a saúde no campo: das políticas oficiais à experiência do...

144
Fernando Ferreira Carneiro A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do MST e de famílias de “bóias frias” em Unaí, Minas Gerais, 2005 Tese apresentada à Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Ciência Animal Área: Medicina Veterinária Preventiva e Epidemiologia Orientador: Prof. José Ailton da Silva Co-orientação: Prof ª Anamaria Testa Tambellini Belo Horizonte UFMG – Escola de Veterinária 2007

Upload: lamnhu

Post on 09-Jan-2019

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

Fernando Ferreira Carneiro

A Saúde no Campo:

das políticas oficiais à experiência do MST e defamílias de “bóias frias” em Unaí, Minas Gerais, 2005

Tese apresentada à Universidade Federal de MinasGerais, Escola de Veterinária, como requisito parcialpara obtenção do grau de Doutor em Ciência Animal

Área: Medicina Veterinária Preventiva e Epidemiologia

Orientador: Prof. José Ailton da SilvaCo-orientação: Prof ª Anamaria Testa Tambellini

Belo HorizonteUFMG – Escola de Veterinária

2007

Page 2: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

2

C289s Carneiro, Fernando Ferreira, 1973- A saúde no campo: das políticas oficiais à experiência do MST e defamílias de “bóias frias” em Unaí, Minas Gerais, 2005 / Fernando FerreiraCarneiro. –2007. 143 p. :il.

Orientador: José Ailton da Silva Co-orientadora: Anamaria Testa Tambellini Tese (doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola deVeterinária Inclui bibliografia

1. Política de saúde – Teses. 2. Saúde do trabalhador – Teses.3. Trabalhadores rurais volantes – Teses. 4. Movimento dos TrabalhadoresRurais Sem Terra – Teses. 5. Epidemiologia – teses. I. Silva, José Ailtonda. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade Federal de MinasGerais. Escola de Veterinária. IV. Título.

CDD -614

Page 3: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade
Page 4: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

4

Page 5: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

5

DEDICATÓRIA

A todos que acreditam e trabalham pela transformação de nossa sociedade.

E, especialmente, aos que lutam pela reforma agrária no Brasil, causa apaixonante e ainda porse realizar.

Page 6: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

6

AGRADECIMENTOS

Não consigo imaginar uma Tese como um trabalho essencialmente solitário e individual. Portrás destas páginas existiu um esforço coletivo.

Nossos agradecimentos às famílias do Assentamento Menino Jesus e Acampamento ÍndioGaldino, que tão bem nos acolheram, e à Direção Estadual do MST, nas figuras de Gaspar eParazinho.

À equipe do PSF do Bairro Mamoeiro, que tão prontamente apoiou nossos trabalhos ajudandoa abrir portas na comunidade.

À Anamaria Testa Tambellini e José Ailton da Silva, pois, realmente, foram grandesorientadores, não somente acadêmicos, mas de vida.

Ao Coletivo Nacional de Saúde do MST, pelo apoio e reflexões.

Ao Centro Mineiro de Estudos Epidemiológicos e Ambientais, na figura de seus diretoresFrancisco Cecílio Viana e Gustavo Werneck, companheiros de pensamentos e ações; eespecialmente, a Waltency Roque de Sá, grande mestre, colaborador em todos os momentosda pesquisa.

Ao André Campos Búrigo, Jaqueline Fernandes e Mateus Carvalho Silva Araújo, por comporema equipe de trabalho de campo, e a Patrícia Andrade Bertolini, pela digitação dos dados.

A João Paulo Haddad, pela assessoria estatística, e a Flavia Elias, pelo apoio nas questões desegurança alimentar.

Ao Guilherme Franco Netto e Luiz Cláudio Meirelles, que entenderam e apoiaram a realizaçãoda Tese ao mesmo tempo em que mantinham meus trabalhos na Vigilância em SaúdeAmbiental do Ministério da Saúde e, posteriormente, na ANVISA.

Ao Grupo da Terra do Ministério da Saúde, pelo privilégio de ser seu integrante, pois ao mesmotempo em que escrevo esta Tese estou tendo a oportunidade de participar do processo deconstrução da Política de Saúde das Populações do Campo e da Floresta (a novidade da“Floresta” vai ficar para novos estudos...). A Jacinta Sena, coordenadora desse grupo, peloapoio na etapa de revisão bibliográfica.

Ao Rodrigo Carneiro Rabelo, pela minuciosa revisão do texto e Luciana Ferreira M. Carneiro,pela ajuda na montagem da apresentação para a banca examinadora. E à Nádia Maria da Silvapela contribuição na formatação final da Tese.

E, finalmente, agradeço de forma muito especial a minha querida Valéria e ao pequeno Marcos,pela companhia e estímulo em todos os momentos. A meus pais, pelo apoio nas horas maisimportantes, até quando não havia recursos financeiros para a etapa de campo, tendo de atuarcomo fomentadores de pesquisa científica voltada para as classes populares.

Este sonho de mais de 10 anos só foi possível ser realizado porque o objeto exigiu umcompromisso e uma responsabilidade com as pessoas que constróem o dia-a-dia da luta pelareforma agrária no Brasil.

Page 7: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

7

“Enquanto não buscarmos constantemente o impossível, nunca alcançaremos o possível.”

Page 8: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

8

SUMÁRIOLISTA DE ABREVIATURAS ............................................................................... 12

RESUMO............................................................................................................. 13

ABSTRACT ......................................................................................................... 14

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................... 15

2. MARCO TEÓRICO ............................................................................................. 172.1 Políticas públicas de saúde ................................................................................ 172.2 Estudos sobre as condições de saúde das populações do campo ................... 19

3. MÉTODOS E PROCEDIMENTOS...................................................................... 283.1 Descrição e análise das políticas oficiais de saúde para as populações do

campo e a experiência do MST .......................................................................... 293.2 Estudo comparativo sobre as condições de saúde de famílias do MST e de

bóias-frias de Unaí-MG....................................................................................... 293.2.1 Desenho do estudo ............................................................................................. 303.2.2 Métodos de análise ............................................................................................. 303.3.3 Descrição das áreas pesquisadas ...................................................................... 303.3.4 Características sociais e históricas da região de estudo.................................... 333.4 Preocupações éticas........................................................................................... 37

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO .......................................................................... 394.1 Contexto histórico da construção das políticas oficiais de saúde para o

campo no Brasil .................................................................................................. 394.2 A organização da saúde nos acampamentos e assentamentos do MST ......... 434.2.1 O processo saúde-doença segundo discussão em grupo com membros do

Coletivo Nacional de Saúde do MST .................................................................. 454.3 Análise das políticas oficiais de saúde para as populações do campo –

FUNRURAL, PIASS, SUS e a experiência do MST ........................................... 474.3.1 Comparando as políticas e a experiência do MST ............................................. 494.4 Estudo comparativo das condições de saúde de famílias do MST e de bóias-

frias de Unaí-MG................................................................................................. 534.4.1 Características sócio-demográficas e familiares das comunidades estudadas 534.4.2 Condições de vida............................................................................................... 604.4.3 Condições de produção e trabalho ..................................................................... 774.4.4 Animais de produção, domésticos e sinantrópicos............................................. 854.4.5 Serviços de saúde............................................................................................... 954.4.6 Noções de saúde ................................................................................................ 984.4.7 Análise fatorial discriminante ............................................................................. 111

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS: ELEMENTOS PARA UMA PROPOSTA DEPOLÍTICA DE SAÚDE PARA AS POPULAÇÕES DO CAMPO......................... 114

6. CONCLUSÕES ................................................................................................... 116

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 117

8. ANEXOS (A, B, C, D, E, F, G) ............................................................................ 124

Page 9: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

9

LISTA DE QUADROS E TABELASQUADRO 1 Estudos sobre as condições de saúde da população do campo..................... 24QUADRO 2 Cronologia das políticas de saúde para o campo no Brasil (1918 a 2004) ..... 41QUADRO 3 Comparação entre a atuação do FUNRURAL, PIASS e SUS junto à

população do campo, Brasil (1967 a 2004)...................................................... 51QUADRO 4 Variáveis selecionadas para a análise fatorial discriminante das três

comunidades estudadas em Unaí-MG, abril de 2005...................................... 111Tabela 1 Universo do estudo segundo comunidade de residência, número de

famílias entrevistadas e pessoas, Unaí-MG, abril de 2005.............................. 53Tabela 2 Distribuição de pessoas de acordo com o sexo e a comunidade de

residência, Unaí-MG, abril de 2005.................................................................. 54Tabela 3 Distribuição de pessoas de acordo com a média da idade e a comunidade

de residência, Unaí-MG, abril de 2005............................................................. 54Tabela 4 Média de anos de estudo segundo o sexo e a comunidade de residência,

Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 54Tabela 5 Número de pessoas que freqüentam a escola segundo a comunidade de

residência, Unaí-MG, abril de 2005.................................................................. 55Tabela 6 Local de moradia segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de

2005.................................................................................................................. 57Tabela 7 Local de moradia antes de acampar ou trabalhar como bóia fria segundo a

comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 59Tabela 8 Ocupação anterior do homem segundo a comunidade de residência, Unaí-

MG, abril de 2005 ............................................................................................. 60Tabela 9 Ocupação anterior da mulher segundo a comunidade de residência, Unaí-

MG, abril de 2005 ............................................................................................. 60Tabela 10 Disponibilidade de alimento nos últimos três meses entre as famílias,

Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 61Tabela 11 Distribuição da freqüência de falta de comida entre as famílias nos últimos

três meses, Unaí-MG, abril de 2005 ................................................................ 61Tabela 12 Distribuição das famílias de acordo com o número de refeições diárias,

segundo comunidade de residência, Unaí MG, abril de 2005 ......................... 61Tabela 13 Alocação de benefícios sociais para os integrantes das famílias segundo a

comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 64Tabela 14 Acesso a serviços públicos e direitos pelas famílias, segundo a

comunidade de residência, Unaí - MG, abril de 2005...................................... 64Tabela 15 Distribuição das famílias que possuem água encanada dentro da

residência segundo a comunidade, Unaí-MG, abril de 2005 ........................... 65Tabela 16 Destino de dejetos das famílias segundo a comunidade de residência,

Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 67Tabela 17 Situação do antigo imóvel (assentamento e acampamento) e atual imóvel

(Bairro Mamoeiro), Unaí-MG, abril de 2005 ..................................................... 69Tabela 18 Participação das famílias em organização ou entidade comunitária,

segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005 ...................... 69Tabela 19 Tipos de organização comunitária de que as famílias participam, segundo

a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005..................................... 71Tabela 20 Uso de equipamentos domésticos pelas famílias segundo a comunidade

de residência, Unaí-MG, abril de 2005............................................................. 73Tabela 21 Principais problemas ambientais vividos pelas comunidades segundo as

famílias, Unaí/MG, abril de 2005...................................................................... 75Tabela 22 Distribuição das famílias segundo atividades que ajudam na renda e

comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 77Tabela 23 Percepção das famílias do uso de agrotóxicos no seu trabalho segundo a

comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 83

Page 10: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

10

Tabela 24 Presença de animais sinantrópicos na casa segundo a comunidade deresidência, Unaí-MG, abril de 2005.................................................................. 86

Tabela 25 Criação de animais de produção segundo a comunidade de residência,Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 86

Tabela 26 Fatores necessários para a criação de animais como as famílias sempresonharam segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005..... 89

Tabela 27 Tipo de animal doméstico presente na residência segundo a comunidade,Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 91

Tabela 28 Conhecimento sobre doenças transmitidas por insetos e animais segundocomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 93

Tabela 29 Percentual de animais de companhia vacinados segundo a comunidade deresidência, Unaí-MG, abril de 2005.................................................................. 93

Tabela 30 Pessoas doentes que procuraram atendimento nas últimas duas semanassegundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005 ...................... 95

Tabela 31 Atendimento das necessidades de saúde das famílias por parte do SUS,segundo comunidade de residência, Unaí, abril de 2005 ................................ 97

Tabela 32 Ações que podem ser realizadas para que o SUS atendesse asnecessidades das famílias, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 97

Tabela 33 Percepção do estado de saúde da família antes de viver na comunidade,Unaí MG, abril de 2005 .................................................................................... 99

Tabela 34 Percepção dos fatores que geram saúde para as famílias segundo acomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 100

Tabela 35 Percepção dos fatores que causam doenças para as famílias segundo acomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005........................................ 100

Tabela 36 Principais doenças percebidas pelas comunidades segundo as famílias,Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 102

Tabela 37 Causas das doenças relatadas pelas comunidades segundo as famílias,Unaí-MG, abril de 2005 .................................................................................... 102

Tabela 38 Percepção dos fatores que faltam para se ter boa saúde nas comunidadessegundo as famílias , Unaí-MG, abril de 2005 ................................................. 104

Tabela 39 Distribuição das famílias em que um dos membros já sofreu acidente oudoença do trabalho, segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abrilde 2005............................................................................................................. 107

Tabela 40 Remédios produzidos em casa por comunidade de residência, Unaí-MG,abril de 2005..................................................................................................... 107

Tabela 41 Influência do MST em relação à saúde segundo a comunidade deresidência, Unaí-MG, abril de 2005.................................................................. 109

Tabela 42 Percepção do estado de saúde de quem está organizado junto ao MSTcomparado aos bóias-frias, Unaí, abril de 2005............................................... 109

Tabela 43 Resumo da classificação da análise discriminante segundo comunidade deresidência e variáveis selecionadas, Unaí-MG, abril de 2005 ......................... 112

Tabela 44 Função discriminante linear das variáveis selecionadas para as trêscomunidades estudadas, Unaí-MG, abril de 2005........................................... 113

Tabela 45 Médias da análise fatorial discriminante das variáveis selecionadas paraas três comunidades estudadas, Unaí-MG, abril de 2005 ............................... 113

LISTA DE GRÁFICOS E FIGURASGráfico 1 Distribuição do número de meses trabalhados ao longo do ano segundo as

famílias de bóias-frias do Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005 .............. 79Gráfico 2 Tempo gasto por dia para deslocamento até o local de trabalho segundo

as famílias de bóias-frias do Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005 ......... 83Figura 1 Casa e quintal de família do Assentamento Menino Jesus, Unaí-MG, abril

de 2004............................................................................................................. 31Figura 2 Casa e quintal de família do Acampamento Índio Galdino, Unaí-MG, abril

de 2005............................................................................................................. 33

Page 11: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

11

Figura 3 Escola do Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005 ...................................... 33Figura 4 Fazenda agroindustrial da região de Unaí-MG, abril de 2005 ......................... 37Figura 5 Reunião na escola do Bairro Mamoeiro com representantes da

comunidade e dos serviços de saúde, Unaí-MG, abril de 2005 ...................... 37Figura 6 Grupo de discussão com o Coletivo Nacional de Saúde do MST, Brasília-

DF, dezembro de 2004..................................................................................... 45Figura 7 Nova escola de Chapadinha Unaí-MG, abril de 2005...................................... 55Figura 8 Transporte escolar para a escola de Chapadinha que serve ao

assentamento e acampamento, Unaí, 2004 .................................................... 57Figura 9 Vila estrutural, Brasília-DF................................................................................ 57Figura 10 Vila estrutural, Brasília-DF................................................................................ 57Figura 11 Assentado buscando água de carroça, Unaí-MG, abril de 2005 ..................... 67Figura 12 Banheiro de família acampada, Unaí-MG, abril de 2005 ................................. 67Figura 13 Reunião com os núcleos de família do acampamento Índio Galdino, Unaí-

MG, abril de 2005 ............................................................................................. 71Figura 14 Cozinha de família acampada, Unaí-MG, abril de 2005 .................................. 73Figura 15 As veredas da região têm sido um dos ambientes mais ameaçados com o

avanço da monocultura, Unaí-MG, abril de 2005............................................. 73Figura 16 Milharal e mandiocal de família acampada, Unaí-MG, abril de 2005 .............. 77Figura 17 Curral do acampamento Índio Galdino, Unaí-MG, abril de 2005 ..................... 87Figura 18 Galinha doente em tratamento por acampado, Unaí-MG, abril de 2005 ......... 91Figura 19 Cão no Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005........................................... 91Figura 20 Meio de transporte mais usado pelas famílias assentadas, Unaí-MG, abril

de 2005............................................................................................................. 95Figura 21 Assentados colhendo arroz – observação participante, Unaí-MG, abril de

2005.................................................................................................................. 105Figura 22 Famílias do Assentamento Menino Jesus, Unaí-MG, 2004............................. 109

Page 12: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

12

LISTA DE ABREVIATURAS

SIGLAS

AIDS Síndrome da Imunodeficiência AdquiridaANVISA Agência Nacional de Vigilância SanitáriaANOVA Análise de Variância entre GruposCONASEMS Conselho Nacional de Secretários Municipais de SaúdeCONASS Conselho Nacional de Secretários Estaduais de SaúdeCONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores da AgriculturaCPT Comissão Pastoral da TerraDST Doenças Sexualmente TransmissíveisCONAB Companhia Nacional de AbastecimentoCUT Confederação Única dos TrabalhadoresFAO Food and Agriculture Organization of the United NationsFIOCRUZ Fundação Oswaldo CruzFUNASA Fundação Nacional de SaúdeFUNRURAL Fundo de Assistência ao Trabalhador RuralFSESP Fundação Serviços Especiais de Saúde PúblicaIBGE Instituto Brasileiro de Geografia e EstatísticaINAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência SocialINPS Instituto Nacional de Previdência SocialINCRA Instituto Nacional da Colonização e Reforma AgráriaIPEA Instituto de Pesquisa Econômica AplicadaMS Ministério da SaúdeMST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem TerraNEAD Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento RuralOPAS Organização Pan-americana da SaúdePAB Piso de Atenção BásicaPABA Piso de Atenção Básica AmpliadoPNAD Pesquisa Nacional por Amostras DomiciliaresPDA Planejamento do Desenvolvimento do AssentamentoPIASS Programa de Interiorização das Ações de Saúde e SaneamentoPADAP Programa de Assentamento Dirigido do Alto ParanaíbaPLANOROESTE Programa de Desenvolvimento Rural Integrado do Noroeste de MinasPOLOCENTRO Programa de Desenvolvimento dos CerradosPRODECER Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para Desenvolvimento dos

CerradosPSF Programa Saúde da FamíliaRIDE Região Integrada do Distrito Federal e EntornoSUS Sistema Único de SaúdeSUCAM Superintendência de Campanhas de Saúde PúblicaUnB Universidade de BrasíliaUnicamp Universidade Estadual de Campinas

Page 13: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

13

RESUMO

As políticas oficiais de saúde para a população do campo no Brasil foram caracterizadas,comparando o contexto histórico, princípios, objetivos, estratégias e seus resultados. Tambémforam investigados os elementos concretos que viabilizaram a implementação dessas políticas,e como as experiências das famílias assentadas e acampadas do Movimento de TrabalhadoresRurais Sem Terra -MST- e de bóias-frias de Unaí-MG podem contribuir para avaliar esseprocesso. Realizou-se a análise documental das políticas oficiais (de 1960 a 2005) e daexperiência do MST (de 1998 a 2005) no campo da saúde. Um grupo de discussão com o seuColetivo Nacional de Saúde contribuiu com novos elementos para caracterizar essaexperiência. Foi desenvolvido estudo comparativo das condições de saúde das trêscomunidades por meio de um censo com aplicação de questionários para 202 famílias,observação estruturada e discussões em grupo. Historicamente, as políticas de saúde para ocampo no Brasil estiveram associadas aos interesses econômicos ligados à garantia de mão-de-obra sadia para a exploração dos recursos naturais. Mesmo assim, os maiores avançosdessas políticas ocorreram nos períodos históricos em que os trabalhadores rurais estiverammais organizados. A resposta do Estado a essas pressões puderam ser entendidas comoestratégias de legitimação frente à sociedade e cooptação dos movimentos sociais. Por meioda realização da análise fatorial discriminante, as três comunidades apresentaram 89% declassificação correta, reforçando a hipótese de que são realmente diferentes entre si. Ostrabalhadores bóias-frias apresentaram alto índice de insegurança alimentar (39,5%), quase odobro da proporção entre as famílias acampadas e quatro vezes maior que as assentadas.Com renda variável e baixa, estão também mais expostos aos agrotóxicos (85,2%) secomparados aos assentados (26,9%) e acampados (9,5%). A produção animal desenvolvidapor todas as famílias assentadas foi uma característica marcante, ao contrário das famíliasbóias-frias que praticamente não contavam com essa possibilidade na cidade. O SUS não tematendido às necessidades de saúde segundo a opinião de quase 70% das famílias assentadase acampadas estudadas em Unaí-MG, sendo que o acesso é uma das questões maisimportantes. Para a maior parte dessas famílias a única forma do sistema atender a suasnecessidades será após reinvidicações e pressões sobre o governo. Na noção de saúdeapresentada pelo MST, a intersetorialidade e a eqüidade são princípios fundamentais,expressando conceito amplo associado ao projeto de transformação da sociedade brasileira. Odiferencial de sua ação está no processo organizativo e nos princípios que resgatam apolitização da saúde, valorizando a promoção e a participação popular. O MST tempressionado o Estado no processo de elaboração e execução de políticas públicas, tendo sidofundamental na criação do Grupo da Terra e das mudanças no cálculo do Piso de AtençãoBásica -PAB-, que incluiu a população assentada. A agenda de luta de movimentos sociaiscomo o MST tem exigido do Ministério da Saúde o desencadeamento do processo deconstrução de uma política para a população do campo inédita em termos participativos. Essapolítica poderá fornecer oportunidade para novo ciclo do SUS, rumo a um projeto de sociedademais justa e democrática.

Palavras-chave: saúde no campo, saúde rural, políticas de saúde, epidemiologia, condições desaúde, MST, bóias-frias, saúde do trabalhador rural

Page 14: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

14

ABSTRACT

The present paper characterizes the official health policies for the rural population in Brazil, bycomparing the historical context, principles, objectives, strategies and their results. The concreteelements that enabled the implementation of those policies were investigated, as well as howthe experience of settled and squatting MST and temporary rural workers families (bóias-frias)can contribute to assess this process. The documental analyses of the official policies (1960 to2005) and of the MST experience (1998 to 2005) were performed. A discussion group with theMST’s National Health Sector contributed with new elements to characterize that experience. Acomparative study was conducted in three communities by means of a survey applied to 202families, structured observation and group discussions. Historically, rural health policies in Brazilhave been associated with economic interests aiming to ensure healthy labor to exploit naturalresources. Even so, the greatest advances in these policies occurred in historical periods inwhich rural workers were better organized. The State’s response to these pressures could beperceived as strategies of legitimization before society and cooptation of social movements.Through the discriminating factor analysis, the three communities produced an average of 89%correct classification, reinforcing the hypothesis that they were different from each other. Thetemporary rural workers showed a high level of food insecurity (39.5%), almost double that ofthe squatting MST families and four times that of the settled MST families. With a varying andlow income, they are also more exposed to pesticides (85.2%) if compared to the settled andsquatted families (26.9% and 9.5%, respectively). The livestock production of all the settledfamilies was a remarkable characteristic, unlike the families of temporary rural workers whovirtually could not count on that possibility in the cities and towns. The public health service(SUS) has not met the health needs of almost 70% of the families settled and squatted thatwere studied in Unaí, MG, with lack of access appearing as a major issue. For most of thesefamilies, the only way for the system to meet their needs is after petitions and pressure on thegovernment. In the notion of health presented by the MST, intersectoriality and equity are keyprinciples, thus expressing a broad concept associated with a project of transformation of theBrazilian society. Their action is different in its organizational process and in principles thatrescue the politization of health, valuing popular promotion and participation. The MST has putpressure on the State in the process of designing and executing public policies and has beeninstrumental in the creation of the Grupo da Terra (Earth Group) and in the changes in thecalculation of the Piso de Atenção Básica –PAB (Minimum Basic Assistance), which benefitsthe settled population. The agenda of social movements like the MST has required that theMinistry of Health take measures to build a policy for the rural population which has never beenso participatory. This policy may provide an opportunity for a new SUS cycle, towards a fairerand more democratic society.

Keywords: rural health, health policies, epidemiology, health conditions, MST, rural temporaryworkers, rural worker’s health

Page 15: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

15

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho se remete às condições desaúde da população do campo, destacando,especialmente, o contingente organizadopelo MST e os assalariados rurais comtrabalho temporário, aqui denominados debóias-frias1. Segundo vários autores(Figueiredo et al, 1987; Faria et al, 2000;Veiga e Burlandy, 2001), a produçãocientífica no Brasil ainda é insuficiente paraexplicar as complexas relações existentesentre as condições de saúde desses grupose seus determinantes.

A estrutura fundiária brasileira (Economia-IBGE, 1996) é caracterizada por 2,4 milhõesde pequenos proprietários com menos de10ha, o que equivale a 50% do total depropriedades, mas corresponde apenas a2% de todas as terras. Na outro extremo, 49mil grandes proprietários de terras (acimade 1000ha), representando apenas 1% daspropriedades, possuem 45% de todas asterras agricultáveis do Brasil. O censoagropecuário indica que de 1985 a 1996foram assentadas 320 mil famílias emaproximadamente 1500 assentamentos2 do 1 Trabalhador rural que vive de trabalhossazonais segundo as épocas de plantio ecolheita. Comumente explorados e sem vínculoempregatício. Não moram nas fazendas, sãolevados para trabalhar de madrugada, em ônibuse caminhões. Cada um é responsável pela suaalimentação; levam marmitas que na hora doalmoço já estão frias – daí a origem do nomebóia-fria (Bertolini, 2005).2 Diversos estudos têm apontado para o fato deque os “assentamentos de reforma agrária”,conforme aparecem no discurso governamental,englobam situações com origens bastantediferenciadas: regularizações fundiárias emterras ocupadas por vezes há décadas por“posseiros”; áreas de conflitos gerados pelatentativa de expulsão de trabalhadores que hámuito viviam na terra como “rendeiros” ou“agregados”; áreas improdutivas ocupadas pormovimentos de luta pela terra (como o MST) outambém por sindicatos de trabalhadores rurais;reservas extrativistas, fruto da luta deseringueiros pela permanência em terras queexploravam há gerações; usinas falidas,posteriormente desapropriadas, onde foramalocados os próprios trabalhadores queanteriormente eram assalariados (Leite et al,2004).

País, porém 400 mil pequenos proprietáriosvenderam suas terras somente entre 1995 e1996.

Os dados do censo de 2000 sãoexpressivos das condições de saúde decinco milhões de famílias rurais que vivemcom menos de dois salários mínimosmensais e possuem os maiores índices demortalidade infantil, de incidência deendemias, de insalubridade e deanalfabetismo, caracterizando uma situaçãode pobreza decorrente das restrições aoacesso aos bens e serviços indispensáveisà vida (Brasil, 2004a).

A população rural brasileira representa 19%da população total, sendo que 15 milhõesde agricultores - 37% das famílias rurais -vivem abaixo da linha da pobreza, e 11%vivem somente da aposentadoria rural(BRASIL, 2004a). Estima-se que existam4,8 milhões de famílias sem terra no País(Morissawa, 2001).

Frente ao contexto de desigualdades, essaspopulações buscaram várias formas deorganização política por meio demovimentos como as Ligas Camponesas,na década de 1950, ou mesmo criandoassociações, sindicatos e entidades como aConfederação Nacional dos Trabalhadoresda Agricultura - CONTAG. Em fins dadécada de 1970, o processo de aberturademocrática, o fracasso de váriosprogramas de desenvolvimento regionalcomo o de colonização da Amazônia, odesemprego nas cidades, e aconscientização de camponeses por meioda Comissão Pastoral da Terra -CPT-propiciaram a mobilização de agricultoresnão proprietários em vários Estados para seorganizar e lutar por terra. O MST foi frutodessa conjuntura e representou a fundaçãoe organização de um movimento decamponeses de âmbito nacional de luta porreforma agrária. Até 2004, o MST (2004) jáatuava em 23 Estados, envolvendo mais de1,5 milhão de pessoas.

A dinâmica das ocupações é retratada porFernandes (2000) como espaço de luta eresistência. Para esse autor a ocupação é

Page 16: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

16

condição da territorialização. A terraconquistada é uma fração do território, ondeos Sem Terra se organizam parapromoverem um novo grupo de famílias queirá realizar uma nova ocupação,conquistando outra fração do território.Assim, a luta se renova e se amplia, comesses trabalhadores migrando por todo opaís, plantando as raízes da luta e minandoa concentrada estrutura fundiária.

A escolha do MST para este estudo se devea seu papel estratégico na sociedadebrasileira, também destacado no relatóriofinal da XII Conferência Nacional de Saúde(2003). Considerado um dos atores a seremarticulados para a implantação de umapolítica de reforma agrária que fixe otrabalhador rural na terra, esse movimento,a partir de sua experiência e organização,pode contribuir para a construção de umapolítica de saúde para o campo.

Para elaboração do projeto de Tese foirealizada uma primeira discussão com oColetivo Nacional de Saúde do MST sobreas questões prioritárias que mereceriam serpesquisadas. A idéia inicial sugerida foi a deavaliar se a questão saúde era umdeterminante para a viabilizar a implantaçãode assentamentos de reforma agrária. Aolongo do processo de elaboração daproposta de pesquisa, esse objetivotransformou-se na caracterização e análiseda questão saúde tal como era elaboradapelo MST, comparando a proposta depolítica de saúde desse movimento com aspolíticas oficiais.

Durante esse percurso, foi consideradaoportuna a inclusão de uma comunidade debóias-frias para comparar as condições desaúde desses grupos com os que vivem emáreas de reforma agrária.

De forma a aprofundar essa análise, foiproposta a realização de um grupo dediscussão com o Coletivo Nacional deSaúde do MST e entrevistas com sua base,mas por dificuldades operacionais não foipossível gravar esses encontros, o quegerou limitações no registro dessasatividades. No decorrer da pesquisa, o MSTfoi identificado como um ator estratégico na

construção da política, mas não como umaentidade que desenvolvesse uma políticaprópria de saúde. Em função dessasquestões, os objetivos foram recolocados.

Finalmente, este trabalho buscoucaracterizar as políticas oficiais de saúdepara a população do campo, analisando ocontexto histórico, princípios, objetivos,estratégias e resultados. Também foraminvestigados os elementos concretos queviabilizaram a implementação dessaspolíticas, e como as experiências dasfamílias assentadas e acampadas do MST ede famílias bóias-frias de Unaí-MG podemcontribuir para avaliar esse processo.

A primeira parte da Tese trata das políticassociais e das categorias fundamentais parase analisar uma política de saúde. Tambémforam levantados os diversos estudoscientíficos e pesquisas sobre as condiçõesde saúde da população do campo no Brasile no mundo, enfocando seus objetivos,desenhos metodológicos e principaisachados.

No capítulo de resultados, como primeiroeixo da análise, foi apresentada a evoluçãohistórica das políticas oficiais com destaqueao Fundo de Assistência ao TrabalhadorRural -FUNRURAL-, o Programa deInteriorização das Ações de Saúde eSaneamento –PIASS- e a atuação maisrecente do SUS. Essas políticas foramanalisadas buscando-se um diálogo com aexperiência do MST na saúde.

Como segundo eixo de análise, foramcomparadas as condições de saúde de trêscomunidades em Unaí-MG (assentados,acampados3 e bóias-frias) avaliando-se oque os sujeitos pensam e constroem emrelação ao processo saúde-doença,

3 Os acampamentos são espaços e tempos detransição na luta pela terra. Podem serconsiderados realidades em transformação euma forma de materialização da organização dossem-terra. Trazem em si os principais elementosorganizacionais do movimento, epredominantemente, são resultados deocupações, portanto, espaços de lutas e deresistência (Fernandes, 2000).

Page 17: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

17

características sociodemográficas efamiliares, condições de vida, trabalho eprodução, presença de animais deprodução, domésticos e sinantrópicos; alémde identificação da operacionalização daspolíticas de saúde. A bibliografia científicaexistente, os documentos, e discussõesrealizadas com o MST subsidiaram esseprocesso.

Ao final, ao mesmo tempo em que seexpuseram importantes diferenciais entreesses três grupos, foram levantadoselementos para contribuir na construção deuma política de saúde para as populaçõesdo campo no Brasil.

2. MARCO TEÓRICO

2.1 Políticas públicas de saúde

Existe uma grande pluralidade de modelosconceituais para o estudo das políticassociais. Longe de esgotar todas asabordagens serão levantadas algumasdefinições e categorias de análise parapermitir avaliar as ações do Estado naspolíticas de saúde para as populações docampo.

Segundo Marshall (1967),

...a expressão política social pode serempregada com referência à política dosgovernos relacionada à ação que exerçaum impacto direto sobre o bem-estar doscidadãos, ao proporcionar-lhes serviços ourenda (p.7).

Várias reformas sociais foram baseadas noprincípio de que o Estado era responsávelpelo bem-estar da “massa do povo” e queestava investido da autoridade de interferirnas liberdades individual e econômica a fimde promover o referido bem-estar. Anovidade dessa idéia residia na suadivergência da concepção antecessora,segundo a qual o Estado se ocupavaapenas com os miseráveis e osdesamparados, e que sua ação embenefício deles não devia entrar em choquecom a vida normal da comunidade(Marshall, 1967).

A Fundação de Economia e Estatística (Apolítica -FEE- 1983) ao discutir o papel doEstado afirma que esse é dado basicamentepor meio das políticas sociais que buscam asua legitimação frente à sociedade. Poroutro lado, o sentido de sua atuação naárea social vincula-se, fundamentalmente,com as transformações relativas aoprocesso de acumulação. Nesse contexto, apolítica social do Estado é dirigida tambémno sentido das questões sociais do campo.Mas, sendo o capitalismo um modo deprodução que induz a uma concentraçãocrescente do capital, da força de trabalho,dos meios de produção e das decisões, ourbano transforma-se no eixo dinâmico daeconomia e no locus onde se acirram ascontradições sociais. Conseqüentemente, aesfera governamental vai ser muito maissensível à problemática urbana. Aviabilidade da tomada de medidas para aárea social vai ser definida pelo jogo dasforças políticas em cada conjuntura (Apolítica -FEE- 1983)

Viana (1997, p. 207), ao analisar osdiversos enfoques metodológicos para oestudo das políticas sociais, sugereconceituar as políticas públicas como“tentativas de regular situações queapresentam problemas públicos, situaçõesessas afloradas no interior de umacoletividade ou entre coletividades”. Assimas políticas sociais são “expressões de umtipo específico de intervenção estatal, cujafinalidade é proteger os indivíduos contra osriscos inerentes à vida individual e social” (p.208).

