a teoria da desconsideraÇÃo da pessoa jurÍdica e...

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Rua José Dias Vieira, 46, Rio Branco. Belo Horizonte-MG. Telefone Geral: (31) 3408-2350 / Central do Aluno: (31) 3408-2382 / Fax: (31) 3408-2391 1 A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA E A SUA IMPORTÂNCIA PARA O REFORÇO AO INSTITUTO DA PESSOA JURÍDICA Gustavo Gomes Coelho Camilla Munich da Silva RESUMO: A relevância deste artigo esta em conhecer de forma mais ampla a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica, pois é um tema pouco abordado atualmente e de grande importância para áreas de Civil, Empresarial, Processual Civil e Constitucional, permitindo que o leitor tenha uma visão global da matéria e possa debruçar-se sobre a doutrina da Disregard (Desconsideração) e encontrar elementos para a solução e compreensão de problemas do dia-a-dia forense, nos termos da legislação vigente. Com o objetivo de trazer um panorama bem claro do que venha a ser “Desconsideração da Pessoa Jurídica,” colocando em pauta todas as suas peculiaridades como instituto no ordenamento jurídico brasileiro. PALAVRAS-CHAVE: Desconsideração; Pessoa Jurídica; Personalidade; Fraude; Abuso de Direito; Sociedade Anônima, Sociedade Limitada; Sócios; Patrimônio. I- INTRODUÇÃO O direito surge e se inova de acordo com a evolução da sociedade, que dele depende para uma convivência harmônica, com o fim do direito de cada um, limitado ao começo do direito de outrem. Antes do Código Civil de 2002, toda a matéria referente ao direito comercial era disciplina pelo Código Comercial de 1850, bem como, através de leis extravagantes. Ocorre que, inovando o ordenamento jurídico até então existente, foi

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Rua José Dias Vieira, 46, Rio Branco. Belo Horizonte-MG. Telefone Geral: (31) 3408-2350 / Central do Aluno: (31) 3408-2382 / Fax: (31) 3408-2391

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A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA E A SUA

IMPORTÂNCIA PARA O REFORÇO AO INSTITUTO DA PESSOA JURÍDICA

Gustavo Gomes Coelho

Camilla Munich da Silva

RESUMO: A relevância deste artigo esta em conhecer de forma mais ampla a Teoria da

Desconsideração da Personalidade Jurídica, pois é um tema pouco abordado

atualmente e de grande importância para áreas de Civil, Empresarial, Processual Civil e

Constitucional, permitindo que o leitor tenha uma visão global da matéria e possa

debruçar-se sobre a doutrina da Disregard (Desconsideração) e encontrar elementos

para a solução e compreensão de problemas do dia-a-dia forense, nos termos da

legislação vigente. Com o objetivo de trazer um panorama bem claro do que venha a

ser “Desconsideração da Pessoa Jurídica,” colocando em pauta todas as suas

peculiaridades como instituto no ordenamento jurídico brasileiro.

PALAVRAS-CHAVE: Desconsideração; Pessoa Jurídica; Personalidade; Fraude;

Abuso de Direito; Sociedade Anônima, Sociedade Limitada; Sócios; Patrimônio.

I- INTRODUÇÃO

O direito surge e se inova de acordo com a evolução da sociedade, que dele

depende para uma convivência harmônica, com o fim do direito de cada um, limitado ao

começo do direito de outrem.

Antes do Código Civil de 2002, toda a matéria referente ao direito comercial

era disciplina pelo Código Comercial de 1850, bem como, através de leis

extravagantes. Ocorre que, inovando o ordenamento jurídico até então existente, foi

Rua José Dias Vieira, 46, Rio Branco. Belo Horizonte-MG. Telefone Geral: (31) 3408-2350 / Central do Aluno: (31) 3408-2382 / Fax: (31) 3408-2391

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inserido no Código Civil de 2002, dispositivos relativos ao direito comercial, extinguindo

parte do Código Comercial de 1850.

Encontra-se, também, disciplinado pelo do Código Civil de 2002, mais

precisamente em seu artigo 50 - sem artigo corresponde no Código Civil de 1916 - a

questão da possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica. Tal disciplina é

necessária para coibir práticas abusivas estampadas por trás de empresas, que deixam

um clima de completa insegurança nas relações comerciais, com prejuízo de uns em

detrimento do crescente crescimento de outros.

Dessa forma, a mutação e complexidade crescente das relações comerciais,

e com elas o surgimento de diversos institutos como o da falência, estado de

insolvência, encerramento ou inatividade das pessoas jurídica provocados pela má-

administração, exigiram o surgimento de uma norma que coibisse que tais ocorrências

servissem de base para que sócios fraudassem seus credores.

