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Aceleração da convergência do Método das Diferenças Finitas na resolução da equação de Schrödinger unidimensional Luis Antonio da S. Vasconcellos, Gustavo V. B. de Souza, Alexys Bruno-Alfonso Departamento de Matemática – Faculdade de Ciências – UNESP CEP 17033-360, BAURU, SP. E-mail: [email protected], [email protected], [email protected] Palavras-Chave: Equação de Schrödinger, Diferenças Finitas, Extrapolação de Richardson. Resumo: Nos marcos da Mecânica Quântica não relativista, a equação de Schrödinger independente do tempo é satisfeita pela parte espacial dos estados estacionários de todo sistema físico. Trata-se de uma equação diferencial linear de segunda ordem cujas soluções analíticas são conhecidas para poucos sistemas físicos como, por exemplo, a partícula livre, o oscilador harmônico e o átomo de hidrogênio. Portanto, na investigação de grande parte dos sistemas físicos de interesse, faz-se necessária a aplicação de métodos numéricos. Neste trabalho, a equação de Schrödinger independente do tempo é resolvida para uma partícula livre numa caixa unidimensional, mediante o método de diferenças finitas. A atenção é centrada no menor autovalor da equação e sua convergência na medida em que o número de divisões do intervalo aumenta. Para acelerar a convergência do autovalor, é utilizado o método de extrapolação de Richardson. Aproveitando o conhecimento da solução analítica, é realizada a análise da eficácia desse método. 1 – Introdução A equação de Schrödinger é uma das mais importantes equações em Mecânica Quântica. Portanto, ela é muito relevante em Física Atômica e Molecular e na Ciência de Materiais, por exemplo. Infelizmente, devido a sua complexidade, o conhecimento de soluções analíticas está restrito a sistemas simples, como por exemplo, o átomo de hidrogênio. Neste sentido, a obtenção de soluções numéricas com alta ordem de precisão tem se tornado um aliado importante no tratamento problemas que envolvem tal equação. Apesar das grandes conquistas alcançadas, os requisitos como precisão e eficiência de algoritmos numéricos tem crescido junto com a complexidade dos problemas a serem resolvidos [1,2,3]. Dentre as técnicas numéricas, destacam-se os métodos das diferenças finitas (MDF) e dos elementos finitos [4,5]. No caso particular das diferenças finitas, uma ferramenta numérica útil para acelerar a convergência é a extrapolação de Richardson [6]. Neste trabalho, é analisada a convergência da energia do estado básico de uma partícula livre numa caixa unidimensional, quando calculada mediante a combinação do método das diferenças finitas com o método de extrapolação de Richardson. 2- Métodos e Procedimentos Nesta seção é tratada a resolução da equação de Schrödinger independente do tempo para o movimento unidimensional de uma partícula confinada no intervalo L x 0 , livre de outras interações dentro dessa caixa. Neste caso, a função de onda ) ( x ψ e a energia ε satisfazem: = = = - . 0 ) ( ) 0 ( ), ( ) ( " 2 2 L x x m ψ ψ εψ ψ h (1) 206 ISSN 2317-3300

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Aceleração da convergência do Método das Diferenças Finitas na resolução da equação de Schrödinger unidimensional

Luis Antonio da S. Vasconcellos, Gustavo V. B. de Souza, Alexys Bruno-Alfonso

Departamento de Matemática – Faculdade de Ciências – UNESP CEP 17033-360, BAURU, SP.

E-mail: [email protected], [email protected], [email protected]

Palavras-Chave: Equação de Schrödinger, Diferenças Finitas, Extrapolação de Richardson. Resumo: Nos marcos da Mecânica Quântica não relativista, a equação de Schrödinger

independente do tempo é satisfeita pela parte espacial dos estados estacionários de todo sistema

físico. Trata-se de uma equação diferencial linear de segunda ordem cujas soluções analíticas são

conhecidas para poucos sistemas físicos como, por exemplo, a partícula livre, o oscilador

harmônico e o átomo de hidrogênio. Portanto, na investigação de grande parte dos sistemas físicos

de interesse, faz-se necessária a aplicação de métodos numéricos. Neste trabalho, a equação de

Schrödinger independente do tempo é resolvida para uma partícula livre numa caixa

unidimensional, mediante o método de diferenças finitas. A atenção é centrada no menor autovalor

da equação e sua convergência na medida em que o número de divisões do intervalo aumenta.

Para acelerar a convergência do autovalor, é utilizado o método de extrapolação de Richardson.

Aproveitando o conhecimento da solução analítica, é realizada a análise da eficácia desse método.

