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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” MONOGRAFIA “A Responsabilidade Civil do Consumidor” Aluno: ROBERTO BEZERRA DE MELLO LINS

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Page 1: “A Responsabilidade Civil do Consumidor” · consumidor e o entendimento da doutrina a respeito do tema que é o escopo ... Apostila de Direito das Obrigações - UFSC. Cap. 8,

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

MONOGRAFIA

“A Responsabilidade Civil do Consumidor”

Aluno: ROBERTO BEZERRA DE MELLO LINS

Page 2: “A Responsabilidade Civil do Consumidor” · consumidor e o entendimento da doutrina a respeito do tema que é o escopo ... Apostila de Direito das Obrigações - UFSC. Cap. 8,

AGRADECIMENTOS

Desejo registrar meus agradecimentos a todos os professores do Instituto “A Vez do Mestre”pela contribuição proporcionada ao meu aprimoramento cultural.

Roberto Bezerra de Mello Lins

Page 3: “A Responsabilidade Civil do Consumidor” · consumidor e o entendimento da doutrina a respeito do tema que é o escopo ... Apostila de Direito das Obrigações - UFSC. Cap. 8,

DEDICATÓRIA

A todos que me contemplaram com seu apoio e incentivo para prosseguir na busca de novos conhecimentos.

Roberto Bezerra de Mello Lins

Page 4: “A Responsabilidade Civil do Consumidor” · consumidor e o entendimento da doutrina a respeito do tema que é o escopo ... Apostila de Direito das Obrigações - UFSC. Cap. 8,

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 2

CAPÍTULO I 4

1. O INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL ............................................ 4

1.1. Noções Gerais 5

1.2. O Consumidor 8

1.3. O Fornecedor 13

1.4. Conceito de Serviço 16

1.5. Princípios Fundamentais do Direito do Consumidor ............................... 17

1.6. Princípio da vulnerabilidade do consumidor ........................................... 18

1.7. Princípio do dever governamental 19

1.8. Princípio da garantia de adequação 19

1.9. Princípio da boa-fé nas relações de consumo ........................................ 20

1.10. Princípio da informação 20

1.11. Princípio do acesso à justiça 20

1.12. Direitos e Deveres de Conduta do Consumidor ................................... 21

1.13.1. Direito à saúde e à segurança 21

1.13.2. Direito à informação 22

1.13.3. Direito à proteção contra práticas desleais e abusivas ................... 22

1.13.4. Direito à proteção contratual 23

1.13.5. Direito à concreta reparação dos danos e facilitação da defesa judicial 23

1.4. Deveres de Conduta dos Consumidores 24

CAPÍTULO II 26

2. A RESPONSABILIDADE CIVIL NO CDC 26

2.1. Evolução histórica 30

2.2. A Responsabilidade Civil Objetiva nas Relações de Consumo .............. 31

2.3. Prescrição 33

2.4. Responsabilidade do comerciante pelo fato do produto e do serviço (art. 13 do CDC). 33

2.5. Quando o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados (art. 13, I) 34

2.6. Quando o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador (art. 13, II)34

CAPÍTULO III 35

3. CAUSAS DE EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE. ................................ 35

CONCLUSÃO 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 38

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INTRODUÇÃO

O instituto da responsabilidade civil é quase tão antigo quanto a história

da humanidade, porquanto sempre houve ações ou omissões por parte dos

seres humanos, que de alguma forma vieram a ocasionar dano a outrem,

surgindo, por conseguinte, a subsequente necessidade de ressarcimento.

No início, donde se tem as primeiras notícias do instituto, vigorava a

vingança generalizada, onde não se buscava a restauração do status quo, mas

tão somente impingir ao ofensor dano de igual magnitude ao que foi causado.

Depois, com a evolução das relações sociais, tornou-se mais interessante a

reparação do dano de forma subsidiária (em pecúnia), quando então o Estado

avocou para si referida tarefa, o que se percebe denotadamente pela Lex

Aquilia, onde, inclusive, reconheceu-se a necessidade de demonstração da

culpa para que se pudesse exsurgir o direito à indenização.