O artigo 50 do Código Civil trata das hipóteses da desconsideração da

personalidade jurídica, tendo a doutrina estendido tal conceito ao abuso de direito,

excesso de poder, violação da lei, do contrato social ou do estatuto, ao ato ilícito,

impondo a responsabilidade pessoal dos sócios sempre que, em decorrência de tais

atos, haja prejuízo a outrem.

Portanto, o presente artigo faz-se fundamental, visto que pretende

demonstrar a importância do instituto abordado em decorrência da complexidade das

relações comerciais desenvolvidas, visando coibir que atos atentatórios contra a

honestidade e boa-fé nas relações comerciais restem impunes.

1) A DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA:

1.1) PESSOA JURÍDICA:

Rua José Dias Vieira, 46, Rio Branco. Belo Horizonte-MG. Telefone Geral: (31) 3408-2350 / Central do Aluno: (31) 3408-2382 / Fax: (31) 3408-2391

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Antes de adentrarmos no tema propriamente dito, qual seja, a análise da

desconsideração da pessoa jurídica e suas conseqüências, será necessário

anteciparmos alguns comentários a respeito do que vem a ser considerado pessoa

jurídica.

Assim, é de fundamental interesse o estudo deste instituto para entendermos

a teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Obviamente não se pretende

discorrer profundamente sobre o assunto. Limitando-se, pois, a extrair noções básicas

que podem ser consideradas essenciais para o entendimento da matéria.

O entendimento do que vem a ser considerado pessoa jurídica, depende,

necessariamente, de uma análise a respeito da pessoa natural.

Relevante, para a matéria por nós estudada, é o entendimento de que toda

pessoa natural, como diz o primeiro artigo do Código Civil, é capaz de direitos e

deveres. Para ter essa capacidade, a pessoa precisa ter personalidade. Segundo os

dizeres de Silvio Rodrigues (2002, p. 35), a personalidade é a

Aptidão reconhecida pela ordem jurídica a alguém, para exercer direitos e obrigações. Essa é adquirida somente com o nascimento com vida. Aí começa a vida civil das pessoas naturais. Da mesma forma, ela termina juntamente com a personalidade e capacidade na morte do indivíduo.

Nesse diapasão, pode-se concluir que a pessoa natural é todo ser humano

apto a adquirir direitos e a contrair obrigações. A personalidade como mencionado, nos

dizeres de Silvio Rodrigues, é a aptidão para desempenhar na sociedade um papel

jurídico como sujeito de direitos e obrigações.

Muitas vezes, as pessoas naturais veem seus projetos e negócios, fruto do

seu trabalho alcançar grandes dimensões e seu controle se torna de difícil

administração por uma só pessoa, surgindo assim as pessoas jurídicas.

Pode-se dizer então que as pessoas jurídicas são entidades, para as quais a

lei empresta personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direito e obrigações. A

sua principal característica é a de que possuem personalidades próprias, diversas da

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dos indivíduos que as compõem. Assim, percebe-se que um dos princípios que

fundamenta o conceito da personalidade jurídica é o universitas distat a singulis

(sociedade distinta de seus membros), segundo o qual ela tem existência distinta de

seus membros como uma consequência imediata da personificação da sociedade.

Feitas estas considerações a respeito da pessoa jurídica, é preciso entender

um pouco sobre a constituição da Pessoa Jurídica. Para que a pessoa jurídica seja

constituída, são necessários alguns requisitos, quais sejam:

• Vontade humana criadora: intenção de criar uma entidade distinta da de

seus membros;

• Observância das condições legais: instrumento particular ou público,

registro ou autorização ou aprovação do governo;

• Liceidade de seus objetivos: objetivos ilícitos ou nocivos constituem causa

de extinção da pessoa jurídica.

A vontade humana se materializa no ato de constituição, através do que se

denomina estatuto, em se tratando de associações (sem fins lucrativos); contrato social,

em se tratando de sociedades, simples ou empresárias (antigamente denominadas civis

ou comerciais); e escritura pública ou testamento em se tratando de fundações –

segundo consta no art. 62 do Código Civil. É no estatuto ou o contrato que os

indivíduos manifestam a intenção em constituir a pessoa jurídica.

O estatuto ou o contrato deve ser registrado, para que assim, comece a

existência legal da pessoa jurídica de direito privado – segundo o art. 45 do Código

Civil. Na realidade, pode-se afirmar que a pessoa jurídica só passa a existir após o

registro feito no órgão competente, qual seja, a Junta Comercial, conforme abaixo

mencionado. O registro é ato constitutivo, assim antes da efetivação do registro, não

passará de mera sociedade de fato1.

Quando a pessoa jurídica registra o ato constitutivo que lhe deu origem na

repartição competente, adquire a capacidade jurídica juntamente com sua

personalidade, o que a torna capaz de exercer os direitos que lhes são compatíveis. 1 A sociedade sem registro é chamada, na doutrina, de sociedade irregular, ou "de fato".