Já Vianna (1998), ao estudar a“americanização das políticas sociais noBrasil”, resgata as diversas definições de“Welfare State4”. Embora diferentes emabrangência e significados, os conceitospassam pela concepção de que a sociedadese solidariza com o indivíduo quando omercado o coloca em dificuldades. Segundoessa autora, a privatização e seletividadeconstituem os eixos da polêmica que agitou

4 Estado de Bem-Estar Social. Expressãocunhada pelos ingleses nos anos 40 para indicaruma espécie de mundo novo no qual queriamviver (Vianna, 1998).

Page 18: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

18

os sistemas de bem-estar no final do séculoXX. Na versão neoliberal, que só vê soluçãono mercado, privatização se confunde comlucro, e seletividade, com assistencialismo.A modernização econômica levada a cabodurante o regime autoritário implantado em1964 teve papel importante nesse processoao incentivar a expansão capitalista,recrutando para o universo lucrativo setoresda proteção social antes residuais (aassistência médica, por exemplo) eestendeu oportunidades (nãonecessariamente supridas) de inclusão demilhares de marginalizados.

Vianna (1998) também levanta as correntesde pensamento que tratam da origem edesenvolvimento do “Welfare State”. Apesarda diversidade de explicações, como recorteteórico do nosso objeto de estudo,destacamos as hipóteses que associamaspectos estruturais do processo deacumulação capitalista a fatores comoconsciência de classe, organização sindicale a disposição de setores dominantes arealizar alianças interclasses. A forçapolítica e organizacional da classetrabalhadora – expressa em greves econtestações – induz ao alargamento daproteção, cuja contrapartida, no entanto, é omaior controle exercido pelos aparelhosburocráticos sobre os própriostrabalhadores.

Outros autores citados por Viana (1997)reforçam a insuficiência dessa abordagemcomo causa única e apontam para anecessidade da combinação de várioselementos explicativos, analisados em umaperspectiva histórica. Os processos deindustrialização, urbanização emodernização, de expansão do mercadocapitalista e de democratização, foramelementos formadores do contexto geral noqual emergiram os modernos sistemas deproteção social. A crise das políticaspúblicas provoca uma mobilização deatores, na qual o ambiente sócioeconômicoe a lógica redistributivista produzemcoalizões. Os ambientes culturais einstitucionais produzem as bases de umprojeto. Esses movimentos desembocamem uma arena de competição política, em

que a busca pelo consenso produz areforma social (Viana, 1997).

A partir desse referencial, ao se examinaruma política, devem ser avaliadas asagências estatais “fazedoras da política”, osatores participantes e as estratégias deinteração, os mecanismos, critérios e estilosdecisórios utilizados pelas instituiçõesresponsáveis; as inter-relações entrevariáveis internas (agências e atores); e asexternas que influenciam esse processo.Em alguns casos podem ser construídosmodelos de causalidade entre as variáveisque interferem nesse processo: o meiosocial e político, os atores participantes, asagências estatais e os conteúdos daspolíticas (princípios, metas e objetivos).

Delgado (2002), ao estudar auniversalização de direitos sociais no Brasilpor meio da avaliação da políticaprevidenciária rural inaugurada pelaConstituição de 1988, constatou impactospositivos sobre a agricultura familiar, aredução da pobreza, a igualdade degêneros e diretamente sobre a proteçãosocial de idosos e inválidos.

Tais achados rumaram na contracorrentedas idéias-força de política social quepredominaram nos anos de 1990. Trazendoessa polêmica para o setor saúde, Cohn(2005) afirma que na América Latina asestratégias para se fazer frente às novasrestrições fiscais e monetárias impostaspela nova ordem global traduziram-se naformulação de políticas orientadas pelafocalização dos gastos. Passou-se então ase travar um embate ideológico e políticosobre a reforma da saúde:

...de um lado o modelo focalista, quedefende a concentração de recursospúblicos nos segmentos mais pobres dapopulação, investindo-se recursos técnicospara sua identificação precisa, uma vezque para os demais segmentos trata-se dearticular recursos públicos e privadosincluindo sua participação nos gastos comsaúde. De outro lado, o modelouniversalista, que defende o acesso aosbens públicos essenciais como um direitodo cidadão, independentemente da sua

Page 19: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

19

situação social, sem qualquer forma dediscriminação, seja ela positiva ounegativa; e neste caso, saúde como umdireito é responsabilidade do Estado edeve, portanto, ser financiada comrecursos provenientes dos orçamentospúblicos das distintas esferas de governo(Cohn, 2005 p. 393).

Nesse sentido, a experiência brasileira é aexceção que confirma a regra na AméricaLatina. Ao mesmo tempo apresenta gravescontradições que segundo Vianna (1998)originaram-se na modernização econômicalevada a cabo pelo regime autoritárioimplantado em 1964 e aprofundado natransição democrática com as soluçõesneoliberais. O SUS, teoricamente universal,é seletivo na prática em grande parte pelascontingências geradas pelo modelo dedesenvolvimento econômico brasileiro.

Em síntese, para se analisar as políticas desaúde, é preciso partir do contextosócioeconômico onde são produzidas ascoalizões, que associadas a um ambienteinstitucional favorável, produzem a basepara um projeto de reforma social. Dessemodo, torna-se fundamental identificar osatores do processo, as estratégias deinteração e os critérios decisórios utilizados,para que os conteúdos das políticas possamser devidamente comparados.

2.2 Estudos sobre as condições de saúdeda população do campo

O enfoque dado à expressão “condições desaúde” neste trabalho será o de suadefinição ampliada, como expresso na Lei8.080 (Brasil, 1990), que regulamentou oSistema Único de Saúde -SUS- ou seja, a“saúde tem como fatores determinantes econdicionantes, entre outros, a alimentação,a moradia, o saneamento básico, o meioambiente, o trabalho, a renda, a educação,o transporte, o lazer e o acesso aos bens eserviços essenciais; os níveis de saúde dapopulação expressam a organização sociale econômica do País”.

Josué de Castro, um dos maioresestudiosos da questão da fome no mundo,já fazia a crítica da orientação de nossa

política agrícola em 1946, por ter sidoinicialmente direcionada peloscolonizadores europeus e depois pelocapital estrangeiro. Essa política focou naprodução que visava a exportação em vezde priorizar uma agricultura intensiva desubsistência, capaz de matar a fome dopovo brasileiro (Castro, 2003).

Fleuret e Fleuret (1980) fizeram uma revisãode estudos sobre mudanças na estruturaprodutiva agrícola de comunidades e osimpactos na nutrição das famílias. Muitosautores pesquisados concluíram que oacesso à terra estava significativamenteassociado ao estado nutricional dascrianças e que o mesmo poderia serutilizado como indicador de saúde enutrição. Também apontaram como riscosao estado nutricional das populações ruraisas mudanças nos processos produtivos queprivilegiam a monocultura e não valorizam adiversidade e as tradições alimentareslocais.

A realização de inferências sobre a relaçãoentre desenvolvimento socioeconômico eestado nutricional é avaliada como umaquestão difícil e complexa, que, segundoFleuret e Fleuret (1980), ocorre em funçãoda etiologia multifatorial das deficiênciasnutricionais. Os problemas principais estãorelacionados à dificuldade de se controlartodas as variáveis que possuem papelrelevante na questão e na escolha dodesenho epidemiológico mais adequadopara a realização das inferências.

Victora (1983) observou no Rio Grande doSul que a desnutrição e a mortalidadeinfantil eram mais elevadas entre filhos deempregados rurais em relação a filhos deproprietários, o que explica em parte asdiferenças observadas entre asmicrorregiões estudadas.

Segundo Lira et al (1985), a contradiçãoentre o grave quadro epidemiológico dascarências nutricionais e o potencial derecursos naturais e meios técnicosdisponíveis ressalta a evidência de que adesnutrição, em suas variadasmanifestações, deve ser basicamenteentendida como um problema de distorção

Page 20: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

20

do quadro sócioeconômico. Esses mesmosautores realizaram estudo sobre adistribuição energético-protéica, anemia ehipovitaminose A em relação ao acesso etamanho da propriedade rural, conformeestá indicado no Quadro 1 (Lira et al, 1985).

Esse estudo concluiu que a média deingestão energética das famílias sem-terrafoi de 1.605 calorias, observando-se que, àmedida que aumentava a quantidade deterra possuída, maior era a média deingestão calórica, chegando a atingir maisde 3.000 calorias entre os grandesproprietários (com mais de 50ha), quecorresponde à média dos valoresencontrados nos países desenvolvidos(Romani e Amigo, 1986).

Victora et al (1986), por meio de outroestudo realizado no Rio Grande do Sul(Quadro 1), afirmaram que a classe socialcategorizada por meio da posse da terraapresentou um importante papel naexplicação dos diferenciais encontradospara a desnutrição infantil nesse estado.Esses autores ainda comentaram oresultado de outros estudos realizados naAmérica Latina em que a posse da terra ouseu tamanho não estava associado aalterações significativas no estadonutricional das crianças. Esses resultadosdiferenciados poderiam estar afetados poroutros fatores como o nível de organizaçãopolítica dos proprietários ou trabalhadores, aqualidade do solo, cultura alimentar e osprodutos agrícolas predominantes - desubsistência ou para o mercado.

Partindo do enfoque do nível deorganização, Yusuf et al (1993), aocompararem o estado nutricional decrianças pré-escolares de pequenosproprietários rurais individuais e decooperativados na Etiópia, identificou umamelhor situação nestes se comparados comos pequenos proprietários individuais(QUADRO 1).

Os achados apresentados no QUADRO 1,de acampados do MST, sugerem que estascrianças encontram-se fortemente afetadaspelo nanismo. Apesar dessa condição serreconhecida como uma das mais visíveis

manifestações da desnutrição nos paísesperiféricos, destaca-se que o caráterconcentracionista da propriedade da terra –parte integrante do modelo dedesenvolvimento adotado no Brasil – étambém um fator estrutural na determinaçãodesse perfil de saúde. Diversos autores queestudaram não só as questões relativas àpropriedade e ao acesso aos meios deprodução rural, como também a situação desaúde da população, apontaram para ummaior risco de desnutrição (e mortalidade) aque estão submetidos os filhos dostrabalhadores sem-terra (Ferreira et al,1997). Em relação aos assentamentos, foiidentificado uma situação diferenciada.Veiga e Burlandy (2001), no Rio de Janeiro,encontraram déficits nutricionais bem abaixodos citados por Ferreira et al (1997). Castroet al (2004) também obtiveram resultadosmais baixos, com 7,6% de desnutridos entrecrianças com idade inferior a 5 anos, menorque a média nacional de 10,5%. Essesresultados reforçam a tendência demelhores índices de nutrição após o acessoa terra (QUADRO 1).

O estado nutricional das crianças foiutilizado em El Salvador para avaliar osesforços de reconstrução do país, após os 6anos do acordo de paz que pôs fim aGuerra Civil (1980-1992). O impacto dadistribuição de terras além das melhoriasdas condições de moradia, saneamento eserviços de atenção primária a saúde foramavaliados para uma amostra representativaque envolveu 761 crianças menores de 5anos que viviam em 27 vilas. Esse estudotransversal encontrou uma prevalência denanismo de 32,4% (Brentlinger et al, 1999).Conforme indicado no QUADRO 1, àmedida que as famílias possuíam maisterra, menor era o risco de as criançasapresentarem nanismo, enquanto o risco denanismo era maior nas casas das criançasque não contavam com água encanada secomparadas com as que utilizavam esseserviço. Outros autores também reforçarama importância do acesso à água encanadadentro de casa como um fator de proteçãopara agravos à saúde da população docampo como as parasitoses intestinais(Carneiro et al, 2002).

Page 21: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

21

Kassouf (2005), ao analisar os dados daPesquisa Nacional por AmostrasDomiciliares - PNAD de 1998 -, verificou quea saúde da população do campo é avaliadacomo mais precária se a compararmos coma da população urbana. A falta dedisposição adequada de dejetos e de águaencanada foi bem maior do que na áreaurbana, o que pode estar associado àocorrência de doenças caracterizadas porsintomas gastrointestinais apresentados noQUADRO 1, também citados por Schmidt etal (1998) e Saúde - UnB (2001). As doresnos braços ou mãos também podem estarassociadas a um maior trabalho braçal nomeio rural. Destaca-se ainda a importânciadas doenças respiratórias no perfil demorbidade das populações assentadas eacampadas (Saúde - UnB 2001) (QUADRO1).

O coeficiente de mortalidade infantilapresentado no QUADRO 1 (Saúde - UnB,2001) conflitou com estudos da (Principais -FAO 1992), nos quais a mortalidade infantilem assentamentos era justamente a metadeda média nacional. Outro achado dapesquisa informou que o coeficiente demortalidade por causas externas emassentamentos (194,1/100.000) era maiorque o dobro se comparado ao deacampamentos (70,2/100.000), e que oshomicídios eram a causa principal de morte(UnB, 2001). As condições de saúde dasfamílias assentadas foram um dos aspectosdas condições de vida com menores índicesde avaliação de impacto se comparadas àsituação anterior (Leite et al, 2004).

Em relação à utilização dos serviços desaúde, foi verificado que uma proporçãobem maior de indivíduos utilizou o sistemapúblico de saúde no meio rural emcomparação ao urbano. Foi identificada atendência maior de procura de atendimentoà saúde para exames de rotina ou deprevenção na área urbana, enquanto nomeio rural o principal motivo estavaassociado a doenças (Kassouf, 2005).Dados da PNAD do ano de 2003continuaram a apresentar as especificidadesdessas duas populações. A cobertura porplano de saúde foi expressivamente maior(28%) na população residente em áreas

urbanas, comparativamente aos queresidiam nas áreas rurais (6%). Issoreforçou a importância que o SUS adquiriupara as populações rurais. Nos 12 mesesque antecederam a entrevista, 64,9% dapopulação urbana e 51,6% na populaçãorural declararam ter consultado um médico.A população urbana também apresentoumaior número de consultas médicas percapita (2,6) do que a rural (1,8). Napopulação urbana 13,6% das pessoasnunca consultaram dentista, e na populaçãorural, 28,0% das pessoas. Entretanto,praticamente não se observaram variaçõesnos coeficientes de internação entre áreasurbanas e rurais (7,0 e 6,9 por 100 pessoasem cada grupo, respectivamente)(Pesquisa- IBGE, 2003).

Cerca de 32,6% dos acampamentos e23,7% dos assentamentos do MST nãocontavam com serviços de saúde. Apenas56,8% dos assentamentos possuíam postosde saúde próximos a suas áreas, sendo queapenas 30,9% destes estavam emfuncionamento (Saúde - UnB, 2001).Embora a presença de agentes de saúde,geralmente pagos pelas prefeituras, sejasignificativa (78% dos projetos), os postosde saúde existiam em apenas 21% dosassentamentos pesquisados (Leite et al,2004). Nos assentamentos que têm postode saúde, raramente há presença regular demédicos. Dada essa precariedade, osassentados procuravam os serviços desaúde na sede do próprio município (em92% dos projetos), em municípios vizinhos(42% dos projetos) ou em cidades que sãopólos regionais (25%) (Leite et al, 2004). Asfamílias não tinham acesso a serviços desaúde em 45,70% das áreas deassentamento, mas, contrariando os valoresapresentados anteriormente, Schmidt et al(1998) encontraram que a presença deagentes de saúde era desconhecida ouinexistente em mais de 40% dosassentamentos pesquisados (QUADRO 1).

Ao se avaliar a qualidade do acesso aosserviços nos assentamentos que contavamcom postos de saúde, a assistência foiclassificada como regular por 6,3% dosassentados e precária por 11,7%, enquantoapenas 4,2% a classificaram como sendo de

Page 22: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

22

boa qualidade. A assistência nos postos desaúde localizados nas cidades foi avaliadacomo de boa qualidade por 14,7% dosassentados, enquanto 24,1% aclassificaram como regular e 25,8% comoprecária (Schmidt et al, 1998). Em relação ànão-procura dos assentados por serviços desaúde ao apresentarem problemas desaúde, os principais motivos foram: 40% pordificuldade de acesso físico ao serviço desaúde, 26% por não ter a unidade de saúdeno local, 8% referiram que “o serviço nãoatenderia”, 2,03% que “não tinha direito deser atendido” (Saúde - UnB, 2001). Kassouf(2005), ao avaliar o não-atendimento daspessoas pelos serviços de saúde encontrouuma diferença entre as áreas urbana e ruralno item “esperou muito e desistiu”, comproporção no meio rural quase o dobro dourbano. As porcentagens mais elevadasocorreram no item “não conseguiu vaga ousenha” e “não tinha médico atendendo”.

Uma pesquisa realizada pela FAO/INCRA(Bittencourt et al, 1999) identificou ascondições que têm potencializado e as quetêm restringido o desenvolvimento deprojetos de assentamentos da reformaagrária no Brasil. A organização política dosassentamentos foi uma das variáveislevadas em conta no trabalho. A pesquisaindicou que um dos fatores presentes emalguns assentamentos com maiordesenvolvimento foi a presença do MST(Bittencourt et al, 1999, p 58) :

...como este movimento social tem forteação política reivindicatória, estesassentamentos possuem grandecapacidade de interlocução, pressão enegociação política com os diferentesespaços públicos, aspecto que não éobservado nos assentamentos com menordesenvolvimento que geralmente possuemuma pequena relação com os movimentossociais.

Outro aspecto importante observado foi quenos assentamentos onde há organizaçãocoletiva da produção, quase não existemdiferenciações internas entre osassentados, principalmente se relacionadascom a forma de produzir e gerar renda,demonstrando que a organização é fator de

diminuição das desigualdades. Esse fato éacompanhado de uma melhor distribuiçãodos solos nos assentamentos que possuemessa forma de organização produtiva(Bittencourt et al, 1999).

Guedes (2006), ao avaliar as condições devida de um assentamento do MST, discuteque a facilidade e a riqueza da alimentação,a liberdade de decisão, a possibilidade deplantar, colher e criar animais, o uso daforça de trabalho em benefício próprio e dafamília; enfim o controle sobre a própria vidaé o aspecto mais marcante da conquista daterra.

Em relação ao bóia-fria, alguns estudos queaprofundaram a análise dos determinantesdas suas condições de saúde na zonacanavieira de São Paulo (Alessi e Navarro,1997; Silva, 1999) e na região nordeste doPaís (Moreira e Watanabe, 2006)encontraram limitações alimentares paraessas populações.

Segundo Alessi e Navarro (1997), aexpansão do capitalismo na agricultura, aoprovocar migrações expressivas do campopara a cidade, determinou alterações nospadrões de morbi-mortalidade da populaçãodo País. A partir da década de 1960,intensificam-se as transformações no meiorural, repercutindo negativamente nascondições de vida e na saúde dostrabalhadores do campo. Essastransformações foram se processando nonível da produção em si e também no dasrelações patrão-empregado, resultando emaumento e diversificação agrícola e tambémna recriação de antigas e na emergência denovas formas de organização do trabalho. Ocamponês, ao ser expulso da terra, passoua residir nas periferias das cidades,encontrando no mercado a possibilidade deofertar a sua força de trabalho a grandesempreendimentos agrícolas. Às suascondições de saúde já debilitadasacresceram-se novos padrões de desgasteque se traduziram em envelhecimentoprecoce, morte prematura, doençascardiovasculares, degenerativas, mentais,entre outras (Alessi e Navarro, 1997). Taistrabalhadores se expõem, diariamente, acargas físicas, químicas e biológicas, que se

Page 23: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

23

traduzem em uma série de doenças,traumas ou acidentes a elas relacionadas,tais como dermatites, conjuntivites,desidratação, câimbras, dispnéia, infecçõesrespiratórias, oscilações da pressão arterial,ferimentos e outros acidentes (inclusive osde trajeto). Além destas cargas laborais,destacam-se aquelas de caráterbiopsíquicos, que configuram padrões dedesgaste manifestos por meio de dores nacoluna vertebral, dores torácicas, lombares,de cabeça e tensão nervosa (estresse),além de outros tipos de manifestaçõespsicossomáticas que podem se traduzir,principalmente, por quadros de úlcera,hipertensão e alcoolismo (Alessi e Navarro,1997). Silva (1999) também encontrou, namesma região do interior de São Paulo, altaprevalência de doenças do aparelhorespiratório e de alergias causadas pelacana queimada. A incapacidade do corpoem se moldar ao trabalho e à disciplinaimposta, aliada ao baixo salário, àsincertezas de se encontrar trabalho, àdominação provocavam a “doença dosnervos”, as tensões, a hipertensão e até aloucura. Estes corpos doentes, segundo osmédicos da região, ainda eramrelativamente jovens (Silva, 1999)(QUADRO 1).

Na zona canavieira da Paraíba também foiencontrado maior risco de acidentesrelacionados à presença de animaispeçonhentos, à insegurança dos transportesutilizados nos seus deslocamentos,manuseio de instrumentos de trabalhocortantes e no uso de agrotóxicos entreesses trabalhadores (Moreira e Watanabe,2006).

Outro importante fator de risco à saúde dostrabalhadores do campo consiste naexposição aos agrotóxicos. O Brasil é o 3ºmaior consumidor de produtos agrotóxicosno mundo e o primeiro no âmbito daAmérica Latina, e, embora tenha logradoavanços consideráveis no controle daprodução e consumo desses produtos nosúltimos anos, ainda apresenta condiçõessociais e sanitárias compatíveis àquelas dospaíses periféricos (Relatório - ANVISA2005). Faria et al (2000) e Soares et al(2003), ao pesquisarem o processo de

trabalho rural no Rio Grande do Sul e emMinas Gerais, encontraram altos índices deexposição a agrotóxicos em variadastipologias de estruturas fundiárias.Nishiyama (2003), ao estudar a utilização deagrotóxicos em áreas da reforma agrária noParaná, encontrou um percentual de uso de62,6%, sendo que 19,7% dos entrevistadosrelataram intoxicações por esses produtos(QUADRO 1). Reforçando a gravidadedesse quadro, Faria et al (2007) avaliouvários sistemas oficiais de informação quenotificam casos de intoxicações poragrotóxicos no Brasil, e nenhum delesrespondia ao papel de sistema de vigilância.Além disso, os receituários agronômicosrevelaram limitações para se avaliar aexposição. A intoxicação aguda é a facemais visível do impacto desses produtos nasaúde, mas a carga crônica de doençaassociada a seu uso ainda é poucoestudada.

Segundo Delgado (2001), a “modernizaçãoconservadora” da agricultura brasileirasignificou a elevação do nível deinvestimentos de capital no campo, masmanteve ou até concentrou ainda mais apropriedade da terra no Brasil. Estamodernização também levou à precarizaçãodas relações de trabalho, além da elevaçãodos riscos socioambientais vinculados àsatividades desse setor (Moreira eWatanabe, 2006; Miranda et al, 2007;Soares e Porto, 2007). Silva (1999) apontatambém que esse mesmo modelo queocasionou o surgimento do trabalhadorbóia-fria tem gerado o seu desaparecimentofrente ao processo de modernizaçãoagrícola, criando os “errantes do fim doséculo”. Além do impacto na saúde humana,autores como Breilh (2004) também têmanalisado como as práticas predatóriasdesse modelo têm atingido gravemente osecossistemas, colocando em risco a vida noplaneta.

Esses dados indicam as dificuldades que apopulação do campo enfrenta para teracesso aos serviços de saúde. E quandochegam até os serviços, costumam obteratenção muito aquém de suasnecessidades. Frente a tal quadro,Albuquerque et al (2000) propõem a

Page 24: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

24

elaboração de indicadores sintéticosespecíficos para contribuir na execução depolíticas de saúde mais apropriadas as suasrealidades.

De modo geral, os estudos sobre ascondições de saúde da população docampo associam o estado nutricional com aposse da terra, processos de trabalho esaúde (incluindo o uso de agrotóxicos),morbimortalidade referida e relação com osserviços de saúde. Os resultados apontampara um maior déficit nutricional à medida

que diminui a posse da terra, além deevidenciarem um perfil de saúde maisprecário da população rural se comparada àurbana. No campo, ainda existemimportantes limitações de acesso equalidade nos serviços de saúde, bem comouma situação deficiente de saneamentoambiental. O processo de “modernizaçãoconservadora” da agricultura no Brasil aindatem agravado mais esse quadro, na medidaem que criou novos riscos socioambientaispara a saúde dessa população.

QUADRO 1. Estudos sobre as condições de saúde da população do campo

1º autor, ano População Objetivos Desenho Resultados/ConclusõesLira (1985)Romani (1986);

1.257 criançasmenores de 6anos, da área

rural do AgrestePernambucano,

no nordestebrasileiro

A distribuiçãoenergético-

protéica, anemia ehipovitaminose A

em relação aoacesso e tamanho

da propriedaderural

Estudotransversal

As categorias de famíliassem terra apresentaram

67% de desnutrição, contra25% para a categoria de

famílias com propriedadesde 50 e mais hectares

(p<0,01)

Victora (1986) 800 criançasamostradas deuma região de

grandesfazendas e outra

de pequenaspropriedades

Avaliar a relaçãoentre a situação

fundiária eindicadores como

desnutrição emortalidade

Aplicação deinquérito

antropométricodomiciliar

Desnutrição e a mortalidadeinfantil são mais elevadas

entre os filhos deempregados rurais do que

entre os filhos deproprietários

Yusuf (1993) Crianças pré-escolares de

pequenosproprietários

rurais individuaise de

cooperativadosna Etiópia

Comparar o estadonutricional

Estudotransversal

Melhores condiçõesnutricionais (peso por idade43,9%(83), peso por altura

9,5% (18), e altura poridade 48,1% (91)

comparado com o grupo deindividuais,

respectivamente: 55,9%(112); 15,5% (29) ; 63,6%

Ferreira (1997) Criançasmenores de 10anos de umaocupação do

MST

Avaliar o perfilnutricional

Diagnósticonutricional.

As prevalências de déficitsnutricionais encontradas

relativas aos índices massacorporal para a idade,

estatura para a idade emassa corporal para

estatura foram,respectivamente, 19,6%,

39,8% e 2%, superando osvalores divulgados para azona rural do estado deAlagoas (8,4%, 22,7% e

1,3%)

Page 25: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

25

QUADRO 1. Estudos sobre as condições de saúde da população do campo (cont.)

1º autor, ano População alvo Objetivos Desenho Resultados/ConclusõesAlessi (1997) Trabalhadores da

cultura canavieirade Ribeirão Preto

Avaliar o processode trabalho e os

padrões dedesgaste e

reprodução daforça de trabalhoempregada nocorte da cana

Pesquisaqualitativa comobservações

diretas eentrevistas

Relaciona a exposiçãodiária dos cortadores decana a cargas físicas,químicas, biológicas e

psíquicas que geradoenças, traumas e

acidentes

Schmidt (1998) 161.556 famíliasdistribuídas em

1460 projetos deassentamentosem 26 Estadosda federação

Identificar todas asfamílias

assentadas emáreas de projetosde reforma agrária

do GovernoFederal, bem como

traçar o perfilsocioeconômico

das mesmas.

Censo dareforma agrária

A maior prevalência dedoenças nos

assentamentos foram agripe (32%), verminose(14%), diarréia (9,9%) e

malária (8,10%). As famíliasnão tinham acesso aserviços de saúde em45,70% das áreas de

assentamento. A presençade agentes de saúde era

desconhecida ou não haviaem mais de 40% dos

assentamentos

Silva (1999) Trabalhadoresrurais da Regiãode Ribeirão Preto

(SP) e Vale doJequitinhonha

(MG)

Avaliar aapreensão dosprocessos deexpropriação,exploração-dominação e

exclusão a queestão submetidosos trabalhadores

rurais.

Diversaspesquisas com

a análise darelação classe,gênero e etnia

Analisa o feixe de relaçõessociais que ocasionou o

surgimento do trabalhadorbóia-fria em 1960, bem

como o seudesaparecimento no

momento atual em virtudedo processo demodernização

conservadora da agricultura

Brentlinger(1999)

761 criançasmenores de 5

anos que viviamem 27 vilas

O impacto dadistribuição deterras além dasmelhorias dascondições de

moradia,saneamento e

serviços deatenção primária à

saúde

Estudotransversal

A baixa estatura em relaçãoà idade foi notadamente

prevalente nas famílias semterra (odds ratio-OR) para onanismo equivalente a 0,64

(95% de intervalo deconfiança -IC 0,44 - 0,93)para cada hectare de terra

cultivada que foidesapropriada. O nanismotambém foi mais prevalente

nas crianças cujas casasnão tinham água encanada(OR ajustada, 2,72; 95% IC,

1,87-3,96)

Page 26: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

26

QUADRO 1. Estudos sobre as condições de saúde da população do campo (cont.)

1º autor, ano População alvo Objetivos Desenho Resultados/ConclusõesFaria (2000) 1479

trabalhadoresrurais

Estudar o perfilsócio-demográfico

da população,conhecer as

características dotrabalho rural e

descrever aprevalência de

algumas patologiasreferidas

Estudotransversal

Cerca de 75% dostrabalhadores lidavam comagrotóxicos de vários tipos

e 12% referiramintoxicações por esses

produtos em algummomento da vida. A

prevalência de transtornospsiquiátricos foi de 36%, e a

freqüência anual deacidentes de trabalho foi de

10%

Veiga (2001) 201 crianças eadolescentes de

umassentamento

rural (RJ)

Avaliação deindicadores sócio-econômicos e perfil

nutricional

Estudodescritivo

transversal

A baixa prevalência dedéficit nutricional apesar da

exposição a fatores derisco, pode se relacionar a

presença de fatores deproteção como o acesso a

serviços de saúde

UnB(2001) 4.347 famíliasassentadas e3.560 famíliasacampadas do

MST

Conhecer asituação de saúdedos trabalhadores

rurais deassentamentos e

acampamentos dareforma agrária

Inquérito demorbi-

mortalidade eamostragem

58,3% da população deassentados e 62,5% deacampados consumiam

água sem qualquertratamento, 35,2% de

assentados e 51,8% deacampados destinavam

seus dejetos a céu aberto.Coeficientes de incidênciade doenças respiratóriastanto em assentamentos(158,2/1000) quanto paraacampamentos (190,5);

doenças infecto parasitárias(57,5/1000 e 95,2/1000) e

cardiovasculares (36,6/1000e 30,0/1000)

respectivamente. Ocoeficiente de mortalidade

infantil encontrado paraassentamentos foi de

73,6/1000 e nosacampamentos 78,7/1000

Carneiro (2002) 1207 criançasmenores de 12

anos de 11comunidades da

zona rural deCaparaó, MG

Desenvolver umindicador para as

condições desaúde ambiental

das famílias

Estudotransversal

analítico

O efeito interativo da altarelação pessoa/quarto

aumentou em 5 vezes aprevalência de ascaridíasepara as famílias que nãopossuíam água encanada

no lavatório

Page 27: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

27

QUADRO 1. Estudos sobre as condições de saúde da população do campo (cont.)

1º autor, ano População alvo Objetivos Desenho Resultados/ConclusõesSoares (2003) 1064

trabalhadoresrurais de novemunicípios de

MG

Caracterizar oprocesso de

trabalho rural,considerando

indicadores sócio-demográficos, aestrutura agrária,

práticas detrabalho

relacionadas aouso de agrotóxicos

e intoxicações

Amostra deconveniência

com aplicaçãode

questionários erealização deexames paradeterminarníveis de

colinesterasesanguínea

Cerca de 50/% dosentrevistados estavam aomenos moderadamente

intoxicados

Nishiyama(2003)

Trabalhadoresintegrantes doMST nas áreas

de reformaagrária (PR)

Analisa o uso deagrotóxico.

Inquérito sobreas condiçõesde trabalho.

A falta de capital próprionão tem limitado o uso deagrotóxicos. Um em cada

cinco trabalhadoresexpostos já sofreu

intoxicações por essesprodutos

Castro (2004) 69 crianças dezero a 60 mesesde idade de umassentamentorural do MST,

Tumiritinga (MG)

Avaliar ascondições gerais

de saúde dascrianças

Estudodescritivo

transversal

7,6% das criançasapresentavam déficits nos

índices peso/idade eestatura idade e 47,5%baixa concentração dehemoglobina. 96,1%

estavam com infestaçãoparasitária, 34% com

vacinação atrasada e amediana de tempo dealeitamento materno

exclusivo foi de 30 dias

Leite (2004) Aplicada em 39municípios comassentamentosselecionados no

Sul da Bahia,sertão do Ceará,

entorno doDistrito Federal,sudeste do Pará,oeste de SantaCatarina e Zona

canavieiranordestina

Avaliar a situaçãodos entrevistadosapós terem sido

assentados

Pesquisa emmanchas

amostrais -áreas de

concentraçãode

assentamento

Os postos de saúdeexistiam em apenas 21%

dos assentamentospesquisados com rarapresença regular de

médicos.As condições de saúde dasfamílias assentadas foram

um dos aspectos dascondições de vida com

menores índices deavaliação de impacto secomparadas a situação

anterior

Page 28: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

28

QUADRO 1. Estudos sobre as condições de saúde da população do campo (cont.)

1º autor, ano População alvo Objetivos Desenho Resultados/ConclusõesKassouf (2005) Abrangência

nacional,excluindo aregião Norte

Comparar oacesso aos

serviços de saúdenas zonas rurais eurbanas brasileiras

PesquisaNacional por

AmostrasDomiciliares

45,3% dos moradores domeio rural avaliaram seuestado de saúde como

ruim, muito ruim e regular.Maior porcentagem de

indivíduos com diarréia evômito e com dores nosbraços ou nas mãos, se

relacionados aos da áreaurbana

Guedes (2006) 40 famílias deassentamentorural do MST,Periquito (MG)

Analisa arelevância da

agricultura familiare o papel do

veterinário nessecontexto

Estudoqualitativo comrealização de

entrevistas nãoestruturadas ede observação

participante

O processo deassentamento cumprepapel fundamental na

estabilidade e na melhoriadas condições de vida das

famílias

Faria (2007) População ruralbrasileira.