Todavia, pode-se dizer que foi no direito francês que o instituto

experimentou evolução maior, pois o Código de Napoleão, veio a regulamentar

a ideia da culpa como parte necessária da responsabilidade de indenizar os

prejuízos causados.

Pode-se afirmar, sem margem a questionamentos, que a responsabilidade

civil no direito brasileiro sempre pautou-se na necessidade de demonstração

de três requisitos principais: o ato ilícito, o dano e o nexo causal, ou seja, a

culpa como pressuposto para que haja a obrigação de reparar o prejuízo

experimentado.

Com efeito, a responsabilidade civil surgiria a partir do momento em que o

indivíduo deixa de cumprir determinada obrigação, ou ainda, que sua atitude

venha a ocasionar dano a outrem, surgindo daí o entendimento de que se

trataria de um dever jurídico sucessivo vindo somente a existir após a violação

de um dever jurídico originário (contratual ou extracontratual).

Portanto, a responsabilidade civil deve ser encarada como fato humano, ou

seja, a necessidade de se proporcionar a devida reparação em virtude de ato

causador de dano. Cumpre transcrever, por oportuno, o escólio de CÁIO

MÁRIO DA SILVA PEREIRA (2002):

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“Como sentimento humano, além de social, à mesma ordem jurídica repugna que o agente reste incólume em face do prejuízo individual”. O lesado não se contenta com a punição social do ofensor. Nasce daí a ideia de reparação, com estrutura de princípios de favorecimento à vítima e de instrumentos montados para ressarcir o mal sofrido. Na responsabilidade civil está presente uma finalidade punitiva ao infrator aliada a uma necessidade que eu designo de pedagógica, a que não é estranha a ideia de garantia para a vítima, e de solidariedade que a sociedade humana deve-lhe prestar”.

Todavia, como sói ocorrer em diversos casos, a demonstração de culpa

não é de simples constatação, vale dizer, em muitos casos, fazer tal exigência

à vítima seria o equivalente a negar o direito à reparação.

Neste panorama, foi necessária a construção, doutrinária e jurisprudencial,

também com origens no direito francês (Saleilles e Josserand), de novas

formas de atender aos anseios de justiça que inspiram o instituto da

responsabilidade civil, de modo a ampliar as possibilidades de indenização,

fornecendo uma entrega de tutela jurisdicional de forma mais eficaz,

proporcionando, assim, a pacificação social visando oferecer um

esclarecimento oportuno e possibilitar discutir a tese proposta da existência da

responsabilidade civil e a consequente obrigação de reparação de danos.

Apresentamos também as causas de exclusão de responsabilidade previstas

em lei, apesar da responsabilidade objetiva, o papel dos órgãos de defesa do

consumidor e o entendimento da doutrina a respeito do tema que é o escopo

principal do processo civil moderno.

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CAPÍTULO I

1. O INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil traduz-se sempre na obrigação de reparar-se um

dano. Ela tem por finalidade tutelar o interesse de cada pessoa na preservação

da sua esfera jurídica, não possui natureza punitiva, não é castigo: consiste

apenas na obrigação de reparar-se um dano causado a alguém.

Segundo Fernando NORONHA, para que a responsabilidade civil seja

verificada, torna-se necessária a presença de determinados pressupostos. São

eles: “a) antijuridicidade do ato praticado ou do fato acontecido; b)

imputabilidade do ato ou fato a alguém; c) que dele tenham resultado danos; d)

que tais danos possam ser juridicamente considerados como causados pelo

ato ou fato praticado; e) que o dano esteja contido no âmbito da função de

proteção assinada à norma violada (teoria do escopo da norma violada)”.1

A responsabilidade civil divide-se em responsabilidade contratual e

extracontratual.

Define-se como sendo responsabilidade contratual, ou negocial, aquela

obrigação de reparar os danos resultantes do inadimplemento de contratos e

outros negócios jurídicos.

