ação civil pública contra loteamentos irregulares

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 Ação civil pública contra loteamentos irregulares Amilton Plácido da Rosa | André Puccinelli Júnior Elaborado em 12/1998. Página 1 de 2 » Desativar Realce  a A Ação civil pública, promovida pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul, contra uma cooperativa habitacional e seus dirigentes. A dita cooperativa vendeu imóveis em um loteamento a terceiros, omitindo a existência de hipoteca em favor da Caixa Econômica Federal. E o pior: que, em virtude de débitos entre a cooperativa e o credor da hipoteca, esta já estava sendo executada, estando penhorados os imóveis alienados. Diversas outras irregularidades foram encontradas, desde irregularidades na natureza da constituição da cooperativa, até a falta de obras de infra-estrutura no loteamento. PROMOTORIA DE JUSTIÇA DO CONSUMIDOR COMARCA DE CAMPO GRANDE  O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul , ora representad o pelo Promotor de Justiça do Consumidor desta comarca, que ao final subscreve e que recebe as intimações, pessoalme nte, na Rua Íria Loureiro Viana, 415, Vila Oriente, nesta – com fundament o no artigo 129, III da Constituição Federal, somado aos artigos 1º, II; 2º, 3º, 5º, "caput"; 11, 12, da Lei 7.347, de 24.07.85, que disciplina a Ação Civil Pública, e, ainda, nos artigos 6º, VI; 81, parágrafo único e incis os I e II; 82, I; 83, 84, "caput" e  parágrafos 3º e 4º; 90 e 91 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 11.09.90) e ancorado nos fatos apurados no Procedimento Administrativo 013/95, em anexo – propõe a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA de obrigação de fazer e de não fazer, com pedido de concessão de liminar, em face de:  1) COOPERATIVA HABITACIONAL DOS SUBTENENTES E SARGENTOS DAS FORÇAS ARMADAS LTDA.  COOPHAUNIÃO, inscrita no CGC/MF sob n.º 15.470.156/0001--03, com sede à Avenida Afonso Pena n.º 1974, térreo, sala 12, nesta cidade de Campo Grande-MS;  2) AUGUSTO PIRES GONÇALVES, diretor presidente da COOPHAUNIÃO nas gestões de 91/93, de 94/96 e no mandato atual , brasileiro, casado, servidor público federal, portador da cédula de identidade n.º 010.216 SSP/MS e do CPF n.º 298.026.101-78, residente na Rua Dom Aquino n.º 110, Bairro Amambaí, nesta capital,

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Ação civil pública contra loteamentosirregulares

Amilton Plácido da Rosa | André Puccinelli Júnior 

Elaborado em 12/1998.

Página 1 de 2»

Desativar Realce a A

Ação civil pública, promovida pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul, contrauma cooperativa habitacional e seus dirigentes. A dita cooperativa vendeu imóveis emum loteamento a terceiros, omitindo a existência de hipoteca em favor da CaixaEconômica Federal. E o pior: que, em virtude de débitos entre a cooperativa e o credor da hipoteca, esta já estava sendo executada, estando penhorados os imóveis alienados.Diversas outras irregularidades foram encontradas, desde irregularidades na natureza daconstituição da cooperativa, até a falta de obras de infra-estrutura no loteamento.

PROMOTORIA DE JUSTIÇA DO CONSUMIDOR COMARCA DE CAMPO GRANDE

  O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, ora representado peloPromotor de Justiça do Consumidor desta comarca, que ao final subscreve e que recebe

as intimações, pessoalmente, na Rua Íria Loureiro Viana, 415, Vila Oriente, nesta – comfundamento no artigo 129, III da Constituição Federal, somado aos artigos 1º, II; 2º, 3º,5º, "caput"; 11, 12, da Lei 7.347, de 24.07.85, que disciplina a Ação Civil Pública, e,ainda, nos artigos 6º, VI; 81, parágrafo único e incisos I e II; 82, I; 83, 84, "caput" e

 parágrafos 3º e 4º; 90 e 91 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de11.09.90) e ancorado nos fatos apurados no Procedimento Administrativo 013/95, emanexo – propõe a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

de obrigação de fazer e de não fazer, com pedido de concessão de liminar, em facede:

  1) COOPERATIVA HABITACIONAL DOS SUBTENENTES ESARGENTOS DAS FORÇAS ARMADAS LTDA. – COOPHAUNIÃO, inscrita noCGC/MF sob n.º 15.470.156/0001--03, com sede à Avenida Afonso Pena n.º 1974,térreo, sala 12, nesta cidade de Campo Grande-MS;

  2) AUGUSTO PIRES GONÇALVES, diretor presidente da COOPHAUNIÃOnas gestões de 91/93, de 94/96 e no mandato atual , brasileiro, casado, servidor públicofederal, portador da cédula de identidade n.º 010.216 SSP/MS e do CPF n.º

298.026.101-78, residente na Rua Dom Aquino n.º 110, Bairro Amambaí, nesta capital,

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  3) AGOSTINHO LOPES PESSOA, diretor administrativo daCOOPHAUNIÃO na gestão 91/93, e diretor financeiro na gestão de 94/96 e no

mandato atual , brasileiro, profissão e estado civil ignorados, residente e domiciliado naRua Diogo José de Souza nº 203, Jardim Monte Líbano, CEP 79030-004, telefone 984-0805;

  4) LUIZ CARLOS SCHELL STAND, diretor financeiro da COOPHAUNIÃOna gestão 91/93, brasileiro, profissão e estado civil ignorados, residente e domiciliadona Rua Evaristo de Moraes nº 133, Bairro Santo Amaro;

  5) ARINO BRITES, diretor administrativo da COOPHAUNIÃO na gestão de

94/96 e no mandato atual , brasileiro, profissão e estado civil ignorados, residente edomiciliado na Avenida Tiradentes nº 556, Bairro Taverópolis, CEP 79090-000;

Instaurou-se, na Promotoria de Justiça do Consumidor, em desfavor da Cooperativa ré,em 22 de outubro de 1997, o Procedimento Administrativo registrado sob o n.º 022/97,com fim de se apurar a existência de irregularidades no processo de alienação de lotes eunidades residenciais no loteamento do Parque Residencial União, bem como a nãosatisfação do compromisso contratual referente a feitura das obras de infra-estrutura doloteamento, além da omissão de informações aos adquirentes de terrenos sobre ahipoteca da área em favor da Caixa Econômica Federal, bem como a existência deexecução e penhora promovidas por este agente financeiro, em razão doinadimplemento da reclamada.

Consoante se depreende do art. 5º de seu Estatuto, a Cooperativa foi fundada em

02.04.1981, sem fins lucrativos, com o objetivo social de promover a construção deunidades residenciais para seus associados.

Entretanto, ela não se limitou apenas a prover as necessidades habitacionais de seusassociados, expandindo o programa de construção e comercialização a terceirosnão integrantes deste grupo, que ficaram sumamente prejudicados com a atuação daré, posto que tudo que era decidido pela Cooperativa os consumidores não cooperadosnão ficavam sabendo, uma vez que sequer eram convocados para as reuniões, o que lhestrouxe prejuízos enormes.

Com o fim de dar cumprimento ao objetivo social, a ré adquiriu uma área de 691.380,00

m2, situada nesta capital, dando-se início assim à edificação de casas nos loteamentosdenominados "Parque Residencial União I" e "Parque Residencial União II" e "ParqueResidencial União III".

Para concretizar a compra desta área, a Cooperativa contraiu um vultoso empréstimo junto a Caixa Econômica Federal no ano de 1982, dando como garantia hipotecáriado débito o terreno adquirido e as unidades habitacionais que seriam construídas.

Em decorrência da inadimplência da Cooperativa, que não solveu as obrigaçõesassumidas por ocasião do empréstimo contraído para a aquisição dos lotes, a CaixaEconômica Federal impetrou uma ação de execução hipotecária em 1993, tendo

penhorado, em 24 de novembro de 1994, todos os lotes e unidades habitacionaisexistentes na área abrangida pelo gravame.

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 No afã de obter recursos e dar execução ao plano de habitação, a Cooperativa passou acomercializar os lotes individuais sem alertar os consumidores a respeito da existênciado ônus hipotecário e de que a coisa era litigiosa e que sobre a mesma já havia penhora,omitindo assim informações essenciais, que certamente inviabilizariam a concretizaçãoda avença.

Cumpre ressaltar que a construção e a venda de casas e lotes foram amplamentedivulgadas à coletividade, através de massiva campanha publicitária, não apenas com adistribuição de panfletos, mas também com a inserção de propaganda no rádio e natelevisão. Todavia, em momento algum os representantes da Cooperativa fizerammenção às restrições supramencionadas, ocultando dos consumidores informaçõesimprescindíveis, configurando-se assim o crime de propaganda enganosa previsto noart. 67 do Código de Defesa do Consumidor.

E é bom que se diga, neste contexto, que o material publicitário utilizado não mais seencontra em poder da Cooperativa, em fragrante violação ao disposto no parágrafo

único do art. 36 da Lei 8.078/90, que impõe a conservação deste material por partedaqueles que dele se utilizaram.

Convém consignar, ainda, que, muito embora recebessem mensalmente dosconsumidores as prestações referentes aos lotes alienados, os representantes legais daCooperativa ré não repassaram, como não estão repassando, tais valores à CaixaEconômica Federal, para amortizar a dívida contraída por ocasião do empréstimo,caracterizando, assim, a apropriação indébita, incidindo, deste modo, nas penascominadas pelo art. 168 do Código Penal.

Mesmo após o fracasso da tentativa de acordo judicial com a Caixa Econômica Federal,os seus representantes legais continuaram, por si ou por meio de terceiro, vendendo oslotes aos consumidores sem cientificá-los acerca do estado dos mesmos. Neste diapasão,insta frisar que tanto a venda do imóvel após a hipoteca, como a continuidade daalienação após a penhora procedida na execução movida pela Caixa Econômica Federal,configuram o crime de estelionato previsto no art. 171 do Código Penal. Devem, pois,responder pelo ilícito todos os diretores e agentes da Cooperativa que procederam anegociação dos lotes após a hipoteca (ano de 1982) e a penhora da área (24/11/94), deforma a recompor os prejuízos auferidos pelos mutuários ludibriados.

Em razão da escassez de recursos, apenas os primeiros lotes foram entregues com casas

construídas. O restante passou a ser alienado sem a construção de moradia, consoantedecisão tomada em Assembléia Geral realizada em 04.03.95, comprometendo-se aCooperativa a executar as obras de infra-estrutura do loteamento (demarcação dequadras e lotes, arruamento, cascalhamento das ruas, rede interna de distribuição deágua e rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão). Importa salientar quesomente nesta Assembléia, ou seja, aproximadamente 06 (seis) meses após ter sido

efetuada a penhora dos lotes, o Presidente da Cooperativa resolveu informar àspessoas presentes à reunião sobre a execução impetrada pela CEF, desde 1993, dandoconta da ônus gravado sobre a área.

Cabe esclarecer também que a maioria dos adquirentes, por não serem cooperados, de

nada ficaram sabendo, sobre o que entre quatro paredes foi decidido naquela data.

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Com receio de perder todas as economias investidas para a concretização do "sonho dacasa própria", em decorrência da execução movida pela CEF, muitos mutuáriosdeixaram de repassar para a Cooperativa os valores referentes às prestações dos lotesnegociados, a fim de evitarem mais prejuízos além daqueles já sofridos.