Avalia os dadossobre intoxicações

por agrotóxicos.Também examinou

as informaçõessobre consumo de

agrotóxicoscontidas noReceituário

Agronômico, apartir dos dados doRio Grande do Sul.Apresenta revisão

dos estudosepidemiológicosbrasileiros sobre

agrotóxicos

Estudos dossistemas deinformação,Receituário

Agronômico erevisão

bibliográfica

A avaliação dos váriossistemas oficiais de

informação que notificamcasos de intoxicações poragrotóxicos concluiu que

nenhum deles respondia aopapel de sistema de

vigilância. Os receituáriosagronômicos revelaram

limitações para se avaliar aexposição. Os estudos

neste campo tem crescidoqualitativamente e

quantitativamente no Brasil

3. MÉTODOS E PROCEDIMENTOS.

Para a realização deste estudo, foi adotadauma abordagem integral considerandoaspectos sociais, econômicos, históricos,culturais e técnicos que se inter-relacionam.Buscou-se a integração dos olhares queenglobassem dos aspectos biológicos atéos sociais, analisando-os na perspectiva desua historicidade, articulando métodos doscampos da epidemiologia e das ciênciassociais, de forma a contribuir para umconhecimento mais adequado do processosaúde-doença, aproximando dos enfoquesde Cordeiro et al (1980), Astudillo (1984) eRosenberg (1986).

Foram utilizados dois eixos de análise. Oprimeiro caracterizou e analisou as diversaspolíticas oficiais de saúde para o campo eas relacionou à experiência do MST. Osegundo eixo se constituiu em um estudocomparativo sobre as condições de saúdede famílias de um acampamento e umassentamento do MST, e de famílias bóias-frias de Unaí-MG. Ao final, foi realizada umadiscussão na qual esses eixos dialogam deforma a contribuírem com elementos para aconstrução de uma política de saúde paraessas populações.

Page 29: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

29

3.1 Descrição e análise das políticasoficiais de saúde para as populações docampo e a experiência do MST

Conforme citado por Viana (1997), aspolíticas foram analisadas a partir docontexto sócioeconômico em que sãoproduzidas, caracterizando o ambienteinstitucional e identificando os atores doprocesso, as estratégias de interação e oscritérios decisórios utilizados. Os princípios,população alvo, objetivos, estratégias,ações, resultados e os problemas dasdiversas iniciativas oficiais e a experiênciado MST foram avaliados por essascategorias.

O método utilizado incorporou documentosde primeira mão - que não receberamtratamento analítico - e documentos desegunda mão - que já foram trabalhados deacordo com Gil (2006).

O período de estudo das políticas oficiais desaúde no campo abrangeu principalmente adécada de 1960 até o ano de 2005, quandoocorreram os programas mais importantes.Foram identificados os documentos oficiaisde textos das políticas ministeriais (saúde,previdência, trabalho, agricultura e reformaagrária) que contemplavam a questão dasaúde no campo tais como: plano nacionalde saúde, programas de saúde, portariasespecíficas, estudos e avaliações.

As informações sobre a experiência desaúde do MST foram obtidas nosdocumentos produzidos no âmbito nacional(cartilhas, planejamentos e textos) e pelosdiversos relatórios e memórias das reuniõesdo Coletivo Nacional de Saúde, além daspautas de negociação com o governofederal. O período compreendeu os anos de1998 – quando foi criado o ColetivoNacional de Saúde no MST – a 2005. Esseprocesso se concentrou no levantamento,descrição e análise da construção doentendimento da questão saúde e seusdesdobramentos no movimento. Foirealizada uma discussão de grupo com oColetivo Nacional de Saúde, por meio de umroteiro semi-estruturado (anexo A), com oobjetivo de registrar a noção de saúdedessa instância organizativa do MST.

Participaram dois pesquisadores com opapel de observadores para realização doregistro da discussão e um terceiro com opapel de facilitador (adaptação de Minayo etal, 2005). A discussão foi realizada emBrasília em dezembro de 2004 durante oencontro periódico realizado pelo Coletivo econtou com a participação de 40 pessoasrepresentando 20 estados brasileiros.

Com o intuito de comparar as políticaspúblicas oficiais de saúde para o campo,foram selecionados o ProgramaFUNRURAL, o PIASS e o SUS. A FundaçãoSESP e a SUCAM não foram destacadaspara essa análise em função do caráterlimitado de sua atuação (Regiões Norte,Nordeste e áreas de endemias). Entretanto,suas ações apresentaram grandecapilaridade e ainda são reconhecidas emmuitas regiões de difícil acesso como aúnica marca da presença do Estado. Essasinstituições participaram do PIASS e,posteriormente, foram inseridas no SUSapós sua fusão na Fundação Nacional deSaúde.

3.2 Estudo comparativo sobre ascondições de saúde de famílias do MST ede bóias-frias de Unaí-MG

Realizou-se estudo comparando a situaçãode famílias de um acampamento e umassentamento do MST com famílias debóias-frias de um bairro periférico, todasresidentes no município de Unaí/MG. Foiavaliado o que os sujeitos pensam econstroem em relação ao processo saúde-doença, características sociodemográficas efamiliares, condições de vida, trabalho eprodução, presença de animais deprodução, domésticos e sinantrópicos; alémde identificação da operacionalização daspolíticas de saúde nos diferentes grupos(anexo B). As perguntas relativas aquestões de segurança alimentar forambaseadas nos trabalhos de Vasconcelos(2000) e da Unicamp ( {In} SegurançaAlimentar – Unicamp 2004).

As ferramentas conceituais foram utilizadaspara se pensar dialeticamente em um objetocomo definido por Breilh (2006) “que semove entre as características de ser, a um

Page 30: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

30

tempo, simples e complexo, determinado econtingente e incerto, social e biológico, egeral, particular e singular”. Para esse autor,o raciocínio epidemiológico deve consideraros determinantes estruturais, processosgenerativos e, por fim, os processosespecíficos. A partir desse enfoque,considera que a epidemiologia não deveapenas definir seu “objeto” detransformação de seu campo científico, mastambém o “sujeito” dessa transformação.Assim, poderia contribuir para aemancipação das pessoas frente aosmodos de vida e situações enfrentadas.

3.2.1 Desenho do estudo

O estudo realizado envolveu a aplicação decenso por meio de um questionário juntoaos responsáveis pelas famílias nas trêsáreas de estudo entre os dias 15 e 28 deabril de 2005. Além desse instrumento,foram obtidas informações por meio daobservação estruturada das condições devida e trabalho, discussões com os coletivosde saúde e representantes da comunidade(anexo C). Buscou-se trabalhar com adenominada triangulação de métodos,articulando-se abordagens quantitativas equalitativas (Minayo et al, 2005).

Antecedendo os trabalhos nas áreas, foramrealizados testes-piloto dos questionários noAssentamento Menino Jesus e em bairrosda periferia de Unaí com reconhecidapresença de trabalhadores bóias-frias. Apósavaliação e aperfeiçoamento dosinstrumentos, os questionários foramaplicados para cada unidade familiar nolocal de moradia. Os informantes principaisforam a mulher (ou pessoa que cuida dafamília) e o homem (para as informaçõesrelativas à produção).

Foi investigado por meio da observaçãoparticipante5 um dia de trabalho noAssentamento Menino Jesus (Minayo et al,2005).

5 Técnica que consiste na participação real dopesquisador na vida da comunidade, assumindopapel de membro do grupo, durante aobservação.

3.2.2 Métodos de análise:

Os dados dos questionários foramcapturados e analisados por meio doprograma EPINFO (Programa deprocessamento – EPINFO 2001) - versão6.0. Para a comparação dos diferenciaisentre as comunidades, foram construídastabelas de freqüência e utilizados os testesdo Qui-quadrado, Teste de Fisher, ANOVAe teste T de acordo com as característicasda informação. Posteriormente a essaetapa, foram selecionadas as variáveis maisexpressivas das diferenças entre os grupospara a realização de análise fatorialdiscriminante (Kleinbaum, 1988; Sampaio,1993) por meio do programa MINITAB(Programa estatístico - MINTAB 2006),versão 14.

Esses dados também foram analisados comas contribuições das discussões com oscoletivos de saúde, grupos organizados eda observação estruturada das condiçõesde vida e trabalho.

3.3.3 Descrição das áreas pesquisadas

O município de Unaí encontra-se na meso-região do Noroeste mineiro e namicrorregião da RIDE (Região Integrada doDistrito Federal e entorno6), situado a 130Km de Brasília (anexo G).

6A Região Integrada de Desenvolvimento doDistrito Federal e Entorno (ou RIDE) é umaregião integrada de desenvolvimento econômico,criada pela Lei Complementar nº 94, de 19 defevereiro de 1998. É constituída pelo DistritoFederal, pelos municípios de Abadiânia, ÁguaFria de Goiás, Águas Lindas de Goiás, Alexânia,Cabeceiras, Cidade Ocidental, Cocalzinho deGoiás, Corumbá de Goiás, Cristalina, Formosa,Luziânia, Mimoso de Goiás, Novo Gama, PadreBernardo, Pirenópolis, Planaltina, Santo Antôniodo Descoberto, Valparaíso e Vila Boa, no estadode Goiás, e de Unaí e Buritis, no estado deMinas Gerais. Ocupa uma região de 55 milquilômetros quadrados e sua população seaproxima dos 3,5 milhões de habitantes.

7 Nesta forma de organização as casas ficammais próximas do que nos lotes individuaistradicionais, mas não tão juntas como em uma

Page 31: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

31

De acordo com o último censo demográficorealizado no ano de 2000, o município contacom 70.033 habitantes, sendo 55.525residentes na zona urbana e 14.508residentes na zona rural. Unaí possui omaior PIB agropecuário de Minas Gerais,com relevante produção de grãos, que em2003 chegou a 234.000 toneladas de milho,173.600 de soja e 114.780 de feijão(Cidades@ - IBGE 2003).

Esse município ganhou destaque nacional einternacional no ano de 2004 devido aoassassinato de fiscais do Ministério doTrabalho que investigavam denúncias detrabalho escravo na região. Entre ossuspeitos estão grandes fazendeiros, osmaiores produtores individuais de feijão doPaís, e que, ao mesmo tempo, dominam opoder político local (Sakamoto, 2006).

O Assentamento Menino Jesus localiza-seno distrito de Guarapuava, ao lado dolugarejo denominado Chapadinha, nomunicípio de Unaí-MG. Está aaproximadamente 88 Km da sede municipale a 268 Km de Brasília-DF. Relativamentepequeno, o assentamento possui área de935,680 ha (definida na Portaria de criaçãonº 16/1999 de 27/08/1999) onde seencontram 29 famílias de trabalhadoresrurais ligados ao MST (Laudos - INCRA1999). A região do assentamentocaracteriza-se por ser alto de chapada comveredas típicas do cerrado e a presençamarcante dos buritis. Há intensa exploraçãoagropecuária com grandes monoculturas defeijão, milho, arroz e soja nas vizinhanças.Em sua trajetória histórica as famíliashaviam passado por vários acampamentosantes de conquistar a área. Após aocupação da sede da fazenda, famílias daregião vieram se somar ao acampamento econtinuaram a chegar mesmo depois doassentamento. Eram antigos sitiantes que,por razões econômicas, acabaram tendoque vender suas terras (Bertolini, 2005).

As famílias desse assentamentoapresentavam identidade com os princípiosdo MST e desenvolviam a organizaçãointerna preconizada em termos da criação agrovila. A comparação com os raios do sol sedá à medida que os lotes se expandem do centropara a periferia (forma piramidal) com um núcleocomunitário ao centro.

de núcleos de base e setores. Doze famíliasdessa área vivenciaram uma nova propostade assentamento na região, organizando-sea partir do desenho de “raio de so7”. (Figura1).

Figura 1 – Casa e quintal de família doAssentamento Menino Jesus, Unaí-MG,abril de 2004.Fonte: Bertolini, 2005

O Acampamento Índio Galdino está a 10 kmdo Assentamento Menino Jesus, nomunicípio de Unaí. Encontra-se em umaregião de cerrado, caracterizada porveredas, alto de chapada e suas bordas. Aspartes de chapada foram muito utilizadas edesmatadas. As veredas estãorelativamente preservadas, assim como asbordas de chapadas e as partes maisíngremes. Trata-se de antiga área doINCRA para fins de reforma agrária, em queseriam assentadas famílias de posseiros daregião. Foi grilada8 por latifundiáriosprodutores de soja e feijão. Os posseiros9

acabaram ficando nas piores terras dosvãos da chapada e o assentamento não seefetivou. As famílias de posseiros se uniramao MST e ocuparam a área novamente em2001. Cerca de 150 famílias constituíram oacampamento dividido em dois grupos detamanhos diferenciados.

8 Termo que designa quem está na posse ilegalde terras, por meio de documentos falsificados.O termo provém da técnica usada para o efeito,que consiste em colocar escrituras falsas dentrouma caixa com grilos, de modo a deixar osdocumentos amarelados e roídos, dando-lhesuma aparência antiga e, por consequência, maisverosímil.9 É o titular de posse exercida sobre terraspúblicas. Tem, no Direito Público, o sentido depossuidor, do Direito Privado.

Page 32: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

32

Page 33: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

33

Além dos antigos moradores, as famíliasvieram, em sua grande maioria, da periferiade Brasília (Bertolini, 2005).

As famílias desse acampamento tambémapresentavam identidade com os princípiosdo MST e desenvolviam a organizaçãointerna preconizada em termos da criaçãode núcleos de base e setores. Durante operíodo de estudo, estavam vivenciando oprocesso de Planejamento doDesenvolvimento do Assentamento (PDA),que envolveu a discussão do parcelamentodos lotes e organização futura do espaço eda produção. A área estava em vias de serlegalizada pelo INCRA (Figura 2).

Figura 2 – Casa e quintal de família doAcampamento Índio Galdino, Unaí-MG, abrilde 2005

A maior parte dos bóias-frias que atuam naregião moram na cidade de Unaí. Segundodados do Sistema de Informações sobre aAtenção Básica de Saúde de Unaí, o BairroMamoeiro concentrava, proporcionalmente,o maior número de famílias cadastradascom esses trabalhadores. Em função dessainformação, esse bairro foi escolhido comouma das comunidades da pesquisa (Figura3).

Foram obtidas informações com osprofissionais do serviço local de saúde doBairro Mamoeiro, sobre estrutura efuncionamento, dados das fichas cadastraisdas famílias bem como o envolvimento ativodos agentes comunitários de saúde nostrabalhos.

Figura 3 – Escola do Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005

3.3.4 Características sociais e históricasda região do estudo

De acordo com o historiador Paulo Bertran,a presença humana no Planalto Centralbrasileiro é de aproximadamente 12 milanos. Desde a pré-história até acolonização, a região foi domínio dos índiosJê, povos caçadores e guerreiros,especializados em viver nos cerrados. Assesmarias mais antigas da área do DistritoFederal datam de 1741. “Embora asbandeiras percorressem a região desde oséculo XVI, com suas doenças e seus fogosa dizimar os indígenas, a colonização sócomeçou no ano de 1700, em Minas Gerais,depois no Mato Grosso (1718) e, por último,em Goiás (1726)” (Bertran, 1994, p.18).

Na questão fundiária, desde as sesmarias -devido às distâncias e dificuldades com ostrâmites burocráticos para a legalização - oque realmente valeu na região foi asubstância da propriedade fundiária descritanos inventários, ou seja, as benfeitorias, ogado, as roças, os equipamentos e,principalmente, os escravos. Na década de1930, já no século XX, as fazendas goianaseram conhecidas por sua escassa basedocumental.

O principal elemento para a dinâmica deocupação da região foi a instalação, a partirdo século XVIII, de grandes fazendas degado nas áreas de cerrado propícias aodesenvolvimento da pecuária extensiva. Asfazendas, com seus vaqueiros e agregados,mantinham em suas margens núcleos

Page 34: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

34

Page 35: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

35

agrícolas, conjugando um padrão deconvivência e dependência entre osgrandes latifundiários e os colonos,moradores, parceiros e posseiros. Osprimeiros municípios da região foram sendoconstruídos entre as grandes fazendas,como entrepostos de tropeiros. Além dasfazendas de gado, no início do século XXhouve um curto ciclo de borracha a partir deespécies nativas do cerrado, contribuindopara a intensificação do processo deocupação da região (Leite et al, 2004, p.49).

Com a criação do Distrito Federal, passandoa capital do País para Brasília em 1960, asregiões de seu entorno imediato passam asofrer mais influência. Um dos principaiselementos dessa zona de influência foi aquestão da migração, principalmente doNorte e Nordeste, aumentando o número demunicípios e a população. A região passa asofrer com a valorização das terras devido àproximidade da capital e ao intenso fluxomigratório.

O processo de ocupação da região ficamarcado pela discrepância entre amodernidade, representada por Brasília, e oatraso dos latifúndios improdutivos e dapecuária extensiva de seu entorno.

O quadro rural começa a se alterar a partirda década de 1960 com o processo demodernização da agricultura e osinvestimentos governamentais paraviabilizar projetos agrícolas no cerrado.Dentro das linhas políticas dos governosmilitares observa-se que:

O Estado teve um papel relevante nesteprocesso por meio da oferta de abundantesrecursos a taxas de juros negativos eincentivos à pesquisa de variedadesvegetais adequadas ao cerrado. Duranteas décadas de 60 e 70 foramimplementados vários projetos dedesenvolvimento agropecuário nestaregião (federais e estaduais), como porexemplo o Polocentro e o Prodecer (ambosdo governo federal); o Planoroeste (dogoverno de Minas Gerais, voltado para aregião noroeste do Estado), o Padap(Programa de Assentamento Dirigido doAlto Paranaíba, também do governo de

Minas). Estes projetos e programasacabaram por reforçar a tendência históricade concentração fundiária dessa região.Parte dos recursos advindos dessesprojetos foram indevidamente direcionadospara a pecuária extensiva, comconseqüências sociais ainda piores (Leiteet al, 2004, p. 58).

Esse processo intensificou a concentraçãofundiária, levando à expropriação depequenos proprietários e posseiros.

A partir da década de 1970, começam asurgir mobilizações mediadas pela igrejacatólica e movimento sindical (CUT). Osconflitos se intensificam e, na década de1980, iniciam as ocupações de terrasimprodutivas por meio das federações detrabalhadores rurais gerando os primeirosassentamentos na região. Os marcosreferenciais foram as desapropriações dasfazendas Saco Grande/Palmeirinha, emUnaí (1984), e Fruta D’Anta, em JoãoPinheiro (1986); a primeira devido a conflitoscom posseiros ameaçados de expulsão e asegunda por ação do movimento sindical.No Nordeste goiano, o principal agente erao movimento sindical de trabalhadoresrurais, além de movimentos de atuação local(Leite et al, 2004).

Segundo Ávila (2002)

...a precarização das condições de vida, asbaixas remunerações temporárias, e asmigrações em busca de trabalho esobrevivência, decorrentes do processo demodernização agrícola, induziram umacrescente luta social na região Noroestemineira, que resultou em diversasocupações de terra na década de 80. Afalta de empregos na cidades seria umfator adicional que levaria as populaçõesda região a crescentes conflitos fundiários(p. 24).

Considerando-se o processo histórico,atualmente, as formas de ocupaçãocaracterísticas das áreas rurais do DistritoFederal e entorno (Minas Gerais e Goiás)podem ser classificadas de acordo comBertolini (2005):

Page 36: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

36

Page 37: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

37

Fazendas de exploração agrícola(empregam trabalhos sazonais). -Moram nessas fazendas algumasfamílias de trabalhadores rurais que“cuidam” da fazenda e desenvolvematividades produtivas em associaçãocom o proprietário. O restantedenomina-se bóia-fria. Esses moramnas periferias das cidades da região,geralmente cidades pequenas e médias,indo para o campo apenas nas épocasde plantio e colheita;

Latifúndios improdutivos - Vastasextensões de terras que empregam umou dois peões para cuidar da terra e dealgumas cabeças de gado;

Fazendas agroindustriais – Médias egrandes fazendas na linha doagronegócio, com produção agrícola demonocultura voltada para a exportação,mecanizada com o uso intensivo defertilizantes e agrotóxicos (Figura 4).Empregam pouca mão-de-obra, masqualificada como tratorista,administrador e gerente. Os bóias-friassão contratados apenas em períodosespecíficos para realizarem tarefasainda não-absorvidas pelamecanização.

Figura 4 – Fazenda agroindustrial da regiãode Unaí-MG, abril de 2005

O restante da população do campo sedistribui em pequenas propriedades eassentamentos rurais, produzindo paraautoconsumo e mercado local, além desítios e áreas de lazer para finais desemana.

Já consolidado em boa parte de Goiás eMinas Gerais desde a década de 1980, oprocesso de organização do MST no DistritoFederal e entorno começou apenas em1992, por meio de experiênciasespontâneas e isoladas. O marco denascimento foi a ocupação da fazendaBarriguda I, em Buritis, Noroeste de MinasGerais, no dia 1o de setembro de 1995 por650 famílias.

O MST do DF e entorno compreende 11acampamentos com 1.957 famílias e 23assentamentos com 1.693 famílias,envolvendo mais de 3.600 famílias (MST,2004).

3.4 Preocupações éticas

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Éticaem Pesquisa da UFMG sob número 588-04(anexo D). Previamente ao trabalho nas trêsáreas, a equipe de pesquisa reuniu-se comrepresentantes das comunidades e do setorsaúde local para planejar suas atividades.Foram desenvolvidas atividades educativasem escolas e com grupos organizados(aulas, teatro). Ao final dos trabalhos decampo, foram realizadas reuniões paradiscussão das impressões da equipe depesquisa sobre as condições de saúde dasfamílias (Figura 5). Foi aplicado oconsentimento livre e esclarecido a todas aspessoas que responderam aosquestionários (anexo E).

Figura 5 - Reunião na Escola do BairroMamoeiro com representantes dacomunidade e dos serviços de saúde, Unaí-MG, abril de 2005

Page 38: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

38

Page 39: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

39

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Contexto histórico da construção daspolíticas oficiais de saúde para o campono Brasil

A evolução das políticas de saúde para ocampo no Brasil esteve principalmenteassociada aos interesses econômicosligados à garantia de mão-de-obra sadiapara a exploração dos recursos naturais -como foi no caso da exploração daborracha; ou para apaziguar os ânimos dosmovimentos sociais do campo - comoocorreu com as Ligas Camponesas e aconseqüente criação do FUNRURAL(Fundação de Economia e Estatística,1983). Essa característica das políticasnesse período é citada por Lima et al,(2006) como uma abordagem restrita darelação saúde e desenvolvimento(QUADRO 2).

Evidenciadas principalmente na década de1950 e no início de 1960, as ações ecampanhas de combate às endemias ruraismobilizaram recursos humanos, financeirose estiveram associadas aos projetos eideologias do desenvolvimento. Entre osargumentos, estavam a recuperação daforça de trabalho no campo, amodernização rural, a ocupação territorial eincorporação de espaços saneados à lógicada produção capitalista (Lima et al, 2005).

Embora a Constituição de 1934determinasse o direito à previdência social atodos os trabalhadores brasileiros, apopulação rural só teve acesso à proteçãosocial no início dos anos de 1970. Váriosfatores poderiam explicar essa questão.Desde a forma subalterna que o setor ruralparticipava da estratégia dedesenvolvimento do País após 1930, até ofato de que essas populações ainda nãotinham se constituído em grupos de pressãocom capacidade de articulação política evocalização suficientes para que o Estadopopulista-paternalista os visse como gruposocial a ser integrado e cooptado por meioda expansão significativa da cobertura dosprogramas sociais (Delgado, 2002). Essaexplicação encontra respaldo em

abordagem também citada por Vianna(1998).

O cenário começou a mudar a partir de1950 com a gradativa mobilização dostrabalhadores, que tinham no eixo de suasreivindicações a reforma agrária, seguidapela extensão das políticas trabalhistas esociais. No início de 1960, um amplomovimento de sindicalização rural com umcrescente grau de organização ficouevidenciado pelo papel das LigasCamponesas. A Igreja Católica contribuiunesse movimento assim como o governoGoulart foi sensível à mobilização (Delgado,2002).

Apesar de a primeira vista paradoxal, oregime militar brasileiro, conservador eautoritário foi o responsável pela expansãode forma inédita na América Latina dacobertura previdenciária ao setor rural.Segundo Delgado (2002 p.191 e 193):

...é lugar comum, entre os analistas,afirmar que o regime militar brasileiro temiaperturbações sociais na área rural,sobretudo porque, nos anos 60 e 70,implementou-se uma política demodernização do setor rural, marcada pelamecanização e quimificação das técnicasde cultivo, expansão da grandepropriedade e produção de commoditiesexportáveis, uma estratégia dedesenvolvimento rural que implicou altocusto social para a pequena produçãorural. Apresentou-se, aos estrategistas, apossibilidade, por meio de um programasocial de cunho paternalista e centralmenteadministrado, aumentar a dependênciaindividual em relação ao Estado e, alémdisso, cooptar organizações sociais taiscomo os sindicatos de trabalhadores eempregadores rurais, transformando-as emintermediários de serviços sociais edesarmando-as enquanto entidadessocialmente representativas (....)cumprindo à perfeição o papel deinstrumento de consecução da doutrina desegurança nacional do governo militar.

Nesse período, apesar da posição favorávelà expansão de cobertura por parte dostecnocratas, houve oposição ao projeto deexpansão de cobertura por parte das

Page 40: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

40

seguradoras privadas e do instituto dosbancários, baseadas em preocupações decunho fiscal (Scorel, 1998).

Posteriormente, já no início da fase deabertura do regime militar, surge apossibilidade de implantação do PIASS, umprograma que almejava ser de impacto,visível para a população e um instrumentode legitimação do regime. Entretanto, foitecnocrático, na medida em que suaelaboração esteve restrita a um conjunto detécnicos sem discussão com a sociedade,mas incorporou uma série de propostasracionalizadoras que o movimento sanitárioencampou como bandeiras de luta. Suaimplantação esbarrava em concepçõesdiferentes dos técnicos do MS que tendiama valorizar a experiência da FSESP ou astécnicas de planejamento da OrganizaçãoPan-americana da Saúde -OPAS-, enquantoo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada-IPEA- defendia a proposta mais modestade municipalização dos serviços de saúde.Em relação ao financiamento, a grande

barreira estava no Instituto Nacional dePrevidência Social -INPS- dominado pelahegemonia do modelo assistencialprivatizante cujos anéis burocrático-empresariais não perceberam que poderiamaumentar sua abrangência ao apoiarem asações de extensão de cobertura. Chegou-sea formar frente política de secretáriosenvolvidos no programa, com o objetivoprimordial de reivindicar recursos daPrevidência Social. Esse movimentoassentou as bases do que viria ser aorganização dos secretários estaduais desaúde – CONASS. A razão do programa terse desenvolvido prioritariamente na regiãonordeste, apesar do discurso de regiãocarente, era em função de sua importânciapolítica como um dos maiores redutoseleitorais (Scorel, 1998).

No QUADRO 2, são apresentadas asprincipais iniciativas relativas às políticas desaúde do Estado voltadas para aspopulações do campo no Brasil:

Page 41: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

41

QUADRO 2. Cronologia das políticas de saúde para o campo no Brasil (1918 a 2004)

Ano Iniciativas Significados

1918 Liga prósaneamento

Campanha pelo saneamento rural, com impacto significativo sobre asociedade brasileira. O Estado passou a abordar a doença como umproblema político, constatando o atraso e o abandono em que se encontravaa quase totalidade da população rural (Lima, 2005).

1934 Previdência socialConstituição de 1934 – o trabalhador brasileiro passava a ter direito àproteção da previdência social, mas sem a extensão da proteção social aostrabalhadores rurais (Delgado, 2002).

1941 ServiçosNacionais decombate asendemias

Interiorização das atividades de saúde pública em direção às áreas rurais,basicamente aquelas onde se verificavam focos de endemias. A preocupaçãocom o controle desses focos estava vinculada com o processo de migraçãodas populações rurais para as cidades, que já começava a adquiririmportância em 1940. Esse fato se relacionava à formação do mercado detrabalho urbano. (A Política - FEE 1983).

1942 FundaçãoServiçosEspeciais deSaúde Pública-FSESP

Criado por razões de ordem estratégica, ligadas à produção de borracha naAmazônia, a FSESP passou a atuar prioritariamente naquela região,combatendo a malária e a febre amarela, os maiores flagelos a dizimar amão-de-obra nos seringais (Scorel, 1998).

1963 Estatuto doTrabalhador Rural

O surgimento das Liga Camponesas reivindicando a reforma agrária fez comque o Governo João Goulart reagisse a essas pressões, sancionando a leique ficou conhecida como o Estatuto do Trabalhador Rural (Delgado, 2002).

1967 Fundo deAssistência aoTrabalhadorRural-FUNRURAL

Criado no Estatuto do Trabalhador Rural somente foi colocado em práticadurante o regime militar brasileiro, implantando um modelo de assistência àsaúde tipicamente urbano e curativo (Pinto, 1984).

1970 Superintendênciade Campanhasde Saúde Pública– SUCAM

Resultado da fusão do Departamento Nacional de Endemias Rurais, daCampanha de Erradicação da Varíola e da Campanha de Erradicação daMalária. Foi responsável pela execução direta de atividades de erradicação econtrole de endemias (Lima et al, 2005).

1976 Programa deInteriorização dasAções de Saúdee Saneamento –PIASS

O Ministério da Saúde procurou implementar programas de extensão decobertura, preocupado basicamente com as áreas rurais e os programastradicionais (Programa –PIASS 1981); Pinto (1984).

1988 SUS

Implementado à partir da nova Constituição – a saúde passa a ser direito detodos e dever do Estado. Os serviços e ações de promoção, proteção erecuperação da saúde (atendimento integral) tornam-se universais (paratodos) e equânimes (com justa igualdade) MS (2003); Lima et al (2005).

2004 Grupo da Terra Criado no âmbito do Ministério da Saúde para participar da formulação,implantação e acompanhamento da Política de Saúde para a População doCampo (Brasil, 2004c).

Page 42: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

42

Historicamente, as Conferências Nacionaisde Saúde também constituíram-se em fórumprivilegiado para o debate e proposições depolíticas públicas de saúde para o campo(Andrade e Nagy, 2004). A 5ª ConferênciaNacional de Saúde (1975) tratou a questãocomo um dos eixos temáticos.

Na 6ª Conferência Nacional de Saúde(1977), deu-se continuidade à estratégia dediscussão da extensão das ações de saúdeàs populações rurais, mas no contexto daproposição de um sistema nacional desaúde e da expansão de cobertura dosserviços de saúde e saneamento (PIASS).As discussões eram voltadas paraampliação da oferta dos serviços primários.

Durante a 7ª Conferência Nacional deSaúde (1980), as discussões focavam ainteriorização das ações como preconizadono PIASS; saneamento ambiental; políticaseducacionais e de formação de recursoshumanos para a saúde; integração com oINAMPS; articulação com os projetosagropecuários e as ações de saúde,habitação e construção de postos de saúdena zona rural; e inserção da saúde nadiscussão dos projetos de desenvolvimento.

A 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986)apontou para a necessidade de se implantaruma reforma agrária que respondesse àsreais necessidades e aspirações dostrabalhadores rurais e que fosse realizadasob o controle dos mesmos. Essaconferência significou o marco político deconstrução da Reforma SanitáriaBrasileira10, fornecendo as bases para asdefinições da Constituição de 1988 (Arouca,2002) e do SUS. O conceito de saúdecunhado na 8ª Conferência foi:

...saúde é a resultante das condições dealimentação, habitação, educação, renda,meio-ambiente, trabalho, transporte,

10 Processo político que transformou o sistemade saúde brasileiro por meio da mobilização deamplos setores da sociedade organizada,fornecendo as bases para a elaboração da partereferente a Saúde da Constituição e para aconstrução do SUS (Netto et al, 2004).

emprego, lazer, liberdade, acesso e posseda terra e acesso a serviços de saúde.

O acesso e a posse da terra não aparecemno conceito definido posteriormente pela Lei8.080 (Brasil, 1990). Seu grande diferencialem relação às outras conferências foi apresença de mais de 4000 pessoasrepresentando um movimento sanitário quebuscava transformações profundas nasaúde pública. Na origem desse movimento,estavam profissionais de saúde, muitosligados ao Partido Comunista Brasileiro,que, a partir de um referencial médico-sociale por meio de práticas políticas, ideológicase teóricas, buscaram transformar o setorsaúde no Brasil, também ocupando postos-chave no aparelho de Estado. Ou seja,passaram a utilizar os espaços institucionaiscomo lócus da construção contrahegemônica (Scorel, 1998). A criação doSUS foi resultado de um movimento que seapresentou na contracorrente das reformasde saúde de cunho neoliberal, baseadas noconceito de ajuste estrutural defendida peloBanco Mundial na década de 1980 (Vianna,1998; Cohn, 2005).

Na 9ª (1992), 10ª (1996), 11ª (2000) e 12ª(2003) Conferências Nacionais de Saúde, areforma agrária foi sempre um dos assuntostratados, mas apesar de não ser priorizadacomo um eixo temático, as questões desaúde no campo apareceram de formadetalhada em várias propostas. A maioriadessas reforçava a garantia dos direitosbásicos da cidadania, bem como aimplementação de medidas de acesso àsações de saúde para as populações rurais.Outro destaque era o caráter intersetorialbem demarcado, evidenciando as grandeslacunas existentes das políticas sociais(habitação, saneamento, distribuição derenda, meio ambiente, transporte, lazer,esportes, educação e outras) – tambémnecessárias para garantir a saúde dapopulação do campo. Na 12ª ConferênciaNacional de Saúde, o MST foi citadodiretamente como um dos atoresestratégicos para contribuir na construçãodessas políticas.

Page 43: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

43

Nas Conferências Nacionais temáticas,destacaram-se as Conferências Nacionaisde Saúde do Trabalhador (1994). Na suasegunda edição, em 1994, foi ressaltado, noeixo específico de política agrária e saúdedo trabalhador rural, o reforço à realizaçãoda reforma agrária e de ações intersetoriaisvisando à qualidade de vida e à proteção dasaúde desses trabalhadores.

A relação da CONTAG e MST com oMinistério da Saúde no final da década de1990 e início do ano 2000 foi marcada pelanegociação de pautas de reivindicaçõesextensas, envolvendo vários programas eáreas técnicas. As demandas eramrespondidas de forma fragmentada edesintegrada, a partir da junção deinformações de múltiplos setores desseórgão. Em 2003, o ministério identificou anecessidade de construção de uma políticade saúde para o campo e a estruturação deum grupo para conduzir esse processo, deforma a desenvolver ação sistêmica paraatender as demandas dos movimentossociais. Essa intenção encontrou respaldoem movimentos como o MST, que já vinhalevantando essas necessidades em suaspautas de luta (Andrade e Nagy, 2004). Aformalização desse processo se deu pormeio da Portaria n° 719, de 14 de abril de2004, do Ministro da Saúde, que criou oGrupo da Terra (Brasil, 2004c) com aparticipação de várias áreas técnicas doMinistério como a Secretaria Executiva,Atenção à Saúde, Vigilância em Saúde,Ciência Tecnologia e Insumos Estratégicos,Gestão do Trabalho e Educação na Saúde,Gestão Participativa; e órgãos vinculadoscomo ANVISA, FUNASA e FIOCRUZ. Emrelação à sociedade, participavamCONASS, CONASEMS e os movimentossociais do campo: MST, CONTAG,Movimento das Mulheres Camponesas,Comissão Pastoral da Terra, com aagregação posterior dos representantes dosQuilombolas e Seringueiros por meio daPortaria n° 2460, de 12 de dezembro de2005 (Brasil, 2005).

