a prova sendo simples pode abranger um universo muito mais significativo de cães e, portanto, selecionar muito melhor uma raça. O mesmo deveria ocorrer com as provas que a um só tempo auferissem capacidade de proteção e de obediência. Um limite de idade deveria ser imposto para títulos diversos nessa área, sendo que essas a idade limítrofe deveria ser quatorze, dezoito meses, conforme complexidade de cada prova. Na mesma e idêntica prova, um título diferente seria dado a um cão que passasse mais precocemente por essa prova e outro título seria dado a outro cão que só conseguisse passar por ela em idade mais adiantada. Observamos que na raça dogue brasileiro a existência de testes de ataque em dupla, onde se procura comprovar que os cães são aptos para trabalho de guarda efetiva em matilha. Esses testes são divididos em ataque em dupla com o sexo oposto e ataque em dupla com o mesmo sexo. Inversamente, os ataques conjuntos graduam em sentido inverso. Isso porque é bem mais fácil que dois cães jovens não briguem durante um ataque conjunto a um mesmo figurante com bite do que dois cães maduros não o façam. Caninos de um modo geral, salvo algumas exceções que se limitam a atacar presas pequenas, como é o guará, agem em matilha. Sua enorme eficiência está no ataque em matilha. Vejam as hienas, que embora não sejam tecnicamente caninos, se assemelham fisicamente aos caninos e utilizam tipos de ataque semelhantes aos dos caninos. Portanto, na guarda efetiva uma matilha é muito mais eficaz do que um cão isolado. Diria que se um cão vale por cem, dois cães valem por quinhentos e três cães valem por mil. As provas de ataque conjunto, outrossim, são também um divisor de águas entre os cães com temperamento de rinha e os verdadeiros guardas. Por fim, interessante seria a criação de um título de manutenção de qualidade, ou de veteranos, que nada mais é do que a prova de campeonato simples aplicada após o cão completar certa idade a ser

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determinada, conforme raça. Dez anos nos parece um bom referencial para uma raça que alcance longevidade de 13 a 14 anos. Essa prova seria de suma importância, pois selecionaria cães que, além de ter qualidade mantêm essa qualidade, como a longevidade dos exemplares. Provas como essa sendo utilizadas como critério de seleção podem aumentar a expectativa de vida do grupo que está sendo selecionado ao longo das décadas. Certa ocasião, uma pessoa nos perguntou qual era a vantagem do ataque em dupla, pois era muito mais fácil um cão atacar em conjunto do que só, e o que queríamos provar com isso? Primeiramente, achamos muito engraçada a mentalidade de que tudo que se faz em cinofilia tenha como objetivo provar algo. Quanta insegurança! A prova de ataque em dupla é uma prova de beleza plástica indescritível, muito empolgante de ver. Em segundo lugar, é claro que atacar em conjunto necessita de menos coragem do que atacar só, mas, como dissemos anteriormente, é um marco divisor entre cães com tendência a rinha e guardas efetivos, o que é importantíssimo na seleção de uma raça de guarda. E é isto que queremos provar. Lembrei também a esta pessoa que nenhum cão participaria de nenhuma prova antes de ter sido aprovado pela prova básica de uso de bastão com força máxima e de pressão psicológica, o que é feito individualmente, e que a coragem dos cães já estaria provada. E se for para provar coragem, nada melhor do que a prova de invasão, quando um estranho invade o território do cão vestindo bite, atacando-o e batendo galões cheios de brita, que estará totalmente só, sem outro cão, sem ninguém da família para lhe apoiar psicologicamente. Há outro importante e sutil fator: cães que exerçam um drive de caça “fajuto”, ou seja, aquele no qual atacam o figurante visando a manga ou entendendo que o figurante em seu bite é uma “caça” facilmente abatível, sem que, para isso, necessitem alguma coragem, podem acabar brigando pelo figurante (observem, pelo figurante e não com o figurante), pois vêem nele um prêmio e não, corretamente, um inimigo ou uma “caça grande” para qual a ajuda é bem-vinda. Não estarão verdadeiramente em luta, mas no máximo em fair game. Ledo e fatal engano pode ser crer que um ser humano é uma caça fácil de ser abatida, principalmente se tiver a seu alcance utensílios que possa usar em sua defesa. Tal comportamento advém de treinamentos em que não foram exigidos toques razoáveis de bastão, e que o cão levou até meio na brincadeira, quase como um fair play. O toque severo de bastão eleva a defesa, mesmo durante o desenvolvimento da caça, averigua a capacidade de o cão em suportar o revide e seleciona corretamente um bom drive de caça em seu nível mais alto, aquele em que o cão, mesmo sabendo do perigo do oponente, o ataca. Em suma, não podemos considerar satisfatório um drive de caça que não exige ou exige muito pouco, da coragem do cão. Quando nos referimos a drive de caça, ou de rapina, não desejamos ao equivalente ao do cão selvagem utilizado para caçar um coelho, mas ao equivalente, na vida selvagem, ao necessário para enfrentar um animal de grande porte e de poder de reação, como um alce, um javali, em termos de coragem e determinação. Um drive equivalente ao de abater um coelho não será suficiente para enfrentar um agressor humano bem determinado. 034 - PREMATURIDADE, UMA FACA DE DOIS GUMES: Filhotes que demonstram precocemente drive de defesa elevado demais podem ser cães adultos de má qualidade.

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Paradoxalmente, os melhores cães reagem bem a provocações precocemente mesmo em nível de drive de defesa. Por via das dúvidas, muitos preferem descartar filhotes que tendem a atacar em idade muito jovem. O que temos a dizer é que fazer isso sem avaliar outros parâmetros pode ser um erro brutal na seleção de cães de guarda. A defesa muito precoce pode ser desequilíbrio do sistema adrenérgico ou dos mecanismos psíquicos do cão, herdado ou adquirido, cujo medo pode ser o fator desencadeante. Tal desequilíbrio se manifesta com insegurança tamanha que pode aparecer precocemente como medo e reação a ele. Este cão tem grandes chances de se tornar um cão com pouca capacitação para o trabalho, um cão agressivo (isto é, aquele que ataca por desequilíbrio e não por necessidade ou comando). Por outro lado, não se pode afirmar com certeza que uma defesa precoce provém necessariamente do medo ou do desequilíbrio psíquico. A precocidade da defesa pode ocorrer por seleção genética de animais com melhores drives de defesa resoluta. Nesse caso, não seria um defeito e, sim, uma qualidade. Por isso, não se pode afirmar com segurança que mesmo que a defesa seja o móvel do ataque precoce, sem qualquer estímulo exterior, que isso se deve ao fato do cão ser inseguro. A explicação, paradoxalmente, pode estar em seu oposto: a do filhote amadurecer precocemente sua segurança a ponto de não temer um homem adulto mesmo aos quatro, cinco meses de idade, ao mesmo tempo em que já demonstra uma defesa precoce. Treinamentos, como o de triangularização da defesa podem ter sido bem sucedidos sem trazer qualquer insegurança ou trauma ao filhote (ver “121 - Triangularização da Defesa”). No entanto, não se deve confundir filhotes com defesa precoce dos com rapina precoce, e que, manipulada da forma relatada no item "Rapina para Defesa", transformou-se em elevação precoce do drive de defesa. É evidente, que, na duvida, seja preferível não optar por um filhote assim, ainda mais se não se não houver como diferenciar uma coisa da outra, e isso, é claro, vai depender da futura utilização do filhote. Pode parecer contraditório, mas como em muitas outras situações, os opostos, por vezes, são parecidos. Se por um lado, corre-se o risco de desprezar um excelente cão, por outro se corre o risco também de optar por um animal que pode ser de temperamento muito ruim. Para isso, é necessário que se conheça a descendência do animal para ter uma melhor base para conhecimento. Mais do que conhecer a descendência, analisar outros fatores irão nos dizer se uma defesa precoce é de excelente ou de má qualidade. Não se pode definir tal fator isoladamente sem a leitura de outros dados. Uma maneira de distinguir um extremo do outro, seria aumentar o nível da agressão e analisar a reação. Se o filhote se mostrasse firme seria porque é das melhores cepas. Do contrário, é o oposto. Só que não recomendamos tal método, pois no caso do cão ter tal comportamento por insegurança – o que dependendo da raça ou da linhagem, pode ser o mais provável, o próprio teste poderá, com grandes chances, piorá-lo a ponto de tornar irrecuperável. Teríamos então que tentar recuperá-lo até um ponto satisfatório, dependendo do nível de qualidade a ser considerado. Podemos, também, ter um grande cão que venha a ter o temperamento quebrado com testes exagerados, motivados apenas pelas nossas dúvidas e inseguranças. Creio que a melhor e mais fácil maneira de saber a questão acima é incitar o cão para rapina, através

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de um pequeno esboço de ataque lançado. Se o filhote comparecer, é porque é dos melhores. Do contrário, as chances são quase todas de que se trate de um filhote cujo temperamento deva ser trabalhado com muito mais cuidado ou deva, o animal, ser descartado para a guarda familiar. Um filhote com boa rapina, dificilmente será um filhote medroso. Em caso de dúvida, esse é um bom teste, embora não nos dê todas as respostas. Outra maneira é analisar as manifestações clínicas da exacerbação das catecolaminas. Um cão de alta defesa com qualidade positiva não deverá, em princípio, arrepiar o pêlo. No entanto, um cão que pouco arrepie o pêlo, erga a cauda e demonstre-se tranqüilo ainda que com firme propósito de ataque, deve ser o preferido entre todos os demais. Veja mais em “038 - Defesa e Fuga”. Nota do autor em um site de relacionamento: “Existem também cães que "viram" guardas com um ou dois treinos. Outros que demandam inúmeros treinos para chegar ao mesmo objetivo. Minha velha Gaia não nasceu fazendo guarda, mas respondeu ao primeiro treino, aos 6 meses de idade, como se tivesse feito guarda a vida toda. Tive outro cão, Pólo, foi idêntico, suportou bastão efetivo total aos 5 meses. Outro exemplo de nunca se esquecer foi a cadela Juma, dada a mim aos 9 anos sem qualquer tipo de treino e mesmo sem exercícios físicos. Ela revidou com intensidade máxima de luta ao primeiro teste. Guardei a cadela, pois ela já estava pronta e evitava morder a manga buscando o figurante e suportando o rigoroso bastão efetivo. E o impressionante é que tinham elevado controle e obediência, alta resistência à dor, drives (especialmente de rapina) muito elevados. O nível de seleção entre usar um cão desses e usar um que faz o mesmo após muito treino é incomparável. Por isso, selecionamos os cães pela precocidade. Cães assim são exceções em qualquer raça. Temos que dizer isso para não gerar expectativas que podem ser frustrantes. Se o cão será para guarda tão somente, já ir dando imprintings de guarda efetiva desde o início. Só que, aí, o cão não irá servir para esporte, pois terá menor controle, o que não significa controle zero. A vantagem é a mordida mais violenta. É graduado o grau de defesa (de insegurança também?...) que o cão deve ter para ser mais arisco e morder com mais raiva. Para grande maioria dos cães, sim. Mas, há cães que nascem assim. São raros em qualquer raça. Mas, se fossem usados como seleção... seria o ideal. Só que não há como saber, exceto pelo proprietário. Aí, teríamos que crer no que ele diz. Fica difícil, exceto em uma comunidade pequena de poucas pessoas. A melhor forma de selecionar cães é quando eles são jovens. A precocidade é o fator mais importante, pois é o fator que dá mais penetrância da qualidade temperamental a ser repassada aos filhos e netos. Isso, pois, há menor modulação do espécime ao ambiente. O que aparenta é natural (genético) em sua maior parte.” Comunidade pequena de poucas pessoas. 035 - FORMATAÇÃO DO TEMPERAMENTO: Além das variáveis genéticas, existem as demais variáveis impostas pelo meio ambiente, que já se iniciam no período de vida intra-uterina. Uma mãe não sujeita a stress prolongado tem muito mais chances de ter uma ninhada sadia, pois as

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catecolaminas geradas pelo stress podem causar vasoconstrição das artérias que servem aos fetos, diminuindo, desse modo, o suprimento de nutrientes e oxigênio. O stress fará também que esta mãe se alimente mal, mesmo que tenha comida à vontade, e que digira mal os alimentos. Aumentará inadequadamente os níveis de cortisol que prejudicarão a ela e a seus filhotes. Isso não significa que não possamos permitir alguma provocação leve à mãe, justamente para que tais hormônios influam positivamente no caráter dos filhotes. Há que diferenciar duas ou três elevações esporádicas dos níveis hormonais, com um período inteiro de gestação, ou grande parte dele sob stress. Essas provocações, no entanto, nunca deverão ser suficientes para gerar stress e de acordo com a capacidade de cada cadela. Além do mais, não devem ser fisicamente capazes de prejudicar a gestação causando um rompimento de bolsa placentária ou uma hemorragia. Se forem feitas, devem ser leves e a considerável distância, mantendo um desfecho da cadela vitoriosa sobre os “invasores”. Particularmente, preferimos não treinar cadelas gestantes. Outro fator fundamental é o período de lactação do filhote. Cadelas histéricas e estressadas são responsáveis por filhos de temperamento fraco. Isto também ocorre com cadelas alienadas em relação a seus filhos. Filhotes criados sem a proteção materna tendem mais a se tornarem adultos inseguros. Muitas vezes, problemas com a mãe, no período em que o cãozinho mama, podem trazer seqüelas insuperáveis. Portanto, uma boa alimentação, calma e paciência com a mamãe cadela, por parte do dono e seus familiares, são elementos essenciais para termos uma boa ninhada, além de um local seguro e sem ruídos excessivos. A cadela tenderá a passar aos filhotes parte do tratamento que dispensarmos a ela, tanto durante a gravidez como durante a lactação. Repetindo o que foi dito no parágrafo anterior, podemos até realizar algum treinamento de temperamento durante tal período, mas com muito cuidado e se tivermos muita experiência, a fim de que a mãe passe aos filhotes algum nível positivo de hormônios, mas devemos ter todo o cuidado para que isto não venha associado ao stress. Muito menos, devemos permitir exercícios de ataque violentos onde haja risco de hemorragia, etc. Mesmo no período pós-amamentação, a tranqüilidade e o sossego que venha a usufruir o filhote são muito importantes para sua formação. Muitas pessoas, indevidamente, imaginam que deixando os filhotes irritados teremos bons guardiões. Puro engano. Filhotes estressados geram adultos perturbados, sem condições de assimilar treinamento e mesmo de adquirir um bom levantamento de seus drives. Como foi dito anteriormente, não podemos confundir agressividade – que deriva do descontrole psíquico - com bons drives de defesa ou de rapina. Embora as fases mais jovens sejam responsáveis, com maior ênfase, à formação da personalidade, não podemos deixar de lembrar que o cão, assim como nós, está sujeito, por toda sua vida, aos efeitos negativos do stress e da depressão, por padrões de vida ruins. Esses padrões incluem má alimentação; abandono; confinamento; falta de exercícios; repreensões desproporcionais; ser escorraçado constantemente, às vezes, até por algum empregado da casa; excesso populacional do canil; ruídos excessivos; etc. Por outro lado, um ambiente calmo, de carinho, de valorização ao cão, comida gostosa, água fresca, passeios, exercícios sem exagero, elogios, bom espaço, sentir-se querido por todos, etc. só irão contribuir para a formação de grande cão de guarda, além da carga genética e dos corretos treinamentos. Quanto aos treinamentos em si, teremos muito a exemplificar sobre no decorrer deste capítulo. O

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incentivo da rapina com a bolinha em nível de fair play, como da obtenção paciente de uma maior gana durante a transição do fair play para o fair fight, tudo isso dando base a um bom desenvolvimento futuro do fair fight e da luta. A elevação da defesa através de sua triangularização, a ser explicada no item 121 deste mesmo capítulo. Todo esse treinamento formatará a parte do temperamento adquirida e especificamente chamada de imprinting, essencial para a obtenção de um bom cão de guarda. 036 - HERANÇA PSÍQUICA - SELEÇÃO: Diferentemente das variáveis influenciadas pelo meio ambiente, a herança genética depende apenas dos genótipos dos pais. Mas, isso não significa que não possamos influenciar o temperamento dos filhotes que venhamos a ter antes das coberturas. É questão de selecionar o temperamento dos cães que usaremos nas coberturas. Deve-se evitar ao máximo possível cruzar cães com baixos drives de proteção ou agressivos. Os cães com bons temperamentos devem ser sempre os preferidos, desde que gozem de boa estrutura e, principalmente, de saúde. Não se deve utilizar de inbreedings mesmo entre os melhores cães, salvo raríssimas exceções. Jamais irmãos inteiros, e mesmo quaisquer coberturas entre parentes em primeiro grau devem ser sempre evitadas. Tais coberturas podem trazer ao fenótipo partes ocultas nos genótipos e que poderiam ficar sem ocorrer para sempre. Mas, uma vez demonstradas, têm maior tendência de serem repassadas e comprometer para sempre uma linhagem. Isso vale não só para o temperamento, mas, ainda pior, para a saúde dos cães na forma de doenças geneticamente transmissíveis. Se entre cães os de bom temperamento a escolher, tivermos um cujos pais, avós, bisavós, etc. se destacam também por essa qualidade, esse deve ser o escolhido para padrear nossa cadela. Cães que ataquem ou mesmo rosnem para seus donos devem ser sumariamente afastados do processo reprodutivo. Aliás, o cão que rosna, via de regra, não é um cão de bom temperamento ou bom caráter. O rosnado é um sinal de agressividade e de aviso que uma agressão está para acontecer. Lembrem-se, agressão não é fruto de trabalho de guarda coerente. É fruto de descontrole emocional ou psíquico. Além do mais, um cão com bom temperamento de guarda não avisa, pois o aviso é, em contrapartida, uma forma de evitar o ataque. Um bom cão de guarda ataca com prazer e não faz nada para afugentar sua presa antes do ataque. Pelo contrário, ele quer que sua caça não fuja. 037 - LUTA. CONDIÇÃO INTERATIVA ENTRE RAPINA E DEFESA? - MORDIDAS ASSOCIADAS: O autor sempre defendeu a idéia de integração entre rapina e defesa. Muitos adestradores diziam ser impossível associar esses dois drives, e isso foi motivo de comentários em vários tópicos anteriores onde se discutia sobre drives. Tal interação já foi chamada de "drive de luta", mas negligenciado por muitos que só buscam vantagens competitivas na utilização dessa interação, pois ela diminui os níveis de controle necessários a um bom rendimento no esporte. A escola americana, principalmente através de Frawley, preconiza que o "drive de luta" e diz que este deve ser obtido através da progressiva irritação que o figurante provoca no cão em sua luta pela caça (onde "caça", provavelmente possa designar a manga). Ou seja, assim como nós, Frawley inicia pela rapina e integra a ela a defesa.

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Temos, no entanto, alguns pontos a comentar. O primeiro é que não tínhamos absoluta certeza que o "drive de luta" é um drive em separado que se formou pela integração de dois outros. Mas, talvez, a evolução natural do drive de rapina, que começa no fair play, fair game, fair fight e progride até a luta (e o fair fight já não seria a luta? Quais as diferenças entre eles? Vejam logo a seguir). Vejam o tópico “Rapina para Defesa”. No entanto, após analisar com profundidade as interações psíquicas do cão, passamos a concordar que Frawley está com a razão ao mostrar que rapina e defesa podem se agregar em algum ponto do treinamento. Nossa opinião particular sobre tal assunto é de que luta é a condição na qual rapina e defesa resoluta atuam juntas, e que drive de luta é a simples condição na qual os drives de rapina e de defesa são de grande intensidade e reagem simultaneamente. O segundo, é que não consideramos como caça jamais a manga ou a lingüiça, quando estas estiverem em mãos de estranhos (figurantes ou cobaias). Tais acessórios serão considerados como caça, assim como a bolinha, apenas quando em mãos de pessoas definidas "como das relações do cão". E, em verdade, nem devem ser usadas – se levarmos a sério o treinamento efetivo – em mãos de pessoas não estranhas ao cão. No caso, na presença do figurante, este deverá ser a verdadeira caça. Por isso, o trabalho básico de figuração, a partir de certo ponto do fair game, deve ser realizado com bite assim que possível, isto é, assim que o cão tiver uma boa mordida para isso. Por isso, também, que recomendamos com restrição ataques a objetos em mãos de pessoas das relações do animal – principalmente da família – a partir de um ponto no início do fair game. A caça, além daquela personificada pelo figurante, só deve ocorrer como um mal necessário para incrementar o desenvolvimento inicial da rapina na formação dos imprintings antes que o filhote tenha condições de atacar bites, etc. O uso da lingüiça e da manga deve ocorrer, enquanto da iniciação e da correção da mordida. O figurante deve aparecer, após as etapas mais avançadas do treinamento, o mínimo possível munido de outro acessório que não seja o bite e equipamentos que já direcionem a mordida para onde queremos que ela realmente venha a ser aplicada, como o jambier. O figurante, também, só deve aparecer usando lingüiça ou manga em somente três situações: quando o cão precise aprender a morder; usar a lingüiça de forma coadjuvante e banalizada para atrair para o figurante em si o alvo do ataque e justamente descanalizar o cão de tais objetos; e, finalmente, para ensinar o cão a ter uma mordida mais consistente da que está aplicando no bite. O terceiro, fortemente associado ao segundo, é exatamente a existência de dois personagens distintos: alguém das relações do cão e alguém estranho ao cão (figurante) para o treinamento de proteção. A defesa e mesmo a caça a partir de certo ponto do fair game, só serão estimuladas por este segundo personagem, e o fair play apenas pelo primeiro. Tal procedimento, sem dúvida, minimizará de maneira importante conflitos inerentes ao treinamento de ataque e auxiliarão ao cão distinguir que, na figuração, a caça é o próprio figurante. Veremos em "045 - Ponto de Corte no Treinamento - Por qual Caminho Iremos Trilhar?", o caso de querermos um cão com violência total na proteção à custa de perder um pouco do controle durante o ataque, e o caso inverso, onde o controle durante o ataque sacrifica em parte a eficiência do ataque. Essa diminuição do controle em função do aumento da intensidade só acontecerá quando da proteção e somente nos momentos em que o cão deve soltar o figurante ou parar um ataque lançado. O controle nas demais situações não será afetado em nada, desde que o trabalho mais rigoroso de obediência geral somente seja implementado em situações diversas das de quando os drives de proteção estão sendo estimulados.

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Para entender mais sobre níveis de drives, vamos usar o exemplo de animais selvagens para exemplificar as situações de rapina, luta e defesa: Fair Play: um filhote de leão que persegue uma borboleta ou brinca com a cauda da mãe. Tipo de mordida: sem muita firmeza, sem força, quase sempre com a parte da frente da boca, às vezes com a "boca cheia". Não tem intenção de machucar o oponente. Nenhuma, ou quase nenhuma, alteração nos níveis adrenérgicos. No cão, seria um filhote ao perseguir alegremente uma bolinha em um treino. Fair Game: uma leoa que persegue e abate um filhote de antílope. Notem que houve aumento substancial do nível do esforço e da tensão empregada com conseqüente e moderado aumento dos níveis dopaminérgicos. Tipo de mordida: "boca cheia" é a mais comum, mas com firmeza e força. Visa impedir que a presa fuja. Quantos mais dentes segurarem a presa, mais difícil será dela escapar. O carnívoro se submete a alguns coices sem grande potencial de feri-lo. No cão, um filhotão que aprende a segurar uma lingüiça e a tenta tomar para si. Fair Fight: uma leoa que ataca uma búfala e encontra resistência severa, mas não desiste. Observem o incremento do fator reação e o maior esforço exigido ao predador, não só de correr, mas de submeter o animal. Tipo de mordida: predominantemente de boca cheia, com ainda mais força e determinação. Visa submeter presa grande através de esforços grandes. O carnívoro se arrisca a golpes duros, suporta se preciso algum nível de dor e tem disposição para tanto. Os níveis dopaminérgicos se elevam, junto com um aumento não tão importante das demais catecolaminas, e aumentam a resistência à dor, a força, a agilidade e os reflexos. No cão, seria a situação em que este ataca um figurante na manga, a pega de boca cheia e é submetido a toques fortes de bastão sem chegar à luta, mantendo a pegada de boca cheia. Luta: neste caso, a búfala reage com tal rigor e eficiência que fere ou ameaça com relevância a leoa. Existe certo equilíbrio no combate. No tipo de mordida aumenta a predominância dos caninos. A intenção do predador é de ferir e se defender da presa e não simplesmente de segurá-la. As mordidas tendem a ser mais dilacerantes com sacolejos vigorosos. A leoa percebe que necessita não só segurar, mas ferir a presa. Os níveis dopaminérgicos se mantêm, mas os percentuais de noradrenalina e adrenalina começam a aumentar de forma mais significante. A resistência à dor, a força, a agilidade e os reflexos pouco - ou nada, aumentam, pois já haviam chegado a um nível máximo – ou quase - no fair fight. Mas, as mordidas tornam-se ainda mais fortes, mais raivosas. No cão, equivaleria à situação em que os golpes dados pelo figurante chegam a seu máximo ou próximos disso, e o cão reage violentamente, mas mantendo a segurança, sacoleja a mordida, usa mais os caninos, pode trocar os locais das mordidas, mas morde sempre violentamente e com a intenção máxima de ferir. Defesa Resoluta: um leão que disputa com outro o território e as fêmeas. Uma leoa que protege seus filhotes de outro predador. Mordidas e comportamentos idênticos ao da luta, tanto para o grande felino quanto para o cão. A diferença estaria apenas na fase inicial. Enquanto que na luta o animal em questão busca o confronto, na defesa, ele é conduzido ou forçado ao confronto. A noradrenalina e a adrenalina aumentam, mas ainda em níveis de conforto para o animal que tem controle sobre suas ações.

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Defesa Simples: Esse é um nível instável de defesa. Imaginemos a situação de uma leoa que, perto de sua presa abatida, percebe movimentos sob a relva. Ela percebe o perigo, mas não sabe bem o que vai enfrentar. Digamos que há hienas. Ela luta com as hienas e as testa na luta. Ela está insegura, mas não o suficiente para entrar em pré-fuga. Ela ainda confia em sua capacidade de luta, mas não suficiente para que ataque francamente o inimigo. Conforme for o número, a disposição e força das hienas, a leoa pode ter reação diversa. Pode partir para um ataque franco e destemido ou pode apenas tentar afugentar as hienas, mas pensando também em, se for preciso, fugir. No cão, é a situação em que o cão morde a manga, mas não está muito seguro nem tampouco confiante. Em verdade, avalia o adversário enquanto ataca. Sua mordida é predominantemente com os caninos, não morde de “bico” (exclusivamente com os incisivos), mas também não é muito confiante para abocanhar fortemente. Pode o animal rosnar, não o rosnado quase que desesperado da pré-fuga, mas um rosnado grosso, que vise impor respeito e medo ao adversário. Os pêlos estarão eriçados, mas a cauda não estará baixa como na pré-fuga. Poderá sacudir a mordida para os lados, mas sem a determinação da defesa resoluta. Na defesa simples, o animal, seja leão ou cão, ainda tem a forte intenção de se impor, mas evita se expor a um combate mais acirrado. A noradrenalina e a adrenalina começam a chegar a um nível intermediário que o animal ainda pode controlar, mas que começa a se tornar perigoso. Pré-fuga: um leão é acossado por outro leão e o teme. Mas, tenta ainda afugentar o oponente. Realiza uma reação tentando espantá-lo. Pode ser que consiga ou não, e isso dependerá mais da reação do outro leão do que de sua própria capacidade. Quer evitar o confronto, mas não irá ceder sem alguma resistência, sem tentar impor medo ao rival. Não tem intenção de ferir de fato, pois poderá provocar reação violenta do inimigo e ambos sairão muito machucados. Quer apenas que o oponente fuja. Se este não se intimidar, ele, sim, irá fugir em breve. No cão, será uma situação em que o cão morde a manga, mas tem medo. Tenta espantar o adversário, mas está pronto para uma fuga, caso o adversário resista ou aumente o grau de ameaça ou de castigo. O animal ficará inseguro, excessivamente tenso: uso predominante dos incisivos ou dos caninos, mas sem determinação, mordidas curtas e rápidas mal direcionadas, acompanhadas de rosnados mais agudos. Em princípio, visam mais afugentar do que ferir o adversário, mas são pouco eficientes e já indicam, em breve, fuga. A força das mordidas diminuirá conforme aumente a insegurança. Pêlos arrepiados para aumentar a silhueta, cauda baixa para proteger os genitais, lábios erguidos para mostrar os caninos. Ainda mais altos níveis de noradrenalina e adrenalina associados, que farão despencar rapidamente a capacidade física e emocional. Pode-se sempre substituir "leão" e "leoa" por "cão" e "cadela", respectivamente. Substituam antílopes, búfalos, hienas e outros animais, pelo modo com que o cão encara a pessoa que interage com ele nas investidas. Qual o estado mais eficiente numa situação real? Cremos, sem nenhuma dúvida, ser a luta, seguida pelo fair fight. Os demais são ineficientes para o que chamamos de guarda efetiva como ineficientes o são para que um predador abata uma presa violenta. Algo que precisa ser dito é que nem todo cão obedece à seqüência fair play, fair game, fair fight, luta. Alguns cães, simplesmente, não interagem no fair play e só vão interagir no fair game ou no fair fight. É preciso não se esquecer que tais cães, em verdade, não estão preparados da mesma forma do que um cão que progrediu em tal seqüência acostumando-se ao uso progressivo do bastão. Tais cães, ainda assim, também precisarão de uma modulação progressiva no uso do bastão e que leve em conta que não estão ainda acostumados a seu uso. Ainda que estejam em fair fight, o uso do bastão não deverá iniciar no mesmo nível de outro cão, nesta mesma etapa, mas que já havia

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recebido golpes progressivos no fair game. Em cães que iniciam em níveis altos de rapina ou na defesa, o condicionamento do “SOLTA” também será difícil de ser realizado por métodos de estímulos positivos. Ver mais sobre isso em: “062 - Lingüiça, como Usá-la Canalizando o Cão para o Figurante”. Geralmente, isso acontece em cães que começam mais tardiamente o treinamento ou que mantinham baixos níveis de rapina na idade mais jovem e que só começaram realmente a interagir com o figurante em nível de fair fight ou de fair game já chegando ao fair fight. Há cães que não demonstram mesmo na tenra idade nenhum estímulo de correr atrás de bolinhas, mas que podem demonstrar grandes estímulos de lutar pela posse da lingüiça. Para concluir este item vamos colocar os conceitos de nível de drive e de intensidade de drive: NÍVEL DE DRIVE – Um mesmo drive pode ter diferentes categorias (ou níveis), motivadas por estímulos diversos. O termo se aplica mais ao drive de rapina, mas pode conceitualmente se aplicar ao drive de defesa, diferenciando a Defesa Resoluta da Defesa Simples e da Pré-fuga. O drive de rapina, por exemplo, não é o mesmo para um cão que busca uma bolinha e para o cão que busca com disposição enfrentar de forma violenta um figurante. Ao primeiro nível retro exemplificado, chama-se Fair Play, e ao último, Fair Fight. Há um nível intermediário, ao qual se chama de Fair Game. Nem sempre um cão com alta Intensidade em um nível de drive, a terá proporcionalmente em outro nível deste mesmo drive. Os motivos disso são: (1) os estímulos são diversos, isto é, não é a mesma motivação que leva perseguir uma borboleta e enfrentar um figurante bem disposto. (2) No fair play, não há qualquer revide da presa. Muitos cães têm disposição seletiva, isto é, apresentam disposição de perseguir apenas presas que não revidem ou que sejam pequenas, etc. Com outros, ocorre o oposto: o cão só apresenta um drive razoável já no Fair Game ou mesmo só a partir do Fair Fight. Tal fato ocorre por influência da psique de cada animal, bem como da Índole de cada raça. A compreensão de que cada drive não é uma única entidade é de fundamental importância. (Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos). INTENSIDADE DE DRIVE – A intensidade do drive significa o volume de um determinado drive em um determinado nível. Sabemos que os níveis do drive de rapina são: Fair Play, Fair Game e Fair Fight. Mas, um cão poderá ter intensidades diferentes em cada um desses drives. Exemplificando, um cão pode ter altíssimo drive de rapina no fair play (correr atrás de uma bolinha com vontade impressionante), mas não ter capacidade de chegar ao fair fight ou mesmo no fair game. Já outro cão poderá não se interessar por perseguir bolinhas, e seu interesse só começar a se despertar ao perseguir figurantes humanos e fazer isso com imensa gana, ou seja, com grande intensidade. (Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos). 038 - DEFESA E FUGA: Quanta confusão é feita, mesmo no meio profissional, em relação do que chamamos de drive de defesa. Às vezes, vemos alguém dizer: "Olha o cão está demonstrando muita defesa", em uma situação em que o cão está prestes a fugir, ou seja, o cão não se encontra na defesa propriamente dita, mas na pré-fuga. Isso ocorre, pois o cão antes de fugir tenta fazer com que o adversário fuja, como um homem que fala grosso demais. ] Alguns sinais são claros: Pêlos eriçados: o cão procura assim aumentar sua silhueta, parecendo maior para espantar o inimigo (sinal geral de defesa). Recomendação: manter ou moderar o treinamento e observar

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evolução. Simular fugas do figurante, estimulando a rapina e a confiança do cão. Pupilas dilatadas: as pupilas se dilatam para aumentar a claridade sobre a retina e também para aumentar o campo visual. Isto porque a atenção do cão está mais dirigida à vigilância do que à tenacidade. Vigilância alta é característica das presas e de quem precisa fugir. Por isso, os herbívoros têm olhos do lado da cabeça para aumentar o campo visual e a vigilância. Tenacidade é característica de quem quer atacar. Por isso, os predadores têm olhos na frente da cabeça para terem melhor noção de profundidade e se concentrarem melhor no ataque (a atenção pode ser desviada tanto para a vigilância quanto para a tenacidade). Sinal geral de defesa. Recomendação: moderar o treinamento e observar evolução. Simular fugas do figurante. Rosnar: o cão procura mostrar agressividade e mais intimidar do que querer atacar. Sinal de defesa insegura. Não necessariamente uma pré-fuga. Recomendação: diminuir o grau de provocação. Simular fugas do figurante. Dar um tempo ao treinamento se o cão não responder. Latir mais grosso que de costume: o cão procura mimetizar um cão maior, de latido mais grave. Sinal de defesa insegura. Não necessariamente de pré-fuga, mas quase sempre é. Recomendação: diminuir o grau de provocação. Simular fugas do figurante. Dar um tempo ao treinamento se o cão nem assim responder. Cauda baixa: a cauda baixa visa proteger os genitais. É uma característica típica de pré-fuga. Recomendação: quase zerar o grau de provocação. Simular fugas do figurante. Conforme reação, aguardar o cão amadurecer ou se recuperar de possível trauma. Em verdade, a defesa ostensiva indica que o cão está demonstrando um prenúncio de fuga. Está tentando dar uma última cartada para tentar "sair por cima", tentando assustar mais o adversário do que este o assusta. Se não conseguir, irá fugir. Não é questão de "se", mas de "quando". Mas, as situações acima não podem ser confundidas com a situação de o cão ter um alto drive de defesa, que seria uma defesa resoluta e não insegura. Os sinais expostos anteriormente não são sinais de alto drive de defesa, mas sinais de um prenúncio para uma fuga ou, no mínimo, de haver a probabilidade próxima de uma fuga. É comum ouvir até pessoas da área dizerem que um cão que eriça o pêlo durante um ataque, que rosna, que dilata as pupilas, que baixa a cauda tem alto drive de defesa. Não estaria errado dizer que o cão está em defesa, mas é um erro crasso atribuir a um cão em tal situação alto drive de defesa. Nem toda defesa está associada a um bom drive de defesa, que significa defesa resoluta e nada mais. Existem outras formas de defesa. Muita confusão advém daí. Não deve ser confundidos sinais de uma defesa que antecedem ou não a uma fuga com alto drive de defesa. Um cão com alto drive de defesa não irá demonstrar nada disso, No máximo, apenas pêlos um pouco eriçados e pupilas um pouco mais dilatadas. Irá atacar firmemente, como uma tigresa que defende sua prole. Quem viu os bons cães de guarda de outrora, mastins, filas, rottweilers lembrará que tais cães atacavam firmemente. Algumas dessas raças ainda atacam firmemente em grande número de seus exemplares. Essas raças se impulsionavam e se impulsionam por um alto drive de defesa e têm, via de regra, baixo drive de rapina. Será que alguém imagina que esses cães atacavam por medo?

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Quem os viu sabe muito bem que medo era a última coisa que eles sentiam. Eram cães de ataque firme, quase sempre demonstrando ódio, mas nunca medo. É provável que um cão que dá sinais ostensivos de defesa durante um ataque sinta uma boa dose de medo. Mas, isso não significa alto drive de defesa, mas baixos drives, tanto de defesa quanto de rapina, além de medo. Pois, quando há um drive alto de defesa ou um alto drive de caça, o cão não sente medo. Quando ocorrerem sinais de submissão ou de medo, devemos esperar o cão amadurecer ou se recompor de algum trauma - jamais devemos forçar o treinamento de proteção, mesmo em nível mais leve. Os sinais de submissão são: Evitar olhar nos olhos do adversário ou até para o adversário: tentativa de ficar indiferente à situação. Medo e fuga iminente. Manter a cauda protegendo os genitais: medo. Abaixar-se totalmente ao solo: medo ou submissão. Deitar de barriga para cima: submissão. Lamber: submissão. Se considerarmos defesa em um sentido mais amplo, ou seja, no sentido de se auto preservar, de procurar permanecer vivo teríamos que incluir a fuga como um meio de defesa. A pré-fuga, embora considerada indesejável na cinofilia, tanto esportiva como efetiva, na natureza é um meio eficaz de tentar proteger filhotes, território, alimento, etc. e também permanecer vivo. É o meio de defesa mais usado pelos carnívoros quando se confrontam, pois evita ferimentos mais sérios. A natureza não é bondosa com aqueles que se ferem com um pouco mais de gravidade. Quase sempre, um ferimento de moderada gravidade levará tanto o predador como a presa à morte, ou pela impossibilidade de fugir ou pela impossibilidade de caçar. Sem falar, é claro, das infecções potencialmente letais oriundas dos ferimentos. Alguns autores consideram a existência do que chamam de drive de fuga. Não concordamos, no entanto, que a fuga pura e simples deva ser considerada como um nível do drive de defesa se formos considerar o drive de defesa como um drive de proteção, que realmente o é. Seria uma forma de preservação, mas não exatamente uma forma de proteção quando se trata de proteger alguém ou alguma coisa que não ao próprio indivíduo. Estaria, pois, fora das considerações da cinofilia de guarda. Mas, não podemos deixar de considerar a fuga e a tendência a fugir para entendermos os níveis do drive de defesa. Em verdade, ante o perigo, há duas opções básicas: defesa ou fuga. A pré-fuga ainda é considerada como defesa, ainda que esteja próxima à fuga. No entanto, não devemos dizer que pré-fuga é uma mistura de defesa e fuga, pois o cão ainda está em defesa e não em fuga. Essa mistura, no entanto, pode ser encontrada no que chamamos de fuga-vigilante: FUGA-VIGILANTE – Chama-se de Fuga-vigilante à situação na qual um animal procura manter distância de seu inimigo ou predador, mas não deixa de ter atenção sobre ele. O animal dá rápidas

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escapadas, mas sempre se volta em direção ao inimigo no sentido de tentar intimidá-lo ou chamar sua atenção sobre si. Por vezes chega mesmo a ameaçar o inimigo para tentar afugentá-lo, em situação próxima à Pré-fuga. Só que na Pré-fuga ainda não existe recuo. Quase sempre a Fuga-vigilante é usada como forma de proteger filhotes, território, etc. de inimigo mais poderoso. Vide: ATAQUE-FUGA, FUGA e PRÉ-FUGA. A diferença fundamental da fuga-vigilante da pré-fuga, é que nesta última o cão não recua. A pré-fuga ainda faz parte da defesa, enquanto que a fuga-vigilante já é um tipo de fuga. Há também a fuga franca, na qual o cão simplesmente dá as costas e foge sem qualquer grau de enfrentamento sobre o adversário. Quase sempre a pré-fuga está associada a um nível elevado de noradrenalina e adrenalina e isso é o que quase sempre ocorre na cinofilia. Mas, pode também ser uma estratégia fria e calculada de defesa quando se trata de confronto entre predadores de mesma espécie ou de espécies diferentes. Mais ainda a fuga-vigilante é quase sempre uma estratégia. É usada até como forma de ataque para fustigar os adversários e roubar suas presas abatidas. É forma inteligente de desviar os inimigos dos filhotes ou expulsá-los dos territórios. Os níveis de defesa seriam, portanto: pré-fuga, defesa simples e defesa resoluta. Os níveis de fuga seriam fuga-vigilante, fuga-indiferente e fuga franca. Veremos mais sobre níveis de defesa em “Fair Fight e Defesa Resoluta. Altos Drives Levam à Luta”. A fuga-indiferente é aquela em que o animal não corre, apenas faz de conta que não nota o adversário, desvia o olhar, finge-se de alienado. Em verdade, o animal tenta se mostrar indiferente e evita correr para não ser visto como presa por seus inimigos. Mas, é um fuga, pois se for atacado, provavelmente terá comportamento de submissão ou de fuga franca. Mas, pode também apresentar pré-fuga como recurso intermediário. Fuga franca é aquela na qual o animal foge em disparada na direção oposta onde está seu adversário. Na submissão, o animal tenta não ser atacado e se rende a outro. Ocorre entre indivíduos de mesma espécie ou na relação cão-dono. É uma maneira de evitar o confronto e, talvez, ainda conseguir um protetor, um aliado mais poderoso. Vamos voltar a ponderar sobre o drive de defesa. Podemos começar pela defesa simples. Ela é instável, pois quando ela ocorre, o cão está em defesa e, também, avaliando o inimigo. O resultado dessa avaliação levará o cão a outro nível de defesa. Tudo isso está também associado ao temperamento e ao caráter do cão, da sua coragem e da socialização anteriores. O outro nível de defesa que ocorrerá após a defesa simples pode ser a pré-fuga ou a defesa resoluta. Dependerá também do drive latente de defesa e da figuração. Um figurante que force demais um cão nessa etapa pode levar o cão à pré-fuga. Se esse mesmo figurante tiver competência, fará o cão “crescer” e tornar seu ataque resoluto. O drive de defesa é o mais difícil de entender. Ele não é uma entidade retilínea, como é o drive de rapina. O drive de defesa pode passar de um nível médio (defesa simples) para um mais baixo (pré-fuga) ou a um mais elevado (defesa resoluta). Ele é paradoxal, pode ser firme ou instável, fraco ou violento. É o drive onde estão as maiores contradições do ser. Está em todos os animais, à exceção de esponjas, e outros mais que não possuam sistema nervoso central. É na situação de defesa, onde este drive atua, onde a vida e a morte estão por um fio. É onde o medo pode prevalecer. É onde, também, a coragem extrema se revela. E só não entrou em drive de defesa o cão que não foi pressionado para tanto. Essa é uma das maiores conclusões da cinofilia efetiva. Pode-se dizer um

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herói quem não percebe o verdadeiro perigo? Seria, em verdade, um valente ou um inocente? Assim como verdadeira índole de um lutador só pode ser medida após sua primeira grande derrota, a verdadeira qualidade de um cão só se mede após ele ser verdadeiramente pressionado. O drive de um cão, qualquer drive de um cão, se baseia antes de tudo numa crença. A rapina na superioridade. Já a defesa, esta se baseia em tantas coisas... Baseia-se no ódio, no medo, no amor ao que se defende, na necessidade de não perder a vida e também de não ceder ao desafio. Inconscientemente, todos esses antagonismos são pesados, dosados, avaliados. E isso exige uma escolha. Essa escolha é que prova a verdadeira coragem de um cão e de um homem. Saber lidar com o stress da defesa é algo fundamental em termos efetivos. Para isso é necessária pressão psicológica e, principalmente, o uso do bastão. Este provoca dor, e a dor é algo real. Um bom cão saberá como resistir a ela ou mesmo não chegar a senti-la, se seu sistema nervoso for ensinado a lidar com neurotransmissores, se sua mente for treinada para tanto. A dor também pode ser habitualizada, mas os limites para isso são muito menores do que os limites das ditas pressões psicológicas. Essa é uma capacidade essencialmente genética. Por isso, ser o uso do bastão indispensável à boa seleção de cães efetivos. Sem seu uso, tudo mais pode ser forjado, habitualizado, acostumado, sem que o cão prove realmente sua real capacidade. Não é preciso exagero, muito menos crueldade. Tal uso deve ser progressivo e parar tão logo se perceba o limite de cada cão. Quebrar um cão não leva a lugar algum a não ser perder sua já não boa capacidade de trabalho. Melhor um cão um pouco fraco do que um cão quebrado. Quando falamos na ambigüidade do drive de defesa, falamos de cães não treinados ou de baixa qualidade efetiva. Um cão efetivo exercerá sempre sua defesa em nível resoluto. 039 - FAIR FIGHT E DEFESA RESOLUTA. ALTOS DRIVES DE PROTEÇÃO LEVAM À LUTA: Muito já se ouviu falar sobre o drive de rapina e sobre seus níveis, embora muitos não considerem o fair game. Em verdade, o fair game é uma fase importante de ser considerada na cinofilia efetiva, pois é nela que preparamos o cão para poder chegar efetivamente ao fair fight, ou seja, que preparamos o cão para que suporte sem sofrimento psíquico o rigor do bastão. Simplesmente seria desastroso para a maioria dos cães uma passagem imediata do fair play ao fair fight. É claro que nenhum adestrador com mínima competência pensaria nisso, mas muitos se esquecem de classificar separadamente a necessária fase intermediária entre um cão ser capaz de brincar com uma bolinha e enfrentar um figurante disposto a afugentá-lo, como ocorre em algumas provas de ring. Uns já chamam o fair game de fair fight, por se satisfazerem com uma menor capacidade efetiva do cão, pois o fair game já é satisfatório para o tipo de prova que realizam. Talvez por isso o termo fair game não seja usado em algumas escolas. Realmente os treinamentos de muitas modalidades de esporte não exigem tanto rigor de bastão nem pressão psicológica real. Um rigor excessivo de bastão, inclusive iria prejudicar a obediência exigida em muitas provas. O rigor do bastão em um cão que tenha qualidade e não venha a fugir, necessariamente aumenta a gana do cão, tanto pelo lado da defesa quanto por elevação do nível e da intensidade da rapina. O controle pode ser considerado como um paradrive que quase sempre se contrapõe aos drives de rapina e de defesa, e esses drives, por sua vez, quanto mais se elevarem, mais difícil será exercer o controle. Um cão de guarda efetiva precisa ter um nível razoável de obediência, é claro. Mas, precisa também

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trabalhar com altos drives de proteção. Quando falamos em provas, onde há disputas mais focadas no controle, teremos alguma dificuldade de trabalhar no fair fight e muito mais ainda com um alto nível de defesa. Por isso, o nível de fair game já é satisfatório para a atividade esportiva, simplesmente porque, via de regras, não se utiliza nível superior em momento algum. Aí, erroneamente, acaba-se por apelidar o fair game de fair fight. Quando há disputa, quase sempre se coloca a importância dos resultados das provas acima da importância da capacidade efetiva dos cães. Não que sejamos contra disputas, mas não temos como deixar de constatar tal fato. Há também que haver respeito ao fato de nem todo o cão de guarda necessitar ter um ataque efetivo. Em alguns casos, isso até não é o desejável, pois quer se evitar ferimentos nas pessoas as quais o cão ataca. É claro que isso só pode ser considerado ético e racional se houver pessoas dando cobertura e protegendo o cão. Do contrário, se estaria cometendo uma tremenda safadeza, covardia e maldade com o animal. Mas, o que realmente não se escuta é falarem em níveis de drive de defesa. Muitos confundem a boa defesa com a pré-fuga, e a defesa chega a ser considerada indesejável. Realmente, a defesa entra em sério conflito com a obediência mais apurada, mas um cão de guarda precisa ter defesa. Do contrário, não poderá ser um cão de guarda efetiva. É nessa bifurcação onde se separam o treinamento esportivo que visa somente resultados de torneios mal julgados com o treinamento efetivo e o esporte de algo nível. E é esse desprezo quanto à necessidade de defesa de um cão, visto pela óptica da mal aplicação do esporte que leva a considerar a defesa como algo indesejável e sequer considerar que existem níveis no drive de defesa, assim como no de rapina. Anteriormente, já expomos os níveis de rapina, mas ainda não falamos sobre os níveis de defesa. Estes seriam: pré-fuga, defesa simples e defesa resoluta. Sobre a pré-fuga também já comentamos no item “038 - Defesa e Fuga”, mas o que seria defesa resoluta? Defesa resoluta pode ser mostrada no ataque franco, sem medo e com imensa intenção de destruir o inimigo. As mordidas tendem a ser dilacerantes, sendo usada muita força e muito sacolejamento. Há notável raiva no ataque e nenhum sinal de fuga ou mesmo de intenção de que o inimigo fuja. O cão quer abatê-lo. Mas, se analisarmos bem, isso não seria o mesmo mostrado no estado de luta? Seria. E qual é a diferença, afinal, entre defesa resoluta e luta? Do ponto de vista do comportamento que podemos observar no cão durante a prova, nenhuma. A única diferença que pode ocorrer é a intenção inicial do ataque, uma vez que a luta pode vir da defesa ou através da rapina. Poderíamos pensar que, então, não faz diferença saber como surgiu a luta, pois ela chega plasticamente ao mesmo resultado, independentemente de advir da defesa ou da caça. No entanto, temos que diferenciar isso para prever as situações que levarão à luta. Um cão que tenha o móvel para a luta baseado na rapina tenderá a atacar estranhos fora de seu território e mesmo sem qualquer ameaça, desde que estes se comportem como caça ou que o cão entenda como caça e poderá o cão proceder ao ataque em luta. Poderá, no entanto, ser dócil com pessoa estranha que chegue a ele de forma amigável. Um cão cujo móvel para o ataque é a defesa, provavelmente terá menor tendência de atacar pelo simples comportamento de caça do estranho, mas será bem mais difícil que aceite aproximação de qualquer estranho sob qualquer hipótese. Cães que tenham elevados os dois principais drives de proteção tanto tendem a não permitir aproximação de desconhecidos em qualquer hipótese como tendem a atacar quem tome

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comportamento de caça desde que se trate de um estranho. O detalhe que não deve ser esquecido é que o trabalho de luta em si acaba por elevar tanto a defesa como a rapina concomitantemente. Se o cão não tiver socialização amigável com estranhos, não poderá exercer trabalho de protetor (cão que protege o dono fora do território) e sempre atacará estranhos. Na defesa resoluta, o cão não pensa mais em se proteger, pensa mais em atacar e lutar. A defesa resoluta leva imediatamente à luta. O cão não mais quer que o atacante fuja, mas que fique para ser abatido. A diferença básica entre a luta e a defesa resoluta é que nesta o ódio é o motivo principal de o cão preferir abater o inimigo a afugentá-lo. Na luta, o principal móvel ainda é a rapina. Entre a situação de uma defesa beirando a fuga, ao qual chamamos de pré-fuga e uma situação de defesa resoluta, podemos considerar uma situação na qual o cão age sob a égide da defesa, sem demonstrar que está perto de entrar em fuga, mas também sem demonstrar a gana da luta. Chamaremos a essa situação de defesa simples. Não há sinais de pré-fuga, como cauda baixa e lábios erguidos, pode o cão manter a silhueta elevada, os pêlos arrepiados, pois, em verdade, ele tem a intenção de afugentar a presa, não necessariamente de abatê-la. Se for excessivamente pressionado, pode derivar para a pré-fuga ou para a defesa resoluta, conforme for a qualidade de seu drive de defesa, tanto do ponto de vista genético como pelo trabalho elaborado até então. Recapitulando, os níveis de defesa seriam, portanto: pré-fuga, defesa simples e defesa resoluta (cujos sinais exteriores são os mesmos da luta). Notem que a pré-fuga é uma situação instável que pode levar à fuga, e que a defesa simples também é uma situação instável, mas que pode levar tanto para a pré-fuga e para a fuga, como para a defesa resoluta. Notemos que o fair fight pode levar a um comportamento muito próximo à defesa resoluta que é a luta. Isso nos leva à conclusão que tanto o aumento do drive de caça como o aumento do drive de defesa convergem para a luta. Esse é o ponto principal deste item. A exceção são os cães que estacionam no fair fight, que não podem ser considerados regra. Talvez, a única maneira de saber se, na prática, um cão está em defesa resoluta ou em luta oriunda da rapina, seja através da realização de um ataque lançado longo fora de seu território. Se estiver em rapina, o cão irá até o adversário se este estiver em se campo visual. Na defesa, por mais resoluta que seja, só atacará a partir de uma determinada distância na qual considere a aproximação do estranho como perigosa ou afrontosa (círculo de pressão). Tratando-se de distâncias longas, a distância na qual um cão está disposto a atacar é proporcional à intensidade do nível do drive de rapina em que se encontrar. Em distâncias mais curtas, será também proporcional à intensidade da defesa resoluta. Embora em distâncias diversas (longas ou curtas), o aumento de um drive de proteção (rapina ou defesa, respectivamente) decorrerá em um aumento da distância na qual um cão atacará. Afronta. Essa é a palavra-chave que impulsiona a defesa resoluta: o cão se sentir afrontado. Muitos associam defesa simplesmente â percepção de perigo ou medo. Por isso, sempre se lembram da pré-fuga. Mas, o cão é um animal orgulhoso. Sentir-se afrontado, mesmo sem ter qualquer sentimento de medo pode ser o móvel da defesa. E é isso que ocorre na defesa resoluta. O cão não sente qualquer medo, mas não tolera o desafio nem ameaças, muito menos quando se dirigem às pessoas que ama, a seu território, seus filhotes, etc.

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040 - PRESERVAÇÃO - CARNÍVOROS: Existem vários instintos ligados à sobrevivência. Alguns específicos do indivíduo e outros da espécie como um todo. Portanto, a primeira divisão seria entre os instintos de preservação da espécie e os instintos de preservação específicos do indivíduo. Preservação do indivíduo: - Procurar melhores condições ambientais (temperatura, água, etc.). - Alimentação do indivíduo: drive de caça (fair game, fair fight e luta – dependendo da necessidade). O fair play é um drive de treinamento e aprendizado, mas que – em última análise – também serve à alimentação. - Defesa do indivíduo: pré-fuga, defesa simples e defesa resoluta (comportamento de luta) – depende do temperamento e caráter de cada indivíduo e do potencial do inimigo. - Fuga-vigilante, fuga-indiferente e fuga franca - depende do temperamento e caráter de cada indivíduo e do potencial do inimigo. - Submissão. - Defesa do território como defesa do alimento e das condições ambientais: todos os níveis de defesa e a fuga-vigilante também. Preservação da espécie: - Instinto sexual; - Instinto maternal e paternal; - Alimentação dos filhotes e do grupo: drive de caça (fair game, fair fight e luta – dependendo da necessidade), além do fair play como aprendizado. - Defesa dos filhotes e do grupo: pré-fuga, defesa simples e defesa resoluta (comportamento de luta) – depende do temperamento e caráter de cada indivíduo e do potencial do inimigo, fuga-vigilante (observemos que não aparece a fuga franca nem fuga indiferente). - Defesa do território como defesa do alimento, das condições ambientais e do grupo que está nele: todos os níveis de defesa e a fuga-vigilante também. 041 - INSTINTOS, DRIVES E SEUS SINAIS: Além da expressividade do cão, que é muito similar à nossa, existem alguns sinais que podem ser percebidos e que podem nos situar sob qual drive ou sob qual emoção o cão se encontra. Esses sinais isolados quase sempre não podem nos levar a nada conclusivo. Por isso, devemos sempre analisá-los em conjunto. Vamos colocar neste item um breve esquema dos principais sinais que podem nos guiar no adestramento e na figuração de um cão. Eles são ferramentas de suma importância de um adestrador e de um figurante. Tentar figurar ou adestrar sem considerar tais sinais seria como tentar pousar um avião com os olhos vendados, sem poder ver a pista nem os instrumentos. Cabe lembrar que sinais não são muito úteis desprovidos do arcabouço teórico que auxiliará sua análise e aplicação. Vamos aos sinais: 1. Mordidas: 1.1. Profundidade da mordida: 1.1.1. Com uso predominante dos incisivos: pré-fuga; 1.1.2. Com uso predominante dos caninos: defesa simples, defesa resoluta ou luta;

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1.1.3. Com boca-cheia: predominância de rapina. 1.2. Força da mordida: 1.2.1. Leve: fair play; 1.2.2. Média: fair game em intensidade baixa, defesa simples ou pré-fuga; 1.2.3. Pesada: fair game em intensidade alta, fair fight, luta, defesa resoluta, defesa simples ou pré-fuga; 1.2.4. Muito pesada: fair fight, luta ou defesa resoluta. 1.3. Sacudida da mordida* (para os lados): 1.3.1. Sem sacudir: rapina em qualquer nível ou pré-fuga; 1.3.2. Sacudindo fracamente: rapina em qualquer nível, defesa simples ou pré-fuga; 1.3.3. Sacudindo com potência: defesa simples, defesa resoluta ou luta; 1.3.4. Sacudindo com muita potência: luta ou defesa resoluta. * Analisar potência e freqüência. 1.4. Puxar (para trás): 1.4.1. Levemente: rapina em fair play; 1.4.2. Moderadamente: rapina em fair game; 1.4.3. Fortemente: rapina em fair fight, talvez defesa resoluta. 1.5. Mordiscar: pré-fuga. 2. Postura da cauda *(1): 2.1. Antes do ataque: 2.1.1. Alta: rapina em qualquer nível, luta ou defesa resoluta; 2.1.2. Média: defesa simples *(2) ou rapina em pantera (ver: “043 - Ataque Pantera”); 2.1.3. Baixa: 2.1.3.1. Com guia tensa: defesa (resoluta, simples ou pré-fuga), luta ou fair fight (no caso do fair fight, da luta ou da defesa resoluta, a cauda fica baixa pela contrariedade pelo fato do condutor o manter preso o cão quando ele quer atacar); 2.1.3.2. Com guia frouxa: pré-fuga. 2.2. Durante o ataque: 2.2.1. Alta: rapina em qualquer nível, luta ou defesa resoluta; 2.2.2. Média: defesa simples; 2.2.3. Baixa: pré-fuga. 2.3. Negando-se a atacar: 2.3.1. Alta: fair play; 2.3.2. Média: indiferença real ou fuga-indiferente; 2.3.3. Baixa: Medo (submissão ou fuga). * (1): A postura da cauda irá também depender de fatores morfológicos raciais, como inserção, postura natural, etc. O ora citado é para dar bases comparativas e não pode ser aplicado a todas as raças.

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* (2): Defesa simples é uma situação instável. Pode evoluir para defesa resoluta ou para a pré-fuga, dependendo da personalidade de cada cão e do nível de pressão exercida sobre ele. 3. Pêlo: 3.1. No ataque: 3.1.1. Normal: rapina em qualquer nível, luta ou defesa resoluta; 3.1.2. Arrepiado levemente: defesa simples ou pré-fuga; 3.1.3. Muito arrepiado: pré-fuga ou fuga. 3.2. Negando-se a atacar: 3.2.1. Normal: indiferença real, fuga-indiferente ou submissão; 3.2.2. Arrepiado (muito ou não): medo com ou sem fuga. 4. Orelhas: 4.1. No ataque: 4.1.1. Eretas: rapina em qualquer nível, luta, fuga vigilante; 4.1.2. Para trás: rapina em fair game ou em fair fight, luta, defesa resoluta, defesa simples ou pré-fuga. 4.2. Negando-se a atacar: 4.2.1. Altas: fair play ou indiferença real; 4.2.2. Baixas: indiferença real, fuga-indiferente, fuga vigilante, fuga franca ou submissão. 5. Olhos: 5.1. Atentos: rapina em qualquer nível, defesa resoluta, defesa simples, pré-fuga, luta ou fuga vigilante; 5.2. Desviantes: pré-fuga, fuga indiferente, fuga franca ou submissão. 6. Testa: 6.1. Franzida: atenção de um modo geral (Pode ocorrer em qualquer nível de defesa, em qualquer nível de rapina ou na luta – com ou sem ataque. Também pode ocorrer na fuga-vigilante). 6.2. Não franzida: pode ocorrer em qualquer drive de proteção, em qualquer nível, durante o ataque (a testa pode passar a não ficar franzida durante o ataque); em qualquer tipo de fuga ou na submissão (cão em submissão não franze a testa). Depende muito da posição das orelhas e não tem quase relevância. 7. Rosnados: 7.1. Com rosnados: 7.1.1. Antes do ataque: defesa simples, pré-fuga ou qualquer outro nível de defesa (nem sempre o cão que rosna irá fugir, pode passar a atacar violentamente se pressionado); 7.1.2. Durante o ataque: pré-fuga, defesa simples, defesa resoluta ou luta; 7.1.3. Negando-se a atacar: fuga-vigilante (o cão não ataca, mas vigia).

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7.2. Sem rosnados: 7.2.1. Antes do ataque: não indica nada; 7.2.2. No ataque: pode ser qualquer drive de proteção em qualquer nível, inclusive pré-fuga; 7.2.3. Negando-se a atacar: fuga-vigilante, fuga franca, indiferença real, fuga-indiferente ou fair play. 8. Latidos: 8.1. Latir antes do ataque e atacar (cão contido): 8.1.1. Latido grave: qualquer tipo de defesa, frustração; 8.1.2. Latido normal: pré-fuga, defesa simples; 8.1.3. Latido agudo: rapina em qualquer nível, luta, frustração; 8.1.4. Não latir: não há como tirar qualquer conclusão, sinais de caça ou indiferença real ou fuga indiferente. 8.2. Latir e não atacar tendo possibilidade: fuga-vigilante. 8.3. Não latir e atacar (não contido): qualquer drive de proteção em qualquer nível, inclusive pré-fuga. 8.4. Não latir e não atacar: fair play, indiferença real, fuga-indiferente, fuga-vigilante, fuga franca ou submissão. O fair play quase sempre não é amparado por mordidas em bites ou mangas. Quase sempre o ataque se foca somente em objetos menores, como bolinhas, etc. Ele é mais cinético do que estático, isso é, ocorre muito mais perseguição do que na firmeza da mordida. Sua firmeza limita-se a proteger a “caça”, isso é, a bolinha ou outro objeto apreendido pelo cão. Lembremo-nos que o que difere com mais ênfase o fair play do fair game é a maior intensidade do esforço de mordida do fair game. Não se pode diferenciar esses dois níveis sem avaliar o nível de esforço da mordida. O que difere com mais ênfase o fair game do fair fight é a maior capacidade de suportar o revide doloroso, se este for imposto, no fair fight. Para se certificar se um cão realmente está em fair fight, o mais conclusivo é o uso intenso do bastão. A resposta do cão aumentará em intensidade, podendo chegar à luta. O que difere com mais ênfase o fair fight da luta é o desejo de destruir e não de prender, é a mordida bem sacudida para os lados e não simplesmente puxada para trás. O que difere com mais ênfase a luta e a rapina da pré-fuga e da defesa simples é a euforia do ataque, a cauda alta, o pêlo não arrepiado, o latido ausente ou agudo que ocorrem na rapina. Já a defesa resoluta tem o ataque idêntico ao da luta. Para saber na prática se o cão encontra-se em defesa resoluta ou em luta, só mesmo observando a distância na qual ocorre um ataque lançado. Isso, pois, o círculo de pressão da defesa, por mais sensível que seja não chega à distância na qual a rapina opera. Somente fora do território do cão e em distâncias de mais de 40 metros poderemos saber se

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há rapina incorporada ao ataque. Se o cão atacar nessas condições ou demonstrar tal intenção, existe rapina. Neste caso, será luta e não defesa resoluta. Em distâncias curtas entre o figurante e o cão ou dentro do território do cão, não há como saber. Fuga vigilante é definida como a situação na qual um cão evita o confronto direto, mas não abandona a vigilância sobre o adversário. O cão costuma rodear em volta dele, esboçar mordiscos e, às vezes, até dar pequenas e rápidas mordidas. Pode até morder e manter a mordida até que o adversário se volte contra ele. Aí, o cão soltará e continuará ameaçando e vigiando o adversário. Geralmente, late ou rosna em torno do adversário, procurando chamar atenção sobre este. Esboça breves ataques, seguidos de rápidas fugas. O termo é conhecido em inglês como avoidance. 042 - CONDUTA SEGURA NA PROTEÇÃO: Foi a nós perguntado várias vezes, após discorrer sobre defesa e fuga, como seria o oposto, isto é, como seriam os sinais inversos àqueles nos quais o cão mostraria não ter nenhuma dose de medo. Via de regra, são os mesmos sinais que se aparecem quando da rapina. Como tal pergunta sempre persiste quando tratamos do assunto defesa e fuga, julgamos por bem, então, colocá-lo em complemento logo após explanar sobre fuga e defesa. Pelo lado estrito da defesa, ocorre a expressão de ódio, quando a defesa propriamente dita se eleva (vide: "Defesa e Fuga") pode estar associado a um nível resoluto. Mas, tal significado é muito relativo. Um dos sinais de ausência de temor seria a cauda ereta durante o ataque. Geralmente, certa expressão de alegria, quando o ataque ocorre sob a égide da rapina. Algo que não podemos confundir é a alegria de um fair play com a alegria de uma caça alta (fair fight). Cães que foram treinados sem levar golpes rigorosos de bastão poderão mostrar alegria, mas perdê-la por completo e fugir quando do primeiro golpe aplicado com mais rigor. Vejo alguns cães de esporte de proteção que se comportam durante uma prova mais como um poodle esperando que lhe joguem uma bolinha do que como um cão de guarda. Por outro lado, cães acostumados a desprezar o bastão aumentam seu gameness quando do seu uso. Até certo limite, quanto mais o bastão for usado com severidade, maior será a reação positiva do cão no ataque. Até esse limite, uso severo do bastão aumentará o nível e a intensidade da rapina, induzirá à luta e não à fuga ou à pré-fuga. É provável que leve o cão à defesa propriamente dita e a uma mordida mais forte e dilacerante, coisa que muita gente que faz proteção de araque condena. Aí, vem aquele papo sem fundamento que uma mordida forte é sinal de "nervos fracos" (descontrole emocional), na tentativa de contrabalançar a ineficiência efetiva de seu trabalho. Por sinal, “nervos fracos” é um termo descabido, tendo em vista não significar nada fisiologicamente. O que a escola efetiva crê é que ou se faz do cão um animal que pode com suas armas neutralizar o inimigo ou se está fazendo proteção de mentirinha. Não adianta morder sem ferir profundamente e não adianta mostrar coragem diante de um perigo mínimo e de um inimigo que não revida ou revida fracamente com tênues toques e com ameaças às quais o cão já se habitualizou, isto é, já aprendeu que nunca irão se concretizar. É só ter paciência e técnica que acostumamos nossos cães a quase tudo, e isso pode não exigir praticamente nenhuma qualidade genética por parte deles. Cara feia, posturas incisivas, barulho, ameaças, praticamente tudo o cão se acostuma se o socializarmos ele com tais situações desde filhote e em momentos descontraídos. O que é mais difícil de acostumar é com o toque pesado de bastão. Isso exige, por ser muito mais refratário à habituação,

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mais coragem, dureza ou insensibilidade à dor, o que só é obtido com o efetivo controle das descargas adrenérgicas, algo que exige muito mais apuramento genético. A pressão em nível físico é uma grande pressão psicológica também, pelo menos é aquela com a qual é mais difícil se acostumar. Manter o equilíbrio de um cão que joga em nível de fair play ou de fair game de pouca intensidade é algo extremamente fácil comparado a manter o equilíbrio de um cão em nível de luta ou mesmo em nível de fair fight. É a oposição entre os drives de proteção que aumentam de forma drástica e o paradrive de obediência. E não podemos que um cão possa ser um bom cão de guarda efetiva sem altos e níveis de rapina e sem elevada intensidade de defesa. No entanto, temos que saber, que conforme função prática de nosso cão, temos que ter uma obediência, no mínimo, razoável. Conseguir operar obediência com altos níveis intensidades de proteção é o grande desafio da cinofilia efetiva. Isso, sim, exige um apuramento genético ainda muito maior do que simplesmente suportar a pressão tanto física quanto psicológica. Bem, voltando ao assunto do tópico, junto com a alegria do ataque, certa dose de ódio ajuda bastante na eficiência do ataque. Não se deve, no entanto, confundir o ódio, que é um sentimento frio, com a raiva, que é como uma chama e logo se vai, deixando apenas o animal desgastado em pouco tempo. O ódio está associado à defesa resoluta e a raiva à pré-fuga. Outros sinais de altíssima caça e de boa defesa é a expressão concentrada. Quando um cão começa a se desconcentrar isso pode significar estar com drives de proteção muito baixos ou, até, já estar em pré-fuga ou mesmo em fuga indiferente. O ápice da caça é o que chamamos de ataque pantera, quando o cão se abaixa e diminui sua silhueta. Caminha silenciosamente em direção ao figurante, como que zelando para que este não fuja. Não pisca, como um gato que fita um passarinho. Vide o item "Ataque Pantera". 043 - ATAQUE PANTERA: O termo mais correto seria "ataque felino", pois todos felinos agem de tal forma no ataque, não exclusivamente as panteras. Mas, foi chamado assim na primeira vez que foi visto pelo autor e muito impressionou. Era o ataque típico da sua cadela Gaia of Romany Storm, uma bull terrier. É comum nos melhores cães. Em caso de dúvida entre a qualidade de dois cães, devemos escolher sempre o que demonstra tal característica sem medo de errar. O ataque pantera é indício seguro de um drive de caça de excelente qualidade. É a excelência na rapina. Na vida selvagem, os predadores eriçam seus pêlos; ficam na ponta dos pés; rosnam ou emitem sons graves para mimetizar maior tamanho e espantar seus inimigos. São demonstrações de desejo que o inimigo fuja e isso cause alívio ao animal. Esses mesmos predadores não eriçam seus pêlos; diminuem suas silhuetas andando abaixados - quase rastejando; não rosnam e procuram ser os menos ruidosos o quanto possível; seus olhos ficam fixos, como os de um gato a espreitar sua pequena presa, suas orelhas firmes e eretas em direção desta, quando estão em postura de caça. Um cão que ataca assim não deseja espantar o intruso, mas o vê como sua presa. 044 - TRABALHANDO O FILHOTE COM ISCAS: Bom, vamos adiantar um pouco da parte prática deste capítulo. Um treinamento que pode ser feito despretensiosamente é a simples

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utilização de iscas antes da alimentação dos nossos filhotes. Isso pode começar tão logo seja possível, 40, 45, 50, 60 dias de idade. Não importa. O que importa é que tenhamos a paciência de saber esperar o momento propício. É claro, que quanto mais cedo estimularmos, mais cedo teremos resultados. Apenas não devemos nos precipitar demasiadamente. Passando a isca sobre o focinho do cão da frente para trás, poderemos os fazer sentar. Não custa dar em voz e tom que não assustem o filhote o comando "SIT". Depois, não custa tentar fazê-lo deitar, usando a mesma técnica a ser aprendida em "057 - Bolinha Mágica, seus Outros Recursos e a Obediência Passiva", mas agora apenas com o uso das iscas. Pode-se também atirar as iscas bem próximas ao filhote e comandar suavemente o "PEGA". O que devemos ter em mente que muitos filhotes não estão aptos a realizarem tal treinamento nas idades sugeridas, e que isso não significa absolutamente nada em relação a poder ou não poder no futuro ser um excelente cão em obediência ou para a finalidade de guarda. É apenas um recurso a mais de treinamento, não obrigatório, no entanto. Portanto, caso o filhotinho não interaja conosco como desejamos, não devemos de forma alguma concluir que será um cão inapto no futuro, até porque tal interação pode estar muito mais associada ao drive por isca do que ao drive de rapina. 045 - PONTO DE CORTE NO TREINAMENTO: POR QUAL CAMINHO IREMOS TRILHAR? Agora, é hora de parar e pensar: para que queremos nossos cães? Queremo-los bem controlados no momento do ataque e com uma mordida razoável ou vamos querer eles não tão controlados no momento do ataque e com uma mordida o mais forte possível? Vamos querer que eles ataquem de maneira mais controlada, mas menos letal, ou vamos querê-los sem tanto controle, mas que ataquem com extrema violência e menores chances de revide por parte de seu inimigo? Chamaremos ao primeiro caso de efetividade moderada e ao segundo de efetividade absoluta. Acho que tal decisão, mais do que dependente de pontos de vistas filosóficos, deve estar em sintonia com a nossa necessidade e real capacidade de manter o cão. Isso deve ser decidido com o animal ainda filhote de três, quatro meses de idade. Pessoas podem se assustar com a frase "ataquem com extrema violência". Mas, se queremos nossos cães para nos defender, e a vida de um membro da nossa família possa depender disso e se nosso cão atacar assim, bem melhor. Isto não significa, de forma alguma, que nossos cães venham a se tornar feras ou que deixem de ser confiáveis em suas relações familiares. Com certeza, uma coisa não tem nada a ver com a outra. Em verdade, não são apenas dois caminhos que são exemplificados, mas inúmeros caminhos que podem ser considerados entre esses dois pólos. Estamos falando somente dentro da cinofilia efetiva. Se formos considerar o esporte, o pólo do maior controle e do ataque mais brando terá que ir muito além do que está sendo tratado neste trabalho. Vejam mais sobre este assunto nos itens: "110 - Proteção e Esporte" e "111 - Cinofilia Esportiva e Cinofilia Efetiva". Bem, vamos deixar de considerações e ir à parte prática da questão. Se a nossa escolha for por ter um cão mais violento no ataque, que morda com mais violência e eficiência, o treinamento de levante de drive de rapina, devemos dar ainda mais ênfase a jamais obrigar o cão a soltar o mordente, bolinha, ou seja lá o que morda quando do treinamento. Deve-se apenas esperar que o cão solte o objeto pelo o uso dos estímulos passivos e aproveitar o momento preciso em que o cão soltará o objeto para lhe dar o comando de soltar. É mais difícil de obter