O temor dos mutuários é procedente, posto que Caixa Econômica Federal, com todacerteza, após adjudicar todo o loteamento, que está indo para praça, irá querer receber do consumidor todo o valor correspondente aos lotes vendidos, tanto é verdade queatualmente ela já está se negando fornecer sua anuência para a feitura da escritura

 pública para aqueles que já quitaram o imóvel.

Entretanto, mesmo sem cumprir sua parte, a ré passou a compelir e coagirarbitrariamente o consumidor a fazer-lhe os pagamentos, chegando ao absurdo de, a"manus militari", iniciar a retomada e revenda dos lotes de quem não se dispunha aceder a mais essa manobra fraudulenta da demandada.

Segundo denúncias encaminhadas a este órgão, um dos prepostos da referidaCooperativa, Alceu Cunha, apresentando-se como corretor de imóveis, começou aameaçar todos os consumidores em atraso, alegando que iria retomar os lotes e revendê-los a terceiro interessado, o que efetivamente fez e vem fazendo em relação a muitoscontratantes.

De acordo com as denúncias, Alceu Cunha tem retomado inúmeros lotes de mutuários"inadimplentes" sem qualquer autorização judicial, alienando-os a terceiros sem aomenos deter a propriedade dos referidos imóveis e sem lhes informar a real situação doimóvel. Houve até casos de o mesmo lote ser vendido simultaneamente a mais de uma

 pessoa.Cumpre ainda acrescentar que, segundo a denúncia, Alceu Cunha, embora alegasse ser corretor de imóveis, não estava credenciado no CREA/MS na época em que fezinúmeras retomadas e vendas dos lotes, o que tipifica a contravenção de exercício ilegalda profissão, isso sem prejuízo da prática dos crimes de estelionato e de informaçãoenganosa, por omissão.

Por esses motivos os adquirentes dos lotes que ainda não pagaram o valor integral estãocom receio de continuarem a pagar as demais prestações. Devido a essa situação de"inadimplência", a Cooperativa vem enviando notificações aos mutuários e os

ameaçando do cancelamento do contrato, caso não façam a renegociação dosrespectivos débitos.

Ao se dirigirem à Cooperativa para a renegociação, os mutuários são obrigados afirmarem novo contrato, e a aceitarem inúmeras cláusulas leoninas ali inseridas,sem respeito ao que fora pactuado quando da realização do negócio, tolhendo assima autonomia volitiva do consumidor que, na maioria dos casos, já cumpriu com boa

 parte de sua obrigação, mas que não é levado em conta na nova avença.

Devido à constrição judicial que recai sobre a área onde se encontra localizado oloteamento residencial, hoje, os compradores dos lotes estão vivendo sob a ameaça de

 perderem seus imóveis, além de estarem preocupados com a perda das importânciascorrespondentes às parcelas que já pagaram. Destarte, percebe-se de pronto a gravidade

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da situação, que urge uma providência imediata e eficaz por parte dos órgãos públicos, principalmente do Poder Judiciário.

Como se não bastassem as irregularidades acima apontadas, a Cooperativas cobrou erecebeu todos os valores referentes às obras de infra-estrutura, sem no entanto promovê-

las, o que caracteriza, mais uma vez, a apropriação indébita dos valores pagos a essetítulo pelos consumidores.

Para destacar um dos problemas graves que vêm sofrendo os moradores do ParqueResidencial União II em face da não realização das obras prometidas, basta dizer quenaquele loteamento não entra sequer ônibus, posto que as ruas estão, como sempreestiveram, em situação precária, não proporcionando qualquer condição detrafegabilidade.

Cabe lembrar, finalmente, que, em razão de todos os comportamentos criminososdescritos, o Ministério Público requisitou a instauração do competente inquérito policial

 para que as apurações devidas sejam feitas.

Apesar de todos os esforços envidados por este órgão ministerial, a Cooperativaesquivou-se às responsabilidades que lhe são próprias, não restando outra alternativasenão a interposição desta "actio" .

II) DO DIREITO:

A presente "actio" visa assegurar a proteção de direitos de consumidores que foram e

virão a ser lesados em razão de relações de compra e venda celebradas com aCooperativa Habitacional dos Subtenentes e Sargentos das Forças Armadas Ltda. -COOPHAUNIÃO, os quais estão sendo e virão a ser violados pela inobservância dosimperativos legais, prática de crime de propaganda enganosa, apropriação indébita eestelionato, além da adoção de várias outras práticas abusivas por parte dos prepostos ediretores desta Cooperativa, gerando inúmeros e incalculáveis prejuízos aosconsumidores.

Visa, outrossim, à reparação dos danos patrimoniais e morais causados a todos osconsumidores que já efetuaram a aquisição dos lotes individuais ofertados pelaCooperativa, os quais encontram-se aguardando a realização da praça, em razão da

execução hipotecária movido pela CEF e devido também ao fato de que a ré nãorealizou no bairro as obras de infra-estrutura devidas.

Atualmente, há uma gama enorme de mutuários que possuem alguma relação jurídicafirmada com a Cooperativa (a ré é responsável pela venda de todos os lotes individuaisque compõem o conjunto habitacional denominado Parque Residencial União II, não sesabendo precisar ao certo qual o número de consumidores que adquiriram lotesindividuais, ou estabeleceram qualquer outro vínculo com a Cooperativa, considerandonesse número os que ainda lá estão e os que foram dela expulsos, a manus militari,

 pelos representantes e prepostos da reclamada). No futuro, a continuar como está, outrostantos consumidores hão de ser burlados, sendo impossível, de antemão, determinar taluniverso.

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 No tocante à enorme massa de consumidores que, no futuro, poderão vir a firmacompromisso com a ré, caso não seja tomada uma providência enérgica e imediata emrelação aos fatos aqui narrados, pode-se falar em tutela de interesses ou direitostransindividuais, de natureza indivisível, de que são titulares pessoas indeterminadas eligadas pela circunstância fática de consumo. O CDC os denomina de interesses ou

direitos difusos (artigo 81, parágrafo único, inciso I).

Frise-se, outrossim, que a propaganda enganosa veiculada com omissão de informaçõesessenciais à conclusão do negócio jurídico, insere-se no rol de interesses difusos, postoque a publicidade foi amplamente divulgada na sociedade, através de inserções no rádioe na televisão, bem como com a distribuição de panfletos publicitários, atingindo acomunidade como um todo. Vê-se, pois, que face a dispersão da lesão, torna-seimpossível especificar as pessoas lesadas, por abranger um grupo indeterminado eindeterminável.

Com relação ao universo de pessoas que já adquiriram lotes individuais da demandada e

não tiveram as obras de infra-estrutura atendidas, pode-se falar na defesa de interessesou direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que é titular um grupo oucategoria de pessoas, que o Código de Defesa do Consumidor denomina de interessesou direitos coletivos (artigo 81, parágrafo único, inciso II), já que não será possívelconstruir individualmente a requerida benfeitoria. Assim, realizada para um, por exemplo, a rede de energia, todos do bairro serão beneficiado, não tendo como cindir em partes autônomas esse direito.

Por fim, quanto à reparação dos danos causados individualmente a todos os moradores, principalmente àqueles cujos imóveis foram retomados arbitrariamente pelaCooperativa e alienados a terceiros, sem que houvesse ordem judicial para tanto e semque fosse efetuada a devolução das prestações pagas, a ação se dirige à tutela coletivados chamados interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos osdecorrentes de origem comum, nos termos do artigo 81, parágrafo único, inciso III, doCódigo de Defesa do Consumidor.

 Neste diapasão, insta frisar que mesmo que a lide versasse tão somente sobre taisinteresses, ainda assim o autor possuiria legitimidade ativa para ingressar em juízo, exvi do que dispõe o artigo 81, inciso III, c/c o artigo 82, inciso I, da Lei nº 8.078/90(Código de Defesa do Consumidor), onde é atribuída ao "Parquet" legitimação para adefesa dos interesses ou direitos individuais homogêneos do consumidor.

Ainda no âmbito deste Diploma Legal, convém ressaltar que o art. 91 prescreve que "oslegitimados de que trata o art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse dasvítimas ou seus sucessores, ação coletiva de responsabilidade pelos danosindividualmente sofridos (...)".

 Neste sentido pontifica a insigne ADA PELIGRINI GRINOVER:

"Trata-se de ação específica em defesa de interesses individuais homogêneos, qual seja,a reparação dos danos individualmente sofridos pelas vítimas ou seus sucessores, umadas espécies a que se refere o artigo 81, III, do Código, sob a denominação de ações

coletivas para a defesa de interesses individuais homogêneos".

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À toda evidência o Ministério Público ostenta todas as condições para integrar o póloativo da ação, porquanto, cumpre-lhe, enquanto fiscal da lei e titular da ação civil

 pública, primar pelo equilíbrio nas relações de consumo, resguardando interessesdifusos, coletivos e individuais homogêneos. Cuida-se de uma atribuição fixada por normas cogentes, de ordem pública e instituídas em prol do interesse social, consoante

se depreende do artigo 1º da Lei 8.078/90.

Ora, a presente "actio" tem como cerne a proteção aos consumidores que vêem-seesbulhados em seus direitos, em razão das práticas abusivas adotadas pela Cooperativa,cujas conseqüências nefastas propagam-se em progressão geométrica, culminando por repercutir na esfera patrimonial de pessoas que em nada contribuíram para a prática doevento danoso. Há, portanto, pertinência subjetiva nesta lide.

Uma coisa seria propugnar em defesa de meia dúzia de pessoas, cujos interessesdisponíveis excedem a órbita de atuação do Ministério Público. Nesse caso, não haveriaexpressão social para justificar a iniciativa ministerial. Coisa diversa, porém, seria negar 

a priori a possibilidade do Parquet ingressar em juízo, com a competente ação civil pública, para expungir as máculas advindas de um comportamento absolutamentecensurável. Trata-se, aliás, de se atender a um anseio popular, posto que, em temposhodiernos, são várias as vítimas lesadas através destas práticas.

A Constituição Federal exalça, em seu art. 129, inciso III, legitimidade ao MinistérioPúblico para

"promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio públicoe social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos" (grifo do autor).

Corroborando a legitimidade deste órgão ministerial, a Lei 7.347/85 determina oajuizamento de ação civil pública para a prevenção ou reparação dos danos causados aoconsumidor, em decorrência de violação de interesses ou direitos difusos e coletivos (v.Artigos 1o, II e IV, 5º, " caput", e 21, todos inclusos na Lei da Ação Civil Pública,aludida em epígrafe).

Convém ressaltar que o Estado preocupado com a vulnerabilidade e hipossuficiência doconsumidor, elevou sua defesa em nível constitucional, tentando minimizar adisparidade evidenciada no grosso das relações de consumo.

Outrossim, não destoam nossos pretórios quanto a solução dada à matéria em feitosdeste gênero. Como se infere dos julgados abaixo colacionados, várias são asorientações jurisprudenciais no sentido de legitimar o Ministério Público para ainterposição de ações como a presente:

"MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA ANULADA.

O Ministério Público está legitimado extraordinariamente para aforar ação civil pública, podendo exercitá-la em caso de defesa dos interesses e direitos individuais homogêneos,decorrendo essa legitimidade da disposição da CF, da própria Lei da Ação Civil Públicae do Código de Defesa do Consumidor." (AC, B-XXI, 39.316-8. Rio Verde de MT. Rel.

Des. Joenildo de Souza Chaves. 2a Turma Cível Isolada. Unânime. J. 25-04-95. DJ-MS,09-06-95, pág. 05).

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"LEGITIMIDADE ATIVA DO MP - CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS -INTERMEDIAÇÃO DE IMÓVEIS PARA A LOCAÇÃO - CDC.

