a textualização científica em dois discursos de lima... · programa de pÓs-graduaÇÃo em...
TRANSCRIPT
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO
CRISTIANE DE LIMA BARBOSA
A textualização científica em dois discursos:
jornalismo ou ciência?
MANAUS
2010
2
CRISTIANE DE LIMA BARBOSA
A textualização científica em dois discursos:
jornalismo ou ciência?
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Comunicação (PPGCCOM) da Universidade
Federal do Amazonas (Ufam), como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Ciências da Comunicação,
área de concentração Ecossistemas Comunicacionais.
Orientador: Prof.Dr. Sérgio Augusto Freire de Souza
MANAUS
2010
3
B238t Barbosa, Cristiane de Lima.
A textualização científica em dois discursos: Jornalismo ou Ciência / Cristiane de Lima Barbosa. – Manaus, Am: 2010.
126 p.: il. color.; 30 cm.
Dissertação (Mestrado em Ciências da Comunicação) – Universidade Federal do Amazonas. Instituto de Ciências Humanas e Letras. Departamento de Comunicação Social. Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação. Área de Concentração: Ecossistemas Comunicacionais.
Orientador: Profº. Dr. Sérgio Augusto Freire de Souza
1. Jornalismo Científico. 2. Análise do Discurso. 3. Difusão Científica. 4. Comunicação Científica. I. Título.
CDD 070.44950
Ficha Catalográfica
Elaborada pela Bibliotecária Tatiane Cruz CRB11/743 (AM)
4
CRISTIANE DE LIMA BARBOSA
A textualização científica em dois discursos: jornalismo ou ciência?
Dissertação apresentada à banca examinadora como requisito parcial
para a obtenção do grau de Mestre no Programa de Pós-Graduação
em Ciências da Comunicação da Universidade Federal do
Amazonas.
Aprovada em 12/07/2010
Banca examinadora
______________________________________________________
Prof. Dr. Sérgio Augusto Freire de Souza/UFAM – Presidente
______________________________________________________
Prof. Dra. Mirna Feitoza Pereira/UFAM - membro
______________________________________________________
Profa. Dra. Maria Luiza Cruz-Cardoso/UFAM - membro
5
Ao Mestre Jesus Cristo, por me conceder
desde sempre a graça de estudar e de alcançar
meus objetivos com o apoio de pessoas tão
especiais que me cercam, como meus pais,
minha filha amada, meu marido, meu guru
professor Sérgio Freire e meus verdadeiros e
poucos amigos.
6
Agradecimentos
A Deus, pela fortaleza, sabedoria e saúde que me foi concedida.
Ao meu estimado orientador Dr. Sérgio Freire, profissional exemplar do saber, amigo e grande ser
humano, que me mostrou os caminhos da Análise do Discurso de maneira paciente e dedicada. Um simples
obrigado é pouco para a tremenda força que este guru me proporcionou nos anos do mestrado.
Ao professor Gilson Monteiro, que desbravou verdadeiros obstáculos para conseguir trazer o primeiro
mestrado em Ciências da Comunicação para o Norte do país. Parabéns a esse grande homem, que marcou a
história da comunicação em toda região. Essa vitória também é dele.
À Universidade Federal do Amazonas, por mais essa oportunidade de formação no seio dessa renomada
instituição.
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) por me incentivar no caminho da
divulgação científica.
A todos os docentes do mestrado que me estimularam e fortaleceram minha caminhada: Dra. Luiza
Elayne, Denize Picolloto, Dra. Mirna Feitoza Pereira, Dr. Walmir Albuquerque e Dr. Narciso Freire Lobo (In
memorian). Ao professor Dr. Dirceu Gama, que contribuiu de forma singular no meu exame de qualificação.
Agradeço ainda aos técnicos do departamento de comunicação da Universidade Federal do Amazonas e à equipe
do Grupo de Pesquisas Interfaces, pelo apoio em todos os momentos.
Aos colegas da primeira turma do mestrado em Ciências da Comunicação (Márcia Daniella, Judy
Tavares, Sylker Teles, Luiz Augusto Pires e Johane), pelas aulas e trabalhos compartilhados que foram muito
produtivos e inesquecíveis.
Aos novos amigos conquistados durante o mestrado, em especial: Sorany Neves, Tatiane Cruz e Luiz
Mansueto Filho, pela compreensão e apoio inestimável nos momentos alegres e também críticos da vida
acadêmica.
À minha família, pelo apoio em todos os momentos, desde a concepção do projeto até a conclusão deste
trabalho. Em especial, meus pais amados Nazaré e Lázaro, esposo Pedro e amada filha Mariah Clara, que
toleraram minha ausência e entenderam minha dedicação maior à pesquisa. Ao amigo Eustáquio Libório, na
época do Jornal do Commercio, por me apoiar nessa fase decisiva de minha vida acadêmica.
Sem o apoio de muitas pessoas esse trabalho seria inviável, pois é apenas com a construção coletiva que
alcançamos grandes obras. Meus sinceros agradecimentos para todos que até aqui me ajudaram no
desenvolvimento dessa pesquisa.
7
Resumo
Este trabalho tem como objetivo principal analisar se e como ocorre o deslocamento do
Discurso Científico para o Discurso de Divulgação Científica em produtos de divulgação
científica no Estado do Amazonas. É um estudo feito a partir da teoria da Análise do
Discurso de linha francesa, sobretudo a partir dos construtos trabalhados no Brasil por Eni
Orlandi. O corpus da pesquisa se consubstancia da análise discursiva do suplemento de
Ciência e Tecnologia do jornal Amazonas em Tempo e da revista Amazonas faz ciência, por
serem publicações voltadas exclusivamente para a ciência no Estado. A principal contribuição
pretendida é a formulação de diretrizes para a prática do jornalismo científico, considerando
as marcas e o funcionamento dos gêneros textuais inerentes a esse discurso. Os resultados
apontam a direção para a articulação de estratégias linguísticas tanto para jornalistas quanto
para cientistas.
Palavras-chave:
Análise do Discurso. Difusão Científica. Jornalismo Científico. Comunicação Científica
8
Abstract
This work aims at analyzing whether and how the movement from the Scientific Discourse to
the Scientific Divulgation Discourse happens. For the analysis, it focuses on some products of
scientific divulgation in the State of Amazonas, Brazil. The research has its theoretical basis
on Discourse Analysis, specially stemming from the works by Eni Orlandi. The corpus was
designed in order to allow the discursive analyses of the Science & Technology newspaper
supplements of Amazonas em Tempo and of the magazine named Amazonas faz ciência,
published by the office for research support in the State of Amazonas (Fapeam). Both were
chosen for being focused on the science produced in the State. The expected outcome for the
work is the design of parameters for the practice of scientific journalism, considering for this
the marks and the functioning of the genres belonging in this discourse. The results point at
the articulation of linguistic strategies for both journalists and scientists.
Key-words:
Discourse Analysis. Scientific Difusion. Scientific Journalism. Scientific Communication.
9
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Revistas “Amazonas faz Ciência” analisadas.................................. 54
Tabela 2 – Suplementos do caderno “Intermais” analisados............................. 76
10
Lista de Abreviaturas
AD – Análise do Discurso
DC – Discurso Científico
DDC – Discurso de Divulgação Científica
JC- Jornalismo Científico
FD – Formações Discursivas
11
SUMÁRIO
Introdução................................................................................................................ 12
1 Fundamentos teóricos........................................................................................... 17
1.1 Discurso e Linguagem......................................................................................... 18
1.2 Sujeito e Ideologia................................................................................................ 23
1.3 Ciência e Difusão Científica................................................................................ 28
1.4 O espaço da divulgação científica........................................................................ 31
1.4.1 Bueno: conceitos e características da Difusão Científica.................................. 31
1.4.2 Ciência e Jornalismo: encontros e desencontros no JC..................................... 34
1.4.3 A Divulgação Científica e o Estado...................................................................... 41
1.4.4 Jornalismo Científico na Amazônia...................................................................... 46
2 Constituição dos discursos em textos de DC....................................................... 50
2.1 DDC ou DC: exemplos de variação discursiva nas revistas................................ 54
2.1.1 Amazonas faz Ciência: características.............................................................. 55
2.1.2 Análise da R1-A................................................................................................ 55
2.1.3 Análise da R1-B................................................................................................ 60
2.1.4 Análise da R2-A............................................................................................... 63
2.1.5 Análise da R2-B................................................................................................ 67
2.1.6 Análise da R3-A................................................................................................ 70
2.1.7 Análise da R3-B................................................................................................ 73
2.2 Suplementos de Ciência e Tecnologia................................................................. 76
2.2.1 Análise do J1-A................................................................................................. 76
2.2.2 Análise do J2-A................................................................................................. 79
2.2.3 Análise do J3-A................................................................................................. 82
3 Considerações finais.............................................................................................. 87
3.1 Diretrizes para uma prática jornalística................................................................ 89
3.1.1 Quando a ciência vira notícia........................................................................... 89
3.1.2 Comunicador: produzindo notícia sobre ciência................................................ 91
3.1.3 Cientista: agente de divulgação científica.......................................................... 94
3.1.4 Conclusão....................................................................................................... 96
Referências................................................................................................................ 97
Anexos........................................................................................................................ 102
12
Introdução
A redação da ciência é considerada ainda em evolução e em construção, em pleno
século XXI. Burkett (1990) aponta que o escritor de ciência se torna parte de um sistema de
educação e comunicação tão complexo como a ciência moderna e a sociedade mais ampla.
“Em seus alcances mais extremos, a redação científica ajuda a transpor a brecha entre
cientistas e não-cientistas”. (idem, p.6).
Pelos diagnósticos históricos do autor, o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia foi
intensificado com o advento da primeira Guerra Mundial. No entanto, na II Guerra Mundial
esse interesse ainda foi maior por conta dos acontecimentos da época. Já no Brasil, o marco
inicial das pesquisas científicas ocorreu com a chegada da corte real portuguesa, em 1808,
quando foram criadas instituições de ensino superior. Já o jornalismo científico iniciou no
país por meio do jornal O Correio Braziliense, de Hipólito da Costa, o primeiro jornal
brasileiro.
A principal função do jornalismo científico é promover a divulgação da ciência ao
homem leigo, contextualizando os trabalhos desenvolvidos no âmbito dos laboratórios e
instituições de pesquisa, segundo o gênero jornalístico.
Trata-se de uma ferramenta utilizada pelos pesquisadores com o objetivo de retratar o
que é pesquisado e analisado dentro dos laboratórios e nas salas das universidades de forma
precisa, clara e coesa. Esse é o desafio. Mas como fazer isso sem comprometer as
informações corretas sobre pesquisas tão complexas? Como deslocar a linguagem acadêmico-
científica para os gêneros do discurso jornalístico?
Busca-se aqui um caminho para a compreensão dos mecanismos de funcionamento da
divulgação científica e com isso, busca-se igualmente entender o papel fundante na imagem
de ciência que circula no imaginário social. Para a definição e caracterização do jornalismo
científico utilizaremos as leituras de Burkett (1990), Oliveira (2002) e Bueno (2009).
Há uma estreita linha entre os dois discursos que falam da ciência em jornal e em
revista. Esse cenário nos leva a seguinte pergunta de pesquisa: A ciência divulgada no
Amazonas é determinada pelos elementos caracterizadores do discurso de divulgação
científica?
Como hipóteses para esta pergunta de pesquisa, temos que:
13
a) As publicações especializadas em Ciência têm maneiras específicas de construir
seus textos, mas ainda há a dificuldade na transição do Discurso da Ciência (DC,
doravante) para o Discurso de Divulgação Científica (DDC, doravante), com o uso
de termos e formatos utilizados no discurso de divulgação científica no jornal ou
revista;
b) O DDC funda um lugar para a ciência, que amplia sua importância social, e a
divulgação científica, por sua textualização, populariza a ciência, mas nem tudo o
que trata a respeito de ciência e está escrito em jornais e revistas pode ser
considerado como jornalismo científico ou ciência.
As notícias relacionadas à ciência e à tecnologia passaram, nos últimos anos, a ocupar
mais espaço na mídia nacional. Elas igualmente despertaram interesse no grande público
dadas a curiosidade e a necessidade de informações sobre temas na agenda, como clonagem,
aquecimento global, técnicas da medicina, nanotecnologia, fórmulas para a longevidade e
outros das mais diversas áreas do conhecimento.
Assim, as informações e resultados de pesquisas que antes ficavam restritas a um
seleto grupo de pessoas foram expandidas para a sociedade em geral por meio de publicações,
tanto em revistas, jornais e sites. Nesse contexto, os passos da ciência passam a caminhar não
mais distantes da realidade cotidiana, mas como integrantes do dia-a-dia do cidadão comum.
Por conta dessa proximidade, o turbilhão de informações relacionadas a descobertas e
novidades científicas e tecnológicas que se produz dentro das instituições de pesquisa precisa
estar mais ao alcance das pessoas, permitindo que elas as relacionem com seu cotidiano. Um
papel de mediação é necessário. No entanto, a discussão acerca de como é feita a difusão
científica no Brasil continua e ainda gera polêmica quando o assunto se refere à transposição
de uma linguagem especializada para uma mais acessível e ao alcance do grande público.
Essa transposição é necessária porque se produz linguagem de forma diferenciada. Por
um lado, cientistas desenvolvem o texto de uma pesquisa a médio e longo prazo, dotados de
termos específicos que exigem conhecimento especialista sobre o tema e por isso é, grosso
modo, somente discutido entre pares. Por outro, os jornalistas, com um prazo reduzido para
concluírem suas matérias, têm a missão de levar o conhecimento científico ao registro de
linguagem acessível à população.
Plural, o texto jornalístico é construído com várias vozes. Essa polifonia pode abranger
desde fontes, jornalistas, articulista, além, é claro, o próprio leitor. É um discurso textualizado
14
em gêneros revestidos, então, de uma materialidade discursiva própria, presente na
constituição dos sentidos que o faz circular.
Nenhuma linguagem acontece isolada. Um dos pontos principais de convergência
entre jornalistas e pesquisadores é o de que a ciência é notícia. Ambos, jornalistas e
pesquisadores, dividem o espaço da disseminação científica, normalmente marcados no
instante da definição do que é ou não notícia, do que interessa ou não ao grande público.
Mesmo com um ponto de convergência, no entanto, são dois lugares enunciativos diferentes.
Essa discussão apresenta algumas facetas que a caracterizam. O debate sobre
disseminação científica, seja por meio do DC – feita por e para especialistas –, seja por
intermédio do DDC – pensada para o público em geral – desperta inquietações na academia.
Todos, em suas contradições, buscando chegar a um denominador comum para delinear
caminhos para uma divulgação eficaz das descobertas e pesquisas científicas.
Dessa maneira, o objetivo geral deste trabalho é analisar se e como ocorre o
deslocamento do DC para o DDC em produtos de divulgação científica, que assim se
apresentam no Estado do Amazonas.
Para atingir o objetivo, a pesquisa foi desenhada a partir do seguinte roteiro:
Primeiramente, abordamos e aprofundamos os conceitos de disseminação científica,
divulgação científica e jornalismo científico e descrevemos cada conceito a partir do modelo
da forma-funcionamento. Em seguida, realizamos uma análise qualitativa da revista e do
suplemento jornalístico, identificando as marcas na textualidade que permitiram chegar às
propriedades do discurso explicitado no conteúdo dos objetos. Em seguida, verificamos se a
divulgação científica, no corpus analisado, converge em seu funcionamento para jornalismo
científico ou não, aqui pensado discursivamente, para além da forma. Por fim, propusemo-nos
a construir, a partir da análise, referenciais que apontem para uma efetiva produção de
jornalismo científico para os profissionais atuantes nesse segmento da comunicação.
Com base teórica sustentada na Análise do Discurso de linha francesa (AD,
doravante), o corpus da pesquisa é composto pela análise do Intermais, suplemento de Ciência
e Tecnologia do jornal Amazonas em Tempo, e da revista Amazonas faz ciência, da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam). A escolha se deu por serem essas
publicações voltadas exclusivamente para a ciência no Estado.1 Nesses informativos, propõe-
1 Neste trabalho utilizaremos o termo ciência no sentido lato, englobando conceitos relacionados a ela, tais como
inovação e tecnologia.
15
se identificar as marcas no discurso de cada objeto e descobrir se eles se caracterizam como
jornalismo científico ou como ciência publicada na revista ou no jornal.
Como recorte metodológico, decidiu-se fazer o levantamento de seis exemplares,
sendo três de cada publicação. Uma análise mais extensiva não se faz necessária, pois, pelos
pressupostos da AD, a partir do momento em que há identificação do funcionamento do
discurso de um objeto estudado e de suas propriedades, ele tende a ser recorrente, atualizando
essas propriedades por paráfrases em suas novas textualidades.
Nos textos selecionados para análise do corpus, pretendeu-se percorrer o olhar de
analista sobre o texto em busca de sua historicidade, verificando o ponto de encontro entre o
ideológico e o linguístico, que não é transparente, até porque se o fosse não se trataria de uma
análise, mas de um trabalho meramente descritivo.
Pela ótica da AD, a pesquisa está diante de um objeto teórico que é o discurso. Por
conta disso, o trabalho discute conceitualmente as noções de ciência, sujeito e discurso, dando
ênfase, sobretudo à análise do jornalismo científico como vetor da difusão de conhecimentos
na sociedade pós-moderna.
Por se tratar de um tema ainda pouco explorado na região e percebendo que não existe
ainda a sistemática divulgação massiva da ciência no Estado do Amazonas, a proposta da
pesquisa é analisar como ocorre o processo de formulação de um discurso outro partindo do
discurso científico, verificando que não há apenas a reformulação ou recodificação para se
dirigir a um público mais amplo.
Trata-se de um trabalho científico que busca mostrar sua relevância por meio da
verificação das formas e maneiras para pensar a divulgação da ciência. É necessário pensar
esse processo não apenas na prática, mas em suas mudanças com reflexo e as consequências
no próprio fazer e pensar jornalismo científico.
Este estudo busca ser relevante igualmente por viabilizar diagnósticos da divulgação
científica, contribuindo com a massa crítica dos vários processos comunicativos no Estado,
estabelecendo uma análise mais detalhada e crítica do discurso da mídia na ciência. Para
compreender como os discursos produzem sentidos, faz-se necessário então considerar as
condições de produção dos mesmos, pensar a formulação do dizer e a memória que o
constitui.
A principal contribuição deste trabalho será a formulação de diretrizes para a prática
do jornalismo científico. Essas diretrizes são propostas considerando as marcas e o
16
funcionamento do discurso inerentes aos gêneros textuais do DC. Os resultados devem
apontar a direção para a articulação de estratégias linguísticas tanto para jornalistas quanto
para cientistas, com vistas à construção de um enunciador jornalista (voltado para o
comprometimento com o público em geral) e o outro com enunciador cientista (mediador do
saber e detentor de voz de autoridade em seu campo de atuação).
Para atingir o objetivo proposto, o trabalho organizar-se-á da seguinte forma:
O primeiro capítulo inicia com um panorama geral dos termos fundantes para esta
pesquisa como, sujeito, linguagem, ideologia e ciência. Além disso, busca-se entender os
conceitos de disseminação científica, incluindo DDC e DC, e discutir o papel do jornalismo
científico e seus desafios na contemporaneidade.
O segundo capítulo traz a análise propriamente dita com a apresentação do discurso-
objeto e análise do corpus composto pelo suplemento Intermais, caderno de Ciência e
Tecnologia do jornal Amazonas em Tempo, e da revista Amazonas Faz Ciência, da Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
O último capítulo, por sua vez, aponta os resultados mais importantes da pesquisa.
Eles devem responder à pergunta de pesquisa que, relembrando, quer saber o que caracteriza
cada um dos discursos que lidam com a ciência (DC e DDC) para construir caminhos que
apontem aos profissionais atuantes nesse segmento uma efetiva produção de jornalismo
científico, apontando questões que não poderão ser desconsideradas por quem quer trabalhar
com jornalismo científico.
É preciso frisar, por fim, que para a AD o gesto da análise não é um gesto linear. É
necessário recorrer às idas e vindas, às recorrências de outros discursos, que são constitutivos
em virtude das sobreposições e confrontos que ocorrem durante o próprio gesto de leitura e
releitura do texto recortado como parte de um campo de documentos pertinentes e disponíveis
sobre uma questão. Com o mapa do percurso desenhado, seguimos viagem.
17
1 Fundamentos Teóricos
Iniciamos pela necessária exposição teórica sobre os conceitos fundantes relacionados
a essa pesquisa. Dentre esses conceitos, estão os de discurso, ideologia, sujeito, linguagem,
formações discursivas e também jornalismo científico, discurso científico e discurso da
divulgação científica. Os conceitos são apropriados e ganham uma dimensão específica dentro
do quadro conceitual da Análise do Discurso Francesa, principalmente pelos trabalhos de
Orlandi (2001, 2003 e 2004).
O entrelaçamento desses conceitos leva ao mapeamento necessário para o
desenvolvimento da análise do corpus proposto neste trabalho. Para isso estaremos utilizando
a AD francesa, que vem pôr em jogo a linguagem e a ideologia, não em um processo
somatório, mas em um fundamentalmente contraditório. “A contradição aqui deve ser
entendida não como algo indesejável, mas como princípio constitutivo da linguagem e da
possibilidade da polissemia, de outros sentidos”. (SOUZA, 2006, p.15). Assim, a AD assume
que essa contradição é constitutiva da língua.
O capítulo inicia com a discussão sobre a noção de discurso e o funcionamento
próprio, à luz da AD francesa, considerando o embasamento teórico proposto nos trabalhos
de Orlandi. Um dos pontos abordados é de que o discurso se configura na conjugação entre a
língua e a história, dando a impressão de realidade. Além disso, mostra ainda a formação do
sujeito discursivo que funciona pelo inconsciente e pela ideologia. Assim, o sujeito de
linguagem é descentrado, pois é afetado pelo real da língua e também pelo real da história,
não tendo o controle sobre o modo como elas o afetam.
Antes de tratar sobre a disseminação científica, recorre-se a Bourdieu, que elabora a
noção de campo científico, contrariando o paradigma da ciência como auto-suficiente,
gerando-se em si mesma, sem intervenção externa e muito menos social.
Esse conteúdo é seguido de uma apresentação e discussão sobre o papel da divulgação
científica na disseminação da ciência para a sociedade. Sob a ótica de Bueno (1984), Zamboni
(2001) e Oliveira (2002), verifica-se que os periódicos de divulgação científica atuam com
características especiais que partem do discurso científico e jornalístico.
18
1.1 Discurso e linguagem
O discurso não deve ser confundido com a noção de fala. Ele tem sua regularidade,
tem seu funcionamento próprio. Na perspectiva da Análise do Discurso, a noção desse
conceito se distancia da forma como o esquema elementar da comunicação dispõe seus
elementos, composto por emissor, receptor, código, referente e mensagem.
Discurso é efeito de sentidos entre locutores, segundo Orlandi (2003). Isso evidencia
que para a AD não se trata apenas de transmissão de informação e nem há linearidade na
disposição dos elementos da comunicação ou algo serializado.
Na língua, não há essa distinção entre emissor e receptor e nem eles atuam numa
sequência em que primeiro um fala e depois o outro decodifica. É como diz Orlandi (2003,
p.15): “O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do
discurso observa-se o homem falando”.
Com constituição nos anos 60 do século passado, a AD é permeada por três regiões do
conhecimento: a Psicanálise (Freud), a Linguística (Saussure) e o Materialismo histórico
(Marx). No entanto, essa linha não se limita apenas ao objeto da linguística, nem apenas à
teoria marxista e tampouco se relaciona ao que teoriza a psicanálise. Orlandi destaca que a
AD trabalha a confluência desses campos de conhecimento, ultrapassando suas barreiras e
produzindo um novo recorte de disciplinas que tem como principal objeto: o discurso.
Para compreender um texto jornalístico científico, deve-se iniciar sempre a análise a
partir do próprio texto, no movimento de identificação das Formações Discursivas (FD).
Dessa forma, a FD é considerada como uma região de sentidos, circunscrita por um limite
interpretativo que exclui o que invalidaria aquee sentido. De acordo com Benetti (2008,
p.112), no mapeamento dos sentidos, é preciso limitar o campo de interpretação dos sentidos
nucleares.
Noção concebida por Foucault (1971a) ao se interrogar sobre as condições históricas e
discursivas, nas quais se constituem o discurso, Pêcheux (1995, p.160) reinscreve “formação
discursiva” no âmbito do discurso como aquilo que a partir de uma dada conjuntura, é
determinada pela luta de classes, “determina o que pode ser e deve ser dito (articulado sob a
forma de uma arenga, de um sermão, de um panfleto, de uma exposição, de um programa,
etc.)”.
19
De maneira formal, a FD abrange dois tipos de funcionamento: a paráfrase (uma FD é
constituída por um sistema de paráfrase, em que um enunciado é retomado e reformulado
como forma de manter sua identidade) e o pré-construído (um dos pontos fundamentais na
articulação da teoria dos discursos com a linguística, segundo Pêcheux (1995).
No caso da paráfrase, a noção se opõe ao que diz Orlandi (1984) com a polissemia.
Enquanto a paráfrase é um mecanismo de delimitação, de fechamento, a polissemia rompe
com essas fronteiras de uma formação discursiva, “embaralhando” os limites e implantando a
pluralidade de sentidos.
Assim, o conceito de FD regula a referência interpelação-assujeitamento do indivíduo
em sujeito do seu discurso, determinando “o que deve e pode ser dito” a seus falantes para
uma homogeneidade discursiva e indicando os efeitos das contradições ideológicas. Então,
cabe à AD trabalhar o discurso (objeto) relacionando-o à história e à ideologia, em busca das
contradições ideológicas na materialidade discursiva.