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resultado, mas se optamos pela efetividade absoluta esse deve ser o caminho. Vejamos a definição dada a estímulo passivo pelo Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos: “ESTÍMULO PASSIVO - Consiste na ausência de estímulo negativo ou positivo. Em verdade, é uma ausência de resposta ao comportamento do cão. Muitas ações do cão têm como meta induzir uma resposta do dono, condutor ou adestrador. O Estímulo Passivo pode também ser entendido a ausência ou retirada de um outro estímulo que mantinha um comportamento. A iniciativa de não interagir como o cão espera, leva este a mudar seu comportamento.” Alguns artifícios devem ser esquecidos e outros modificados conforme nossa opção de treinamento. Algumas alternativas entre efetividade moderada e efetividade absoluta poderão ser comentadas nos itens a seguir. Na opção efetiva absoluta, o fair play deve incentivar basicamente a perseguição e a obediência em soltar qualquer objeto que o cão tenha como presa deve ser realizada exclusivamente pelo estímulo passivo. Mas, em nenhuma opção efetiva, deve-se arrancar nada da boca do cão em momento de treino de levante da rapina. Na opção mais efetiva, ao invés de ensinar o cão a soltar sob comando ou a trocá-lo por outro artefato ou petisco em nossa mão, devemos sempre que possível apenas condicioná-lo soltar pela simples utilização do estímulo passivo ou pela apresentação de outro objeto de mesma categoria (bolinha por bolinha, lingüiça por lingüiça, etc.). Aliás, essa sempre, em qualquer hipótese deve ser nossa conduta. Apenas devemos ser mais radicais em relação a isso quando optamos pela efetividade absoluta. A perseguição à bolinha pode ser realizada, mas o comando de soltá-la não deve ser usado no treinamento, independentemente a opção efetiva, de forma que se extraía com o uso de nossas mãos nada da boca do cão, pois tenderá a deixá-lo com a “boca mole”, isto é com a mordida sem força e gana necessária à atividade efetiva. Na opção mais efetiva, não se deve utilizar do artifício do cão esperar alguma recompensa tipo isca para que solte algo. Isso poderá fazer com que ele comece a afrouxar a mordida na espera da recompensa. Isso poderá criar nele um imprinting de já estar pronto para a recompensa durante o trabalho de mordida. Os imprintings infantis ficam arraigados ao comportamento e aos reflexos do cão, e o cão poderá levar consigo, mesmo em situações de fair fight, o condicionamento de morder fraco e com pouca ênfase. A melhor forma de ensinar a soltar é a utilização do estímulo passivo. Pois o estímulo passivo só irá atuar quando o estímulo de morder se abrandar por si. Não haverá nenhum outro tipo de conflito ainda que através de estímulos positivos. Dentro da opção de efetividade absoluta, pessoas das relações do animal nunca devem ser usadas nos treinos. O toque de bastão, ainda que de início muito ameno, deve ser realizado tão logo o cão comece a morder com mais firmeza o objeto e modulado de forma que o cão o suporte e fique com mais gana na mordida, ainda que muito prudentemente. Em qualquer das opções, batidas com o bastão devem começar de forma bem leve no cão e mais fortes no solo para acostumar o animal a seu som. Nenhum treinamento para obediência, além de estímulos positivos (e somente positivos) deve ser dado ao filhote. A necessária lapidação posterior com estímulos negativos na obediência no caso da opção efetiva absoluta deve aguardar por mais tempo, tanto na obediência como um todo como em particular no controle sobre o ataque. Isso porque a intensidade deverá prevalecer sobre o controle. Este capítulo é escrito levando-se em conta a opção pela efetividade moderada, e este item vem a trazer as considerações que devem ser observadas se a opção

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for pela efetividade absoluta. Tais opções deverão ser lembradas no decorrer da leitura. Continuando ainda sobre a opção pela efetividade absoluta, toda obediência deve se limitar a ensinar a sentar, a vir junto, etc., além de ser ensinado a conviver harmoniosamente com seus donos e familiares. Comando de soltar, nessa fase, jamais. Do contrário, estaremos ensinando ao nosso cão um comportamento esportivo ou efetivo moderado e não efetivo absoluto. O controle deve ser ensinado depois. Os imprintings iniciais devem maximizar a intensidade. Com certeza, isso fará diferença na intensidade do ataque quando o cão for adulto. Não devemos confundir obediência no sentido geral com obediência associada à proteção. Um cão, mesmo que não seja ensinado a não soltar com tanta presteza ou não interromper um ataque lançado, pode ter obediência elevada em outros itens de sua educação. Isso não alterará em nada sua efetividade e o tornará um animal apto à convivência familiar. Não adianta eficácia de ataque sem que o cão esteja próximo para defender os seus. E, para isso, o animal necessita de um mínimo de obediência para que sua presença seja desejável, agradável. Cães ensinados prematuramente a soltar tendem a ficar aguardando durante toda a mordida que dêem o comando para soltar. Isso faz com que eles mordam com menos obstinação, pois esperam que a qualquer momento a mordida seja interrompida. Imprintings de soltar dados durante a fase de fair game tenderão a se manter, e o cão tenderá por toda a sua vida a morder com muito menor força e fúria dado ao conflito inerente entre controle e intensidade. Haverá uma grande tendência de que o cão venha a morder com menos firmeza. Posteriormente, ensinaremos a como fazer um cão soltar e não perder a obstinação da mordida com perda mínima do tempo em que o cão irá soltar a presa no item "114 - Como Fazer um Cão Soltar sem o Comando Verbal”. É claro, que nas fases iniciais é muito mais fácil fazer o cão aprender a soltar. Por isso ser este tópico sobre o ponto de corte entre pender mais para o controle ou pender mais para a intensidade e comentar sobre a opção ainda mais efetiva. No caso, falamos na opção pela intensidade, a da efetividade absoluta. Mas, mesmo na efetividade absoluta, poderá haver a necessidade de que em algum momento o cão solte. Para isso o método que menos conflito traz é o do Estímulo Passivo, onde apenas se deixa o cão cansar de morder e se associa o momento em que ele por si larga o mordente com o comando de soltar. Vide mais em “050 – Técnica de Prever uma Ação e Comandá-la antes dela Ocorrer”. Se o fulcro do treinamento for a efetividade absoluta, o cão deverá ser treinado a morder somente quando já puder fazer isso com a devida gana. Não se deve formatar imprintings de morder sem a devida gana. Portanto: (1) deve-se evitar treinar o cão a morder objeto que esteja em mãos de pessoas que não sejam realmente estranhas ao animal, pois quando há o estranho, este é que deve ser mordido; (2) mesmo assim, os treinamentos mais “pesados” (isto é, com uma maior exigência de maior nível de rapina) devem ser apenas efetuados quando o cão já tiver evoluído parcialmente sua defesa e já saiba discernir um amigo de um estranho, daí a grande utilidade da triangularização da defesa para que a defesa possa ser erguida o quanto antes; (3) não bastará apenas discernir. Será necessário que já existam mecanismos psíquicos prontos para sentir sensações diferentes entre a presença de um estranho e a presença de um conhecido. Para isso, deve haver uma idade mínima, que varia de exemplar para exemplar. Isso poderá acontecer em raríssimos animais a partir dos quatro meses de vida. Mas, na grande maioria dos casos, ocorrerá entre o sétimo e o décimo mês de vida, como pode ocorrer até os dezoito meses sem que isso tenha que ser considerado necessariamente uma falha temperamental. Tentar apressar

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esse momento pode ser um erro grave, e, salvo nos casos em que o filhote passou por traumas (o que nunca será positivo), ele depende muito mais da herança genética para atingir esse ponto do que de qualquer outro fator. Portanto, precisamos ser pacientes. O máximo que se pode fazer é tentar elevar a defesa dos filhotes suavemente, através do exemplo dado pelos cães mais velhos e por provocações muito discretas feitas à distância por estranhos. Mas, se o filhote ainda for imaturo quanto a essa questão, de muito pouco adiantará, o que, em princípio, não deve ser motivo de preocupação; (4) em nenhuma hipótese, quem faz a figuração deverá ter qualquer intimidade com o animal, nem mesmo ficar após o treino perto dele sem se comportar como figurante. Isso vale para qualquer opção efetiva; (5) o figurante deverá sempre manter atitude de provocação e caça, conforme as possibilidades de cada animal. Muita sensibilidade e conhecimento são necessários. Isso também vale para qualquer opção efetiva; (6) os treinos devem ser comedidos e moderados em filhotes com menos de sete meses e serem realizados no máximo duas ou três vezes por semana, sob risco de gerar descontrole temperamental futuro ou, paradoxalmente, diminuir os drives de proteção pela banalização dos treinos. 046 - TREINAMENTO PRÁTICO – CONSIDERAÇÕES INICIAIS: A partir de dois meses de idade, podemos, de forma muito sutil e insidiosa, iniciar alguma base para se ter um cão com bom nível de obediência no futuro. Uma boa obediência não está necessariamente dissociada de um bom nível de efetividade. Pessoalmente, preferimos esperar até já haver iniciado o treinamento com “bolinha”, lá pelos quatro meses e meio de idade, mas, de preferência, não deixar que ultrapasse o quinto mês, muito embora o cão adulto em qualquer idade, exceto na senilidade avançada, pode sempre aprender, pelo menos obediência. O treinamento que vise a obediência através do fair play e dos estímulos positivos, muitas vezes tem uma idade limite para ser iniciado. Diríamos essa idade é aquela em que o cão ainda tem os instintos de rapina em sua fase infantil, em nível de brincadeiras. Enquanto pudermos fazer um cão correr com alegria atrás de uma bola, temos um potencial drive de rapina a ser levantado. Na maioria dos cães de raças de guarda efetiva, o treinamento simplesmente para guarda pode começar bem mais tarde, diretamente em nível de fair game avançado com figuração. Quando nos detivemos no item "Ponto de Corte no Treinamento: Por qual Caminho Iremos Trilhar?", vimos que devemos trabalhar com a bolinha e dispensar os comandos de solta para incentivar o desenvolvimento da rapina no caso de optarmos pela efetividade absoluta. Mas, isso não é verdade se nossa opção for pela efetividade moderada. Apesar de a bolinha poder ser dispensável, ela sempre poderá trazer estímulos ao desenvolvimento da rapina. Embora possa um cão só ter afinidade pelo fair play ou só pelo fair game, via de regras, tais afinidades estão associadas. Implementar o fair play ajudará a incentivar o fair game e, por fim, o fair fight. Anteriormente, indicávamos o treinamento de obediência, dando limites ao filhote já aos dois meses de idade. Só que isso pode influenciar negativamente o despertar do drive de rapina. Mas, no caso de podermos conviver com o filhote em nossa casa, haverá veemente necessidade de dar limites ao filhote, para que sua conduta não se torne insuportável. Podemos iniciar com o comando do “NÃO” e com o recurso do degrau, a serem citados posteriormente em “071 - Comando “NÃO” – Definindo os Limites”. Devemos, no entanto, cuidar que excessos de repreensões não prejudiquem o desenvolvimento dos drives do filhote. Por vezes, é preferível afastar o cãozinho da

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nossa convivência cotidiana até que esteja mais apto ao aprendizado do que correr o risco de forçá-lo demais, se for o caso de não termos a experiência necessária para sabermos lidar com obediência em filhotes dessa idade sem traumatizá-los. Se por outro lado, a convivência entre filhote e donos pesa positivamente mais do que quase qualquer outro fator, por outro, havendo alguém da casa que repreenda exageradamente o filhote ou o maltrate, melhor será afastar o filhote ou tal pessoa. Se o dono ou os donos souberem como lidar com o filhote sabendo da forma correta lhe impor limites sem traumas, essa será a situação ideal. Outro risco seria ensiná-los a desobedecer ao invés de obedecer. Para evitar estes dois últimos problemas, temos duas palavras-chaves: ternura e energia. Jamais deixar que o cão vença quando lhe for dito para não fazer algo. Por isso, devemos apenas comandar o que for possível, além de ter sempre a perseverança e nunca a violência como nosso principal recurso. A experiência é um fator que também irá ajudar muito. Após certa fase, que varia de exemplar para exemplar, o trabalho de guarda terá que ser tentado em cima da defesa, o que não é o ideal. Mas, não devemos nos preocupar, pois nem todo cão que não corre atrás de bolinha não tem potencial de rapina. Esse potencial pode ser levantado de muitas formas, inclusive com a inclusão do cão em trabalho em matilha, desde que não tenha instinto de briga. O trabalho de matilha e a criação em matilha, por um lado são inviabilizados pelo instinto de briga, mas, por outro, inibem a tendência de que os cães briguem, pois os acostuma a conviverem juntos. Serve também como demonstrador de quais filhotes, desde cedo, têm tendência à luta entre cães, e isso ajuda a descartá-los da reprodução. O trabalho em matilha parece, e dissemos ‘parece’, já que não temos dados suficientes para uma comprovação mais convicta, que inibe o instinto dos cães brigarem entre si, pois os acostuma a uma boa cooperação entre eles, pode demonstrar a eles que são aliados e não inimigos. Mas, tal afirmação necessitaria de mais dados epidemiológicos. Durante este capítulo, os comandos verbais serão comentados no decorrer das exposições sobre os diferentes assuntos, e os comandos por estímulos visuais serão discutidos no final em "Comandos Mímicos". 047 - RAPINA, O LEVANTE INICIAL: Lá pelos três meses de idade, podemos começar com o trabalho de levantamento conjunto da rapina e da defesa, que nada mais deve ser do que ver estranhos a certa distância tomando atitudes provocativas leves, mais voltadas a estimular a curiosidade e caça dos filhotes do que a defesa. O ideal é que se faça isso até os quatro meses de idade, mas filhotes de três meses já podem iniciar ainda que como observadores do comportamento dos mais velhos. Provocações, como se aproximar diretamente em direção aos filhotes, bater com o pé no chão, gritar, devem ser rigorosamente proibidas. O que deve ser feito nada mais é do que manter os estranhos a uma distância de alguns metros da grade ou tela onde estão os filhotes juntamente com algum cão mais velho que não os agrida e que tenha drives já mais altos e reaja à presença do estranho. Pode ser um ou mais filhotes mais velhos, de preferência. Cães muito violentos podem ter um efeito inverso, ao assustar, com sua reação, os filhotes. Isso pode ser feito, no máximo, uma ou duas vezes por dia e não durar mais do que dois ou três minutos.

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Leiam mais sobre o assunto em “121 – Como Desenvolver o Potencial de Proteção”. 048 - RAPINA E A BOLINHA MÁGICA: A bolinha deverá ser usada apenas para estimular o drive de caça, além de poder servir de futuro instrumento para captar a atenção do cão durante os treinamentos de obediência. Não se dará imprintings nesse momento para ensinar o cão a soltá-la diretamente. O imprinting de soltar sob comando ainda em fair play foi feito no passado e foi notável a diminuição da força das mordidas dos cães que fizeram tal treinamento em relação aos demais cães que não realizaram tal tipo de treinamento. Podemos usar mais de uma bolinha, apenas para que o cão obtenha o imprinting de soltar uma delas para perseguir outra, aprendendo a troca de caça. Mas, o comando deverá ser o "PEGA" em relação à bolinha que entra no jogo e não o "SOLTA" em relação à bolinha que com morde. Tal treinamento poderá iniciar tão logo o cão se interesse em perseguir a bolinha, via de regra, dos 75 aos 120 dias de vida. Mais adiante, utilizaremos o comando “SOLTA” associado ao estímulo passivo no preciso momento em que o cão por si só solta o objeto. Este último comando pode ter seu ensinamento apressado de outra forma também. Bastaria que quando o cão naturalmente soltasse a bolinha, sob a influência do estímulo passivo, mostrássemos a ele outra bolinha até então oculta em algum bolso, sempre meio segundo antes do cão soltar a primeira bolinha comandar o “SOLTA”. Isso, com certeza, o fará a aprender bem mais depressa a soltar e a obedecer tal comando. Nada é impossível para quem leva jeito e tem boa-vontade. No entanto, em caso de insegurança por parte do leitor, o melhor é procurar um profissional. Só que, em todo caso, é bom ter o conhecimento de como é o processo, pois muitos que se dizem profissionais – e, por vezes, até são profissionais – podem tentar adestrar cães pelo pior caminho, e, nesse caso, é melhor procurar outro profissional ou até se virar sozinho com o cão. Iniciamos brincando com uma bola de tênis no chão e analisando o interesse do filhote. Caso este se demonstre interessado na bola, temos um grande e importantíssimo fator ao nosso lado. Tal fator é: o cão demonstra aparentemente um bom drive atual de rapina. O que, agora, é só um fair play de brincar com a bola, mas é um bom início. Saber até que ponto este drive atual poderá ser fomentado até o fair fight é outra história. Se for de raça e linhagem bem selecionadas para guarda efetiva, é quase certo que deverá manter o drive de rapina até o fair fight, se bem manipulado. Como já foi dito, esse fair play pode, ou não, evoluir até o fair fight, pois este último implica suportar pressão psicológica e, principalmente, rigor no uso do bastão inerente à evolução do drive de rapina do fair play ao fair fight. Obviamente, que na fase infantil da vida de um cão ou mesmo no início dos trabalhos de levantamento de drive em um cão adulto, não devemos colocar nenhuma pressão nem ter a prematura intenção de saber se o cão suporta ir até o fair fight ou não. Um teste realizado prematuramente, tanto em um filhote quanto em um cão adulto, poderá inibir um bom drive de caça e até acabar com o incipiente fair play. Caso o filhote não se interesse pela bolinha, teremos que usar de outros recursos a serem comentados posteriormente e em fase um pouco mais adiantada da vida do cão. Mas, vamos repetir, isso não deve ser encarado como algo dramático. O treinamento consiste em nada mais do que brincar com uma bolinha de tênis até atrair a atenção do cão. Depois, atirá-la para que ele a persiga, mantendo mais uma ou duas bolinhas conosco. No

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exato momento de atirar a bolinha, devemos dizer em voz alta o comando “PEGA”. Com isso, fixaremos o imprinting do cão perseguir a caça após ouvir tal comando. É provável que o cão pegue a bolinha e fique com ela na boca sem vir até nossa direção. Após alguns segundos, deveremos quicar com outra bolinha no chão, atraindo a atenção do cão à caça-viva (bolinha que se mexe em nossas mãos ou que é lançada), que deverá ser preferida por este à caça-morta (bolinha que não mais se mexe em sua boca). Um ou dois segundos antes de quicar a nova bolinha, devemos dizer em bom tom o nome do cão, quicar a bolinha e falar com voz bem audível o comando “VEM”. Se o cão vier até nós com a primeira bola na boca, não devemos tirá-la da boca do cão. Apenas deixar que a largue (ou não) e, em seguida, atirar a nova bolinha, comandando novamente o “PEGA”. Enquanto o cão busca a nova bola, pegaremos a anterior e reiniciaremos o ciclo. Sobre o comando “VEM”, veremos algo a seguir em “Técnica de Prever uma Ação e Comandá-la Antes dela Ocorrer”. Durante esse treinamento, podemos ficar sentados em local confortável, pois será mais produtivo. Outro fator importante e que pode ser oportunizado nessa fase é o elogio ao cão com voz mimetizada como que falando com crianças. A mudança de voz é importante, pois atrelar ela o prazer da brincadeira e à obediência dos comandos cria uma associação prazerosa e bidirecional entre os elogios (com o timbre diferenciado de voz – “BONITO, ÔÔÔ, BONITO”), o prêmio (a bolinha) e a obediência (ao “VEM”, no caso). Muitos adestradores não ficam à vontade em mimetizar suas vozes, principalmente aqueles que vêm de uma formação militar. Nesse caso, podem usar o recurso do clicker, um aparelho levado na outra mão e que emitirá um som característico ao qual o cão associará momentos e eventos gratificantes. O clicker pode ser substituído por um assobio específico ou por uma palavra-chave, como "OKAY". Mas, com certeza, para quem não se envergonha de mimetizar a voz e falar carinhosamente com o cão, essa é a melhor forma. Até aqui, estamos nada mais do que exercitando um fair play, mas também dando estímulo à elevação do drive de rapina. Estamos também já ensinando o cão a vir até nós sob comando. Estamos, pois, a exercitar a um só tempo rapina e obediência. A passagem do fair play para o fair game deve ser sempre insidiosa. Na verdade, um bom fair play pode ser um bom início para o desenvolvimento de um bom fair fight e de uma boa capacidade de luta. Vejam, nessa brincadeira, já ensinamos três comandos: “PEGA”, “VEM” e “SOLTA”. Em complemento a este item vide: “099 - Adaptações no Bite para Direcionar o Ataque”. 049 - TROCA SUJA E TROCA LIMPA: O que é troca suja, e o que é troca limpa? Diz-se troca suja é aquela na qual o cão é recompensado com petisco, que a cada acerto, ganha um petisco, um suborno por haver obedecido. Daí, o termo "troca suja". E como é a troca limpa? Bom, troca limpa é aquela na qual o cão obedece simplesmente para agradar o dono e receber seus elogios. Aquela que o cão faz pela simples alegria de agradar. Daí, o termo "troca limpa". Para chegar à troca limpa, alguns adestradores e seus cães têm que "sujar" mãos e focinhos. Quando dissemos isso, nos referimos aos petiscos que eles dão aos cães juntamente com mimos e agrados

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para previamente melhor condicioná-los a ter alegria em obedecer e em alegrar ao adestrador ou dono. Isso significa que ao invés de recompensar o cão com iscas a cada ato de obediência, o adestrador os recompensará com seus agrados, condicionando-o previamente a receber iscas e agrados a um só tempo. Isso criará uma associação límbica de prazer entre os elogios e afagos do dono com tais iscas. Em outras palavras, ao invés de usar o artifício da recompensa diretamente, o utilizam de forma indireta. Fazem isso por saberem que elogios por parte do adestrador e do dono sempre devem ser usados em todos os momentos gratificantes para o cão, não somente quando do treino com iscas. Quando se pega a guia para passear, quando se dá água, comida, quando o dono chega à sua casa... Alguém poderia questionar: "Mas, não dá no mesmo? Não é 'sujeira' de qualquer forma?". Respondemos que não. Pois no caso da recompensa direta, o cão se foca na isca, e, no segundo caso, o cão se foca no dono. A reação do dono e não o petisco é a recompensa que alegrará o cão. Isso traz inúmeras vantagens. A primeira, é que o interesse do cão em obedecer não diminuirá com a diminuição do apetite. Um cão já farto de comer iscas, ainda que o móvel da recompensa possa se basear mais na punção do que no instinto (ou seja, mais no desejo de ganhar a recompensa do que na fome em si) terá seus limites para engoli-las. A segunda, é que aumentará a interação com a figura do dono propriamente dita e a benéfica amizade que age positivamente em todos os sentidos, inclusive quanto à obediência e à defesa ao dono. A terceira é que o cão não terá seu foco dividido entre o trabalho que faz e a isca. A quarta vantagem é que nem sempre dispomos de bolinha ou de iscas à mão e teremos mais dificuldades de fazer obedecer sem o uso delas um cão que esteja acostumado a obedecer com tais recursos. A quinta é que não acostumaremos o cão a comer coisas fora de sua tigela, o que minimiza as chances de envenenamento. A busca pela isca, ao trazer para si a tenacidade do cão, tira sua vigilância necessária a um cão de guarda. Se formos começar a pensar, é provável que apareçam muitas outras vantagens. Desvantagem, nenhuma. Mas, qual será exatamente a moeda de troca na troca limpa? Já foi dito: os elogios e afagos do dono. Mas como? Quando ensinamos um cão a obedecer usando petiscos, vamos ver a importância que deve ser dada aos elogios durante todo o trabalho no qual a isca participa. Na memória inconsciente do cão, ficará a associação límbica (vide em "008 - Sistema Límbico, o Quê É Isso?"). Esse sistema cerebral e inconsciente gravará sensações prazerosas entre o exercício de obediência, a sensação de receber o petisco e com os elogios e afagos do dono ou adestrador. Isso ocorrerá de tal forma que o prazer em receber os agrados do dono superará o desejo pela isca. Em verdade, estamos colocando no cão uma punção. Uma punção por ser aprovado e querido. Mas, tal punção ocorrerá e trabalhará de forma positiva, pois é fruto de um trabalho agradável e não de uma neurose. Existiria ainda uma forma intermediária que seria criar uma punção pela bolinha. Isso é realizado quando interagindo com o cão jogando a bolinha para que ele a pegue enquanto o elogiamos. Depois, utilizaremos a bolinha como meio de ensinar o cão a obedecer, como será visto adiante neste capítulo. Em verdade, as três formas dão como prêmio tanto a isca, quanto a bolinha, como o reconhecimento do treinador. O enfoque, no entanto, é diferente e muda radicalmente o resultado do trabalho. A forma do uso da bolinha teria como vantagem em relação a das iscas o fato de não se tornar inaplicável quando o cão estiver farto de alimento, bem como do cão não se acostumar a comer

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fora de sua tigela. Ainda que seja incômodo andar com uma bolinha no bolso, isso é bem preferível a andar com o bolso cheio de iscas. Aí, teremos mais uma outra vantagem do uso da bolinha ao invés do das iscas. O uso da bolinha, por outro lado, não trará vantagem alguma em relação às iscas no sentido de ambas subtrairem parte do foco do cão no trabalho propriamente dito. Uma limitação no trabalho com bolinha é que este só funcionará em cães que desde filhote apresentaram uma boa intensidade de drive de caça no fair play. Tal artifício de manter a bolinha juntamente com os elogios, no entanto, tem sua vantagem quando se trata de cães dispersivos, pois é instrumento de manter a atenção deste concentrada na bolinha, ou seja, em quem segura a bolinha. Por isso, por vezes, é interessante seu uso, mas, se o cão não apresentar problemas de concentração, o preferível é que não se use qualquer outro prêmio se não a voz carinhosa do dono e seu afago. Isso não significa que usar a bolinha para brincar com o cão não seja algo positivo. Apenas, sempre, quando possível, devemos dispensá-la no trabalho de obediência. Mesmo assim, ela traz enormes vantagens em relação às iscas. Alguns preferem o clicker ou assobio ao invés do uso carinhoso da voz ou de palavra-chave. Particularmente, achamos o clicker mais frio e mais distante da pessoa de quem o aplica do que sua própria voz. Principalmente nos casos nos quais é o dono quem faz o treinamento, a voz deste tem uma função bem mais completa do que o uso do clicker, que pode, no entanto, ser usado com vantagens em outras especificações. O ideal é a passagem gradual e insidiosa da bolinha e dos agrados para os agrados tão somente quando se tratar de treinar e exercer a obediência, caso o adestrador fique mais à vontade iniciando o trabalho com bolinha. No entanto, não vemos inconveniente em usar petiscos, desde que não o troquemos por apetrechos de mordida. Não vemos não vemos razão para desaconselhar o uso de petiscos para ajudar no cão nos comandos de “SIT” e “DEITA”, por exemplo. Mas, de forma alguma recomendamos que se use petiscos na troca por lingüiças, etc. Como vimos em “Rapina e a Bolinha Mágica”, também nunca se deve tirar objetos da boca do cão durante os exercícios. Tirar com as mãos objetos de mordida da boca do cão dará a ele o imprinting de morder sem força. O ensinará a ceder na mordida e deve ser evitado. 050 - TÉCNICA DE PREVER UMA AÇÃO E COMANDÁ-LA ANTES DELA OCORRER: Esta é uma técnica muito simples, mas demanda algum grau de sensibilidade por parte do adestrador. Ela consiste em prever que o cão irá ter um determinado comportamento que será por nós induzido e usaremos a palavra usada no comando de tal comportamento antes que este ocorra. Um bom exemplo seria, como veremos adiante, fazer um cão soltar uma lingüiça sob o estímulo passivo. Quando o figurante larga a lingüiça, e esta fica na boca do cão, este não a irá soltá-la de imediato. A tendência natural será que o cão a leve ao solo tentando destruí-la ou a roer. O que faremos será manter o pescoço do cão alto com o uso de uma coleira (não de enforcador) até que o cão se canse da caça que está “morta” e a solte. Pois bem, com um pouco de experiência conseguiremos analisar a expressão facial do cão para prever esse exato momento que o cão soltará e diremos “SOLTA” um segundo antes que aconteça. Isso irá, aos poucos, trazer um condicionamento natural do cão soltar objetos quando ouvir tal comando. Não tenham pressa, pode ser um processo lento, já avisamos. O mesmo podemos fazer com a bolinha, etc.

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No item “Rapina e a Bolinha Mágica”, dissemos em comandar o “VEM” para que o cão nos traga a bolinha e não explicamos bem como. Seria usando essa mesma técnica: aguardaremos que o cão condicionado a fazer a troca da bolinha pela isca ou por outra bolinha que está em movimento em nossa mão venha até nós e no exato momento que ele estiver tomando tal decisão a comandaremos. Faremos o mesmo antes de comandar o “PEGA”, que servirá para comandar o figurante a provocar o cão. Sabemos que o cão irá reagir à provocação do figurante e anteciparemos o comando de ataque. Nesse caso, a evolução é bem rápida, tendo em vista o estímulo precipitante ser ativo (provocação por parte do figurante) e não passivo (ausência de estímulo em manter preso o mordente). Essa é uma técnica que evita conflitos e deve ser adotada sempre que nossa imaginação vislumbrar uma ocasião para usá-la, desde que tenhamos embasamento técnico para tanto. 051 - BRINQUEDOS E MATERIAL DE TREINAMENTO: Devemos fazer distinção bem rigorosa entre dois tipos de objetos com o qual um cão irá se entreter: aquele que ele usa somente para brincar e aquele que usamos durante os treinos. Os brinquedos, como ossinhos, chocalhos, etc., devem ficar com o cão para que este se entretenha quando está só – o que também minimiza a possibilidade do cão estragar outros objetos, como mangueiras, vassouras esquecidas no jardim, etc. Já as bolinhas e outros objetos usados nos treinos e mesmo objetos semelhantes aos usados nos treinos não devem, de forma alguma, serem deixadas com o cão. Após os treinos devemos guardá-los fora de seu alcance. Tais objetos devem exercer fascinação no cão, principalmente, porque são um modo deste interagir com seu dono ou treinador. Deixar com que a bolinha, por exemplo, permaneça com o cão irá banalizar sua presença, e o cão perderá grande parte do fascínio exercido por ela. Tais objetos deverão ser apresentados somente no momento do treino, não devendo ser sequer mostrados em outras ocasiões. A banalização provocada em relação a tais objetos, caso eles permaneçam com o cão, irá diminuir e muito o interesse do cão por eles e afetar negativamente a formação de seu drive de caça e ensinamento da obediência por meio dos estímulos positivos, podendo, inclusive, dificultar sobremaneira todo o treinamento ora exposto. Sempre é bom lembrar que todo brinquedo e o todo material de treinamento devem sempre não possuir qualquer possibilidade de lesionarem o cão, de ser engolidos pelo cão. Um plástico que se torne cortante ao ser quebrado pode provocar hemorragia gástrica ou intestinal e sequer ser visualizado no RX, podendo levar ao óbito Um saco plástico ou algo que a isso se assemelhe pode causar obstrução gástrica e também levar ao óbito se não for feito logo o diagnóstico e a competente cirurgia. Produtos que usem tintas podem ser tóxicos, etc. Por isso, todo cuidado é pouco antes de dar algum material para que o cão brinque.

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052 - OBEDIÊNCIA E A BOLINHA MÁGICA: Em "Rapina e a Bolinha Mágica", ensinamos o cão a ver a bolinha como uma caça em nível de fair play, além da alegria da interação cão-dono. A partir daí, a bolinha poderá ser usada como meio de treinar a obediência sem qualquer castigo, apenas através de estímulos positivos. Devemos, no entanto, sempre associarmos a bolinha aos comandos de voz ou mímicos. É fundamental que logo o cão não relute em nos obedecer sem o uso da bolinha ou de qualquer outro objeto. Primeiramente, deveremos colocar a bolinha na mão e movê-la enquanto o cão espera que seja lançada, até fazê-lo perceber que não pode alcançar a bolinha na nossa mão se isso nós não quisermos, já que somos muito mais ágeis com as mãos do que um filhote com a boca. Saberemos que o cão percebeu tal coisa assim que ele pára à nossa frente esperando que joguemos a bolinha. Para obter a obediência, colocaremos a bolinha na mão e a levantaremos sobre a cabeça do cão, tirando-a de seu alcance toda vez que tentar pegá-la, até que ele pare. Conforme a bolinha, levada por nossa mão, for passando sobre a cabeça do cão, no sentido da ponta do focinho para a nuca e diminuindo de altura, o cão tenderá a sentar para mantê-la em seu campo visual. Neste momento, ou uma fração de segundo antes, falaremos em bom som: “SIT”, por mais de uma vez, se for o caso, até que o cão sente. Caso, de início, o cão não perceba que a nossa intenção é que ele se sente, uma ajudazinha com a outra mão, baixando a garupa do animal é bem-vinda. Com alguns cães, é interessante usar a ajuda de uma guia e de um peitoral para que o cão não caminhe para trás ou se vire. O peitoral é preferível a qualquer artefato que prenda o cão pelo pescoço, pois não impede que o cão erga o pescoço e se sente. Por fim, assim que o cão se sentar, o deixaremos por dois ou três segundos nessa posição e lançaremos a bolinha, como fazíamos antes, sob o comando de “PEGA”. Assim, repetiremos todo o ritual de esperar que o cão venha até nós, sob o comando “VEM”, esperando que lancemos outra bolinha, conforme o descrito em “Rapina e a Bolinha Mágica”. O comando de busca da bolinha será, por si, o estímulo positivo com o qual presentearemos o cão, desde que tenhamos conseguido despertar no cão o interesse por ela. Usar iscas por duas ou três sessões pode ser necessário para que o cão pegue o condicionamento de vir até nós. Mas, devemos tão logo quanto o possível dispensá-las. O que não devemos, de forma alguma, é arrancar a bolinha ou qualquer outro objeto para ser mordido em treinos da boca do cão e condicioná-lo a afrouxar a boca para que dela retiremos o objeto. O tempo de manutenção entre o cão sentar, após o “SIT”, e nós atirarmos a bolinha deve ir aumentando gradativamente até chegarmos a uns quinze segundos ou mais. A bolinha deve ser mantida sob o olhar e atenção do animal durante tal período, pois é ela que prende a atenção do cão, fazendo que permaneça imóvel. Por vezes, ao invés de atirarmos diretamente a bolinha, a manteremos na mão e nos agacharemos e acariciaremos o cão com elogios sempre com timbre de voz carinhoso (ou uso de palavra-chave ou clicker). Ficaremos agachados junto ao cão rigorosamente encostando-nos a ele, reforçando, com isso, o estímulo positivo em resposta à sua obediência. Em seguida, lançaremos a bolinha e repetimos o ritual, “PEGA”, “VEM”, “SOLTA”, “SIT”. O comando de “SIT” com o auxílio da bolinha deve evoluir ainda nesta fase, até que a bolinha não precise mais ser sequer mostrada ao cão, sendo somente necessário a ordem verbal. Aos poucos, vamos realizando uma trajetória mais incompleta com a bolinha sobre a cabeça do cão, até que somente a mostremos e a seguir, só a voz do adestrado deve ser suficiente.

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Até aqui, somente através de estímulos positivos, sem qualquer trauma, por mínimo e irrelevante que seja, conseguimos de forma gratificante, para o cão e para nós, estabelecer condicionamento de obediência a quatro comandos importantes. Ao mesmo tempo, reforçamos o elo de amizade e cooperação com o cão, aumentamos sua confiança em nós e em nos obedecer e elevamos as bases de sua rapina. Por isso, dissemos: “bolinha mágica”. Antes de discutir sobre o teste com a lingüiça, vamos nos reportar ao cão que não se interessa em perseguir a bolinha. Devemos, entretanto, lembrar que esse não é o cão ideal para ser lapidado para a função esportiva, mas que pode a se tornar um grande cão para o trabalho de guarda para uso civil. Define-se como “civil” o trabalho de guarda para uso residencial e sem pretensão a obter prêmios em provas esportivas. Na verdade, é o trabalho que discorremos neste livro. Muito embora, os princípios aqui descritos sirvam como boa base a qualquer tipo de trabalho. Alguns, tanto para quem os irá usar, como até para quem queira resultados diversos, fazendo o oposto, evitando-os. Utilizamos “SIT”, ao invés de “SENTA”, pois este equivale à posição em que o cão fica sentado, sobre os posteriores, mas com os anteriores erguidos. No “SIT”, os anteriores ficam com as almofadas plantares apoiadas ao solo. O comando “SENTA” é dado a partir da posição “SIT”, e nele o cão ergue os anteriores, ficando sentado com os jarretes no chão. Outra posição é a que obedece ao comando “DE PÉ”, onde o cão a partir do “SENTA”, ergue-se, esticando os posteriores, ficando somente apoiado sobre as almofadas plantares posteriores. Questionamos a utilidade dos comandos “SENTA” e “DE PÉ” na cinofilia efetiva. Para complemento deste assunto, deve-se ler o item "113 - Modular o Comando de "SOLTA" e a Força da Mordida". 053 - ALTERNATIVAS PARA CÃO QUE NÃO CURTE BOLINHA: Muito bem, nosso cão não demonstra o mínimo interesse pela bolinha. E agora? A primeira alternativa é substituir a bolinha por um kong, para isso vamos especificar o que seja um kong: “KONG – Dispositivo de borracha resistente onde se inserem petiscos ou substâncias com odores específicos para treinamento e entretenimento dos cães. Há dois tipos básicos de kongs. O primeiro tem como finalidade básica entreter o cão que deverá aprender a retirar guloseimas de seu interior. O segundo também pode ter tal finalidade, mas é utilizado para o ser usado como “caça”. Este pode ser atirado longe para que o cão o busque, sendo que alguns têm a possibilidade de ser incorporado a ele um cordão para puxá-lo à distância, bem como para estimular o cão a persegui-lo enquanto o adestrador dá a ele movimento através do cordão. Todos os tipos podem ser usados no treino de faro, colocando-se no interior dos kongs quaisquer substâncias as quais o cão deverá localizar.” Dicionário de Cinologia e Termos Correlatos. O kong, por ter odor atrativo ao cão, pode ser mais atraente do que a bolinha, e muitos cães que não se interessam pela bolinha podem vir a se interessar pelo kong. Cabe lembrar que tal dispositivo quando usado para treino nunca deve ser colocado como simples brinquedo para o cão. Na boca de um cão com mandíbulas poderosas, a partir de certa idade, não seria muito longa a vida

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de qualquer kong usado como brinquedo. Como vimos anteriormente, deixar material de trabalho à disposição do cão banaliza a presença de tais materiais. Isso trará uma provável queda do desejo dos cães persegui-los pela diminuição da valorização dos equipamentos de treinamento, o que trará conseqüente diminuição do impulso de persegui-los, ou seja, do drive de caça e de todo trabalho de obediência baseado nos estímulos positivos nos quais tais equipamentos sejam usados. Uma das razões para que o cão não se interesse pela bolinha e, até, pelo kong, pode ser o excesso de repreensões de nossa parte ou de alguém mais que conviva com o cão. Por isso, que por uma questão de prudência, abandonamos nossa antiga técnica do degrau e do comando “NÃO” antes de iniciarmos e consolidarmos o levantamento de drive com a bolinha. No mínimo por uns quinze dias, devemos ter o cão confiante em correr atrás da bola e brincar com ela, sem medo de repreensões por nossa parte. Ralhar com filhotes que ainda não se formataram imprintings de perseguir objetos nos treinos pode castrar os impulsos iniciais do fair play e vir a prejudicar todo trabalho posterior tanto para obediência quanto para a guarda. Por isso, quando nossos cãezinhos perseguirem vassouras em uso, mexerem em alguma coisa que não devem, até que tenhamos formatado seu comportamento de perseguir kongs, bolinhas, etc. não devemos, de forma alguma, ralhar com eles. É preferível apenas os afastar do ambiente caso tornem-se muito inconvenientes. Deixemos a educação de ensiná-los a não mexer nas coisas que não devem para um pouco mais adiante. Um cão muito condicionado a não mexer em nada, a não transpor nenhum limite pode imaginar que correr atrás de uma bola pode ser ofensa grave a seu dono e que isso resultará em castigo. Ainda que não imagine como pensamos, haverá um imprinting formado de não ousar muitas coisas. Ousadia é altamente associada ao drive de rapina. Não devemos, por outro lado, apenas procurar culpas em nós ou no mundo exterior à psique canina para que um filhote não se interesse pela bolinha – o que seria relativo tecnicamente às vivências infantis do filhote até então. A parte genética pode ter influência decisiva. Nesse caso, estamos nos referindo o que tecnicamente chamamos de herança genética. Sem um histórico dos acontecimentos, fica difícil ter uma noção aproximada da razão de tal desinteresse. Tratando-se de uma falta na herança genética é muito mais grave do que esta mesma falta nas demais variáveis do temperamento ou no caráter. Isso porque herança genética é inquestionavelmente repassada aos descendentes. Mas, como já dissemos, estas variáveis não são facilmente dissociáveis e só um relato verdadeiro e minucioso dos acontecimentos, bem como o conhecimento do temperamento de seus ascendentes, inclusive fatores raciais, poderá nos dizer algo razoavelmente conclusivo. Além do potencial do que será, ou não, repassado para os filhotes, é interessante saber se o desinteresse pela bolinha vem da herança ou é resultado do ambiente. Isso porque uma falha no ambiente ainda é mais fácil de ser recuperada até certa idade do que uma qualidade na genética. O que importa, para efeito de treinamento, é se, e como, podemos conseguir tal interesse ou se teremos por optar por métodos alternativos. Primeiramente, vamos tentar fazer com que o cão se interesse pela bolinha. Ao observarmos o cão em outras ocasiões, poderemos notar sua conduta. Se ela é alegre ou apática. Nos cães de conduta alegre e brincalhona, sem dúvida, é mais fácil conseguir tal interesse. Deveremos de início procurar

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conseguir que o cão brinque conosco de qualquer forma que seja, pular à sua frente, rolar, não importa o quê. Cada cão terá seu segredo para conseguir – se for possível – trazê-lo à brincadeira. Se isso for conseguido, ótimo. A partir daí, aos poucos, é só tentar incorporar a bolinha ou o kong a elas. Oportuno é referir que um cão desestimulado em suas brincadeiras, que sempre sofre repreensões por tudo o que faz, será muito menos propenso a brincar e correr atrás de bola, principalmente na frente de pessoas, em especial, daquelas que o censuram. Portanto, por vezes, em caso de ser impossível conviver com o filhote dentro de casa, o melhor é impedir seu acesso aos locais onde ele potencialmente possa destruir algo. Isso é bem preferível a viver ralhando com ele. Outra forma de trazer um cão às brincadeiras é colocar outro junto a ele, principalmente, se forem filhotes. Terá chance então de desinibir aquilo que não conseguia, provavelmente por temor às reações dos seres humanos. É de se pensar, no caso do cão se desinibir com filhotes e não com pessoas, a origem de tal fator. Por que o cão não se desinibe com pessoas? Será que sofreu ou vem sofrendo traumas? Em caso positivo, onde, quando, por que e por quem? Deveremos procurar saber para corrigir urgentemente tal fator. Usar outro filhote, caso possamos dispor de mais um, deverá ser a primeira tentativa, por ser o método mais fácil e mais eficaz. Outros cães brincalhões juntos quase sempre irão acabar por contaminá-lo com sua alegria, bem como mostrarão ao cão que as brincadeiras não serão repreendidas. Assim que o cão começar a brincar com outro filhote, coloquemos a bolinha junto a eles, jogando-a e esperando que eles tomem gosto por ela. Se conseguirmos, aos poucos, deveremos ir entrando na brincadeira. Depois, é só entrar no treinamento com bolinha desde o início, sem jamais ralhar com o cão durante tal treinamento, principalmente para os que tiveram dificuldades de assimilar a bolinha. Mas, se mesmo assim nosso cão não gostar de bolinha? A primeira alternativa será substituir a bolinha por uma isca no comando de “SIT” e no comando “DEITA”, que veremos posteriormente. Acho que até aí, não haverá nenhum problema em adaptar um treinamento a outro, já que os procedimentos praticamente não mudam. Antes, em trabalhos anteriores, preconizávamos que tentássemos o uso de uma lingüiça para substituir a bolinha. Atualmente, não usamos mais a lingüiça no fair play. Deixamos para usar tal artefato somente para treinamento em fair game. A lingüiça é um mordente, não devemos focar cães efetivos em mordentes. Essa foi a razão de nossa mudança de postura. Cães efetivos deveriam sempre se fixar em carne viva ou, pelo menos, se fixarem o mínimo possível em mordentes. É necessário também considerar se o cão ainda está muito novo para nossas expectativas. Antes de pensarmos em qualquer outra coisa, o melhor é avaliar se não devemos esperar um pouco mais. Caso o cão não tenha nenhum drive por isca, nem corra atrás da lingüiça, a forma tradicional de fazer sentar pelos estímulos negativos deverá ser usada, conforme explicaremos posteriormente, já que este capítulo está disposto de forma a acompanhar a idade cronológica do cão no que diz respeito ao seu ataque e obediência. Neste caso, sim, a mudança de filosofia e na forma de treinamento será significativa.

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Deixamos para depois, pelo seguinte motivo: se o filhote já não se interessa por uma bolinha nem por uma isca é porque lhe faltam obviamente drive de caça e drive por isca. Se formos colocar obediência agora através de estímulos negativos, iremos ainda mais sufocar as iniciativas e os impulsos do cão. Vamos esperar mais tempo para que o cão amadureça e ganhe personalidade. Quanto ao trabalho de proteção, é possível que tenhamos que começar pelo drive de defesa. Na maioria das vezes, no entanto, tratando-se de raças efetivas, o interesse do cão pela caça poderá ser desperto somente no nível de fair game ou até de fair fight e aparecer de forma quase que inesperada a um dado momento. Tal tipo de cão, via de regra, não dão bons animais para atividades esportivas, mas são excelentes cães de guarda efetiva. 054 - OBEDIÊNCIA - ESTÍMULOS NEGATIVOS, POSITIVOS E PASSIVOS: A obediência divide-se em três categorias. A primeira delas é a obediência ativa, em que o cão obedece através de uma ação ao comando. Como exemplo de um momento ativo, imaginemos o comando “SIT”, seguido do ato do cão sentar. A obediência passiva ocorrerá quando o cão deve permanecer numa determinada posição, sob comando. Como exemplo de obediência passiva, podemos citar o momento em que um cão permanece sentado, pelo simples fato de não se dar mais nenhum outro comando após o “SIT”. Para esclarecer, o comando de “FICA”, nada mais é do que um reforço sobre o comando inicial, podendo até ser dispensável. O comando "FICA" será ensinado a partir de "073 - Guia e Enforcador na Obediência - Seus Usos e Comandos". Finalmente, quando se tolhe uma iniciativa do cão através de um comando ou de um condicionamento forjado nesse sentido, obtivemos o que podemos chamar de obediência interruptiva. Como exemplo, podemos exemplificar a situação do cão indo à direção a uma lata de lixo – onde poderá haver veneno para ratos ou substâncias estragadas – e é tolhido através do comando “NÃO”, sobre o qual discorreremos posteriormente. Neste caso, a obediência interruptiva ocorreu diretamente e é chamada de obediência interruptiva direta. Ela poderá ocorrer através de um condicionamento forjado anteriormente, simplesmente pela aplicação de um estímulo negativo que condicionará o cão a não fazer algo. É o que conseguimos através de choques elétricos para que o cão não coma iscas para condicioná-lo a não ser envenenado. De qualquer forma, sempre terá que haver um condicionamento negativo anterior. Observem que o comando ativo advém de um estímulo verbal ou mímico inicial que provoca a ação, enquanto os demais da inibição ou interrupção de uma ação comandada por um impulso. Note-se que se inibe ou interrompe a ação e não o impulso que lhe dá suporte. Quando se consegue inibir o impulso não se denomina mais de obediência. Muito bem. A obediência ativa pode ser conseguida no adestramento de duas formas: estímulos positivos ou estímulos negativos. Quando se usa estímulos positivos, cria-se um condicionamento, por exemplo, de sentar através de ser recompensado com isca ou com a aprovação do dono. Pode-se usar, ainda, com a própria satisfação do impulso de caça (no caso, pegar ou correr atrás da bolinha) como seria o condicionamento inicial do comando “PEGA”. Existem ainda os estímulos passivos. São aqueles que aplicamos simplesmente por não interagir

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com alguma manifestação na qual o cão esperava uma interação. É o caso da bolinha que o cão a pega e a leva para longe esperando que corramos atrás dele para pegá-la e com isso se divertir (observem que nem sempre será esse o motivo do cão não se aproximar com a bolinha – pode ser apenas para proteger a caça). Quando ficamos estáticos, sem correr atrás do cão ou chamá-lo, frustrando suas expectativas, estamos usando um estímulo passivo. Com isso – se o motivo que leva o cão não nos trazer a bolinha for se divertir a nos ver perseguindo-o - ele tenderá a vir até nós e nos trazer a bolinha para conseguir alguma interação, embora não seja a por ele inicialmente desejada. Nossa técnica é não pegar nada da boca do cão para fazê-lo soltar. Esperamos, então, sem dar atenção ao cão que ele solte a bolinha para obter interação. É claro, que o estímulo passivo é um estímulo bem mais fraco do que os estímulos ativos, positivos ou negativos, por isso, ainda no caso da bolinha, Quando batemos com outra bolinha no chão, estamos despertando a caça ao mesmo tempo em que damos um estímulo positivo ao cão. Por isso, quicar outra bolinha no chão traz bem maior resultado do que simplesmente esperar. Podemos obter sucesso usando o estímulo passivo, que nesse caso foi não fazer nada. Mas, deveremos, sempre que possível, adicionar reforço positivo, como por exemplo, agradar o cão quando ele solta a bolinha e lhe dar nossa atenção. Para soltar a lingüiça, em fase posterior, podemos usar o estímulo passivo, simplesmente solicitando que o figurante a solte e a deixe sem "vida" para que o cão se desinteresse por ela. Com isso, poderemos trocar o foco do cão para o figurante, ou seja, da caça-morta à caça-viva, como veremos posteriormente. Forçar o cão a sentar através de puxões no enforcador e condicioná-lo a isso, ao mesmo tempo em que comandamos “SIT”, é um exemplo do uso de estímulo e de condicionamento negativos. Podemos testemunhar que os estímulos positivos são mais fáceis de aplicar, mais gratificantes para o adestrador e para o cão, mais eficazes e não causam conflito com o levantamento dos drives de rapina e por isca. Muito pelo contrário, interage com eles. A obediência ativa pode ser toda, ou quase, estimulada positivamente, com grandes benefícios para todos envolvidos, cão, dono e adestrador. A obediência passiva também pode ser obtida das duas formas, positiva ou negativamente, mas não se consegue mantê-la exclusivamente com estímulos positivos. Como exemplo de estímulo positivo sobre a obediência passiva, apresentamos o caso de um cão que após sentar, fica longos momentos sendo acariciado e elogiado, mas quando o adestrador perceber que o cão se levantará, o adestrador erguerá a mão com a bolinha, mostrando-a ao cão, que deverá ficar aparentando hipnose como uma naja ao encanto da flauta (é exatamente isso que fazem os encantadores de cobras – mantendo-as fixas na flauta que se move). O cão assim ficará por algum tempo, que obviamente deve ser limitado e gradualmente aumentado, esperando que a bolinha seja lançada para persegui-la. O estímulo negativo para manter um cão numa dada posição, por exemplo, pode ser descrito através do puxão no enforcador a cada intenção do cão se levantar, com o uso do reforço “FICA”. Caso o cão desobedeça e chegue a se levantar, usaremos o mesmo puxão concomitante ao comando "NÃO" e o colocamos na mesma posição com o comando "SIT", seguido, ou não, do comando “FICA” (podemos usar somente o "SIT"; ou o "NÃO" e o "SIT"; ou o "NÃO", o "SIT" e o "FICA"; ou, ainda, o “SIT” e o “FICA”). No caso da obediência passiva, é mais difícil mantermos todo o condicionamento apenas com o uso de estímulos positivos. Alguns reforços através dos estímulos negativos deverão ser necessários. Será interessante até que estimulemos a desobediência através de ações inesperadas, como agachar-nos, fingir que iremos embora, etc. para que efetuemos a

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correção através do estímulo negativo. No entanto, devemos iniciar tal obediência apenas com os estímulos positivos e quanto mais pudermos condicionar um bom imprinting antes de começar o uso dos estímulos negativos, melhor, pois menos eles precisarão ser aplicados. Como foi dito, no caso do "FICA" o uso do estímulo positivo pode ser feito previamente simplesmente mandando o cão sentar e ficar enquanto nos mantemos ao lado do cão, acariciando-o durante esse tempo. Mas, para lapidar esse comando, sem dúvida, iremos precisar do estímulo negativo. A obediência interruptiva é a mais difícil de ser obtida através de estímulos positivos. Teríamos que gerar um estímulo inicial – o qual o cão não deva seguir – e, em seguida, gerar outro mais forte o estimulando em contrário, ao mesmo tempo em que comandássemos, por exemplo, o comando “NÃO”. Consideramo isso totalmente inviável na prática e pouco eficaz, exceto em alguma ou outra oportunidade em especial, que não deverão ser suficientes para formatar um condicionamento. Uma maneira de driblar tal dificuldade seria um bom condicionamento no comando “JUNTO”, a ser visto posteriormente, que desviaria o animal do que não deve fazer e o traz ao adestrador ou dono. Pode, sem dúvida, ser usada. Mas, cremos que um reforço por estímulos negativos precisa ser formatado. Daí, a necessidade da formatação do comando “NÃO”, criticado por alguns por gerar algum conflito, ser condicionado através de estímulos negativos na obediência passiva, o que trará enormes facilidades para a obediência interruptiva. É claro que só conseguiremos indiretamente a obediência interruptiva através do comando “JUNTO” de forma positiva se este for formatado de forma também positiva. Cremos, no entanto, que há coisas proibitivas para o cão e que os estímulos negativos, nesse caso, são melhores para deixar claro ao cão que tais coisas são erradas. No entanto, cremos que os estímulos negativos não devem ser usados preferencialmente para obediência inicial, muito menos como base de treinamento. Da mesma forma, cremos que nenhum estímulo negativo para elevação de drive de defesa deve ser usado enquanto não se levantar de forma satisfatória o drive de rapina, desde que isso seja possível. Alertamos com muita ênfase para tais aspectos. Como foi dito, drive é impulso manipulável. A obediência com lastro nos estímulos positivos não se contrapõe aos drives de rapina ou de defesa. Mas a obtida por estímulo negativo, principalmente a interruptiva, se contrapõe aos drives de rapina e de defesa, pois é, de certa forma, a inibição de estímulos, ou seja, funciona inversamente a um drive (ou de um impulso – por isso, ser considerada um paradrive). Principalmente, se for estimulada antes da elevação dos impulsos, contribuirá contrariamente a tal elevação. Mesmo a obediência ativa, que deve ser calcada basicamente nos estímulos positivos, em algum momento, necessita de um reforço com base em estímulos negativos. Disse Maquiavel que o rei deve ser temido antes de ser amado. É claro que não é essa relação que queremos com os nossos cães e que o amor deve ser a base de todo nosso trabalho. O que queremos ao citar Maquiavel é apenas que se não for dado nenhum grau de repressão à desobediência, chegar-se-á a um ponto em que algum estímulo externo pode sobrepujar ao condicionamento realizado apenas com estímulos positivos. A lição final é que: (1) os estímulos positivos devem ser empregados ao máximo, e que os estímulos negativos devem ser empregados ao mínimo; (2) que sempre que possível, os

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ensinamentos devem ser iniciados com base nos estímulos positivos e os imprintings devem ser formatados ao máximo com base nesses estímulos; (3) mas, que em qualquer hipótese, um reforço precisa ser dado com base nos estímulos negativos para que haja confiança de que o cão sempre (ou quase – a palavra “sempre”, em termos absolutos, é utópica, tanto em animais racionais como em irracionais) obedecerá; (4) que quanto mais usarmos estímulos positivos na formatação da obediência, menos vamos precisar dos negativos como reforço. 055 - OBEDIÊNCIA PODE SER CONSIDERADA DRIVE? Drives são impulsos manipuláveis, conforme foi explicado exaustivamente neste capítulo. Mas obedecer pode ser visto como algo associado a um impulso? A obediência pode, se adquirida através de estímulos positivos, ser associada a estes para obtenção de um comportamento até se formar um imprinting comportamental, ainda que esse imprinting comportamental, muitas vezes, possa se contrapor a outros impulsos. Embora a obediência não possa ser vista como um impulso, o ato de obedecer, muitas vezes, pode. Principalmente quando se trata de obediência ativa e formatada por de estímulos positivos, ainda que não sejam impulsos naturais. Cremos que o fato de um impulso não ser baseado nos instintos naturais, não deixe de ser um impulso. O consumo de drogas de abuso no meio humano é um exemplo de que impulsos não necessitam ser de ordem natural, nem baseados necessariamente em instintos. De qualquer forma, sendo impulso ou inibindo impulsos, a obediência ativa age de maneira importante nesses mecanismos psíquicos, permitindo ao adestrador manipulá-los. Mas, e a obediência passiva ou interruptiva adquiridas através de estímulos negativos? Na verdade, tal forma de obediência foi forjada na inibição de um impulso e não no aproveitamento de um impulso. Não seria um impulso, a não ser que usemos um raciocínio quase algébrico para argumentar que seria o inverso de um impulso, sendo, portanto, também um impulso, só que negativo. Deixando de lado tais considerações abstratas, o que interessa, em termos práticos, é que obediência que advém de estímulos negativos influi sobre os impulsos, inibindo-os. Embora possamos considerar, pelo menos, a obediência ativa e obtida através de estímulos positivos como paralela a um drive, deixemos aos filósofos defini-la ou não como um drive em seu caráter mais amplo. Filosoficamente também se o drive de defesa advém de estímulos negativos impostos pela natureza, como ameaças de outros predadores, etc., e, nessa mesma linha de raciocínio, a obediência passiva viria de estímulos negativos impostos pelo adestrador. O importante é que, na prática, considerá-la, em qualquer caso, como paralela a um drive irá facilitar nosso raciocínio durante o adestramento e em seu planejamento. Parece-nos, no entanto, que é entendimento geral que o termo “drive”, no meio cinófilo, aplica-se tão somente aos impulsos básicos advindos dos instintos. Isso afastaria a hipótese da obediência ser admitida como um drive dentro deste mesmo meio, ainda que adquirida através de impulsos formatados. Mas, o importante não é definir a obediência e sim raciocinar como se fosse algo que se opõe ou se soma aos drives, dependendo da situação.

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Se quisermos criar um neologismo, o que, no caso é o mais indicado, podemos dizer que a obediência é um paradrive, onde o prefixo “para” indicaria a noção de trabalhar ao lado de, agir como, etc. Ler mais sobre em “111 - Cinofilia Esportiva e Cinofilia Efetiva”. 056 - COMO COMEÇAR? PELA OBEDIÊNCIA OU PELO ATAQUE? Diríamos que nem por um nem por outro. A forma correta de iniciar um cão no treinamento de guarda é pelo levante de seu drive de caça e unirmos a ele a obediência usando somente estímulos positivos como a bolinha, as iscas, os elogios. Colocando e reforçando imprintings associando-os ao drive de rapina e, por vezes, ao drive por isca. O drive de defesa poderá ser levantado somente de forma muito sutil apenas o necessário a dar um pouco de malícia ao filhote antes da obediência. Mas, o treinamento, não leva em princípio o filhote até o ataque propriamente dito. Fazendo um parêntese, particularmente, nos parece uma coisa horrível um cão que faz um trabalho de guarda sem demonstrar qualquer maldade, como se estivesse num fair play ou em um fair game de baixa intensidade. É certo que esse cão não usa da mesma mordida e nem o mesmo poder que poderia em suas investidas. É muito provável também que não suporte um castigo mais severo por parte do figurante. Mas, isso é assunto para tratarmos posteriormente. Esqueçam o jargão dos antigos: “Treinamento se começa pela obediência. Depois do cão estar controlado, inicia-se o ataque”. Tal jargão demonstra toda a insegurança no próprio trabalho e era usado quando o trabalho de guarda era iniciado quase que somente em cima do drive de defesa. Imaginemos, além disso, uma obediência calcada em estímulos negativos e poderemos ter uma vaga idéia de quantos cães eram perdidos para guarda ou subpontencializados para esse fim. Já o levante de drive de rapina, ao contrário do de defesa não traz conflitos ao cão. Na verdade, rapina e defesa se conflitam e se completam, algo muito paradoxal. Conflitam, pois a defesa gera ansiedade, que inibe a rapina. Completam, pois a defesa traz gana, que aumenta a rapina. Pois é, depende muito da qualidade da defesa. O grande segredo é desenvolver a rapina até próximo do seu limite e lapidá-la progressivamente com a defesa. Assim, elas se potencializarão ao invés de se conflitar. Iriam, sim, se conflitar caso iniciássemos pela defesa ou mesmo a usássemos de forma excessiva durante o levante da rapina. A defesa em seu levantamento deve se manter proporcionalmente bem mais baixa do que a rapina obtida. Vimos sobre isso em “006 – Drive de Defesa e Drive de Rapina – Considerações Fisiológicas”. A razão é que a defesa pode advir de uma necessidade mais premente do que a rapina, a de salvar rapidamente a vida. Já a defesa resoluta é outra questão. Ela não deverá inibir mais a rapina e, se o fizer, não deverá diminuir o nível do ataque. Sendo assim, em filhotes e cães jovens, insistimos para que a defesa não seja levantada além de provocações mínimas feitas a uma distância que possa ser considerada segura pelo cão contra o agressor. Em todos os cães, sempre é mais indicado que comecemos pela rapina, mas, em alguns

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cães adultos, isso nem sempre é possível. Estímulos isolados como os descritos em “121 – Como Desenvolver o Potencial de Proteção” quando comentamos sobre a triangularização da defesa entre figurante, mãe e filhotes, obviamente não são considerados como base de treinamento, muito embora seus resultados sejam magníficos. O grande problema do filhote que não curte bolinha, nem kong e se demonstra inelástico aos estímulos de rapina ou até por isca, é que só nos resta esperar que a rapina apareça em nível mais elevado (no fair game ou no fair fight). Se isso não acontecer, só nos restará a defesa – e os inerentes conflitos - como meio de estímulo. Nesse caso, de não conseguirmos levantar a rapina do cão, deveremos iniciar pela defesa e a obediência apenas através de estímulos positivos (nem sempre eficazes quando a rapina é baixa). Mas, tão logo o cão começar a atacar e morder o figurante com certa firmeza (se isso acontecer), podemos usar a obediência, ainda que com estímulos negativos leves. As idades recomendadas de início, nesse caso, seriam: Obediência por estímulos exclusivamente positivos: 45 dias no trabalho exclusivo com isca (Vide: "Trabalhando o Filhote com Iscas") e 90 a 120 dias para trabalho com uso de bolinha (Vide: "048 - Rapina e a Bolinha Mágica") ou tão logo o cão aceitar tal trabalho. Levantamento da defesa: gradual, sem pressão, em média, a partir dos quatro a cinco meses, dependendo do cão, conforme resposta do cão. Podendo diminuir para qualquer idade se através do método de triangularização. Levantamento de defesa com pressão: somente após o cão reagir bem ao estímulo sem pressão em qualquer em qualquer idade, estando com a rapina em fair fight. A partir dos 14 meses, em caso da rapina inexistir ou estar baixa e, mesmo assim de forma progressiva. Se, já nas primeiras sessões, não obtivermos êxito, o melhor e esperar, por mais ou menos, 30 dias e tentar de novo. Tentar trocar o figurante e, principalmente, dar carinho e companhia ao cão. Ir tentando, de 30 em 30 dias ou de 45 em 45 dias. Não tentar em períodos menores de tempo, o que, se for feito, só irá acuar e amedrontar mais ao animal. Quanto maior for a margem entre a pressão imposta e a reação negativa do animal, maior deverá ser o tempo de resguardo. Por isso, ao menor sinal de insegurança por parte do cão, deveremos suspender de imediato o treino. Se não conseguirmos após umas quatro ou cinco sessões, com adestradores diferentes (de preferência), devemos dar um espaço de tempo maior ou até desistir, pois nosso cão que por uma falha em seu temperamento ou nossa, na condução da sua personalidade, não é talhado para ser um cão de guarda. Resta-nos entendermos suas limitações da mesma forma como gostamos que entendam as nossas. Se conseguirmos, deveremos gradualmente entrar com uma sutil obediência, sempre procurando obtê-la através de estímulos positivos. Estímulos negativos, como já foi dito, somente deverão ser aplicados após o cão morder com firmeza. Dever-se-á ir monitorando a obediência e o ataque, ou melhor, o controle e a intensidade, de forma que um não se sobressaia demais sobre o outro. Aos poucos, ir incrementando esses dois fatores de forma equilibrada. Ainda que obediência não seja um drive propriamente dito, como já foi dito, podemos tratá-la como um paradrive que poderá se opor à boa formação de um drive para efeitos práticos. Esse entendimento de paradrive de obediência ajuda muito a raciocinar na condução equilibrada entre intensidade e controle.