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O registro do contrato social de uma sociedade empresária faz-se na junta

comercial. Os estatutos e os atos constitutivos das demais pessoas jurídicas de direito

privado são registrados no cartório de registro civil das pessoas jurídicas.

Vejamos o que prescreve o artigo 1150 do Código Civil:

Art. 1150 - O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao registro público de empresas mercantis a cargo das juntas comercias, e a sociedade simples ao registro civil das pessoas jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária.

Há que ressaltar, também, que algumas pessoas jurídicas precisam, ainda,

de autorização ou aprovação do Poder Executivo pra que possam funcionar, conforme

consta da regra do artigo 45 do Código Civil, como é o caso das seguradoras, as

instituições financeiras, as administradoras de consórcio, etc.

Adquirindo personalidade jurídica, adquire-se autonomia patrimonial, que

nada mais é do que a separação dos patrimônios dos sócios e das sociedades.

Desta forma, ficam as sociedades e os sócios protegidos, pois sendo

pessoas diferentes, com personalidades diferentes, terão também patrimônios

diferentes. Assim, para saldar suas respectivas dívidas, uma não interfere no patrimônio

da outra, a não ser nos casos de desconsideração da pessoa jurídica previstos em lei

que é o ponto crucial do presente artigo.

Feitas estas breves considerações a respeito da pessoa jurídica, passa-se a

analisar a fraude e o abuso de direito da pessoa jurídica.

1.2) FRAUDE E ABUSO DE DIREITO DA PESSOA JURÍCA

Antes de qualquer coisa é preciso frisar que os princípios fundamentais da

desconsideração da personalidade jurídica são a fraude e o abuso do direito.

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A liberdade de associação para fins lícitos é garantida pela Constituição

Federal e 1988, mais precisamente no art. 5º, XVII, entretanto, veda os interesses que

afrontem a ordem jurídica e os bons costumes.

No mesmo sentido, temos o disposto na Lei de Registros Públicos que

declara em seu art. 115 que:

Art. 115. Não poderão ser registrados os atos constitutivos de pessoas jurídicas, quando seu objetivo ou circunstâncias relevantes indiquem destino ou atividades ilícitos ou contrários, nocivos ou perigosos a bem público, a segurança do Estado e a coletividade, a ordem pública ou social, a moral e aos bons costumes

Não obstante o rigorismo legal, os sócios utilizam a autonomia

patrimonial da pessoa jurídica, com certa freqüência para acobertar fins ilícitos,

abusivos ou fraudulentos, buscando proveito próprio em detrimento de direito de

terceiros que podem ser prejudicados.

A fraude é justamente um meio pelo qual se tenta ludibriar, iludir,

enganar, com a finalidade de prejudicar terceiro.

O civilista Caio Mário da Silva Pereira (1991, p. 371), explica que:

Fraude é a manobra engendrada com o fito de prejudicar terceiro; e tanto se insere no ato unilateral (caso em que macula o negócio ainda que dela não participe outra pessoa), como se imiscui no ato bilateral (caso em que a maquinação é concertada entre as partes). Na fraude, o que está presente é o propósito de levar aos credores um prejuízo, em benefício próprio ou alheio, furtando-lhes a garantia geral que devem encontrar no patrimônio do devedor, e a intenção de impor um prejuízo a terceiro. Mais modernamente, digamos, com mais acuidade científica, não se exige que o devedor traga a intenção deliberada de causar prejuízo (animus nocendi); basta que tenha a consciência de que produz dano.

Conforme melhor se verá, existem hipóteses de fraude que justificam a

aplicação da desconsideração da pessoa jurídica, por operarem com uso do expediente

da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, englobando a fraude à lei, aos credores e

até mesmo aos membros da pessoa jurídica.

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Porém, a desconsideração só pode ser aplicada na fraude contra credores

quando houver relação jurídica que implique em débito e alienação que implique em

insolvência, de forma que, traga algum tipo de prejuízo para o terceiro.

Os ensinamentos de Fábio Ulhoa Coelho (2003, p.127) merecem ser

expostos, dada à precisão:

A desconsideração é instrumento de coibição do mau uso da pessoa jurídica; pressupõe, portanto o mau uso. O credor da sociedade que pretende a sua desconsideração deverá fazer prova da fraude perpetrada, caso contrário suportará o dano da insolvência da devedora. Se a autonomia patrimonial não foi utilizada indevidamente, não há fundamento para a sua desconsideração.

O abuso de direito, é mais bem entendido, se analisarmos que a sociedade

garante a certas pessoas algumas prerrogativas. O abuso dessas prerrogativas, ou

seja, o uso de determinado instituto de forma excessiva e injustificada caracteriza o

abuso de direito.