Os maiores avanços das políticas oficiais desaúde para o campo ocorreram nosperíodos históricos em que os trabalhadoresrurais estavam mais organizados. Nadécada de 1960, o FUNRURAL; na décadade 1980, o PIASS e, no ano de 2004, o

Grupo da Terra. Com a criação dessegrupo, pela primeira vez, o “público alvo” dapolítica de saúde para o campo começou aparticipar diretamente do processo de suaconstrução.

4.2 A organização da saúde nosacampamentos e assentamentos do MST

Após a ocupação, inicia-se o acampamento.Os acampados passam a se organizar emnúcleos de 10 famílias, elegendo umcoordenador e uma coordenadora que farãoparte da direção do acampamento. Cadanúcleo define uma pessoa para participar detarefas como produção, saúde, educação,lazer, segurança. Atuando em conjunto compessoas de outros núcleos, formam ossetores responsáveis pela execução dastarefas (Fernandes, 2000). A participaçãonas decisões ocorre por meio das reuniõesnos núcleos, reunião da coordenação eassembléia geral. “Os princípios quenorteiam a organização são a democracia, aparticipação de todos no processo decisório,a divisão de tarefas e a direção coletiva”(Morissawa, 2001). Estas formas deorganização terão continuidade naimplantação do assentamento, assim comoé adotada nas demais instâncias do MST.

Desde a criação do MST, são desenvolvidasações de saúde nos acampamentos eassentamentos. O movimento possuisetores organizados em todas as áreas,inclusive saúde, para enfrentar de formaorganizada, os problemas que surgem aolongo dos processos de ocupação eassentamento. As atividades dessescoletivos abrangem desde oacompanhamento de doentes até aspreocupações com o acesso aos serviçosde assistência médica, água de boaqualidade, promoção da fitoterapia entreoutras. Muitos de seus integrantes atuamcomo agentes comunitários de saúdeinseridos em programas como o PSF e, emalguns Estados, participam nas instânciasde controle social do SUS como osConselhos Municipais e Estaduais de Saúde(Relato -MST, 2005a).

No ano de 1998, o MST organizou oColetivo Nacional de Saúde, por meio deuma oficina nacional, em Brasília, com aparticipação de representantes de 23

Page 44: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

44

estados do Brasil. Nesse encontro, foramdefinidos os princípios a serem utilizados naluta pela saúde, relacionados à educação, àprodução, lazer, moradia e também à lutapela terra, entendida também como direitopara que todos tivessem condições dignasde vida e bem-estar (Oficina –MST 1998).

Uma das linhas iniciais de discussão doColetivo considerou o direito à saúde comoconquista consagrada na Constituição de1988, mas que não estava garantida naprática para quem vive no campo. Segundoo Coletivo:

...para ter saúde é preciso que ascondições de vida sejam garantidas:terra e trabalho; condições de moradia;educação de qualidade; alimentaçãosaudável, sem venenos e conservantes;meio ambiente limpo e conservado; lazere bem-estar, etc (Lutar por saúde -ANCA 2000).

Essas discussões envolviam os princípiosconstitucionais da saúde como direito detodos e dever do Estado, conceitos oriundosdo movimento da moderna ReformaSanitária Brasileira. O conceito ampliado desaúde também é resgatado e entendido queseu alcance está condicionado ao acesso à“terra, trabalho, moradia, alimentação,educação, saneamento básico, transporte,saúde pública, cultura, meios decomunicação, energia elétrica – onde hajajustiça, igualdade, participação eorganização” (Construindo -MST 2000, p.12).

Um dos resultados da criação do Coletivo foia elaboração dos princípios de saúde doMST, o que contribuiu para o processo deformação dos integrantes do setor (MST,2000). Para o MST, a política de saúde docampo deve ser baseada no fortalecimentoe consolidação do SUS e dos princípios daReforma Sanitária.

Segundo o Movimento,

...historicamente, nunca houve umapolítica de atenção à saúde doscamponeses. O próprio SUS não estávoltado para o campo, não existe uma

linha na Lei do SUS que mencione aatenção à população rural. Hoje jácomeça a haver uma discussão sobreisso, mas muito retraída. E o MST,nesses 20 anos de luta, vem levantandoessa bandeira, assim como levanta abandeira da educação do campo eoutras questões que aparentemente nãoestão ligadas à reforma agrária. Essasquestões vão surgindo a medida que aluta vai desvendando outras lutas e quenão são só dos camponeses, mas dopovo brasileiro. Por isso, nos colocamosno cenário da disputa política, seja nocampo da saúde, da educação, dacomunicação, da cultura, daagroecologia (Saúde e Reforma Agrária -MST, 2005 p 2)

Para o MST, no campo da saúde,

...o que o Estado oferece às famílias docampo são campanhas: vacinação,prevenção de câncer, doençassexualmente transmissíveis, por exemplo.Não existe uma política, uma atençãocontinuada de promoção da saúde doscamponeses. Isso não interessa aosistema, e a população do campo étransformada em instrumentos damercantilização da saúde, onde o tripémédico-hospital-laboratório farmacêutico équem sai ganhando, pois detém a maioriados recursos do SUS. Com isso oscamponeses ficam em situação mais frágil,pois acabam dependentes desse processode mercantilização e são ainda maismarginalizados do acesso aos serviços dequalidade, pois não fazem parte doconjunto de sujeitos que dão lucro aosistema (Saúde e Reforma Agrária -MST, 2005 p 2)

O Setor de Saúde do MST, expressãoadministrativa de seu Coletivo Nacional,apresenta um amplo leque de ações eparcerias, tanto no âmbito federal, quantono estadual. Além dos projetos relacionadosa DST/AIDS, existem iniciativas voltadaspara a produção de fitoterápicos em váriosassentamentos, que garantem a utilizaçãodesses produtos no âmbito das atividadesdo próprio MST.

Page 45: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

45

As questões relacionadas a DST/AIDS,fitoterapia, a discussão sobre as políticas desaúde/SUS, participação social e aorganização dos coletivos foram setornando os principais temas discutidos nosencontros do setor saúde. Ao longo doprocesso, outros temas foram incorporados,como os relacionados à saúde ambiental,haja vista que a falta de saneamento, acontaminação por agrotóxicos e ascondições de moradia são alguns dosproblemas que continuam a contribuir para operfil de morbimortalidade dessaspopulações (Saúde – UnB 2001; Saúde eReforma Agrária – MST 2005). Além dosencontros periódicos dos coletivos desaúde, o MST já colocou em andamentomais de oito cursos no campo da saúdecoletiva pelo Brasil, a exemplo do CursoTécnico em Saúde Comunitária realizado noInstituto de Pesquisa sobre a ReformaAgrária/Escola Josué de Castro, emVeranópolis/RS (Proposta -MST 2001). Aconstrução e implementação desses cursostêm absorvido boa parte da agenda detrabalho do Coletivo Nacional de Saúde doMST.

Uma das marcas dos processos deformação e capacitação do MST é autilização de princípios pedagógicospróprios. A partir de referenciais teóricoscomo os de Paulo Freire, é construída umapedagogia própria dos Sem Terra,entendendo estes como uma categoriasimbólica que vai além de ter ou não ter aterra (Caldart, 2000). No horizonte dessemovimento, está o objetivo de construir umanova sociedade, lutando contra o sistemacapitalista e criando as bases para ummodelo de reforma agrária socialista, comodefiniu Stédile (1994).

4.2.1 O processo saúde-doença segundodiscussão em grupo com membros doColetivo Nacional de Saúde do MST

“Quando a gente luta por melhorescondições de vida estamos construindopolíticas de saúde– o Ministério só combate a doença”

(fala de um dos participantes do grupode discussão)

A discussão em grupo foi realizada durantereunião do Coletivo Nacional de Saúde doMST, em Brasília, no dia 4 de dezembro de2004 (Figura 6). A avaliação do MST emrelação ao conceito de saúde, às políticasdo SUS para o campo e sobre os fatores derisco de adoecimento mostra a existência deobstáculos a serem superados para que osprincípios definidos na Constituiçãobrasileira sejam de fato cumpridos.

Figura 6 - Grupo de discussão com oColetivo Nacional de Saúde do MST,Brasília-DF, dezembro de 2004

Para a maioria dos integrantes do Coletivo,o conceito de saúde envolve a “capacidadede reagir” frente à opressão e a tudo quefere sua autonomia como ser humano, poisa busca pela saúde está refletida no fim dolatifúndio, do capitalismo, da violência, deforma a se libertar do sistema atual.Consideram que a maneira de reagir édeterminada pelo meio em que vivem.Avaliam, portanto, que não basta ter a terra,mas deve ser forjado novo jeito de viver,com agricultura que não utilize venenospara produzir alimentos, visando umaprodução saudável. A questão dadesigualdade e a relação com a doença éfundamental, pois como uma família comfome pode ter saúde? Pensar a saúde apartir da qualidade de vida, da necessidadede um ambiente e uma alimentaçãosaudável, higiene e melhores relações entreas pessoas, ainda é um enfoque nãopraticado de forma geral. Consideram estaabordagem um tabu na sociedade, difícil detrabalhar inclusive com os dirigentes doMST.

Page 46: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

46

Page 47: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

47

Ainda é muito presente a idéia de que otrabalho do setor saúde no movimento écuidar dos doentes nas áreas ou nasmobilizações. Para o Coletivo, a visãoassistencialista é dominante na base domovimento.

A noção de saúde apresentada pelosdirigentes do Coletivo expressa um conceitoampliado, já destacado no movimentopolítico da Reforma Sanitária Brasileira, oumesmo por autores como Breilh (2006) -representante do pensamento daepidemiologia social latinoamericana.Entretanto, é na vivência da doença que aface dura das dificuldades de acesso aosserviços de saúde foi explicitada pelo grupo,em depoimentos carregados de emoção.

As experiências relatadas são relacionadasa momentos de humilhação, horas de fila,discriminação, que fazem baixar a auto-estima das pessoas na busca de umatendimento pelo serviço público de saúde.As dificuldades de acesso as fazem buscarmétodos alternativos de cura na fitoterapia,no controle do estresse e outras soluções.Muitos preferem ser tratados noacampamento, contando com o carinho e asolidariedade das pessoas, fato nãoencontrado no atendimento na cidade. Aexperiência da doença pode serconsiderada como algo difícil, ruim,sensação de estar imprestável, cansado,depressivo. A pessoa fica sem força paratrabalhar, lutar. É como ser levado “para umburaco escuro”, segundo um depoimento.Com o acesso à informação e à formaçãorealizadas pelo MST, várias pessoas saíramde situações de abandono e isolamento.Passaram a ser conscientizadas de que asaúde é um direito e a luta por atendimentoadequado, questão de resgate da dignidadehumana. Levanta-se a auto-estima daspessoas por meio da reflexão, análises econversas.

No acampamento, existe maiorvulnerabilidade em razão da falta desaneamento, barracos próximos, fumaça ecarência de alimentos, propiciando osurgimento de doenças. Há também atensão e o cansaço mental devido àameaça de despejo. Mas, ao mesmo tempo,

há maior noção de coletivo e solidariedade.A organização do acampamento ajuda noenfrentamento dos problemas.

No assentamento, o saneamento pode sermelhor que no acampamento, auxiliado peloespaço entre as moradias e o créditohabitação, assim como a produção dealimentos com os créditos para produção.Entretanto, mudam-se as relaçõesinterpessoais, consideram que noacampamento a vida é mais solidária.Avaliam que “quem pega o crédito ficadoente com as dívidas” e as preocupaçõescom o lote. No assentamento, aproblemática dos agrotóxicos cresce detamanho para o grupo.

O Coletivo avaliou que o SUS tem sedesenvolvido pouco no campo. Os relatosapontam para um uso partidário do sistema,por meio do controle sobre os conselhos desaúde, apadrinhamentos políticos e deoutras situações relacionadas a má gestãodos recursos públicos. “O SUS está bonitosomente no papel” Afirmam que osassentamentos ficam isolados em termos depolíticas públicas, as “pessoas têm que ir àcidade para ter acesso às políticas”. Avaliamque o governo não tem um programaespecífico para o campo, continuando coma política assistencialista. As pessoas docoletivo colocaram que “se o princípio daeqüidade fosse praticado boa parte dessesproblemas estariam resolvidos”. Constatamtambém que falta mais participação social ehumanização no atendimento do SUS.

O grupo considerou que a política dereforma agrária não está acontecendo deforma efetiva. Ela deveria estar gerandoqualidade de vida no campo. O crédito nãoestá acessível, a política agrícola privilegia aagricultura para a exportação, não havendoincentivos para as pequenas agroindústrias.

4.3 Análise das políticas oficiais desaúde para as populações do campo –FUNRURAL, PIASS, SUS e a experiênciado MST

De modo a aprofundarmos a caracterizaçãodas políticas, foram analisados seusconteúdos (Viana, 1997) por meio da

Page 48: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

48

seleção de programas como o FUNRURAL,PIASS e SUS. Os resultados da experiênciado MST na saúde também foram discutidosde forma a dialogarem com essas políticas.

O FUNRURAL possuía como princípiosbásicos o modelo curativo com enfoqueurbano e responsabilidade privada pelaexecução do serviço. A partir de umacoordenação centralizada, eramorganizadas suas diretrizes, tendo umcaráter não-universal, sendo necessárioestar sindicalizado. O programa era voltadopara o trabalhador rural e seusdependentes, estando entre seus objetivoso de garantir a assistência médica,ambulatorial e hospitalar para ostrabalhadores rurais. Entre suas principaisestratégias de implantação estavam osconvênios com sindicatos rurais deempregadores, trabalhadores e governos(federal e estaduais). Suas prioridadesforam a cessão de equipamentos, aconstrução de unidades hospitalares depequeno porte, a recuperação de hospitais,e a distribuição de unidades móveis deassistência. O FUNRURAL teve o mérito deimplantar uma estrutura mínima de saúdepara o campo alcançando a interiorizaçãode mão-de-obra, mas construiu um sistemadesintegrado, urbano, curativo, comdiminuição progressiva dos recursos, comescassez de medicamentos e de examescomplementares, apresentando distorçõesna assistência odontológica e restrições aoacesso à hospitalização (Pinto, 1984).

Já o PIASS partia de uma ampla utilizaçãode pessoal do nível auxiliar, com ênfase naprevenção de doenças transmissíveis,buscando o desenvolvimento de ações debaixo custo e alta eficácia, com apreconização da participação comunitária(Pinto, 1984). Com foco nas comunidadesde até 20 mil habitantes das regiõesNordeste, Norte e Centro Oeste do País,estados do Espírito Santo e Minas Gerais. Oprograma visava implantar uma estruturabásica para a melhoria do nível de saúde dapopulação e proporcionar novos empregosem regiões de grande carência social. Comoestratégia, buscou a criação de uma redeintegrada de unidades primárias de saúde acargo de pessoal auxiliar nas menores

localidades (até 2000 habitantes) ligadas aunidades de apoio, com articulação com assecretarias estaduais de saúde e subsídioparcial do INAMPS (Programa -PIASS1981). O PIASS possuía como escopo deatuação a construção e reformas deunidades de saúde, laboratórios,consultórios odontológicos e sistemas deabastecimento de água e soluçõesindividuais para destino de dejetos além dacapacitação de pessoal. Entre os anos de1976 e 1981, conseguiu a implantação e ofuncionamento (envolvendo incorporação)de 2179 centros de saúde e 4364 postos desaúde com potencial de cobertura de 25milhões de pessoas e treinamento de11.508 profissionais de saúde; 552 sistemasde abastecimento de água e 67.579 fossas(Programa -PIASS 1981). Entretanto,apresentou como um de seus principaisproblemas a priorização dos serviços desaúde em detrimento aos de saneamento,uma participação restrita da previdência,uma baixa cobertura dos postos de saúde,com retração estadual do custeio e damanutenção e operação da rede deunidades, com limitação de recursoshumanos, supervisão das unidades desaúde, e dificuldade de atendimentos demaior complexidade (Pinto, 1984).

O advento do SUS resultou em um avançodesta última abordagem ao incluir entreseus princípios e diretrizes a universalidade,a integralidade, a eqüidade, adescentralização e o controle social. Essafoi a mais ampla das políticas avaliadas emfunção de seu caráter universal. Dados de2003 indicavam que 90% da populaçãobrasileira era usuária e dessas 28,6% eramexclusivas do SUS (SUS -MS 2003). Oobjetivo do sistema de saúde foi ampliadoquando a saúde passou a ser direito detodos e dever do Estado. Foi priorizada aexecução das ações por parte do nívelmunicipal, com a formação de comissõesintergestoras de pactuação (para as 3esferas); criação de fundos de saúde comrepasse fundo a fundo e de conselhos desaúde para propiciar a participação social. OSUS, em termos da saúde para o campo,apresentou como principal estratégia oPrograma Saúde da Família, que atua nocontexto da Atenção Básica de Saúde

Page 49: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

49

visando ser a porta de entrada doatendimento a essas populações. Com oestímulo do Grupo da Terra (Brasil 2004c e2005) e pela pressão de movimentos comoo MST, foi incluída na base de cálculo dovalor do Piso de Atenção Básica (PAB-fixo)e do Piso de Atenção Básica Ampliado(PABA) a população assentada entre osanos 2000 e 2003. Somado a isso, forampublicadas portarias que definirammudanças no financiamento e criaram oincentivo à eqüidade, para estimular acriação de equipes do PSF em municípiospequenos com expressiva população ruralBrasil, 2004d e b). Outras políticas afins aessas populações como a de plantasmedicinais e fitoterapia foram construídastambém com o estímulo do Grupo da Terrae a pressão dos movimentos do campo(Brasil, 2006). Em relação ao saneamento,foi publicada uma Portaria da FUNASA(Brasil, 2004e) definindo critérios deelegibilidade para obras em áreas deassentamento, mas a amplitude de suasações ficaram muito limitadas, esbarrandonos problemas de operacionalização.Apesar do avanço de sua concepção, oSUS ainda apresenta iniqüidade, recursosfinanceiros insuficientes e gastos irracionais,deficiência quali-quantitativa de recursoshumanos, baixa resolutividade e limitaçõesno acesso aos serviços.

Os objetivos do SUS vão ao encontro dasaspirações do MST, à medida que aconquista de uma vida saudável associa-sea realização de uma reforma agrária em queestivessem garantidos os direitosfundamentais da pessoa humana. Osprincípios da atuação do MST na saúderesultaram da valorização de algunsprincípios do SUS, mas reforçaram adimensão política da saúde, poispriorizaram: a luta pela valorização da vida,o acesso ao conhecimento e à informação,a saúde como dever do Estado, a atençãointegral, a prioridade à promoção e àprevenção, o respeito às diferençasculturais, e o fortalecimento das práticasnão-convencionais e, finalmente, a saúdecomo conquista de luta popular (Oficina -MST, 1998; Reunião -MST2000a;Construindo -ANCA 2000; Saúde ereforma agrária -MST, 2005b). As

estratégias do MST para fazer que aspolíticas públicas fossem implantadas emsuas áreas envolvem a realização demarchas, encontros, mobilizações, cursos enegociações de pautas de luta com osórgãos da saúde e outros afins (MST, 2004).Isto se dá, tanto no âmbito municipal,quanto no federal. A experiência de atuaçãodo MST no campo da saúde tem se pautadopela organização da comunidade e amobilização política na luta por melhorescondições de vida. Nesse contexto,inserem-se também demandas específicaspara responder às necessidades poratendimento à saúde, problemas como adesnutrição, dependência química ecuidados com o meio ambiente entre outrasações específicas de acordo com arealidade local. A realização de cursos deformação para atuação dos coletivos desaúde, as orientações para práticas comofitoterapia e as atividades educativasvoltadas para as DST/AIDS são algumasdas ações promovidas cotidianamente peloscoletivos de saúde no âmbito dosacampamentos, assentamentos, encontrose mobilizações do MST (Relato –MST2005a; Saúde e Reforma Agrária –MST,2005b). O MST na sua relação com o SUStambém conseguiu apoio para a formaçãode militantes (Proposta -MST 2001) epautas com os governos parcialmenteatendidas. A experiência de atuação nasaúde pode ser considerada aindaembrionária se comparada a ações deoutros setores do movimento como os deprodução e educação. Falta infra-estrutura eapoio econômico para a realização dostrabalhos. Há pouca sistematização dasexperiências e baixo reconhecimento daimportância do setor saúde nas instânciasdecisórias do MST, com a necessidade deampliação da formação de militantes dasaúde (Saúde e Reforma Agrária –MST,2005b).

4.3.1 Comparando as políticas e aexperiência do MST

O FUNRURAL criou nova rede deatendimento, que apesar de ter tido o méritode se constituir como uma estrutura mínimade saúde para o campo, ao abrir váriasportas de entrada ao sistema, implantou um

Page 50: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

50

modelo tipicamente urbano e curativo(QUADRO 3). Em 1980, o antigo INAMPShavia gasto mais de 13 vezes o valor percapita com o morador urbano comparado aorural (Pinto, 1984).

Ao contrário do FUNRURAL, o PIASSpropôs a criação de uma rede integrada deunidades de saúde, com ampla utilização depessoal de nível auxiliar e articulação comas Secretarias Estaduais de Saúde.Entretanto, a prioridade aos serviços desaúde em detrimento às ações desaneamento, somadas às dificuldades demanutenção e operação da rede deunidades, limitou o impacto do programapara a saúde da população brasileira(QUADRO 3). O PIASS, apesar do avançode sua arquitetura em relação aoFUNRURAL tropeçou nos problemas deoperacionalização (Pinto, 1984).

Com a criação do SUS, foram definidas asbases para a implantação de um sistemapúblico de saúde de caráter universal,

eqüitativo e integral, requisitos fundamentaispara a saúde no campo. Em função daprópria dinâmica da descentralização, aspolíticas de saúde para o campo ficaram acargo dos municípios que em um curtoespaço de tempo assumiram a gestão dosistema de saúde local (Lima et al, 2005). Aimplantação de ações de saúde no campoacabou por depender do enfoque dado aprogramas de atenção básica ou de saúdeda família municipais. Na esfera federal,somente no ano de 2004, com a criação doGrupo da Terra, iniciou-se processo deconstrução de uma política de saúde para apopulação do campo. O governo passou ase articular de forma mais integrada ecomeçou a criar mecanismos para estímulode novas ações nesse âmbito. Entretanto,essas iniciativas ainda são de caráterembrionário, com a maioria dos municípiosbrasileiros desinformados sobre osincentivos financeiros, a exemplo do Piso deAtenção Básica diferenciado e do aumentode repasse de recursos do PSF paraatuarem junto à população do campo(QUADRO 3).

Page 51: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

51

QUADRO 3 – Comparação entre a atuação do FUNRURAL, PIASS e SUS junto àpopulação do campo, Brasil (1967 a 2004)

Políticas Avanços ProblemasFUNRURAL Implantou uma estrutura mínima de saúde

para o campo e interiorizou a mão-de-obra

Sistema desintegrado, urbano, curativo,centralizado, de responsabilidade privada,não universal, convênios com sindicatos,diminuição progressiva dos recursos,escassez de medicamentos e de examescomplementares, apresentando distorçõesna assistência odontológica e restriçõesdo acesso a hospitalização

PIASS Ampla utilização de pessoal do nívelauxiliar, ênfase na prevenção de doençastransmissíveis,desenvolvimento de ações de baixo custoe alta eficácia e preconização daparticipação comunitária

Priorização dos serviços de saúde emdetrimento aos de saneamento;participação restrita da previdência;baixa cobertura dos postos de saúde, comretração estadual do custeio e damanutenção e operação da rede deunidades;limitação de recursos humanos,supervisão, e dificuldade de atendimentosde maior complexidade

SUS Universalidade, integralidade, equidade,descentralização e o controle socialSaúde como direito de todos e dever doEstadoPriorizada a execução das ações porparte do nível municipalCriação do Grupo da Terra e início daconstrução de uma política de saúde parao campo

Iniqüidade; recursos financeirosinsuficientes e gastos irracionalmente;deficiência quali-quantitativa de recursoshumanos, baixa resolutividade elimitações no acesso aos serviços.

Fonte: Programa -PIASS (1981); Pinto (1984); Brasil (2004c e 2005); Lima et al (2005).

Apesar dos avanços, para movimentossociais como o MST, as iniciativas foramtímidas, existindo distanciamento entre opreconizado pelo Ministério e a realidade nabase do sistema de saúde. A experiência doMST coloca a saúde como objeto de lutapela valorização da vida. A saúde passa asignificar uma conquista da luta popular,exigindo do MST a formação de militantesda saúde e a delegação deresponsabilidade para todos os níveis daorganização. Esse talvez seja o grandediferencial da ação do MST sobre a saúde:seu processo organizativo. O resgate dapolitização da saúde, no sentido de valorizaros princípios originais do SUS, baseados napromoção da saúde e na participaçãopopular é outra prioridade importante. Esseolhar é estratégico, pois o SUS focou suaresposta na grande demanda porassistência médica, responsável peloconsumo de mais de 80% de seus recursos,

ficando seu núcleo medicalizado (Arouca,2002). Segundo o próprio ConselhoNacional de Saúde:

Os princípios e diretrizes do SUS e suatentativa de concretização encontram-seinequivocadamente dificultados pelapolítica econômica vigente nestes últimosanos, que privilegia o sistema financeiro, omercado e um paradigma de Estado debaixíssimo compromisso com políticaspúblicas redistributivistas,desenvolvimentistas, de pleno emprego ede ações intersetoriais, visando aqualidade de vida e aos direitos decidadania, no que tange à alimentação esegurança alimentar, saneamento, meioambiente, educação, trabalho (urbano erural), emprego, renda, habitação,segurança pública, cultura, lazer e,também, a saúde” (O desenvolvimento -MS, 2002, p 22).

Page 52: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

52

Ao analisar a pauta de reivindicações doMST com o Ministério da Saúde, Andrade eNagy (2004) afirmam que as demandasrelacionadas à temática daintersetorialidade e da eqüidade são as quemais se destacam. Essa agenda éfortemente reivindicada pelo MST,principalmente para atender às demandaspor saneamento rural, moradia, águapotável e produção de fitoterápicos. Tratam-se de lutas por melhores condições de vidadaqueles que vivem nos assentamentos eacampamentos, bem como para apreservação ambiental e a geração derenda. A própria criação do Grupo da Terrae de um PAB fixo para o campo estavamentre as pautas do movimento com oMinistério da Saúde (Andrade e Nagy,2004), o que pode indicar claramente umbom resultado das pressões feitas sobre ogoverno.

Albuquerque et al (2000), ao avaliarem ascondições de saúde nas áreas de reformaagrária, concluiram pela necessidade decriação de um novo modelo de promoção eassistência à saúde para as famíliasassentadas. Sugerem que

...é preciso incluir no modelo atual,tipicamente urbano, uma política globalde saúde dirigida à população rural,reforçando que não deve haver umaproposta de saúde exclusiva paraassentados, mas sim, para oambiente/área rural e para as famíliasque lá vivem, estudam e trabalham (sn).

O contexto de construção da política desaúde para o campo também passa peladiscussão sobre o desenvolvimento do Paíse pelo debate de alternativas rumo a umprojeto popular para o Brasil, como explicaStédile (1994). A adoção do modelo políticoneoliberal, no início da década de 1990,ainda tem limitado a capacidade de açãofinanceira do Estado brasileiro, que vempriorizando a elevação dos superávitsprimários necessários ao pagamento dadívida interna (O desenvolvimento -MS,2002; Miranda et al, 2007). A implantaçãodessa política implicará investimentos ecustos que irão criar uma demanda contra-hegemônica frente ao ideário do “Estado

mínimo” (Marshall, 1967; Vianna 1998;Cohn, 2005).

Ademais, uma das expressões dessemodelo está na grande mudança ocorridana agricultura brasileira e mundial, ditadapela acumulação transnacional em grandeescala. Autores como Breilh (2004, p.15)alertam que “o espaço privilegiado ondeadquiria maior densidade a acumulação decapital eram as cidades, com todo oexcesso de problemas ecológicos que istoacarretou para os espaços urbanos, masagora a essa problemática se soma o rápidoavanço da transnacionalização rural e novasseqüelas para os ecossistemas rurais”. Talenfoque vai de encontro ao papel do urbanoem relação ao rural colocado por outrosautores na década de 1980 (A política-FEE1983). Esse novo padrão envolve aexpansão dos latifúndios agroindustriais dealta complexidade tecnológica e com umalto grau de externalidades negativas, comotambém afirmam Soares e Porto (2007) emreferência ao uso de agrotóxicos no cerradobrasileiro. Tais externalidades estãorelacionadas aos danos ambientais e àsaúde humana cujos custos acabam sendosocializados.

Finalmente, para o sistema mudar o seuenfoque, é necessária a proposição de “umnovo ciclo para o SUS” como defendemalguns autores (Netto, et al 2004). Essenovo ciclo exigiria que as ações de saúdefossem realizadas fundamentalmente,embora não exclusivamente, fora da práticadas unidades de saúde. Ocorrendo nosespaços do cotidiano da vida humana, nosambientes dos processos produtivos e nadinâmica da vida das cidades e do campo,buscando compreender o ambiente comoum território vivo, dinâmico, reflexo deprocessos políticos, históricos, econômicos,sociais e culturais, onde se materializa avida humana.

A evolução histórica das políticas de saúdepara as populações do campo no Brasilestiveram estreitamente associadas aosmomentos de mobilizações dostrabalhadores rurais, quando se constituíramem grupos de pressão com capacidade dearticulação política frente ao Estado. Nesse

Page 53: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

53

processo foram vencidas importantesbarreiras associadas a interesses privados ecorporativos. Mesmo assim, o Estado usouessas políticas como forma de cooptaçãodos movimentos ao mesmo tempo em quebuscava uma maior legitimidade junto àsociedade. Essas populações sempreenfrentaram a descontinuidade das ações,modelos que não se consolidaram, e umafragmentação de iniciativas que aindacontribuem para seus altos níveis deexclusão e discriminação pelos serviços desaúde.

4.4 Estudo comparativo sobre ascondições de saúde de famílias do MST ede bóias-frias

No Assentamento Menino Jesus, foramaplicados questionários em 26 residências,

o que correspondeu à totalidade dasfamílias.

No Acampamento Índio Galdino, foramentrevistadas 95 famílias. No entanto, 50famílias ali residentes encontravam-seausentes no período da pesquisa. Asfamílias de 10 posseiros não foram incluídasna pesquisa por não viverem noacampamento.

O processo de seleção das famílias detrabalhadores rurais partiu do cadastro doSistema de Informação da Atenção Básicada cidade de Unaí que identificou no BairroMamoeiro a maior concentração dapopulação de trabalhadores bóias-frias. Deum total de 98 famílias cadastradas peloPSF local foram aplicados questionáriospara 81. Ocorreram três recusas e 14famílias não estavam em casa.

Tabela 1 - Universo do estudo segundo comunidade de residência, número de famíliasentrevistadas e pessoas, Unaí-MG, abril de 2005

Número de famíliasentrevistadas Número de pessoasComunidade

Nº % Nº %Assentamento Menino Jesus 26 12,87 115 14,43

Acampamento Índio Galdino 95 47,03 328 41,15

Bairro Mamoeiro 81 40,10 354 44,42

Total 202 100 797 100

Os resultados da aplicação dosquestionários nas três comunidades foramagrupados como informações relacionadasa: caracterização sócio-demográfica efamiliar, condições de vida, condições deprodução e trabalho, presença de animaisde produção, domésticos e sinantrópicos,condições de saúde e relação com serviçosde saúde. A análise dessa informação serácomplementada pelos relatos dos grupos dediscussão organizados, dados daobservação estruturada, bem como com abibliografia científica pertinente. Ao finalserá realizada uma análise fatorialdiscriminante com o objetivo de verificar se

as três comunidades estudadas eramrealmente distintas entre si.

4.4.1 Características sócio-demográficase familiares das comunidades estudadas

A comparação entre as três comunidadespor meio das variáveis sexo e idadeapontaram que não havia diferenças doponto de vista estatístico (p = 0,41 – Tabela2). Entretanto, a variável sexo quandoassociada a escolaridade apresentoudiferenças entre os grupos (p=0,0008 –Tabela 3). Isso pôde ser explicado pelamaior escolaridade das mulheres doassentamento que apresentaram médias de

Page 54: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

54

quase cinco anos de estudo, enquanto oshomens das três comunidades possuíamsuas médias abaixo de 4 anos. Nas três

comunidades, o sexo feminino apresentoumaior escolaridade se comparado aomasculino (Tabela 4).

Tabela 2 - Distribuição de pessoas de acordo com o sexo e a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005*.

SexoFeminino MasculinoComunidade

Nº % Nº %Total

Assentamento Menino Jesus 56 48,7 59 51,3 115

Acampamento Índio Galdino 139 42,4 189 57,6 328

Bairro Mamoeiro 170 48 184 52 354

Total 365 45,80 432 54,20 797*Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.

Tabela 3 - Distribuição de pessoas de acordo com a média da idade e a comunidade deresidência, Unaí-MG, abril de 2005*.

IdadeComunidadeMedia D. E Min Max

Total

Assentamento Menino Jesus 25,32 17,42 1 68 114

Acampamento Índio Galdino 25,48 19,21 0 81 328

Bairro Mamoeiro 23,65 17,01 0 72 354

Total 796* Uma família assentada não respondeu.

Tabela 4 - Média de anos de estudo segundo o sexo e a comunidade de residência, Unaí-MG,abril de 2005.

Média de anos de estudo*Comunidade

Feminino MasculinoTotal

Assentamento Menino Jesus 4,84a 3,93 a 115

Acampamento Índio Galdino 4,14 ab 3,35 ab 328

Bairro Mamoeiro 3,81 b 3,01 b 354

Total 4,26 3,43 797* Letras iguais numa mesma coluna indicam valores semelhantes entre as comunidades para p<0,05(ANOVA)

Page 55: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

55

As características sócio-demográficas efamiliares das comunidades eramsemelhantes se levarmos em conta a idade,o sexo, a escolaridade bem como aconformação das famílias (maioria nuclear –chefe, cônjuge e os filhos). Essascaracterísticas comuns contribuem parauma melhor comparação entre os grupos.

