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1 ACIDENTES DO TRABALHO 1 1. CONCEPÇÕES E ABORDAGENS DE ACIDENTES DO TRABALHO Entende-se por acidentes do trabalho, eventos bem configurados no tempo e no espaço, cujas conseqüências, imediatas na quase totalidade dos casos, permitem estabelecer facilmente o nexo causal com o trabalho. Em vários idiomas, a palavra acidente apresenta significado semelhante: evento súbito e imprevisível, que produz resultados não esperados e não desejados. Na literatura técnica, constatam-se referências a acidentes como “eventos de causas remotas e desconhecidas”, “acontecimentos não planejados, não previstos”, “ocorrências não intencionais” 4, 14 . Há também referências de que, no imaginário de trabalhadores, os acidentes são considerados como conseqüências de falta de sorte, de azar, ou ainda, de descuidos das próprias vítimas 1, 19 . Na quase totalidade dos casos, fatores capazes de desencadear acidentes do trabalho encontram-se presentes na situação de trabalho muito tempo antes que ocorram. Portanto, ao contrário do que o termo insinua, trata-se de fenômenos previsíveis, embora não seja possível prever exatamente quando ocorrerão e qual ou quais trabalhadores serão atingidos. Podem ser prevenidos por meio de neutralização ou de eliminação dos fatores capazes de desencadeá-los. Os acidentes do trabalho também expressam correlações de forças existentes na sociedade, configurando fenômenos socialmente determinados ou seja, relacionados à forma de inserção dos trabalhadores na produção e, conseqüentemente, no consumo,. Machado e Goméz 22 , referindo-se à caracterização do perfil epidemiológico dos acidentes do trabalho afirmam que “ as características do acidente estão relacionadas às do processo de trabalho, da força de trabalho, da base tecnológica e de processos produtivos determinados historicamente, configura-se, em cada momento e local, um perfil epidemiológico dos acidentes”. Segundo Lert et al. 20 , as dificuldades para conceituar acidentes do trabalho relacionam-se com a complexidade do fenômeno em si: ”o acidente do trabalho se caracteriza por apresentar, simultaneamente, lesão física, categoria social, reconhecida e definida por lei, e categoria econômica, pela valorização monetária bem codificada das incapacidades físicas ”. Algumas dificuldades, entretanto, relacionam-se aos objetivos de quem elabora o conceito. Na década de 30, Heinrich 15 esboçou a teoria do dominó, apresentando o acidente como o último evento de uma seqüência linear, constituindo tentativa de sistematização que se contrapunha à noção de fatalidade. Essa teoria representa o acidente por uma seqüência de cinco pedras de dominó posicionadas de modo que a queda de uma, desencadeia a queda das subseqüentes. A terceira pedra da série introduziu as noções de atos inseguros e de condições inseguras como fatores imediatamente precedentes ao acidente propriamente dito e à lesão. De acordo com a teoria, as ações do trabalhador - ou de seus colegas exercem papel de destaque e devem ser contempladas na prevenção. No Brasil, os atos inseguros, provavelmente, ainda estão entre as “causas” mais difundidas de acidentes. Embora a teoria do dominó descreva o acidente como seqüência linear de eventos, sua difusão destaca a dicotomia ato inseguro / condição insegura, que também aparece referida como fator humano / fator técnico. A maioria das publicações brasileiras destinadas a profissionais de Saúde e Segurança do Trabalho, editadas sob os auspícios da Fundacentro até meados da década de 80, difunde essa concepção, definindo a identificação de atos e, ou condições inseguras como objetivos da análise, considerando-os “causasdos acidentes. Almeida et al. 1 e Binder et al. 3 consideram que, no Brasil, a adoção, pelas empresas, de práticas de análise de acidentes 1 Texto para uso didático exclusivo, extraído e adaptado do capítulo Acidentes do Trabalho: acaso ou descaso?, de autoria de Binder e Almeida. In: Mendes, R. (Org.). Patologia do Trabalho . 2ª. ed. Rio de Janeiro, 2003, v. I, p.770-808.

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ACIDENTES DO TRABALHO1

1. CONCEPÇÕES E ABORDAGENS DE ACIDENTES DO TRABALHO

Entende-se por acidentes do trabalho, eventos bem configurados no tempo e no espaço, cujas conseqüências, imediatas na quase totalidade dos casos, permitem estabelecer facilmente o nexo causal com o trabalho. Em vários idiomas, a palavra acidente apresenta significado semelhante: evento súbito e imprevisível, que produz resultados não esperados e não desejados.

Na literatura técnica, constatam-se referências a acidentes como “eventos de causas remotas e desconhecidas”, “acontecimentos não planejados, não previstos”, “ocorrências não intencionais” 4, 14. Há também referências de que, no imaginário de trabalhadores, os acidentes são considerados como conseqüências de falta de sorte, de azar, ou ainda, de descuidos das próprias vítimas 1, 19. Na quase totalidade dos casos, fatores capazes de desencadear acidentes do trabalho encontram-se presentes na situação de trabalho muito tempo antes que ocorram. Portanto, ao contrário do que o termo insinua, trata-se de fenômenos previsíveis, embora não seja possível prever exatamente quando ocorrerão e qual ou quais trabalhadores serão atingidos. Podem ser prevenidos por meio de neutralização ou de eliminação dos fatores capazes de desencadeá-los.

Os acidentes do trabalho também expressam correlações de forças existentes na sociedade, configurando fenômenos socialmente determinados ou seja, relacionados à forma de inserção dos trabalhadores na produção e, conseqüentemente, no consumo,. Machado e Goméz 22, referindo-se à caracterização do perfil epidemiológico dos acidentes do trabalho afirmam que “as características do acidente estão relacionadas às do processo de trabalho, da força de trabalho, da base tecnológica e de processos produtivos determinados historicamente, configura-se, em cada momento e local, um perfil epidemiológico dos acidentes”. Segundo Lert et al. 20, as dificuldades para conceituar acidentes do trabalho relacionam-se com a complexidade do fenômeno em si: ”o acidente do trabalho se caracteriza por apresentar, simultaneamente, lesão física, categoria social, reconhecida e definida por lei, e categoria econômica, pela valorização monetária bem codificada das incapacidades físicas”. Algumas dificuldades, entretanto, relacionam-se aos objetivos de quem elabora o conceito. Na década de 30, Heinrich 15 esboçou a teoria do dominó, apresentando o acidente como o último evento de uma seqüência linear, constituindo tentativa de sistematização que se contrapunha à noção de fatalidade. Essa teoria representa o acidente por uma seqüência de cinco pedras de dominó posicionadas de modo que a queda de uma, desencadeia a queda das subseqüentes.

A terceira pedra da série introduziu as noções de atos inseguros e de condições inseguras como fatores imediatamente precedentes ao acidente propriamente dito e à lesão. De acordo com a teoria, as ações do trabalhador - ou de seus colegas – exercem papel de destaque e devem ser contempladas na prevenção. No Brasil, os atos inseguros, provavelmente, ainda estão entre as “causas” mais difundidas de acidentes. Embora a teoria do dominó descreva o acidente como seqüência linear de eventos, sua difusão destaca a dicotomia ato inseguro / condição insegura, que também aparece referida como fator humano / fator técnico. A maioria das publicações brasileiras destinadas a profissionais de Saúde e Segurança do Trabalho, editadas sob os auspícios da Fundacentro até meados da década de 80, difunde essa concepção, definindo a identificação de atos e, ou condições inseguras como objetivos da análise, considerando-os “causas” dos acidentes. Almeida et al. 1 e Binder et al. 3 consideram que, no Brasil, a adoção, pelas empresas, de práticas de análise de acidentes

1 Texto para uso didático exclusivo, extraído e adaptado do capítulo Acidentes do Trabalho: acaso ou descaso?, de autoria de Binder e Almeida. In: Mendes, R. (Org.). Patologia do Trabalho. 2ª. ed. Rio de Janeiro, 2003, v. I, p.770-808.

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baseadas nessa teoria têm contribuído para a atribuição de culpa às vítimas de acidentes do trabalho.

Nas últimas décadas, a concepção multicausal e a aplicação da Teoria de Sistemas ao estudo dos acidentes do trabalho, vêm ampliando os horizontes a serem explorados nas investigações e minimizando a importância anteriormente atribuída aos fatores imediatamente precedentes às lesões. As empresas, consideradas como sistemas sócio-técnicos abertos por sua vez constituídos por dois sub-sistemas: 1) sub-sistema técnico (ambiente, máquinas, tecnologia, produtos etc.) e 2) e sub-sistema social (trabalhadores com diferentes qualificações que estabelecem entre si relações pessoais e hierárquicas etc,). Esses dois sub-sistemas interagem entre si, bem como recebem influências e influenciam o meio social em que se inserem (Figura 1). E, em seu interior, perturbações são capazes de desencadear efeitos indesejáveis como desgastes, perdas de materiais, quebras e acidentes do trabalho.

FIGURA 1 – ESQUEMA DE SISTEMA SÓCIO-TÉCNICO ABERTO

Interações positivas contribuem para a maximização da produção com qualidade. Interações negativas, cujos resultados não foram planejados, podem perturbar a produção, interferir com a qualidade e desencadear acidentes do trabalho. Uma vez ocorrida a perturbação, os trabalhadores, individual ou coletivamente, podem tentar corrigir o problema, constituindo o que Faverge 10 denomina “recuperação de incidente” que, não sendo bem sucedida, pode desencadear novas perturbações que, se não corrigidas ou recuperadas, acabam por culminar em acidentes e, ou outras perdas para o sistema. As relações que os trabalhadores estabelecem entre si, entre níveis hierárquicos equivalentes, assim como entre níveis hierárquicos diferentes, são influenciadas pelo histórico de vida pessoal e profissional de cada um deles, pelas características das comunidades das quais são oriundos, bem como pela posição que ocupam no interior do sistema e pelos meios e objetivos definidos pelo sistema e pelos próprios empregados para a execução de suas atividades. Disso resulta que as relações sociais em cada empresa possuem características próprias que influenciam o desenrolar de seus processos de trabalho (relações chefes e subordinados, meios disponibilizados para o desenvolvimento das atividades etc.). Nas abordagens sistêmicas, a noção de mudanças no curso da atividade assume grande importância, particularmente quando são capazes de perturbar o desenvolvimento habitual ou cotidiano da atividade, afetando a segurança e, ou a confiabilidade do sistema. O esclarecimento das origens de tais mudanças envolve elucidação das interações ocorridas no sistema e, ou as origens dos comportamentos humanos no trabalho. Estudos com enfoque de Ergonomia enfatizam a importância da variabilidade presente nas situações reais de trabalho e a necessidade de análises do trabalho para a identificação dos mecanismos de regulação de que os trabalhadores - individual e coletivamente - lançam mão para fazer “o que precisam fazer”, em especial, face à ocorrência de imprevistos que exigem ações de

SUB-SISTEMA TÉC-NICO (instalações, máquinas etc)

SUB-SISTEMA SO-CIAL (trabalhadores, chefias etc.