Ementa: O Ministério Público tem legitimidade ativa para propor ação visando anulidade de cláusula de contrato de adesão. (Ac. Da 5ª Câm. Cív. Do TARS - ApCiv

195.136.106 - rel. Juiz Rui Portanova - 08.08.1996 - v.u.)"

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUTOR MINISTÉRIO PÚBLICO.PRELIMINAR DE FALTA DE LEGITIMIDADE, REJEITADA. DEFESA DEINTERESSES COLETIVOS.

O MP tem legitimidade processual para mover ação civil pública em defesa dosinteresses coletivos". (AC, B-XXI, 38.474-1. Dourados. Rel. Des. Alécio AntônioTamiozzo. 1a Turma Cível Isolada. Unânime. J. 20-12-94. DJ-MS, 23-03-95, pág. 06).

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE

ATIVA. MINISTÉRIO PÚBLICO. DEFESA DOS INTERESSES COLETIVOS.LIMINAR. PRESSUPOSTOS PRESENTES. IMPROVIDO.

O Ministério Público, a teor do disposto nos artigos 81, 82, 83 e 90, todos do Código deDefesa do Consumidor, tem legitimidade ativa para defender em juízo os interesses deum grupo de consumidores". (Ag. I, B-XXI, 36.014-7. Campo Grande. Rel. Des. LuizCarlos Santini. 3a Turma Cível. Unânime. J. 09-02-94. DJ-MS, 15-04-94, pág. 05).

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Propositura pelo Ministério Público. Defesa dos direitosindividuais homogêneos. Admissibilidade. Inteligência dos artigos 81, III e 82 do

CDC". (TJGO - RT 707/125)."APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Recursos não conhecidos.Intempestividade. Preliminares de Ilegitimidade ativa do Ministério Público,ilegitimidade passiva e incompetência absoluta. Rejeitadas. ICMS. Energia Elétrica.Incidência. Imposto que integra sua base de cálculo. Art. 18 da Lei 904/88 e 32 do Dec.5.880/91. Inconstitucionalidade afastada. Pretensão inicial improcedente. Recursos

 providos.

O Ministério Público tem legitimidade para promover a defesa de valores da sociedade,entre eles os interesses dos consumidores, por meio de ação civil pública". (AC, B-XXI,

39.715-1. Três Lagoas. Rel. Des. Joenildo de Sousa Chaves. 2a Turma Cível Isolada.Unânime. J. 05-03-96. DJ-MS, 11-04-96, pág. 07).

Com relação à legitimidade do Ministério Público para a tutela de interesses individuaishomogêneos cabe citar aqui, para reforçar os entendimentos acima, decisãointerlocutória proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara de Fazenda Pública e RegistrosPúblicos da Comarca de Campo Grande/MS, Dr. Jorge E. S. Frias, na ação civil

 pública proposta em face da empresa Encol e do Banco Itaú, a saber:

"2. Malgrado a estar o autor procurando defender interesses homogêneos de númerodeterminado de consumidores, malgrado opiniões contrárias, tenho que é ele parte

legítima para a demanda, nos termos do artigo 82, c/c o art. 81, III, ambos da Lei n.

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8.078/90. O desafogamento da máquina judiciária parece ser o melhor argumento afavor de tal legitimação extraordinária" (f. 97 dos autos 96.0015730-8).

Em relação, ainda, ao interesse individual homogêneo, há que se dizer que esse direitose fundamenta na Constituição Federal art. 129, IX, quando dispõe que o Ministério

Público pode "exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveiscom sua finalidade". O interesse social exigido nesse caso se individualiza não só pelogrande número de consumidores que a Cooperativa lesionou com sua publicidadeenganosa e suas práticas abusivas, mas também por esse fato constituir crime previstono Código de Defesa do Consumidor e no Código Penal.

Em relação às práticas criminosas, faz-se necessário abrir um parênteses para reforçar alegitimidade ativa do Ministério Público tendo em vista o interesse público lesado, emvirtude do cometimento de infrações penais. Fácil é demonstrar que em relação aosinteresses individuais homogêneos pode ocorrer, como efetivamente ocorreu no caso emcomento, lesão a direitos públicos indisponíveis.

De acordo com os fatos evidenciados nesta peça, ocorreram, também, como já dito,infrações às normas do Código Penal e do CDC, tanto é verdade que o MinistérioPúblico requisitou a instauração de inquérito policial, para apurar as práticas tidas comocriminosas.

Com efeito, existem provas de que teriam sido veiculadas ofertas enganosas e venda deimóveis gravados de ônus e litigiosos, o que tipifica os crimes previstos nos artigos 66,67, do CDC e 171, "caput" e § 2º, inciso II, do Código Penal, "in verbis":

"art. 66 - Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre anatureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:

Pena - Detenção de três meses a um ano e multa

Art. 67 - Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ouabusiva:

Pena - Detenção de três meses a um ano e multa".

art. 171, "caput" - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio,induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outromeio fraudulento.

(....).

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

(....).

II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada

de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias"

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Desta forma, o interesse prevalente a proteger com a presente ação é, indubitavelmente,o interesse público, maculado que foi pela conduta comercial dos demandados, quandoexecutaram práticas comerciais abusivas e enganosas no mercado de consumo.

Mais ainda fica reforçada a imperiosa atuação do Ministério Público, a fim de que sejam

obedecidos os ditames da "norma-objetivo" do artigo 4º, do CDC, especificamente asregras dos incisos IV, V e VI deste artigo.

Por outro lado, a condenação da empresa nesta ação prevenirá danos e publicidadesenganosas em relação a um número bem maior de consumidores. A dispersão da lesãoestá bem arraigada na sociedade, estando a merecer a atenção do órgão ministerial.

Mero exame perfunctório basta para dimensionar a proporção e a extensão dos danosaveriguados no caso vertente. Indubitavelmente, um contingente enorme deconsumidores foi lesado em decorrência dos abusos cometidos pela Cooperativa e seus

 prepostos. De pronto, percebe-se que os prejuízos amargados pelos mutuários do Parque

Residencial União atingem cifras vultosas. Segundo informações colhidas, mais de 500(quinhentas) famílias foram ludibriadas e agora estão na iminência de perder o imóvellegitimamente adquirido. Destarte, em razão da grande massa de lesados, os prejuízosalcançam valores exorbitantes.

B) DA PROPAGANDA ENGANOSA:

Prevê o Código de Defesa do Consumidor a proteção contra a publicidade enganosa,abusiva, métodos comerciais coercitivos e desleais, bem como contra práticas ecláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços, além da

igualdade nas contratações.Rui Barbosa, em Orações aos Moços, ensina:

"A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualdade aos desiguais, namedida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdadenatural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, doorgulho, ou loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade,seria desigualdade flagrante, e não igualdade real."

 Não há como se admitir, por previsão legal, que haja desnível ao contratar, colocando o

consumidor numa esfera bem inferior, vítima de métodos desleais e abusivos.

A ré, desrespeitando o ordenamento jurídico pátrio, utilizou-se de publicidade enganosana venda dos lotes do Conjunto União II, consistente em iludir o consumidor de que

 pagando os valores consignados no primeiro contrato por eles firmado teria no fim do plano quitado seu imóvel. Ocorre, porém, que tal não era verdade, posto que vemobrigando aquelas pessoas que já adquiriram tais imóveis a assinarem outro contratocom valores e formas de reajustes muito mais onerosos que o primeiro, pretendendo,com isso, transferir para os mesmos a obrigação de pagar uma dívida que fora assumida

 pela própria Cooperativa junto ao agente financiador e que por incompetência de seuadministradores tornou-se impagável, tanto é verdade que ocorreu penhora de todos os

lotes, em ação de execução.

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Por outro lado, os consumidores adquirentes não foram informados, no ato da aquisiçãodos imóveis, da existência da hipoteca, da execução e da penhora, ficando eles com afalsa idéia de que pagas as parcelas anunciadas teriam quitado o imóvel, sem qualquer risco de perder seu bem para o agente financiador ou de ter que tornar a pagar os mesmovalores à Caixa Econômica Federal.

Além disso, a infra-estrutura prometida não passa da esfera da precariedade, nãoapresentando nenhuma das benfeitorias propaladas nos informes publicitários, o quetorna o loteamento irregular(1).

Os réus propalaram a oportunidade de um negócio único e irrecusável, incutindo noespírito dos contratantes vantagens promissoras.

 Não há, portanto, que se discutir sobre o teor lesivo das publicidades feitas. Como foiaduzido linhas atrás, a Cooperativa alienou os lotes individuais sem alertar osconsumidores a respeito da existência do ônus hipotecário e de que a coisa era litigiosa

e que sobre a mesma já havia penhora, omitindo assim informações essenciais, que,conhecidas, certamente inviabilizariam a concretização do negócio jurídico. Faltoua boa fé e o equilíbrio próprios da relação de consumo. O consumidor se encontrou decerta forma diante de uma cláusula surpresa. Uma por omissão, dado que não informouas restrições existentes sobre os lotes, e outra por comissão, dado que prometeu aconstrução de benfeitorias que jamais foram realizadas.

A publicidade não pode ser enganosa. Deve ela espelhar a verdade dos fatos. Engana-seaté por omissão. Claro está que, no caso vertente, os consumidores deixariam decomprar os lotes comercializados pela Cooperativa se tivessem conhecimento da real

situação da área.Considera-se enganosa e abusiva qualquer modalidade de informação ou carência deinformação capaz de induzir o consumidor a erro, muito mais se evidenciando taisvícios quando sequer foi realizado os benefícios prometidos aos consumidores.

A idéia falsa incutida no comprador é uma pura inversão dos princípios sistemáticos quedevem ordenar as relações de consumo.

A boa-fé e a equidade realmente não são respeitadas pelos réus, até porque inserem emseus contratos as proibidas e ilegais "cláusulas surpresa". Nossa doutrina é veemente ao

apontar a ilegalidade desta espécie de cláusula negocial:

"A proibição de cláusula surpresa tem relação com a cláusula geral de boa-fé, estipuladano inciso IV do artigo 51 do C.D.C. Ambas configuram uma técnica de interpretação darelação jurídica de consumo e, também, verdadeiros e abrangentes pressupostosnegativos da validade e eficácia do contrato de consumo, quer dizer, as cláusulascontratuais devem obediência à boa-fé e equidade e não devem surpreender oconsumidor após a conclusão do negócio, pois este contratou sob certas circunstâncias edevido a aparência global do contrato.

Para caracterizar-se como estipulação proibida, é necessária que estejam presentes dois

requisitos: uma de ordem objetiva e outro de natureza subjetiva. O pressuposto objetivo para classificação de estipulação proibida pelo inciso comentado é de que a surpresa

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 seja extraordinária, o que se certifica pela natureza do negócio jurídico que se estáexaminando, de acordo com as regras ordinárias e da lealdade que devem formar ocomportamento dos contratantes. O requisito subjetivo é preenchido quando se constataa falta de informação adequada ao consumidor sobre o conteúdo global do contrato"(Comentários de Nelson Nery Júnior ao Código Brasileiro de Defesa do Consumidor 

comentado pelos autores do anteprojeto, p. 350 e 351, 4.ª Edição, Editora ForenseUniversitária).

Com efeito, presentes estão, no caso em comento, tanto um quanto outro requisito.Faltou a lealdade e a informação adequada ao consumidor. A imposição de perder o lote

 para a Caixa Econômica Federal ou ter que pagá-lo novamente a esse agente financiador é surpreendente, posto que extraordinário. Foge à relação e ao objeto contratual.Também não possuíram os consumidores informação adequada sobre a situação real dosimóveis, que se encontravam hipotecados e penhorados à referida instituição financeira.