1 – Introdução

A equação de Schrödinger é uma das mais importantes equações em Mecânica Quântica. Portanto, ela é muito relevante em Física Atômica e Molecular e na Ciência de Materiais, por exemplo. Infelizmente, devido a sua complexidade, o conhecimento de soluções analíticas está restrito a sistemas simples, como por exemplo, o átomo de hidrogênio. Neste sentido, a obtenção de soluções numéricas com alta ordem de precisão tem se tornado um aliado importante no tratamento problemas que envolvem tal equação. Apesar das grandes conquistas alcançadas, os requisitos como precisão e eficiência de algoritmos numéricos tem crescido junto com a complexidade dos problemas a serem resolvidos [1,2,3]. Dentre as técnicas numéricas, destacam-se os métodos das diferenças finitas (MDF) e dos elementos finitos [4,5]. No caso particular das diferenças finitas, uma ferramenta numérica útil para acelerar a convergência é a extrapolação de Richardson [6]. Neste trabalho, é analisada a convergência da energia do estado básico de uma partícula livre numa caixa unidimensional, quando calculada mediante a combinação do método das diferenças finitas com o método de extrapolação de Richardson. 2- Métodos e Procedimentos

Nesta seção é tratada a resolução da equação de Schrödinger independente do tempo para o movimento unidimensional de uma partícula confinada no intervalo Lx ≤≤0 , livre de outras interações dentro dessa caixa. Neste caso, a função de onda )(xψ e a energia ε satisfazem:

==

=−

.0)()0(

),()("2

2

L

xxm

ψψ

εψψh

(1)

206

ISSN 2317-3300

em que h é a constante de Planck reduzida e m é a massa da partícula. Considerando como unidade

comprimento o valor L e como unidade de energia o valor 2

2

02mL

Eh

= , a posição e a energia

adimensionais são L

x=ζ e

0E

E=ε , respectivamente. Além disso, a função de onda adimensional

toma a forma Lxy ).()( ψζ = e satisfaz o sistema:

==

=−

.0)1()0(

),()("

yy

yy ζεζ (2)

Ao aplicar o método de diferenças finitas para resolver (2), é feita uma partição uniforme do

intervalo [0,1] em n partes de comprimento n

1=∆ . Os nós da malha são ∆= .iiζ , com i = 0 (1)

n, e os valores respectivos da função incógnita são )( ii yy ζ= . Além disso, a segunda derivada em

(2) é escrita na forma discretizada [2]:

211 2

)("∆

+−= +− iii

i

yyyy ζ . (3)

Portanto, aplicando a equação (3) nos pontos da malha, obtemos o sistema de equações:

==

==∆

−+− +−

.0

,111 com,2

0

211

n

iiii

yy

) n- ( i yyyy

ε (4)

É importante notar que em (4), os valores de ε são os autovalores da matriz )1()1( −×− nnH ,

cujos elementos têm a forma 2

1,,2

−= ±jiji

ijhδδ

, em que ji,δ representa o delta de Kronecker.

Assim, a energia do estado básico corresponde ao menor dos autovalores da matriz H . Na implementação computacional da diagonalização da matriz H , é utilizado o software Mathematica [7] e são usados diversos valores do número n de divisões do intervalo. Para acelerar a convergência do MDF, é usado o método de extrapolação de Richardson. Em poucas palavras, a idéia é que o valor estimado de ε depende do número de divisões do intervalo segundo

220 ∆+= aaε , (5)

em que 0a e 2a são constantes. A determinação dos valores desses coeficientes é feita mediante um

processo simples de interpolação de um conjunto de pares ),( nn ε∆ . Em particular, 0a é o limite de

ε quando ∆ tende a zero e serve como valor extrapolado do menor autovalor da matriz H . Neste trabalho, a idéia da extrapolação é estendida mediante a proposta da seguinte lei de quarto grau:

44

220 ∆+∆+= aaaε , (6)

em que 0a , 2a e 4a são constantes. Novamente, os valores dos coeficientes são determinados por

interpolação de um conjunto de pares ),( nn ε∆ , e 0a é o valor extrapolado do menor autovalor da

matriz H . 3 – Resultados obtidos Nesta seção são apresentados resultados ilustrativos da aplicação combinada do método de diferenças finitas e o método de extrapolação de Richardson para calcular o estado básico de uma

207

ISSN 2317-3300

partícula que se mexe livremente numa caixa unidimensional. A Tabela 1 mostra os valores do passo δ e do menor autovalor da matriz H para n = 100 (100) 1000. A tabela sugere que o menor

valor converge, quando que n aumenta, ao valor exato ≈= 2* πε 9.869 604 401 089 359. Note-se

que esse autovalor corresponde à energia 2

22

2mLE

πh= .

n1

ε

1001 9.86879

2001 9.8694

3001 9.86951

4001 9.86955

5001 9.86957

6001 9,86958

7001 9.86959

8001 9.86959

9001 9.86959

10001 9.8696

Tabela 1 – Valores do passo n

1=∆ e Tabela 2 – Valores do número de divisões n =100

do menor autovalor para n = 100 (100) 1000. (100) 1000 e da diferença entre o menor autovalor calculado e o valor exato *ε .

