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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 3 stamos na última edição da Revista de Seguridade Social deste século. Pouca gente atentou ainda para a importância da data, tal- vez porque, como carregamos a velha mania de deixar tudo para a última hora, o espírito de fim de ano – ou de Natal, como preferem alguns – esteja demorando mais um pouco a baixar entre nós. Pode ser. Mas pode ser também por outro motivo. O brasileiro anda meio ressabiado com o fim do mi- lênio. Debaixo da linha do Equador as coisas nunca an- daram muito bem, é verdade, mas resolveram piorar um pouco justamente na virada do milênio ou, se quiser- mos continuar pensando em datas comemorativas, 500 anosdepoisdeCabralporaquiaportar. É bom que se reconheça: da linha do Equador para cima, as coisas andam muito bem, obrigado. Nada contra o bem-estar deles, mas, em tempos de globalização,nãosejamosegoístas.O Sol nasceu para todos. Poraquivivemosinstantesperigo- sos e insuportáveis de anomalia político-institucional, que se traduzem numa crise moral sem precedentes. Se não quiser ler o noticiário, basta olhar a seu redor. A capa desta edição não é montagem. A criança foi foto- grafada a poucos metros do Poder – local ou federal. O que fazer? Mais uma vez, na história política de nossoPaís,nesteséculoXXprestesafindar,asociedade civil brasileira não pode mais esperar pela ação das au- toridades constituídas. Delas, lamentavelmente, não nos têm vindo soluções ou mesmo orientação, mas, inversa- mente, problemas e decepções. Quanto a isso, ao me- nos, não estamos diante de nenhuma novidade. Foi assim ao tempo da ditadura militar. Foi preciso que a sociedade civil se unisse, mostrasse a sua cara, sua vontade, sua determinação, para que o País recupe- rasse suas liberdades fundamentais e retornasse ao Es- tado Democrático de Direito. A campanha das diretas- já, em 1984, que resultou no fim do regime militar e na convocação, dois anos depois, da Assembléia Nacional Constituinte, é um marco memorável nesse processo. Mais recentemente, tivemos outro momento marcante, de mobilização nacional, com o impeachment de Fernando Collor de Mello e o desmonte de um esquema de corrupção dentro da máquina administrativa federal. Hoje, mais uma vez, a sociedade precisa se mobili- zaremdefesadasinstituições,doserviçopúblicoefici- ente, da ética na vida pública, da integridade da ordem jurídica e do Estado Democrático de Direito. Vivemos uma realidade político-institucional em que os gover- nos, em vez de adaptar seus progra- mas à Constituição, fazem o inverso: querem adaptá-la a seus projetos e in- teresses. Quando a lei – e sobretudo a Lei Maior, a Constituição – deixa de ser a referência e o limite do gover- nante e a garantia do cidadão, poden- do ser mudada ou transgredida ao sa- bor das circunstâncias, abre-se uma porta para a desor- dem, a impunidade e a intranqüilidade social. Ela, nesse caso, vira apenas uma lei, vulnerável, como sabemos, ao velho(masmuitoatual)princípiodoscoronéisdapolíti- ca:“Aleiécomoumacerca:quandoéforte,agentepassa por baixo, quando é fraca a gente passa por cima”. Na questão da cobrança previdenciária dos inativos da União era isso que estava em jogo. E os ministros do STF acabaram se transformando em vidraça para ata- ques do Governo e da própria imprensa. É este o quadro que temos. A sociedade civil não pode mais esperar e a ANFIP está consciente de seu papel no novo milênio. É preciso se impor diante das autoridades constituídas e transmi- tir-lhes a gravidade do quadro presente, que não auto- riza acomodações. Editorial Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 3 Asociedadecivilbrasileiranão pode mais esperar pela ação dasautoridadesconstituídas. Delas, lamentavelmente, não nos têm vindo soluções ou orientação, mas, inversamente, problemas e decepções Bem-vindo ao ano 2000 Bem-vindo ao ano 2000 E

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Page 1: aaaaaaaaaaaaaa aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa a … · Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 5 Ao Leitor Um novo formato foi adotado para a nos sa revista, a partir do

Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 3

stamos na última edição da Revista de

Seguridade Social deste século. Pouca gente

atentou ainda para a importância da data, tal-

vez porque, como carregamos a velha mania de deixar

tudo para a última hora, o espírito de fim de ano – ou

de Natal, como preferem alguns – esteja demorando mais

um pouco a baixar entre nós. Pode ser. Mas pode ser

também por outro motivo.

O brasileiro anda meio ressabiado com o fim do mi-

lênio. Debaixo da linha do Equador as coisas nunca an-

daram muito bem, é verdade, mas resolveram piorar um

pouco justamente na virada do milênio ou, se quiser-

mos continuar pensando em datas comemorativas, 500

anos depois de Cabral por aqui aportar.

É bom que se reconheça: da linha do

Equador para cima, as coisas andam

muito bem, obrigado. Nada contra o

bem-estar deles, mas, em tempos de

globalização, não sejamos egoístas. O

Sol nasceu para todos.

Por aqui vivemos instantes perigo-

sos e insuportáveis de anomalia político-institucional,

que se traduzem numa crise moral sem precedentes. Se

não quiser ler o noticiário, basta olhar a seu redor. A

capa desta edição não é montagem. A criança foi foto-

grafada a poucos metros do Poder – local ou federal.

O que fazer? Mais uma vez, na história política de

nosso País, neste século XX prestes a findar, a sociedade

civil brasileira não pode mais esperar pela ação das au-

toridades constituídas. Delas, lamentavelmente, não nos

têm vindo soluções ou mesmo orientação, mas, inversa-

mente, problemas e decepções. Quanto a isso, ao me-

nos, não estamos diante de nenhuma novidade.

Foi assim ao tempo da ditadura militar. Foi preciso

que a sociedade civil se unisse, mostrasse a sua cara,

sua vontade, sua determinação, para que o País recupe-

rasse suas liberdades fundamentais e retornasse ao Es-

tado Democrático de Direito. A campanha das diretas-

já, em 1984, que resultou no fim do regime militar e na

convocação, dois anos depois, da Assembléia Nacional

Constituinte, é um marco memorável nesse processo.

Mais recentemente, tivemos outro momento marcante,

de mobilização nacional, com o impeachment de Fernando

Collor de Mello e o desmonte de um esquema de

corrupção dentro da máquina administrativa federal.

Hoje, mais uma vez, a sociedade precisa se mobili-

zar em defesa das instituições, do serviço público efici-

ente, da ética na vida pública, da integridade da ordem

jurídica e do Estado Democrático de Direito. Vivemos

uma realidade político-institucional em que os gover-

nos, em vez de adaptar seus progra-

mas à Constituição, fazem o inverso:

querem adaptá-la a seus projetos e in-

teresses. Quando a lei – e sobretudo a

Lei Maior, a Constituição – deixa de

ser a referência e o limite do gover-

nante e a garantia do cidadão, poden-

do ser mudada ou transgredida ao sa-

bor das circunstâncias, abre-se uma porta para a desor-

dem, a impunidade e a intranqüilidade social. Ela, nesse

caso, vira apenas uma lei, vulnerável, como sabemos, ao

velho (mas muito atual) princípio dos coronéis da políti-

ca: “A lei é como uma cerca: quando é forte, a gente passa

por baixo, quando é fraca a gente passa por cima”.

Na questão da cobrança previdenciária dos inativos

da União era isso que estava em jogo. E os ministros do

STF acabaram se transformando em vidraça para ata-

ques do Governo e da própria imprensa.

É este o quadro que temos.

A sociedade civil não pode mais esperar e a ANFIP

está consciente de seu papel no novo milênio. É preciso

se impor diante das autoridades constituídas e transmi-

tir-lhes a gravidade do quadro presente, que não auto-

riza acomodações.

Editorial○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 3

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A sociedade civil brasileira nãopode mais esperar pela açãodas autoridades constituídas.Delas, lamentavelmente, nãonos têm vindo soluções ou

orientação, mas, inversamente,problemas e decepções

Bem-vindo ao ano 2000Bem-vindo ao ano 2000

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OrgulhoAcabo de ler a Revista de Seguridade

Social nº 62 e é com um misto de orgu-lho e agradecimento que comecei a re-digir esta correspondência.

Tantos foram e têm sido os nossosproblemas, as nossas angústias e frus-trações no cotidiano da carreira nos úl-timos anos que nos acostumamos a “sóreclamar”. As últimas conquistas daANFIP, os seus planos para o futuro, oacompanhamento do presente e a en-trevista do colega/presidente AntonioRodrigues de Sousa Neto são aconteci-mentos positivos, dignos dos mais pro-fundos e sinceros elogios.

Alfredo A. de Araújo FilhoAuditor Fiscal da Previdência Social

Petrópolis/RJ

Cartas ANFIP

Associação Nacional dos Fiscaisde Contribuições Previdenciárias

SBN, Ed. ANFIP, Quadra 1, Bloco H,Projeção 27 - CEP 70040-907

Brasília, DFFone: (0--61) 225-8113Fax: (0--61) 225-6083

Telex: 61-1452E-mail: [email protected]

Home page: http//www.anfip.org.br

CONSELHO EXECUTIVO

Antônio Rodrigues de Sousa NetoPRESIDENTE

Nildo Manoel de SouzaVICE-PRESIDENTE

Carlos Roberto BispoASSUNTOS FISCAIS

Maria Erbênia Ribas CamargoPOLÍTICA DE CLASSE

Marcelo OliveiraPOLÍTICA SALARIAL

José Avelino da Silva NetoSEGURIDADE SOCIAL

Maruchia MialikAPOSENTADOS E PENSIONISTAS

Rosana Escudero de AlmeidaCULTURA PROFISSIONAL

Roswílcio José Moreira GóisSERVIÇOS ASSISTENCIAIS

Margarida Lopes de AraújoASSUNTOS JURÍDICOS

Misma Rosa SuhettADMINISTRAÇÃO

Maria Salete PazPATRIMÔNIO E CADASTRO

Durval Azevedo SousaFINANÇAS

Luiz Mendes BezerraPLANEJAMENTO E CONTROLE ORÇAMENTÁRIO

Floriano Martins de Sá NetoCOMUNICAÇÃO SOCIAL

Maria Aparecida F. Paes LemeRELAÇÕES PÚBLICAS

Rodolfo Fonseca dos SantosASSUNTOS PARLAMENTARES

Aurora Maria Miranda BorgesINTERASSOCIATIVA

CONSELHO FISCAL

Luiz Gonzaga de Souza - (SC)Maria Oneyde Santos - (PA)

Ronald Ferreira de Aguiar - (DF)

CONSELHO DE REPRESENTANTES

Sérgio Luís Braga Pinto – ACFrancisco de Carvalho Melo – AL

Emir Cavalcanti Furtado – APMiguel Arcanjo Simas Novo – AM

Luiz Antônio Gitirana – BAGilson Ferreira de Mattos – DF

Francisco de Assis Bastos Castro – CENicéa Bof de Andrade – ES

Dalva Pimenta de Souza e Silva – GORaymundo Luiz de Barros – MA

Ivana Maria Fernandes Campelo Barros – MTCarlos Graciano da Silva – MS

Marcos Borbonaglia da Silva – MGÊnnio Magalhães S. Câmara – PA

Dijanete de Souza Lima – PBClea Maria da Silveira Caldas – PEJoão Soares da Silva Sobrinho – PI

Reinoldo Bento dos Santos - PRLizanias Tavares – RJ

Jonilson Carvalho de Oliveira – RNVilson Antonio Romero – RS

Merian Corrêa Brasiliense – ROEzio Luiz Isoppo – RR

Pedro Dittrich Júnior – SCAssunta Di Dea Bergamasco – SP

Jorge Lourenço Barros – SEValter Rodrigues de Oliveira – TO

Publicação da Associação Nacional

dos Fiscais de ContribuiçõesPrevidenciárias.

CONSELHO EDITORIALFloriano Martins de Sá Neto

Carlos Roberto BispoMaria Erbênia Ribas Camargo

José Avelino da Silva Neto

Permitida a reprodução total ou parcial dos textos. Pede-se citar a fonte. As matérias e artigospublicados não refletem, necessariamente, a opinião do Conselho Executivo da Anfip.

DIRETOR RESPONSÁVEL:Floriano Martins de Sá Neto

Esta edição: 20.000 exemplares Distribuição gratuita.

EDITOR:Bartolomeu Rodrigues

REVISÃO:Nadja Lidia da Rocha

EDITORAÇÃO ELETRÔNICA:Licurgo S. Botelho

FOTOGRAFIA: Projeto Luz

CAPA: Foto de Bernadete Brasiliense

SAPIENS COMUNICAÇÃO

(0--61) 328-3532E-mail: [email protected]

OmissãoLendo a reportagem “O rombo da

sonegação” dá para entender por queainda há tantos mi-seráveis neste País,desassistidos deuma política social.Só não dá para en-tender a razão deo Governo não fa-zer nada para

combater mais eficazmente a sonega-ção e aplicar corretamente o dinheiroda arrecadação. Que o Brasil tem com-promissos com credores externos edeve, de alguma forma, honrar com suasobrigações, todos entendemos. Agora,tirar da boca dos mais pobres para en-cher a barriga dos mais ricos do Primei-ro Mundo, isso ninguém entende, nemaceita. Parabéns pela reportagem.

Moacyr Ferreira DantasBelo Horizonte/MG

QualidadeGostaria de parabenizar a ANFIP

pela excelente qualidade da Revista deSeguridade Social que, sem dúvida, éuma importante fonte na busca de me-lhor qualificação de nossos quadrospolíticos.

Marcos CintraDeputado Federal

Brasília/DF

MoratóriaJá era tempo de o Governo brasilei-

ro bater forte na mesa e parar de man-dar dinheiro para o FMI.

Cleusa NogueiraSobradinho, Brasília/DF

u s t u s t

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 5

Ao Leitor

Um novo formato foi adotado para a nos

sa revista, a partir do atual bimestre. Do

ponto de vista de visualização gráfica e edito-

rial, nada mudou. A novidade se resume à qua-

lidade do papel e ao tamanho, ligeiramente

modificado para se adequar às necessidades

de impressão. A revista está mais leve e isso

refletirá, obviamete, no custo da postagem. O

fato é que, com seus oito anos de vida, 63 edi-

ções, ela conseguiu quebrar a idéia segundo a

qual uma publicação institucional segue um

padrão marcadamente corporativo, dirigido a

um público específico. No nosso caso, ocorre o

contrário. Com um público leitor variado e

diante do interesse em aprofundar temas mui-

tas vezes relegado a um segundo plano pela

mídia tradicional, a revista precisou se moder-

nizar. Para isso, foi adotada uma estratégia

de duas etapas: um novo projeto editorial

e um novo projeto gráfico. Esse último, teve

início ainda no ano passado e se consolida ago-

ra. Pretendemos, dessa forma, continuar ofe-

recendo reportagens que mostrem o verso e

reverso de uma questão, entrevistando pessoas

interessantes que realmente tenham algo a di-

zer, fornecendo análises sobre os números da

seguridade social e, obviamente, desejamos

atingir um público bem maior (e variado) de

brasileiros. Estamos, por exemplo, chegando

às prefeituras por intermédio da nossa mala-

direta, com distribuição gratuita. Pode ser uma

meta ambiciosa chegar a todos os municípios,

mas pode ser também uma boa maneira de

entrar no novo milênio com o pé direito.

