acórdão praça da moça - cartão vermelho

8

Click here to load reader

Upload: perisson-andrade-advogados

Post on 21-Jul-2016

217 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

Page 1: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Registro: 2015.0000167484

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº1003523-87.2013.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que éapelante/apelado PRAÇA DA MOÇA CALÇADOS LTDA, é apelado/apelanteFAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal deJustiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento aorecurso da autora, prejudicado o da ré. V.U.", de conformidade com o voto doRelator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. DesembargadoresMARIA OLÍVIA ALVES (Presidente) e EVARISTO DOS SANTOS.

São Paulo, 16 de março de 2015.

REINALDO MILUZZIRELATOR

Assinatura Eletrônica

Page 2: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

2/8

6ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICOAPEL.Nº: 1003523-87.2013.8.26.0053APTES. : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO E PRAÇA DA MOÇACALÇADOS LTDA.APDOS. : OS MESMOSCOMARCA: SÃO PAULO 10ª VARA DA FAZENDA PÚBLICAJUÍZA : LUIZA BARROS ROZAS

VOTO Nº: 19989

EMENTASAÇÃO DE RITO ORDINÁRIO Pretensão à anulação de autode infração lavrado em decorrência da suposta ausência derecolhimento de ICMS, bem como ao cancelamento ou reduçãoda multa aplicada Possibilidade Alegação de que aautuação, bem como a respectiva multa foi embasada em provailícita Quebra do sigilo bancário sem prévia ordem judicial(art. 6º da LCF 105/2001), na Operação Cartão VermelhoSentença de improcedência - Precedentes desta Corte e do STF

Recurso da autora provido.HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Pretensão da FESP àmajoração da verba honorária, caso mantida a r. sentençaImpossibilidade Inversão do julgado Recurso prejudicado

RELATÓRIO.

Trata-se de ação de rito ordinário ajuizada pela empresa

Praça da Moda Calçados LTDA em face da Fazenda do Estado, buscando a

anulação do auto de infração decorrentes de suposta omissão ao Fisco do real

movimento das vendas cujos pagamentos foram feitos com cartão de crédito e

débito, e o cancelamento ou redução da multa aplicada.

A r. sentença de fls. 249/253, de relatório adotado, julgou a

demanda improcedente, condenando a autora ao pagamento das custas e

despesas processuais, bem como da verba honorária arbitrada em

R$2.000,00, conforme o artigo 20, §4º do CPC.

Page 3: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

3/8

Irresignadas, ambas as partes interpuseram recursos de

apelação.

A FESP sustenta, em síntese, que a verba honorária deve

ser majorada, pois o valor arbitrado corresponde a menos de 0,5% do valor da

causa e é inferior ao patamar estabelecido pelo artigo 20, §3º do CPC.

A autora, de seu lado, aduz que o auto de infração é nulo,

visto que foi baseado em dados obtidos de maneira que afrontam às garantias

da intimidade e do sigilo constantes no artigo 5º, X e XII da Constituição

Federal; que a quebra de sigilo relativa aos dados advindos das

administradoras de cartões foi irregular, pois depende de autorização judicial

que não foi expedida; que as disposições da LC 105/01 que permitiam o

acesso da Administração Tributária a informações bancárias quando há

procedimento fiscal em curso foram declaradas inconstitucionais pelo STF; que

a Lei Estadual 12.186/06 contraria o próprio artigo 6º da LC 105/01; que não

existem quaisquer provas da origem das informações utilizadas pela Fazenda

na instrução do auto de infração; que há ofensa ao artigo 142 do CTN, pois a

autoridade não comprovou a materialização da obrigação tributária; traz

precedentes jurisprudenciais.

Recursos tempestivos e respondidos.

FUNDAMENTOS.

A empresa autora ajuizou ação de rito ordinário visando ao

cancelamento do procedimento administrativo que culminou na lavratura de

Auto de Infração e Imposição de Multa nº 3.129.313-0, em decorrência da

ausência de recolhimento de ICMS, referente a operações não declaradas.

Alega que a autuação e a respectiva multa foram

embasadas em prova ilícita, pois obtida por meio da quebra do sigilo bancário

Page 4: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

4/8

na chamada Operação Cartão Vermelho, sem processo administrativo, e muito

menos autorização judicial.

A r. sentença julgou improcedente a ação.