INTERAÇÕES

POSITIVAS

NEGATIVAS

Produção

Qualidade

Defeitos

Quebras

Acidentes ...

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recuperação. Assim, o esquema da Figura 2 pressupõe a existência de variabilidade dos diferentes componentes, implicando exercício de atividades numa “zona de incertezas”.

FIGURA 2 – VARIABILIDADE E ZONA DE INCERTEZA NO SISTEMA SÓCIO-TÉCNICO

Na literatura recente destacam-se vários tipos de abordagens de acidentes do trabalho. Por

exemplo, a Escola Comportamentalista ou Behaviorista aborda as ações humanas no trabalho, identificando-se a) autores que analisam os comportamentos sob a ótica dos erros humanos, procurando identificar nos acidentes os tipos de erros ocorridos e centrando a prevenção na supressão desses erros. 17, 18, 25; b) autores que procuram desenvolver modelos explicativos dos comportamentos humanos face ao perigo 9, 13.

Outras abordagens exploram, de maneira isolada ou associada: (a) contribuições da Ergonomia acerca de aspectos cognitivos - individuais e coletivos - da confiabilidade humana em sistemas sócio-técnicos abertos; (b) aspectos do estudo das formas de gestão da produção e da segurança nesses sistemas.

Segundo Rassmussem et al. 25 e Reason 26, as ações humanas podem ser divididas em 3 tipos:

a) Ações baseadas em habilidades, que se tornam “automatizadas”, em que se usa a memória não consciente, podendo ser acionadas sem demanda de tempo, como trocar marcha de um automóvel, andar de bicicleta e executar trabalhos manuais repetitivos.

b) Ações baseadas em regras ou prescrições, que exigem recorrer a estas para definir a ação, como, por exemplo, executar manutenção preditiva em equipamento.

c) Ações baseadas em conhecimentos, que exigem raciocínios e integração de conhecimentos mais complexos para serem definidas, necessitando por vezes de tempo para avaliar o conjunto de informações disponíveis, como por exemplo, a correção de parâmetros em sala de controle de sistema de elevada complexidade. Hale e Glendon 13 afirmam que, se em situação baseada em habilidades, ocorre um

acidente e este é atribuído à “falta de cuidado” do operador, a recomendação de mais atenção só fará sentido se acompanhada por mudanças no nível de controle, isto é, transformação de ações baseadas em habilidades para ações baseadas em regras e, ou conhecimentos. É preciso assinalar que, em algumas situações, tal transformação exigirá modificações na concepção da atividade, porém, em outras, poderá exigir modificações em vários aspectos do processo produtivo.

A corrente comportamentalista defende o desenvolvimento de cultura de segurança e a utilização dos acidentes como fonte de aprendizado organizacional. Trata-se de autores que dedicam-se ao estudo de acidentes ocorridos em sistemas em que a confiabilidade e a segurança associadas aos componentes técnicos são elevadas. Ou seja, em contexto no qual a confiabilidade humana assume importância que não pode ser negligenciada. Segundo Cooper 7, um dos autores dessa corrente, antes do início de qualquer tarefa, cabe aos membros da equipe, avaliar seus

SUB-SISTEMA TÉC-NICO (instalações, máquinas etc)

SUB-SISTEMA SO-CIAL (trabalhadores, chefias etc.

INTERAÇÕES

POSITIVAS

NEGATIVAS

Produção

Qualidade

Defeitos

Quebras

Acidentes ...

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riscos. Para esse autor 7, a existência de cultura de segurança implica identificar a priori, em cada um dos processos e tarefas a eles relacionadas, as situações que implicam riscos à saúde e à integridade física dos trabalhadores, avaliando, para cada um deles, os danos potenciais e as probabilidades de ocorrência, devendo-se, a partir desse diagnóstico, adotar medidas de controle. Para esse autor, todos os procedimentos deverão ser registrados e essa documentação colocada gratuitamente à disposição dos interessados. Mudanças no processo produtivo, introdução de novos equipamentos, de novas matérias primas etc. deverão ser submetidos aos mesmos procedimentos antes de serem implantados definitivamente.

Reason 26 desenvolveu um modelo que considera que barreiras colocadas em seqüência possuiriam a capacidade de evitar os acidentes (Figura 3) . Entretanto, devido à existência de brechas nessas barreiras, é possível que elas sejam ultrapassadas, dando ensejo à ocorrência de acidente. Nesse modelo, considera-se o trabalho prescrito, não o trabalho real (como é desenvolvido na prática), ou seja, os riscos existentes seriam identificados “a priori”.

FIGURA 3 – ESQUEMA DE REASON – TRAJETÓRIA DA OPORTUNIDADE DO ACIDENTE

Falhas

gerenciais

latentes

Precursores

psicológicosErros ativos Defesas profundas

Gatilhos locaisDefeitos intrínsecosCondições atípicas

TRAJETÓRIA DA OPORTUNIDADE DE ACIDENTE

Falhas

gerenciais

latentes

Precursores

psicológicos

Falhas

gerenciais

latentes

Precursores

psicológicosErros ativos Defesas profundas

Gatilhos locaisDefeitos intrínsecosCondições atípicas

TRAJETÓRIA DA OPORTUNIDADE DE ACIDENTE

Em 1990, Reason 26 introduziu as denominações erros ativos e erros latentes, Os erros cometidos pelos executantes / operadores, que atuam na linha de frente e cujas conseqüências são imediatas, constituem os erros ativos, Os cometidos por idealizadores, responsáveis por decisões de alto nível, construtores do sistema, diretores..., cujas conseqüências podem ficar “adormecidas” por muito tempo são denominados erros latentes. Segundo esse autor, os esforços para descobrir e neutralizar os erros latentes produzem resultados mais efetivos em termos de aumentar a confiabilidade do sistema do que as tentativas pontuais de reduzir erros ativos.

Para Sperandio 28, a confiabilidade do sistema baseia-se justamente nas capacidades e habilidades dos trabalhadores para corrigir perturbações: “não é somente não cometer erros, mas também fazer o gesto adequado, tomar a iniciativa que convém no momento, recuperar um erro da máquina ou de outro operador”, Na literatura ergonômica, essa posição é largamente difundida e adotada em estudos sobre confiabilidade humana em sistemas considerados seguros, especialmente no tocante aos componentes técnicos, contrapondo-se às que atribuem papel exclusivo a ações do trabalhador pela ocorrência de acidentes.

Para Dejours 8, a abordagem do fator humano nos acidentes de trabalho possui duas vertentes: a da falha humana e a da gestão de recursos humanos. A primeira prioriza a identificação de falhas, de desrespeito a regras, de erros ou de faltas cometidas no trabalho, privilegiando a defesa de regulamentos, de disciplina, de vigilância e de instruções direcionadas para o controle das ações. A vertente da gestão de recursos humanos, por sua vez, prioriza aspectos como a motivação do indivíduo e a cultura da empresa.

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“Viver é arriscar-se”. As decisões e as práticas de correr riscos estão sempre presentes no cotidiano das pessoas. Estão também presentes na gestão das atividades das empresas, face às variabilidades normais dos processos de produção e de trabalho.

A abordagem dos acidentes do trabalho deve necessariamente incluir a análise dos aspectos subjetivos envolvidos nas tomadas de decisão de assumir de determinados riscos ou de arriscar-se. Para Goguelin 11, arriscar-se implica decisão de agir e significa expor-se a um perigo na esperança de obter vantagem ou ganho. Entretanto, o insucesso – capaz de prejudicar o autor e, ou outrem -, pode sobrevir, sendo possível estimar suas probabilidades de ocorrência, bem como a gravidade do resultado ou resultados.

Dentre os fatores que influenciam a decisão de arriscar-se, são mencionadas a falta de formação adequada, a existência de competitividade nas relações entre o indivíduo (que arrisca) e o grupo, as pressões da organização (empresa), a adaptação ao perigo gerando falsa sensação de segurança, e a existência de medidas / regras de segurança que geram desconforto 11. Simard 27, analisando os fatores psico-sociais que influenciam a decisão de arriscar-se, menciona a pressão de colegas, as atitudes da supervisão e a orientação da empresa.

Goguelin 11, referindo-se à importância de comportamentos seguros por parte dos trabalhadores, dá grande importância a dois fatores:

o exemplo dado pelos escalões hierárquicos superiores e

a possibilidade de recusar a execução de tarefas perigosas. No contexto brasileiro, na maioria dos casos, arriscar-se é parte das tarefas habituais,

desenvolvidas em contextos de sub-sistemas técnicos extremamente precários do ponto de vista da segurança. Acresce que, em muitos casos, os trabalhadores assumem riscos em obediência a determinações de chefias, ou seja, sabendo que a conseqüência possível da desobediência é a perda do emprego, o que paralisa a discussão, ainda que teórica, da aceitabilidade, pelos trabalhadores, de condições sabidamente frágeis do ponto de vista da segurança do trabalho. Nesses casos, arriscar-se não é fruto de decisão baseada em livre escolha do trabalhador. Pelo contrário, trata-se de imposição, em grande parte mediada pelo medo de perder o emprego.

Mesmo em empresas que possuem critérios que definem a aceitabilidade dos procedimentos a serem adotados em situações que podem ensejar acidentes, não é sempre que se garante o respeito a eles, particularmente se surgiram sem ampla discussão e sem o apoio explícito e irrestrito dos escalões hierárquicos superiores. Para numerosos autores, o desenvolvimento de cultura de segurança na empresa só é possível se houver adesão de sua alta hierarquia.