Boa leitura!

Sumário○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ENTREVISTAJosé Serra quer fiscalizarplanos de saúde

6

Fazendo água: os problemasda previdência no Chile

9

A controvérsiasobre o déficitda Previdência

22

Impostos: quemganha e quemperde com oRefis

26

A luta pelos direitosdos aposentadosainda não acabou

13

Panorama: no país dasmedidas provisórias

17

CAPAA dívidabrasileira e osacrifício dosmais pobres

18

Sua saúde: muitocuidado com ouso do celular

28

Artigo: Reginaldode Castro fala deloucos e caras-de-pau

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Foto: José Humberto/Projeto Luz

Foto: Bernadete Brasiliense/Projeto Luz

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6 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Entrevista○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

om uma atuação que tem me-recido elogios até mesmo deadversários políticos, o sena-dor José Serra (PSDB) derru-

bou o mito segundo o qual ser ministroda Saúde no Brasil, onde existem mais pro-blemas do que recursos, é como herdarum abacaxi. “Na verdade, é uma distin-ção”, diz. Segundo ele, a crônica falta dedinheiro vem sendo gradualmente resol-vida e já é possível se pensar num saltode qualidade para atender às populaçõesmais carentes. O ministro espera dar essesalto corrigindo um erro histórico: a faltade investimento para a atenção básica. “Asfilas nos hospitais existem porque a do-ença não foi evitada por meio de açõesbásicas”, afirma Serra.

Nesta entrevista, o ministro conta oque vem sendo feito para combater asfraudes na rede do Sistema Único deSaúde (SUS) e anuncia a criação de umaagência, independente, para fiscalizaros planos de saúde privados. Outro se-tor que tem recebido atenção do minis-tro envolve os grandes laboratórios fa-bricantes de remédios. Para provocar aqueda de preços, Serra promete se em-penhar na divulgação dos remédios ge-néricos e manda um aviso aos lobistas:“Eles não perdem por esperar, por-que o ministro da Saúde vai sergaroto-propaganda dos genéri-cos”. A seguir, a entrevista do mi-nistro concedida ao jornalista

Bartolomeu Rodrigues.Revista de Seguridade Social – Mui-

tos de seus antecessores deixaram a pastareclamando que a falta de dinheiro vemfazendo do Brasil um país cada vez mais

Descascando o abacaxiO ministro José Serra diz quea Saúde está preparadapara um salto dequalidade e anuncia acriação de uma agênciapara fiscalizar os planosde medicina privados

JOSÉ SERRA

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Descascando o abacaxi

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doente. É um abacaxi ser ministro daSaúde?

José Serra – É verdade que temosmenos dinheiro do que problemas naárea de saúde pública, mas também éverdade que os recursos vêm aumentan-do. Eles passaram de R$ 13,2 bilhões em1995 para quase R$ 15 bilhões na rubri-ca OCC do Orçamento da União em 1999,em valores médios. No total, são mais deR$ 19 bilhões. Mas há também muitaslendas em torno do assunto. Uma delasé a de que os recursos da CPMF são desvi-ados para outros setores, o que é falso. Oque ocorreu foi um deslocamento de ou-tras fontes, que eram da Saúde, como aCofins e a Contribuição Social sobre oLucro das Empresas, hoje destinadas à Pre-vidência. Na renovação da CPMF pelo Con-gresso, a parte destinada à Saúde mante-ve-se intacta e é repassada integralmen-te. O excedente, com o aumento daalíquota, é que tem outro destino, mas issojá estava previsto no projeto aprovado.

Seguridade Social – Mas não há sem-pre o risco de eventuais cortes no Orça-mento?

José Serra – O Governo vem garan-tindo, como disse, um aumento nos re-cursos. Então, ser ministro da Saúde nãoé um abacaxi, é uma distinção e umagrande responsabilidade. Nesse momen-to, estamos, ao contrário do que supõea pergunta, muito próximos de um novoaumento de recursos e, mais importanteainda, da garantia de que eles estarãovinculados ao PIB nominal. No momentoem que conversamos, está em aprecia-ção no Senado a proposta de emendaconstitucional, já aprovada na Câmara,que vincula os recursos da Saúde ao PIBnominal. Se for aprovada, como espera-mos, já no próximo ano teremos um au-mento no Orçamento da União para aSaúde correspondente ao crescimentonominal do PIB.

Seguridade Social – E a parte dos Esta-dos e dos municípios?

José Serra – Atualmente, de cadaR$ 10 que são aplicados em saúde noPaís, R$ 7 são recursos federais. Há mu-nicípios que aplicam muito em saúde eoutros, quase nada. Pois a emenda esta-belece que Estados e municípios apli-quem, já em 2000, no mínimo, 7% de seusOrçamentos na Saúde. Esse percentualaumentará gradualmente, até chegar, em2004, a 12% para os Estados e 15% paraos municípios. De qualquer forma, di-nheiro não é o único problema nem aúnica solução, pois é preciso mudar paramelhor o financiamento e a gestão.

Seguridade Social – E como evitar odesperdício e o desvio?

José Serra – Para dar um exemplo, empouco mais de um ano, só com a revisãode contratos de fornecedores de servi-ços de limpeza, lavanderia e material deconsumo, como oxigênio e outros gases,para os hospitais administrados pelo Mi-nistério da Saúde no Rio, conseguimosuma economia de R$ 30 milhões. Era di-nheiro desperdiçado em contratos ruins,mas suficiente para manter um grandehospital funcionando por um ano. Quan-to às fraudes, um bom exemplo são ascartas que passamos a mandar para quemé atendido em UTI e para todas as mu-lheres que fizeram parto na rede do SUS.Perguntamos se receberam, realmente, oatendimento que os hospitais cobraramdo SUS. É impressionante a quantidadede respostas indicando hospitais quecobram pelo que não fizeram.

Seguridade Social – Sem as cartas nãoseria possível descobrir as fraudes?

José Serra – Em muitos casos, essasfraudes ocorrem com a conivência ou aomissão da Secretaria Municipal de Saú-de, que deve fiscalizar o uso do dinheirodo SUS. Quando isso ocorre, o municí-pio perde o direito de administrar os re-cursos e fica sob intervenção. Agora, emnovembro, descredenciamos as prefeitu-ras de Cabo Frio e de Nova Friburgo,ambas no Estado do Rio, e o Governo do

Estado de Roraima, por causa de irregula-ridades na gestão do dinheiro do SUS.Enfim, pedimos ao cidadão para fiscalizaro SUS e a resposta tem sido excelente.

Seguridade Social – Por falar em dinhei-ro, os recursos da Seguridade Social desti-nados à Saúde vêm sendo repassados inte-gralmente pelo Tesouro? Como ele chega aosmunicípios?

José Serra – Recebemos e repassamosnormalmente, de acordo com a Consti-tuição, os recursos do SUS aos municípi-os. Os repasses podem ser acompanha-dos por qualquer cidadão pela Internet.Boa parte deles tem gestão plena sobreesses recursos, mas estamos introduzin-do novidades em benefício da população.A primeira foi a criação do Piso de Aten-ção Básica, o PAB, que destina a cadamunicípio R$ 10 por habitante ao ano. Éum dinheiro para as prefeituras aplica-rem em ações básicas de saúde, açõespreventivas, que não apenas evitam asdoenças mas também reduzem a deman-da por serviços mais complexos nos hos-pitais. Aliás, a atenção básica é a nossaprioridade e acreditamos nela parareestruturar totalmente o modelo deatenção à saúde no País.

Seguridade Social – Reestruturar em quesentido?

José Serra – No sentido de garantirverdadeiramente atenção à Saúde e dei-xar de ser um ministério da doença. Nasultimas décadas, investiu-se muito pou-co na assistência básica no País, o quefoi um grande erro. Países como o Cana-dá, a Inglaterra e Cuba, onde há muitotempo se faz isso, resolvem mais de 80%dos problemas de saúde nas unidades bá-sicas, nos postos de saúde, ficando ape-nas um pequeno percentual para os ser-viços mais complexos e especializados.As filas nos hospitais existem porque adoença não foi evitada por meio de açõesbásicas, como a vacinação, o controlede endemias, o ensinamento de noçõesde higiene, o combate às carências

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8 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-998 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Entrevista○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

nutricionais, o acompanhamento da ges-tação com exame pré-natal, o acompa-nhamento das crianças nos primeiros me-ses de vida etc.

Seguridade Social – Como é que oMinistério da Saúde pode promover essaassistência?

José Serra – Sozinho ele não promo-ve, mas estamos apontando o caminho.A prioridade do Ministério, hoje, é o Pro-grama Saúde da Família, que já tem maisde quatro mil equipes, atuandoem conjunto com os agentes co-munitários de saúde. É um pro-grama que desenvolvemos jun-to com as secretarias municipaisde Saúde e com os Estados, querequer e permite um grandeenvolvimento das comunidadese de outros parceiros. As equi-pes do Saúde da Família são for-madas por um médico, um en-fermeiro, um auxiliar de enfer-magem e ate seis agentes comu-nitários de saúde. Elas já acom-panham, perto de casa e atédomiciliarmente, quando neces-sário, mais de 14 milhões de pes-soas em 1.600 municípios. Nossameta é ter 20 mil equipes em trêsanos, o que possibilitará atenderà metade da população brasileira, de for-ma, inclusive, mais humana do que noshospitais. Investindo cada vez mais, vamostornar esse programa irreversível.

Seguridade Social – Certamente porcausa do modelo que o senhor descreveu, asaúde pública entrou em crise, levando 40milhões de brasileiros a pagar planos pri-vados de saúde. Essa rede de planos tam-bém tem muitos problemas. O que está sen-do feito em relação aos planos?

José Serra – O primeiro e importan-tíssimo passo foi a aprovação, pelo Con-gresso, de legislação regulamentando osplanos de saúde, algo que levou 30 anospara ser feito. Seguiu-se a edição de me-dida provisória que, em sua última edi-

ção possibilitou uma fiscalização aindamais eficaz por parte do Ministério daSaúde. Os planos privados estão tendode se adaptar às novas exigências, sem-pre em benefício do consumidor. Ficaproibida a exclusão de doenças, que eraa maneira que muitos empresas encon-travam para aumentar seus lucros, aban-donando o cliente à própria sorte, mes-mo depois de anos de contribuição. Issonão vai acontecer mais. O próximo pas-

so, para encerra essa fase, será a criaçãode uma agência nacional independente,para cuidar especificamente dos planosde saúde.

Seguridade Social – Quais serão os po-deres dessa agência?

José Serra - Ela fiscalizará os planossob todos os aspectos: o equilíbrio finan-ceiro, os preços cobrados, reajustes e, oque é muito importante, a qualidade dosserviços oferecidos. Ela também será im-portante para garantir a confiabilidade dosistema. Quando uma empresa de planode saúde quebra, o que acontece com oconsumidor? A agência terá de preversituações desse tipo e criar condiçõespara que o associado não seja prejudica-

do em seus direitos. Se esse sistema, quehoje atende 40 milhões de pessoas, fun-cionar bem, diminuirá a pressão sobre oSUS. Aliás, outra medida muito importan-te que já tomamos foi exigir dos planosde saúde o cadastro de seus associados.Muita gente que é atendida no SUS templano de sáude, mas quem paga a contaé a sociedade. Com o cadastro em mãos,nós vamos exigir dos planos o ressarci-mento pelo atendimento do SUS aos seus

associados.Seguridade Social – Nas últimas

semanas, uma grande campanha foilançada pela Abifarma alertandocontra o uso de medicamentos ge-néricos. Ela tem razão?

José Serra – Na verdade, háduas campanhas. Essa mais for-te, da Abifarma, que representaos grandes laboratórios, e que écontra os genéricos porque sãomedicamentos mais baratos, quevão tomar mercado dos remédiosde marca. A outra é a dos labora-tórios que fabricam medicamen-tos chamados “similares”, quetambém são mais baratos, masnão são a mesma coisa que os ge-néricos. O genérico, que tem onome do princípio ativo do me-

dicamento, só pode ser vendido depoisde passar no exame de bioequivalência,isto é, depois que ficar provado que eletem exatamente as mesmas qualidadesque o remédio de marca e que é absorvi-do pelo organismo humano da mesmaforma. No início do ano, os genéricos es-tarão sendo produzidos e, em algum tem-po, vão produzir um efeito de baixa nospreços dos remédios de marca. O primei-ro impacto positivo será para a rede hos-pitalar, que é a maior consumidora de re-médios. Logo em seguida, o benefícioserá percebido pelo consumidor nas far-mácias. Os lobistas não perdem por es-perar, porque o ministro da Saúde vai sergaroto-propaganda dos genéricos.

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 9

Privatização

Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

por Antonio Carlos Camposde Brasília

decisão do Chile de implan-tar um sistema de previdên-cia social baseado na priva-tização, inicialmente apon-

tado como “farol” de inspiração para ossistemas previdenciários da AméricaLatina e que chegou a ser “a menina dosolhos” de diversos economistas e

governantes brasileiros, é avaliada,hoje, como um grande passo em falso.Os chilenos estão assustadíssimos como custo, para o Estado, representadopela transição do regime previdenciáriopúblico para o sistema privado, inicia-do em 1981 pela ditadura de AugustoPinochet. O ônus dessa mudança, 18anos depois, está-se tornando um pe-sadelo para as contas públicas chilenas.

Estudo do Ministério da Fazendachileno sinaliza para um déficit anual(diferença entre as contribuições arre-cadadas e os benefícios pagos) equiva-lente a 6% do Produto Interno Bruto(PIB) daquele país em 1999, por contadessa transição. Antes da reforma, essecusto para os cofres públicos chilenoschegava a 3,8% do PIB e a estimativa erade que esse déficit não passaria de 2%nessa virada de século. Mas o que seconstata, hoje, é algo bem diferentedaquelas previsões. As projeções ofi-ciais chilenas são de que a média anualdos gastos com a previdência pelos co-fres públicos será ainda, na melhor dashipóteses, de 4,3% do PIB entre 1999 e2037.