No processo de produção do discurso, destaca-se a existência de aspectos, que se
entrecruzam, em que sujeitos e sentidos se constituem e se configuram. Orlandi (2001) afirma
que estes ocorrem em três momentos igualmente relevantes:
1- Sua constituição, a partir da memória do dizer, fazendo intervir o contexto
histórico-ideológico mais amplo;
2- Sua formulação, em condições de produção e circunstâncias de enunciação
específicas e;
3- Sua circulação que se dá em certa conjuntura e segundo certas condições.
Orlandi diz que a linguagem ganha vida na formulação, que a memória se atualiza, que
os sentidos se decidem, que o sujeito se mostra (e se esconde). Orlandi (2001, p.9) entende
que há um confronto do simbólico com o político.
O corpo do sujeito e o corpo da linguagem não são transparentes, mas atravessados de
discursividade, isto é, de efeitos desse confronto, em processos da memória que têm sua
forma e funcionam ideologicamente. Na formulação, há um investimento do corpo do sujeito
presente no corpo das palavras. O momento em que o sujeito diz o que diz.
O discurso não é composto pelo enunciado, mas é um objeto teórico que possibilita
compreender a interpretação presente nos textos. Desse modo, a base para a análise dos
processos discursivos é a língua, que é dotada de autonomia e afetada pela história.
20
Segundo Pêcheux (1999), a pretensão da AD não compreende em se instituir em
especialista da interpretação, dominando o sentido dos textos, mas somente construir
procedimentos expondo o olhar-leitor a níveis opacos à ação estratégica de um sujeito. O
objetivo do analista não estar relacionado a interpretá-lo ou descrevê-lo, mas explicitar os
processos de significação que constituem o texto em análise.
Na AD, a língua tem sua ordem própria, mas se é relativamente autônoma
distinguindo-se da linguística, ela reintroduz a noção de sujeito e de situação da análise da
linguagem. (ORLANDI, 2003, p.19).
Relacionar a AD ao jornalismo pode se tornar ainda mais interessante do ponto de
vista científico principalmente quando se aborda como se constitui, se formula e põe em
circulação o que é produzido entre pares, na academia. Aqui se pretende verificar como
ocorre o funcionamento do discurso na divulgação científica, seja ela considerada como
disseminação ou divulgação científica, como bem explica Bueno (1984), conforme será
mostrado adiante.
O discurso é o lugar em que se pode observar essa relação entre língua e ideologia,
compreendendo-se como a língua produz sentidos por/para os sujeitos. A AD atua assim
como forma de conhecimento que realiza em seu objeto – o discurso - a conjunção desses três
modos de “opacidade”: a do sujeito, a da língua e a da história.
A linguagem supõe então a existência de indivíduos socialmente organizados. Baccega
(2007) destaca que o ato da fala, individual e único, está vinculado a uma apropriação de um
processo coletivo, em que o sujeito se apropria da cultura que encontra, se origina nesse
processo e retorna quando é manifestado. Nesse retorno, a autora aponta que o
indivíduo/sujeito poderá estar „reproduzindo‟ o que já estava ou inovando.
Baccega então questiona como nasce o sentido da palavra de que nos apropriamos e
como ela se produz. E como se produz o sentido de novas palavras? E prossegue: que o
sentido de uma palavra surge ou nasce a partir de mudanças sociais, de novas teorias, a partir
de novos conteúdos, enfim de novas ações humanas.
Os novos sentidos se agudizam dentro de um processo revolucionário, como a
Revolução Francesa, por exemplo.
O período que se segue ao apogeu revolucionário se caracteriza, em geral, por uma
explosão desses novos sentidos de que pouco a pouco se vão fundindo ao que já estava estabelecido, consubstanciando-se definitivamente. O novo é sempre
resultado do que já era. (BACCEGA, 2007, p.32).
21
O discurso se configura, então, nessa conjugação entre a língua e a história, dando a
impressão de realidade. As teorias científicas também impregnam as palavras de novos
sentidos.
É no dia a dia, na cotidianidade, que o processo de mudança social é percebido.
Bakhtin (1988), citado por Baccega, define a mudança social como ideologia do cotidiano,
distinguindo tais procedimentos dos sistemas ideológicos constituídos como a moral, o
direito, etc., que regem a sociedade.
Assim, o gesto da formulação é o gesto ideológico mínimo, que consuma o imaginário
no sujeito, ou seja, sua relação com a realidade, em que o assujeitamento se realiza no sujeito
sob a forma de autonomia.
Pela sua condição de flexibilidade é na ideologia do cotidiano que os movimentos das
inovações se manifestam. Apenas em seguida é que eles são modelados nos sistemas
ideológicos constituídos, conservando-os ou modificando-os.
Segundo Baccega (2007), é no cotidiano que as palavras, que acompanham nossos
gestos e atos surgem em mutação, muitas vezes indecisas, plenas de sua
reprodução/transformação. A autora então reforça dizendo que “o novo está contido nas
possibilidades do velho. Esse é um fato inscrito na linguagem” (idem, p.34).
Na perspectiva discursiva, o que interessa no momento da análise é a organização do
texto em sua discursividade, em sua relação com a língua: a sua materialidade.
O texto é lugar de jogo de sentidos, de trabalho da linguagem, de funcionamento da
discursividade. Assim, o texto é atravessado por várias formações discursivas, como explica
Orlandi (2004, p.56): “[...] o objetivo da AD é compreender como um texto funciona, como
ele produz sentidos, sendo ele concebido enquanto objeto linguístico-histórico”. A autora
chama a atenção para isso, destacando que o discurso é estrutura e acontecimento.
Em relação aos dispositivos de análise, o que interessa nessa perspectiva é o que o
texto organiza em sua discursividade, relacionado à ordem da língua e das coisas, ou seja, à
sua materialidade. Considerando que o texto é o fato da linguagem, por excelência, os estudos
que não tratam da discursividade não atingem a relação com a memória da língua.
Para a análise, é importante considerar que o texto é uma unidade complexa, composto
por uma articulação dotada de relações significativas individualizadas em uma unidade
22
discursiva. Assim, o texto é tido como heterogêneo e para efeito de análise, Orlandi cita as
seguintes características:
1) Quanto à natureza dos diferentes materiais simbólicos: imagem, grafia, som, etc.;
2) Quanto à natureza das linguagens: oral, escrita, científica, literária, narrativa,
descrição, etc.;
3) Quanto às posições do sujeito;
4) Além disso, podemos trabalhar essas diferenças em termos de Formações
Discursivas (FDs). É importante citar que um texto, por sua heterogeneidade, não
corresponde a apenas uma só FD;
O texto é o objeto da interpretação. É nele que ocorre o lugar do jogo de sentidos.
Dentro desse contexto são vários os procedimentos de análise, com a observação de
paráfrases, relação com diferentes discursos, etc. A AD não tem o texto como objeto final de
sua explicação, mas como unidade que permite ter acesso ao discurso.
Após a análise, não é sobre o texto que vai tratar o analista, mas sobre o discurso. Uma
vez alcançado o processo discursivo, que é o que faz o texto ter significado, o texto some
como referência específica para dar lugar à compreensão do processo discursivo.
Em relação ao discurso do jornalismo, que faz parte do universo da divulgação
científica, a ser abordada neste trabalho, a AD pode ser apontada como um caminho a ser
percorrido para o entendimento desse campo. E não há jornalismo sem a noção do que é
exterior, ele mostra e esconde por meio de estratégias discursivas, compondo um movimento
complexo.
No caso do jornalismo científico, esse discurso ultrapassa os limites da comunidade
científica e chega ao grande público por meio da imprensa, revestido de caráter informativo,
com o intuito de reduzir distâncias entre o público científico e o leigo.
Segundo Ponte (2005), circulam no discurso jornalístico, diferentes textos e vozes.
Para esse processo há uma reconstrução do discurso científico original, o que requer uma
textualização qualitativa do mesmo.
O tom do discurso jornalístico é definido a partir da perspectiva de enunciação. Ducrot
(1987), citado por Machado e Jacks (2001), destacou a figura do enunciador, como a voz
discursiva que se relaciona diretamente com as formações ideológicas. Dentro desse
movimento, sempre organizado em torno de elementos que o próprio texto mostra, é que a
23
AD pode explicitar o que habitualmente permanece opaco no jornalismo, ou seja, quem fala e
a partir de que posição ideológica.
Por definição, entendo por locutor um ser que é, no próprio sentido do enunciado,
apresentado como seu responsável, ou seja, como alguém a quem se deve imputar a
responsabilidade do enunciado. É a ele que se refere o pronome eu e as outras
marcas da primeira pessoa. (DUCROT, 1987, p. 182).
Desse modo, o enunciador é tido como a voz de uma perspectiva (ideológica) que leva
ao locutor falar. Já o locutor é aquele que fala e pode ser identificado como responsável pelo
enunciado.
É por conta desse movimento que repentinamente os leitores podem perceber ou ter a
impressão que estão lendo o mesmo conteúdo em diferentes conteúdos, ainda que em um
texto diferenciado e com autores distintos.
Nesse cenário, os jornalistas assumem o papel de locutores e mesmo em diferentes
veículos, a perspectiva sob a qual eles falam pode ser a mesma, já que seguem as mesmas
normas, seguindo até interesses econômicos ou políticos e enunciar sob a mesma perspectiva
ideológica. Com isso, os locutores são diferentes, embora o enunciador seja um só. No tópico
a seguir serão resgatados os conceitos de sujeito e ideologia, cruciais dentro da
fundamentação teórica da AD.
1.2 Sujeito e ideologia
É importante resgatar, neste trabalho, o conceito de sujeito em AD. Esse é um termo
que distancia os estudiosos de outras áreas da linguística. Na AD, o sujeito não pode ser
entendido como indivíduo. Ao mesmo tempo, um indivíduo se divide em muitos sujeitos,
visto que não se constitui na mesma coisa.
No contexto do presente recorte teórico, o sujeito de linguagem é descentrado. É
afetado pelo real da língua e também pelo real da história, não tendo o controle sobre o modo
como elas o afetam. Assim, o sujeito discursivo funciona pelo inconsciente e pela ideologia.
Em vez do indivíduo empírico, o sujeito da AD é um lugar histórico-social.
Com o racionalismo, desde Descartes, o homem vem assumindo a condução de seu
caminho. Mas a noção de inconsciente do Freud mostra que o homem não constrói um mundo
apenas baseado na consciência, mas na maior parte das vezes, é refém de seus desejos,
24
preconceitos e sentimentos muitas vezes inconfessáveis. A essa noção de subjetividade, a AD
evidencia que o homem assume, por inúmeras vezes, sujeitos diferentes nos discursos, com
uma mobilidade constante.
O mesmo indivíduo é cindido em diversos sujeitos, que se formam no interior do
processo discursivo e que podem se movimentar de acordo com as circunstâncias. Para Jacks
e Machado (2001), isso é um processo complexo porque se assemelha a uma quebra de
identidade busca legítima de todo indivíduo e, por isso, é feito de modo inconsciente e
não-reflexivo.
É válido ressaltar que sujeito e sentido se constituem ao mesmo tempo, na articulação
da língua com a história, em que figuram a ideologia e o imaginário. Conforme aponta
Orlandi:
Se na Psicanálise temos a afirmação de que o insconsciente é estruturado como
linguagem, na Análise do Discurso considera-se que o discurso materializa a
ideologia, constituindo-se no lugar teórico em que se pode observar a relação da
língua com a ideologia. (ORLANDI, 2001, p. 99)
Na perspectiva da AD, as palavras ditas no cotidiano já chegam às pessoas carregadas
de sentidos. O homem não sabe como foram constituídas, mas que significam nele e para ele.
Assim, o sujeito funciona pelo insconsciente e pela ideologia. Mergulhado em suas
experiências e vivências, o sujeito se entrelaça com a linguagem e historicidade, formando o
jogo da língua na história.
Um dos fundadores da AD, Pêcheux, postula a teoria do sujeito assujeitado, que quer
dizer que este não é capaz de um discurso novo e sim reproduz discursos anteriores
consolidados. Existe então um discurso reconfigurado, não há um novo discurso.
Dependente da conjuntura da época, o assujeitamento tem forma histórica, em que o
sujeito está sujeito à língua para ser sujeito da língua, o que representa uma ambiguidade
constitutiva. A AD trata então o assujeitamento com o princípio de que o indivíduo é
interpelado em sujeito pela ideologia.
Não se quantifica o assujeitamento, já que a subjetivação é uma questão de qualidade,
de natureza, diz respeito à relação do sujeito pela sua constitutiva com o simbólico, ou seja
“se é sujeito pelo assujeitamento à língua, na história” (ORLANDI, 2001, p.100). Assim, o
sujeito submete-se à língua e sem isso, não há como se subjetivar.
25
Pêcheux fez a AD enveredar para uma teoria não-subjetivista da enunciação que
recusa a noção idealista de um sujeito centrado no querer dizer de um sujeito fonte e origem
do sentido. Desse modo, o autor define a ilusão discursiva motivada por dois tipos de
esquecimento inerentes ao discurso (PÊCHEUX & FUCHS, 1990): o esquecimento número 1
ligado à ordem do sistema insconsciente, dá conta do fato de que o sujeito falante não pode se
encontrar no exterior da formação discursiva que o domina.
Segundo a AD, é por esse esquecimento que o sujeito recusa, rejeita, apaga
insconscientemente qualquer elemento que escape da formação discursiva em que está. E é
por conta disso que o sujeito tem a ilusão de ser o criador do seu discurso. É pelo
esquecimento 1 que o sujeito tem a ideia de que ele é a fonte do sentido do seu dizer.
Esse apagamento, no jornalismo, é identificado em diversos momentos. Um deles a
destacar é a relação com as fontes de informação. Isso porque os jornalistas, normalmente,
utilizam nos textos escritos por eles não só a realidade fornecida pelas fontes, mas também de
suas expressões. Assim, no momento em que constroi o texto, considera-se como autor,
mesmo assumindo as perspectivas de enunciação de outros pensando como se fossem suas.
Já o esquecimento número 2 é da ordem do pré-consciente, em que todo sujeito falante
seleciona no interior da formação discursiva que o domina formas e sequências que nela se
encontram em relação de paráfrase. Aqui, o sujeito tem a ilusão de que o seu discurso reflete o
pensamento e o conhecimento que tem do mundo.
O esforço da AD em deslocar a noção de sujeito da concepção de „idealista‟,
intencional, como origem e causa de si mesmo, desprovido de qualquer
determinação, levou-a, no fluxo da influência de Althusser e de Freud, a desembocar
na concepção de um sujeito completamente assujeitado, produto puro das estruturas,
a quem resta apenas a ilusão de que fala, já que é atravessado pela ideologia e pelo
inconsciente. (ZAMBONI, 2001, p.8)
Em relação à mídia, uma das instituições mais influentes e influenciadoras da
sociedade pós-moderna, observa-se discursividades distintas funcionando no processo de
individualização da forma-sujeito na produção de sentidos. O sujeito/indíviduo tem sua forma
individualizada, que sabe o que pensa e também o que diz. Por outro lado, tem seu estilo e
tendências determinados por um discurso imposto pelos próprios meios de comunicação.
No caso do jornalismo científico, trata-se de um discurso polifônico constituído por
várias vozes. De imediato, podemos citar como vozes: o jornalista- indivíduo que escreve e
assina a autoria do texto, o jornalista-instituição quando o texto não é assinado, o leitor com a
26
carta publicada. No caso do discurso científico, a composição é feita por várias vozes
também, as dos autores citados, como no caso desta dissertação, a posição do próprio autor
que escreve a pesquisa, assumindo a autoria do que transpõe para o papel.
No caso desta pesquisa, voltada para a textualização do Discurso Científico para o
Discurso de Divulgação Científica, destaca-se que o jornalismo é entendido como um lugar de
circulação e também de produção de sentidos.
Por isso, para o mapeamento dos sentidos é necessário verificar as Formações
Discursivas e no caso do texto de disseminação da ciência, interpretar os sentidos nucleares
do discurso.
O jornalismo é tido como um discurso que tem as seguintes características: a)
dialógico; b) polifônico; c) opaco; d) ao mesmo tempo efeito e produtor de sentidos; e)
elaborado segundo condições de produção e rotinas particulares (BENETTI; LAGO, 2008).
Desse modo, a relação entre discursos e a relação entre sujeitos são dois planos que
interessam na construção do discurso jornalístico. No primeiro ponto, trata-se da
interdiscursividade, termo interligado aos estudos sobre sentidos e, no segundo, está
relacionado à intersubjetividade, em que o discurso só existe em um espaço entre sujeitos.
Na visão de Benetti (2008, p.111), o primeiro tipo de pesquisa para o qual a Análise
do Discurso é um método adequado está relacionado à análise dos sentidos do discurso
jornalístico. Para tanto, é preciso ter visão sobre a estrutura do texto, compreendendo que esta
estrutura vem da parte externa. Com isso o texto é decorrência de um movimento de forças
que lhe é exterior e anterior.
O primeiro passo é enxergar a existência de duas camadas para a aplicação do método
da AD: a primeira, mais visível, é a camada discursiva; a segunda, só evidente quando
aplicamos o método, é a camada ideológica.
Para fins metodológicos, Benetti aponta que basta compreender que algo externo e
anterior determina a produção do discurso. Orlandi (2001) destaca também que o discurso é
compreendido como lugar onde as práticas sociais são materializadas na e pela linguagem.
A divulgação científica pode ser considerada como uma prática social que se
materializa na forma de textos, sejam escritos ou orais, sejam imagéticos. Além disso, esse
tipo de divulgação pode ser entendido como um gênero de discurso específico com vários
gêneros.
27
Atrelado à ideologia, o sujeito é interpretação. Como diz Orlandi (2001, p.22), “é pela
interpretação que o sujeito se submete à ideologia, ao efeito da literalidade, à ilusão do
conteúdo, à construção da evidência dos sentidos, à impressão do sentido já-lá”.
A ideologia, por sua vez, é considerada heterogênea e está sob o signo da contradição,
visto que as FDs são constituídas de várias vozes do sujeito-forma. Segundo Althusser (1985,
p. 96), “[...]toda ideologia interpela os indivíduos concretos enquanto sujeitos concretos,
através do funcionamento da categoria de sujeito”.
Para o autor, todo indíviduo se torna sujeito ao ser interpelado por uma ideologia,
designando assim a interpelação ideológica, capaz de formar um quadro fundamental para
compreender qualquer discurso, neste caso, também o Discurso Científico e o Discurso de
Divulgação Científica, que serão abordados mais a frente.
É natural não fazer conexões ideológicas, como se nada viesse antes do sujeito, há a
sensação, como diz Machado e Jacks (2001), de que vivemos “um eterno presente” e “um
presente sem laços com o passado, como se todos tivéssemos nascido „ontem‟ e nada
houvesse antes de nós”.
O sujeito é determinado pela exterioridade e revestido de uma historicidade, afetado
pelo real da língua e também pelo real da história, sem controle sobre o modo como elas o
afetam. “
Nesse percurso, é percebido então que o indíviduo é cercado de vários sujeitos que só
pode falar porque se desloca e se descentra. O sujeito fala sempre de um lugar, que pode ser
distinto daquele em que ele ocupou há um minuto. “A subjetividade pode interessar,
discursivamente, pelo fato de que ela permite compreender como a língua acontece no
homem. A subjetividade é assim estruturada no acontecimento do discurso”. (ORLANDI
2001, p. 100).
Então, no caso do discurso científico e de divulgação científica (inerente ao JC), tem-
se um entre-lugar que o sujeito ocupa e assume diversas posições de saber e poder, entre
discurso dos cientistas e dos jornalistas que são relacionadas a heterogeneidade de todo
discurso.
Os discursos expostos no corpus apresentado serão assim analisados a partir das
características com o apagamento e o aparecimento do sujeito. Assim verificamos que todos
os conceitos citados anteriormente estão interligados.
28
1.3 Ciência e difusão científica
Antes de tratar sobre a disseminação científica em si, faz-se necessário recorrer a
Bourdieu (2004). O autor elabora a noção de campo científico, contrariando o paradigma ou
tradição que via a ciência como auto-suficiente, gerando-se em si mesma, sem intervenção
externa e muito menos social. E nesse sentido, o autor destaca:
[...] para compreender uma produção cultural (literatura, ciência, etc.) não basta
referir-se ao conteúdo textual dessa produção, tampouco referir-se ao contexto social
contentando-se em estabelecer uma relação direta entre texto e contexto [...] entre
esses dois polos [...] existe um universo intermediário que chamo campo literário,
artístico, político e científico. (BOURDIEU, 2004, p.20)
Então, o campo seria o universo autônomo e com leis próprias no qual estão as
instituições que produzem e difundem arte, literatura e a ciência. Para o autor, o campo
científico é um mundo social que faz solicitações e também imposições sobre o ambiente
externo que o envolve.
Bourdieu discute ainda as relações de poder que ocorrem internamente dentro do campo.
Segundo ele, a estrutura de um campo em determinado momento é a estrutura da divulgação
do capital científico. Esse último é considerado como uma espécie de capital simbólico que
consiste no reconhecimento ou no crédito atribuído pelos pares concorrentes no interior do
campo.
Há então duas formas de capital científico, definidas por Bourdieu (2004): por um lado o
poder institucionalizado e, por outro, o poder de prestígio. No primeiro, o poder está
relacionado à ocupação de posições importantes dentro das instituições de pesquisa e ensino,
com a direção de institutos ou departamentos, etc.
No segundo caso, ocorre o poder de prestígio pessoal, que é mais ou menos independente
do precedente. O capital científico é que vai apontar as regras do jogo, do que deve ou não ser
publicado ou direcionado para a divulgação para a massa.
Segundo Bourdieu, esse capital proporciona autoridade e contribui para definir não só as
regras do jogo, mas também suas regularidades, definindo “as leis que fazem que seja ou não
importante escrever sobre tal tema, que é brilhante ou ultrapassado, e o que é mais
compensador publicar no American Journal de tal e tal do que na Revue Française disso e
daquilo”. (BOURDIEU, 2004, p.27).
29
Em um resgate sobre a história do conhecimento, Burke (2003) fala sobre a
comercialização do conhecimento, destacando que na sociedade da informação a produção e
venda de informações contribui de maneira considerável para as economias mais
desenvolvidas.
A ideia de comercializar o conhecimento é tão antiga quanto a crítica de Platão aos
sofistas por essa prática. Burke enfatiza que a ideia do conhecimento como propriedade foi
formulada por Cícero, na Roma antiga.
Burke cita exemplos ilustrativos sobre a crescente preocupação com a propriedade de
textos e ideias.
O primeiro caso, em 1533, foi uma disputa entre dois impressores, de Frankfurt e
Estrasburgo, respectivamente, sobre o uso de entalhes de madeira plagiados para
ilustrar um tratado sobre ervas. O impressor acusado de plágio se defendeu
argumentando que a difusão do conhecimento era um „benefício para a humanidade‟. O segundo caso foi uma disputa entre escritores, em que um
divulgador da filosofia natural foi acusado de plágio por diversos estudiosos. (idem,
p.137)
Como Burke diz, a revolução científica revela ambiguidade e ambivalência. Por um
lado, tornar o conhecimento público para a humanidade era levado muito a sério, e do outro,
figuram as ásperas disputas sobre prioridades em descobertas que iam do telescópio ao
cálculo. Além disso, o próprio conhecimento acadêmico podia virar mercadoria, visto que
ensinar por dinheiro já consistia, há longo tempo, em atividade tradicional em escolas e
universidades.
Dentro desse contexto, em Londres, no século XVIII, o chamado varejo do
conhecimento se tornou parte da cultura londrina, mas a percepção dos laços entre o
conhecimento e o mercado foi incrementada nos séculos XVII e XVIII.
Mais adiante, com o advento da impressão, as informações em papel foram
proliferadas, principalmente com informações relacionadas a assuntos comerciais, abordando
feiras de negócios, preços de mercados, notícias sobre chegadas e partidas de navios. Mesmo
as informações comerciais de tipo mais confidenciais eram impressas, com ou sem
autorização, segundo contextualiza Burke (idem, p.145).
Os jornais e revistas que passaram a ser publicados após 1600, são os gêneros
literários que melhor ilustravam a comercialização da informação. Nesse processo histórico,
30
os conhecimentos acadêmicos eram difundidos por revistas cultas, publicadas mensalmente
ou a cada dois meses.
Mas a comercialização de livros impulsionou, logo em seguida, ainda no século
XVIII, a chamada “revolução do consumo” ou “nascimento da sociedade de consumo”. Burke
relembra ainda que no Japão, a partir do século XVII, há indícios de uma explosão do
comércio de livros ligada ao surgimento de novos tipos de livros, os kana-zoshi, que significa
“livros para consumo”.
Mesmo com toda disponibilidade de informações, Burke (p.161) ressalta que: “[...] a
aquisição do conhecimento depende não só da possibilidade de acesso a acervos de
informação, mas também da inteligência, pressupostos e práticas individuais”.
Assim, os resultados práticos da pesquisa científica tomaram forma a partir das
possibilidades geradas pela primeira Revolução Industrial, em meados do século XVIII e
posteriormente aprofundadas com o século XIX, com a segunda Revolução Industrial,
elevando a consciência social sobre potenciais aplicações da ciência.
Apesar disso, foi na II Guerra Mundial que houve um estreitamento entre ciência e
sociedade, com a propagação da física para todos os campos do saber e inclusive mudanças e
novidades no campo da defesa (implantação de tecnologias como radar) e na medicina, com a
descoberta da penicilina.
No século XX, a ciência deixa de ser uma instituição ortodoxa e caminha para estar
presente no cotidiano das pessoas, seja por meio da difusão de conceitos relacionados com a
qualidade de vida e saúde, seja por meio da aplicação de novas tecnologias em prol da
praticidade e da produção em massa, atendendo às necessidades da sociedade de consumo em
evolução. Essa preocupação ficou mais evidente a partir do final da década de 70 por conta do
contexto político-social e cultural que caracterizou aquele período.
Dotados de legitimidade e autoridade, os cientistas e pesquisadores geram o discurso
científico produzido por e para cientistas, com suas características e textualização próprias.