Estudos ergonômicos enfatizam a importância do reconhecimento da existência de variabilidade nas formas de realização das atividades pelos trabalhadores. Assim, existe zona ou faixa de interações capaz de conduzir à obtenção dos resultados planejados, correspondendo à “variabilidade normal”, esperada, de componentes do sistema. Entretanto, mudanças que perturbam o fluxo da atividade (perturbação) a ponto de subtraí-lo do controle do trabalhador (ou trabalhadores), são consideradas “variabilidades incidentais”. Considera-se que as análises de acidentes, incidentes e quase-acidentes exigem:

a compreensão da existência de variabilidade normal,

o esclarecimento das estratégias ou “jeitos” de que o trabalhador lança mão no desempenho de suas atividades e,

a identificação dos fatores que, eventualmente, possam acarretar o insucesso dessas estratégias ou “jeitos”. O esclarecimento das origens da desestabilização e do insucesso das estratégias usadas

pelos trabalhadores exige confrontá-las com as exigências da tarefa. Freqüentemente, sem que se busquem tais origens, rotulam-se os insucessos como “erros humanos” ou “falhas humanas”, expressões geralmente empregadas entre nós como equivalentes de atos inseguros.

Cabe ressaltar que, na maioria dos processos de produção e de trabalho, particularmente quando há separação entre planejamento e execução, as margens de manobras dos trabalhadores

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na execução de suas tarefas são extremamente exíguas, uma vez que objetivos, metas de produção, meios a serem utilizados, horários, equipes, prescrições etc., já foram definidos pelos planejadores.

A abordagem ergonômica enfatiza a importância da distinção entre trabalho real e trabalho prescrito, chamando a atenção para possibilidades de equívoco nas análises de acidente quando se perde de vista esta diferença. No trabalho real, exigências diversas, incertezas de situações que escapam da norma ou a ultrapassam estão sempre presentes, constituindo a denominada “variabilidade normal” 12.

Trabalhar é fazer face a essa “variabilidade”, integrante inseparável da situação de trabalho, por meio do que esses autores denominam gestos (manobras executadas). Os gestos, entretanto, não resultam de livre escolha do operador, pelo contrário, são conseqüências de relações (compromissos) entre objetivos, tarefa, meios de trabalho e características do operador. Nesse contexto, ser competente significa saber encontrar o “bom compromisso”, ou seja, ser capaz de adquirir habilidades e de adotar estratégias gestuais, individuais e coletivas eficientes. Como as características dos operadores diferem entre si, ainda que tenham tido a mesma formação, seus gestos poderão ser semelhantes, não iguais, o que remete para grupo de gestos ou gestos assemelhados.

Amalberti 2 denomina a gestão de situações de regulação do trabalho face à variabilidade de compromisso cognitivo, assinalando que se trata de algo forjado na atividade. Essa autora critica estudos que entendem erro humano como falha dos operadores, superáveis por melhoria na formação e aperfeiçoamentos das regulamentações das tarefas, ressaltando que os acidentes e os incidentes graves são raros, muitos deles provavelmente evitados “graças aos atores do sistema”, infelizmente sem estatísticas a apoiá-los, exatamente porque foram evitados.

Segundo Reason 26, o erro humano não pode ser totalmente eliminado, configurando o que esse autor considera como “revés a ser pago à inteligência humana” e “qualquer que seja a formação, o tratamento ergonômico ou a regulamentação [...] ele resta na origem de necessidades de segurança e tudo deve ser feito para conseguir sua redução”.

Partindo do reconhecimento da inevitabilidade do erro, Llory 21 defende a necessidade de mudança do enfoque proposto nas abordagens de erro humano. Segundo ele, deve-se adotar justamente a idéia de que “errar é humano”.

A idéia central de Amalberti 2 é que o compromisso cognitivo sobrepõe-se ao erro (que faz parte do conjunto dos processos cognitivos do operador). “Inteligente, extraordinariamente flexível e adaptável e, ao mesmo tempo, frágil e limitado em seus processos cognitivos” é como essa autora descreve o operador que considera dotado de meta-cognição, ou seja, conhece suas limitações e possui visão reflexiva acerca de suas capacidades. Em outras palavras, “sabe o que sabe e sabe o que não sabe” e, graças a isso, é capaz de conferir eficácia e segurança ao sistema.

Tipos de acidentes do trabalho

Monteau 23, com base em algumas características dos acidentes do trabalho e dos processos de produção em que ocorrem, propõe classificação desses fenômenos em três tipos.

Os acidentes de tipo 1 caracterizam-se por constituir quase uma seqüência linear de eventos, a partir de mudança ou variação na situação de trabalho cuja presença gera perturbações ou interações negativas que resultam no acidente. Ocorrem em empresas com baixa incorporação tecnológica, que ainda não atingiram a fase de superação de problemas elementares de engenharia de segurança, como proteção de máquinas e adequação de postos de trabalho. Em virtude disso, essas empresas apresentam elevadas taxas de freqüência de acidentes do trabalho, com a maioria dos episódios ocorrendo em atividades habituais. Visto que as condições de insegurança são facilmente identificáveis e estão presentes de maneira permanente nas condições de trabalho, as inspeções são o método mais indicado de investigação (e, aliás, deveriam ser efetuadas antes que os acidentes ocorressem). Trata-se de sistemas nos quais a segurança depende quase exclusivamente do desempenho do trabalhador que deve manter níveis de atenção que excedem

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suas capacidades fisiológicas, configurando situações consideradas como “um acidente esperando para acontecer” 5.

Do ponto de vista dos autores deste capítulo tais condições de trabalho são inaceitáveis e configuram desrespeito flagrante a direitos básicos da condição de cidadania, especialmente ao direito a um trabalho saudável. Em nosso meio essa maneira de violação de direitos tem sido reconhecida como uma das formas de violência a que são submetidos os trabalhadores 6, 16.

Os casos de tipo 2 caracterizam-se pela participação de conjunto de variações que, isoladamente, dificilmente seriam capazes de desencadear acidentes do trabalho, mas que, combinadas, são suficientes para fazê-lo. Ocorrem em empresas com grau de incorporação tecnológica mais elevado, que já superaram a maioria dos problemas clássicos de engenharia de segurança, e que apresentam taxas de freqüência de acidentes consideradas baixas. A maioria dos casos ocorre durante o desenvolvimento de atividades eventuais, particularmente, nas de manutenção. Nesse tipo de acidente observa-se a participação de fatores relacionados à organização do trabalho e ao gerenciamento da empresa, muitas vezes presentes na situação de trabalho de maneira limitada no tempo.

Por fim, os acidentes de tipo 3 são aqueles cujas origens exigem a presença de conjunções de numerosas mudanças ou variações independentes entre si. Ocorrem em empresas com elevada incorporação tecnológica nas quais os acidentes do trabalho constituem evento excepcional, resultando de acumulação de erros ou afastamentos de regras e, ou procedimentos em sistemas considerados como apresentando bom nível de segurança. Sob certos aspectos, os acidentes de tipo 3, segundo esta classificação assemelham-se aos acidentes normais, de Perrow 24.

A noção de tipologia de acidentes discutida até aqui permite ilustrar que as condições de estabilidade dos gestos, ou estratégias de regulação, adotados pelos trabalhadores na operação, variam de acordo com as características dos sistemas. À medida que aumentam a confiabilidade e a segurança do sistema, a tolerância às variações também aumenta. Assim, nos sistemas em que há predomínio de acidentes de tipo 1, essas estratégias desestabilizam-se com muita facilidade, não tolerando a ocorrência de mudanças, por mínimas que sejam. Nas outras duas situações as regulações suportam mudanças isoladas, embora, algumas delas possam tornar mais frágeis a confiabilidade e a segurança do sistema. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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24. Perrow C. Normal Accidents. New Jersey: Princeton University Press; 1999.

25. Rassmussen J, Duncan K, Leplat J. New Technology and human error. Chichester: John Wiley & Sons; 1987.

26. Reason J. Human error. Cambridge: Cambridge University Press; 1999.

27. Simard M. La prise de risque dans le travail, un phénomène organisationnel. In Goguelin P et Cuny X. La prise du risque dans le travail. 2ème ed. Toulouse: Octares Édition; 1993.

28. Sperandio JC. Les processus cognitifs au cours du travail. In Cazamian P, Hubault F, Noulin M. Traité d‟Ergonomie. Nouvelle édition actualisée. Toulouse: Octares Édition; 1996. p. 181-190.

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2. ANÁLISE DE ACIDENTES DO TRABALHO TÍPICOS

O desejável é que acidentes do trabalho não aconteçam. Entretanto, quando acontecem, é importante retirar deles o maior número de ensinamentos possível, visando prevenir novos episódios. Analisar um acidente do trabalho é desvendar meticulosamente a rede de fatores que contribuíram para sua ocorrência.

A análise de acidentes do trabalho é um processo a ser desenvolvido coletivamente, com participação de diversos atores (acidentado, colegas de trabalho, contra-mestres, etc.), prática que apresenta inegáveis aspectos pedagógicos, particularmente quando se consegue participação de empregados de diferentes níveis hieráquicos da empresa em que o acidente ocorreu. A falta de definição clara de objetivos tem sido um sério complicador das análises de acidentes do trabalho: análises visando à prevenção devem buscar esclarecer os fatores causais que participaram do episódio em foco, deixando a identificação de responsáveis e, ou culpados, a cargo da Justiça Civil e da Justiça Criminal, respectivamente. A confusão entre objetivos jurídicos e objetivos de prevenção tem-se revelado altamente prejudicial aos últimos, na medida em que o encontro de culpados ou responsáveis costuma encerrar a análise, além de, progressivamente, induzir à sonegação de informações por parte dos trabalhadores, temerosos quanto às conseqüências em termos de punição por parte da própria empresa.

Após um evento emocionalmente traumatizante, como são os acidentes do trabalho, a recuperação de informações por meio de entrevistas a trabalhadores que possuam relações diretas ou indiretas seja com o acidentado, seja com as circunstâncias em que o acidente ocorreu não constitui tarefa fácil. O fato de, no Brasil, ainda prevalecer a concepção dicotômica de que os acidentes do trabalho decorrem da prática de atos inseguros pelos trabalhadores, constitui dificuldade que não pode ser subestimada. Na literatura internacional é possível também encontrar análises simplistas e, ou tendenciosas de acidentes do trabalho. Nos Estados Unidos, um acidente fatal 4 envolvendo um robô no qual o acidentado entra na área de funcionamento do equipamento e é prensado entre um dos braços do robô e o poste de limitação de rotação do braço, segundo a análise do National Institute for Occupational Safety and Health – NIOSH “o maior fator contributório para este acidente fatal pode ter sido o comportamento da vítima”. Em contradição com esta conclusão, as medidas de prevenção propostas foram:

fechamento da área de trabalho do robô;

instalação de painéis de controle do equipamento fora da área de operação;

recomendação de não utilização de postes de segurança para limitação de movimentos em caso de descontrole do equipamento 4

Tais medidas levam ao questionamento da real importância do comportamento da vítima na situação em que o acidente ocorreu.