Custo subestimado – Para o secre-tário de Previdência do Ministério daPrevidência e Assistência Social, Viní-cius Pinheiro, que recentemente parti-cipou, em Santiago, do seminário “Res-ponsabilidades Fiscais dos Sistemas dePrevidência”, o alegado susto das auto-ridades chilenas sobre seu novo regimeprevidenciário não deveria constituir

O GRANDEPASSO EM FALSO

Há 18 anos considerada ummodelo para a América Latina, a

privatização do sistema deprevidência do Chile, hoje,

transformou-se em um pesadelopara as contas públicas

CHILE O GRANDE

PASSO EM FALSO

A

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1 0 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Privatização○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Ao passar do sistema derepartição para o de

capitalização, o governo chilenoinventou para a previdência acorda com que agora ambos

estão se enforcando

nenhuma surpresa. “O fato é que os cus-tos dessa transição foram subestima-dos”, afirma Pinheiro, para quem a mu-dança do regime previdenciário no Chi-le foi muito radical. Segundo ele, essealto déficit ocorreu devido a diversosfatores que envolveram a decisão de sepassar de um sistema público de repar-tição (onde os ativos pagam os benefí-cios dos inativos) para um regime pri-vado de capitalização individual (cadaum contribui para sua aposentadoria emfundos de pensão privados).

“O novo sistema chileno foi pensa-do, por exemplo, considerando um mer-cado de trabalho em que a maioria daspessoas contribui por um tempo maior,em torno dos 40 anos, o que não se con-firmou”, analisa Vinícius Pinheiro. Ooutro fator é que o governo também foigeneroso no reconhecimento do tem-po anterior de contribuição dos segu-rados e na concessão dos benefíciosmínimos assistenciais. Além disso, o sis-tema era antigo, com alta coberturapopulacional, que está envelhecendo”.

Uma das principais distorções estáno fato de que o sistema, a partir de1981, tornou-se obrigatório para quemingressava no mercado de trabalho e

opcional para quem já estava no siste-ma estatal, instituído em 1920. Os tra-balhadores do antigo sistema, quandofaziam a opção por um fundo privado –criado em 1981 e operado exclusiva-mente com contribuições dos segura-dos, que são de 10% do salário, sem li-mites –, levavam os chamados “bônusde reconhecimento”, que eram títuloscom valores equivalentes ao tempo deserviço no sistema anterior.

Através desse mecanismo, o gover-no chileno tem de resgatar esses bônusde reconhecimento por ocasião da apo-sentadoria (e ele não dispunha dessesrecursos, já que o que arrecadava antesda reforma não dava para pagar os be-nefícios concedidos, fato que o obrigoua aumentar seu déficit). Além disso, ogoverno, pela reforma, banca uma

complementação de aposentadoria mí-nima, além de ficar responsável poraqueles que não optaram pelos fundosde previdência privados e por militarese outros funcionários que têm um regi-me próprio.

No final, o que se verifica, hoje, éque os fundos privados não atendem aonúmero de pessoas que, inicialmente,na reforma, se projetava. Além disso, se-gundo os dados governamentais, maisda metade dos optantes não conseguepoupar o suficiente para custear o be-nefício mínimo, exigindo, do governo,contrapartida ou complementação, naforma de subsídios previstos na legisla-ção da mudança do regime.

De acordo com o Ministério da Fa-zenda do Chile, mais de 50% das aposen-tadorias têm garantido o recebimento dovalor mínimo porque os segurados não

Quanto custa a transiçãode um regime para outro

As perspectivas dos custos da transi-ção do regime previdenciário emoutros países da América Latina (alguns

adotaram regime misto),segundo um es-tudo do Minis-tério da Previ-dência e Assis-

tência Social (MPAS) a

Idades para aaposentadoria

País Homem MulherAlemanha 65 65França 65 65Reino Unido 65 60Itália 62 57Espanha 65 65Portugal 65 65Suécia 65 65Estados Unidos 65 65Canadá 65 65Argentina 64 59Chile 65 60Uruguai 60 56Paraguai 60 60México 65 65Japão 65 65Brasil(*) 60 55

(*) Na fase de transição adotada pela reforma daPrevidência, as idades mínimas são 53 (homem ) e 48(mulher); No setor privado, ainda não há idade mínima paraa aposentadoria integral.

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 1 1

conseguiram acumular o suficiente (noregime de capitalização) para receberembenefício igual ao salário da ativa. Resu-mo da história: quem pagará a conta sãoos cofres públicos, concorrendo para oexpressivo déficit de 6% do PIB represen-tado pela Previdência.

O estudo do Ministério chileno con-clui alertando que o governo terá deadotar medidas para evitar que o au-mento das aposentadorias de valor mí-nimo e os benefícios assistenciais aca-bem desestimulando a contribuição sis-temática do regime de capitalização.Ou seja, ao passar do sistema de repar-tição para o de capitalização, o gover-no chileno inventou para a previdênciaa própria corda com que agora ambosestão solidariamente se enforcando.

Estratégia – A privatização da pre-vidência chilena teve apoio popular noinício, devido ao desgaste da previdên-cia pública provocada pelo seu sucatea-mento. Para o economista Dércio GarciaMunhoz, professor da Universidade deBrasília (UnB), o Brasil está indo no mes-mo caminho. “Vamos acabar privatizan-do à la Chile a nossa previdência, que éum regime de repartição simples (os ati-vos recolhem para que se paguem aos

que a Revista de Seguridade Social teveacesso:

Uruguai, Chile e Argentina – Popu-lação mais envelhecida e sistemasprevidenciários mais atingidos (67 e 80anos). A cobertura está entre 60% e 80%dos participantes. Custos mais altos.

Bolívia e El Salvador – Populaçãomais jovem e regimes mais recentes (en-tre 43 e 45 anos). A cobertura é mais

baixa (12% a 23%). Custos mais baixos.

Colômbia, México e Peru – Sistemasprevidenciários criados entre 54 e 61anos e cobertura de 32% e 38%. Custosintermediários.

Obs: A transferência de todos os se-gurados para um novo sistema geraum déficit altíssimo. Mas o estabeleci-mento de restrições à concessão dosbenefícios e aporte de recursos pode

aliviar esse rombo e tornar aindamais suave a transição. Os fatoresque determinam o custo da transi-ção: a idade da população, o tem-po de existência do sistema de pre-vidência, percentual de trabalhado-res que participam, o número desegurados que se transferiram parao novo programa, as responsabili-dades da previdência pública e suasituação financeira, as condições deobtenção dos benefícios do sistemaanterior.

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Munhoz: A tática do Governo é

sucatear a Previdência para

justificar a privatização do sistema

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Privatização○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Segundo o economistaDércio Munhoz, ao insistirno modelo de capitalizaçãoda previdência, o Brasilvai repetir os mesmos

erros do Chile

inativos) dos mais eficientes que já fun-cionou em todo o mundo”. Munhoz en-tende que o próprio Governo está,maquiavelicamente, engendrando essasituação.

Para o economista, ao impor o limi-te mínimo de 35 anos de contribuiçãopara as aposentadorias e criar mecanis-mos como a “caderneta” de contribui-ções, o Governo está, na verdade, mi-nando e desestruturando um sistemaque funcionava bem. “Agora, ele fingetratar como regime de capitalização umregime que é repartição simples, mas,nessa bagunça, acaba não sendo nemuma coisa nem outra, e nem tampoucoum regime misto. A conseqüência seráa liquidação de um sistema que funcio-nou com grande eficiência até aquicomo foi o de repartição simples”, aler-ta o professor.

“Num país em que mais da metadepopulação economicamente ativa nãotem carteira assinada, com o desempre-go atingindo e cerca de 20% da força detrabalho e em que informalidade na eco-nomia avança, a chamada reforma da pre-vidência vai lograr o trabalhador. Ele nãovai nunca alcançar 35 anos de contribui-ção para aposentar-se, ao passo que ospoucos que cumprirem essa regra vãoacabar se aposentando com salários bemabaixo dos últimos anos, pelas normasvigentes”, analisa Dércio Munhoz. Naavaliação dele, a conseqüência naturalvirá na forma de protestos dos trabalha-dores, ao se sentirem ludibriados pelaPrevidência. Aí estarão, na sua opi-nião, criadas as condições que o Go-verno deseja para a implantação de-finitiva de um regime plenode capitalização (o trabalha-dor recebe como aposenta-doria aquilo que contribuiudurante o tempo de serviço emfundos de pensão privados).

“É a mesma estratégia que o Gover-no usou para chegar à privatização dastelecomunicações: ele descapitalizou asempresas estatais, impediu os investi-mentos, sufocou-as de tal forma quehouve uma grita geral da população, deSão Paulo, principalmente – que maissofreu com a falta de novos investimen-tos -, pedindo a privatização desse ser-viço para sair do estrangulamento”, lem-bra o economista. Munhoz acha que omesmo pode ocorrer com o sistemaprevidenciário, “desestruturando-o porcompleto”.

Para o economista, “o que está ocor-rendo em relação ao sistema previden-ciário do País é extremamente lamentá-vel”. Ele afirma que a previdência urba-na sempre foi superavitária e, com isso,cobria ineficiências da previdência e as-sistência social da área rural. Mesmo quea Constituição de 1988 tenha criado me-canismos para financiar a previdência ru-ral e os benefícios da renda mensal vita-lícia, destinando a ela parte do recolhi-mento da Cofins e da Contribuição So-

cial sobre Lucro Líquido, segundo ele, foia previdência urbana que continuou sub-sidiando a rural ultimamente. “Isto por-que o governo desviou para toda sortede subsistemas previdenciários esses re-cursos”.

Munhoz afirma que há muito o Go-verno brasileiro tenta implantar um re-gime de capitalização na previdência,mas, inicialmente, enfrentou resistên-cias no Congresso, que só admitia essapossibilidade para quem ganhasse aci-ma de 10 salários-mínimos mensais –até esse limite ficaria coberta pelo re-gime estatal. Ele tentou introduzir essesistema também recentemente com umplano do economista André LaraResende. Ex-presidente do BNDES, LaraResende trabalhava no Palácio do Pla-nalto num projeto de privatização doregime previdenciário quando foi obri-gado a pedir demissão, envolvido noescândalo que ficou conhecido como o“Grampo da Telebrás”.

Na opinião do professor Munhoz, “oGoverno agora busca mesmo introduzira chilenização da previdência no Brasil,sucateando-a até que os próprios traba-lhadores, cansados de serem ludibriados,peçam a sua privatização, como ocorreucom as teles”. Uma perspectiva nadaagradável para os trabalhadores e para asociedade brasileira, em geral – pois oque se verifica, pelo exemplo do Chile, éque, no final, todos terão de pagar a con-ta do desastre. O déficit do INSS, hoje,

corresponde, segundo o Gover-no brasileiro, a cerca de 1%do PIB, ou cerca de U$ 9 bi-lhões. Na perspectiva de setrilhar o mesmo caminhodo Chile, esse custo iriaU$ 54 bilhões – mais queo dobro de tudo que se

gasta hoje em aposentado-rias e pensões no País.

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por Gerson Menezesde Brasília

inguém é obrigado a fazerou a deixar de fazer qualquercoisa, a não ser em virtudeda lei.

O velho axioma parece desgastadodiante da enxurrada de críticas que de-sabou sobre o Supremo Tribunal Federal(STF), quando a mais importante Cortedo País decidiu, em virtude da Lei mai-or (a Constituição), derrubar a cobran-ça de contribuições previdenciárias paraservidores aposentados e a pro-

gressividade de alíquotas para os servi-dores da ativa.

Sob a batuta das pressões governa-mentais, os grandes jornais e revistasde circulação nacional foram tomadosde verdadeira febre de histeria anticons-titucional, estabelecendo-se, a partirdaí, sintomaticamente, um clima depânico destinado a facilitar – o que aca-bou ocorrendo – a aprovação de dispo-sitivo que estabelece outro confisco.Dessa vez, dos trabalhadores da inicia-tiva privada, que vão amargar uma drás-tica redução no valor de suas já mirra-

das aposentadorias, ainda que sigam àrisca todos os requisitos até então vi-gentes para se aposentarem.

O balanço não poderia ser mais ne-gativo para um final de século. A par derepresentar uma apologia da desobedi-ência à Lei Maior do País, a ação doGoverno está longe de representar aabertura de um franco debate sobre aquestão previdenciária, limitando-seaos “tapa-buracos” que, ao final, se re-duzem à extorsão dos que têm menospoder político para reagir.

Afastando-se de sua missão precípuade investigar, a chamada grande impren-

Aposentados

O que foi um simplescaso de obediência àConstituição vira assuntopredileto da imprensa eministros do STF são atécomparados a “loucos”

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Plenário doSupremo em

Brasília durante

julgamento daADIN. Ao lado,

fac-símile doartigo em The

Economist:

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Decisão de juízoDecisão de juízo

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1 4 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Aposentados○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

sa brasileira limita-se a absorver os nú-meros oficiais sobre supostos déficits,sem debruçar-se sequer sobre um exa-me mais criterioso de como ele se pro-duz, com a expressiva participação dequem o alardeia – o próprio Governo.

Na conta de um mais um, produz-seo zero: nada de novo surge no horizon-te, além da reincidência do Governo emsua sanha pelo corte de benefícios, queatinge a todos os trabalhadores. De umlado, os da iniciativa privada vêem re-duzida uma aposentadoria já de longeinsuficiente para arcar com as necessi-dades básicas. De outro, os servidorescivis, sufocados por quase cinco anossem reajustes salariais, assistem empânico às reiteradas tentativas do Go-verno em avançar sobre seus defasadosvencimentos, que estarão ceifados emquase 50%, caso se estabeleçam novosdescontos além dos que já estão emvigor.

Como tábua de salvação, o presiden-te Fernando Henrique Cardoso tentabuscar na proposta do deputado Eduar-do Jorge (PT-SP) um consenso que nãoexiste sequer na oposição, embora setrate de um projeto petista. Uma dasdificuldades maiores é exatamente a

resistência oficial em abrir as contas demodo a viabilizar a reestruturação to-tal do sistema, pressuposto básico paraque possa haver confluência de interes-ses por uma proposta realmente séria.

O líder do PT, deputado JoséGenoíno (SP), tem reiterado sua convic-ção de que a seriedade do debate nãoé exatamente a meta do Governo, “quejá desfigurou” a Previdência com suasiniciativas “tapa-buracos” e estaria dis-posto a apenas dividir o ônus políticocom as esquerdas.