Para Bourdieu (2004, p.122), essa competência científica refere-se à capacidade de falar e agir
legitimamente, isto é, de maneira autorizada e com autoridade, que é socialmente outorgada a
um agente determinado.
Bourdieu fala, então, da necessidade dos cientistas em trabalharem em prol da divulgação
de suas pesquisas e resultados para um público mais amplo. O autor levanta ainda a questão
da divulgação científica na mídia, destacando que há formulação de falsos problemas ou até
31
mesmo os problemas mal colocados pela mídia. Assim, quando o cientista é entrevistado, este
é levado a discutir assuntos de interesse jornalístico e não científicos.
Para a circulação de novos saberes e conhecimento científico, o autor propõe ser
interessante adotar uma linguagem mais acessível. É então que surge a importância do
trabalho da divulgação científica, que conta principalmente com o suporte da imprensa
especializada neste gênero, abrangendo um público mais amplo que o dos bancos escolares.
1.4 O espaço da difusão científica
O espaço da difusão científica é traçado ainda por conflitos e tréguas entre
pesquisadores e jornalistas. Por um lado, está o profissional que busca, em anos de pesquisa,
inovar e descobrir saídas para problemas formulados nos laboratórios e ambiente acadêmico.
No outro extremo, está o repórter, que com a urgência do jornalismo busca cumprir o deadline
(prazo) para entregar a matéria sobre a pesquisa, que fora desenvolvida durante anos e com a
qualidade exigida pelas empresas de comunicação. Eis o cenário.
1.4.1 Bueno: conceitos e características da Difusão Científica
Bueno (1984) conceituou difusão científica como todo e qualquer processo usado para a
comunicação da informação científica e tecnológica, em que ela pode ser orientada tanto para
especialistas quanto para o público leigo.
Em relação à difusão científica, de modo geral, é entendida como um gênero que se
divide em: disseminação científica e divulgação científica. Essa difusão é desdobrada em
disseminação científica (para especialistas) e divulgação científica (para o grande público),
conforme esquema abaixo (BUENO, 1984):
32
Segundo o autor, a disseminação científica é gerada para um público específico, com
uma linguagem especializada, ou seja, trata-se do Discurso Científico (DC), e a divulgação
científica aborda a ciência como produtora de informações, com uma linguagem mais
acessível ao público externo, o que remete para o Discurso de Divulgação Científica (DDC).
Quanto ao aspecto da composição, as formas de estruturação do DDC põem em
funcionamento procedimentos discursivos nos quais se incluem, entre outros, a recuperação
de conhecimentos tácitos, a segmentação da informação, fórmulas de envolvimento, a
presença de procedimentos explicativos, busca de credibilidade e a interlocução direta com o
leitor.
Ao observar as propriedades discursivas dentro de cada texto da disseminação
científica, é possível verificar em cada nível (constituição, formulação e circulação) as
características dispostas tanto no DC quanto no DDC. Como será apresentado na análise do
corpus deste trabalho (Capítulo II).
A comunicação de Ciência e Tecnologia (C&T doravante) tem, então, o sentido de
divulgar sobre essa área por meio de uma linguagem mais clara para um público mais
abrangente, portanto o papel da divulgação científica pode estar voltado para diferentes
objetivos, tais como:
a) Educacional: promover a ampliação do conhecimento científico para o grande
público com caráter prático, esclarecendo os indivíduos sobre o desvendamento e a
solução de problemas com a ótica da ciência e estimulando a curiosidade científica
como atributo do homem. Aqui, a divulgação científica pode ter o mesmo sentido
da educação científica.
33
b) Cívico: desenvolver opinião pública sobre os impactos do desenvolvimento
científico e tecnológico sobre a sociedade, especialmente em áreas que exigem
cuidados para processo de tomada de decisões. Transmitir informação científica
para a ampliação da consciência do cidadão a respeito de questões sociais,
econômicas e ambientais relacionadas ao desenvolvimento da ciência e tecnologia.
c) Mobilização popular: ampliar a qualidade da participação da sociedade na
formulação de políticas públicas e na escolha de opções tecnológicas. Neste item,
o objetivo é transmitir informação científica que dê suporte aos atores sociais a
intervir melhor no processo decisório.
A atuação da divulgação científica ocorre nesse sentido e em cada um desses aspectos
e objetivos também variam os públicos-alvo destas funções, sejam formados por estudantes,
formadores de opinião, agentes formuladores de políticas públicas, agências de fomento e até
os próprios cientistas e pesquisadores.
Ao mesclar formações ideológicas típicas do Discurso Científico (DC) e do discurso
jornalístico, o Discurso de Divulgação Científica (DDC) está imbuído de ideologias de grande
importância na sociedade atual. O DDC oferece aos leitores uma representação de seu
posicionamento relacionado à ciência. Em torno do Discurso de Divulgação Científica há uma
ilusão de neutralidade que envolve essa textualização. A AD entra em cena para então
contribuir para revelar ideologias na camada mais escondida desses textos.
Dentro desse contexto, Orlandi (2001) leva em consideração três pressupostos para a
reflexão sobre a divulgação científica:
1. A produção de sentidos envolve três momentos inseparáveis: a constituição,
formulação e circulação. 2. Há indissociabilidade entre ciência, tecnologia e governo, do
ponto de vista discursivo; e 3. O discurso da divulgação científica desloca o processo do
conhecimento científico para a informação científica e noticia a produção científica.
Todos os três momentos concorrem à produção de sentidos, que se constituem,
formulam-se e como circulam. O DDC não pode ser entendido como uma soma de discursos
composto por ciência mais jornalismo igual à divulgação científica, porém é formado por uma
articulação específica com efeitos próprios.
34
Essa articulação forma um jogo complexo de interpretação e não de tradução,
seguindo a linha de pensamento da autora, já que não se trata de duas línguas distintas, mas de
uma relação em duas formas de discurso: o científico e o jornalístico.
O divulgador/jornalista lê/ouve num discurso e diz em outro, formando um duplo
movimento de interpretação de uma ordem de discurso que constituirá um outro, denominado
jornalismo científico. “[...] ao se produzir como uma forma específica de autoria,
desencadeará por sua vez novos gestos de interpretação, agora produzindo uma certa forma de
efeito-leitor”. (ORLANDI, 2001, p. 151).
Por outro lado, Authier-Revuz (1998) analisa a produção em divulgação científica a
partir do conceito de tradução, reformulação, mediação entre os produtores de um discurso
fonte, científico (D1) e o público leigo por meio da produção de um outro discurso (D2).
Neste trabalho, trata-se não como tradução, anteriormente já dito, mas como um jogo
complexo de reformulação de texto, com a formação de um novo discurso.
Segundo Authier-Revuz, o objetivo do discurso científico não é estender a uma
comunidade de origem, mas sim disseminar, em direção ao exterior, conhecimentos
científicos produzidos no interior de uma comunidade mais restrita.
Na enunciação do DC, na perspectiva da autora, há uma estrutura enunciativa de três
lugares: o da ciência, ocupado por várias pessoas identificadas, legitimado pelos nomes dos
cientistas; o público-leitor, que é o público interessado pelas ciências, mas ciente de sua
distância em relação aos especialistas; e o lugar do divulgador, aquele que media, que coloca
os dois pólos opostos em contato.
1.4.2 Ciência e Jornalismo: encontros e desencontros no jornalismo científico
Seja com caráter informativo, seja com caráter opinativo, o jornalismo científico é um
dos precursores da especialização na área e consiste em um processo social baseado em uma
frequente relação entre organizações formais (estabelecimentos e redes de editores) e
comunidades (público/espectadores), com lugar através da mídia em geral, circulando notícias
e informações sobre ciência e temas relacionados, independente dos níveis de interesse e
conhecimento do público.
Ao conceituar Jornalismo Científico, Bueno (2010) afirma que “diz respeito à
divulgação da ciência e tecnologia pelos meios de comunicação de massa, segundo os
35
critérios e o sistema de produção jornalísticos”. Para tanto, ele separa as duas expressões que
compõem o termo: jornalismo e científico, chamando a atenção para a produção de textos,
artigos ou materiais sobre temas relacionados à ciência que não podem ser definidos como
jornalismo científico, pois em princípio, não são considerados como jornalismo, com a
periodicidade, a atualidade e a difusão inerentes a esse gênero.
Contextualizando o jornalismo científico, Oliveira (2007) conta que se passaram dois
séculos entre o momento da publicação do primeiro livro completo impresso na máquina de
tipos móveis e o advento do jornalismo científico. Além disso, o surgimento na imprensa no
século XV não só impulsionou a difusão científica como também possibilitou o surgimento
do jornalismo científico no século XVII.
Já em 1610, ainda segundo Oliveira (idem, p.18), Galileu Galilei publica o livro
“Mensageiro Celeste”, que por meio de uma linguagem mais coloquial fez sucesso em todo
continente europeu. Mais tarde, por conta das perseguições da Inquisição, passou a usar a
linguagem matemática e inacessível ao clero e à sociedade da época.
A partir de meados do século XVII começava uma intensa circulação de cartas
expedidas por cientistas sobre suas idéias e descobertas, que eram redigidas em vários
idiomas. De acordo com a autora, a Inglaterra pode ser considerada o berço do jornalismo
científico, mas o pioneirismo coube ao alemão Henry Oldenburg, que logo percebeu o caráter
informal das cartas com o potencial de alcance de texto impresso, mas que com sua
capacidade empreendedora, criou assim a profissão de jornalista científico.
Burkett (1990) confirma que foi Oldenburg quem inventou o jornalismo científico,
com o lançamento do “Philosophical Transactions”, da Royal Society, em março de 1665. Na
época, os textos eram traduzidos de várias fontes para publicar em latim e inglês.
Uma das características iniciais da divulgação da ciência em veículos de massa era a
impressão de versões de jornais e revistas em artigos dos periódicos científicos, na íntegra ou
reescritos, na Europa, Inglaterra e em colônias britânicas da América do Norte.
O século XIX foi marcado por grandes inovações científicas, tais como demonstrações
como do barco a vapor, em 1807, da locomotiva a vapor, em 1830, e do telefone em 1876 que
receberam menções relativamente inexpressivas nos jornais, visto que fatos político
partidários interessavam mais aos editores do que avanços científicos importantes para a
humanidade.
36
Com o avanço da 1ª Guerra Mundial, os jornalistas passaram a glamourizar as
descobertas da química que todos pensavam que seriam para uma vida melhor. A 2ª Guerra
Mundial, por sua vez, tornou-se a guerra dos físicos por sua contribuição em dividir o átomo
para derivar bombas de fissão e poder nuclear. “Dessa vez, nem mesmo os cientistas
concordaram que uma vida melhor resultaria daí”. (BURKETT, idem, p.33).
Como novo gênero literário lançado, o jornalismo científico permitiu uma maior
abertura para a divulgação das mais destacadas notícias dos tempos modernos. Tanto que a
partir da segunda metade do século XIX, essa área específica do jornalismo recebeu um
grande impulso.
Oliveira também contextualiza que as duas guerras mundiais contribuíram de forma
significativa para a expansão, uma prova disso é que após a primeira guerra mundial
jornalistas europeus e norte-americanos criavam as primeiras associações de jornalismo
científico, impulsionados pelo desenvolvimento científico e tecnológico, promovido pela
fabricação de novas armas de grande potencial, gases venenosos, aeroplanos e submarinos,
utilizados no conflito.
No entre guerras, os jornalistas se dedicaram de forma mais aplicada à divulgação
científica, como profissionais exclusivos para a cobertura temática. Atualmente, grande parte
dos países conta com associações voltadas para jornalistas científicos, tais como a União
Europeia das Associações de Jornalismo Científico e Associação Iberoamaericana de JC.
No Brasil, as atividades de C&T estão centralizadas aos governos estaduais e ao
federal. Cerca de 1% do Produto Interno Bruto do país é destinado às pesquisas e projetos da
área, mesmo estando à frente dos países vizinhos nesse aspecto, o Brasil fica ainda muito atrás
de países desenvolvidos que investem de 2% a 3% e mais participação da iniciativa privada.
Tradicionalmente, a literatura em jornalismo científico se concentra prioritariamente
em discussões sobre a relação entre cientistas/pesquisadores e jornalistas/divulgadores de
ciência ou verifica a dificuldade de adaptação do discurso científico ao universo da maioria
dos cidadãos.
O jornalismo científico veicula informações sobre ciência, tecnologia e inovação e se
caracteriza por desempenhar inúmeras funções, entre eles a popularização do conhecimento
científico, ampliando o debate.
Com compromisso e espírito público, a divulgação convoca os brasileiros a participar
do processo de tomada de decisões e retira de uma elite o poder exclusivo de decidir onde,
37
quanto e como investir em ciência e tecnologia. Assim, esta função é eminentemente de
caráter político (sem ser partidário) no sentido de favorecer a explicitação dos envolvidos no
financiamento, produção e aplicação da ciência e tecnologia.
Pode-se destacar que o discurso jornalístico não é mero receptáculo, ele é um meio, no
sentido material. O jornalismo científico ocupa uma posição-sujeito específica determinada
que não resulta em mera soma, nem substituição, mas trata-se de transferência, ou seja, “[...] é
preciso que se produza em um efeito metafórico pelo qual algo que significava de um modo,
desliza para produzir outros efeitos de sentidos, diferentes”. (ORLANDI, 2001, p.153).
A ciência, então, sai de si e passa a ocupar um espaço social e histórico, no cotidiano
dos sujeitos, ou seja, passa a ser vista como afetando as coisas a saber no cotidiano da vida
social. É por isso que o efeito de exterioridade da ciência em relação à divulgação científica se
torna uma necessidade para a sociedade, já que o conhecimento científico continua circulando
mais agilmente entre pares.
Quando essa textualização de um discurso (científico) para outro (jornalístico) não é
elaborada conforme os respectivos processos discursivos, observando as especificidades e
momentos de cada um (ver constituição, formulação e circulação) trata-se de apenas
transporte e não formulação de um novo discurso.
Oliveira (2002), por sua vez, relaciona o discurso jornalístico e discurso científico,
frisando que a produção do jornalista e a do cientista detêm aparentemente enormes
diferenças de linguagem e finalidade. Isso porque a redação do texto científico segue normas
rígidas de padronização e normatização universais e desprovidas de atrativos.
Já a escrita jornalística é coloquial, objetiva e simples, por isso deve-se ter cuidado
para não banalizar um trabalho científico de anos de investigação, pois segundo afirma
Oliveira:
O casamento maior da ciência e do jornalismo se realiza quando a primeira, que
busca conhecer a realidade por meio do entendimento da natureza das coisas,
encontra no segundo fiel tradutor, isto é, o jornalismo que usa a informação
científica para interpretar o conhecimento da realidade. (OLIVEIRA, 2002, p.43).
Neste trabalho, concorda-se com Oliveira. Discordamos, no entanto, no ponto em que
a autora destaca que o jornalismo é o fiel “tradutor” da primeira. No DDC, há a reformulação,
pelos construtos da AD. Verifica-se que existe a formulação de um novo discurso.
Nas publicações ditas científicas, divulgadas em jornal e em revista, observa-se que há
uma linha tênue entre esses dois discursos, ainda sem definição determinada. Além disso, o
38
jornalismo científico atravessa um momento singular, já que pouco a pouco ganha um espaço
considerável nos debates acadêmicos em razão da crescente divulgação de informações, que
antes eram restritas, para uma população mais ampla.
Bueno (2009a) aponta ainda que o governo federal e as fundações de amparo à pesquisa
dos diversos Estados têm contribuído de maneira significativa para aumentar a massa crítica
na área.
O avanço na área é palpável quando se observa o volume de publicações voltadas para a
temática da divulgação científica e a multiplicação de cursos especializados e de pós-
graduação em jornalismo científico em todo o país. Da mesma forma, a quantidade de
trabalhos de conclusão de cursos de jornalismo que versam sobre o processo de divulgação
científica e jornalismo científico está em expansão, o que indica a adesão de mais
profissionais voltados a esta temática.
A missão maior do jornalismo científico consiste na popularização e partilha de
saberes, sendo um processo fundamental para o conhecimento da sociedade sobre a
produção científica. É como diz Bueno (2009a), no artigo “Jornalismo Científico e
democratização do conhecimento”:
Sem uma divulgação e um Jornalismo Científico qualificados, a ciência e a
tecnologia brasileira que, em muitas áreas, competem com as realizadas nos países
chamados hegemônicos, permanecerão distantes dos cidadãos, das autoridades, dos
parlamentares, da sociedade de maneira geral. Impedir que isso aconteça é dever de
todos nós.
A mídia, então, se configura em instrumento necessário à perpetuação do
conhecimento e ampliação do capital científico, independente de interesses mercenários e
comerciais, como os ditados pelo mercado de laboratórios especializados em divulgar
materiais apenas de interesse marketeiro. (BUENO, 2009a). A mídia ainda se pauta por
acontecimentos pontuais relacionados à ciência, como grande eventos, e também por
temáticas de grande repercussão popular, como clonagem humana e cura para doenças
como a obesidade.
O jornalismo especializado em divulgar assuntos relacionados à ciência se
caracteriza por meio de inúmeras funções. Para citar algumas está a pedagógica, assim
chamada, por complementar a educação e alfabetização científica, que atinge a todos, tanto
os que deixaram as salas de aula quanto aos excluídos delas. Outro aspecto é a
39
popularização do conhecimento científico, que proporciona debates e reflexões a respeito
de temas de ciência.
O jornalismo científico também abre oportunidades para que os produtores de
ciência e tecnologia possam mostrar à sociedade os investimentos realizados em pesquisa e
desenvolvimento. É nesse sentido que o jornalista busca ser a ponte que interliga os
pesquisadores ao público em geral, levando informações sobre várias questões, sejam
factuais ou de profundo debate social.
No que diz respeito ao estilo (por ser dirigido a um destinatário leigo), conforme
aponta Zamboni (2001), o DDC deve dispensar a “linguagem esotérica” exigida pelo
discurso científico preparado por e para especialistas e se abrir para o emprego de
analogias, aproximações, comparações, simplificações – recursos que contribuem para
corporificar um estilo que vai se constituir como marca da atividade de vulgarização
discursiva.
Caldas (2003) faz a importante observação de que a circulação da informação
científica tem o poder de acabar com o fetiche da mercadoria, da religião e do consumo e
desse modo, a relação com os meios de comunicação não pode se dar de maneira unívoqua.
Com o ritmo acelerado da produção de notícias, principalmente por conta do avanço
da internet, as informações desfragmentadas, veiculadas de forma apressada impossibilitam a
reflexão para que se estabeleça a conexão entre o imaginário do receptor e a realidade. “O que
importa é como a mídia descreve, interpreta, fotografa e divulga o mundo e não o mundo
vivido, experenciado, como ensina o método científico”. (CALDAS, 2003, p.76).
Quanto ao processo de produção do jornalismo científico, obrigatoriamente ele
representa uma cobertura jornalística com atributos específicos, com suas especificidades, sua
cultura e seu objeto, mas em essência, trata-se de jornalismo. O jornalismo científico, desse
modo, obedece ao processo de produção jornalística, enquanto técnicas, cronograma e
atividade profissional, portanto está submetido às mesmas pressões e desafios da atividade
jornalística.
Assim, o JC tem o leigo como sua audiência, embora, evidentemente, possa se
endereçar a públicos especializados. O sistema de produção científica é bem distinto da
produção jornalística. O primeiro é voltado para os pares e público especializado, enquanto o
segundo tem seus compromissos com o público em geral e é dotado de um analfabetismo
40
científico. Há ainda uma questão de método de conhecimento e apreensão da realidade:
método científico x método jornalístico.
Entre outros aspectos que marcam a produção jornalística, destacam-se: o
sensacionalismo na divulgação da ciência e da tecnologia, com uso inclusive de metáforas e
figuras de linguagem; a distinção de um tema científico e um tema jornalístico; a notícia como
critério de seleção; e a exiguidade do espaço e do tempo de enunciação do discurso, com a
delimitação de espaço (uma lauda) ou tempo (30 segundos).
Da mesma forma que existem as diferenças nos dois sistemas de produção, existem as
aproximações entre a ciência e o jornalismo, a saber:
• Os dois sistemas têm patrões;
• Os dois sistemas defendem interesses e compromissos;
• Os dois sistemas estão subordinados ao sigilo e ao controle;
• Os dois sistemas obedecem a uma ética particular‟;
• Os dois sistemas buscam estabelecer parceria em prol da popularização do
conhecimento;
• O jornalista científico não deve atuar como porta-voz de uma fonte especializada;
• O Jornalismo Científico é um discurso construído a partir das fontes de C & T, mas
não deve restringir a elas;
• O Jornalismo Científico contextualiza as informações, conceitos ou processos e os
repercute a partir de sua inserção na sociedade.
Segundo Bueno (2009b), o JC depende estritamente de alguns parâmetros que
tipificam o jornalismo, tais como a periodicidade, a atualidade e a difusão coletiva. “O
jornalismo, enquanto atividade profissional, modalidade de discurso e forma de produção tem
características próprias, gêneros próprios e assim por diante”.
O teórico afirma ainda que divulgação científica e jornalismo científico não são a
mesma coisa, embora estejam muito próximas. “Ambos se destinam ao chamado público
leigo, com a intenção de democratizar as informações (pesquisas, inovações, conceitos de
ciência e tecnologia), mas a primeira não é jornalismo”.
Além disso, o JC abrange não apenas as chamadas "ciências duras", tais como a
Matemática, a Física, a Química, etc., mas inclui as ciências humanas (Educação, Sociologia,
Comunicação, etc.). Em razão da especialização em algumas áreas, tem figurado, em alguns
41
casos, como o Jornalismo Ambiental, o Jornalismo em Agrobusiness (Agronegócios), o
Jornalismo em Saúde, o Jornalismo Econômico, o Jornalismo em Informática, etc. Na prática,
no entanto, todas estas manifestações específicas remetem para o Jornalismo Científico,
entendido aqui como o termo genérico, porém mais abrangente. (BUENO, 2009b.).
Um aspecto que se deve levar em consideração neste estudo é que o jornalismo
científico é relacionado à divulgação da ciência e tecnologia por meio dos meios de
comunicação de massa, segundo o sistema de produção jornalístico. Por outro lado, duas
partes compõem essa expressão – o jornalismo e o científico.
Com isso, nos veículos de massa, especialmente a imprensa escrita, manifestam-se
textos, materiais e artigos sobre temas de ciência e tecnologia e que não são considerados
jornalismo científico por conta da sua forma de produção e marcas discursivas, assim nem
tudo que fala a respeito de ciência e está escrito em jornais ou revistas pode ser considerado
jornalismo científico.
Entre tantos exemplos, tem-se o artigo científico, com citações dos autores,
obedecendo às normas da Associação Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT) e impregnado
de termos científicos, sem explicações, não se constitui em exemplo desse tipo de jornalismo
que estamos tratando. Está publicado em um meio (jornal) e não surte o efeito esperado no
público (massa) que lê o conteúdo.
Na visão de Bueno (2009b), alguns artigos publicados pela revista Ciência Hoje, da
SBPC, escritas por pesquisadores, apesar de bem ilustradas, não podem ser incluídos na
categoria Jornalismo Científico. Nada relacionado com a qualidade do material, mas por não
estarem dentro do que está determinado para o jornalismo.
1.4.3 A Divulgação científica e o Estado
Como forma complementar a esta análise, faz-se necessário uma reflexão a respeito da
ligação entre a produção do conhecimento científico e o Estado. Nas entrelinhas dos textos
publicados em cadernos de ciência, tecnologia e inovação e especificamente, no corpus
analisado neste trabalho, percebe-se que há atravessado o discurso político, ligado ao poder do
Estado, principalmente por conta do fomento e financiamento das pesquisas desenvolvidas.
Atualmente, com o reconhecimento do poder público de que apenas com o
desenvolvimento científico e tecnológico, a nação poderá atingir um patamar equiparado aos
42
grandes países desenvolvidos, os investimentos em C&T têm sido ampliados de maneira
salutar. Só no Amazonas, no período de 2003 a 2009 foram investidos mais de R$ 1 bilhão
pelo Governo do Estado do Amazonas, por meio das instituições que compõem o sistema de
C&T estadual: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), Secretaria
de Estado de Ciência e Tecnologia (Sect), Cetam e Universidade do Estado do Amazonas
(UEA).
Nesse período, a Fapeam, órgão que financia pesquisas no AM, foi responsável pelo
aporte de R$ 198 milhões, destinados ao fomento de programas de desenvolvimento científico
e tecnológico e apoio a bolsas de pesquisa.
O reflexo dessa participação no fomento de pesquisa é perceptível na produção do
material jornalístico que circula tanto na revista institucional quanto no suplemento de C&T
analisado.
Guimarães (2001), ao refletir sobre as relações entre produção de conhecimento e sua
circulação em relação às políticas públicas no Brasil, destaca o percurso do conhecimento
desde sua produção pela comunidade científica até a sociedade tomada como público pela
imprensa.
Para o autor, os percursos sociais do conhecimento têm impacto direto da ação do
Estado, já que concorda com Orlandi ao defender que a “questão da informação é uma
questão do Estado”. E levanta as seguintes questões:
1) “Até que ponto o Estado é o responsável pelas instituições da informação? Ele os
controla?”
2) “Até que ponto o Estado produz algo que é o político e que está na base da
interpretação da mídia?”
Para Guimarães, “os discursos do Estado e da mídia de divulgação não são, do ponto
de vista ideológico, diferentes”. Justifica-se isso porque as políticas para a elaboração do
conhecimento e sua divulgação visualizam a ciência a partir de uma mesma posição. (2001,
p.77).
O discurso científico e o de divulgação científica presentes nos textos publicados em
sites institucionalizados e também na mídia em geral tem conteúdo impregnado pelo discurso
político, já que há uma ligação forte da produção do capital científico com o poder simbólico
do Estado. Grande parte das matérias publicadas tem a citação da participação de algum órgão
público, gerido pelo Estado, sustentando as informações contidas no texto.