Como preceitua o Código Civil, em seu artigo 187: também comete ato ilícito

o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestadamente os limites impostos

pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

No abuso de direito não existe, propriamente, trama, ou seja, intenção de

fraudar o direito do credor, mas surge do inadequado uso do direito por parte da

empresa. O ato praticado, em princípio, é lícito, mas o seu mau uso causa um resultado

considerado ilícito.

Ao tratar da teoria do abuso de direito, o professor Caio Mário da Silva

Pereira (1991, p. 466-467) afirma que:

(....) O seu germe prende-se à noção do exercício dos direitos, que em verdade só se constituem para proporcionar benefícios, vantagens ou utilidades ao respectivo sujeito. Conseguintemente à idéia do direito está imediatamente vinculado o co-respectivo desfrute, situado na sua utilização, e, como esta é uma faculdade ou um poder do titular, admitir-se-ia em princípio que pode ser levada a último extremo, ainda que tal programa viesse causar a ruína, a desgraça, a humilhação alheia. Abusa, pois, de seu direito o titular que dele se utiliza, levando malefício a outrem, inspirado na intenção de fazer mal, sem proveito próprio. O fundamento ético da teoria pode, pois, assentar em que a lei não deve permitir que alguém se sirva de seu direito exclusivamente para causar dano a outrem.

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Conclusivamente, Mônica Gusmão (2011, p. 161-162) assevera que:

Não se pode confundir a teoria da desconsideração da personalidade jurídica com o ato ultra vires, o abuso de direito e a responsabilidade decorrente da própria lei. O Código Civil considera abuso da personalidade jurídica o desvio de finalidade e a confusão patrimonial. Por desvio de finalidade, entenda-se a utilização da sociedade, pelo sócio, ainda que dentro do seu objeto social, mas com a intenção de auferir vantagens indevidas. O ato praticado pelo sócio, apesar da fraude, é lícito. No abuso do direito, tem-se o ato como ilícito. Comete ato ilícito todo aquele que, a pretexto de exercer um direito, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa fé ou pelos costumes.

Não há dúvidas que a fraude e abuso de direito são hipóteses de

desconsideração da pessoa jurídica. Porém, há que se ressaltar que o excesso de

poder, infração à lei, fato ou ato ilícito, violação dos estatutos ou contrato social não

constituem casos de aplicação da teoria mencionada, estas hipóteses são constantes

na doutrina como atos da teoria ultra vires.

A teoria ultra vires funda-se no objeto social (especificado no contrato ou nos

estatutos sociais), englobando a atividade e o fim, que é sempre lucro. Os atos serão

ultra vires quando estiverem em desacordo com a atividade ou finalidade da empresa,

quando incorrerem em violação aos estatutos ou contrato sociais, ou quando não forem

expressamente autorizados pelos estatutos por serem dispensáveis à realização do

objeto social.

No caso dos atos ultra vires, aqueles que de boa fé contratarem e sofrerem

prejuízos terão como válidos estes atos, respondendo a sociedade perante terceiro de

boa fé e o administrador perante a sociedade, lembrando que, o terceiro de boa fé é

quase sempre protegido pelas normas do direito brasileiro.

1.3) DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA:

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Como vimos a pessoa jurídica, após ser constituída, pode sofrer a

desconsideração. Neste momento, passaremos a analisar a teoria da desconsideração

da pessoa jurídica.

A Teoria da Desconsideração da Pessoa Jurídica surgiu na Inglaterra. A

primeira aplicação de que se tem registro foi, ainda no século XIX (1897), pela justiça

inglesa, quando um empresário constituiu uma limited company (similar a uma

sociedade anônima fechada brasileira), atendendo aos requisitos para estar legalmente

constituída com sete sócios, sendo todos de sua família, ficando ele com vinte mil

ações e os demais seis, cada qual com uma única ação. (REQUIÃO, p. 408, Vol.1;

2009).

A sociedade logo em seguida se revelou insolvente, com um ativo

insuficiente para satisfazer as obrigações por ela contraídas, nada sobrando para os

credores. O liquidante afirmou que a atividade da limited company era, na verdade, do

empresário, que usara daquele artifício para limitar sua responsabilidade pessoal

(REQUIÃO, p. 409, Vol.1; 2009)

De lá, A Teoria chegou aos Estados Unidos, tendo se desenvolvido e se

espalhado para outras partes do mundo, inclusive no Brasil. No direito alemão, tem o

sentido de penetração; na Itália, de superação (superamento); em inglês, também é dito

levantamento (lifting), embora a expressão inglesa mais comum seja disregard, ou seja,

desconsideração (REQUIÃO, p. 409, Vol.1; 2009)

A teoria da despersonalização da pessoa jurídica, em verdade, surgiu como

uma solução a ser utilizada, quando for empregado o instituto da personalidade jurídica

visando à fins condenáveis pelo direito e pela moral, ou seja, fins incompatíveis com os

de sua própria criação, causando prejuízos ao direito de terceiros.