A conclusão da análise desse acidente choca-se frontalmente com as colocações de Hale e Glendon 3:

o último fator desencadeante do acidente do trabalho pode ter sido o comportamento do acidentado, porém esse comportamento geralmente é irrelevante para a prevenção de novos acidentes;

os acidentes do trabalho indicam que as capacidades de controle do sistema foram excedidas e que eles eram previsíveis muito tempo antes dessas capacidades terem sido excedidas. Praticamente não existem divergências entre estudiosos de acidentes do trabalho, quanto à

importância de análises bem conduzidas, não só de acidentes do trabalho, como de incidentes e de quase acidentes. Tais análises visam diagnosticar, tanto as falhas no sistema que deram ensejo à ocorrência do episódio pesquisado, como suas origens, de crucial importância para a prevenção.

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Um bom método deve prover maneiras adequadas de sistematizar a análise, particularmente a coleta de dados, de sorte que os principais aspectos que possam ter contribuído para o desencadeamento do acidente sejam identificados e adequadamente descritos e caracterizados.

Atualmente considera-se que os métodos baseados na Teoria de Sistemas, isto é, que partem do princípio que as empresas constituem sistemas sócio-técnicos abertos, em cujo interior podem ocorrer perturbações potencialmente capazes de desencadear incidentes, quase-acidentes e acidentes, e que adotam questões abertas direcionadas para a identificação de perturbações e de suas origens, são os que propiciam investigações mais abrangentes.

No interior das empresas, entendidas como sistemas sócio-técnicos abertos com objetivo de produzir de bens ou serviços, podem ocorrer perturbações indesejáveis potencialmente capazes de evoluir desfavoravelmente, produzindo não só acidentes de trabalho, mas desgastes e, ou perdas de materiais. Entende-se como sistema sócio-técnico aberto, o sistema constituído por dois sub-sistemas:

sub-sistema técnico (ambiente, máquinas, tecnologia, produtos etc.), e

sub-sistema social (trabalhadores com diferentes qualificações que estabelecem entre si relações pessoais e hierárquicas etc,). Esses dois sub-sistemas interagem entre si, assim como recebem influências e influenciam

o meio social em que se inserem. Neste texto, os episódios serão denominados:

acidentes - quando houver vítima(s);

quase acidentes – quando o episódio, por pouco, não produziu lesão em algum trabalhador;

incidentes – quando não houver nenhum trabalhador lesado (vítima) Como exemplo de incidente, pode-se citar a pane de um equipamento e, de “quase

acidente”, a queda de uma laje ao lado de um trabalhador que, por pouco, não é atingido. No Brasil, é crucial abordar alguns aspectos da cultura da culpa que ainda prevalece em nosso país, o que levou Cohn e colaboradores, em 1985, a cunhar a expressão “produção da consciência culposa”. Lamentavelmente, a atribuição de culpa ao trabalhador pelo acidente que o vitimou, já superada na maioria dos países desenvolvidos. ainda é forte entre nós. Recentemente foi possível constatar, a partir do estudo da análise de 125 acidentes do trabalho típicos ocorridos em três empresas metalúrgicas de grande porte do Estado de São Paulo, e investigados pelas mesmas, o peso atribuído à “negligência”, “imprudência”, “descuido”, “exposição desnecessária ao perigo”, etc. pelos encarregados das investigações, evidenciando emissão a priori de juízo de valor, em detrimento da busca dos reais fatores envolvidos na gênese destes fenômenos. Além disso, tais investigações revelaram média de 1,14 “causas” por acidente, resultado que aponta claramente para a concepção monocausal em relação a fenômenos sabidamente multi ou pluricausais. Lamentavelmente, no que diz respeito à gênese dos acidentes do trabalho, a concepção unicausal, calcada, sobretudo, em “fatores humanos”, entendidos como descuido, negligência, imprudência, etc ainda prevalece no interior da maioria das empresas. Essa concepção associa-se a análises que não diagnosticam as verdadeiras causas dos acidentes do trabalho, mas tão somente apontam culpados.

Para profissionais preocupados com a prevenção, as análises dos acidentes devem buscar esclarecer os fatores causais que participaram do episódio em foco, deixando a identificação de responsáveis e, ou culpados, a cargo da Justiça. Ainda está por ser superada a confusão entre objetivos jurídicos e objetivos de prevenção, cabendo assinalar que o encontro de culpados ou responsáveis costuma encerrar a investigação e que os trabalhadores tendem a sonegar informações.

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Os acidentes de trabalho podem ser entendidos, também, como o encontro entre o trabalhador exposto e uma energia perigosa, que é liberada. Desse ponto de vista, analisar um acidente requer a identificação:

do tipo de energia liberada;

da forma pela qual essa energia atingiu o exposto (ou os expostos)

das conseqüências do encontro entre expostos e energia liberada;

das razões da existência de energia potencial (perigo) no sistema;

dos fatores associados à liberação da energia que estava sob controle;

das condições que explicam a existência de expostos;

das razões de inexistência ou de insuficiência de barreiras ou de medidas de proteção capazes de evitar o encontro entre expostos e energia liberada.

Como conduzir a análise

Qualquer que seja o método que venha a ser adotado, é necessário:

preservar o local do acidente;

iniciar análise, no próprio local, o mais rapidamente possível após a ocorrência;

esclarecer os trabalhadores quanto aos objetivos da análise e suas etapas;

esclarecer os trabalhadores sobre a importância de sua colaboração no sentido de fornecer informações aos analistas;

realizar esquemas, fotografar e registrar aspectos que podem ser decisivos na compreensão de como o acidente ocorreu (vista geral das instalações em que ocorreu o acidente, aspectos particulares do local, máquinas, equipamentos, desenvolvimento habitual da tarefa etc.);

entrevistar o acidentado (acidentes não fatais);

entrevistar todos os trabalhadores que possam contribuir para o esclarecimento de aspectos direta ou indiretamente relacionados ao acidente, independentemente do nível hierárquico;

não se deixar intimidar quando for necessário buscar informações em escalões hierárquicos superiores da empresa;

durante a coleta de informaçõe, não esboçar conclusões e, ou realizar interpretações e, sobretudo, não emitir juízos de valor, pois interferem negativamente com a análise;

se necessário, formular hipóteses explicativas e buscar evidências capazes de confirmá-las ou de afastá-las;

não advertir, punir ou multar em decorrência de fatos, relacionados ou não ao acidente, que vierem à tona durante análise;

consultar documentos como atas de CIPA, cartões de ponto, registros de manutenção, bancos de dados de acidentes;

consultar registros de acidentes pregressos que incluam aspectos semelhantes ao episódio analisado.

Os métodos que propiciam análses mais abrangentes são os baseados na Teoria de Sistemas, isto é, que partem do princípio que as empresas constituem sistemas sócio-técnicos abertos, em cujo interior podem ocorrer perturbações potencialmente capazes de desencadear incidentes, quase-acidentes e acidentes, e que adotam questões abertas direcionadas para a identificação de perturbações e de suas origens.

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Os acidentes, embora, do ponto de vista da saúde pública, constituam problema sério, na verdade são relativamente raros, ou seja, na maioria dos dias de trabalho não ocorrem acidentes. E, quando ocorrem, alguma coisa “diferente”, no sentido de “não habitual”, aconteceu. Ou seja, houve alguma(s) mudança(s) ou variação(ões) na situação de trabalho e a análise do acidente terá o objetivo de identificar tal(ais) mudança(s). Como ponto de partida toma-se a mudança que ocorreu por último – a lesão do trabalhador acidentado e procura-se identificar seus fatores causais. Por exemplo, um trabalhador apresenta estiramento dos ligamentos do tornozelo. Como isso aconteceu? Na verdade, o trabalhador chega contando, por exemplo, que escorregou e torceu o pé direito. Habitualmente o trabalhador não torce o pé e chega ao final da jornada sem apresentar lesões. Este fato – torcer o pé – constitui uma mudança ou variação e, neste caso, no estado do trabalhador. Para desvendar o que aconteceu será necessário indagar o que o trabalhador estava fazendo quando torceu o pé. Por exemplo, ao caminhar para buscar uma ferramenta, ele pode ter escorregado numa poça de óleo em área de circulação, no chão. Interessa ao analista saber: (a) como a poça foi parar aí? (b) é comum a existência de poça de óleo em área de circulação? (c) que ferramenta o trabalhador fora buscar? (d) é comum ter de ir buscar ferramentas em outros locais? E assim por diante. Em outras palavras é preciso recuperar o maior número possível de informações de modo a formar um quadro mental - quanto mais completo, melhor - dos fatores que precederam o acidente, tanto próximos da lesão no tempo (imediatamente antecedentes), como remotos. Pode-se considerar que analisar um acidente de trabalho é como abrir uma caixa preta para observar o que ela contem. E, para que a condução dessa observação leve a resultados que ajudem a compreensão abrangente de como o acidente aconteceu, é importante sistematizar a análise. Uma sistematização adequada é a preconizada pelo método de Árvore de causas, no qual o trabalho que o acidentado estava executando é decomposto em quatro componentes:

trabalhador (indivíduo) – com seus aspectos físicos e psicológicos;

tarefa (atividade, segundo a Ergonomia), representada pelo conjunto de ações executadas pelo indivíduo enquanto partícipe da produção (de bens ou serviços; direta ou indiretamente);

material, entendido como todos os meios técnicos que o trabalhador utiliza para executar sua tarefa (atividade, segundo a Ergonomia),

meio de trabalho, isto é, o ambiente físico e o ambiente social no qual o indivíduo executa sua tarefa.