43
Por exemplo, uma pesquisa desenvolvida no Amazonas envolvendo células-tronco,
que teve grande repercussão no Estado por conta do ineditismo e importância do trabalho, foi
divulgada no site da Fapeam, com destaque também para o fomento da instituição, que faz
parte da esfera do governo estadual:
Bióloga com doutorado em Imunologia pela Universidade de São Paulo, a
pesquisadora Adriana Malheiro tem uma história peculiar com a região Norte.
Chegou ao Amazonas incentivada pelo Programa de Desenvolvimento Regional
(DCR), fomentado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas
(FAPEAM) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) que consiste em apoiar doutores titulados em outros Estados interessados
em desenvolver pesquisas em instituições locais e, por aqui, completa cinco anos de
residência em 2010.
Essa prática está ligada tanto ao fortalecimento da marca institucional dos órgãos de
ciência e tecnologia, quanto para mostrar a presença de investimentos governamentais na
área. Isso não é elemento perceptível apenas no Amazonas, mas é praticado em todo país.
Outro exemplo, é matéria divulgada pela Agência Fapesp que trata sobre um projeto
denominado “Estudo molecular e funcional de transportadores de íons em membranas”,
publicada em 19/3/2010 no site com o título: “PD em biologia molecular com Bolsa da
Fapesp”:
O Projeto Temático “Estudo molecular e funcional de transportadores de íons em membranas”, apoiado pela FAPESP, tem uma vaga em aberto para
pós-doutorado no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São
Paulo. O projeto é coordenado pelo professor Gerhard Malnic.
Nessa matéria, assim como em outras, há a citação da Fapesp como agência apoiadora
dessa pesquisa. O trecho acima faz parte da introdução da matéria publicada no site da
fundação paulista, que tem vínculo com o governo daquele Estado.
Ainda ilustramos esse exemplo com matéria publicada no site do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) onde também há a citação da
instituição nos materiais publicados como pano de fundo dos textos produzidos. Como pode
se conferir no trecho da matéria “Prêmio Almirante Álvaro Alberto 2009 já tem ganhador”,
extraído do site em 26 de março de 2010:
O nome do pesquisador que receberá a mais importante honraria em ciência e
tecnologia do Brasil, o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e
Tecnologia, acaba de ser divulgado pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/MCT). O agraciado será o
44
físico Luiz Davidovich, escolhido durante a 151ª reunião do Conselho
Deliberativo do CNPq. A cerimônia de entrega será realizada no próximo dia 4
de maio, na Academia Brasileira de Ciências (ABC), no Rio de Janeiro, com a
participação do ministro de Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende.
Nos termos em negrito, percebe-se a presença institucional no texto publicado no site e
que deve ter sido, assim como muitas notícias de ciência, reproduzido pela mídia em geral.
Esse, no entanto, é considerado um ponto fundamental para circular as notícias voltadas para
a ciência, conforme aponta Guimarães (p.79):
[...] pensar as relações da mídia com a ciência, deixando de lado o Estado, pode
atribuir ao discurso científico uma autonomia que ele não tem em relação à
sociedade nem em relação à mídia. Pensar o Estado nestas relações é também pensar
as condições para considerar as determinações da mídia sobre a ciência.
Em concordância com o que aponta o autor acima, verifica-se que a constituição de
um texto dotado pelo discurso de divulgação científica tem a sua variabilidade discursiva,
entre o discurso de ciência, o institucional e o político em razão da formação do próprio
contexto do tema abordado.
De um lado, o discurso científico, formado por seus paradigmas que têm função
normativa para a comunidade científica. De outro, o discurso de divulgação científica,
dominado pelos jornalistas/divulgadores, que se municiam no discurso científico estabelecido
e assim, como aponta Guimarães, legitima a “normatividade do Estado que se mantém a partir
de certas conquistas que a comunidade científica construiu”. (2001, p.78).
Contudo, o papel central do poder público não está atrelado somente ao financiamento
das pesquisas, mas no uso desses produtos em aplicação de políticas públicas. Dessa forma, o
principal parceiro das pesquisas científicas no país é o poder público, isso porque o
comprador e o usuário da pesquisa científica é dominado mais pelo setor público que o
privado.
Schawartz (2002) em um artigo publicado na Revista de Inovação da Unicamp, aborda
a questão da pesquisa e o interesse público, destacando que são os governos que fazem
guerras, que respondem a emergências e catástrofes, que produzem armamentos, respondem
pela saúde pública, da educação, de políticas voltadas para o meio ambiente, cuidam de
problemas voltados para o saneamento, energia, abastecimento de água, transportes e outros.
Por isso, fazem mapeamentos e necessitam de pesquisas científicas e tecnológicas que
apontem soluções para situações diversas. Podem ser desenvolvidas por instituições
45
governamentais e não-governamentais, mas é o setor público que acompanha e regula as
ações.
Por outro lado, Schawartz chama atenção para dificuldades na relação entre
pesquisadores e responsáveis pelos governos e administração pública.
Segundo ele, essas dificuldades são explicadas em duas ordens: mais familiar a quem
trabalha na América Latina, consiste no lugar relativamente secundário que ocupam os
cientistas e pesquisadores em suas sociedades, sem maior participação nos centros de decisão;
a segunda consiste nas tentativas de colocar pesquisadores e suas instituições ao reboque de
políticas e ideologias governamentais rígidas, comprometendo a liberdade de pesquisa e de
expressão dos pesquisadores. “A primeira dificuldade sempre dominou a visão da
comunidade científica brasileira a respeito da própria experiência”.
Lyotard (1993), por sua vez, aborda as relações de poder que permeiam os discursos
da ciência e o da divulgação científica, bastantes presentes nas mídias em geral, em especial
nas impressas (revistas e jornais). De uma maneira geral, pesquisas de interesse econômico
têm um destaque privilegiado, sempre com os recursos financeiros que são destinados à
pesquisa dispostos em evidência.
Segundo Lyotard, o conhecimento produzido tem um “valor” sócio-econômico
fundamental na tomada de decisão em todas as esferas sociais. Assim, a ciência passa a ser
utilizada como mercadoria de troca nas sociedades modernas, em que a produção do
conhecimento passa a ser uma relação entre fornecedores e usuários.
Em sua obra “A condição pós-moderna”, Lyotard convencionou chamar as sociedades
mais desenvolvidas como pós-moderna, que é um termo usado no continente americano pela
sociologia e pela crítica.
[...] considera-se „pós-moderna‟ a incredulidade em relação aos „metarrelatos‟. É,
sem dúvida, um efeito do progresso das ciências, mas este progresso, por sua vez, a
supõe. Ao desuso do dispositivo metanarrativo de legitimação corresponde
sobretudo a crise da filosofia metafísica e a da instituição universitária que dela
dependia. (LYOTARD, 1993, p. 3).
O saber transformado radicalmente em mera mercadoria é uma das principais
modificações no universo pós-moderno, como aponta o autor: “o saber é e será produzido
para ser vendido, e ele é e será consumido para ser valorizado numa nova produção: nos dois
casos, para ser trocado” (1993, p.5). Na visão lyotardiana, o saber deixa ser para si mesmo seu
próprio fim, já que não divulga mais pelo valor “informativo”, colocando-se em circulação
conforme a necessidade, segundo as redes da moeda.
46
Então, nas sociedades atuais, ocorre a troca da ciência tal como uma mercadoria.
Assim, o saber terá como objetivo da sua produção, o mercado e a troca, tornando secundário
o seu valor de uso.
O autor destaca ainda que a linguagem como vínculo social é uma alternativa pós-
moderna, já que a modernidade tinha outros parâmetros para a representação desse vínculo
social. Ele frisa que os jogos de linguagem foram propostos como método geral do
conhecimento do saber na sociedade pós-moderna, assim a linguagem é o vínculo social nessa
nova fase das sociedades desenvolvidas.
Nessa fase histórica, a comunicação se tornou central porque a linguagem se
diferencia da forma anterior, ainda na época moderna (nem manipula e nem informa).
Segundo ele:
[...] numa sociedade em que a componente comunicacional torna-se cada dia mais
evidente, simultaneamente como realidade e como problema, é certo que o aspecto
de linguagem adquire nova importância, que seria superficial reduzir à alternativa
tradicional da palavra manipuladora ou da transmissão unilateral de mensagem, por
um lado, ou da livre expressão ou do diálogo, por outro (Ibid., p. 29).
Dessa forma, na comunicação contemporânea, as mensagens não funcionam mais
apenas como informação, já que, como aponta Lyotard, reduzi-las a esta função seria adotar
uma perspectiva que privilegia indevidamente o ponto de vista do sistema e seu único
interesse. Pois é a máquina cibernética que funciona pela informação”(Ibid.,p.30).
Nesse contexto, na idade pós-industrial e pós-moderna o saber científico conservará e
reforçará ainda mais sua importância na disputa das capacidades produtivas dos Estados-
nações, sob a forma de mercadoria informacional fundamental na competição mundial pelo
poder, da mesma maneira que disputaram territórios e riquezas.
Em outras palavras, Lyotard reforça que houve a mercantilização generalizada do
saber, visto que o que é decisivo agora na circulação de um conhecimento é o desempenho e
performance para a melhoria do processo produtivo.
1.4.4 Jornalismo científico na Amazônia
Ao se voltar para o jornalismo científico na Amazônia, existem alguns pressupostos
essenciais para o cumprimento desta cobertura, entre eles: buscar entender a região em sua
plenitude, o que significa ter presente que há, na prática, várias Amazônias, com diversidades
47
culturais e sociais. Além disso, é necessário não ter dúvida de que diversidade da Amazônia
não se traduz ao mundo vegetal, à riqueza da floresta, mas se está presente e de forma
contundente, nas suas sociedades e culturas.
Além disso, existem perfis diferenciados de “povos da floresta” (caboclos,
seringueiros, pescadores, indígenas e o habitante da cidade, etc.) e que eles têm histórias e
trajetórias singulares.
Nessa cobertura, o divulgador precisa também assumir o conceito de cultura de forma
integral, de modo que sejam admitidas e legitimadas as diferenças e não contemplar o cidadão
da Amazônia com uma visão que privilegia o exotismo ou com pretensa fragilidade.
Os povos da floresta interagem, as populações diversas que moram na Amazônia
convivem e não digladiam com ela. Como afirmou Bueno2: “A imprensa julga que a floresta
se constitui em um ambiente hostil e que o cidadão da floresta passa o tempo todo lutando
pela sobrevivência. Imagina um embate quando, na verdade, há quase sempre uma
convivência harmônica” (informação verbal).
Entre tantos outros aspectos fundamentais para a cobertura de temas científicos na
Amazônia, o divulgador também terá como meta compreender a articulação entre floresta e
água; floresta, água e solo; floresta, água, solo, sociedade e cultura.
Entender que a intervenção externa desestrutura padrões de conduta, hábitos,
costumes, culturas e que o pretenso desenvolvimento desencadeado por ações exógenas
apenas acelera o processo de degradação. Com o reconhecimento e a valorização dos saberes
e práticas associado à Amazônia, enxergar a região em profundidade e descartar o “olhar
turístico”.
Escrever e falar sobre a Amazônia fica impossível sem senti-la e sem ouvir os que nela
vivem, por isso é tão importante recorrer às fontes locais, considerando que os moradores
locais não deva ser apenas um apêndice, mas um protagonista. Bueno (2009a) recomenda
também para que não seja incorporada a tendência de perceber a Amazônia apenas como
fonte de lucros, reproduzindo o discurso de fontes comprometidas apenas com a lucratividade,
rentabilidade, produtividade dos negócios, mas “ter consciência de que as fontes são sempre
comprometidas e que elas explicitam os seus compromissos e interesses”.
Para escrever e divulgar o que se produz na ciência sobre a Amazônia, faz-se
necessário então conhecê-la, descobri-la e pesquisá-la. Do contrário, a cobertura se torna
2 BUENO, Wilson da Costa. Informação verbal concedida na 61a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência (SBPC), em Manaus, em julho de 2009.
48
superficial e sem atingir a real popularização das pesquisas desenvolvidas na região. “O
compromisso do jornalista científico com a democratização do conhecimento coloca-o na
posição de intérprete do mundo e como tal, historiador do cotidiano”. (CALDAS, 2003, p.76).
Para esse compromisso do jornalista deve haver por parte dos profissionais o
desenvolvimento de novos hábitos, novas atitudes com uma visão analítica e interpretativa
para que possam promover discussões e não ser cúmplice de interesses meramente políticos e
econômicos.
É nesse sentido que a contribuição das Fundações de Amparo à Pesquisa, as “Faps”,
como a Fapeam e Fapesp, das fontes sobre Amazônia, os institutos de pesquisa,
universidades, pesquisadores e jornalistas (repórteres e editores) tendem a estar mais
concentrados e comprometidos com a pesquisa do que com a simples reprodução de falas e
versões.
No caso do Amazonas, ainda há a escassez de veículos de comunicação que levem ao
grande público o que acontece dentro dos laboratórios das universidades, que divulguem de
forma constante os estudos e até recentes descobertas e avanços técnico-científicos feitos no
Estado.
Apenas um dos principais jornais da capital mantém uma página dedicada à
divulgação da ciência e de notícias ligadas ao meio ambiente e um com uma página semanal.
Os outros dois jornais publicam materiais de forma esporádica, produzindo materiais mais
focados apenas em datas especiais, como a Semana do Meio Ambiente e Dia da Água.
Uma das iniciativas de divulgar a ciência dentro de um jornal diário (Amazonas em
Tempo) foi o suplemento de ciência e tecnologia Intermais, produzida pelo Grupo de Estudos
e Pesquisas em Ciência da Comunicação, Informação, Design e Artes (Interfaces) da
Universidade Federal do Amazonas. Nela é observada como ocorre a passagem do discurso
científico, legitimado pelos pesquisadores e especialistas, para o discurso de divulgação
científica.
O suplemento semanal, composto por oito páginas, contava com espaço para artigos,
entrevistas, matérias e notas, segundo os padrões jornalísticos. Perdurou assim até o final de
2008, quando o jornal passou a ceder apenas uma página semanal para ciência e tecnologia,
por motivos internos do veículo, um deles, a viabilidade econômica.
49
Em 2010, essa página também foi extinta, limitando-se a páginas esporádicas voltadas
para conhecimento e meio ambiente, mas pela importância do tema, verifica-se a importância
de estudar esse corpus.
Outro exemplo de publicação, que contribui de forma sistemática para a divulgação
científica é a revista Amazonas faz Ciência, produzida pela Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado do Amazonas (Fapeam). Além deles, existe a divulgação por meio dos sites do
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, da própria Fapeam e o portal da ciência,
coordenado pela Faculdade Boas Novas, em Manaus.
Esta preocupação com a ampliação do conhecimento sobre a produção científica no
Estado é bastante visível, frente a esses exemplos pontuais de veículos de divulgação
científica, sejam eles, institucionais ou não.
A fundamentação teórica sob a perspectiva da análise do discurso permite identificar o
quê que caracteriza e como se formula o jornalismo científico e o discurso da ciência.
A reflexão sobre a circulação do conhecimento é uma forma de verificar como dar às
pessoas acesso à produção científica e seus resultados, de modo que elas possam tomá-los
para si de algum modo. O mundo deu a incumbência à ciência de encontrar soluções para
problemas das sociedades contemporâneas.
Guimarães (2003) diz que não há dúvida que esta atribuição de responsabilidade passa
a cada dia pelas formulações dadas pela mídia, assim como pelas formulações que os
governos fazem do que competiria aos cientistas realizarem. Isso envolve ainda as relações de
poder configuradas no interior da própria comunidade da ciência. “Poder que, de um lado, cria
regulações para a prática científica e que, de outro, procura instalar-se nas estruturas do
Estado e em lugares da mídia”, (idem, p.8).
No próximo capítulo, será feita a análise do corpus proposto para esta análise, sob a
ótica da AD francesa.
50
2 Constituição do discurso em textos de DC
Do ponto de vista discursivo, todo texto é heterogêneo. É atravessado por várias vozes
que caracterizam as condições de produção textual. É nessa polifonia que aparece o discurso
jornalístico fundido ao discurso científico, que se formam a partir de outros discursos,
conforme visto no capítulo anterior.
Dentro desse contexto, este capítulo apresenta as análises conduzidas a partir dos
referenciais teóricos abordados no trabalho. Dentro do corpus proposto, é apresentado um
quadro com as matérias e respectivas edições analisadas e posteriormente, feita a análise
descritiva, considerando as propriedades discursivas de cada uma.
O corpus da pesquisa é formado por textos retirados de três exemplares do suplemento
InterMais de Ciência e Tecnologia do Jornal Amazonas Em Tempo e matérias de três edições
da Revista Amazonas faz Ciência, publicada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
do Amazonas (Fapeam). Ao todo foram analisadas nove matérias de capa das duas
publicações, que eram as principais publicações de divulgação científica do Estado, quando
iniciada a pesquisa em 2008. O suplemento InterMais teve a publicação suspensa por
questões econômicas do jornal em que circulava, como descreve o próprio editorial do
suplemento, em 18/12/2008.
Leitoras e leitores. A partir deste número, o Caderno InterMais de Ciência e
Tecnologia deixa de ser encarte e passa a ser uma página no jornal Amazonas EM
TEMPO. A crise mundial e o recesso escolar pesaram na decisão da direção do
Amazonas EM TEMPO e do Grupo de Estudos e Pesquisas em Ciências da
Comunicação, Informação, Design e Artes (Interfaces) em reduzir os custos no
período de férias.
O jornal passou então a publicar uma página semanal destinada aos temas ligados à
ciência, mas ainda em 2009, também suspendeu a publicação da página, feita em parceria pelo
Grupo de Estudos Interfaces da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
Ao todo foram analisados nove textos, um de cada suplemento de Ciência e
Tecnologia e dois, de cada revista. As matérias principais (capa) foram o critério delimitado
pela análise do suplemento e, no caso da revista, além da manchete, mais uma matéria
51
principal foi utilizada para averiguação, por se tratar de uma publicação com maior número de
páginas.
Para sistematizar a análise, foram utilizados aspectos que abordaram os três grandes
momentos discursivos (constituição, formulação e circulação) relacionados ao Discurso
Científico (DC) e ao Discurso de Divulgação Científica (DDC), segundo referenciais teóricos
da AD e do jornalismo. A análise dos textos selecionados para este corpus foi baseada no
quadro a seguir, elaborado por Souza3 (2008):
Propriedades discursivas
Nível Discurso Científico (DC) Discurso de Divulgação Científica (DDC)
Constituição
- Pré-construído: objetividade e neutralidade - Apagamento do sujeito - Efeitor-leitor: relação simétrica - Ciência como conhecimento - Versão A de x
- Pré-construído: objetividade e neutralidade - Explicitação do sujeito - Efeitor-leitor: relação assimétrica
- Ciência como informação - Versão B de x
Formulação
- Textualização dentro da ordem do DC
- Sujeito não-formulado - Formulação como produto de trabalho mediato - Termos partilhados: metalinguagem
- DDC: Textualização jornalística/didática do DC - Sujeito formulado - Formulação como produto de trabalho imediato - Termos explicados: terminologia
Circulação
- Restrita - Efeito de simetria de interlocução - Espaço amplo na esfera cronotópica - Faz ciência
- Ampla - Efeito de assimetria de interlocução - Espaço restrito na esfera cronotópica - Informa o que a ciência faz
Conforme disposto no quadro, para identificar as propriedades discursivas do DC, no
nível da Constituição, foram observados se os textos eram revestidos de características desse
tipo de discurso, verificando se havia objetividade e neutralidade, com o apagamento do
sujeito, destacando a ciência como conhecimento e com um efeito-leitor simétrico (entre
pares, entre os especialistas). Por outro lado, na constituição do DDC, existe também um texto
com base na objetividade e neutralidade, mas com explicitação do sujeito, enfatizando a
ciência como informação, com um efeito-leitor assimétrico, ou seja, voltado para outros
públicos.
No nível da formulação, o DC surge como produto de trabalho mediato e com um
sujeito não formulado, em que os termos partilhados, ocorrem por uma metalinguagem,
3 SOUZA, Sérgio Augusto Freire de. Informação relevante apresentada e elaborada em sala de aula, durante a
Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, na UFAM, em 2008.
52
específica dentro da ordem do discurso científico. Já na DDC, a formulação é didática e
dentro da textualização jornalística, com o sujeito formulado, mas é realizado como produto
de trabalho imediato. Os termos científicos e tecnicistas são explicados nesse funcionamento.
Em relação à circulação, o DC ocorre de forma restrita, voltada para um público mais
fechado, a textualização é destinada à produção de ciência. Enquanto que no DDC, a
circulação é ampla, voltada para a grande massa, valorizando a ciência como geradora de
informação e notícias.
A partir da análise desses tópicos, foi gerado um panorama das matérias analisadas e
posteriormente, verificando se os discursos estão dentro das especificidades do jornalismo
científico.
É importante refletir aqui, antes da análise, sobre o que se entende por objetividade e
neutralidade. O jornalismo, segundo Marcondes Filho (1989) acaba por dar eco apenas às
vozes institucionais, servindo como suporte do poder social, político ou econômico. Desse
modo, o acesso à imprensa para divulgar o outro lado do acontecimento fica restrito.
Diante disso, a notícia (matéria-prima do jornalismo) finda por ter um acabamento
padronizado para o pronto consumo do grande público. Assim, a notícia é constituída por
características baseadas no ineditismo, no verdadeiro, na imparcialidade e na objetividade.
Este último aspecto é passível de discussões e investigações de estudos da área de
comunicação.
No caso desta pesquisa, será visto de uma maneira mais geral para compreender
melhor a funcionalidade dos discursos aqui estudados. A objetividade jornalística, adotada
com maior ênfase a partir do início do século XX, é abordada geralmente até como um mito
dentro do próprio meio e é tida como uma das principais virtudes da matéria jornalística.
Além disso, é considerado o princípio básico que norteia o texto jornalístico.
Conforme Barros Filho (2001), a objetividade jornalística surgiu no momento da
evolução do espaço ideológico, como uma reprodução do jornalismo ideal e geograficamente
delimitado. Diante da censura no período da ditadura militar, a partir de 1964, essa noção
ganha ainda mais espaço. O fim dos pequenos jornais políticos e o avanço de grandes grupos
de comunicação, que reduziram os espaços de opinião também impulsionaram a incorporação
de padrões americanos de fazer reportagem.
53
A objetividade então é adotada como princípio do jornalismo para combater notícias
pretensamente manipuladoras, imprecisas, interesseiras e sensacionalistas, como aponta Bahia
(1990). Assim, um discurso tem objetividade quando apresenta aspectos próprios de objeto,
ou seja, o fato, e não características do sujeito, nesse caso, o do autor do relato (o jornalista).
Na visão de Moretzsohn (2002) esses aspectos da objetividade e imparcialidade são aceitos
pela imprensa ocidental e é nesse sentido que, mesmo com críticas, é em torno deles que se
procura formular uma teoria do jornalismo.
Para Erbolato (1991), os fatores subjetivos têm mais oportunidade de se manifestar do
que simplesmente descrever os fatos. Para ele, nenhum jornalista duvida que interpretar
objetivamente é mais difícil do que informar. “Contudo, a simples informação, às vezes,
também é difícil de ser redigida, dentro de rigorosa objetividade” (1991, p. 35).
A reportagem objetiva foi feita por jornalistas em imitação aos métodos científicos das
ciências naturais, segundo Goodwin (1993). No entanto, sabe-se que a iniciativa foi para
separar informação e opinião.
É nesse sentido que Traquina (2001) rejeita a chamada ideologia da objetividade, visto
que o processo de seleção é subjetivo e arbitrário, atrelados a juízos de valor baseados nas
experiências e expectativas de quem seleciona a informação. “As notícias são o resultado de
processos complexos de interação social entre agentes sociais: os jornalistas e as fontes de
informação; os jornalistas e a sociedade; os membros da comunidade profissional, dentro e
fora da organização”. (ibidem,p.69). Neste caso, então há um jogo de intersubjetividade, que
interfere em todo o processo, o que está relacionado à teoria do gatekeeper (notícias
explicadas como um produto das pessoas e das suas intenções).
Orlandi (2001) diz que a compreensão dos sentidos dos enunciados passa pela leitura
contrastiva, por conta das implicitações discursivas, fazendo-se necessário saber quem é o
sujeito, a que classe pertence, os valores que defende e qual a sua posição político-ideológica.
São fatores que levam ao não dito, induzido pelo jogo semântico e com a utilização de
partículas argumentativas, tais como: mas, embora, porém, entretanto e outros. As intenções
implícitas no discurso também ficam mais evidentes por meio dos tempos verbais empregados
num dado contexto, principalmente com o uso de paráfrase, metáforas e marcas da
subjetividade.
54
2.1 DDC ou DC: exemplos de variação discursiva nas revistas
Para sistematizar a análise, foram selecionadas a primeira revista, a 7ª (que representa
o meio do tempo de circulação da publicação) e a 11ª edição, que não contou com a
participação desta pesquisadora no desenvolvimento editorial da mesma. A partir desse
número, tivemos a participação no desenvolvimento de matérias para a Amazonas faz
Ciência.
Como o conteúdo da revista é composto por 52 páginas editoriais, definiu-se que
fossem analisadas duas matérias principais da edição, sendo a capa (por ser a matéria de
maior destaque e com maior conteúdo) e a primeira matéria em evidência na revista.
Dividimos então a análise em tópicos e em localizadores, conforme tabela abaixo. A
primeira matéria da revista nº 1, corresponde ao localizador R1-A, a segunda matéria, R1-B;
já a matéria de capa da edição nº 7 é identificada pelo código R2-A e o outro texto, R2-B; na
terceira e última publicação, definiu-se, a matéria de capa como R3-A e a outra, R3-B.