Explícito restou o dolo empregado na propaganda enganosa levada a efeito pela

Cooperativa, objetivando induzir em erro os ofendidos. Dolo e erro nada mais são quevícios de vontade existentes no ato jurídico. É sabido, também, que todo negócio

 jurídico eivado de qualquer vício de consentimento é anulável, em conformidade com oque dispõem os artigos. 86 e 92 do Código Civil:

"Art. 86 – São anuláveis os atos jurídicos, quando as declarações de vontade emanaremde erro substancial".

"Art. 92 – Os atos jurídicos são anuláveis por dolo, quando este for a sua causa".

 Nesse sentido merece transcrição o magistério de Arruda Alvim:"A publicidade enganosa constitui-se em figura jurídica autônoma, se bem que esta seaproxima do dolo daquele que anuncia, objetivando induzir em erro o consumidor ".

E acrescenta o referido jurista:

"Quando o Código de Proteção e Defesa do Consumidor qualifica como enganosa a publicidade que possa induzir em erro o consumidor, também se está referindo a errosubstancial, erro este, sem o qual inexistiria o ato de consumo, pois relativo àsqualidades essenciais, que elenca sobre produtos e serviços".

Seduzidos pelas artimanhas ventiladas pela Cooperativa, inúmeras foram as pessoaslesadas. Nas informações veiculadas, registram-se propostas tentadoras, capazes deinduzir em erro tanto o incauto quanto o astuto. Em momento algum se fez mençãoacerca da hipoteca e da penhora existente sobre os lotes negociados. Agora, osconsumidores correm o risco de perder todas as economias poupadas ao longo da vida einvestidas no "sonho da casa própria".

Em tempos hodiernos, a subjetividade do marketing comercial é cerne de interpretaçõesdúbias, que fogem à inteligência mediana. Imprescindível pois a clareza de idéias paraque o consumidor não seja induzido ao erro. Mais ainda no caso vertente, onde as

 pessoas lesadas, por serem de origem humilde e simples, jamais iriam desconfiar dosembustes articulados pelos diretores e prepostos da Cooperativa.

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Destarte, através de sua conduta incidiu o réu nas proibições constantes do art. 37 doCDC, in verbis:

"Art. 37 – É proibida toda a publicidade enganosa ou abusiva.

Parágrafo primeiro – é enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicaçãode caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo,mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza,características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outrosdados sobre produtos ou serviços."

In casu, é perfeitamente aplicável as conclusões de Antônio Herman de Vasconcelos eBenjamin, ao dizer que:

"Não se imagine que, em marketing, só a publicidade pode ser contaminada por enganosidade ou abusividade. Todas as técnicas mercadológicas dão azo a tais desvios.

Por conseguinte, as promoções de venda também podem ser enganosas ou abusivas".

A oferta do produto, nos moldes do CDC, vincula o fornecedor ao seu cumprimentointegral. Tal obrigação tem origem na veiculação da propaganda, quando o adquirentemanifesta sua aceitação. Este não é senão o axioma contido no art. 30 do CDC, inverbis:

"Art. 30 - Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidosou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer, veicular ou dela se utilizar e integra o

contrato que vier a ser celebrado."O preceito em epígrafe nada mais representa que uma tautologia do art. 1.080 doCódigo Civil, onde se encontra disciplinada a progênie contratual. Ao regrá-laestabelece a responsabilidade do proponente em relação às obrigações assumidas, inverbis:

"Art. 1.080 - A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dostermos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso".

Completando a disposições legais supra tem-se o art. 31 do CDC, que determina

expressamente:

"A oferta e apresentação dos produtos ou serviços devem assegurar informaçõescorretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa, sobre suas características,qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entreoutros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dosconsumidores".

Registre-se, por oportuno, que o material publicitário utilizado para a divulgação dacomercialização dos lotes não mais se encontra em poder da Cooperativa, em flagranteviolação ao disposto no parágrafo único do artigo 36 da Lei 8.078/90, que impõe a

conservação deste material por parte daqueles que dele se utilizaram. Tal comporta,

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indubitavelmente, indica o intento lesivo da ré em eliminar os vestígios e indícios de sua própria torpeza.

Mas a lei, sábia que é, previu que cabe ao fornecedor provar que sua publicidade não éenganosa, ficando a cargo da autoridade competente aplicar ao infrator as sanções

cabíveis, com o fim de proteger os consumidores.

Ao consumidor basta apenas denunciar as autoridades que foi enganado, sendo que se a partir daí se aplica a inversão do ônus da prova. Tal não é só entendido em nossodireito, como também na doutrina aplicada aos países da União Européia.

Trazemos à colação alguns julgados que melhor exemplificam a matéria:

"Consumidor. Propaganda enganosa. Induzimento do consumidor, através daembalagem visível, à aquisição de produto, o que daria direito à participação de sorteiode prêmios, àquela altura, segundo o regulamento oculto no interior da embalagem, já

realizado. Responsabilidade do fabricante". (Ac. da 5ª Câm. Cív. Do TJRS - ApCiv596.126.037 rel. Des. Araken de Assis - j. 22.08.1996 - v.u.)

"Incorre nas penas do art. 66, caput, da Lei 8.078/90, a agente que, na qualidade devendedora, faz afirmações falsas para conseguir vender livros, tanto em relação aosautores quanto a respeito da qualidade da mercadoria vendida, vez que tal procedimentonão se trata de mera técnica comercial de venda, mas de comportamento falso ementiroso, com o intuito de enganar as vítimas, que de boa-fé acabam por adquirir os

 produtos". (Ac. Da 2a Câm. Do TACrimSP - Ap. 888.013-0 - rel. Juiz Rulli Júnior - j.20.10.1994 - v.u.)

"OFERTA PUBLICITÁRIA - Passagem aérea com desconto - Não concessão aoconsumidor - Violação ao dever de boa-fé - Restituição devida.

Pecou a propaganda pela falta de informação essencial.

Se pretendia a requerida colocar em promoção somente as passagens que não tivessem preço reduzido, porque protecional, a exceção deveria constar expressamente doanúncio.

 Não foi sem razão que o Código de Defesa do Consumidor chegou às raias de

especificar a oferta de produtos e serviços no mercado.

A oferta vincula, obriga e integra o contrato que vier a ser vinculado." (Processo 359/96- Juizado Central II - Juiz José Ernesto de Mattos Lourenço - São Paulo, in Revista deDireito do Consumidor, vol. 20, págs. 239 a 243).

O consumidor deve ficar isento de encargos excessivos que extrapolem a esfera do justo, máxime quando dissimulado o escopo do fornecedor. Não há, pois, como lhe

atribuir o risco do negócio. O alienante deve fazer boa a coisa que vende,respondendo ainda pelos riscos da evicção. Assim, a Cooperativa está obrigada a reparar os prejuízos causados aos consumidores.

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Antes de finalizar esse item, há de se deixar bem claro quais são as conseqüênciastambém da não realização das obras de infra-estrutura prometidas. Nesse particular a lei, a doutrina e a jurisprudência são claríssimas, não deixando dúvidas de que o não-cumprimento por parte do loteador de suas obrigações (feitura das obras de infra-estrutura) dá ao consumidor o direito de suspender o pagamento das prestações mensais,

até que as obras sejam feitas. É a aplicação do princípio "exceptio non adimpleticontractus", bem explanado por Sílvio Rodrigues na sua obra Direito Civil, Vol. 3, DosContratos e das Declarações Unilaterais da Vontade, Editor Saraiva, edição 25ª, página77:

"A exceptio non adimpleti contractus pode ser invocada, qualquer que seja a causageradora do inadimplemento do contrato. Quer a recusa de cumprimento se funde namá vontade do contratante, quer na força maior ou no caso fortuito, em ambas ashipóteses a outra parte pode aduzir a exceção. Porque, tendo um prestação sua causa daoutra, deixando aquela de ser cumprida, seja qual for o motivo, cessa de exigir a causade cumprimento da segunda."

A "exceptio non adimpleti contractus" é tratada no artigo 1.092 do Código Civil, nosseguintes termos:

"Art. 1092. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contraentes, antes de cumprida a suaobrigação, pode exigir o implemento da do outro."

Em relação as benfeitorias no loteamento, a obrigação do loteador réu era a seguinte:

"CLÁUSULA TERCEIRA (....).

 b) R$ 840,00 (oitocentos e quarenta reais) representados por 08 (oito) parcelas fixas, novalor de R$ 105,00 (cento e cinco reais), cada, integralmente quitadas em 24/06/97,(última delas), que serviram e foram destinadas a implantação de melhorias doempreendimento, tais como: demarcação de quadras e lotes, arruamento,

encascalhamento das ruas, rede interna de água, rede de energia elétrica em baixa

tensão e despesas administrativas."

Como se vê, pelo próprio termo do contrato e pelo tempo transcorrido, todos osconsumidores já pagaram os valores destinados às obras de infra-estrutura, o quesignifica que as parcelas que estão sendo deles exigidas se referem ao preço do terreno

em si, parcelas estas que deveriam ser repassadas à CEF. Com tal não ocorreu nem estáocorrendo, é mais que justo que o consumidor suspenda os pagamentos restantes,devendo a ré ser condenada a se abster de tomar qualquer medida para forçar ocontratante a pagar valores indevidos.

Mister faz lembrar que a obrigação da feitura da infra-estrutura, além de ser objeto deavença, é determinação que resulta de leis federal e municipal, não tendo como ofornecedor dela se livrar.

A Lei Federal nº 6.766, de 19/12/1979, sobre a matéria dispõe, "in verbis":

"Artigo 4º - Os loteamentos deverão atender, pelo menos, aos seguintes requisitos:

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I - as áreas destinadas a sistema de circulação, a implantação de equipamento urbano ecomunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais àdensidade de ocupação prevista para a gleba, ressalvado o disposto no § 1 deste artigo;

(....).

Artigo 5 - O Poder Público competente poderá complementarmente exigir, em cadaloteamento, a reserva de faixa non aedificandi destinada a equipamentos urbanos.

Parágrafo único. Consideram-se urbanos os equipamentos públicos de abastecimentode água, serviços de esgotos, energia elétrica, coletas de águas pluviais, redetelefônica e gás canalizado.

(....).

Artigo 18 - Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao Registro Imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob penade caducidade da aprovação, acompanhado dos seguintes documentos:

(....);

V - cópia do ato de aprovação do loteamento e comprovante do termo de verificação pela Prefeitura da execução das obras exigidas por legislação municipal, queincluirão, no mínimo, a execução das vias de circulação do loteamento, demarcação

dos lotes, quadras e logradouros e das obras de escoamento das águas pluviais ou da

aprovação de um cronograma, com a duração máxima de 2 (dois) anos , acompanhado 

de competente instrumento de garantia para a execução das obras;(....).

"Artigo 38 - Verificado que o loteamento ou desmembramento não se acha registradoou regularmente executado ou notificado pela Prefeitura Municipal, ou pelo DistritoFederal quando for o caso, DEVERÁ o adquirente do lote SUSPENDER OPAGAMENTO das prestações restantes e notificar o loteador para suprir a falta."

A lei municipal que trata do parcelamento do solo urbano também dispõe como sendoda responsabilidade da empresa ré a execução das obras de infra-estrutura.

Mutatis mutandis, em relação ao instituto jurídico em comento, valem as decisõesabaixo citadas:

"44339 - LOTEAMENTO IRREGULAR - PROVA DA REGULARIZAÇÃO -CARÊNCIA DE AÇÃO.