Trapalhadas – A exemplo de quan-do criticou a morosidade do Congres-

so, pedindo desculpas emseguida, o presidente daRepública encarregou-sede transformar os desdo-bramentos da decisão doSupremo numa trapalha-da recheada de contradi-ções. Por intermédio dosecretário-geral da Presi-dência da República,Aloysio Nunes Ferreira,travestido de porta-voz,considerou de início“chocante” a decisão doSupremo. Em seguida, foi

a vez de o próprio Fernando Henrique,em reunião com os líderes governistas,admitir que o STF agiu corretamente,“do ponto de vista jurídico”. O presi-dente teria, inclusive, dito que, “se es-tivesse lá (no tribunal) também votariacontra a contribuição”.

O presidente do Supremo irritou-secom o destempero verbal da renomadapublicação inglesa The Economist, cha-mando os ministros de “loucos”. Emcontrapartida, segundo matéria publi-cada pelo Jornal do Brasil, o ex-diretor-executivo do fundo de pensão dos servi-dores do Estado de Nova York e doutor

A ANFIP, que estevepresente em todas as lutasdestinadas a livrar os ser-vidores públicos da sanha

confiscatória oficial, tem se pau-tado pela apresentação de dados einformações que desmitificam oeterno “discurso do déficit”, a mola-mestra daquilo que o líder petistaapelidou de “saco de maldades”,

aparentemente destinado – segundo aabalizada opinião de especialistas – aapresentar satisfações ao Fundo Mone-tário Internacional (FMI). A par disso, aANFIP tem pregado constantemente aadoção de ações saneadoras das con-tas públicas que surtiriam efeito mui-tíssimo mais significativo do que todosos cortes, confiscos e sacrifícios quepretendem impor aos aposentados.

Basta olhar os números: as dívidasacumuladas para com o INSS, porexemplo, superam os R$ 50 bilhões,enquanto a arrecadação resultante dodesconto previdenciário de aposenta-dos e pensionistas somaria parcos R$2,4 bilhões, muito aquém do alegadodéficit, cujos números variam confor-me a fonte de informação, podendomesmo transformar-se em superávit,caso sejam adotados conceitos maiscriteriosos para se efetuarem os cálcu-los. Não é o que o Governo faz. As as-

A conta que não fecha

Ministro Celso de Melo: autor do parecer que chocou o Governo

Foto: Bernadete Brasiliense/Projeto Luz

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em Direito, Joseph Metz, admitiu que aSuprema Corte dos Estados Unidos teriaadotado postura idêntica à da mais altacorte brasileira, em defesa dos direitosadquiridos dos servidores públicos.

Confisco dos pobres – Mas direitoadquirido não é o forte do Governo bra-sileiro, muito menos a obediência acláusulas contratuais. Os servidores pú-blicos, valendo-se da legítima pressãode suas entidades representativas, con-seguiram escapar ao confisco represen-tado pelo redutor de 30% em seus ven-cimentos – luta da qual a Anfip colheuhistórica vitória, após lançar, compioneirismo, a campanha de aerogra-mas para convencer os parlamentaresdo absurdo do confisco salarial.

Os trabalhadores da iniciativa priva-da não tiveram a mesma sorte. No dia 6de outubro, por 301 votos a favor e 157contrários, assistiram a mais uma gar-fada nos valores já insignificantes desuas aposentadorias – cujo teto de R$1.255 alardeado pelo Governo, que di-ficilmente era alcançado por qualquertrabalhador, mesmo com a legislaçãoantiga, passa a ficar ainda mais distan-te com as novas artimanhas criadas paradiminuir os valores dos benefícios. O

trabalhador da iniciativa privada foiatingido pelo redutor de forma brutal,e com requintes que violentam os seusmais elementares direitos. Isto porquemesmo os segurados que já contribuemhá décadas para o sistema serão atingi-dos pela mudança de regras em plenoandamento do jogo, pois o máximopermitido pela voracidade governamen-tal em cortar benefícios foi a conces-são de um “prazo de carência” em quea perda é menor, mas ainda assim exis-te, ainda mais levando-se em conta quenormalmente quem se aposenta na ini-ciativa privada passa a ter uma pensão

muito aquém do mínimo necessáriopara uma sobrevivência digna de serhumano.

A pretensa solução para as contas doINSS foi a tal ponto esdrúxula que atémesmo um antigo colaborador deFernando Henrique – o ex-ministro daPrevidência, Reinhold Stephanes – adesqualificou em artigo publicado emvários jornais. Antes da aprovação dasmudanças pela Câmara dos Deputados,Stephanes fez uma previsão que acabounão se concretizando: a de que o fatorprevidenciário, por não obedecer à “boatécnica e à doutrina universal”, acaba-ria por não ser aceito pelo Legislativobrasileiro. Depois da aprovação, o atualcolaborador do presidente, ministroWaldeck Ornélas, encarregou-se de alar-dear que a equação atendia a princípiosatuariais irretocáveis, algo desmentidopelos técnicos que procuram preservar– como disse Stephanes – “a boa técni-ca e a doutrina universal” em matériade previdência. A solução se resumia,na verdade, a uma “fórmula matemáti-ca” destinada a cortar benefícios, semobedecer aos preceitos atuariaispretensamente adotados pelo governo,na visão nada imparcial de Ornélas.

sustadoras somas negativas produzem-se em razão de confusões conceituaisgeradas intencionalmente com objeti-vos diversos, entre os quais – segundoos partidos de oposição – o de prepa-rar terreno para a privatização da Pre-vidência. Uma das estratégias preferi-das é misturar o Regime Geral da Pre-vidência Social (INSS) com a Previdên-cia do setor público. Outra constanteguerra de informações se trava em tor-no dos recursos que deveriam ser re-passados pelo Tesouro para o Sistema

de Seguridade Social, uma desobedi-ência explícita à Constituição que aequipe econômica teima em cometerde forma reincidente.

Todos esses aspectos, abordados in-cansavelmente pela ANFIP em vários es-tudos de sua Assessoria Econômica (vejanesta edição o último estudo a respeito), re-presentam um dos motivos principaisque levam as oposições a adotar postu-ra de extrema cautela quando o Gover-no, procurando dar a entender que estátomado por uma febre de boa vontade,

conclama todas as facções políticasa um “entendimento” em torno dotema Previdência Social. Negocia-ções, conversas e buscas de soluçãopressupõem disposição de jogar lim-po, e isto só poderá se evidenciar porparte do Governo, caso ele se dispo-nha a abrir suas contas e a discutircom franqueza esses números, dis-pondo-se a identificar as divergên-cias e a explicá-las de forma, no mí-nimo, condizente com o bom sensoe o respeito aos interlocutores.

Deputado Eduardo Jorge: possível alternativa

Foto: Bernadete Brasiliense/Projeto Luz

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Aposentados○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

São essas trapalhadas que dificultamqualquer negociação séria para tentarresolver ou ao menos estancar as defi-ciências do sistema previdenciário bra-sileiro. Para piorar a situação, o gover-no embaralha o jogo na hora de tentarnegociar. O deputado Eduardo Jorge, doPT, foi chamado para uma conversa noPalácio do Planalto em torno do seuprojeto, o que motivou a ira do líder dopartido na Câmara, José Genoíno. Em-bora a imprensa – como sempre – te-nha adotado a defesa do Governo, pro-curando atacar o PT pela sua supostaojeriza às negociações, o argumento deGenoíno é, no mínimo, convincente: seo Governo quisesse de fato discutir umasolução ampla e duradoura para a Pre-vidência, teria suspenso a remessa deprojetos “tapa-buracos” ao Congresso.

Nada mais verdadeiro. O PT suspeitade que o Governo esteja apenas tentan-do dividir o ônus das medidas amargascom as oposições, uma suspeita que tam-bém não deixa de ser verossímil, paradizer o mínimo. Com ampla bancada noCongresso, o Governo jamais precisou –dotado de seu rolo compressor – dospartidos oposicionistas para aprovarqualquer medida que considere crucial.Uma prova disso ocorreu recentemente,num processo decisório não por acaso arespeito exatamente da Previdência So-cial. A deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ) apresentou substitutivo ao projeto doGoverno que institui o confisco apelida-do de “fator previdenciário”. Foi bombar-deada de todos os lados e teve seu pare-cer derrubado na Comissão deSeguridade Social. Em seguida, a maté-ria foi aprovada por ampla margem noplenário da Câmara.

Uma das questões nevrálgicas quan-do o assunto é negociar com o Gover-no reside no fato exatamente de não serespeitarem limites na negociação. Que

a Previdência Social precisa ser discuti-da e saneada não resta a menor dúvida.Só que o Governo se vale de métodospouco civilizados e quer para si o quenão pode ser auferido pelos demaisagentes que atuam na vida do País. Sãofreqüentes as agressões ao direito ad-quirido e ao ato jurídico perfeito.

A Previdência assumiu proporçõessignificativas na vida brasileira e, sehouve desmantelo, o maior responsávelé o próprio Estado, que não soube ounão se empenhou em manter a casa emordem. O resultado disso é que a socie-dade, da forma como está estruturada,não tem condições de absorver mudan-ças radicais sem que isto seja acompa-nhado de graves conseqüências sociais.

Numa época em que o desempregoe os baixos salários transformam-se noprincipal drama da sociedade, a situa-ção ainda se torna mais difícil. Estudoelaborado pelo AFPS Álvaro Sólon deFrança, ex-presidente da ANFIP, demons-tra que na maioria dos municípios bra-sileiros a economia ainda é movida pe-los proventos dos aposentados epensionistas. O jornal Correio Braziliensepublicou no dia 10 de outubro desteano resultado de estudo do Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (Ipea)atestando que “um quarto das famíliasbrasileiras depende dos parentes commais de 60 anos para sobreviver”, e que,nesse grupo, “metade do orçamento do-méstico é formado por aposentadoriase pensões”. Um dos argumentos para aurgência de se sanar a Previdência é ofato de que o prejuízo acaba sendopago por toda a sociedade, como deresto o prejuízo resultante de toda po-lítica econômica desastrada que vemsendo praticada nas últimas décadas.Nem por isso o Governo irá decretar,para si próprio, a revogação de todasas leis a fim de consertar desastres queele próprio provocou. O que se vê éexatamente o contrário: a aprovação deleis que municiam o Estado de regaliasque não estão ao alcance dos que pa-decem nas mãos de governantes desas-trados, inescrupulosos, mal-intenciona-dos ou simplesmente incompetentes.Se todas essas questões não forem le-vadas em conta, jamais o Governo en-contrará interlocutores dispostos a de-bater as soluções para os problemas doPaís, pois, do contrário, não estará ofe-recendo a contrapartida mínima da leal-dade e da honestidade, que deve pautarqualquer negociação destinada a ir alémdo blablablá inconseqüente, irrespon-sável e, em última análise, absolutamen-te estéril.

Reinhold Stephanes: críticas ao Governo

Jandira Feghali: empenho contra o confisco

Fotos: Bernadete Brasiliense/Projeto Luz

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Panorama○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Panela vazia

Quem reconhece é o Instituto dePesquisa Econômica Aplicada

(Ipea): o Programa de Garantia de Ren-da Mínima, com o qual o Governo pre-

tendia combater a pobreza, não aten-de nem 3% dos miseráveis do País. Atéo final do ano, o programa vai benefi-

ciar 502,4 mil famílias. A meta do pró-prio Governo era chegar ao ano 2000

atendendo 1,4 milhão de famílias.Tudo isso por causa dos cortes no Or-çamento e da obsessiva benevolência

oficial para cumprir o ajuste fiscal pro-metido ao Fundo Monetário Interna-

cional (FMI). O benefício médio que oGoverno destina às famílias pobres éde R$ 35,60. Em alguns casos, chega

a R$ 7,50. Por mês.

Marx sobrevive

Ofilósofo alemãoKarl Marx, principal

expoente do comunis-mo, foi eleito o pensa-dor do milênio em uma

votação conduzidapelo serviço de Inter-

net da rede inglesa deTV BBC, News Online,divulgada em outubro. O autor de livros como

“Contribuição à Crítica da Economia Política”e “O Capital” venceu cientistas como Albert

Einstein e Isaac Newton na votação. “Nós fi-zemos uma feira sobre o 10º aniversário daqueda do comunismo”, disse um porta-voz do

serviço da Internet. “Talvez isso tenha torna-do as pessoas um pouco nostálgicas”. Em ou-

tras votações online, William Shakespeare foiescolhido o melhor autor dos últimos mil.

Os campeõesdo gatilho: Total

Governo Sarney Collor Itamar FHC

Originárias 125 87 141 199 552Reeditadas 22 73 364 3.336 3.795Convertidas 109 66 117 110 402Revogadas 2 5 5 9 21 60Sem eficácia 5 5 15 4 29Rejeitadas 9 11 - 1 21Em tramitação - - 4 75 79

OCongresso reclama porque é dadoa outro Poder o papel de legisla-dor; o Executivo a considera um malnecessário porque, sem ele, é im-possível governar. Desde que foi in-cluída na Constituição, a medidaprovisória, usada e abusada por su-cessivos governos, só tem contri-buído para escaramuças entre osdonos do poder e dor de cabeça

para a sociedade. O País que a in-ventou, a Itália, resolveu pôr um fima tudo isso numa canetada. Tudo emnome da harmonia entre os Pode-res e felicidade geral da nação. En-quanto isso, no Brasil, os presiden-tes sacam da caneta no velho estilosalve-se quem for mais rápido. Ou,se preferir: primeiro, uma MP; de-pois, pergunte para quê.

Medidas nada provisórias Q u e mdá mais?

As últimas concorrências públi-cas deste ano para a venda deimóveis do INSS serão realizadasno dia 6 de dezembro, em 13 Es-tados, quando estarão disponí-veis 137 unidades entre prédios,terrenos, casas, salas, lojas egalpões. Os editais e as guias decaução já estão à disposição dosinteressados nos Estados doAmazonas, Bahia, Goiás,Maranhão, Mato Grosso do Sul,Pará, Paraíba, Pernambuco, RioGrande do Norte, Rio Grande doSul, São Paulo, Sergipe eTocantins. Segundo a direção doINSS, essa é uma ótima oportu-

nidade para as empresas e paraos particulares adquirirem imó-veis a preços abaixo dos pratica-dos no mercado, com excelentescondições de pagamento. Infor-ma ainda que os recursos arre-cadados serão investidos no Pro-grama de Melhoria do Atendi-mento da Previdência Social, nosestados onde as concorrênciasserão realizadas.

Para se ter uma idéia dos pre-ços mínimos fixados pela CaixaEconômica Federal, estão sendooferecidos, por exemplo, terre-nos de 192 m̋ na Vila Romana,em São Paulo, por R$ 43,5 mil;terrenos de 157m̋ em Lorena,também em São Paulo, por R$4,1 mil; pavimentos de 320,21m̋em Porto Alegre, por R$ 160 mil;apartamento de 85m̋ em Salva-dor, por R$25,8 mil.