Tabela 1 – Revistas Amazonas faz Ciência analisadas
Edição Localizador Título da matéria Páginas
No 1 – Ano I
Agosto/2005 R1-A Iniciação Científica (Capa) 22 a 24
No 1 – Ano 3
Agosto/2005
R1-B Indígenas dão o tom da pesquisa (1ª matéria
do conteúdo interno da revista)
8 a 10
No 7 – Ano 3
Dez/2007
R2-A Mudanças climáticas globais (Capa) 25 a 32
No 7 – Ano 3
Dez/2007
R2-B Pescado na cesta básica do amazonense (1ª
matéria do conteúdo interno da revista)
10 a 13
No 11 – Ano 4
Out/2008
R3-A Rede de pesquisa vai ampliar conhecimento
sobre a malária (Capa)
40 a 42
No 11 – Ano 4
Out/2008
R3-B Estudantes de Rio Preto da Eva testam adubo
alternativo (1ª matéria do conteúdo interno da
revista)
9 a 11
55
2.1.1 Amazonas faz Ciência: características
Antes de iniciar as análises das revistas, é importante fazer uma descrição das
características da revista Amazonas faz Ciência. Criada pela Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado do Amazonas (Fapeam), em 2005, como uma ferramenta para suprir a lacuna na
divulgação científica local, a revista foi lançada com outra denominação: Amazonas Ciência,
com textos de predominância institucional e voltados para a divulgação de projetos
desenvolvidos com fomento da fundação.
A publicação é desenvolvida pelo Departamento de Difusão do Conhecimento
(Decon) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), com o apoio
do Programa de Comunicação Científica, fomentado pela fundação. A publicação é composta
por 52 páginas, em papel couchê e colorida, sendo distribuída gratuitamente para órgãos
públicos, escolas, instituições de ensino e pesquisa, no âmbito local e nacional. A tiragem em
média da publicação é de 5 mil exemplares a cada três meses.
A revista é composta por várias matérias que mostram a produção do conhecimento
desenvolvida no contexto local. Além disso, é subdividida em seções, descritas de forma
resumida a seguir:
Canal Ciência – Notas diversas sobre assuntos que foram notícia em todo país e no
Amazonas.
Espaço do Leitor – Seção destinada aos leitores para envio de e-mails, notas e sugestões de
melhoria na revista, elogios e espaço para críticas.
Notícias – Matérias voltadas para a divulgação de pesquisas e também de temas
institucionais.
A ciência responde – espaço destinado para perguntas de leitores leigos a especialistas sobre
diversos temas.
2.1.2 Análise da R1-A
O texto A (ver reprodução nos anexos) mostra como ocorrem as atividades de um
grupo de pesquisa de iniciação científica que desenvolve projeto de aproveitamento de
resíduos madeireiros, na zona leste de Manaus. Para analisá-la foram empregados os aspectos
56
já anteriormente descritos dentro do quadro de propriedades discursivas delimitado. A matéria
de capa é ilustrada com uma fotografia que tomou uma página inteira, que mostra bolsista do
PIBIC Jr. em atividade.
O título da matéria é formulado sem apoio de verbo e é sustentado pelo subtítulo: “A
criatividade é o ponto forte dos estudantes da rede pública de ensino. Eles fazem arte a partir
dos restos de produtos que seriam jogados no lixo”. Logo acima, no que se convém chamar
retranca ou como mais conhecido pelos jornalistas, como “chapéu”, titulou-se “Inclusão
social”, o que ideologicamente remete o trabalho desenvolvido pelo Programa como ação
conjugada entre ciência e sociedade.
Dentro do quadro de propriedades discursivas, verificou-se que a constituição do texto
“Iniciação Científica” é pré-construído buscando a objetividade e neutralidade, inerentes tanto
ao Discurso Científico (DC), quanto ao Discurso de Divulgação Científica (DDC). Como foi
abordado anteriormente, há a busca por essa objetividade e neutralidade, pois ainda que o
subjetivo (o eu) não esteja presente dada a linguagem impessoal imposta pelas regras
inerentes à produção jornalística, não há a eliminação do autor do processo enunciativo do
discurso jornalístico, determinando com isso a produção de efeitos de sentidos.
Diz-se da objetividade quando estão expressos os aspectos próprios do objeto, ou seja,
o fato e não referente ao sujeito, ou seja, sobre o autor do relato (o jornalista). Tanto o DC
quanto o DDC são pré-construídos com o pressuposto da objetividade, apesar de esse ponto
ser complexo, porque ambos são construídos por sujeitos dotados de ideologia, história e
aspectos culturais inerentes a cada indivíduo.
Há contido nesse texto a explicitação do sujeito legitimado, aqui representado pela
pesquisadora Claudete Catanhede, que é coordenadora do projeto de aproveitamento de
resíduos, que dá o tom da matéria, com a inclusão do discurso direto. A inclusão do nome da
pesquisadora legitima o fato descrito no texto, conforme o trecho: “Uma das nossas grandes
preocupações foi não deixar que o grupo manipulasse sozinho os equipamentos”, afirma
Claudete Catanhede. (grifo nosso).
Além desse trecho, o segundo parágrafo da matéria dá indícios de que o projeto em si
é legitimado por uma pesquisadora, conforme a seguinte construção na voz ativa:
57
Coordenados pela professora doutora Claudete Catanhede, eles participam e são
a primeira turma do projeto „Aproveitamento de Resíduos Madeireiros como
Alternativa de Fonte de Renda para a Zona Leste de Manaus. (Amazonas Ciência,
2005, p.22)
Desse modo, a explicitação do sujeito indica características discursivas de texto de
divulgação científica. O texto jornalístico normalmente utiliza de paráfrases para sustentar
ideias e constituir a matéria.
Orlandi (2005) nos leva a reflexão sobre o efeito-leitor, destacando que ao produzir
um texto, “o autor faz gestos de interpretação que prendem o leitor nessa textualidade
constituindo assim ao mesmo tempo uma gama de efeitos-leitor correspondente”. (p.151).
Assim a noção de efeito-leitor permite a compreensão que um texto prevê e por quais
mecanismos ele o antecipa e propicia novos elementos para as práticas de leitura da ciência.
No texto da revista, há ainda referências a alguns participantes do projeto, atendendo
ao princípio jornalístico de ouvir mais de uma fonte.
[...] “nós queremos mostrar nas serrarias, nas escolas, na vizinhança e no bairro que
o que seria queimado pode ser reaproveitado”, afirma Simoneta Silva de Silva, 20.
“Tive que convencer a minha mãe, disse que eu não poderia perder essa
oportunidade. Em Santa Izabel não tem universidade, a mais próxima é em
Barcelos”, completa Gisele [...] (Amazonas Ciência, 2005, p.24)
Desse modo, a análise do efeito-leitor está relacionada à materialidade textual, à
análise da função-autor que lhe corresponde e às direções de sentidos que os textos
contribuem para que se constituam no processo de leitura. Nesse texto em análise, percebeu-
se uma relação assimétrica, ou seja, o texto é direcionado para o público mais amplo, com as
devidas explicações sobre os termos e siglas. Inclusive, o texto é iniciado com a descrição do
cenário em que a pesquisa é desenvolvida, quebrando o paradigma do lide4 formado pelas
informações básicas:
“O ruído das serras, tornos e furadeiras ou a poeira da serragem em suspensão no ar parecem não exercer alteração alguma na concentração do grupo de jovens que se
reúne numa oficina de carpintaria quase todas manhãs”. (Amazonas Ciência, 2005,
p.22)
4 Do inglês lead, significa parágrafo líder, abertura da notícia, sem tradução na língua portuguesa. O texto
começa pelo lide (forma aportuguesada do termo), que deve conter os elementos essenciais da notícia: o quê,
quem, quando, onde, como e por quê.
58
Verifica-se que a descrição do local e do ambiente em que a pesquisa está sendo
desenvolvida, tem a intenção de levar o leitor para dentro do cenário onde foi feita a
entrevista. Essa é uma estratégia linguística do jornalista para que haja desde o primeiro
contato com o texto. Como aponta Malavoy (2005, p.19): “A abertura representa a vitrine de
seus argumentos. Assim como uma vitrine, ela deve conter os elementos capazes de chamar a
atenção”.
E mais adiante, o texto explica do que se trata, indicando a qual grupo se refere:
O grupo faz parte do Programa Institucional de Iniciação Científica – PIBIC Júnior,
fruto do convênio entre o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas
(Fapeam). (Amazonas Ciência, 2005, p.22)
O uso de adjetivo no texto também soa como uma técnica que leva o leitor a uma
visão mais atrativa da pesquisa para o grande público, daí mostra que não há tanta
neutralidade na discursividade inerente ao jornalismo:
Nas mãos criativas dos jovens cientistas, resíduos de madeira que seriam queimados
e usados como adubo se transformam em carrinhos, conjuntos de escritório, bandejas, vasos, porta-jóias, mesa marchetada, cadeira, castiçais, abajures e porta-
retratos, perfazendo um total de 100 peças. (Amazonas Ciência, 2005, p.22)
Ainda nesse contexto, a matéria apresenta a ciência como informação ao detalhar
aspectos do projeto em questão, não transmitindo a ciência como conhecimento. Um dos
pontos que mostra isso consiste na explicação dos objetivos do projeto e a relação dele com a
comunidade:
Tem como objetivos contribuir para a capacitação de estudantes em ciência e
tecnologia; possibilitar maior interação entre o ensino médio e pós-médio das
instituições de pesquisa ou ensino médio e pós-médio científico e tecnológico.
(ibidem).
Ainda que não esteja assinada por nenhum jornalista, a matéria tem a versão de um
outro autor (Versão B de x) sobre o projeto desenvolvido sob coordenação de uma
pesquisadora, mediante toda análise de constituição acima citada (o sujeito fica explícito e
efeito-leitor assimétrico).
Quanto ao nível de formulação, o texto apresenta características de Divulgação
Científica, ao apresentar uma formatação mais didática e de compreensão razoável:
59
Depois das aulas, na oficina do Inpa, os adolescentes começaram a trabalhar nas
peças, baseados em revistas de decoração e de design. Isac de Oliveira, 21, não abre
mão de desenhar os objetos que confecciona. Como sempre gostou de desenho e
grafite, agora usa os conhecimentos estéticos para planejar mesas, cadeiras, armários
e cômodas de brinquedo. (Amazonas Ciência, 2005, p.22)
Nesse mesmo parágrafo é possível identificar a formulação do sujeito, inclusive no
decorrer de todo o texto os personagens/atores da pesquisa são incluídos com aspas, onde
descrevem alguma relação com a pesquisa em foco. Aqui, a formulação passa por um trabalho
mais imediato, visto que a textualização desse projeto é expressa em duas páginas de texto,
enquanto que o trabalho científico se estende por anos, neste caso, desde 2003, como aponta o
próprio texto.
Na matéria não constam termos muito específicos da área, mas algumas terminologias
como resíduos madeireiros e desenvolvimento sustentável ficam dotados de fácil
compreensão pela maneira que o autor descreveu as atividades, tal como:
[...] resíduos de madeiras que seriam queimados e usados como adubo se
transformam em carrinhos, conjuntos de escritório. (Amazonas Ciência, 2005, p.22)
Um ponto importante a ser destacado neste aspecto da análise é de que no nível da
formulação reside a institucionalização do que é dito, com a citação de instituições
fomentadoras da pesquisa, isso deverá ser observado em quase todas as matérias da revista em
análise, já que está ligada a um órgão público do governo estadual.
Quanto à circulação, o projeto de cunho científico é divulgado no meio revista, com
distribuição voltada para um público ainda seleto, dentro do circuito de universidades, escolas
e instituições de pesquisa do Amazonas. Dentro da esfera cronotópica, o texto se enquadra
com funcionamento coincidente, de gênero jornalístico e discurso polifônico composto por
várias vozes.
Diante da análise pontual, avaliando os níveis das propriedades discursivas, o material
em questão é considerado como divulgação científica, ainda que institucionalizada. Percebe-
se uma influência de outros discursos, tal como o científico, o político e o jornalístico,
formando um discurso dotado de variabilidade textual, percebido nas camadas além da
superfície textual. Dessa forma, não se trata de um texto puramente de divulgação científica,
mas construído com elementos formadores de outros processos discursivos.
60
Percebeu-se ainda que o texto de capa foi feito ainda de maneira bem elementar, em
relação ao espaço destinado a matérias de revista que ganham destaque na capa. Distribuído
em duas páginas de texto e duas de imagens, o texto se ateve apenas a um projeto de iniciação
científica, que poderia ter sido ampliado para outros projetos desenvolvidos no âmbito local.
2.1.3 Análise da R1-B
O título da matéria “Indígenas dão o tom da pesquisa” foi utilizado para despertar o
interesse do leitor, já que remete aos conceitos de conhecimento tradicional e tecnologia,
abrangentes nas populações de São Gabriel da Cachoeira (AM).
Os dois termos são fortemente utilizados na matéria, que apresenta o estudo intitulado
“Avaliação de Adubo Orgânico obtido das sobras de mandioca, casa de cupim e paú no
rendimento do milho e feijão em roças de produtores indígenas de São Gabriel da Cachoeira”.
Do ponto de vista da constituição, o texto em análise não conta com identificação de
autoria. Vale aqui fazer uma breve reflexão sobre a noção de autoria. Na obra de Orlandi
(2001) ela aborda Ducrot para distinguir a função enunciativa do locutor e a do enunciador,
em que o primeiro se representa como “eu” no discurso e o outro representa a perspectiva que
esse “eu” constrói.
Orlandi se refere ainda a Foucault (1971b) que considera a existência de princípios
internos de controle e delimitação do discurso. Para ele, o autor consiste no princípio de
agrupamento do discurso e origem de suas significações. Assim, o autor é responsável pelo
texto que produz. Para Orlandi, a noção de autoria é estendida para o uso corrente, enquanto
função discursiva do sujeito, distinta da de enunciador e de locutor, já para Foucault, a noção
de autor é voltada para situações enunciativas especiais. Para Orlandi, o produtor de
linguagem se representa na origem, o que condiz com a função autor.
Apesar disso, no texto em análise, além de não haver a identificação visível, a matéria
também não é construída na primeira pessoa, mas de forma narrativa, sem a formatação do
tradicional lide, que é previsto na pirâmide invertida própria de textos jornalísticos e
noticiosos. Segundo verificou-se no seguinte trecho do parágrafo inicial:
A palavra adubo não tem tradução na maioria dos idiomas falados em São Gabriel
da Cachoeira (distante 852 km de Manaus). [...] Há cerca de seis meses, o termo
61
adubo passou a ser palavra comum em duas comunidades onde está sendo
desenvolvido o projeto de pesquisa sobre fertilização da roça de mandioca.
(Amazonas Ciência, 2005, p.8)
Há a explicitação do sujeito (pesquisador) quando o texto identifica o professor
responsável pela pesquisa no segundo parágrafo da matéria, legitimando o trabalho que está
sendo exposto:
O projeto é coordenado pelo professor Simão Corrêa da Silva, da Escola
Agrotécnica Federal de São Gabriel da Cachoeira (EAF-SGC), e faz parte do
Programa Jovem Cientista Amazônida (JCA). (Amazonas Ciência, 2005, p.8)
Orlandi (2001) aponta que o corpo do sujeito e o corpo da linguagem são atravessados
de discursividade, não sendo transparentes. Neste caso, em nível de constituição, percebe-se
os sujeitos atravessados na voz ativa, sem ter o apagamento, característico do discurso de
ciência. Além da voz do pesquisador, nesse texto, observam-se citações de outros professores
e também de um pai de um dos bolsistas envolvidos no projeto.
“Muitas pessoas vêm aqui dizendo que são turistas, mas nós sabemos que são
pesquisadores disfarçados. Com nossos filhos participando das pesquisas, sabemos
que os resultados ficarão para nossos povos”, relata Adalberto Joaquim Borges,
pai de um dos bolsistas JCA. (Amazonas Ciência, 2005, p.22)
Neste texto, o efeito-leitor também é assimétrico, ou seja, um jornalista que descreve a
pesquisa desenvolvida por um pesquisador com o objetivo de divulgar para o público em
geral, bem mostrada por meio das técnicas jornalísticas.
Em relação a esse efeito-leitor, Orlandi (2005, p.151), afirma que “ao produzir um
texto, o autor faz gestos de interpretação que prendem o leitor nessa textualidade constituindo
assim ao mesmo tempo uma gama de efeitos-leitor correspondente.” Nesta matéria, configura-
se então a versão B de X (jornalista de um cientista).
Orlandi destaca que “à escrita (formulação) do discurso da divulgação científica
corresponde, pois, o efeito-leitor que o institui e que o caracteriza no modo mesmo em que ele
se apresenta na circulação dos sentidos em uma formação social dada em sua história” (2005,
p.151). Todavia, também existem outros textos, que além da divulgação científica jornalística
uma série de outros textos, fazem circular discursos científicos na sociedade.
Na formulação, há um investimento do corpo do sujeito presente no corpo das
palavras. O momento em que o sujeito diz o que diz. É nítida a presença atravessada do
62
Estado e a relação de poder impregnada por conta do fomento e participação da Secretaria
Estadual de Ciência e Tecnologia (Sect) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do
Amazonas (Fapeam), como expresso no parágrafo:
Desenvolvido pela Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia (SECT), por meio da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), o JCA é uma
iniciativa promissora no país. (Amazonas Ciência, 2005, p.22)
Observa-se então a ideologia do Estado expressa por conta da política de
financiamento da pesquisa. A força do Estado não interfere no momento da constituição, mas
é no instante da formulação que há essa presença mais explícita. Assim, a esfera da ciência é
subordinada ao Estado e até mesmo à mídia, segundo Guimarães (2001). Conforme
conferimos no seguinte parágrafo:
O programa pretende melhorar a qualidade de vida da população fomentando
projetos de pesquisa envolvendo questões rurais, indígenas e municípios do interior,
financiando, hoje, 383 bolsistas em Anamã, Autazes, Barcelos, Barreirinha [...].
(Amazonas Ciência, 2005, p. 9).
Aqui, fica clara a passagem de uma política pública atravessando uma atividade de
cunho científico em diversos municípios do Amazonas. Esse é um caso claro de intervenção
do aparelho ideológico do Estado na formulação desse discurso. A textualização é tida como
jornalística, apesar de não haver a construção do lide do padrão americano e nem a ordem
prioritária de informações.
Há a descrição dos projetos, com as referências das fontes, legitimadas o que confirma
o texto ser caracterizado nesse nível como Discurso de Divulgação Científica (DDC). Trata-se
ainda de um produto formulado como resultado de trabalho imediato e com terminologia de
palavras, tais como a explicação do que é “paú” referente a “pau podre”.
No nível da circulação, trata-se de uma divulgação ainda restrita por ser partilhada
para um público específico (universidades, instituições de pesquisa, pesquisadores e bolsistas
da Fapeam), apesar de ser publicada em uma revista. Refere-se também a um texto de cunho
jornalístico, com participação de diversas vozes, formadas pelo próprio jornalista e pelas
fontes entrevistas (professores e pai de bolsista). O texto informa o que a ciência faz e por
isso, se configura como DDC, segundo as propriedades fundantes do discurso.
63
2.1.4 Análise da R2-A
O texto aborda a questão das mudanças climáticas globais e a constante degradação do
planeta por parte da humanidade. Para tanto, o jornalista, devidamente identificado como
autor do texto, ouviu três pesquisadores, especializados na área, que colaboraram para a
legitimidade do que é dito pelo autor da matéria.
O título dessa matéria já identifica do que trata o assunto “Mudanças Climáticas
globais”, com um subtítulo que leva à reflexão: “A ameaça de degradação do planeta exige
que a humanidade mude seu padrão de consumo”. Estamos preparados para esta tarefa?”.
Assim, o jornalista se inclui no enunciado (humano que é) para chamar a atenção dos leitores
sobre o tema.
A construção da matéria inicia com a descrição do espaço em que o jornalista esteve
presente para entrevistar uma das fontes da matéria, recurso para tornar a leitura sobre um
tema tão científico, em um texto mais hermético, conforme o trecho:
Antes da entrevista concedida para esta reportagem, o matemático, físico e químico
Prakki Satyamurty, 65, apanhou uma caneca de porcelana de cima da mesa, pediu
licença e se dirigiu a um bebedouro no corredor do prédio do Programa LBA, no
campus 2, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Abasteceu a caneca, tomou um pouco de água e tornou a enchê-la, para só então voltar à sala.
(Amazonas Faz Ciência, 2007, p.25)
O jornalista escolheu outra maneira de começar um texto sem partir do lide
tradicional, mais informal para aproximar o leitor do assunto principal proposto no título da
chamada. Pode-se considerar o texto com um recorte pré-construído com objetividade e
neutralidade por ser informativo, com a explicitação do sujeito, próprio do DDC, grifos
nossos:
Para início de conversa, (tom informal) Prakki Satyamurty (pesquisador) explicou
que a frase no bebedouro é exemplo de como as pessoas podem adotar medidas
simples para contribuir com a sustentabilidade do planeta. (Amazonas Faz Ciência,
2007, p.25).
As falas dos pesquisadores entrevistados são explicitadas em várias partes do texto,
identificando os sujeitos desse discurso, tal como aponta o trecho:
Satyamurty e os físicos Paulo Eduardo Artaxo Netto, 51, chefe do Departamento
de Física Aplicada do Instituto de Física da USP, e Antônio Ocimar Manzi, 77,
gerente executivo do Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na
64
Amazônia (Programa LBA) afirmam que a sociedade só vai se envolver na busca de
soluções quando passar a entender o que está acontecendo com o planeta.
No Discurso Científico, há o apagamento do sujeito que faz a ciência, o que não é o
caso deste texto que apresenta o caráter coincidente de um texto de divulgação científica.
Além da explicitação do sujeito (pesquisador), a matéria apresenta ao público questões
pontuais do cotidiano para explicar mais claramente os impactos das mudanças climáticas:
Nem todas as pessoas são universitárias e a maioria nem tem noção de que esteja
envolvida nessas mudanças climáticas. Por exemplo, um rapaz que pega motosserra
e corta uma árvore milenar está fazendo isso para ganhar um dinheirinho. Alguém
disse para ele: - você faz isso e será recompensado. No fim do dia ele pega ao salário
dele”, afirma Satyamurty,que está preparando uma cartilha com sugestões de
medidas a serem adotadas pelos governos e cidadãos mais comuns”. (Amazonas Faz
Ciência, 2007, p.26)
Zamboni (2001) destaca que a inserção da fala de especialistas leva o texto a assumir o
caráter de argumentos de autoridade no discurso “vulgarizado” menos pela forma de dizer e
mais pela possibilidade de revelar a ancoragem que lhe confere a autoridade do discurso da
ciência.
A relação assimétrica é também evidente em outro trecho do texto, que aponta mais
exemplos das ações da humanidade sobre o meio ambiente:
Praticamente tudo o que homens e mulheres utilizam no dia a dia contribui de forma
direta ou indireta para aumentar as emissões de gases do efeito estufa. O celular, o
computador, o carro, os alimentos, as roupas, os produtos de beleza, os papéis e plásticos...tudo tem relação com as mudanças climáticas. (Amazonas Faz Ciência,
2007, p.26).
No outro parágrafo, o texto ressalta e explica termo utilizado por pesquisadores,
reforçando a assimetria, na relação do efeito-leitor e na constituição da ciência como
informação.
Entender a engrenagem da sociedade e suas conseqüências ao meio ambiente é
chave para que se adote o que os cientistas chamam de medidas mitigadoras
(redutoras). “A mitigação se fará pela drástica redução das emissões de gases de
efeito estufa, não há outra alternativa viável, opina Manzi. (Amazonas Faz Ciência,
2007, p.26)
O uso de infográfico, que por meio de um esquema com figuras mostra como se forma
o efeito estufa também colabora para o melhor entendimento do leitor em relação a esse
fenômeno, explicado pela ciência.
65
Os trechos abaixo do infográfico explicam com a fala do pesquisador como ocorre o
fenômeno, neles pode-se observar a versão B de x, ou seja, o jornalista mostra a informação,
legitimada pela fala de pesquisadores:
O efeito estufa, ao contrário do que muita gente pensa, não foi criado pela ação
humana. Trata-se de um efeito natural causado pela combinação de uma série de
eventos também naturais. De acordo com Prakki Satyamurty, a maior parte dos
gases de efeito estufa concentra-se na baixa atmosfera (a troposfera) que se estende
até 20 quilômetros de altitude. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.27).
Segundo Antonio Manzi, se não houvesse os gases de efeito estufa, a Terra seria 33
graus Celsius mais fria e a vida no planeta seria praticamente impossível. “O efeito estufa é essencial para o planeta. Ele é um efeito natural, principalmente por conta
do vapor de água e do gás carbônico (que juntos respondem por mais de 90% do
efeito estufa)”. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.27)
No que se refere à formulação, a textualização pode ser considerada em parte didática,
ainda que traga uma carga científica muito além do conhecimento da maioria das pessoas,
como pode-se observar em alguns trechos da matéria, tal como no quadro sobre o efeito
estufa:
Com as emissões após a revolução industrial (século XVIII), a manta que aquece o
Planeta (que manta?) ficou mais espessa e aumentou a temperatura da Terra e da
atmosfera. Nos últimos 100 anos, os cientistas constataram aumento de 0,76 grau
Celsius na temperatura média da Terra, com algumas regiões aquecendo mais que
este valor. [grifo nosso] (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.27)
O jornalismo científico tem o leigo como seu principal público e por isso deve
expressar as pesquisas de maneira simples e ao alcance do mais comum cidadão. Nesta
matéria, em específico, percebe-se que há o esforço de ouvir especialistas no tema proposto
pela pauta e até há a simplificação de alguns conceitos, no entanto, há ainda alguns termos
não são muito comuns para a maioria das pessoas, tais como: ecossistemas, graus Celsius,
manta, matriz energética, combustíveis fósseis, bioma, carbono e outros.