Afasta-se, assim, por meio da teoria da desconsideração, a personalidade

autônoma da pessoa jurídica, da personalidade dos indivíduos que a compõem. Na

verdade busca-se por intermédio da teoria da desconsideração, uma solução justa,

para os problemas decorrentes do uso abusivo do instituto da pessoa jurídica,

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problemática comum aos países nos quais vigora o princípio básico da distinção entre

pessoa jurídica e seus componentes, bem como, da separação patrimonial entre estes.

A desconsideração é um conceito ligado ao funcionamento da pessoa

jurídica, tal fato deixa pouca margem para definições apriorísticas de caso. Nada

correspondendo aos assuntos da validade da constituição, estrutura, legalidade dos

atos. Para estes atos associados a defeitos tais como simulação, fraude, nulidade; o

direito oferece remédios análogos à desconsideração; mas que não devem ser

confundidos com a mesma.

Cabe falar da desconsideração quando não haja uma solução legislativa

específica para os eventuais desvios de função da pessoa jurídica.

Para que se possa aplicar a teoria da desconsideração da personalidade

jurídica é necessário que o ordenamento jurídico considere a personalidade jurídica da

sociedade como distinta da personalidade de seus membros o que em regra ocorre.

Outro requisito importante para viabilizar a aplicação da teoria da

desconsideração é a existência de responsabilidade limitada, isto porque esta limitação

é que foi utilizada como instrumento para a perpetração do abuso cometido. É

importante salientar que a responsabilidade do sócio varia de acordo com o tipo de

sociedade ao qual pertence.

Diante de tais fatos pode-se restringir a aplicação da teoria a dois tipos

societários, que são as sociedades anônimas e as sociedades por quota de

responsabilidade limitada. Nas sociedades onde os sócios têm responsabilidade

limitada e ilimitada, os sócios dirigentes sempre serão responsabilizados ilimitadamente

o que inviabiliza a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

Quanto às pessoas jurídicas de direito público, são elas responsabilizadas

civilmente por atos de seus representantes que se beneficiem desta qualidade

utilizando a pessoa jurídica para prejudicar terceiros, ressalvado o direito de regresso

contra os causadores.

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A disregard doctrine não visa à desconstituição da personalidade jurídica, ou

seja, a despersonificação. Desconsideração e despersonificação são diferentes. E esta

diferenciação precisa ficar clara.

A despersonificação tem por finalidade a anulação da personalidade jurídica,

por lhe faltar condições de existência, como nos casos de invalidade do contrato social

ou dissolução de sociedades. Já a desconsideração visa à desconsiderar, apenas no

caso concreto, o instituto da pessoa jurídica.

A doutrina da desconsideração nega precisamente o absolutismo do direito

da personalidade jurídica, superando-se a existência de personalidades distintas entre

a sociedade e os sócios, e atingindo-se a personalidade de seus membros, para

questionar certos atos dos sócios. A personalidade jurídica passa a ser

desconsiderada, doutrinariamente, um direito relativo, que permite ao juiz deixá-la de

lado para atingir a personalidade de seus sócios e coibir os abusos ou condenar a

fraude por meio de seu uso.

A teoria da desconsideração não visa a destruir ou questionar o princípio da

separação da personalidade jurídica da sociedade da dos sócios, mas, simplesmente,

funciona como mais um reforço ao instituto da pessoa jurídica, adequando-o a novas

realidades econômicas e sociais, evitando que seja utilizado pelos sócios como forma

de encobrir distorções em seu uso.

O objetivo da teoria é desconsiderar, momentaneamente, a personalidade

jurídica da sociedade para atingir os bens particulares dos sócios na hipótese de

comprovação da prática de atos fraudulentos, preservando-se desse modo, os

interesses e direitos dos credores prejudicados pelo mau uso da sociedade. (MÔNICA

GUSMÃO, 2011, p.159).

O que se pretende com a doutrina da desconsideração não é a anulação da

personalidade jurídica em toda sua extensão, mas apenas a declaração de sua

ineficácia para determinado efeito em virtude de seu uso ter sido desviado da sua

legítima finalidade (abuso de direito), ou para prejudicar credores ou terceiros, ou ainda

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para frustrar a lei (fraude), mas a teoria tem sobretudo o objetivo precípuo de combater

a injustiça.

2) O ARTIGO 50 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Apesar de o instituto ser de construção pretoriana, ou seja, criada pela

jurisdição, e teorizada pelos doutrinadores, não afasta a possibilidade, nem mesmo a

necessidade, de previsão legal, ao menos no que tange ao reconhecimento da

possibilidade da desconsideração e de sua aplicabilidade, por isto foi edificada pelos

legisladores, dentro do nosso ordenamento jurídico.