  Imprescindível a situação regular do loteamento para que possa ademandante exercer o direito da ação. O art. 37 da Lei 6.766, de 1979, ao estatuir que"é vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento nãoregistrado", eleva o registro à condição indispensável ao exercício de qualquer ação pela

 propriedade do imóvel prometido a venda. Não trazendo a autora documentocomprobatório do registro do loteamento, alegadamente irregular, cuja regularização é

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 pretendida pelo demandado, é ela carecedora de ação, por impossibilidade jurídica do pedido. A demanda atenta contra as regras postas na Lei 6.766, de 1979, especialmenteos arts. 37, 38 e 39. Deve a autora registrar previamente o loteamento, para,

 posteriormente, reclamar eventual inadimplência, sempre cabendo ao adquirente valer-se das disposições consignadas no art. 38 e seus parágrafos do estatuto legal precitado.

Assim como a teor do disposto no § 3º do art. 267 do CPC, a matéria constante noinciso VI do mesmo dispositivo pode ser conhecida em qualquer tempo, acolhe-se a preliminar de carência de ação, prejudicada a de litispendência" (TJ-RS - Ac. Unân. da1ª Câm. Civ., de 20.12.88 - Ap. 588.064.972 - Rel. Des. Milton Martins - Companhia deHabitação do Estado do Rio Grande do Sul - COHAB x Álvaro Pereira).p.22/89 -Adv/coad.

"45994 - LOTEAMENTO IRREGULAR - PROCEDIMENTO DO ADQUIRENTE.

Incide na espécie o art. 39 da Lei 6.766, de 1979, que estabelece a ineficácia, dacláusula de rescisão do contrato de aquisição de lote, por inadimplemento do

adquirente, se e enquanto o loteamento não estiver inscrito. Desde a vigência dessaregra, portanto, já não estaria o compromissário-comprador obrigado a solver as suas

 prestações, enquanto não cumprisse os promitentes-vendedores a prestação legal defazer aprovar e registrar o loteamento, legalizando-o. Na melhor das hipóteses, poderá  o adquirente do lote, suspendendo o pagamento , notificar o loteador para suprir a 

 falta, após receber a notificação nos termos do art. 38 da mesma lei, já então vigente. Eterá então a faculdade de depositar as prestações devidas junto ao Registro de Imóveiscompetente - § 1º - para que a loteadora as levante após regularizado o loteamento - §3º. Se não houve tal depósito, mesmo assim só após a regularização do loteamento, aloteadora poderá proceder à notificação aludida no art. 32 da mesma lei, o loteador ficainibido de reclamar do adquirente o implemento de sua obrigação; não está legitimado alançar mão de qualquer medida para exigir o cumprimento do avençado. Só após aregularização do loteamento é que a cláusula passa a ter validade, ganha eficácia. Aíentão o loteador fica totalmente desarmado, impedido de molestar o comprador (TJ-SP -Ac. unân. da 12ª Câm. Civ., de 12.06.89 - Ap. 140.420-2 - Rel. Des. Carlos Ortiz -Lávio Pereira Matos x Empreendimentos Imobiliários Serramar Ltda.).p.39/89 -Adv/coad.

Assim, caracterizada a utilização de publicidade enganosa, não podem prosperar as pretensões da ré de continuar cobrando o que não lhe é devido, devendo a mesma ser condenada às obrigações de fazer e de não fazer, consistentes em devolver todos os

valores recebidos dos consumidores e não repassados à CEF, e abster-se de efetuarqualquer cobrança dos consumidores enquanto não resolver sua pendência com aCaixa Econômica Federal e não executar as obras de infra-estrutura no loteamento.

A devolução dos valores não só é exigível em virtude da publicidade enganosa feita,mas também porque a Caixa Econômica Federal, após adjudicar os imóveis, nãoreconhecerá os valores já pagos pelos adquirentes dos terrenos, já que a ré recebeu as

 parcelas e não as repassou àquela entidade, que está se negando a dar sua anuência paraque sejam lavradas as escrituras públicas para quem já quitou o imóvel. Isso sem dizer que as obras de infra-estrutura não foram realizadas, tendo os representantes da ré e oraréus nesta ação se apropriado indevidamente de tais valores.

Em seu artigo 964, reza o Código Civil:

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"Art. 964 - Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir".

Outrossim, o Código de defesa do Consumidor determina no parágrafo único do artigo42, que os valores correspondentes à devolução devem corrigidos, em dobro eacrescidos dos juros legais:

"Art. 42. (....).

Parágrafo único - O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição doindébito, por valor igual ao dobro ao que pagou em excesso, acrescido de correçãomonetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".

 Neste diapasão, cumpre esclarecer que a Cooperativa promoveu, bem como vem promovendo a cobrança das prestações mensais dos mutuários sem, no entanto, repassar tais valores à Caixa Econômica Federal, para a amortização da dívida contraída emrazão da aquisição da área loteada e sem promover as obras de infra-estrutura. Vale

dizer, apropriou-se indevidamente um capital que não lhe pertencia. As importâncias pagas pelos mutuários tinham destino certo: a) as 8 primeiras parcelas, no valor unitáriode R$ 105,00, num total de R$ 840,00, como especificadas na cláusula terceira, letra "b"do contrato (f. ? dos autos de PA), deveria ser destinada a feitura das obras de infra-estrutura; e b) as demais parcelas estavam vinculadas ao adimplemento das obrigaçõesassumidas pela Cooperativa junto à instituição financeira, posto que se isso nãoocorresse, como não ocorreu, os consumidores estariam sendo cobrados indevidamente.Todavia, a ré não fez sua parte, e agora os consumidores correm o risco de perder o seuimóvel e ficar sem ter onde morar. Destarte, cabe ao Judiciário tomar as medidascabíveis no sentido de compelir a Cooperativa e seus representantes legais a

recomporem os prejuízos causados, restituindo aos consumidores em dobro, acrescidode correção monetária e juros legais, ex vi do que dispõe o parágrafo único do art. 42 daLei 8.078/90, todo o dinheiro recebido e não repassado à CEF nem destinado aexecução das benfeitorias devidas no loteamento.

O dever de restituir decorre diretamente da postura ilegal e imoral adotada pelarequerida. Como é cediço em Direito, todo aquele que causa prejuízo a outrem éobrigado a indenizar. E não há de ser diferente no caso em apreço, haja vista asinúmeras arbitrariedades cometidas pelos diretores e prepostos da Cooperativarequerida.

Cumpre ressaltar que a exceção de "engano justificável’, contemplada no parágrafoúnico do já mencionado art. 42, não se configura no caso vertente, pois a Cooperativa eseus representantes legais agiram com dolo, uma vez que não alertaram os adquirentes arespeito da existência de gravames sobre os lotes alienados, não repassaram as quantias

 percebidas mensalmente dos mutuários nem executaram as obras infra-estrutura previstana lei e no contrato e cobradas dos consumidores contratantes.

Este artigo contempla uma sanção imposta àqueles que, ao agirem com má-fé,locupletaram-se em detrimento do consumidor. Aqui, o fulcro do conceito ressarcitórioencontra-se deslocado para a convergência de três forças: o "caráter punitivo" , o"caráter preventivo" e o "caráter compensatório" da norma. Tem cunho punitivo, pois a

condenação à repetição do indébito, em dobro, avulta-se como um castigo para aqueleque infringiu a lei. É de inspiração preventiva, já que evitará que a lesão se perpetue a

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outros membros da sociedade. Por fim, tem natureza compensatória, pois ressarcirá oconsumidor dos prejuízos experimentados.

E é exatamente isto que o autor pretende obter, atendendo a um anseio eminentementesocial. A condenação da Cooperativa e dos seus representantes na devolução em dobro

servirá como um exemplo a ser seguido em nossa grei. Com efeito, muitas empresas, principalmente as que atuam no ramo de loteamento, haverão de pensar duas vezesantes de se apropriar indevidamente de quaisquer valores pagos pelos mutuários,evitando-se com isso que a lesão se perpetue na sociedade.

Para finalizar, convém salientar que caso propugne a defesa pela aplicação do CódigoCivil, só fará ratificar as verdades preditas neste venábulo, máxime porque ausentes asexceções contempladas nos artigos 969, 970 e 971 daquele códex.

D) DA CONSEQÜÊNCIA DA INEXECUÇÃO DAS OBRIGAÇÕESPOR PARTE DA COOPERATIVA – DEVOLUÇÃO DASPRESTAÇÕES PAGAS PELOS MUTUÁRIOS – RESPONSABILIDADE POR PERDAS E DANOS, MATERIAL EMORAL:

O Código Civil perfilha dois sistemas de proteção e responsabilidade por perdas edanos, a saber: 1) o contratual, decorrente da inexecução de obrigações mutuamenteajustadas, regulado pelo art. 1.056; 2) o extracontratual ou aquiliano, oriundo de atosilícitos, disciplinado pelo art. 159 daquele códex.

Tanto num, quanto noutro, aquele que der causa à quebra do vínculo obrigacional ou

 praticar ilícitos que importem em prejuízo a outrem, sujeita-se ao dever de reparar as perdas e danos averiguados, restaurando a situação originária como se nada tivesseocorrido.

 Nesse sentido dispõe a lei supracitada:

" Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano"

"Art. 1.056. Não cumprindo a obrigação, ou deixando de cumpri-la pelo modo e notempo devidos, responde o devedor por perdas e danos."

À luz de tais preceitos, descabe indagar acerca da responsabilidade dos réus. Comefeito, o dever de reparar o dano causado constitui a regra matriz do Direito Civil, seja aresponsabilidade decorrente de ato ilícito (aquiliana), seja oriunda de descumprimentode obrigações contratuais.

Uma vez configurado o dano, aquele que obrou para sua ocorrência estáirremediavelmente obrigado a repará-lo. E deste dever não se esquiva, pois tem lugar aíverdadeiro laço incindível, ligando o autor da lesão às conseqüências de suas ações.

Ora, com o vagar necessário discorreu-se acerca dos atos praticados pelos diretores e prepostos da Cooperativa, cujas conseqüências, assaz nefastas, repercutiram em

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vultosos prejuízos aos consumidores. A propaganda enganosa veiculada, a nãocientificação aos adquirentes dos ônus gravados no imóvel, a recusa de repassar àCEF as prestações pagas pelos mutuários, para a amortização da dívida, a nãoexecução das obras de infra-estrutura e, por fim, a inércia da Cooperativa no

 processo de execução movido pela CEF, dentre outros fatos, ocasionaram a situação

 preocupante, quiçá caótica, em que estão mergulhados os mutuários do ParqueResidencial União. E tais atos, nunca é demais frisar, foram praticados por membros daCooperativa, a quem, indubitavelmente, compete recompor as perdas havidas.

 No caso em apreço, tem razão de ser tanto a responsabilidade aquiliana, quanto aresponsabilidade contratual. De fato, a ré, ao não efetuar o repasse das quantias pagas

 pelos consumidores nem executar as obras de infra-estrutura, não só descumpriu asobrigações contratuais que vinculavam as prestações recebidas à amortização do débitocontraído junto à CEF, como também procedeu de modo ilícito, apropriando-seindevidamente de dinheiro alheio. Frise-se, outrossim, que além destes, a Cooperativacometeu ainda vários outros atos fraudulentos, tais como: o crime de propaganda

enganosa e o de estelionato, quando alienou terrenos hipotecados e penhorados semalertar os adquirentes sobre as restrições existentes. Assim, tem vigência no casovertente as disposições invocadas nos dois sistemas de proteção.