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057 - BOLINHA MÁGICA, SEUS OUTROS RECURSOS E A OBEDIÊNCIA PASSIVA: A bolinha, nesse caso com a ajuda da isca, pode servir para ensinar ao cão outros comandos, sempre através de estímulos positivos. Assim que estiver bem consolidado o comando “SIT”. O exposto neste item pode iniciar aos quatro meses, se nessa idade já houver assimilado bem o “SIT”. Via de regra, em umas quatro a cinco sessões, o filhote de quatro meses já poderá ter assimilado o “PEGA” e o “SIT”, conforme ensinado em "Rapina e a Bolinha Mágica" e em "Obediência e a Bolinha Mágica”. Outro comando que já deve ter aprendido é o “VEM” e deverá estar adiantado ou pronto no comando “PEGA”. Quatro a cinco sessões do treinamento citado é um número razoável para adestradores experientes com um cão colaborativo, de quatro meses e um imprinting já razoavelmente estabelecido, no qual somente a ordem verbal fará o cão obedecer a todos os comandos ensinados até então. Para neófitos, é óbvio que o número de sessões deverá ser maior, o que é natural. O comando mais simples a seguir é o “DEITA”. Começaremos com o ritual acima descrito, em “Obediência e a Bolinha Mágica”: “PEGA”, “SIT”. Só que, agora, ao invés de recomeçarmos, após o “SIT”, desta posição comandaremos o “DEITA”. A diferença é que dessa vez nos colocaremos (ou continuaremos) sentados no chão e esperaremos que o cão nos traga a bolinha. Não é necessário que o cão traga a bolinha, mas é extremamente conveniente, tendo em vista o desconforto de levantar para constantemente buscá-la. Nesse caso, um auxiliar seria indicado para trazer tal acessório até nós. Essa é a posição mais eficiente e confortável para trabalhar o cão com o uso da bolinha nos diversos comandos que daremos neste tópico. A eficiência dessa posição vem também do maior conforto, carinho e segurança que melhor poderemos dar ao cão no reforço dos estímulos positivos, uma vez que estamos mais aconchegantes e mais perto dele. Com o cão previamente sentado, com a bolinha ao nosso alcance, colocaremos a bolinha próxima ao focinho do cão, levando-a para baixo e para frente do cão. Se a bolinha não se constituir em estímulo suficiente, voltaremos ao uso de iscas, que a esse tempo já devem ter sido abandonadas pelo uso exclusivo da bolinha (lembremos que podemos usar as iscas apenas para que o cão troque a bolinha por elas – tão logo o cão sinta a alegria do jogo deverá trazer a bolinha naturalmente, e as iscas devem ser dispensadas o mais brevemente o quanto for possível). Para o comando de deitar, quase sempre a bolinha não nos traz bons resultados. Por isso, apenas nesse comando, temos que abrir uma exceção e usar ou retornar ao uso de iscas. Durante o ensinamento do “DEITA”, é provável que a primeira tendência do cão seja se levantar e ir à frente. Neste momento, damos o comando “NÃO”, em tom suave, ao mesmo tempo em que seguramos o cão com a outra mão para que não saia do lugar inicial. A entonação do “NÃO” deve ser enérgica, um pouco longa (NÃÃO) e moderadamente alta, e deve ser utilizada nos primeiros contatos que o cão tem com tal comando (essa é a primeira entonação do comando “NÃO”). Deve demonstrar calma e energia, ao mesmo tempo certo carinho, conforme no item “070 - Entonação da Voz – um Detalhe Importante”, a ser visto à frente. Logo a seguir, deve-se partir diretamente para a quarta entonação definida nesse mesmo tópico: "Deve ser entoada normalmente, em um tempo normal, com razoável grau de energia, mas ser ao mesmo tempo suave, relativamente branda e sem qualquer tom de repressão". A segunda e a terceira entonação jamais devem ser usadas nesta fase do treinamento, pois trazem fortes conotações negativas. A amplitude da voz no comando

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"DEITA" inicialmente deve ser média, evoluindo para volumes menores. O trabalho será bem sucedido quando não precisarmos mais ajudar o cão a se deitar, utilizando apenas do comando verbal “DEITA”. Procuraremos aqui amenizar o comando “NÃO” através do tom da voz e de gestos carinhosos e, também, suaves ao corrigir os seus erros. Assim, tiraremos do “NÃO” boa parte do teor desagradável que tal comando poderia trazer a esse momento, bem como no futuro, quando precisarmos dar o reforço com estímulos negativos. Assim agindo, faremos com que o “NÃO” fique amenizado em função de ter sido ensinado de forma suave, e o cão se familiarize com ele de forma insidiosa e minimizando conflitos futuros. Se ainda o cão insistir em ir à frente, deveremos ser perseverantes e, com a mesma calma inicial, seguraremos as patas anteriores do cão e as colocaremos mais à frente, uma a uma, até que o cão perceba que desta forma conseguirá se abaixar, ir à frente e alcançar a isca ou a bolinha. A bolinha deve ser usada preferencialmente. Mas se não se consistir em um estímulo suficiente (o que é mais comum), deveremos optar pela isca, ficando com a bolinha em nossa mão para que atiremos, ao mesmo tempo em que falaremos o “PEGA” e reiniciemos o ciclo (“PEGA”, “VEM”, “SIT”, DEITA, “PEGA”...). Uma ajuda com a outra mão, ao fazer certo peso sobre a cernelha do cão ajudará nosso trabalho. Cada vez, a ajuda deverá ser menor tanto de abaixar o cão, como de levar suas patas à frente. Por fim, a isca não deverá mais ficar na mão sempre – apenas esporadicamente, ficando somente a bolinha, até que esta também não seja também mais necessária, bastando o comando verbal. Vez ou outra, por toda a vida do animal, deveremos fazer feed backs em tudo que foi ensinado, o que vale para todos os comandos. Vejam, iniciamos pensando em ensinar o cão a deitar, mas já ensinamos outro comando, assim funciona o método efetivo. Demos acima um exemplo de como usar o “NÃO” suave, isto é, usando voz branda e recursos apenas de conter o cão, sem aplicar-lhe nenhum castigo ou estímulo negativo. As vantagens de tal uso já foram amplamente explanadas neste tópico e por todo este capítulo. Mas, e quando o cão aprender a deitar, como iremos trabalhar após essa fase o “NÃO” suave? Poderemos provocar a desobediência e, em seguida, a reprimir sem uso de estímulos negativos importantes. Como? Adivinhem? Usando a bolinha, é claro! Além da bolinha, deveremos usar iscas para um trabalho mais completo. Para fazer isso, sentaremos ao lado do cão, deixando-o bem confortável, embora na correta posição, que tanto pode ser o “SIT” como o “DEITA” - permutando-as, de preferência - seguraremos o cão de forma mais discreta possível, desde que ele fique bem firme e que não possa sair do lugar. É claro, que isso é mais fácil se o cão for um filhote. A seguir, atiraremos a bolinha e diremos o “PEGA”, permitindo que o cão vá buscá-la e trazê-la até nós. Na próxima vez, atiraremos bolinha, mas não daremos comando algum. Se o cão tentar sair, o impediremos e usaremos o “NÃO” suave, como explicado anteriormente (primeira e quarta entonação). Ficaremos com o cão ao nosso lado procurando ser mais suaves do que enérgicos, na medida do possível. Deveremos fazer afagos e carinhos no cão, cafunés são liberados. Inesperadamente,

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daremos o “PEGA” e permitimos que o cão saia e busque a bolinha. O lapso de tempo entre jogar a bolinha e o "PEGA" deve ir aumentando com o tempo. Por vezes, usaremos iscas na forma de petiscos. Quanto mais variarmos, melhor. Se, após a bolinha perder o movimento, o cão perder por ela o interesse, poderemos pedir a outra pessoa que dê movimento a bola ou usar um kong preso a um fio que pode ser movido à distância, mas termos o cuidado – e isso é fundamental – de só permitir que o cão vá atrás da bola após o nosso comando. Cabe salientar também, como veremos adiante, que se o objetivo do “NÃO” suave é justamente diminuir os futuros conflitos entre a obediência e a iniciativa de correr atrás da bola, que interage com o drive de rapina. Não faria nenhum sentido e seria inconsistente tentar forçar sua obediência através de castigos ou de meios dolorosos ou brutos. Apenas deveremos manter o cão seguro junto a nós até que ele se acalme e pare de se esforçar em sair, sempre de maneira branda. É importante, comentar que o cão sempre terá maior estímulo e levantará mais seu drive de rapina em objetos ou pessoas em movimento do que parados. Esse conceito não deve ser esquecido e pode ser chamado de cinetaxia (atração pelo movimento). O usaremos posteriormente. Via de regra, no drive de defesa também, exceto no uso da Técnica do Desafio, sobre a qual também depois discorreremos. 058 - RASTEJAR: Para ensinar um cão a rastejar, iniciaremos colocando esse cão na posição equivalente à do comando "DEITA". O estimularemos, a seguir, com iscas que levaremos em nossas mãos, até que o cão rasteje para alcançá-las, sem permitir, obviamente, que se levante. Usaremos o comando "NÃO" toda vez que o cão quiser se levantar e o forçamos para baixo segurando-o na altura da nuca. Coleira e guia podem nos ajudar no início, mas devem ser dispensadas tão logo possível. Pode-se também deixar as iscas previamente colocadas no solo em intervalos de vinte a trinta centímetros. Tais intervalos devem ir se expandindo na medida que o cão progride. Existem duas maneiras de fazer o cão rastejar. A primeira é sob o comando verbal "REST", na qual ficaremos de ajoelhados ao lado do cão para que o façamos entender o comando e, posteriormente ficaremos de pé. Na segunda, ensinaremos simplesmente o cão a se deitar automaticamente ao nosso lado quando nós nos deitamos no chão. Na primeira, iniciaremos comandando "DEITA", depois nos ajoelharemos ao lado do cão e comandaremos o "REST" ao mesmo tempo em que ofertaremos uma isca uns vinte centímetros à frente do alcance do cão. Repetiremos o "REST" enquanto o animal se dá conta que deve rastejar. Deixaremos o cão comer a isca e o agradaremos. Continuaremos com o método não dando sempre a isca em toda progressão que o cão fizer no chão, mas incentivando-o com os nossos agrados. Aos poucos, daremos o condicionamento de rastejar ao ouvir o comando específico. Agrados e elogios não devem ser poupados. Para a segunda, é recomendável que já tenhamos habituado o cão na primeira maneira. Começaremos nos deitando, chamando o cão para o nosso lado esquerdo, comandando o "DEITA" enquanto o cão é atraído com a isca, a seguir comandaremos o "REST" e agiremos de modo similar ao da primeira maneira, só que iremos rastejando junto ao cão. Gradativamente, iremos diminuindo a intensidade verbal dos comandos e condicionando o cão a se deitar ao nosso lado toda vez que

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nos deitemos de bruços e a rastejar conosco toda vez que rastejemos. Como rastejar tem por finalidade esconder-se não há muita razão de ser - exceto para demonstrações - a primeira forma de fazer o cão rastejar, uma vez que seu condutor se mantém de pé. Caminharemos com o cão ao nosso lado, nos abaixaremos e deitaremos de bruços e rastejaremos, ensinando o cão, automaticamente a nos imitar. Vejam o tópico "120 - Comandos Mímicos" ao fim do capítulo. 059 - CLICKER. COMO USAR: O clicker é um dispositivo que emite um som característico lembrando um leve e fino estalo. Seu objetivo é condicionar o cão a associar seu som a situações agradáveis. Com isso, no futuro, quando acionarmos o clicker, faremos com que o cão tenha um estímulo positivo, pois tal som automaticamente, através do sistema límbico, terá associações positivas e soará de forma agradável. Vejam o tópico “008 - Sistema Límbico. O que é Isso?”. O acionamento do clicker pode ser um reforço positivo precioso para a obediência, para o levantamento de drives ou qualquer situação que queiramos que o cão assimile e repita um comportamento. O uso do clicker será realizado em duas situações distintas: a primeira será a que condicionamos o som do clicker com eventos positivos; a segunda será a que acionaremos o clicker como reforço positivo a um comportamento desejado. Com o tempo, se o método funcionar bem, os dois tipos de situação se confundirão. Quanto mais nebuloso for o limite entre os eventos positivos básicos, ou iniciais, e os que se tornaram agradáveis por condicionamento através do clicker, maior é o sucesso de sua utilização. Condicionamos o som do clicker a eventos positivos nas seguintes situações: - Chegada do dono, de familiar ou de pessoa que o cão goste; - Início da alimentação; - Colocação da guia para passeio; - Saída do cão do canil ou do portão para a rua no início dos passeios; - Fair play que o cão aprecie; - Saciedade da sede intensa após passeios ou exercícios; - Elogios verbais; - Premiação com isca; - Oferta de petisco. O utilizaremos posteriormente no adestramento nas seguintes situações: - Trazer a bolinha ou outro objeto sob comando; - Soltar a lingüiça, manga ou bite, sob comando (mais adiante); - Responder ao comando “JUNTO”, assim que o cão se completar a aproximação; - Aprendizado dos comandos voltados à obediência ativa: “SENTA”, “DEITA”, “REST”, “SOLTA”, “PEGA”, “BUSCA” ou qualquer outro; - Morder com força lingüiça ou outro artefato quando este comportamento for o desejado; - Sacolejar a lingüiça, manga ou bite, no caso de treinamento efetivo; - Chegada de outro cão ou de outro animal ao qual queremos que o cão se acostume (neste

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caso, é importante que o nosso cão já não tenha criado restrições severas contra o outro animal – É importantíssimo que o clicker também não venha despertar comportamento de rapina em relação ao outro animal. Portanto, só deveremos usá-lo quando o cão já tiver tido um primeiro contato positivo com o outro cão); - Chegada de pessoa a qual queremos que o cão venha a se acostumar (mesmos cuidados de chegada de cão ou outro animal); - Treinamento de direcionamento de mordidas em nível de fair play ou em nível inicial de fair game; - Defecação e micção nos locais apropriados. Quando não usar o clicker: - Aproximação de estranhos; - Em qualquer tipo de desobediência; - Em situações que o cão considera desagradável (banho – se for o caso, durante a aplicação de estímulos negativos, aplicações de vacinas, etc.); - Situações neutras. Observe que a não recomendação do uso as citadas “situações neutras”, visa evitar a banalização de uso de tal dispositivo com a conseqüente perda da capacidade de estimular positivamente o cão. O uso durante situações desagradáveis, obviamente, será ainda menos recomendável. O clicker deve ser usado somente em momentos apropriados e jamais servir como objeto de uso banal, sob pena de perder sua eficácia. O clicker, em verdade, tem uma função similar aos elogios e afagos quando estamos felizes ao encontrarmos com o cão ou ao que lhes ofertamos de petiscos quando ele faz o que consideramos correto. Só que o clicker tem uma função superior aos agrados no que tange à obediência, bem como os elogios e afagos são insubstituíveis para os elos afetivos entre o cão e seus familiares. Por vezes, por treinar o cão com duas guias (uma para coleira ou peitoral e outra para enforcador ativo), falta mão para segurar e acionar o clicker. Neste caso, um tipo específico de assobio pode ser usado em substituição ao clicker. O ideal, nesse caso, é o repetir por várias vezes o som “FIU-FUU, FIU-FUU, FIU-FUU...”, se é que podemos representar graficamente o som de um assobio. Ao invés do clicker e dos assobios podemos usar uma palavra-chave, como "BONITO...". 060 - LINGÜIÇA, COMO DEVE SER, COMO USAR E DIRECIONAR O CÃO PARA ELA: Para os que não sabem, “lingüiça” é o nome dado para um cilindro recheado de material relativamente mole, próprio para o cão morder, e forrado com tecido resistente a mordidas como o usado em mangas e bites. Existem dois tipos de lingüiças, Uma deverá ter duas alças, uma em cada extremidade. A outra apenas uma alça em uma das extremidades. Tal apetrecho deverá ter uma maciez passiva, isto é, não deverá devolver consideravelmente a pressão sobre os dentes do cão (deve ser maleável, mas não flexível). Jamais ser excessivamente dura. A primeira a ser usada deve ser mais macia. Depois deveremos trocar por outra um pouco mais dura e mais grossa. Equipamentos muito duros não condizem com a cinofilia efetiva, pois induzem o cão a bater os dentes com menos força e a não

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sacolejar a mordida. É na batida inicial dos dentes que os caninos perfuram a presa e a sacudida que a rasga e aprofunda nela mais os dentes. Por isso retirar a característica de uma mordida impactante é ir contra a efetividade. Mordentes duros, em mangas ou lingüiças, ensinam mais o cão a prender e manter firme a mordida, mas são péssimos para uma mordida de intenção mais lesiva. Em contrapartida, materiais macios e flexíveis, principalmente aqueles que devolvem a pressão de forma contínua sobre os dentes do cão - como a espuma plástica, tendem a deixar a mordida mole. O cão tenderá a pegar com muito pouca firmeza e até a soltar a lingüiça tão logo a morda. A partir de certo ponto do desenvolvimento do cão, cuja idade varia de exemplar para exemplar, devemos treinar nossos cães para melhorem suas mordidas nesse tipo de artefato. A lingüiça poderá até ser um substituto da bolinha, na fase inicial do treinamento, caso o cão não se interesse pela bolinha. Neste caso, é óbvio que teremos que iniciar diretamente pela lingüiça se possível for. Assim como nunca devemos ensinar o cão a soltar a bolinha em nossas mãos, mais razões ainda temos para não ensiná-lo a soltar a lingüiça dessa maneira. Alguns treinadores usam exercer resistência na lingüiça para que o cão venha a adquirir imprintings de prender com força ainda em fase bem jovem e com pessoas das relações do animal, quando não com o próprio adestrador ou dono. Realmente, não vem ao caso a idade do animal, e a palavra “jovem” usada no período anterior não se refere à idade cronológica, mas à maturidade do exemplar. Isso não está totalmente errado, mas é certo que ensinar o cão a morder antes dele aprender a ter maldade, poderá deixá-lo sem maldade para morder no futuro. A palavra “maldade” não acabou de ser utilizada com o significado de crueldade, mas de malícia, raiva, desconfiança e os demais sentimentos que podem não estar ainda amadurecidos. Ainda que ensinar o cão prematuramente venha a lhe dar uma boa mordida de presa, não lhe dará uma boa mordida de luta, pois formatará o cão a morder para segurar e não para ferir. Ainda que o psicológico do cão amadureça, o jeito de morder já estará definido, sendo grandes as dificuldades para mudar posteriormente. Isso é, teríamos que usar o bastão pesado para compensar parcialmente a perda sofrida, gerando ódio no animal. É claro, que agindo assim, conforme o temperamento de cada cão, corremos o risco de estragar o cão, deixando-o medroso. Ainda que em algum momento de sua vida, o cão deva mostrar que suporta o bastão pesado para que seja selecionado para a reprodução, não devemos tê-lo presente durante períodos longos no treinamento, sob o risco de mais prejudicar do que melhorar todo o desempenho efetivo do animal. Portanto, a lingüiça pode ser usada para dar uma mordida mais firme como para dar uma mordida mais dilacerante. Tudo vai depender de como a utilizarmos e da idade que iniciamos o treinamento. Usando a lingüiça em idade mais jovem e fazendo com ela, desde o início um cabo de guerra com o cão, trabalhando mais na rapina, obteremos uma mordida mais firme, com a boca mais cheia. Usando a lingüiça em fase em que a defesa do cão já estiver mais evoluída, não a usando tanto como cabo de guerra, exceto inicialmente e levemente apenas dar alguma firmeza de mordida, usando mais o bastão, dando maior pressão psicológica pela postura do figurante, aumentando o nível de provocação obteremos, em princípio, uma mordida mais sacudida, mais raivosa e mais dilacerante. Podemos também ficar em algum estágio intermediário sem qualquer problema. Nossa atitude deve interagir com as reações do cão e com os objetivos que temos em mente. Além de ser auxiliar no levantamento dos drives, a “lingüiça”, na verdade, tem mais duas funções:

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a primeira de treinar que o cão abocanhe; a segunda, que se sinta seguro, pois, o fato de estar mordendo não deixa de ser um elemento de êxito, e isto é essencial na psicologia canina. A primeira maneira de trabalhar com a lingüiça deverá ser atirá-la como se fosse uma bolinha e trabalharmos com este novo artefato da mesma forma com que trabalhávamos com a bolinha, na mesma seqüência de comandos e ações. Isso poderá ser feito no fair play, mas – repetindo, sem usar nessa fase tal acessório como cabo de guerra caso queiramos uma mordida mais dilacerante e a usando assim, caso queiramos uma mordida mais esportiva. Assim, como com a bolinha, não devemos retirar a lingüiça da boca do animal jamais. Apenas esperar que o estímulo passivo da caça morta incentive esse comportamento. No fair play, poderemos, para aumentar o interesse do cão sobre ela, movimentá-la rapidamente na frente do animal, não permitindo que este a pegue antes de atirá-la e comandarmos o "PEGA". O resto do treinamento com a lingüiça é idêntico ao treinamento com a bolinha. Por isso, precisaremos ter mais do que uma lingüiça. Tal tipo de treino com lingüiça em fair play pode ser perfeitamente dispensável, caso já tenhamos o realizado com a bolinha. Fica como algo opcional, mas que já prepara o cão para o fair game ao direcioná-lo para a lingüiça. As lingüiças usadas em nível de fair play tendem a ser menores e mais finas do que as utilizadas no fair game. Outro recurso é dar “vida” a ela atando-a em uma guia fina e longa ou corda fina e a arrastando de forma que pareça se rastejar pelo chão, o que será obtido simplesmente dando à corda movimentos laterais e paralelos ao solo. Se o cão a abocanhar, deveremos dar à corda resistência para melhor estimulá-lo a morder o objeto. O recurso da corda atada à lingüiça é sobremaneira precioso no caso de cães cuja pressão psicológica da proximidade do figurante ainda pode perturbá-los. A uma distância que pode chegar a três metros, daremos resistência à corda e faremos com que o cão aumente a pressão da mordida. Assim, iremos proceder até que o cão morda com força o apetrecho. O figurante irá se aproximar e se afastar aumentando e diminuindo respectivamente, dessa forma, a pressão psicológica sobre o cão. O recurso de puxar a corda e correr, arrastando moderadamente o cão deve ser usado amplamente. Esse método inicia em fair play, mas rapidamente chega ao fair game, dado o alívio da pressão psicológica sobre o cão. O bastão pode ser usado, mas muito fracamente ou aplicado sobre o solo em cães iniciantes. Bom, até aqui, discorremos sobre o uso da lingüiça no fair play, que é muito limitado, pois tal apetrecho não foi inventado para ser usado em fair play, mas, a partir do fair game. O fair game é uma fase de período variável de cão para cão entre o fair play e o fair fight. É uma fase adaptativa entre o animal deixar de brincar e começar a perceber as emoções do fair fight e os perigos da luta. É no fair game que o bastão ou a vara começam a serem utilizados. Isso deve ser feito desde bater de leve no chão, bater de leve no cão, bater com força no chão, bater moderadamente no cão. E, aí, deve parar. Bater com força no cão já é fair fight. O que diremos a seguir neste item deve ser usado somente em um filhote que já ultrapassou os limites do fair play e começa a poder ingressar no fair game. Somente recomendamos isso a partir do momento no qual o filhote demonstre alguma defesa em relação a estranhos ou tenha condições para isso. Ao mesmo tempo em que o fair game preferencialmente só deve ser iniciado após haver alguma defesa ainda que incipiente, ele pode ser o instrumento para o levantamento dessa defesa e da rapina. Portanto, precisaremos de extrema sensibilidade para “pescar” esse momento ao iniciar essa fase do treinamento. Isso, pois, caso a defesa não se apresente de início, é sinal de que o cão ainda não deve iniciar o fair game, sob pena de ser

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formatado a morder de forma não efetiva pelo resto de sua vida. Em outras palavras, terá mais dificuldade de atingir a luta. Poderá até ficar com mais firmeza de temperamento ou não, mas não terá o mesmo poder lesivo de ataque. Agora, estamos no fair game. Isso significa que a lingüiça deve ser apresentada e segura por um figurante. E como esse figurante deve apresentá-la? A lingüiça inicialmente apresentada a ele na posição mais fácil de ser mordida - isto é, na horizontal. Após, deveremos a apresentar de forma oblíqua e, por fim, vertical. De preferência, sempre do lado esquerdo da pessoa que a apresentar e de modo que o cão a abocanhe com a parte de cima de sua cabeça de modo lateral à perna esquerda de quem segura tal equipamento. Isso é conseguido quando quem segura a lingüiça a for, gradativamente, girando, a cada apresentação, da horizontal para a vertical no sentido anti-horário e com a parte esquerda do corpo mais voltada para frente. O sentido anti-horário é o que aparecerá para quem gira tal dispositivo. Portanto, obviamente, que para quem segura o cão, o sentido será o horário. A apresentação sempre deverá ser baixa – na altura da perna, não da coxa. Esse tipo de lingüiça deve possuir uma alça em cada extremidade. Quando, enfim, for obtida uma boa pegada com a lingüiça na vertical, diremos à pessoa que a segura para pisar em uma de suas alças com o pé esquerdo, mantendo esse pé à frente do direito, enquanto segura a outra alça com a mão direita, se ainda a quiser obliqua e, posteriormente, com a mão esquerda, para mantê-la na vertical. A pessoa deverá o mais que puder tentar manter a lingüiça com uma de suas alças presa embaixo de seu pé, enquanto o cão a traciona. Para um filhote de aproximadamente quatro meses e meio e uns dezoito quilos, boa idade para chegar a tal ponto do treinamento, uns quatro centímetros de diâmetro são uma boa medida para iniciar o trabalho. Tal acessório deverá ser substituído bem depois por outros de diâmetro maior, de seis, oito de dez centímetros e de forma gradativa. Lingüiças de diâmetro superiores a dez centímetros, no entanto, não são producentes no treinamento, exceto em cães muito grandes e de focinhos longos. Mesmo assim, não devem ultrapassar em muito tal dimensão. As lingüiças de diâmetro acima de oito centímetros são boas para ensinarem o cão a abrir bem a boca, mas mordicas com bocas muito abertas não têm força e são ineficientes. O diâmetro ideal para treinamento em um cão do porte de um pastor alemão, por exemplo, é em torno de oito centímetros. Quatro dúvidas talvez, a esta altura, incomodem o leitor: Por que apresentar a lingüiça na vertical? Por que deve ser apresentada baixa? Por que do lado esquerdo? Por que da horizontal evoluir para a vertical no sentido anti-horário do ponto de vista de quem a segura? A resposta para por que a lingüiça deve ser apresentada na vertical é porque um dos locais mais corretos para que o cão ataque é a perna, que fica na posição vertical em um homem de pé. O cão tem dificuldade em virar a cabeça para abocanhar a perna em momento de tensão se não for treinado antes para tal mister. Para um cão treinado a abocanhar virando a cabeça é fácil morder objetos sem precisar pensar como fazê-lo, mas o mesmo não se sucede com um cão que só é acostumado a morder sem virar a cabeça. Veja mais sobre em “023 – Iscas e a Bolinha para Direcionamento e Condicionamento dos Locais de Mordida”. A lingüiça deve ser apresentada baixa, pela óbvia razão que a perna de um homem de pé fica nessa altura. A altura ideal de apresentação é do joelho para baixo. Levantar essa altura para o cão morder é muito fácil. O difícil será baixá-la, caso precise em treinamento posterior.

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O lado esquerdo, via de regra, é o preferencial, pois a maioria dos humanos é destra. Um ataque à perna esquerda é provavelmente mais difícil de ser defendido no sentido do malfeitor reagir, em função deste geralmente usar a arma na mão direita. A apresentação da lingüiça deve evoluir da horizontal para a vertical no sentido anti-horário do ponto de vista de quem a segura em razão de, com isso, acostumarmos o cão a virar no sentido inverso. Como a perna preferencialmente visada é a esquerda, o cão deverá abocanhá-la de forma que o topo de seu crânio fique lateral a ela. Se o topo do crânio ficasse medial, e não lateral, ficaria bem mais fácil que o meliante, ao dobrar o joelho mordido, se ajoelhando, obrigasse o cão a soltar a pegada ou mesmo ficasse com a garganta ou o corpo preso por baixo do outro joelho do malfeitor. Isso acontecerá caso o meliante se ajoelhe com o outro joelho ou com os dois de uma só vez. Além disso, pela posição do cão, caso morda com o topo do crânio em posição medial à perna mordida, deixará o animal bem mais exposto a ser atingido por projétil ou arma branca. Outra razão, é que com a posição de mordida mantendo o crânio lateralmente à perna do indivíduo fica mais fácil do cão evoluir para a parte de trás da perna, com estruturas bem mais vulneráveis, além de deixar o cão em posição ainda mais protegida. O cão, aos poucos, ao se desviar do bastão, irá aprender a evoluir para a parte de trás da perna e rodear em torno do inimigo, ficando em posição bem mais protegida e vantajosa. A evolução para a parte de trás da perna, além de ser mais eficiente, deixa o cão mais atrás do malfeitor e, portanto, menos exposto à reação deste. Com o uso do bastão nessa posição de mordida, o cão logo aprenderá a se proteger, justamente procurando ficar fora do alcance do bastão, isto é, atrás do oponente humano. Essa mordida realmente é eficiente, ainda mais se for fortemente sacudida. A lingüiça de duas alças deverá ter uma delas presa ao pé esquerdo e a outra segura pela mão direita na fase em que a usamos inclinada. Quando a colocarmos bem na vertical, as alças deverão ser seguras pelo pé e mão esquerdos, de preferência o mais lateralmente possível em relação a tal perna, e a mão direita do figurante livre para usar o bastão. Caso sejamos adestradores profissionais ou amadores altamente interessados, o recomendável é ter um bom jogo de lingüiças. Um jogo completo, ou quase, seria: - uma de 35 cm de comprimento e 3 cm de diâmetro, com uma alça e mais macia; - uma de 35 cm de comprimento e de 4 a 5 cm de diâmetro, com uma alça e já não tão macia; - uma de 55 cm de comprimento e 6 cm de diâmetro, com uma alça e de maciez moderada; - uma de 55 cm de comprimento e 6 cm de diâmetro, com duas alças e de maciez moderada; - uma de 65 cm de comprimento e 8 cm de diâmetro, com duas alças de maciez moderada; - uma de 60 cm de comprimento e 10 cm de diâmetro, com duas alças e maciez moderada. Esta deverá ter uma de suas alças bem longas, ser adaptado um cordão forte que ligue tal alça à lingüiça e que possibilite que esta alça seja segura sem que a pessoa precise se curvar. Sua finalidade é incentivar e treinar o ataque dirigido à perna. O cordão também pode ser usado para evitar que a pessoa corra risco de ser mordida na mão e deve ser forte o suficiente para suportar a força do cão. Esta lingüiça deverá ter uma camada exterior de espuma bem macia, maleável, mas não flexível. Macia o suficiente para que não faça qualquer pressão sobre os dentes do animal, que se achate passivamente sobre a pressão da mordida. Essa camada deve ser de 2,5cm, deixando a parte mais dura de 5 cm internamente (2,5 + 5,0 + 2,5 = 10). - outra igual à anterior, mas com 12 cm de diâmetro para que o cão acostume a abrir bem a boca

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antes da mordida e, assim, abocanhar pernas de calça, mais largas do que o objeto final a ser mordido. Observem que o que deve aumentar é a camada externa bem macia, apenas para que o cão abra a boca. Quando o cão morder, nenhuma lingüiça deve ser muito grossa, e esta deverá diminuir pela metade no que se refere ao diâmetro. Esta só deve ser dada a cães de porte grande. Todas as lingüiças devem ser deformáveis e não flexíveis, isto é, não devem devolver a pressão da mordida ao cão. Quando, o cão morder a lingüiça segura pelo figurante ainda na horizontal, este deverá movimentá-la para ambos os lados, para cima e para baixo, com movimentos sempre compatíveis com a pressão exercida pela mordida. Não se deve parar de movimentá-la em todos os sentidos para com isso incentivar mais o cão a apertar com mais força. Os movimentos corretos, após o cão já ter uma boa pegada, é, após segurá-la com as duas mãos, deixando o focinho do cão entre elas, dar pequenas frações de giro para um lado e para o outro, o que é diferente de movimentá-la lateralmente. Isso porque, é assim que os caninos penetram na carne das presas. Tal movimento condicionará o cão para que gire assim ao morder. Se movimentarmos lateralmente com muita violência, correremos, sim, o risco de quebrar uma presa do cão. Os movimentos laterais devem continuar, mas em giro deve ser acrescentado. Toda vez que o cão movimentar bem o pescoço quando estiver mordendo, devemos dar o reforço com elogio ou palavra-chave. Observem que quem deve incentivar o cão deve ser o dono ou o condutor. Nunca quem está segurando a lingüiça. É importante lembrar que sempre antes de cada investida do cão, deveremos falar em alto e bom som o comando “PEGA”. A modulação dos movimentos feitos pelo figurante deverá ser realizada conforme a pressão da mordida do cão. Se os movimentos forem muito débeis, isso não incentivará ao máximo o cão, e ele tenderá a morder sem força. Se os movimentos forem demasiadamente bruscos, poderão com que o cão solte o acessório, podendo ficar temeroso em mordê-lo de novo, caso esteja em seus primeiros treinos. Progressivamente, o cão irá ficar mais confiante e morder com mais vigor. Na mesma proporção, o figurante deve usar mais vigor em seus movimentos. Nunca fazer: Bater com potência na lingüiça com o bastão em cães iniciantes. A vibração transmitida à boca do animal, em animais ainda inseguros, pode ser fator de desestímulo para que mantenha a pegada. Vejam mais em: “065 - Lingüiça – Cão que não Solta; Cão que a Pega sem Firmeza”. Paradoxalmente, em cães mais seguros, tais batidas, sendo realizadas de forma progressiva, deverão fazer com que o cão aumente a pressão da mordida. Se o drive está elevado, isto é, se o cão vai determinado e demonstrando gameness até morder a lingüiça e se a pega firmemente, criando dificuldades para largá-la, deveremos agir de forma diferente do que no caso de que com um outro cão que vai titubeante até a lingüiça ou a pega sem firmeza. Como dissemos no início do Capítulo, o método deve interagir com a reação de cada cão. Isso será melhor visto no retro citado item. 061 - COMO AUMENTAR – EM MUITO – A CAÇA COM O USO DA LINGÜIÇA: Este é um procedimento muito fácil. Nesta fase, dentro da efetividade, independente do trabalho ser mais, ou menos, efetivo, o figurante, mais do que nunca, deve ser realmente um figurante e não pessoa das relações do animal. Não estamos mais em fair play, mas em fair game. Uma pessoa das relações e amizade do cão irá banalizar o ataque e prejudicar a psique do animal com ambigüidade e conflito. Independente da idade do cão, a opção ainda mais efetiva de treinamento deve iniciar nesse estágio.

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Com quase certeza, o leitor já presenciou em algum documentário como que lobos, chacais, cães selvagens e hienas seguram uma presa maior, bem maior. Um dos predadores segura na vítima com uma mordida de boca cheia, e ela o arrasta até que outros predadores façam o mesmo e a presa fique exausta não podendo arrastar a todos. Pois bem, a partir dessa informação que a natureza nos ensina, fazemos um método de incrementar o drive de rapina e conferir ao cão uma mordida compatível com esse drive, isto é, firme e de boca cheia. Na prática, a técnica consiste em o figurante caminhar como que em fuga e puxar o cão assim que a mordida deste comece a se firmar. Com o treinamento, a mordida tenderá a ficar cada vez mais firme e mais forte. O cão fará isso no instinto de não perder a caça, e o treinamento deve lhe aumentar em muito drive correspondente. O figurante após arrastar o cão por dez a vinte metros, numa velocidade a qual o cão possa ser arrastado sem ferir suas almofadas plantares (prestar atenção ao piso), e, depois, abandonar a lingüiça com o cão que deverá manter a perseguição ou carregando consigo o apetrecho ou largando-o e perseguindo o figurante, o que será ainda melhor. O ideal é trabalhar com duas lingüiças para descanalizar o cão de uma para a outra, bem como para ensinar a troca de pegada. O disposto neste item deve ser aplicado conjuntamente com o disposto em “062 - Lingüiça, Como Usá-la, Canalizando o Cão para o Figurante” e em “063 - Lingüiça e Troca de Pegada”. 062 - LINGÜIÇA, COMO USÁ-LA CANALIZANDO O CÃO PARA O FIGURANTE: Assim que o cão segure a lingüiça com firmeza, o figurante deverá, a um dado momento, largá-la e, em seguida, correr chamando a caça para si. Se o cão correr carregando o acessório na boca atrás do figurante, está bom. Se o cão soltar automaticamente o acessório perseguir o figurante, melhor ainda. Esse é o momento onde formataremos os mais importantes imprintings de guarda efetiva no cão. Se o cão não soltar o acessório, temos dois recursos que podemos usar intercaladamente. O primeiro é deixar que o cão corra com o apetrecho na boca até que se canse dele, e deve ser o primeiro a ser usado para dar o imprinting de se focar no figurante, ainda que levando consigo a lingüiça. O figurante deve correr para os lados, provocar o cão, instigá-lo a persegui-lo sempre. É provável que o cão solte o acessório a um dado momento, e a perseguição deve prosseguir por mais um tempo. O segundo será que pisemos no acessório tão logo o cão aprenda a perseguir o figurante, enquanto este o chama para si. É claro, que se o cão não soltar o acessório e não perseguir o figurante, devemos afrouxar o pé e permitir que leve o acessório consigo durante a perseguição. A melhor técnica para canalizar o cão para o figurante é a de que este, após largar a lingüiça, não perca a movimentação e provoque o cão, ao mesmo tempo em que fuja estimulando o cão para que o persiga mesmo com a lingüiça na boca. Após correr por uns vinte metros, deverá parar e provocar o cão. A tendência é que este largue o apetrecho e continue a perseguição ao figurante, o que nem sempre conseguido nas primeiras paradas. A “mágica” para que isso dê certo, é a sensibilidade do condutor de permitir que o cão progrida à frente, assim que largar a lingüiça, em direção ao figurante que deverá correr. O resto da “mágica” depende da arte do figurante em manter sobre ele a fixa atenção do cão, chegando bem perto do animal, sem ser mordido. Se o cão apresentar tendência a perseguir o figurante com a lingüiça na boca, devemos deixar que

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ele faça isso sem repreendê-lo. Pois esta é uma situação infinitamente melhor do que a situação do cão ficar parado mordendo o apetrecho que está ao solo, enquanto o figurante se afasta. Um erro comum e grave por parte de alguns cobaias é destes ficarem parados à frente do cão, o que obriga ao condutor conter o animal para que este não venha a mordê-los. Com isso, o cão tende a descarregar no apetrecho suas frustrações de não poder morder nem perseguir o figurante. Devemos prestar muita atenção para evitar que isso ocorra, pois geralmente é essa a mais comum forma de criar um cão mangueiro. Quem faz isso não pode ser chamado de figurante. É cobaia mesmo. Um bom figurante deve sempre continuar dando caça ao cão após largar qualquer apetrecho de mordida, seja lingüiça, manga, bite pillow, etc. Deve fazer com que a rapina do cão seja dirigida para si. Tecnicamente falando, deve trazer o cão da falsa caça à caça verdadeira. Perseguições nas quais a lingüiça permanece na mão do figurante sem que o cão a morda devem ser feitas. Logo devem ser substituídas por perseguições nas quais o figurante não leve nada nas mãos e que, preferencialmente, esteja vestido com uma roupa que em nada lembre uma roupa de treino. Quando e somente quando o cão já estiver fissurado em perseguir o figurante. Mais nele do que no acessório, e, mesmo assim, não quiser largar o acessório, é que se deve pisar sobre o apetrecho logo que o figurante o largue, obrigando o cão a soltá-lo para perseguir o figurante. Mas, se notarmos que o cão insiste em não soltar o acessório enquanto persegue o figurante ou nem vai atrás deste, limitando-se a morder a lingüiça, levantaremos a cabeça do cão pela coleira de modo que esta lhe pressione a garganta. O manteremos nesta posição desconfortável para ele até que ele se canse (por isso guia e coleira são os acessórios corretos para esse fim. Nada de peitorais nem de enforcadores). Nos limitaremos a comandar o “SOLTA” várias vezes em voz suave, mas audível, e sem perder a calma até que o cão solte o acessório. Em seguida, comandaremos o “PEGA”, enquanto o figurante chama para si o cão. Observe-se que nunca deveremos colocar a mão no acessório enquanto este estiver sendo mordido pelo cão. Um cão que se fixe demais na lingüiça e não a queira soltar, deve ter estímulos passivos para que mude tal comportamento. Isso se baseia em não interagir com o cão até que este se enjoe desse objeto inanimado. Ficar rodeando o cão e tentando lhe tirar a lingüiça é tudo que não devemos fazer, pois o fará se concentrar ainda mais no mordente. Devemos, sim, não dar atenção ao cão, levantar sua cabeça com a coleira através de guia, dar o comando “SOLTA” da forma mais impessoal possível sem quase olhar para o cão. Ao levantar a cabeça do cão, vamos deixar claro que o objetivo é não permitir que o ele fique sacudindo a lingüiça no chão e não o de estrangular o animal. Portanto, nada de exageros nessa postura. Do contrário, podemos estar desestimulando o cão ao treino ou mantendo sua luta para manter a falsa caça. Uma outra lingüiça, em caso extremo do cão não largar de jeito nenhum por bem a primeira lingüiça, deve ser usada. O cão sempre deverá dar preferência à lingüiça que estiver em movimento e largará da primeira. Veja também em “114 - Lingüiça, como Fazer o Cão Soltar sem o Comando Verbal”. Várias perseguições do figurante sem nada nas mãos deverão ser sempre realizadas em meio a outras carregando a lingüiça. Sempre se iniciando pelo comando “PEGA” que deverá ser seguido pela imediata provocação por parte do figurante, que deverá ao mesmo tempo provocar e se

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comportar como caça em fuga. Poderíamos aplicar a máxima de dizer que o figurante deve se comportar como se em fuga-vigilante. Nessa fase, deve iniciar o uso do bastão, que deve começar sendo usado no chão, depois no cão de forma leve, depois alternadamente entre o chão e o cão, ir aumentando gradativamente sua pressão, sempre se prestando muita atenção à reação do cão a cada golpe dado. Ao menor sinal de enfraquecimento da reação do cão, o treino deve ser mais atenuado. Se o sinal de enfraquecimento for mais importante, o treino deve ser suspenso e só reiniciado alguns dias após. Essa fase deve ser bem firmada e demorar no mínimo um mês ou mais de treinamento, conforme a freqüência semanal dos treinos e do progresso do animal. Por isso, os golpes devem evoluir muito lentamente e a potência máxima de bastão não deve aparecer sequer em pensamento. Alguma luta do cão para manter a lingüiça deve ser feita esporadicamente antes que o figurante a largue e chame para si a rapina do animal. A técnica de arrastar o cão por meio da lingüiça também deve ser usada esporadicamente como reforço. O importante é que sempre, a partir dessa etapa do treinamento, o cão tenha seu foco principal no figurante. Importante também que aos fins dos treinos sempre o cão esteja focado no figurante que deverá fugir e sumir dentro da casa, por trás de automóveis, etc. Erro muito comum é ficar condutor e figurante conversando junto ao cão após o treino. Isso banaliza para o cão a presença do figurante e pode diminuir seu foco em sua pessoa. Pode também colaborar negativamente para uma boa formação dos drives de rapina e de defesa. Tão logo o cão esteja realmente a mordendo com alguma determinação e demonstrando usar força na mordida e só após isso ocorrer, daremos o comando de “SOLTA”. Se não esperarmos pelo menos por um grau razoável de força de mordida, estaremos não ensinando o cão a morder, mas fazendo o oposto. Iniciaremos comandando o “SOLTA" na lingüiça não segura pelo figurante, apenas dando o comando verbal e levantando o pescoço do cão pela coleira, como já foi explicado, caso o cão já não faça isso espontaneamente. A seguir, damos o “PEGA” em direção ao figurante que deverá mimetizar uma fuga, atraindo o cão para si. Se o cão insistir em não largar o apetrecho, uma leve e progressiva pressão deve ser dada em sua garganta até que ele a solte, enquanto o condutor, fala em voz suave “SOLTA”, “SOLTA”... Vejamos que a essa altura já estamos no fair game quase no fair fight. Muito importante levar em conta que o figurante atrair o cão após este soltar a lingüiça é também reforço positivo para que o cão solte tal apetrecho. Tal reforço, assim que o cão o entenda, terá muito mais eficácia do que o estímulo passivo para que solte. Após, esse comportamento estar bem formatado com a lingüiça já largada pelo figurante, faremos o mesmo com a lingüiça ainda segura pelo figurante, mas que, em hipótese alguma, deverá continuar movendo o acessório. Essa etapa é dispensável na efetividade absoluta, mas faz parte da efetividade moderada. Jamais deveremos ordenar que o cão solte a lingüiça enquanto tal acessório continuar a ser movimentado pela pessoa que o segura. Antes de iniciarmos o trabalho, precisamos informar a tal pessoa que o comando “SOLTA” se destina para que o cão solte o artefato; “LARGA”, para que a pessoa o solte, e “PÁRA” para que a pessoa pare de movimentá-la. Nunca, mas nunca mesmo, se comanda “SOLTA” antes de “PÁRA”. O figurante deve sempre antes de o cão ser comandado a soltar o apetrecho parar de movê-lo. Isso equivale a ensinar ao cão que só deverá parar o ataque

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quando não houver mais reação a ele. Note que sempre deveremos dar o comando de solta somente sobre a caça-morta. A técnica da caça-morta, baseada em estímulo passivo, seguida da atração do ataque e perseguição ao figurante não munido de apetrecho algum, é infinitamente superior às técnicas de soltar trocando a lingüiça por petiscos, pois estas tendem a prejudicar a firmeza e a violência da mordida e não dar foco efetivo no figurante e sempre em algum outro apetrecho ou, pior ainda, em comida, tendo em vista que a disposição de comer nada tem a ver com os drives que tentamos trabalhar. Se a lingüiça estiver sendo segura pelo figurante, é recomendável sempre darmos um reforço na pegada após o cão largar a lingüiça quando ela está ainda segura pelo figurante (o mesmo valerá para manga e bite). Esse reforço tem como finalidade darmos confiança ao cão de que ele não perderá definitivamente a lingüiça (a caça) ao soltá-la. A forma de fazê-lo será após a primeira pegada de cada investida, mandarmos o cão soltar e, em seguida, mandarmos pegar por mais uma vez, para só depois comandarmos o “SOLTA” definitivo, sem tirarmos o cão de perto da lingüiça e de quem a segura. Só após o segundo “PEGA” e após o segundo “SOLTA”, solicitaremos que o figurante se afaste do cão, de preferência, sem a lingüiça. O procedimento de a pessoa dar, ou não, reforço na pegada, não deve acontecer em todas as investidas. O ideal é que se alternem em uma seqüência não-organizada, podendo variar o número de pegadas antes do figurante se colocar em fuga. Nada deve ser muito previsível nos treinos efetivos. Adiante, em “114 – Como Fazer um Cão Soltar sem o Comando Verbal”, veremos como fazer um cão a soltar após o fair fight ou mesmo após a luta, dando continuidade ao treinamento deste item. A caça morta dada agora, será um imprinting positivo para tal aprendizado futuro. Após o cão soltar, afagos e elogios não devem ser poupados. Vejamos bem, se quisermos nosso cão com maior efetividade ainda, ao invés de o ensinarmos a soltar nessa fase a lingüiça segura pelo figurante, no treinamento com lingüiça, poderemos o fazer em fase posterior, caso venhamos utilizar a manga. Só que, adiantamos, será bem mais difícil. O problema da manga é condicionar muito o cão a ser direcionado para o antebraço, algo difícil de ser mudado posteriormente. É esta e outras muitas opções que fazem do treinamento algo muito diverso e que deve ser muito bem pensado antes de sabermos exatamente para qual finalidade queremos o nosso cão. Em um cão de paiol, por exemplo, sequer é recomendável o ensinarmos a soltar qualquer artefato ainda preso ao figurante. O grande problema, neste caso, será o treino com bite... ou o figurante terá que aprender a despir o bite em meio ao treino ou o cão terá que aprender a soltá-lo. Se optarmos pelo radicalismo efetivo, o figurante terá que despir o bite. Conforme vimos em “045 - Ponto de Corte no Treinamento. Por qual Caminho Iremos Trilhar?”, estamos diante de dois caminhos: o caminho mais voltado à efetividade moderada e o caminho mais efetivo, o da efetividade absoluta. O caminho de maior efetividade não condicionará o cão a deixar de morder enquanto o figurante estiver segurando a lingüiça, ainda que sem movê-la. Isto porque um malfeitor pode se fazer de morto, ficar inerte esperando o melhor momento de reagir. Neste caminho, não devemos condicionar o cão a deixar de morder com vigor pelo simples fato da presa não esboçar mais reação. Sendo assim, o cão só será conduzido a soltar o artefato após o figurante o haver largado. Neste caso, só ensinaremos o cão a soltar sob comando em fase mais adiantada do treinamento em “114 – Como Fazer um Cão Soltar sem o Comando Verbal”. Alguns cães simplesmente não se interessam por perseguir bolinhas, buscar lingüiças de forma alguma quando em fair play. É comum que alguns cães só demonstrem sua caça quando em fair

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fight, em nível já próximo à luta, e isso, para que ocorra, só acontecerá quando existe alguém estranho, o qual o cão deseja atacar. Algumas vezes, fica até difícil saber se o ataque ocorreu em fair fight ou em defesa resoluta, a não ser que filmemos e analisemos com calma todos os sinais demonstrados pelo cão no ataque. Filhotes seletos de quatro, cinco meses, muitas vezes, atacam com vigor. Em grande parte das vezes, isso não é motivado pelo drive de defesa, mas pela rapina dirigida a pessoas estranhas já em nível já inicialmente elevado. É óbvio que não devemos esquecer que são filhotes, e, mesmo que ataquem com enorme disposição, devemos graduar o uso do bastão de forma ainda mais progressiva, sempre interagindo com a reação apresentada pelo animal. Sempre é melhor sermos cuidadosos e econômicos no nível de potência empregado no bastão, quando se tratar de cães ainda não bem formados no ataque. Isso porque mesmo cães que já se apresentem em fair fight não tiveram oportunidade de serem submetidos à gradual e competente exposição anterior do bastão, e isso necessitará ser feito desta forma e nunca de forma inicialmente violenta. Outra dificuldade é que, como esses cães não praticam treinos de rapina na fase do fair game, é difícil haver imprimido neles o comando de “SOLTA”. Isso dificulta em muito descanalizar o cão da lingüiça e o canalizar para o figurante. Portanto, já teremos que iniciar o treinamento em fair fight com a preocupação de não haver um foco errado de ataque pelo acessório ao invés da pessoa do figurante. A técnica a ser usada nesses casos como em qualquer outro, mas principalmente nesses casos é a explicada em “061 - Como Aumentar – em Muito – A Caça com o Uso da Lingüiça”. Tal técnica deverá rapidamente colocar o cão em rapina. Ela pode nesse momento ser usada para reforçar a pegada. E, lembremos, consiste no figurante correr segurando a lingüiça com o cão a mordendo. Isso ensinará o cão a reforçar sua mordida, a prender com mais força. Levantará a rapina do animal, remontando os tempos em que cães seguravam assim suas presas grandes até esgotá-las para, depois, abatê-las. Esse é outro detalhe de suma importância. Duas coisas de ouro foram ditas neste item: a primeira é que o figurante nunca deve parar de dar caça ao animal após largar o apetrecho de mordida, e a outra é que devemos dar um bom imprinting do cão perseguir o figurante sem que este tenha nada nas mãos. Sempre é bom repetir que o figurante deve correr para todos os lados, provocar o cão a caçá-lo ao máximo para imprimir o comportamento do cão persegui-lo com muita vontade. Este parágrafo é um dos mais importantes desta obra. Como detalhe final, mas suma importância, devemos citar a situação na qual, durante uma perseguição, o cão pára e olha para nós – quando condutores - como que perguntando o que fazer. É provável que o cão esteja pedindo a nossa aprovação para continuar a perseguição. Ao notarmos isso, nada mais deveremos fazer que desviar nosso olhar do cão e o dirigi-lo para o figurante, fitando-o e caminharmos em perseguição deste. Isso provavelmente fará o cão entender que o figurante é uma caça para a dupla, o condutor e ele. Ficar parado olhando o cão e chamando sua atenção é tudo que não devemos fazer. Mais sobre o assunto em “065 - Lingüiça – Cão que não Solta; Cão que a Pega sem Firmeza”. 063 - LINGÜIÇA E TROCA DE PEGADA: Na guarda efetiva, o cão deve ter seus reflexos bem apurados. O cão deve atacar e ferir com mais gravidade possível e, ao mesmo tempo, deve se

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preservar ao máximo e se expor ao mínimo. Lobos são mestres em atacar sem se ferir, mas atacam em pré-fuga em quase cem por cento dos seus ataques a presas grandes e a alternam com a fuga-vigilante para extenuar o inimigo. Enquanto um ataca e foge, o outro também ataca e foge, sempre de forma sincronizada para que o inimigo não consiga direcionar seu ataque nem descansar. Mas, tal tipo de ataque contra homens armados é extremamente ineficaz. Se o ataque não for extremamente violento, as chances de o animal ser vitorioso contra um inimigo humano e armado são quase nulas. Por isso, o ideal é o ataque em matilha e, ao contrário do que fazem os lobos, em luta e não em pré-fuga. Um cão que morda um homem em local que seja fácil a reação do humano é um cão morto se esse homem estiver armado com qualquer lâmina perfurante ou cortante. O mesmo vale se o inimigo tiver objeto contundente que possa usar com destreza pela posição desfavorável do cão. Além das técnicas de morder na perna, de morder nos genitais, etc., é preciso saber trocar o local das mordidas quando esses são desfavoráveis. A troca de mordida se contrapõe à rapina, pois a rapina exige a manutenção da pegada para que a presa não fuja. Só que a presa de um cão de guarda não é uma presa inofensiva. Muito pelo contrário, em verdade, não uma presa, é um inimigo com potencial de perigo superior ao do cão. Esquecer-se disso não é só uma utopia, é uma covardia com o animal que nos guarda e protege. Diferente dos cães de polícia, os cães que guardam as famílias e as propriedades não têm atrás de si um policial armado para lhe cobrir a retaguarda. Treinar cães que irão trabalhar efetivamente como se fossem para esporte é algo irreal ante as necessidades atuais de proteção. Esporte é esporte e deve ter treino para esporte. Guarda efetiva é guarda efetiva e precisa ter treino para guarda efetiva. Dizer que um bom cão de esporte “sobra” na guarda civil é uma mentira. Somente com técnicas voltadas para a eficácia podemos tentar contornar a enorme diferença que existe entre um homem armado com uma inteligência muitíssimo superior e um cão armado apenas com seus dentes e seus instintos. Só que o que a grande maioria dos trabalhos de guarda em todo o mundo faz é retirar dos cães seus instintos e os tornarem, quase sempre, ainda mais vulneráveis do que um cão sem qualquer treinamento. Uma dessas insensatezes é ensinar o cão a não trocar mordida. Argumentam que assim o cão demonstra um bom drive de caça. Isso é verdade. Demonstra sim. Mas, e aí? O que adianta um bom drive de caça em um cão morto? Em verdade, treinam cães para guarda apenas para exibições sem jamais pensarem que algum dia esses cães possam realmente ser usados em uma situação real, além daquela na qual há policiais armados dando cobertura e na qual o cão é usado como bucha de canhão. O pobre e valente cão, se usado for, será usado por aqueles a quem ama a se expor a riscos que nenhum humano quer correr. Isso se resume em uma só palavra: covardia. Outra argumentação sempre presente é a que certos trabalhos visam mais a seleção do que a eficiência. Mas, o que ocorre é que essa seleção não é uma seleção voltada para a efetividade, mas apenas para provas. Um cão selecionado por provas esportivas está sendo selecionado para provas esportivas. Parece o óbvio, mas poucos realmente enxergam ou deixam de fingir que não enxergam, presos à monumental inércia intelectual ou pelo fato de serem resistentes a mudarem seus costumes ou, até, por não quererem dar o braço a torcer ao fato de que durante toda uma vida fizeram coisas despropositadas no sentido efetivo. Depois desse desabafo, temos a dizer: um cão que não troca local de mordida quando esse lhe é desfavorável age de forma idiota e irracional. Talvez, a palavra “irracional” seja, por muitos

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humanos, algo associado a todos os animais exceto o homem. Só que a natureza age com muito mais racionalidade que nós, e os instintos de um cão foram forjados por ela em muitos milênios. É claro, que os instintos do cão não foram formados para a guarda e, sim, para buscar os alimentos através da caça ou para a luta contra seus inimigos mais poderosos, incluindo outros cães. A situação de guarda efetiva não é uma situação de caça, mas uma situação de luta. É necessário que trabalhemos nossos cães para atuar em luta e com alvos que os tornem menos vulneráveis a revides humanos. E isto um cão não tem como saber, pois a natureza não o selecionou para lutar contra homens, cabe a nós ensiná-lo. Mas, nós não o selecionamos assim. Nós, muitas vezes, o selecionamos inclusive no sentido inverso por não considerar as verdadeiras necessidades de um cão numa luta contra um humano. É isso que a cinofilia efetiva tenta mudar: cães efetivos devem ser treinados e selecionados para a luta contra humanos, o que é essencial no trabalho de guarda civil, a mais nobre tarefa de um cão, pois reside na proteção da família que adotou. Voltando à prática, como ensinaremos nossos cães a trocarem mordida? Bom, estávamos falando sobre lingüiças. Não era isso? A técnica consiste em usar duas lingüiças. O figurante deverá ter uma em cada mão. É realmente muito simples: deixar “morta” a que o cão morde a um determinado momento e dar movimento à outra. Assim que o cão morder uma das lingüiças, agitá-la para que o cão aprenda a chacoalhá-la; puxá-la para que o cão aprenda a morder com força e com boa presa. Em seguida, largá-la em frente ao cão e começar a agitar a outra. Esse será o trabalho do figurante. O trabalho do condutor será apenas de conter mecanicamente o cão para a proteção do figurante e levantar seu pescoço através de guia e coleira, para quando o cão se tornar resistente a largar a lingüiça que não é mais segura pelo figurante, conforme foi ensinado em item anterior. Não é necessário que o condutor dê qualquer comando. Isso deve ser feito até que o cão aprenda a trocar mordida instintivamente. Recomendamos o uso de calça de bite suit. Realmente, é muito simples, mas, embora simples, não é tão fácil conseguir. É só isso, mas devemos ser insistentes. Insistentes no sentido de não desistirmos, jamais no sentido extenuar o cão em longos treinamentos. Treinamentos exaustivos, pelo cansaço e pela banalização da situação, acabam sufocando e não incrementando o drive de rapina. Por vezes, o treinamento de troca de mordida se conflita com o treinamento para uma mordida mais poderosa, mais forte, em um bom fair fight. A troca em si traz conflito. Isso é inerente à escolha entre dois alvos. Infelizmente, nunca conseguimos maximizar tudo, mas devemos lembrar também que o ato de abocanhar é o momento mais avassalador da pegada, pois é nele que ocorre o impacto dos dentes do animal sobre a pele do inimigo. Quanto maior for a troca de mordida, tão mais numerosos e graves serão os ferimentos que elas causarão e quão maior será a eficiência real do ataque. Para evitar que a mordida fique, por outro lado, muito vacilante, a melhor medida será alternar trocas com pegadas firmes e modular a resposta do cão conforme objetivo que pretendemos atingir. Os treinos de troca de mordida, quando possível, deverão ser sempre ensinados antes que o cão firme por demais sua mordida. Existe um conflito inerente ao aprendizado, pois exige integração de dois drives. Exige também figurantes e adestradores experientes, interessados e competentes. 064 - USO CORRETO DO JAMBIER: Para iniciar usaremos o nosso Dicionário para explicar o

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que é jambier: JAMBIER – Proteção usada na perna do figurante que se constitui de tecido resistente, como o utilizado no Bite Suit para que se possa direcionar o ataque do cão à perna do Figurante. Palavra de origem francesa. PRONÚNCIA: jambiê. Vide: BITE. O que é feito com jambier pode ser também realizado com a parte inferior do bite suit, mas o jambier dá maior mobilidade e conforto ao figurante, além de poupar o bite, que é um acessório muito mais caro. Conforme explicações anteriores sobre direcionamento de mordida e sobre uso de lingüiça, o jambier deve ser usado preferencialmente na perna esquerda, tendo em vista tornar o cão menos vulnerável a contra-ataques, já que a maioria das pessoas é destra e usa a arma na mão direita. Uma corda ou, preferencialmente, uma faixa, como as usadas em artes marciais, deve ser colocada na cintura do figurante para que alguém o segure ou para que prenda a algo fixo. Isso porque o cão tentará desequilibrar o figurante, e este ficará com apenas um dos pés no chão em grande parte do tempo. Uma de suas mãos precisará segurar o jambier, e a outra o bastão para estimular o cão. Portanto, se alguém não ajudar a equilibrá-lo, e o cão atuar como deve, é provável que caia caso não esteja seguro pela cintura. O figurante deverá dar movimento à perna que usa o equipamento para chamar o ataque do cão para esse local. Assim que o cão morder, deverá manter a perna mais movimentada quanto possível. O condutor deverá exercer ligeira pressão na guia para trás por dois motivos: para resguardar o figurante e para ensinar o cão a morder com boa pegada a perna. É um trabalho relativamente difícil se não for ensinado anteriormente o cão a virar a cabeça para morder como está em “060 - Lingüiça, como Deve Ser, como Usar e como Direcionar o Cão para Ela”. Assim que o cão aprender a morder bem o jambier, o figurante deverá aumentar a energia com o bastão e o condutor ficar pronto para dar uma fração de volta em torno do figurante, pois o objetivo do uso mais pesado de bastão é que o cão aprenda a se esquivar dos golpes sem soltar a mordida. O cão deve fazer isso rodando lateralmente ao figurante até ficar em suas costas e se manter rodando acompanhando o giro dado pelo figurante para tentar alvejá-lo com o bastão. Essa é uma excelente maneira de ensinar o cão a ser “esperto” e eficiente durante seu ataque e ao mesmo tempo aprender a se preservar dos contragolpes. Em cães cujo treinamento futuro incluirá mordidas na perna, o jambier deve substituir por vezes a lingüiça assim que possível em todas as fases de seu uso. Deve ser levada nas mãos do figurante, dobrada, de modo que fique fácil de ser mordida pelo cão. 065 - LINGÜIÇA - CÃO QUE NÃO SOLTA, CÃO QUE A PEGA SEM FIRMEZA: Preconizamos o treinamento interativo, isto é, aquele que se adapta automaticamente às peculiaridades de cada cão. Assim sendo, devemos levar em consideração que duas variáveis as quais pretendemos controlar: os drives de proteção (rapina e defesa) e o controle. Devemos, outrossim, saber que na formação dos imprintings e do caráter, tais variáveis se contrapõem, ou seja, no mesmo momento, não podemos maximizar controle e intensidade, tanto na rapina como

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na defesa. Precisaremos abrir mão um pouco de uma para melhorar a outra, quando o nível e a intensidade dos drives de proteção se elevam além de certo limite. Isso torna-se ainda mais complicado quando chega-se à luta. Muito do que trata este item é comentado em “060 - Lingüiça, como Usá-la Canalizando o Cão para o Figurante”. Devemos levar em consideração que temos comportamentos e sinais dados pelo cão que nos dirão qual variável devemos incrementar prioritariamente por estar mais deficitária, tendo em vista nossos objetivos de treinamento. Um drive de rapina elevado se manifesta em duas variáveis distintas, mas associadas: o impulso de ir até a lingüiça e a firmeza da pegada. Falta de iniciativa de ir até a lingüiça indica um baixo drive de rapina no sentido geral. Uma pegada frouxa ou breve indica, em princípio, um drive de rapina em nível de fair play. Dizemos em princípio, pois algum trauma durante uma mordida, como, por exemplo, morder objeto duro ou haver sido punido ao morder algo, pode baixar a gana da pegada ou mesmo fazer com que o cão se recuse a morder (filhotes em época de trocar dentes devem ter tal fator considerado, e esperar uma semana será mais producente – não devemos nunca forçar filhotes com dor dentária ou gengival a morder). Fica a dúvida teórica se nesse exemplo, o drive realmente diminuiu após o trauma ou se deixa de se manifestar através da mordida. Provavelmente, parcialmente acontecem as duas coisas, cremos. Mas, tal questão tem pouca importância prática. Que, por favor, não apareça nenhum “teórico” afirmar que “drive não diminui nem aumenta”... “que nasce com o cão, e pronto”. Diminui e aumenta, sim. O que não muda é a carga genética que o cão traz consigo em relação a isso, pelo menos numa visão neodarwinista. No caso do cão que tem dificuldade de largar a lingüiça e desobedeça ao comando de “SOLTA”, devemos ter em mente que um alto drive de rapina não é defeito. Devemos saber também que esse deve vir a ser um cão de “caça pesada”, ou seja, que deverá atuar bem no fair fight, se for resistente à dor. Existe a fase intermediária entre o fair play e o fair fight, que chamamos de fair game. E é nessa fase que devemos formatar de forma mais incisiva o imprinting de soltar em um cão de guarda efetiva. Por essas razões é que postulamos que não se deve nunca tentar pular degraus no adestramento. Tal procedimento, ao invés de acelerar o processo, o atrasará e ainda levará a um resultado frágil e inconsistente. Por isso, é que não devemos ir ao fair fight antes que esteja formatado o comportamento de soltar a lingüiça tão logo o figurante a largue. Caso, isso ocorra, o melhor mesmo será provisoriamente abrandar o treinamento novamente para o fair game para melhor formatar melhor os imprintings de soltar quando necessário. Lembramos que corrigir vícios é bem mais difícil do que impedir que eles se formem. No entanto, se de início o cão soltava bem a lingüiça e com a continuidade do treinamento está se tornando resistente a soltá-la sob comando ou, o que é pior, resistente ao soltar o acessório de mordida solto ao solo, não vinculado ao figurante, o que demonstra ataque irracional. Nesse caso, o erro provavelmente deverá estar em pelo menos um de dois fatores: O primeiro pode ser o excesso de estímulo para que o cão pegue tal acessório e pouca ênfase durante o treinamento para que o cão solte. A solução será, já nas primeiras pegadas, após diagnosticarmos tal problema, pedir à pessoa que segura a lingüiça que a solte tão logo o cão a pegue, diminuindo desta forma o estímulo, caso este extrapole o necessário para uma boa pegada enquanto o imprinting de soltá-la sob comando se estabelece. É claro que almejamos chegar ao ponto de maior controle e maior drive de rapina. Mas, por vezes, temos que diminuir um deles para não comprometer o outro. Essa diminuição tentará ser apenas temporária até que o outro objetivo

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se incremente e se consolide. Portanto, aos poucos, iremos novamente aumentando o estimulo após obter uma maior adesão do cão à obediência até que cheguemos a um limite dentro das nossas preferências no binômio intensidade/controle. O segundo, que é mais provável, pode ser a simples incompetência do figurante em se manter próximo ao cão após largar para este o apetrecho, como foi visto em “060 - Lingüiça, como Usá-la, Canalizando o Cão para o Figurante”. Assim como permanecer ao lado cão sem fugir é o pior que um figurante pode fazer, além de bater em um cão mais do que ele pode suportar. Mas, fugir sem cuidar uma distância mínima para se manter como caça é outro erro comum. Um figurante não deve simplesmente correr em disparada quando o cão soltar o apetrecho e abrir muitos metros de distância do animal, que deverá persegui-lo. Isso poderá fazer com que o cão retorne seu foco ao mordente. Comandar o cão para soltar a lingüiça solta é bem mais fácil de ser obedecido do que uma lingüiça segura por alguém, principalmente se esse alguém for estranho e tiver provocado o animal. Para que a pessoa solte esse artefato, deveremos comandar “LARGA”. Caso o cão não queira soltar a lingüiça mesmo após esta não ser segura por mais ninguém humano, deveremos deixar que o cão fique com ela na boca sem lhe dar atenção e mantendo alta a sua cabeça com guia e coleira, tendo apenas o cuidado de não permitir que a estrague. Conforme foi dito em “060 - Lingüiça, como Usá-la, Canalizando o Cão para o Figurante”, não terá graça para o cão se ninguém disputar com ele a posse de tal acessório. Deveremos, também, diminuir a movimentação da lingüiça antes da pegada, e, principalmente, sua movimentação após a pegada, caso o cão esteja se tornando refratário ao comando de soltá-la. O correto é perceber tão prematuramente quanto possível que o cão está se tornando resistente a soltar o artefato em pauta e corrigi-lo, diminuindo os estímulos para rapina até que se estabeleça um sólido condicionamento de soltá-lo após o comando específico ou o simples fato de o artefato ser solto pelo figurante. O cão deverá soltar a lingüiça e se focar no figurante logo que o artefato de mordida for largado pelo figurante em ato reflexo, o que indicará identificação e reconhecimento por parte do cão da caça-verdadeira. Um cão que não reconhece a caça verdadeira e se prende à falsa-caça não é um cão verdadeiramente efetivo por mais corajoso e determinado que seja. Em verdade, o cão que não solta a lingüiça e não se canaliza para o figurante teve em alguma parte de seu treinamento algum erro de percurso por parte do adestrador ou do figurante. Se lhe fosse ensinado tudo, conforme o disposto em “060 - Lingüiça, como Usá-la Canalizando o Cão para o Figurante” e tal treinamento fosse sempre preservado, dificilmente o cão teria tal problema. Existem dois caminhos para que um cão solte a lingüiça no fair game e no início do fair fight: o primeiro, como já foi dito, seria usarmos o comando “SOLTA”, enquanto levantamos a cabeça do animal de forma mais calma possível, esperando que ele abandone a caça morta. O figurante não deverá provocar o cão neste caso, pois a impossibilidade de não poder alcançar o figurante pode trazer um efeito paradoxal de o cão direcionar suas frustrações para o equipamento. A provocação por parte do figurante, no entanto, deve reiniciar tão logo o cão solte o apetrecho, na medida em que o cão gosta da atividade de rapina. Isso fará que ele seja recompensado por haver tido tal comportamento. Particularmente, consideramos esta a melhor forma de dar um bom imprinting para o animal. O outro método seria do figurante trazer para si a rapina do cão sem que este solte o apetrecho.

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Deixaríamos o cão correr atrás dele, como já foi explicado em outros itens, com a lingüiça na boca até que desinteressasse por ela, pisaríamos no apetrecho, deixando-o imóvel enquanto o figurante chama para si o cão, etc. Como já foi dito antes, pisar no equipamento de mordida solto ao solo só funciona em cães que já estão com seus focos corretamente voltados para o figurante. E isso deve ser realizado conforme parágrafo anterior. Em verdade, esses dois caminhos não precisam ser excludentes. Recomendamos que se treine o cão das duas maneiras. A pergunta é: mas, se o primeiro método é tão melhor, por que usar também o segundo? Ocorre que em certas provas que exigimos pressão máxima de bastão, mesmo que o cão tenha recebido um bom condicionamento de soltar e estiver com o foco corretamente voltado para a caça-verdadeira, ele pode direcionar sua raiva para o objeto de mordida para minimizar a frustração de não morder a caça verdadeira. Isso porque o uso violento de bastão eleva por demais a defesa e a luta. A raiva irá crescer a tal ponto que a necessidade de “se vingar” no objeto irá se tornar quase que incontrolável. Nesse caso, o cão mesmo focado no figurante tenderá a carregar consigo a falsa-caça. Pisando no equipamento, obrigamos ao cão tomar a decisão entre perseguir a caça verdadeira ou se conformar com a falsa-caça. Para que o cão não se frustre com a opção tomada, devemos sempre lhe dar mais caça, ou através de uma boa corrida de perseguição ao figurante ou através de outro apetrecho de mordida. Melhor ainda, alternando os dois procedimentos. É claro que o último ataque de cada treino deve ser sempre em perseguição ao figurante de mãos vazias e que não reste mais nada na boca do cão. O que consta no parágrafo anterior pode ser explicado pela polaridade entre elevação de drives e controle, e fará o leitor entender por que a obediência, ou melhor, o controle é tratado como um paradrive. Já, para o cão que pega frouxo na lingüiça, deve ter reduzida a preocupação de que a solte, ao mesmo tempo que necessita ser mais estimulado a abocanhá-la com firmeza. Isso se obtém fazendo quase que exatamente o oposto do que se deve fazer no caso do cão que não quer largar a lingüiça. Ou seja, não se deve comandar "SOLTA", enquanto não se conseguir aumentar o drive de rapina; deve-se aumentar a movimentação desta antes e após o cão abocanhá-la, mas sem movimentos bruscos que a soltem da boca do animal. O tipo de comportamento do figurante deverá ser de acordo com o estágio de rapina que o cão se encontra. Com um cão em fair play, o dono deve mimetizar um rosnado típico de filhotes que brincam, com um tom menos grave do que de um rosnado de ameaça, e com movimentos mais tênues, se for conseguido que o filhote abocanhe qualquer coisa como um pano, uma toalha ou equivalente. Em fase já de fair game, os movimentos dados pelo figurante devem ser mais fortes, o rosnado mais ameaçador. Aí, temos que observar dois possíveis opostos: ou o cão pode estar temendo tomar uma atitude mais violenta, aplicando uma mordida mais forte e a suposta represália ou o cão pode estar sem a excitação necessária por achar que tudo é apenas uma brincadeira tola que não é suficientemente estimulante para lhe levantar a rapina ou a defesa. Em outras palavras, ou o cão teme o que está sendo para ele apresentado ou o nível de rapina que ele exige para se excitar é mais alto. Como já dissemos, o cão tende a se interessar mais pelo que se mexe mais ativamente. Portanto, um recurso que pode ser usado para incrementar a caça e o interesse na lingüiça consiste no figurante balançá-la na frente do cão após comandar "PEGA". Veremos, então, que a partir, daí,

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o cão provavelmente a morderá com mais determinação do que antes. Na falta de outro recurso, o figurante poderá balançar a lingüiça mais espalhafatosamente, mas esse é um recurso que, em princípio, é melhor ser evitado, pois valoriza a falsa-caça e não a caça-verdadeira. Como dissemos, “em princípio”. Se não houver outro modo, o pior será também o melhor. É recomendável também ter uma outra lingüiça de igual diâmetro da primeira, mas um pouco mais dura e com apenas uma alça para usarmos nesse trabalho de alta movimentação, pois muitos cães têm a costume de morderem a alça que fica para o seu lado, o que não é de forma alguma desejável. Se conseguirmos fazer com que o cão morda a lingüiça, devemos nos lembrar da técnica já vista de fazer que o figurante finja fugir arrastando o cão consigo. De forma bem leve e cuidadosa para cães ainda inseguros. O único procedimento aparentemente comum entre os treinamentos para cães que pegam a lingüiça sem energia e o dos cães que apresentam dificuldade em soltar a lingüiça será o de comandar a pessoa que segura a lingüiça a solte, sob comando "LARGA". A diferença será que no caso no qual o cão não interessa em morder a lingüiça - tal providência visava fazer com que o cão se desinteressasse por ela. Agora, o objetivo é paradoxalmente oposto, o de que o cão tenha a sensação de vitória ao "conseguir" arrancar tal artefato das mãos do oponente. Portanto, a lingüiça deve ser largada nesse caso no momento em que o cão exercer mais força, sacudir, etc. O que muda em nossa atitude é que no caso anterior iríamos simular desprezo à ação do cão morder o artefato, enquanto, no caso do cão morder com pouca força ou com certo desinteresse, deveremos elogiar o animal, deixando-o curtir seu “troféu” e somente dar o estímulo passivo após certo tempo. O comando "SOLTA" será deixado para depois. Se o cão se recusar em largar o artefato logo após demonstrar dificuldade em mordê-lo com firmeza, o ideal é termos outra lingüiça e pedirmos ao figurante que a movimente para atrair a atenção do animal. Assim, o cão tenderá a largar a lingüiça que detém sob seu controle para ir de encontro ao objeto similar com mais movimentação e não sofrerá estímulos negativos quanto a ter pegado a primeira lingüiça. Só um detalhe, em cães nessa fase, não há pressa em fazê-los soltar o equipamento de mordida. Essa pressa só virá quando o cão estiver com a mordida firme e se tornar resistente em abandonar a falsa-caça. Podemos até de utilizar de recursos utilizados pela cinofilia esportiva de fazer o cão valorizar a falsa-caça, tendo em vista ser isso o que nos resta para trabalhar. Deixar que a prenda consigo, que a carregue; deixar o figurante fazer de conta que irá roubá-la, etc. Portanto, devemos interagir nossas ações com as respostas que o cão der a elas. Por isso, dissemos no início deste capítulo que o método preconizado é flexível e inteligente. Os drives de rapina e de defesa , bem como o paradrive de obediência, devem ser aumentados ou ter seus incrementos provisoriamente suprimidos, conforme exigir o comportamento do animal e equilíbrio momentâneo de seus drives e paradrive, para o desenvolvimento de sua coragem, equilíbrio e eficiência como cão de guarda. De modo geral, os cães que têm dificuldade de morder artefatos de mordida devem ter o foco de suas atenções no aumento do drive de rapina, enquanto que os cães que tiverem dificuldades de soltar tal artefato devem ter mais atenção para a obediência e para o foco correto da caça: o figurante. No entanto, é claro, mesmo para os animais que precisamos deixar valorizar a falsa-caça, devemos lembrar que essa é uma etapa passageira. Logo, teremos que fazer o trabalho de redirecionar o foco do ataque ao figurante. Por isso, o trabalho com esses cães é bem mais longo.