Devemos citar o artigo 50 do Código Civil, já que neste encontra-se prevista

a desconsideração da personalidade jurídica.

Vejamos o que prescreve o artigo 50 do Código Civil de 2002:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Este artigo estatui que, em caso de abuso da personalidade jurídica

(desvio de finalidade ou confusão patrimonial), o juiz pode determinar (a pedido da

parte ou do Ministério Público) que os efeitos de certas e determinadas relações de

obrigações sejam estendidas aos bens particulares dos administradores ou sócios da

empresa jurídica. Há confusão patrimonial quando os ativos e passivos entre sócio e

sociedade se confundem.

Portanto, abre-se aqui mais uma porta à esfera de legit imação

ativa do Ministério Público, quer dizer, o mesmo, também, está apto a

requerer do órgão judiciário a decisão de desconsideração da

personalidade jurídica da sociedade empresária.

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O que os juizes devem ter em mente, quando se depararem com o

requerimento ou pedido de desconsideração efetuado pela parte ou pelo Ministério

Público, é o fato de que devem aplicar a teoria da desconsideração onde estiverem

presentes os requisitos, quais sejam, a fraude ou abuso de direito, pois esta formulação

doutrinária corresponde a uma aplicação mais justa da teoria, pois se assim não fosse,

estaria comprometido o próprio instituto da pessoa jurídica, que traz enorme impulso ao

desenvolvimento da economia.

Demais disso, o texto não é um primor de clareza, pois fica obscuro o fato de

que a desconsideração da personalidade jurídica visa apenas à efetivar a

responsabilidade do sócio sobre aqueles bens incorporados à sociedade, e que a

pessoa jurídica poderá continuar no mais em sua atividade normal.

Principalmente porque tal artigo não é dos mais elucidativos é que pesquisas

e estudos sobre o tema merecem atenção e cuidado.

3) O SÓCIO DIANTE DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

Como visto, a desconsideração da pessoa jurídica pode acarretar

responsabilidades para o sócio podendo, inclusive, afetar o seu próprio patrimônio.

Desta forma, a análise do sócio é de fundamental importância, no presente momento.

3.1) QUEM É O SÓCIO

Sócio é a pessoa que reciprocamente se obriga a contribuir, com bens ou

serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

Conforme Rubens Requião (2003, p. 424):

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Conforme o tipo de sociedade, o sócio pode ter uma denominação especial. Assim, diz-se sócio solidário ao da sociedade em nome coletivo; sócio comanditado ou sócio solidário e sócio comanditário, na sociedade em comandita simples; sócio de indústria ou da sociedade que participa com seu trabalho; sócio ostensivo ou sócio oculto ao que integra a sociedade em conta de participação; sócio cotista na sociedade por cotas de responsabilidade limitada; sócio acionista, ou simplesmente acionista, ao da sociedade anônima”.

3.2) RESPONSABILIDADE DO SÓCIO

No estudo da responsabilidade do sócio devemos considerar a espécie de

sociedade a qual o sócio pertence. Isto porque, a natureza de cada tipo societário

determina a extensão de sua responsabilidade. A responsabilidade do sócio poderá ser

limitada ou ilimitada.

É importante ressaltar que toda sociedade empresária responde

ilimitadamente por suas dívidas, não existindo nenhuma regra que permita que ela

deixe de honrar com seus compromissos se ultrapassado algum limite. Quando se fala

em limitação da responsabilidade faz-se referência à possibilidade ou não de os sócios

responderem com seus próprios bens pela dívida da sociedade

Fábio Ulhoa Coelho (2004, p. 117-118) preleciona com brilhantismo sobre a

responsabilidade dos sócios nas sociedades ilimitadas, mista e limitadas:

A) Sociedade Ilimitada- em que todos os sócios respondem ilimitadamente pelas obrigações sociais. O direito contempla um só tipo de sociedade desta categoria, que é a sociedade em nome coletivo (N/C); B) Sociedade mista- em que uma parte dos sócios tem responsabilidade limitada e outra parte tem responsabilidade ilimitada, são desta categoria as seguintes sociedades: em comandita simples (C/S), cujo sócio comanditado responde ilimitadamente pelas obrigações sociais, enquanto o sócio comanditário responde limitadamente; e a sociedade em comandita por ações (C/A), em que o sócios diretores tem responsabilidade ilimitada pelas obrigações sociais e os demais acionistas respondem limitadamente;

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C) Sociedade limitada- em que todos os sócios respondem de forma limitada pelas obrigações sociais. São desta categoria a sociedade limitada (LTDA.) e a anônima (S/A)

É preciso, ainda, sabermos que na sociedade em nome coletivo, conforme

preceitua o art. 1039 CC:

Art. 1.039. Somente pessoas físicas podem tomar parte na sociedade em nome coletivo, respondendo todos os sócios, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais.