Demais disso, cumpre aduzir que todos os elementos ensejadores da responsabilidadecivil foram diagnosticados no caso em análise. Com efeito, registrou-se a condutadolosa da Cooperativa e de seus membros, a ocorrência de um evento danoso, bemcomo o nexo de causalidade entre aqueles atos e este resultado. Para elucidação emelhor compreensão, impende agora decompor tais elementos.

Os fatos aduzidos linhas atrás demonstram, de forma inequívoca, a intenção dolosa daré, que não hesitou, sequer por um átimo, em manipular as informações, induzindo emerro o consumidor. A recusa em alertar os adquirentes a respeito do real estado doslotes, subtraindo-lhes intencionalmente subsídios imprescindíveis à consumação válidado negócio, redundou no erro daqueles que, na boa fé, envidaram esforços para aaquisição do imóvel. O vendedor possui o dever legal e moral de fazer boa a coisavendida, e deste imperativo não pode se furtar, sob pena de agir dolosamente e ser compelido a arcar com as conseqüências de tal comportamento. Indubitavelmente,houve dolo no comportamento dos agentes da Cooperativa que, maliciosamente,omitiram informações essenciais, configurando-se assim o crime de propagandaenganosa tipificado no art. 67 da Lei. 8.078/90. E, como é cediço em Direito, aquele

que, por, por ação ou omissão voluntária, causar prejuízo a outrem, é obrigado a reparar o dano.

Deve-se deixar claro que os mutuários do Parque Residencial União II são, em suamaioria ou quase totalidade, pessoas carentes, de escassas luzes, e, portanto,amplamente vulneráveis a lesões de toda a espécie, principalmente àquelas maiscomplexas e dissimuladas, como no caso em questão. As vítimas, nesse contexto,tornam-se mais vítimas ainda, posto que Cooperativa Habitacional dos Subtenentes eSargentos das Forças Armadas, em razão da ingenuidade e da hipossuficiência dosconsumidores, não teve muita dificuldade para enganá-los e induzi-los em erro,

 prevalecendo-se, para tanto, de sua posição de superioridade, principalmente pelo fato

de usar o nome das "Forças Armadas Brasileiras" que, sem sobra de dúvida,inspira confiança e impõe respeito. A toda evidência, os mutuários, no momento da

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celebração do contrato de compra e venda, agiram com boa fé, apostando na

idoneidade da ré e de seus representantes. Todavia, a recíproca não foi verdadeira, posto que os réus, desde o início, deram provas de suas intenções malignas, alterando averdade dos fatos, omitindo informações e obnubilando as relações de consumo.Ressalte-se que a hipossuficiência do consumidor está prevista na Lei 8.078, com

disposições expressa, dentre outras conseqüências fáticas para protegê-lo da inversão doônus da prova, deixando, assim, a cargo do fornecedor fazer prova em contrário.

A ocorrência do evento danoso restou amplamente comprovada no transcorrer doInquérito Civil n.º 022/97. Pelos elementos hauridos destes autos, constata-se facilmentea gravidade da situação dos moradores do Parque Residencial União II, cujos lotesindividuais já foram penhorados no processo de execução movida pela CEF e, agora,estão na iminência de serem alienados em hasta pública ou adjudicados pela exeqüente.

E o pior é que estes mutuários, por não possuírem outro teto, correm o sério risco de padecer na penúria, sem abrigo e proteção, apesar de muitos já haverem honrado

integralmente seus compromissos, investindo o capital acumulado durante anos e anosde trabalho árduo e dedicado. Seria uma iniquidade imperdoável impor mais este fardosobre uma família sofrida e honesta, o que, por óbvio, refletiria até mesmo no descréditoda Justiça por parte das pessoas lesadas e, ainda, no estímulo à ilicitude face aimpunidade dos verdadeiros culpados. Trata-se, pois, não apenas de recompor os

 prejuízos amargados pelos consumidores, mas também de evitar que a lesão arranhe aimagem dos Poderes Públicos, aos quais incumbe a defesa da ordem jurídica e dosdireitos e garantias fundamentais dos cidadãos.

 No sistema de responsabilidade civil, preconizado pela doutrina, perfilhado pelolegislador e lapidado pela jurisprudência, não se concebe dano sem causa. Mister, assim,estabelecer um liame entre a conduta do agente e o evento danoso, fixando-se averdadeira contribuição daquele para a consumação do dano.

Ora, dúvida não há com relação ao nexo causal existente entre a conduta dolosa daCooperativa e os prejuízos daí advindos. Omitindo informações essenciais à conclusãodo negócio, a ré mascarou a real situação da coisa a ser vendida, transmitindo aosconsumidores uma noção errônea, uma falsa concepção da realidade, induzindo-os emerro. Tivessem os consumidores ciência de todas as restrições constantes na árealoteada, por certo não haveriam de adquirir os lotes individuais; cercando-se de todas ascautelas a fim de se prevenirem de futuras lesões. Obrou, com tais omissões, para a

conclusão do negócio, que provavelmente não ocorreria em outras condições.

Ademais disso, a Cooperativa não efetuou o repasse para CEF das prestações pagas pelos mutuários, mantendo-se inadimplente. E foi só por isso, ou seja, em decorrênciadeste seu comportamento censurável, que a CEF resolveu promover a execuçãohipotecária que resultou na penhora dos bens dos mutuários. Frise-se, neste particular,que a ré não opôs embargos à execução, conservando-se inerte na relaçãoprocessual instaurada, o que contribuiu ainda mais para a ocorrência da lesão. Comose percebe, todos os prejuízos decorrem diretamente da seqüência de atos desastrosos

 praticados pela ré. Há, pois, nexo de causalidade.

Destarte, não é necessário esforço para vislumbrar que todos os requisitos necessáriospara a configuração da responsabilidade civil da Cooperativa estão presentes: dolo,

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evento danoso e nexo causal. A Cooperativa, por meio de seus prepostos, praticou umato ilícito contrário à ordem jurídica, violando direitos subjetivos e invadindo a esfera

 patrimonial de terceiros. Galgou as balizas intransponíveis da Constituição daRepública, infringindo os direitos e as garantias fundamentais do cidadão,

 principalmente no que tange ao princípio da propriedade.

Com efeito, não havendo resgate da hipoteca pela Cooperativa, os lotes alienadosficaram sujeitos à execução movida pela CEF, muito embora os mutuários tenhamadquirido a propriedade dos mesmos. A Cooperativa, na qualidade de alienante, deveriafazer boa a coisa vendida, resgatando a hipoteca, responsabilizando-se pelos víciosocultos e pelos riscos da evicção, de modo a garantir o domínio transferido aosconsumidores. Todavia, isto não sucedeu.

Como se percebe, a ré não sofreu prejuízo algum com a penhora destes lotes, postoque já não era mais dona da referida área quando da constrição judicial. Em veras, osúnicos prejudicados foram os mutuários do Parque Residencial União, legítimos

 proprietários dos lotes, que ficaram privados do domínio recém adquirido, para garantir o pagamento da dívida contraída por terceiro junto à CEF, ressarcindo assim danoscausados pela Cooperativa ré.

E, como é cediço em Direito, todo aquele que reparar dano causado por outrem, seeste não for seu descendente, poderá reaver aquilo que foi obrigado a custear,reembolsando-se da soma indenizatória que despendeu, bem como do valor dascoisas dadas em pagamento ou garantia de uma obrigação. Tal axioma decorrediretamente do direito de regresso, abraçado por nosso ordenamento jurídico, cuja

 previsão legal encontra-se estampada no art. 1.524 do Código Civil, a saber:

"Art. 1.524. O que ressarcir o dano causado por outrem, se este não for descendente seu pode reaver, daquele por quem pagou, o que houver pago."

 Não há, portanto, que se questionar a responsabilidade civil da Cooperativa, uma vezque os danos por ela causados foram garantidos com a penhora dos lotesadquiridos pelos mutuários. O produto da alienação destes imóveis, ou adjudicaçãodeles pela CEF, cobrirá todos os danos causados pela demandada. Indubitavelmente, oque está sendo dado em pagamento da dívida bancária é o patrimônio dosconsumidores, aos quais compete o direito de reaver tudo aquilo que foram obrigados adespender para ressarcir danos gerados por terceiros.

Registre-se, outrossim, que o direito regressivo somente deixará de existir quando ocausador do prejuízo for um descendente daquele que o ressarciu, o que, in casu, nãoocorre. Portanto, nada justifica a exclusão de responsabilidade civil da Cooperativa eseus prepostos.

Para finalizar, cumpre ressaltar que, em se tratando de ato ilícito, a correção monetáriafluirá a partir da data do ilícito, consoante pacífico entendimento jurisprudencial,consubstanciado na Súmula 43 do Superior Tribunal de Justiça, abaixo transcrita:

"Súmula 43 - Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do

efetivo prejuízo."

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E) DA RESPONSABILIDADE DO ALIENANTE PELA EVICÇÃO -DEVER DE FAZER BOA A COISA ALIENADA:

alienada. Com efeito, o vendedor assegura o comprador contra o risco de vir a ser  privado da coisa, pela reivindicação promovida com êxito por terceiro. E a lei, para

tornar eficaz tal garantia, sujeita o alienante à obrigação de indenizar o adquirente, casoeste venha a ser evicto.

 Nos contratos bilaterais (e todos os contratos bilaterais são onerosos, embora o contrárionão seja verdade), a prestação de uma das partes tem por causa e razão de ser a

 prestação de outra (v. n. 35, supra). Ora, se a coisa entregue pelo vendedor foireclamada judicialmente pelo seu verdadeiro dono, e, portanto, legalmente arrancada da

 posse do comprador, a prestação por este paga (i. e., o preço) deve ser-lhe devolvida, pois deixou de ter causa." (Sílvio Rodrigues – Direito Civil – Vol. 3 – 25a Edição – pág.111/112)

Consoante se infere do excerto acima transcrito, a responsabilidade da Cooperativa éincontrastável. O baluarte jurídico não alberga pretensões ilícitas, imputando aos queassim procederem o dever recompor os prejuízos gerados, ex vi do que dispõe o art.159, que conjugado com as disposições concernentes à evicção, às perdas e danos, e aos

 postulados do Código de Defesa do Consumidor, conduz, inexoravelmente, à reparaçãodos danos sofridos pelos mutuários do Parque Residencial União II, impondo-se de

 pronto a devolução dos valores por eles pagos.

F) DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DAASSOCIAÇÃO RÉ:

 Neste tópico, cumpre esclarecer que, em razão de sua debilidade financeira, aCooperativa, com toda certeza, não reunirá condições patrimoniais para cobrir os

 prejuízos advindos aos consumidores. Assim, os mutuários correm o sério risco de lutar em vão.

Ora, seria por demais iníquo permitir que os lesados pelo ilícito ficassem num estado deeterna insatisfação, pelo simples fato de que a entidade demandada não possuir benscapazes de responder pelos prejuízos causados pelos seus representantes legais.

 Nesta ordem de idéias, a doutrina abraçou a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, que foi depois acolhida por nossos legisladores e pretórios. Hoje, osresponsáveis pelo dano não podem mais se ocultar atrás da personalidade jurídica. Casoa empresa, a associação ou a cooperativa não possuam condições financeiras paraindenizar, os seus diretores, prepostos e agentes respondem pelos atos praticados.