Contudo, respeitado o entendimento da MMª Juíza a quo,

entendo que o julgado comporta reforma.

Cabe aqui reproduzir o que ficou anotado no Agravo de

Instrumento nº 0112431-60.2012.8.26.0000, com voto condutor desta relatoria,

cujo acórdão decidiu pelo provimento do recurso, para antecipar a tutela,

suspendendo os efeitos do AIIM nº 4.002.387, j. em 3/9/12, por v.u.

(fls.445/450):

“Na hipótese dos autos, observa-se que a exclusão da

agravante, efetuada pelo Fisco, do referido sistema Simples Nacional, com base na

quebra de sigilo das informações fornecidas pelas administradoras de cartões de

crédito, conforme AIIM de fls. 18/22, se deu sem o devido amparo legal.

Com efeito, não obstante a existência de precedente desta E.

Corte entendendo o contrário (AI nº 0120222-17.2011, 11ª Câmara de Direito Público,

j. em 4.7.2011, rel. Des. AROLDO VIOTTI), o fato é que somente no curso do

procedimento administrativo a Lei Federal nº 105/2001, hierarquicamente superior,

autoriza a quebra do sigilo das informações contidas nos registros das instituições

financeiras, sem prévia autorização judicial.

Nesse sentido já se pronunciou a E. 10ª Câmara de Direito

Público, nos autos do Agravo de Instrumento nº 911.181-5/0, no qual participei como

2º Juiz, sendo relatora a Desembargadora Teresa Ramos Marques, que assim

pontificou:

“1. A agravante ... .

“A Portaria CAT nº 87, de 18.10.05, tendo em vista o

disposto no inciso X do artigo 494 do RICM, aprovado pelo Decreto 45.490/00

(artigo 494 Não podem embaraçar a ação fiscalizadora e, mediante notificação,

Page 5: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

5/8

são obrigados a exibir impressos, documentos, livros, programas e arquivosmagnéticos relacionados com o imposto e prestar informações solicitadas pelo

fisco Lei 6.374/89, art. 75, IX a empresa de administração de bens) disciplina

a entrega de arquivo eletrônico pela empresa administradora de cartões de

crédito ou débito, relativamente às operações ou prestações realizadas por

contribuinte.

Já o art. 509, caput e seu par. 1º, do Regulamento, tem o

seguinte teor:

'Artigo 509 O movimento real tributável realizado pelo

estabelecimento em determinado período poderá ser apurado por meio de

levantamento fiscal, em que deverão ser apurado por meio de levantamentofiscal, em que deverão ser considerados os valores das mercadorias entradas,

das mercadorias saídas, dos estoques, inicial e final, dos serviços recebidos e

dos prestados, das despesas, dos outros encargos, do lucro do estabelecimento

e de outros elementos informativos (Lei 6.374/89, art. 74).

§ 1º - No levantamento fiscal poderá ser utilizado qualquer

meio judiciário, bem como aplicado coeficiente médio de lucro bruto, de valoracrescido ou preço unitário, considerados a atividade econômica, a localização

e a categoria do estabelecimento'.

Evidente, portanto, que a utilização de dados constantesdos arquivos das operadoras de cartão de crédito não se deu no curso do

procedimento administrativo, tendo sido o ponto de partida do próprio

levantamento fiscal, no qual foi constatada a infração.

O par. 1º do art. 509 do Regulamento realmente autoriza a

utilização de qualquer meio indiciário no levantamento fiscal, o que deu ensejo à

apuração mediante as declarações das operadoras de cartão de crédito,

colhidas antes de iniciado o procedimento administrativo.

2. Forte assim a verossimilhança da alegação de violação

da Lei Complementar Federal 105/2001 que, no seu art. 6º, somente autoriza o

Page 6: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

6/8

exame de registros de instituições financeiras, sem autorização judicial,“quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em

curso e tais exames sejam considerados indispensáveis”.

Útil lembrar, ainda, que, no seu art. 1º, par. 1º, inciso VI, amesma Lei Complementar 105/2001 considera as operadoras de cartão de

crédito instituições financeiras”. (grifos do original)

No mesmo sentido, Agravo de Instrumento nº

814.522.5/0-00, 5ª Câmara de Direito Público, rel. Des. XAVIER DE AQUINO,

j. em 13.11.2008”.