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Outro recurso, por vezes, usado, com maior ou menor eficiência para aumentar a força da pegada, é o da pessoa apertar a parte de cima do focinho e a mandíbula do cão de modo que estes apertem a lingüiça e façam com que o cão perca o possível medo de fazê-lo. Não é demais repetir que uma possível causa do cão não apertar com rigor pode ser a troca de dentes e a possível dor causada ao morder com força esse acessório. Neste último caso, o melhor será esperar que o cão se restabeleça dos problemas dentários e não devemos de forma alguma apertar o focinho do animal contra o artefato. Algo extremamente paradoxal é bater na lingüiça enquanto o cão a morde. Para um cão que morda fraco por insegurança ou para um cão em início de treinamento, bater na lingüiça pode ser um estímulo para que o cão a largue e não a pegue mais. Para um cão bem formado na coragem, mas que morde fraco ou solta muito a pegada, bater na lingüiça e causar nela uma vibração desagradável pode aumentar a raiva do cão e aumentar em muito a força e a firmeza da pegada, bem como o instinto de chacoalhá-la, ou seja, poderá melhorar em muito a mordida. Como tudo nos treinos, o toque da lingüiça com o bastão deve ser gradual, respeitar e interagir com a capacidade do animal. 066 - LINGÜIÇA, CÃO QUE NÃO SE INTERESSA POR ELA: A princípio, pode parecer que esse caso é semelhante ao do cão que tem pouca gana em relação à lingüiça e a morde com a "boca mole". Em verdade, é difícil diferenciá-los a grosso modo. Mas, a fundamental diferença é que enquanto no caso anterior o animal demonstra certa insegurança, no caso deste tópico, o cão simplesmente não tem interesse por tal acessório. Às vezes, cães que demonstram alto drive de caça ao buscar uma bolinha não o demonstram pela lingüiça e vice-versa. Pode ser também que o cão tenha tão boa qualidade temperamental que esteja já verdadeiramente focado na caça verdadeira e despreze qualquer apetrecho de mordida. Se for este o caso, deveremos partir diretamente para o ataque a bite para que tal hipótese seja confirmada. Se for, devemos esquecer a lingüiça, pois a entrega saiu melhor do que a encomenda e tirar o foco do cão da caça verdadeira para a falsa-caça seria um non sense, exceto se houver outras destinações ao cão além de ser um guarda efetivo ou alguma eventual necessidade de correção ou direcionamento de mordida. Caso não consigamos através da rapina que o cão morda a lingüiça nem o bite, teremos que pensar, caso o cão já apresente qualidade para tanto, a dar ao cão certa provocação para defesa. Se conseguirmos elevar o mínimo necessário a defesa do cão, é possível que este venha a atacar a lingüiça para compensar a frustração de não conseguir morder quem a segura. Se não recomendamos que apetrechos de mordida sejam seguros por pessoas das relações do animal mesmo no trabalho de rapina, com muito mais razão não recomendaremos em trabalho de defesa. Tal procedimento é proibido em qualquer escola de adestramento. Cabe a seguinte reflexão: valerá a pena tirarmos o foco de um cão da caça verdadeira (figurante) para a falsa caça (lingüiça)? Por outro lado, será que o cão realmente irá morder o figurante se o fôssemos deixar fazê-lo? Neste caso, o melhor seja ir direto ao bite ou à manga. Tudo isso é muito relativo. Ele poderia morder a pessoa, mas ter dificuldade em abocanhar o bite. Ele pode não morder o bite, mas morder a manga. Ele pode não morder artefato nenhum e morder com extrema violência a pessoa. Mas, ele pode não morder nada que efetivamente esteja em seu alcance. Por isso, talvez o melhor seja ter certeza que o cão morde para poder confiar nisso. Uma das opções de trabalho seria se houver uma grade longa e com espaço suficiente entre as

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barras para que a lingüiça seja introduzida, esta grade deve inicialmente separar o cão do figurante. Este deverá tomar ações provocativas moderadas e raspar a lingüiça na grade, o que irritará o cão. Observem que estamos mexendo com a defesa. Em seguida, deverá o figurante correr rente às grades como se fugindo do cão. Assim, a um só exercício praticamos provocação, incrementando a defesa, e fuga, incrementando a rapina. Quando o cão tiver levantado sua rapina e já perseguir o figurante do outro lado da grade com certa gana, a lingüiça deverá ser introduzida, e é muito provável que o cão a morda, desde que possua qualidades para tanto. Se isso acontecer, o figurante deverá segurar a lingüiça firmemente e a mover fazendo que o cão sinta os movimentos desta com sua boca e oferecer certa resistência. Assim que o cão comece a interagir com a resistência oferecida pelo figurante e tente puxar para si o acessório, o figurante deverá largá-lo para que o cão seja vitorioso e, em seguida, oferecer-lhe outro similar. Alguém da família poderá ficar do lado de dentro da grade junto ao cão para devolver ao figurante tais acessórios. Praticaremos várias vezes o movimento até que o cão se sinta seguro. O figurante depois de obter do cão o comportamento de lhe perseguir por trás das grades com a lingüiça na mão, deve fazer o cão o perseguir sem que porte nada nas mãos, e isso é importantíssimo. Talvez leve algumas sessões, talvez possa ser ainda na primeira sessão. Sobre alguém da família ficar junto ao cão é algo paradoxal e que poderá ter resultado diametralmente oposto, caso a caso. Isso tanto pode deixar o cão seguro – se tal pessoa transmite segurança ao animal, como pode ser motivo para total inibição do cão – caso essa pessoa seja vista pelo animal como elemento repressor. Neste caso, é preferível que o cão esteja só, e deveremos pensar onde tal pessoa erra e como atua para que o cão se sinta inseguro com sua presença. Quando percebemos que o cão já está com uma rapina mais levantada e morde com gana o apetrecho, abriremos algum portão que dê passagem ao outro lado da grade, deixando nele apenas uma fresta que equivalha ao espaço que há entre as grades. Nesse espaço o figurante deve a lingüiça como a colocava por entre as barras da grade. Quando o cão estiver bem firme em sua mordida, abriremos lentamente a porta e o figurante irá puxar a lingüiça e arrastar brandamente o cão, como o disposto no item “Como Aumentar – em Muito – a Caça com o Uso da Lingüiça”. Observem, o figurante não deve de imediato arrancar o cão de sua zona de conforto. A evolução desse trabalho deve ser insidiosa. Se tudo der certo, mais umas poucas escaramuças como essa serão suficientes para que o problema esteja resolvido, e o cão deverá vir a morder a lingüiça sem precisar do artifício da grade. O resto da técnica será a descrita em “062 - Lingüiça, como Usá-la Canalizando o Cão para o Figurante” e, principalmente, em “061 – Como Aumentar – em Muito – a Caça com o Uso da Lingüiça”. Cuidados devem ser tomados para que o cão não morda a grade, com risco que quebrar um dente. Talvez alguém pergunte: "Para que a grade?". A resposta será: para que o cão que está em fase inicial de treinamento se sinta mais seguro. São respostas óbvias para perguntas óbvias, mas muitas vezes esquecidas por muitos teóricos do que foi aprendido em cursos práticos de curtíssima duração. O que temos que acreditar é que algumas situações de treinamento de um cão não são as mesmas das que ocorrem na natureza, quando o animal discerne com mais exatidão uma situação de caça e outra de defesa. Se assim não o fosse, como que quando no uso da rapina, o figurante que mais faz espalhafato, que mais ameaça o cão e desfere severos golpes com o bastão de schutzhund, no momento oportuno, é o primeiro a ser atacado? O que o faz a primeira “vítima” de um cão com

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elevado drive de rapina? O drive de rapina responde de imediato e tende a aumentar com o aumento do enfrentamento em um cão bem formado (embora seja o inverso em um cão ainda imaturo). Será que, na natureza, os predadores dão preferência às presas mais fortes e que reagem com maior vigor? Em princípio, creio que não, pois isso iria contra o instinto de sobrevivência. Portanto, tudo é relativo. Comparar etologicamente (Etologia = ciência que estuda o comportamento animal) um animal doméstico a um animal selvagem, em certas circunstâncias, pode ser um grave erro. Reagir mais a golpes, em um raciocínio simplista, não seria atividade relacionada ao drive de rapina e sim ao de defesa. Mas, certamente é a rapina que atua quando em uma brincadeira, até com seu dono, o cão reage com certa violência, mas com alegria e confiança, sem agressividade. No entanto, a situação fica inexata quando não é o dono quem desfere os golpes, mas alguém que o cão não tem simpatia e que machucaria com gravidade caso pudesse alcançar, mas mesmo assim mantém inequívoca atividade de rapina. O cão é um animal que tem mais de 10.000 anos de convivência simbiótica com o homem. O ambiente do cão é o ambiente do homem. Analisar a etologia canina como a de um animal selvagem certas vezes é elucidativo, mas em outras, nos faz sair da realidade, pois o cão é um animal doméstico e, entre todos, disparado, o mais domesticado. Os mecanismo de defesa e rapina de um cão estão bem mais interligados do que os de seu irmão lobo. Ao selecionar cães para serem seus guardas, o homem alterou os mecanismos psicológicos e mesmos instintos e impulsos caninos. Tratar os drives de proteção, rapina e defesa, como excludentes é reducionismo científico. Por isso, alguns etólogos especializados em comportamento canino falam em drive de luta, que seria um impulso à parte, derivado do drive de rapina, mas não exatamente igual a ele. Isso, pois, a busca do inimigo mais poderoso ao invés do mais mesquinho, não é um comportamento de um simples caçador. Embora, drives sejam entidades independentes e com fundamentos diversos, existem, sem dúvida, links psicológicos entre eles. Por essa razão, após a lingüiça haver sido mordida numa atividade de levantamento de defesa, o cão estará mais propenso a atacá-la quando exercer sua atividade de caça. Isso pode ser comprovado, após o cão ser treinado a morder tal acessório, quando pessoa das relações do animal, até mesmo seu dono, sacudir tal acessório na mão, e o cão o atacar numa atitude inequívoca de atividade de rapina, o que não fazia antes de se fazer o levantamento da defesa com estranhos numa mesma situação. Se, através do uso do drive de defesa, conseguirmos fazer com que o cão ataque a lingüiça, isso quase que certamente facilitará que no trabalho de rapina o uso de tal apetrecho possa ser realizado sem problemas. Já pudemos comprovar isso várias vezes. Deve-se, no entanto, ponderar que se o cão não demonstrou defesa na tentativa de levantar tal drive ou assustou-se no início das provocações pelo figurante - que deveria ser competente - tal trabalho deve ser imediatamente suspenso. A recomendação em tal caso é esperar pelo amadurecimento do cão e utilizar métodos alternativos, como o trabalho de levante matilha, etc. Outro método alternativo, mas de menor eficiência seria manter o cão preso contido por meio de guia e enforcador travado, coleira ou peitoral, deixando que a guia fique esticada e tensa entre o cão e o adestrador. A guia deve inicialmente ser segura curta e ir aumentando gradativamente, conforme o incremento da autoconfiança do cão. Então, o cão seria provocado, quase ameaçado. A movimentação da lingüiça deve ser feita sem deixar que o cão se aproxime além de certo limite próximo da pessoa que o provoca. Com isso, teremos boas chances de aumentar muito os drives

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do cão. É um pouco difícil para neófitos, nesse caso, saber, com certeza, qual drive realmente está se atuando. Provavelmente o de defesa, estimulado pela reação às provocações. Veja em “009 - Defesa para Rapina” considerações importantes sobre isso. Não apreciamos muito tal método, pois ele valoriza demais o acessório. Só o colocamos aqui para ser usado como um dos últimos recursos para levantar os drives de proteção. Quando nossos recursos se esgotam para tentar fazer com que um cão morda a lingüiça ou a manga ou o bite. A única opção que nos resta e que é a melhor de todas é utilizarmos o treinamento em matilha comentado em “088 – Matilha, Convivência e Levantamento de Drives” e em “089 – Matilha, Treinamento e Levantamento de Drives”. 067 - LINGÜIÇA. SEU USO NO FAIR GAME: Este item é um resumo de muitas coisas já ditas anteriormente. Portanto, encontraremos assuntos já comentados anteriormente. Julgamos interessante colocá-los agora de forma bem sucinta, organizada e esquemática para melhor entendimento geral. No entanto, o que pode parecer agora fácil de entender só pode ser visto de tal forma pela detalhada explanação anterior. Muitas vezes, começamos o treinamento de um cão já mais adulto ou que não brinca conosco em nível de fair play. Nesse caso, podemos ter que ir direto ao fair game, pois muitos desses cães muitas vezes reagem somente nesta fase mais avançada. Em nível de fair game, o treinamento com a lingüiça deve ter a seguinte seqüência: (1) o cão morde a lingüiça, e o figurante modula a resistência conforme a reação do cão. Caso o cão tiver dificuldade de soltá-la, o figurante não deve dar tanta resistência. Caso o cão não a pegue com firmeza, o figurante deverá ir dando mais resistência e estimulando o cão a morder com mais força. Correr moderadamente arrastando o cão através da lingüiça é um recomendável procedimento. (2) O figurante deve soltar a lingüiça e correr, e o cão deve soltar a lingüiça e perseguir o figurante ou persegui-lo levando a lingüiça na boca. Caso o cão largue a lingüiça, é preferível. Deve-se deixá-lo perseguir o figurante com ou sem a lingüiça na boca. Isso é importante. (3) O figurante pára, o cão larga a lingüiça para mordê-lo, o figurante foge e o cão corre atrás, deixando a lingüiça. Caso o cão não largue a lingüiça, o condutor comandará o “SOLTA”. Se o cão não obedecer, o figurante deverá se aproximar mais dele, e o condutor deverá triplicar os cuidados para que o figurante não seja mordido. Se não funcionar, isto é, se o cão continuar sem largar o apetrecho, deve-se entrar com estímulo passivo, ou seja, não dar importância a ele, até que ele se enjoe dela, e o figurante deve aumentar sua distância do cão sem sair de sua vista. Outra tentativa secundária é tentar atrair o cão com outra lingüiça para que solte a que mantém na boca. (4) Caso o cão não largue a lingüiça ou só a largue para trocá-la por outra, devemos, após, e somente após, o cão ter bem desenvolvido o instinto de perseguir o figurante com o artefato na mão, pisar no artefato, obrigando o cão a soltá-lo para perseguir o figurante que deve estimulá-lo ao máximo nesse momento através da provocação e fuga. Quanto mais o figurante se movimentar, mais atrairá o cão.

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(5) O figurante, após correr com o cão em sua perseguição, torna ao local onde a lingüiça foi deixada e começa tudo de novo. Faz isso por três, quatro vezes por treino no fair game. Com, ou sem, alguns toques leves a moderados de bastão, conforme o caso, isto é, conforme a capacidade do cão assimilar os toques. (6) Para cães que mordem fraco, o figurante arrastar o cão simulando uma presa em fuga que arrasta o predador irá incrementar em muito a rapina desses cães e a firmeza da mordida. O que não devemos nos esquecer é da apresentação já correta da lingüiça, isto é, compatível com o local para onde queremos direcionar a mordida. Portanto, assim que o cão abocanhá-la com facilidade na posição horizontal – que é mais fácil para iniciar, deveremos apresentá-la, de preferência, na posição vertical e baixa. Observar trocas de pegada com duas lingüiças e trabalho com jambier. São importantes na guarda efetiva. 068 - PODE-SE TREINAR RAPINA E DEFESA AO MESMO TEMPO? Pode-se. A técnica de a um só tempo estimular a rapina e a defesa é uma técnica extremamente fácil e muito simples, como um ovo de Colombo. Depois de descoberta é óbvia, mas a ficha só cai para quem realmente entende do assunto. Muito do aqui disposto está descrito em “066 - Lingüiça, Cão que não se Interessa por Ela”, quando discorremos em treinar o cão por trás de grades. Recomendamos para quem meio que passou por cima de tal item que o leia de novo para melhor entendimento deste. Embora plasticamente diferentes, ambos os trabalhos baseiam-se nos mesmos princípios básicos. Além da já citada técnica de provocação e fuga por trás de grades, outra técnica consiste no figurante passar correndo sem muita velocidade na frente do cão. O figurante não deve se dirigir diretamente sobre o cão, mas tangenciar um ponto imaginário colocado a, mais ou menos, um metro à frente do cão. Podendo ou não segurar um artefato, manga ou lingüiça (vestido ou não de bite). Se levar algum artefato para ser mordido, este deverá estar do lado onde está o cão que deverá estar contido pela guia e sem enforcador ativo, de preferência de coleira ou peitoral. Em verdade, quando o figurante se aproxima do cão, desperta sua defesa e, quando se afasta, desperta sua rapina. No princípio, o condutor não deve deixar o cão morder o objeto, para aumentar seus drives e sua gana. Depois, o figurante deverá deixar com que o artefato possa ser mordido pelo cão. Deverá correr com ele na mão por um alguns metros, arrastando levemente o cão, e, depois, soltá-lo para que fique com o cão. O condutor deverá deixar o cão seguir o figurante com o artefato na boca, até que solte o artefato e se foque na pessoa do figurante, mantendo, obviamente, o cão seguro pela guia. Quanto às técnicas de soltar, veja em “065 - Lingüiça – Cão que não Solta, Cão que a Pega sem Firmeza”. Quem leu os itens anteriores com atenção pode ver quantas técnicas descritas anteriormente estão misturadas em um só movimento. Após algumas sessões ou mesmo após alguns exercícios, a rapina já será estimulada e poderá se sobrepor à defesa, mesmo quando o figurante vem em direção ao cão, ou quase nessa direção, conforme vimos acima. Após o cão já atacar bem, com o tempo, o figurante diminui a distância entre o ponto imaginário e o local onde está efetivamente o cão. Fará isso até vir literalmente em direção ao cão. Com isso, estimulará insidiosamente a elevação do drive de defesa e acostumará o

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cão a lidar com tal drive sem uma alteração expressiva da noradrenalina e na adrenalina, que – em última análise – serão parcialmente controladas pelo figurante! Ensinará, em outras palavras, o cão, a manejar e controlar seus próprios drives de defesa e de rapina na fase mais jovem, quando incorpora os imprintings comportamentais essenciais, através de uma progressão racional e de acordo com a capacidade de cada cão. É um bom preparo para a luta, pois treina, desde cedo o cão para saber lidar com tais drives ao mesmo tempo e transformar o que seria defesa em rapina em nível elevado. 069 - ENFORCADORES - USO E TIPOS: Ao colocarmos no pescoço do animal um enforcador, devemos lembrar que o enforcador é um instrumento de comando, para transmitirmos ao animal, através dele, nossa vontade, nunca um instrumento de castigo. Nunca devemos, através dele, com violentos puxões, transmitir nossos eventuais sentimentos de raiva, oriundos de nossos insucessos iniciais que, muitas vezes, são normais. Portanto a dosagem da força dos puxões deve ser cuidadosa para que nunca traumatize o animal, o que poderá prejudicar todo o nosso trabalho. Existem dois tipos básicos de enforcadores. O primeiro é composto por grampos, e, ao ser acionado, as pontas desses grampos apertam o pescoço do cão. Se mal utilizado, se constitui mais um instrumento de tortura do que de comando. Portanto, preferimos não o indicar, exceto para profissionais experientes e apenas os modelos de melhor qualidade, fabricados na Europa ou nos USA, onde as pontas dos grampos são ogivais e arredondadas, não possuindo um corte bruto que arranha e maltrata o animal. O segundo é composto por corrente de elos com extremidades constituídas por elos mais largos, sendo, assim, bem menos traumático para o cão. Devemos levar em conta que devemos conduzir o animal com a mão esquerda, e que tal enforcador é composto de dois elos grandes, em suas extremidades, e vários pequenos, sendo um dos elos grandes preso ao mosquetão da guia e que por dentro do outro elo grande corre a corrente formada pelos elos pequenos. Este último deverá ser colocado de maneira que a corrente desça, a partir do mosquetão, da direita para a esquerda do animal, passando por dentro do elo que não está preso diretamente ao mosquetão. A corrente deverá envolver o pescoço até novamente subir pelo seu lado direito do cão e ter como último elo o elo grande pelo qual passam os elos menores. Descrever é meio complicado, não é? Mas, na prática é bem simples. Podemos fazer de conta que a guia e a corrente são continuidade de nosso braço esquerdo e imaginar que esse conjunto abraça o cão e que estamos ao lado do o cão e com ele à nossa esquerda. Interessante observar, que o costume de se conduzir o cão, o cavalo e, até, a mulher com a mão esquerda, vem, desde tempos remotos, da necessidade de se ficar com a mão direita livre para utilização da arma ou outras atividades. Dentro do segundo tipo de enforcador, preferimos para o trabalho de ataque e obediência aqueles cuja corrente têm elos grandes, de forma que possa ser travado com o mosquetão em qualquer um de seus elos intermediários, funcionando como uma coleira opcionalmente, isto é, sem enforcar (ao que chamamos de uso passivo do enforcador). Assim fica opcional não usar o enforcamento, para o ataque, e usar o enforcamento para o treinamento de obediência. Se formos sair e só praticar obediência, o bom é um enforcador cujos elos deslizem mais suavemente. Para isso, devemos sempre preferir os enforcadores cujos elos têm a forma aproximadamente elíptica.

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Todos os tipos de enforcador, independente dos modelos, precisam ser fortes, resistentes e apropriados à largura do pescoço do animal, pois a segurança do cão, de outros cães, do figurante e de outras pessoas pode depender muito de suas qualidades. O mesmo dizemos sobre a guia, inclusive seu mosquetão. 070 - ENTONAÇÃO DA VOZ – UM DETALHE IMPORTANTE: O cão através da entonação de nossa voz capta melhor nossas mensagens do que com a combinação de sílabas que formam as palavras dos comandos, o que só serão percebidas pelo animal quando em um estágio um pouco mais evoluído. Evidentemente, que não é tarefa muito fácil colocar por escrito as diversas entonações sonoras que utilizamos no adestramento, mas vamos tentar. O comando “NÃO”, por exemplo, deve ser pronunciado em quatro entonações: A primeira, deve ser enérgica, um pouco longa (NÃÃO) e moderadamente alta, e deve ser utilizada nos primeiros contatos que o cão tem com tal comando. Deve demonstrar calma e energia, ao mesmo tempo certo carinho. A segunda deve ser alta, enérgica, curta e seca, e deve ser utilizada quando o cão não obedecer a alguma coisa já mais ou menos aprendida, ou seja, quando ele desobedecer conscientemente. Por exemplo, o comando de ficar, de não mexer em alguma coisa que já sabe ser proibida, ou de entrar ou sair de algum local que esteja aprendendo a não o fazer sem autorização. Este “NÃO” deve inicialmente para ser ensinado sempre preceder alguma chamada de atenção, como, por exemplo, um pequeno puxão na guia com enforcador. A terceira, deve ser alta, porém longa, soará como “NÃÃÃÃO”, e deve ser dita quando desconfiamos que o cão vá desobedecer alguma ordem, como nos exemplos do parágrafo anterior. Pode parecer estranho para quem não conhece bem cães, mas, pela expressão facial do animal podemos prever isso com facilidade. Esta terceira entonação do “NÃO” é muito eficiente, pois atua diretamente no pensamento do cão, antecipando a desobediência e, quase sempre, evitando-a e, assim, abreviando muitas repreensões e desentendimentos, que sempre são preferíveis que não aconteçam. Alguns pobres de espírito podem argumentar que cães não pensam e que agem movidos somente por instinto. É evidente que conhecem muito pouco sobre cães ou só enxergam aquilo que lhes foi ensinado ver. Quem nunca observou um cão dormindo e o viu rosnar, latir, choramingar em pleno sono? Tais alterações só podem ser explicadas por sonhos. O que são os sonhos senão imagens e pensamentos imprecisos que realizamos durante o sono? Bom, se não fosse assim, esse comando não funcionaria. Mas, ele funciona e muito bem. A quarta entonação é aquela que utilizamos corriqueiramente para um cão já treinado. Deve ser entoada normalmente, em um tempo normal, com razoável grau de energia, mas ser ao mesmo tempo suave, relativamente branda e sem qualquer tom de repressão. Se não for obedecido é porque o animal ainda não está bem treinado. Devemos, então, retornar, por mais algum tempo, a entonações mais enérgicas. Esse último “NÃO” deve ser brando, pois é sempre aconselhável se manter o clima o menos tenso quanto possível. É evidente que a passagem da primeira entonação para a quarta, que, em verdade, trata-se da evolução de um mesmo comando para um mesmo tipo de situação, deve ser gradual, na medida em que o treinamento evolui. As outras duas, as utilizaremos apenas para corrigir alguma possível

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desobediência mais flagrante. Com o exposto no parágrafo anterior, podemos subtrair que no início do ensinamento de cada novo comando devemos falar alto e em bom tom, com as sílabas muito bem pronunciadas para que o animal possa assimilar o comando e sermos enérgicos, ainda que gentis, para que nos obedeça. Posteriormente devemos abrandar nossa voz e atitudes, paulatinamente, para que não se torne desgastante tanto para o animal quanto para nós. Além de ser ridículo e espalhafatoso, ao conduzirmos nossos cães, utilizarmos voz alta como se estivéssemos conduzindo uma tropa em ordem unida. Ademais, certos comandos, como “PEGA”, para o cão atacar, não convém, em muitas circunstâncias, que sejam ditos em alto som. Por exemplo, se realizado um bom trabalho com estímulos positivos durante o ensinamento do comando “DEITA”, talvez não seja necessária a utilização da segunda e da terceira entonação do "NÃO" na fase de reforço com uso de guia e enforcador. Vejam mais sobre o comando “NÃO” no item “071 – Comando “NÃO”. Conforme for a entonação de nossa voz, também passamos ao cão nossas emoções e o estado emocional que desejamos que ele venha a ficar. Por exemplo, o comando “CUIDA”, que tem como finalidade fazer com que o animal desconfie e preste atenção aos movimentos dos estranhos, e que, muitas vezes, precede ao ataque, deve ser dito de maneira sussurrante e preocupada para que o cão se dê conta da gravidade da situação. O fator “entonação”, de maneira alguma, deve ser desprezado durante todo o treinamento. O que pudemos aprender durante anos que ministramos cursos a proprietários de cães, é que os proprietários que, até por timidez, não conseguem entoar bem seus comandos, pouquíssimos resultados conseguem de seus animais. Aliás, o dono é a principal peça para o adestramento de seu cão. O adestrador deve ser mais um orientador, cuja principal missão e, também, sua maior dificuldade, é a de conseguir que o dono assimile o treinamento. De pouco adianta entregarmos um cão adestrado a um proprietário desinteressado ou sem a menor propensão para lidar com cães. 071 - COMANDO NÃO: Conforme foi explicado em “Bolinha Mágica, Outros Recursos”, o comando “NÃO” deverá já ter sido dado de forma suave, isto é, com o mínimo necessário de estímulos negativos. Imprescindível, antes de ler este tópico, haver lido “070 - Entonação da Voz – Um Detalhe Importante”. A maneira mais prática de ensinar ao cão o comando “NÃO” é a de colocar o cão sentado, após comandar o “SIT” e comandarmos o "NÃO" meio segundo antes de puxarmos seu enforcador sem demasiada energia, assim que ele tentar se levantar. Poderemos ficar parados esperando o cão se mover ou, para apressar o processo, provocar a desobediência. Isso pode ser feito usando de recursos, como fingir que vamos andar e não andarmos; darmos um passo à frente, mas sem comandar o cão a nos seguir (sem o comando “VEM”); agacharmo-nos na frente do cão (sem o comando “VEM”), que tenderá a vir ao nosso encontro e deverá ser corrigido; andarmos em volta ao animal; pularmos à sua frente; passarmos a perna por cima dele, etc. Repetimos, é imprescindível lermos com atenção o tópico “070 - Entonação da Voz – Um Detalhe Importante”, no que tange ao comando “NÃO”. É provável que um cão que tenha sido lapidado

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no “NÃO” da forma mais suave, possa ser reciclado apenas com a primeira e a quarta entonação, talvez até mesmo só com quarta, no caso do trabalho inicial tenha sido bem feito. Nesse último caso, melhor para o cão e para seu sucesso, pois usaremos menos estímulos negativos diretos em seu treinamento. Quanto mais um cão aprende o “NÃO” para uma situação, mais fácil fica dele perceber o mesmo comando para outras situações. Por isso tal comando facilita e muito o treinamento. O cão que compreende o significado da palavra NÃO saberá que ela está ligada a algo errado e que não deve ser feito. Assim, apenas pronunciando-a, mostraremos ao animal quando não queremos que faça algo sem precisar repreendê-lo. Esse aprendizado, de preferência, deverá estar arraigado desde a mais tenra idade, para que venha a fazer parte do inconsciente do cão. Daí, a necessidade do uso do “NÃO” suave, que minimizará os conflitos com o levantamento dos drives. Há quem diga que não devemos ensinar a palavra “não” ao cão por ter conotação negativa. Isso é pura bobagem sem qualquer justificativa real. A prática comprova que o ensinamento do comando “NÃO” poupa muitas repreensões e facilita por demais o trabalho posterior. 072 - GUIA – COMO ACOSTUMAR O CÃO A USAR: A maneira correta de acostumar um cão que nunca usou guia a tal uso é inicialmente atrelar a guia a uma coleira e não a um enforcador. Não é nada recomendável que nas primeiras vezes que utilizemos a guia isso seja traumático para o cão. De três a quatro meses é a melhor idade para que acostumemos o cão a tal uso, sempre lembrando que locais onde outros cães transitam têm enormes chances de estarem contaminados com diversas doenças e não deveremos expor nossos filhotes antes dos seis meses, quando já estiver completo todo o esquema de vacinação e ativa sua imunidade contra muitas doenças. Inicialmente, após colocar a guia no cão, deixaremos que ele nos conduza. Iremos sendo levados por ele, dentro dos limites da segurança, onde ele quiser. Aos poucos, começaremos a limitar suas ações até conduzi-lo por completo. É um processo muito rápido, e sua limitação está unicamente em conseguir que o cão comece a se movimentar com a guia fora do território. Caso haja alguma resistência por parte do cão, deveremos levá-lo no colo até local bem próximo ao portão de nossa casa e esperar que o cão volte por sua própria conta nos conduzindo com a guia, conforme explicado acima. Se o cão não o fizer, tentemos novamente a uma distância menor. Outro recurso é deixar o cão com uma coleira e uma guia velha atada a ela permanentemente até que se acostume. Não deveremos tentar acostumar um cão a andar com guia arrastando-o. Levar junto a andar com guia um outro cão já acostumado também pode ajudar muito. Se o cão não se mover de modo algum a não ser arrastado, devemos fazer isso por uns poucos metros de cada vez para que perceba que andar com guia não vai lhe trazer problemas. Só deveremos fazer isso em percursos curtíssimos de dois a três metros com pausas regulares entre eles nas quais devemos agradar o cão. Se mesmo assim não conseguirmos um resultado positivo, teremos que ficar com o animal em algum lugar fora de seu território com coleira e guia e deixar que ele se acostume com tal situação para depois reiniciar as tentativas de caminhar com a guia. 073 - GUIA E ENFORCADOR NA OBEDIÊNCIA - SEUS USOS NOS COMANDOS: Embora, devamos a esta altura, já termos acostumarmos o filhote ao uso de guia e haver dado inúmeros

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passeios com ele, chegará um momento, preferencialmente após o cão já ter elevado bem seus drives de rapina, no qual começaremos a utilizar a guia e o enforcador em seu treinamento. O comando “SIT” deverá ser o primeiro comando praticado. Independentemente do cão já haver o aprendido bem somente com a bolinha ou com o petisco, o que deve ser o desejável. Sendo assim, o comando “NÃO” será o primeiro comando a ser ensinado com o uso da guia e do enforcador. Devemos lembrar que quase todos os comandos ensinados com uso de enforcador e guia baseiam-se em estímulos negativos, portanto conflitantes com o levantamento de drives, exceto obviamente com o paradrive de obediência, conforme foi explicado em “055 - Obediência Pode Ser Considerada Drive?”. O comando “SIT” deve de preferência já ter sido ensinado com a bolinha ou com petiscos, repetimos. Sempre devemos iniciar, quando possível, todo treinamento pelos estímulos positivos. No entanto, se não houve tal possibilidade, e somente se não houve realmente tal possibilidade, deveremos iniciar o ensinamento do “SIT” com o uso da guia e do enforcador. Por outro lado, mesmo cães que já sentam perfeitamente sem o uso da guia e do enforcador devem ter um reforço deste comportamento pelo estímulo negativo dado pelo uso destes acessórios. Embora os estímulos negativos tragam sempre seus efeitos adversos, eles são reforços fundamentais para consolidar a obediência. Em momentos de muita excitação, cães que só aprenderam pelos estímulos positivos tendem a desobedecer. O que temos a ponderar mais uma vez é que quanto mais condicionamos um cão com estímulos positivos, menos precisaremos lapidá-los através de estímulos negativos para igual resultado. E acrescentamos: quanto menos precisarmos de estímulos negativos para chegar a esses resultados, melhor. Para o exposto, talvez precisemos das técnicas de provocar a desobediência dispostas no item “071 - O Comando Não”. Para ensinar com uso da guia e do enforcador um cão que ainda não sabe sentar, levaremos o animal para um local adequado e diremos com entonação alta e clara o comando “SIT”, por duas vezes. Meio segundo após, será dado um suave puxão na guia que obrigará o cão a erguer sua cabeça. Logo a seguir, com mais um segundo de tempo, exercendo pressão moderada e continua sobre guia para cima, pressionaremos com a mão que não segura a guia, a garupa do animal para baixo forçando-o a sentar, para que entenda que é isto que queremos dele. Enquanto exercemos a pressão sobre a garupa do cão até que ele sente, devemos continuar repetindo verbalmente o comando “SIT”. A pressão sobre a guia para cima e a pressão sobre a garupa para baixo devem aumentar progressivamente até obrigar o cão a sentar. A entonação da voz no comando “SIT” deverá ir gradativamente se tornando mais branda, de acordo com sua progressiva assimilação pelo animal. Após conseguir nosso intento, devemos elogiar o cão, enquanto lhe afagamos a cabeça com a mão que não segura a guia, ao mesmo tempo em que deixamos a mão que a segura pronta para tornar a puxar a guia, caso o cão tente sair da posição. Se isto chegar a acontecer, utilizaremos o segundo tipo de comando “NÃO” (seco, forte e firme), ao mesmo tempo, daremos outro puxão na guia. Se percebermos claramente, por sua expressão e atitude, que o cão tentará sair da posição, bastará entoarmos o terceiro tipo de comando “NÃÃÃÃO” (leia novamente quais são o segundo e o

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terceiro tipo de comando "NÃO") sem que precisemos dar qualquer puxão na guia. Haverá uma interação entre o aprendizado do comando “SIT” e o reforço do “NÃO” que deverá ser totalmente assimilado nesta ocasião. Aí, já podemos ver uma das utilidades do "NÃO", tanto no corrigir a desobediência já realizada, quanto evitando, através de antecipar a consumação de uma futura desobediência. Para tanto, não devemos deixar de ler “070 - Entonação da Voz – Um Detalhe Importante”. No comando “SIT”, deveremos sempre obedecer rigorosamente à ordem: comando verbal; puxão na guia; pressão na garupa para baixo, podendo ou não manter a pressão ascendente sobre a guia, conforme melhor resultado. Tudo isso é necessário que seja feito juntamente com a continuidade dos comandos verbais, até que o cão se sente. Começaremos a obter sucesso quando não precisarmos mais pressionar a garupa para que o animal sente, e concluiremos nosso objetivo quando bastar o comando verbal com amplitude normal de voz. O tempo necessário para alcançarmos este intento é variável, podendo até ser quase que imediato, dependendo das condições treinador-cão. Mas, para fixarmos na memória do animal tal comando serão necessárias várias seções e, periodicamente, algumas reciclagens enquanto o cão viver. Deveremos deixar o cão, por alguns segundos, sentado, sem sairmos de seu lado. Após, damos o comando “VEM” ao mesmo tempo em que damos também um passo à frente, gesticulando com uma das mãos, nas primeiras vezes, para que ele entenda o que queremos. Este último comando deve ser dito com voz amável e suave, pois comanda sua aproximação com o dono e isto deve ser para o cão algo agradável. Caso o cão não venha a nosso comando, não haverá problemas em puxá-lo suavemente com a guia e recebê-lo com afagos. Logo ele aprenderá a vir sob comando. Preferimos, neste caso, o “VEM” ao “JUNTO”, justamente por seu som ser mais suave. Deixamos o comando “JUNTO” para ser usado em outra ocasião. Não devemos nos agachar ao chamar o cão, nem fazer gestos exagerados, pois isso o acostumará a não prestar atenção aos comandos verbais. Muito importante, é que jamais deixemos o animal sair da posição “SIT” sem que seja usado o comando “VEM”. Devemos, após conseguir que o cão sente, utilizar vários estratagemas para que ele aprenda que deve permanecer sentado enquanto não o chamarmos para junto de nós. O primeiro será andarmos em círculos em torno do animal sem soltar a guia e ao mesmo tempo vigiando para que ele não se levante. Se o tentar, como já vimos, nos valeremos de um leve toque na guia e do comando “NÃO” na segunda entonação. Em seguida, nos colocaremos ao lado do cão e faremos de conta que iremos partir. A tendência natural do animal será de nos acompanhar, mas deveremos lembrar a ele, através dos mecanismos acima, que só deverá o fazer após receber o comando “VEM”. Outro teste será, sem soltar a guia, nos agacharmos a, mais ou menos, um metro do cão sem permitir que ele se mova. Caso, em algum momento, o cão consiga sair da posição, antes que possamos impedi-lo, deveremos o colocar exatamente no mesmo local e na mesma posição e continuar, pacientemente, nosso adestramento até conseguir nosso intento. A necessidade de voltarmos com o cão exatamente ao mesmo lugar onde antes se encontrava vem em função de que venha saber que com a desobediência não progredirá em nada. É preciso que

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observemos quando estamos em algum gramado ou qualquer outro piso onde não possamos, com precisão, saber a posição anterior à desobediência, deveremos marcar bem o local onde deixamos inicialmente o cão sentado. Isso porque, embora para nós um gramado, por exemplo, seja uma superfície homogênea, para o cão não é, pois seu olfato detecta odores diferentes, como a urina de uma fêmea, o rastro de um outro animal, etc. Algo importante a ser dito é que o “SIT” e o “VEM” devem ser dados conjuntamente de modo intercalado. Do contrário, um cão muito condicionado a sentar e ficar sentado, por exemplo, terá enormes dificuldades e conflitos para aprender o “VEM” e vir até nós. Da mesma forma, como vamos ensinar o “SIT” sem haver um comando que tire o cão de tal posição? Não podemos simplesmente abandoná-lo sentado até que seja obrigado a, sem qualquer comando, a sair da posição, aprendendo, assim, a desobedecer. Após percebermos que o cão obedece perfeitamente o comando “SIT”, e que dele não sai sem que seja dado o comando “VEM”, podemos iniciar o comando “FICA”. Este comando propiciará que possamos deixar nosso amigo imóvel mesmo que dele necessitemos nos afastar. Algo de extrema utilidade no nosso cotidiano com o cão. Alguns criticam com certa razão lógica o comando “FICA”. Sua crítica baseia-se no fato de que se o “SIT” ou o “DEITA” forem bem imprimidos, não haverá necessidade do “FICA”, e, de certa forma, têm a razão. O “FICA” realmente é um comando dispensável. Mas, ele é também um comando facilitador do entendimento canino. Quem julgar que tal comando mais atrapalha do que ajuda poderá dispensá-lo. Só, que no nosso ponto de vista e experiência, ele tem se demonstrado como meio de reforçar o comando anterior e a obediência passiva. Em verdade, o “SIT” e o “DEITA”, como todo comando, proporcionam a obediência ativa, embora exijam um comportamento passivo imediato para sua mínima manutenção. O “FICA” é um comando cuja manutenção exige exclusivamente obediência passiva e é dado somente com caráter de reforço à obediência passiva já iniciada. Embora o “FICA” exija um comportamento passivo, por ser um comando, ele proporciona um reforço ativo. Com o uso do "FICA", a obediência passiva será diretamente trabalhada. É claro, que o cão aprenderá isso sem a necessidade do “FICA”. Só que deverá levar mais tempo. Passamos o comando “FICA” ao leitor, uma vez, que, de forma alguma, poderá vir a ser prejudicial. Optamos, no caso do adestramento, a sermos mais fiéis àquilo que nossa experiência recomenda, ainda que melindrando algumas antigas posturas teóricas que desconheciam o valor do reforço no adestramento. Ademais, a mente do cão não segue à estrita lógica cartesiana com a qual raciocinamos. 074 - TRAÇÃO, CONTROLE: Controle de tração em cinofilia não tem nada a ver com a tecnologia lançada pela escuderia inglesa Willians na Fórmula 1. Brincadeiras à parte, controle de tração é a obediência, por parte do cão, de quando deve e de quando não deve tracionar a guia. Por um lado, é extremamente inconveniente um cão que fique sempre puxando a guia, porque, além de nos cansar, este cão chegará sempre exausto ao fim de uma caminhada de distância moderada. Por outro lado, é uma maneira alternativa de um cão se exercitar. Em caso de cães tímidos, é uma maneira de aumentar sua capacidade de iniciativa e de liderança, o que o ajudará muito, desinibindo drives latentes pelo aumento de sua auto-estima. Para o entendimento canino, andar na frente pode ser sinal de liderança.

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Alguns podem criticar dizendo que o cão ir à frente do condutor o deixa tomar a liderança na relação entre este e o cão. Bom, se o cão for muito dominante ou se a pessoa se sentir incapaz de reverter, a qualquer momento, qualquer liderança provisória concedida ao animal, por certo, um dos três: cão, dono ou adestrador precisa de certa reciclagem. Devemos, no entanto, alertar que tração não é um exercício dos mais saudáveis, pois pressiona os discos intervertebrais que não foram criados para essa função. E isso vale tanto para o cão que puxa quanto para a pessoa que o segura. A tração sempre deve ser exercida com força moderada, por tempo não excessivo e, de preferência, em subidas. Isso porque nas subidas, uma parte do esforço é gasto contra a gravidade, diminuindo a força usada para tracionar. Além disso, auxilia a formação de uma melhor angulação dos anteriores do animal, dadas as posturas exigidas no esforço. Para o cão que não traciona, mas queremos que tracione: o método consiste em, com o auxílio de uma outra pessoa que conduzirá outro cão, passear com os dois cães normalmente, lado a lado. A um dado momento, comandar "RÁÁÁ", quando a outra pessoa deixará que o outro cão passe à frente do cão que está sendo treinado. Este, de imediato, por disputa ou impulso de seguir a matilha, deverá puxar a guia para frente. Depois, volta-se à posição dos cães lado a lado. Continua-se no percurso, vez por outra repetindo o procedimento. Nesse caso, não se usa puxões no enforcador para que o cão deixe de tracionar, apenas o deixa à vontade. O outro cão deverá já ter sido treinado a obedecer tal comando ou simplesmente sempre tracionar naturalmente. Após e somente após percebermos que o nosso cão condicionou-se a puxar ao ouvir o comando, mesmo antes do outro cão ultrapassá-lo, repetiremos mais algumas poucas sessões e poderemos de leve usar em outra guia o enforcador de forma leve para que não tracione ao comando de "JUNTO", "ÔÔÔ JUNTO". Com o tempo, o cão aprenderá quando deve e quando não deve tracionar. O importante é que lembremos que, no caso do cão que tem dificuldade psíquica para tracionar, só devemos trabalhar o "JUNTO" muito tempo depois de o cão ter desinibido quanto ao ato de tracionar sob comando. Caso não tenhamos mais de um cão, outra pessoa além do condutor estimulará o cão a tracionar adiantando-se à sua frente ao caminhar. Caso tenhamos outro cão, mas não um auxiliar humano, teremos a complicada tarefa de permitir que o outro cão se adiante e de conduzir dois cães com três guias em duas mãos. Uma das guias atrelada ao outro cão, e as demais atreladas ao cão que estamos trabalhando. Destas últimas, uma através de um enforcador, outra de uma coleira ou peitoral. Em animais com a força e boa massa corporal será necessário um condutor de boa capacidade física. Por todas essas dificuldades, o melhor, se possível, é sempre esperar por alguém que possa ajudar. Caso o outro cão já estiver sido treinado e obedeça aos comandos de tracionar (“RÁÁÁ”) e de não tracionar (“ÔÔÔ JUNTO”), será bem mais fácil treinar o iniciante. Por mais óbvio que seja, sempre é bom alertar que jamais se realiza tração com enforcador. Para ensinar a um cão a tracionar e, também, a não tracionar sob comando, usam-se duas guias uma com enforcador ativo e outra com coleira, peitoral ou enforcador travado. A pressão da tração sempre deve ser exercida apenas na guia que não está com enforcador ativo. A outra guia com enforcador ativo deve ser mantida frouxa e será usada somente quando quisermos mostrar ao cão que ele não deve tracionar. Assim, alternaremos a guia efetivamente usada conforme o

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comportamento que queremos do animal. Já em um cão treinado tanto em tracionar como em não tracionar sob comando, bastará uma única guia atada a uma coleira ou a um enforcador travado. Para o cão que sempre traciona e queremos que ele aprenda a não tracione sem ser sob comando, o método é exatamente o mesmo. O que muda é que já iniciaremos puxando a guia com enforcador ativo mais prematuramente e com um pouco mais força. Adaptando, assim, o método a cada cão, como sempre é nossa filosofia de trabalho. 075 - TREINAMENTO COM A GUIA LONGA: Uma guia longa, de uns 10 metros, é necessária para início do nosso treinamento do “FICA” ou dos comandos que este venha a reforçar. Caso não dispusermos de um local cercado ou longe do trânsito de veículos, bem como pessoas ou animais que possam gerar acidentes ou constrangimentos, tal dispositivo é ainda mais exigível. De qualquer forma, a guia longa é essencial, pois, além da segurança que ela proporciona, tal dispositivo também é instrumento importante do próprio adestramento. Com ela podemos expressar à distância ao cão nossa vontade, e, em caso deste desobedecer, ainda assim, o mantermos sob nosso controle. Uma das razões pelas quais preferimos começar o adestramento quando o animal ainda é um filhote, é que um cão já mais criado muitas vezes percebe tal artifício e, às vezes, passa a só obedecer quando atrelado à guia longa. Em alguns cães adultos, tal treinamento pode ser muito decepcionante ao retirarmos a guia longa de cena, justamente por tal motivo. Portanto, sempre é conveniente que atrelemos tal dispositivo da maneira mais discreta possível ao enforcador. Este é um dos motivos que justificam que os cães devem ser introduzidos em alguns treinamentos iniciais o mais cedo quanto possível, em idade na qual ainda não tenham muita compreensão e esperteza para entenderem alguns dos nossos truques e artifícios usados no condicionamento. Algumas raças tidas por alguns como pouco inteligentes, na verdade trazem obstáculos ao adestramento por terem exemplares extremamente perspicazes, espertos e com temperamento mais independente. Primeiramente, devemos ordenar que o cão sente como já foi explanado anteriormente. Após o elogiarmos, como de costume, com firmeza e determinação na voz entoaremos o comando “FICA”, olhando o animal bem nos olhos e tentando ao máximo despertar sua atenção. Devemos inicialmente apenas guardar uma distância um pouco maior daquela que mantínhamos quando do comando “SIT”, sem usarmos toda a extensão da guia longa. Aos poucos, devemos ir aumentando tal distância para que o cão se acostume a ela gradualmente. O artifício de nos agacharmos, para provocar e corrigir a desobediência, poderá continuar sendo usado como teste. Caso o animal saia da posição, conforme vimos anteriormente, deverá ser recolocado de preferência exatamente no mesmo local. Primeiramente, após atingirmos certa distância, devemos parar por poucos segundos à sua frente e logo chamá-lo, dizendo seu nome e, após pequena pausa de um segundo, o comando “VEM”. Se o cão não vier, devemos chamá-lo por mais uma ou duas vezes. Se continuar insistindo em não vir, um leve toque na guia deve ser dado trazendo o animal em nossa direção. Nunca devemos ralhar com o cão quando ele de nós se aproxima. Quando o cão, por fim, até nós chegar, devemos enchê-lo de elogios e carinhos. A aproximação do cão ao dono deve ser algo sempre gratificante. Um cão, que por qualquer motivo, tema de seu dono se aproximar, provavelmente deve ter sido algum dia penalizado após fazê-lo. Esse cão poderá sofrer acidentes por não obedecer ao comando de aproximação, como, por exemplo, ser atropelado. Pode acontecer do animal, após o comando “FICA”, seguido pelo “VEM”, ao invés de procurar seu

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dono, acabe por ir à direção de outra pessoa, ou simplesmente vá para longe de seu dono. Toques na guia, também, devem, então, serem dados trazendo-o em nossa direção. A força dos toques, ou puxões, deve ser graduada de acordo com o grau da desobediência, sem nunca, no entanto, ultrapassar os limites da educação racional. Todas as desobediências comentadas acima não deverão acontecer caso o cão tenha sido previamente bem treinado com a bolinha, conforme tópicos anteriores. Muito mais produtivo é manter um reforço positivo ao "VEM" com o uso de agrados ao cão. Petiscos podem ser usados, mas moderadamente. Mas, lembremo-nos do que consta em "049 - Troca Suja e Troca Limpa". A distribuição das iscas deve ser aleatória e não seguir a uma seqüência programada, muito menos ser feita a toda aproximação do cão. No entanto, iscas não devem ser ofertadas a cães que já se obedecem com facilidade ao comando “VEM”, mas, por outro lado, têm resistência em sair posição “SIT”. Mais uma vez percebemos que o treinamento deve ser modulado a cada peculiaridade de cada cão. No caso oposto. Isto é, no caso no qual o cão não fica parado e insiste em vir até nós, um artifício que podemos nos valer com a utilização da guia longa é o de darmos o comando “FICA” com o cão a poucos metros de um poste ou palanque liso e arredondado. Passaremos a guia longa por trás do poste, de modo que o cão fique entre nós e o poste. Nesta posição, se o animal caminhar para frente, será puxado para trás pelo puxão que aplicaremos na guia. O “NÃO” deve ser sempre repetido cada vez que puxemos a guia para repreender o cão, meio segundo antes. O ideal é que o “NÃÃÃÃO” preventivo sozinho baste, sem que haja necessidade de qualquer toque na guia. Para isto, temos que saber interpretar as expressões do animal. Algo que um adestrador com o tempo aprende é que a obediência só se firma após ter sido contestada e reconquistada. Um dia, o cão deverá teimar em desobedecer, e isso acontece quase sempre no ensinamento com a guia longa. Deverá haver um dia em que o cão irá desafiar nosso comando. Isso faz parte do processo e não deve ser encarado por nós como um desafio pessoal. Nesse dia, teremos que ser firmes. Mas, devemos lembrar, por outro lado, que não devemos perder de nenhuma forma a ternura. Podemos chamar esse dia de dia "D". Isso porque é quase inevitável que ele venha a ocorrer. Por mais estranho que isso possa parecer, é somente após esse dia é que o cão passa definitivamente a nos obedecer com um nível satisfatoriamente baixo de contestação. Por isso, devemos encarar tal dia como uma etapa necessária e importante. Com a progressão do ensinamento, deveremos nos aproximar do animal, após o comando “FICA”, e de novo dele tornarmos a nos afastar, corrermos, nos agacharmos, enfim, tudo que possa estimular o cão a se mover sem permitir que ele o faça. Esta evolução, obviamente, deve ser progressiva. Assim como no comando “SIT” simples, no comando “SIT”, seguido do “FICA”, obrigatoriamente, deve ser finalizado com o comando “VEM”. Se não o fizermos, o cão, que evidentemente não ficará eternamente sentado, acabará por relaxar, e desaprenderá o aprendido. Haverá um momento em que o cão não mais necessitará da guia longa e poderemos dispensá-la. No entanto, é sempre bom lembrar que o cão não é uma máquina, nem tem a racionalidade de um ser humano normal. Sendo assim, nas proximidades de rodovias, ou qualquer outro local onde circulem veículos com moderada velocidade, devemos abrir mão de deixarmos soltos nossos cães. Quanto à proximidade de pessoas ou animais só devemos dispensar a guia se tivermos absoluta certeza do controle que temos sobre o cão e de não estarmos expondo terceiros a

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constrangimentos, como, por exemplo, ter que suportar, indesejavelmente, lambidas, patadas, ou apreensão por temer o animal, ainda que para nós isso possa parecer infundado. Isso, sem sequer considerar a trágica possibilidade de o cão atacar injustificadamente transeuntes. Mais adiante, podemos usar a guia longa para exercer todos os comandos à distância. Caso o cão não os obedeça, deveremos ir até o cão e fazê-lo obedecer. Mas, o significado de termos que ir até o cão para corrigi-lo após este já haver aprendido a obedecer com guia longa o comando “SIT”, é que os condicionamentos de obediência não foram bem formatados nos treinamentos anteriores com guia média. O melhor mesmo é retornar aos treinos anteriores e melhor formatar tais condicionamentos para depois retornar ao treinamento com guia longa. O uso da guia longa também é citado em "100 - Treinamento Integrado". 076 - MANUTENÇÃO E ELEVAÇÃO DO DRIVE DE RAPINA QUANDO DO USO DA GUIA NA OBEDIÊNCIA: Tal tarefa é simples, e a grande equação é controlar os altos drives, de rapina e, depois, de defesa, sem perder o controle e obter uma boa obediência sem prejudicar tais drives. Na verdade, é mais do que isso: é conseguir aumentar tanto esses dois drives bem como o controle. Tudo a um só momento. Em outras palavras, minimizar os efeitos da equação onde a intensidade dos drives de proteção e o paradrive de controle se contrapõem. Em verdade, a grande tarefa é minimizar os conflitos inerentes entre a intensidade dos drives e o controle dos impulsos a eles associados. Aqui, talvez, esteja o grande diferencial entre o método preconizado neste livro e os métodos tradicionais e mesmo os mais modernos. Trabalhar os drives e o controle analogamente ao modo de conduzir a direção de um automóvel, onde existem acelerador e freio; câmbio e marchas; luzes de alerta, relógios e outros indicadores sobre o funcionamento das várias partes do veículo para que possam ser adotadas medidas para corrigir as irregularidades que estes apontam. Conhecer as leituras desses indicadores é uma das grandes qualidades de um adestrador e de um figurante – muito mais do que conhecer e decorar métodos e procedimentos. É claro que todo o trabalho efetuado com a bolinha, com a lingüiça, com iscas, etc. nos ajudarão para isso. Tudo que foi impresso de forma positiva na mente do cão, tanto em nível consciente quanto inconsciente, irá agora ser precioso. Pois, tudo abrandará os conflitos e facilitará o aprendizado tanto no que se refere ao ataque quanto a seu controle. Os treinamentos que não procurem métodos menos conflitantes entre obediência e drives de proteção, sem dúvida, irão deixar de tornar muitos cães guardas aptos. Nos métodos que não se preocupam com isso, os bons continuarão a ser bons, mas talvez um pouco menos do que poderiam vir a ser; a maioria dos cães chegará a um patamar inferior ao de seu potencial, e isso poderá ser a diferença entre ser satisfatório para guarda ou não; outros que poderiam dar bons cães de guarda, poderão se tornar totalmente inaptos para tal trabalho. Da mesma forma, colocar a obediência sempre como prioritária e iniciar sempre por ela com uso de estímulos negativos poderá fazer perder muitos cães para o trabalho. Não é necessário dizer que o trabalho de obediência simplesmente com guia e enforcador utiliza-se quase que somente de estímulos negativos materializados no tranco com o enforcador.

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Mas, se agirmos de forma gradual, interativa e competente, ponderando ações e analisando resultados, certamente poderemos ter a certeza que se não formos bem sucedidos em formar um cão para guarda, que tal culpa não cabe a nós. Provavelmente caberá a uma má qualidade genética ou a traumas independentes de nossa atuação. Poderemos, também, com certeza, saber que os desequilíbrios e desvios comportamentais não derivam de nossa culpa. Será muito difícil que aconteçam tais desequilíbrios e desvios, no que tange à agressividade desenfreada, pois em sua esmagadora maioria devem-se à incompetência de falsos adestradores e de condutas bizarras por parte de seus proprietários, familiares humanos ou terceiros que tiveram indevido acesso ao cão, principalmente quando filhote. Podemos com facilidade, se competência tivermos para tanto, iniciar a partir deste ponto todo o treinamento de ataque e obediência de um cão de guarda. Quando iniciarmos o trabalho a seguir exposto, é importante que o cão já tenha aprendido a obedecer no mínimo os comandos “SIT”, “VEM” e “FICA”, tanto através de estímulos positivos, como seus respectivos reforços com estímulos negativos. Após as ponderações iniciais, vamos ao treinamento propriamente dito: O primeiro passo será colocar o cão na posição induzida pelo comando “SIT”. Já podemos notar que se o cão já tiver aprendido isso anteriormente apenas com estímulos positivos, o quanto nosso trabalho agora será facilitado. A partir daí, o manteremos nessa posição através dos recursos já referidos com o uso de “FICA”, “NÃÃÃO”, puxões na guia, etc. Se necessário, rever "073 - Guia e Enforcador na Obediência - Seus Usos e Comandos". Um figurante portará uma lingüiça, que primeiramente será apresentada ao cão da forma mais fácil dele abocanhar - na horizontal, caso o cão ainda não tenha sido condicionado anteriormente, conforme tópico "060 - Lingüiça, como Deve Ser, como Usar e Direcionar o Cão para Ela". Caso contrário, o que será preferível, tal acessório já será apresentado na vertical, em posição baixa e à esquerda de quem a segurar. Caso o cão, ao ver a lingüiça, queira investir sobre ela e saia da posição, deveremos tentar contê-lo, através de toques na guia, precedidos, uma fração de segundo antes, pelo comando "NÃO" dado em boa entonação. Faremos isso até que o cão torne à posição relativa ao "SIT". A pessoa deverá ficar imóvel e sem mexer a lingüiça, muito menos provocar o cão. Após uns dez segundos, nos quais cão e pessoa ficam imóveis, daremos o comando “PEGA”. Ao ouvir tal comando a pessoa deverá agitar a lingüiça, e o cão deverá investir sobre ela. Se insistimos muito em deixar o cão sentado e imóvel antes de darmos o comando de ataque, poderemos encontrar dificuldades para que ele ataque e causar conflitos. Se deixarmo-lo atacar antes de aprender que não é para atacar sem comando, poderemos encontrar dificuldades para que ele não ataque sem comando. Saber observar e dosar a obediência e o drive deve ser nossa arte. Presumindo que o cão obedecerá e morderá a lingüiça - caso contrário, seremos obrigados a retornar a alguma das etapas anteriores, conforme comportamento do animal - a pessoa que segura a lingüiça deverá mantê-la segura ao mesmo tempo em que a agita sem movimentos excessivamente bruscos que possam arrancá-la da boca do cão. Após, aproximadamente, uns quinze segundos, comandaremos "LARGA", e o figurante a soltará, deixando que o cão fique com ela. O ideal é que o cão a solte e foque-se no figurante e o persiga, conforme os itens “061 - Como

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Aumentar – em Muito – a Caça com o Uso da Lingüiça”, “062 - Lingüiça, como Usá-la Canalizando o Cão para o Figurante” e “067 - Lingüiça. Seu Uso no Fair Game”. Se tivermos problemas em fazer o cão soltar, voltemos ao item "065 - Lingüiça - Cão que não Solta, Cão que a Pega sem Firmeza". Vejamos, estamos trabalhando em fair game. Caso o cão não solte a lingüiça e não se foque no figurante, nem a traga para nós, não haverá maiores problemas. Nos primeiros trabalhos, escritos anteriormente, recomendávamos que se esperasse para que o cão trouxesse o acessório até nós e trocasse tal acessório por petiscos. Isso não condiz exatamente com a cinofilia de guarda efetiva. Tal tipo de procedimento, em regra geral, leva o cão a não ter uma mordida compatível com as reais necessidades de um cão de guarda. Vide: “045 - Ponto de Corte no Treinamento: Por Qual Caminho Iremos Trilhar?”. Esperar que o cão trouxesse para nós o acessório, como ocorre em muitos treinamentos esportivos, equivale a considerar a falsa caça como caça verdadeira. Isto é, significa a dar mais relevância à lingüiça do que ao figurante. Isso formatará imprintings indesejáveis. E entre estes, formataremos uma mordida fraca, em um nível esportivo de game e não de luta. Quando iniciamos o trabalho que ora está aqui exposto, pedíamos a pessoas das relações dos cães que segurassem lingüiças e ensinávamos os cães a devolvê-las para nós. Isso fazia que os cães mordessem relevantemente com menor força. Esperávamos que os cães fossem trocar o comportamento quando passássemos para um figurante (estranho) propriamente dito. Realmente o comportamento do cão se altera e muito se tiver boa defesa. Mas, a mordida – principal ação de um cão na guarda - permaneceu ainda em nível aquém do desejável, era bem mais fraca da dos cães que não recebiam treinamento de controle. A explicação é que os imprintings de soltar com facilidade e de morder sem raiva já foram formatados. Foi a partir daí que percebemos com muita clareza que esportividade e efetividade não se misturam. Ou se faz uma ou se faz outra ou, ainda, se fica pelo meio. Mas, maximizar as duas atividades é impossível. Ter um cão esportivo com uma capacidade de mordida efetiva é praticamente impossível. Pode-se argumentar que um ou outro cão esportivo tem uma mordida muito forte. E isso é possível. Mas, com certeza, esse cão teria uma mordida ainda muito mais forte caso tivesse um método de treino que maximizasse tal fator. Isso não é uma crítica à cinofilia esportiva, é apenas uma constatação que não se pode maximizar tudo na cinofilia, e que, a partir de certo ponto, temos que optar qual a opção que tomaremos. Não se trata de superioridade ou de inferioridade, nem também de igualdade ou mesmo de equivalências. Trata-se de opções diferentes, nada mais. Cães com imprintings formatados de trabalharem mais com falsa caça ou de levarem o treino sempre como uma brincadeira tendem a morder fraco para sempre. Se o foco for excessivo no controle, o mesmo se sucederá. Para melhorar a mordida dos cães que soltavam mordentes em nossas mãos, que mordiam já esperando o comando de soltar, tivemos que esperar a fase adulta e usar o bastão pesado, puxando o cão para a luta violenta, o que poderia ter quebrado os cães, caso não fossem de boa qualidade temperamental. Mesmo assim, os resultados não foram tão satisfatórios. Apenas melhores, muito melhores, mas não tanto quanto seriam, tendo como parâmetro outros cães de mesma raça e demais condições equivalentes. Só obtivemos uma recuperação razoável usando o bastão de forma muito intensa e, depois, dando bastante tempo ao cão para que seus instintos naturais corrigissem sua mordida. Foram meses até conseguir imprimir nos cães mordidas compatíveis com a atividade efetiva.

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A valorização da falsa caça no treinamento é artifício esportivo e não efetivo, bem como a facilidade de soltar rapidamente que as competições esportivas exigem. Aí, a razão que um só cão não pode ser maximizado para as funções de guarda e de esporte. Portanto o uso de apetrecho de mordida em fair play foi totalmente descartado nos métodos de treinamento efetivo, bem como o uso desses apetrechos em mãos de pessoas das relações do animal. Isso traz conflito, e esse conflito provoca insegurança sobre a força a ser aplicada e conduz a imprintings de atacar moderadamente e a morder sem o uso máximo da potência e com um tipo de mordida menos lesiva, que prenda mais do que fira. Mesmo que o cão se enraiveça posteriormente seu condicionamento será de morder com menor força, sacudir bem menos e ferir bem menos ainda. Voltando à prática, se o cão não soltar o acessório, deveremos voltar até o cão efetuando pacientemente (se for necessário) o disposto em "065 - Lingüiça - Cão que não Solta, Cão que a Pega sem Firmeza", usando o comando "SOLTA". Para simplificar, neste caso, levantaremos a cabeça do cão e daremos a ele o estímulo passivo até que solte a lingüiça. Temos que ter consciência que teremos que retornar a algumas das etapas anteriores muitas vezes. E não devemos encarar isso como um fracasso, mas como um aprendizado. Na utilização do comando “SOLTA” através do estímulo passivo, não devemos deixar de observar o disposto em “050 - Técnica de Prever uma Ação e Comandá-la antes dela Ocorrer”. Agora, estamos diante de dois caminhos a seguir: o primeiro seria usarmos o comando “SOLTA”, enquanto levantamos a cabeça do animal de forma mais calma possível, esperando que ele abandone a caça morta. O figurante não deverá provocar o cão neste caso. Particularmente, consideramos esta a melhor forma de manter um bom controle sobre o animal. O outro método seria do figurante trazer para si a rapina do cão. Deixaríamos o cão correr atrás dele, como já foi explicado em outros itens, com a lingüiça na boca até que desinteressasse por ela, pisaríamos no apetrecho deixando-o imóvel enquanto o figurante chama para si o cão, etc. O método anterior é o mais eficiente no caso de pensarmos também no controle. Deixemos este último como alternativo. Tudo isso está melhor explicado em itens anteriores. Em verdade, esses dois caminhos não precisam ser excludentes no trabalho de levante de rapina. Recomendamos anteriormente que se treinasse o cão das duas maneiras. Só que, agora, há um “pequeno detalhe”, estamos tentando a um só tempo integrar a obediência ao ataque e o cão deve obedecer a soltar sob comando. Portanto, correr com a lingüiça na boca atrás do figurante não deve mais ser permitido. Ainda mais conveniente será se pudermos já colocar a lingüiça no corpo do figurante na parte a qual quisermos posteriormente direcionar o ataque para já começar a formatar tal imprinting. Para integrarmos a obediência à proteção, o tempo que o cão deverá esperar entre ser comandado a sentar e a ordem de ataque deverá, aos poucos, ir aumentando sem, no entanto, depender de uma mesma rotina. Ou seja, mesmo o tempo máximo aumentando, ele deverá ser variável. Além disso, ora deveremos comandar a posição "DEITA" precedendo ao "PEGA", ora ordenaremos o "PEGA" já na posição relativa ao "SIT". Quanto mais variabilidade, menos bitolado deverá ficar o cão e mais preparado para uma situação real.

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Da mesma forma antes usamos os recursos de elevação de drive referidos no tópico "065 - Lingüiça - Cão que não a Solta; Cão que a Pega Sem Firmeza" para modular a obediência e o drive de rapina. A diferença é que agora estamos usando o recurso da guia e do enforcador e modulando rapina e obediência a diversos comandos, enquanto que antes apenas modulávamos o drive de rapina e o comando de "SOLTA". Antes, usávamos apenas estímulos positivos e passivos. Agora, introduzimos também estímulos negativos. Quanto melhor tiver sido nosso trabalho anterior, menos precisaremos usar desses estímulos negativos e menos conflitos teremos entre controle e intensidade. Uma recomendação que sugerimos é a utilização de duas guias para tal tipo de trabalho: uma atada ao enforcador ativo, por onde materializaremos os impulsos negativos para submeter o animal à obediência passiva ou interruptiva e outra atada a uma coleira, peitoral ou enforcador travado por onde apenas controlaremos as investidas do cão sem a atuação do enforcador que estiver ativo (não se usa enforcador de grampos, as carranas, nesse treinamento). A guia destinada apenas à contenção física do animal, em verdade, será também instrumento de impedir a atuação do outro conjunto constituído pela outra guia e enforcador ativo. A utilização de duas guias é medida importante, pois impede que involuntariamente venhamos a inibir as investidas comandadas e desejadas do cão. É também um bom recurso para limitarmos o alcance do cão para que não venha a ferir o figurante ao mesmo tempo em que não castigamos involuntariamente o animal a cada investida. Poderemos, na realização do trabalho descrito neste tópico, perceber o quanto foi importante a utilização anterior da elevação do drive de rapina e, principalmente, a elevação da obediência através de estímulos positivos. Quanto mais imprimidos através de meios positivos os imprintings desejados, menos precisaremos, agora, corrigir o cão, através de estímulos negativos, que sabemos ser conflitantes com a elevação e manutenção dos dois drives de ataque: o drive de rapina e o drive de defesa. Outra recomendação importantíssima é a de que, caso a obediência esteja muito longe do satisfatório e tal fato não se deva principalmente a um desequilíbrio que tenha privilegiado excessivamente a rapina. Isto é, se o cão estiver sem uma obediência adequada e com um drive de rapina não-alto, deveremos fazer o levantamento de rapina e o melhoramento da obediência em momentos separados e distantes pelo tempo que for necessário. Deveremos dar preferência a realizar primeiramente o levantamento da rapina, depois a melhora da obediência. Somente após conseguir a melhora desses dois fatores, deveremos trabalhá-los de forma conjunta. A razão disso é que drives de proteção e paradrive de obediência se contrapõem. Portanto, tratemos primeiramente de melhorar os drives e deixar o cão mais seguro em utilizá-los antes de contê-los. A razão pela qual dissemos no início deste tópico que ele minimizaria as chances de conflito entre a intensidade e o controle dos drives é justamente por ele expor diretamente tal conflito. Tendo em vista os conflitos serem expostos abertamente e no justo momento em que ocorrem, podem mais facilmente ser contornados e minimizados, não se excedendo demais nem para acentuar o controle nem a intensidade além do ponto que queremos nosso cão ou conforme nossas necessidades específicas.