A Constituição Federal e o Código do Consumidor, como instrumentos de justiça quesão, patrocinam o arrimo ao consumidor indefeso, esbulhado em seus direitos,

 proporcionando o acesso àquilo que lhe é próprio. Objetiva nossa legislação através demétodos assépticos, elidir as máculas advindas da malsinação das relações de consumo,cujo cerne consiste no socorro à parte mais frágil, porquanto mais facilmente logradas,

quais sejam, os consumidores em geral.

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Como se percebe, os verdadeiros responsáveis pelo golpe, para consumá-lo, valeram-seda personalidade jurídica da Cooperativa, apostando na impunidade. Cônscios dosabusos e das ilegalidades cometidas, os diretores e prepostos da COOPHAUNIÃO

 permaneceram anônimos, utilizando sempre o nome da entidade para ilidir qualquer responsabilidade individual.

Entretanto, o patrimônio da referida entidade civil é por demais escasso para ressarcir osdanos causados aos consumidores. A execução promovida pela CEF em razão dainadimplência da Cooperativa, que não efetuou o pagamento do mútuohipotecário, constitui prova inequívoca de sua debilidade financeira. Força éreconhecer que se não houver a desconsideração da personalidade jurídica, osconsumidores não receberão qualquer ressarcimento pelas perdas e danos. O que sepretende assegurar, em última análise, é o resultado útil do processo.

Para evitar, portanto, que os culpados fiquem impunes, o que representaria um sérioestímulo à imoralidade e injuridicidade, cumpre desde já responsabilizar solidariamente

todos os agentes, prepostos e diretores da reclamada que contribuíram para aconsumação do golpe. A continuar como está, jamais haverá a subjugação da Justiça,mas sim o prestígio aos matreiros astutos, pela inocuidade do provimento jurisdicional.

Para que tal iniquidade não ocorra, mister se faz a desconsideração da personalidade jurídica da COOPHAUNIÃO, a fim de que seus dirigentes e demais responsáveiscumpram com o seu dever, indenizando e reparando os danos causados a terceiros.

Certo é que a pessoa jurídica tem existência distinta da de seus membros, cujo capitalnão se confunde com o daquela. Entretanto, isto não os avaliza a praticarem atos que

comprometam o vigor patrimonial da sociedade, mormente quando em prejuízo deinúmeras pessoas.

É o que reza o Código do Consumidor, em seu artigo 28, "caput" e § 5º, "in verbis":

"Art. 28 - O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, emdetrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração dalei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideraçãotambém será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ouinatividade da pessoa jurídica provocada por má administração.

(....).

§5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que suapersonalidade for de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízoscausados aos consumidores".

Este dispositivo legal tem aplicação integral no caso em tela. Ao assumir compromissos perante uma vasta gama de consumidores, os dirigentes da COOPHAUNIÃO utilizarama personalidade jurídica desta entidade, praticando em nome dela atos abusivos, ilegais,criminosos, lesivos e comprometedores de seu balanço financeiro. Receberam odinheiro dos consumidores, embolsando-o, sem contudo efetuar a respectivo repasse à

CEF e sem construir as obras de infra-estruturas prometidas e legalmente obrigatórias.Surrupiaram o patrimônio alheio. Agora, a toda evidência, os verdadeiros culpados, para

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fugir a toda e qualquer responsabilidade, irão querer se ocultar sob o manto da personalidade jurídica da Cooperativa, para frustrar, assim, os escopos instrumentais do processo. O que não é possível.

Daí a necessidade da desconsideração da personalidade jurídica, a fim de sujeitar os

 bens de todos os responsáveis pelos danos causados aos consumidores aos efeitos dasentença condenatória, assegurando o resultado útil do processo.

 Nesse sentido merece transcrição o magistério de Arruda Alvim:

"Inocorrendo suporte da pessoa jurídica para arcar com as conseqüências, o juiz podedesconsiderá-la e responsabilizar o verdadeiro autor da prática do ilícito. Por issomesmo, e principalmente, se a empresa não tiver meios para pagar, poderá o juiz,aplicando o art. 28 em questão, desconsiderá-la condenando o próprio fornecedor".

Mais adiante, acrescenta o emérito jurista:

"Havendo prejuízo, nexo de causalidade entre a prática e o dano e pretendendo estar oresponsável resguardado sob a capa de uma sociedade, esta deve ser desconsidera".

 Neste ensejo, merece destaque a lição da insigne Maria Helena Diniz:

"Ante a sua grande independência e autonomia devido ao fato da exclusão daresponsabilidade dos sócios, a pessoa jurídica, às vezes tem-se desviado de seus

 princípios e fins, cometendo fraudes e desonestidades, provocando reações doutrináriase jurisprudenciais que visam coibir tais abusos; surge a figura da "desconsideração ou

da desestimação da pessoa jurídica", o disregard of the legal entity do direito anglo-saxão, ou da "penetração da pessoa jurídica", o Durchgriff, do direito alemão.

A desconsideração ou penetração permite que o magistrado não mais considere osefeitos da personificação ou da autonomia jurídica da sociedade para atingir e vincular aresponsabilidade dos sócios, com o intuito de impedir a consumação de fraudes eabuso de direito cometidos, por meio da personalidade jurídica, que causemprejuízos ou danos a terceiros". (Curso de Direito Civil Brasileiro - 10 Volume -Teoria Geral do Direito Civil - Editora Saraiva)

Outra não é a orientação jurisprudencial:

"Apelação Cível. Indenização cumulada com perdas e danos. Carência de Ação.Legitimidade passiva do sócio da pessoa jurídica para figurar no pólo passivo daação. Teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Provimento.

É parte legítima para figurar no pólo passivo da ação ajuizada contra empresa quecausou prejuízos ao consumidor, os sócios que por ela são responsáveis, na medida emque sobre eles recairão os ônus da demanda. Aplica-se na espécie a teoria dadesconsideração da personalidade jurídica." (AC, B-XV, 42.169-4. Três Lagoas. Rel.Des. Oswaldo Rodrigues de Mello. 2a Turma Cível Isolada. Unânime. J. 21-03-95. DJ-MS, 05-05-95, pág. 03).

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"Apelação Cível. Embargos de Terceiro. Sócios de sociedade irregular. Falta de bens.Penhora em bens dos sócios. Possibilidade. Teoria da desconsideração da

 personalidade jurídica. Provido.

(...)

 Não encontrados bens de propriedade irregular, é cabível a penhora em bens dos sócios.

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica ajusta-se a casos em que a fraudeé praticada através daquela personalidade." (AC, q, 890. Dourados. Rel. Des. José C. C.Castro Alvim. 2ª Turma Cível Isolada. Unânime. J. 12-02-88. DJ-MS, 18-03-88, pág.07).

"Apelação Cível. Adjudicação compulsória. Transação. Dação em pagamento. Atos praticados por sócio-gerente de sociedade de responsabilidade limitada. Atos ‘UltraVires Societatis’. Desconsideração da personalidade jurídica. Órgão da sociedade.

 Nulidade dos atos praticados. Provida.

(...)

Praticando o sócio gerente da sociedade atos ‘ultra vires societatis’, inescusável que seaproveitou da personalidade jurídica dela. Ocorre, no caso, a chamada desconsideraçãoda personalidade jurídica, pois foi ela o instrumento de fraude ou abuso de direitoimputáveis aos sócios, no caso, ao sócio. (...)." (AC, n, 645. Costa rica. Rel. Des. JoséAugusto de Souza. 2a Turma Cível Isolada. Unânime. J. 15-06-88. DJ-MS, 16-09-88,

 pág. 05).

"Apelação Cível. Ação revocatória. Doação a descendentes. Execuções e falências jáaparelhadas. Insolvência caracterizada. Sócios que avalizaram títulos para a firma.Improvida.

O princípio da impenetrabilidade do absolutismo do direito da personalidade jurídica pode ser afastado pela doutrina da desconsideração quando, numa sociedade por cotasde responsabilidade limitada, composta apenas de pessoas da família, estas avalizamtítulos para a entidade e a sombra da empresa pretendam frustar o cumprimento de suasobrigações." (Acórdão publicado RTJMS -32/122. - AC, m, 732. Campo Grande. Rel.Des. Sérgio Martins Sobrinho, Turma Cível. Unânime. J. 17-12-85. DJ-MS, 21-02-86,

 pág. 12).

Fruto de dilemas intermináveis, a dúvida quanto a responsabilização das pessoas físicas,em razão do inadimplemento das pessoas jurídicas, exauriu-se quando da publicação dosupracitado artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, consagrando-se o princípioda desconsideração da personalidade jurídica da sociedade. É a facilitação da defesa doconsumidor ao vivo e em cores.

O mútuo hipotecário contraído para a aquisição da área, a publicidade enganosa levada para divulgação do negócio, a alienação dos lotes aos consumidores, o não repasse dodinheiro recebido ao agente financiador nem sua aplicação no loteamento para feitura

das benfeitorias legalmente exigíveis, bem como a omissão de informaçõesimprescindíveis à conclusão do negócio jurídico foram obrados pelos prepostos e

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diretores da COOPHAUNIÃO, porquanto, responsáveis diretos pelo cumprimento dasobrigações assumidas e recomposição dos danos causados.

Por outro lado, o artigo 1.518 do Código Civil dispõe que os bens do responsável pelaofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado e,

se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação,acrescentando, no seu parágrafo único, a responsabilidade solidária dos cúmplices, inverbis:

Art. 1.518 – Os bens do responsável pela ofensa ou violação de direito de outrem ficamsujeitos à reparação do dano causado; e, se tiver mais de um autor a ofensa, todosresponderão solidariamente pela reparação.

Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores, os cúmplices e as pessoas designadas no art. 1.521.

A separação absoluta entre a existência da pessoa jurídica de direito privado e a dosseus membros, tal como prevista no artigo 20 do Código Civil Brasileiro, constitui-seem um dos pilares da construção teórica acerca da outorga da personalidade jurídica eagrupamento de pessoas ou bens.

Ocorre que essa estrutura, por si só, não conseguiu evitar fraudes e abusos cometidos. A par disto, o legislador, sabiamente, penetrou no âmago da questão, onde pessoas,mascaradas de personalidade jurídica, enriquecem ilicitamente, deixando consumidoresinocentes à margem de suas pretensões e direitos.

Ora, no caso sub judice não restam dúvidas de que houve efetivo abuso de direito,excesso de poder e infração às regras supracitadas por parte da Cooperativa e seusagentes, causando prejuízos aos consumidores.

Assim, tendo-se em vista o conjunto teórico-probatório exposto nesta peça, estácaracterizada a legitimidade passiva da empresa e das pessoas físicas que a compõe,cujos bens devem sujeitar-se aos efeitos da condenação.

E não se aduza que inadimplência da Cooperativa junto à CEF deveu-se a fatoresexternos à vontade de seus agentes, posto que elemento volitivo (dolo) foi amplamentedemonstrado no decorrer desta peça, bem assim os outros componentes da

responsabilidade civil, quais sejam, evento danoso e nexo causal.

O dolo restou provado na intenção de fraudar, caracterizada pela omissão deinformações. Tanto é verdade que o dinheiro repassado à Cooperativainexplicavelmente desapareceu. Não foi empregado no loteamento, tampouco repassadoà CEF para saldar a dívida hipotecária. Simplesmente sumiu, razão pela qual não se

 pode deixar de indagar: Onde está esse dinheiro? Com certeza alguém o embolsou.Cabe agora responsabilizar os verdadeiros culpados, sujeitando-os aos efeitos dacondenação.

Há de ressaltar, outrossim, que - em se tratando de relação de consumo, muito embora o

dolo esteja fartamente caracterizado - não haveria sequer necessidade de averiguação deculpa, posto que o Código de Defesa do Consumidor consagra a Teoria da

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Responsabilidade Objetiva. Para esta é imprescindível apenas a ocorrência do eventodanoso e do nexo causal que, no caso em comento, estão presentes.