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Globalização○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Enquanto o gerente doFundo fala em “humanizar”a globalização, os nossosgovernantes andam nacontramão e cortaminvestimentos sociais paraatender banqueirosinternacionais

por J. Paulo da Silvado Rio

romover superávit primáriopara o setor público de 3,25%do Produto Interno Bruto(PIB) para o ano 2000 é uma

das metas previstas no programabrasileiro pelo Fundo MonetárioInternacional (FMI) que pode exi-gir mais sacrifícios da populaçãoe acentuar a disparidade entre osmuito ricos e os muito pobres noPaís. O grande temor, na avalia-

ção de economistas, é que, com aobrigatoriedade do aperto do cinto –ajustes cada vez mais necessários –, osinvestimentos nos programas sociais,

P

As fotos desta página e das seguintes,

de autoria de Bernadete Brasiliense,

revelam o abandono das nossascrianças em favelas e lixões próximos

ao centro do Poder em Brasília

O que o FMI viu e oGoverno finge não verO que o FMI viu e oGoverno finge não ver

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a exemplo do Plano Plurianual, possamsofrer cortes e agravar a questão dapobreza e aumentar o desemprego, fa-tores que provocaram a queda de po-pularidade do presidente FernandoHenrique Cardoso.

Embora o Governo tenha consciên-cia da necessidade de investimentos naárea social, cumprir à risca as metas doFMI tornou-se prioritário, mesmo como sacrifício da população. O “remédioamargo, mas necessário”, como defi-nem alguns economistas, parece umaclara contradição às declarações, feitas,no final de setembro, pelo diretor-ge-rente do FMI, Michel Camdessus, e queprovocaram excitações exageradas.

Camdessus defendeu a necessidadede humanizar a globalização e de seouvir a voz dos pobres. Mas não anun-ciou qualquer mudança que pudesseflexibilizar as rigorosas determinaçõesdo organismo americano. Houve quemimaginou que as declarações deCamdessus pudessem significar mudan-ças na política ortodoxa do FMI, capa-zes de permitir uma revisão no acordofechado com o Brasil, que busca obtero aval do organismo para ter acesso aomercado financeiro internacional e ofe-recer segurança aos investidores estran-geiros, principalmente depois das cri-ses da Ásia e da Rússia.

Fosso da miséria – Apesar da apa-rente preocupação de Camdessus, o FMInão alterou as suas normas que, indire-tamente, empurram milhões de pessoasdos chamados países emergentes, comoo Brasil, para o fosso da miséria,aprofundando as desigualdades sociais.O Brasil não tem, pelo menos, no mo-mento, condições de oferecer previsõesseguras sobre o desempenho de suaeconomia no primeiro semestre do ano2000, como esperava a missão do FMIque veio ao País em outubro para a quar-ta revisão do acordo. Políticos até mes-mo da base aliada, como o presidentedo Senado, Antônio Carlos Magalhães,questionam o acordo brasileiro com oFMI e defendem a sua revisão. Recla-mam ainda que o FMI tem interferidodemais na política brasileira, ditando,inclusive, regras para que o superávitseja obtido.

Internamente, também há divergên-cias em relação ao porcentual de cres-cimento. O Governo tem tentado mos-trar que as metas de desempenho fixa-das no acordo com o FMI têm sidoalcançadas até o momento. Existem,entretanto, dúvidas, sobretudo, em re-lação ao volume de reservas neste finaldo ano. A questão diz respeito à fixa-ção de metas para o primeiro semestrede 2000 que dependem dos efeitos doajuste fiscal, que terá de ser aprovadopelo Congresso, de modificações no sis-tema tributário e de efetivos cortes nosgastos orçamentários, sobre os quais oPoder Legislativo não quer assumir com-promissos, principalmente quando oscortes atingem a área social.

A necessidade de cumprir as metasdo FMI levou o Governo a estabeleceruma espécie de corrida contra o tempopara promover o superávit. Uma das pri-meiras medidas foi resolver o déficit deR$ 45 bilhões estimado para a Previdên-cia este ano, mas a forma encontradasofreu dura derrota no Supremo Tribu-nal Federal (STF). O Supremo proibiu acobrança de contribuição previdenciáriados servidores públicos inativos, com aqual o Governo pretendia cobrir o défi-cit do setor. Os ministros do STF consi-deraram inconstitucional a taxação e pro-vocaram muita discussão em torno de al-

Mesmo sabendo danecessidade de investir nosocial, o Governo preferecumprir à risca as metas doFMI. Um remédio amargo,mas necessário, segundo os

economistas oficiais

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Globalização○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ternativas verdadeiramente sérias pararesolver o problema de caixa do Tesouro– principalmente quando se sabe que égrande o número de sonegadores, sobre-tudo empresas, que têm numa legislaçãoarcaica sua maior aliada.

Se a cada meta do FMI o Governotiver olhos apenas no sacrifício da po-pulação, a tendência é de a pobreza,aumentar cada vez mais no País. Exem-plo da disparidade é verificado no es-tudo feito pelo Instituto de PesquisaEconômica Aplicada (Ipea), que mostraque a camada mais pobre da população

Desde que declarou sua indepen-dência de Portugal – na época,nem sombra daquela potência ma-rítima que contornou o Cabo dasTormentas em busca das especiari-as das Índias – e passou a ser depen-dente do emergente império britâ-nico, o Brasil já importou tantas fór-mulas para acabar com a inflação,reduzir o déficit público e promo-ver o crescimento que deveria, aomenos, receber o crédito de labora-tório para certos economistas. Ra-ramente, porém, algum deles assu-me a culpa, e, quando o faz, o pro-blema não é exatamente seu, masde quem não entendeu o que disse.

De certo modo, foi o que deixoubem claro o economista inglês JohnWilliamsom, que já passou para ahistória como um dos papas doneoliberalismo. Ele foi o autor do“Consenso de Washington”, umaespécie de receituário, divulgadoem 1989, para os países pobres mo-dernizar suas economias. Não se

um ponto de vista digno de um viradade milênio. Disse ele: “O progresso quecelebramos não chegou aos países e àspessoas mais pobres. Em muitos casos,a desigualdade entre os países aumen-tou. E isso é pior que uma crise finan-ceira: isso é um escândalo”. Não preci-sou dizer mais nada.

A idéia é deles, as regras são nossas– E os nossos neoliberais, o que dizem?O ex-ministro Roberto Campos ( hoje,imortal da Academia Brasileira de Le-tras) descarta os discursos segundo osquais o FMI é o responsável pelo pro-cesso de empobrecimento do Brasil ede outros países dependentes da insti-tuição.

“Não é o FMI quem dita as regras”,disse o economista. “São os países quefazem as regras e as apresentam”. Cam-pos considera ousadas as propostas fei-ta pelo Governo brasileiro no acordocom o FMI e defende uma revisão. Pro-posta semelhante foi apresentada pelopresidente do Senado, Antônio CarlosMagalhães (PFL-BA). “O que está acor-

Para um dos papas doneoliberalismo, John

Williamsom, a ordem era paraque os países pobresmodernizassem suas

economias. Ninguém falouem sacrificar a população

tem notícia de sir Williamsom visitan-do favelas da América Latina, mas, comoele próprio reconheceu, os governosdesse continente seguiram seu manualao pé da letra. Ou, melhor: foram longedemais. Em entrevista ao jornal Folha deS. Paulo, em outubro, o economista in-glês reconheceu que os países pobres,como o Brasil, foram longe demais emsuas idéias. Âncora cambial e excessode liberdade concedido aos fluxos decapitais, por exemplo, não estavam naconcepção original do “Consenso deWashington”, segundo Williamsom. “Es-sas duas coisas, em particular, estão portrás da crise que o Brasil enfrenta hoje”,reconheceu.

Problema nosso? Nem tanto. A idéiade globalização para os mercados estávalendo também para a cada vez maiscrescente compreensão de um mundode recursos naturais limitados e que jádá claros sinais de esgotamento. O se-cretário-geral das Nações Unidas, KoffiAnan, na assembléia-geral que ocorretodos os anos, fez questão de registrar

Quem mandou fazer o quê?

poderia ter maior poder de compra, nãohouvesse a pesada carga de impostosindiretos que é obrigada a pagar sobreos alimentos que consome.

O estudo revela ainda que os tribu-tos sobre os itens da cesta básica pres-tam um desserviço social, tendo em vis-ta que chegam a mais de 15% em algunscasos, e, com esse dinheiro, grande fa-tia da população ganharia poder aqui-sitivo e sairia da linha de pobreza. Semesses impostos, famílias de menor po-der aquisitivo nos grandes centros, au-mentariam os seus rendimentos em, nomínimo, 4% a 8%.

De acordo ainda com o estudo, aisenção fiscal sobre os alimentos po-deria reduzir o número de indigentes e

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dado, deve ser cumprido”, esclareceu,em declarações recentes. “Mas rever oacordo, não significa calote”, explicouRoberto Campos. “Moratória seria lou-cura”.

De uma forma geral, os economis-tas reconhecem que a população já sesacrificou o bastante e que o Brasil pre-cisa criar estabilidade macroeconômica,com um bom funcionamento do mer-cado, solidez do setor financeiro e umambiente propício ao investimento pri-vado, condições que favorecem a umapolítica social eficiente e para as quaisas contribuições internacionais são in-dispensáveis, principalmente paraerradicar a pobreza.

As discussões tecnocratas – e, àsvezes, pouco práticas – parecem cami-nhar para o vazio, enquanto a progres-são do empobrecimento no Brasil podeser constatada em diferentes estudos,a exemplo do que foi realizado pelapesquisadora Sonia Rocha, do Institutode Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).O estudo mostra que o empobrecimen-to causado pelo desemprego atingemais os trabalhadores menos qualifica-

dos – com pouco estudo. É, certa-mente, reflexo dos parcos investi-mentos na área social, especialmen-te na educação. O trabalho da pes-quisadora mostra ainda que se in-verteu a tendência do início do real,quando se registrou uma melhoriade renda dos mais pobres.

O estudo da pesquisadora, divul-gado pelo jornal O Estado de S. Paulo,é baseado nos números do EstudoNacional de Despesa Familiar(Endef) e da Pesquisa de Orçamen-tos Familiares (POF) do IBGE e reve-la que o real reduziu de 44% para 34%o porcentual de brasileiros abaixo dalinha da pobreza, mas adverte queo nível foi atingido há três anos,quando estacionou. Indica aindaque os efeitos distributivos do Pla-no Real, em nível nacional, já haviamesgotado em setembro de 1996 emostra que a população diminuiumais em áreas rurais que nas zonasmetropolitanas, fortemente atingi-das pela reestruturação da produ-ção, com a abertura da economia eo desemprego.

os efeitos se estenderiam à populaçãopobre. O economista Salvador WerneckViana, um dos responsáveis pelo estu-do, adverte que as medidas apontadaspelo trabalho são complementares eque o combate à pobreza exige outrasalternativas.

Os números das metas de superávitprimário para o setor público previstosno acordo com o FMI são de 3,1% doPIB, em 1999; 3,25% do PIB, em 2000; e3,35% do PIB, em 2001. O Governo pre-cisa economizar para abater de suasdespesas financeiras e estancar o au-mento da dívida pública. Mas comofazê-lo, sem sacrificar mais a popula-ção? No livro “Finanças Públicas no Bra-sil”, cujos dados foram publicados pelajornalista Maria Luiza Abbot, de O Glo-bo, os economistas Fabio Giambiagi eAna Cláudia Alem montaram uma fór-mula para calcular o impacto dos com-ponentes da relação dívida com o PIB:inflação, privatizações, juros, superávitprimário e o crescimento da economia.

Os economistas fixaram, em um dosexercícios utilizados como parâmetro,o crescimento da economia de 4% em2000, inflação de 2% e juros médiosnominais de 14%. Com esse cenário, osuperávit teria de ser de 3,26%, igual aoque prevê o acordo com o FMI. FábioGiambiagi alerta que o grande proble-ma do Brasil é o ritmo de crescimento,lembrando que de 1997 para 1998,quando os juros subiram em decorrên-cia da cotação do real na crise da Ásia eda Rússia, a dívida passou de 30,9% para38,3% do PIB. Sua previsão é que esteano feche em 46% do PIB, devido aoimpacto da desvalorização sobre a dí-vida externa e o estoque de títulosindexados ao câmbio. Esses percen-tuais, no entanto, de acordo com oseconomistas, não consideram a basemonetária.

Em vez de escola, lixão: crianças da periferia de Brasília brincam com as sobras dos ricos

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2 2 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Estudo○ ○ ○ ○ ○

pela Assessoria Econômica da Anfip

unca os meios de comunica-ção falaram tanto sobre odéficit da Previdência Socialno Brasil. Mesmo os mais

neófitos, sem saber nada a respeito, ex-ploram demasiadamente o assunto,principalmente quando estão diante dealguns dados claramente tendenciosos,apresentados com o objetivo de des-montar o sistema público de Seguri-dade Social.

É notório que o sistema, como umtodo, precisa ser ajustado, tendo emvista fatores internos e externos, taiscomo: demografia, expectativa devida, procriação, qualidade de vida,mortalidade infantil. Devem ser in-cluidos nesse rol fatores decorrentesda globalização, da reestruturação pro-dutiva e dos novos componentes dosmercados.

No entanto, é lamentável que todoum sistema de cunho social seja alijado,sem que antes sejam analisados os seusvários componentes de dificuldades e osdesvirtuamentos de seus subsistemas.

A causa da controvérsia – Os cons-tituintes, ao elaborarem a Carta Magnade 1988, estabeleceram, em seu artigo194, as três ações da Seguridade Social:Saúde, Previdência Social e AssistênciaSocial. Porém, tiveram o cuidado e aresponsabilidade de contemplar, em seu

N

A controvérsiasobre o déficit daPrevidência SocialNunca se falou tanto – e de forma errada – nas contasprevidenciárias, sem levar em consideração o inadequadorepasse dos recursos do orçamento da Seguridade Social

artigo 195, três fontes básicas de finan-ciamento para fazer frente aos seus res-pectivos dispêndios: Cofins, Contribui-ção sobre o Lucro Líquido e folha desalários.

Não obstante, houve, ao longo desseperíodo, uma série de distorções referen-tes aos repasses. A controvérsia sobre odéficit da Previdência Social se estabe-lece quando o Governo separa a Previ-dência do sistema maior, e, em conseqü-ência, desvirtua a função daquelas rubri-cas pertencentes ao orçamento daSeguridade Social, utilizando-as paracobrir rombos do Orçamento Fiscal.