Já nas sociedades em comandita simples, prescreve o art. 1045 CC que:

Art. 1.045. Na sociedade em comandita simples tomam parte sócios de duas categorias: os comanditados, pessoas físicas, responsáveis solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais; e os comanditários, obrigados somente pelo valor de sua quota.

O art. 1052 CC, prescrevendo a respeito da sociedade limitada afirma que:

Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.

Já o artigo art. 1088 CC, referindo-se à sociedade anônima prescreve que:

Art. 1.088. Na sociedade anônima ou companhia, o capital divide-se em ações, obrigando-se cada sócio ou acionista somente pelo preço de emissão das ações que subscrever ou adquirir.

Por fim, é preciso mencionar que a respeito da sociedade em comandita por

ações prescreve o art. 1090 que:

Art. 1.090. A sociedade em comandita por ações tem o capital dividido em ações, regendo-se pelas normas relativas à sociedade anônima, sem prejuízo das modificações constantes deste Capítulo, e opera sob firma ou denominação.

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3.3) A RESPONSABILIDADE DO SÓCIO NA DESCONSIDERAÇÃO

Como dito anteriormente, a aplicação da teoria da desconsideração se

restringe a dois tipos societários, que são as sociedades anônimas e as sociedades por

quota de responsabilidade limitada.

No caso das sociedades anônimas a desconsideração se justifica no fato de

inexistir qualquer acionista que responda por dívidas da pessoa jurídica, e nos casos

das sociedades por quota de responsabilidade limitada, por inexistir responsabilidade

dos sócios por dívida da sociedade, desde que o capital tenha sido totalmente

integralizado.

Para que o tema fique mais claro, vejamos a responsabilidade dos sócios

nos tipos societários supracitados, nas sociedades anônimas e nas sociedades

limitadas.

• Sociedade anônima: A lei das Sociedades Anônimas (lei 6.404/76) veio

tratar das sociedades coligadas, controladoras e controladas, empresas que, durante

muito tempo, prejudicavam os acionistas minoritários, os credores comerciais,

trabalhistas e o próprio Fisco, além de praticar abuso do poder econômico nos

mercados.

O objetivo desta lei é evitar prejuízos para o sócio minoritário ou para

terceiros, credores da companhia, ela contempla situações de responsabilidade

pessoal, subsidiária ou solidária de terceiros, a fim de evitar abusos que pudessem ser

praticados com a utilização da pessoa jurídica.

Na sociedade anônima, o capital social é dividido em ações, é sociedade de

capital e não de pessoas, a responsabilidade dos sócios é limitada ao preço de emissão

das ações subscritas ou adquiridas, é sempre empresarial independentemente de seu

objeto social.

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A existência de sociedades coligadas manifesta-se quando uma participa

com 10% ou mais do capital de outra, sem controlá-la (art. 243, § 1º da lei de nº

6.404/76), o controle ocorrera quando uma sociedade tiver sobre a outra

preponderância nas liberações sociais e poder para eleger maioria dos administradores

(art. 243, § 2º da lei de nº 6.404/76).

As sociedades coligadas, controladoras e controladas que mantém entre si

relações societárias segundo o regime legal de sociedades isoladas constituem grupos

de fato. As sociedades controladas e controladoras constituídas através de convenção

arquivada no registro do comércio da sede da sociedade de comando denominam-se

grupo de direito.

O legislador, nos grupos de direito, não assegurou a devida proteção nem

aos não controladores nem aos terceiros. Aos não controladores é garantido o direito

de retirada no momento da constituição do grupo (art. 270, p.u), e o grupo, quando já

constituído, terá ação somente contra a sociedade controladora e contra os

administradores da controlada quando houver violação da lei ou violação do grupo

(art.276).

Contra terceiros credores, exclui toda e qualquer responsabilidade legal de

uma sociedade por débito da outra.

Os credores do grupo não são protegidos diretamente pelo legislador, os

terceiros que se sentirem prejudicados por atos praticados com fundamento na

existência do grupo podem recorrer somente a uma interpretação ampliativa dos artigos

116 e 117.

Os artigos 116, 117 e 246 da Lei das Sociedades Anônimas versam sobre o

problema da responsabilidade civil do acionista controlador e da sociedade controlada,

porém não se pode afirmar que tais dispositivos possuem qualquer relação com a teoria

da desconsideração da personalidade jurídica, pois responderá pelo dano aquele que o

causar.

As deficiências e omissões da legislação acionária brasileira demonstram a

necessidade de aplicação de soluções na linha da Disregard Doctrine.

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• Sociedade por quotas de responsabilidade limitada ou sociedade limitada:

Instituída pelo Dec. nº 3.708, de 10 de janeiro de 1919.