 Neste diapasão, bem pontificam os professores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria B. B.de Andrade Nery:

"A responsabilidade objetiva faz com que os pressupostos do dever de indenizar sejamapenas o evento danoso e o nexo de causalidade".

Deste modo, não se cogita nem sequer a culpa dentre os quesitos reclamados para oajuizamento da competente ação civil pública. Logo, mesmo que os danos tenhamocorrido por motivos alheios a vontade dos agentes da Cooperativa, ficam estes sujeitosàs conseqüências jurídicas daí advindas e, ante a insuficiência da azienda daCOOPHAUNIÃO, respondem por elas seus diretores e preposto.

Ante o exposto, é de se concluir que, mais que tautologia, constitui já um truísmo

altercar sobre a necessidade da desconsideração da personalidade jurídica da entidaderé, a fim de que, amoldando os infratores da lei aos parâmetros da legalidade e damoralidade, sejam eles compelidos a ressarcir os danos efetivados, de forma a expungir qualquer estímulo à ilicitude e imoralidade, garantindo-se também o resultado útil do

 processo.

G) DA NECESSIDADE DA INDISPONIBILIZAÇÃO DOS BENS DOSAGENTES, PREPOSTOS E DIRETORES DA ENTIDADE RÉ PARAASSEGURAR O RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO:

A responsabilidade dos representantes legais da ré já foi claramente evidenciada no itemanterior. Agora, neste artigo, cumpre demonstrar que a indisponibilidade dos bensdessas pessoas torna-se imprescindível para o efetivo ressarcimento dos danos causadosaos consumidores.

A Constituição Federal consagra, em seu artigo 5º, inciso XXXII, o sistema de proteçãoao consumidor, impondo ao Estado o dever de zelar pela lisura das relações deconsumo, vejamos:

"Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do

direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termosseguintes:

(....);

XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor."

O escopo do constituinte foi propiciar o grau máximo de celeridade, presteza eefetividade na tutela de interesses coletivos, evitando com isso a dispersão evulgarização das práticas comerciais abusivas.

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Para tanto impôs ao Estado o dever de zelar por tais interesses, promovendo a defesa doconsumidor através de órgãos especializados e mecanismos adequados ao desempenhodesta missão.

E quando o texto constitucional se reporta ao vocábulo "Estado", o faz na mais ampla

acepção da palavra, referindo-se indistintamente a todos os poderes integrantes doEstado Democrático de Direito. Com efeito, não apenas ao Poder Executivo incumbe odesempenho dessa missão atribuída pela Carta de 1988, mas também ao Poder Legislativo e ao Poder Judiciário.

Assim fica a cargo do Estado-Executor a fiscalização das relações de consumo (hojerealizada pelo PROCON), além da assistência jurídica às vítimas de práticas comerciaisabusivas, atualmente desempenhada pela Defensoria Pública do Consumidor (defesados interesses individuais) e pelo Ministério Público (defesa dos interesses individuaisindisponíveis, homogêneos, coletivos e difusos).

Por seu turno, o Poder Legislativo se obriga a traçar as diretrizes básicas para a defesado consumidor, inovando o ordenamento jurídico com a aprovação de leis queassegurem a efetiva proteção de seus interesses. Nesse campo, aliás, várias foram ascontribuições propiciadas pelo legislador. A título de ilustração, pode-se citar a Lei8.078/90 como exemplo do comprometimento parlamentar com o dever imposto pelaConstituição Federal. Esta lei trouxe inúmeras inovações em matéria de tutela jurídicado consumidor, principalmente no que tange à prevenção e à reparação de danos,nulidade de cláusulas contratuais leoninas e combate às práticas comerciais abusivas.

Por fim, cumpre ao Estado-Juiz, diante de situações concretas que lhe forem

submetidas, apreciar a plausibilidade do direito invocado e o espectro do dano causado,a fim de realizar com imparcialidade a justa composição da lide, adotando as medidasnecessárias à efetiva proteção do consumidor.

Como se vê, a Constituição Federal conferiu ao Estado a árdua missão de promover adefesa do consumidor, tarefa por vezes extremamente difícil. E para consumar na

 prática aquilo que o constituinte anteviu na teoria, os Poderes Públicos devem estar unidos, envidando esforços conjuntos para executar o postulado constitucional.Judiciário, Executivo e Legislativo, cada qual em sua esfera, devem garantir o equilíbrioe a paridade entre comerciantes e consumidores em suas relações costumeiras.

Todavia, esta garantia constitucional seria inócua caso não fossem admitidas, no âmbitode uma relação processual, medidas destinadas a assegurar o resultado útil do processo ea efetiva satisfação da pretensão deduzida em juízo. De nada adiantará obter um

 provimento favorável após vários anos de batalha judicial, se os réus já houveremdilapidado seus respectivos patrimônios, frustrando assim futura execução de sentença

 para o azar dos consumidores.

Para se evitar tamanha injustiça, cumpre tomar-se, ab initio, medidas constritivasincidentes sobre os bens de todos responsáveis pelo ressarcimento, sujeitando-os aosefeitos da sentença que vier a ser prolatada.

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A corrente moderna do Processo Civil, preocupa-se muito mais com a praticidade eutilidade das medidas judiciais, do que com os excessivos rigores formais, que de restosó atravancam o desenvolvimento da técnica processual.

O Direito Processual não mais se apraz com a simples composição da lide por meio da

cognição. Mais que isso, preocupa-se com a efetiva satisfação do crédito ou da pretensão estampada na petição inicial.

Em veras, a prestação jurisdicional não está completamente entregue com o julgamentode mérito, eis que o réu poderá opor-se aos efeitos da condenação, restando ao autor apenas o direito de promover a execução da sentença. E ainda aqui, se o executado não

 possuir bens suficientes para a satisfação do crédito, todos os esforços envidados peloautor serão inúteis, apesar de ter realizado inúmeras despesas para resgatar o crédito,tais como o desembolso de custas judiciais e honorários advocatícios.

Portanto, mister se faz a indisponibilização de todos os bens existentes em nome da

Cooperativa, de seus diretores e de seus prepostos. Com esta medida, garante-se,antecipadamente, o resultado útil do processo, sem o risco de se pleitear um provimentoinócuo ante a escassez patrimonial. Com efeito, o conjunto de bens registrados em nomedos responsáveis pela recomposição dos danos, provavelmente, é assaz vultoso e capazse fazer frente às indenizações pleiteadas.

O Código Buzaid perfilhou com afinco esta nova tendência processual, conferindo aomagistrado, diante de um caso concreto e em hipóteses excepcionais, certa dose deliberdade para adotar as providências necessárias à garantia do regular deslinde do

 processo e da efetiva outorga da prestação jurisdicional, com a conseqüente entrega do

 bem da vida. Trata-se do Poder Geral de Cautela, prerrogativa conferida ao juiz, emfunção do múnus público que desempenha na relação processual.

O Poder Geral Cautelar do juiz atua como um poder integrativo da eficácia global daatividade jurisdicional. Se esta tem finalidade declarar o direito de quem tem razão esatisfazer esse direito, deve ser dotada de instrumentos para a garantia do direitoenquanto não definitivamente julgado e satisfeito.

Através deste poder, o magistrado adota, de plano, as medidas imprescindíveis paragarantir a eficácia de futura sentença de mérito, primando pela presteza e pelaefetividade da tutela jurisdicional. Aliás, muito injusto seria o Direito Processual, caso

não se concebesse tal idéia.

Assim, na concessão de liminares, antecipações de tutela, ou medidas cautelares, ocritério que o magistrado deverá levar em conta, mediante um juízo de certa formadiscricionário, é a garantia de eficácia da decisão que vier a ser proferida, ou seja, agarantia de um resultado útil, o que pode ser aquilatado por dois requisitosfundamentais: o fumus boni juris e o periculum in mora.

  A indisponibilização dos bens registrados em nome dos réus constitui medidaimprescindível ao sucesso da demanda, tendo-se em vista o perigo existente naeventual espera pelo provimento jurisdicional definitivo. O desfecho de qualquer litígio

 judicial demanda tempo, havendo assim fundado receio de danos aos consumidores.Ademais, no caso vertente, mesmo com a decretação da procedência do pedido, os

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consumidores poderão ficar sem obter qualquer ressarcimento, já que os réus poderão, aqualquer tempo, desfazer-se de seus pertences, frustrando os escopos instrumentais do

 processo.

 Não é necessário muito esforço para vislumbrar a enorme área de risco a que ficarão

submetidos os consumidores caso esta medida constritiva não seja decretada deimediato. Com efeito, se isto vier a ocorrer, os réus irão procurar se desfazer de suas posses, alienando ou doando bens de sua propriedade, reduzindo-se à insolvência, tudono afã de se esquivarem à responsabilidade de reparar os danos. E, como a Cooperativatambém não possui patrimônio suficiente para garantir futura execução, já que sequer efetuou o pagamento do mútuo hipotecário, os consumidores ficariam "a ver navios".

Daí a imprescindibilidade da decretação da indisponibilidade dos bens registrados emnome dos réus. Trata-se de uma medida assecuratória e acautelatória, através da qual se

 busca prevenir lesões graves e de difícil reparação, de moldo a tornar efetiva, na prática,a proteção e a defesa do consumidor, em cumprimento ao dever imposto pelo artigo 5º

de nossa Carta Constitucional.

Por outro lado, a fumaça do bom direito elucidou-se no delinear desta exposição. A publicidade enganosa, o dolo e as tergiversações dos réus, o propósito livre e premeditado de auferir ganhos por meios ilícitos, a inadimplência da Cooperativa juntoà CEF, que resultou em prejuízos a terceiros, bem assim as determinações da Lei8.078/90 bastam para vaticinar as conseqüências dos atos praticados pelos réus. Por certo, finda a pendência, o consumidor há de lograr êxito em sua pretensão, quão fortessão os argumentos, consubstanciados na boa-fé e nos imperativos legais. O conjunto dalegislação citada, que se ajusta com perfeição ao caso, torna indeclinável o dever deressarcir o dano causados aos consumidores, ensejando a presença do fumus boni juris.

Essa medida mostra-se indispensável considerando o significativo valor do prejuízo, bem como a real possibilidade de dilapidação do patrimônio e a conseqüente ineficáciado provimento jurisdicional principal.

Consigne-se, ainda, que o direito material acha-se suficientemente demonstrado nosdocumentos que instruem esta inicial, o mesmo ocorrendo com a possibilidade do

 perigo que poderá representar a demora da prestação jurisdicional final conforme járessaltado.

Fica, assim, claramente evidenciada a necessidade de amparo judicial urgente paraafastar de pronto os riscos de perecimento dos bens que representam a garantia deeficácia da sentença de mérito postulada por meio desta ação civil pública.

H) DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR:

A Cooperativa ré, na forma já comentada continua praticando abusos no mercado deconsumo, prejudicando não somente os consumidores como também seus concorrentes,além do que a forma de retomada e revendas dos lotes têm gerado tensão social,contendas judiciais e reclamações diversas.

O "fumus boni iuris" caracteriza-se pela farta documentação e pelas várias reclamações,comprovando lesões à lei e aos consumidores.

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O "periculum in mora" está presente, diante da natural demora de tramitação de umaação coletiva, a qual oportunizará o desvio de patrimônio, dificultará o ressarcimentodos prejuízos ocorridos e ensejará o nascimento de outros danos maiores aosconsumidores.