Nas três comunidades, em torno de umterço das famílias possuíam membrosfreqüentando a escola (Tabela 5). Cabedestacar que a mesma escola servia ao

assentamento e ao acampamento.Anteriormente, em condições precárias,atendia apenas ao vilarejo mais próximo,denominado Chapadinha. Com aimplantação do assentamento e doacampamento foram realizadas pressõespor parte dessas comunidades sobre osadministradores municipais no intuito degarantir melhores condições de estudo paraas crianças. Foi construída uma novaescola, com um maior número de salas,amplas e arejadas, modelo para a região(Figura 7).

Tabela 5 - Número de pessoas que freqüentam a escola segundo a comunidade de residência,Unaí-MG, abril de 2005*.

Freqüenta a escolaSim NãoComunidade

Nº % Nº %Total

Assentamento Menino Jesus 42 36,5 73 63,5 115

Acampamento Índio Galdino 109 33,2 219 66,8 328

Bairro Mamoeiro 113 31,9 241 68,1 354

Total 264 33,12 533 66,88 797*Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.

Figura 7 – Nova escola de Chapadinha, Unaí-MG.

Page 56: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

56

Page 57: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

57

Entretanto, o transporte escolar foiqualificado pelos jovens do acampamento edo assentamento como precário (Figura 8).Percursos de longo tempo de duração, máqualidade das vias, exposição à poeira oumesmo à chuva no interior do veículoestiveram entre os problemas relatados naforma de um teatro, no dia do encerramentodas atividades e divulgação dos resultadospreliminares da pesquisa pela equipe decampo. A utilização do teatro foi umaestratégia didática desenvolvida pelo grupode jovens do assentamento para aexposição dos problemas vivenciados pelacomunidade.

O assentamento possuía 22,6% dosintegrantes da família morando fora do local,contra 16,8% do acampamento e 7,1% doBairro Mamoeiro. O Bairro Mamoeiro

contava com a população mais fixa (Tabela6).

Fonte: Bertolini, 2005

Figura 8 – Transporte escolar para a escolade Chapadinha que serve ao assentamentoe acampamento, Unaí, 2004

Tabela 6 - Local de moradia segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.Mora no local

Sim NãoComunidadeNº % Nº %

Total

Assentamento Menino Jesus 89 77,4 26 22,6 115

Acampamento Índio Galdino 273 83,2 55 16,8 328

Bairro Mamoeiro 328* 92,9 25* 7,1 353

Total 690 86,68 106 13,32 796* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação; faltou uma resposta para o Bairro Mamoeiro

A origem das famílias do assentamentoMenino Jesus era predominantemente ruralse comparada com as famílias doacampamento Índio Galdino, que exibiamum perfil predominantemente urbano(p<0,05). Essas famílias acampadas vieram

de uma das áreas mais pobres edegradadas da periferia do Distrito Federal,denominada Vila Estrutural. Essa cidadecresceu junto ao lixão de Brasília, possuindoaltos índices de pobreza, violência e falta deinfra-estrutura básica (Figura 9 e 10).

Figura 9 e 10 - Vila estrutural, Brasília-DF Fonte: Cabral (2002); Dugger (2004)

Page 58: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

58

Page 59: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

59

Os dados do assentamento (Tabela 7)apresentaram correspondência com outrosde âmbito nacional (Saúde nosassentamentos -UnB 2001; Schmidt et al,1998). Já o acampamento exibiu algumascaracterísticas não muito comuns às demaisáreas do MST se compararmos com osdados da pesquisa da UnB (Saúde nos

Assentamentos – UnB 2001). A maioria dasfamílias (82,4%) morou anteriormente nascidades, o que pode sinalizar para um outroperfil de beneficiário da reforma agrária. Poroutro lado, as famílias do Bairro Mamoeiroestavam em uma situação intermediária(42,3%), pois uma parcela possuía origemrural, e outra, urbana.

Tabela 7 - Local de moradia antes de acampar ou trabalhar como bóia fria segundo acomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Local de moradiaZona rural Zona urbanaComunidade

Nº % Nº %Total

Assentamento Menino Jesus 20 76,9 6 23,1 26

Acampamento Índio Galdino 16* 17,6 75* 82,4 91

Bairro Mamoeiro 46 56,8 35 43,2 81

Total 82 41,41 116 58,59 198* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Faltaram 4 respostas no acampamento.

Silva (1999), ao estudar a migração detrabalhadores bóias-frias no interior de SãoPaulo identificou a migração interestadualproveniente de áreas rurais e a migraçãointerna proveniente de áreas urbanas. Essaautora considera que o processo demodernização da agricultura em algumasregiões como o norte de Minas Geraiseliminou a possibilidade de sobrevivência demuitas famílias camponesas, com a tomadadas chapadas e até mesmo de regiões degrotas pelas grandes fazendasmecanizadas. No final de 1960, aintensificação do processo de modernizaçãoda agricultura e a oferta de recursos(financeiros, tecnológicos e jurídicos) para aadaptação do cerrado às exigências de umaagricultura capitalista também trouxerammudanças com a expropriação de pequenosproprietários e posseiros, intensificando aconcentração fundiária (Leite et al, 2004;Miranda et al, 2007; Soares e Porto, 2007).No caso das comunidades analisadas emUnaí, já estamos lidando com a geração dos“filhos dos expropriados”. Muitos quehaviam trabalhado nas fazendas ou partiram

para a periferia de Unaí, atuando comobóia-fria ou para Brasília, como assalariadosurbanos, segundo os relatos durante aaplicação dos questionários.

A ocupação anterior mais citada para oschefes de família foi a de empregado defazenda, com exceção do acampamentoÍndio Galdino, onde prevaleceu o trabalhocomo assalariado urbano (37%). A altafreqüência do item “outros” está associada àdiversidade de serviços temporáriosurbanos ou em fazendas, denominados“bicos” pelas pessoas. Várias famílias doBairro Mamoeiro não responderam essaquestão por sempre terem atuado comobóias-frias (Tabela 8).

Assim como no caso dos homens, 28,2%das mulheres do acampamento trabalhavamcomo assalariadas urbanas, exibindotambém uma grande diversidade em outrasocupações temporárias urbanas (33,8%).Entretanto, de modo geral a função de donade casa é ainda a mais importante nos trêsgrupos (50%) (Tabela 9).

Page 60: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

60

Tabela 8 - Ocupação anterior do homem segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abrilde 2005.

Ocupação anterior do homem

Empregadode fazenda Bóia Fria Meeiro Assalariado

urbanoPequeno

proprietário OutrosComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %

Total

AssentamentoMenino Jesus 9 34,6 6 23,1 2 7,7 2 7,7 1 3,8 6 23,1 26

AcampamentoÍndio Galdino 12* 14,8 4* 4,9 3 3,7 30* 37 1 1,2 31 38,3 81

Bairro Mamoeiro 28 39,4 - - 9 12,7 5 7 - - 29 40,8 71

Total 49 27,5 10 5,6 14 8,0 37 20,8 2 1,1 66 37,0 178* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Vinte e quatro famílias do Bairro Mamoeiro nãoresponderam a pergunta.

Tabela 9 - Ocupação anterior da mulher segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abrilde 2005.

Ocupação anterior da mulher

Dona decasa Bóia Fria Empregada

de fazendaAssalariada

urbanaPequena

proprietária OutrasComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %

Total

AssentamentoMenino Jesus 13 54,2 4 16,7 3 12,5 2 8,3 - 2 8,3 24

AcampamentoÍndio Galdino 23 32,4 3* 4,2 1* 1,4 20* 28,2 - 24* 33,8 71

Bairro Mamoeiro 42 63,6 9 13,6 2 3 5 7,6 2 3 6 9,1 66

Total 78 48,4 16 10,0 6 3,7 27 16,8 2 1,2 32 19,9 161* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. 41 famílias não responderam a pergunta.

O fato do assalariamento urbano ser aocupação principal anterior do acampadotambém reforça a hipótese da importânciada atração de fluxos migratórios para aregião do entorno de Brasília. Já aocupação anterior do empregado defazenda para os assentados e bóias frias doBairro Mamoeiro pode estar associada àconcentração fundiária previamenteexistente e ao processo de modernizaçãoconservadora da agricultura, responsáveispor inviabilizar a permanência dessasfamílias no campo, como observadotambém por Leite et al (2004) e Bertolini(2005).

4.4.2 Condições de vida

Em relação à segurança alimentar, os bóias-frias do Bairro Mamoeiro apresentaram asituação mais crítica. Ocorreu falta decomida nos últimos três meses em 39,5%das famílias, quase o dobro da proporçãoentre as famílias acampadas (22,1%) equatro vezes mais que as assentadas(11,5%). O Assentamento Menino Jesus e oAcampamento Índio Galdino apresentarammelhores indicadores de segurançaalimentar que as famílias do BairroMamoeiro (Tabelas 10, 11 e 12).

Page 61: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

61

Tabela 10 - Disponibilidade de alimento nos últimos três meses entre as famílias, Unaí-MG,abril de 2005.

Falta de comida nos últimos três mesesSim Não Não sabeComunidade

N° % N° % N° %Total

Assentamento Menino Jesus 3 11,5 23 88,5 - 26

Acampamento Índio Galdino 21 22,1 73 76,81 1 1,1 95

Bairro Mamoeiro 32* 39,5 49* 60,5 - 81

Total 56 27,72 145 71,78 1 0,5 202* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação

Apesar de não haver diferençassignificativas entre os grupos, a freqüênciade falta de comida é expressiva (56,3%)para a opção “em alguns dias”, indicando amagnitude do problema da insegurançaalimentar paras as comunidades (Tabela11).

O número de refeições diárias reforçou atendência de uma maior segurançaalimentar no assentamento, onde 46,2 %das famílias consumiam até quatro refeiçõesdiárias contra 22,5% das famílias de bóias-frias do Bairro Mamoeiro. No acampamento,51,6% das famílias contavam pelo menoscom três refeições diárias (Tabela 12).

Tabela 11 - Distribuição da freqüência de falta de comida entre as famílias nos últimos trêsmeses, Unaí-MG, abril de 2005*.

Freqüência de falta de comida nos últimos três mesesEm quase todos os

diasEm alguns dias Em apenas 1 ou 2

diasComunidade

N° % N° % N° %

Total

Assentamento Menino Jesus - - 2 66,7 1 33,3 3

Acampamento Índio Galdino 3 14,3 13 61,9 5 23,8 21

Bairro Mamoeiro 6 19,4 16 51,6 9 29 31

Total 9 16,4 31 56,3 15 27,3 55*Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.Faltou uma resposta relativa à freqüência.

Tabela 12 - Distribuição das famílias de acordo com o número de refeições diárias, segundocomunidade de residência, Unaí MG, abril de 2005.

Número de refeições diáriasUma Duas Três Quatro CincoComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %Total

Assentamento Menino Jesus - 6 23,1 8 30,8 12 46,2 - 26

Acampamento Índio Galdino 3 3,2 24 25,8 48* 51,6 15* 16,1 3 3,2 93

Bairro Mamoeiro 3 3,8 31 38,8 28 35 18* 22,5 - 80

Total 6 3,0 61 30,7 84 42,2 45 22,6 3 1,5 199

p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Três famílias não responderam.

Page 62: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

62

Os achados do estudo comparativo relativosà maior insegurança alimentar entre osbóias-frias se comparados aos assentadostambém estão relacionados aos resultadosmencionados por diversos autores (Victora1983 e 1986; Lira et al 1985; Romani eAmigo, 1986; Yusuf et al, 1993; Ferreira etal, 1997; Brentlinger et al, 1999; Veiga eBurlandy, 2001; Castro, 2004). Essesestudos apontaram que a propriedade dosmeios de produção, no caso entendidacomo a posse da terra, está associada a ummelhor estado nutricional das crianças. Leiteet al (2004) e Guedes (2006) tambémobservaram que o acesso à terra e àpossibilidade de plantio para o consumoparece levar a uma melhoria nas condiçõesde alimentação das pessoas que antesviviam de trabalho temporário ou de outrasformas de trabalho instáveis. A análise dageração de renda levando em conta a rendade autoconsumo e a monetária mostrou quemesmo com valores limitados as famíliasgarantiram a segurança alimentar. Alémdesse fator, Leite et al (2004) encontraramuma média geral de 90% de melhora nascondições de vida das famílias após seremassentadas nas principais “manchas” deassentamentos do País.

Os dados encontrados relativos àinsegurança alimentar entre bóias-frias doBairro Mamoeiro foram também observadospor Silva (1999) no interior de São Pauloalém de Moreira e Watanabe (2006) naZona Canavieira da Paraíba, que, aoestudarem o quadro alimentar semanal defamílias bóias-frias, notaram um padrãoalimentar precário em proteínas,concentrando-se o maior consumo emcereais e derivados. Boa parte dessasfamílias utilizavam mais de 50% do saláriofamiliar com a alimentação (Silva, 1999).Apesar de Fleuret e Fleuret (1980)realizarem ponderações sobre asdificuldades de se controlar as variáveis quepossuem papel relevante na questão, Josuéde Castro, no seu livro clássico – Geografiada Fome (Castro, 2003), já buscava aexplicação principal da fome no Brasil nãonas condições naturais, mas nos sistemaseconômicos e sociais, nos quais o uso

monopolista da terra era, e ainda é, uma desuas expressões mais significativas.

A Tabela 13 mostra que 76% das famíliasdas três comunidades não receberam apoiogovernamental, seja na forma de bolsas,seja outro benefício. Somente 20,1% dosacampados receberam a cesta básica,sendo a bolsa escola o auxílio maispresente no assentamento (14,8%),enquanto a bolsa família foi mais recebidano Bairro Mamoeiro (4,8%). Segundoinformações da área social da PrefeituraMunicipal de Unaí, os baixos índices decobertura dessa bolsa para as famíliasbóias-frias estão associados ao Índice deDesenvolvimento Humano municipal, que émaior que outras regiões como o Vale doJequitinhonha, fazendo com que o repassedo governo federal priorize essas áreas.Outro aspecto, é que o fato de muitos bóias-frias estarem com a carteira assinada osretiram da população beneficiária, masquando estão desempregados ao entrar na“fila” para receber o benefício vão para ofinal. Ou seja, recebem o benefício de formainconstante. O baixo recebimento de cestasbásicas no acampamento está relacionadoà sua inconstância, apesar dos acampadosconsiderarem que possuem acesso a essapolítica por meio da ação do INCRA (Tabela14).

O Bairro Mamoeiro apresentou melhoracesso ao transporte coletivo (100%), aosserviços de saúde (98,8%), ao saneamento(53,8%), à educação (97,5%), e à telefonia(31,3%) (Tabela 14). O fato de estar inseridona área urbana facilitou a utilização dessesserviços. Ao contrário, o assentamento e oacampamento tiveram uso muito limitadodos serviços de saúde (7,7% e 5,3%respectivamente). Isso está associado àsdistâncias para as áreas urbanas, poisestão a mais de 80 Km da sede domunicípio. A energia havia sidorecentemente instalada no assentamento oque o colocou nos mesmos níveis do BairroMamoeiro. As políticas públicas maisacessíveis aos assentados foram a energia(92,3%), educação (76,9%), crédito (73,1%)e habitação (65,4%). O saneamento, a

Page 63: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

63

telefonia e o transporte coletivo chegaram a0%, considerados praticamente inacessíveispara assentados e acampados. As políticasde segurança alimentar atingiram de formasignificativa a 93,7% dos acampadosdiferenciando-os dos assentados e bóias-frias. A educação apresentou valoressuperiores para as três comunidadesindicando a capilaridade dessa política,apesar do melhor acesso para os bóias-frias. Entre as especificidades pode-seobservar que somente o assentamentorecebeu incentivos para a melhora da

moradia, crédito e assistência técnica; oacampamento recebeu cestas básicas e oBairro Mamoeiro possuía saneamento eserviços de telefonia. As questõesenfrentadas pelo acampamento no que serefere ao transporte coletivo ou e a relaçãocom os serviços de saúde são semelhantesàs encontradas no assentamento MeninoJesus. A diferença é que no acampamentoexiste o setor de finanças do MST queviabiliza o deslocamento das pessoasenfermas para Unaí-MG ou Cabeceiras –GO, as cidades mais próximas.

Page 64: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

64

Tabela 13 - Alocação de benefícios sociais para os integrantes das famílias segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Benefícios sociaisAposentadoria Bolsa Família Bolsa Escola Vale Gás Pensão Cesta básica Não recebe Outro

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %Assentamento Menino Jesus 5 4,3 1 0,9 17 14,8 2 1,7 - - 88 76,5 2 1,7

Acampamento Índio Galdino 4 1,2 5 1,5 13* 4 4 1,2 4 1,2 66 20,1 228 69,5 4 1,2

Bairro Mamoeiro 7 2 17* 4,8 22* 6,2 12 3,4 1 0,3 1 0,3 290 81,9 4 1,1

Total 16 2,0 23 2,9 52 6,5 18 2,3 5 0,63 67 8,4 606 76,0 10 1,3p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Tabela 14 - Acesso a serviços públicos e direitos pelas famílias, segundo a comunidade de residência, Unaí - MG, abril de 2005.

* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Acesso a serviços públicos e direitosHabitação Segurança

alimentarSaúde Saneamento Crédito Energia Telefonia Transporte

coletivoEducação Assistência

TécnicaEstradas

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus 17 65,4 7 26,9 2 7,7 0 - 19 73,1 24 92,3 0 - 0 - 20 76,9 7 26,9 11 42,3

AcampamentoÍndio Galdino

2* 2,1 89* 93,7 5 5,3 0 - 10* 10,5 0 0 0 - 0 - 77 81,1 6* 6,3 18* 18,9

BairroMamoeiro

1* 1,3 10 12,5 79* 98,8 43* 53,8 3* 3,8 72 90 25* 31,3 80 100 78* 97,5 - - - -

Total 20 9,9 106 52,5 86 42,6 43 21,3 32 15,8 96 47,5 25 12,4 80 39,6 175 86,7 13 6,4 29 14,4

Page 65: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

65

Essas comunidades estão, de certa forma,alijadas das políticas sociais do Estado, poisquase 80% das famílias não recebiamqualquer benefício social. Em relação aosserviços públicos, a falta de acesso foi maisobservada no assentamento eacampamento se comparados às famíliasde bóias-frias. Isso pode estar associado auma das características marcantes do modode produção capitalista que induz umaconcentração crescente da força de trabalhonas cidades, observada no caso nos bairrosperiféricos de Unaí e já apontada por outrosautores (A política FEE 1983). Para asfamílias assentadas e acampadas a únicapolítica pública capaz de diferenciá-los dosbóias-frias foi justamente o acesso aocrédito agrícola. Esse diferencial explicita apossibilidade de financiamento da produçãode seu próprio alimento. Por outro lado,segundo o grupo de discussão com oColetivo Nacional de Saúde do MST, issotambém gera preocupações no sentido danecessidade de honrar com essescompromissos - “quem pega o crédito ficadoente com as dívidas”.

Esses dados indicam as limitações daspolíticas públicas voltadas para essascomunidades, mas sugerem que, para a

zona rural, existem importantes lacunas quepodem ser sanadas com programasapropriados às realidades locais a exemplodo que já ocorre com certas políticas desegurança alimentar, crédito, energia eeducação.

As águas superficiais, por meio de minas,constituem-se na principal fonte de águapara as famílias no assentamento eacampamento. Entretanto, somente 11,5%das famílias do assentamento e 17,9% dasfamílias do acampamento possuem águaencanada dentro de casa. Já o BairroMamoeiro conta com 84% das casas comágua encanada (Tabela 15). Apesar da máavaliação da qualidade da água por partedas famílias, o Bairro Mamoeiro conta com oserviço público de rede de distribuição deágua potável. A presença de águaencanada dentro de casa é importanteindicador (Carneiro et al, 2002) no sentidode viabilizar as condutas de higiene,essenciais para prevenção de diversosagravos à saúde e para potencializar oimpacto de programas de reforma agrária(Brentlinger et al, 1999).

Tabela 15 - Distribuição das famílias que possuem água encanada dentro da residênciasegundo a comunidade, Unaí-MG, abril de 2005.

Água encanadaSim NãoComunidade

N° % N° %Total

Assentamento Menino Jesus 3 11,5 23 88,5 26

Acampamento Índio Galdino 17 17,9 68 84 85

Bairro Mamoeiro 68 84* 13 16 81

Total 88 45,8 104 54,2 192*p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Dez famílias do acampamento não responderam.

Page 66: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

66

Page 67: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

67

No Assentamento Menino Jesus, no sub-grupo Fruto da Terra (12 famíliasdistribuídas no modelo “raio de sol”), oacesso à água foi um fator limitante para aqualidade de vida das pessoas. Gastava-secerca de 2 horas por dia para buscar água.Essas limitações de uso dificultavam ahigiene, a produção de alimentos em voltada casa e a criação de animais. Seutransporte e armazenamento tambémimplicavam riscos à saúde (Figura 11).

Figura 11- Assentado buscando água decarroça, Unaí-MG, abril de 2005.

Já no acampamento, apesar da abundânciade água, parte de sua distribuição era a céu

aberto, que, associado às precáriascondições sanitárias (lixo e dejetos),propiciava a ocorrência de doenças. Comoexemplo pode-se citar a hepatite, quandohouve a suspeita de sua ocorrência entrepelo menos duas crianças durante otrabalho de pesquisa de campo.

A maior parte das famílias do assentamentoe do acampamento utilizava a fossa (Figura12), mas o destino de dejetos “a céu aberto”ainda era a opção de mais de um terçodestas pessoas. No Bairro Mamoeiro, nãoocorreu respostas “a céu aberto”, sendo que81,5% das residências possuíam banheiroscom fossa (Tabela 16).

Figura 12- Banheiro de família acampada,Unaí-MG, abril de 2005

Tabela 16 - Destino de dejetos das famílias segundo a comunidade de residência, Unaí-MG,abril de 2005 *.

Destino de dejetos

Fossa Céu aberto Banheiro comfossa OutrosComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº %

Total

Assentamento Menino Jesus 14 53,8 10 38,5 - - 2 7,7 26

Acampamento Índio Galdino 60 63,8 29 30,9 - - 5 5,3 94

Bairro Mamoeiro - - 66 81,5 15 18,5 81

Total 74 36,8 39 19,4 66 32,8 22 11,0 201

* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.

Page 68: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

68

Page 69: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

69

Um bom exemplo que reforça asdificuldades de acesso a serviços e políticaspúblicas por parte dos beneficiários dareforma agrária está na questão dosaneamento. Os dados do assentamento eacampamento reforçam esta afirmação(Tabelas 15 e 16). Esses dados tambémsão observados na maioria das áreas deassentamento e acampamento do MST(Saúde nos assentamentos -UnB, 2001) enos assentamentos pesquisados por Leiteet al (2004) e Schmidt et al (1998) indicandoa insuficiência das políticas públicas deEstado referentes ao saneamento rural.

O antigo imóvel dos assentados eacampados bem como o atual imóvel das

famílias do Bairro Mamoeiro foram, em suagrande maioria, próprios ou cedidos, nãosendo apresentados diferenciaissignificativos entre as comunidades. Oaluguel respondeu por 15,3% da situaçãodo imóvel das famílias do Bairro Mamoeiroou do antigo imóvel dos assentados eacampados (Tabela 17).

A maior parcela das famílias pertencentesao assentamento e acampamentoconsiderava-se inserida em uma forma deorganização comunitária (65,4% e 61,1%respectivamente). Já as famílias dos bóias-frias do Bairro Mamoeiro apresentaram umgrau de organização comunitária beminferior (25%) (Tabela 18).

Tabela 17 - Situação do antigo imóvel (assentamento e acampamento) e atual imóvel (BairroMamoeiro), Unaí-MG, abril de 2005*.

Situação do imóvel

Próprio Cedido Alugado Ocupado OutroComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %

Total

Assentamento Menino Jesus 12 46,2 9 34,6 5 19,2 - - 26

Acampamento Índio Galdino 41 43,6 26 27,7 14 14,9 7 7,4 1 1,2 89

Bairro Mamoeiro 51 63 17 21 11 13,6 1 1,2 1 1,2 81

Total 104 53,1 52 26,6 30 15,3 8 4,0 2 1,0 196

* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado. Faltou a resposta de 6 famílias do acampamento.

Tabela 18 - Participação das famílias em organização ou entidade comunitária, segundo acomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Participa de organização ou entidade comunitáriaSim NãoComunidade

Nº % Nº %Total

Assentamento Menino Jesus 17 65,4 9 34,6 26

Acampamento Índio Galdino 58 61,1 37 38,9 95

Bairro Mamoeiro 20* 25 60* 75 80

Total 95 47,3 106 52,7 201* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Uma família do Bairro Mamoeiro não respondeu.

Page 70: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

70

Page 71: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

71

As famílias do assentamento seidentificavam com a associação deassentados enquanto as famílias doacampamento apresentavam maioridentidade com o MST. Esse fenômeno ébem característico das áreas do movimento,pois no momento do acampamento existemelhor organização (Figura 13) em funçãoda própria dinâmica do processo de luta eda proximidade espacial entre as famíliascomo também foi reforçado no grupo dediscussão com o Coletivo Nacional deSaúde do MST. Já no Bairro Mamoeiro64,7%, das famílias possuíam comoreferência de participação comunitáriaapenas a igreja (Tabela 19).

Figura 13 - Reunião com os núcleos defamília do acampamento Índio Galdino,Unaí-MG, abril de 2005

Tabela 19 - Tipos de organização comunitária que as famílias participam, segundo acomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

EntidadeAssociação MST IgrejaComunidadeN° % N° % N° %

Total

Assentamento Menino Jesus 13 76,5 4 23,5 - 17

Acampamento Índio Galdino 1* 1,7 48* 82,8 7 12,1 56

Bairro Mamoeiro 6* 35,3 - 11 64,7 17

Total 20 22,2 52 57,8 18 20,0 90* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Duas famílias acampadas e três do Bairro Mamoeiro não responderam.

Apesar de alijados da maioria das políticas eserviços públicos, as famílias assentadas eacampadas do MST possuem nível deorganização política bem superior ao dosbóias-frias. A sua forte ação políticareivindicatória tem possibilitado diminuiralguns diferenciais como o acesso àeducação e aos créditos governamentais. Aconstrução de uma nova escola em umdistrito próximo ao assentamento MeninoJesus mostrou a importância dessaspressões, conforme também foi observadoem um outro estudo (Bittencourt, et al 1999).Essa característica do MST é um de seusmais importantes diferenciais em relaçãoaos outros movimentos e grupos(Morissawa, 2001). O nível de organizaçãopolítica contribui para a emancipação dossujeitos frente aos modos de vida esituações de risco a saúde, como explicaBreilh (2006), criando uma lógica dasolidariedade, que coloca o bem comumcomo meta fundamental, contrapondo-se a

uma lógica da concorrência, que parte daprimazia do individual Breilh (2004).

Os acampados apresentaram as maioreslimitações em termos do acesso aequipamentos domésticos como pia decozinha (20,2%), tanque de lavar roupa(8,5%) e vaso sanitário com descarga(7,4%) (Tabela 20). Esses resultados eramesperados em função do caráter provisóriodo acampamento (Figura 14). É importantedestacar como o filtro de água está maisdisseminado no assentamento (88,5%) secomparamos com as outras duascomunidades. Isso pode estar relacionadoàs suspeitas da água estar contaminada, deacordo com os relatos de problemasambientais enfrentados pelas famíliasassentadas (Tabela 21). As famílias debóias-frias apresentaram os melhoresindicadores relativos à presença de vasosanitário com descarga (77,8%), o que estárelacionado ao acesso à rede de água(Tabela 20).

Page 72: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

72

Page 73: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

73

Tabela 20 - Uso de equipamentos domésticos pelas famílias segundo a comunidade deresidência, Unaí-MG, abril de 2005.

Uso de equipamentos domésticosFiltro Pia de cozinha Tanque de

lavar roupaVaso sanitáriocom descarga

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº %Assentamento Menino Jesus 23 88,5 16 61,5 19 73,1 8 30,8

Acampamento Índio Galdino 49* 52,1 19* 20,2 8* 8,5 7* 7,4

Bairro Mamoeiro 55* 67,9 55 67,9 55 67,9 63* 77,8

Total 127 62,9 90 44,5 82 40,6 78 38,6* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Figura 14- Cozinha de família acampada,Unaí-MG, abril de 2005

Apesar de contarem com os maiores índicesde saneamento, bóias frias destacaram olixo (35,8%), a poeira (24,7%), o esgoto(6,2%) e os insetos (7,4%) como osproblemas ambientais mais vividos (Tabela21). Tais problemas praticamente não foramcitados nos outros dois grupos. A águacontaminada para os assentados (38,5%) eas queimadas para os acampados (25,3%)foram os mais importantes problemasambientais enfrentados. O desmatamento(42,3% e 18,9%) e os agrotóxicos (11,5% e5,3%) estavam entre os problemaspercebidos somente pelos assentados eacampados (Figura 15), sendo que 37,9%

das famílias acampadas consideravam quenão possuíam problemas ambientais emsua comunidade. Esses diferenciais podemestar associados ao lugar de moradia dasfamílias. Enquanto os assentados eacampados convivem todo o tempo comproblemas ambientais relativos à produçãoagrícola como o desmatamento, queimadase uso de agrotóxicos, os bóias-friasvisualizam os problemas mais próximos asua moradia como o lixo, a poeira e insetos;típicos da cidade.

Figura 15 – As veredas da região têm sidoum dos ambientes mais ameaçados com oavanço da monocultura, Unaí-MG, abril de2005

Page 74: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

74

Page 75: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

75

Tabela 21 - Principais problemas ambientais vividos pelas comunidades segundo as famílias, Unaí/MG, abril de 2005.

* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Problemas ambientaisDesmatamento Água

ContaminadaVeneno Lixo Queimadas Esgoto Insetos Poeira Outros Nenhum Não sabe

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %

AssentamentoMenino Jesus

11 42,3 10 38,5 3 11,5 2 7,7 1 3,8 - - 3 11,5 4 15,4 1 3,8

AcampamentoÍndio Galdino

18 18,9 8* 8,4 5 5,3 - 24* 25,3 - - 8 8,4 36* 37,9 12 12,6

BairroMamoeiro

- - - 29* 35,8 9 11,1 5 6,2 6 7,4 20 24,7 11 13,6 20 24,7 9 11,1

Total 29 14,4 18 8,9 8 4,0 31 15,3 34 16,8 5 2,5 6 3 20 10 22 10,9 60 29,7 22 10,9

Page 76: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

76

Page 77: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

77

4.4.3 Condições de produção e trabalho

Mais da metade das famílias doassentamento (57,7%) conseguia viverapenas da produção do lote, plantandomandioca (96,2%), arroz (92,3%), cana-de-açúcar (84,6%), milho (65,4%), feijão(53,8%), frutas (73,1%), hortaliças (69,2%) eamendoim (30,8%) o que as diferenciavamdos acampados e bóias-frias. Basicamente,

toda a produção era direcionada aosustento da família, quase não havendoexcedentes. Os assentados desenvolviampoucas atividades cooperadas, existindoalguns exemplos de cooperação entrevizinhos e parentes (19,2%). Em torno de42,3% das famílias, trabalhavam tambémem fazendas para complementar sua renda(Tabela 22).

Tabela 22 - Distribuição das famílias segundo atividades que ajudam na renda e comunidadede residência, Unaí-MG, abril de 2005*.

Atividades que ajudam na renda

Trabalhos emfazendas

Trabalhos nacidade

Outros Nenhuma Total

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº %

AssentamentoMenino Jesus

11 42,3 1 3,8 6 23,1 8 30,8 26

AcampamentoÍndio Galdino

34 36,1 6 6,4 23 24,5 31 33 94

Bairro Mamoeiro 34 42 10 12,3 12 14,8 25 30,9 81

TOTAL 79 39,3 17 8,5 41 20,4 64 31,8 201* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado. Uma família acampadanão respondeu.

Mesmo com todas as dificuldades deestarem acampadas, 22,1% das famílias doacampamento Índio Galdino conseguiamretirar seu sustento do lote. As culturaspreferidas estavam ligadas a suaautosustentação como o milho (64,2%),mandioca e hortaliças (62,1%), seguidospelo arroz (32,6%), frutas (28,4%),amendoim (22.1%) e cana-de-açúcar(14,7%) (Figura 16). Em termos darealização de atividades cooperadas, assimcomo no assentamento, 21,1% dosacampados trabalhavam com seu vizinho.Não havia excedentes na produção e boaparte das famílias também tinha de trabalharcomo bóias-frias em fazendas (36,1%), oubuscava trabalho temporário na cidade (9%)para obter renda (Tabela 22). O trabalho emuma carvoaria vizinha ao acampamentotambém foi citado por alguns acampados,valendo destacar o aspecto degradantedessa atividade em função da exposição aocalor e fumaça.

Figura 16- Milharal e mandiocal de famíliaacampada, Unaí-MG, abril de 2005

Resultados semelhantes foram encontradospor Leite et al (2004) e Guedes (2006).Esses produtos se destinam aoautoconsumo. O feijão e o milho tambémsão produzidos em maior escala na regiãopelas grandes fazendas do agronegócio(População -IBGE, 2003).

Page 78: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

78

Page 79: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

79

A complementação da renda para asfamílias assentadas e acampadas obedeceà sazonalidade da colheita que ofereceoportunidade para trabalho temporário.

Os bóias-frias do Bairro Mamoeirocultivavam nas grandes fazendaspredominantemente o feijão (95,1%),seguido pelo milho (64,2%), algodão(51,9%), soja e cana-de-açúcar (25,9%), ehortaliças (24,7%). A principal etapa daprodução desempenhada por essestrabalhadores era a colheita (96,3%),seguida pela capina (63%), plantio (27,2%)e aplicação de agrotóxicos (16%). A maioriarelatou possuir carteira assinada (67,1%).Em função dos casos de trabalho escravo

identificados pelo Ministério do Trabalho naregião foi criado o “condomínio rural”. Umaparcela dos bóias-frias era empregadanesses condomínios e atuava em diversasunidades produtivas, tendo a situaçãolegalizada por essa via. Trabalhavam desegunda a sábado (66,2%), mas parte dogrupo (7,8%) deslocava-se todos os dias. Aoferta de trabalho limitava-se, de maneirageral, a apenas seis meses ao ano, mas deforma inconstante, fazendo que as famíliastivessem renda variável e baixa (Gráfico 1).Essa situação pode ser considerada comoimportante fator que contribuiu para ainsegurança alimentar desse grupo,conforme já apresentado nas Tabelas 10,11 e 12.