Limitada é a responsabilidade do cotista, não da sociedade, é claro. Na

verdade, trata-se de uma sociedade empresária com a totalidade dos sócios de

responsabilidade limitada. A responsabilidade da sociedade perante terceiros é plena,

tendo em vista que esta é dotada de autonomia jurídica.

Observa-se que na sociedade por quota de responsabilidade limitada, os

sócios gerentes ou que derem nome à firma não respondem pessoalmente pelas

obrigações contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para

com terceiro, solidária, ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados

com violação de contrato social ou lei.

O sócio gerente que praticar atos lesivos aos interesses sociais respondera

perante terceiros, perante a própria sociedade ou perante os outros sócios. Não se

pode, dessa forma, afirmar que na lei de sociedades por ações exista dispositivo que

consagre a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica.

Nesse sentido, vários estudiosos da teoria da desconsideração

consideravam as hipóteses de responsabilidade dos sócios, gerente ou administradores

como de desconsideração. É possível que alguns desses estudiosos seduzidos pela

novidade da matéria tenham sido tentados a adequar os dispositivos legais que versam

sobre responsabilidade civil por atos próprios aos princípios fundamentais da teoria da

desconsideração.

Tal posicionamento só veio a dificultar a aplicação da teoria da

desconsideração no direito brasileiro. A aplicação da desconsideração exige não só a

prova do dano, como também a existência da fraude ou do abuso, enquanto na

responsabilização, o responsável não se oculta atrás da personalidade da sociedade;

ele responde por atos próprios, como na prática de ilícito, aplicando-se para sua

responsabilização o art. 159 do Código Civil, conjugado com os dispositivos da

legislação societária.

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4) O CREDOR EM FACE DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

Caso seja aplicada a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, os sócios

poderão responder com o patrimônio próprio perante as obrigações contraídas em

beneficio de terceiros que são denominados de credores.

Apesar de não ser o objeto principal do presente trabalho, algumas

considerações a respeito dos terceiros credores devem ser feitas, para elucidar a

questão.

Por credor devemos entender como sendo aquela pessoa que possui um

crédito a receber de uma pessoa que é denominada de devedor.

O objeto do crédito irá variar de acordo com o tipo de obrigação contraída,

podendo este ser oriundo de uma obrigação de fazer, não fazer, entrega de coisa certa

ou incerta, ou obrigação consistente em pagar certa quantia em dinheiro.

Conforme se viu anteriormente, ao aplicar-se a desconsideração da pessoa

jurídica deixa de existir a autonomia do patrimônio da empresa, deixando de haver, na

realidade, a separação entre o patrimônio dos sócios e o patrimônio da empresa.

Há que se ressaltar que, a autonomia do patrimônio da empresa é

justamente uma das características mais importantes da constituição da pessoa

jurídica, conforme foi exaustivamente trabalho no momento oportuno.

Desta forma, pode-se concluir que se for aplicada a desconsideração da

pessoa jurídica, o credor poderá buscar satisfação de seu crédito, não só no patrimônio

da empresa, mas, também, no patrimônio individual de cada sócio. Isto porque, é

justamente esta a possibilidade de maior importância quando se aplica a

desconsideração da pessoa jurídica.

Em relação à situação do credor em face da desconsideração da pessoa

jurídica, propriamente dita, a doutrina é silente, não existindo comentários específicos a

respeito. Assim, tal conclusão ficou a cargo do pesquisador, que diante da análise

realizada pode afirmar que os credores poderão sim, caso a personalidade jurídica seja

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desconsiderada, buscar satisfação do crédito no patrimônio particular de cada sócio,

sempre visando à plena satisfação do crédito.

Ao que parece é justamente esta a intenção da lei, haja vista que, a pessoa

jurídica será desconsiderada quando existir fraude ou abuso de direito.

REFERÊNCIAS

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Brasília: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Código Civil (2002). Brasília. LEI n. 6.404-15 dez. 1976. Dispõe sobre

sociedades por ações. Diário oficial da União. Brasília, 17 de dez. 1976. Suplemento.

LEI n. 6.015-31 dez. 1973. Dispõe sobre os registros públicos.

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Revista dos Tribunais, 1989.

GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 15. ed. Rio de janeiro: Forense, 2000.

GUSMÃO, Mônica. Lições de Direito Empresarial. 10ª Ed. Rio de Janeiro Lúmen

Júris, 2011.

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Revista do Advogado, São Paulo, v. 36, p.38-44, mar. 1992.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. v.I, Rio de janeiro:

Forense, 1991

REQUIÃO, Rubens. Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica.

São Paulo: in Revista dos Tribunais, 410: 12-24, dez.1969.

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, São Paulo, Vol. 1; 28 ed. Saraiva,

2009.

RODRIGUES, SILVIO. Direito Civil, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002.