Em relação a cada um dos componentes, o analista deve identificar as variações ocorridas, ou seja, o que se passou de forma não habitual. É indispensável distinguir variação – conceito utilizado no Método ADC - de variabilidade normal, conceito da Ergonomia. Segundo esta, variabilidade normal constituem pequenas variações nas formas de realização das atividades pelos trabalhadores que não interferem com a obtenção dos resultados planejados. Já as variações perturbam o desenrolar da atividade fazendo com que o trabalhador perca o controle dos resultados. A Ergonomia chama as variações de variabilidade incidental.

As variações são sempre identificadas em relação ao trabalho real, não ao trabalho prescrito.Isto significa que, se na análise de um acidente, depara-se com uma situação na qual uma prescrição (ou norma ou regra) é sistematicamente descumprida, este fato não constitui uma variação, mas um fato habitual. Desse ponto de vista, se tudo se desenvolve de forma habitual (sem nenhuma variação) não ocorre acidente. O contrário, entretanto, não é verdadeiro, isto é, pode haver variação em relação à atividade habitual ou cotidiana, sem que sobrevenha um acidente. Por exemplo, a designação de um trabalhador para outro posto de trabalho que não o seu constitui uma variação e, entretanto, em grande parte das vezes em que isto ocorre, não sobrevêm acidentes.

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Ainda em relação ao conceito de variação, cabe esclarecer que, se o não cumprimento sistemático de normas ou regras de segurança constitui fato habitual, por si só, não explica a ocorrência do acidente, para o que é imprescindível a existência de pelo menos uma variação. Qualquer que seja o método utilizado, é extremamente importante que, a partir do acidente / quase acidente / incidente a pesquisa tanto de variações, como de fatos habituais que possam ter participado do acidente seja ampliada de maneira sistemática em relação ao indivíduo / trabalhador, à tarefa, aos materiais, ao ambiente físico e ao ambiente social, neste último, incluindo-se aspectos da organização do trabalho na empresa. A descrição deve, pois, retroceder até o ponto em que fatos remotos em relação ao acidente caíram no esquecimento, ou quando os analistas acreditarem possuir um quadro – o mais completo possível - do episódio analisado. Esta ampliação da análise possibilita evidenciar fatores da organização do trabalho e do gerenciamento da empresa que contribuíram para a ocorrência do acidente. Outro aspecto fundamental da descrição é relatar os fatos ocorridos de forma clara, concisa e sem emissão de juízo de valor. Além disso é muito importante não formular interpretações antes que se tenha completado a coleta de informações necessária à elaboração de uma boa descrição do acidente. Termos como “negligência”, “descuido”, “imprudência”, etc., que caracterizam emissão de juíso de valor, devem ser substituídos por descrições de fatos. Não sistematização da coleta de informações, com Interrupção precoce acarretando o aparecimento de lacunas são fatores que desembocam em descrições imprecisas e que prejudicam a identificação dos fatores que participaram do desencadeamento do acidente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Binder MCP, Azevedo ND, Almeida IM. Análise crítica de investigações de acidentes do trabalho típicos realizadas por três empresas metalúrgicas de grande porte do Estado de São Paulo. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional 1997; (85/86): 103 - 118.

2. Cohn A, Karsh US, Hirano S, Sato AK Acidentes do Trabalho. Uma forma de violência. São Paulo: Editora Brasiliense, CEDEC; 1985.

3. Hale AR, Glendon AI. Individual behaviour in the control of danger. Amsterdam: Elesevier; 1987.

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3. PREVENÇÃO DE ACIDENTES DO TRABALHO

Em decorrência, seja de inspeções de segurança, seja de investigações de acidentes, o objetivo de prevenção só é atingido ao se identificar, selecionar e, sobretudo implantar e acompanhar o resultado de medidas capazes de eliminar ou de neutralizar as condições que implicam em risco para a saúde e integridade física dos trabalhadores.

Dentre os critérios para adoção dessas medidas, alguns são considerados fundamentais: 1ª) eliminar ou neutralizar os fatores de risco; 2ª) apresentar estabilidade ao longo do tempo; 3ª) ser independente da vontade do operador; 4ª) não implicar em esforço adicional para o operador; 5ª) não interferir com a produtividade; 6ª) não provocar deslocamento do risco nem surgimento de novos riscos: por exemplo, sem adoção de outras medidas complementares, melhorar as condições das pistas de uma rodovia, possibilitando maior desenvolvimento de velocidade, poderá acarretar aumento da freqüência e, ou da gravidade dos acidentes; 7ª) apresentar alcance amplo (quanto mais à montante em relação à lesão, maior amplitude): por exemplo, adequar quantitativa e qualitativamente o efetivo às demandas da empresa; 8ª) ter prazo de aplicação compatível com o grau de risco: por exemplo, interditar uma área em que há risco de incêndio ou explosão, independentemente da adoção de outras medidas de implantação a curto, médio e longo prazo; 9ª) relação custo / benefício compatível com a capacidade financeira da empresa, excetuando-se condições que configurem situação de risco grave e iminente.

Alguns pontos de referência para a prevenção de acidentes do trabalho

Os acidentes do trabalho constituem objeto de interesse de diferentes áreas do conhecimento, cujo estudo requer o concurso de diversas especialidades, para que seus múltiplos aspectos - jurídicos, sociais, psicológicos, médicos, ergonômicos, de engenharia, dentre outros -, possam ser bem explorados e conhecidos.

O fato do trabalho real, em maior ou menor grau, diferir sempre do trabalho prescrito constitui aspecto freqüentemente negligenciado, levando a explicações simplistas acerca da origem dos acidentes, que seriam fruto de desobediência a regras e, ou a prescrições.

Além de dominar as habilidades técnicas requeridas pelas tarefas a serem executadas, os trabalhadores precisam integrar-se ao coletivo da empresa, processo que implica estabelecer relações com colegas e chefias, conhecer regras formais e informais, desvendar o “clima” ou ambiente psico-social da empresa e aprender a utilizar procedimentos e estratégias - adotados, aceitos ou tolerados - visando superar a variabilidade e as incertezas presentes na situação real de trabalho. Nesse sentido, é fundamental que os mecanismos cognitivos e afetivos dos seres humanos no trabalho sejam levados em consideração.

As análises dos acidentes do trabalho (e também as análises do trabalho) devem evidenciar os fatores potencialmente capazes de desencadear tais eventos para planejar as intervenções preventivas, incluindo aí aspectos da organização do trabalho e do gerenciamento da empresa.

Os conceitos de atos inseguros e de condições inseguras, originados na década de 30, com base na concepção de acidentes como seqüência linear de eventos, foram abandonados por grande número de estudiosos ou passaram por mudanças significativas em sua interpretação. Desconsiderando a evolução dos conhecimentos, em numerosas empresas do país persiste a concepção dicotômica, atos inseguros e condições inseguras, como norteadora das investigações de acidentes do trabalho.

Uma das conseqüências da evolução da concepção de acidentes tem sido a crescente compreensão da inutilidade de recomendações de prevenção como “prestar mais atenção”,

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“conscientizar”, “tomar mais cuidado” e assemelhadas. Firma-se o entendimento de que o trabalho desenvolvido em condições em que a segurança depende exclusivamente no desempenho do trabalhador, exigindo a manutenção de grau vigília incompatível com as capacidades humanas, configuram “acidente esperando para acontecer” sendo, portanto, inaceitável.

Devido à diversidade dos processos de produção e de trabalho, com graus variados de incorporação tecnológica e enorme variabilidade de condições de segurança do trabalho, a prevenção de acidentes de trabalho no Brasil apresenta numerosos complicadores.

A maioria dos estudos contemporâneos sobre segurança do trabalho aborda problemas relativos a sistemas de alta complexidade e questionam as formas de organização do trabalho e de gerenciamento das empresas. De acordo com Simard 10, as práticas de gerenciamento escolhidas e adotadas pelas empresas dependem da importância dada à segurança pelos escalões hierárquicos superiores. Para esse autor, dada a resistência de chefias intermediárias, que vêem nas práticas de segurança do trabalho entraves à produtividade, as chances de êxito destas dependem de apoio visível da alta direção das empresas.

“Este nível nos envia às atividades de prevenção propriamente ditas, permitindo observar que as empresas possuidoras de taxas mais baixas de acidentes praticam um conjunto de atividades de identificação sistemática de riscos e de análise de fatores de acidente: por exemplo, atividades tais como a inspeção freqüente dos locais de trabalho e o recenseamento de condições perigosas, análise imediata de todos os acidentes e incidentes, análise de segurança das tarefas, elaboração e análise de estatísticas de acidentes. [..] constata-se também que as atividades de intervenção visando a prevenção de acidentes são de orientação sócio-técnica [...] intervindo-se sobre fatores técnico-materiais e sobre os fatores psicossociais e organizacionais dos acidentes” 10.

Kuorinka e Forcier 5 chamam a atenção para as resistências a mudanças no interior das organizações, afirmando que seu enfrentamento pode se beneficiar da utilização de ferramentas de planejamento, bem como do envolvimento dos trabalhadores nos processos de mudanças, com objetivo de melhorar sua natureza e conteúdo e de facilitar seu gerenciamento. Esses autores sugerem: a) programas estruturados, b) comprometimento e envolvimento das gerências com os programas, c) boa comunicação entre supervisores e trabalhadores e d) envolvimento dos trabalhadores em atividades de saúde e segurança.

De acordo com Pransky et al 8, para fazer face aos problemas de segurança do trabalho identificados, as empresas precisam organizar um conjunto de ações, denominado resposta organizacional, que deve possuir as seguintes características:

envolvimento efetivo do trabalhador, incentivado por meio de treinamento do grupo em habilidades para resolução de problemas;

um forte líder de projeto;

flexibilidade organizacional, ou seja, abertura à exploração das causas dos problemas e à adoção de correções, mesmo quando estas impliquem em questionamento de decisões estratégicas;

consistência entre ações e metas estabelecidas pela organização,

comprometimento dos recursos com a resposta, Um dos expoentes da corrente de autores que se ocupam da melhoria da confiabilidade

humana em sistemas sócio-técnicos, Leplat 6, considera de grande importância: a) melhorar o conhecimento acerca da tarefa; b) aumentar as possibilidades de antecipação de problemas, determinando as variáveis

essenciais para o operador, dando-lhe informações sobre a evolução do processo,

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alargando o seu campo de controle e melhorando os dispositivos de aviso acerca dos momentos em que as variáveis críticas afastam-se da zona de segurança;

c) melhorar a percepção e o diagnóstico de erros concebendo sistemas tolerantes a erros e garantindo acesso a informações acerca dos estados intermediários do sistema antes do estado final em que pode manifestar-se o erro;

d) estabilizar as condições de funcionamento do sistema; e e) eliminar a atribuição de culpa ao autor do erro, de modo a diminuir dificuldades que

podem surgir no trabalho daqueles que dedicam-se à identificação de erros ocorridos. Discutindo o que deve ser feito diante da revelação de “erros humanos”, o Canadian Center

of Occupational Health and Safety 2 afirma expressamente:

“Nunca faça recomendações disciplinares a uma pessoa ou pessoas que podem ter cometido uma falta. Isso poderia não somente ir contra o propósito real da investigação, mas poria em risco as chances do livre fluxo de informações em investigações futuras”.