Há então uma variação constante, com interlocução entre pares, o que caracteriza
enunciações simétricas, típico do discurso no campo científico, portanto. Observa-se um
exemplo de entrada no segmento explicativo no texto, dirigido a um receptor leigo:
O pesquisador Antônio Manzi explica que a Amazônia tem um estoque estimado de
100 a 130 bilhões de toneladas de carbono na biomassa (nas folhas e troncos das
árvores). [grifo nosso] (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.28)
66
No trecho fica evidente, a preocupação do jornalista em esclarecer para o leitor não
especializado do que se trata o termo biomassa, que não é tão comum no dia a dia das
pessoas.
Em relação ao aspecto da formulação, verifica-se no texto a relação governamental,
presente por ter pesquisadores apoiados pela Fapeam (ver página 31) e ao mesmo tempo, com
um tom de cobrança por parte de pesquisador em relação ao governo, conforme exposto no
texto:
A partir do momento que a população tomar consciência disso e entender o funcionamento do planeta, na opinião de Manzi, a população pode começar a exigir
dos seus governos e das grandes empresas[...].
[...] Podem cobrar que seus governos atuem em políticas, como essa Lei de
Mudanças Climáticas do Estado do Amazonas. A população tem um papel fundamental para fazer com que os governos e grandes corporações mudem suas
políticas e mudem a matriz energética do planeta. De uma maneira mais direta, ainda
é um pouco difícil a população agir”, afirma Manzi. (Amazonas Faz Ciência, 2007,
p.27)
As passagens demonstram a carga ideológica contida no texto, revestida de um
discurso polêmico emitido pelo pesquisador em uma revista institucional, mantida pelo
governo estadual. Por outro lado, a formulação do texto emite o valor do financiamento das
pesquisas por parte do governo, clara no seguinte trecho:
Prakki Satyamurty é pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe) e está em Manaus como professor sênior do Programa de Pós-graduação em Clima e Ambiente (parceria Inpa/UEA), com bolsa da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
[grifo nosso]. (pág.31)
Mais adiante, a matéria de capa ainda é composta por uma entrevista com o
pesquisador Paulo Artaxo, que aborda ainda o tema do aquecimento global e entre as
respostas, destaca o papel do Estado, no que tange à Lei de Mudanças Climáticas e o
Programa Bolsa Florestas, que são ações diretas do governo estadual, segundo afirma o
próprio pesquisador:
A Lei de Mudanças Climáticas do Amazonas é um excelente exemplo para o país.
Estrutura estímulos econômicos para que a floresta em pé tenha um valor agregado
maior que o desmatamento.
67
O Programa Bolsa Floresta também é uma excelente iniciativa que incentiva a
preservação da floresta, distribui renda e torna o pequeno agricultor um parceiro
essencial no processo de preservação. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.34)
Por estar no meio da revista impressa, com uma tiragem média de 5 mil exemplares a
cada três meses, a circulação pode ser considerada ampla, mas ainda dentro de um universo
mais restrito, já que o texto compartilha de certo grau de instrução e de conhecimento sobre a
temática. A esfera cronotópica é considerada matéria jornalística, que divulga indicadores
científicos sobre o aquecimento global, com opiniões e dados legitimados por pesquisadores
da área.
Concluindo análise descrita acima, o discurso do texto em questão pode ser
considerado de Divulgação Científica, ainda que tenha ainda uma leitura muito especializada
sobre a questão do aquecimento global.
No início do texto, houve uma preocupação de atrair o leitor e aproximar o cotidiano
dele da ciência, mas no decorrer da matéria, observou-se uma forte presença autoral dos
pesquisadores, o que leva a uma elocução oficial de um saber institucionalizado. “É a busca
da credibilidade, que se ampara na crença socialmente difundida da veracidade científica”.
(ZAMBONI, 2001, p.106).
2.1.5 Análise da R2-B
Com o título “Pescado na cesta básica do amazonense”, a matéria B que será analisada
neste tópico, foi produzida e identificada por uma jornalista, e é a primeira matéria do
conteúdo interno da revista, por isso entra no recorte dos textos a serem estudados. O material
aborda, com informações de pesquisadores, a possível regionalização da cesta básica para o
Amazonas.
O texto começa com impacto científico no lide, indicando o resultado de estudo feito
por pesquisadores, que incluíram o peixe e até o limão como alimentos indispensáveis à dieta
de quem vive no Estado, conforme abaixo:
Pesquisadores da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) criaram uma cesta
básica regional para o Amazonas, que inclui o peixe e até o limão como alimentos
68
indispensáveis à dieta de quem vive no Estado. A regionalização da “ração mínima
essencial” a cada família, conceito que supostamente define o custo de vida nas
cidades, mostra como os regimes de vazante e cheia dos rios influenciam no acesso
e no preço de produtos comercializados nos municípios da calha do rio Solimões-
Amazonas. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.10)
Após essa introdução, inicia-se o relato jornalístico que detalha o nome oficial do
estudo “A Rede Urbana da Cesta Básica no Amazonas: uma proposição a partir das cidades
de Coari e Manacapuru”, desenvolvida no âmbito do projeto “As cidades e os Rios:
Tipificação da Rede Urbana na Calha do Rio Solimões-Amazonas”. Há aqui a identificação
do grupo de pesquisa, ligado à Universidade Federa do Amazonas (Ufam).
No sétimo parágrafo da matéria, há a primeira inserção da figura de uma pesquisadora
(sujeito explícito) ligada ao núcleo de pesquisas que identificou a possibilidade de incluir o
limão e o pescado na cesta básica do amazonense.
“Produtos como limão e peixe obedecem a padrões de quantificação e unidades
locais de preços, como muitos outros produtos da cesta básica regionalizada”,
explica a pesquisadora do Nepecab, Tatiana Shor. (Amazonas Faz Ciência, 2007,
p.11)
“Pela primeira vez, um estudo evidencia hábitos alimentares e de comercialização da população do Norte do país, que sofrem influência das particularidades locais e não
podem ser comparados a outros Estados. Mesmo assim, são historicamente
negligenciadas pelo governo federal, no que se refere à política alimentar brasileira,
ordenada pela cesta básica”, explica Tatiana. [grifos nossos]
Em todo o texto há apenas a fala legitimada dessa pesquisadora acima mencionada. A
matéria é em sua totalidade feita pela enunciação do autor do texto, que se remete aos dados
da pesquisa como ponto de partida para os relatos. Dessa forma, então há a presença muito
forte e subjetiva da autoria da jornalista que produziu o texto.
Ao compreender o discurso como efeito de sentidos entre locutores, Orlandi (1999)
diz que na própria produção discursiva há a inscrição do outro que está constituído na
materialidade do texto ou na sua textualidade. “Não se pode falar do lugar do outro, no
entanto, pelo mecanismo de antecipação, o sujeito-autor projeta-se imaginariamente no lugar
em que o outro espera com sua escuta e, assim, “guiado” por esse imaginário, constitui, na
textualidade, um leitor virtual que lhe corresponde, como seu duplo”. (ORLANDI, 2005,
p.61). Assim, o sujeito se constitui em função da textualidade a qual se submete.
O texto flui como resultado de um relatório que indica aspectos da pesquisa e leitura
qualitativa a respeito do que foi detectado. Um exemplo é o trecho, a seguir:
69
A diferenciação no padrão de transporte das duas cidades reflete no fluxo de pessoas
e no alcance de bens e serviços. Manacapuru, sexto município em arrecadação no Estado, apresenta aspectos econômicos voltados para o setor primário da economia,
destacando-se a agricultura e tendo ainda a pesca como atividade praticada pela
população da zona urbana. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p
[...] Por sua vez, Coari tem apresentado um crescimento acelerado com um processo
diferenciado d que seria uma cidade do Amazonas devido à execução do projeto da
Petrobrás na Bacia de Urucu, ocupando o segundo lugar em arrecadação de ICMS e
royalties de petróleo.
Então no nível da constituição e também da formulação, percebe-se ainda um
revezamento entre o efeito simétrico e assimétrico, visto que em alguns trechos, são citados
termos pouco conhecidos e não explicados no texto, como os exemplos:
Porém, mesmo considerando a Economia das duas cidades, a variação do valor
médio da cesta básica regionalizada [o que significa esse conceito nas ciências
econômicas? Não foi explicado] se dá conforme a sazonalidade das águas – cheia e
vazante do rio, sendo maior o custo da cesta da enchente.
Também é necessário considerar a importância do chamado “lugar central”, de onde
saem todos os produtos industrializados para as cidades do interior do Estado. [ aqui
o termo lugar central foi devidamente explicado].
Pela análise, observa-se que mesmo sendo um texto que está contido em uma revista
de divulgação científica, portanto, para um grande público, não especializado, a linguagem
está mais próxima da divulgação dos resultados extraídos diretamente do relatório, resultante
da pesquisa realizada por especialistas. Pode-se então considerar, ciência na revista? Há,
então, presente no texto uma segmentação de divulgação científica e ao mesmo tempo de
discurso científico.
Ainda que formulado dentro de uma riqueza de dados técnicos, o autor do texto
sempre recorre a recursos que localizem a presença de pesquisadores no contexto das
informações.
[...] os pesquisadores duvidam que a cesta básica do órgão (nacional) atenda às
necessidades dos amazonenses.
A conclusão encontrada pelos pesquisadores fortalece a hipótese de Manacapuru e
Coari como cidades médias, a primeira com responsabilidade territorial e a segunda
de dinâmica econômica externa, apesar de não haver essa categoria urbana no
Amazonas, de acordo com o IBGE. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.13)
70
Quanto à circulação, a matéria assim como a anteriormente analisada, está em um
espaço amplo de divulgação, que pode estar ao alcance de um público maior do que pares
científicos. Por isso mesmo deveria ser elaborada de uma maneira mais completa e
abrangente, como prevê a prática do jornalismo: ouvir mais de uma fonte, confrontar e
contextualizar, além de promover debates sociais.
Após a análise, percebeu-se que não basta colocar em um veículo de comunicação
para caracterizar como jornalismo científico. O texto se trata de uma divulgação de resultados,
mas não categorizado como jornalismo. Apenas uma fonte foi destacada no texto, sem
contrapontos e sem promover reflexão dos benefícios ou desvantagens da referida pesquisa, o
que torna o texto sem caráter coincidente dentro da esfera cronotrópica textual (jornalismo),
ainda que tenham sido feitas inserções com o aparecimento do sujeito (pesquisador) por meio
de fala ilustrada com aspas. É como aponta Zamboni: “Divulgar a ciência e a tecnologia no
jornalismo leigo significa, de certa forma, explorar as potencialidades que tem o discurso
científico para se converter em notícia, formatando-o segundo a macroestrutura do texto
jornalístico”. (ZAMBONI, 2001, p.122).
Dessa forma, o texto poderia conter a opinião do consumidor amazonense e também
de empresários locais que deveriam fazer suas considerações a respeito dessa novidade, obtida
a partir de levantamento. Essa seria a prática coincidente com o jornalismo científico, que
deve ser realizado com a missão de informar e promover reflexão, envolvendo atores sociais
com que o público leitor se identifique.
2.1.6 Análise da R3-A
A matéria, assinada por duas jornalistas, aborda uma parceria interestadual entre as
Fundações de Amparo à Pesquisa do Amazonas, Pará, Maranhão, Mato Grosso, Minas
Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, com o apoio do CNPq e o Ministério da Saúde, no
combate à malária, por meio de pesquisas científicas.
Na primeira superfície textual, apresentada no título, fica claro o assunto a que o texto
se refere: “Rede de pesquisa vai ampliar conhecimento sobre a malária”, seguida pela
explicação de um texto curto que introduz o tema abordado na matéria.
71
Para atrair a leitura de um tema institucional, a estratégia utilizada foi iniciar
explicando o que significa a palavra malária, a fim de situar o leitor sobre a doença tão
comentada no Estado.
A palavra malária deriva do italiano “mal aire”, numa referência à crença que se
tinha antes da descoberta da doença, de que ela era causada pelo mau cheiro
emanado dos pântanos e de outros locais de águas estagnadas e odor desagradável.
(Amazonas Faz Ciência, 2008, p.40).
Ainda na introdução do texto, há a explicação sobre a origem da doença e algumas
características do mosquito transmissor.
Hoje, porém, ao contrário do que se pensava, sabe-se que a malária está ligada
diretamente a locais com águas limpas, pois o Anopheles darlingi, a principal
espécie de mosquito transmissor dessa enfermidade só se reproduz em tais
ambientes. (Amazonas Faz Ciência, 2007, p.25)
Há ainda a inclusão de dados para sustentar a gravidade do assunto colocado no texto:
Dados do Ministério da Saúde apontam que no ano de 2006, o Brasil registrou
545.696 casos de malária.
Cerca de 99,7% das ocorrências aconteceram na Amazônia Legal, onde já foram
identificados 90 municípios como sendo de alto risco para a malária, ou seja, com
um Índice Parasitário Anual (IPA) igual o maior a 50 casos por 1.000 habitantes. Em 2007 – apenas três Estados – Amazonas, Rondônia e Pará – registraram cerca de 350
mil casos, o que corresponde a 78% das ocorrências. [grifos nossos] (Amazonas
Faz Ciência, 2008, p. 40).
Essa parte introdutória serve para remeter o leitor ao assunto principal do texto que é
divulgar uma rede institucional que apoia pesquisas sobre a malária. Assim, sob o aspecto da
constituição, a matéria tomou como referência principalmente dirigentes institucionais como
sujeitos que dão informações sobre a rede interinstitucional, conforme os trechos a seguir:
“A idéia é que o Ministério aporte pelo menos o valor igual conseguido pelas
fundações. O fato de lançarmos um edital dessa dimensão será uma grande
conquista para as pesquisas em malária”, assevera Odenildo Sena, diretor-presidente
da Fapeam. (Amazonas Faz Ciência, 2008, p.41)
“Todo mundo sai ganhando, pois cada agência investe seus recursos que são
potencializados com os valores de outras institucionais”. (diretor presidente da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Pará –Fapespa).(Amazonas Faz Ciência, 2008,
p.41)
“É importante fomentar uma rede interinstitucional que potencialize os estados e as
capacidades do Estados [sic]. O Brasil já tem bons investimentos em pesquisa sobre
malária e é importante trabalhar para eliminar a doença”, ressaltou a diretora
(Secretaria de C&T do Ministério da Saúde, Suzanne Jacob Serruya).
72
Há ainda a fala legitimada de um pesquisador da área, que explica os motivos da
queda no volume de casos de malária nos últimos anos.
De acordo com Wanderli Tadei, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (Inpa), a baixa tem se dado em função do desenvolvimento de ações
integradas no combate à doença nos últimos anos. “Não é possível controlar a
malária com uma só atividade, a eficiência do combate se dá com um conjunto de
medidas como termonebulização, utilização de biolarvicidas e borrifacao intra-
domiciliar, entre outras”, diz Tadei. (Amazonas Faz Ciência, 2008, p. 42)
Dentro da análise, há configurado a explicitação do sujeito a partir da fala legitimada
do pesquisador, que explica o que a ciência está fazendo para reverter o cenário da doença no
Amazonas. Pelas explicações do próprio pesquisador, percebe-se a relação assimétrica no
efeito-leitor e no texto, a ciência apresentada como informação.
Apesar disso, o texto se configura como divulgação científica institucional, sem a
abordagem social de pessoas atingidas pela doença e o impacto e expectativas da população
em relação às pesquisas que estão em andamento e que são mostradas no texto. Há
configurado também a versão B de x, ou seja, o jornalista explicando o trabalho do
pesquisador, conforme indica o trecho:
O pesquisador explica que o mosquiteiro oferece ao homem dupla barreira contra o
Anopheles darlingi. A primeira é física, evitando o contato do homem com o
mosquito. A segunda é química, quando o vetor entra em contato com os cristais de
piretróide (não foi devidamente explicado) impregnados na rede que atingem seu
sistema nervoso, impedindo-o de atacar o homem. (grifo nosso)
Apesar de estar configurada a versão do jornalista em relação à pesquisa, o termo
próprio da pesquisa não está devidamente explicado para o grande público. Nem todos sabem
o significado de cristais de “piretróide”, que inclusive grifamos acima, ou seja, não há
dentro do aspecto da formulação, termos explicados, inerente do DDC.
Em outro trecho da matéria, há também destacado, no final da matéria, que o
pesquisador pretende fazer um sequenciamento do “genoma funcional do Anopheles darlingi”
e aponta a pretensão do estudo que é “localizar a expressão dos genes de resistência do
mosquito a certos inseticidas”, no entanto não há nenhum quadro posterior à matéria que
explique do que se trata essas terminologias.
73
A constatação leva a uma formulação discursiva não coincidente para um texto de
jornalismo científico e que exija conhecimento prévio por parte dos leitores a respeito do
assunto abordado no texto, principalmente no que se refere aos termos acima citados.
Um dos aspectos interessantes na análise desse texto é presença da influência do poder
econômico na ciência. Como fica evidente na declaração do pesquisador: “Nós caminhamos
mais rápido ou lentamente, de acordo com a disponibilidade de recursos existentes”.
(Amazonas Faz Ciência, 2008, p.42).
Nesse ponto, recorre-se à Mayor & Forti (1998) que destacam o elo entre a ciência e o
poder. Segundo eles, o governo concede dinheiro à ciência para alcançar determinadas metas,
para que realize pesquisa, sem conhecimento dos pormenores e procedimentos técnicos.
O cientista já não é independente. Ele trocou sua autonomia por uma posição
próxima ao poder e pelos meios materiais para realizar sua pesquisa. Já não é mais
um solitário; trabalha cada vez mais em grupo, é parte de uma organização. (1998,
p.56)
Com base nesses autores, percebe-se que para a produção científica há uma forte
relação e dependência econômica para realizar as pesquisas, o que fica bem representado na
fala do cientista em questão na matéria analisada.
Quanto à circulação, o texto está dentro de uma revista de divulgação científica de
ampla distribuição e para o público em geral. No entanto, há aspectos, trechos que não
coincidem com o tipo de discurso proposto pelo meio, que deve ser acessível e com
terminologias partilhadas. Assim, o texto tem o discurso que varia entre o DC e o DDC e
circula num espaço amplo, que é a revista institucional, como a proposta de informar o que a
ciência faz.
2.1.7 Análise da R3-B
A matéria descreve as atividades da pesquisa “Horta escolar – Produzindo alimentos
saudáveis” realizada no Rio Preto da Eva por alunos de uma escola estadual com o apoio da
Fapeam. Na análise do aspecto da constituição, o texto é pré-construído com objetividade das
informações e há a explicitação do sujeito, quando há a legitimação da fala de especialista na
área, além de professores envolvidos na pesquisa:
74
Desenvolvido por pesquisadores e técnicos da Coordenação de Pesquisas em
Ciências Agronômicas, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), o
Escola Verde foi criado há quatro anos no âmbito do Programa Jovem Cientista
(JCA), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
(Amazonas Faz Ciência, 2008, p.9)
De acordo com a coordenadora do Escola Verde, Bianca Galúcio Pereira,
Engenheira Agronôma e Tecnologista do Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (Inpa), os alunos estão testando as combinações para definir a
quantidade de nutrientes adequadas às necessidades das plantas.(ibidem)
Além desses trechos, ficam registradas as falas de professores envolvidos no projeto, o
que legitima a pesquisa desenvolvida:
Segundo o professor da escola, Elias Gomes da Fonseca, o projeto está gerando vários benefícios para os alunos. Um deles é a oportunidade de participar de uma
atividade extra-classe. “Antes, os alunos viviam na ociosidade e agora, passaram a
ter outra atividade, além da sala de aula”. (Amazonas Faz Ciência, 2008, p. 11)
A professora Nilde Pereira, uma das mais experientes do quadro funcional da escola,
ressalta ainda a influência positiva do projeto no desempenho escolar dos alunos
participantes, bem como no processo de socialização dos estudantes. “Sentimos uma
mudança no comportamento dos alunos e com certeza, essa mudança foi para
melhor”, ressalta a professora. (Amazonas Faz Ciência, 2008, p.11)
Essas duas falas reforçam ainda mais a presença dos sujeitos legitimados dessa
pesquisa, característico do discurso de divulgação científica.
Nesse texto, observa-se ainda a ciência como informação, já que pela textualidade, foi
verificado que a pauta foi construída (na fase da constituição) a partir do projeto apresentado.
O projeto “Escola Verde: Educação com os pés na terra”, está se tornando
referência. Criado em 2004 com a finalidade de ser um instrumento para a melhoria
da qualidade de vida da comunidade escolar por meio do ensino de práticas
agrícolas, com foco no cuidado com o meio ambiente, o Escola Verde tem como
diferencial a construção de processo educativo a partir da valorização da prática do
cultivo da terra. (Amazonas Faz Ciência, 2008, p. 10).
Esse é um dos exemplos de efeito assimétrico do texto que flui de dentro para fora, ou
seja, partiu da ciência e está sendo levado para diversos leitores, de diversos níveis. Com a
constatação da legitimidade dos sujeitos, comprovou-se também que o texto é constituído
com a versão B de x, ou seja, do jornalista sobre o trabalho de pesquisa.
A formulação do texto se converge praticamente à análise feita no nível de
constituição, visto que a textualização com paráfrases e explicações sobre o texto de forma
objetiva, apontam para a forma de DDC. Com linguagem acessível o texto não é dotado de
75
termos técnicos e a pesquisa desenvolvida pelos alunos é contextualizada de maneira
explicativa e direta, inclusive com o depoimento de alunos que participam do projeto, o que é
característico do jornalismo, que tem como um dos princípios, ouvir e envolver no texto os
atores de determinada notícia, promovendo reflexão sobre o assunto abordado.
Max Victor de Oliveira, 19, é um dos atuais bolsistas do Escola Verde. [...] Para
Max, a participação no projeto fez com que ele resgatasse valores culturais de seus antepassados. “O mais importante deles foi o prazer no lidar com a terra”, diz o
estudante, ressaltando que antes tinha uma visão um pouco preconceituosa com
relação a essa atividade. (Amazonas Faz Ciência, 2008, p.11)
Trata-se ainda de formulação como produto de trabalho imediato, típico da atividade
jornalística, já que a pesquisa está retratada em três páginas da revista e ilustrada com diversas
imagens dos estudantes em ação nas tarefas realizadas em campo.
O texto é encerrado com uma afirmativa do estudante, que destaca a satisfação em
atuar dentro do projeto de iniciação científica: “Está sendo realmente uma experiência
gratificante”, finaliza. (2008, p. 11)
Quanto à circulação, o texto analisado está contido em uma revista que é distribuída
não só entre pares, mas para um público maior, apesar de ainda não abranger o grande
público, por fatores como a tiragem, distribuição e enfoque editorial. Dentro da esfera
cronotópica, o texto está dentro de uma categoria restrita, que é o jornalismo de divulgação
científica e informando o que a ciência faz e não produz ciência.
Diante dessa análise pelas propriedades discursivas, considerando os três momentos da
discursividade, o texto tem como característica maior as marcas do DDC, já que trata a
pesquisa de maneira objetiva e não deixa transparecer termos científicos mais específicos que
não tenha explicação clara na matéria. O material conta ainda com a presença dos diversos
atores envolvidos na pesquisa, desde especialistas, professores e alunos de iniciação
científica, com destaque para os benefícios da comunidade, mediante a realização dessa
pesquisa.
76
2.2 Suplementos de Ciência e Tecnologia
Para analisar como ocorre a divulgação científica no meio jornal, foram selecionados
três exemplares do suplemento InterMais de Ciência e Tecnologia, produzido semanalmente
pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Ciência da Comunicação, Informação, Design e Artes
da Ufam, por meio do Jornal Amazonas Em Tempo.
Os textos analisados são os que tiveram destaque em capa, pelo nível de importância
editorial dentro da publicação em análise. Foram considerados os aspectos das propriedades
discursivas, segundo quadro teórico da AD, já exposto anteriormente. Para efeito de
localização, as matérias foram codificadas segundo a tabela 2, onde constam informações
como a edição, o código localizador, título da matéria e as páginas em que estão publicadas.
Tabela 2 – Suplementos do caderno Intermais analisados:
Edição Localizador Título da matéria Páginas
No 1 – Ano I
02/09/2007
J1-A Software detecta tuberculose automaticamente
(Capa)
4 e 5
No 1 – Ano 2
06/11/2008
J2-A Mudanças climáticas, conservação ambiental e
desenvolvimento sustentável do Brasil (Capa)
4 e 5
Ano 2 18/12/2008 J3-A Projeto promove a gestão integrada da
Biodiversidade no Amazonas (Capa)
4 e 5
2.2.1 Análise do J1-A
O texto, publicado em setembro de 2007, não é assinado por nenhum autor e se reporta
à divulgação de pesquisas voltadas para a mudança no método de diagnóstico da tuberculose,
por meio de um software desenvolvido pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em
Tecnologia Eletrônica e da Informação (Ceteli) da Universidade Federal do Amazonas
(UFAM).
A abertura do texto leva o leitor a uma previsão do que a pesquisa em si pode
proporcionar:
77
Em aproximadamente um ano e meio o nome da Universidade Federal do Amazonas
(Ufam), por meio do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Tecnologia
Eletrônica e da Informação (Ceteli), poderá ser citado nas revistas científicas
nacionais e internacionais como a primeira universidade a desenvolver um sistema
capaz de fazer o diagnóstico automático da tuberculose.(Intermais, 2007, p.4)
Posterior ao lide há uma contextualização de como é feito o diagnóstico da
tuberculose:
Atualmente, a detecção da tuberculose é feita por meio de uma lâmina preparada
com o escarro humano (catarro). Essa lâmina é posta em um microscópio e um
operador (laboratorista) faz a contagem do número de Mycobacterium tuberculosis
(bacilo da tuberculose). (Intermais, 2007, p.4)
Verifica-se com os trechos em negrito que, nos parágrafos iniciais deste texto, existe a
textualização da ciência para a divulgação científica, com a explicação de termos
específicos/científicos.
A explicitação do sujeito é identificada com a inclusão do discurso de pesquisadores
envolvidos no trabalho, o que indica característica de DDC (sujeito formulado). As paráfrases
na constituição textual também dão indicadores de que o texto será formulado textualmente
dentro das propriedades do DDC.