0

5

10

15

20

25

30

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 (vazio)

Meses

Núm

ero

de fa

míli

as

Gráfico 1 - Distribuição do número de meses trabalhados ao longo do ano segundo as famíliasde bóias-frias do Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005

Page 80: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

80

Page 81: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

81

A grande maioria das famílias (90%)gostaria de mudar de ocupação. Asalternativas pretendidas incluíam de“qualquer outro” (29,2%) até “operador demáquinas” (13,9%), “trabalhar em fazendas”(8,3%) e outras opções consideradas “maistranqüilas”.

Entre o que havia de pior no trabalho estavaa hora de acordar (44,52%), odeslocamento (19,5%), a comida, os danosa saúde, o cansaço e a “exploração”(14,3%). Essas condições chegavam asituações extremas. Os relatos incluem atéquatro horas de tempo gasto para chegar aolocal de trabalho diariamente, fazendo quemuitos iniciassem seu deslocamento noinicio da madrugada Os trabalhadoreschegavam a viajar mais de 130 Km para àsfazendas onde vão trabalhar com tempo dedeslocamento médio de três horas (Gráfico2). Isso implicava dificuldades naconservação de seu alimento, comotambém contribuía para as reclamações decansaço e de danos à saúde. Portanto, osmotivos relacionados à vontade demudança estavam associados aos horários(23,5%), necessidade de encontrar trabalho

menos cansativo e sofrido (20,6%) quetivesse carteira assinada (13,2%) comalguma estabilidade financeira (11,8%) eficando mais perto da família (5,9%).

As condições degradantes de trabalhocitadas pelos bóias-frias também já foramencontradas nos estudos dos processos detrabalho específicos na região canavieira deRibeirão Preto, São Paulo (Alessi e Navarro,1997) e da Zona Canavieira da Paraíba(Moreira e Watanabe, 2006). Ostrabalhadores eram expostos diariamente acargas físicas, químicas e biológicastraduzidas em uma série de doenças,traumas ou acidentes a elas relacionados,além da carga biopsíquica que geravamanifestações psicossomáticas. Osresultados da modernização conservadorano campo brasileiro (Delgado, 2001; Ávila,2002) têm agravado as condições de vidados bóias-frias, gerando uma super-exploração do trabalho humano, comconseqüente aumento da carga laboral(Alessi e Navarro, 1997). Isso pode ajudar aexplicar porque 90% dos bóias-frias doBairro Mamoeiro preferiam trocar detrabalho.

Page 82: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

82

Page 83: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

83

Gráfico 2 - Tempo gasto por dia para deslocamento até o local de trabalho segundo as famíliasde bóias-frias do Bairro Mamoeiro, Unaí-MG , abril de 2005

Destacou-se também a percepção do altoíndice de uso de agrotóxicos no trabalhopelos bóias-frias (85,2%) (Tabela 23). Oagrotóxico é presença constante na vidadesse grupo. Também foram relatadassituações em que aviões realizavampulverizações bem próximas às áreas emque estavam trabalhando. Provavelmenteem função do regime intensivo de produção,

os bóias-frias estavam bem mais expostosaos agrotóxicos se comparados aosassentados (26,9%) e acampados (9,5%), oque contraria resultados de outros estudosque apontam para o uso disseminadodesses venenos em várias categorias desistemas produtivos (Faria et al, 2000;Nishiyama, 2003; Moreira e Watanabe,2006).

Tabela 23 - Percepção das famílias do uso de agrotóxicos no seu trabalho segundo acomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Utilização de agrotóxicoComunidade Sim Não Não sabe Total

N° % N° % N° %Assentamento Menino Jesus 7 26,9 18 69,2 1 3,8 26

Acampamento Índio Galdino 9* 9,5 83* 87,4 3 3,2 95

Bairro Mamoeiro 69* 85,2 8* 9,9 4 4,9 81

Total 85 42,0 109 54,0 8 4,0 202* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

0

5

10

15

20

25

1 1,5 2 2,5 3 4 5 5,5 6 7 8Horas

Núm

ero

de fa

míli

as

Page 84: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

84

Page 85: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

85

Os índices de exposição aos agrotóxicoscitados pelas famílias de bóias-frias estãosemelhantes aos encontrados na SerraGaúcha (75%) por Faria et al (2000), emmunicípios de Minas Gerais (59%) porSoares et al (2003) e nos estudosrealizados em outras partes do Brasil (Fariaet al 2007). Apesar da estrutura fundiáriados estudos levantados serem diferentes, osaltos índices de uso de agrotóxicos estãorelacionados ao processo de modernizaçãotecnológica denominado Revolução Verde,que modificou profundamente as práticasagrícolas, gerou mudanças ambientais, nascargas de trabalho e nos seus efeitos sobrea saúde, deixando os trabalhadores ruraisexpostos a riscos diversificados (Figueiredoet al, 1987; Faria et al, 2000; Moreira eWatanabe, 2006).

O uso de agrotóxicos no assentamentoseguiu o padrão já encontrado por Leite etal (2004) em assentamentos do entorno doDistrito Federal. O acampamento exibiuíndices inferiores provavelmente em funçãode sua condição temporária. Entretanto,essa situação não é homogênea no País,dependendo do contexto da região deinserção do assentamento. Nishiyama(2003), ao estudar a questão dosagrotóxicos nas áreas do MST no Paraná,constatou freqüência na utilização de62,6%. O mesmo autor relatou que talresultado não era esperado, pois a condiçãode Sem Terra estava associada à falta decapital próprio e à pouca disponibilidade decréditos, o que implicaria limitações noinvestimento em insumos como osagrotóxicos. A questão principal é que o usode agrotóxicos na agricultura familiar assimcomo na grande propriedade estásubordinado ao mesmo modeloconservador. Esse modelo tem se impostohistoricamente e, principalmente, por meiodas políticas de crédito rural, da assistênciatécnica e da pesquisa (Relatório -Anvisa2005). Nishiyama (2003) também encontrouuma média de 20% de trabalhadoresexpostos aos agrotóxicos que já sofreramde intoxicações por estes produtos. Sendoque dentre os mesmos, 53,8% já estiveraminternados pelo menos uma vez devido adanos causados por esses produtos.

Entretanto, a alta exposição aos agrotóxicosdos bóias-frias de Unaí em relação aosassentados e acampados pode estar

indicando tendência de agravamento dessasituação no contexto da grande produção.Breilh (2004) faz referência a mudanças naacumulação do capital trazendo a noção depilhagem, como conjunto de práticaspredatórias radicais dos ecossistemas e dasaúde utilizadas pelos grupos econômicos.Soares e Porto (2007), ao analisarem asexternalidades negativas do uso deagrotóxicos no cerrado brasileiro, tambémencontraram essa tendência ao associaráreas contaminadas com o grau deatividade agrícola dos municípios. O quadromais grave estava nas zonas de agriculturade larga escala.

4.4.4 Animais de produção, domésticos esinantrópicos

Avaliando a presença de animaisvenenosos ou peçonhentos, oassentamento e o acampamentoapresentaram, respectivamente, maiorpresença de escorpiões (38,5% e 23,2%) ecobras (38,5% e 40%) se comparados como Bairro Mamoeiro (19,8% e 16%). O ratotambém foi mais presente para assentadose acampados (46,2% e 58,9%), assim comoa barata no Bairro Mamoeiro (80,2%). Foiencontrada alta presença (60,4%) demosquitos/pernilongos nas três áreas. Adistribuição dos outros animais entre osgrupos não apresentou diferençassignificativas. Pode-se considerar que asfamílias do assentamento e doacampamento estão expostas a animais demaior perigo a saúde se comparadas comas do Bairro Mamoeiro (Tabela 24). Taisresultados podem ser consideradosesperados, pois as casas dos assentados eacampados, por estarem na zona rural,exibem relação mais estreita com osecossistemas desses animais secompararmos com as áreas urbanas.

No assentamento, 100% das famíliascriavam algum tipo de animal de produção.As famílias assentadas distinguiam-se dasoutras comunidades na criação de galinhas(84,6%), gado (80,8%), animais de trabalho(65,4%) e porcos (46,2%). No BairroMamoeiro, 86,4% das famílias não criavamanimais de produção, o que poderia estarassociado às dificuldades encontradas paraesse tipo de atividade em áreas urbanas(Tabela 25).

Page 86: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

86

Tabela 24 - Presença de animais sinantrópicos na casa segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Presença de animais na casaRato Mosquito/

pernilongoBarata Mosca Cobra Escorpião Barbeiro Aranha

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus 12 46,2 19 73,1 16 61,5 7 26,9 10 38,5 10 38,5 - 18 69,2

AcampamentoÍndio Galdino

56 58,9 53 55,8 46 48,4 40 42,1 38 40 22 23,2 5 5,3 55 57,9

BairroMamoeiro

16* 19,8 58 71,6 65* 80,2 39 48,1 13* 16 16* 19,8 3 3,7 62 76,5

Total 84 41,6 122 60,4 127 62,9 86 42,6 69 34,2 48 23,8 8 4 135 66,8* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Tabela 25 - Criação de animais de produção segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Criação de animaisAves Gado Equídeos Suínos Caprinos Não cria Outros

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus 22 84,6 21 80,8 17 65,4 12 46,2 - - 2 7,7

AcampamentoÍndio Galdino

55* 58,5 14* 14,9 22* 23,4 18* 19,1 1 1,1 29 30,9 1 1,1

BairroMamoeiro

7 8,6* 1 1,2* - 1* 1,2 1 1,2 70 86,4 1 1,2

Total84 41,6 36 17,8 39 19,3 31 15,3 2 1 99 49,0 4 2,0

* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Page 87: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

87

A produção animal desenvolvida pelasfamílias assentadas foi uma característicamarcante também observada em outrosestudos em assentamentos (Leite et al,2004 e Guedes, 2006). Mesmo que voltadabasicamente para o autoconsumo, esse tipode produção contribui para a elevação darenda familiar e para a melhora dasegurança alimentar (Principais -FAO 1992).

No acampamento, a criação de animais deforma desorganizada impediu muitasfamílias de produzir alimentos próximos desuas casas. Esses animais invadiamplantações de mandioca e milho causandosua destruição. Como conseqüências,muitos desistiram de plantar, ficando comdieta restrita à cesta básica recebidaperiodicamente do governo. Essasdificuldades limitaram os acampados àcriação de galinhas (58,5%), animais detrabalho (23,4%), porcos (19,1%) ou mesmoimpediram a criação de animais (30,9%)(Tabela 25). Mesmo assim, 14,9% dosacampados conseguiam criar gado (Figura17).

Figura 17: Curral do acampamento ÍndioGaldino, Unaí-MG, abril de 2005

As limitações de infra-estrutura, recursosfinanceiros e crédito foram os principaisentraves para as famílias criarem os animaiscomo sempre haviam sonhado. Noassentamento, a falta de alimentos para osanimais representou 57,7% dos problemasenfrentados. As ausências de assistênciatécnica e de medicamentos foramresponsáveis por 10,9% dos problemas(Tabela 26).

Page 88: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

88

Page 89: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

89

Tabela 26 - Fatores necessários para a criação de animais como as famílias sempre sonharam segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Fatores que faltam para criação de animais como as famílias sempre sonharamAlimentação Infra-estrutura Dinheiro Crédito Assistência Medicamentos Outros

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %Assentamento Menino Jesus

15 57,7 12 46,2 8 30,8 7 26,9 4 15,4 1 3,8 2 7,7

Acampamento Índio Galdino 9* 13,6 32 48,5 29 44 26 39,4 6 9,1 9 13,6 1 1,5

Total24 26,0 44 47,8 37 40,2 33 35,9 10 10,9 10 10,9 3 3,3

* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Relativo as 92 famílias que criam algum tipo de animal.

Page 90: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

90

Page 91: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

91

Várias tipologias de cuidados com ascriações foram relatadas. As famíliasutilizavam desde medicamentos comerciaisaté soluções baseadas na cultura popularcamponesa (Figura 18). Guedes (2006)avaliou em um assentamento do MST naregião do Vale do Rio Doce que a produçãoanimal estava marcada por alta prevalênciade doenças facilmente evitáveis e peladificuldade de acesso ao serviço deassistência técnica. No caso doassentamento Menino Jesus e doAcampamento Índio Galdino, a produçãoanimal está condicionada a um conjunto defatores ecológicos, sociais, econômicos,culturais, técnicos, políticos e históricoscomo apontado por Astudillo (1984) eRosemberg (1986).

Figura 18 – Galinha doente em tratamentopor acampado, Unaí-MG, abril de 2005

Em termos de animais domésticos, asfamílias do assentamento e doacampamento possuem mais animais(84,6% e 73,7%) se comparadas com asfamílias de bóias-frias do Bairro Mamoeiro(46,9%). Os cachorros são os maispresentes nas três comunidades (86,2%), eos gatos, no assentamento (68,2%) (Tabela27) (Figura 19).

Figura 19– Cão no Bairro Mamoeiro, Unaí-MG, abril de 2005

Tabela 27 - Tipo de animal doméstico presente na residência segundo a comunidade, Unaí-MG, abril de 2005.

Animais domésticos

Sim Cachorro Gato Pássaro Não cria OutrosComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus

22 84,6 20 90,9 15 68,2 4 18,2 4 15,4 1 4,5

AcampamentoÍndio Galdino

70 73,7 59 84,3 28* 40 16 22,9 25 26,3 2 2,8

BairroMamoeiro

38* 46,9 33 86,8 7* 18,4 6 15,8 43* 53,1 -

Total 130 64,4 112 86,2 50 38,5 26 20 72 35,6 3 2,3

p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Page 92: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

92

Page 93: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

93

As famílias de bóias-frias do BairroMamoeiro apesar de conviverem menoscom animais e insetos relacionam mais oconhecimento de casos de doençastransmitidas por esses últimos (56,8%) doque as famílias assentadas e acampadas(Tabela 28). Uma das hipóteses para essediferencial pode ser o melhor acesso àmídia e às informações governamentaispelas populações que vivem na cidade secomparadas com as do campo.

Observa-se na Tabela 29 que não houvediferenças estatísticas significativas entre ascomunidades em relação ao percentual deanimais vacinados. As vacinas referem-seao programa de prevenção à raiva. Sementrar no mérito dos valores de coberturavacinal alcançados, as três comunidadesforam atingidas de maneira semelhante, oque demonstra a importância dodesenvolvimento de ações direcionadaspara a população que vive no campo.

Tabela 28 - Conhecimento sobre doenças transmitidas por insetos e animais segundocomunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Conhecimento sobre doenças transmitidas poranimais e insetos

Sim NãoComunidade

Nº % Nº %

Total

Assentamento Menino Jesus 9 34,6 17 65,4 26

Acampamento Índio Galdino 28 29,5 67 70,5 95

Bairro Mamoeiro 46 56,8* 35 43,2* 81

Total 83 41,1 119 58,9 202* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Tabela 29 - Percentual de animais de companhia vacinados segundo a comunidade deresidência, Unaí-MG, abril de 2005*.

Animais domésticos vacinadosSim NãoComunidade

Nº % Nº %Total

Assentamento Menino Jesus 15 68,2 7 31,8 22

Acampamento Índio Galdino 35 51,5 33 48,5 68

Bairro Mamoeiro 25 69,4 11 30,6 36

Total 75 59,5 51 40,5 126* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.

Page 94: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

94

Page 95: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

95

4.4.5 Serviços de Saúde

As famílias do Bairro Mamoeiro procurarammais vezes (71,2%) por atendimento secomparados ao assentamento (23,5%) eacampamento (29,8%) (Tabela 30). Issopoderia estar associado às maioresfacilidades no acesso aos serviços de saúde

para quem mora na cidade em comparaçãocom os moradores do campo (Figura 20).Esse quadro já foi explicitado em váriosestudos como os da PNAD (População –IBGE 2003).

Tabela 30 - Pessoas doentes que procuraram atendimento nas últimas duas semanas segundoa comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.

Procura de atendimentoComunidade Sim Não Não sabe Total

N° % N° % N° %Assentamento Menino Jesus 4 23,5 12 70,6 1 5,9 17

Acampamento Índio Galdino 14 29,8 33 70,2 - 47

Bairro Mamoeiro 42 71,2* 17 28,8 - 59

Total 60 48,8 62 50,4 1 0,8 123 * p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Figura 20 – Meio de transporte mais usado pelas famílias assentadas, Unaí-MG, abril de 2005

Apenas para as famílias dos bóias-frias dobairro Mamoeiro, o SUS vem atendendosuas necessidades (83,8%). Para a grandemaioria das famílias assentadas (69,2%) edas acampadas (69,5%), o SUS não cumpreseu papel (Tabela 31). Assim como napergunta relacionada ao acesso aosserviços de saúde (Tabela 14), essa é umadas políticas públicas de menor acesso aos

assentados e acampados, como a desaneamento por exemplo.

As famílias do Bairro Mamoeiro relataramter acesso ao SUS, de modo geral, maisespecificamente ao Posto de Saúde, porquesão acompanhados pelos agentes de saúdedo PSF.

Page 96: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

96

Page 97: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

97

Tabela 31 - Atendimento das necessidades de saúde das famílias por parte do SUS, segundocomunidade de residência, Unaí, abril de 2005.

* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. Uma família do Bairro Mamoeiro não respondeu apergunta.

Para que o SUS cumprisse seu papel, asfamílias assentadas e acampadasconsideraram que o importante seriagarantir o acesso aos serviços de saúde,bem como o transporte necessário (7,9%). Anecessidade do acesso é mais citada noacampamento (67,7%), enquanto no BairroMamoeiro não é mencionada (Tabela 32).

Para a maior parte das famílias, comdestaque para o assentamento (57,7%), aúnica forma de o SUS atender às suasnecessidades será após reivindicações epressões sobre o governo. O acesso à terratambém aparece como fator importante paraos acampados e bóias-frias (7,4%).

Tabela 32 - Ações que podem ser realizadas para que o SUS atendesse as necessidades dasfamílias, Unaí-MG, abril de 2005.

Ações para que o SUS atenda as necessidades de saúde das famíliasAcesso aos

serviçosde saúde

ReivindicarmelhoriasPressionar o governo

Acessoa terra

Transporte nada Não sabe

Outras Nãosabe

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus

9 39,1 15 57,7 - 2 7,7 1 3,8 - 4 15,4 -

AcampamentoÍndio Galdino

63 67,7* 34 36,6* 10 10,8 14 15,1 4 4,3 - 12 12,6 -

BairroMamoeiro

- 15 18,8* 5 3,8 - - 32 40 30 7 8,8

Total 72 35,6 64 31,7 15 7,4 16 7,9 5 2,5 32 15,8 16 7,9 7 3,5* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

A ausência de transporte coletivo dificulta oacesso aos serviços de saúde, implicandoaltos custos para as famílias. Foramrelatadas situações em que foi impossívelbuscar assistência à saúde, as pessoas nãocontavam com recursos para efetivardeslocamentos com o custo de R$50 a R$

70,00 (para Unaí). O município ainda nãohavia implantado programa de saúde paraessa população, atendendo apenas àdemanda espontânea que chegava a suasede. Durante visita à Secretaria Municipalde Saúde de Unaí, verificou-se a intençãode expandir o PSF para as áreas rurais,

Atendimento das necessidades de saúde das famílias pelo SUSComunidade Sim Não Não sabe Total

N° % N° % N° %Assentamento Menino Jesus 7 26,9 18 69,2 1 3,8 26

Acampamento Índio Galdino 26 27,4 66 69,5 3 3,2 95

Bairro Mamoeiro 67 83,8* 11 13,8 2 2,5 80

Total 100 49,7 95 47,3 6 3,0 201

Page 98: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

98

mas os técnicos enfrentavam problemasrelacionados com a falta de recursosfinanceiros e de infra-estrutura paradesencadear essas ações. Não haviaconhecimento sobre os programas deincentivos do Ministério da Saúde.

O SUS não tem atendido às necessidadesde saúde segundo a opinião de 70% dasfamílias assentadas e acampadas, e oacesso é uma das questões maisimportantes. Leite et al (2004) tambémidentificaram o acesso aos serviços desaúde como importante limitante, poissomente 21% dos assentamentospesquisados contavam com postos desaúde. A maioria desses foi instalada porpressão dos assentados. Também foramcitadas as mesmas limitantes noAssentamento Menino Jesus e noAcampamento Índio Galdino, as distânciasem relação aos centros urbanos e acarência de transporte coletivo, somados àprecariedade do atendimento à saúde.Quando as famílias assentadas eacampadas conseguiam o atendimento,enfrentavam problemas como o dadiscriminação e o da falta de vagas,questões também observadas em outrosestudos (Schmidt et al 1998; Saúde -UnB2001).

Os depoimentos da discussão com oColetivo Nacional de Saúde do MSTtambém reforçaram a problemática doisolamento dos assentamentos eacampamentos e a necessidade de sempreterem que ir aos centros urbanos,ressaltando a inexistência de programasespecíficos do governo para a saúde nocampo.

De modo geral, o acesso aos serviços desaúde está limitado, o que obriga apopulação do campo a deslocar para oscentros urbanos. Apesar de algumas áreasserem cobertas pelos agentes de saúde, aspopulações beneficiárias da reforma agráriacontam com escassas unidades de saúde

funcionando próximas de suas residências.Isso aponta para a necessidade de serempriorizadas políticas no SUS de incentivo aodesenvolvimento da atenção básicaapropriada à realidade desses grupos.

Além de enfrentar a baixa qualidade dosserviços, a população do campo considera-se discriminada e com muitas dificuldadespara ser atendida na forma e nos horáriosdisponíveis das áreas urbanas (Schmidt etal, 1998; Saúde –UnB 2001; Kassouf,2005). As políticas de humanização do SUSainda não têm levado em conta essasespecificidades de forma a adequar osserviços às necessidades dessaspopulações.

As famílias do assentamento e doacampamento acreditam que somente comreivindicações e pressões sobre osgovernos o SUS atenderá a suasnecessidades de saúde. Essa posturapolítica da base social do MST também foiverificada em seu Coletivo Nacional deSaúde, que pressionou o Ministério daSaúde para a criação e manutenção doGrupo da Terra, quase extinto devido àmudanças no governo federal nos anos de2004-2005.

Já para as famílias bóias-frias, 40% nãosabem o que fazer para que o SUS possamelhorar suas ações.

4.4.6 Noções de Saúde

As famílias do acampamento (37,2%)consideraram que sua saúde piorou depoisde estarem na comunidade se compararmoscom os outros dois grupos. De modo geral,as categorias “melhorou” ou está “igual” nãoexibiram diferenças significativas entre osgrupos. Sabe-se que a situação deacampamento pelo grau de provisoriedade,tensões e expectativas podem gerarproblemas de saúde (Tabela 33 e 35). Issojá havia sido assinalado pela comunidadeem reuniões do coletivo local de saúde.

Page 99: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

99

Tabela 33 - Percepção do estado de saúde da família antes de viver na comunidade, Unaí MG,abril de 2005.

Estado de saúde da famíliaMelhorou Igual Piorou TotalComunidade

Nº % Nº % Nº %

Assentamento Menino Jesus 10 41,7 11 45,8 3 12,5 24

Acampamento Índio Galdino 32 34 27 28,7 35* 37,2 94

Bairro Mamoeiro 25 33,8 26 35,1 23 31,1 74

Total 67 34,9 64 31,7 61 30,2 192* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação. 10 famílias não responderam esta pergunta.

A percepção da saúde das famílias antes deestarem nas três comunidades oscilou entrea melhora ou a não-alteração do mesma,com piora acentuada no acampamento. Asaúde como um dos componentes dascondições de vida foi um dos itens commenor índice de melhora se considerada asituação anterior ao assentamento quandoavaliada por Leite et al (2004). Essainformação também foi encontrada napesquisa da UnB (Saúde –Unb 2001) e deSchmidt et al (1998). A vulnerabilidade dasituação de acampamento foi identificadapor Ferreira et al (1997) e nas discussõescom o Coletivo Nacional de Saúde do MST.Essa questão deveria servir como alerta aosgestores públicos da reforma agrária, pois,em função da morosidade dos processos dedesapropriações, as famílias chegam apassar vários anos acampadas e, portanto,expostas a graves riscos à saúde.

Como não existiram diferenças estatísticassignificantes entre os grupos, ao se analisaros percentuais dos fatores que geramsaúde, a boa alimentação (73,8%), ahigiene (41,1%), o ar puro/tranqüilidade(20,8%), dormir/descansar bem (14,9%) e osaneamento (10,9%) foram os maisimportantes para as famílias (Tabela 34).Esses fatores remetem para um conceitomais ampliado de saúde desenvolvido pelasfamílias como já definido na lei do SUS(Brasil, 1990).

O alimento contaminado aparece de formamais destacada como fator que gera doençapara assentados (65,4%) e acampados(52,6%) se comparados com as famílias de

trabalhadores rurais autônomos (36,3%)(Tabela 35). Isso pode estar relacionadocom as dificuldades de conservação dosalimentos, pois o acesso à energia aindaera recente no assentamento, além dasdificuldades de higienização dos mesmosdevido à situação precária de saneamento.

De modo geral, para as famílias das trêscomunidades, a higiene (31,7%), apresença de animais e insetos (30,2%) e afalta de saneamento (25,2%) lideram osfatores que causam doenças, reforçandouma concepção mais ampla de saúde. Oalcoolismo e o tabagismo também foramidentificados como problemas nas trêscomunidades, apresentando um percentualde 13,9% e 12,9% respectivamente. Fatorescomo nervosismo e estresse, apesar deapontados no assentamento eacampamento, não foram citados pelosbóias-frias do Bairro Mamoeiro.

Como a saúde está condicionadaprincipalmente, segundo as famílias, afatores como boa alimentação, higiene,relação com animais/insetos e saneamentoa sua má-avaliação é justificável em funçãode todas as dificuldades que esses gruposenfrentam, apesar das diferenças entre oacesso a algumas políticas públicasrelacionadas. Essa visão mais ampliada danoção de saúde exposta também nosmateriais de formação do MST (ANCA,2000) contradiz a idéia do Coletivo Nacionalde Saúde de que sua base tem uma visãoassistencialista da saúde, conformeexplicitado no grupo de discussão.

Page 100: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

100

Tabela 34 – Percepção dos fatores que geram saúde para as famílias segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005*.Fatores que geram saúde

Boaalimentação

Higiene/cuidadopessoal

Saneamento Ar puro/tranquilidade

Dormir/descansar

bem

Esporte/atividade

física

Acesso aos serviçosde saúde/

medicamentos

Moradiaadequada

Outrosfatores

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº %º Nº % Nº % Nº % Nº % Nº

%

AssentamentoMenino Jesus

21 80,8 11 42,3 6 23,1 5 19,2 2 7,7 2 7,7 3 11,5 1 3,8 8 30,8

AcampamentoÍndio Galdino

71 74,7 38 40 16 16,8 25 26,3 13 13,7 3 3,2 13 13,7 5 4,2 19

20

Bairro Mamoeiro 57 71,3 34 42,5 - 12 15 15 18,8 4 5 - - 21

26,3

Total 149 73,8 83 41,1 22 10,9 42 20,8 30 14,9 9 4,5 16 7,9 6 3,0 48

23,8

* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.

Tabela 35 – Percepção dos fatores que causam doenças para as famílias segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005.Causas das doenças

Alimentocontaminado,

estragado e máalimentação

Falta dehigiene

Animais/insetos

Fumo/cigarro

Falta desaneamento

Preocupação,nervosismo,

stress

Trabalho/esforço

excessivo

Falta deacesso aosserviços de

saúde/medicamentos

Mudançade tempo/climática

Álcool Outrascausas

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus

17 65,4 7 26,9 7 26,9 1 3,8 6 23,1 2 7,7 2 7,7 1 3,8 5 19,2 1 3,8 4 15,4

AcampamentoÍndio Galdino

50 52,6 40 42,1 33 34,7 16 16,8 32 33,7 13 13,7 1 1,1 5 5,3 1* 1,1 14 14,7 18 18,9

Bairro Mamoeiro 29* 36,3 17 21,3 21 26,3 9 11,3 13 16,3 - - - 7 8,8 13 16,3 25 31,3

Total 96 47,5 64 31,7 61 30,2 26 12,9 51 25,2 15 7,4 3 1,5 6 3,0 13 6,4 28 13,9 47 23,3* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação

Page 101: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

101

A gripe e a dor de cabeça foram os agravosmais prevalentes se compararmos osassentados (80,8% e 30,8%) e acampados(80% e 26,3%) com os bóias-frias do BairroMamoeiro (48,8% e 7,5%). Já esse últimogrupo destacou-se na prevalência dahipertensão de 22,5%, contra 3,8% dosassentados e 11,6% dos acampados.Problemas de coração (13,8%), bronquite(7,5%) e leishmaniose visceral (7,5%) foramcitados somente pelas famílias do BairroMamoeiro, enquanto a diarréia (18,9%) e ador de dente (11,6%) foram citadasexclusivamente pelos acampados. A febre ea dor de coluna estavam presentes nos trêsgrupos com percentual de 19,8% e 11,9%respectivamente. A dor de barriga somentefoi citada no assentamento e acampamento,o que pode estar associado às baixascondições de saneamento dessas áreas(Tabela 36).

A gripe e a dor de cabeça são os agravosmais freqüentes se compararmos osassentados e acampados com os bóias-friasdo Bairro Mamoeiro, como já havia sidoindicado por outros estudos (Schmidt et al,1998 e Castro et al, 2004). As famílias debóias-frias citaram mais problemas crônicos

de saúde se comparados aos outros doisgrupos. As explicações para estesdiferenciais podem estar associadas a ummelhor acesso ao diagnóstico por parte dosbóias-frias, pois vivem na zona urbana.

Quando a pergunta sobre as causas dasdoenças referiu-se ao coletivo, o climaliderou o grupo de causas, principalmenteno assentamento (65,4%) (Tabela 37). Aspessoas associaram o aparecimento deagravos, como a gripe, às mudançasclimáticas. Essa concepção exibecorrespondência com a alta prevalência degripe nas áreas. A alimentação continuasendo citada como importante fator depromoção da saúde (17,8%). São relatados,somente no assentamento e noacampamento, fatores de risco ambientaiscomo água contaminada, moradiainadequada, além da presença de poeira efalta de higiene. O trabalho pesado surgiucomo fator que causa doença para as trêscomunidades (6,4%). A preocupação e afraqueza foram consideradas causas dedoenças somente para as famílias doacampamento, enquanto os insetos foramcausas para as famílias de bóias-frias doBairro Mamoeiro.

Page 102: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

102

Tabela 36 - Principais doenças percebidas pelas comunidades segundo as famílias, Unaí-MG, abril de 2005.

Principais doençasGripe Dor de

cabeçaDor decoluna

Dor deBarriga

Febre Hipertensão Diabetes Diarréia Dor dedente

Coração Bronquite Calazar

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº

%

AssentamentoMenino Jesus

21 80,8 8 30,8 5 19,2 5 19,2 4 15,4 1 3,8 4 15,4 - - - - -

AcampamentoÍndio Galdino

20 80 25 26,3 12 12,6 15 15,8 27 28,4 11 11,6 - 18 18,9 11 11,6 - - -

BairroMamoeiro

39* 48,8 6* 7,5 7 8,8 - 9 11,3 18* 22,5 14 17,5 - - 11 13,8 6 7,5 6 7,5

Total 80 39,6 39 19,3 24 11,9 20 9,9 40 19,8 30 14,9 18 8,9 18 8,9 11 5,4 11 5,4 6 3 6 3* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Tabela 37 – Percepção das causas das doenças relatadas pelas comunidades segundo as famílias, Unaí-MG, abril de 2005.

Causas das principais doençasClima Alimentação

inadequadaPoeira Água

contaminadaFalta dehigiene

Trabalhopesado

Preocupação Fraqueza Máscondições de

moradia

Insetos Outras

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus

17 65,4 4 15,4 5 19,2 1 3,8 1 3,8 2 7,7 - - 1 3,8 - 1 3,8

AcampamentoÍndio Galdino

38* 40 19 20 11 11,6 9 9,5 10 13,9 6 6,3 7 7,4 6 6,3 8 8,4 - 25 26,3

Bairro Mamoeiro 13* 24,5 13 16,3 - - - 5 6,3 - - - 6 7,5 16 19,8

Total 68 33,7 36 17,8 16 7,9 10 5,0 11 5,4 13 6,4 7 3,5 6 3 9 4,5 6 3 42 21* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Page 103: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

103

Quando as famílias foram questionadassobre o que falta para se ter boa saúde nacomunidade, o acesso aos serviços desaúde foi importante para os três grupos(55%) (Tabela 38). O acesso foi ainda maisdeterminante para 76,9% dos assentados e61,1% dos acampados. As necessidades detransporte foram destacadas também noassentamento por 26,9% das famílias. Aalimentação deixou de ser preponderantequando a pergunta passou a se referir à

comunidade, e não à família (10,4%),ficando os medicamentos como um dositens mais citados (13,4%). A especificidadedo acampamento foi a “falta de receber aterra” (12,6%) como fator determinante paranão se ter boa saúde. No Bairro Mamoeiro,as questões como necessidade de asfalto(28,8%) e segurança (6,3%) surgiram comoaspectos de preocupação típicos das zonasurbanas.

Page 104: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

104

Tabela 38 – Percepção dos fatores que faltam para se ter boa saúde nas comunidades segundo as famílias , Unaí-MG, abril de 2005.

* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Fatores que faltam para se ter boa saúde nas comunidadesAcesso aosserviços de

saúde

Medicamentos Estradastransporte

Acessodefinitivo à

terra

Boaalimentação

Asfalto Segurança Nada Outras Não sabe

Comunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº

% Nº % Nº % Nº % Nº %

AssentamentoMenino Jesus

20 76,9 4 15,4 7 26,9 - 3 11,5 - - - 4 11 -

AcampamentoÍndio Galdino

58 61,1 14 14,7 8 8,4* 12 12,6 18 18,9 - - - 22 23,2 -

Bairro Mamoeiro 33 41,3* 9 11,3 - - - 23

28,8 5 6,3 6 7,5 24 30 7 8,8

Total 111 55,0 27 13,4 15 7,4 12 5,9 21 10,4 23

11,4 5 2,5 6 3 49 24,3 7 3,5

Page 105: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

105

Cabe ressaltar que não foi apresentadacorrespondência entre as “causas dasdoenças” ou os “fatores geradores desaúde” com “o que falta para se ter boasaúde na comunidade”. A resposta paraessa pergunta apresentou viés medicalizadose comparado com as respostas anterioresque faziam referência à alimentação e aosaneamento (Tabelas 35, 36 e 37).