A controvérsia se dá, também, quan-do novamente o Governo parece esque-cer que a folha de salários vem, em gran-de parte, arcando com o pagamento debenefícios assistenciais (Lei Orgânica deAssistência Social e Renda Mensal Vita-lícia) e rurais – ambos de pouca ou ne-nhuma contribuição – aumentando as

A controvérsia se estabelecequando o Governo,

separando a previdência dosistema maior, desvirtua afunção das rubricas do

orçamento da seguridade e asutiliza para cobrir rombos

fiscais

A controvérsiasobre o déficit daPrevidência Social

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tivos, pensionistas de todosos poderes do Governo Fe-deral (sem agregar suas re-ceitas) e a saneamento bá-sico para os Estados, des-virtuando totalmente damissão original dada a es-

ses recursos.

Quando da criaçãodas referidas receitas(em 1988), os consti-tuintes, ao ampliar e cri-ar novos benefícios, prin-cipalmente na área rural, o

fizeram exatamente preven-do que aqueles dispêndios se-riam subsidiados pelas rubri-cas Confins e Contribuiçãosobre Lucro Líquido das em-presas, uma vez que somentea receita sobre a folha de pa-gamento seria insuficiente.

Assim, falar em déficit previ-denciário, só registrando a receita dafolha de pagamento e o total de dispên-dio dos benefícios previdenciários,assistenciais e rurais – estes dois últi-mos, como já foi dito, com nenhuma oupouca contribuição – é querer distorcertodo um conceito de Seguridade Social

QUADRO 1

RESULTADOS DOS SISTEMAS DE PREVIDÊNCIA SOCIAL – INSS E RJUVisão distorcida

(R$ milhões correntes)

Discriminação 1995 1996 1997 1998 1999 (*)

Regime Geral – INSS 10 -656 -2.791 -7.805 -10.893

Contribuições (arrecadação líquida) 32.576 40.631 44.260 45.957 48.739

Benefícios previdenciários 32.566 41.287 47.051 53.762 59.632

Previdência da União -13.355 -14.806 -17.100 -18.317 -22.137

Contribuição dos servidores 2.101 2.580 2.583 2.633 2.763

Despesa com inativos e pensionistas 15.456 17.386 19.683 20.950 24.900

Fonte: Governo Federal – Secretaria do Tesouro(*) Previsão

dificuldades financeiras do INSS, dadoo inadequado repasse das rubricas com-ponentes do orçamento da SeguridadeSocial.

Em outras palavras, apesar daque-las rubricas fazerem parte do orçamen-to da Seguridade Social, a controvérsia

está na alocação dos recursos destasreceitas, quando da elaboração da pro-posta orçamentária. No conceito deSeguridade Social, apesar de constitu-cionalmente bem definidos, incluem-se,na proposta orçamentária, desde ospagamentos de servidores ativos, ina-

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2 4 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Estudo○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

e descaracterizar o que está fundamen-tado na Constituição Federal.

Visão distorcida – O conceito deSeguridade Social deveria ser agregado,incluindo todas as receitas e despesas.Entretanto, a visão de muitos é compa-rar somente a Receita Previdenciária Lí-quida, advinda da folha de pagamento,com todas as despesas dos benefíciosprevidenciários e rurais.

Pelo Quadro 1, a Receita Previden-ciária (somente da folha de pagamen-to) Líquida, em 1998, foi de R$ 45,957bilhões, enquanto que a despesa de be-nefícios previdenciários e rurais foi deR$ 53,762 bilhões, ocasionando uma di-ferença de R$ 7,805 bilhões. Isto é o quechamam de déficit.

Porém, não dizem e nem analisamque foram alocados recursos de R$10,336 bilhões para o pagamento dosbenefícios rurais, enquanto que sua ar-recadação foi de apenas R$ 1,02 bilhão,ocasionando uma diferença de mais deR$ 9 bilhões, os quais deveriam vir daCofins e da Contribuição sobre o LucroLíquido.

A visão dos que adotam o con-ceito simplista do déficit pecaao isolar a Previdência Social dotodo da Seguridade Social,distorcendo númerose conceitos. Além dis-so, considera no défi-cit da Previdência dosetor privado apenasa diferença entre a ar-recadação previden-ciária líquida do INSSe a despesa com bene-fícios previdenciáriose fiscais.

Os adeptos dessatese misturam e so-mam o Regime Geralda Previdência Social

QUADRO 2

RECEITAS E DESPESAS DA SEGURIDADE SOCIAL (1)

Regime Geral do Setor Privado(1998 e primeiro semestre de 1999)

Em R$ bilhões correntes

I – RECEITAS 1998 1999

Receita Previdenciária Líquida (2) 47,166 20,947

Cofins 17,742 11,922

Contribuição sobre o Lucro Líquido 6,525 3,967

CPMF (3) 8,113 1,309

Concurso prognóstico 0,529 0,000

Total das Receitas 80,075 38,145

II- DESPESAS 1998 1999

Benefícios 56,021 27,275

* Previdenciários 45,583 21,219

* Rurais 10,336 5,032

* Assistenciais (LOAS + RMV) 2,102 1,024

Saúde 17,470 8,735

Outras despesas previdenciárias (4) 3,667 1,494

Total das Despesas 77,158 37,504

SALDO FINAL 2,917 0,641

Fonte: Fluxo de Caixa do INSS, Secretaria do Tesouro Nacional (Portaria nº 52/fev/99) e Secretaria da Receita Federal (SRF).NOTAS: (1) A Portaria nº 52, de fevereiro de 99, da STN foi a que divulgou a Execução Orçamentária do Governo Federal;

(2) Arrecadação líquida = Arrecadação bruta (inclui Simples) – Transferências a terceiros;(3) Exclusivo para a Saúde; (4) Inclui custeio administrativo e de pessoal.

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(INSS) com a Previdência do setor pú-blico, como se pode observar no Qua-dro 1. No tocante ao déficit da Previ-dência dos servidores públicos daUnião, o Governo computou R$18,317 bilhões, em 1998, e está esti-mando em R$ 22,137 bilhões para

1999. Esses encargos previdenciáriossão de exclusiva responsabilidade daUnião, não cabendo a quem quer queseja retirar recursos de um regimeprevidenciário para outro e juntartudo num mesmo déficit, como sepossuíssem o mesmo desempenho, as

mesmas fontes de recursos e a mes-ma administração.

Seguridade e Regime Geral do Se-tor Privado – Pela visão constitucio-nal (artigos 194 e 195), são consigna-das somente as rubricas que fazem par-te do conceito de seguridade social, in-cluindo o RGPS. Por essa visão, o Sis-tema de Seguridade Social e suas fon-tes básicas (inclusive CPMF, recursosdestinados exclusivamente à saúde) definanciamento arrecadaram R$ 80,075bilhões, enquanto que as despesascom Previdência (inclusive com despe-sas de custeio administrativo e de pes-soal), Saúde e Assistência chegaram aR$ 77,158 bilhões. Portanto, houve umsaldo de R$ 2,917 bilhões, conformeQuadro 2.

Em 1999, no primeiro semestre, fo-ram arrecadados R$ 38,145 bilhões egastos R$ 37,504 bilhões. Portanto, umsaldo de R$ 641 milhões.

Seguridade, RGPS e Previdência dos

servidores públicos da União – Por ou-tro lado, se incluirmos nas receitas edespesas da Seguridade Social aquelasrelativas à Previdência dos ServidoresPúblicos da União (ainda nos manten-do no conceito constitucional e sistê-mico de seguridade), teríamos um défi-cit de R$ 4,008 bilhões, em 1998, e deR$ 3,161 bilhões no primeiro semestrede 1999, conforme Quadro 3.

Portanto, mesmo incluindo a Previ-dência da União, o déficit encontrado émuito inferior ao divulgado pelas fon-tes oficiais. Dessa maneira, não se podediscutir déficit na Previdência Social,sem levarmos em conta o inadequadorepasse dos recursos do Orçamento daSeguridade Social e a distinção entreRegime Geral do setor privado e Previ-dência dos Servidores da União, já quesão fontes de financiamento diferentese encargos também diferentes.

QUADRO 3

RECEITAS E DESPESAS DA SEGURIDADE SOCIAL (1)Regime Geral (RGPS), incluindo os servidores civis e militares da União

(1998 e primeiro semestre de 1999)

Em R$ bilhões correntes

I – RECEITAS 1998 1999

Receita Previdenciária Líquida (2) 47,166 20,947

Confins 17,742 11,922

Contribuição sobre o Lucro 6,525 3,967

CPMF (3) 8,113 1,309

Concurso de prognóstico 0,529 0,000

Contribuição dos servidores (ativos) 2,618 1,309

Civis 2,482 1,241

Militares 0,136 0,068

Contribuição da empresa (4) 5,236 2,618

Total das Receitas 87,929 42,072

II – DESPESAS 1998 1999

Benefícios 56,021 27,275* Previdenciários 43,583 21,219* Rurais 10,336 5,032* Assistenciais (LOAS + RMV) 2,102 1,024

Saúde 17,470 8,735Servidores inativos/pensionistas 18,446 9,223

* Civis 12,256 6,128* Militares 6,190 3,095

Total das Despesas 91,937 45,233

SALDO FINAL -4,008 -3,161

Fonte: Fluxo de caixa do INSS, Secretaria do Tesouro Nacional (Portaria nº 52, de fev/99) e Secretaria da Receita FederalNOTAS:(1) A Portaria nº 52, de fev/99 da STN foi a que divulgou a Execução Orçamentária do Governo Federal(2) Arrecadação líquida = Arrecadação bruta (inclui Simples) – transferências a terceiros(3) Exclusivo para a Saúde(4) Contribuição devida e não recolhida pela União como contrapartida da contribuição do servidor, que corresponde àalíquota do regime geral ao da empresa (2X1), conforme emenda constitucional nº 20.

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2 6 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Impostos○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

pacote anunciado pelo pre-sidente Fernando HenriqueCardoso dia 5 de outubro,destinado a aliviar o peso

dos débitos tributários das empresasbrasileiras, batizado Programa deRefinanciamento Fiscal (Refis),continua suscitando controvér-sias em diversas áreas em-presariais e mesmo dentrodo Governo. Na área em-presarial, acredita-se queo alcance do pacote serábastante restrito em funçãode exigências consideradas“desmedidas” que o acompanham,como o compromisso por parte da em-presa que optar pelo Refis de dar am-plo acesso a seus dados, revelando atémesmo movimentação bancária e ou-tras informações indicadoras de ren-da. Na prática, observa-se, essa exigên-cia equivale a uma quebra do sigilo fis-cal assegurado em lei, o que estariasendo revogado.

O Refis foi adotado com o objeti-vo de estimular a renegociação de dí-vidas fiscais das empresas, indepen-dentemente de seu porte, com a Re-ceita Federal e o Instituto Nacional doSeguro Social (INSS). A medida Provi-sória (MP) que instituiu o programaprocura consolidar todas as dívidas daspessoas jurídicas com a Receita e oINSS, ocorridas até 31 de agosto de1999. Estima-se que o montante doscréditos que o Governo pretende re-cuperar com essa medida esteja nacasa dos R$ 160 bilhões, sendo R$ 100bilhões na esfera da Receita Federal ecerca de R$ 60 bilhões na Previdência.

As empresas que aderirem ao Refisse comprometerão a destinar, pelomenos, 2% de seu faturamento mensalao pagamento de prestações relativasao débito tributário. Nesse percentual

de comprometimento míni-mo residiriam, segundo ava-liações dos próprios técnicosdo Governo, alguns obstácu-los ao alcance dos objetivosdo programa. Principalmenteno caso das grandes empre-sas, que também respondempelo maior naco das dívidastributárias, eles não vêm pers-pectiva de sucesso para a re-cuperação de créditos atravésdo Refis.Sem atrativo – Um desses

técnicos faz as contas para mos-trar a baixa atratividade do Refis jun-to às grandes devedoras: a maioriadelas, segundo ele, aufere lucros quevariam de 2,5% a 8% do faturamento.“Dessa forma, na melhor das hipóte-ses, uma empresa com lucro de 8% so-bre o faturamento teria de destinar, nomínimo, 25% dele para o pagamentode débitos tributários, o que é muitodifícil; imagine, então, uma empresacujo lucro está em torno de 2,5% dofaturamento?”, pergunta ele.

Além de pouco atrativo aos olhosdos grandes devedores, o programa éapontado também como portador debrechas para a elisão fiscal. Ao prevera possibilidade de que empresas semfaturamento atualmente sejam isentasdo pagamento do passivo fiscal ou dedébitos trabalhistas, conforme especi-alistas da Previdência Social, a MP es-taria facilitando a elisão. O artifício, se-gundo eles, estaria em transferir deuma empresa A para uma empresa Bo faturamento, deixando a primeira,devedora de tributos, com o caixa va-zio. Em conseqüência, o empresárioescaparia do pagamento dos débitosfiscais.

Outro problema previsto está rela-cionado às micro e pequenas empre-

Afinal, oRefis vairefazer oquê?

Além de pouco atrativoaos olhos das empresascom débitos tributários, oprograma contém brechas

para a elisão fiscal

O

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 2 7

O objetivo do Governo éambicioso: recuperar cercade R$ 160 bilhões; dosquais R$ 100 bilhões na

esfera da Receita Federal ecerca de R$ 60 bilhões na

Previdência

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

sas, que são tributadas com base no sis-tema do Simples. A avaliação é de quea alíquota de 2% sobre seu faturamento,destinada ao pagamento de prestaçõesde débitos fiscais, equivalerá a menosde 0,5% sobre o volume desses débitos.Assim, a tendência é de que esses débi-tos, ao invés de diminuir, se transfor-mem numa bola de neve, tornando-seimpagáveis com o passar do tempo.

Assim, o Refis, lançado como instru-mento de alívio para as dívidas fiscaisdas empresas e uma nova fonte de arre-cadação do Governo – sempre preocu-pado em levar calote nesses créditos –,pode acabar se transformando umrotundo fracasso.

Na Previdência Social e na ReceitaFederal, calcula-se que os custos

Como funciona o Refis

O que concedeAlgumas concessões do Programa de Refinanciamento

Fiscal: renegociação das dívidas com a Receita Federal,Previdência Social e multas para todas as empresas, nãosó pequenas e micros. Os débitos serão consolidados eos juros substituídos pela Taxa de Juros de Longo Prazo,de 12,5% ao ano. Não haverá prazo para pagamento e asempresas terão de amortizar o débi-to comprometendo, no mínimo, 2%do faturamento mensal. Além disso,reduz alíquota do IOF de 1,5% para0,5% a novos financiamentos com va-lor igual ou inferior a R$ 30 mil, dispen-sa de certidões negativas os que não es-tão no Cadin e concede Fundo de Aval paraa geração de emprego e renda, para faci-litar o crédito aos empreendedo-res de baixa renda, entre ou-tros pontos.