O professor doutor Cícero Ferreira Fernandes da Costa Filho, diretor do Cetelli e co-
orientador do trabalho de Juliana Ferreguete, diz que o método de reconhecimento e
contagem está desenvolvido e que a dissertação será defendida em novembro.
O objetivo da dissertação de Juliana, a ser defendida em novembro deste ano, é minimizar esses erros e aumentar a confiabilidade dos resultados. “Com um método
automático que auxilie o profissional nessa tarefa, os erros com respeito à
variabilidade intra e inter-observador serão eliminados”, garante Ferreguete.
(Intermais, 2007, p.4)
Tanto na constituição quanto na formulação desse texto, observa-se que há a relação
assimétrica, com versão B de x, ou seja, do divulgador sobre o cientista para o público, mas
que ainda deixa transparecer marcas muito próprias do discurso científico, conforme o trecho
grifado a seguir:
A tuberculose é uma doença ocasionada por um bacilo álcool-ácido resistente
(BAAR) denominado Mycobacterium tuberculosis. Esse problema de saúde
pública mundial de proporções incomensuráveis. Para se ter uma ideia da gravidade,
morrem, anualmente, no mundo interior, aproximadamente de três milhões de
pessoas vítimas da doença. (sic)
78
Na formulação dessa matéria, há a textualização jornalística sobre o tema pesquisado
dentro da academia e destaca a importância de acionar empresas a desenvolverem o
experimento científico em escala industrial. A matéria mostra ainda a importância ideológica
do capital e de recursos financeiros para o desenvolvimento da ciência.
As universidades precisam “achar” empresas interessadas em produzir os produtos
que podem ser gerados a partir das pesquisas (e das patentes). “O fato de realizarmos
uma pesquisa não significa que, de imediato, a sociedade será beneficiada com um
produto resultante dessa pesquisa, explica o diretor do Cetelli, que completa: “Por
isso precisamos constantemente de recursos financeiros para que a sociedade possa
efetivamente ser beneficiada com os resultados das nossas pesquisas”. (2007, p4)
[...] “Se tivéssemos verdadeiramente uma equipe de desenvolvimento de produtos, com profissionais contratados e não apenas com bolsistas, com muito otimismo,
poderíamos dizer que o trabalho da Juliana seria transformado em um produto em
um ano, a partir da defesa, que ocorre em novembro”. (ibidem)
Além desses exemplos, o texto ainda mostra uma característica informativa (mostra o
que a ciência faz e não faz ciência), destacando dados da Organização Mundial de Saúde
(OMS) e apresentando detalhes do método do diagnóstico:
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estimou, em 2005, que no período entre
2000 e 2020, um milhão de pessoas serão infectadas e, dessas pessoas, 200 milhões
ficarão doentes. Estimativas apresentadas no projeto de Juliana Ferreguette apontam
que, no Brasil, ocorrem anualmente 100 mil novos casos de tuberculose. (Intermais,
2007, p.4)
Como a grande maioria das doenças infecto-contagiosas, o diagnóstico e
acompanhamento dos casos de tuberculose pulmonar positiva é a baciloscopia.
Nesse método tradicional de contagem dos bacilos, o operador é um humano. Com
isso há uma imensa variação de interpretações. (ibidem)
Quanto à circulação deste material, pode ser considerado amplo, já que está em um
suplemento distribuído em um jornal de grande circulação. Atualmente não circula mais. Por
ter formulação como produto imediato (poucas páginas produzidas em curto espaço de
tempo), o texto tem um efeito de assimetria de interlocução e circula com a formulação
baseada principalmente em dois discursos: o da ciência e o jornalístico. No entanto, sobrepõe-
se, neste caso, o Discurso de Divulgação Científica, mas há marcas do discurso científico, que
79
é o primeiro de onde foram originadas as informações e ainda se mostram muito evidentes
mesmo em um novo discurso (após ser reformulado).
Observando o que diz Orlandi, “o discurso de divulgação científica não é uma soma de
discursos: ciência mais jornalismo científico (C+J=DC). Ele é uma articulação específica com
efeitos particulares [...]”. (ORLANDI, 2001, p.151). Assim, o discurso de divulgação
científica é textualização do discurso científico, é uma reformulação, com as informações
científicas ditas pelo jornalista.
2.2.2 Análise do J2-A
A matéria de capa do segundo suplemento a ser analisado, aborda essencialmente
sobre a Lei de Mudanças Climáticas, como ocorreu o processo de elaboração e os principais
objetivos e instrumentos criados dentro da Lei. Por se tratar de legislação, o discurso de
origem política é um dos mais marcantes no decorrer do texto, que não teve identificação da
autoria.
Em relação à constituição do texto, observa-se pelas marcas discursivas que não há a
presença de falas de pesquisadores, mas conta apenas com falas legitimadas de representantes
do governo estadual, tais como a então titular da Secretaria do Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável (SDS) e coordenador do Centro Estadual de Mudanças
Climáticas (Ceclima), sem considerar posicionamento de outras fontes, principalmente de
pesquisadores ou estudiosos como prevê o jornalismo científico.
Com a aparição apenas de fontes legitimadas pelo governo (discurso político), o
sujeito científico, propriamente dito, aquele que legitimaria a importância da Lei de Mudanças
Climáticas ou sobre assuntos relacionados a esse tema, não ficou explícito, ficando aparentes
os sujeitos apenas como representantes governamentais, ou seja, a matéria foi construída com
porta-vozes oficiais.
“A criação da Lei é uma iniciativa do governo do Amazonas para contribuir com a
estabilização da concentração de gases de efeito estufa nos setores floresta,
energético,industrial, de transporte, saneamento básico, construção, mineração,
pesqueiro, agrícola e agroindustrial”, declara Nádia Ferreira, secretária da SDS.
(Amazonas Faz Ciência, 200, p.4)
“O nosso estilo de vida pode estar ameaçado e o futuro comprometido se não
encontrarmos novas soluções. Por essa razão, o Ceclima multiplica esforços na promoção da utilização eficiente da energia e na aposta nas fontes de energia
80
renováveis como o sol, o vento ou a água. Nesta cartilha, focamos na mudança dos
padrões do consumo”, explica Luís Piva, coordenador do Ceclima. (ibidem)
Um aspecto interessante deste material é que o texto vem sustentado por uma
ilustração, que mostra uma criança segurando globo terrestre, destacando no texto introdutório
que o “governo do Amazonas ante as modificações efetuadas pelo ser humano no ambiente,
que provocam os efeitos nocivos da mudança global do clima, instituiu em 2007, a 1ª Lei de
Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável”. Esse
aspecto já indica que a matéria foi constituída dentro de um contexto político, constatado
pelas marcas do discurso. Assim, não houve também o duplo movimento, esperado do DDC,
ou seja, o jornalista lê em um discurso e diz em outro.
O texto não indica neutralidade no discurso, já que há um forte indicativo para o
discurso político, onde predomina a ação governamental.Tal como nas falas, que destacam
que a criação da Lei, como por exemplo: “[...] é uma iniciativa do governo do Amazonas
para contribuir para a estabilização da concentração de gases do efeito estufa [...]”.
Outro exemplo, onde constam as marcas do discurso político:
[...] é o primeiro centro governamental do Brasil especializado na articulação desse
segmento. Sua missão é a implementação da política de mudanças climáticas do
Estado. (Intermais, 2008, p.5).
Por estar em um suplemento de jornal, a descrição sobre o projeto piloto de redução de
emissões de desmatamento está no texto com a versão B de x, ou seja, do
divulgador/jornalista sobre o que está sendo feito pelos pesquisadores do Ceclima. A relação
textual também é assimétrica, ou seja, extrapares, voltado para o grande público. No texto, a
ciência é divulgada como informação, não como conhecimento, típico do DC.
Quanto à formulação, observa-se no texto que a textualização ocorreu dentro da
textualização jornalística, visto que há a descrição direta e com linguagem coloquial dos
objetivos e informações sobre a Lei de Mudanças Climáticas, Ceclima e também sobre o
Projeto Piloto de Redução de Emissões de Desmatamento, que estão ligados diretamente às
ações do governo do Estado. Logo no lide, no início do texto, o autor descreve do que se trata
o objeto principal do texto:
A Lei de Mudanças Climáticas tem por base o reconhecimento da importância da
conservação das florestas e os compromissos fundamentais do Estado com o
81
desenvolvimento sustentável da economia, do meio ambiente, da tecnologia e da
qualidade de vida das presentes e futuras gerações. (Intermais, 2008, p.4).
Mais adiante, o texto mantém as características de divulgar as ações do Ceclima no
Amazonas (ação governamental):
O Ceclima tem como principal ferramenta de trabalho a publicação “Mudanças
Climáticas, uma preocupação de todos”, que é direcionada aos professores de ensino
médio do sistema estadual de ensino. (Intermais, 2008, p.5)
O Ceclima também é o responsável pela criação e implementação do primeiro
projeto de Redução de Emissões de Desmatamento (RED) na Amazônia Brasileira.
Este projeto visa valorizar as florestas por meio dos serviços ambientais na Reserva
de Desenvolvimento Sustentável do Juma, no município de Novo Aripuanã, por
meio do desmatamento evitado. (Intermais, 2008, p.5)
A formulação como produto de trabalho imediato também é uma característica deste
texto, já que está produzido em duas páginas, com espaço restrito dentro da esfera do
jornalismo. O texto em si, não se mostra dotado simplesmente de discurso de divulgação
científica, mas é atravessado por outros não menos importantes, como o político e
institucional, já que se refere nas camadas discursivas ao governo e às instituições a que estão
atreladas a questão das mudanças climáticas.
O suplemento de oito páginas tratou em sua totalidade sobre o tema, mas a matéria de
capa, que foi analisada, não foi trabalhada de maneira mais aprofundada, com informação de
fontes e com dados que levassem os leitores a uma reflexão mais completa sobre termos que
comuns, tais como efeito estufa, mudanças climáticas e energias alternativas.
Pelo contrário, foi feita apenas a divulgação do trabalho do Ceclima, de maneira
institucional, sem citação de pesquisas e informação mais detalhada sobre o problema que
preocupa todas as esferas, não só a governamental. Na chamada da capa, a impressão que se
tem é que a matéria será mais completa com dados e inclusive, infográficos detalhando as
informações, como é previsto dentro do DDC.
A matéria foi divulgada em um suplemento de um jornal de grande circulação no
Amazonas, como o Em Tempo, por isso está dentro de uma esfera ampla de divulgação, no
entanto, o gênero disposto no texto não coincide com o que é proposto pelo meio jornal. Isso
porque a matéria apresenta uma variabilidade discursiva, o que é natural, mas, sobretudo, não
82
está disposta como texto jornalístico, não houve os contrapontos, como determina as técnicas
de jornalismo.
2.2.3 Análise do J3-A
O texto em análise traz informações gerais sobre o Projeto de Manejo Integrado da
Biodiversidade Aquática e dos Recursos Hídricos na Amazônia (AquaBio), destacando de
forma direta os seus objetivos e área de atuação do projeto. O material não segue o padrão
jornalístico de informação, com uma notícia formulada no lide, bem como não inicia o
assunto com alguma novidade ou item que atraia o leitor para o resto do texto.
Inicia com a descrição do objetivo do projeto e destaca por quem é coordenado, dando
sequência nos parágrafos subsequentes a mais detalhes sobre o projeto, tais como área de
atuação do projeto e parceiros.
O Projeto Manejo Integrado da Biodiversidade Aquática e dos Recursos Hídricos na
Amazônia (AquaBio) tem como objetivo promover ações estratégicas para a
implementação da Gestão Integrada da Biodiversidade Aquática e dos Recursos
Hídricos –Gibrah. (Intermais, 2008b, p.4)
[...] O projeto é coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, sob responsabilidade da diretoria do Programa Nacional de Conservação da
Biodiversidade da Secretaria de Biodiversidade e Florestas. [...] (ibidem)
Do ponto de vista discursivo, observando o nível de constituição desta matéria,
observa-se que o autor tentou construir o texto de forma objetiva, tal como as caracterizações
do DC e do DDC, com explicitação de um sujeito institucionalizado (representado pelo
coordenador do Aquabio), mas não de um especialista no tema sobre manejo da
biodiversidade aquática. Como mostra o trecho, com a fala do coordenador nacional do
projeto, João Paulo Viana: “O grande objetivo do AquaBio é apoiar a gestão integrada da
biodiversidade aquática e dos recursos hídricos na Amazônia”. (Intermais, 2008b, p.4).
O texto deixa alguns termos sem explicações detalhadas sobre termos importantes na
matéria, tal como “ecossistemas aquáticos”, que não fica claro para o mais simples leitor, sem
conhecimento sobre o tema, já que está publicado no meio jornal de grande circulação. Aqui o
termo deveria ser mais explicado.
83
[...] Outro ponto importante é que os ecossistemas aquáticos dos rios de águas
claras e pretas (área de atuação do AquaBio) são mais pobres em nutrientes que os
ecossistemas de águas brancas (que é o caso dos rios Solimões/Amazonas), e por
isso, os impactos das alterações ambientais e do uso dos recursos aquáticos podem
ser mais intensos. (Intermais, 2008b, p.4).
Orlandi (2001, p. 153) afirma que não se transportam sentidos de um discurso para o
outro. “O jornalista científico ocupa uma posição-sujeito específica determinada que não
resulta de mera soma, nem substituição”. Desse modo, a despeito do efeito-leitor, percebe-se
que há uma predominância mais científica do que de divulgação em todo o texto, que discorre
como apresentação de um projeto científico,sem inclusão de falas de outros sujeitos,
principalmente os legitimados, como pesquisadores e também dos atores envolvidos
diretamente no projeto, como populações indígenas, que são os mais beneficiados pelo projeto
(conforme descrito na matéria).
Ainda no quadro da constituição, observa-se que há a produção de ciência como
informação, ainda que o projeto esteja simplesmente descrito, sem gerar maior reflexão do
impacto social do mesmo sobre as populações envolvidas. Há na leitura do texto, a
prevalência da versão A de x, ou seja, o próprio projeto é descrito com os seus objetivos e
informações, conforme deve constar no trabalho original.
Não se observa uma formulação mais jornalística sobre a pesquisa trabalhada. O texto
é praticamente um grande artigo, mas com a inferência do coordenador do AquaBio entre
aspas.
Quanto à formulação do texto, conforme foi dito anteriormente, não há a presença do
sujeito formulado (pesquisador), mas apenas uma fala institucionalizada do coordenador do
projeto.
E queremos que as preocupações ambientais sejam incorporadas nas políticas
públicas para a região contribuindo assim, para a conservação e o uso sustentável
dos recursos naturais e a melhoria das condições de vida das comunidades locais.
(Intermais, 2008b, p.4)
Nesse ponto, recorremos a Orlandi (1996) que destaca que “a questão da informação é
uma questão de Estado”. Na fala desse sujeito aparente no texto, fica evidente que há uma
forte relação da ciência/pesquisa com o poder público controlado pelo Estado. Quando ele
84
destaca as palavras políticas públicas fica ainda mais fácil visualizar que o texto todo em si se
gera em torno da relação ciência/pesquisa/comunidade/Estado.
Na própria matéria, há destacado a importância do Ministério do Meio Ambiente, de
instituições como Ibama (todos ligados ao governo) para o desenvolvimento regional e gestão
da biodiversidade, como o próprio título da matéria frisa: “Projeto promove a gestão integrada
da biodiversidade no Amazonas”.
Desse modo, o AquaBio, desenvolvido pelo Estado é quem vai promover a proteção
dos recursos aquáticos da Amazônia, conforme destacado na linha do subtítulo (logo abaixo
da manchete): “Ministério do Meio Ambiente coordena e executa a política institucional de
proteção das florestas tropicais e dos recursos aquáticos da Amazônia”.
Segundo Guimarães (2001), o que se nomeia político é constitutivo da vida social e
considera necessariamente seus conflitos. Para ele, há uma posição nova para pensar as
relações da ciência com o poder e a relação da mídia com o poder.
O DDC é considerado um discurso segundo, pois advém do DC, que contém
elementos enunciativos atrelados ao Estado e com a ciência em particular. No entanto, dentro
da reflexão de Guimarães, se o DDC não estiver atrelado ao Estado, ele toma uma autonomia
que “ele não tem em relação à sociedade nem em relação à mídia. Pensar o Estado nestas
relações é também pensar as condições para considerar determinações da mídia sobre a
ciência”. (2001, p.79).
A formulação do produto em si, é resultado de um trabalho imediato, até por estar
resumido em duas páginas de jornal, ilustrado com fotos, no entanto está com formato
descritivo do projeto em si, sem características jornalísticas. Os termos não são explicados,
como ocorre normalmente em DDC.
Dentro do aspecto da circulação, o texto está disposto também no suplemento, no meio
jornal, e por isso revestido da característica da distribuição para o grande público, com efeito
assimétrico de interlocução, mas não coincidente com o conteúdo do texto, que como já foi
mostrado, não tem características de redação jornalística, mas de artigo, ainda que sem
citações.
85
Nesse sentido, o espaço é restrito na esfera cronotópica, já que está contido no meio
jornal e informa, descreve o que está sendo no âmbito de um projeto de cunho científico,
neste caso o AquaBio.
Dentro desse contexto, o material analisado apresenta em sua totalidade marcas do
discurso científico e político, mas não se configura, não coincide com a categoria de
jornalismo científico, não está revestido da materialidade textual de um texto de jornal.
Apenas há uma fala, não há lead formulado, havendo apenas a descrição do projeto de
maneira direta, como se fosse a propaganda do projeto, desenvolvido pelo Ministério do Meio
Ambiente.
Frente a essas análises e conclusões, chegou-se a algumas conclusões que atendem à
pergunta inicial: A ciência divulgada no Amazonas é determinada pelos elementos
caracterizadores do Discurso de Divulgação Científica (DDC)?”
Verificou-se que na mostra do corpus analisado há características empreendidas do
Discurso de Divulgação Científica, segundo as caracterizações de Bueno (1984), revestidas de
materialidade discursiva, com paráfrases e a busca pela objetividade e neutralidade, inerentes
a esse gênero. No entanto, percebeu-se que a maioria dos textos analisados não é meramente
constituída pelo DDC, mas é atravessada por outros discursos, muitas vezes, dominante no
texto, tal como o político e o institucional, além do científico (origem do DDC).
Dessa forma, o DDC não representa o único recorte caracterizador dos textos
compostos nos exemplares analisados neste trabalho. A partir disso, entende-se que jornalistas
ainda encontram dificuldades na reformulação de um novo discurso a partir do DC que
origina o texto jornalístico, no caso da ciência. Para tanto, parece ser necessário ainda uma
adequação linguística, conforme indicações pela própria AD e teóricos da área, tais como
Bueno, Zamboni e Oliveira, citados neste estudo.
Nesse contexto, um dos grandes desafios do jornalista/divulgador da ciência, é se
manter, antes de tudo, informado sobre as categorizações linguísticas para informar o leitor,
ouvinte ou telespectador. Ele deve estar amparado tanto na técnica quanto na ética
profissional para atender a essas expectativas.
Deve-se levar em consideração que o fazer jornalístico não é simples, pois é facultado
a ele o ofício de escolher uns entre tantos fatos e simplificá-los, tornando-os discurso e fazê-
86
los circular para o grande público. Esse é o caminho árduo a seguir. Então, se são
transformações que se buscam, cabe tanto aos jornalistas quanto cientistas/pesquisadores
tentar compreender e conhecer criticamente a comunicação e pensar nas questões que a ela
estão atreladas.
87
3 Considerações Finais
Após a análise, percebeu-se que não basta colocar um texto em um veículo de
comunicação para ser caracterizado como jornalismo científico. Há de ser constituído e
formulado discursivamente como tal. No corpus analisado, verificou-se que em sua maioria,
os textos apresentam uma variabilidade discursiva entre o discurso de ciência (de onde
originam as informações), discurso de divulgação científica (formulado pelo jornalista para a
melhor compreensão do público) e ainda o discurso institucional (até porque uma das
publicações é ligada a uma fundação pública) e discurso político (relações de poder da ciência
e Estado).
Dos nove textos analisados, três apresentaram todas as características relacionadas ao
DDC, mas no restante houve uma variação discursiva passando por outras formulações não
coincidentes com o percurso do discurso do jornalismo científico, conforme categorizações de
Bueno e a AD.
Isso também pode ser explicado porque o DC não é neutro, visto que é impregnado
pela visão de mundo de quem o elabora. Isso, no DDC, é perceptível, apesar do mito da
imparcialidade dos jornalistas. Isso responde à pergunta de pesquisa: A ciência divulgada no
Amazonas é determinada pelos elementos caracterizadores do discurso de divulgação
científica?”
Assim a hipótese inicial deste trabalho fica constatada. As publicações ditas
especializadas em Ciência têm maneiras específicas de construir seus textos, mas ainda há a
dificuldade na transição do DC para o DDC, com o uso de termos e formatos utilizados no
discurso de divulgação científica no jornal ou revista.
Confirma ainda a outra hipótese de que o DDC funda um lugar para a ciência,
ampliando sua importância social, e a divulgação científica, por sua textualização, populariza
a ciência, mas nem tudo o que trata a respeito de ciência e está escrito em jornais e revistas
pode ser considerado como jornalismo científico ou ciência.
Em alguns textos analisados apenas uma fonte é destacada no texto, sem contrapontos
e sem promover reflexão dos benefícios ou desvantagens da referida pesquisa, o que torna o
88
texto sem caráter coincidente dentro da esfera cronotrópica textual (jornalismo), ainda que
tenham sido feitas inserções com o aparecimento do sujeito (pesquisador) por meio de fala
ilustrada com aspas.
Assim, as incompreensões entre quem faz ciência e quem a divulga ainda são
marcantes, já que se trata de dois processos de produção bem distintos, um voltado para a
ciência e tecnologia e o outro para o jornalismo em si, cada um com suas peculiaridades.
No entanto, essas arestas podem ser minimizadas quando há uma busca pelo
entendimento de ambos os papéis na sociedade, o da produção e o da popularização do
conhecimento. O desafio é grande, pois levar temas complexos sobre feitos na ciência e
inovação tecnológica para o cotidiano das pessoas não consiste em tarefa fácil.
Com a análise do corpus proposto neste trabalho foi possível verificar, então, que não
há um discurso determinante, mas há uma variabilidade marcante nos discursos que se
revezam entre o discurso científico propriamente dito, o DDC e o discurso político e
institucional.
Para contornar essa constatação que é, de certa forma, uma tendência na Divulgação
Científica local, visto que fizemos uma análise de um veículo institucional (revista) e outro
midiático (suplemento de jornal), recomenda-se tanto para jornalistas/divulgadores quanto
para cientistas/pesquisadores que sejam observados os aspectos e características inerentes a
cada tipo de discurso, respeitando desde as metalinguagens até o público receptor das
mensagens.
É como afirma Bueno (2009b): “Nem tudo que fala sobre ciência e está escrito em
jornais ou revistas é jornalismo científico”.
Diante disso, o trabalho propõe estratégias para jornalistas e pesquisadores para que
haja uma maior interação entre o DC e o DDC, com o objetivo de popularizar a ciência para
os diversos públicos.
89
3.1 DDC: Diretrizes para uma prática jornalística
Ao desenvolver esta análise do discurso e verificar o funcionamento do DC e do DDC,
busca-se neste trabalho apontar algumas estratégias para os atores envolvidos no processo da
divulgação científica, sejam jornalistas/divulgadores, sejam pesquisadores.
É sabido que a informação qualificada é peça fundamental no jogo de poder entre os
vários campos de produção do conhecimento, já que a relação da ciência e política passa ser
mediada fortemente pelo campo midiático.
Neste sentido, mais do que informar a mídia por meio dos seus diversos veículos
(impresso, eletrônico, digital, etc.) a DC assume o intercâmbio de interação entre os atores e
as instituições sociais. Assim, a difusão científica não é mais uma ferramenta complementar
na produção da ciência e tecnologia, não respeitada por cientistas/pesquisadores, mas passa a
ser fundamental para o ciclo da pesquisa estar concluído: chegar ao povo, ser compreendida e
ter o funcionamento coincidente.
É como aponta Kreinz (2009,p.24): “não há muitos trabalhos que discutem a
divulgação científica pela sua função [...]”, mas mesmo assim, na visão da autora, “é preciso
elucidar aspectos da pesquisa, e divulgar ao que se chegou. Nem que seja para discutir”.
Kreinz nos ajuda nessa reflexão ao destacar o prêmio Nobel de Química, Ilya
Prigogine, que questiona o conceito de uma ciência portadora de certezas definitivas,
discutindo o fim dos metarrelatos da ciência e quebrando o conceito de um discurso científico
acabado, com “evidência absoluta” e única. Daí a necessidade, de elucidar sempre os aspectos
da pesquisa e divulgar ao que se chegou. Esse é o papel final do texto de divulgação
científica, formulado com o DDC.
A seguir, destacamos de forma preliminar, alguns pontos importantes para a
construção de um enunciador cientista (mediador do saber e detentor de voz de autoridade em
seu campo de atuação).
3.1.1 Quando a ciência vira notícia
Vários são os conceitos sobre notícia e o que representa o valor-notícia, mas para
quem lida com a divulgação científica, tanto pesquisadores quanto jornalistas/divulgadores há
um ponto de vista em comum bastante forte: ciência é notícia. É assim que pesquisadores pós-
modernos e jornalistas dividem o espaço da disseminação científica traçada por conflitos e
90
tréguas, normalmente marcados no instante da definição do que é ou não notícia, do que
interessa ou não ao grande público.
Antes de tudo, para se configurar como notícia, um determinado acontecimento deve
estar dentro dos critérios de noticiabilidade, ou seja, a potencialidade de produção de
resultados e novos fatos pelos meios de comunicação de massa e seus profissionais, que
então, é transformado em notícia.