Não ocorreram diferenças estatísticassignificativas no percentual de acidentes detrabalho para as três comunidades (Tabela39). Durante uma observação participante(Figura 21) realizada durante a colheita doarroz no Assentamento Menino Jesus11,verificaram-se riscos associados ao uso deferramentas ou mesmo a picadas de cobras.Ocorreu acidente com o próprio membro daequipe de pesquisa no manejo do cutelo,espécie de pequena foice utilizada nacolheita do arroz. A natureza do trabalho nocampo implica maiores riscos também paraa coluna em função da posição corporalexigida para a colheita do arroz e do feijão.Deve-se ressaltar que parcela importante deacampados (36,1%) e assentados (42,3%)trabalha temporariamente em fazendas, oque pode estar contribuindo para ahomogeneidade do dado.

Esta comparação também não é tãosimples, pois Faria et al (2000) encontraramjornadas de trabalho de mais de 12 horasentre pequenos e médios agricultoresfamiliares na safra, e de 10 horas diárias naentressafra na Serra Gaúcha do Rio Grandedo Sul com um índice médio anual deacidentes de trabalho de 10%.

11 Não foi possível acompanhar os trabalhos dosbóias-frias em função do clima de desconfiançapor parte dos condomínios rurais, investigadospelo Ministério do Trabalho e pela Polícia Federaldevido a denúncias relacionadas às condiçõesde trabalho de seus integrantes.

A fitoterapia é importante alternativa detratamento para as comunidades. Destaca-se o uso do chá no assentamento (72%) epara as famílias com bóias-frias (67,5%). Asfamílias acampadas lideram a produção dexarope (68,4%) (Tabela 40). O uso do chácomo alternativa para o tratamento tambémfoi encontrado por Castro et al (2004) aoavaliar a saúde de crianças em umassentamento no Vale do Rio Doce emMinas Gerais.

Figura 21 – Assentados colhendo arroz –observação participante, Unaí-MG, abril de2005

Page 106: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

106

Page 107: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

107

Tabela 39 - Distribuição das famílias em que um dos membros já sofreu acidente ou doença dotrabalho, segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005*.

Sofreu Acidente ou Doença do TrabalhoSim NãoComunidade

Nº % Nº %Total

AssentamentoMenino Jesus

12 46,2 14 53,8 26

AcampamentoÍndio Galdino

27 28,7 67 71,3 94

Bairro Mamoeiro 33 41,8 46 58,2 79

Total 72 36,2 127 63,8 199* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.3 famílias deixaram de responder esta pergunta.

Tabela 40 - Remédios produzidos em casa por comunidade de residência, Unaí-MG, abril de2005.

Tipos de remédiosChá Xarope Pomada Soro Nenhum

RemédioOutros Não

SabeComunidade

Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %AssentamentoMenino Jesus

18 72 5 20 3 12 - 3 12 7 28 -

AcampamentoÍndio Galdino

35* 36,8 65*

68,4 - - 5 5,3 33 34,7 -

BairroMamoeiro

54 67,5 15 18,8 - 3 3,8 10 12,5 11 13,8 6 7,5

Total 107 53,0 85 42,0 3 1,5 3 1,5 18 8,9 51 25,2 6 3,0* p <0,05 tomando o assentamento como base de comparação.

Esses resultados contribuem para alegitimação da Política Nacional de PlantasMedicinais e Fitoterápicos (Brasil, 2006),pois são práticas amplamentedisseminadas entre a população do campo,o que reforça a necessidade de o SUSfavorecer o acesso seguro e racional comoformas de tratamento.

Ao avaliarem a influência do MST emrelação à saúde, as famílias assentadas eacampadas consideraram que o fato deestarem em uma organização como o MSTmelhorou suas perspectivas de saúde(Tabela 41). Isso está associado a umamaior capacidade de organização e

reivindicação junto aos atores públicoscomo também foi observado em outrosestudos (Bittencourt et al, 1999).

A percepção do estado de saúde de quemestá organizado junto ao MST comparadoscom os bóias-frias exibiu uma tendência deser igual (37%) ou melhor (42,9%) (Tabela42). Isso reforça a idéia de que o fato deser Sem Terra (Figura 22) (categoria depertencimento conforme Caldart, 2000) eestar organizado melhora as perspectivasde sua saúde em comparação com osbóias-frias, que não possuem em seuhorizonte ter acesso a terra como omilitante do MST.

Page 108: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

108

Page 109: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

109

Tabela 41 - Influência do MST em relação à saúde segundo a comunidade de residência, Unaí-MG, abril de 2005*.

Influëncia do MST em relação a saúdeBoa Não temComunidade

Nº % Nº %Total

AssentamentoMenino Jesus

21 80,8 5 19,2 26

AcampamentoÍndio Galdino

70 73,7 25 26,3 95

Total 91 75,2 30 24,8 121 * Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado.

Tabela 42 - Percepção do estado de saúde de quem está organizado junto ao MST comparadoaos bóias-frias, Unaí, abril de 2005*.

Saúde em relação ao bóia fria

Igual Melhor Pior Não sabe TotalComunidade

N° % N° % N° % N° %

AssentamentoMenino Jesus

10 41,7 11 45,8 1 4,2 2 8,3 24

AcampamentoÍndio Galdino

34 35,8 40 42,1 9 9,5 12 12,6 95

Total 44 37,0 51 42,9 10 8,4 14 11,8 119* Não foi possível identificar diferenças entre os grupos segundo a distribuição de qui-quadrado. 2 famílias do assentamento não responderam a pergunta.

Fonte: Bertolini, 2005Figura 22 - Famílias do Assentamento Menino Jesus, Unaí-MG, 2004

Page 110: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

110

Page 111: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

111

4.4.7 Análise fatorial discriminante

Foi realizada análise fatorial discriminantecom o objetivo de verificar se as trêscomunidades estudadas eram realmentedistintas entre si. Essa análise permitiuverificar quais, entre as variáveis estudadasmais caracterizavam ou discriminavam

esses grupos (Kleinbaum, 1988; Sampaio1993).

A partir da análise das variáveis e com baseno marco teórico adotado foramselecionadas as mais representativas e quemelhor caracterizassem (p < 0,05 no Testedo Quiquadro ou de Fisher) os diferenciaisentre as comunidades (QUADRO 4).

QUADRO 4. Variáveis selecionadas para a análise fatorial discriminante das três comunidadesestudadas em Unaí-MG, abril de 2005

Grupo temático Variáveis

Características sócio-demográficas efamiliares

Origem urbana ou rural

Condições de vida

Segurança alimentar

Saneamento

Crédito

Organização comunitária

A comida acabou nos últimos três meses

Presença de água encanada dentro de casa

Acesso a políticas de crédito (agrícola)

Participação em organização ou entidadecomunitária

Condições de produção e trabalho

Exposição a agrotóxicos Utilização de agrotóxicos no trabalho

Produção animal Não cria animais de produçãoServiços de saúde

Ações para que o SUS atenda asnecessidades de saúde da família oucomunidade

Reinvindicar melhorias, pressionar o governo eorganização.

Noções de saúde

Fatores que faltam para se ter boasaúde

Acesso e melhoria dos serviços de saúde

Page 112: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

112

Por meio das variáveis selecionadas, as trêscomunidades apresentaram percentualgeral de 89% de classificação correta, comapenas 21 famílias que não exibiram ascaracterísticas típicas de seu próprio grupo,de um total de 189 famílias analisadas. Asfamílias dos trabalhadores bóias-frias do

Bairro Mamoeiro obtiveram o melhor índicede adequação à classificação com 96%,seguida de 86% do acampamento e 76% doassentamento (Tabela 43). Valores acimade 70% são considerados satisfatórios(Sampaio, 1993).

Tabela 43 - Resumo da classificação da análise discriminante segundo comunidade deresidência e variáveis selecionadas, Unaí-MG, abril de 2005

Grupos classificados pelaanálise discriminante

AssentamentoMenino Jesus

Acampamento ÍndioGaldino

Bairro Mamoeiro

Assentamento Menino Jesus 19 8 0

Acampamento Índio Galdino 6 76 3

Bairro Mamoeiro 0 4 73

Total 25 88 76

Classificação correta 19 76 73

Proporção 0,760 0,864 0,961*Treze famílias apresentaram informações incompletas e foram excluídas da análise. Foram analisadas 189 famílias deum total de 202.

Nenhuma família assentada foi classificadacomo bóia-fria, o que mostra a diferenciaçãobem demarcada entre essas populações.Seis famílias do assentamento foramclassificadas como acampadas, porque nãoobtiveram acesso ao crédito agrícola. Ao sechecar o motivo, foi identificado quechegaram no lote há pouco tempo, poisexiste a reposição de famílias quando háabandono da parcela. Entretanto, como afamília moradora anterior consumiu oscréditos, esse novo assentado ficou semacesso ao benefício. Sua estruturação irádepender da capacidade própria deinvestimento e trabalho. Oito famíliasacampadas foram classificadas comoassentadas devido o acesso ao créditoagrícola, principalmente o da CONAB.Essas famílias apresentaram produçãosemelhante ao dos assentados, o que indicaa importância desse incentivo, mesmo parauma situação temporária. Outrosacampados foram classificados como bóias-frias por relatarem o uso de agrotóxicos notrabalho. Essa exposição foi fortementeassociada ao grupo de bóias-frias, o quemotivou essa aproximação. Finalmente,quatro famílias de bóias-frias receberam aclassificação de acampadas por não terem

água encanada em casa ou por criaremanimais. Isso está associado à presença deum grupo de “sem-teto” no Bairro Mamoeiro,o que explica a falta de acesso à águaencanada. Como a produção animal estavamais relacionada com a populaçãoassentada e acampada, as poucas famíliasde bóias-frias que criavam animais seaproximaram do perfil da populaçãobeneficiária da reforma agrária (Tabela 43).

As variáveis que melhor caracterizaram asfamílias assentadas foram o crédito, acriação de animais de produção, a presençade comida nos últimos três meses, a origemrural, a necessidade de melhor acesso aosserviços de saúde e a ausência de águaencanada em casa. No outro extremo,estavam as famílias de bóias-friasdiferenciadas pela utilização de agrotóxicosno trabalho, não-criação de animais deprodução, presença de água encanada ebaixa participação e organizaçãocomunitária. Os acampados exibiram nívelintermediário, com maioria de origemurbana, elevada participação e organizaçãocomunitária, baixa utilização de agrotóxicose de crédito (Tabela 44).

Page 113: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

113

Tabela 44 - Função discriminante linear das variáveis selecionadas para as três comunidadesestudadas, Unaí-MG, abril de 2005*

Variáveis AssentamentoMenino Jesus

AcampamentoÍndio Galdino

Bairro Mamoeiro

Constante -6,95 -3,92 -9,88

Origem urbana ou rural 0,12 3,86 2,49

Presença de água encanada dentrode casa

0,93 1,69 5,29

Acesso a crédito 10,22 1,06 1,21

Utilização de agrotóxicos no trabalho 1,12 -0,06 7,46A comida acabou nos últimos trêsmeses

1,32 1,40 3,54

Reinvindicar melhorias para o SUS,pressionar o governo e organização

2,88 1,08 -0,47

Participação em organização 2,89 3,02 0,98Não cria animais de produção 0,99 2,20 6,04Acesso e melhoria dos serviços desaúde

2,56 1,98 1,163

*Categorização das variáveis: 1= presença do fator 0=ausência

As médias mais altas foram relacionadas aocrédito e a necessidade de acesso e

melhoria dos serviços de saúde para osassentados; a origem urbana e a alta

participação comunitária dos acampados; osaltos índices de uso de agrotóxicos, nãocriação de animais, insegurança alimentar epresença de água encanada na residênciadas famílias de bóias-frias (Tabela 45).

Tabela 45 – Médias da análise fatorial discriminante das variáveis selecionadas para as trêscomunidades estudadas, Unaí-MG, abril de 2005.

Médias por grupoVariáveis*Média Assentamento

Menino JesusAcampamentoÍndio Galdino

Bairro Mamoeiro

Origem urbana ou rural 0,59 0,24 0,81 0,45

Presença de água encanada dentro decasa

0,44 0,12 0,18 0,84

Acesso a crédito 0,15 0,76 0,09 0,03

Utilização de agrotóxicos no trabalho 0,44 0,28 0,10 0,89

A comida acabou nos últimos três meses 0,28 0,12 0,22 0,41

Reivindicar melhorias para o SUS,pressionar o governo e organização

0,32 0,60 0,35 0,20

Participação em organização ou entidadecomunitária

0,47 0,64 0,61 0,24

Não cria animais de produção 0,49 0 0,28 0,90

Acesso e melhoria dos serviços de saúde 0,55 0,76 0,59 0,43*Categorização das variáveis: 1= presença do fator 0=ausência

Page 114: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

114

A análise fatorial discriminante revelou emuma nova dimensão as diferençasexistentes entre os três grupos. Melhorescondições de segurança alimentar e deprodução animal somados a um nívelelevado de organização comunitária ecapacidade de reivindicação foram atributospositivos da população do MST. Issodemonstra o potencial desse grupo paracontribuir na implementação de uma amplae participativa política de reforma agrária.Entretanto, a falta d’água dentro de casa ede acesso qualificado aos serviços desaúde significaram desvantagensassociadas às limitações das políticaspúblicas de saúde e de saneamento aindanão superadas, o que também foi apontadopor vários autores (Schmitd et al, 1998;Saúde nos assentamentos -UnB 2001; Leiteet al, 2004; Kassouf, 2005).

Os bóias-frias diferenciam-se positivamenteapenas no acesso ao saneamento, graçasàs maiores facilidades encontradas nodesenvolvimento dessa política na zonaurbana se comparada com a rural.Entretanto, a alta exposição aosagrotóxicos, um alto índice de insegurançaalimentar e o baixo nível de organizaçãopolítica também os fazem diferentes dapopulação do MST estudada em Unaí.Esses atributos negativos são expressivosdas conseqüências do modelo de produçãode grande escala baseado na monocultura,analisados também por vários autores(Alessi e Navarro, 1997; Silva, 1999; Castro,2003; Breilh, 2004; Miranda et al, 2007;Soares e Porto, 2007).

Essas constatações remetem a umareflexão sobre o projeto de desenvolvimentodo País. Tido como o grande carro de forçada economia brasileira e responsável por40% do volume total exportado pelo Brasil(Miranda et al, 2007), o denominado“agronegócio” brasileiro não tem sidoavaliado nos seus impactos na saúde(trabalhadores, famílias e comunidades) enos ecossistemas (Soares e Porto, 2007).Os bóias-frias de Unaí sofrem com asprecárias condições de trabalho a que estãosubmetidos (90% querem mudar detrabalho) e possuem futuro incerto com oprocesso atual de modernização

conservadora da agricultura. Oaparecimento de máquinas cada vez maiseficientes na região animam os grandesfazendeiros, pois acreditam que irãodiminuir seus problemas com o Ministério doTrabalho, já que dependerão cada vezmenos dos bóias-frias que rumam para a“extinção”, segundo Silva (1999).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:ELEMENTOS PARA UMA PROPOSTA

DE POLÍTICA DE SAÚDE PARA ASPOPULAÇÕES DO CAMPO

Neste capítulo, apresentamos uma sínteseintegradora das discussões desenvolvidas,de forma a destacar, mas longe de esgotar,os elementos que consideramos maisimportantes para a construção de umaproposta política. O percurso partirá daspolíticas e organização dos serviços,passando pelas condições de saúde daspopulações do campo, chegando aosconceitos de saúde que estão guiando aluta de movimentos sociais como o MST.

A política econômica neoliberal vigente nasúltimas décadas vem restringindo o papel doEstado (Vianna, 1998), contribuindo para apopulação do campo continuar relegada noacesso aos serviços públicos básicos comoos de saúde, saneamento, transportecoletivo, entre outros. Uma das expressõesdesse modelo também está namodernização conservadora da agriculturabrasileira (Delgado, 2002), que concentra apropriedade da terra, precariza as condiçõesde trabalho e tem impactado osecossistemas. As famílias expulsas da terraacabam migrando para as cidades embusca de trabalho e melhores condições deacesso a saúde e de outros serviços.

As primeiras políticas de saúde para ocampo, baseadas em uma concepçãorestrita da relação desenvolvimento e saúdeno Brasil, buscaram atender aos interesseseconômicos ligados à garantia de mão-de-obra sadia para a exploração dos recursosnaturais (Lima et al, 2005). Sua evoluçãoesteve estreitamente associada aosmomentos de mobilizações dostrabalhadores rurais, quando se constituíram

Page 115: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

115

em grupos de pressão com capacidade dearticulação política frente ao Estado. Nesseprocesso, foram vencidas importantesbarreiras associadas a interesses privados ecoorporativos. Na década de 1960, apressão das Ligas Camponesas obrigou oEstado a implementar o FUNRURAL. Já nofinal dos anos de 1970, o movimento pelaredemocratização do País abriu espaçopara a concepção de um programa como oPIASS. Entretanto, o Estado usou essaspolíticas como forma de cooptação dosmovimentos ao mesmo tempo em quebuscava maior legitimidade frente àsociedade.

No ano de 2003, com a chegada de um ex-líder do movimento sindical urbano aPresidência da República, sãoestabelecidas maiores pontes de diálogocom os movimentos sociais, contribuindopara a estruturação do Grupo da Terra. Acriação desse grupo fez, pela primeira vezna história brasileira, o “público alvo” dapolítica nacional de saúde para o campoparticipar diretamente do processo de suaconstrução, antes dominada por tecnocratase representantes dos anéis burocráticoempresariais. No entanto, apesar dosavanços da criação do SUS, os incentivospara a atuação na saúde do campo aindasão tímidos, existindo uma distância do queé preconizado na lei e o que chega à basedo sistema de saúde.

Essas populações sempre enfrentaram adescontinuidade das ações, modelos quenão se consolidaram, e uma fragmentaçãode iniciativas que ainda contribuem paraseus altos níveis de exclusão ediscriminação pelos serviços de saúde.Como lições para se pensar em novaspolíticas, deve se ressaltar o fracasso daspropostas de caráter desintegrado,centralizado, curativo, urbano, não-universais, em detrimento de ações como asde saneamento, de estímulo a participaçãosocial e de ampla utilização de agentes desaúde (Pinto, 1984; Escorel,1998; Lima etal, 2005).

Os resultados dos diversos estudos sobreas condições de saúde desses gruposevidenciam um perfil mais precário se

comparado com a população urbana. Nocampo, ainda existem importanteslimitações de acesso e qualidade nosserviços de saúde, bem como uma situaçãodeficiente de saneamento ambiental. Ascondições de saúde nas áreas de reformaagrária é uma das questões mais malavaliadas pelas famílias, em termos de suamelhora após serem assentadas (Leite et al,2004). Tais constatações servem paraapontar o fracasso das políticas de saúdepara o campo no Brasil.

Um dos achados mais expressivos de nossoestudo está na comparação entre ascondições de saúde de assentados,acampados e bóias-frias de Unaí-MG. Osbóias-frias do Bairro Mamoeiroapresentaram a situação mais crítica emrelação à segurança alimentar. A oferta detrabalho no Bairro limitava-se, de maneirageral, a apenas seis meses ao ano e deforma inconstante, fazendo que as famíliastivessem renda variável e baixa. A grandemaioria das famílias gostaria de mudar detrabalho em função do escasso tempo paradormir, da precariedade dos meios dedeslocamento, conservação da comida,danos à saúde, cansaço e à “exploração”.Provavelmente, em função do regimeintensivo de produção, os bóias-friastambém estavam mais expostos aosagrotóxicos se comparados aos assentadose acampados.

A produção animal desenvolvida pelatotalidade das famílias assentadas, foi umacaracterística marcante, ao contrário dosbóias-frias que praticamente não contavamcom essa possibilidade na cidade.Entretanto, as limitações de infra-estrutura,recursos financeiros e crédito continuamsendo entraves para que essa produçãotenha impacto que ultrapasse oautoconsumo e gere renda para assentadose acampados. Essa é uma questãoimportante que, somada à melhora naprodução agrícola, pode fazer que parte dasfamílias não precisem mais buscar trabalhofora de suas áreas.

Apesar de alijados da maioria das políticas eserviços públicos, as famílias assentadas eacampadas do MST possuem nível de

Page 116: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

116

organização política bem superior ao dosbóias-frias, que, por outro lado, têm maisacesso às políticas de saúde e saneamento,desenhadas para quem vive na cidade. Aforte ação política reivindicatória domovimento tem possibilitado diminuir algunsdiferenciais à medida que se tornam sujeitoshistóricos construtores de seu futuro. Essaposição contribui para a emancipação dasfamílias frente aos modos de vida esituações enfrentadas de risco a saúde, poisavaliam que o fato de estarem naorganização melhorou suas perspectivas desaúde. Já os bóias-frias parecemresignados a uma condição de sem futuro,de não ser, frente a um modelo agrícola quese moderniza e cada vez menos necessita.deles

A experiência do movimento coloca a saúdecomo objeto de luta pela valorização davida. A saúde passa a significar conquistada luta popular. Esse talvez seja o grandediferencial da ação do MST: seu processoorganizativo. O resgate da politização dasaúde, no sentido de valorizar os princípiosoriginais do SUS, baseados na promoçãoda saúde e na participação popular, é outraestratégia importante para fazer frente aoprocesso de mercantilização emedicalização da saúde no Brasil. Anecessidade de se implementar aintersetorialidade é fortemente reivindicada,principalmente para atender às demandaspor saneamento rural, moradia, saúdeambiental e produção de fitoterápicos.Tratam-se de lutas por melhores condiçõesde vida daqueles que vivem nosassentamentos e acampamentos, bemcomo para a preservação ambiental e ageração de renda. Frente a esses desafios,o movimento vem investindo na formaçãode militantes e na delegação deresponsabilidade para todos os níveis daorganização para serem capazes de atuarna saúde. Entretanto, é um desafiocomplexo, pois cria-se uma linha tênueentre o que é papel do Estado e asatribuições dos movimentos sociais. Torna-se oportuno relembrar que a estreita relaçãoque os sindicatos de trabalhadores ruraispossuíam com o FUNRURAL, em termos derecebimentos de recursos eresponsabilidades de prestar serviços,

desencadeou um processo deburocratização e perda da capacidadeorganizativa dessas entidades (Viana, 1997;Vianna, 1998; Delgado, 2002).

Finalmente, pode-se afirmar que o MSTpossui um importante papel de indutor doprocesso de elaboração e execução depolíticas públicas, possibilitando a seusparticipantes o exercício da cidadania aomesmo tempo em que tenciona o Estado acumprir seu papel. A construção de umapolítica de saúde para as populações docampo poderá ser uma oportunidade paragerar novo ciclo para o SUS, em que apromoção da saúde deverá ser peçafundamental rumo a um projeto dedesenvolvimento de País que distribuariqueza e seja ecologicamente sustentável.

6. CONCLUSÕES

Historicamente, as políticas de saúde para ocampo no Brasil voltaram-se para interesseseconômicos, que, para potencializar aexploração dos recursos naturais,necessitavam de mão-de-obra sadia.Mesmo assim, os maiores avanços dessaspolíticas ocorreram nos períodos históricosem que os trabalhadores rurais estiverammais organizados. A resposta do Estado aessas pressões puderam ser entendidascomo estratégias de legitimação frente àsociedade e de cooptação dos movimentossociais. Como resultado desse processo aspopulações do campo sempre enfrentarama descontinuidade das ações, modelos quenão se consolidaram, e uma fragmentaçãode iniciativas que ainda contribuem paraseus altos níveis de exclusão ediscriminação pelos serviços de saúde.Como lições para se pensar em novaspolíticas para essas populações, deve seressaltar o fracasso das propostas decaráter desintegrado, centralizado, curativo,urbano, não-universais, em detrimento deações como as de saneamento, de estímuloa participação social e de ampla utilizaçãode agentes de saúde.

A análise fatorial discriminante de variáveisselecionadas para as três comunidades(assentamento, acampamento e bóias-frias

Page 117: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

117

de Unaí-MG) reforçou a tese de que sãorealmente diferentes entre si. Os bóias-friasdo Bairro Mamoeiro apresentaram altoíndice de insegurança alimentar, quase odobro da proporção entre as famíliasacampadas e quatro vezes maior que asassentadas do MST. Com uma rendavariável e baixa, estão também maisexpostos aos agrotóxicos se comparadosaos assentados e acampados. A produçãoanimal desenvolvida pela totalidade dasfamílias assentadas foi uma característicamarcante, ao contrário das famílias bóias-frias que praticamente não contavam comessa possibilidade na cidade de Unaí. Essaprodução para o autoconsumo pode estarcontribuindo para a elevação da rendafamiliar e para a melhora da segurançaalimentar dessas famílias.

A precariedade da infra-estrutura enfrentadapelas famílias do MST de Unaí indica ainsuficiência das políticas de Estadoreferentes ao saneamento rural secomparada com a situação das áreasurbanas. O SUS também não tem atendidoa uma grande parcela das necessidades desaúde das famílias assentadas eacampadas das comunidades estudadasem Unaí, sendo que o acesso é uma dasquestões mais importantes. Para a maiorparte dessas famílias, a única forma de osistema atender suas necessidades seráapós reivindicações e pressões sobre ogoverno. O fato de ser Sem Terra, estarorganizado, melhora as perspectivas de suasaúde em comparação com os bóias-frias,que não possuem as mesmaspossibilidades de ter acesso à terra como omilitante do movimento. Tais constataçõesservem para avaliar o fracasso das políticasde saúde para o campo no Brasil.

A noção de saúde apresentada pelo MSTexpressa um conceito ampliado, destacadono movimento político da Reforma SanitáriaBrasileira e associado a um projeto detransformação da sociedade. Oentendimento, tanto da base do MST,quanto dos dirigentes do Coletivo Nacionalde Saúde, mostra que existem muitosobstáculos a serem superados para que osprincípios definidos na Constituiçãobrasileira sejam de fato cumpridos. O

diferencial da ação do MST sobre a saúde éseu processo organizativo, cujos princípiosresgatam a politização da saúde,valorizando a promoção da saúde e aparticipação popular. O movimento possuiimportante papel de indutor do processo deelaboração e execução de políticaspúblicas, tendo sido fundamental para acriação do Grupo da Terra e das mudançasno cálculo do PAB que incluiu a populaçãoassentada. A agenda de luta de movimentossociais como o MST tem exigido doMinistério da Saúde o desencadeamento doprocesso de construção de uma políticapara a população do campo em que aparticipação social, a intersetorialidade e aeqüidade são elementos fundamentais. Aconstrução dessa política poderá ser umaimportante oportunidade para que o SUS serenove, priorizando a promoção da saúde edando um salto qualitativo na suas práticasrumo a um projeto de sociedade mais justae democrática.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

A POLÍTICA Social brasileira 1930-1964: aevolução institucional no Brasil e no RioGrande do Sul. Porto Alegre: Fundação deEconomia e Estatística, 1983. 331 p.

ALBUQUERQUE, C. S. S; CASTRO, A. J.W; ROSAS, R. J. R. Análise situacional desaúde para assentados da reforma agrária.Brasília: Ministério do DesenvolvimentoAgrário, Núcleo de Estudos Agrários eDesenvolvimento Rural, 2000. Relatório.

ALESSI, N. P. ; NAVARRO, V. L. Health andwork in rural areas: sugar cane plantationworkers in Ribeirão Preto, São Paulo, Brazil.Cadernos de Saúde Pública, v.13, suppl.2,p.111-121. 1997.

ANDRADE, P A; NAGY M. R. Saúde equalidade de vida no campo: a luta dos (as)trabalhadores (as) da CONTAG e dos (as)participantes do MST. 2004. 82 f.Monografia. (Especialização em SaúdeColetiva – Educação em Saúde). Faculdadede Ciências da Saúde, Unb, Brasília.

Page 118: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

118

AROUCA, S. Dr. Democracia. Rio deJaneiro: O PASQUIM 21, 27 ago. 2002.Disponível em: <ilus.http://bvsarouca.cict.fiocruz.br/lildbi/docsonline/5/7/275-Sergio_arouca_entrevistao.doc> Acessoem: 10 de outubro de 2007.

ASTUDILLO, V. Formas da organização daprodução como determinantes de risco defebre aftosa. Hora Veterinária, ano 3, n. 17,p.11-20, 1984.

AVILA, R. V. Os impactos dosassentamentos de reforma agrária nonoroeste de Minas Gerais. 2002. 117 f.Dissertação (Mestrado emDesenvolvimento, Agricultura e Sociedade)Instituto de Ciências Humanas e Sociais,Universidade Federal Rural do Rio deJaneiro, Rio de Janeiro.

BERTOLINI, V. A. Ocupando o cerrado –Avaliação do processo de implantação deassentamentos rurais no entorno do DistritoFederal. 2005. 183f. Dissertação (Mestradoem Arquitetura e Urbanismo) Faculdade deArquitetura, Universidade de Brasília,Brasília.

BERTRAN, P. História da Terra e doHomem no Planalto Central: eco-história doDistrito Federal: do indígena ao colonizador.Brasília: SOLO,1994. 270 p.

BITTENCOURT, G.A; CASTILHOS, D. S B;BIANCHINI, V et al. Principais fatores queafetam o desenvolvimento dosassentamentos de reforma agrária no Brasil.Brasília: Projeto de Cooperação TécnicaINCRA/FAO/Ministério do DesenvolvimentoAgrário, 1999, 62p.

BRASIL. Decreto nº 5.813 de 22 de junhode 2006. Dispõe sobre Dispõe sobre aPolítica Nacional de Plantas Medicinais eFitoterápicos. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: 10 dezembro de 2006.

BRASIL. Lei nº 8080 de 19 de setembro de1990. Dispõe sobre o Sistema Único deSaúde. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: dezembro de 2006.

BRASIL. Portaria 2.607 de 10 de dezembrode 2004a. Aprova o Plano Nacional deSaúde/PNS - Um Pacto pela Saúde noBrasil. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: 25 outubro de 2006.

BRASIL. Portaria FUNASA nº 106 de 4 demarço de 2004. Dispõe sobre critérios deelegibilidade para a execução de projetosde saneamento em comunidadequilombolas, assentamentos, reservasestrativistas e populações com menos de30.000 habitantes. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: 20 outubro de 2006.

BRASIL. Portaria nº 1432 de 14 de julho de2004d. Dispõe sobre a inclusão, na base decálculo do valor do Piso de Atenção Básica(PAB -fixo), a população assentada entre osanos 2000 e 2003, e dá outras providências.Disponível em: < http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html > . Acesso em: 24 deoutubro de 2006.

BRASIL. Portaria nº 1434 de 14 de julho de2004b Define mudanças no financiamentoda atenção básica em saúde no âmbito daestratégia Saúde da Família, e dá outrasprovidências. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: 25 outubro de 2006.

BRASIL. Portaria nº 2460 de 12 dedezembro de 2005. Dispõe sobre a criaçãodo Grupo da Terra.. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: 26 de outubro de 2006.

BRASIL. Portaria nº 719 de 14 de abril2004c. Dispõe sobre a criação do Grupo daTerra. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html> . Acesso em: 15 outubro de 2006.

Page 119: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

119

BREILH, J. Epidemiologia Crítica: ciênciaemancipadora e interculturalidade. Rio deJaneiro: Editora Fiocruz, 2006. 317 p.

BREILH, J. Pilhagens, ecossistemas esaúde. Conferência de abertura do IIISeminário Nacional sobre Ambiente eSaúde. Rio de Janeiro: Fiocruz. 2004. 20 p.(mimeografado).

BRENTLINGER, P. E; HERNÁN, M. A;HERNÁNDEZ-DIAZ et al. Childhoodmalnutrition and postwar reconstruction inrural El Salvador – a community-basedsurvey. Journal of the American MedicalAssociation, v. 281, n.2, p 184-190, 1999.

CABRAL, P.BBC Brasil. Lixão de Brasíliasustenta 'indústria informal'. BBC Brasil. 27set. 2002. Disponível em<www.bbc.co.uk/.../2002/020927_paulodi.shtml> Acesso em24 de janeiro de 2007.

CALDART, R. Pedagogia do MovimentoSem Terra. Petrópolis: Vozes, 2000. 276p.

CARNEIRO F.F; CIFUENTES E; TELLEZ-ROJO M; ROMIEU, I. The risk of Ascarislumbricoides infection in children as aenvironmental health indicator to guidepreventive activities and Caparáo and AltoCaparaó, Brazil. Bulletin of World HealthOrganization, v 80 n.1; 40-45. 2002

CASTRO, J. A geografia da fome – o dilemabrasileiro: pão ou aço. 3 ed. Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 2003. 318 p.

CASTRO, T. G. C; CAMPOS, F. M;PRIORE, S. E. et al. Health and nutrition ofchildren, 0 to 60-month old, in an agrarian-reform settlement, Vale do Rio Doce, MG,Brazil. Revista de. Nutrição, v. 17, n. 2, pp.167-176. 2004.

CIDADES@. IBGE Cidades. Unaí, lavouratemporária de 2003. Disponível em:<www.ibge.gov.br>. Acesso: junho de 2006.

COHN, A. O SUS e o direito à saúde:universalização e focalização nas políticasde saúde. In: LIMA, N. T (org). Saúde eDemocracia: história e perspectivas do SUS.Rio de Janeiro: Fiocruz, 2005. p. 385-405.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE DOTRABALHADOR. 2ª, 1994. Relatório.eletrônico Disponível em : <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE.10ª, 1996 Relatório eletrônico. Disponívelem:<http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html >. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE.11ª, 2000 Relatório eletrônico. Disponívelem:<http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html >. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE.12ª, 2003. Relatório eletrônico. Disponívelem:<http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html >. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. 5ª,1975. Relatório eletrônico. Disponível em : <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. 6ª,1977. Relatório eletrônico. Disponível em : <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. 7ª,1980. Relatório eletrônico. Disponível em : <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. 8ª,1986. Relatório eletrônico. Disponível em : <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. 9ª,1992. Relatório eletrônico. Disponível em : <http://bvsms.saude.gov.br/html/pt/home.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2006.