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077 - GUIA E ENFORCADOR NA OBEDIÊNCIA - SEUS USOS NOS COMANDOS, PARTE II: Recapitulando, até agora, discorremos sobre os comandos "SIT", "NÃO", "PEGA", "SOLTA", "FICA", "VEM", "DEITA" e "RAST". Os comandos "PÁRA" e "LARGA" não são direcionados ao cão e sim à pessoa que ou faz a figuração. Com a ajuda da guia, somente consideramos até o momento os comandos "SIT", "NÃO", "FICA" e "VEM", além dos comandos "PEGA" e "SOLTA", no qual a guia com o enforcador efetivamente não é usada. Continuaremos pelo comando "DEITA", já anteriormente referido e ensinado, através de estímulos positivos em "057 - Bolinha Mágica, seus Outros Recursos e a Obediência Passiva". Provavelmente, se bem ensinado com estímulos positivos, quando do treinamento com guia e enforcador, pouco restará a se ensinar. Apenas poderemos dar algum reforço com estímulos negativos, caso o cão se demonstre recalcitrante em obedecer ao comando. Para isso, bastará colocar o cão na posição referente ao "SIT" e, a partir dela, comandar o "DEITA" puxando a guia para baixo, meio segundo após o comando verbal. Como em todos os comandos, a entonação da voz deverá começar em intensidade mais elevada e ir diminuindo gradativamente. Com o tempo, espera-se não necessitar nada mais para que o cão deite, exceto o comando verbal. Notem, agora, em vez da bolinha, usamos a guia e o enforcador. Em vez de estímulos positivos, usamos estímulos negativos. Um mínimo de estímulos negativos colabora para melhor consolidação dos ensinamentos. Isso pode ser chamada lapidação através de estímulos negativos. É isso que estamos mostrando no momento para os ensinamentos já ministrados ao cão através de estímulos positivos e passivos referentes à obediência. Voltando ao comando “DEITA”, de início, nos agacharemos ou nos ajoelharemos para puxar a guia para baixo no comando de deitar. Com o tempo, após o cão já saber como fazê-lo, precisando apenas de presteza na obediência, usaremos a sola do pé para baixar de leve a guia, enquanto comandamos o "DEITA". Assim como o "DEITA", se bem formatado, bem menos haverá a ensinar no comando "RAST", e apenas daremos um reforço negativo ao estímulo positivo já ensinado, o que, às vezes, é necessário. Após comandarmos o "DEITA", e o cão obedecer, comandaremos o "RAST" e o estimularemos à frente com o uso do toque no enforcador. Todo o resto é semelhante ao descrito em "058 - Rastejar". O próximo comando é o "JUNTO". Esse comando nada mais é do que o mesmo comando "VEM", ensinado anteriormente. Quase todos adestradores utilizam-se apenas deste último, por considerarem ambos os comandos apenas um. Estão cheios de razão. No entanto, como já explicamos anteriormente, preferimos o “VEM” quando retiramos o animal de alguma posição. É um comando relaxante que traz o cão até nós. Sua entonação, por sua própria estrutura fonética, é muito mais suave e leva ao cão uma sensação mais próxima daquela que ele deverá ter quando de nós se aproximar e o ajudará a fazê-lo. Quanto ao “JUNTO”, o utilizaremos quando o animal está em movimento e o queremos que de nós se aproxime ou caminhe ao nosso lado. A sonoridade deste comando é naturalmente mais enérgica, sendo mais bem assimilada nessa situação. De novo, preferimos, pragmaticamente, adotar aquilo que a prática nos ensinou ser mais eficiente. Na verdade, as posturas teóricas adotadas

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por alguns críticos deste sistema baseiam-se na racionalidade cartesiana entendida por nós, humanos, nem sempre a mais fácil de ser assimilada pelo animal e nem sempre a mais racional para atuar em seus mecanismos psíquicos. Sendo o cão o elemento de menor intelectualidade, deverá ser o mesmo mais valorizado, e os métodos que facilitem seus aprendizados privilegiados em relação ao aparentemente mais lógico, do ponto de vista de um raciocínio humano e puramente dedutivo. A mente do cão reage muito mais a sensações do que a mecanismos dedutivos por mais simples que para nós possam parecer. Mas, se pararmos para pensar, veremos que há enorme racionalidade em separar o “VEM” e o “JUNTO”. O primeiro comando provoca obediência ativa e que, em princípio, deve ser baseada em estímulos positivos. O segundo comando traz obediência interruptiva e que praticamente só pode ser acionada por estímulos negativos. Portanto, há muita lógica em separar o comando de chamar o cão em dois, pois cada um atua de forma diferente na mente canina. Devemos, ao ensinar ao cão o “JUNTO”, atar ao enforcador uma guia longa, de quatro a cinco metros de comprimento. Manteremos, inicialmente, quase toda a guia enrolada em nossa mão direita e com a mão esquerda a seguraremos controlando o cão com um comprimento de guia equivalente ao de uma guia curta. Daremos inicialmente o comando “SIT”, e após o animal sentar o comando “VEM” para que nos acompanhe. Caminharemos com o cão ao nosso lado e, aos poucos, iremos soltando mais a guia e gradativamente aumentando a liberdade do cão até que ele se afaste de nós até o limite da guia, ao mesmo tempo em que entoaremos o comando “JUNTO” de maneira alta, clara e seca, enquanto acionaremos com leves puxões a guia. Caminharemos, correremos; em um percurso reto, em círculos, em “oito”, em zig-zag, dando meia volta, etc. e fazendo com que o cão nos acompanhe a uma distância máxima de dois a três metros durante a corrida (e de menos de um metro durante a caminhada), ainda que estando com maior liberdade física em função do comprimento dado à guia. Paulatinamente, suavizaremos a intensidade dos puxões e da entonação da voz, até que não seja mais necessário. Quando concluirmos o ensinamento do comando “JUNTO”, automaticamente teremos concluído, também, o aprendizado de como fazer o cão caminhar ao nosso lado. O “JUNTO” também deverá ser usado quando estivermos parados, e o cão em movimento para que venha até nós. Após estarmos seguros quanto ao aprendizado do nosso companheiro, deveremos realizar tal trabalho com ele totalmente solto, tomando sempre as precauções relativas à proximidade de rodovias e trânsito de veículos, bem como, conforme a agressividade e controle que temos sobre o animal, a presença de transeuntes e de outros animais. Veja mais em “078 - Como Acostumar o Cão a Andar do Nosso Lado”. Em verdade, o “JUNTO” deverá, ao final do aprendizado, ser entoado apenas uma vez. Automaticamente, o cão deverá nos acompanhará em qualquer direção ou velocidade que tomemos. Repetindo, o cão deve manter uma distância média de dois metros na corrida e de menos de um metro na caminhada. Se já tivermos conseguido ensinar ao nosso amigo os comandos já expostos, o que, na verdade, é bem simples, uma vez que nós e ele tenhamos captado o “espírito da coisa”, podemos dizer que já ensinamos ao cão o básico do adestramento puramente de obediência. Comandos para rastrear (“RAST”), para ficar sentado (“SENTA”) e para ficar de pé (“DE PÉ”), diria que são dispensáveis para a maioria dos trabalhos que é exigido de um cão de guarda. Quanto ao comando “SENTA”, que é totalmente opcional, iremos ensinar o cão a se sentar com as patas da frente levantadas. Primeiramente, daremos a ele o comando “SIT” para que o cão sente

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normalmente. Após, com entonação média, o “SENTA”, ao mesmo tempo em que manteremos a garupa do cão sentado apoiada entre nossas canelas e daremos leves toques na guia para cima e o ajudaremos discretamente com a mão direita a que se levante. Com paciência, logo dispensaremos a ajuda da mão direita e, em seguida, dos toques na guia e, finalmente, do apoio de nossas canelas, bastando o comando verbal. Elogios nos sucessos nunca devem ser poupados. Esse comando pode ser formatado com a bolinha ou com iscas e lapidado com o e enforcador e a guia, ou vice-versa. É claro que os métodos de estímulos positivos, onde simplesmente, ao invés dos toques na guia, usa-se iscas são melhores para o trabalho principal de formatação por basearem-se mais nos estímulos positivos. Uma combinação entre ambos estímulos, negativo e positivo, pode ser usada com muita eficiência, devendo sempre a maneira positiva ser prevalente. A partir da posição relativa ao "SIT", colocaremos a garupa do cão apoiada em nossas canelas, como explicado acima, e o estimularemos a levantar as patas da frente erguendo sobre sua cabeça a isca. Com o tempo, não precisaremos mais apoiar a garupa do cão em meio às nossas canelas, ele aprenderá a se equilibrar sozinho. A partir da posição do “SENTA” que poderemos, através de estímulos puramente positivos com o uso de petiscos comandar o comando “DE PÉ”, quando o cão ficará apoiado apenas nos pés de trás. Serventia efetiva de tal treinamento, cremos não existir. 078 - COMO ACOSTUMAR O CÃO A ANDAR DO NOSSO LADO: Uma maneira fácil de obter tal controle é inicialmente dar o comando “JUNTO” e um toque no enforcador ativo cada vez que o cão ultrapassar o condutor. Com o tempo deixa-se uma guia longa de comprimento entre quatro a cinco metros atada ao enforcador ativo e com a outra extremidade na mão do condutor enquanto ele e o cão caminham. É claro, que a guia irá se arrastar no chão, pois o cão e o condutor estarão mais perto um do outro do que a extensão da guia. Mas, é isso que queremos. Toda vez que o cão ultrapassar o condutor, este dará o comando “NÃO” e pisará a guia. Isso fará com que o cão sinta mais o puxão, que vindo de baixo é mais eficaz, pois o fará baixar a cabeça. Para cães treinados com a bolinha mágica, ela poderá auxiliar sobremaneira neste aprendizado. Sobretudo porque ela mantém o cão ligado e andando junto ao dono para obtê-la. O condutor mostrará, por vezes, a bolinha e a manterá em seu bolso, fazendo com que o cão o siga sem se afastar. Este método, baseado no estímulo positivo, auxiliará muito a diminuir o treinamento baseado nos estímulos negativos que se constituem em pisões na guia e conseqüentes os puxões do enforcador. No entanto, o estímulo negativo através do enforcador, ainda que apenas como reforço é necessário para manter boa confiabilidade no aprendizado, a lapidação do aprendizado. O método da bolinha no bolso deve, aos poucos fazer desaparecer a bolinha por longos períodos no bolso do condutor, e a alegria de seguir a bolinha deve ser substituída pela alegria de seguir o condutor. Para isso, é claro, afagos e amizade são essenciais. Se o local não oferecer risco ao cão e a outros animais ou pessoas, poder-se-á deixar a guia totalmente solta no chão, atada somente ao enforcador. Isso fará que o cão se acostume a obedecer mesmo vendo o as mãos do condutor vazias. Conforme já foi dito em “073 - Guia e Enforcador na Obediência - Seus Usos nos Comandos, Parte II”, no que se refere ao Comando “JUNTO”, deveremos caminhar para um lado e para o outro dando este comando, de forma gradativamente menos intensa, até que nem seja mais necessário dar qualquer comando para que o cão nos acompanhe bem ao nosso lado. Poderemos correr, andar,

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parar, fazer zig-zags, oitos, etc., mantendo o cão ao nosso lado e bem próximo a nós. 079 - TREINAMENTO COM GUIA LONGA. PARTE II: Talvez o leitor se pergunte por que alguns tópicos são desdobrados ou por que certos assuntos são interrompidos neste capítulo e resgatados alguns tópicos depois. A razão disso é que este capítulo é colocado de forma seqüencial, na mesma sucessão na qual o treinamento deve evoluir de acordo com sua progressão lógica, bem como, com a idade e o amadurecimento do cão. No tópico “075 - Treinamento com Guia Longa”, nos focamos nos reforços à distância dos comandos "FICA", "NÃO" e "VEM". Neste tópico, vamos nos deter nos demais comandos. Tentaremos usar de estímulos negativos e positivos, sempre procurando, dentro de um método eficiente, valorizar estes últimos. Para os comandos "SIT" e "DEITA": usaremos simplesmente de início a guia longa como se curta o fosse. Aos poucos, iremos nos afastando do cão e dando tal comando a maior distância. Na seguinte ordem: "SIT", "FICA" e "VEM" ou na ordem "SIT", "DEITA", "FICA" e "VEM". O ideal é o uso aleatório das duas seqüências. O "NÃO" será usado para tolher as possíveis iniciativas de o cão desobedecer. Petiscos poderão ser dados aleatoriamente após o cão obedecer ao comando "VEM". A bolinha poderá ser apresentada para chamar o cão. Mas, lembrem-se: petiscos e bolinha devem aos poucos serem substituídos pelo simples comando verbal, e a alegria do trabalho para o cão deve estar em obedecer e alegrar seu dono com isso. O dono, para isso, deve sempre elogiar o cão durante o aprendizado. Comando "PEGA": usando da bolinha ou da lingüiça, mantendo o cão na posição relativa ao "SIT", jogaremos a bolinha e, caso o cão se mova em direção a ela, usaremos do toque no enforcador precedido do comando "NÃO". Quando o cão voltar à posição sentada ou deitada (poderemos, por vezes, dar o "DEITA" após o "SIT"), esperaremos um tempo variável e comandaremos o "PEGA", que já deverá estar formatado para que o cão alcance a bolinha. Inicialmente usaremos a guia longa como se fosse curta, e aumentaremos progressivamente a distância entre nós e o cão. Embora seja contrário aos princípios da efetividade, não haverá problema se alguém das relações do animal e que não corra risco de ser atacado por ele segure uma lingüiça nas mãos para efeito único de obediência. O que deve ser proibido será levantar drives exceto em nível de fair play com pessoa amiga. Essa pessoa nem de brincadeira deverá levar consigo um bastão de treino. Comandaremos o "SOLTA", apenas pelo estímulo passivo da caça-morta, pois a pessoa indicada deverá largar o acessório tão logo o cão o abocanhe. Se ela resistir ao largá-lo estará apurando rapina em nível de fair game, o que conflita com o treinamento efetivo. Por isso, ser necessário tal treinamento com lingüiça em nível mais baixo possível de rapina, pelo menos inicialmente. O “SOLTA” é um comando que precisa estar bem formatado antes de pensarmos que seja obedecido de longe. E o aqui exposto também precisa ser muito bem formatado para que posteriormente possa ser levado ao nível de fair fight ou para a luta. Muito importante para o comentado agora o disposto no item “050 - Técnica de Prever uma Ação e Comandá-la antes Dela Ocorrer”. Todo este treinamento visa formatar condicionamentos que serão usados posteriormente na obediência em geral e no treinamento integrado desta com o ataque. O último condicionamento a ser dado nesta fase é o de fazer o cão interromper sua busca primeiramente à bolinha, depois à

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lingüiça em mãos estranhas, mas que não ameacem o cão. Este último recurso será usado como base para interrupção do ataque conforme veremos em "100 - Treinamento Integrado". Sem o exposto neste item será muito difícil obtermos sucesso no que será discorrido no item retro-mencionado. Tal treinamento consiste simplesmente, após lançarmos a bolinha e darmos o comando de "PEGA", darmos o comando "JUNTO" antes que o cão alcance a bolinha, que deverá preceder um leve toque no enforcador. Quanto mais tivermos formatado bem a obediência do “JUNTO”, mais facilidade teremos agora. Não devemos nos esquecer que, de início, neste aprendizado, não devemos excitar o cão para a bolinha. Devemos jogá-la nas primeiras vezes com pouca força, próximas a nós e sem darmos muita ênfase à entonação do “PEGA”. Com o tempo, poderemos ir aumentando a excitação enquanto o cão progride na obediência. Em verdade, o treinamento do comando “JUNTO” só se completará realmente nessa fase. Veremos que agora fica muito mais difícil fazer o cão obedecê-lo, tendo em vista a enorme demanda do drive de rapina. Esse é um treinamento importantíssimo para obter um bom equilíbrio entre intensidade e controle, fundamental, podemos dizer. Após conseguirmos que o cão pare, independentemente de ser pelo comando verbal ou pelo puxão do enforcador, que – na medida do possível - deverá ser mínimo, repetiremos o "JUNTO" mostrando ao cão que lhe ofertamos a bolinha (para isso, no início é bom termos duas bolinhas, uma que lançaremos e outra que ficará conosco). Os toques no enforcador só devem aumentar sua graduação quando já tivermos certeza que o cão entendeu muito bem o que deve ser feito e não obedece por teimosia e o comando “JUNTO” repetido com muita energia. Este condicionamento é um dos mais delicados e sensíveis. Deve ser feito por adestrador realmente competente, pois pode inibir a disposição de ataque e quebrar o drive de rapina do animal. Por isso pode precisar de enorme paciência em sua realização. Sem pressa, sem pressa, muita manha e paciência. Jamais se pode tentar treinar um cão em um treinamento de tal sensibilidade e importância em dias que nós estamos irritados. O resultado poderá ser catastrófico. Em caso de dúvida se o animal está sendo, ou não, inibido, o melhor é parar o treinamento de imediato. Ultrajar o drive de rapina de um cão efetivo em formação é a última coisa que deve ser feita. Outra medida importante é dar certo comprimento na guia para que haja tempo do animal sair de um comando e assimilar o outro durante o trajeto. O negativo disso é que conforme aumenta a distância, aumenta a velocidade e o impacto do enforcador. Podemos minimizar este problema usando coleira, desde que o cão não demonstre teimosia intencional. Uma dica é usar de tal recurso, pelo menos de início, sempre no fim dos treinos, quando o animal estiver mais cansado e com menor gameness, para melhor assimilar a faceta interruptiva envolvida. “Faceta interruptiva”, no caso, é o caráter interruptivo que o comando “JUNTO” tem em relação a um cão que se dirige a seu objeto de caça. O "JUNTO" também poderá ser usado após o "SOLTA", usando-se de estímulo negativo (toque com enforcador) e positivo (iscas e agrados). E lembrem-se, petiscos são tolerados inicialmente no “JUNTO”, mas nunca no “SOLTA”, pois podem “amolecer” a mordida do cão. 080 - QUANDO NÃO TREINAR: Uma colocação que faremos agora, é que, às vezes, parece impossível conseguirmos que um cão venha a aprender alguma coisa. Devemos, neste caso, primeiramente, analisar se a falha não é nossa. Caso não seja, continuarmos, sempre sem afobação, firmes em nosso propósito, pois, cedo ou tarde, ele deverá acabar por obedecer. É comum que pessoas, iniciantes na arte do adestramento, tenham pequenas crises nervosas, em função do

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animal, em certos momentos, se tornar totalmente desobediente. Tal estado de espírito, de imediato, contaminará o animal que, provavelmente, acabará por ficar totalmente alienado a qualquer comando. Poderá tentar fugir da presença do adestrador, procurar abrigo em outras pessoas ou se deitar apavorado. Isto acabará por irritar, ainda mais, o neófito. A perda do controle da situação poderá ser total. Estabelecer-se-á, então, um caótico ciclo vicioso. Quando isto acontecer, o ser humano envolvido deve procurar ter consciência de qual deverá ser o lado mais racional da guia. Acalmar-se ou, se achar que é mais recomendável, deixar para continuar em outra hora. Voltamos a repetir, adestramento é algo que só devemos realizar quando estamos tranqüilos, de bem com a vida. Uma “dica” para que tenhamos naturalidade quando saímos para adestrar nossos cães, será a de sairmos despreocupados para simplesmente dar o nosso passeio, e, durante este passeio, procedermos ao adestramento sem preocupações exageradas se ele será, ou não, bem sucedido. Caso venhamos a perceber que “o dia não está bom”, forçaremos menos os ensinamentos ou até postergaremos o adestramento. Não devemos determinar “hoje ele aprende isso”. Nunca devemos criar tal exigência para nós e para o cão. Ela atrapalhará muito a nós dois. O sucesso deve simplesmente acontecer. Devemos estar com a mente relaxada para tanto. 081 – TEMPO DAS SESSÕES: Outro fator, que não podemos desprezar, é o tempo das “aulas”, que jamais deve ultrapassar a quarenta e cinco minutos. A capacidade mental do animal é limitada e, em pouco tempo, estará esgotada, tornando-se o cão resistente a qualquer aprendizado. Até em humanos, qualquer aprendizado que exceder a tal período de tempo é contraproducente. Mesmo assim, 45 minutos é um tempo excessivo para um treinamento ininterrupto. Tal tempo seria o tempo total de treino, incluindo pequenos intervalos de repouso para nós e para nosso amigo. Se insistirmos, é provável que até venha a desaprender o já ensinado. Isto não impede, no entanto, que, em passeios longos e descontraídos, possamos realizar várias seções curtas de treinamento, a qual é sem dúvida a melhor opção, mas, na maioria das vezes, inviável em função de nossas outras obrigações ou de outros cães que tenhamos que adestrar. 082 - SUCESSO NO ADESTRAMENTO: Todo adestramento será bem sucedido, desde que o adestrador não venha a falhar. Os insucessos cuja única responsabilidade for do animal, na verdade, não são insucessos, mas apenas etapas que, de alguma maneira, acabaríamos, antes ou depois, por ter com que nos deparar. Em outros momentos, nos surpreendemos de como conseguimos com extrema facilidade que o cão faça o que queremos. Devemos, também, lembrar que só deveremos comemorar o sucesso depois de consegui-lo várias vezes. O tempo de aprendizado necessário para ser conseguir um cão treinado dependerá da experiência e habilidade do adestrador; da idade, inteligência e temperamento do cão, e, enfim, do grau de adestramento que desejamos atingir. Se formos adestradores profissionais e estivermos trabalhando para terceiros, precisamos levar em conta que nosso sucesso só ocorrerá quando o cão fizer sob comando dessa pessoa o que o faz conosco. Essa é uma variável dono-dependente, isto é, o ponto em que poderemos dizer que um cão está pronto para um dono não é o mesmo se for para outro dono. Alguns donos, mais refratários à lida com animais, precisam de um cão com condicionamentos mais calcados do que outros para que seus animais os obedeçam. Em caso de dúvida, o melhor é firmarmos um bom

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condicionamento antes de acharmos que o cão está preparado. Outro ponto, quando um cão estiver sendo treinado por um adestrador profissional, só ele deve treinar o cão. Se o dono ou seus familiares tentarem fazer isso intercaladamente antes que o adestrador autorize atrapalhará e atrasará em muito o trabalho deste. Isso, pois, se mal ensinadas durante sua evolução, o cão deixará de fazer coisas que já começara a aprender e terá maior dificuldade de aprender outras. São comuns os casos em que os donos tentam ganhar tempo tentando “ajudar” o adestrador. Um bom adestrador logo se dará conta que o cão regrediu em seu treinamento e saberá por que. Também é total ilusão crer que um cão está adestrado porque começou a obedecer comandos. O adestramento só estará concluído quando tais comandos estiverem impressos em nível profundo no inconsciente animal. E mais, não existe adestramento que prevaleça se não estiver sujeito a feed backs periódicos, ou por parte do próprio dono na vivência cotidiana ou por ação de adestrador. No que se refere à guarda, obviamente, que estaremos dependentes do auxílio de um figurante ou mesmo de um cobaia. Lembremo-nos, cães inexperientes e com temperamento fraco necessitam de um bom figurante; cães experientes e com bom temperamento fazem bonito com qualquer cobaia. Aliás, ridículo é esperar na cinofilia efetiva que um oponente real venha a facilitar a mordida do cão... Um bom figurante, em verdade, ensina o cão como deve morder, mas, conforme evolução do cão, ao contrário, tentará dificultar o animal, assim como faria qualquer marginal acossado pelo cão. Mas, nas etapas ainda de aprendizado, precisamos de um bom figurante. Ele é essencial. Outra recomendação que deixamos, é que um animal que seja premiado com exercícios físicos como passeios, trote, tração moderada, etc. deverá ser muito menos estressado e mais apto ao aprendizado. Será, também, psíquica e fisicamente, mais apto à realização das provas de proteção. Lembremo-nos que gana e vontade depende de preparo físico, e que um cão bem preparado fisicamente apresentará melhor seus drives e aprenderá com muito mais facilidade e suportará com mais facilidade muito maior tempo de treino. 083 - IDADE MÍNIMA IDEAL PARA CADA ETAPA DE TREINO: Em um filhote de boa qualidade, entre 90 e 120 dias pode-se começar o levantamento da rapina com a bolinha. Após, quinze dias só utilizando a bolinha, deve-se iniciar a lingüiça em fair play, apenas atirando a lingüiça para que o cão a pegue. Aos cinco meses, pode-se iniciar o descrito em "073 - Guia e Enforcador na Obediência. Seus Usos e Comandos" e em "074 - Tração, Controle". Aos cinco meses e meio, pode-se iniciar o que encontramos em "075 - Treinamento com Guia Longa" e "076 - Manutenção e Elevação do Drive de Rapina, Quando do Uso da Guia na Obediência". Aos seis meses, podemos iniciar o que está escrito em "077 - Guia e Enforcador na Obediência. Seus Usos e Comandos - Parte II" e "079 - Treinamento com Guia Longa. Parte II". Seriam esses os indicativos de idade mínima e ideal para se iniciar cada fase, não sendo recomendado as iniciar mais precocemente. Então, as indicações dadas no parágrafo acima, como o nome diz, são meramente indicativas. Cada cão é um cão, e o mais importante é não pular nenhuma dessas etapas. Também devemos levar em consideração, que tais tempos são considerados para um excelente exemplar quando filhote - o que, de forma alguma significa que exemplares de menos precoces não venham a ter, ainda que somente mais velhos, qualidades e rendimentos superiores. Outro fator importante a ser dito é que tais intervalos de tempo de treinamento baseiam-se em uma média de cinco sessões semanais.

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O treinamento indicado em "057 - Bolinha Mágica, Seus Outros Recursos e a Obediência Passiva", pode ser iniciado em qualquer tempo após conseguir sucesso na sua base que aparece em "052 - Obediência e a Bolinha Mágica". Este, recomendamos aos quatro meses e meio. O leitor poderá ter uma boa idéia da seqüência ideal das etapas simplesmente acompanhando a seqüência exposta neste capítulo, que já foi elaborado com tal finalidade, para facilitar o entendimento e a aplicação do aqui exposto. No entanto, a partir do tópico "085 - Estímulos Paralelos sobre os Drives de Rapina e de Defesa- Parte I", há uma outra seqüência que começa na mais tenra idade e que pode ser usada conjuntamente com a já exposta sem prejuízo desta. Muito pelo contrário, os trabalhos irão se potencializar na direção de formar, dentro do potencial de cada espécime, um excelente cão de guarda. Para o próximo tópico, cremos que seis meses seja uma idade excelente para iniciar sua aplicação, levando em consideração, no entanto, a exceção motivada pelas necessidades descritas em seu início. 084 - COMANDO NÂO - DEFININDO OS LIMITES: A obediência, nessa fase, deve limitar-se a encontrar algum local bem delimitado e proibir os filhotes de ultrapassarem esse limite. A obediência poderá começar a ser ensinada proibindo-se que o cão entre ou saia de algum lugar, de preferência bem delimitado, por um degrau, por exemplo. Tal tipo de treinamento – mesmo que a rapina ainda não tenha sido levantada - até pode ser feito ser houver necessidade veemente no que tange ao comportamento do cão dentro de nossa casa, etc. Do contrário, é preferível que somente seja realizado após o drive de rapina estar bem incrementado. No caso, de iniciarmos antes do drive de rapina estar evoluído, devemos compensar com brincadeiras que elevem esses drive. Se isso for conseguido, será realmente ainda melhor do que esperar para iniciar o ensinamento do que está neste tópico. A situação ideal seria tão logo esteja bem firmado, pelo menos em nível de fair play, o drive de rapina comecemos o descrito neste tópico. Quanto antes pudermos levantar o drive de rapina e quanto antes pudermos criar imprintings de obediência, melhor será o todo o treinamento futuro. Devemos lembrar do fulcro de topo do método exposto neste capítulo. Isto é, de que o treinamento deve ser flexível e interativo com as respostas do cão. Um animal mais tímido e apresentando um menor drive de caça deverá ser menos forçado na obediência. Já, um animal hiperativo ou que apresente um alto drive de caça poderá ser mais forçado. A sensibilidade do dono e do adestrador são fundamentais para perceber as transformações impostas ao cão e com isso graduar o binômio drive de rapina / paradrive de obediência. A principal preocupação na formação de um cão de guarda efetiva, no entanto, deve estar sempre focada em não comprometer a formação dos drives de proteção. É preciso também levar em consideração que a necessidade prematura de que o filhote, desde cedo, já conheça certos limites deve coincidir com ele estar mais incorporado ao convívio familiar, o que ajudará a compensar em muito os conflitos gerados pelas limitações impostas. É totalmente diferente ensinar obediência com estímulos negativos a um cão que convive conosco e sabe que lhe queremos bem e a um outro que só tiramos de seu canil para lhe impor estímulos negativos.

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Como já dissemos, a obediência, nessa fase, deve limitar-se a encontrar algum limite físico bem delimitado, mas fácil de ser transposto, e proibir os filhotes de ultrapassarem esse limite. Repetindo, a obediência poderá começar a ser ensinada proibindo-se que o cão entre ou saia de algum lugar, de preferência bem delimitado, por um degrau, por exemplo. A palavra NÃO, chave de grande parte do ensinamento futuro - no caso desse ser o primeiro ensinamento, será dita a seguir, no momento que será aplicado ao cão um muito leve tapinha, apenas com a ponta dos dedos indicador e médio ao lado do focinho - nunca na trufa. A palavra NÃO deve ser pronunciada com energia, mas sem agressividade na voz, e o tapinha dado muito levemente apenas para que o cão venha saber que NÃO representa algo proibido. A intensidade do tapinha será aumentada ou diminuída de acordo com a necessidade e sensibilidade do animal de captar nossa mensagem, e sempre ser limitada ao mínimo necessário. Se sentirmos, no entanto, que o animal mais se intimida do que obedece, algo de muito errado está acontecendo, e convém pararmos imediatamente o treinamento. Um cão de guarda por ser valente e possuir altos drives de defesa ou de rapina deve possuir extremo respeito ao dono, mas para ser valente deve desprezar o medo, ou, pelo menos, não ser traumatizado em relação a ele. Excessos na força dos “tapinhas”, gritos, nervosismos e outros estímulos negativos podem traumatizar, prejudicar ou até inviabilizar o cão como futuro guarda. Em caso de não conseguirmos manipular a situação, é preferível retrocedermos, perguntarmos a outras pessoas onde estão nossos erros e nos acalmarmos antes do que continuar. Há muito tempo para um cão ser treinado, desde que não se pense no tempo como um recurso inesgotável. Portanto, deixemos para continuar outro dia. Excessos ou condução desastrosa por nossa parte, na melhor das hipóteses, equivale a muitos dias de treinamentos bem sucedidos jogados fora. Poderão também causar seqüelas insuperáveis no caráter e até no temperamento. No caso do filhote se comportar de maneira muito tímida, é hora de darmos a ele muito carinho e deixarmos que ele nos lamba a mão e, para quem não se importa, de preferência, o rosto. A lambida e sua aceitação por nossa parte têm para o cão um significado de perdão, de conciliação, e, assim, ele saberá que não guardamos mágoas e continuamos seus amigos, aceitamos suas desculpas, o que o deixará tranqüilo para prosseguirmos o aprendizado satisfatoriamente. Aceitar a lambida no rosto em termos cinológicos equivale a aceitar ser o alfa da matilha. O alfa é o protetor de todos e que protege o grupo, sendo protegido por ele. É o líder incontestável. O cão lamber nosso rosto significa que ele nos elegeu como seu líder, e aceitar as lambidas significa que aceitamos ser seu líder e não seu inimigo. Isso tranqüiliza o cão e deve nos tranqüilizar também. E mais, entre os cães, a lambida no rosto equivale a uma submissão por parte de quem a dá e a um pedido de desculpas também. Não aceitar a lambida equivale a não aceitar as desculpas, dizer que não está tudo bem como antes. Mas, mesmo sem sermos excessivamente enérgicos, jamais deveremos permitir, nem por uma só vez, que o filhote ultrapasse a barreira. Se isso acontecer fora do nosso controle, deveremos levar o filhote de volta ao local de imediato e continuarmos o processo. Ceder uma só vez, assim como ser enérgicos em excesso, põe por água abaixo muitas sessões anteriores e descondiciona o cão para o futuro aprendizado. Em outras palavras, ensina-o a desobedecer. E isso é algo bem mais

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difícil de retirar do cão do que simplesmente ensiná-lo a obedecer. Durante muito tempo, voltaremos sempre ao mesmo experimento, condicionando-o ao significado da palavra NÃO, sem jamais sermos brutos, apenas enérgicos, na medida apenas do necessário. É absolutamente não recomendável tentarmos adestrar cães, principalmente filhotes, nos dias em que estamos estressados e de mal com a vida, pois estenderemos ao animal nossas tensões e o treinamento será, no mínimo, improdutivo ou, mais provavelmente, danoso. O cão que compreende o significado da palavra NÃO saberá que ela está ligada a algo errado e que não deve ser feito. Assim, apenas pronunciando-a, mostraremos ao animal quando não queremos que faça algo sem precisar repreendê-lo. Esse aprendizado deverá estar, de preferência, arraigado desde a mais tenra idade, para que venha a fazer parte do inconsciente do cão. Daí, a necessidade do uso do “NÃO” suave, que minimizará os conflitos com o levantamento dos drives. A total impessoalidade nas repreensões é importantíssima. Quando damos ao cão estímulos negativos, sempre devemos fazê-lo de forma impessoal. Em outras palavras, devemos ter expressão facial neutra e procurarmos não mostrar qualquer emoção. Jamais, mas jamais mesmo, deveremos mostrar raiva ao cão na fase de filhote. Isso pode ser catastrófico em termos do futuro desse cão como guarda e como criatura sadia mentalmente. Melhor ainda, em nenhuma fase. O treinamento mais precoce, tenderá a fazer o cão a obedecer sem questionar se deve, ou não, fazê-lo. Tal trabalho deverá ser realizado sem pressa, com muita paciência e carinho para não quebrarmos a personalidade do animal. Do contrário, tornará este imprestável para guarda. No entanto, jamais devemos permitir que o cão “ganhe”, senão a lição será contraproducente, o tiro sairá pela culatra. Portanto, ainda que de uma maneira carinhosa, devemos ser enérgicos o suficiente para que nossa vontade prevaleça sobre à do animal. As vigas mestras da obediência são a paciência e a persistência. Nunca a violência ou a brutalidade. Juntamente com o entendimento da palavra NÃO, passamos ao cão, ainda que inconscientemente, muitos outros entendimentos. Daí nos alongarmos neste item. Por ser, dentro da nossa metodologia, o comando "NÃO", a viga mestra que antecede - mas abranda os estímulos negativos, também pode ser o primeiro ensinamento verbal que proporcionamos ao animal, no caso de iniciarmos por este tópico os ensinamentos – o que, só será a melhor estratégia se conseguirmos elevar o fair play desde cedo. É através do comando “NÃO” e de suas entoações de voz, convenientes em cada caso, que socializaremos o cão à sua convivência conosco e a captar nossos desejos e formas de ser, de nós, humanos. O método efetivo valoriza como nenhum outro o cão como ser e até como pessoa. O cão nessa metodologia não é tido como uma máquina ou como uma coisa sem sentimentos que deve entender nossas exigências de forma mecânica. Entender os sentimentos do cão, dar a ele carinho, tudo isso também é ser efetivo. Conforme já foi comentado anteriormente, há pessoas não leigas que não admitem, de forma alguma, o comando "NÃO", movidas pelo fato de que a palavra ou o comando "NÃO" ter conotação negativa e, portanto, nunca deve ser dita, e que o cão só deve ser movido por impulsos positivos. Filosoficamente, isso é muito bonito, mas pouco eficiente. O "NÃO" arraigado à personalidade de maneira não traumática é um instrumento valioso e um grande atalho para muitos ensinamentos. O que, por vezes, ocorre é que maus adestradores incutem tal comando de maneira bruta ou até cruel. Isso sim é que não pode, de forma alguma, ocorrer.

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É evidente que, filosoficamente, o ideal seria não usarmos estímulos negativos. Devemos ao máximo os substituir pelos estímulos positivos durante todo o treinamento. Mas, é irreal achar que nunca iremos precisar de algum método que utilize, por menor que seja, de algum estímulo negativo. Sendo assim, nesse caso, é, de longe, preferível o simples uso do comando "NÃO" em voz branda do que outro recurso que provoque dor ou desconforto. Como vimos anteriormente, estímulos positivos e negativos se reforçam e um bom imprinting comportamental deve ser moldado e lapidado por ambos, ainda que com a maior predominância possível dos estímulos positivos. 085 - ESTÍMULOS PARALELOS SOBRE OS DRIVES DE RAPINA E DE DEFESA - PARTE I: Neste tópico, comentaremos alguns métodos paralelos que devem ser feitos para a maximização do potencial dos drives fundamentais para um bom cão de guarda. A preparação do temperamento de um cão para que ele venha a possuir coragem e equilíbrio, deve ser iniciada o mais cedo quanto for possível, uma vez que ela é o lastro essencial para tudo o que venha a ser esse cão. E tal preparação deve obedecer uma ordem seqüencial. Observem, entretanto, que "o mais cedo quanto possível" não significa prematuramente, apenas que na idade mínima recomendável o trabalho deve ser iniciado, respeitando, outrossim, que o conceito de idade mínima para tal início deve respeitar as peculiaridades de cada espécime. Por exemplo, numa mesma ninhada, nem todos os irmãos necessariamente deverão começar um mesmo treinamento na mesma idade. Já a partir dos dois meses de idade talvez possamos iniciar o trabalho, apenas utilizando guia e coleira, pois o enforcador nunca deve ser usado quando estimulamos os drives. Nesta etapa, a primeira preocupação que deveremos ter é evitar a convivência do cão com pessoas estranhas, principalmente dentro de casa. Isso não significa, de forma alguma, que o filhote não deve ver pessoas estranhas. Muito pelo contrário, é importante que veja, mas nunca se deve permitir que se aproximem no que é definido como área íntima, ou seja, aquela na qual as pessoas que não tenham muita intimidade não devem se aproximar, o que equivale a mais ou menos a meio metro. No caso do filhote, por medida de garantia, essa distância deve ser estendida a um metro ou até mais. O convívio com animais de todas as espécies que forem possíveis e que não coloquem em risco a integridade do filhote, no entanto, é recomendado. Além da crueldade, é uma estultice apreciarmos que nossos cães persigam animais inocentes, no futuro, um gato, um gambá, ou até um outro cão, pode ser utilizado por malfeitores como isca, fazendo com que o cão negligencie sua função de guarda. Devemos levar nosso cão à rua e fazê-lo à noite, em locais mais ou menos ermos e escuros e, a cada estranho que passar, discretamente procurar mostrar ao cão que é algo ameaçador. Em filhotes ainda muito novos, mas com eventual capacidade de assimilação, deveremos levá-los ao colo, talvez dentro do nosso carro, para não que se exponha a doenças. A guia e a coleira ficarão atadas no pescoço do cão para irmos acostumando-o a isso e para que sejam posteriormente usadas como instrumento de trabalho, mesmo com o cão no colo ou em um banco de praça ou de carro. Deveremos tomar atitude tensa a cada estranho que passar, criando em nós certo retesamento muscular, o qual deixaremos transmitir através de nossas mãos ou da guia, ao mesmo tempo em

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que chiamos baixinho, olhando de maneira tensa para o estranho, de forma obviamente discreta (risos). Quando cão já souber andar com a guia, à presença de cada estranho, pararemos a marcha e induziremos ao cão que observe o estranho. Manter a guia esticada, a segurando com tensão, ao mesmo tempo em que nos aparentarmos também tensos, emitindo baixos chiados e olhando para o estranho, sem dúvida deverá transmitir ao animal nossa “preocupação”. Quando o cão começar a parar e fitar as pessoas estranhas, franzindo a testa, levantando as orelhas, parte do caminho já estará andada em toda a preparação do temperamento. Daí para frente, é somente termos o cuidado de nunca avançarmos demais nas etapas seguintes. Suaves e tensas oscilações na guia já esticada com adição de alguns chiados e fala sussurrante são temperos indispensáveis. Aos poucos, sempre de maneira discreta, devemos permitir que o cão siga as pessoas, no sentido de encará-las como uma caça, e que tal interesse se consolide. É assim que os lobos e outros caçadores educam seus filhos. Esta é a maneira mais saudável de se despertar o temperamento dos cães. À primeira vista, pode até parecer que estamos ensinando a se formar cães caçadores de homens e assassinos. Não é nada disto! Trata-se apenas de uma maneira de se trazer ao filhote, durante um breve período de sua vida, com a personalidade ainda em formação, segurança e uma sensação de superioridade muito positiva no sentido que venha a evitar que se torne perigoso. Devemos lembrar que o complexo de inferioridade, o medo e a insegurança, não só no homem, mas também em outros animais, são os principais elementos para os tornarem maus, agressivos e perigosos. A agressividade é muito mais irmã do medo do que da coragem. Um cão corajoso atacará sem hesitar e com firmeza ao cumprir sua tarefa de guarda, mas não deverá agredir fora dela. Um cão agressivo poderá se comportar de modo exatamente oposto. Os treinamentos baseados no estímulo da insegurança, da neurose e do medo não são, de forma alguma, muito eficientes, pois parcela do medo adquirido ficará para sempre na memória do animal. O cão deverá atacar com violência, mas somente por obediência e instinto natural nunca dissociados da alegria em fazê-lo. Cães treinados pelo medo provavelmente vacilarão ante uma reação mais enérgica. A duração ideal do treinamento ora exposto deve ser dos dois aos quatro meses de idade, mas poderá ser iniciada em qualquer idade. Caso o animal já tenha quatro meses, ou mais, poderemos encurtá-la substancialmente. A sensibilidade de se perceber que já podemos progredir de uma etapa para a outra é algo um tanto difícil de explicar em um livro. De um modo geral, podemos tomar como base o momento em que percebemos que o cão não tem mais como evoluir dentro de cada etapa, e após mais umas duas repetições, sem que se obtenha um resultado significantemente mais positivo, mas amplamente satisfatório. Será, então, o momento de progredir no método. Procurar precipitar as coisas é um erro grave, mas também atrasá-las em demasia pode ser contraproducente, tendo em vista que pode levar ao cão se cansar do treinamento e acabar regredindo neste aspecto. É claro, que em caso de dúvida, é sempre preferível caminharmos devagar que muito depressa. 086 - ESTÍMULOS PARALELOS SOBRE OS DRIVES DE RAPINA E DE DEFESA - PARTE II: A segunda etapa deste item deve ser realizada com muito cuidado, de preferência com o auxílio de pessoa com certa experiência. Em tal fase, como em todas as outras, é preferível que avancemos de maneira lenta e gradual, mas sempre obtendo resultados melhores, a excelentes resultados

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iniciais e tropeços posteriores. O ideal é que esta fase venha a se iniciar após o cão já estar bem iniciado na etapa anterior, descrita em “085 – Estímulos Paralelos sobre os Drives de Rapina e de Defesa – Parte I”. Pode acontecer, no entanto, que o cão, em virtude de algum problema, não venha a obter nenhum resultado positivo na primeira etapa. Neste caso, deveremos esperar até que o animal venha a completar, no mínimo, quatro meses de idade e poderemos iniciar esta segunda etapa. Nesta etapa, o cão deve já ter um amadurecimento que lhe permita diferenciar as pessoas em duas categorias: pessoas conhecidas e pessoas estranhas. Se quisermos o cão como guardião, o estranho para ele deve ser sempre um inimigo; se o quisermos como protetor, as pessoas estranhas não devem ser encaradas desta maneira. Mas, mesmo assim, devem ser bem diferenciadas das pessoas da família. Quando dividimos didaticamente os cães de guarda em grupos tínhamos como um dos objetivos orientar os adestradores e proprietários em relação ao tipo de adestramento que devem seguir. Muitas vezes, simplesmente mandamos adestrar um cão para guarda deixando toda a decisão a critério do treinador sem informar a ele o que queremos de nosso cão nem das nossas necessidades e projeções em relação a este assunto. Muitos adestradores não concordam em treinar cães de maneira diferente ao arquétipo por eles idealizado, sem a menor preocupação no que tange aos anseios de seus proprietários. Isto acontece, muitas vezes, por falta de conhecimento e prática no assunto de uma maneira mais ampla, pois alguns adestradores, por vezes, seguem apenas a maneira como aprenderam trabalhar, sem procurarem encontrar maior profundidade no que fazem. Outras vezes, pode ser devido a um idealismo bitolado combinado com uma falta de respeito à figura do proprietário. No entanto, louvamos casos em que o adestrador se recuse a treinar um cão de certa maneira, pois, conforme as necessidades, condições psicológicas e materiais do dono do animal, não encontrar sentido, mas perigo para terceiros, para o cão e mesmo para o proprietário e sua família. Continuando, nesta segunda etapa, o ideal é que levemos o animal aos mesmos locais onde realizamos a primeira etapa, além, é claro, da propriedade onde o cão habita. Um excelente lugar para a realizarmos é em veículos estacionados. O interior de um automóvel é um ambiente fechado e bem limitado onde o cão pode conviver momentos agradáveis junto a seus donos. Sentir-se-á seguro e fazendo parte de um grupo e tenderá a não tolerar qualquer intromissão que possa vir a perturbar este estado de coisas. Outra “dica”: à noite, todo treinamento que vise fortalecer drives será muito mais produtivo, pois, em quase todos os carnívoros, a noite melhor estimula quase todos os instintos e sentidos. Da mesma forma, nem mesmo simples treinamentos de obediência devem proceder em horas de muito sol e calor. É, então, chegado o momento de introduzirmos na cena alguém já conosco previamente combinado, que se aproximará do cão de maneira ameaçadora, mas com movimentos lentos e não excessivamente espalhafatosos. Tal aproximação não deve de maneira alguma ser direta e frontal. Esta terceira pessoa, que também pode ser chamada de “cobaia” ou de “figurante” (palavras que não são sinônimos perfeitos – “cobaia” significa alguém despreparado que tenta fazer o trabalho de figurante), deverá se aproximar inicialmente sempre em zig-zags, ou seja, deverá caminhar quase que perpendicularmente à linha imaginária que a une ao cão. Deverá, o figurante, manter os braços semi-erguidos, dedos crispados, andar lento, rosnar baixinho.

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Há um detalhe importante: o olhar. O figurante deverá captar como poderá excitar mais o animal. Ou olhando-o fixamente nos olhos ou evitando fazê-lo ou, ainda, permutando as posturas. Os animais de melhor temperamento tomarão atitudes de revide ao olhar do figurante, enquanto os de temperamento mais fraco ou ainda incipiente ficarão amedrontados. Isso precisa ser captado pelo figurante para saber quando e como fitar cada cão. O confronto de olhar com o animal tende a despertar nele reação, tendo em vista que é desta forma que quase todos mamíferos e aves disputam suas lideranças. O procedimento nesta fase visa estimular o drive de defesa ou o de rapina. Isso variará da forma como o estranho se comportar e do temperamento de cada cão. A defesa deve ser despertada somente a uma distância na qual o cão não se sinta ameaçado, mas apenas afrontado. Uma defesa que cause medo no animal deve ser evitada e está totalmente proibida em qualquer método racional de treinamento. Essa distância deve ser mantida a um mínimo de cinco metros em filhotes que ainda não tenham uma boa rapina e que ainda não ataquem sob a égide deste último drive. Poderá evoluir até dois metros e meio para filhotes que já apresentem uma boa rapina e que já se precipitem para o ataque. A aproximação em zig-zags e não direta tem por objetivo evitar um confronto direto e a dar sensação ao cão de que esteja sendo ameaçado ou acuado, o que poderia lhe levantar em momento indevido e de forma indesejável a defesa ou mesmo provocar reação de medo ou de fuga. A ameaça do figurante indo diretamente sobre o cão é muito mais incisiva do que a dele se aproximar em zig-zags, por isso, a aproximação direta deve ser evitada nessa fase do treinamento. Devemos lembrar, como foi dito anteriormente, que a defesa não deve ser nunca estimulada prematuramente em excesso, pois isso poderá trazer conflitos e insegurança ao animal. O quanto se deve levantar também a defesa, além da rapina, dependerá do que se quer futuramente do animal. Mas, é certo que, independe do objetivo final, forçar em demasia o estímulo para defesa é contraproducente e levará provavelmente a resultados indesejáveis. A defesa sempre deve ser estimulada de forma moderadamente incisiva somente após o cão já haver obtido sucesso em seus ataques, isto é, após haver mordido e mantido pegada com firmeza em algum tipo de acessório. Uma exceção seria em nível de afronta, quase sempre incipiente e até ausente em filhotes – mesmo assim, pode-se tentá-la a uma distância recomendada. Portanto, o drive de defesa só deve ser estimulado nessa etapa de forma muito sutil e prudente, independentemente da reação do cão a tal estímulo. Outra exceção seria o processo de triangularização da defesa já comentado anteriormente e descrito no item “121 – Como Desenvolver o Potencial de Proteção”. Portanto, o drive de defesa só deve ser estimulado nessa etapa de forma muito sutil e prudente, independentemente da reação do cão a tal estímulo. Ou seja, mesmo em filhotes que demonstrem uma boa defesa, os estímulos dados pelo figurante devem ser moderados. Como foi dito em "034 - Precocidade, uma Faca de Dois Gumes", os melhores cães, mas também muitos cães inseguros - que descarregam catecolaminas em demasia, tenderão a ter reação mais enfática. Mas, a reação do filhote não deve influir muito no nosso trabalho que, nesse sentido, excepcionalmente, não deve ser muito interativo. Isto porque o que pode prejudicar o cão, ainda não preparado para isso, é a própria provocação em si. A reação que o cão tiver já é parte da genética do cão ou fruto de experiências que, de alguma forma, já influíram em seu temperamento ou caráter. Em outras palavras, não se deve estimular prematuramente e em excesso a defesa de um filhote, deve-se dar um estímulo muito leve que não tenha potencial de trauma e para por aí, quase que de forma independente da reação a esse estímulo.

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Pois bem, o levantamento da defesa deve se limitar a provocações como fixar o olhar no olhar do cão, dedos crispados e mãos erguidas até, no máximo, a altura do rosto do figurante. Quanto ao levantamento para caça não existem limites para seus estímulos. O figurante caricaturará furtivamente o andar como personagem de desenho animado; mimetizará estar manco (os carnívoros sentem-se mais seguros em atacar presas feridas); forçará o som de sua respiração; irá, no máximo, até uns dois metros e meio de onde está o cão o olhará nos olhos e correrá, como se dele tivesse medo; etc. Apenas isso ou recursos equivalentes. Nada de ameaçar com varas, bater pé no chão, etc. No entanto, é imprescindível que venhamos a permitir que o ainda inseguro filhote, após ter tal instinto despertado, venha a se sentir vitorioso. Para tanto, deverá o figurante demonstrar para ele certo medo e recuar um pouco cada vez que tome qualquer atitude ativa. Nesta etapa não deve, o figurante, levar nada em suas mãos. A distância inicial deverá ser de uns dez metros e irá, aos poucos, diminuindo até se chegar a um mínimo de dois metros e meio. Em alguns cães, essa distância não deverá ser menor do que cinco metros. Caso o cão esteja em situação de se sentir mais protegido, como que dentro de um veículo parado ou atrás de uma grade, tal distância pode ser reduzida para até um metro. O figurante, após evoluir em zig-zags aproximando-se do cão, deverá novamente, aos poucos, ir recuando até voltar à posição inicial, aí sim, em linha reta. O momento mais propício para se iniciar o recuo será aquele em que o cão demonstre maior intenção de atacar. Tal procedimento deverá ser repetido por mais três ou quatro vezes, no máximo por treino. Pode, tudo isto, parecer um pouco cinematográfico, mas é eficiente. Treinamentos longos, principalmente nestas primeiras fases e em animais muito jovens, cansarão, desinteressarão e, até, amedrontarão o animal. Portanto, tal tipo de provocação deve se limitar a pouquíssimos minutos. Um fator, aparentemente estranho, é que donos muito preocupados que seus animais fiquem com o temperamento forte, normalmente têm maior dificuldade de conseguirem seus objetivos do que aqueles mais tranqüilos nesse aspecto. De alguma forma, talvez, o animal capte a tensão negativa e a preocupação do dono, o que acabará por o deixar tenso e, até, medroso. Portanto, embora devamos ser persistentes em nossos objetivos, não devemos ter exageradas preocupações relativas a possíveis insucessos futuros de nossos cães. Isso, via de regra, traz efeito paradoxal e oposto. Durante todo o treinamento, tanto de obediência como de levantamento de drives, é incrível como a imagem projetada em nossas mentes irá influir na reação do cão. Se quisermos que um cão, que pela primeira vez venha a receber o comando de se sentar, se sente, devemos já o imaginar sentado no exato momento em que damos a ele tal comando. Isto pode não funcionar como mágica, mas irá facilitar para que o cão tenda a entender mais rapidamente o que queremos. Da mesma forma, se queremos que o cão reaja à provocação deveremos imaginá-lo reagindo no momento exato que deverá fazê-lo, mas não pensarmos nisso antes da hora precisa. Não realizamos qualquer experimento científico para comprovar tal tese (nem tratamos como tese, mas como experiência e fato), mas encontramos substancial respaldo na prática e em diversos campos da moderna psicologia, os quais não cabem aqui explanar. O essencial, no entanto, é que a prática demonstrou isso inúmeras vezes. Cobaia ou Figurante? Chamamos de "cobaia" a pessoa de pouco conhecimento teórico que pode vir a auxiliar o adestrador quando do treinamento de ataque. Figurante seria um indivíduo bem

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mais instruído na arte da provocação e na psicologia canina, nos princípios de estímulo aos respectivos drives de defesa e de caça. Um bom figurante dispensa a figura do adestrador, quando do treinamento exclusivo de ataque. Um cobaia, não. Jamais se prescinde da presença do adestrador quando a pessoa que fizer a figuração não tiver sólidos conhecimentos sobre o assunto e o animal ainda não tiver seu treinamento concluído. Dono inexperiente + cão com treinamento em evolução + cobaia = "Cacaca" 087 - CONVIVÊNCIA ENTRE CÃES DE GUARDA: Cães, e isso inclui lobos, são animais sociais. Sua eficácia depende em grande parte desse fator. No mundo selvagem, vemos dingos australianos, lobos, cães africanos e asiáticos serem o topo da cadeia alimentar de seus habitat. Isso, no entanto, só se deve às táticas de trabalho em grupo. Canídeos têm seu poder exponencializado quando estão em grupo. Sozinhos teriam dificuldades de caçar e falta de condições para enfrentar grandes felinos, ursos e hienas (estas, no caso dos cães selvagens africanos as enfrentarem – hienas não são canídeos), seus principais rivais. Na guarda, cães que atuem em conjunto são muito mais eficientes. No entanto, cães domésticos, principalmente os de drives mais elevados tendem a não se relacionarem bem com os de sua espécie, principalmente quando o outro exemplar também tem mesmas características de drives mais elevados. Isso se deve em parte a muitas raças terem sido utilizadas em rinhas entre cães e ao fato do homem ter modificado o temperamento dos cães para que fossem usados na proteção e em outras atividades além da caça em matilha. Os fatores principais, porém, são os ciúmes com relação ao dono e um alto drive de dominância. A falta de hierarquia entre os companheiros ou a frágil hierarquia existente acaba resultando em lutas pela dominância, ou melhor, pela vice-liderança (já que o dono assume a posição de indivíduo alfa) na matilha. Canídeos selvagens foram selecionados pela habilidade e aceitação de conviverem em grupo, já que têm maiores chances de sobrevivência no meio ambiente aqueles que convivem em grupos. O mesmo não ocorreu com cães domésticos. Pelo contrário, via de regra, as famílias humanas não necessitavam nem estavam dispostas a manter vários cães. Antes dos humanos se manterem atrás de grades e muros, muitas vezes, os cães que eram mantidos pelas famílias eram aqueles que espantavam para longe seus rivais. Agindo assim, talvez sem conhecimento disso, recebiam mais sobras de alimentos recebidas dos humanos. Então, ao contrário dos lobos, os cães não foram selecionados pela união grupal. Pelo contrário, existem razões para crer que até isso tenha ocorrido em sentido inverso. Mas, é claro que é bem mais eficiente mantermos cães em matilhas para a guarda, bem como cães aprendem melhor a desenvolverem drives de rapina estando em matilhas, na medida em que um incentiva os outros, além de ganharem maior confiança estando em grupo. Diria que se o potencial de um cão é cem, de dois será quinhentos, de três será mil. Desde que, é claro, ataquem unidos e em grupo. Do contrário, ao invés de multiplicar, iremos dividir.

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088 - MATILHA, CONVIVÊNCIA E LEVANTAMENTO DE DRIVES: Filhotes e fêmeas, criados em grandes ambientes cercados junto com um macho ou mesmo mais machos de boa índole, valentes e gentis com sua matilha, tendem a serem adultos mais valentes, menos dispostos a lutas com outros cães, mais dispostos para exercer guarda com maiores e mais bem direcionados drives de rapina e defesa. A matilha dá segurança a seus membros e é fator de agregação entre eles. Cães criados em matilha têm melhor relacionamento com outros cães, muito embora quando em matilha possam se tornar muito mais perigosos com cães estranhos. Fêmeas com dificuldades de aceitar passivamente a dominância da fêmea alfa ou do macho devem ser afastadas da matilha ou ter sua própria matilha caso isso seja possível por haver espaço reservado para tanto ou serem criadas em separado ou com um macho, caso ela aceite a dominância deste. Fêmea alfa demasiadamente dominante ou cruel com as demais fêmeas ou com os filhotes deve ter o mesmo destino. O mesmo deve acontecer com a fêmea beta que, embora respeitando a alfa, seja por demais agressiva com as demais fêmeas ou filhotes. Jovens machos que chegam à idade de desafiar o macho alfa devem ser afastados à primeira reação à dominância violenta deste. Macho alfa demais agressivo com jovens machos, com filhotes ou com fêmeas deve ser substituído por outro de melhor índole. Machos submissos podem fazer parte da matilha, desde que o macho alfa os tolere. Macho alfa que não tolere machos submissos e persista em atacá-los sem razão, também deve ser afastado. A reprodução não deve privilegiar animais que precisam ser afastados da matilha, bem como os que não demonstram bons drives de rapina e de defesa. A reprodução deve privilegiar sempre o macho beta e não o alfa. O beta quase sempre é o que primeiro ataca, tem maior tendência que o alfa de dar o alarme. Selecionando uma raça ou uma linhagem focados nos cães beta teremos muito maior chances de termos filhotes que convivam em matilha, muito superiores para guarda e muito menos passíveis de lamentáveis acidentes em brigas de cães e, provavelmente, melhores cães de guarda. Um erro cometido durante anos pela humanidade foi focar a criação em cima dos alfas por achá-los superiores. Qualquer possibilidade de briga séria deve ser vigiada. Caso todas as pessoas com condições de separar uma briga violenta tenham que se afastar da propriedade, é recomendável que sejam separados anteriormente, ainda que de modo provisório, todos os indivíduos com maiores chances de briga. Brigas por dominância são, até certo ponto, normais, mas merecem nossa vigilância. Interferir numa briga por dominância, normal na espécie canina - que inclui cães e lobos, pode ser procedimento totalmente errado e prolongar para sempre uma inimizade entre dois animais. Machos e fêmeas entre si, no ambiente selvagem, tendem a encontrar naturalmente seus líderes pela capacidade de luta ou de intimidação dos demais ou, ainda, pela capacidade de congregar amizades que os defendam. São os chamados alfas. A separação de uma luta pela disputa da liderança impedirá que esta dominância se estabeleça no momento adequado e provavelmente será prenúncio de outra luta bem pior pouco tempo após. Enquanto a dominância não se estabelecer, é provável que as lutas não tenham fim. Em alguns casos, o fim só ocorrerá com a morte de um dos cães ou até dos dois em virtude dos ferimentos sofridos. Em outros, ela ocorre e os cães poderão conviver em matilha. Por isso, devemos ficar atentos. Existem até fêmeas que nunca se deixarão submeter mesmo pelo

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macho e estarão dispostas a lutar até a morte ou até terem ferimentos graves e, por vezes, seqüelas incapacitantes. Há também a possibilidade que muitos ataquem a um só com conseqüências graves para o atacado. No caso de percebemos que a briga está indo além do esperado, deveremos imediatamente intervir e separar definitivamente da matilha um dos envolvidos. Incorporar cães adultos à matilha ou mesmo filhotes de mesma idade e sexo não é recomendado. Onde há equilíbrio de condições físicas e de dominância, haverá luta longa e violenta. No entanto, animais mais fortes, muitas vezes, se submetem moralmente a outros mais fracos e mais velhos, pois se socializaram dessa forma desde filhotes. Há exceções louváveis de machos de mesma ninhada que, criados juntos, sempre foram companheiros e nunca brigaram. Esses cães, caso tenham bons drives de proteção, devem ser escolhidos sobre todos os demais, mesmo que os últimos tenham muito melhores qualidades físicas. Não devemos nos esquecer que lobos são animais mais sociáveis entre si do que cães, pois estes últimos foram selecionados, por vezes, pelo homem a terem maior agressividade com os da sua própria espécie. Isso aconteceu, no decorrer dos milênios, por serem muitas vezes criados e mantidos separados dos outros cães sem ter a seleção adequada para serem animais submissos a uma liderança dentro do próprio grupo, vital para sobrevivência da espécie no ambiente selvagem, pois é ela que mantém os grupos unidos e viáveis. Não bastasse isso, o homem, ao longo desses milênios, chegou ao absurdo de selecionar cães que lutassem até a morte contra os da sua própria espécie. Por isso, uma briga entre cães é bem mais provável e preocupante do que uma briga entre lobos. Além disso, lobos vivem em ambientes abertos, onde é mais fácil ao vencido fugir após a luta. Cães de guarda vivem confinados em propriedades cercadas e só restará ao mais fraco contar com a piedade do vencedor, por vezes também ferido e raivoso, o que nem sempre ocorre. Por todas essas razões, deveremos estar sempre preparados para separar brigas antes que aconteça o pior. Enquanto no lobo, a união é condição de sobrevivência, no cão mais um indivíduo no amparo de um mesmo dono pode representar menos comida para todos. Talvez os cães que espantem novos indivíduos caninos nos grupos familiares humanos tenham se saído melhor na luta pela sobrevivência. Para criar uma matilha para guarda, a condição ideal é que a matilha fique em posição de avistar à moderada distância movimento esporádico de pessoas estranhas, mas sem chance de que estranhos cheguem muito perto, senão para instigar o drive de defesa e o de caça. Via de regra, se o estranho se aproximar demais, o macho alfa ou a fêmea alfa têm a tendência de, na impossibilidade de atacar o estranho, atacar os outros cães que se aproximam da tela de arame ou da grade que obstaculiza o ataque ao estranho. Isso pode inibir a caça dos filhotes e dos demais membros, além de colocá-los sob risco de serem machucados. Portanto, uma distância mínima de uns três metros deve ser preservada, caso notemos tal tipo de comportamento. Falamos em cães presos e de estranhos protegidos por grades. Cães soltos, tendem a atacar em grupo se tiverem qualidade. Várias vezes, vimos cães totalmente traumatizados ou inviáveis para guarda terem seus drives rapidamente recuperados após convivência e treinamento em matilha. Há canis especializados em recuperar o caráter de cães de guarda usando exatamente desse recurso. O treinamento em matilha e o ataque em dupla ao bite são fatores positivos para integração e

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melhora da segurança e levantamento do drive de rapina. Engana-se quem imagina que as alcatéias mantêm-se apenas por amizade, amor ou simpatia. Assim como a maioria dos grupos humanos estáveis, elas se mantêm pela necessidade. Incitar a matilha contra elemento estranho e ameaçador pode ser fator de união, pois provavelmente agirá sobre os mecanismos psicológicos que interagem com os fatores de sobrevivência do indivíduo e da espécie. Portanto, recomendamos o treinamento em matilha contra inimigo humano comum como fator de sua integração, se a função dos cães for a de guarda efetiva. 089 - MATILHA, TREINAMENTO E LEVANTAMENTO DE DRIVES: Além de provocações a certa distância, conforme definido no tópico anterior, outros treinamentos podem ser realizados em matilha. O ataque ao bite em dupla não é exatamente um treinamento em matilha, mas é excelente subsídio para futuros ataques efetivos em matilha. Será discutido em tópico separado, "Ataque em Dupla". É uma atividade muito gratificante para os cães e para quem os treina, pois é bonito ver os animais se unirem para realização de um trabalho que, além de tudo, fortifica os laços entre os membros do grupo canino. Ataque com mais de dois cães ao figurante, mesmo com bite, é por demais perigoso para integridade física deste. Ainda que possível de fazer com três cães, desde que com uso de capacete e polainas protetoras, não recomendamos. Aviso: não se iludam aqueles que pensam que um coturno pode proteger razoavelmente pés e tornozelos. Já vimos cães de guarda furarem com seus caninos com muita facilidade o couro destes calçados. Um cão treinado tendo a guarda efetiva como base e com bons imprintings formatados de mordida tenderá a ter ataque muito mais eficaz e mordidas muito mais penetrantes e dilacerantes. Um treinamento interessante é prendermos toda a matilha e procedermos como em "Faro Alto - Treinamento", com comandos próprios, para que a matilha localize o invasor de seu território que, obviamente, deverá estar em local inalcançável, como em cima de uma árvore, e, preferencialmente, sem bite. De cima da árvore, após ser encontrado, o figurante deverá provocar os cães, deixar pendente uma lingüiça para que os cães a mordam e se pendurem. A lingüiça pode ser presa a uma corda amarrada a um galho e ser movimentada pelo figurante e ser presa por um laço que seja fácil de ser solto pelo figurante. Deve ser longa tal tipo de lingüiça, e devem ser várias para que o figurante a troque. O dono do cão terá que chegar a cena após o início do treinamento para repor os apetrechos arrancados da mão do figurante. Há que ter cuidado com o tipo de árvore a ser escolhida. Alguns cães sobem em algumas árvores com extrema facilidade. Esse treinamento não deve ser praticado por cães que ainda não tenham absorvido bem o imprinting de trocar a falsa-caça pela caça verdadeira, pois poderá reforçar o indesejável condicionamento de se fixar na falsa-caça. Tal tipo de trabalho é bom por vários aspectos. Canaliza a tensão emocional dos cães para um inimigo que não pertença à matilha. Cria união e cooperação entre seus membros. Permite que o líder mostre sua liderança sem precisar usar a força ou a intimidação contra os outros membros. Estimula enormemente o drive de rapina em todos os cães. Levanta o moral dos cães mais submissos ou com drives mais baixos. Prepara os cães para agirem em conjunto em uma situação

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real. Desvantagens? Nenhuma. Vide complemento deste tópico em "Recuperação de Cães para Guarda Considerados Fracos ou Perdidos". Importantíssimo. 090 - OLHOS NO OLHOS - O OLHAR E O LEVANTAMENTO DA DEFESA: Este é um treinamento de defesa que pouco ou nada irá influenciar negativamente a personalidade de um cão de guarda nem deverá causar-lhe conflitos. Consiste simplesmente no figurante olhar o cão nos olhos de forma provocativa, sem se mover, apenas encarar o cão. É um tanto difícil descrever isso, mas procurem se lembrar do olhar que alguns lutadores olham para seu oponente antes do início das lutas. Outro exemplo idêntico é o olhar como os cães olham para outros cães quando desejam lutar ou desafiá-los. Este olhar indica provocação em nível animal. De animal para animal. Um cão que tema pessoas, talvez por traumas passados, poderá despertar com fúria total contra a pessoa que lhe faz figuração, movido apenas pelo desafio em nível animal. Podemos atestar que tal técnica já mostrou sucesso por inúmeras vezes. O figurante devera continuar olhando fixo o animal mesmo após este se enfurecer. O condutor deve manter a guia tensa e jamais usar enforcador não travado. Após alguns segundos, o figurante deverá simular fuga, após o condutor permitir que o cão vá um pouco à frente. Isso pode ser repetido por algumas poucas vezes consecutivas em um tempo total de uns dez minutos com intervalos para descanso. Como o tópico “Levantamento Inicial de Defesa para Cães que Demonstram ou Não Rapina”, tal tática pode ser usada para levantar defesa tanto em animais com drive de rapina já elevado ou não. Não existe melhor maneira de levantar diretamente a defesa (sem ser através da rapina e da luta). Isso porque olhar nos olhos significa desafio, afronta, e a afronta age diretamente sobre a defesa resoluta, que não está associada ao medo, como as demais formas de atingir a defesa sem ser através da rapina. Esse pode ser um instrumento precioso para instigar cães que não demonstrem bom drive de rapina. 091 - LEVANTAMENTO INICIAL DE DEFESA PARA CÃES QUE DEMONSTRAM OU NÃO RAPINA: Para animais que demonstrem rapina, mas nos quais se quer aguçar a defesa, principalmente para aqueles que deverão ser guardiões, o ideal é que esta etapa seja iniciada quando o animal já reagir bem ao descrito em “Olho no Olho – o Olhar e o Levantamento da Defesa”. De qualquer modo, o preconizado neste tópico em princípio não deve ser realizado em cão com menos de sete meses. No entanto, existem casos de animais, mais ou menos, alienados e que poderão não responder de forma satisfatória a nenhuma das etapas iniciais. Neste caso, esperaremos até os sete meses para entrar diretamente nesta etapa. A esta altura, o leitor se perguntará: Se as etapas anteriores podem não funcionar e, nesse caso, devemos entrar diretamente nesta etapa, por que não dispensar as anteriores?

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A resposta é que as chances de que este treinamento seja bem-sucedido são bem menores do que as chances com os treinamentos anteriores. Mas, paradoxalmente, pode ser este o único caminho, o que irá depender das peculiaridades de cada cão, isto é, do temperamento de cada cão. Em outras palavras, dos drives iniciais apresentados de defesa e de rapina. Um cão com bom drive inicial de rapina, por exemplo, pode ter tal drive inibido se iniciarmos o treinamento com provocações de levante para o drive de defesa. Em contrapartida, um cão com drive inicial de rapina baixo pode ter nas provocações que lhe elevem o drive defesa como a única forma de iniciá-lo ao ataque. O treinamento deve interagir com a personalidade de cada cão. O treinamento deste tópico mal-sucedido é fator que pode inibir o sucesso – sucesso que poderia ser fácil - nos treinamentos anteriores. Como já dito anteriormente, a resposta de defesa ao estímulo específico inibe o drive de rapina, pelo menos momentaneamente. Mas pode inibir muito além de tal momento, caso o estímulo gerado com a intenção de levantar a defesa seja traumatizante. E o que é traumatizante para um cão e até que ponto - ainda mais para um filhote, é algo que nunca iremos saber por completo. Portanto, o melhor é não corrermos riscos desnecessários. Cães submetidos às etapas anteriores têm muito melhor resposta nesta fase do que aqueles que são submetidos diretamente a ela. Isso porque um animal cuja personalidade foi reforçada com estímulos positivos tenderá a reagir sem medo às provocações desta fase. Como também já foi dito: a rapina está associada a fatores positivos, como a auto-estima e o sentimento de superioridade, enquanto que a defesa pode estar associada ao medo. Mas não é o caso da defesa resoluta, sobre a qual adicionaremos o verbete oriundo do Dicionário de Cinologia e de Termos Correlatos. Além disso, os ensinamentos e instintos despertados nas etapas anteriores, ocorridos em idade mais jovem, irão se fixar mais à personalidade dos cães, tornando-os melhores cães de guarda. Portanto, só na impossibilidade de levantarmos o ataque nas etapas anteriores, através do drive de rapina e na técnica descrita em “Olho no Olho”, é que devemos fazê-lo diretamente nesta fase. A etapa descrita neste tópico pode ser realizada em qualquer cão. Mas, sem dúvida, muito mais cuidado deveremos ter com animais que não demonstraram resultados satisfatórios nos treinamentos que visavam levantar o drive de rapina. O pior é que são exatamente esses que necessitam no descrito neste item. Há que considerar também que o fato de aparentemente não vislumbrarmos resultados visíveis nas fases anteriores, não significa que o trabalho realizado não tenha provocado resultados que só se evidenciarão posteriormente e isso pode ser nesta fase. O treinamento descrito em "Estímulos Paralelos sobre os Drives de Rapina e de Defesa (Parte I e Parte II)” irá se arraigar mais profundamente na personalidade do animal com pouquíssimas possibilidades de gerar qualquer tipo de trauma. Na verdade, nas duas etapas ora citadas, estimulamos os instintos inatos de guarda do animal que começarão a serem postos em prática nesta. O disposto neste item pode ser iniciado em período bem anterior, se levarmos em conta a rapidez da evolução de cada filhote. Caso não tenhamos passado, e com sucesso, nas fases anteriores, significa que esta fase irá atuar mais como um estímulo baseado na irritação e no medo

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que no instinto natural, o que é muito menos recomendável, para um cão de guarda. O fato, o de não conseguirmos sucesso nas etapas anteriores e só nesta fase, também não significa obrigatoriamente que venhamos a ter um “cão treinado pelo medo”, o que sempre condenamos. Podemos utilizar a irritação como último recurso para despertar o cão para que ataque e, posteriormente, voltamos às fases descritas em "Linguiça. Cão que não se Interessa por Ela" e mesmo para os tópicos "Estímulos Paralelos sobre os Drives de Rapina e de Defesa (Parte I e Parte II)" e deixar aflorar os instintos sufocados que só foram despertados após o animal ser suficientemente provocado. Em outras palavras, caso consigamos sucesso nesta etapa, devemos tentar retornar às etapas onde anteriormente não conseguimos sucesso. Sempre que for possível, tentar levar o treinamento pelo lado da rapina para depois retornar a esta fase. Antes de mergulharmos cegos nesta etapa, é conveniente usá-la apenas para fazer provocações leves, sem alto teor de ameaça e pouca ênfase por parte do figurante em ameaçar o animal. Só iremos acentuar o descrito nesta fase caso o cão esteja reagindo muito positivamente em relação aos estímulos aplicados. Caso isso não ocorra, deveremos esperar nosso cão amadurecer mais em sua idade. E repetir tão somente as tentativas iniciais, em intervalos de mais ou menos de um a dois meses. Mesmo para cães adultos em recuperação de personalidade, deve-se dar um tempo para que se tornem seguros. Como veremos em tópico posterior, "Recuperação de Cães para Guarda, Considerados Fracos ou Perdidos". Local tranqüilo e confortável, passeios, situações e atividades desestressantes, demonstrações de confiança e amizade de nossa parte são fatores importantíssimos para aumentarem as possibilidades de se obter melhores resultados. Neste treinamento, começaremos, aos poucos, a tornar concreta a ameaça do figurante. Precisamos alguém realmente experiente para entrar nesta fase, pois uma avaliação mal feita da capacidade do animal, ainda em formação, em reagir pode fazer com que se prejudique todo o treinamento anterior e, o que é muito pior, que venha a trazer traumas nunca totalmente superáveis nos cães. O correto é que nunca venhamos a ter qualquer insucesso em todo o treinamento no que se refere ao temperamento. Portanto, é sempre preferível que o façamos de maneira gradual e muito prudente. Outra razão para que se exija um figurante experiente é que pessoas inexperientes poderão facilitar e acabar por se ferirem, pois podem menosprezar a capacidade dos cães. Um bom e experiente figurante também deverá ser seguro o suficiente para demonstrar ao cão que dele sente medo, um medo que, na verdade, não deverá ter. É chegado o momento do figurante, ainda sem nada nas mãos, se aproxime do cão a uma distância que permitiria que lhe aplicasse algum golpe se estivesse munido de alguma vara, por exemplo, mas sem o estar. A maneira de aproximação em zig-zags deve ser mantida. O figurante ameaçará o animal com golpes simulados, por alguns segundos, e simulará uma fuga. Os rosnados emitidos baixinho pelo figurante na primeira etapa deverão, agora, ser já em tom bem mais alto. Deverá repetir este procedimento por umas três ou quatro vezes, no máximo, sempre tomando o cuidado de recuar preferivelmente quando o cão reagir mais fortemente. Isto estimulará o cão para que venha proceder desta forma, uma vez que perceberá que seu ataque assusta seu adversário.

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A técnica descrita em "Olho no Olho - O Olhar e o Levantamento da Defesa" deve-se ser tentada antes desta e poderá acompanhá-la. Paradoxalmente, caso não surta efeito, deve o figurante evitar olhar desafiadoramente o animal. Poderá tentar, ora encarando, ora não encarando, mas sem perder a calma até encontrar qual a melhor técnica para cada cão em particular. Algo que ajudará a encorajar o animal, é que o figurante finja bater no seu dono, pois o estimulará a desenvolver o instinto de proteção grupal. Caso, o cão reaja positivamente a este estímulo, seu dono deverá o acarinhar e elogiar muito, mostrando todo seu agradecimento. A agressão concomitante ao cão e a seu dono pelo figurante é uma das melhores formas de estimular o animal e associar que cão e dono devem se proteger mutuamente. Uma outra dica: o dono e o animal, antes da realização da provocação, podem permanecer juntos, quietos, de preferência com o dono sentado em um ambiente de perfeita paz, a qual o figurante irá violar e, com isso, causar a irritação do animal ao agredir com provocações, ainda que sutis, o espaço íntimo e de agradável convívio entre cão e dono. As mãos do dono contendo o cão e o abraçando, é precioso fator de segurança ao animal. Lembrem das velhinhas de muito antigamente segurando seus ferozes pequineses. Se o animal, ainda assim, não esboçar uma reação satisfatória, teremos que nos deter em duas hipóteses: a primeira seria do cão demonstrar medo. Neste caso, deveremos procurar encontrar os motivos pelos quais o cão teme a aproximação ameaçadora de seres humanos. Se for devido a más condutas de pessoas envolvidas com o animal, como repreensões exageradas, castigos, etc., deveremos procurar sanar tal erro. Se estivermos certos que não é este o motivo, significa que o cão em sua mais tenra idade sofreu traumas ou que geneticamente seu temperamento não é o ideal para tarefa de guarda. Em todo o reino animal, principalmente, no caso dos animais que convivem em grupo, haverá alguns com mais e outros com menos coragem. Sua existência é necessária, pois normalmente são eles que dão o primeiro alarme de alerta. São eles, também, que permitirão a sobrevivência da espécie caso ela se defronte com um adversário que não possa ser vencido. A segunda seria de o cão demonstrar alienação. Neste caso, nossa tarefa ainda é mais difícil, e a única alternativa viável, tanto para um, como para outro tipo de reação, é darmos ao cão um bom tempo em ambiente calmo sem ser sujeito a stress. De preferência, na presença de outros indivíduos de sua espécie tranqüilos com outros cães, mas que demonstrem instinto de guarda com pessoas. Outro fator importante é o da matilha poder vislumbrar pessoas estranhas e se mostrar irada ou com elevação da rapina quanto na sua presença. Um cão que obtenha sucesso no treinamento descrito neste tópico ou no tópico a seguir e não nos treinamentos dos tópicos anteriores deve ser um animal com baixos drives atuais de proteção quando do início do treinamento. No entanto, pode obter sucesso se tiver melhores drives latentes. Tudo depende da genética, dos traumas sofridos, da idade do animal e da competência do adestrador. O importante é, em caso de ser impossível conseguir reverter o quadro, é ter a dignidade de entender que, mesmo não sendo um guarda, nosso amigo pode ser um excelente companheiro e não deve ser maltratado por isso. Não é uma escolha do cão não ter capacidade de ser um cão de guarda, mas simplesmente uma incapacidade, como nós temos tantas para tantas outras coisas. Devemos tratá-lo bem e dar-lhe o melhor que pudermos, tendo apenas o cuidado de afastá-lo da reprodução.