É certo que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a

repercussão geral sobre a faculdade conferida pelo artigo 6º da Lei

Complementar nº 105, de 10/1/01 às autoridades e aos agentes tributários de

examinar, sem prévia autorização judicial, “documentos, livros e registros de

instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações

financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal

em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade

administrativa competente”.

E a Portaria CAT 87, de 18/10/06, regulamentou esse

dever das administradoras em repassar tais informações à Fazenda Pública

(artigos 1º e 3º).

Todavia, se a referida lei determina prévia existência de

processo administrativo, ilegal a busca indiscriminada por indícios de infrações

tributárias com violação ao sigilo bancário do contribuinte.

E a lavratura do AIIM nº 3.129.313-0 baseou-se

unicamente nas informações fornecidas pelas empresas administradoras de

cartões de crédito e/ou débito, de acordo com o disposto no inciso X do artigo

75 da Lei 6.374/89, acrescentado pelo artigo 2º da Lei nº 12.294/06, no inciso

X do artigo 494 do Regulamento do ICMS/2000 e na Portaria CAT 87/2006.

Page 7: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

7/8

Portanto, é patente a ilegalidade do processo

administrativo e da consequente lavratura do auto de infração e imposição de

multa, por violação ao art. 6º, “caput”, da Lei Complementar nº 105/2001.

Nesta direção, decidiu o Colendo Supremo Tribunal

Federal, cuja ementa está assim redigida:

“SIGILO DE DADOS AFASTAMENTO. Conforme disposto no

inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, a regra é a privacidade quanto à

correspondência, às comunicações telegráficas, aos dados e às comunicações,

ficando a exceção a quebra do sigilo submetida ao crivo de órgão equidistante o

Judiciário e, mesmo assim, para efeito de investigação criminal ou instrução

processual penal. SIGILO DE DADOS BANCÁRIOS RECEITA FEDERAL. Conflita

com a Carta da República norma legal atribuindo à Receita Federal parte na relação

jurídico-tributária o afastamento do sigilo de dados relativos ao contribuinte”. (RE

389808, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em

15/12/2010, DJe-086 DIVULG 09-05-2011 PUBLIC 10-05-2011 EMENT

VOL-02518-01 PP-00218 RTJ VOL-00220- PP-00540).

Esse também é o entendimento dispensado por esta

Colenda 6ª Câmara de Direito Público:

“Apelação Cível - Constitucional e Administrativo Ação

Anulatória de Débito Fiscal - “Operação cartão vermelho” - Ação ordinária pela qual a

autora visa declarar a inexigibilidade de débito tributário constante de Auto de Infração

e Imposição de Multa - Sentença de procedência - Recurso da Fazenda Estadual -

Desprovimento de rigor.

Preliminar afastada - Insurgência da apelada pelo não

conhecimento da apelação pela ausência de impugnação específica - Descabimento -

Recorrente que atacou de forma clara e suficiente o que restou decidido na r. decisão

combatida. O sigilo bancário somente pode ser afastado desde que implementadas as

Page 8: Acórdão Praça da Moça - Cartão Vermelho

TRIBUNAL DE JUSTIÇAPODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Apelação Nº 1003523-87.2013.8.26.0053 - VOTO Nº 19989 - COMARCA: São Paulo – 10ª Vara de

Fazenda Pública - ANDREA

8/8

exigências do artigo 6º da Lei Complementar Federal 105/2001 - Inexistência de

processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso Ilegal a conduta

administrativa - Desconstituição do lançamento tributário constante do AIIM

3.1433128-8 - Ônus de sucumbência mantidos - R. Sentença mantida - Preliminar

afastada e recurso da FESP desprovido”. (AC nº 0032053-55.2012.8.26.0053,

Des. Rel. Sidney Romano dos Reis, j. em 14/03/2014)

A r. sentença deve, pois, ser reformada.

A ação é, pois, procedente para determinar a anulação do

auto de infração instruído contra a autora e o cancelamento da multa aplicada.

Fica invertido o ônus decorrente da sucumbência.

Em face do que foi decidido, julgo prejudicado o recurso da

Fazenda do Estado de São Paulo que diz respeito à majoração de verba

honorária.

Para efeito de prequestionamento, infere-se da

fundamentação supra que não houve ofensa a qualquer dos dispositivos legais

invocados pela Fazenda do Estado.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao

recurso da autora, prejudicado o da ré.

REINALDO MILUZZIRelator