Page 120: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

120

CONSTRUINDO o conceito de saúde doMST. Veranópolis: ITERRA. 2000. 55p.(Cartilha de Saúde nº 5).

CORDEIRO, H A; AROUCA, A. T; FIORI; J.L. et al. Los determinantes de la produccióny distribución de la enfermedad. Rio deJaneiro [S.N], 1980. p 159-180.

DELGADO, G. C. Expansão emodernização do setor agropecuário nopós-guerra: um estudo da reflexão agrária.Estudos avançados, v.15, n.43, p.157-172.2001.

DELGADO, G.C ; CARDOSO JR, J. C (Org).A universalização de direitos sociais noBrasil: a previdência rural nos anos 90. 2 ed.Brasília: Ipea, 2002. 242p.

DUGGER, C W. Brazilian Slums Seen asPawns in Political Games. The New YorkTimes. 18 jan. 2004. Disponível em:<http://www.nytimes.com/2004/01/18/international/americas/18BRAZ.html?pagewanted=1&ei=5007&en=bc4f7e4732f3a0ab&ex=1389762000&partner=USERLAND>. Acessoem: 24 janeiro de 2007.

ECONOMIA –IBGE. Censo Agropecuário,1996. Disponível em: <www.ibge.gov.br>.Acesso: junho de 2004.

ESCOREL, S. Reviravolta na saúde: origeme articulação do movimento sanitário. Rio deJaneiro: Fiocruz, 1998. 208 p.

FARIA, N. M. X; FACCHINI, L.A; FASSA,A.G. et al. Processo de produção rural esaúde na serra gaúcha: um estudodescritivo. Cadernos de Saúde Pública,v.16, n.1, p.115-128. 2000.

FERNANDES, B. M. A formação do MST noBrasil. Petrópolis: Editora Vozes, 2000. 318p.

FERREIRA, H. S; ALBUQUERQUE, M.F.M;ATAIDE, T.R et al. Estado nutricional decrianças menores de dez anos residentesem invasão do “movimento dos sem-terra”,Porto Calvo, Alagoas. Cadernos de SaúdePública, v 13, n. 1 p. 137-139, 1997.

FIGUEIREDO, V. M; FREITAS, E; PINTO,M.G.O; BARROS, M. E. Questão Agrária eSaúde no Brasil contemporâneo. RevistaBrasileira de Saúde Ocupacional, v.15, n.59,p.7-17. 1987.

FLEURET, P.; FLEURET, A. Nutrition,consumption, and agricultural change.Human Organization, v. 39, n. 3, p. 250-260,1980.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisasocial. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2006. 206 p.

GUEDES, F. V. N. L. Condições, modo devida e renda no Assentamento Liberdade,Periquito – MG – Fundamentação para aEpidemiologia Social. 2006. 70f. Dissertação(Mestrado em Medicina Veterinária -área deconcentração : Epidemiologia) –Universidade Federal de Minas Gerais,Escola de Veterinária. Belo Horizonte.

KASSOUF, A. L. Acesso aos serviços desaúde nas áreas urbana e rural do Brasil.Revista de Economia e Sociologia Rural., v.43, n. 1, pp. 29-44. 2005 Disponivel em :<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-20032005000100002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 23 outubro de2006.

KLEINBAUM, D. G. Applied regressionanalysis and other multivariable methods. 2ed. Boston: PWS-KENT PublishingCompany. 1988. 718 p.

LAUDOS de Vistoria e Avaliação: fazendaPorteira Santa Cruz (PA Menino Jesus) efazenda São Miguel do Mulungu (PA CarlosLamarca). Brasília: INCRA SR 28, 1999 .

LEITE, S; HEREDIA, B; MEDEIROS, L. et al(org). Impacto dos Assentamentos: umestudo sobre o meio rural brasileiro. Brasília:Instituto Interamericano de Cooperaçãopara a Agricultura: Núcleo de EstudosAgrários e Desenvolvimento Rural; SãoPaulo: Editora UNESP, 2004. 392 p.

LIMA, N. T (org). Saúde e Democracia:história e perspectivas do SUS. Rio deJaneiro: Fiocruz, 2005. 504p.

Page 121: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

121

LIRA, P.I.C . Estado nutricional de criançasmenores de seis anos, segundo posse daterra, em áreas rurais do estado dePernambuco, Nordeste do Brasil. ArchivosLatinoamericanos de Nutrición, v. 35, n.2, p.246-257, 1985.

LUTAR por saúde é lutar por vida. ANCA. 2a

Edição. São Paulo: Coletivo Nacional deSaúde, Movimento dos TrabalhadoresRurais Sem Terra, 2000. Caderno de Saúden.1.16p.

MARSHALL, T.H. Política Social. Rio deJaneiro: Zahar Editores, 1967. 369 p.

MINAYO, M.C; ASSIS, S. G; SOUZA; E. R.(Org) et al. Avaliação por triangulação demétodos – abordagem de programassociais. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2005. 244p.

MIRANDA, A.C; MOREIRA, J. C;CARVALHO, R et al. Neoliberalismo, uso deagrotóxicos e a crise da soberania alimentarno Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.12,n.1, p. 7-14. 2007.

MOREIRA, E. ; WATANABE, T (Org).Ambiente, Trabalho e Saúde. João Pessoa:Universitária UFPB, 2006. 232 p.

MORISSAWA, M. A História da Luta pelaTerra e o MST. São Paulo: ExpressãoPopular, 2001. 256 p.

MOVIMENTO DOS TRABALHADORESRURAIS SEM TERRA- MST. Página nainternet desenvolvida pelo MST. Apresentahistórico e dados gerais sobre o movimento.Disponível em : <www. mst.org.br> . Acessoem: junho de 2004.

NETTO, G. F; CARNEIRO, F. F; ARAGÃO,L. G. T. et al. Saúde e Ambiente: reflexõespara um novo ciclo do SUS. IN: CASTRO.A;MALO, M. SUS – ressignificando apromoção da saúde. São Paulo:HUCITEC/OPAS, 2006. 222 p.

NISHIYAMA, P. Utilização de agrotóxicosem áreas de reforma agrária no estado doParaná. 2003. 136 f. Tese (Doutorado emSaúde Coletiva) Faculdade de CiênciasMédicas, Universidade Estadual deCampinas, Campinas.

O DESENVOLVIMENTO do Sistema Únicode Saúde: avanços, desafios, e reafirmaçãode seus princípios e diretrizes. Brasília:Ministério da Saúde, 2002. 72p (série B.Textos Básicos de Saúde).

OFICINA. 1ª Oficina. Brasília: ColetivoNacional de Saúde do MST, 1998.(Relatório).

PINTO, V G. Saúde para poucos ou paramuitos: o dilema da zona rural e daspequenas localidades. Brasília: IPEA, 1984.200 p. (Série Estudos para o Planejamenton 26)

POPULAÇÃO-IBGE. Pesquisa Nacional porAmostragem Domiciliar, 2003a. Disponívelem: <www.ibge.gov.br>. Acesso: junho de2006.

PRINCIPAIS indicadores sócio-econômicosdos assentamentos de reforma agrária.FAO. Brasília: Ministério da AgriculturaAbastecimento e da Reforma agrária. 1992.(Relatório). 24p.

PROGRAMA de Interiorização das Ações deSaúde e Saneamento. Brasília: Ministério daSaúde. Secretaria Geral, 1981. (Relatório)13p.

PROGRAMA de processamento de textos,dados e estatísticas em Saúde Pública.EPINFO. Versão 6.04d. CDC e WHO, 2001.Disponível em :<http://www.cdc.gov/epiinfo/Epi6/EI6dnjp.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2006.

PROGRAMA Estatístico. Versão 14.Pennsylvania: MINITAB, 2006.

PROPOSTA do Curso Técnico de SaúdeComunitária. Brasília: Coletivo Nacional deSaúde do MST, 2001.

Page 122: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

122

RELATO de experiências de Saúde.Brasília: Coletivo Nacional de Saúde doMST. 2005b. 44 p.

RELATÓRIO – Seminário Nacional deAgrotóxicos, Saúde e Ambiente. 2005,Olinda. Brasília: Anvisa, 2006.25 p.

REUNIÃO do Coletivo Nacional de Saúdedo MST. Cajamar, 2000 (Relatório).

ROMANI, S.A.M; AMIGO, H. Perfil Alimentare posse da terra na área rural do estado dePernambuco, nordeste do Brasil. Revista deSaúde Pública, v. 20, n 5, p 369-376, 1986.

ROSENBERG, F.J. Estructura social yepidemiologia veterinária em AméricaLatina. Boletim. Centro PanamericanoFiebre Aftosa, v. 52, p. 3-23, 1986.

SAKAMOTO, L.Quatro mortes, dois anos.agência carta maior, 1 de fevereiro de 2006.Colunistas. Disponível em:<http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=2889>Acesso em: 27 de junho de 2006.

SAMPAIO, I.B.M. Análise de dadosmultidimensionais. Madrid: Escuela TécnicaSuperior de Ingieneiros Agronomos/Universidad Politécnica de Madrid, 1993.123 p. (Relatório das atividades de pós-doutorado).

SAÚDE E REFORMA AGRÁRIA – umaescola em Movimento, relatos de umaconstrução. Veranópolis: Instituto Técnicode Capacitação e Pesquisa em ReformaAgrária/Escola Josué de Castro. CursoTécnico em Saúde Comunitária. 2005(Mimiografado).

SAÚDE nos assentamentos eacampamentos da reforma agrária. Brasília:UnB/MST, 2001, 179 p.

SCHMIDT, B V; MARINHO, D N C; COUTOROSA, S L (ORG). Os assentamentos dareforma agrária no Brasil. Brasília: EditoraUniversidade de Brasília, 1998. 306 p.

SCOREL, S. Reviravolta na saúde: origem earticulação do movimento sanitário. Rio deJaneiro: Fiocruz, 1998. 208 p.

SEGURANÇA ALIMENTAR no Brasil:validação de metodologia paraacompanhamento e avaliação. UNICAMP,Faculdade de Ciências Médicas,Departamento de Medicina Preventiva eSocial. 2004. 33p. (Relatório).

SILVA, M. A. M. Errantes do fim do século.São Paulo: Fundação Editora da UNESP,1999. 370 p.

SOARES, W.L; PORTO, M.F. Atividadeagrícola e externalidade ambiental: umaanálise a partir do uso de agrotóxicos nocerrado brasileiro. Ciência e Saúde Coletiva,v.12, n.1, p. 131-143. 2007.

SOARES, W; ALMEIDA, R. M; MORO, S.Trabalho rural e fatores de risco associadosao regime de uso de agrotóxico em MinasGerais, Brasil. Cadernos de Saúde Pública,v. 19, n. 4, p. 1117-1129, 2003.

STÉDILE, J. P. (Org). A questão agráriahoje. 2a ed. Porto Alegre: EditoraUniversidade,. UFRGS, 1994. 322 p.

SUS – 15 anos de implantação – desafios epropostas para sua consolidação. Brasília:Ministério da Saúde, 2003. 23 p. (TextosBásicos de Saúde – Série Políticas deSaúde – série B).

VASCONCELOS, F. A.G. AvaliaçãoNutricional de Coletividades. 3 ed.Florianópolis: Editora da UFSC, 2000. 154p.

VEIGA, G V; BURLANDY, L. Indicadoressócio-econômicos, demográficos e estadonutricional de crianças e adolescentesresidentes em um assentamento rural doRio de Janeiro. Cadernos de. SaúdePública, v.17, n.6, p.1465-1472. 2001.

Page 123: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

123

VIANA, A L D. Enfoques metodológicos empolíticas públicas: novos referenciais paraos estudos sobre políticas sociais. In:CANESQUI, A M (org.). Ciências sociais esaúde. Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco,1997, p. 205-215.

VIANNA, M.L.T.W. A americanização(perversa) da seguridade social no Brasil:estratégias de bem-estar e políticaspúblicas. Rio de Janeiro: Revan, UCAM,IUPERJ, 1998. 272 p.

VICTORA, C. G. Desnutrição e apropriedade da terra no campo. CiênciaHoje, v. 1 n.5 p. 80; 1983.

VICTORA, C.G; VAUGHAN, J.P;KIRKWOOD, B. et al. Child malnutrition andland ownership in southern Brazil. Ecologyof Food and Nutrition, v. 18. p. 265-275,1986.

YUSUF, E. M; EHRLICH, A; MARITIM, G.K.A comparison of nutritional status of pre-school children of cooperative and individualfarmers in rural Ethiopia. Tropical andGeographical Medicine, v. 45, p. 93-94,1993.

Page 124: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

124

8. ANEXOSAnexo A

Roteiro de discussão com o Coletivo Nacional de Saúde do MST

1.Qual é o conceito de saúde do MST? (Reflexão sobre o conceito de saúde das pessoas)

2. Existem diferenças do conceito de saúde do MST em relação ao conceito de saúde edoença de sua base social? (focar no entendimento do grupo)

3. O que mais produz doença nos assentamentos e acampamentos? (Existem diferenças,quais, focar no cotidiano)

4. O que mais produz saúde nos assentamentos e acampamentos? Existem diferenças?

5. Qual a relação do processo de reforma agrária e a política agrícola com a saúde? (abrirdiscussão)

6. O que acham do SUS? O que precisa ser modificado ou aprimorado no SUS?

7. Deve ser alterado o modelo de reforma agrária para se ter uma melhor saúde? Como fazerisso?

8. Quais necessidades contribuíram para a criação do setor saúde no MST? Qual foi aconjuntura sócio-econômica e política deste momento?

9. Quais são os resultados da criação do setor saúde do MST?

10. Como a visão de saúde do coletivo de saúde é implementada junto a base do MST? Quetipo de ações existem? Quais as condições?

12. Quais são as principais dificuldades e os desafios para o trabalho dos coletivos de saúde?

13. O que se espera com a implantação do plano/ações do coletivo de saúde?

Page 125: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

1

Código questionário:

Código da comunidade:

Número da moradia:

Data: Resultado da Entrevista:

(1) completa (2) incompleta (3) recusa (4) ninguém em casa Observação:

1. FAMÍLIA Histórico da família 1.1. Anos de acampamento, considerando o primeiro acampamento: Percurso: 1.2. Local de residência antes de acampar:

(1) Zona Rural (2) Zona Urbana Percurso de migração: 1.3. Com relação ao antigo imóvel, qual era a condição?

(1)próprio (2)cedido (3)ocupado (4)alugado R$___________ (5)outro___________

1.4. Profissão e/ou ocupação (homem) antes de ser assentado/acampado: (1)Bóia Fria (2)Meeiro (3)Empregado fazenda (4)Pequeno proprietário (5)Assalariado urbano.Especifique_________________ (6) outros:__________________

1.5. Profissão e/ou ocupação (mulher) antes de ser assentada/acampada: (1)Bóia Fria (2)Dona de casa (3)Empregada fazenda (4)Pequena proprietária (5)Assalariada urbana.Qual?_________________ (6) outros:__________________

1.6. Membros da família

Nome

Sexo

idad

e

parentesco

Freq

üent

a a

esco

la

Escolarid.

Mor

a no

lo

cal

Qua

ntas

ho

ras

trab

alha

po

rdi

aR

ecur

sos

exte

rnos

(a

pose

ntad

oria

/bol

sa

esco

la)

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.

QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA DE CAMPO

Para famílias acampadas e assentadas

Realização: Universidade Federal de Minas Gerais -UFMG – Escola de Veterinária (Doutorado em epidemiologia)

Page 126: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

2

2. MORADIA

2.1 Materiais da casa Piso: (1)terra (2)cimento grosso (3)cimento queimado (4)cerâmica (5)outros_______ Paredes: (1)tijolo bruto (2)rebocado (3)barro (4)lona (5) palha (6)outros___________ Telhado: (1)amianto (2)telha cerâmica (3)palha (4)lona (5)outros_________________

Água 2.2 Fonte de água para beber:(1) cisterna (2) nascente (3) poço artesiano (4) rio (5) Outros________

2.3 Têm água encanada dentro de casa? (1) Sim (2) Não

2.4 Quantidade de água em litros que se consome por dia

2.5 Qualidade da água (1)boa (2)regular (3)péssima (4)ótima

2.6 Quem vai buscar a água? (1) Mulher (2) Homem (3) crianças (4) mulheres e crianças (5)Outros _________

2.7 Quantas horas se gasta por dia para buscar água?

2.8 Dos itens a seguir quais estão sendo utilizados em sua casa? (1)Filtro (2)pia de cozinha (3)tanque de lavar roupa (4)Vaso sanitário com descarga

Dejetos 2.9 Onde fazem suas necessidades? (1)fossa (2)mato (3)outros_________

2.10 Que destino é dado ao lixo orgânico (ex: restos de alimentos)? (1)adubação (2)alimentação animal (3)enterra (4)outros

2.11 Que destino é dado ao lixo inorgânico (papel, plástico, metais, vidro)?(1)queimado (2)jogado a céu aberto (3)enterrado (4)separado (5)outros_________

2.12 Quais desses animais aparecem mais em sua casa? (1)rato (2)mosquito (3)barata (4)mosca (5)cobra (6)escorpião (7)barbeiro (8)aranhas

Animais de companhia2.15 Cria animais domésticos?Quais? (1)cachorro ______ (2)gato______ (3)pássaro______ (4)não (5) outros_________

2.16 São vacinados? (1)sim (2)não

Page 127: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

3

3. PRODUÇÃO

3.1 Você tira o sustento do lote? (1)sim (2)não Explique:

3.2 O que se produz na sua parcela? (1)arroz (2)feijão (3)milho (4)cana (5)mandioca (6)frutas (7)hortaliças (8)outros ___________(9) não produz nada

3.3 O que faz com a produção? (1)sustento (2)vende na cidade (3)comercializa com vizinhos (4)outros_________

3.4 Que atividades ajudam na renda? (1)Bóia Fria em outras fazendas (2)trabalho temporário na cidade (3)outros_______

3.5 Desenvolvem alguma atividade cooperada? (1)produção com vizinho (2)beneficiamento (3)comercialização (4)não (5)outro____

3.6 Quantos hectares há atualmente no seu lote de: área plantada área desmatada para plantio

área verde intocada área para o gado

Produção Animal x Saúde 3.7 Que animais cria? (1)gado (2)cabras (3)porcos (4)galinha (5)animais de trabalho (cavalo, mula, burro) (6)não cria (7) outros__________

3.8 Quais são os cuidados básicos com a criação?

animal quantidade instalações alimentação sanidade (remédios, vacinas, vermífugos)

doenças mais comuns

3.9 Você tem conhecimento de casos de doenças transmitidas para as pessoas por animais, insetos, ou outros bichos no assentamento?

3.10 O que falta para criar os animais como sempre sonhou?

Modelo Agrícola x Saúde

3.11 Quais políticas públicas a comunidade tem acesso?

( 1) habitação

( 2 ) alimentação/segurança

alimentar

( 3 ) saúde

( 4) saneamento

( 5 ) crédito agrícola

( 6 ) energia

( 7 ) telefonia

( 8 ) estradas

( 9 ) transporte

( 10 ) educação

( 11 ) assistência

técnica

Page 128: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

4

3.12 São utilizados agrotóxicos no assentamento?

(1) Sim (2) Não (3) Não sabe

3.13 Já se intoxicou ou conhece casos de intoxicação na comunidade ou

nas áreas próximas? (1) Sim (2) Não (3) Não sabe

3.14 Quais são os principais problemas ambientais sofridos pela comunidade?

4. SEGURANÇA ALIMENTAR

4.1 Nos últimos três meses a comida acabou antes que a (o) senhora(sr)

tivesse produção ou dinheiro para comprar comida?

(1) Sim (2) Não (3) Não sabe

4.2 Com que freqüência isso ocorreu?

(1) Em quase todos os dias (2) Em alguns dias (3)Em apenas 1 ou 2 dias (4) Não sabe

4.3 O que a família comeu no dia anterior?

Refeição/hora Alimentos Quantidade

(medida caseira)

1.

2.

3.

4.

5.

6.

4.4 O que os animais comeram no dia anterior?

Alimentos (ração, comida e etc) Freqüência Quantidade

1. Cachorro

2.Gato

3.Vaca

4.Porco

5.Galinha

6. Outros (especificar)

Page 129: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

5

5. SAÚDE (entrevista individual com quem cuida da família):5.1 Que coisas da vida produzem doença?

5.2 Que coisas da vida produzem saúde?

5.3 Na sua família teve algum doente nestas 2 semanas? (1)sim (2)não (3) não sabe 5.4 Qual doença?

5.5 Para você qual foi a causa?

5.6 Precisou procurar um atendimento (tipo, qualidade e etc)? (1)sim (2)não (3) não sabe

5.7 Já houve óbito na família? (1)sim (2)não (3) não sabe Qual foi a causa?

5.8 Como está a saúde das pessoas no assentamento/acampamento? Por que?

5.9 Quais são as principais doenças sentidas pela comunidade?

5.10 Quais são as causas?

5.11 Que doenças podem ser tratadas dentro do assentamento/acampamento?

5.12 Quais os remédios produzidos dentro do assentamento?

5.13 As condições de saúde da família antes de estar na comunidade eram iguais as de hoje? (1)sim (2)não (3) não sabe Porque?

5.14 O que falta para se ter boa saúde na comunidade?

5.15 Você ou alguém de sua família já sofreu algum acidente ou doença do trabalho? (1)sim (2)não (3) não sabe Explique

5.16 Você participa de alguma entidade/organização comunitária? (1)sim (2)não (3) não sabe Qual?

5.17 Que influência o MST tem em relação a saúde (incluir as ações dos coletivos)?

5.18 A saúde de quem está no MST é diferente da saúde dos “Bóias Frias”? (1)sim (2)não (3) não sabe Porque?

5.19 O SUS atende as necessidades de saúde de sua família ou comunidade? (1)sim (2)não (3) não sabe

5.20 O que pode ser feito para mudar esta situação?

Page 130: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

134

Page 131: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

1

Código questionário:

Código da comunidade:

Número da moradia:

Data: Resultado da Entrevista:

(1) completa (2) incompleta (3) recusa (4) ninguém em casa Observação:

1. FAMÍLIA Histórico da família 1.1. Anos de trabalho como trabalhador rural temporário:

1.2. Local de residência antes de trabalhar como trabalhador rural temporário: (1) Zona Rural (2) Zona Urbana

Percurso de migração: 1.3. Com relação ao atual imóvel, qual é a condição?

(1)próprio (2)cedido (3)ocupado (4)alugado $___________ (5)outro___________

1.4. Ocupação (homem) antes de ser trabalhador rural temporário: (1)Meeiro (2)Empregado fazenda (3)Pequeno proprietário (4)Assalariado urbano.Qual?_________________ (5) outros:__________________

1.5. Ocupação atual da mulher: (1)Dona de casa (2)Empregada fazenda (3)Pequena proprietária (4)Assalariada urbana.Qual?_________________ (5) Bóia-fria (6) outros:__________________

1.6. Membros da família

Nome

Sexo

Idad

e

Parentesco

Freq

üent

a a

esco

la

Escolarid.Mora

no local Q

uant

as

hora

s tr

abal

ha

por

dia

Rec

urso

sex

tern

os

(apo

sent

ador

ia/b

olsa

es

cola

)

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.

QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA DE CAMPO

Para famílias de trabalhadores rurais temporários

Realização: Universidade Federal de Minas Gerais -UFMG – Escola de Veterinária (Doutorado em epidemiologia)

Page 132: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

2

2. MORADIA

2.1 Materiais da casa Piso: (1)terra (2)cimento grosso (3)cimento queimado (4)cerâmica (5)outros_______ Paredes: (1)tijolo bruto (2)rebocado (3)barro (4)lona (5) palha (6)outros___________ Telhado: (1)amianto (2)telha cerâmica (3)palha (4)outros_______________________

Luz 2.2 Quando gasta (R$), em média, de conta de luz por mês?

Água 2.3 Fonte de água para beber:(1)cisterna (2)nascente (3)poço artesiano (4)rio (5)rede pública (6)Outros_______

2.4 Têm água encanada dentro de casa? (1)Sim (2) Não

2.5 Quanto gasta (R$), em média, de conta de água por mês?

2.6 Qualidade da água (1)boa (2)regular (3)péssima (4)ótima

2.7 Dos itens a seguir quais estão sendo utilizados em sua casa? (1)Filtro (2)pia de cozinha (3)tanque de lavar roupa (4)Vaso sanitário com descarga

Dejetos 2.8 Onde fazem suas necessidades? (1)banheiro com fossa (2)banheiro com rede de esgoto (3)outros_________

2.9 Que destino é dado ao lixo orgânico (ex: restos de alimentos)? (1)coleta pública (2)adubação (3)alimentação animal (4)vai com o lixo inorgânico (5)enterra (6)outros

2.10 Que destino é dado ao lixo inorgânico (papel, plástico, metais, vidro)?(1)coleta pública (2)queimado (3)jogado a céu aberto (4)enterrado (5)separado (6)outros_________

2.11 Quais desses animais aparecem mais em sua casa? (1)rato (2)pernilongo (3)barata (4)mosca (5)cobra (6)escorpião (7)barbeiro (8)aranhas

Animais de companhia2.12 Cria animais domésticos?Quais? (1)cachorro ______ (2)gato______ (3)pássaro______ (4)não (5) outros_________

2.13 São vacinados? (1)sim (2)não

3. OCUPAÇÃO E RENDA

3.1 Que outras atividades complementam sua renda (ex. construção civil, serviços gerais)? Explique:

Page 133: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

3

3.2 Em quais culturas você trabalha? (1)arroz (2)feijão (3)milho (4)cana (5)algodão (6)soja (7)hortaliças (8)outros _________________________________________________

3.3 Você participa de qual etapa da produção? (1)plantio (2)colheita (3)carpina (4)aplicação de agrotóxicos (5)todas (6)outros____

3.4 Durante quantos meses do ano você trabalha como bóia-fria?

3.5 Você participa de alguma organização? (1) associação (2) sindicato (3)cooperativa (4)não (5)outro_________

3.6 Qual é o seu rendimento (financeiro) diário no trabalho?

3.7 Trabalha quantos dias da semana? (1) segunda à sexta (2) segunda à sábado (3) todos os dias (4) outros____________

3.8 Trabalha quantas horas por dia?

3.9 Tempo médio gasto em deslocamento para o local de trabalho por dia?

3.10 Você trabalha com carteira assinada (fichado)? (1) Sim (2) Não

3.11 O que há de pior em seu trabalho?

3.12 Você tem vontade de mudar de trabalho? (1) Sim. Para qual e porque?_______________ (2) Não

Produção Animal x Saúde 3.13 Que animais cria? (1)gado (2)cabras (3)porcos (4)galinha (5)nenhum (6)não cria (7) outros_________

3.14 Quais são os cuidados básicos com a criação? animal quantidade instalações alimentação/

quantidade/freqüência sanidade (remédios, vacinas, vermífugos)

doenças mais comuns

3.15 Você tem conhecimento de casos de doenças transmitidas para as pessoas por animais, insetos, ou outros bichos?

Page 134: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

4

Modelo Agrícola x Saúde

3.16 São utilizados agrotóxicos no seu trabalho?

(1) Sim (2) Não (3) Não sabe

3.17 Você já se intoxicou ou conhece casos de intoxicação na comunidade ou

nas áreas próximas?

(1) Sim (2) Não (3) Não sabe

3.18 Quais políticas públicas a comunidade tem acesso?

( 1) habitação

( 2 ) alimentação/segurança alimentar

( 3 ) saúde

( 4) saneamento

( 5 ) crédito

( 6 ) energia,

( 7 ) telefonia,

( 8 ) rua pavimentada

( 9 ) transporte coletivo

( 10 ) educação

3.19 Quais são os principais problemas ambientais sofridos pela comunidade?

4. SEGURANÇA ALIMENTAR

4.1 Nos últimos três meses a comida acabou antes que a (o) senhora(sr)

tivesse dinheiro para comprar comida?

(1) Sim (2) Não (3) Não sabe

4.2 Com que freqüência isso ocorreu?

(1) Em quase todos os dias (2) Em alguns dias (3)Em apenas 1 ou 2 dias (4) Não sabe

4.3 O que a família comeu no dia anterior?

Refeição/hora Alimentos Quantidade

(medida caseira)

1.

2.

3.

4.

5.

Page 135: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

5

5. SAÚDE (entrevista individual com quem cuida da família):5.1 Que coisas da vida produzem doença?

5.2 Que coisas da vida produzem saúde?

5.3 Na sua família teve algum doente nestas 2 semanas? (1)sim (2)não (3) não sabe 5.3.1 Qual doença?

5.3.2 Para você qual foi a causa?

5.3.3 Precisou procurar um atendimento (tipo, qualidade e etc)? (1)sim (2)não (3) não sabe

5.4 Já houve óbito na família? (1)sim (2)não (3) não sabe Qual foi a causa?

5.5 Como está a saúde das pessoas na comunidade? Por que?

5.6 Quais são as principais doenças sentidas pela comunidade?

5.7 Quais são as causas?

5.8 Que doenças podem ser tratadas dentro da comunidade (bairro)?

5.9 Quais os remédios produzidos dentro de casa?

5.10 As condições de saúde da família antes de estar na comunidade eram iguais as de hoje? (1)sim (2)não (3) não sabe Porque?

5.11 O que falta para se ter boa saúde na comunidade?

5.12 Você ou alguém de sua família já sofreu algum acidente ou doença do trabalho? (1)sim (2)não (3) não sabe Foi a óbito? Explique

5.13 Você participa de alguma entidade/organização comunitária? (1)sim (2)não (3) não sabe Qual?

5.14 O SUS atende as necessidades de saúde de sua família ou comunidade? (1)sim (2)não (3) não sabe

5.15 O que pode ser feito para mudar esta situação?

5.16 Qual o seu maior desejo na vida?

Page 136: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

135

Page 137: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

136

Anexo C

Roteiro de observação estruturada das áreas

1. Parcelamento

2. Vegetação

3. Topografia

4. Organização da produção agropecuária

5. Condições de vida

Moradia (qualidade da habitação)

Infra estrutura (estradas, energia elétrica e etc)

Saneamento

Educação

Trabalho (formas, atividade, duração, divisão, intensidade)

Alimentação (freqüência, tipo, quantidade)

6. Organização interna política

Guia estruturada para informantes chaves e coletivos locais de saúde

1. Histórico do assentamento/acampamento e da luta pela terra na região

2. Histórico das conquistas internas (água, escola, etc)

3. Organização interna

4. Participação do assentamento em atividades do MST

5. Relação com os serviços de saúde

6. Relação entre produção agrícola/animal e saúde

Registros fotográficos/:

Casas:

- Interior

- Exterior

- Fossas

Page 138: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

137

- Destino dejetos

- Imediações

- Hortas

- Chiqueiros

- Galinheiros

- Localização no lote

Lotes:

- Áreas de cultivos

- Animais

- Vegetação

- Características ambientais

Equipamentos comunitários:

- Edificações

- Entorno

- Localização no assentamento

Formas de transporte:

- Na parcela

- Dentro e fora do assentamento

- Escolar

Infra-estrutura:

- Estradas

- energia

Características ambientais:

- vegetação

- Animais

- hidrografia

Page 139: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

138

- topografia

Água:

- Fontes

- transporte

- Tratamento água de beber

- Águas servidas

Comunidade:

- Festas, eventos e reuniões.

- Crianças

- Adolescentes

- Mulheres e homens

Caracterização do trabalho

Acompanhar um dia de trabalho no assentamento, acampamento e com um grupo de bóias-frias avaliando as condições de trabalho por meio de uma observação estruturada quecontemple:

Alimentação

Riscos no trabalho

Transporte

Moradia

Page 140: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

Anexo DParecer do Comitê de Ética e Pesquisa da UFMG

Page 141: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

140

Anexo E

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Estamos desenvolvendo trabalhos de pesquisa com o objetivo de trazer novas informações erecomendações para as políticas públicas que venham a contribuir na melhoria de vida dostrabalhadores rurais. Os estudos desenvolvidos são voltados para conhecermos melhor osriscos e às condições de vida a que estão submetidos os trabalhadores, e a relação comdoenças e saúde.

Os resultados serão organizados e devolvidos para as famílias na forma de reuniões a seremplanejadas posteriormente.

Estes trabalhos fazem parte do estudo de campo do aluno Fernando Ferreira Carneiro(matrícula 2003203340.99.041-8) do Doutorado em Ciência Animal da UFMG – área deconcentração Medicina Veterinária Preventiva e Epidemiologia, da Universidade Federal deMinas Gerais.

Se sua família está de acordo em participar e contribuir com o desenvolvimento da pesquisa,respondendo aos questionários, por favor, assine ou marque com sua digital no espaço abaixo.

Nome completo:_______________________________________________________

Assinatura:___________________________________________________________

Local e Data:__________________________________________________________

Contato com o pesquisador

Fernando Ferreira Carneiro : (61) 811 59477 61 (343-3765) residencial

Endereço: QRSW 05 Bloco B8 Apt 304 – Setor Sudoeste – Brasília/DF

Correio eletrônico: fernandocarneiro.brasí[email protected]

Qualquer reclamação ou questionamento em relação a esta pesquisa também poderá ser feitojunto ao Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG – fone 31 3499-4592

fax 31 3499 4027 email: [email protected]

Endereço: Avenida Presidente Carlos Luz, 6627, Prédio da Reitoria – 7o andar sala 7018

Cep 31270-901 BH/MG.

Page 142: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

141

Anexo F

Equipe da Pesquisa

Equipe da Pesquisa de Campo

André Campos Búrigo

Estudante de Medicina Veterinária do último período da UFPel

Fernando Ferreira Carneiro (Coordenador da Pesquisa)

Biólogo, Estudante de Doutorado da UFMG, Especialista em Regulação e Vigilância Sanitáriada ANVISA

Jaqueline Fernandes

Pedagoga, estagiária técnica do Decanato de Extensão da UnB

Mateus Carvalho Silva Araújo

Estudante de Medicina Veterinária do último período da UFMG

Valéria Andrade Bertolini

Arquiteta, Mestre em Arquitetura e Planejamento Urbano pela UnB

Waltency Roque de Sá

Biólogo, membro do Centro Mineiro de Estudos Epidemiológicos e Ambientais

Digitação dos dados

Patrícia Andrade Bertolini

Acadêmica de Medicina - UFPr

Page 143: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

142

Page 144: A Saúde no Campo: das políticas oficiais à experiência do ...bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/TeseFernando03_5_071.pdf · da. II. Tambellini, Anamaria Testa. III. Universidade

143

ANEXO G

Localização do município de Unaí

(Base cartográfica – IBGE)