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“DEFESA RESOLUTA – Tal termo foi introduzido na cinofilia para desfazer enorme confusão até então vigente entre alto drive de defesa e a situação em que a defesa atua na pré-fuga. Muitos "teóricos" em cinologia diziam que as demonstrações de defesa significam uma situação que sempre antecede à fuga. Mas, como poderemos dizer que, em um exemplo animal, uma leoa que ataca um chacal que tentasse lhe roubar um filhote estaria em pré-fuga? Está, sim, em alto drive de defesa, determinada a lutar até a morte. O mesmo acontece com um cão que ataca valentemente para defender seu dono. Daí, a necessidade de discernir entre a defesa propriamente dita e a pré-fuga. Sinais gerais de defesa são: pêlos eriçados e pupilas dilatadas. Já quando a estes sinais se somam rosnados, latidos mais graves do que de costume e cauda baixa, há forte possibilidade de que o cão esteja em Pré-fuga. Sinais de Defesa Resoluta são iguais aos da Luta. A Defesa Resoluta muitas vezes é estimulada pela Afronta e está, em muitos casos, a ela associada.” 092 - LEVANTAMENTO INICIAL DE DEFESA PARA CÃES QUE DEMONSTRAM, OU NÃO, RAPINA - PARTE II: Esta etapa, ainda mais delicada que a precedente - quando se trata de cão com baixa rapina, requer do adestrador e, principalmente, do figurante, todo o cuidado e sensibilidade. Deverá ser realizada somente após se obter sucesso na etapa anterior. Nesta etapa, deveremos ter cuidados no sentido que um erro na medida do que realizamos para estimular o cão pode ser altamente danoso para seu temperamento presente e futuro. Uma fina vara ou bastão de schutzhund deverão ser portados pelo figurante com a única função de provocar e acostumar o cão à sua presença e jamais de testá-lo. Começaremos batendo, sem muita violência, com a vara no chão e nunca no animal. Devemos observar que o figurante não deverá permitir que o cão se fixe na vara e sim na sua pessoa. Para tanto, deverá gesticular com a outra mão ao mesmo tempo em que mantém a vara não muito exposta ao olhar do animal. Uma das falhas mais freqüentes de muitos figurantes consiste em permitir que o animal se concentre na vara ao invés de atraí-lo para seu corpo. Melhor ainda, se ao invés de chamar atenção para sua outra mão, o figurante a chamar para sua perna esquerda. Nesta etapa, as ameaças do figurante se tornarão aos poucos mais consistentes, pois ele trará na mão a vara. Um, ou outro toque no animal deverão ser muito levemente aplicados preferencialmente nas patas anteriores, tomando-se sempre o cuidado de observar sua reação após cada toque. Se a reação for negativa, isto é, se o cão, de alguma forma, se assustar com eles, teremos, então, o momento mais difícil de todo o nosso trabalho. Grande parte dos cuidados que tivemos nas etapas anteriores visava evitar que isto acontecesse. Provavelmente, isso não ocorrerá caso o cão tenha reagido bem no descrito no tópico anterior e, no caso de já haver o drive de rapina levantado, o fracasso será praticamente impossível. O que temos que levar em conta agora é o seguinte: uma batidinha um pouquinho mais forte que a anterior que o cão não se assustou não o irá assustar muito, e o trauma se acontecer será pequeno. Por isso, que o aumento da pressão com o bastão deve ser lento e gradual. Mesmo assim, se percebermos algum trauma por menor que seja no animal, devemos retroagir um pouco mais à fase anterior, e voltarmos à atual com toques ainda mais brandos, sem insistirmos em nos manter, de maneira alguma, na fase que versa este item. Assim como nós, os cães também têm seus dias, melhores ou piores, influenciados por uma série de fatores. Portanto, muitas vezes, é melhor deixarmos tudo para outro dia, e procurarmos analisarmos o motivo, ou motivos que ocasionaram esta queda na “curva do caráter” e os tentar eliminar. Pode ser por excesso de rigor

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na prática do treinamento de obediência; talvez, alguém da própria casa esteja reprimindo erradamente o animal, etc. Isto porque é difícil que um cão bem sucedido nas etapas anteriores possa se sentir traumatizado com toques realmente leves de uma vara, a não ser que estes toques não sejam assim tão leves. Jamais deveremos permitir que o cão morda a vara, pois em um caso real, em seu lugar não estará um objeto flexível e as presas do animal poderão se quebrar. No caso de nosso animal, até o momento, haver mostrado quase nenhuma, ou nenhuma, reação a todos os artifícios que utilizamos para lhe encorajarmos da maneira que preconizamos, só nos restará a tentativa questionável de colocar o animal em uma posição em que não tenha como escapar e fazer com que o figurante o irrite cutucando-o brandamente com a vara na região perianal ou com puxões próximos à sua virilha. O dono deverá ficar a seu lado estimulando e dando confiança ao cão. Deixamos claro que só nos utilizaremos tais recursos quando os demais se esgotarem, pois somos contrários, em princípio, a esses métodos. Mesmo assim, deveremos ter a perfeita consciência de não sair de uma situação de adestramento para uma de maltrato - altamente condenável tanto técnica, como eticamente. Os puxões e os toques com vara descritos neste parágrafo não devem jamais superar o limite da irritação e alcançar a humilhação, a perversidade, a dor - coisas condenáveis, ineficientes e que desmoralizam o adestrador como profissional e como ser humano, perante o dono do cão, perante a comunidade e perante sua própria consciência. Embora, em tese, como já dissemos, sejamos contrários a tais métodos, não podemos nos prender a radicalismos e não vemos porque não os aplicar quando nada mais funciona. Pode ser que o cão reaja. Nesse caso, deveremos ao máximo, assim que possível, fazê-lo partir para uma perseguição ao figurante, como versa o item “009 - Defesa para Rapina”. Mas, se, após algum tempo (que não deve se limitar a pouquíssimas sessões), não conseguirmos do animal qualquer reação, deveremos ter a consciência de que, se continuarmos, o estaremos torturando inutilmente e nos frustrando. O treinamento de ataque deixará de ter o seu prazer natural e se tornará algo cruel e sem nenhum resultado senão o de traumatizar ainda mais o animal. Devemos, então, ter a nobreza de compreender as falhas do cão, como esperamos que compreendam as nossas, e aceitar que nosso amigo deverá apenas ser um cão de companhia e não o utilizarmos para a reprodução, caso sua raça seja de guarda. O que temos a comentar é que os animais naturalmente valentes dispensarão este último recurso no caso de termos realizado todas etapas anteriores, pois o animal já haverá obtido sucesso anteriormente, principalmente se começarmos na idade ideal. No entanto, cães já adultos, iniciados tardiamente no treinamento, poderão também precisar que cheguemos a tanto ainda que possam não possuir inadequação inata para guarda, podendo, a partir de um dado momento, tornarem-se bons guardiões. É claro que o percentual de nosso sucesso decrescerá nos cães adultos à medida que a idade do animal avança, enquanto cresce à medida que a idade avança em cães jovens. Também decrescerá na medida em que só seja obtido em etapas mais avançadas. Há que haver humildade e honestidade em admitir que não foi possível conseguir o que pretendíamos. E ao mesmo tempo tranquilidade de poder olhar para trás e ter consciência que não erramos. De que apenas não realizamos o que não era possível realizar. A certeza de ter feito tudo da melhor forma, com a melhor intenção, sem precipitação e com honestidade será o escudo da nossa consciência. Outra hipótese a ser observada, é a de o dono ser a razão do temor do animal. Neste caso, o

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adestrador deverá levá-lo para longe da presença do dono, e, se possível, por algum tempo, hospedá-lo sem a visita do proprietário. Observações também deverão ser feitas no sentido de apurar se o dono, de alguma forma, não está sendo demais enérgico com o cão. É muito comum cães de boa genética permanecerem inibidos por, desde filhotes, ralharem com eles cada vez que latem para alguém que para eles é estranho. Muitos donos, por vezes, não se dão conta que um grande amigo ou familiar que não o visita há muito tempo para o cão é um estranho como qualquer outro e ralham com o animal na presença dessa pessoa toda vez que ele late ou demonstra intenção de atacar. Por isso, quando o animal reage assim, devemos prendê-lo e não ralhar com ele ou então socializá-lo (se for o caso de querermos socializar o cão com essa pessoa) de forma positiva. A socialização nunca deve ser feita de forma negativa, isto é, através de broncas. Os rosnados das etapas anteriores dados pelo figurante, aos poucos, deverão ser substituídos por gritos de sonoridade crescente. Deveremos preparar, também, o cão para psicologicamente estar condicionado a ser pressionado com gritos e comandos dados por estranhos sem que com isto se perturbe. A postura corporal do figurante deve, aos poucos, evoluir de temerosa para ameaçadora. Isso acostumará o cão a ser ameaçado e pressionado. Caso o cão ainda não houver sido bem-sucedido em morder a linguiça durante o levantamento do drive de rapina, poderemos iniciar tal procedimento durante o levantamento do drive de defesa. Deveremos permitir que o cão morda a “lingüiça”, a qual o figurante fará alguma resistência enquanto desfere leves toques no animal. Se verificarmos que o cão ataca e morde de maneira relativamente violenta a lingüiça, antes de cada novo ataque devemos pronunciar o comando “PEGA”, com voz firme e alta nas primeiras vezes. Um parêntese aqui pode ser feito: o condutor do cão não deve de maneira alguma ficar dando o comando "PEGA" para um cão que ainda sequer aprendeu a morder, muito menos ficar dando toques patéticos na guia como que puxando o cão na direção do figurante. Isso desconcentrará totalmente o animal sobre o figurante e praticamente pode inviabilizar o ataque. A postura correta de um condutor durante a provocação do cão que conduz deve ser discreta e se limitar a agradar o animal em seus sucessos. O condutor deve olhar mais para o figurante do que para o cão, um leve chiado poderá ser emitido pelo condutor para estimular o levante da defesa do animal. Em cães que precisam ter seu drive de defesa levantado, a postura do condutor com a guia deve ser sempre de manter o cão contido, sentindo-se tolhido. Isso o deixará mais valente, como o fanfarrão que vira valentão depois de ser seguro pelos amigos. Só que no caso do cão, cada investida que ele dá e percebe que o condutor não o repreende nem o inimigo o machuca, irá reduzir o medo e as aflições do animal. No caso do cão começar a reagir, a guia deve ser solta aos poucos para que o cão progrida progressivamente. Soltar repentinamente a guia provavelmente dará um efeito contrário ao desejado, pois o cão poderá perder a coragem no momento que se sentir livre para enfrentar efetivamente o inimigo. A progressão deve ser lenta e gradual até que possamos perceber que o cão realmente quer atacar o inimigo sem demonstrar temor. Como hábito que faz o monge, um cão que ataca sem ser reprimido acaba se tornando realmente valente se soubermos lidar com ele. É chegado, pois, o momento de tentarmos fazer o cão morder linguiças, sempre começando pela mais fina e mais macia. Os atraques à lingüiça não devem passar de um máximo de cinco ou seis por sessão, e nenhum deles ultrapassar a dez segundos com o objeto seguro pelo cão, exceção aos casos de cães inicialmente muito tímidos, e que tal procedimento venha a servir como terapia de segurança. A técnica do figurante correr moderadamente arrastando o cão através da lingüiça deve ser usada e é

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excelente, caso o cão chegue a morder tal acessório. Vide: “Como Aumentar – em Muito – a Caça com o Uso da Lingüiça”. Se o cão fixar bem sua mordida, o figurante, então, soltará a lingüiça e tentará chamar a atenção do cão para si, gesticulando em volta do cão e se movimentando em fuga. Lembrem-se do dito anteriormente que o cão sempre será estimulado pelo que tiver com mais movimento, o que é conhecido como cinetaxia. Só que esse fenômeno deriva-se mais do drive de caça e o drive levantado no momento é o de defesa. Se o cão já tiver anteriormente sua caça levantada, provavelmente não haverá problema. Do contrário, no caso da defesa já estar sendo utilizada como último recurso para o ataque, é provável que o cão se agarre à lingüiça como recurso desesperado de descarregar sua raiva em resposta às provocações que recebe e o cão não queira largar o acessório nem seguir a caça verdadeira, no caso, o figurante. É possível que se o figurante continuar a provocar o cão levemente com a vara, o cão abandone a lingüiça e o persiga. Mas, em cão inseguro e inexperiente em morder apetrechos, é muito mais provável que a provocação do figurante sobre o cão faça com que este, paradoxalmente, se "vingue" ainda mais no objeto e se fixe ainda mais a ele. Mesmo que a provocação possa retirar a atenção do cão do objeto, é muito comum que, numa seqüência de investidas, o cão, após perceber que nunca alcança efetivamente o figurante, resigne-se a morder a lingüiça e tenha nela sua real fixação. Devemos tentar evitar que se chegue a tal ponto. Ver: “Lingüiça, como Usá-la Canalizando o Cão para o Figurante” e “Lingüiça, seu Uso no Fair Game”. Em um animal que já tem um bom imprinting comportamental no comando "SOLTA", seria fácil resolver o problema. Seria só comandar "SOLTA", seguido de "PEGA" focado no figurante. Mas, estamos justamente tratando das dificuldades de treinamento do cão que não teve ou não pôde ter rapina levantada anteriormente e que sequer aprendeu a morder. Deveremos, pois, usar o estímulo passivo deixando a lingüiça morta na boca do cão e nos limitarmos a levantar sua cabeça através da coleira e da guia. Nesse caso, o figurante continuar chamando o cão para si pode ser pouco producente ou até paradoxal caso ele não tenha outra lingüiça nas mãos. Isso porque não sabemos se a falta de impulso de atacar do cão não está amparada na dificuldade de morder pessoas. Por isso devemos sempre insistir com tais equipamentos até termos certeza que ele investirá sobre o figurante propriamente dito. A interrupção da investida como preconizada em "Treinamento com Guia Longa. Parte II" com o uso do comando "JUNTO" só deverá ser feita em animais que já estejam bem evoluídos em suas investidas. Não se deve, por outro lado, esperar que se crie um condicionamento de investir de forma alucinada impermeável ao comando "JUNTO", mas, antes de pensarmos nisso, precisamos que o cão perca seus medos. A sensibilidade do adestrador neste caso é fundamental. Nunca é demais repetir que tal comando não deve ser dado, pelo menos no início do treinamento em cães de baixo drive de rapina, sempre ao final de cada treino, com o cão mais cansado, menos estressado e mais seguro. Em caso de dúvida, é preferível que usemos o ataque do cão à lingüiça inicialmente como forma de aumentar sua segurança. Deixar o comando de “SOLTA” para uma etapa bem posterior, ainda que conscientes que teremos um trabalho maior mais adiante. Devemos, nesta fase, deixar o cão “ganhar” a lingüiça, agradá-lo e nunca desincentivá-lo quanto a atacar e manter preso tal objeto, exceto com o estímulo passivo.

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Uma informação que é bom trazer de volta aqui é que na maioria dos cães que demonstram pouco caráter em raças ou linhagens de cães de temperamento forte, o medo do cão se baseia muito mais no temor de ser reprimido pelo dono ou condutor do que no figurante. Por isso, que quanto mais neutros dono e condutor se comportam durante o levantamento de drive de proteção, melhor. Há casos em que a presença do dono dá segurança ao cão e há casos inversos. Cabe a um bom adestrador perceber qual é o caso de cada cão. Vamos lembrar o que significa cinologicamente “caráter”: CARÁTER – É a parte da estrutura psíquica do cão adquirida na interação com o meio ambiente. É forjado sobre o temperamento e depende do meio ambiente, da educação, do adestramento, enfim, de todas as experiências passadas, positivas e negativas, após o período da infância. 093 - MANGUEIROS: CÃES QUE SE RECUSAM A LARGAR LINGÜIÇAS E MANGAS. CAUSAS: Este tópico só será bem entendido se o leitor ler anteriormente, pelo menos, os seis últimos parágrafos do tópico “Levantamento Inicial de Defesa para Cães que Demonstrem, ou não, Rapina – Parte II”. Como fazer para que o cão largue a lingüiça, manga ou qualquer artefato semelhante? A melhor maneira é a do estímulo passivo da caça-morta, descrita em “Lingüiça, como Deve Ser, como Usar e Direcionar o Cão para Ela”. Mas, este item exatamente existe para tratar de cães que são mais refratários a este método, provavelmente por ter tido imprintings mal formatados ou formatados de forma errônea. Tentaremos, agora, entender também as causas que levam um cão a se tornar mangueiro. A maneira mais fácil é dar ao cão uma moeda de troca: outra lingüiça. Ainda que o cão tenha a rapina baixa, tenderá a preferir a lingüiça que brande na mão do figurante à inerte. A técnica consiste em substituir as lingüiças por outras, sendo comandado o "PEGA" cada vez que nova lingüiça ou nova manga for apresentada ao cão em situação hábil de ataque. Existem duas opções em todo o treino de soltar apetrechos de mordida: atrair o cão para outro equipamento ou atrair o cão para o figurante em si, sempre ou usando o auxílio do estímulo passivo juntamente com realizar a permuta do que não tem movimento pelo que tem movimento, do que está “morto” pelo o que está “vivo”. Trocar uma lingüiça por outra é bem mais fácil e é mais apropriado no caso de cães que encontram resistência em atacar diretamente humanos e esta técnica deve ser usada como alternativa até que se possa realizar a segunda que é bem mais eficiente. Conseguir o foco, após o cão soltar um apetrecho, diretamente sobre o figurante é muito mais efetivo e eficiente, se tratando de um cão de guarda, mas pode ser em alguns casos mais difícil de conseguir. Vamos supor que em um determinado cão a um determinado momento não seja possível conseguir o foco diretamente sobre o figurante. Teremos, então, que partir para o método de troca de apetrechos. Após largar por várias vezes o acessório para investir sobre outro similar, o cão acabará por formar um drive que poderá levá-lo a investir contra o figurante mesmo desprovido de acessório similar. É importantíssimo que o figurante corra e fuja do animal para continuar dando a este caça, isto é, movimentando-se para causar cinetaxia. Erro comum é quando nos utilizamos de

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um cobaia é este ficar parado olhando o cão após o cão abandonar a manga olhando para o cão. O cão, por sua vez, não terá outra alternativa, nesta fase do adestramento, exceto voltar a abocanhar o acessório largado ao chão ou se desestimular por completo para investir, na medida que o condutor tem que conter o cão junto ao equipamento para que ele não morda o cobaia (nessas horas, dá vontade de deixar o cão morder o cobaia). Se dispusermos de recursos, humanos e materiais, o ideal será trabalharmos com dois figurantes e três lingüiças ou mangas. Mas, usar mais de um figurante em um cão que está com temperamento ainda incipiente e que se encontra inseguro pode aumentar tal insegurança pelo aumento da intensidade da ameaça. Por isso, deixemos isso para depois do cão está mais firme em seus drives de proteção. Outra falha comum em cobaias é estes procurarem chamar a atenção do cão para si e os fazerem soltar a manga cutucando-o ou batendo nele com a vara. Podem ser válidas uma ou duas tentativas nesse sentido. Mas, há que se observar se o cão, a cada toque sofrido, fixa-se cada vez mais à manga, como forma de canalizar para o objeto sua raiva e frustração. Isso é mais comum em cães treinados a atacar pelo levantamento do drive de defesa, ao perceberem que nunca conseguem morder o verdadeiro objeto de seu ódio - o cobaia. Nesses casos, quanto mais se cutuca ou castiga o cão, mais este se fixará ao acessório. Dissemos agora “cobaia”, pois um bom figurante jamais faria isso. O fato de um cão não largar a manga ou a lingüiça largadas pelo figurante ao chão, pode ser conseqüência do cão haver sido treinado inicialmente com sua rapina dirigida inadequadamente para a falsa-caça ou com maior ênfase no drive de defesa e não no drive de rapina. E se por esta última razão, não haver sido condicionado a obedecer ao comando "SOLTA", pois em um cão de rapina baixa precipitar o comando "SOLTA" pode ser destruir a incipiente e frágil atitude do cão em morder algo. Outra possibilidade também, ainda que o treinamento seja tido feito com base na rapina, seria a desta ser baixa, e o treinador ter tido justificado temor de não lhe colocar freios quando o cão estava atuando na mordida. Mais uma razão para que um cão não solte o acessório de mordida pode ser a incompetência no treinamento dos drives de rapina em não intercalar o comando “SOLTA” nos treinos ou ensiná-lo a automaticamente trocar a presa-morta pela presa-viva, conforme exposto em itens anteriores. A clássica atitude de um cobaia incompetente de ficar parado em frente ao cão após largar o acessório de mordida, sem trazer a caça para si. Ou seja, à estupidez de não ensinar o cão a focar a caça verdadeira e, sim, a falsa-caça. A causa que levou um cão a formatar o comportamento de não soltar objeto de mordida tem que ser identificada. Se não for por incompetência do adestrador, até se prove em contrário, deverá ser a inibição do drive de rapina ou a falta de um drive de rapina adequado para a realização dos devidos treinos de pegar e soltar. Talvez tenha sido preciso inverter o processo postulado em todo este capítulo que é iniciar pela rapina e a temperar posteriormente com a defesa, o que, muitas vezes, não é possível. Daí, obrigou-se a fazer o oposto, isto é, na impossibilidade de se levantar a rapina do cão, se começou o treinamento pela defesa. O comando de "SOLTA", em princípio, não deverá ser treinado em cão que ainda se apresenta em defesa. Neste momento, pode o leitor questionar: "Se o cão pode aprender o "SOLTA" durante o

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levantamento de seu drive de rapina, por que não fazê-lo durante o levantamento de seu drive de defesa?". Para que possa entender a razão, o leitor terá que retornar a leitura a todos os tópicos anteriores que versam sobre os drives. Seria altamente conflitante e incompetente durante uma situação inicial de frágil resposta às provocações necessárias para o levante da defesa, atuar inibindo à única "válvula de escape" ao morder o único objeto que lhe é permitido. Certamente tal procedimento por parte do adestrador iria inviabilizar totalmente qualquer reação e possibilidade do cão se recuperar para poder ser aproveitado como um bom animal de guarda. Caso o cão não tenha em seu temperamento drive de rapina algum e tenha aprendido a atacar apenas movido pelo drive de defesa, somente após a mordida estar firme através do levantamento da defesa, poderemos pensar em ensinar o comando “SOLTA” ao cão. Antes disso, ainda deveremos tentar incrementar a rapina como descrito em "Defesa para Rapina". Cabe até questionar se a função efetiva do cão necessita que ele aprenda a soltar sob comando. Em verdade, no caso real, conforme aumenta o nível de defesa, aumenta o nível de rapina e vice-versa. Portanto, essa situação dificilmente se configurará na prática, ainda que possível. Cães não têm drives tão independentes como carnívoros selvagens. Se esquecer isso pode ser um grave erro etológico. Vide mais em “Fair Fight e Defesa Resoluta. Altos Drives de Proteção Levam à Luta”. Conforme foi dito em “Como Aumentar – em Muito – a Caça com o Uso da Lingüiça”, para incrementar a rapina, assim que o cão morda firme em defesa o acessório, uma alternativa é que o figurante corra moderadamente puxando o cão consigo. Isso incrementará automaticamente a rapina, pois simula a situação do cão que persegue a presa em fuga. Após o cão aprender a perseguir o figurante que o puxa através do apetrecho, deve-se fazer com que o cão persiga o figurante que segura o apetrecho na mão sem que o cão o morda. Nessa fuga, o figurante deverá exibir o artefato ao cão de início, mas, aos poucos, ir o colocando oculto, encoberto por seu corpo. Poderá também ir diminuindo o tamanho do apetrecho: de uma manga para uma lingüiça, de uma lingüiça maior para uma menor. Por fim, o figurante deverá dar caça ao cão sem levar consigo qualquer apetrecho. O certo é que um cão que persegue por alguns minutos um figurante está em rapina. Assim que isso estiver bem impresso no comportamento do animal, pode-se sem problemas comandar o "SOLTA". O que condenamos anteriormente, troca de objetos de mordidas por petiscos, em última instância, poderia ser tentado não fosse a melhor eficiência do estímulo passivo trazido pela caça morta e que não pode ser despedaçada pelo fato da cabeça do cão ser mantida alta. Se o método de soltar através de iscas fosse usado, seria preciso que o figurante de afastasse completamente - de preferência se retirando do local, e o dono do cão tentará negociar com o ele a troca do acessório de mordida por um petisco, enquanto comanda o "SOLTA". Talvez fosse possível que o esquema de trocas gratificantes acabasse por tornar agradável para o cão o treinamento e que este, após algum condicionamento, passasse a morder a lingüiça mesmo em situações que não fossem de defesa. Se isso fosse conseguido, ajudaria na questão. A partir daí, seria só criar um condicionamento bem formatado de que o cão sempre soltasse após ouvir tal comando. Se o comando verbal não fosse suficiente, a mão do condutor próxima à boca do cão o reforçaria. Colocamos esse parágrafo apenas para efeito ilustrativo e para maior compreensão teórica da questão. A troca de apetrecho de mordida por petiscos deve ser totalmente afastada do treinamento a partir do fair game, tendo em vista sua pouca eficiência em um animal com altos níveis adrenérgicos (que se conflitaria com a pulsão de comer iscas) e o enfraquecimento que isso traria à mordida do cão. Além do mais há muito maior eficácia e simplicidade do método do estímulo passivo pela caça-morta.

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Uma medida que seria essencial seria parar por completo os treinamentos com o uso de provocações enquanto iniciássemos o sistema de trocas, e consequentemente parássemos o levantamento da defesa, durante o período necessário para que esse condicionamento fosse formatado (justamente pelo aumento dos níveis adrenérgicos). O deslocamento do figurante sendo seguido pelo cão contido com guia seria também fundamental para canalizar para ele a caça. Bom, voltando à prática aplicável, se finalmente conseguirmos que um cão mangueiro ataque a lingüiça ou a manga e depois a solte com comando usando somente estímulos positivos e passivos e não conflitantes, poderemos nos considerar adestradores realmente competentes. A partir daí, deveremos procurar canalizar nosso trabalho priorizando sempre que possível o drive de rapina. Observem que o termo "mangueiro" não se aplica exclusivamente ao cão que somente não solta mangas, mas também não solta similares como lingüiças e, dependendo da óptica que se analise a questão, bites. Pois bem, acima aprendemos uma forma de ensinar o cão mangueiro a soltar a lingüiça ou a manga sob comando numa situação sem stress. Esperamos com isso formatar um condicionamento comportamental para que o cão venha soltar tais artefatos mesmo sob futuro stress. Quando isso acontecer, por vezes, o cão fica indeciso, após soltar o acessório, se parte para o figurante ou se torna a abocanhar o acessório que está no chão. Um recurso que nos ajudará nesta situação é o aprendizado anterior do comando "NÃO". Será usado toda vez que o cão mostrar intenção de morder o acessório e não o figurante, seguido de "PEGA" para direcionar o ataque à caça verdadeira. No entanto, para animais que estão em trabalho de melhorar sua disposição de ataque à lingüiça ou outro artefato similar jamais deve ser comandado "NÃO", mesmo que tal acessório esteja no chão. Somente deverá ser feito quando houver uma boa disposição e ataques consistentes a esses objetos. Portanto, o comando do "NÃO" deverá ser realizado em situações diferentes e nunca antecedentes à de direcionamento do cão a investir sobre acessórios próprios para ataque. A maneira mais simples é através de adestramento com guia e estímulos positivos associados como descrito em "Guia e Enforcador na Obediência", lembrando sempre que um cão que se trabalha para recuperar drives não deve ter a obediência muito exigida nesse período. Após o cão conseguir investidas seguras contra a lingüiça, outro treinamento será o condutor segurá-la com a mão, próxima ao cão, enquanto o figurante o provoca novamente chamando para si sua atenção. Isso deverá ser feito tanto com outra lingüiça na mão quanto sem nenhum objeto. O adestrador dará o comando “NÃO” toda vez que o cão se fixar no objeto. Mesmo procedimento deverá ser realizado com a vara. Os animais mais inseguros devem ser deixados por mais tempo mordendo a lingüiça, mas deveremos sempre ter por cuidado que isto não venha a se exceder, uma vez que tal prática poderá vir a viciar o cão. Já, em cães mangueiros, sempre deveremos dar períodos curtos quando o cão morde o artefato, o figurante deverá largá-los logo após a pegada e tentar trazer o cão para si, enquanto o condutor eleva a cabeça do cão com a guia. Uma tática que deve ser usada em todos os cães é a de deixarmos no chão a manga, a lingüiça e a vara, bem em frente ao cão, enquanto o figurante o provoca, a fim de desligar o animal destes objetos. Primeiramente, o figurante atrairá o cão usando de outros acessórios. Depois, deve fazê-lo sem segurar nada nas mãos. O dono do animal ou outro familiar deve segurar tais apetrechos,

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vestindo, inclusive a manga, e o cão, caso se fixe neles, repreendido com o comando “NÃO” e puxões no enforcador. Vejam bem, comando NÃO é conflitante em situação de ataque, por isso só deve ser aplicado para animal que já obteve alguma segurança e firmeza. Outro recurso interessante é o uso de focinheiras de ataque e o condicionamento de fazer o cão atacar o figurante que não porte qualquer apetrecho de mordida. Devemos lembrar um dos princípios básicos de que "cada cão é um cão, assim como cada homem é um homem". Há animais que melhores resultados obterão simplesmente com o afastamento do figurante da manga e ficando de longe, fazendo que o cão dela se desinteresse. Devemos sempre lembrar que a inteligência, a flexibilidade e a observação, assim como a insistência e o carinho são as melhores ferramentas de um adestrador. 094 - ALVO DO ATAQUE, CONSIDERAÇÕES SOBRE: É de vital importância que ensinemos ao cão que o objeto do ataque não é a “lingüiça”, manga ou vara, mas o figurante em si. Portanto, se caso o cão não tente morder a “lingüiça”, mas diretamente o figurante, não deveremos corrigi-lo, pois, de fato, sua atuação estará melhor que o esperado. Sempre que o ataque for estimulado contra alguém – figurante ou cobaia, o qual deverá receber uma dessas denominações, e o cão for diretamente contra tal pessoa ao invés de morder a lingüiça ou a manga, podemos considerar como positivo. Falamos de cinofilia efetiva, não de cinofilia esportiva. Como veremos em tópico posterior, nunca se deve tocar - exceto muito levemente e em casos muito especiais - no cão com vara ou bastão caso ele não esteja mordendo algum acessório. Portanto, na situação mencionada no parágrafo anterior - a do cão investir diretamente sobre o corpo do figurante, o que não poderemos obviamente permitir, exceto se este vestir bite, não se deve jamais bater no animal com rigor. É chegada a hora de se usar um bite para continuar o treinamento para poder usar com rigor o bastão. Em verdade, a lingüiça tem como funções: ser usada no levantamento da rapina; servir como segurança por permitir que o animal a morda enquanto aprende a suportar alguns toques de bastão; como ensinamento inicial para o animal aprender a morder; direcionar o ataque a partes do corpo. A manga tem como função principal corrigir a mordida caso o animal não morda bem o bite. Indicamos usá-la, fora de sua serventia original, colocando-a na vertical na altura equivalente à da perna do figurante. Pode, também, ser usada para direcionar o ataque ao antebraço, o que não julgamos, a princípio, conveniente no que diz respeito ao que chamamos de guarda efetiva. A linguiça quando usada na vertical tem que ter alças duplas, uma em cada extremidade. Uma fica presa à mão e outra ao pé. Deve ser também mais longa do que a linguiça comum. Com uma manga comum, não poderemos realizar a rotação relatada em "Lingüiça. Como Deve Ser, como Usar e Direcionar o Cão para Ela", isto porque uma manga de boa qualidade geralmente não pode ser usada no braço direito - a não ser que seja feita sob medida. Como o preconizado no recém citado tópico, recomenda que o ataque seja à perna esquerda, que o giro seja dado no sentido anti-horário de quem o dá, é impossível fazer isso com a mão esquerda. Portanto, uma manga normal - a mais indicada para correção de mordida - não pode ser usada exceto já

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apresentada na vertical. Ou seja, ou já se formatou tal condicionamento com lingüiça ou teremos que usar uma "manga de filhote", pois estas podem ser portadas em qualquer antebraço (a manga de filhote só veste o antebraço), sem distinção. Em razão do ataque à perna ser baixo, teremos que usar a manga de filhote no antebraço direito à frente da perna esquerda até que fique quase na horizontal, para depois a apresentarmos na vertical, no antebraço esquerdo. Em verdade, nem a manga de filhote serve para correção de mordida, nem é prático usarmos manga na mão direita para condicionar o cão a morder na perna esquerda, ainda que tenhamos uma manga comum feita para ser usada na mão direita. Portanto, só se utilizará manga na vertical para correção de mordida caso o cão já tenha sido condicionado, através de lingüiça, a morder acessório em tal posição. Mesmo que usemos manga para melhorar a mordida na perna, devemos iniciar o treinamento com lingüiça, até porque mesmo dada baixa, a manga condiciona o cão a ir no braço. Se o cão aprendeu bem a morder com o uso só da linguiça, esqueçamos tudo sobre manga no que tange a ensinar o cão a morder na perna. Podemos também chegando ao diâmetro adequado da linguiça, ensinarmos apenas com ela ao cão morder firmemente a perna. Começando da posição mais horizontal para a mais vertical e sempre no sentido anti-horário de quem a apresenta. Acho bem mais prático do que a utilização de manga para esse fim. Mas, se usarmos a manga, devemos lembrar que o polegar do membro que a segura deve estar voltado para o corpo do figurante. O porquê do sentido anti-horário está explanado em “060 - LINGÜIÇA, COMO DEVE SER, COMO USAR E DIRECIONAR O CÃO PARA ELA”. O detalhe da correção da mordida é procurarmos - uma fração de segundo antes do cão fechar a boca - empurrarmos um pouco a manga ou linguiça em sua direção para que a abocanhe melhor. Devemos, em todas as etapas do treinamento, termos em mente a filosofia inicial de nossa metodologia, ou seja, a de que o figurante deve ser encarado como uma caça e não algo que apavore o animal. O que também não significa que sempre deva ser uma caça encarada pelo cão como indefesa e que se pode abatê-la como em um fair play. O figurante, aos poucos, deve ser visto pelo cão como uma caça que irá lutar, e o cão deve estar psicologicamente preparado para isso. Já foi dito em outro item que a postura do figurante deve evoluir progressivamente da de fuga para a de luta, ou seja, para o enfrentamento direto contra o cão. O cão deve diferenciar desde cedo o que é uma situação de fair play usada para levantamento inicial da caça, de uma provocação usada para levantamento da defesa ou da caça a estranhos. No tópico “Ataque com Manga”, veremos importantes considerações sobre tais conceitos. Devemos também evitar comandar com muita intensidade o "SOLTA" enquanto o estranho ainda a estiver segurando apetrecho de mordida. Após o cão haver sido ensinado a largar a caça morta e estar bem condicionado pelo comando de "SOLTA", poderemos iniciar a treinar esse comando para a caça "semi-morta", isto é, para o figurante que não se move com bite ou para artefato de mordida sem movimento nas mãos do figurante. Jamais deveremos treinar o cão soltar caça viva, isto é, figurante que se movimente. Para cada cinco investidas, ordenaremos apenas um "SOLTA" com a lingüiça ainda segura pelo figurante sem que haja uma sequência já perceptível pelo cão. Apenas para que ele não perca o condicionamento de soltar sob comando também nessa situação. Para tanto, sempre daremos o comando “SOLTA”, e afagaremos e elogiaremos o animal quando

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ele nos obedecer. Nas outras quatro investidas o figurante deve largar o acessório, chamando para si a atenção do cão. Daremos o "SOLTA" neste caso, somente se o cão vacilar em largar o objeto e investir sobre o figurante. A razão de não darmos menor ênfase a que o cão largue a lingüiça ou a manga ainda na mão de pessoa estranha é que isso enfraquecerá o vigor do ataque, na medida em que ao morder já estará, o cão, psicologicamente preparado para soltar, o que não é interessante na guarda efetiva, pois tende a enfraquecer a força da mordida. O comando "SOLTA" tem um efeito de suspender o ataque. Sua expectativa constante por parte do cão a todo ataque, irá diminuir substancialmente o ímpeto do cão, que deverá estar psicologicamente preparado para abater o oponente e não para soltá-lo. Pode parecer exagerado e cruel, mas um animal que não ataque com tal expectativa, com certeza terá um ataque menos consistente, e essa poderá ser a diferença entre ser vitorioso ou derrotado. Derrota, para um cão de defesa, pode significar morte do cão e da família que ele protege. Cremos que é falta de determinação moral nos dividirmos psiquicamente entre o valor da vida da nossa família, incluindo nosso cão, e o valor da vida de um intruso que penetra em nossa casa disposto a roubar e, quem sabe? Estuprar e assassinar. Por isso, muitos cães efetivos, principalmente guardiões, nem são condicionados em seu treinamento ao comando de "SOLTA". Cães de guarda de boa linhagem temem muito mais, na hora do ataque, a não aprovação de seus donos do que a ameaça física do figurante. Devemos ter controle sobre o cão quando do seu ataque. Mas, por outro lado, a ânsia por um controle exagerado poderá bloquear a necessária obstinação do ataque. Tal controle deve ter a medida certa e não ir além do necessário para a atividade para qual mantemos o nosso cão. É evidente que qualquer cão guardião deve estar protegido por altos muros e outros obstáculos intransponíveis para uma criança de pouca idade, bem como que não tenha como sair sozinho do local que deve guardar. A outra categoria de cães de guarda, os cães protetores, devem ter equilíbrio emocional de só iniciarem um ataque após comando ou situação extrema de agressão por parte de terceiros e devem soltar sob comando. 095 - ATAQUE COM MANGA: A manga (ou luva) é um acessório que tem por finalidade fazer o cão aperfeiçoar sua mordida. Alguns esportes usam somente a manga como objeto de ataque, canalizando para o antebraço, se não para o artefato em si, o ataque do cão. Na cinofilia efetiva, a manga é usada quase que tão somente para corrigir a mordida do cão, uma vez que o figurante tem maior controle sobre ela por portá-la no antebraço. A manga também permite melhor o uso severo do bastão, pois torna mais cômodo esse trabalho para o figurante. Sendo assim, funciona melhor para levar o cão à luta e serve melhor para realização de provas onde o bastão necessita ser usado com rigor para seleção de matrizes e reprodutores de cães de guarda efetiva. No direcionamento da mordida para a perna, a manga será portada na altura da perna e na posição vertical, conforme explicado em "Alvo do Ataque. Considerações sobre". A manga dará a oportunidade de o figurante empurrá-la em direção à boca do cão no exato instante em que este a fecha, aperfeiçoando sua mordida. Por isso, mesmo que nosso objetivo seja canalizar a mordida para qualquer local, a manga será de utilidade para fazer com que o cão morda mais "cheio", no caso de só morder com os incisivos. Um cão que morda demasiadamente somente com os caninos poderá ao objetivar uma perna, por exemplo, acabar por rasgar somente a calça do meliante por

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falta de profundidade de mordida. A manga dará ao cão a oportunidade de exercer e treinar uma mordida mais forte, na medida em que oferece ao figurante a oportunidade de exercer mais força ao puxar o cão pela melhor maneira de segurá-la. Embora devamos oferecer a manga na posição vertical e baixa, não implica necessariamente que não a possamos levantar para "lutar" com o cão com mais facilidade. No fim, antes de ser dado o comando "SOLTA" pelo adestrador ou quando a soltamos para que o cão a leve, devemos torná-la à posição baixa e vertical. Quando o cão chegar a essa fase, deve-se ir graduando com mais energia o toque do bastão de schutzhund. A manga é um bom artefato para facilitar ao figurante levantar o cão até a altura propícia para aplicar nele golpes mais severos. Atenção total, no entanto, na reação do cão a cada golpe. Caso o cão demonstre que irá fraquejar, é necessário que diminuamos a severidade do toque. Não recomendamos que por muito tempo se use a manga no treinamento de ataque, por poder gerar um condicionamento viciado quanto ao objeto do ataque que deve ser o figurante e acabar por canalizar a mordida para o antebraço. Tão logo quanto possível, deveremos passar para o ataque com o bite. A manga só deve ser usada se for necessária para melhorar a mordida ou em provas de ataque que exigem toque severo de bastão. Algo quase sempre esquecido é a qualidade do refil da manga (bem como dos tecidos que cobrem as lingüiças). É importante que os dentes dos cães possam penetrar neles sem rasgá-los. Por isso, devem ser com a malha apropriada. Um tecido, cuja malha não permita a penetração dos dentes dos cães, irá aumentar o impacto das mordidas e maltratar os alvéolos dentários dos cães, bem como acabar funcionando como lixa sobre os dentes, limando-os e fazendo-os perder o fio. A juta, que permite que os cães penetrem em sua malha é A melhor fibra para o tecido do refil da manga. Juta é a fibra crua de cor bege amarelado formando fios grossos antigamente usado em sacos de batatas de 60kg. 096 - MANGA. COMO DEVE SER - SEUS EFEITOS SOBRE A MORDIDA: Uma manga (ou luva) para que consigamos uma mordida firme, típica de uma situação de caça, deve ter em seu mordente um bom diâmetro para que o cão aprenda a morder procurando usar de todos os recursos disponíveis para que “ela não escape” de sua mordida, isto é, apertando-a bem e usando o maior número possível de dentes na mordida. Assim, através desses recursos, mimetizaremos uma mordida de caça em nível de fair game. O grande problema, é que se a superfície a ser mordida for muito dura, automaticamente o cão se acostumará a morder com menor impacto. Para isso, a primeira manga ofertada ao cão deve ser mais macia e, somente depois, outras mangas de dureza um pouco superior devem ser ofertadas. Hoje, sabe-se que se pode obter a mordida ideal apenas controlando o drive em ação, e coisas como mangas duras foram rigorosamente esquecidas. Se fosse um modo natural, a natureza, em milhões de anos de seleção, já faria cães que mordessem de tal modo. Não precisaríamos, portanto, do recurso de diminuição gradual da maciez. Ocorre que na caça real, o canino não hesitará em usar de impacto total de sua mordida na tenra carne da presa e mais ainda na defesa da prole ou do próprio indivíduo. Com a diminuição do impacto da mordida, ocorrerá a obrigatória diminuição do seu poder de perfuração. Já no sob a égide da rapina, o cão tenderá a querer manter a presa segura e quanto mais dentes utilizar melhor fará isso. Rapina associa-se a segurar – manter a presa - e a boca-cheia. Luta se associa a dilacerar, ferir e predominância dos dentes caninos na mordida, além da mordida ser bem mais sacudida.

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A dureza da manga deve estar associada à dureza do local ao qual direcionamos a mordida. Mordidas direcionadas à canela precisam de uma dureza maior do que mordidas direcionadas ao ombro, por exemplo. Mas, em verdade, vamos lembrar, não é exatamente a canela que o cão deve atacar, mas a batata da perna do oponente humano. Uma manga de diâmetro muito grande, lisa e dura acabará por tirar do cão o costume de chacoalhar e dilacerar, pois os movimentos de sacolejar fariam desprender a mordida, fazendo o cão, inclusive, morder uma porção de carne superior à sua capacidade de dilaceração. Cabe lembrar que a força máxima dos músculos masseteres não é exercida quando estes estão muito distendidos, e é bom que o cão se acostume a morder a porção exata. É claro que um cão que apenas mordisque a manga, abocanhando porções muito pequenas ou usando os incisivos, será ainda mais indesejável. Uma manga muito dura fará com que o cão acabe por abocanhá-la firmemente, mas tenderá a lhe tirar, aos poucos o impacto mandibular, como um saco muito duro acabará fazendo com que o boxeador acabe por golpear com menos força. Em verdade, a manga não deve ser dura e, dependendo do direcionamento da mordida, não deverá ser por demais macia, embora esta segunda opção sempre deva ser usada inicialmente. Lembramos que o poder de perfurar da mordida está muito mais no impacto do que na força exercida para manter a presa segura. Raças como os buldogues de enorme força mandibular têm pouco poder de perfurar ao morder. O efeito da mordida não advém tanto dos músculos da boca quanto de todo o conjunto de músculos do cão, ombros, membros, pescoço, etc. Isso porque quando um cão sacode a mordida é que o efeito desta é devastador. Isso ocorre da mesma forma que os músculos do braço de um boxer de longe não são os únicos responsáveis pela potência de seu soco. Um bom boxer usará a força de seus membros inferiores, da sua cintura, dos seus ombros... A manga dura e de maior é utilizada quando não se deseja que o cão dilacere, mas apenas mantenha firme o agressor, coisa, como já vimos acima, é desejável apenas para um cão de captura policial e que tenha preocupação de não machucar muito o prisioneiro, não para um cão que deve minimizar as possibilidades de que alguém venha a fazer mal à sua família ou a ele próprio. É a manga utilizada em treinamentos para esportes que têm por base a atividade policial na qual se deseja imobilizar provisoriamente o agressor, e quando dando cobertura ao cão, supõe-se a existência de um policial armado, como é o caso do schutzhund. Conforme vimos em "Luta. Condição Interativa entre Rapina e Defesa? - Mordidas Associadas", a mordida ideal para um cão cuja função é a de guarda efetiva, deve corresponder à usada na condição de luta, com preponderância dos caninos ou com a boca cheia, mas sempre sacudida e respeitando sempre a especificidade do local foco da mordida. Para isso, o ideal é comecemos o treinamento com uma manga macia, passando para uma manga de maciez média, sem nunca chegar a uma dureza superior ou a um diâmetro excessivo. 097 - TOQUE DO BASTÃO, COMO GRADUAR - O AJUSTE ADRENÉRGICO: Esse talvez seja um dos momentos que exige mais feeling na figuração. Recomendamos a releitura de "Rapina para Defesa" e de "Luta. Condição Interativa entre Rapina e Defesa? - Mordidas Associadas" antes da leitura deste tópico.

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Um cão de guarda efetivo tem por obrigação suportar algumas varadas até certos níveis razoáveis, como um lutador de boxe deve suportar os socos do adversário, pois, em um caso real o malfeitor procurará bater no animal para vencê-lo. Não poderemos dizer que nosso cão é de guarda se ele só se limitar a atacar sem que sofra nenhuma reação e venha a recuar no caso do adversário revidar de forma mais violenta dentro dos limites do suportável, e precisamos conhecer quais são tais limites. Como poderemos fazer isto sem sermos cruéis e, consequentemente, traumatizar o animal? Da mesma forma como se treina um atleta para a arte do boxe ou do karatê, ou seja, acostumando-o paulatinamente a que não sinta dor. Isto se fará possível na medida em que, aos poucos, durante o treinamento o atleta, ou o cão, vai gradativamente aumentando sua produção de catecolaminas nos momentos necessários. Um cão de trabalho, como um lutador humano, deve aprender a não sentir a dor dos golpes. Quem já praticou alguma forma de arte marcial que envolvesse golpes traumáticos sabe que isso é facilmente possível após um tempo variável - de pessoa para pessoa, como também é de cão para cão. O que dá a capacidade de não sentir tais dores é o aumento das catecolaminas no sangue, como vimos em "Drive de Defesa e Drive de Rapina". Sempre lembrando que basicamente o aumento da noradrenalina está relacionado com a defesa e a dopamina com a rapina, como também que a primeira se mal modulada estressa rapidamente o animal. A serotonina, a endorfina e as encefalinas, por sua vez, modulam o sistema nociceptivo eferente, o qual faz diminuir a sensação de dor no local do trauma. O sistema límbico tanto pode diminuir ou aumentar a sensação de dor nas vias analgésicas naturais. A insegurança e a ansiedade aumentam tal sensação, a segurança e o raiva as diminuem. E, como sabemos, as catecolaminas exercem sobre o organismo um efeito anestésico. Isto não é em nada cruel, pois é o que aconteceria com qualquer animal em seu estado selvagem. Pelo contrário, agindo assim estaremos repondo ao cão sua verdadeira identidade, por vezes adormecida, dentro deste mundo civilizado ao qual nem o próprio homem consegue se habituar. Estaremos, também, não permitindo que a espécie canina se degenere e torne-se até uma espécie inapta à sobrevivência em seu estado natural. Portanto, concomitantemente ao avanço nos comandos deveremos avançar também com o grau de reação do figurante aos ataques. Caberá, então, ao figurante, ter a sensibilidade e experiência para saber até onde poderá ir sem traumatizar física e psicologicamente o animal, ou seja, de não exigir dele mais do que está preparado para suportar, não permitindo, efetivamente, que venha a sentir dor, o que, realmente, será cruel e contraproducente. Podemos resumir tal discussão em duas premissas: Primeira, que para se bem preparar um cão para guarda deveremos aumentar nele sua capacidade de suportar o castigo sem que, na verdade, venha a sentir dor, ou seja, que o castigo realmente não seja efetivo para a psique do animal. Segunda, que se temos um bom cão de guarda é porque ele não foi traumatizado durante seu treinamento. Quem conhece bem as provas de temperamento e já as viu no passado, com cães realmente bem estimulados, vê com certo ceticismo provas onde nitidamente os cães as realizam sem demonstrar qualquer gana real, mas parecendo estarem cumprindo um simples treinamento circense sem qualquer emoção. A carga de catecolaminas a ser descarregada no organismo provém de comandos no cérebro que interagem com as emoções. Conforme o tipo e a amplitude da emoção, maior ou menor deverá ser esta carga, e consequentemente, maior ou menor deverá ser a resistência do animal à dor, e pequena sua capacidade de realizar efetivamente seu trabalho em uma situação real. Isso porque a interação dos controles psíquicos com a capacidade do organismo de produzir e

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modular tais substâncias, bem como na organização neuronal de receptores para ela, dentro de um determinado treinamento, não aumenta de uma hora para outra, se o cão, estiver despreparado emocionalmente para tal situação. Atletas humanos, principalmente os das artes marciais, são unânimes em relatar a total inexistência de qualquer tipo de dor durante as lutas. No boxe, no full contact, no vale-tudo, etc. existem golpes que realmente poderão comprometer fisicamente os atletas, como socos, chutes e torções. No treinamento de cães para guarda isto não acontece, pois a vara, embora possa ser doída para alguém despreparado, não trará nenhuma dor a cães bem treinados, tendo em vista tal fato ser inerente ao sucesso do treinamento, e, sendo tal objeto flexível, não terá nenhuma chance de trazer ao cão nenhum comprometimento físico desde que o figurante tenha sempre presente a preocupação de não atingir o animal nos olhos, o que é algo facílimo de ser evitado. Sobre a dor, devemos também saber que existem duas vias aferentes para ela, ou seja, duas vias que levam a dor ao cérebro. A via rápida, conduzida pelo trato neoespinotalâmico. Esta via é estimulada por estímulos mecânicos ou térmicos sobre os tecidos. Sua condução até o encéfalo é rápida e o seu efeito passa em períodos curtos de tempo. E a via lenta, conduzida pelo trato paleoespinotalâmico, sua condução é lenta e seu efeito é bem mais duradouro, pois ocorre provocada por substâncias inflamatórias nos tecidos lesados. Quando o indivíduo consegue sublimar a dor rápida e não há lesão tecidual que possa provocar reação inflamatória não haverá dor de nenhum tipo, e isso ocorrerá no caso do bastão de adestramento. Entre adestradores há a preocupação de que o cão não “perca os nervos”. Em outras palavras, que não exacerbe os níveis sanguíneos de catecolaminas, o que pode ocorrer em uma situação de defesa tensa como visto em "Luta. Condição Interativa entre Rapina e Defesa - Mordidas Associadas", e isso é correto. No entanto, é necessário que haja aumento nos níveis adrenérgicos numa situação de luta. Do contrário, o cão não terá capacidade de resistir a golpes inerentes ao treinamento ou a uma situação real de proteção, como é visto no capítulo "Prova de Ataque - Perigo ou Proteção?". A luta contém também a defesa, e a defesa suporta muito mais tempo seu estímulo, pois um cão cansado se enjoa do trabalho de caça, mas um cão só irá desistir da luta quando estiver extenuado. É preciso lembrar, por outro lado, que a exacerbação das catecolaminas também desgastará rapidamente o animal. Por isso que os treinamentos devem ser realizados paulatinamente, para que os cães aprendam aos poucos a controlar os níveis necessários de catecolaminas. E para quem não sabe, o cérebro aprende a controlá-los. Cães que elevam demais sua adrenalina e noradrenalina não terão condição de exercer um bom trabalho, não suportarão a pressão psicológica, se esgotarão rapidamente e poderão deixar de atacar e até fugir. A elevação da noradrenalina e da adrenalina é paradoxal. Um aumento moderado resulta em mordidas mais fortes e contundentes, enquanto que um aumento exacerbado repercute em mordidas fracas e com os dentes da frente. Cães que não elevam necessariamente a dopamina terão mais dificuldades em suportar golpes, pois sentirão mais dores nos golpes. Com o tempo, a psique aprenderá a comandar o funcionamento fisiológico do corpo na exata medida de suas necessidades e a modular o nível de catecolaminas conforme necessidades momentâneas. Isso é obtido por herança genética, mas também até um certo ponto por aprendizado. Outro fator importante a não ser esquecido é que existe um amadurecimento natural que só ocorre com a idade. Observe-se, no entanto, que sempre existirá uma limitação genética em cada exemplar. As boas raças de guarda são selecionadas nesse sentido, ainda que quem as selecione, na maioria das vezes, não saiba como funcionam os mecanismos fisiológicos e genéticos.

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Dentro desses mecanismos, está o do controle efetivo da dor. Se iniciarmos um treinamento batendo com rigor superior ao que o cão pode suportar, ele tenderá a abandonar o ataque e até a fugir. A modulação da severidade dos toques é importantíssima, pois ela é responsável pelo aprendizado psíquico e fisiológico de não sentir dor. Tal modulação deve educar e acompanhar a capacidade que ela mesma incrementa em cada exemplar. Deve ser gradativa também para que o animal, aos poucos, aprenda a graduar sua produção e secreção interna de catecolaminas. Isso porque uma das respostas à dor é a exacerbação adrenérgica. Paradoxalmente, os possíveis traumas causados pelo excesso ou precipitação do uso do bastão trarão o resultado exatamente oposto, e a psique do cão aprenderá ao inverso o que queremos, isto é, os níveis de noradrenalina se exacerbarão com um mínimo de estímulo, tanto no toque do bastão como na possibilidade dele ser usado, isto é resultado do medo. Além disso, um cão por demais valente pode suportar o castigo, mas poderá ser prejudicado pelo mal aprendizado de aumentar exageradamente seus níveis séricos de tais hormônios. Aprenderá a atacar numa atitude de defesa, possivelmente à beira do descontrole emocional. Terá dificuldades de obedecer durante o ataque e nos momentos em torno do ataque. Terá pouca resistência para realizar um trabalho mais longo. Mesmo que tenhamos quase certeza que nossos cães suportarão um toque mais forte de bastão, não devemos permitir que sejam aplicados antes do amadurecimento dado pela idade e pelas experiências vividas, que devem ser tempestivas e graduais. Os golpes aplicados na forma e na graduação corretas para a idade e para capacidade de cada exemplar, servirão de ensinamento ao sistema psíquico, neurológico e hormonal do cão de tal forma que não constituirão castigo, mas prazer ao animal durante o jogo da luta. Um cão que morda uma manga ou um bite, mas não esteja capacitado a suportar um nível mínimo de toques e que esses toques se transformem mais em um castigo do que em condição intrínseca à luta, não poderá, a nosso ver, ser considerado como cão de guarda efetivo. Devemos comentar que no treinamento para cães efetivos, os golpes deverão crescer gradualmente até um patamar máximo, no qual se testará o cão para condição de reprodução. Esse patamar deverá ser de muito rigor. Mas, esse rigor só deve ser empregado em cães previamente preparados, não se constituindo em nenhuma crueldade, como pode parecer aos olhos dos leigos. Após tal teste, tal patamar nunca mais deverá ser exigido, pois o patamar para teste não é o mesmo do que os de treinamento, e sua repetição poderá desequilibrar o cão. Durante o treinamento deveremos simplesmente observar toda vez que a expressão do cão "acusar o golpe", é o momento de regredirmos não apenas à graduação anterior, mas uma ou duas graduações na força dos toques, para, aos poucos e em outras ocasiões, retornarmos à graduação onde o cão mostrou fraqueza. Para que não chegue a ocorrer tal situação, que não é indicada, muito melhor e mais eficaz é evitar um nível de toque que chegue a ser sentido mais fortemente pelo cão. Por isso, a sensibilidade do figurante de perceber quando os golpes estão ultrapassando o limite de cada cão é fundamental. À menor indicação de que o nível está acima do limite de cada exemplar, deverá ser imediatamente baixado. Quanto mais sensível for o figurante em captar a mais sutil resposta negativa do cão,

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menor será o retrocesso que será posteriormente exigido, menor será o eventual trauma e mais rápidos serão os progressos. Somente a experiência e sensibilidade do figurante poderá evitar que o cão não chegue sequer demonstrar a mínima reação negativa como também não se perca tempo excessivo no incremento da qualidade de absorver golpes sem perceber a dor. É de fundamental importância que não se toque com a vara no rosto ou focinho do animal em todo o decorrer do treinamento, pois, no início, provavelmente, irá acovardá-lo, e em qualquer fase acarretará em sério risco de feri-lo nos olhos ou provocar hemorragia grave na cânula nasal. A coluna vertebral também jamais deve ser atingida em nenhum momento, bem como a região lombar, onde estão os rins. Outro fator importante é que não se deve tocar - exceto muito levemente - no cão com vara ou bastão caso ele não esteja mordendo algum acessório. O fato de estar mordendo dá ao cão segurança de que está lutando e não apanhando. O importante é que o cão ao final de cada sessão sempre saia “ganhando” e o figurante acabe em fuga. Tal fato trará, ao nosso amigo, um grande alimento para seu ego e uma quebra salutar na rotina de sua vida quase sempre monótona. Em um treinamento realizado em um cão bem preparado, tal animal não sofrerá qualquer dor física, em razão da emoção e do prazer que lhe proporcionará. Em todos bons cães de guarda, podemos notar claramente a alegria que os contagia durante e após os treinos. Seus rabos abanam em sinal de felicidade. Seu comportamento em casa torna-se mais equilibrado e agradável. O treinamento se bem feito lhe tira o stress acumulado pela rotina. Outro fator a não ser esquecido é que o ajuste adrenérgico é mais eficiente nos cães jovens. Não se pode esperar – na maioria das vezes - o mesmo resultado de um cão que inicia tal trabalho de forma gradual aos seis meses de outro que o inicia aos dois anos. Sinais de que se necessita reduzir a pressão do bastão: - baixar a cauda; - arrepiar os pêlos; - mostrar temor no olhar; - desvio do olhar; - morder fraco (isso é paradoxal, pois é aumentando a graduação do bastão que se obtém muitas vezes uma mordida mais forte - não pode ser analisado separadamente de outros sinais); - morder com a ponta da boca (incisivos); - ir relutante até o figurante. Outra coisa que devemos lembrar é a limitação de cada cão, o que está muito associado ao fator racial. Uma potência usada tranquilamente para levantar a defesa em um cão com drives médios para uma dada raça pode colocar em fuga um cão de outra raça que tenha drives médios de proteção mais modestos ou menor insensibilidade à dor. O efeito de aumentar a pressão do bastão é paradoxal. A um primeiro momento, eleva as catecolaminas em níveis controláveis pelo cão e aumenta a sua resistência à dor, bem como sua raiva. Se o uso continuar até um limite, que depende de cão para cão, o efeito será inverso. As catecolaminas se exacerbarão e o cão entrará, cedo ou tarde, em fuga. Isso é dependente da capacidade de cada cão, do tipo de bastão, da força nele empregada e do número de varadas aplicadas. Ultrapassar ou mesmo chegar perto desse limite passa a ser contraproducente e constitui maltrato. Se, por um lado, o uso de bastão irá aumentar a confiança e a autoestima do cão, por outro, se exagerado, levará à insegurança e à baixa-estima.

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Existem dois fatores a serem lembrados: a resistência à dor propriamente dita, que depende da genética e do preparo em nível de neurotransmissores e hormonal, e a dureza, característica de suportar psiquicamente a dor sentida e que varia com o temperamento e com o caráter de cada cão e de cada raça e linhagem. 098 - ATAQUE AO BITE: Após o cão saber morder bem a lingüiça que deverá lhe ter sido sempre apresentada no local onde queremos direcionar a mordida, é chegada a hora de iniciar o ataque ao bite. O treinamento realizado com o bite suit é sem dúvida o ideal para treinar cães de guarda. Desenvolvido para as provas de ringue, nas quais o cão ataca o figurante fica protegido por uma roupa especial, o bite suit - ou simplesmente bite, em todas as partes do corpo à exclusão dos pés e da cabeça, que pode, ou não, estar protegida por um capacete de motociclista. É um ataque mais real e muito mais eficiente do que o treinado somente com a manga. Mesmo assim, há casos em que a manga precisa ser usada por umas poucas vezes para que o cão aprenda a melhor abocanhar. Aí, pode-se perguntar: mas se os caninos, os caçadores mais eficientes da terra, superiores inclusive, muitas vezes, aos grandes felinos em sua organização e eficiência na caça a animais muito maiores que eles, não sabem morder bem, será que o homem poderá ensiná-los a fazer melhor o que a mãe-natureza lhes ensinou? O que ocorre é que há diferença enorme entre o ataque de um cão de guarda e o de um cão selvagem que caça animais para sua subsistência (não confundir caçar animais com "drive de caça"). Na natureza, os caninos - cães, lobos, cães africanos (espécie diversa do cão doméstico e um dos maiores caçadores da terra, que rivalizam com os leões e com o leopardo em eficiência e letalidade), chacais, etc. – bem como a hiena (que não tecnicamente um canino), usam a técnica de minar a resistência de presas maiores pelo cansaço. Não há um ataque direto às presas até que estas se encontrem em fuga ou já exaustas, para não se exporem a ferimentos e perda de dentes cujas chances são minimizadas por mordidas fracas e dadas sem pressionar por demais a presa. Já na guarda, onde o inimigo é o homem, muitas vezes, armado. Se o ataque não for rápido e decisivo há uma maior chance de que o cão seja atingido por armas brancas ou pelos disparos de arma de fogo. O cão deve dar a mordida com maior impacto e profundidade possíveis e logo chacoalhar, destruindo o máximo possível no menor espaço de tempo, minimizando as chances de reação. Voltando ao assunto do treinamento com o auxílio do bite. A manga deve ser utilizada por breve período, o mínimo possível para que o cão aprenda a abocanhar com a boca razoavelmente cheia. Pode ser usada toda vez que vier a decair a qualidade da mordida - o que não é comum - mas sempre no mínimo necessário. A mordida na perna é muito mais eficiente do que a mordida no antebraço, onde a manga ensina o cão a atacar se for portada na posição tradicional. Um malfeitor frio e ágil pode facilmente degolar um cão que o ataque no antebraço usando, inclusive, uma jaqueta enrolada e uma adaga. Eficiente também é a mordida direcionada aos órgãos genitais. Sobre como direcionar para tais locais leiam "Iscas e Bolinha para Direcionamento e Condicionamento dos Locais de Mordida". A grande diferença do citado tópico para o atual é que, neste, ao invés de lidarmos com o drive de rapina em um nível mais próximo do fair play, estaremos trabalhando com o drive de rapina em nível de fair fight.