Reason 9, analisando a importância dos erros humanos para a segurança do trabalho destaca como meios para sua redução:

a supressão de condições associadas ao seu desencadeamento, consideradas erros latentes ou condições em potencial para a sua ocorrência;

a introdução de sistemas de ajuda à tomada de decisões, genericamente denominadas próteses cognitivas, capazes de ajudar o operador em seus pontos “fracos”, incluindo dispositivos técnicos de aviso, melhorias de treinamento e suportes informatizados;

a inclusão de dispositivos de ajuda à memória de pessoal de manutenção;

a incorporação, no sistema sócio técnico, de defesas voltadas para a recuperação dos erros já ocorridos, dentre as quais cita o envolvimento de coletivos de trabalho, regulamentações, procedimentos, organização, gerenciamento e, enfim, da técnica. Na visão de Reason 9, é o conjunto de todas essas defesas que confere ao sistema seu

desempenho e seu nível de segurança global. Llory 7 critica a visão administrativa que pressupõe que o estabelecimento de normas e de

procedimentos resolve os problemas e as dificuldades de trabalho. Depois de destacar que essa idéia difundiu-se através do movimento da qualidade e estendeu-se ao gerenciamento de recursos humanos o autor afirma:

“Os procedimentos, as prescrições, mesmo detalhados, não podem ser completos: embora necessários, não são suficientes [...].”

Criticando as opiniões que consideram que o controle dos erros humanos ou fatores humanos implica reduzir o máximo possível a autonomia dos operadores, esse autor 7 afirma que os defensores dessas estratégias esquecem-se ou perdem de vista o fato de que a introdução de qualquer dispositivo de ajuda pode mudar sensivelmente as relações sociais de trabalho e tornar inoperantes certos “savoir faire” utilizados pelos operadores. Com isso, deslocam os seus problemas, desestabilizam as suas práticas de trabalho, as regras informais cotidianas o que pode ensejar o aparecimento de outras dificuldades ainda não identificadas, desconhecidas. Por isso, este autor recomenda

“extrema prudência em relação às modificações das condições de trabalho que parecem funcionar por si mesmas, ser „evidentes‟.”

Amalberti 1 propõe a noção de compromisso cognitivo, criticando as abordagens de segurança centradas exclusivamente nos erros. Uma ação “sobre a detecção e a recuperação dos

Grifo no original.

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erros não seria suficiente para permitir ao operador o restabelecimento de seu equilíbrio cognitivo”. A prevenção deve basear-se na descrição daquilo que serve de fundamento a esse compromisso cognitivo, à representação da situação e sua manutenção dentro de valores pertinentes para o sucesso da tarefa e a segurança do sistema. Para essa autora, os objetivos da prevenção devem ser:

a) não privar o operador de suas defesas naturais e não contrariá-las, b) deixar o operador regular seu compromisso deixando-lhe o controle da situação e dos

riscos a correr (“de la prise de risque”), favorecer a visibilidade de suas próprias ações e das ações do sistema, para que ele regule eficazmente os riscos que corre e suas defesas e de modo coerente.

Propostas semelhantes já haviam sido apresentadas por Dejours3, para quem o trabalho deve desenvolver-se em clima de confiança, que favoreça o estabelecimento de relações de solidariedade entre os trabalhadores.

Llory 7 usa a expressão trabalho vivo para referir-se ao trabalho real, às “trocas de idéias entre os operadores, [...] decidir como se vai fazer a operação, avaliar [...] os modos [...] menos onerosos [...], julgar a situação dos chefes de equipe, dos colegas, ou a capacidade técnica deles [...]”. Esse autor enfatiza que “o trabalho vivo se realiza graças ao desenvolvimento da coordenação, de estratégias de cooperação e de um conjunto complexo de comportamentos, de táticas que permitem viver bem, fazer-se entender, ter certeza de ter sido bem compreendido e ajudar-se uns aos outros”.

Para Kouabenan 4, a explicação causal “ingênua” do indivíduo comum, particularmente do próprio acidentado, também deve ser levada em consideração, afirmando que a explicação acerca do ocorrido é uma necessidade que as pessoas têm. Segundo esse autor, para a vítima do acidentes, a lógica da causalidade

“vem de suas experiências, de suas crenças, de suas percepções, de seu desejo de justiça, mas, sobretudo, de seu desejo legítimo de se crer com o domínio de seu mundo” (“maître de son monde”).

Os métodos especializados podem aproveitar esses conhecimentos “ingênuos” para aumentar a confiabilidade dos dados em que se baseiam suas análises, bem como para melhorar a credibilidade das medidas de segurança que delas decorrem, afirmando que

“as mensagens de prevenção melhorariam em eficácia, e perspicácia, se integrassem os vieses defensivos mais comuns” [das pessoas].

A necessidade de abordagem trans e interdisciplinar dos acidentes do trabalho está gerando um novo campo, o da “acidentologia”. A heterogeneidade da situação brasileira em termos de diferentes tipologias de acidentes do trabalho presentes na mesma área geográfica, quando não no interior da mesma empresa, constitui um complicador de peso, tanto para os estudiosos do tema, como para os envolvidos com os programas de prevenção. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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4. Kouabenan DR. Explication naïve de l‟accident et prévention. Paris: Presses Universitaires de France; 1999.

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9. Reason J. Human error. Cambridge: Cambridge University Press; 1999.

10. Simard M. La prise de risque dans le travail, un phénomène organisationnel. In Goguelin P et Cuny X. La prise du risque dans le travail. 2ème ed. Toulouse: Octares Édition; 1993.

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4. ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS

Indicadores epidemiológicos

Um dos importantes usos da Epidemiologia é fornecer elementos para nortear o estabelecimento de prioridades em termos de prevenção. Em relação aos acidentes de trabalho, essa disciplina é capaz de:

descrever, segundo os parâmetros clássicos de pessoa, local e tempo, a ocorrência dos acidentes do trabalho;

estimar os riscos de acidentar-se, de ficar inválido, e de morrer, segundo ramo de atividade econômica, ocupação, região geográfica e outros parâmetros;

avaliar a evolução da ocorrência dos acidentes comparando-as com variações na atividade econômica, introdução de novas tecnologias e implementação de medidas de prevenção;

avaliar o impacto dos acidentes na vida dos acidentados em termos de saúde mental, desenvolvimento de doenças psicossomáticas, hipertensão arterial e outras.

Os indicadores epidemiológicos constituem instrumento valioso para acompanhamento da evolução da ocorrência dos acidentes de trabalho. Incidência e taxa de freqüência são indicadores utilizados para medir a ocorrência dos acidentes do trabalho. Aliados a um terceiro indicador, a taxa de gravidade, constituem importantes ferramentas para a definição de prioridades.

A incidência é a razão entre o número de casos de acidentes do trabalho (numerador da fração) e a população exposta ao risco de vir a acidentar-se (denominador da fração), em determinado local (país, região, cidade, ramo de atividade...) e em determinado intervalo de tempo. Para evitar trabalhar com cifras muito pequenas, o valor obtido é geralmente multiplicado por 1.000.

Incidência = N.º de acidentes do trabalho ocorridos

x 1.000 N.º de trabalhadores expostos ao risco de acidentar-se

Exemplo de cálculo: em 2005 foram registrados junto à Previdência Social 393.921

acidentes do trabalho típicos e a população segurada estimada foi de 33.238.617 trabalhadores. O cálculo da incidência revela que, nesse ano, ocorreram 11,8 acidentes do trabalho por 1.000 trabalhadores.

A taxa de freqüência é um indicador mais preciso do que a incidência, pois leva em conta o número de horas trabalhadas pelos expostos ao risco de se acidentar no trabalho. Ela é calculada por:

Taxa de freqüência = N.º de acidentes do trabalho ocorridos

x 1.000.000 N.º de horas-homem trabalhadas

A taxa de freqüência de acidentes do trabalho leva, pois, em consideração a dinâmica da

população trabalhadora: ao deixar o trabalho por demissão, aposentadoria ou outra causa, o trabalhador, simultaneamente, deixa de estar exposto ao risco de acidentar-se não podendo mais contribuir para o denominador (número de horas-homem trabalhadas).

Vejamos dois exemplos: 1º) uma empresa A com 10 empregados, num mês qualquer, registrou um total de 1.760

horas-homem trabalhadas. Se nesse mês um dos trabalhadores tiver se acidentado, a taxa de freqüência de acidentes dessa empresa, nesse mês, será calculada por:

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Taxa de freqüência = 1 acidente

x 1.000.000 = 568,1 1.760 horas-homem trabalhadas

A taxa de freqüência de acidentes da empresa A no mês em questão foi de 568,1 acidentes por milhão de horas trabalhadas. No mesmo mês, suponhamos que na empresa B tenham sido registrados 10 acidentes do trabalho em 176.000 horas-homem trabalhadas.

Teremos:

Taxa de frequência = 10 acidentes

x 1.000.000 = 56,8 176.000 horas-homem trabalhadas

A taxa de freqüência de acidentes dessa empresa B, nesse mês, será de 56,8 acidentes por milhão de horas trabalhadas, equivalendo, portanto, a um décimo da observada na empresa A. Com base nesses dados, deve ser dada prioridade de atuação à empresa A.

Outro indicador importante é a taxa de gravidade, dada por:

Taxa de gravidade = nº de dias perdidos + nº de dias debitados

x 1.000 nº de horas-homem trabalhadas

Esse indicador permite avaliar quantitativamente as perdas decorrentes dos acidentes de trabalho por incapacidade temporária ou permanente dos acidentados.