O que exigeA Receita Federal terá acesso irrestrito aos dados da

empresa que optar pelo programa, inclusive movimen-tação bancária e outras informações sobre renda, comoconsumo de energia elétrica, embalagem etc. Além dis-so, a empresa deverá fazer uma confissão irrevogável eirretratável de suas dívidas com os dois órgãos, inclusive

aquelas não encontradas pelos fiscais. Será obrigada,ainda, a manter em dia seus pagamentosà Receita e ao INSS, bem como acertarsua dívida com o FGTS. Qualquer in-formação falsa implicará a exclusãoda empresa do Refis. “Quem en-trar no sistema terá de jogar lim-po”, advertiu o secretário da

Receita e xerife do Refis,Everardo Maciel, du-rante o lançamentodo programa.

presas do Estado têm problemas com oFisco e que o Refis não representará umalívio substancial para esses empreen-dimentos. Mais eficaz, segundo empre-sários alinhados à Fiesp, seria a aprova-ção de uma reforma tributária capaz demodernizar o sistema tributário brasilei-ro, acabar com os impostos em cascatae com a guerra fiscal, conferindo maiorcompetitividade ao produto nacional.

Em setores do Governo como doempresariado, avalia-se também que foidado excessivo poder à Receita Federalpara gerir e conduzir o Programa deRefinanciamento Fiscal. A Receita so-zinha será responsável pela arrecadaçãototal dos recursos, inclusive os do INSS,e por sua distribuição ao OrçamentoFiscal e à Seguridade Social.

operacionais do programa para essasduas áreas do Governo acabarão repre-sentando mais do que o retorno em ter-mos de liquidação de débitos fiscais dasempresas.

Ao mesmo tempo, a poderosa Fe-deração das Indústrias do Estado de SãoPaulo (Fiesp) estima que 85% das em-

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2 8 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Tecnologia & Saúde○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ma notícia ocupou as primei-ras páginas da imprensa euro-péia neste final de ano: neuro-logistas concluíram que os

usuários de telefones celulares podemestar correndo risco de desenvolver adoença de Alzheimer, esclerose múltiplae mal de Parkinson devido à emissão deradiação dos aparelhos portáteis.

Um estudo divulgado pelo jornal in-glês Daily Mail, e aqui traduzido, desco-briu que apenas dois minutos de exposi-ção podem desativar uma barreira de se-gurança no corpo que serve para prote-ger o cérebro de substâncias nocivas nosangue. Umas vez que elas invadem, au-mentam as chances de desenvolver do-enças no cérebro e no sistema nervoso.

De acordo com o jornal, os cientistasafirmam que os telefones celulares po-dem causar perda de memória a longoprazo. As descobertas irão aumentar apreocupação sobre a segurança dos tele-fones. Já houve referências ligando-ostambém a tumores no cérebro, confusãoe dores de cabeça.

A prova mais recente, de um estudosueco, explica como a radiação do tele-

fone celular pode ini-ciar no corpo o quepoderia ser uma desas-trosa reação em cadeia.Pesquisadores realiza-ram, na UniversidadeLund, experiências comratos usando campos demicroondas, os quais imitaram as emis-sões dos telefones celulares. Após doisminutos de exposição, a barreira de se-gurança sangüínea do cérebro se abriu,permitindo a entrada de proteínas e to-xinas no mesmo.

De modo preocupante, até mesmoquando as microondas não eram sufi-cientemente fortes para esquentar a ca-beça dos ratos, os cientistas detectaramuma atividade venenosa bem no centrode seus cérebros.

Isso sugere que as atuais diretrizessobre o uso de telefones celulares, daOrganização Mundial de Saúde (OMS),baseadas em níveis mínimos de aqueci-mento radioativo, não são suficientespara garantir a segurança dos usuários.

O professor Leif Salford, o neurolo-gista que realizou a pesquisa, disse: “Nós

vimos a barreira do cérebro se abrir, atémesmo depois de uma pequena exposi-ção à radiação no mesmo nível dos tele-fones celulares. Ainda não temos certe-za se esse é um efeito nocivo, mas pare-ce que moléculas como proteínas e toxi-nas podem entrar no sangue, quando oaparelho está ligado, e atravessá-lo até océrebro”.

Segundo o professor, seu grupo con-seguiu os mesmos resultados quandorepetiram a experiência. “Acreditamosque estamos com algo muito significati-vo”, disse ele. Proteínas são uma partenormal do sangue, mas podem causardanos nos nervos ou iniciar doenças do

sistema nervoso se conseguirementrar no cérebro.

Em um estudo separado,que será publicado no jornal deciência Bioeletromagnetics, dosEstados Unidos, a radiação dotelefone celular foi ligada àperda de memória de longoprazo em ratos. Dr. HenryLai, da Universidade deWashington, em Seattle,realizou uma experiência

em que 100 ratos foram colocados emum tanque largo com água turva e ensi-nados a nadar para uma plataforma. Me-tade do grupo foi, então, exposta à ra-diação e todos esqueceram o caminhopara a plataforma, enquanto os ratos quenão foram expostos se lembraram.

Um segundo teste envolveu a remo-ção da plataforma do tanque. Enquantoos ratos normais nadaram em volta e es-tranharam a ausência da plataforma, osque foram expostos à radiação não de-monstraram lembrar-se que a plataformaalguma vez esteve lá.

Um porta-voz do Departamento deSaúde disse que um comitê escolhidopelo governo irá examinar, no próximoano, a pesquisa mais recente devido àsnotificações sobre a segurança dos tele-fones celulares.

O celulare o seucérebro

Com muito dinheiro em jogo no grande negócio da telefoniacelular, informações como esta são omitidas ou, no máximo,viram nota de rodapé do noticiário brasileiro

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

28 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

U

O celulare o seucérebro

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 2 9

Biblioteca○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Experiênciaspara refletirAuditora Fiscal deContribuições

Previdenciárias,

Nérida Sanchesestréia na literatura

em “Conversandocom uma Estrela”

(Edicon, São Paulo, 126páginas), no qual

mantém uma espécie

de diálogo com o

apresentador detelevisão Carlos

Roberto Massa, oRatinho, cuja

experiência de vida

serve de estímulopara narrar sua

própria trajetória. Apartir dessa

conversa, segundo as

palavras de Nérida, oleitor ficará sabendo

como alguém inicioucarreira no serviço

público como

servente de ginásio –“com uma vassoura

na mão e um balde naoutra” – e, em menos

de 13 anos, assumiu

o cargo de auditorafiscal do INSS.

Unidos. Segundo ela, o Sistema deSeguridade Social brasileiro está marcadopor duas questões: pelo lobismo, que seconfigura como um modelo de articulaçãode interesses que acentuam a exclusão so-

cial, de um lado; e, de outro,pela residualidade da proteçãosocial. Ou seja, na prática auniversalização dos serviçosde saúde significou a reduçãodo sistema público aos po-bres. Em meio às privati-zações sobre o futuro daSeguridade Social e do fun-cionalismo público, o livrose constitui em importante

instrumento para análise da nossa reali-dade. Maria Lucia é diretora-adjunta degraduação do Instituto de economia daUniversidade Federal do Rio (UFRJ), profes-sora de Ciências Políticas e Políticas Públi-cas. O livro está à venda em livrarias oupelo fone (21) 502-7495, ou, via Internet,no e-mail: [email protected]

Compra de imóveisAspectos jurídicos, cautelas e análise de ris-

co. Este livro descreve os vários aspectos jurí-

dicos relacionados à aquisição de bem imóvel.“Compras de Imóveis”, do procudador

autárquico do INSS Bruno Mattos e Silva (Edito-ra Atlas, São Paulo, 189 páginas), enfatiza as cau-telas que devem ser tomadas pelo comprador,

de modo que se entendam os riscos perti-nentes no caso de

negócio eventual-

mente desfeito porforça de decisão ju-

dicial. Explica, numaabordagem prática,

como obter os dados

e as certidões indis-pensáveis para adqui-

rir um imóvel.

Reformatributária

O Fórum Perma-

nente das Entidades

Representativas daFiscalização no Esta-

do de Minas Geraislançou, para discus-

são, “Reforma Tributá-

ria: Contribuição do Fisco Fórum-MG ao Deba-te” (64 páginas, distribuição gratuita), que reúnetextos importantes para entender melhor o quese discute atualmente no Congresso em torno

de tributos. Além de defender o combate à so-

negação e à fraude, o Fisco-Fórum ressalta quemais importante do que a reforma tributária é

a correta aplicação dos recursos públicos, demodo a contemplar as classes sociais menos

favorecidas.

Em “A Americanização (perversa) daSeguridade Social no Brasil” (Editora

Revan, Rio, 270 páginas), Maria Lucia WerneckVianna traça uma trajetória recente do Sis-tema de Seguridade Social brasileiro e ten-ta identificar os fatores de na-tureza política que vêm pro-duzindo barreiras para a im-plantação do modelo univer-salista que embasa a Consti-tuição de 1988. A americani-zação da Seguridade Socialbrasileira é uma referência aoprocesso em que interessesmúltiplos e fragmentados com-petem (por intermédio de lobbies)para obter maior espaço nos pro-cessos decisórios. A autora procura, assim,evidenciar que o neocorporativismo típicodas democracias liberais européias, em quegrandes organizações representativas dosdiferentes interesses sociais atuam median-do a relação trabalho-capital, não é viávelno Brasil, como também não é nos Estados

As origens da perversidade oficial

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3 0 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

ANÁLISE DA AÇÃO FISCAL – Janeiro a setembro de 1999

30 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Assessoria Econômica da ANFIP

Oresultado da ação fiscal (RAF) noperíodo de janeiro a setembro de1999 totalizou R$ 6,966 bilhões,

correspondendo a 19,26% do total daarrecadação bancária + Simples, que foide R$ 36,155 bilhões, de acordo com oFluxo de Caixa do INSS. Comparando-se com o mesmo período de 1999,quando totalizou R$ 8,095 bilhões, ve-rificou-se queda considerável, aindacomo reflexo da troca de sistema dearrecadação e cobrança do INSS, que,vem gerando, desde a mudança, proble-mas de gerenciamento e adaptação aonovo sistema.

Os auditores fiscais de contribuiçõesprevidenciárias fiscalizaram em todo oterritório nacional 50.753 empresas evisitaram outras 40.335. Nesse trabalho,foram emitidas 9.734 Notificações Fis-cais de Lançamento de Débito (NFLD),que totalizaram R$ 4,762 bilhões e re-presentaram 68,36% do total do RAF. Éimportante assinalar que essas notifica-ções apresentaram aumento no volumemonetário arrecadado em relação amesmo período de 1998, quandototalizaram R$ 4,612 bilhões.

Quanto aos recolhimentos, elestotalizaram R$ 635,92 milhões, repre-sentando 9,11% do total do RAF e apre-sentando uma pequena queda em rela-ção a mesmo período de 1998, quandosomaram R$ 676,44 milhões.

Já com relação aos parcelamentos,foram emitidas 11.738 Confissões deDívida Fiscal (CDF), que totalizaram R$1,568 bilhão, representando 22,51% do

total do RAF e que apresentaram que-da em relação a mesmo período de1998, quando somaram R$ 2,806 bi-lhões.

O número de empresas visitadas efiscalizadas chegou a um total de91.088, inferior ao verificado no perío-do de janeiro a setembro de 1998, que

Resultado da ação fiscal noperíodo atinge R$ 6,966 bilhões

foi de 118.458. Noentanto, mesmo re-gistrando-se redu-ção do número deempresas, está ha-vendo uma melho-ria na qualidade daação fiscal.

Analisando oranking das regiõesdo País, verifica-seque o Sudeste re-presentou, no acu-mulado de janeiroa setembro de1999, 66,25% doresultado monetá-rio da ação fiscal.Ela é seguida delonge pela regiãoSul, 14,42%; Nor-deste, 11,70%; Cen-tro Oeste, 4,19%; eNorte, 3,59%.

Quanto aos Es-tados da Federa-ção, São Paulo foiresponsável por44,41% do RAF, se-guido pelo Rio de

Janeiro, com 14,38%; Rio Grande doSul, 5,78%; Minas Gerais, 5,12%; Paraná,4,68% e Santa Catarina, 3,96%. Essesseis estados totalizaram 78,33% do RAFno período de janeiro a setembro de1999.

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 3 1

RESULTADO DA AÇÃO FISCAL (RAF)Janeiro a setembro de 1999

UF EMPRESAS RECOLH. CDF NFLD RAF (%)FISCAL. VISIT. VALOR QTDE. VALOR QTDE. VALOR VALOR

A M 749 174 3.572 108 11.044 142 64.015 78.631 1,13

PA 13 382 1.989 231 40.469 150 67.318 109.777 1,58

AC 1 30 319 31 4.505 13 3.012 7.837 0,11

AP 14 39 114 10 1.853 8 12.106 14.072 0,20

RO 0 53 1.827 14 5.912 36 20.289 28.029 0,40

RR 1 38 73 4 88 6 1.251 1.412 0,02

TO 4 291 616 102 6.355 53 3.672 10.642 0,15

NORTE 782 1.007 8.510 500 70.226 408 171.663 250.400 3,59

AL 366 496 491 49 9.160 136 118.537 128.187 1,84

BA 1.824 1.121 15.291 500 85.999 413 97.861 199.152 2,86

CE 407 465 3.475 144 23.925 67 20.384 47.784 0,69

M A 282 407 3.544 107 15.816 164 41.115 60.475 0,87

PB 616 802 1.814 148 8.463 316 40.272 50.549 0,73

PE 510 549 9.475 169 39.316 193 125.093 173.884 2,50

PI 0 986 771 113 11.733 147 15.180 27.685 0,40

RN 225 331 2.633 53 15.535 47 22.146 40.315 0,58

SE 36 354 1.251 32 9.812 276 76.202 87.265 1,25

NORDESTE 4.266 5.511 38.746 1.315 219.759 1.759 556.790 815.296 11,70

ES 867 947 32.552 221 29.114 370 89.838 151.505 2,17

M G 7.496 5.515 77.673 931 110.603 609 168.435 356.711 5,12

RJ 3.829 1.981 26.648 311 109.449 681 865.753 1.001.850 14,38

SP 16.667 18.790 362.694 5.187 684.337 3.612 2.047.076 3.094.107 44,41

SUDESTE 28.859 27.233 499.567 6.650 933.503 5.272 3.171.102 4.604.173 66,25

PR 2.629 3.514 37.131 1.384 128.701 476 160.440 326.272 4,68

RS 1.735 9.275 19.992 784 75.392 704 307.294 402.677 5,78

SC 1.098 2.208 19.544 802 76.810 598 179.431 275.785 3,96

SUL 5.462 14.997 76.667 2.970 280.903 1.778 647.165 1.004.734 14,42

MS 392 380 6.012 97 17.112 273 45.728 68.852 0,99

GO 451 585 3.730 172 25.238 153 58.441 87.409 1,25

MT 98 259 2.319 31 21.364 79 59.987 83.670 1,20

DF 25 781 373 3 393 12 51.250 52.015 0,75

C.OESTE 966 2.005 12.434 303 64.107 517 215.406 291.946 4,19

BRASIL 40.335 50.753 635.924 11.738 1.568.498 9.734 4.762.126 6.966.549 100,00

Fonte: MPAS/INSS /DAFNotas:Recolh. = RecolhimentoCDF = Confissão de Dívida Fiscal (parcelamentos)NFLD = Notificação Fiscal de Lançamento de DébitoRAF = Resultado da Ação Fiscal = Recolh. + CDF + NFLD

(R$ milhares)

31Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

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3 2 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-9932 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

FLUXO DE CAIXA - Janeiro a setembro de 1999

Analisando o comportamento daprincipal fonte de receita da Previ-dência Social, qual seja a Arreca-

dação Bancária + Simples (advindas dorecolhimento de empregadores e em-pregados), no período de janeiro a se-tembro de 1999, observou-se que hou-ve um incremento nominal de 3,44%em relação ao acumulado do mesmoperíodo de 1998 e uma queda real de4,46%. Em termos monetários, houveum acréscimo nominal de R$ 1,202 bi-lhão para os cofres do INSS, ou seja,passou de R$ 34,953 bilhões nos noveprimeiros meses de 1998 para R$36,155 bilhões no mesmo período de1999. Já em termos monetários reais (apreços de setembro de 1999, atualiza-dos pelo IGP-DI), houve uma queda deR$ 1,769 bilhão, ou seja, passou de R$39,685 bilhões para R$ 37,916 bilhões.