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Uma das preocupações que devemos ter logo no início do ataque ao bite é se os condicionamentos formatados para ataques localizados estão sendo eficientes. Se isso não estiver acontecendo, devemos parar o treinamento e, com ajuda de linguiças direcionarmos o cão para os locais. Este treinamento deve ser feito com cão contido por guia e coleira - ou enforcador travado ou peitoral, e terá seu alcance limitado para que só alcance a linguiça. Aos poucos, esta deverá ser levada pelo figurante no local desejado, sejam genitais, perna, etc., até que o cão automaticamente busque tal local. Posteriormente, retiraremos a linguiça e conduziremos o cão, restrito pela guia, ao local desejado. Iremos gradativamente soltando o cão a uma maior distância do local - podemos começar com poucos centímetros. Existem coleiras de ataque com alças para que direcionemos melhor o cão ao local desejado já no próprio bite. Outro treinamento com uso de bite é o ataque ao figurante deitado e em posições diversas. É extremamente comum que cães valentes suspendam o ataque quando o figurante cai ao chão ou que circulem o figurante sem o morder se este estiver deitado. A razão disso é simplesmente não haver condicionamento para que mordam o figurante deitado. O caminho mais fácil é iniciar o ataque já ao ponto escolhido no corpo do figurante que já deverá se abaixar até simular queda; deixar o cão morder por um tempo; comandar o "SOLTA" e reiniciar o ataque. Pode-se também, se for julgado conveniente, acostumar o cão a trocar o local da pegada quando da troca de posição ou já iniciá-la por local diverso conforme posição, apenas mudando o local da lingüiça durante, ou antes, do ataque respectivamente. Veja também: “Lingüiça e a Troca de Pegada”. Outro caso comum é o do cão não atacar pessoas que simulem indiferença a ele. Se isso ocorrer, basta que o figurante bata levemente com o bastão no próprio bite continuando a mostrar indiferença até chamar atenção do cão, enquanto o adestrador reforça o comando de "PEGA". Gradualmente, as batidas devem ser mais fracas e menos audíveis, baixando, dessa forma, o limiar do estímulo necessário para o ataque. 099 - ADAPTAÇÕES NO BITE PARA DIRECIONAR ATAQUE: Podemos usar a bolinha em nível de fair play para direcionar o cão (no caso para os genitais). Neste caso, utilizaremos pessoa das relações do animal ou até familiares. Não haverá conflito, desde que não façamos o cão soltar a bolinha em nossas mãos, e apenas a troquemos por outra a ser lançada, conforme explicado em “Rapina e a Bolinha Mágica”. Exatamente a mesma técnica usada no item acima citado poderá ser empregada. A diferença será somente que a bolinha ao invés de ser lançada para que o cão a pegue, a partir do cão já estar habituado a buscá-la, será lançada para outra pessoa conhecida (familiar ou não) que a esconderá entre seus membros inferiores, à altura dos genitais. O cão deverá pegar a bolinha que de início deverá ficar visível ao cão. Depois, deverá ficar oculta para que o cão a encontre. A pessoa deverá usar macacão de schutzhund ou bite para não ser ferida pelos dentes e unhas do cão, ainda que sem intenção de fazê-lo. Vamos supor o ataque direcionado aos genitais. Depois dos ensinamentos com a bolinha, em nível de fair play, poderemos usar uma lingüiça com adaptação com velcro que se unirá à zona a ser atacada – no caso os órgãos genitais. Enquanto esta nova lingüiça estiver presa somente com velcro, o nível ainda será de fair play. Sempre é bom lembrar, não se deve forçar o cão a soltar

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nenhum acessório com o uso de nossas mãos – apenas com a indiferença do estímulo passivo ou direcionando-o a outro acessório. No entanto, tal lingüiça deverá ter uma alça em cada extremidade, cada uma das quais poderá, quando for o momento, ser presa a finas cordas que penetrarão, juntamente com as alças, em orifícios feitos bilateralmente no bite na altura da virilha. Tem que ser uma lingüiça feita exclusivamente para essa atividade, com uns 15 centímetros de comprimento e seis de largura. Outro par de orifícios, também simétrico, deve ser feito mais atrás, no local onde estariam os bolsos em uma calça normal, por onde as cordas devem se exteriorizar. O figurante poderá, então, segurando as cordas – que também devem ter, cada uma delas, na extremidade mais uma alça, controlar a lingüiça e até movê-la, chamando para ela a atenção do cão. Muitos usam o bite pillow para condicionar cães a morder em genitais, mas esse acessório, a nosso ver, não deve ser usado em nível de fair play, e a maioria dos bites pillows não dispõe de proteção adequada para as mãos dos figurantes. Caso alguém deseje usar tal equipamento, deverá fazê-lo somente em nível de fair game ou de fair fight e encontrar um bite pillow que disponha de ampla proteção para as mãos. Um cão treinado racionalmente na efetividade sempre preferirá a pele ao pano dos apetrechos. Por isso, só deveremos usar um bite pillow que não tenha a adequada proteção para as mãos, se usarmos também um bite com mangas muito longas. Com a lingüiça presa através de cordões, poderá o figurante impor resistência à mordida do cão e trabalhar em nível de fair fight. Se as alças das extremidades de cada lingüiça forem colocadas para que possam se encontrar nas costas do figurante, este poderá segurar as duas com uma só mão e ter a outra mão para livre para o uso do bastão. É claro que o figurante não suportará por muito tempo tal situação, dada a desproporção entre a força do cão e a força que aquele pode fazer em tal posição. Mas, devemos levar em conta que, em um caso real, os órgãos genitais de um meliante não ofereceriam grande resistência. Se a mordida for direcionada à perna – de preferência a esquerda, uma adaptação com presilhas em uma outra lingüiça sem alças pode ser obtida. O importante é lembrar que essas presilhas ou qualquer outro dispositivo de adaptação não devem conter partes metálicas que possam quebrar os dentes do cão. Essa lingüiça deverá ter uns 23 centímetros de comprimento e uns nove de diâmetro. Treinamento inicial deve ter sido feito na posição vertical da lingüiça com outras lingüiças de menor diâmetro. Essas medidas não necessitam ser exatas. Outro acessório que pode substituir esta última lingüiça é o jumbier, quando elevarmos o nível da rapina para o fair fight, podemos usar com vantagem o jumbier até condicionar o cão a morder a perna, para posteriormente passarmos ao bite durante este último nível. Via de regra, não há a necessidade de qualquer adaptação com velcro de lingüiça à perna do figurante para direcionamento de ataque à perna. O uso do jumbier deve ser cuidadoso para evitar ofensas físicas ao figurante. O ideal é que o cão use uma coleira com alça para que o condutor conduza o focinho do cão até o acessório de mordida. 100 - TREINAMENTO INTEGRADO: Nas etapas anteriores moldamos a estrutura psíquica de um cão de guarda. Embora, exceto em situações especiais, sempre tenhamos procurado colocar os

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treinamentos de uma forma integrada, nesta etapa, iremos associar, de uma maneira mais objetiva e ampla, os dois principais fatores que regem um bom cão de guarda: disposição de proteger e obediência. Para tanto, tudo que foi ensinado nas etapas anteriores será agora de imensa valia, e só deveremos entrar nessa fase quando o cão estiver bem preparado nos treinamentos específicos que visavam justamente dar amparo ao que será ministrado nesta fase. Chegaremos, agora, ao cume de todo o ensinamento deste capítulo. Nesta fase não é mais necessário termos como figurante uma pessoa experiente, pois o cão deverá já estar preparado para enfrentar qualquer tipo de agressor, sem a preocupação de que venha, ou não, se assustar, bem como seus imprintings de mordida já devem estar formatados. Quanto mais pudermos variar as pessoas que representarão como cobaias, melhor. Caso nossa opção seja por um cão protetor deveremos dispor de pessoas outras que possam conosco colaborar para que o animal aprenda a conviver amigavelmente com estranhos ou, preferivelmente, de uma forma indiferente. Chegou o momento de conjugarmos os ensinamentos de obediência com os de ataque, ensinando ao cão o exercício do autocontrole, indispensável ao seu equilíbrio, principalmente no caso de cães protetores. Na verdade, os guardiões já estarão com seu trabalho concluso antes mesmo de iniciarem neste treinamento. Bastaria que realizássemos, de tempos em tempos, alguns feed backs, ou seja, alguns treinos adicionais. Nestes treinos, o ideal é que procedamos a cada dois ou três treinos um sem a utilização de bites, muito menos mangas e menos ainda linguiças. É indispensável a utilização de pessoas variadas na provocação. Uma boa fórmula é a cada três treinos, fazer um com bite, um com focinheira de ataque e outro apenas simples perseguição com o cão contido. Assim, não daremos associações ao cão de atacar somente com o uso de equipamentos. O que merece uma pausa para um esclarecimento paralelo seria o comentário de que se deve preparar a obediência antes de começar a se treinar o ataque. Isto é uma falácia e pode trazer um efeito negativo na coragem do animal, tendo em vista que muitos comandos necessários à obediência, se não compensados pela melhora na autoestima que o ataque proporciona, podem tornar o cão por demais contido para sua futura progressão no ataque. Os treinamentos devem ser feitos concomitantemente ou, no caso de treinadores muito experientes, nas mesmas aulas, pelo menos nos cães que não tenham sofrido traumas. O que não se deve permitir é que o cão torne-se um "alucinado" no ataque sem a devida contenção pelo dono em caso de necessidade de parar tal investida. Os cães guardiões de propriedades extensas e bem cercadas não têm necessidade de tal contenção, na medida em que não devem e não precisam sair da propriedade, exceto em casos de cuidados veterinários ou de acasalamento e com extremo cuidado. Cabe aqui um "gancho" decorrente do parágrafo anterior de que apenas em propriedades com bom espaço para a exercitação do animal deveremos ter um cão classificado efetivamente como guardião, radical ou não, tendo em vista deverem ser supridas suas necessidades de exercício e de passeio para cães que fiquem em propriedades menores. O autor usa a esteira de treino, mas boas esteiras são caras e as que não são caras não são boas. Deveremos agora dispor de uma guia longa de, aproximadamente, dez metros, duas guias curtas de, aproximadamente, um metro e vinte centímetros cada, uma coleira e um enforcador. Nesta etapa, não deveremos utilizar a vara na intensidade máxima de toque. O melhor é que exerçamos uma severidade variável de dez a setenta por cento da definida como máxima em termos de potência do braço de um homem normal, conforme disposto em "Toques do Bastão, como Graduar

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- O Ajuste Adrenérgico". Aliás, toque máximo só deve ser usado em prova específica para testar o cão como apto a ser reproduzido. Algumas poucas vezes, pode ser necessário o uso variável de 80% a 100% deste potencial para levantamento do drive de defesa até alcançar o estado de luta. Não deve ser uma constante no treinamento dos cães sob risco de ter um efeito paradoxal e inverso. Para os que não podem dispor de bite, a utilização da manga deverá ser, aos poucos, reduzida durante a evolução desta etapa, pois ela tende a viciar o cão. Embora reduzida, tal utilização não deverá, de forma alguma, ser eliminada, pois o animal necessita de vez em quando descarregar sua raiva, sob o risco de parar de atacar. Quanto mais utilizarmos-nos o toque com a vara ou com o bastão, mais precisaremos utilizar a manga. O uso desses objetos deve ser moderado. Devemos ter em conta que o objetivo do ataque é a carne e não o refil da manga. Portanto, menos utilização de vara equivale a menos utilização de manga e um cão mais eficiente, desde que se mantenha os drives de proteção. O uso do bite permite muito mais repetição da figuração. Mesmo assim, não são produtivos excessos nem muita carência do uso do bastão. Podemos, inicialmente, utilizar duas guias curtas ao mesmo tempo, uma ligada ao enforcador ativo e outra à coleira (se forem de cores diferentes para que não as confundamos, melhor. Daremos ao animal o comando “SIT”, e, após, o figurante ficará parado a uma distância de cinco metros do cão, que gradualmente, conforme evolução positiva, deverá chegar até um metro do cão sem provocá-lo. Quando o cão for atacá-lo, comandaremos o “NÃO”, se preciso com puxões no enforcador, mantendo o animal sentado. É preferível, em caso do cão insistir em não obedecer, aumentar a distância antes do que aumentar a energia dos puxões. Em outras palavras, inicialmente, é preferível diminuir o estímulo do que incrementar a repressão. Se o cão chegar a se levantar, repetiremos o comando “SIT” ou "DEITA". A um dado momento, após mantermos o controle da situação, daremos o comando “PEGA”, ao qual o cobaia, de imediato, responderá provocando o cão, que deverá atacar, sendo detido somente pelo bite ou pela manga, ou, no caso do figurante estar sem qualquer proteção, pela coleira, nunca pelo enforcador. Iremos alternando os comandos de “SIT” e “PEGA”, auxiliados pela atuação do cobaia, até que nosso amigo consiga diferenciá-los. Pode ser que nas etapas anteriores o cão já tenha assimilado o comando “PEGA” e o obedeça de imediato, mas só agora é o momento de nos fixarmos ainda mais nisso. Anteriormente, dávamos tal comando para que fosse, aos poucos, sendo assimilado, mas sem a preocupação de que o cão o aprendesse efetivamente. Isso, porque não poderíamos ensinar bem o “PEGA” sem lhe ensinar a ficar parado sem atacar. E tentar frear o ataque, antes de concluirmos as etapas iniciais, que ora nos amparam, não seria conveniente pelo risco de inibir demasiadamente o cão. A movimentação do cobaia deverá ir gradualmente diminuindo após o comando "PEGA", até que o cão ataque sob tal comando mesmo sem que o cobaia esboce qualquer reação. Colocaremos, de novo, nosso cão sentado, sob o comando de “SIT”, em local amplo. O cobaia aparecerá sem provocar o cão. Se o cão tentar se levantar, lhe daremos o comando “NÃO” seguido do puxão no enforcador que deverá, neste momento específico, estar atado à guia longa a qual seguraremos com “pouca corda”, ou seja, como se uma guia curta o fosse. Se o animal chegar a se levantar, o faremos se sentar novamente. O figurante se aproximará do cão, que permanecerá sentado, até uma distância de uns quatro metros, sem provocá-lo. A partir daí, o figurante começará a circular em volta do cão e, em dado momento, começar a encarar o cão, mas sem provocá-lo

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mais do que isso. O adestrador dará o comando “CUIDA”, de forma sussurrante, sem permitir que o animal saia do lugar. O cão não deverá tirar os olhos do figurante, mas não deve atacá-lo. Caso o cão não se “ligue” na presença do figurante, esse deverá se aproximar mais do animal, a fim de que se sinta mais ameaçado, quando do comando “CUIDA”, podendo, até, tocar no animal com a vara caso ele continue displicente (nesse caso deveremos obrigatoriamente permitir que o cão ataque). Desta forma, através do “CUIDA”, ensinaremos ao cão que algo está errado, o faremos se “ligar”, o faremos prestar mais atenção e ficar mais atento pois afinal, no cotidiano, não poderemos exigir que nossos cães fiquem permanentemente “ligados”. Muitos adestradores desprezam tal comando. Mas o consideramos de imensa importância e utilidade principalmente na proteção efetiva, pois aguçará momentaneamente a vigilância exercida pelo cão. Cabe comentar que alguns adestradores têm sua base cinotécnica nos esportes de proteção nos quais o cão já sabe que irá atacar e inicia automaticamente já pronto para isso. Na cinofilia efetiva, o cão não pode estar sempre ligado permanentemente em atacar, pois a cinofilia efetiva é para treinar o cão para situações da vida real e não para o esporte. Após circular em torno do animal, o figurante voltará à posição inicial e lá ficará parado. Daremos, ainda estando junto do animal, que deverá permanecer sentado, o comando “PEGA”. Se o cão não atacar, o figurante se agitará e o ameaçará a uma distância compatível ao comprimento da guia. Se o cão partir na direção do figurante, deveremos aumentar o alcance da guia longa, atrelada à coleira e não ao enforcador. Caso o cão não ataque, o figurante deverá diminuir a distância, e o condutor diminuir o comprimento da guia solta, e repetir a ameaça, assim que for dado o comando “PEGA”, nunca antes. Tal procedimento deverá ser repetido, encurtando-se distância, até que o animal ataque. Após isto ser conseguido, a distância deverá novamente ir aumentando e o procedimento repetido até que o cão proceda ao ataque a qualquer distância em que o figurante possa ser visualizado ou mesmo estando oculto. Após o comando “PEGA”, é conveniente que o cão efetivamente morda bite ou manga. Notem que este tópico é detalhado visando as dificuldades que podem ocorrer durante o treinamento de que ele trata. Um cão bem treinado nas etapas anteriores, provavelmente não apresentará todas as dificuldades ora comentadas. Talvez nenhuma. Na realidade, a guia longa, a um dado momento, deve ser dispensada no caso do figurante usar bite, devendo o ataque, neste caso, ser lançado. Ela é usada apenas no caso do figurante estar portando somente uma proteção menos ampla, no caso a manga. O comprimento dado à guia deve ser superior ao comprimento entre o condutor e a manga, mas inferior à distância entre o condutor a perna do figurante se o ataque for dirigido à manga. Levando-se em conta que a distância entre a manga e a perna do figurante é pequena, isso significa que o comprimento da guia deve ser preciso e que o condutor e figurante devem ficar atentos. Repetimos que nesta fase do treinamento, o ataque com uso de manga é altamente improdutivo e até prejudicial para o cão, caso queiramos direcionar a investida para local mais eficiente. Só utilizaremos de tal dispositivo na absoluta impossibilidade de obtermos um bite. Uma vez, chegando-se no nível de treinamento atual, jamais deveremos voltar ao uso da manga, caso pudermos usar de bite, ainda que bem mais esporadicamente. Fora isso, o retorno do uso da manga só se justifica no raro e excepcional caso de precisar voltar a corrigir a mordida do cão. Como estamos já realizando o treinamento integral, nos detendo na formação de um cão de proteção, é recomendável que pessoas estranhas, além das que façam o papel de cobaia, coloquem

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a manga no braço e circulem livremente por perto do animal indiferentes a ele. O figurante, neste momento, deverá provocar o cão até que este, “ligando-se” no figurante, acabe por não prestar atenção na pessoa que portar a manga. É normal que o cão se fixe na pessoa que porta a manga mais que no figurante. Isso pode ser corrigido se este último ameaçar o animal durante o processo, enquanto que o portador da manga comporte-se de maneira não-agressiva e de preferência, pelo menos inicialmente, não olhando nos olhos do animal. Pode-se iniciar dando a manga para que o dono do cão a coloque, depois um familiar, uma pessoa de suas relações, por fim, estranhos que não demonstrem agressividade. Toda vez que o cão fixar olhar para manga, o adestrador deverá dar o comando "NÃO", e o figurante deverá se movimentar de forma provocativa. A tal processo se chama “descanalizar o cão da manga”. Pode também ser feito para descanalizar de qualquer acessório de mordida, mesmo o bite. Neste caso, outra pessoa teria que vestir o bite e se comportar de forma neutra, enquanto o figurante atrai para si o cão. Veremos isso ainda neste item. Notem que o descrito no parágrafo acima recomenda o uso da manga em aparente contradição ao parágrafo anterior a ele. Só que no, último caso, a manga não será mordida pelo cão. Nesse sentido, a manga deverá continuar a ser usada de forma indireta, como mero instrumento ao qual o cão deverá, em princípio, desprezar. Havendo possibilidade, um treinamento similar poderá ser realizado com o uso de dois bites. O bite mais usado pelo cão deverá ser colocado por um estranho neutro, enquanto outro vestirá o bite ainda não estreado pelo cão. O mesmo treinamento explicado acima, na situação na qual um estranho que não provoca o cão coloca no braço a manga, valerá para o estranho que vestirá o bite sem provocar o cão. O cão deverá aprender a desprezar a presença do bite que já mordeu e se concentrar onde pode estar a ameaça apresentada como real. Devemos lembrar que o cão tem um faro muito superior ao nosso e poderá diferenciar um bite que já atacou de um outro mesmo que estivesse em total escuridão. Pode-se e deve-se fazer o mesmo fazendo que um estranho neutro vista o bite enquanto outro desprovido desse equipamento age de forma ameaçadora, e o cão deverá ser trabalhado de forma a que somente se atenha à situação de ameaça simulada. O treinamento de guarda dentro da propriedade que o cão é responsável pela segurança é algo recomendável, pois aprimorará ainda mais seu instinto de protegê-la. Parte do treinamento é recomendável que se faça fora do território do animal, onde alguém estranho, de preferência totalmente desconhecido do animal, atacará seu dono, para que o cão, assim, acostume-se a, de imediato, reagir. Esta última parte é essencial aos cães protetores. Mesmo podendo contar com o bite, a guia longa é de fundamental importância para mantermos o cão sob controle à distância e em situação periférica ao ataque. Com ela, poderemos treinar o controle do cão à distância. Mandá-lo sentar, deitar, ficar, vir, vigiar, atacar, interromper o ataque e soltar. O ideal é que todos esses condicionamentos já deverão ter sido formatados anteriormente, conforme já explicado em vários tópicos anteriores. A guia longa sempre deverá ser usada quando houver pessoas sem uso de bite envolvidas no treino ou este se realize em área não fechada ou pública. 101 - COMANDO "CUIDA". VANTAGENS: Conforme foi dito acima, muitos adestradores

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desprezam tal comando. Mas o consideramos de imensa importância e utilidade principalmente na proteção efetiva, pois aguçará momentaneamente a vigilância exercida pelo cão, o que pode ser de imensa valia por vários motivos: - O cão poderá mais prematuramente identificar o potencial agressor, avaliá-lo e ganhar tempo precioso com isso; - O cão, no caso da situação de perigo se concretizar, terá tempo de melhor se preparara psicologicamente e evitar o fator surpresa, que sempre traz certa insegurança ao cão e pode também ser decisivo no sucesso da proteção; - O agressor ao perceber a postura vigilante do cão poderá desistir da agressão (nas situações em que isso for mais provável); - Como o comando “CUIDA” fica a critério do condutor, este poderá dar tal comando em voz baixa sem que o suspeito perceba e o cão se prepara. Isso facilitará que o comando “PEGA” também possa ser dado em voz baixa, o que aumentará a surpresa contra um possível agressor, materializada no ataque imprevisto do cão (isso porque o comando de ataque em voz alta alerta também o atacado); - Se o suspeito tinha intenção de neutralizar o cão antes do ataque ao seu condutor, a postura defensiva do cão irá dificultar tal tarefa; - O cão aprenderá a diferenciar as situações reais de perigo mediante o aprendizado do “CUIDA”. Desvantagens do aprendizado do comando “CUIDA” fora do mundo da ficção e das teorias: não conseguimos vislumbrar nenhuma. 102 - ATAQUE LANÇADO: Sempre que houver a possibilidade do uso do bite, o ataque deverá ser lançado, o que, em outras palavras, significa ataque com o cão solto. Alguns figurantes só dispõem de manga e, talvez, de uma jardineira (nome correto do macacão sem mangas, com proteção apenas nos membros inferiores e na parte anterior do tronco e com suspensórios) de couro. Neste último caso, se o cão for realmente eficiente na prova de ataque, o figurante ainda correrá grande risco, podendo ser ferido gravemente pelo animal. Quando nos referimos a “cão realmente eficiente”, não estamos nos reportando àqueles, por vezes até campeões em algumas provas de temperamento, mas que mordem exclusivamente a manga, e, sim, àqueles que distribuem mordidas com grande impacto em quase todos locais possíveis ou que estão direcionados para pontos específicos, como panturrilhas ou área genital. Sempre será preferível que não utilizemos a manga por mais tempo que o necessário, pois, o cão se habituará, por demasia, a mordê-la acabando por não se acostumar em morder em outros lugares do corpo, sendo, assim, presa fácil para assaltantes conhecedores do assunto, que com uma manga e uma adaga, matarão sem dificuldade qualquer cão que proceda tal tipo de ataque. Em verdade, só teremos cães efetivamente muito bem condicionados se dispusermos de um bite. Felizmente, hoje, disponível por um preço razoável no mercado nacional. Pode-se treinar cães efetivos apenas com um jambier, mas quem irá fazer ataque lançado apenas com um jambier? Seria confiar demais que o cão esteja focado somente na perna... De extrema importância, lembrar, que para se fazer um ataque de maior risco como é um “ataque lançado”, sem o devido equipamento, indispensável que o figurante seja maior de idade, com emocional seguro, bons reflexos e preparo físico, de preferência, iniciado nas artes marciais, onde deverá ter adquirido as condições para tanto, e, mesmo assim, que o dono do cão esteja por perto

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e pronto para socorrer o figurante caso seja necessário. O figurante ou o cobaia, outrossim, deverão possuir força e peso corpóreo compatíveis aos do animal, do contrário poderá ser lançado ao solo e ficar indefeso a seus ataques. Um figurante de aproximadamente cinquenta e cinco quilos provavelmente se verá em uma situação desagradável ao realizar uma prova de “ataque lançado” com um molosso de sessenta e cinco quilos. Se um cão fila brasileiro, por exemplo, fizer o ataque dentro das características de sua raça, ou seja, puxando para baixo, com toda a violência, a manga, e o figurante não tiver o imediato reflexo de largá-la, ainda que pese bem mais que o animal, provavelmente será jogado no chão, exposto a todo tipo de mordida. Para ataque lançado com bite com cão com tais características, o ideal é o uso do "escafandro", isto é, o bite mais um capacete de motociclista. Melhor ainda se usar polaina de material resistente, além de coturno. É evidente que fazer ataque lançado em manga em cão canalizado para outra parte do corpo ou em cão com capacidade de arrancar tal acessório do braço de quem o segura é total insensatez. Um bom figurante, no que se refere à formação do temperamento, é ainda mais importante que um bom adestrador. Deve ser pessoa valente. Valente o suficiente para mostrar ao cão um medo que não deverá ter ou, pelo menos, saber, muito bem, controlar. As demonstrações de medo por parte do figurante são importantíssimas ao desenvolvimento da segurança do animal. Durante todas as etapas, o figurante deverá improvisar fugas às quais o animal participará como perseguidor. Uma maneira de trazer mais segurança ao ataque no qual não haja o uso do bite suit, é medir o comprimento da guia e fazer duas marcas no chão. Numa delas deverá ficar o condutor e na outra o figurante. A marca onde ficar o figurante deve ficar em um ponto equidistante entre seu braço com a manga e seu corpo. Extremo cuidado deve ser tomado para que a distância não fique curta demais e o cão seja impedido violentamente pela guia, com possíveis sérios reflexos no seu temperamento e até com a possibilidade de morte por fratura do pescoço. Para minimizar tal chance, é melhor usar peitoral ao invés de coleira. Mas, o impacto do peitoral, embora não cause trauma cervical, o fará em nível torácico e lombar. Mesmo com essa precaução, o uso de uma guia de material mais flexível ou de uma mola como dispositivo amortecedor deve ser feito. O bite evita todos esses problemas, além de propiciar uma maior variedade e, conseqüente, imprevisibilidade do modo e da parte do corpo onde se efetuará o ataque, tornando-o muito mais eficiente. Como foi dito anteriormente, a guia deve terminar em um ponto intermediário entre a manga e o corpo do figurante. Durante o treinamento integrado, o ataque lançado será realizado somente soltando o cão contra o figurante que deverá ficar a uma distância relativamente considerável. Isto só deverá ser efetuado quando sentirmos total segurança no animal em relação a seu temperamento, pois a figura do dono ou adestrador, que, de certa forma, encoraja o animal, não estará mais tão perto. A segurança no ataque lançado se evidencia mais quando o cão foi treinado mais com base no drive de caça ou que alcançou a defesa resoluta. O ataque lançado acontece quase que exclusivamente sob a égide da rapina. Isso não significa que o cão não possa entrar em luta no ataque lançado. Durante o treinamento referido neste tópico, se só dispormos de manga para o treino, o trabalho só deverá ser realizado após conseguirmos total obediência com a guia longa ou o cão for focado somente no antebraço. Vide "Treinamento com Guia Longa" e "Treinamento com Guia Longa. Parte II". Mesmo com o uso do bite, devemos ter a preocupação de modular ímpetos e obediência à distância. Um bom adestrador deve agir como juiz ao equilibrar as balanças entre os drives de rapina e de defesa com o paradrive de obediência.

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O ataque lançado, em suma, nada mais é do que um ataque no qual o cão corre do ponto onde está, desacompanhado do condutor, e ataca o figurante. A primeira forma de realizar o ataque lançado é simplesmente, após ordenar o “SIT” ou o “DEITA”, ordenarmos o “PEGA”. O cão deverá atacar o figurante, até que comandemos o “SOLTA”, se e somente se o figurante parar seus movimentos. Para isso podemos nos aproximar do cão. Quanto mais próximo do cão chegar o condutor, maior será a pressão para a obediência e, portanto, mais fácil será exercê-la. A segunda forma, mais avançada, iniciará com o comando para que o cão sente ou deite, como na anterior. Só que, nesta forma, o condutor se afastará do cão, e este deverá se manter imóvel. O figurante também ficará imóvel. O condutor, decorrido um período, ordenará o ataque, e o cão deverá atacar. Após, o condutor ordenará que o cão solte, também a distância e, se e somente se, como anteriormente, quando o figurante não mais reagir ao ataque. Por fim, o condutor chamará o cão, que deverá ir até o condutor. Comandar o “SOLTA” à distância exige muito maior dedicação e um condicionamento de soltar muito mais apurado. No entanto, não há segredo em fazer isso. Será somente nos afastarmos gradualmente do cão à medida que damos o comando de soltar e reforçarmos esse paradrive se for o caso voltando às etapas anteriores. Entre essas duas formas, da menos à mais complexa, pode haver uma forma intermediária que seria o cão ser comandado à distância, mas soltar somente com a presença próxima do condutor. Falamos nessa forma intermediária, pois é muito mais fácil deixar um cão à distância sem atacar do que fazê-lo soltar à igual distância. Sendo assim, talvez, o dono do cão só veja necessidade de comandar à distância o cão atacar, podendo chegar junto a este para mandar soltar. Por fim, devemos esclarecer que no comando de ataque no qual o condutor se coloca à distância do cão, via de regra em um cão com bons drives, a dificuldade não está em fazer o cão atacar ao comando, mas, sim, deixar de atacar. Podemos observar que pouco foi comentado neste item, pois quase tudo necessário ao ataque lançado já foi devidamente estruturado nos itens anteriores e um cão que chegue a esta etapa bem formatado anteriormente passará por essa com relativa facilidade. 103 - RINGUE EFETIVO - TREINAMENTO PARA: Inclui as técnicas de treinamento com bite e mais uma diversidade de técnicas outras para que o cão suporte a pressão psicológica e esteja preparado para o imprevisível. No ringue, qualquer artifício que venha a assustar o animal é utilizado dentro dos limites de não feri-lo, nem afetar sua visão, audição ou olfato. Choques elétricos não são permitidos. Bombinhas são jogadas em meio ao ataque lançado; ruídos de chocalhos estrondosos ou estridentes; apitos; cornetas, etc. podem ser usados; mangueira com jato d'água; cadeiras de plásticos podem ser lançadas pelo figurante à frente do cão que investe (não sobre o cão); obstáculos diversos; toques com o bastão; outro figurante que surpreende e interrompe ataque do cão, etc. Ou seja, tudo que simule uma situação real em que um malfeitor use de todos recursos possíveis para se livrar do ataque de um cão, havendo, no entanto, a preocupação de não feri-lo durante a prova. É impressionante como um simples chocalho bem barulhento pode afugentar um cão que suporta com rigor máximo o toque com o bastão, se este não for condicionado para tanto. A bolinha e outros recursos podem ser usados como foco principal durante todos esses treinamentos.

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A situação com a qual o cão deve se acostumar deve aparecer inicialmente de forma coadjuvante, quase subliminar. O condicionamento para que o cão não se intimide com o chocalho, no entanto, é o mais simples possível. Basta que se comece com o mesmo a lentamente acostumar o cão com seu som, usando-o de maneira mais branda e com menor ruído que será aumentado progressivamente. Devemos usá-lo nos momentos em que nos divertimos e damos iscas ao cão, ao chamá-lo para perto do chocalho, e onde o cão está descontraído, até o levar ao treinamento junto ao ataque. Um chocalho é facilmente construído com um pequeno galão vazio com alça para segurar, onde se coloca algum cascalho. Pode ser de plástico ou de lata, preferivelmente um de cada tipo, pois emitem sons diferentes. Dois galões com pedregulhos dentro batidos um contra o outro fazem muito barulho. As bombinhas devem ser precedidas dos "estalinhos", para que o cão se acostume. Depois, colocadas inicialmente a uma distância maior que, aos poucos, deverá diminuir. Sempre, de início, em momentos de maior descontração para compensar o susto que causam e não serem associados a momentos tensos até que bem os cães a eles se acostumem. Depois, aos poucos, irem servido de fundo nos adestramentos. "Cabeções" (bombas maiores) não devem ser usados e são proibidos por danificarem o tímpano dos animais. Pisos de brita devem ser colocados para que o cão se acostume a andar sobre eles. Jatos d'água também devem ser usados com fluxo crescente e apenas no calor até o cão se acostumar com eles e em meio a brincadeiras até serem levados ao treinamento de ataque. Jatos de ar devem ser iniciados com fluxo mínimo até os cães a eles se acostumarem. A estes últimos, deve o cão se acostumar mais cedo. No geral, não há idade máxima ou mínima para que um cão se acostume com sons e a maioria dos recursos usados no ring. Jatos de ar ou de água com muita pressão podem cegar animais. É bom disso nunca se esquecer para não exagerar em nada do que for feito. Obstáculos, como uma cortina com latas penduradas, podem ser colocados dentro do canil ou em local por onde o cão obrigatoriamente tenha que passar, até se acostumar com sua presença. Podendo, sem problemas, serem usados nas fases mais iniciais do treinamento de guarda. Sempre começando do mais simples e menos "assustador". Uma das etapas do ring efetivo consiste em atar através de um cordão várias latas e chocalhos à coleira do cão. Isso será usado em um ataque lançado. Este cordão deve ter comprimento tal que só comece a arrastar as latas quando o cão estiver em plena investida. Na mesma linha, começaremos acostumando o animal com objetos menos barulhentos e gradualmente os trocaremos por objetos que causem maior sonoridade. Guarda-chuva: uma das provas que assusta muitos cães valentes é a abertura de um guarda-chuva automático às suas frentes. O treino para que o cão se acostume com a abertura do guarda-chuva é fazer a abertura lentamente com um guarda-chuva não-automático, e aumentarmos de forma gradual a velocidade de abertura. Devemos lembrar que o cão enxerga em preto-e-branco, e que o treinamento deve ser feito com um guarda-chuva claro e outro escuro. Tudo, sempre em clima de brincadeira, com elogios para o cão.

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Existem pisos instáveis e outros diversos recursos mais variados e imaginativos. O importante é mantermos a filosofia de que tudo deve ser apresentado de forma gradual e em clima descontraído, de preferência bem alegre. Que a atenção do cão deve ser desviada para outro evento ou objeto, como uma bolinha, uma isca, etc. Que jamais deveremos iniciar tais treinamentos junto com defesa e, sim, em meio a um fair play, para, depois, evoluir para rapina e, se for o caso, bem depois, defesa. Alguns podem arguir: “Em verdade, não estamos acostumando o cão com diversos fatores negativos e não lhe aumentando a coragem?”. Sim, em parte sim e em parte não. Isso porque realmente estamos acostumando o cão gradativamente aos supostos perigos, mas, por outro lado, esse tipo de condicionamento o torna realmente com mais coragem. O trabalho de todo este capítulo é sobre treinamento e não sobre seleção genética. Mesmo assim, é claro que nem todos os cães, mesmo sendo treinados conforme recomenda este capítulo, não irão se tornar bons cães de guarda, portanto, o treinamento é também um modo de seleção desde que selecionemos isso no momento da reprodução. O que muda é que iremos ao máximo buscar toda a capacidade em termos de drives e obediência que um cão pode oferecer. 104 - TREINAMENTO AVANÇADO COM BITE - CÃO DE ASSALTO: Não há nada de especial no treinamento desses cães, exceto uma maior ênfase ao ataque lançado e a exigência de um bom drive de rapina. O treinamento lançado com bite é o ideal. Outro treinamento ainda melhor seria o de ensinar cão a aprender a largar uma de suas presas quando atacado por outra. Para isso, seria recomendável, embora nem todos tenham recursos para tanto, o treinamento com dois figurantes munidos de bite e bastão. Esta última modalidade é de grande utilidade para o treinamento de qualquer cão de guarda, não somente os de assalto. Como Conseguir? O fundamento básico de o cão ter a capacidade de enfrentar de uma só vez duas ou mais pessoas é o treinamento do reflexo de largar a presa assim que for atacado por outra, ou, melhor ainda, na iminência disto acontecer. Para tanto, facilitará bastante que tenhamos moldado anteriormente a atitude do cão largar a bolinha, a lingüiça, a manga ou o bite desde o início do treinamento, sob comando ou trocando um apetrecho por outro. Ver também “Lingüiça e Troca de Pegada”. Todo treinamento, desde início dos primeiros imprintings, das primeiras brincadeiras, do levantamento do drive de rapina, desde o primeiro fair play até a luta, visavam ter um cão que pudesse alcançar tal ponto de adestramento. A insistência, por vezes, até irritante de cada detalhe, tinha, desde o início, tal objetivo. Com certeza, um cão após exacerbar sua rapina ou sua defesa antes de adquirir atitudes comportamentais estáveis em relação à obediência ou cuja formação iniciou pelo drive de defesa dificilmente chegará a tal sucesso. Quando orgulhosos de nossos cães adultos vigorosos e eficientes, é bom lembrar que tudo isso devemos ao nosso filhotinho que alguns meses ou anos atrás que perseguia uma bolinha de forma inocente e a trazia até nós para que jogássemos outra bolinha ou simplesmente para nos alegrar, sendo sempre devidamente recompensado com nossos afagos e elogios. Assim que outro figurante se aproximar do cão daremos o comando de "SOLTA", que deverá ser

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seguido do comando "PEGA", assim que este chamar mais para si a atenção do cão, por seus movimentos ou grau de ameaça, enquanto o primeiro figurante se paralisa. É importante que o figurante, ao qual o cão atacou, pare imediatamente de exercer resistência ou tocar o cão com o bastão antes do comando "SOLTA" ser dado. Com o tempo, é esperado que o cão aprenda sozinho a abandonar o figurante que não reaja e dirija o ataque ao que o ataca. Outro elemento positivo é a introdução da focinheira com mordente no treinamento. Para isso, utilizaremos uma focinheira especial, bem atada ao animal, na qual haja uma parte que é mordida pelo cão. Este dispositivo para morder nos dá tripla vantagem. Do ponto de vista fisiológico, o cão com a boca mais aberta respirará melhor - já que o mordedor não veda toda a boca, correndo menor risco em sua saúde. Do ponto de vista psicológico, o fato de estar mordendo algo é positivo para que o cão suporte melhor o ataque, pela sensação de estar revidando. Do ponto de vista de segurança para o figurante, fará com que o cão se contente com a mordida que exerce e diminua as chances que querer se livrar da focinheira. O ataque lançado com focinheira e sem manga ou bite, apenas um simples macacão de schutzhund, para proteger o figurante das unhas do animal, retira do cão a ideia que só deve atacar linguiças, mangas ou bites e lhe dá melhores reflexos. O ataque a dois figurantes, como visto logo acima também pode ser realizado com metodologia similar com o uso de focinheira de ataque. Devemos advertir que cada treinamento com focinheira de treino deve ser restrito a um tempo muito curto e a pouquíssimos ataques por treino. Caso não se disponha desse tipo de apetrecho, e venha-se a usar focinheiras comuns, é bom saber que só podemos usar aquelas que dêem bom espaço para o cão abrira a boca e sejam bem ventiladas. No caso de focinheiras comuns, o tempo de cada lançada, que com uma focinheira de treino seria no máximo vinte segundos irá se reduzir para, no máximo, seis segundos. Um detalhe importante é que não se use a focinheira de treino apenas em treinos. Isso poderá condicionar o animal saber que sempre que coloca tal artefato sempre deverá atacar. Por fim, se não dermos passeios e acostumarmos o cão de alguma forma com a focinheira em outros momentos que não somente nos treinos de ataque, será menos eficaz sua função de descanalizar o cão do bite. Não deixem de ler: “Ataque em Dupla”, “Ataque contra Dois Figurantes” e “Dois Cães Versus Dois Figurantes”. 105 - FOCINHEIRA PARA TREINO – COMO DEVE SER E USOS: Ver também “Treinamento Avançado com Bite – Cão de Assalto”, onde consta grande parte do assunto deste tópico. O objetivo das focinheiras de treino é sempre o mesmo: descanalizar o cão de atacar somente bites, mangas e outros apetrechos. No entanto, colocá-las somente no momento do ataque, significa, por outro lado, poder condicionar o cão para que ataque somente os apetrechos de mordida ou quando do uso de focinheira. Para que isso não aconteça, devemos usá-la em outros momentos, tendo em mente que focinheiras sempre são dispositivos que, de uma forma ou de outra, limitam a respiração e a homotermia do cão. Portanto, nunca devemos usá-las em momentos de calor ou com atividade física intensa ou mesmo moderada se o tempo não for muito curto.

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Existem dois principais tipos de focinheira de treinamento: as com mordedor interno e as sem mordedor interno. O ideal é que o cão use os dois tipos para se descondicionar ao máximo. Mas, se tivermos que escolher um dos tipos, obviamente a com mordedor interno é muito mais preferível e útil. Conforme vimos no tópico anterior, o mordedor interno pode aumentar em aproximadamente até três vezes o tempo de ataque em cada lançada. Poderá também aumentar o número de lançadas de duas para três ou quatro por treino. Digamos, para focinheiras comuns, duas ou três lançadas de 5 segundos. Para focinheiras com mordentes, quatro a cinco lançadas de 15 segundos. O objetivo do mordedor interno é dar a segurança psíquica ao cão de que esteja mordendo e, portanto, reagindo ao castigo imposto pelo figurante. Os instintos básicos responsáveis pelos drives e que norteiam todo o ataque, respondem melhor quando o animal morde seu inimigo ou, pelo menos, tem a sensação de estar mordendo algo. Consideramos o treinamento esporádico e racional com focinheiras de ataque necessário para completa formatação de um bom cão de guarda, que deve estar totalmente descanalizado de qualquer apetrecho usado pelo figurante. 106 - FARO BAIXO E FARO ALTO: Existem duas formas básicas de um cão farejar: faro baixo e faro alto. Faro baixo é aquele em que o cão captará o odor deixado por um indivíduo sobre o solo. Tal odor, totalmente imperceptível para nós humanos pode ser captado por cães e outros animais. Se não houver chuva para lavar o terreno, esse odor ficará por certo tempo impregnando o caminho pelo qual o indivíduo passou de forma a ser percebido por um cão. Esse tempo é relativo ao tipo e a intensidade do odor; à capacidade de cada cão; ao tipo do terreno; às condições climáticas, e será inversamente proporcional à velocidade com a qual o indivíduo se locomoveu e ao tempo que se passou desde que tal indivíduo passou. Com condições favoráveis, tal tempo poderá ser relativamente longo, e um bom cão rastreador poderá seguir a trilha de um fugitivo muitas horas após este haver passado por ela. O faro baixo equivale à atividade conhecida como rastreamento. É útil para localizar fugitivos, pessoas perdidas, movimentos anteriores de tropas inimigas ou de pessoas estranhas em locais privados, etc. O faro alto, por sua vez, é usado pelos animais e até pelo homem para farejar o ar. O odor exalado pelo indivíduo é captado diretamente no ar e não no chão onde ele se impregna. O faro baixo tem como vantagens seguir ou perceber o deslocamento de pessoas várias horas após estas haverem passado por um local, enquanto o faro alto é inútil para localizar pessoas ou animais que passaram há menos de alguns minutos por local aberto. Outra fragilidade do faro alto é que ele não funciona se o indivíduo a ser localizado estiver na direção oposta de onde vem o vento. O faro baixo localiza tanto inimigos próximos como os que já passaram pelo local há várias horas onde está o cão. Por isso, pode ainda ser usado contra o cão e seu parceiro humano se o inimigo souber estar sendo seguido e der uma grande volta para emboscar por onde já passou, pois poderá prever com exatidão por onde passará o cão algum tempo após.

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A vantagem do faro alto é localizar indivíduos próximos e evitar emboscadas, tendo nisso como única fraqueza o vento não ser favorável. Outra enorme vantagem do faro alto é que o cão tem a ajuda dos olhos para localizar o inimigo, enquanto que no faro baixo seus olhos estão voltados ao chão. Cães bem treinados nos dois tipos de uso do faro, mesmo usando do faro baixo, podem se valer do faro alto ao perceber que o odor do inimigo impregna mais fortemente o ar. Isso significa que o rastreado está perto, e o cão irá tirar as narinas do solo e elevá-las para tentar farejar em que direção está o indivíduo em questão e enxergá-lo. Na guarda civil efetiva de propriedades urbanas ou na proteção ao condutor, não há quase uso para o faro baixo, havendo uma maior utilidade para o faro alto. Mas, na proteção de grandes propriedades e no uso militar ou policial, o faro baixo também é de grande serventia. 107 - FARO ALTO. TREINAMENTO: Uma maneira saudável e divertida de treinar estes cães será a de quando ainda filhotes, a partir de uns três meses e meio de idade, fazer com que o dono do cão se esconda e alguém da intimidade do animal perguntar-lhe-á com voz interrogativa, em tom amigável: “CADÊ O FULANO?” seguido do comando "BUSCA". De início, o dono do animal deverá se esconder em local facilmente localizável. A dificuldade, gradativamente, deverá ir aumentando. Em etapas posteriores, uma roupa usada do dono deverá ser dada para o cão cheirar ao mesmo tempo em que é dito: "CADÊ O FULANO?". Terá a função de fazer o cão associar a apresentação do cheiro de seu dono e o ato de buscá-lo, fixar seu nome e acostumar-se às situações posteriores. Muita festa e bajulação devem se seguir ao momento em que o dono é encontrado. O comando "BUSCA" deverá ter um tom mais sério e ser dito entre o a interrogativa sobre onde está o dono do cão. Esses treinos devem ser feitos em locais abertos e de preferência fora do território, onde o cão se sente mais inseguro de ficar sem o dono e seu interesse de achá-lo é maior. Com o tempo, alguém da intimidade do animal se esconderá e seu dono lhe perguntará: “CADÊ O CICRANO?”, seguido de "BUSCA", dando para o cão cheirar uma roupa da pessoa. O ideal é que façamos isto de maneira descontraída em meio aos passeios em áreas verdes. Quando o cão encontrar a pessoa amiga, esta e o dono do cão deverão elogiar o animal. Podemos realizar o treinamento usando todas as pessoas da família e suas peças de roupas, repetindo sempre o mesmo procedimento, em um clima de grande alegria e descontração. Sempre tendo o cuidado de associar o ato de cheirar as roupas ao ato de buscar as pessoas. Mais adiante utilizaremos pessoas estranhas. Caso o cão não ataque o procedimento será idêntico aos anteriores, tendo-se, inclusive, sempre o cuidado de dar para que o animal fareje uma peça de roupa da pessoa. As únicas e importantes diferenças é que apenas o dono festejará o sucesso do animal, nunca a pessoa encontrada, e que ao invés de “CADÊ O ...”, diremos apenas: “BUSCA”, após o animal cheirar a peça com o cheiro da pessoa. Se o cão já atacar, deveremos ter o cuidado de que a pessoa esteja protegida, em cima de alguma árvore, por exemplo. Se quisermos que o nosso amigo apenas localize sem atacar, daremos a ele, se necessário, o comando “NÃO” se ele mostrar tal intenção e elogiá-lo pela descoberta. Se quisermos que ele ataque, deveremos concluir o trabalho com o comando “PEGA”. Se quisermos realmente que o cão ataque logo ao avistar o rastreado, bastará orientar este para que, vestido de bite, provoque o cão assim que for encontrado. Neste caso, a pessoa poderá até ser um cobaia, caso o cão já tenha uma boa mordida. Deveremos

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realizar tal trabalho com pessoas diversas bem protegidas pelo ambiente, mas sem manga ou bite, para que o animal não se habitue a procurar o rastro desses objetos (que tem seu odor próprio) e sim da pessoa. Quanto mais pudermos variar o universo de nossos colaboradores, melhor. No caso de combinarmos a busca com o ataque deveremos sempre lembrar que o cão, a partir de tal treinamento, sempre atacará a pessoa encontrada e do perigo de brincadeiras. Por isso é que só recomendamos estes cães para forças militares, policiais, profissionais de elite, esportistas muito criteriosos ou grandes propriedades muito bem cercadas e com mais de um portão sucessivo entre o local onde fica o cão e a via pública. Um modo de enganar e treinar o cão é esconder o bite em um local e a pessoa esconder-se em outro, que obviamente precisará ser seguro, pois não poderá usar de nenhum apetrecho de segurança, pois todos exalam forte odor. Outra opção é o uso de focinheira de ataque. O trabalho com focinheira de treino é essencial para que o cão possa atacar pessoas que não tenham dispositivo de proteção após localizá-las, se essa for nossa intenção. Não devemos ler esse tópico sem antes ler “Treinamento Avançado com Bite – Cão de Assalto”. Por uma questão de segurança, este tipo de treinamento só poderá ser realizado longe de vias públicas, para que o cão não acabe sendo atropelado, ou para que não possa vir a atacar algum transeunte. Após termos muita segurança em relação à capacidade de nosso cão, que deverá obrigatoriamente antes ser socializado, poderemos permitir que pessoas outras venham a participar do treinamento de forma passiva, ou seja, para que fique indiferente em relação a elas. Nesse caso, inicialmente deixaremos o cão atado à guia e o acompanharemos até podermos estar seguros de que o animal não atacará ninguém além daquele que busca. Mesmo assim, devemos advertir que tal trabalho é de alto risco, pois o cão pode se confundir e atacar quem não está preparado para tanto. Cremos que o uso de focinheira de ataque seja uma boa e profilática medida. Devemos, também, saber que não são todos os cães que poderão realizar bem tal tarefa, pois ela está limitada à capacidade de faro do animal e que, por vezes, por melhor que nosso amigo seja em obediência, temperamento e inteligência, poderá nunca poder chegar a ser um grande farejador. Isto não impede, no entanto, que venha a apreender e buscar pessoas em locais não muito grandes procurando-as não só com o faro, mas também com a visão. Esse treinamento poderá vir a ser útil no caso de escutarmos algum barulho suspeito durante a noite. No entanto, voltamos a lembrar, que um cão com tais características combinadas ao ataque não poderá de forma alguma ser conduzido por crianças ou pessoas despreparadas, pois uma simples brincadeira poderá ter consequências muito desagradáveis, e a culpa, de forma alguma, poderá ser atribuída ao animal, muito menos à sua raça. Cabe lembrar que o faro alto só pode ser exercido em distâncias curtas de até aproximadamente 50 metros. 108 - FARO BAIXO. TREINAMENTO - CÃO DE RASTREAMENTO: Este treinamento pode ser feito solicitando que alguém coloque iscas (salsichas cortadas transversalmente são excelentes para esse caso) inicialmente de 25 em 25 centímetros sob a grama em terreno gramado. Depois, aumentaremos a distância para 35 em 35 centímetros, 50 em 50... fazendo uma trilha com iscas, na qual, por pisarmos no local, deixaremos nosso rastro. Conforme a distância for aumentando,

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esse é um trabalho cujo tempo de sucesso varia muito de cão para cão. O cão se acostumará a procurar cada isca disposta na trilha, e o recurso associativo e mais fácil para tanto será seguir o rastro deixado pela pessoa que o fizer. Inicialmente, usar uma pessoa cujo odor seja conhecido pelo cão ajuda muito. Se for o figurante, o qual o cão mais está acostumado a atacar com bom drive de rapina, tanto melhor. É óbvio que o terreno não pode haver sido caminhado anteriormente pelo o figurante, isto é, ele não poderá ter anteriormente em prazo menor do que alguns dias ter se deslocado pela área, só o fazendo quando distribuir as iscas e não retornará pelo mesmo caminho ou por caminho próximo ao que largar as iscas. No primeiro treino, poderemos começar dispondo as iscas de 25 em 25 centímetros para no final da trilha (de uns 50 metros) estarem dispostas de 35 em 35 centímetros. No segundo treino, poderemos começar com 25 em 25 centímetros e progredir numa trilha de 70 metros até que as iscas distem 50 centímetros uma das outras. No terceiro, iniciamos distando as iscas de 35 em 35 centímetros progredindo até alcançarmos uma distância de 60 em 60 centímetros por um percurso de 90 metros. Após iremos aumentando a distância entre os petiscos e a distância total até podermos colocar as primeiras iscas distando dois metros uma das outras para chegarmos às últimas a distâncias de quinze metros de distância entre as iscas em percursos de 500-1000 metros que não devem ser sempre retos. Poderemos depois substituir pequenas iscas por iscas maiores colocadas distando 20-100 metros em percursos de quilômetros. O objetivo final é não colocar mais isca nenhuma exceto no fim do percurso onde o cão será brindado com um pequeno prato de petiscos gostosos. Se o objetivo final for de que o cão ataque, antes da porção de salsichas, deverá ocorrer o ataque, quando o figurante já estará esperando com bite. Mas, é importante que o bite já esteja colocado no local sem que o figurante o leve durante a trilha, pois não é o cheiro do bite que deve ser seguido e, sim, o do figurante. Outro fator a ser modulado é a velocidade na qual a pessoa dispõe as iscas. Inicialmente deve caminhar devagar na trilha, deixando maior odor impregnado nela. Dias de vento um pouco mais forte não são recomendados inicialmente nem para colocação das iscas ou mesmo para o rastreamento. Dias chuvosos também não são recomendados. O tempo entre a elaboração da trilha e o começo do rastreamento também deve variar de quinze minutos iniciais a algumas horas. É importante que o cão não esteja presente no local no início da elaboração da trilha. Uma roupa usada recentemente pelo figurante deverá ser dada ao cão para que cheire com o comando "BUSCA". A roupa já deverá estar no início da trilha e não vir no mesmo veículo (só se for no porta-malas) que o cão nem ser trazida ao local junto com ele. Se soubermos onde estará escondido o figurante, poderemos dar o comando de "PEGA", o qual se o cão já for treinado também no faro alto - o que é conveniente, automaticamente deverá iniciar tal modalidade (mais competente para localizar pessoas próximas). Um cuidado que deveremos ter é o de utilizar, pelo menos inicialmente, trilhas feitas em locais ermos, elaboradas, preferencialmente, no fim da madrugada para que o cão as siga no começo da manhã. Outras pessoas que tenham feito bite com o cão, por algumas vezes, devem fazer trilhas. Por fim, pessoas totalmente estranhas para o cão dentro do trabalho de rastreamento com ataque.

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Já, se o objetivo é termos um cão que ache pessoas simplesmente desaparecidas, podemos começar com o dono do cão, seguido de pessoas da família, pessoas conhecidas, até chegarmos a estranhos. No encontro dessa pessoa, ao invés do ataque, muito agrado e iscas gostosas devem ser ofertados. O grande problema associado ao treinamento para faro baixo é que praticamente inviabiliza o condicionamento do cão não comer iscas, nos treinamentos anti-envenenamento. Há que se analisar o local onde o cão fica exposto à possibilidade do crime do cão ser envenenado e a necessidade do aprendizado de rastreamento. Um cão exposto a ser envenenado, ainda mais que trabalhe em buscas policiais - com todo ódio que isso vai causar a bandidos - e fragilizado por não possuir condicionamento a não comer iscas no chão, quase que certamente, mais cedo ou mais tarde, será envenenado. Tais cães devem ser mantidos em locais bem protegidos. Outra dica é que cães recém alimentados não terão boa disposição para qualquer trabalho de faro, alto ou baixo. 109 - RASTREAMENTO - UTILIDADES NA BUSCA E CAPTURA - TREINAMENTOS ASSOCIADOS: Um trabalho complementar, desejável para um cão policial de trabalho, é o de busca. Podemos realizá-lo de duas formas: Na primeira, o cão simplesmente localizará o elemento procurado. É o trabalho para encontrar crianças desaparecidas e afins. Na segunda, localizará e atacará. É o trabalho para encontrar fugitivos perigosos ou invasores. Obviamente que no segundo tipo de missão o cão obrigatoriamente necessitará de um trabalho prévio de ataque. Essas alternativas geralmente são utilizadas no trabalho de faro baixo, mas não são inviáveis também no faro alto. Existiria uma terceira forma de o cão atuar. Seria aquela em que o cão dominaria o fugitivo, imobilizando-o, sem, no entanto, causar-lhe maiores ferimentos. Há duas maneiras de treinar o cão para tal mister. Na primeira, ensina-se o cão a segurar sem ferir. Isso se consegue ensinando o cão a morder com pouco impacto e sem chacoalhar o figurante. Tal treinamento se inicia com manga macia, que deverá gradativamente ser substituída pela manga dura; depois, usa-se o bite. Lembramos que de forma de atuar não é recomendável, uma vez que o animal poderá ser degolado numa situação real. Por isso, não discorreremos sobre ela aqui. Outra ainda seria a do cão manter a certa distância do figurante obrigando-o a ficar imóvel, atacando-o, ou ameaçando-o, toda vez que se mover. Neste último caso é recomendável que ensinemos ao cão atacar imediatamente toda vez que ver uma arma em mãos de estranhos, pois o fugitivo poderá estar armado e sorrateiramente alvejar o cão. O autor, no entanto, não recomenda o treino e emprego destas atividades de captura, pelo alto risco inerente que corre o animal, à exceção se for exclusivamente para captura de fugitivos praticamente indefesos e sem chances de estarem armados. Neste último caso, os treinos consistem em durante o treinamento integrado, condicionar o cão a atacar toda vez que o figurante se mover. O que seria somente dar o comando de "CUIDA" ao menor movimento, seguido de "PEGA" se o movimento não cessar. A voz dos comandos gradativamente irá ficando mais baixa até que os comandos não precisem mais ser dados, uma vez que o estímulo visual da movimentação do figurante se tornará, aos poucos, mais distinguível e importante do que o som dos comandos. No caso de fugitivos que tenham a possibilidade de estarem armados, o ideal no caso real é manter

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o cão com guia e acompanhá-lo também armado e com todos dispositivos de proteção em condições de enfrentar com êxito os adversários ou orientar outros grupamentos sobre sua localização. Não devemos bancar heróis por coisas que não valem a pena, muito menos colocarmos nossos cães em elevado risco por isso. Melhor deixar que o prisioneiro fuja do que perder o cão. Poderemos capturá-lo em outra ocasião. Conforme a periculosidade do prisioneiro, também devemos alvejá-lo antes de colocar o cão em risco. No trabalho de busca simples, sem ataque, o cão deverá ser recompensado toda vez que encontrar a pessoa com iscas apetitosas. Melhor ainda se o ensinarmos a latir e nos chamar atenção quando encontra a pessoa. Para isso, iniciaremos dando petiscos ao cão quando este acha a pessoa a ser encontrada. Mas, paulatinamente, iremos nos fingindo de desentendidos para que o cão aprenda a nos solicitar a recompensa associada a seu sucesso, estimulando-o a que lata em protesto. Obviamente, que para isso, são mais indicados cães com mais tendência a latir, como pastores alemães. 110 - PROTEÇÃO E ESPORTE: Todo esporte voltado para o trabalho seleciona cães de proteção no sentido de congregar coragem, equilíbrio, persistência e perspicácia do animal. Embora o método preconizado neste capítulo vise todas essas qualidades, ele não é voltado para valorização esportiva, mas sim para a guarda efetiva. Sendo uma competição, todo esporte procura maximizar alguns pontos na prova de ataque como, por exemplo, em alguns deles, a fixação do cão na manga, a pouca valorização da ameaça concreta da figura do figurante, caso não fosse uma simulação. Dizia o imortal Hélio Gracie, em relação às competições de jiu-jitsu, que por vezes elas acabariam por retirar a eficiência da arte marcial no que se refere à defesa pessoal no sentido de incorporar golpes e técnicas que iriam contra quem os aplica, não fossem as regras da competição. É claro, que nem por isso não devam existir competições desse eficiente esporte, que mostra seu valor em competições de vale-tudo em todo o mundo, apenas que devemos as olhar com o devido cuidado. O mesmo podemos dizer em relação a muitas competições de trabalho canino em si. Não cabe, no caso, uma crítica a essas competições do seu ponto de vista intrínseco, mas aos métodos de treinamento distorcidos que elas obrigam empregar, para quem almeja mais do que tudo a vitória. Em alguns treinamentos, no afã de uma vitória dentro de regras limitadas, faz-se o cão valorizar a manga e ter uma indevida obsessão em relação a ela, quando o correto do ponto de vista de defesa funcional seria a valorização do figurante em si. Chega-se a ponto de fazer – mesmo nas fases mais adiantadas do treinamento - o cão “ganhar” a luva e sair “vitorioso” com ela na boca, esquecendo o figurante e a ameaça que ele representaria em uma situação real. “Ganhar” a manga é artifício, às vezes, empregado com eficiência para incentivo aos cães com baixo drive de rapina, mas não deve ser um método de utilização nas etapas mais evoluídas do treinamento. Um cão, por demais estimulado a se fixar em objetos, pode vir a ser literalmente massacrado com uma barra de ferro, ou qualquer coisa similar, sem que esboce qualquer reação de defesa. Nesse caso, quanto mais valente for o animal, maior será sua vulnerabilidade. Cães que atacam a luva no braço de seu proprietário ou treinador são outra demonstração de um treinamento totalmente absurdo do ponto de vista funcional e psicológico. O cão aprenderá a atacar sem raiva e isso o fará perder boa parte de seu potencial de ataque e capacidade de autodefesa. O cão também, em muitos esportes, perde a malícia em se esquivar eficientemente de golpes, o que é necessário na cinofilia efetiva. E os

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esportes nos quais o bastão é usado tão somente como ameaça ou usado de forma tênue não preparam o cão para uma reação mais violenta do inimigo. Diz-se que o esporte é um excelente veículo de seleção e é. Mas, muitas vezes, apenas para seleção para o esporte que seleciona. É evidente que os esportes têm utilidade do ponto de vista efetivo, principalmente no aprendizado dos adestradores, pois os esportes exigem muito deles. Mas, cães efetivos precisam ser treinados e selecionados por métodos efetivos. Por essas razões, é que desde o início existem dois tipos de pessoa no adestramento de guarda: a conhecida e a estranha. A conhecida, chamada por nós como "pessoa das relações do cão", "pessoa amiga do cão", etc., deverá somente ser empregada nos treinamentos que envolvam drive de rapina em nível de fair play ou em nível muito inicial de fair game. Quando um treinamento objetivar uma rapina mais elevada, isto é, na fase intermediária do fair game até a luta, ou no levantamento da defesa, a pessoa conhecida deverá ser substituída por uma desconhecida, chamada de figurante (no caso de ter conhecimento e competência) ou cobaia (no caso de ser uma pessoa estranha, mas sem tais características para cães já com treinamento avançado). Tudo isso visa ser bem nítido na mente do cão quem é amigo, quem é estranho e quem é inimigo. As áreas de penumbra conceitual, entre as situações nas quais o cão deve demonstrar brincadeira ou demonstrar gana, devem ser minimizadas ao máximo – embora sejam necessárias - para que haja um ataque consistente, consciente e eficiente, e que utilize o real rigor que uma situação de fato exige. Alguns defensores desses métodos advogam que são etapas iniciais, e que no final o cão se adaptará à situação real. Sinceramente, temos sérias dúvidas quanto a isso e cremos que tudo deve ser iniciado sem levar o cão a conflitos que podem, com muita chance, se tornarem insuperáveis. Além do mais, não há razão para que não se comece o adestramento pela maneira coerente e racional. Para alguns treinadores, o cão deve segurar a luva sem chacoalhá-la, por ser exigido em alguns esportes. Criticam o cão ir com algum grau de raiva contra o figurante. Alegam, inclusive, que um trabalho realizado com algum grau maior de emoção não poderia ser mantido por muito tempo, na medida em que as catecolaminas em nível mais elevado desgastariam o animal. Isso pode verdade para cães que realizam trabalhos restritamente policial de captura e que, simplesmente auxiliam a um policial humano e armado ou que precisam trabalhar por horas seguidas em buscas de pessoas ou substâncias. Estão cobertos de razão se o cão realmente for utilizado para tais finalidades. Mas, um cão que ataca o inimigo com ferocidade extrema, não necessariamente é um cão nervoso. Pode ser (e quase sempre é) um exemplar muito calmo fora da situação de ataque. Além do mais, ferocidade e violência não necessariamente estão ligadas a nervosismo e descontrole. O que ocorre, no entanto, é que, como muitos treinadores têm sua formação elaborada por tais métodos ou visando algum esporte com tais exigências associadas acabam por treinar de tal forma animais cujo trabalho visa unicamente de segurança familiar. Tais animais muitas vezes são responsáveis pela segurança de uma família e pela sua própria segurança. Neste caso, quanto maior for o poder de destruição de curto prazo, melhor. Um bom cão não necessitará de mais que alguns minutos para neutralizar um malfeitor, ao contrário de um cão de rinha que necessita de muito tempo para suportá-la. O cão que simplesmente segure o meliante, sem feri-lo com gravidade, estará sujeito a que este, mais inteligente que o animal, acabe por neutralizá-lo de alguma forma, seja sutilmente com a utilização de um objeto cortante que traga escondido, seja afogando-o em uma piscina ou até enforcando-o com seu cinto. Essa é a realidade concreta e dura que um cão de guarda tem que enfrentar, por vezes só, se chegar a uma situação real.

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Muitas modalidades esportivas, em si, são interessantes, desde que não haja distorções no treinamento para atingir o objetivo da vitória esportiva. Infelizmente, a vaidade humana, invariavelmente, na maioria das vezes, leva a que os objetivos de títulos e vitórias se sobreponham aos reais objetivos funcionais. Os métodos preconizados no decorrer deste capítulo podem ser usados com sucesso em qualquer modalidade esportiva desde que adaptados para elas. No entanto, consideramos que competições, por muitas vezes, acabam por se tornarem negativas, na medida em que procuram obter o máximo em certos aspectos, o que acaba por prejudicar os demais. Por essa razão, que as provas de temperamento e trabalho a que estão sujeitos os cães efetivos não devem ser classificatórias, mas qualificatórias. Onde existe a competição, ela acaba sendo o foco principal, se não o único, de todo o treinamento. Há um capítulo à parte, sobre Ring-efetivo, um esporte que visa somente testar e selecionar cães para atividade de proteção e defesa efetivas, militar ou civil. Uma das características dessa modalidade é que muitas provas são sorteadas no momento de sua realização, minimizando a possibilidade dos cães terem uma preparação específica sem uma boa formação geral. Amplia-se enormemente o espectro das situações para as quais um cão de guarda deve estar preparado e, por conseguinte, minimizam-se os desvios específicos que, porventura, algumas provas especificamente podem solicitar para maximização de sua eficácia específica. 111 - CINOFILIA ESPORTIVA E CINOFILIA EFETIVA: Este item é uma continuação do item “Proteção e Esporte”. Grandes discussões têm sido geradas dentro da cinofilia sobre métodos de treinamento para obtenção de um cão de trabalho de proteção. A maior parte dessas discussões quando realizada por treinadores capazes tem muito mais natureza filosófica do que por qualquer outro aspecto que se possa supor. Antes de nos estendermos nesse assunto, vamos definir o que seja cinofilia esportiva e o que seja cinofilia efetiva. Podemos dizer que cinofilia esportiva seja a prática de treinar cães para os mais diversos esportes tanto esportes voltados à proteção ou a outros tipos de trabalho, como esportes simplesmente esportivos como o game dog e o agility. Como esportes voltados à proteção, que são a razão de tais discussões às quais este tópico se refere, destacamos o schutzhund e as diversas modalidades de ring, como o mondiorring, o ring belga, o ring francês e o ring holandês. Já a cinofilia efetiva procura aprimorar os cães para em um trabalho mais voltado para a guarda efetiva, que, como o nome diz, é voltada para as situações em que um cão de guarda familiar é exigido sem qualquer tipo de floreio. Alguns esportes se aproximam mais, outros menos do treinamento efetivo e capacitam melhor o cão do que outros para o que se chama de defesa civil. Nome este não muito feliz, pois as forças militares necessitam de cães efetivos, ou seja, de cães de defesa civil. Dizemos inclusive que cães com treinamento civis são os mais úteis no serviço militar quando seu treinamento consiste guarnecer bases militares. Muitos iniciados no esporte chegam a ponto de criticar o cão que chacoalha a mordida. O que vem ocorrendo no schutzhund moderno, principalmente nas provas regidas pela FCI é que os árbitros não impõem que os figurantes usem devidamente o bastão. Talvez por adaptação a tempos de decoratividade, talvez por pressão dos defensores da “pacificação cinológica” preconizada pela FCI, embora as regras do schutzhund não tenham mudado, mordidas sacolejadas começaram a não serem tão bem vistas e qualquer sinal de defesa também por muitos admiradores. Mas, o pior, sem dúvida tem sido a falta de pressão no

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bastão. A “pacificação cinológica” veio de reboque com as políticas de desarmamento defendidas por órgãos internacionais ligados à ONU. Talvez tenha sido uma compactuação para evitar que mais raças caninas fossem proibidas na Europa Ocidental. Talvez tenha sido apenas por quem resolveu aclamá-la estivesse em sintonia com esses espúrios ideais. (ver Capítulo 11). Por que damos tanta importância à pressão do bastão? Simples. Bons treinadores conseguem sem infringir as regras fazer com cães com pouca capacidade de drives, principalmente de defesa, consigam passar pelas provas e não perder pontos. Como drives de proteção e obediência se contrapõe, é até mais fácil de certo modo conseguir comandos e evitar que o cão ataque antes do comando bem como soltar logo que comandado. Com isso, cães que de longe não são os melhores ganham provas, sagram-se campeões e são escolhidos como padreadores. Bem ao inverso do que se desejaria. Mas se há algo que nenhum adestrador consegue é dar a um cão a capacidade de resistir à pressão do bastão mais do que sua genética permite. O problema não está no esporte, de forma alguma. O problema está na mentalidade de se valorizar mais a vitória do que a seleção. O problema está na competição e na vaidade. Está também na mentalidade de ser politicamente incorreto pressionar o cão com o bastão não só em termos de pressão psicológica (que é altamente relativa e pode deixar de ser efetiva com o treinamento e com a socialização), mas também em termos de capacidade de suportar tais golpes. Suportar tais golpes também não ocorre por melhor capacidade física para cães de mesmo porte, mas pela melhor psique do indivíduo. Leia-se como pressão psicológica dita neste parágrafo apenas aquela na qual o cão é ameaçado pela postura do figurante, pelo modo deste usar o bastão sem com ele tocar com a força necessária no cão, etc. O esporte bem praticado auxilia as qualidades efetivas de guarda de um cão. Mas adestradores realmente competentes sabem que não se pode maximizar um cão com qualidades para dois tipos de esportes diferentes, o que dirá otimizar as qualidades de um mesmo cão para o esporte e para a guarda efetiva. Observem bem, alguém poderá contra argumentar exemplificando que tem um cão que é excelente no esporte e que e um bom cão de guarda efetiva, e isso poderá ser verdade. Outro alguém poderá exemplificar com um cão que se sagrou campeão em mais de uma modalidade esportiva de proteção. Tudo isso é possível de acontecer. O que não é possível, insistimos, é que um mesmo exemplar seja maximizado para a guarda efetiva e para qualquer esporte cujas regras, além da seleção não se volte também para o modo de ataque que maximize que o cão saia vitorioso em um embate contra o elemento humano. Vamos explicar o que dissemos acima. Para isso, teremos que relembrar um pouco do que foi visto anteriormente neste mesmo capítulo. Nem falaremos das tantas situações conflitantes entre os diversos esportes ou entre os esportes e a guarda efetiva. Basta-nos uma para esclarecer o que está sendo dito. Um bom exemplo bem elucidativo é o conflito inerente entre a obediência durante uma situação de ataque (esportivo ou real) entre o que concerne o comando de “SOLTA” ou a interrupção de um ataque lançado e a violência da mordida, bem como, a gana no ataque. Por mais que digam e dêem exemplos vivos e reais de cães que atacam com violência e também que soltam sob comando e interrompam seus ataques sob comando, não deixa de ser verdade que um cão não pode ser maximizado na potência da mordida e na obediência durante o ataque, o que não quer dizer que não possa ser muito bom em ambos. Apenas não pode ser maximizado em ambos. O objetivo do antigo schutzhund, por exemplo, era (e ainda é para quem ainda o pratique) encontrar esse equilíbrio ideal. Não estamos defendendo que o ideal do cão efetivo é ser uma máquina de

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moer carne. Apenas estamos comentando em nível de maximização de drives e do paradrive de obediência. A obediência e o controle também deve ser exigido na maioria dos cães de guarda, exceto nos cães sumários e guardiões radicais. Associado a tudo isso está também a forma de usar o bastão e o incremento da capacidade de resistência à dor e de luta. Quanto mais expormos o cão ao bastão e quanto mais o usarmos com violência, tanto mais acostumaremos o cão à dor e mais raiva obteremos no ataque. Isso porque ensinaremos o cão a se utilizar melhor de suas vias adrenérgicas. Em contrapartida, mais dificultaremos que o animal esteja propenso a soltar sob comando (principalmente verbal) a manga ou seu inimigo real e bem mais difícil que interrompa um ataque já iniciado. Veja mais em “Toques do Bastão, como Graduar o Ajuste Adrenérgico’. Cabe ressaltar que o dito acima “tanto mais acostumaremos o cão à dor e mais raiva obteremos no ataque” só acontecerá em cães preparados para tanto. Em cães não preparados, o efeito será paradoxal. Fará o cão entrar em pré-fuga ou fuga, dependendo da severidade do uso do bastão. E é preciso também lembrar que “cães preparados” é extremamente relativo à raça, à linhagem e ao indivíduo em si, tanto do ponto de vista de herança genética, quanto do preparo anterior. Cabe relembrar que tudo na vida tem seu limite, cães, mesmo os melhores, também os têm. Um cão treinado a atacar com o máximo de violência, o que é ideal na guarda efetiva, ficará praticamente inviável para qualquer tipo de esporte tradicional, nos quais a obediência apurada no decorrer das provas de proteção é fator fundamental. Durante uma prova esportiva, se o bastão for exigido com extrema violência, ou o cão fugirá ou irá morder com grande violência, sacolejar a mordida, tender a não obedecer com facilidade o comando de “SOLTA”. Vem a pergunta clássica: “um cão, obtendo seu treinamento para ser um campeão de IPO terá maximizada sua capacidade efetiva de guarda”, a resposta será: “provavelmente não”. Se a pergunta for: “um cão treinado nos moldes do antigo treinamento para schutzhund, sem tanta preocupação com o resultado das provas, terá maximizada sua capacidade efetiva de guarda”, a resposta será: “provavelmente sim, mas dependerá do tipo de guarda efetiva que queres do cão (proteção do dono ou guardião da propriedade)” Se a pergunta for: “um cão treinado para morder com mais violência e mais preparado o quanto o possível para enfrentar um inimigo humano, poderá ser o melhor possível na prática do IPO?”, a resposta será “não”. No entanto, cabe a ressaltar que a polaridade entre um ataque mais eficaz e a obediência ocorre tão somente no que tange à obediência no que se refere às situações de paralisação de um ataque ou, em alguns casos até, de não iniciá-lo quando o cão possa pressentir sua iminência, independente do drive em questão ser o de rapina ou o de defesa. Como a obediência, quando associada ao ataque, opõe-se aos drives de proteção (rapina e defesa), pode ser tratada como um paradrive para efeito prático em situações específicas de treinamento de proteção. Daí, as considerações do item “Obediência Pode ser Considerada um Drive?”. O que foi dito até aqui nos remete a uma outra pergunta: qual o melhor ponto de equilíbrio entre uma boa obediência e um ataque consistente? A resposta é: depende para que finalidade queremos o cão. Depende, em primeiro lugar, se queremos o cão para prática esportiva ou se o queremos para guarda efetiva. Caso queiramos o cão somente e tão somente para o esporte, temos que saber para qual esporte e sobre as regras deste detalhadamente.

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Caso queiramos o cão para guarda efetiva, teremos que saber de nossas necessidades reais. Se nossa pretensão é somente ter um cão que proteja um território com muros altos e com avisos que este é protegido por cães de possíveis invasores mal-intencionados, a obediência de interromper um ataque iniciado não terá quase nenhuma importância e nem deverá ser treinada. Talvez, seja até melhor que não exista. Se for um guardião que deva acumular as funções de protetor, a interrupção do ataque sob comando é um fator que não deve ser negligenciado. Outras perguntas se sucedem, como “um esporte como o IPO leva a um bom ponto de equilíbrio em um cão cujo treinamento foi mais baseado em obter títulos?”. Diríamos que não. Mas se o objetivo do treinamento de schutzhund for levar o cão ao equilíbrio desejado, a resposta obviamente será sim. Outra pergunta é: “o schutzhund é um excelente esporte para selecionar e formatar cães a terem um excelente equilíbrio de drives e de obediência, mas seria realmente eficiente para um cão guardião de propriedade que trabalha sem a companhia de um humano armado?”. A resposta será não. Isso pois o schutzhund prepara bem o cão para ter ótimo equilíbrio de drives e de obediência, mas foca o ataque à manga ou ao antebraço. Vimos em tópicos anteriores que esse não é o tipo de ataque mais eficiente em termos reais. Falamos agora em eficiência, não em seleção. Bem diferente do cão ser companheiro de um policial armado que lhe dê cobertura contra bêbados, arruaceiros e outros oponentes de não muito grande periculosidade. Já se a exigência desse mesmo cão policial for morder com mais ênfase o malfeitor talvez o antebraço não seja o local mais desejado. Disse talvez, depende do que se quer em termos de ataque. Se é a mão que porta a arma, lembremo-nos que o oponente não está de forma alguma trocar a mão da arma. Aliás, nem é preciso, pois o ataque se foca no antebraço esquerdo quando a arma quase sempre é portada na mão direita. Quanto ao ponto ideal de equilíbrio entre drives e obediência, não temos um ponto ideal de equilíbrio que seja geral. O que podemos, sim, é ter um ponto de equilíbrio ideal para cada necessidade ou até para cada proprietário ou para cada adestrador. Se formos estabelecer uma equação entre a melhor obediência possível em interromper ataques ou não iniciá-los sem comando para cada nível de um determinado drive de proteção, e a partir dela elaborar um gráfico, não teremos um único ponto, mas uma linha sobre a qual estarão os pontos máximos de eficiência entre obediência máxima associada às diversas intensidades de um determinado nível de um determinado drive. Essa linha será feita pelos quase infinitos pontos de preferência entre os diversos adestradores, proprietários, etc. Qualquer esporte bem praticado estará sobre essa linha, qualquer tipo de treinamento efetivo bem praticado também estará sobre essa linha, só que cada um em partes diferentes dela. Ou seja, qualquer ponto dessa linha resulta de eficiência máxima no trabalho de adestramento para guarda. A mesma linha polarizará, de um lado, uma efetividade máxima e de outro o melhor nível possível de obediência. Tudo para um mesmo cão. Teoricamente, para cada cão, haverá uma equação diversa e um gráfico diferente para cada nível de cada drive de proteção que poderão vir a ser obtidos a partir de cada treinamento a ser realizado. Esse item fala sobre a óbvia, porém tão pouco lembrada, condição que não se pode maximizar tudo a um só tempo. Não se pode objetivar no mesmo cão a melhor efetividade possível e a melhor esportividade possível no que tange à cinofilia de proteção. O que existe são curvas de eficiência

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máxima onde podemos tanto obter maior obediência quanto maior intensidade de drive, ou seja, maior gana. Por incrível que pareça, pessoas não entendem ou preferem não entender isso e querem impor aos demais suas convicções pessoais como as únicas coerenes. Vejamos mais sobre esse assunto no item “Obstinação x Inteligência Emocional”. Os principais pontos que diferem a cinofilia esportiva da efetiva são: (1) Na cinofilia efetiva valoriza-se exclusivamente o figurante e não o material de mordida, exceto o estritamente necessário no caso de cães temerosos ou traumatizados; (2) Na cinofilia efetiva, valoriza-se a força e a eficiência real da mordida, o cão deve sacolejar a presa sempre, usando o maior potencial possível; (3) Na cinofilia efetiva, o cão pode – e, algumas vezes, deve - soltar e remorder o figurante quando encontrar-se em situação de desvantagem; (4) Na cinofilia efetiva, a obediência é valorizada apenas até o limite de sua necessidade real e não deve ter mais atenção do que a eficiência do ataque; (5) Na cinofilia efetiva, é valorizado mais o equilíbrio do cão na convivência familiar do que durante provas de proteção; (6) A cinofilia efetiva deixa o cão mais livre no ataque para que seja mais imprevisível quanto à forma de atacar (não em quando atacar) e use mais seus instintos naturais; (7) Na cinofilia efetiva, o treinamento não visa a competição em provas, mas a eficiência real. (8) Na cinofilia efetiva, é mais valorizada a real capacidade física do cão. Efetividade é um conjunto de métodos ou apenas um único método que engloba todo conteúdo que leva um cão a ser funcional no quesito guarda, sobretudo guarda civil. Efetividade é pragmática em relação aos seus objetivos, mas é amplamente amparada por imenso cabedal teórico para chegar às suas metas finais. Efetividade é sobretudo uma filosofia não somente cinológica mas geral, uma forma de agir, de enfrentar a vida e os desafios. Cão efetivo é aquele que atende aos objetivos da cinofilia efetiva. Dono efetivo é aquele que cria e treina seus cães para que atinjam esse mesmo objetivo. 112 - OBSTINAÇÃO x INTELIGÊNCIA EMOCIONAL: Um cão, assim como um ser humano, obriga-se a dividir sua capacidade mental entre a obstinação e a inteligência emocional. A maximização de uma, por vezes, resulta na diminuição da outra. Mas, não podemos dizer que sempre obstinação e inteligência emocional são conflitantes. Vimos anteriormente em outros tópicos deste capítulo que a obediência interruptiva durante um ataque e a elevação dos drives de defesa e de rapina constituem-se em um par de opostos. Isso também acontece com a tenacidade e a vigilância no que tange à atenção, pois a elevação de uma exige a diminuição da outra, pelo menos dentro de um mesmo nível de consciência. Mas, obstinação e inteligência emocional não necessariamente são conflitantes. Quando é, então, que a obstinação e a inteligência emocional se conflitam e quando não se conflitam? Podemos dizer que isso depende da genética, mas que depende também do aprendizado psíquico e neuronal. São os levantamentos eficientes dos drives, de forma gradual e minimizando os conflitos inerentes é que pode evitar o conflito entre essas duas importantes variáveis. A obstinação em nível de irracionalidade emocional pode ser filha de um drive de defesa

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muito elevado ou de um drive de rapina exacerbado sem as devidas modulações do comportamento advindas dos inúmeros comandos ensinados ao cão durante seu treinamento. Quando permitimos que um cão morda desenfreadamente uma manga ou um bite, estamos “dando corda” para um aumento da obstinação. Se o figurante submete ao toque severo com vara, de forma competente, o cão durante o ataque incrementa tal fator, desde que o uso do bastão venha a aumentar a gana do ataque, quer seja pelo aumento do nível da rapina, quer seja por um aumento na defesa. Paradoxalmente, um excesso de castigo, um tempo exagerado em cada investida ou de cada treino ou, ainda, um excesso de repetições dos treinos podem diminuir de forma negativa a obstinação. O exagero pode levar à banalização da situação. Ou seja, pode-se diminuir a obstinação do cão, não pelo aumento do controle emocional, mas pela diminuição de seu ímpeto. Em verdade, a obstinação não é um defeito, mas uma qualidade se for bem conduzida de forma que não comprometa demasiadamente a inteligência emocional. Por outro lado, a inteligência emocional não pode ser confundida com indiferença ou egoísmo (este no caso humano). Afinal, o que queremos para nossos cães? Boa pergunta. Cremos que seja altamente subjetiva tal questão. Lembremos da frase escrita logo acima "a obstinação em nível de irracionalidade emocional pode ser filha de um drive de defesa muito elevado ou de um drive de rapina exacerbado sem as devidas modulações". É verdade que as modulações comportamentais estruturadas na obediência por estímulos negativos tendem a diminuir a obstinação e prejudicar drives de defesa e de rapina latentes. Aí, se apresenta uma das grandes vantagens dos estímulos positivos na modulação da obediência. Mas, o grande objetivo é conseguirmos uma obstinação guiada pela própria inteligência emocional. Isso vale tanto para nossos cães como para nós mesmos. Em nível filosófico e psicológico, equivale a transferir a obstinação do objetivo imediato e de menor valia ao mais distante e de maior importância. É claro que isso não é racionalizado pelos cães, mas deverá ser por seus treinadores. Em todo este capítulo, procuramos induzir à colocação de condicionamentos comportamentais através de estímulos positivos que devem ser formatados ainda antes das investidas baseadas em drives elevados de rapina ou em drives de defesa. Procuramos também utilizar sempre as situações de caça mais próximas do fair play, realizadas em clima de alegria e descontração, pessoas amigas do cão e nestas situações procurar forjar ao máximo, com estímulos positivos, os imprintings de permanecer imóvel, soltar, parar o ataque, etc., que se conflitam com a obstinação do cão. Se quisermos um cão bem equilibrado, somente após tais condicionamentos estarem já formatados é que levaremos o cão a levantar de forma incisiva seus drives. Da mesma forma, só após moldar imprintings comportamentais é que devemos chegar às situações nas quais a rapina se aproxima da luta, aquelas nas quais somos auxiliados por pessoas estranhas às quais o cão deve atacar realmente de forma obstinada. Obstinada, mas permeável à obediência, que já foi, dentro do possível, formatada anteriormente. Mesmo assim, devemos estar cientes de que um nível máximo de bastão, por exemplo, sempre tenderá a se conflitar com um cão soltar uma manga ainda em mãos de um figurante. Numa situação real, isso equivale a um malfeitor que feriu ou causou dor no cão. Ora, não temos muita preocupação de poupar tal agressor da violência do animal. Por isso, não devemos encarar tal fato como problema.