Para cálculo dos dias debitados, muitos países seguem a orientação da Sixth International Conference of Labour Statisticians que estabeleceu em 7.500 o número de dias a debitar em caso de óbito e de incapacitação total permanente. No Brasil, em casos de óbito ou de incapacitação total permanente são debitados 6.000 dias; em outros tipos de perda, o número de dias a debitar é estabelecido pela Norma Regulamentadora Nº 5.

Retomando o exemplo das empresas A e B: se o único trabalhador acidentado na empresa A, em conseqüência de lesão da qual se

recuperou completamente, tiver permanecido afastado por 75 dias, a taxa de gravidade, para o mês em questão será:

Taxa de gravidade (Empresa A) =

75 x 1.000 = 42,6 dias/1.000 horas-homem trabalhadas

1.760

se, na empresa B, a soma dos afastamentos dos 10 trabalhadores (afastamentos decorrentes dos acidentes) tiver sido, por exemplo, 48 dias, com todos os trabalhadores recuperando-se completamente, a taxa de gravidade no mês considerado será:

Taxa de gravidade (Empresa B) =

48 x 1.000 = 0,27 dias/1.000 horas-homem trabalhadas 176.00

0 Nesses exemplos não coube debitar dias para o cálculo da gravidade, visto que houve recuperação completa dos trabalhadores. Esses resultados revelam que a taxa de gravidade da empresa A foi 157 vezes maior do que a da empresa B (42,6/0,27).

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Esses dados hipotéticos indicam que, no tocante à intervenção para melhorar as condições de segurança do trabalho, deve-se priorizar a empresa A, cujas taxas de freqüência e de gravidade de acidentes do trabalho foram superiores às da empresa B. A letalidade constitui outro indicador epidemiológico e, como o nome indica, mede a capacidade de matar, no caso, dos acidentes do trabalho.

Letalidade = nº de óbitos por acidentes do trabalho

x 1.000 nº de acidentes do trabalho ocorridos

Em 1990 foram registrados junto ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) 768.703

acidentes do trabalho, dos quais 5.372, fatais. Calcula-se a letalidade:

Letalidade = 5.372

x 1.000 = 6,99 óbitos por 1.000 acidentes registrados 768.703

Esse resultado indica que, em 1990, de cada 1.000 acidentes notificados ao INSS, 7 (6,99) acarretaram a morte do acidentado.

Essas taxas, além de dimensionar o problema, são instrumentos importantes para o acompanhamento da evolução da ocorrência e da gravidade dos acidentes do trabalho, seja para o país como um todo, seja para determinado ramo de atividade, região, cidade, empresa, etc.

Estatísticas oficiais brasileiras

A fonte de dados utilizada para a elaboração das estatísticas oficiais brasileiras de acidentes do trabalho é constituída pelas comunicações de acidentes do trabalho (CAT), criadas com fins securitários, pela Previdência Social

Trata-se de documento que fornece informações referentes à identificação do acidentado, sua ocupação, à empresa, tipo de atividade econômica, horário de ocorrência do AT, agente causador da lesão, e descrição sumária da situação geradora do acidente. No atestado médico da CAT há informações referentes à unidade que prestou atendimento, além de descrição da lesão ou lesões e sua natureza, diagnóstico provável e respectivo código segundo a Classificação Internacional de Doenças, CID-10, se o acidentado deverá afastar-se do trabalho durante o tratamento e a duração provável do afastamento.

Em se tratando de empregados cobertos pelo seguro acidentário, entre a ocorrência do acidente e a chegada da CAT ao INSS existe um caminho a percorrer, ou seja, o fluxo das CAT. Ainda que possa ser preenchida pelo próprio acidentado, seus familiares, sindicato, médico de atendimento, ou ainda, por qualquer autoridade pública, a emissão da CAT, em grande parte, depende de ato voluntário do empregador ou de seus prepostos. Uma vez emitida, é necessário que o médico de atendimento preencha o atestado médico e, finalmente, que seja encaminhada à agência do INSS da área de abrangência da localidade em que ocorreu o acidente. Embora a responsabilidade desse encaminhamento seja da empresa, isso muitas vezes fica a cargo do próprio acidentado ou de seus familiares; outras vezes é o hospital onde foi prestado o atendimento que se encarrega de fazê-lo. Nesse caminho, existe probabilidade não negligenciável de que muitas comunicações, sobretudo as referentes a acidentes leves, não cheguem ao seu destino, isto é, ao INSS. ______________________________________

A Previdência Social disponibiliza dados sobre acidentes do trabalho segundo grandes regiões e unidades da federação em sua home page na Internet, http://www.mpas.gov.br.

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A emissão de comunicação de acidente do trabalho é obrigatória apenas para os trabalhadores abrangidos pelo seguro acidentário, isto é, para empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho e segurados especiais (produtor, parceiro, meeiro e arrendatário rurais, pescador artesanal e seus assemelhados, que fazem jus ao recebimento de benefícios acidentários). Isto significa que funcionários públicos estatutários (civis e militares), profissionais liberais, proprietários, trabalhadores autônomos, empregados domésticos e trabalhadores do setor informal, não abrangidos pelo seguro acidentário, quando se acidentam, permanecem “invisíveis” para as estatísticas oficiais brasileiras, que não revelam a real extensão e gravidade dos acidentes do trabalho e o seu impacto sobre a saúde pública.

Segundo a legislação previdenciária, os acidentes do trabalho, ocorridos com empregados celetistas, que resultarem em afastamento do trabalho, têm de ser comunicados por meio da CAT, ao Instituto Nacional de Seguro Social, até o primeiro dia útil após sua ocorrência. Desde abril de 2.000 as empresas podem optar pelo envio das CAT referentes a acidentes sem afastamento ou com afastamento de até 15 dias pela internet. Esse procedimento tem a vantagem de diminuir e, mesmo, eliminar a interrupção do fluxo das CAT emitidas, particularmente em casos de acidentes com afastamento menor ou igual a 15 dias, situação em que o pagamento dos dias parados cabe à empresa.

No nível local e micro-regional, a partir de abril de 2000 perdeu-se o acesso às informações referentes aos acidentes que não geram benefícios. Esta sistemática de registro de acidentes via internet apresenta a séria desvantagem de limitar a construção de indicadores por micro-regiões e por municípios. Esse procedimento, passou a impedir o acesso a essas CAT aos serviços de saúde, partidularmente aos centros de referência em Saúde do Trabalhador, uma vez que não são registradas nas agências locais / regionais da Previdência Social.

Os acidentes fatais, além da comunicação ao INSS, devem ser comunicados, de imediato, à autoridade policial. Embora com resultados não generalizáveis para o restante do país, duas investigações realizadas em Botucatu-SP ajudaram esclarecer alguns aspectos relativos à pouca fidedignidade dos registros de acidentes do trabalho típicos no município 1, 2 . Um dos estudos 1, realizado a partir dos casos registrados junto à agência local do INSS, no período de 1995 a 1999, baseado nas informações contidas nas CAT, revelou diferenças estatisticamente significantes no tempo de afastamento previsto para os acidentes típicos registrados por grandes empresas quando comparado com o tempo previsto para os notificados por micro e pequenas empresas. Nestas últimas, o tempo médio de afastamento previsto foi o dobro do das primeiras. Esse dado foi considerado pelos autores como forte indício de sub-registro de acidentes de menor gravidade por micro e pequenas empresas do município estudado. O segundo estudo 2, realizado por meio de entrevistas domiciliares, utilizando amostra de moradores de 4.782 dos 33.900 domicílios existentes no município, possibilitou estimar em 1.810 o número de acidentes do trabalho (típicos e de trajeto) ocorridos em 1997. Em relação aos casos com obrigatoriedade de emissão de CAT (49%), menos da metade haviam sido registrados junto ao INSS. No geral, os resultados revelaram que os registros previdenciários captaram 22,4% dos acidentes do trabalho. Embora restritos ao município de Botucatu – SP, tais resultados levam a concluir que a utilização de outras fontes de informação, além das CAT, é imprescindível para tornar as estatísticas brasileiras de acidentes do trabalho mais fidedignas.

O gráfico 1 apresenta a evolução da incidência de AT no Brasil de 1970 a 2006. O valor mais elevado ocorreu em 1972, com 181,5 casos / 1.000 empregados segurados, declinando progressivamente nos anos seguintes, com pequena oscilação para cima em no início dos anos 80. As setas inseridas no gráfico indicam modificações na legislação previdenciária e na organização da assistência médica aos acidentados do trabalho.

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GRÁFICO 1 - INCIDÊNCIA DE ACIDENTES DO TRABALHO TÍPICOS POR 1000 TRABALHADORES NO

BRASIL DE 1970 A 2006

(1) 1973 - Decreto 71.885 de 9 de março de 1973 regulamentando a Lei 5.859 de 1972, passando a incluir autônomos e empregados doméstidos na Previdência Social (população segurada, incluída no denominador sem possibilidade de inclusão no numerador, uma vez que não são cobertos pelo seguro acidente); (2) 1975 - Plano de Pronta Ação do INSS (intensificação dos convênios com empresas e da delegação a estas para efetuar procedimentos até então de competência exclusiva da Previdência Social, como concessão de benefícios previdenciários e acidentários, realização de perícias médicas e concessão de licenças); (3) 1976 - Lei Nº 6.367 transfere para o empregador a responsabilidade de pagamento pelos primeiros 15 dias de afastamento do trabalho; (4) década de 80 – progressivamente acidentados são atendidos na rede pública de saúde; (5) 1988 – extinção do pagamento diferenciado à rede privada pelo atendimento aos acidentados do trabalho; (6) 1991 - Lei nº. 8.213 de Benefícios da Previdência Social, garantindo um ano de estabilidade no emprego a partir do fim do recebimento de benefício acidentário; (7) 1994: Extinção do pagamento de pecúlio em caso de invalidez permanente e de óbito por acidente do trabalho

Em relação à estabilidade no emprego a partir da Lei nº 8213, nossa prática tem revelado que alguns trabalhadores de empresas possuidoras de Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho, apresentando lesões que requerem afastamentos longos (fraturas, amputações) são afastados por 15 dias, voltam à empresa onde “trabalham” um ou dois dias para, a seguir serem novamente afastados. Isso constitui estratégia das empresas para driblar a estabilidade dos trabalhadores pós benefício acidentário.