Analisando sob a ótica da ReceitaTotal, verificou-se um incremento nomi-nal de 16,01% e um incremento real de7,15% no total dos recebimentos, de ja-neiro a setembro de 1999, em compa-ração a igual período de 1998. Em ter-mos monetários, essa receita subiu noperíodo de R$ 40,495 bilhões para R$46,978 bilhões, ou seja, um acréscimode R$ 6,483 bilhões. Esse fato se deve,principalmente, à ocorrência de ante-cipação de receita acumulada da ordemde R$ 5,113 bilhões no período. Valeassinalar que estamos designando deReceita Total a arrecadação bancária +transferências do Tesouro + outras re-ceitas + antecipação de receita + apli-cações financeiras.

Arrecadação bancária realcai 4,46% no período

Quanto aos repasses constitucionaisdo Tesouro Nacional, observou-se umadrástica queda nesse período na rubri-ca Contribuição sobre o Lucro Líquido,já que o valor repassado nos nove pri-meiros meses de 1998 foi de R$ 2,777bilhões, enquanto que no mesmo pe-ríodo do corrente ano o repasse foi deapenas R$ 488,22 milhões. Quanto aocomportamento dos repasses da rubri-ca Cofins/Loas, destinados ao pagamen-to de benefícios dos idosos acima de70 anos e inválidos, é preciso levar emconta que houve uma considerável me-lhora, passando de R$ 608,32 milhõesde janeiro a setembro de 1998 para R$1,122 bilhão no mesmo período de1999.

Em seu conjunto, os repasses daUnião aumentaram de R$ 4,312 bilhõesde janeiro a setembro de 1998 para R$5,777 bilhões no mesmo período de1999, evidenciando um melhor cumpri-mento do Tesouro Nacional para comsua obrigação constitucional de realizara devida alocação dos recursos orça-

mentários destinadosao financiamento daSeguridade Social.

Se analisarmos ocomportamento daarrecadação/Simples,em particular, verifica-se que ela teve umcrescimento nominalde 8,35% e real de0,03% nos meses acu-mulados, considera-dos de 1999 em com-

paração a mesmo período de 1998. Emtermos monetários, isso representouum aumento de R$ 85 milhões, passan-do de R$ 1,019 bilhão de janeiro a se-tembro de 1998 para R$ 1,104 milhãono mesmo período de 1999.

Sob a ótica das despesas e analisan-do especificamente o comportamentoda principal rubrica, qual seja a de Be-nefícios em manutenção, observou-seum aumento nominal de 9,86%, caindoem termos reais para 1,47%, nos noveprimeiros meses de 1999 em relação aosde 1998.

Em termos gerais, o Fluxo de CaixaConsolidado do Instituto Nacional doSeguro Social (INSS), de janeiro a se-tembro de 1999, continua apresentan-do um desempenho favorável em rela-ção a igual período do ano passado, oque confirma mais uma vez o esforçoarrecadador dos fiscais de contribui-ções previdenciárias, bem como tam-bém do conjunto dos servidores daPrevidência.

Assessoria Econômica da ANFIP

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Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99 3 3 33Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Fluxo de caixa consolidado do INSS - Janeiro a setembro de 1999(R$ milhares)

DISCRIMINAÇÃO JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET ACUM.

1 - SALDO INICIAL 464.910 299.758 179.144 259.925 505.459 297.072 372.219 1.213.966 593.449 464.910

2 - TOTAL RECEBIMENTOS (A+B) 5.056.081 4.918.834 5.188.656 8.786.909 1.400.795 5.242.315 6.296.746 4.715.012 5.373.076 46.978.424

Arrecadação Bancária 3.711.314 3.730.924 3.838.881 3.945.264 3.871.893 3.943.924 4.016.476 3.991.877 4.000.956 35.051.509

Depósitos Judiciais 99.658 36.447 38.176 39.898 44.868 48.653 48.553 52.646 50.525 459.424

Remuneração s/ Arrecadação Bancária 389 441 548 467 448 270 590 578 281 4.012

Rendimento Aplicações Financeiras 4.129 4.973 4.924 5.079 4.202 3.139 2.901 2.797 2.815 34.959

Resgate de Títulos e Bonificações 4 2 0 0 0 0 208 208 208 630

Outros 37.763 32.610 37.624 22.588 43.699 32.846 41.159 46.717 32.638 327.644

Antecipação de Receita 537.436 447.106 463.065 243.931 370.345 357.137 2.419.019 0 275.582 5.113.621

SUBTOTAL A 4.390.693 4.252.503 4.383.218 4.257.227 4.335.455 4.385.969 2.419.019 4.094.823 4.363.005 36.881.912

Arrecadação / SIMPLES 127.418 101.905 104.784 119.793 118.809 127.272 130.673 135.867 137.705 1.104.226

Recursos Ordinários 90.000 238.472 114.871 16.918 18.673 17.751 89.368 126.405 270.845 983.303

Cota de Previdência 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

COFINS 166.371 93.501 269.351 362.875 390.288 445.037 545.874 121.575 293.957 2.688.829

COFINS/LOAS 111.135 113.036 114.569 127.330 122.890 131.700 131.000 134.761 136.410 1.122.831

Contribuição Plano Seguridade Social 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Fundo de Estabilização Fiscal 90.000 92.000 90.000 75.900 71.000 15.480 40.000 0 0 474.380

Fundo de Estabilização Fiscal / EPU 108.358 12.184 56.862 57.084 56.627 56.543 55.653 57.892 57.384 518.587

Contribuição Social Sobre o Lucro 0 7.100 40.350 29.314 28.166 62.654 120.943 45.810 153.888 488.225

Cont. Prov. S/ Mov. Financeira 0 0 0 0 0 0 3.488.274 0 544.706 4.032.980

SUBTOTAL B 693.282 658.198 790.787 789.214 806.453 856.437 4.471.112 622.310 1.594.895 11.282.688

3 - TOTAL DE PAGAMENTOS 5.220.213 5.039.448 5.097.875 5.070.385 5.090.172 5.167.367 5.455.039 5.338.526 5.373.237 46.852.262

Benefícios 4.521.413 4.471.371 4.518.760 4.538.367 4.581.594 4.644.218 4.840.857 4.846.307 4.841.581 41.804.468

Custeio 232.518 70.985 163.812 61.782 98.542 66.973 83.890 75.153 66.121 919.776

Pessoal 151.022 214.649 149.515 207.989 142.676 192.303 248.713 172.462 187.931 1.667.260

Restituições 2.494 3.157 4.220 4.692 3.978 4.016 4.733 5.949 8.881 42.120

Transferência a Terceiros 312.766 279.286 261.568 257.555 263.382 259.857 276.846 238.655 268.723 2.418.638

FNDE - Salário-Educação 103.667 93.983 85.072 70.141 88.370 87.086 91.751 65.210 64.708 749.988

INCRA 20.282 17.611 16.500 17.853 16.374 16.692 17.948 16.873 20.847 160.980

DPC/FDEP - Marítimo 1.544 1.374 1.351 1.544 1.110 1.641 1.737 1.641 1.689 13.631

SEFA - Fundo Aeroviário 3.254 2.799 2.895 2.943 2.509 2.413 3.040 3.040 2.943 25.836

SDR/MAARA 3.630 3.088 2.847 3.185 2.991 2.895 3.089 2.943 3.474 28.142

SENAI 18.630 17.129 14.572 16.309 16.585 13.896 17.272 15.352 18.670 148.415

SESI 23.512 21.905 19.397 21.423 20.245 19.589 21.613 20.268 23.226 191.178

SENAC 25.825 23.932 22.774 22.436 20.024 21.230 22.192 20.838 25.007 204.258

SESC 51.955 45.355 45.450 45.452 40.530 44.472 43.419 41.774 47.884 406.291

SEBRAE 48.421 42.219 40.819 41.736 40.749 37.246 41.685 39.083 46.813 378.771

SENAR 2.917 2.316 2.123 2.654 3.908 3.957 3.817 2.412 2.847 26.951

SEST 5.512 4.535 4.632 4.680 5.211 4.246 4.776 4.825 5.452 43.869

SENAT 3.617 3.040 3.136 3.136 3.377 2.095 3.232 3.138 3.667 28.438

SESCOOP 0 0 0 4.063 1.399 1.399 1.496 1.361 1.496 11.214

6 - SALDO NOMINAL (1+2-3) 328.438 199.287 276.108 250.041 297.072 372.220 1.213.966 593.449 604.289 604.289

7 - SALDO OPERACIONAL (2-3) -136.472 -129.152 75.822 -26.068 47.031 75.148 841.747 -620.517 10.839 138.378

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3 4 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

Reginaldo de CastroPresidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB

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34 Revista de Seguridade Social - Novembro/Dezembro-99

m setembro, o presidente do Fun-do Monetário Internacional, MichelCamdessus, em reunião anual dos

sócios daquele organismo financei-ro, declarou, preocupado, que “é preciso

humanizar a globalização”, cujo custo nes-se setor “tem sido imenso”.

Disse mais: que a globalização, em vez

de resolver a questão da miséria no mundo,ampliou-a, aprofundou-a. Lembrou, por fim,

algo óbvio: que a economia deve servir ohomem e não o inverso. Como se sabe, nadadisso é exatamente novo.

Tratou-se, porém, de momento singularna trajetória do capitalismo deste século que

finda, pois, pela primeira vez, tal enunciadoera feito pelos donos do mundo, pelos au-tores do modelo diagnosticado como fracas-

sado. Desde sua criação, há mais de cinqüenta anos, foi aprimeira vez que o FMI e os organismos multilaterais de cré-

dito, mentores do processo de globalização que aí está, ad-mitiram que o combate à pobreza deve ser tratado comometa prioritária.

Dia 9 de outubro, a revista inglesa The Economist, uma dasbíblias dos investidores do Primeiro Mundo – exatamente a

platéia reunida dias antes em torno da surpreendenteconstatação de Camdessus –, classificava de “loucos do Bra-sil” (era o título do editorial) os 11 ministros do Supremo

Tribunal Federal. O motivo: cumprindo fielmente seu deverde zelar pela integridade do texto constitucional brasilei-

ros, esses ministros haviam rechaçado a cobrança indevidade contribuição previdenciária dos servidores públicos apo-sentados.

A revista, que exprime interesses e pontos de vista debanqueiros internacionais – exatamente os que se servem

das fragilidades econômicas e institucionais dos países peri-féricos para multiplicar fortunas especulativas da noite parao dia –, preocupa-se com a perda da receita de R$ 2,38 bi-

lhões, gerada por aquela decisão, e que deveria compor osuperávit imposto pelo FMI ao Governo brasileiro como re-

serva estratégica para pagar banqueiros.Com esse dinheiro, serão pagos juros escorchantes ao

cassino mundial da especulação financeira. O mesmo cassi-

no que Camdessus admite estar gerandomais miséria e colocando o ser humano aserviço da economia – e não o contrário.

Loucos, portanto, não são os ministrosdo STF, que cumpriram seu dever constitu-

cional de defender a ordem jurídica e o Es-tado Democrático de Direito, mas a lógicamonetarista selvagem, sustentada pela re-

vista, que, em nome de interesses espolia-tivos, considera a Constituição um detalhe

e a miséria humana mera figura de retórica.Se estivessem efetivamente preocupados

com o crescimento da pobreza no planeta,

os financistas de The Economist não conside-rariam os ministros do STF loucos. Loucos são

os que sustentam uma ordem econômicaalucinada, perversa e absolutamente burra,que conduz o planeta a um desfecho trágico,

inclusive para os interesses do Primeiro Mundo. A estratégiade matar a galinha dos ovos de ouro é irracional, pois até para

sustentar um quadro de dominação e exploração é precisolevar em conta certas regras, ter alguma consideração com osexplorados para que continuem vivos e em condições de con-

tinuar a servir. Nem isso está sendo observado.Loucos e caras-de-pau, portanto, são os que sustentam a

lógica do editorial daquela revista. Caras-de-pau porque le-varam a cobiça a um ponto em que já não há sutileza. A hipo-crisia, ensinava La Rochefoucauld, é a homenagem que o ví-

cio presta à virtude. E o escracho dos dias de hoje, o queserá? É o império da cara-de-pau, do cinismo mais deslavado,

vocalizado por The Economist.De acordo com o Banco Mundial (outro artífice da

globalização selvagem), 81% da população do planeta têm

renda suficiente para apenas manter-se subnutridos. Cercade 1,3 bilhão de pessoas vivem com apenas 1 dólar por dia.

Os norte-americanos, que comandam os organismos multi-laterais que conduzem a globalização, representam 5% dapopulação mundial, mas respondem pela metade da renda e

do consumo do planeta.Há algo de louco, muito louco, em tudo isso. E a loucura,

com toda certeza, não emana dos ministros do STF brasilei-ro, nem muito menos dos servidores públicos aposentados,cujos direitos adquiridos foram preservados.

“Loucos não são osministros do STF, mas a

lógica monetarista selvagemque considera a Constituição

um detalhe e a misériahumana mera figura de

retórica”

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Foto: Rosane Marinho/Sapiens

Idéias & Debates

Loucos e caras-de-pauLoucos e caras-de-pau

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