Ela é a matéria-prima do jornalismo e tem alguns aspectos que influenciam na
qualidade dela, tais como: a novidade/ineditismo (deve conter informações novas), relevância
(deve ser significativa para o público, sem envolver acontecimentos banais) e proximidade
(fatos relacionados com o cotidiano das pessoas, aproximando-as dos fatos).
Nesse sentido para se tornar notícia, a pesquisa científica ou assunto relacionado pode
estar ligado basicamente a alguns critérios:
1) Imprevisibilidade: fora do contexto do que estava programado. Um exemplo disso
pode estar relacionado a notícias tais como: abertura de editais temáticos de forma
emergencial ou adiamento de prazos para participação de eventos científicos e outros.
2) Ineditismo: quando resultados de uma pesquisa ou um projeto nunca foi divulgado.
Ex: Projeto sobre voadeira solar no Amazonas.
3) Abrangência: Tema com amplitude social e de grande importância para a sociedade
como um todo. Ex: Novo tratamento da leishmaniose é indolor./ Vacina contra malária
a um passo de ser descoberta.
4) Curiosidade: Ser um tema relevante e interessante para o público em geral, visto que a
notícia está no curioso, não no comum.
5) Eventos: Geralmente a área de Ciência, Tecnologia e Inovação tem uma grande
abertura para divulgação de eventos científicos, com prazos para inscrições, etc. Ex.:
Prorrogação do 2º prazo para inscrições da SBPC 2010.
6) Inovação – Pesquisas desenvolvidas no contexto de aperfeiçoamento tecnológico com
impacto social, tais como: Telhado ecológico de pet tem qualidade comprovada e
baixo custo./ Mouse ocular permite deficientes físicos utilizarem computador.
Certamente há outros critérios para noticiar ciência, mas neste trabalho de dissertação
pontuamos apenas alguns para um posterior estudo mais aprofundado. A performatividade das
91
notícias em ciência, inclusive, é alvo de pesquisa no Programa de Ciências da Comunicação
da Universidade Federal do Amazonas.5
As notícias são a matéria-prima do jornalismo, pois só após serem divulgadas é que
ocorre a ampla repercussão. Não há, no entanto, uma definição que reproduza toda a
complexidade do critério para um fato se tornar notícia, vários autores buscaram definir o
termo de uma forma geral.
Aqui, recorre-se a Noblat (2003), que define da seguinte forma: “notícia é todo fato
relevante que desperte interesse público”, conforme ensinam os manuais de jornalismo.
Segundo ele, fora dos manuais, “notícia é tudo que os jornalistas escolhem para oferecer ao
público”.
Na visão de Erbolato (1991), as notícias variam no tempo, pois o que ontem foi
importante, hoje poderá não ser. Um exemplo utilizado pelo autor é de que quando o primeiro
satélite artificial foi lançado ao espaço, a matéria mereceu manchete na primeira página dos
jornais e hoje qualquer lançamento semelhante, sequer é comentado.
Na ciência, um caso parecido é o da discussão dos clones, no caso da ovelha Dolly.
Todos estamparam nos jornais e revistas com destaque para este feito. Hoje, clone é um termo
comum até para o mais simples cidadão. Agora, o tema da vez envolve pesquisas com células-
tronco e a polêmica com a religião.
3.1.2 Comunicador: produzindo notícia sobre ciência
A imparcialidade e objetividade da imprensa e do jornalista não se sustentam, segundo
Rossi (1986, p.10), porque entre o fato e a versão que é publicada em qualquer veículo de
comunicação há a mediação de vários jornalistas e também a alta direção da empresa,assim,
todos são envolvidos na preparação do produto notícia.
O primeiro mediador é o jornalista que faz a entrevista e escreve a matéria. Ele é quem
deve verificar, investigar e elucidar todas as dúvidas no momento da constituição e da
formulação do texto jornalístico que se origina no Discurso Científico e será reformulado para
o Discurso de Divulgação Científica. O primeiro mediador é conhecido pelo público,
5 Luís Mansuêto Filho investiga o processo de noticibialidade por meio da Análise do Discurso, perfomatividade
e agenda-setting (agendamento da pauta) .
92
geralmente, porque assina a matéria, já o editor e os outros que intervieram de alguma forma
no texto não são explicitados no texto jornalístico.
A questão da neutralidade e objetividade jornalística é muito complexa para ser
abordada nesse tópico, mas é fato que qualquer jornalista carrega consigo toda uma formação
cultural, política e ideológica. “É realmente inviável exigir dos jornalistas que deixem em casa
todos esses condicionamentos[...]”. (ROSSI, op. cit).
Ao desenvolver qualquer pauta jornalística, o profissional tem o preceito básico de
ouvir as partes envolvidas no tema. Da mesma forma, o divulgador de ciência deve não só
buscar ouvir o especialista/pesquisador da área, mas também integrar alguém da sociedade
que esteja ligado de alguma forma ao estudo. Como destaca Erbolato:
Nenhum jornalista duvida que interpretar objetivamente é mais difícil do que
informar, já que, no processo de pesquisa, de investigação e de análise dos
acontecimentos, os fatores subjetivos têm mais oportunidade de se manifestar do que
simplesmente são descritos os fatos. Contudo, a simples informação, às vezes,
também é di-fícil de ser redigida, dentro de rigorosa objetividade (ERBOLATO,
1991, p. 35).
Um exemplo: Uma pesquisa no Amazonas está sendo desenvolvida para implante de
células-tronco para o tratamento de cardiopatia isquêmica. Além de enunciar a pesquisa, com
a explicação dos termos especializados e técnicos de maneira clara para o mais simples leitor,
é interessante ouvir algum paciente envolvido no processo da pesquisa.
Isso levará ao leitor refletir na questão das ciências aplicáveis no dia-a-dia,
ultrapassando as fronteiras da academia. Esse aspecto não se aplica apenas às ditas ciências
biológicas, que tem alta performatividade na agenda setting da mídia, mas também às ciências
humanas e sociais, que possuem estudos de grande interesse da sociedade.
Além disso, é importante o divulgador escolher um assunto e delimitá-lo (tal como no
discurso científico), porque se for falar sobre Amazônia, por exemplo, há uma imensidade de
pautas atreladas a esse assunto, em todos os campos de investigação. Dessa forma, escrever
um texto de divulgação não se restringe a resumir em palavras/termos simples e coloquiais os
aspectos de uma pesquisa (desenvolvida por anos). Ele deve se deter a um tema, desenvolvido
e circunscrito da melhor maneira possível para captar a atenção do leitor, que deve ser
conquistada desde o início do texto (lide).
É um desafio falar de ciência e conquistar a atenção e interesse de leitura, ainda mais
com tantos fatos ocorrendo à velocidade da internet. Então, como conseguir isso? É preciso
93
associar o tema tratado à realidade das pessoas. Se não tiver, pode se iniciar um texto
desconstruindo algum pensamento já formado, surpreendendo o público. Acima de tudo é
preciso respeitar o tema como foi constituído no DC ao reformular para uma nova ordem de
discurso, neste caso, o DDC.
Os princípios estilísticos complementam a eficácia da Divulgação Científica. Para
tanto, é necessário que jornalistas/mediadores do DC utilizem-se da voz ativa, visto que nos
escritos técnicos e científicos, os pesquisadores/cientistas utilizam de termos frequentemente
na voz passiva.
Tais como: “A avaliação de fronteiras e desmatamentos na Amazônia de difícil acesso
está sendo feita por meio de uma nova tecnologia brasileira de sensoriamento remoto”.
Fica bem melhor: “Uma nova tecnologia brasileira de sensoriamento remoto ajuda a
avaliar fronteiras e desmatamentos na Amazônia de difícil acesso”.
O uso de parágrafos curtos e frases sempre diretas também facilita e atrai a leitura,
tanto em jornais, revistas quanto no webjornalismo científico. É interessante recorrer também
ao auxílio de infográficos e boxes explicativos que localizam mais detalhadamente o leitor
sobre o assunto abordado.
O uso de sinônimos é um recurso muito positivo para evitar repetições no texto, porém
deve ser usado com cautela no jornalismo especializado, por isso deve se constatar antes de
fechar o texto definitivo se os termos aplicados estão conforme as informações determinadas
pela fonte (pesquisador/cientista).
Sobre as citações é também básico ter um cuidado dobrado com o que está sendo
divulgado. As citações/paráfrases são recursos próprios do discurso jornalístico e também do
científico. Sendo que o primeiro utiliza sempre a fala de seu entrevistado/fonte para legitimar
o que está sendo dito/enunciado no texto e o segundo, parafraseia autores relacionados a seus
estudos.
No discurso jornalístico são utilizados com frequência as opiniões, ideias e
contrapontos de especialistas e indivíduos envolvidos no tema abordado na matéria,
conferindo ao texto maior credibilidade e confiança ao que está sendo exposto. Assim, não
são os jornalistas que afirmam o dito, mas as fontes explícitas com as aspas na matéria. Por
meio delas, os leitores ficam em contato direto com as fontes.
Nas aspas, no entanto, não devem ser expressas obviedades ou colocações salutares,
mas devem complementar e constatar alguma informação significativa.
94
Existem outras diretrizes que podem e devem ser consideradas nessa abordagem sobre
o jornalista/divulgador em relação a ciência, mas este trabalho deverá ser produto dessa
pesquisa a ser continuado mais a frente.
3.1.3 Cientista: agente da divulgação científica
Difundir suas ideias entre os pares já é uma prática que ocorre há bastante tempo entre
os pesquisadores, no âmbito acadêmico. Retomando um pouco de história, há relatos que a
partir do século XVII, houve a criação de uma linguagem e um modo de pensar próprios da
ciência moderna, que estava fora da linguagem coloquial e do senso comum das pessoas
leigas.
A produção desse discurso próprio da ciência está, desse modo, atrelado a própria
produção do conhecimento científico e tecnológico. No entanto, nos séculos XIX e XX essa
difusão passou a ocorrer também por meio do ensino formal e dos museus, formando
pesquisadores e divulgando o conhecimento científico e tecnológico.
No processo de produção da notícia/matéria jornalística científica, o
pesquisador/cientista é a principal fonte de informação, é quem municia o jornalista de todos
os dados básicos a uma publicação.
Os cientistas devem contribuir com a divulgação verificando o principal resultado que
pode ser divulgado para o grande público. Ao contrário da produção científica, o texto
jornalístico tem produção imediata, em curto prazo e tem espaço reduzido, delimitado pelo
espaço no jornal, revista, site, televisão, rádio, etc.
Chama atenção de jornalistas dados consolidados, pesquisas (em andamento ou
inéditas), inovações tecnológicas, opiniões especializadas, informações inéditas sobre estudos
nas mais diversas áreas de atuação. Tudo depende do recorte que é feito pelo pesquisador,
pois pesquisas/trabalhos científicos sem informações bem definidas e claras não atraem os
profissionais de comunicação e não despertam interesse para publicações nas diversas mídias.
As informações corretas e devidamente confirmadas devem ser premissa fundamental
dos cientistas ao concederem entrevistas, pois também (assim como os jornalistas) estão
passíveis de erros.
Tuffani (2009, p.90) cita o caso do jornalista Cássio Leite Vieira, na revista Ciência
Hoje, em novembro de 2002, que durante a Conferência Mundial de Jornalistas de Ciência
mostrou casos de erros cometidos em textos especializados por cientistas como Albert
95
Einstein e vários outros pesquisadores de renome. No artigo ele afirma: “Porém, só os
jornalistas erram? Sabemos que não. Para mim, isso ficou mais evidente depois que comecei a
trabalhar como editor de textos de ciências exatas para a revista Ciência Hoje”. (op.cit.)
Vieira destaca ainda que “caso o texto fosse publicado em seu formato original, ele
também traria vários erros – erros são bem comuns nos artigos escritos por cientistas, sendo
que a exceção é mesmo o texto em que os consultores não pedem para que informações ou
trechos sejam modificados pela edição”. (p.91).
A baixa qualidade dos textos e resumos submetidos para publicação são considerados
pelo editor citado acima como minoria, mas existem.
Para evitar esse tipo de ocorrência, a submissão de textos finais à fonte para a aprovação era
uma prática bastante utilizada para suprimir os erros.
Segundo Tuffani, esse recurso foi sistematicamente usado em algumas publicações,
tais como a Superinteressante em seus primórdios, nos anos 80. “A aceitação desse recurso
implica dar às fontes das reportagens um status diferenciado daquelas das outras áreas do
jornalismo, como política, economia e polícia, por exemplo”.
Esse ponto é considerado polêmico pelos profissionais de comunicação, pois se fosse
em outra editoria, eles não poderiam depender das fontes por uma razão simples: o prazo final
para a publicação (geralmente um curto período).
Neste caso, a relação entre jornalistas/divulgadores e cientistas deve ser de confiança e
responsabilidade com a informação para evitar erros grotescos, como o caso relatado por
Bonalume Neto (2009, p.97):
Anos atrás, a revista Globo Ciência, que já não tem mais esse nome, hoje chama-se
Galileu, publicou uma matéria com a cura da AIDS. Um brasileiro tinha descoberto
a cura da AIDS, o composto XYZ. Ora isso é de uma irresponsabilidade inacreditável [...]
Esse tipo de equívoco deve ser evitado antes mesmo de ser publicado, por isso na
origem da informação devem-se aparar todas as dúvidas por ambas as partes.O caminho ainda
é extenso, mas é apenas o começo para um diálogo possível entre jornalistas e cientistas.
Quem vai ganhar com isso principalmente é o público em geral que terá informações sobre
ciência com qualidade e garantia de credibilidade.
96
3.1.4 Conclusão
Diante do exposto nos capítulos anteriores, concluímos que as incompreensões entre
quem faz ciência e quem a divulga ainda são marcantes, já que se trata de dois processos de
produção bem distintos, um voltado para a ciência e tecnologia e o outro para o jornalismo em
si, cada um com suas peculiaridades.
No entanto, essas arestas podem ser minimizadas quando há uma busca pelo
entendimento de ambos os papeis na sociedade, o da produção e o da democratização do
conhecimento. O desafio é grande, pois levar temas complexos sobre feitos na ciência e
inovação tecnológica para o cotidiano das pessoas não consiste em tarefa fácil.
Apesar disso, sabe-se que a comunicação, tal como nenhuma outra área, não é absoluta
na complexidade da estruturação da sociedade contemporânea, portanto é preciso mais do que
retórica, abrir as práticas teóricas para outros campos de estudo. Nesse sentido, a interlocução
crítica entre áreas permite outros olhares e por isso, permite o levantamento de outras
questões tocadas neste trabalho, tal como a textualidade da produção científica e da produção
jornalística.
Assim, na conclusão deste trabalho, concordamos com Morin (2002) quando ele diz
que não há interrupção no processo de conhecimento. “Não só nos restam muitas trevas na
compreensão humana, como também o mistério se aprofunda na medida em que avançamos
no conhecimento” (2002, p.29).
A pretensão com esta pesquisa é de alçar outros horizontes e prosseguir pensando a
comunicação e a linguagem por suas diversas formas. É o desafio de quem faz ciência.
97
Referências
AUTHIER-REVUZ, Jaqueline. Palavras incertas: as não-coincidências do dizer. Campinas,
São Paulo: Editora da Unicamp, 1998.
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos Ideológicos de Estado. 2.ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985.
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. Problemas fundamentais do
método sociológico na ciência da linguagem. Trad. de Michel Lahud. São Paulo: Hucitec,
1988. In: BACCEGA, Maria Aparecida. Palavra e Discurso: História e Literatura. 2 ed. São
Paulo: Ática, 2007.
BACCEGA, Maria Aparecida. Palavra e Discurso: História e Literatura. 2.ed. São Paulo:
Ática, 2007.
BACHELARD, Gaston. O racionalismo aplicado. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.
BAHIA, Juarez. Jornal, história e técnica: as técnicas do jornalismo. Vol 2, 4.ed. São Paulo:
Ática, 1990.
BARROS FILHO, Clóvis de. Ética na comunicação: da informação ao receptor. Colab.
Pedro Lozano Bartolozzi. São Paulo: Moderna, 2001.
BENETTI, Márcia; LAGO, Cláudia. Metodologia de pesquisa em jornalismo. 2 ed.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo
científico. Trad. Denice B. Catani. São Paulo: Editora UNESP, 2004.
BONALUME NETO, Ricardo. Precisão e bom senso na construção da notícia. In:
PAVAN, Crodowaldo. FILHO, Ciro Marcondes; KREIZ, Gloria (orgs). Divulgação
científica: olhares. São Paulo: NJR-ECA/USP, 2009.
BUENO, Wilson. Jornalismo científico no Brasil: os compromissos de uma prática
dependente. São Paulo: USP/ECA, 1984 (tese de doutorado).
________. Jornalismo científico e democratização do conhecimento. Portal do Jornalismo
Científico. São Paulo, [2009a]. Disponível em: <http://www.jornalismocientifico.com.br/
/jornalismocientifico/busca_site.htm.> Acesso em 03 de fev. de 2009.
98
_________. Jornalismo Científico. Portal do Jornalismo Científico. São Paulo, [2009b].
Disponível em: <http://www.jornalismocientifico.com.br/jornalismocientifico/
conceitos/jornalismo cientifico.php>. Acesso em 05 de mar.de 2009.
________. Jornalismo Científico. Conceitos. Portal do Jornalismo Científico. Conceitos.
Disponível em http://www.jornalismocientifico.com.br/jornalismocientifico/conceitos/
jornalismocientifico.php. Acesso em março de 2010.
BURKE, Peter. Uma história social do conhecimento: de Gutenberg a Diderot. Trad.: Plínio
Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003.
BURKETT, Warren. Jornalismo científico: como escrever sobre ciência, medicina e alta
tecnologia para os meios de comunicação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990.
CALDAS, Graça. “Comunicação, educação e cidadania:o papel do jornalismo científico”.
2003. In: GUIMARÃES, Eduardo (org.). Produção e circulação do conhecimento: política,
ciência e divulgação. v.2. Campinas, SP: Pontes Editores, 2003.
DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.
ERBOLATO, Mário. Técnicas de codificação em jornalismo: redação, captação e edição no
jornal diário. 5. ed. São Paulo: Ática, 1991.
FOUCAULT, Michel.. Arqueologia do saber. Trad. L.F. Baeta Neves. Petropólis: Vozes,
1971a.
___________. A ordem do discurso. Trad. Sírio Possenti, Paris, Callimard, 1971b.
GOODWIN, H. Eugene. Procura-se ética no jornalismo. Rio de Janeiro: Nórdica, 1993.
GUIMARÃES, Eduardo. A ciência entre as políticas científicas e a mídia.2001.In: Produção
e circulação do conhecimento: Estado, mídia e sociedade. v.1. Campinas, SP: Pontes
Editores. 2001.
GUIMARÃES, Eduardo (org.). Produção e Circulação do conhecimento: Política, Ciência,
Divulgação. v.2. Campinas, SP: Pontes Editores, 2003.
99
KREINZ, Gloria. Divulgação Científica: entre temas, prática e textos. In: PAVAN,
Crodowaldo. FILHO, Ciro Marcondes; KREINZ, Gloria (orgs). Divulgação Científica:
Olhares. São Paulo: NJR-ECA/USP, 2009.
LYOTARD, Jean-François. O pós-moderno. Tradução: Ricardo Correia Barbosa. 4. ed. Rio
de Janeiro: José Olympio, 1993.
MACHADO, Márcia Benetti. JACKS, Nilda. O discurso jornalístico. Brasília: Compós,
2001 - ufrgs.br Disponível em: <www.ufrgs.br/gtjornalismocompos/doc2001/
machado_jacks2001.rtf.> Acesso em 02 de fev. de 2009.
MAYOR, Frederico. FORTI, Augusto. Ciência e Poder. São Paulo: Papirus, 1998.
MALAVOY, Sophie. Guia prático de divulgação científica. Trad. Bernardo Esteves. Rio de
Janeiro: Casa de Oswaldo Cruz, 2005.
MARCONDES FILHO, Ciro. O capital da notícia: jornalismo como produto social de
segunda natureza. 2. ed. São Paulo, SP: Ática, 1989.
MORETZSOHN, Sylvia. Jornalismo em tempo real: o fetiche da velocidade. Rio de
Janeiro: Revan, 2002.
MORIN, Edgar. O método 5: a humanidade da humanidade. Porto Alegre, RS: Sulina, 2002.
NOBLAT, Ricardo. A arte de fazer um jornal diário. São Paulo: Contexto, 2003. Coleção
Comunicação.
OLIVEIRA, Fabíola de. Jornalismo científico. São Paulo: Contexto, 2002.
ORLANDI, Eni Puccinelli. Discurso e texto: formação e circulação dos sentidos. Campinas,
SP: Pontes, 2001.
______. Discurso e texto: formulação e circulação dos sentidos. 2a ed.Campinas, SP: Pontes,
2005.
______. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 5 ed., 2003.
______.Autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. São Paulo, SP: Pontes, 4 ed., 2004.
100
______. A linguagem e seu funcionamento. São Paulo: Brasiliense, 1984.
PÊCHEUX, Michel. Dos contextos epistemológicos da Análise de Discurso. Trad. Eni P.
Orlandi. In: Escritos, nº 4. Campinas/SP: Unicamp/Labeurb, 1999.
______. Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. 2.ed. Campinas: Unicamp,
1995.
______. &FUCHS, C. A propósito da análise automática do discurso: atualização e
perspectivas. In: GADET, F. & HAK, T. Por uma análise automática do discurso: uma
introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas,SP: Editora da Unicamp, 1990.
PONTE, Cristina. Para entender as notícias. Linhas de análise do discurso jornalístico.
Florianopólis: Insular, 2005.
Portal da Agência Fapesp. PD em biologia molecular com Bolsa da FAPESP. Disponível
em: http://www.agencia.fapesp.br/materia/11924/noticias/pd-em-biologia-molecular-com-
bolsa-da-fapesp.htm. Acesso em 30/03/2010.
ROSSI, Clóvis. O que é jornalismo. 7 ed. São Paulo, Brasiliense, 1986.
SOUZA, Sérgio Augusto Freire de. Conhecendo a análise do discurso: linguagem,
sociedade e ideologia. Manaus: Editora Valer, 2006.
Site do CNPq. Prêmio Almirante Álvaro Neto já tem um ganhador. acesso em 26 de mar
de 2010, 18h02 - http://www.cnpq.br/saladeimprensa/noticias/2010/0326.htm.
SCHWARTZMAN, Simon. A pesquisa científica e o interesse público. Revista Brasileira
de Inovação, Vol.1, no 2, 2002. Disponível em: http://www.ige.unicamp.br/ojs/index.php/rbi/
article/viewFile/248/162. Acesso em 1/04/2010.
TRAQUINA, Nelson. O estudo do jornalismo no século XX. São Leopoldo, RS: Unisinos,
2001.
TUFFANI, Maurício. Armadilhas na busca do rigor do jornalismo científico. In: PAVAN,
Crodowaldo. FILHO, Ciro Marcondes; KREINZ, Gloria (orgs). Divulgação Científica:
Olhares. São Paulo: NJR-ECA/USP, 2009.
101
ZAMBONI, L. M. S. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica: subjetividade e
heterogeneidade no discurso da divulgação científica. Campinas: Editora Unicamp, 2001.
103
Anexo 2 – Revista Amazonas Ciência – Ano I – no 1 – Agosto/2005 R1-A - Matéria de Capa: Inclusão Social : Iniciação Científica (Págs. 22 a 24)
104
Anexo 3 – Revista Amazonas Ciência – Ano I – no 1 – Agosto/2005 R1-B – Conhecimento Tradicional: Indígenas dão o tom da pesquisa – (Páginas 08 - 101)
105
Anexo 4 – Revista Amazonas Ciência – Ano I – no 1 – Agosto/2005 R1-B – Conhecimento Tradicional: Indígenas dão o tom da pesquisa – (Páginas 10 a 11)
107
Anexo 6 – R2-A Matéria de capa da Revista Amazonas Ciência – Ano 3 – no 7 – Dez/ 2007 Matéria: “Mudanças Climáticas Globais”
108
Anexo 7 – R2-A Matéria de capa - da Revista Amazonas Ciência – Ano 3 – no 7 – Dez/ 2007 Matéria: “Mudanças Climáticas Globais” - p. 26 - 27
109
Anexo 8 – R2-A Matéria de capa - da Revista Amazonas Ciência – Ano 3 – no 7 – Dez/ 2007 Matéria: “Mudanças Climáticas Globais” - p.30-31
110
Anexo 9 – R2-A Matéria de capa - da Revista Amazonas Ciência – Ano 3 – no 7 – Dez/ 2007 Matéria: “Mudanças Climáticas Globais” - p.32-33
114
Anexo 13 – R3-A - Matéria de capa: “Rede de pesquisa vai ampliar conhecimento sobre malária – Out/2008 - p.40-41
115
Anexo 14 – R3-A - Matéria de capa: “Rede de pesquisa vai ampliar conhecimento sobre malária – Out/2008 - p.42
118
Anexo 17– J1-A - Capa do Suplemento Intermais (Amazonas Em Tempo) – Ano 1 – no 1 – 2 de setembro de 2007
119
Anexo 18 – J1-A - Matéria de Capa do Suplemento Intermais (Amazonas Em Tempo) "Software detecta tuberculose automaticamente" – Ano 1 – n
o 1 – 2 de setembro de 2007
120
Anexo 19 – J2 A - Anexo 10 – J3-A - Capa do Suplemento Intermais (Amazonas Em Tempo) – Ano 1 – n
o 1 – 2 de setembro de 2007 -
121
Anexo 20 – J2 -A - Capa do Suplemento Intermais (Amazonas Em Tempo) – Ano 1 – no
1 – 2 de setembro de 2007 - Matéria: "Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Brasil" - 6/9/2008
122
Anexo 21 – J3-A - Capa do Suplemento Intermais (Amazonas Em Tempo) – Ano 2 - 18/12/2009 - Aquabio: Projeto de manejo integrado de biodiversidade aquática