Em anos recentes, Ribeiro 3 e Wünsch Filho 4, analisando a evolução da incidência de acidentes do trabalho, argumentam que, tanto as já mencionadas mudanças na legislação, quanto o sub-registro, não são suficientes para explicar a persistência do declínio observado nas últimas décadas. Segundo esses autores, o declínio é real e não apenas aparente. Introdução de novas tecnologias, processos de re-estruturação produtiva, retração do setor secundário com concomitante expansão do setor terciário da economia são fatores que explicariam a redução real na incidência de acidentes do trabalho.

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Wünsch Filho4, analisando o período de 1975 a 1995, assinala também a existência de relações entre o nível de atividade econômica e a incidência de acidentes do trabalho. Para esse autor, a falta de informações relativas ao setor informal da economia limita de maneira importante o conhecimento da extensão dos acidentes do trabalho no país. Essa ausência de informações ficou evidenciada no estudo efetuado em amostra populacional, em Botucatu - SP 2, segundo o qual, 51% dos acidentes detectados ocorreram em trabalhadores informais ou não abrangidos pelo seguro acidentário e, em relação aos acidentados com obrigatoriedade de emissão de CAT, menos da metade dos casos haviam sido registrados junto à Previdência Social. A precarização do trabalho representada pelos contratos temporários e pelo crescimento do mercado de trabalho informal, com diminuição do número de assalariados segurados junto à Previdência Social é preocupante, pois esses trabalhadores sabidamente são submetidos a piores condições de trabalho, correndo maiores riscos de adoecer e de acidentar-se no trabalho em comparação com os inseridos no mercado formal.

Estudos analisando a mortalidade por acidentes do trabalho têm mostrado aspecto importante relacionado ao local de ocorrência dos óbitos: em espaços da empresa ou em espaços externos a ela. Machado 5, no município do Rio de Janeiro em 1987-1988, observou que 395 (79%) dos 500 óbitos analisados ocorreram em espaços externos à empresas, ou “espaço da rua”.

Pesquisa sobre acidentes do trabalho fatais realizada em municípios da região de Campinas 6 revelou que acidentes de trânsito envolvendo veículos motorizados e homicídios foram as principais causas externas dos óbitos no período de 1979 a 1989.

Gawryszewski et al.7, analisando 540 acidentes fatais no Estado de São Paulo, em 1995, observaram que apenas 28,7% haviam ocorrido nos ambientes de trabalho das empresas, enquanto 69,4% haviam ocorrido em espaços externos às empresas, sendo que 29,3% foram constituídos por acidentes do trabalho típicos ocorridos no trânsito, 24,5% por acidentes de trajeto e 15,9%, por homicídios. Os autores chamam a atenção para o fato de mais de dois terços dos acidentes fatais estarem ocorrendo fora dos espaços das empresas, mudança da realidade que precisa ser considerada e estudada em maior profundidade, pois as medidas de prevenção são diferenciadas, de acordo com o tipo de acidente.

No tocante aos acidentes de trânsito, melhoria das condições da malha viária, melhoria de itens relacionados à segurança dos veículos, construção de ciclovias, melhoria da educação para o trânsito de condutores e de pedestres e aumento da fiscalização, dentre outras, são medidas indicadas para prevenir esses eventos. Já os homicídios, cujo aumento tem sido considerado alarmante por vários autores8, 9, 10, 11, 12, configurando verdadeira epidemia, e que apresenta determinantes econômicos, sociais, políticos e culturais, exige resposta social organizada, que conduza a decisões políticas capazes de operar mudanças econômicas e sociais, e à superação das graves contradições existentes no país. Mello Jorge13 assinala algumas limitações das declarações de óbito: registro de natureza da lesão, ao invés de causa externa, diferentemente do preconizado, o que somado ao não preenchimento do campo específico sobre tratar-se ou não de acidente do trabalho, impede a identificação do óbito como tal, quando este for o caso. Já em relação a acidentes de trânsito, Ladeira e Guimarães14, estudaram óbitos ocorridos em hospitais de Belo Horizonte, comparando a causa básica - no caso, causa externa - registrada nas declarações de óbito com as obtidas por meio de questionário. Esses autores constataram a existência de elevado percentual de casos de acidentes não especificados nas declarações de óbito, e no geral, perda de informação acerca dos acidentes e das vítimas em 70% dos casos, ressaltando tratar-se de preenchimento deficiente por parte de médicos legistas. Os autores enfatizam a importância de estratégias visando melhorar a qualidade das informações. Em 1992, em Porto Alegre, Barros de Oliveira e Mendes15, a partir das Declarações de Óbito, investigaram amostra composta por 159 casos classificados como decorrentes de causas

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externas, por meio de entrevista com os familiares. Destes, 31 (19,4%) relacionavam-se ao trabalho, segundo o resultado das entrevistas, dos quais, apenas 6 (20%) haviam sido registrados como tal nas declarações de óbito. Em relação às causas externas, dos 31 óbitos, 14 foram homicídios; 4, assalto com morte; 9, atropelamento ou colisão e 4, classificados como outras causas (esmagamento por máquina, choque elétrico, carbonização e afogamento). Os dados desses autores15 revelaram que 55% dos trabalhadores mortos estavam inseridos no mercado formal de trabalho, porém, a maioria (64,7%) não se enquadrava na obrigatoriedade de emissão de CAT por não serem abrangidos pelo seguro acidentário. Revelaram também que 45% dos óbitos corresponderam a trabalhadores do mercado informal, incluindo neste, a execução de atividades ilegais. Ficou claro o papel da violência urbana na ocorrência de óbitos relacionados ao trabalho, uma vez que 87% dos casos ocorreram no espaço da rua. Os autores afirmam ser “necessária a urgente revisão do conceito de óbito por acidente de trabalho, de modo a incluir todas as situações de risco oriundas do trabalho”. Como recomendações, assinalam “a solução não está restrita às ações dos setores saúde e trabalho, mas implica necessariamente a adoção de uma política de segurança pública, de segurança no trânsito, de articulação com o judiciário, incluindo, necessariamente, a educação. Implica ainda a implementação de políticas de emprego, de moradia, de transporte e de redistribuição de renda, entre outras” 15. Pinheiro16, abordando a Vigilância em Saúde do Trabalhador - VISAT - no Sistema Único de Saúde, considera-a “prática emergente, complexa, heterogênea, inacabada e fundamentalmente conflitiva”. Para esse autor, seu objeto “é em última instância a vigilância dos processos de trabalho, de seus determinantes e de seus impactos (positivos e negativos) e dos procedimentos adotados diante das relações conflitivas capital-trabalho na sua ralação como a saúde dos trabalhadores”. Assim as tensões e os conflitos nas diversas esferas de governo, que têm sido observados durante a implantação dessa vigilância, são estruturais, na medida em que se trata de disputa sobre quem “detém a propriedade e o poder sobre os destinos dos processos de trabalho”. Os achados relativos à distribuição espacial das mortes por acidentes do trabalho põem em evidência a necessidade do desenvolvimento de novos estudos acerca dos acidentes que ocorrem no espaço da rua e de estratégias de prevenção organizadas de modo interdisciplinar e inter-institucional. Nessas condições, cabe abordar a importância dos sistemas de registros e de análise dos acidentes do trabalho que, de acordo com Freitag e Hale 17, trata-se de processo que apresenta etapas distintas:

a) detecção (reconhecimento e registro); b) seleção do tipo de eventos para análise, e posterior descrição detalhada e estudo

aprofundado; c) classificação de causas organizacionais; d) reconhecimento de padrões ou prioridades e) interpretação dos resultados e elaboração de recomendações; f) implementação de monitoramento. Na situação brasileira, como se tentou mostrar, ainda não atingimos de modo satisfatório a

fase inicial, de reconhecimento e registro. Numa perspectiva otimista, pode-se considerar que os sistemas de registro oficiais captam cerca de um quarto dos acidentes. Afinal, quais os eventos a serem detectados? Se o objetivo do sistema é a avaliação do impacto do trabalho sobre a saúde da população brasileira, é necessário considerar todos os acidentes do trabalho sem filtros, como o da vinculação ao seguro previdenciário acidentário, critério adotado para registro das comunicações de acidentes de trabalho junto à Previdência Social. Além disso, a definição adotada deve ser uniforme em todo o território coberto pelo sistema.

Outro aspecto de crucial importância refere-se à necessidade de utilização de outras fontes de informação além das CAT, ou seja, declarações de óbito, boletins de ocorrência policiais, registros de atendimentos de urgência e de emergência, internações hospitalares, de consultas

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ambulatoriais. No caso das declarações de óbitos, é crucial que se desenvolvam esforços visando a melhoria de seu preenchimento e a qualidade das informações que contêm.

Cabe mencionar duas tentativas de melhorar os registros dos acidentes do trabalho: a primeira, tornando compulsória a notificação de acidentes do trabalho e de doenças profissionais no país, representada pela Resolução Ciplan nº 23, de 1989 que, entretanto nunca foi posta em prática. A segunda, no âmbito do Estado de São Paulo, representada pela Resolução SS-60, de 17 de fevereiro de 1992 (Diário Oficial do Estado, 18/02/1992, p 13), tornando compulsória a notificação de acidentes do trabalho e adotando o mesmo documento utilizado pela Previdência Social, isto é, a comunicação de acidente do trabalho como instrumento de notificação. Também nesse Estado tal resolução vem sendo sistematicamente ignorada.

Em por último, em 28 de abril de 2004, a Portaria nº 777 do Ministério da Saúde regulamentou a notificação compulsória de agravos à saúde do trabalhador - acidentes e doenças relacionados ao trabalho estabelecendo como agravos de notificação compulsória os acidentes de trabalho fatais, com mutilações, com exposição a material biológico e de crianças e adolescentes, além de algumas doenças (dermatoses, intoxicações exógenais, LER/DORT, pneumoconioses, .perdas auditivas induzidas por ruído, transtornos mentais relacionados ao trabalho e câncer relacionado ao trabalho. Esses agravos devem seguir o fluxo do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). Apesar dos esforços dos esforços no sentido de superar a carência e a precariedade de dados na área Trabalho - Saúde, pode-se considerar que o Brasil chega ao século XXI com o importante problema de saúde pública, a elevada incidência de acidentes de trabalho, ainda mal dimensionado e mal caracterizado, o que dificulta enormemente o acompanhamento de sua evolução ao longo do tempo e, sobretudo, da avaliação do impacto dos numerosos fatores que sabidamente influem na ocorrência desses fenômenos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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