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Lembremos que a obstinação não é somente um estado de espírito. Ela aumenta a resistência, potencializa a força e o chacoalhar da mordida e a velocidade do ataque, diminui o temor, bem como a sensação subjetiva da dor e aumenta a determinação do animal antes, durante e após cada ataque. A falta de obstinação ou a obstinação cega são coisas que devem ser evitadas em um cão efetivo. Quando falamos em evitar obstinação cega, devemos lembrar dos vários imprintings formatados em troca de mordida e em procurar a mordida em locais onde o cão não seja alvo das varadas do figurante. Esses imprintings, sem dúvida, ensinam o cão a se comportar de forma inteligente e racional durante a luta, ainda que seja considerado um animal “irracional”. Devemos lembrar que inteligência emocional não se refere somente à obediência, e que este não é o único fator a ser contraposto à obstinação. Há outros fatores dentro da própria forma do ataque. Um cão que pega a primeira parte do corpo que se apresenta sem considerar a de maior eficiência não usa de inteligência emocional (ou melhor, não foi treinado de forma inteligente). Um cão que não troque a mordida durante uma situação de nítida desvantagem também não usa. Isso seria obstinação cega que seria indesejável, mesmo sendo fiel ao mais radical conceito de efetividade. Muito pelo contrário, efetividade é acima de tudo não só determinação, mas também eficiência. Em outras palavras – se quiséssemos complicar, poderíamos dizer que, em um bom treinamento, são alteradas, de forma a se tornarem inelásticas, as hipotéticas curvas, onde os parâmetros obstinação e inteligência emocional se moveriam e seriam analisados, de forma que o aumento de um desses fatores não diminua ou diminua de forma não relevante o outro (isso seria ser inelástico). Assim, ao máximo, faremos o possível para forjar um caráter equilibrado e obstinado. É óbvio que há também a parcela da psique do cão que não depende de nós, mas da genética que o filhote trouxe de seus pais, a herança psíquica. Somente colocamos os cães à prova, testando e selecionando os reprodutores que poderemos interferir nesta variável. Vejam o item "Modular o Comando de "SOLTA" e a Força da Mordida". 113 - MODULAR O COMANDO DE "SOLTA" E A FORÇA DA MORDIDA: Sempre que condicionamos um cão a soltar sob comando, estamos utilizando do paradrive da obediência que se opõe aos drives de proteção (rapina e defesa). Se ensinarmos o cão a soltar desde bem filhote qualquer objeto que seja em nossas mãos, estaremos o ensinando para que coloque pouca força na boca, pois se obrigará a diminuir a força da pegada para que o objeto seja retirado de sua boca por nossas mãos. Por isso, é que damos preferência à utilização do estímulo passivo da caça-morta ou da troca de caça, tendo em vista tais técnicas permitirem o cão definir o exato momento de soltar o objeto. Parece apenas um detalhe e é. Mas, é um detalhe de extrema importância, pois cabendo ao próprio cão definir o exato momento de afrouxar a boca, não ocorrerá dele já ficar com a boca mais frouxa a espera de que lhe seja arrancado algum mordente. Este costume, ou imprinting, de morder mais fraco acaba por se fixar de tal maneira, que mesmo em uma situação de luta, ele pode ser será mantido. O conteúdo deste parágrafo já está disposto em várias partes deste capítulo. O comando “SOLTA” deverá ser dado toda vez que percebamos que o cão irá soltar durante o estímulo passivo. Isso deverá ser feito de tal forma que o cão acabe por soltar associando tal comando ao fato de haver solto. No entanto, um cão que a todo ataque lhe é comandado soltar, tenderá a morder com menos energia, pois a mente do cão já espera ser comandada a soltar a

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qualquer momento, o que, de certa forma, pode ser interpretado como uma obediência interruptiva. Toda obediência interruptiva impressa em treinamento de proteção tende a diminuir o ímpeto da proteção. Outra técnica que pode ser realizada lá no início do treinamento, isto é, em nível de fair play, é a de troca da falsa caça por petisco no mesmo instante no qual o comando “SOLTA” é dado. Esta (estímulo positivo) é indicada apenas no nível de fair play, enquanto que a presa-morta (estímulo passivo) mais em nível de fair game e a troca de caça (estímulo positivo com troca de foco) em nível de fair game mais avançado ou em nível de fair fight. Obviamente que em muitas funções de guarda, o cão deve soltar sob comando, principalmente a que definimos anteriormente como de “cão protetor”, isto é, aquele que protegerá a pessoa dentro e fora de seu território. Devemos, no entanto, ter em mente que obediência de soltar e obstinação no ataque são variáveis antagônicas. Conforme nossas necessidades, deveremos modular o ponto que nos parecer melhor. Um excelente cão irá morder com muito ímpeto e soltar prontamente. Isso dependerá do uso correto do explicado por todo este capítulo, bem como do temperamento de cada cão. Cremos que tentamos, aqui, chegar ao melhor possível dentro das limitações de cada cão. Como já foi explicado anteriormente, a capacidade de cada cão, que é função de suas limitações, nos apresentará uma curva de indiferenças em um gráfico invisível. Cabe ao adestrador perceber esse hipotético gráfico e definir o ponto desta curva que é mais conveniente de acordo com as necessidades e limitações de cada proprietário. Em “Como Fazer um Cão Soltar sem o Comando Verbal”, falaremos sobre uma técnica que minimizará o conflito entre soltar e morder com bom ímpeto. Alertamos que tal técnica tem o inconveniente e a limitação de precisar que toquemos no cão. 114 - COMO FAZER UM CÃO SOLTAR SEM O COMANDO VERBAL: Só haverá sentido nesse tipo de treinamento se for realizado após o cão já haver chegado ao fair fight. Em verdade, tal tipo de treinamento é uma maneira de corrigir a falha do cão não aprender a soltar até tal momento. Sendo assim, não cabe, dentro da racionalidade, usar tal técnica em lugar dos métodos de estímulos positivos ou passivos. Em verdade, esse método se baseia no estímulo negativo e contradiz quase tudo exposto neste trabalho até então. O método da troca por isca, que só pode ser usado no fair game, é um método de estímulos positivos. Seria excelente se pudesse ser aplicado em fase avançada. Mas, isso é impossível, tendo em vista não se conseguir, exceto em fair play, conseguir que um cão abandone uma mordida em troca de um petisco. E se conseguíssemos, estaríamos com um péssimo cão. Pois, se isso for conseguido, ou o cão estará literalmente esfaimado ou terá rapina de qualidade muito fraca, incompatível com o trabalho que exerce e que, em prática, não pode ocorrer, sendo, portanto, uma abstração teórica. Como já dissemos anteriormente, abandonamos tal método por concluir que ele formata imprintings de morder fracamente, exatamente pelo drive por isca ser incompatível a um só tempo com a rapina elevada. O método da caça-morta baseia-se basicamente no estímulo passivo e é reforçado com o estímulo positivo do elogio do dono, bem como pela nova provocação e fuga do figurante - que são importantíssimos para seu sucesso. Pode e deve ser usado tanto no fair play como no fair game

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para aquisição de imprintings de soltar a presa-morta, que podem ser estendidos com alguma dificuldade e muita competência para a presa-viva. É difícil iniciar um treinamento em fair fight em presa-viva e verdadeira, ainda que essa presa se comportasse como presa-morta. Isto é, ainda que o figurante fique inerte até que o cão o solte. Mas, pode ser tentado. A técnica de fazer o cão soltar sem comando verbal é uma técnica que congrega estímulos passivos, negativos e positivos, nessa ordem. A primeira regra é tentar ao máximo que o cão solte sob estímulo passivo, ficando o figurante inerte, enquanto o condutor comanda o "SOLTA" em tom neutro de voz. Por períodos de uns dez segundos, devemos insistir dessa forma. Caso o cão não solte, o que é esperado, iremos apertando sua garganta com nosso antebraço, enquanto encostamos nossa face na face do cão. Iremos aumentando a pressão sob a garganta do cão, enquanto continuamos a comandar o "SOLTA" com o tom mais impessoal possível, quase que carinhoso. Essa pressão deverá aumentar de forma muito gradual até que o cão solte. Devemos, aí, ter dois cuidados importantíssimos. Essa técnica jamais deverá ser usada se não tivermos absoluta certeza que o cão não irá nos morder. O primeiro será que não estrangulemos o cão. Para isso, é preferível que não precisamos chegar à luta, mas apenas ao fair fight, onde a obstinação ainda não é tão grande. Não devemos iniciar tal tipo de trabalho em animais já maduros. Mesmo tomando todos esses cuidados, devemos solicitar que o figurante ou outro alguém observe as mucosas do animal, que não deverão ficar demais azuladas. O segundo cuidado será a de ter certeza que o cão é realmente equilibrado. Para isso, o cão poderá ter altos drives de proteção, mas agressividade baixa. Cães como todos os bull & terriers, dogues brasileiros, bull dogs são, sem dúvida, os mais confiáveis nesse sentido por terem um bom foco na caça, muito dificilmente atacando o "em torno". Lupóides, em contrapartida, dificilmente necessitam que cheguemos a tal extremo para soltarem. O estímulo positivo será concretizado pelo elogio do condutor assim que o cão solte a caça. Esse detalhe é importantíssimo. Sempre é bom dar em seguida mais um comando de "PEGA", deixar o cão confirmar o ataque, para depois comanda-lo novamente a soltar. Esse novo detalhe tem a importância de fazer o cão entender que não perderá para sempre a caça após soltá-la. Além do elogio, há outros dois estímulos positivos importantes a serem aplicados após. O primeiro será que o cão possa sempre remorder após soltar, ainda que por uma única vez. O outro será que o figurante dê caça ao cão e que este possa persegui-lo. Estes estímulos consistem em fazer o cão aprender que após soltar a caça morta, terá a caça viva (o figurante em si - o ideal - ou algo que se move em suas mãos, ainda que não o pegue efetivamente). Após ensinar através de tal técnica um cão a soltar, nada mais precisará para que ele solte do que passar a mão em sua garganta levemente. Isso porque com o tempo, a pressão que precisaremos aplicar sobre a garganta do animal será progressivamente menor. Se insistirmos em pronunciar o comando verbal enquanto fazemos a pressão na garganta do cão, é provável que em pouco tempo possamos apenas dar o comando verbal. Alguns treinadores experientes dirão que isso é loucura, mas acreditem já foi feito e com total sucesso. Como dissemos anteriormente, está longe de ser o melhor método. É apenas um recurso derradeiro. Sempre é bom relembrar que o figurante não deve se movimentar muito menos bater no cão durante

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a aplicação de qualquer método de fazer o cão soltar. Infelizmente, qualquer que seja a técnica de fazer soltar, ela acaba, mais ou menos, se conflitando com a qualidade da mordida e com os drives de proteção. O defeito do bite é não permitir que o cão continue a morder até que tome forma de caça-morta, na medida em que há uma caça-verdadeira dentro dele. A solução para isso é o figurante despir o bite durante o treino... Sobre o desvio de mordida para outra caça, poderemos encontrar material no item "Ataque contra Dois Figurantes". Nessa medida, é interessante que tenhamos acessórios de mordida que portemos encostados no bite para que possamos direcionar o ataque ao bite e deixá-los na boca do cão, enquanto o figurante chama o cão para si. A razão disso é que o cão não seja sempre coagido a soltar a toda mordida que aplica. É importante que ele, por vezes, solte a mordida por sua conta para manter uma boa qualidade efetiva de mordida. Se o ataque é direcionado ao antebraço do bite, isso é facilmente contornável com o uso da manga ou o figurante se despindo do bite. Mas, o ataque ao antebraço, além de ser menos eficiente, nem justifica o uso do bite. Portanto, por vezes, é bom que recorramos à velha lingüiça, vez ou outra. A esta altura, o leitor já percebeu que não existe uma técnica suprema para ensinar um cão a soltar. Se existisse, ela seria única e não haveria por que comentar outras. Todas essas técnicas formam um repertório que um adestrador experiente e sagaz deverá usar, conforme ocasião, conforme as especificidades de cada cão, conforme cada fase do adestramento e conforme os objetivos de cada treinamento. A crítica que tais métodos podem receber é que não selecionam cães para tenham equilíbrio entre drives e obediência. Em parte, é verdade, pois podemos conseguir que cães cuja genética não é a ideal venham a ser bons guardas. Em parte não é verdade, pois sempre procuramos o método mais seletivo como o inicial, e há um outro fator em questão: o criador ou proprietário saberá também do potencial de seu cão pela rapidez e precocidade do sucesso do treinamento. Podem também argumentar: “mas não pode interferir no resultado da reprodução se o proprietário ou criador for desonesto no que contar aos demais?”. É verdade, pode. Olhos mais experientes saberão a diferença. Mas é claro, nem todos têm esses olhos... 115 - ATAQUE EM DUPLA: Tal modalidade só pode ser feita contra figurante com bite. Se a dupla de cães contém, pelo menos, um de seus membros com maior porte físico e boa disposição, o uso do capacete é recomendado, bem como o das polainas protetoras. De início, não faremos os ataques lançados. Dois condutores devem levar um cão até que cada um dos cães morda o bite nos locais a que foram condicionados. Essa é uma razão para quem possui vários cães não direcione todos nos mesmos pontos de pegada. Após percebermos que os cães tomam gosto pelo figurante, e que se aproximam um do outro sem querer brigar entre si, e estarmos seguros disso, poderemos proceder ao ataque duplo lançado. Um show de beleza plástica para nossos olhos. Vale a pena filmar e ver várias vezes. Isso, sim, é show! Ataque em dupla é algo muito simples e que não demanda muito mais explicações além das acima, mas vamos tecer algumas considerações sobre suas vantagens: - Descanaliza o ataque dos cães contra os de sua espécie, o que é uma aberração, principalmente se tratando de cães de guarda; - Dá segurança a cães jovens ou iniciantes e auxilia - e muito - na recuperação de cães medrosos,

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traumatizados ou com baixa rapina; - Ensina os cães a trabalhar em dupla e, por extensão, em grupo, que é o modo correto e eficiente da espécie canina atuar. O que é muitíssimo mais eficiente; - Como teste, é um teste que serve como divisor de águas entre cães de guarda e cães rinhentos; - Como teste, serve também para testar se os cães brigam pela "caça", o que significa não verem perigo nela. Predadores grupais só brigarão pela caça se já a considerarem morta, sem poder de reação. Concluindo, cães que brigam pela caça não atuam em altos níveis de rapina, próximos ao fair fight, mas em níveis baixos, próximos ao fair play. Indo além: não são cães confiáveis se houver reação violenta de quem foi atacado além da já condicionada nos treinamentos específicos; - É um belíssimo espetáculo para ser assistido. Quanto a desvantagens, não conseguimos vislumbrar nenhuma. Devemos lembrar que o treinamento deve ser feito com bite, e os cães devem morder, pelo menos inicialmente, partes diferentes deste. Começaremos com os cães presos por guias até poder fazer um ataque lançado. Precisamos entrar em uma boa profundidade de entendimento para ir ao fundo do problema. A caça vai do fair play ao fair fight, passando pelo fair game. Por fim, pode ir do fair fight à luta, que seria a interação entre caça e defesa. Cães e outros carnívoros disputam a caça leve, mas se unem quando a caça é pesada. Isto é, até certo ponto do fair game, eles lutam pela presa. Depois, eles lutam contra a presa e vice-versa. O treinamento em dupla deve ser feito desse ponto em diante. Não se faz treinamento em dupla com bolinhas, kongs, etc., à exceção de animais que convivem socialmente muito bem. Cães que disputam entre si em um ataque a bite não têm consciência que o humano é seu inimigo. Estão em game leve ou em play. Fazem mais um jogo do que uma proteção. Precisam ter mais raiva da caça e, para isso, de mais rigor de bastão. Um treinamento e exercício paralelo será caminhar com os cães lado a lado para previamente acostumá-los com a presença mútua. A caminhada em locais estranhos deixa os animais mais inseguros e mais dependentes da matilha. Portanto, é a mais indicada pelo menos para o início do treinamento. 116 - ATAQUE CONTRA DOIS FIGURANTES: Um bom cão de guarda efetiva tem que estar apto a lutar contra dois elementos humanos. Para isso, precisa de toda sua agilidade, inteligência e vigor de mordida. Um cão que não tenha sido bitolado na irracionalidade de um treinamento por demais direcionado terá muito maior facilidade de aprendizado, pois maior será seu vínculo com os reflexos instintivos de ataque e de defesa dados pela Mãe Natureza. O cão necessita redirecionar o ataque com a inteligência dada pelos seus instintos naturais. Por isso, um grau de liberdade razoável deve ser dado ao cão para que tais instintos fluam naturalmente. Grande parte do que seria exposto neste tópico já está citado em “Treinamento Avançado com Bite – Cão de Assalto”. O principal segredo deste treinamento é o figurante que estar sendo

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mordido deve baixar seu nível de reação quando o outro se aproxima, e o cão deve aprender a aumentar sua vigilância sobre outro figurante – ou sobre sua volta – enquanto não suspende seu ataque. No início, o figurante que não está sendo mordido se aproximará em ângulo que permita facilmente ao animal notar bem sua aproximação. Aos poucos, irá dificultando tal percepção até um nível de sutileza, devendo, no entanto, continuar sua abordagem a ser notada pelo cão, que deverá atacá-lo, após soltar o outro figurante. O nível do uso do bastão pelo figurante livre deve evoluir sempre que o cão não dê a importância devida a este. Mas, é preciso atentar para uma possível reação paradoxal, na qual o cão, ao invés de trocar a pegada, se detém mais na mordida já encaixada, e isso é muito comum. Caso ocorra tal tipo de reação paradoxal, é evidente que devemos não usar com rigor o bastão, e o figurante ainda solto se limitará a se movimentar mais com a parte do bite a ser mordida o mais próximo possível da boca do cão, enquanto o outro figurante procurará ficar imóvel. É muito importante, mais importante mesmo, que apliquemos anteriormente a esse treino o descrito em “Lingüiça e Troca de Pegada”. Imprintings formatados para trocar pegada quando do fair game no cão de preferência mais jovem auxiliarão muito no momento de treinar o ataque contra mais de um figurante. Um cão não muito bem preparado poderá fugir nesse tipo de treinamento. Portanto, deveremos ter todo o cuidado de não quebrar o cão, moderando o necessário a pressão até que o cão evolua. O objetivo final deste treinamento é que o cão ataque com vigor toda pessoa estranha que dele se aproxime enquanto estiver realizando um ataque. Para que não fique canalizado ao bite, tal treinamento também deve ser realizado, nas fases mais avançadas, com focinheira de treino com mordedor interno. Como o tempo necessário para que ataque dois figurantes é um pouco maior do que o uso recomendável para uma focinheira comum, este último tipo de apetrecho jamais deve ser usado em tal tipo de treinamento e, sim, uma focinheira com mordente. Veja “Focinheira de Treino – Como Deve Ser e Usos”. O dono ou o condutor poderão participar orientando o cão pelo menos nos primeiros treinos com o uso de coleira (ou enforcador travado) e guia. Os comandos aprendidos de "SOLTA" e de "PEGA" irão ajudar muito neste treinamento. Como podemos notar todo treinamento tem o seu ponto fraco, e o cão obstinado e que não solte seu adversário ou não pare de atacá-lo provavelmente terá uma mordida mais avassaladora, mas estará mais exposto ao ataque de dois inimigos. Isso nos faz lembrar da máxima das máximas, "tudo é relativo". Por fim, o cão deverá ser também acostumado a jamais atacar pessoa amiga que se aproxime por trás durante tal treino e até a parar o ataque sob seu comando. É um teste objetivo, prático e difícil de ser realizado por um animal cujo controle emocional não esteja muito bom. Por outro lado, é um teste fácil para um bom cão, treinado e criado com base na confiança mútua com seu dono. Este é um grande teste de temperamento para cães e que denota alto equilíbrio emocional. 117 - DOIS CÃES VERSUS DOIS FIGURANTES: Em verdade, tal treinamento não apresenta quase nenhuma novidade em relação ao disposto em “Ataque Contra Dois Figurantes”. Pode-se fazer esse tipo de treinamento de várias formas. Tanto pode ser um ataque que já inicie com dois cães sendo lançados contra dois figurantes; como começar dois cães contra apenas um figurante, com o outro figurante entrando em cena depois; ou um cão contra dois figurantes, sendo o outro cão solto após o início do ataque. Há, ainda, a possibilidade que se inicie com um contra um, somando-se mais um cão ou mais um figurante que entram em cena simultaneamente. Portanto,

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parece que existem, no mínimo, cinco derivações da forma básica. As técnicas de ataque e de treinamento são basicamente as mesmas das descritas no tópico supracitado. A grande diferença é que sempre os cães deverão dar preferência a atacar o figurante que está solto, isto é, o que não está sendo mordido. A estratégia de ataque sempre deve privilegiar distribuir melhor os cães, tendo em vista, ser o homem um animal inteligente que, uma vez livre, buscará artifícios para reverter a situação. Portanto, os cães devem minimizar tais chances não concentrado seu poder em um só foco. Para que isso seja exeqüível, a técnica é a mesma da já referida no já tópico anterior com trocas de pegada de um para outro figurante, com o figurante já mordido se movimentar menos que o outro e atraindo para ele o ataque de um dos cães. 118 - RECUPERAÇÃO DE CÃES PARA GUARDA CONSIDERADOS FRACOS OU PERDIDOS: Esse é um dos trabalhos mais bonitos e gratificantes da cinofilia. Com ele, conseguimos devolver ao cão sua autoestima, sua autoconfiança, seu gosto pela vida. O cão, em seu estado selvagem, é um animal que naturalmente tem grande instinto de caça. Quase sempre tal instinto está ligado a alto drive de rapina. Do contrário, não seria viável na natureza, pois se alimenta basicamente de animais abatidos. Um cão com boa rapina, que chegue à luta, é um animal que não foi desvirtuado desse instinto natural. No entanto, cabe aqui a ressalva que cães de caça são cães de caça e cães de guarda são cães de guarda. A rapina contra humanos e a caça contra animais por muitas vezes, para não dizer quase sempre, se contrapõe. Falamos no início do parágrafo do instinto básico, elementar e comum entre essas duas entidades. Cães sem tais características ou foram muito mal selecionados na reprodução ou sofreram injúrias psicológicas graves em seu desenvolvimento. Recuperar a capacidade de trabalho de um cão é recuperá-lo também de um trauma grave, que o faz inseguro e, quase com certeza, infeliz. Devolver a um cão sua efetividade é devolver-lhe à felicidade da vida. Antes de nos propormos a recuperar um cão, temos que tentar analisar as causas que o deixam inseguro e suas vulnerabilidades. Depois, teremos que estudar qual é o fio condutor que mais provavelmente o tirará de tal estado. Se as causas estão em seu lar, isto é, na família humana ou nas condições onde ele habita, o recomendável é retirá-lo o mais rapidamente possível desse ambiente. Devemos, também, ter em mente que se não o recuperarmos bem, as condições que deprimiram seus drives provavelmente os destruirão novamente quando retornar ao ambiente. Para isso, teremos que analisar a importância de tais condições e a capacidade intrínseca do cão. Cabe ao adestrador aconselhar aos proprietários que o cão se isole temporariamente da casa enquanto é treinado. Cabe também ao adestrador alertá-los sobre o que e como deve ser mudado no ambiente para que o animal possa se firmar como cão de guarda em seu retorno. Por vezes, nada é preciso fazer além de demonstrar ao cão que pode recuperar seus drives que estavam em latência e mostrar a ele que não será reprimido ao realizar a guarda. Que isso não desgosta seus amigos humanos. Para isso, repetimos: no ataque, o conflito está no figurante; na obediência e ela inclui também não atacar no entendimento de um cão que sempre foi “castrado” em quase todas suas iniciativas, o conflito está no condutor, no treinador, no dono, no familiar. Este pode ser o motivo da não iniciativa do cão não partir para o ataque ou mesmo não correr atrás

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de uma bola. Quantas broncas pode ter levado ao longo de sua vida cada vez que perseguiu uma vassoura, um pano de chão em movimento? Geralmente, começamos nosso trabalho deixando o cão a sós ou, de preferência - se for viável, com outros cães camaradas e com bons drives. Mas, de forma alguma, devem ser cães com tendência dominante muito marcante. Neste caso, é preferível deixar o cão a ser recuperado só. Podemos usar vira-latas para essa finalidade, desde que não notemos, no cão a ser recuperado, agressividade contra a própria espécie que poderá se manifestar assim que comece a se recuperar. Um ambiente espaçoso é sempre preferível. Uma casinha quente e confortável é importante. O importante é que o ambiente seja tranqüilo e confortável. Um período curto, variável conforme estado emocional do cão, será necessário, deixando o cão sossegado até que conheça e confie nas pessoas que o alimentam e entram em seu espaço. Jamais, por nenhum motivo, ralharemos ou castigaremos o animal. Esse período de adaptação é fundamental e deve ser respeitado antes que se inicie qualquer trabalho. Não respeitar tal período seria trabalhar exatamente em sentido oposto aos nossos objetivos. Se a personalidade do cão permitir, deveremos colocá-lo em uma matilha, após o deixarmos isolado em local onde a matilha possa se acostumar à sua presença sem alcançá-lo. O disposto no tópico "Matilha, Convivência e Levantamento de Drives" deve ser observado. Assim que notarmos uma melhora, poderemos colocar no cão uma guia com coleira e darmos longos passeios sem que lhe seja aplicado qualquer ensinamento. Apenas ofereceremos, sempre que possível, iscas, após chamarmos amigavelmente seu nome, acompanhadas de afagos e elogios. O uso do clicker pode ser útil nos momentos agradáveis para repeti-lo depois quando conveniente. Se o cão não for treinado a andar com guia, seguiremos o que está em "Guia, como Acostumar um Cão a Usar". Uma outra pessoa poderá - e isto será conveniente - passear com outro cão, no início, de preferência do sexo oposto junto com o cão a ser recuperado e seu condutor. Quantos mais cães puderem caminhar juntos, melhor. Com tal procedimento, é provável que cedo comecemos a notar mais confiança no animal em seu modo de andar de farejar os locais por onde passa, em colocar seu odor com urina por onde passa, se for um macho. Esse será um bom sinal de que está melhorando seu caráter. Animais muito deprimidos e amedrontados podem até não fazer isso. As horas noturnas e frescas são as mais indicadas para passeios. Locais ermos também são os mais indicados. Deve-se deixar os cães irem à frente, tracionando moderadamente a guia. Deve-se alternar qual cão segue na frente da matilha. Deve-se obrigatoriamente usar coleira, peitoral ou enforcador travado. Jamais enforcador ativo em todos os animais da matilha, principalmente no(s) que deve(m) ser recuperado(s). Com o tempo, podemos solicitar que alguém, previamente oculto, provoque levemente os animais e observe suas reações. Os animais de temperamento firme deverão ir à frente, e o cão a ser recuperado deve seguir logo atrás. A reação deste deve ser observada, e ele não deve ser estimulado pelo condutor. O condutor não deve olhar para o cão encarando-o, mas se focar no figurante, para estimular o cão a imitá-lo. O condutor deve se deixar levar pelo cão quando aparece o figurante. Jamais deve forçá-lo para junto deste. Quando o figurante se aproximar do cão, este deverá ser contido de forma suave pelo condutor para que observe a ação dos demais cães que

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deverão se aproximar mais do figurante. Tal aproximação deverá ser progressiva, treino a treino, e deve chegar somente à distância que o não se sinta ainda pressionado. O figurante deverá simular fuga, e os cães devem persegui-los. Essas fugas podem ser realizadas por centenas de metros. Isso estimulará muito o aparecimento do drive latente de rapina. O figurante deve desaparecer sob a perseguição dos cães e não retornar à cena. Após o figurante fugir e desaparecer, o condutor deverá elogiar os cães. Ser “contido de forma suave” significa evitar ao máximo dar puxões na guia quando o cão de alguma forma investir contra o figurante ou deste tentar se aproximar. Significa amortecer ao máximo os impactos na guia para conter a progressão usando os membros superiores do condutor como amortecedor. Aliás, esse é um cuidado que deve ser constante em todo treinamento efetivo de ataque. Isso pode ser repetido algumas poucas vezes no mesmo treino. Após sentirmos que nosso cão está se tornado seguro, o figurante poderá aparecer portanto lingüiças que poderão ser mordidas pelos cães mais dispostos. O figurante fugirá arrastando moderadamente os cães que mordem o artefato através deste. Só devemos deixar que o cão a ter o temperamento recuperado tente morder a lingüiça quando percebermos capaz para tanto. Jamais permitir que se aproxime o suficiente para que possa morder se não o for fazer. Isso dará condicionamento de ficar perto do objeto de mordida sem mordê-lo. Quando ele o fizer, o figurante deverá correr arrastando-o, assim como fez com os outros cães. Tudo de forma inicialmente delicada respeitando as limitações de cada cão. Jamais deveremos tentar forçar reação deste cão através de estímulos para a defesa. O treinamento correto para ele é o preconizado no tópico "Matilha, Treinamento e Levantamento de Drives" e, quando estiver mostrando melhora consistente, deverá iniciar seus ataques conforme o explicitado no tópico "Ataque em Dupla". O cuidado que devemos tomar é de inicialmente lançar o cão recuperado juntamente com outro cão que ataque sem problemas. Aos poucos, vamos deixando para soltar o outro cão, um segundo de tempo ou dois após haver solto o cão em recuperação. Esse tempo deverá ir aumentando gradativamente até que o cão recuperado vá só até o figurante sem o apoio do companheiro. Por fim, o companheiro nem precisará estar presente. Da mesma forma, assim que o cão estiver firme no ataque, o figurante deverá evoluir da fuga para o enfrentamento e acostumar o cão com graus mais severos de intimidação, tanto psicológica quanto do bastão. Isso dever ser feito muito paulatinamente e com todo o cuidado para que o cão não se traumatize. Elogios não devem ser poupados por parte do dono e condutor. O que devemos alertar é que a brusca mudança do ataque em dupla para o ataque solo pode levar o cão ao congelamento, isto é, a ficar sem saber como se comportar de evoluir o ataque, ter uma mordida fraca e conflito e inconsistência no ataque. Poderá logo entrar em pré-fuga e fuga. Também não se deve manter inicialmente no ataque solo a mesma pressão do ataque em dupla. A recuperação de um cão depende: (1) da herança genética do exemplar - o que inclui as tendências raciais e familiares; (2) da idade do cão (mais jovem, melhor, pelo menos no longo prazo); (3) dos traumas sofridos pelo exemplar; (4) da natureza desses traumas; (5) da intensidade e freqüência desses traumas; (6) das demais vivências do exemplar que formaram seu caráter; (7) do tempo que elas vigoraram; (8) do método de recuperação empregado - matilha é o melhor; (9) da capacidade do adestrador e dos figurantes, incluindo experiência, sensibilidade, habilidade e conhecimento; (10) do ambiente fornecido ao cão; (11) do carinho de seus tratadores; (12) das características dos demais cães que conviverem com ele no período de recuperação; (13) do tempo de recuperação.

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119 – DESVIOS DE ATAQUE: Cães, por vezes, desviam o alvo de seu ataque. Isso é chamado na cinofilia, de um modo geral, de redirecionamento. Conceituaremos redirecionamento ao desvio do foco de um ataque que mantenha, ainda que com drive diverso, a intenção de atingir algo diverso do inicial (pessoa, animal ou qualquer outro alvo) que entenda como presa ou ameaça como seu foco principal. Isto é, o objeto principal do ataque muda e o novo elemento passa a ser o objeto principal. Os redirecionamentos podem ocorrer pela impossibilidade do cão alcançar sua presa ou o que entende como ameaça. Neste caso, irá morder aquele que pode alcançar. É comum ver cães contidos por cercas morderem seu companheiro na impossibilidade de atacarem seu foco primário que despertou algum drive de proteção. Outra forma de ocorrer redirecionamento é o cão perceber ameaça mais contundente ou outra presa preferencial após partir para o ataque. No primeiro caso, ilustraremos como um cão que desvia seu ataque ao perceber que outra pessoa ataca seu dono. No segundo, daremos como exemplo o cão que percebe em meio ao ataque a presença de uma presa que o atraia mais, isso pode ocorrer por cinetaxia, isto é, pela presa se movimentar mais. Ou por ser presa cujo cão já tenha adquirido fissura ou raiva. Pode ser por ser de tipo que lhe desperte mais interesse, mulher para homem, figurante para um gato ou outro cão, etc. Via de regra, o drive em questão se mantém. Mas, isso não é condição obrigatória. Um cão pode desviar um ataque em rapina para defender seu dono, o que lhe despertará seu drive de defesa. Quase sempre os estímulos provocados pela defesa se sobrepõem aos despertados pela caça, tendo em vista a defesa advir de necessidades mais urgentes para sobrevivência do indivíduo ou do grupo. Há ainda outros desvios de foco que não se constituem exatamente um redirecionamento, pois o foco do novo ataque é secundário e não principal. Um deles é o que pode ser chamado como “defesa da caça”. Para que ocorra a defesa da caça, o cão tem que perceber o foco principal de seu ataque como presa. Logo, é necessário que o drive do ataque ao foco principal seja em rapina. Provavelmente, rapina em nível baixo (fair play ou fair game). A rapina em nível de fair fight implica na percepção do cão de presa mais perigosa. Nesse caso, outros cães são bem-vindos para auxiliarem na tarefa de combaterem a presa. O mesmo, com mais ênfase, ocorre na luta. Tais ataques em defesa da presa ocorrem mais com “presas mortas”, isto é, com mordentes largados pelo figurante e conquistados pelo cão, como mangas e lingüiças. Na situação selvagem isso equivaleria a uma lebre abatida pelo cão, que seria defendida de outros cães. Um cão que lute contra uma presa grande, como um javali, dificilmente iria lutar contra outro cão que esteja atacando tal animal. A ajuda é bem-vinda, e o nível de rapina que na lebre era fair game ou até fair play, no ataque a um javali deverá ser fair fight, se não, luta. Por isso cães condicionados a atacarem em níveis de rapina mais baixos têm maior tendência a atacarem outros cães durante um ataque em matilha. Observemos que o ataque principal ocorre sob a égide da rapina, mas o ataque em defesa da caça ocorre sob o drive de defesa. A defesa da caça não pode ser considerada exatamente como um redirecionamento, pois o foco principal não muda, o ataque secundário visa apenas proteger o fruto do primeiro ataque, muito embora, o foco principal possa mudar violentamente se houver reação daquele que foi ameaçado ou agredido pelo cão. Aí, se constituiria um novo ataque, uma nova situação, e não um desvio de ataque.

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Há o caso do cão que morde o condutor apenas como tática para ser solto e poder seguir o ataque ao foco principal em qualquer drive de proteção, mas mais provavelmente em rapina. Não é um redirecionamento, pois o foco do cão se mantém. Um cão que tenha tal procedimento está demonstrando falha grave no controle. Há que levantar o paradrive de obediência, pois há nítido desequilíbrio entre este paradrive e algum dos drives de proteção. Tal tipo de descontrole pode ser provocada pela exacerbação de algum drive, mas se constitui em agressividade, provocada por descontrole emocional. Outro caso mais sutil é a proteção feita pelo macho à fêmea ou a do macho ou da fêmea aos filhotes. Quando há impedimento de alcançar o alvo, o macho espanta a fêmea, sem, no entanto, mordê-la. Se morder, o faz muito levemente para fazê-la recuar. Isso só ocorre quando há impedimento de se alcançar o alvo. Em um ataque duplo a bite, por exemplo, isso não ocorre. A natureza faz com que os machos tendam a se exporem mais para protegerem a fêmea e a prole e manterem a propagação da espécie. Pássaros machos são mais vistosos para atraírem seus predadores e chamarem para si a atenção desses. As fêmeas de diversas espécies também dão preferência a machos mais vistosos por puto instinto porque estes as protegem mais por chamarem para si maior atenção. 120 - COMANDOS MÍMICOS: Muitas vezes, temos intenção que nosso cão nos obedeça sem que seja preciso darmos a ele comandos verbais que chamem atenção de outros indivíduos. No tópico "Rastejar", condicionamos o cão a se deitar e rastejar ao lado do seu condutor, "imitando" o procedimento deste (colocamos "imitando" entre aspas, pois não é essa a intenção do cão). Na verdade não houve mímica alguma, mas algo similar, pois também houve obediência ao comando visual. Vejamos, a seguir, a mímica dos demais comandos. Devemos lembrar que é técnica comum em todos eles diminuir gradativamente o volume da voz enquanto realizamos o comando mímico. Outra técnica indispensável é chamar a atenção do cão para nossa mão. Para isso, basta – literalmente - estalar os dedos. "SIT". Este comando será substituído facilmente colocando a mão, apontada para cima, espalmada acima e à frente do animal e a "empurrando" lentamente para frente enquanto entoamos o "SIT". "DEITA". Colocamos a mão espalmada, com a palma para baixo, por cima e à frente do focinho do cão e a “empurraremos” para baixo lentamente, enquanto dizemos "DEITA". "FICA". Após o cão estar sentado ou deitado, colocamos a palma da mão na posição em que comandamos o "SIT” e a empurramos rapidamente em iguais movimentos aos dos comandos anteriores, a trazendo de volta com igual velocidade, como se fosse um golpe. "VEM". Desta vez, colocamos nossa palma da mão voltada para nós e a movimentaremos em nossa direção, como se chamássemos uma pessoa. A mão deverá apontar para cima. "JUNTO". Não há mímica para esse comando, uma vez que normalmente é dado quando o cão está distraído e não olha para nós. A única solução é associar previamente o cão a olhar para nós por algum som que emitamos, o que poderá ser "trocar seis por meia dúzia". Mas, se assim preferirmos, será só antes de chamar o nome do cão, o acostumar a ouvir o som, que pode ser um

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assovio, um chiado, simular tosse ou qualquer outro som. Depois que o cão olhar, será a mesma mímica usada em "VEM". Se o cão estiver olhando para nós, a mímica será a mesma da feita no comando “VEM”. "NÃO". Geralmente, este comando não é dado quando o cão não nos olha. A solução é remediar substituindo o comando verbal por outro som, assim como o "JUNTO", podendo inclusive ser o mesmo som. Caso o cão olhe para nós, usaremos como mímica colocar o indicador para cima como se estivéssemos ralhando com o cão. "PEGA". Balançaremos nosso dedo indicador à frente do cão e o apontamos para o alvo. "BUSCA". Idêntico ao "PEGA". "CUIDA". Usa-se mais um chiado baixinho quase que perceptível só para o cão. Mas, pode-se colocar a mão apontada para baixo á frente do animal e mimetizar um dedilhado enquanto se chia, até não precisar mais deste último recurso. "SOLTA". Colocaremos o dedo indicador à frente dos olhos do cão e o sacudiremos, tocando em seu focinho. Não há nenhuma razão para quando ensinarmos os comandos verbais, na medida do possível, não ensinarmos também os comandos mímicos. 121 - COMO DESENVOLVER O POTENCIAL DE PROTEÇÃO: Donald Winnicott, pediatra inglês que se tornou um dos maiores psicanalistas da história. Winnicott, discípulo de Melanie Klein, que foi discípula de Freud, defende que o ambiente da criança ainda muito pequena é que definirá a o núcleo da sua psique. Winnicott discordou implicitamente que o complexo de Édipo, como até então se acreditava, ser a parte ambiental mais importante na formação da personalidade. Esse meio-ambiente era definido principalmente pela mãe, pela sua capacidade de dar maternagem, de abraçar (holding) e se relacionar de forma harmônica com o seu bebê. Muito antes que o conflito descoberto por Freud, o bebê tem, como seu principal conflito, sua própria existência, física e psicológica. O carinho materno é a principal garantia dessa segurança. Sua existência ou sua ausência é que irão construir o principal elemento da psique dado pelo meio-ambiente. Cabe ressaltar que na criança humana, a fase em que isso ocorre é pré-simbólica, isto é, a criança ainda é jovem demais para simbolizar e exprimir seus anseios, não fala e não pensa de forma racional. É como um bichinho, um cãozinho. O desenvolvimento do intelecto, no que tange aos aspectos dedutivos da inteligência, ocorre posteriormente a esta fase. Nada leva a crer que o que ocorre com os bebês humanos não ocorre também com os cães. Pelo contrário, a experiência indica que sim. Muito antes de conhecer a obra de Winnicott, o autor já havia notado que mães histéricas e inquietas não geram bons cães de guarda. Que um bom cão de guarda depende também de uma boa mãe, calma e que transmita segurança e conforto à sua prole. Winnicott disse que a mãe não precisa ser maravilhosa. Precisa somente ser “suficientemente boa”. A partir de um mínimo ofertado pela mãe, o bebê evoluirá em seu máximo. E que esse mínimo é subjetivo, isto é, será percebido de forma diferente por cada bebê. Essa subjetividade provavelmente seja influenciada por fatores genéticos.

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Nas crianças, podemos dizer que a figura única da mãe gradativamente, via de regra, é substituída pela a da mãe somada a do pai. Nos cães, a mãe é substituída pelo dono e outras pessoas da casa como influenciadoras do seu desenvolvimento temperamental, além da de outros cães que convivam com o filhote em sua idade mais tenra. Parodiando Winnicott, diríamos que o filhote precisa de um ambiente suficientemente bom para seu bom desenvolvimento. Se formos levar em consideração que o cão adulto mantém a condição mental de uma criança pequena no que tange à sua carência de simbolização, podemos concluir que o cão, no desenvolvimento global de sua personalidade (temperamento + caráter), necessita de bom ambiente por toda a sua fase de desenvolvimento mental, que inclui bom dono, bons familiares, bons companheiros caninos e um bom adestrador, além de um bom figurante. Isso tudo inclui, obviamente, alimentação, treinamento adequados e carinho. Observemos que “minimamente adequado” tem um significado de não perseguir obsessivamente o melhor dos melhores, principalmente no que se refere a treinamento. Isso pode até atrapalhar o bom desenvolvimento do cão, pois uma ansiedade demasiada por parte do dono acabará por ser sentida pelo cão que ficará apreensivo e, por fim, tolhido em sua expressão natural. Outro fator primordial no dono “suficientemente adequado” é este não ter paranoias sobre dominância, muito comum por muitos donos e adestradores. Um cão sempre tolhido em todas suas investidas não tem um ambiente suficientemente adequado. Paranoias como não deixar o cão frequentar a intimidade da família, não poder ganhar uma porção do que o dono come, não poder caminhar à frente denotam donos e adestradores inseguros ou mal informados. Um bom guarda deve ter um bom grau de liberdade. Exercícios e até esportes que exijam excessivo controle provavelmente irão impedir o cão chegar a seus drives potenciais. Seria bom voltar, em caso de dúvidas, para o tópico “Drive Atual, Drive Latente e Drive Potencial – Elasticidade de Drive”. Da mesma forma, um dono preocupado demais em perder sua liderança para o cão irá acabar por enfraquecer a personalidade deste, como um pai que educa com excessivo rigor seus filhos. A palavra-chave para tal questão é moderação. Moderação não significa um meio-termo constante para todos os cães. Assim como, com relação ao binômio intensidade/controle, moderação significa adaptar o método para as especificidades para cada cão e para cada finalidade (mais obediência ou mais intensidade nos drives de proteção?). No caso da dominância, moderação significa apenas sufocar ao mínimo necessário esta característica para uma boa e segura convivência com o cão. Um bom dono ou adestrador deve ser seguro o suficiente para naturalmente ser o alfa dominante sem precisar usar qualquer autoridade em excesso. Quanto menos autoridade precisar ser exercida, melhor. É claro, que tal qualidade não se compra em farmácia, mas é importante levar isso em conta quando falamos sobre drives potenciais. O comentado até aqui neste tópico refere-se ao ambiente como primeiro fator para maximizar as futuras qualidades de um cão de guarda. O segundo fator é a socialização. Devemos deixar o cão desde cedo conhecer o mundo e não o temer. Ambientes diferentes, animais diferentes, pessoas diferentes (com ou sem aproximação, dependo da futura missão do cão), situações diferentes, ruídos, etc. O terceiro fator é o que está descrito por todo este capítulo: estimular os drives de proteção de

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forma gradual e progressiva. Brincadeiras progressivas, bolinhas, linguiças, talvez manga, bite para elevar positivamente a caça e pressão progressiva para o estímulo do drive de rapina, bastão com frequência e intensidade progressivos e ameaça progressiva no estímulo do drive de defesa. Rapina sempre estimulada e firme antes de estímulos de defesa. A exceção a esta última regra e que é uma colaboração nossa ao treinamento efetivo de cães é o modelo materno em defesa. Esse treinamento consiste em uma ameaça à mãe feita por pessoa estranha. A ninhada deverá ter no mínimo 90 dias e ficará junto à mãe. Mãe e filhotes devem estar isolados do estranho por uma tela ou grade. O estranho não deve se aproximar menos do que um metro da tela ou grade. O estranho deve tomar atitude silenciosa e ameaçadora contra a mãe. Sempre de forma progressiva e branda ameaçar a mãe. De forma branda, porque mesmo que ela esteja bem preparada a responder estímulos para levante do drive de defesa, seus filhotes não estarão. Uma batida no chão ou na grade, um som forte, pode trazer insegurança aos filhotes. É claro, que isso só pode ser aplicado se a cadela tiver tal drive em boas condições, isto é, resposta em drive de defesa resoluta. As batidas mais fortes até podem ocorrer se fizermos alguns treinos regulares e com filhotes um pouco mais velhos e formos incrementando a intensidade de forma muito prudente. “Alguns treinos” significa alguns treinos e não muitos treinos. Não será producente estimularmos demais nem pelo excessivo número de treinos menos ainda pelo excessivo tempo de cada treino. De vinte segundos a um minuto em cada treino com uma frequência máxima de duas a três vezes por semana estará mais do que bom. À tal técnica batizamos de ‘triangularização da defesa’. Essa foi a fórmula encontrada para ativar a defesa sem provocar a insegurança inerente a esse drive. Em verdade, quem suporta a pressão de defesa é a mãe. Ela devolve na forma de ataque. Os filhotes imitam o modelo de comportamento sem serem pressionados. Assim, a defesa ficará mais alicerçada no temperamento dos filhotes e será despertada com muito mais facilidade em idade mais adiantada. Observem que tal método causa um imprinting comportamental de defesa já adquirido na infância, sem trazer as inseguranças inerentes ao estímulo deste drive. Relembre sobre ‘imprinting’ no tópico “Drive de Defesa e Drive de Rapina”. O grande risco de tal método, principalmente se o adulto presente não for a mãe, é de este redirecionar seu ataque para algum filhote, tendo em vista não poder alcançar o figurante e não suportar a frustração, e esta ocorre na rapina, drives em alto nível se misturam, não acreditem em pseudoentendidos que advogam o contrário com explicações sobre animais selvagens. Cães não são animais selvagens. Aconselhamos que sempre, pelo menos até ter confiança no cão adulto, estejamos juntos a ele e com o uso de coleira (não de peitoral, com menor controle sobre a cabeça do cão) e guia para evitarmos alguma tragédia ou, no mínimo, algum trauma psíquico grave no filhote mordido. Aí, o resultado sairá pela culatra. Em suma, o dono e o treinador devem propiciar o meio ambiente e os estímulos adequados, sem paranoias de dominação e sem paranoia que o cão vá além do seu drive potencial. Por isso, o termo ‘roubado’ da teoria winnicottiana, ‘minimamente adequados’, pois tentar ir além do possível, via de regra, significa retroceder em relação a ele. Ansiedade de ter o melhor cão acaba exercendo pressão insuportável sobre ele. Poderá fazê-lo transformar-se em um cão de baixa qualidade para guarda, irá impossibilitar chegar a seu drive potencial. Maximizar as possibilidades de um cão é dar a ele o que é saudável e normal, além de aplicar de forma gradual e não obsessiva os conhecimentos técnicos da etologia nos estímulos de seus drives.

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O próprio modelo materno de resposta em defesa é copiado da Mãe Natureza, o que fizemos foi apenas aplicá-lo à cinofilia. 122 – INSEGURANÇA, MEDO E CORAGEM: Há no meio cinófilo uma enorme confusão sobre essas entidades. Por vezes, critica-se o cão por dar sinais de insegurança. O que importa, para a guarda real, não é se há ou não insegurança inicial, mas se o cão consegue vencê-la. Um cão, um homem, um lutador, um guerreiro, sem insegurança alguma é um alienado, um tolo que pensa que é alegre, uma vítima em potencial da realidade que cairá sobre ele. E o mais importante, para construir segurança temos que desafiá-la e deixar que ela vença. Sem desafio algum, nada sabemos. É o caso da guarda natural, pode até haver, mas como vamos saber? A única situação que nos permitiria que pudéssemos saber seria se o cão na realidade tivesse que lutar de verdade com um inimigo real e vencê-lo ou pelo menos fustigá-lo muito sem deixar que o medo o vença. Vamos ficar esperando que alguém resolva invadir nossa casa para saber? A cinofilia de guarda não-esportiva e a cinofilia esportiva de qualidade, isto é, a cinofilia destinada à guarda real (guarda civil, ou guarda efetiva), necessita que o cão tenha certa dose de insegurança. Isso, pois, o drive de defesa baseia-se em algum resíduo de insegurança. Um cão sem drive de defesa terá enorme dificuldade de exercer a guarda, principalmente territorial. Terá até dificuldade de distinguir as situações de perigo. Muitos exercícios no esporte exigem que o cão tenha um mínimo de insegurança ou que demonstre insegurança alguma. Há que saber até que ponto a ausência de insegurança não está baseada muitíssimo mais na inocência, no desconhecimento do perigo do que na coragem. Uma criança que não sabe que uma arma atira e mata não terá medo algum que alguém lhe aponte uma arma. Um cão que nunca foi experimentado com golpes de bastão provavelmente não vê nele qualquer ameaça. O bastão e a postura ameaçadora do figurante podem ser banalizadas até que o cão não perceba qualquer ameaça neles. E isso é muito fácil de se fazer. Um bom guarda precisa conhecer o potencial de seu inimigo para poder enfrentá-lo com condições de vencê-lo. Do contrário, provavelmente, será surpreendido na primeira sensação de dor, na primeira reação mais violenta do antagonista. Um bom cão precisa sentir um pouco de medo e ter muita coragem para desprezá-lo. Quem não tem medo não é testado na coragem. Coragem não é ausência de medo, isso é alienação. Coragem é a capacidade de superar o medo. Ao medo não vencido, chama-se pavor; ao medo superado, chama-se coragem; ao medo desconhecido, chama-se alienação. Treinamento alienante é aquele que treina o cão de forma que as ameaças impostas sobre o cão sejam ignoradas por este, não pelo incremento da coragem, mas pelo desconhecimento do cão sobre o perigo que elas representariam quase sempre através de artifícios de acostumar o cão a eles até que o deveria ser visto como ameaça passe a ser visto como algo neutro. Em termos práticos, essa ponta de insegurança que deve se manter no temperamento do cão é que dá as características de defesa e de luta que um cão de guarda necessita, uma mordida penetrante e sacudida, uma boa esquiva, quando necessária, sem, no entanto, perder o foco e a força do ataque. 123 - DRIVES, PARADRIVE E OS ELEMENTOS DE PRESSÃO E CONFLITO: Neste item vamos considerar sobre os elementos de conflito em diversas situações. A primeira situação é a

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situação que ocorre no drive de defesa. Qual é o elemento que se conflita com o cão? Obviamente, é o figurante. É o figurante que faz com que o cão aumente sua defesa, tanto quando na defesa resoluta quanto quando na pré-fuga. Há nesse caso um conflito inerente entre o cão e o figurante com estados emocionais, como medo, ansiedade, ou raiva, sós ou combinados, que derivam da ameaça percebida pelo cão pela presença ou atitudes do figurante. No drive de rapina em nível de fair play não existe qualquer conflito. O que há é apenas o foco do cão sobre o objeto. Conforme esse drive for elevando seu nível o cão começa a incorporar elementos de preservação à sua psique. Isso ocorre, pois aumentam os riscos no embate contra a presa e, assim sendo, o conflito com ela, na figura do figurante. Quando falamos em riscos, não falamos sobre riscos reais, mas nos riscos percebidos pela psique, bem como na dor que porventura for imposta pelo bastão. O conflito com o figurante irá crescer até que se chegue ao nível de luta. Já na obediência, ou paradrive de obediência, o conflito não é com o figurante, mas com o condutor. Pois este é que exigirá do cão a obediência. O mais difícil na cinofilia de guarda é justamente equilibrar tal conflito com o conflito imposto com o figurante. Muitos cães cujos donos ou condutores exijam em demasia obediência e por métodos não corretos, como baseado nos gritos raivosos ou no castigo físico, isto é, com uma pressão exagerada ou mal feita, podem simplesmente não atacarem, não pelo conflito com o figurante mas por conflito com o condutor. A busca do cão equilibrado deve levar em consideração todos esses fatores. Quando se fala em equilíbrio de drives e paradrive, fala-se também modulação desses conflitos. 124 - CONCLUSÕES: Por todo este capítulo vimos que os estímulos positivos devem sempre que possível ser a base da obediência. Mas, que os estímulos negativos precisam ser usados como reforço após os imprintings iniciais estarem formatados. Por melhor que sejam os estímulos positivos, se forem somente eles aplicados, poderão dar ao cão a sensação de que obedecer é um grande prazer, mas que pode ser feito apenas quando se tem vontade, sendo portanto visto como algo opcional. Os estímulos negativos devem corrigir a impressão da opcionalidade da obediência. Os estímulos passivos não devem ser desprezados e, em alguns aprendizados, como o do comando "SOLTA", são os principais. O método deve ser todo flexível e adaptável a qualquer cão. Não devemos 'arrastar' o cão até o método, mas levar o método até o cão, para depois conduzi-lo através do método. Sempre que possível todo método de treinamento não deve contrariar os estímulos e as tendências naturais dos animais, mas, sim, se aproveitar destes. Isso minimizará os conflitos e potencializará as capacidades do cão. Deve-se evitar, salvo em ou outro caso especificado, "bater de frente" com o cão. Todo o método é calcado na amizade simbiótica cão-dono. O carinho e o elogio nunca devem ser desprezados. O inerente conflito entre os drives de proteção e a obediência deve ser minimizado ao máximo. Mas, sempre a obediência irá frear, por menos que seja, algum drive, e estes ao serem realmente levantados além de certos níveis, por menos que seja, irão prejudicar em muitos casos a obediência. Por melhor que seja um cão e por mais que ele seja bom tanto em relação a seus drives de proteção quanto à obediência, sempre ele poderia ser melhor em um desses pólos em detrimento do outro. Não há, no entanto, um ponto ideal geral para todos os cães, nem para todos os treinadores, para

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todos os donos, para todas as funções. Disso decorre que o melhor treinamento para esporte não será o melhor treinamento para guarda e vice-versa. Disso decorre também que o melhor treinamento para um esporte não será o melhor treinamento para outro esporte. Indo além, o melhor treinamento para uma exigência da guarda efetiva não poderá ser o melhor treinamento para outra exigência da guarda efetiva. Todo tipo de treinamento tanto no que se refere à polaridade entre obediência e gana, quanto aos próprios imprintings formatados de localização de mordida; quando soltar e trocar a mordida ou quando fixar a mordida; quando redirecionar ou não, etc. têm suas vantagens e suas desvantagens. Cabe analisar seriamente qual o tipo de guarda queremos para formar o nosso cão, além, é claro, do que ele pode oferecer suas capacidades e limitações. Por exemplo, um cão que é mais obstinado pode ser mais eficaz em sua mordida, mas pode ser vítima mais fácil se não souber soltar e trocar a pegada ou, até, se direcionar para outro inimigo. A arte de adestrar e de figurar é uma eterna evolução tanto do conhecimento quanto da própria pessoa que a pratica. O bom-senso e o observar e compreender os cães devem ser nossos principais mestres. - Lamber os lábios; - Olhar para os lados ou desviar o olhar quando encarado pelo figurante; - Bocejar; - Deitar; - Dar as costas para o figurante; - Sentar virado para o condutor; 125 - CONSIDERAÇÕES FINAIS: Um cão sujeito à agressão aberta por parte do figurante (aquela na qual o figurante investe contra o cão) pode entrar em defesa que pode ir da pré-fuga à defesa resoluta. Da pré-fuga, poderá evoluir para a fuga ou mesmo fugir diretamente assim que for atacado. A mordida caso ocorra será dada pelo medo. E que tipo de mordida será essa? A resposta estará simplesmente em como esse cão superou os seus medos. Se superou bem, será em defesa resoluta. Do contrário, em pré-fuga. E a defesa simples? Bem esta será algo que pode ocorrer caso o cão ainda não tenha superado seus medos e, como esta defesa é instável, ela tenderá a evoluir para a pré-fuga e até fuga (conforme pressão dada pelo figurante) ou poderá evoluir para a defesa resoluta. Quando ela evoluirá da defesa simples para a defesa resoluta? Isso ocorrerá quando o cão superar seus medos durante a ação. Quando isso ocorrer, o cão estará galgando um importante degrau em seu drive de defesa. Se bem conduzido após essa fase, provavelmente o manterá nos próximos treino e isso se incorporará a seu caráter. Pode também em um cão com alto drive de rapina que a mordida mesmo nessa situação seja dada pela rapina, pois o figurante será visto como presa mesmo que corra na direção do cão. A autoproteção pode levar a duas respostas finais: à defesa ou a à evitação. O que é evitação? É o cão não esboçar reação de defesa, pode ser na forma de fuga, de fingir indiferença, de se tornar submisso podendo até se deitar de barriga para cima. A evitação está ligada à submissão e a defesa à dominância. O que pode levar a uma ou a outra são dois fatores: o nível da pressão e a coragem do cão. Quando o nível de pressão está muito alto e há risco de o cão não suportá-lo, o figurante deve se colocar em fuga, estimulando assim a rapina do animal. O agressor passará a ser presa e isso estimulará o cão até que sua defesa evolua na continuidade dos treinos.

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O agressor passar à condição de caça é elemento de incremento dessa defesa. Há quem diga que defesa e rapina não se misturam em uma mesma situação, pois tem como base estímulos bem diversos, a autopreservação ante um ataque e a fome, respectivamente. Bom, mas essa não é minha opinião nem a de grandes nomes do schutzhund como Helmut Raiser. Cães não são mais animais selvagens, e mesmo nos carnívoros selvagens nada faz crer que não ajam da mesma forma. Será que uma onça faminta atacada não irá atrás do inimigo se este for comestível e se colocar em fuga? Não vamos nos alongar nessa discussão, pois nosso objetivo e falar sobre cães, não sobre outros carnívoros. E não é somente isso. Eliminar o inimigo também é uma estratégia da defesa. Por isso, perseguir o inimigo derrotado, provocar nele o terror ou mesmo matá-lo é minimizar o risco de ser atacado de novo. A inversão da situação de atacante para atacado irá inverter o vetor do medo e se colocar em fuga aumentará esse medo, por isso o inimigo ainda que escape ileso terá menor probabilidade de atacar novamente. Neste caso, uma perseguição que tivesse evoluído de uma defesa seria uma continuidade da defesa ou uma rapina? Creio que na maioria dos casos comece pela primeira podendo evoluir para segunda. Mas, pouco importa, pois muito difícil a resposta a tal pergunta e ela pode ter os dois componentes. O que importa é que se colocar em fuga em relação ao cão que se encontra em defesa é uma boa e quase que necessária estratégia na maioria dos treinamentos quando se eleva o drive de defesa. Outra forma seria o alívio da pressão do figurante na forma de diminuição da pressão do bastão e diminuição da ameaça em nível de postura do figurante. O aumento da pressão irá aumentar o volume do drive e este deverá chegar à luta, com aumento do sacolejamento da mordida e de sua pressão. A parceria com outros cães ou com o condutor leva o cão a aumentar suas chances de defesa e diminuir a chance de evitação. Por essa razão que o ataque em matilha é um ótimo incentivo aos cães em seu trabalho de guarda. Outro fator em questão é o território. Quanto mais próximo à zona de maior conforto do cão (centro psíquico do território), maiores serão chances de defesa. Quanto mais afastado dessa zona, maiores serão as chances de evitação. Existem três teorias que tentam explicar por que os cães têm comportamento de ataque relacionados à defesa ou à agressividade. A primeira explica que o cão ataca por imitação, ao ver seu semelhante ter esse comportamento. Isso ocorre por processos de aprendizados que ocorrem em fases primárias do desenvolvimento do temperamento através de experiências bem sucedidas (teoria da resposta psicológica aprendida). A segunda explica que a agressividade pode vir pela frustração através de privações dos impulsos ou instintos. Essa como o nome já a explica é a teoria da agressividade por frustração. Ela ocorre muito quando vemos redirecionamentos inadequados de ataques. Mas pode também ser explorada como um meio de estimular o cão ao ataque. A terceira explica a agressividade e também a defesa como um impulso nato, esta estaria ligada à dominância e, provavelmente, à defesa do território. Nós cremos que essas três teorias se confirmam na prática e suas motivações interagem entre si, todas elas explicando e sendo responsáveis pelo drive de defesa.

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A degradação do conhecimento inicia quando se exaurem as dúvidas (o autor). ÍNDICE DOS TÓPICOS DO CAPÍTULO: 001- OBJETIVOS DO CAPÍTULO 002 - HERANÇA E VARIABILIDADE GENÉTICAS 003 - SOBRE DRIVES 004 - DRIVE DE RAPINA 005 - DRIVE DE DEFESA 006 - DRIVE DE DEFESA E DRIVE DE RAPINA – CONSIDERAÇÕES FISIOLÓGICAS 007 - RAPINA PARA A LUTA E O DRIVE DE DEFESA 008 - SISTEMA LÍMBICO. O QUE E ISSO? 009 - DEFESA PARA RAPINA 010 - RAPINA OU DEFESA? 011- OS CÃES DOMÉSTICOS TÊM DRIVES IGUAIS AOS LOBOS E OUTROS CARNÍVOROS? 012 - DRIVE ATUAL, DRIVE LATENTE E DRIVE POTENCIAL – ELASTICIDADE DE DRIVE 013 - APTIDÃO PARA GUARDA – RAÇA 014 - APTIDÃO PARA GUARDA – MANEJO DOS FILHOTES FORA DOS TREINAMENTOS 015 - SOCIALIZAÇÃO 016 - CONVIVÊNCIA E TERRITORIEDADE 017 - PEQUENO RESUMO DO QUE JÁ FOI DITO 018 - DEGENERAÇÕES TEMPERAMENTAIS 019 - AGRESSIVIDADE E DRIVE DE DEFESA 020 - INSTINTO DE PREDAÇÃO, FOME, DRIVE DE RAPINA E DRIVE POR ISCA 021 - DRIVE POR ISCA, DRIVE DE FARO E DRIVE DE CAÇA 022 - SOBREVIVÊNCIA 023 - ISCAS E A BOLINHA PARA DIRECIONAMENTO E CONDICIONAMENTO DOS LOCAIS DE MORDIDA 024 - O INSTINTO NATURAL, A CAÇA SIMULADA E O DRIVE DE CAÇA 025 - DRIVE E DEFESA E O REFORÇO FAMILIAR 026 - DEFESA DO TERRITÓRIO 027 - RAÇAS E DRIVES 028 - TIPOS DE GUARDAS E FUNÇÕES 029 - TREINAMENTO ULTRA-SIMPLES PARA GUARDIÕES 030 - PROVA DE ATAQUE OU PROVA DE DEFESA? A ESCRAVIDÃO PELO POLITICAMENTE CORRETO 031 - CONTROLE DO BINÔMIO TEMPERAMENTO/CARÁTER NA ASCENDÊNCIA DO CÃO 032 - HERANÇA, TEMPERAMENTO E CARÁTER – OBJETIVO DAS PROVAS E PARADIGMA FUNCIONAL

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033 - PROVAS SIMPLES, MAS DURAS. CRITÉRIO DE PRECOCIDADE PARA SELEÇÃO MAIS VOLTADA AO TEMPERAMENTO DO QUE AO CARÁTER 034 - PRECOCIDADE, UMA FACA DE DOIS GUMES 035 - FORMATAÇÃO DO TEMPERAMENTO 036 - HERANÇA PSÍQUICA – SELEÇÃO 037 - LUTA. CONDIÇÃO INTERATIVA ENTRE RAPINA E DEFESA? MORDIDAS ASSOCIADAS AOS NÍVEIS DE DRIVES 038 - DEFESA E FUGA 039 - FAIR FIGHT E DEFESA RESOLUTA. ALTOS DRIVES DE PROTEÇÃO LEVAM À LUTA. 040 – PRESERVAÇÃO – CARNÍVOROS 041 - INSTINTOS, DRIVES E SEUS SINAIS 042 - CONDUTA SEGURA NA PROTEÇÃO 043 - ATAQUE PANTERA 044 - TRABALHANDO O FILHOTE COM ISCAS 045 - PONTO DE CORTE NO TREINAMENTO: POR QUAL CAMINHO IREMOS TRILHAR? 046 - TREINAMENTO PRÁTICO – CONSIDERAÇÕES INICIAIS 047 - RAPINA, O LEVANTE INICIAL 048 - RAPINA E A BOLINHA MÁGICA 049 - TROCA SUJA E TROCA LIMPA 050 – TÉCNICA DE PREVER UMA AÇÃO E COMANDÁ-LA ANTES DELA OCORRER 051 - BRINQUEDOS E MATERIAL DE TREINAMENTO 052 - OBEDIÊNCIA E A BOLINHA MÁGICA 053 - ALTERNATIVAS PARA CÃO QUE NÃO CURTE BOLINHA 054 - OBEDIÊNCIA - ESTÍMULOS NEGATIVOS, POSITIVOS E PASSIVOS 055 - OBEDIÊNCIA PODE SER CONSIDERADA DRIVE? 056 - COMO COMEÇAR? PELA OBEDIÊNCIA OU PELO ATAQUE? 057 - BOLINHA MÁGICA, SEUS OUTROS RECURSOS E A OBEDIÊNCIA PASSIVA 058 - RASTEJAR 059 - CLICKER. COMO USAR 060 - LINGÜIÇA, COMO DEVE SER, COMO USÁ-LA E DIRECIONAR O CÃO PARA ELA 061 - COMO AUMENTAR – EM MUITO – A CAÇA COM O USO DA LINGÜIÇA 062 - LINGÜIÇA, COMO USÁ-LA, CANALIZANDO O CÃO PARA O FIGURANTE 063 - LINGÜIÇA E TROCA DE PEGADA 064 - USO CORRETO DO JAMBIER 065 - LINGÜIÇA - CÃO QUE NÃO SOLTA, CÃO QUE A PEGA SEM FIRMEZA 066 - LINGÜIÇA, CÃO QUE NÃO SE INTERESSA POR ELA 067 - LINGÜIÇA. SEU USO NO FAIR GAME 068 - PODE-SE TREINAR RAPINA E DEFESA AO MESMO TEMPO? 069 - ENFORCADORES - USO E TIPOS 070 - ENTONAÇÃO DA VOZ – UM DETALHE IMPORTANTE

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071 - COMANDO NÃO 072 - GUIA – COMO ACOSTUMAR O CÃO A USAR 073 - GUIA E ENFORCADOR NA OBEDIÊNCIA - SEUS USOS NOS COMANDOS 074 - TRAÇÃO, CONTROLE 075 - TREINAMENTO COM A GUIA LONGA 076 - MANUTENÇÃO E ELEVAÇÃO DO DRIVE DE RAPINA QUANDO DO USO DA GUIA NA OBEDIÊNCIA 077 - GUIA E ENFORCADOR NA OBEDIÊNCIA - SEUS USOS NOS COMANDOS, PARTE II 078 - COMO ACOSTUMAR O CÃO A ANDAR DO NOSSO LADO 079 - TREINAMENTO COM GUIA LONGA. PARTE II 080 - QUANDO NÃO TREINAR 081 - TEMPO DAS SESSÕES 082 - SUCESSO NO ADESTRAMENTO 083 - IDADE MÍNIMA IDEAL PARA CADA ETAPA DE TREINO 084 - COMANDO NÂO - DEFININDO OS LIMITES 085 - ESTÍMULOS PARALELOS SOBRE OS DRIVES DE RAPINA E DE DEFESA - PARTE I 086 - ESTÍMULOS PARALELOS SOBRE OS DRIVES DE RAPINA E DE DEFESA - PARTE II 087 - CONVIVÊNCIA ENTRE CÃES DE GUARDA 088 - MATILHA, CONVIVÊNCIA E LEVANTAMENTO DE DRIVES 089 - MATILHA, TREINAMENTO E LEVANTAMENTO DE DRIVES 090 - OLHOS NO OLHOS - O OLHAR E O LEVANTAMENTO DA DEFESA 091 - LEVANTAMENTO INICIAL DE DEFESA PARA CÃES QUE DEMONSTRAM, OU NÃO, RAPINA – PARTE I 092 - LEVANTAMENTO INICIAL DE DEFESA PARA CÃES QUE DEMONSTRAM OU NÃO RAPINA - PARTE II 093 - MANGUEIROS: CÃES QUE SE RECUSAM A LARGAR LINGÜIÇAS E MANGAS. CAUSAS 094 - ALVO DO ATAQUE, CONSIDERAÇÕES SOBRE 095 - ATAQUE COM MANGA 096 - MANGA. COMO DEVE SER - SEUS EFEITOS SOBRE A MORDIDA 097 - TOQUES DO BASTÃO, COMO GRADUAR O AJUSTE ADRENÉRGICO 098 - ATAQUE AO BITE 099 - ADAPTAÇÕES NO BITE PARA DIRECIONAR ATAQUE 100 - TREINAMENTO INTEGRADO 101 - COMANDO "CUIDA". VANTAGENS 102 - ATAQUE LANÇADO 103 - RINGUE EFETIVO - TREINAMENTO PARA 104 - TREINAMENTO AVANÇADO COM BITE - CÃO DE ASSALTO 105 - FOCINHEIRA PARA TREINO – COMO DEVE SER E USOS 106 - FARO BAIXO E FARO ALTO 107 - FARO ALTO. TREINAMENTO 108 - FARO BAIXO. TREINAMENTO - CÃO DE RASTREAMENTO

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109 - RASTREAMENTO - UTILIDADES NA BUSCA E CAPTURA - TREINAMENTOS ASSOCIADOS 110 - PROTEÇÃO E ESPORTE 111 - CINOFILIA ESPORTIVA E CINOFILIA EFETIVA 112 - OBSTINAÇÃO x INTELIGÊNCIA EMOCIONAL 113 - MODULAR O COMANDO DE "SOLTA" E A FORÇA DA MORDIDA 114 - COMO FAZER UM CÃO SOLTAR SEM O COMANDO VERBAL 115 - ATAQUE EM DUPLA 116 - ATAQUE CONTRA DOIS FIGURANTES 117 - DOIS CÃES VERSUS DOIS FIGURANTES 118 - RECUPERAÇÃO DE CÃES PARA GUARDA, CONSIDERADOS FRACOS OU PERDIDOS 119 – DESVIOS DE ATAQUE 120 - COMANDOS MÍMICOS 121 - COMO DESENVOLVER O POTENCIAL DE PROTEÇÃO 122 – INSEGURANÇA, MEDO E CORAGEM 123 - DRIVE, PARADRIVE E OS ELEMENTOS DE PRESSÃO E CONFLITO. 124 - CONCLUSÕES 125 - CONSIDERAÇÕES FINAIS