Na tabela 2 são apresentados os erros correspondentes a cada valor do número n de divisões. Vale ressaltar que o erro obtido para o maior número de divisões utilizado (1000) é da

ordem de 510− . A figura 1 mostra graficamente os valores na Tabela 1, e sugere que o comportamento parabólico previsto pela teoria de Richardson realmente ocorre [5].

0.000 0.002 0.004 0.006 0.008 0.0109.8686

9.8688

9.8690

9.8692

9.8694

9.8696

9.8698

1�n

Ener

gia

Figura 1 – Menor autovalor da matriz H em função do passo

n1=∆ do MDF.

Na Tabela 3 são mostradas as diferenças entre os pontos da Figura 1 e ajuste quadrático da equação (5), com coeficientes 4508013996049.869 0 =a e 1588987341548.117- 2 =a . O

valor extrapolado pelo método de Richardson é 4508013996049.869 e o erro correspondente é

-1.288×10-9. Vemos que neste caso, o método de Richardson diminui o erro a um fator da ordem de 10 000.

n Erro

100 -0.000811716 200 -0.000202934

300 -0.0000901933 400 -0.0000507338

500 -0.0000324697

600 -0.0000225484

700 -0.0000165662 800 -0.0000126835

900 -0.0000100215

1000 -8.11744 610−×

208

ISSN 2317-3300

n Erro de 2ª ordem

100 0,0000000010381

200 -0,0000000037748

300 -0,0000000013820

400 -0,0000000002721

500 0,0000000002529

600 0,0000000005534

700 0,0000000007551

800 0,0000000008290

900 0,0000000009999

1000 0,0000000010006

Tabela 3 – Erro do ajuste quadrático dos pontos na Tabela 4 – Erro segundo ajuste quártico dos Figura 1 segundo (5). pontos na figura 1 segundo (6). Na Tabela 4 são apresentadas as diferenças entre os pontos da Figura 1 e o ajuste quártico da equação (6), com coeficientes 0630864016049.869 0 =a , 0905296764238.117 2 −=a e

5023839207512.664 4 =a . Desta vez o valor extrapolado é 0630864016049.869 e o novo erro é -3.293×10-12. Assim, a nova extrapolação diminui o erro num fator da ordem de 10 000 000. 4 – Análise de resultados e conclusão

A energia do estado básico de uma partícula numa caixa unidimensional foi calculada pelo método de diferenças finitas, para vários valores do número de divisões do intervalo. O número

máximo de divisões utilizado foi de 1000, e o erro correspondente é da ordem de 510− . Quando o

método de extrapolação de Richardson de 2ª ordem é usado o erro é da ordem de 910− . Além disso,

quando um termo de 4ª ordem é adicionado, a extrapolação gera um erro da ordem de 1210− . Conclui-se que esse método de extrapolação pode acelerar significativamente a convergência do método de diferenças finitas e que modificações do método podem contribuir ainda mais para a aceleração. O problema abordado é o mais simples da Mecânica Quântica, mas permite ilustrar e aprimorar o conhecimento de métodos poderosos da Análise Numérica. Dessa maneira, o trabalho serve de base e complemento para a investigação de sistemas de várias partículas. 5 - Referências [1] A.G Abrashkevich, D.G. Abrashkevich, “Finite-Difference solution of the coupled-channel Schrödinger equation using Richardson extrapolation”, Computer Physics Communications 82, p. 193-208, 1994. [2] Marcos M. Almeida, Marcílio N. Guimarães, Frederico V. Prudente, “Sobre o confinamento espacial de sistemas quânticos: o oscilador harmônico unidimensional e o átomo de hidrogênio”, Physics Act., 2007. [3] Richard L. Burden e J. Douglas Faires, “Análise Numérica”, Ed. Cengage Learning, 2008. [4] M. K. Jain, S. R. K. Iyengar, R. K. Jain, “Numerical Methods for Scientific and Engineering Computation, Ed. John Wiley & Sons, 1985. [5] Hong-Lin Liao, Zhi-Zhong Sun and Han-Sheng Shi, “Error estimate of four-order compact scheme for linear Schrödinger equations”, Siam J, Numer. Anal., v. 47, nº6, p. 4381-4401, 2010. [6] Ruben Specogna, Francesco Trevisan, “A discrete geometric approach to solving time independent Schrödinger equation”, Journal of Computational Physics, 230, p. 1370-1381, 2011. [7] http://www.wolfram.com.

n Erro de 4ª ordem

100 0,000000026648

200 0,000000001664

300 0,000000000322

400 0,000000000124

500 0,000000000044

600 0,000000000016

700 0,000000000019

800 -0,000000000035

900 0,000000000047

1000 -0,000000000015

209

ISSN 2317-3300