Já a responsabilidade extracontratual é aquela que é imputada pela

prática de um dano causado de forma antijurídica. Dentre os danos causados

de forma antijurídica, são abrangidos os danos resultantes de atos ilícitos

(aqueles geradores de responsabilidade subjetiva), e os danos resultantes de

atos não culposos, mas ainda assim reprovados pelo ordenamento jurídico, e

1 NORONHA, Fernando. Apostila de Direito das Obrigações - UFSC. Cap. 8, p. 01.

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equiparados, para efeitos de responsabilidade, aos atos ilícitos (gerando a

responsabilidade objetiva).

A responsabilidade extracontratual é classificada como responsabilidade

civil em sentido estrito, e caracteriza-se por ser a obrigação de reparar danos

resultantes da violação de deveres gerais, como os de não lesar direitos

alheios, sejam eles absolutos, sejam até relativos.

Portanto, a responsabilidade civil extracontratual divide-se em subjetiva

e objetiva. Enquanto a responsabilidade civil subjetiva, culposa, por atos

ilícitos, ou ainda aquiliana, é a obrigação de reparar danos resultantes da

violação intencional ou meramente culposa de direitos alheios, já a

responsabilidade civil objetiva, ou pelo risco, é a obrigação de reparar

determinados danos, acontecidos durante atividades realizadas no interesse ou

sob o controle da pessoa responsável, independentemente de esta ter ou não

agido com culpa.

Interessa para este trabalho de pesquisa o conceito de responsabilidade

civil objetiva extracontratual.

Na responsabilidade objetiva, a imputação do ato ou fato lesivo ao

responsável tem por base um risco que ele próprio criou, ou que, pelo menos,

acontece dentro da sua esfera de ação.

Ocorrendo responsabilidade objetiva, o responsável poderá se exonerar

quando provar que o dano se deveu a atuação do próprio lesado, ou de

terceiro, ou que foi causado por caso fortuito ou força maior.

1.1. Noções Gerais

A responsabilidade objetiva origina-se, na opinião de José Reinaldo de

Lima LOPES, da teoria da responsabilidade pelo fato da coisa, formulada no

final do século XIX na França. Esta fórmula já foi acolhida antes do Código de

Defesa do Consumidor, em nosso Código Civil nos artigos 1.528 e 1.529, em

que se estabeleceram as regras de vigilância para o dono das coisas

potencialmente danosas. Apesar do Código Civil definir a responsabilidade

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proveniente desses artigos como sendo subjetiva, a jurisprudência inverteu-a

para objetiva. Este fato justificou-se pela obrigação derivada do dever de

vigilância aplicado com especial cuidado em certas atividades, sempre mais

alargado modernamente.

Alguns outros casos evidenciadores da responsabilidade civil objetiva

pelo fato da coisa que antecederam o da Lei 8.078/90 no Brasil, foram:

- a responsabilidade para os meios de transporte, mais especificamente,

das ferrovias (Decreto n° 2.681 de 1912) e transportadoras aéreas (Decreto-lei

n° 32 de 1966 - Código Brasileiro do Ar, hoje substituído pelo Código

Aeronáutico);

- a responsabilidade das empresas de energia nuclear (Lei n° 6.493 de

1977).

Torna-se importante salientar que há casos de responsabilidade objetiva,

como o das transportadoras aéreas dentre os exemplos citados acima, em que

a admissão de tal responsabilidade possue certas limitações, visto que são

numerosas as controvérsias que circundam o denominado instituto.

2 - A Responsabilidade Civil Objetiva no Código de Defesa do

Consumidor

Já foi visto na parte introdutória deste trabalho, embora de forma

bastante sucinta, que o desequilíbrio estrutural nas relações de consumo entre

o fabricante e consumidor, pela disparidade de forças com que se apresentam

no mercado, e o fato de que os produtos defeituosos não são elementos

recolhidos da natureza, mas criados pela fabricação humana, justificam a

adoção de um sistema que busque de forma mais eficaz, responsabilizar

alguém pelos danos ocorridos.

O Código de Defesa do Consumidor, como dito, introduziu a

responsabilidade objetiva do fornecedor ao estabelecer, no artigo 12, a

responsabilidade civil “independentemente da existência de culpa”. Com isso, o

legislador pretendeu que a vítima de um dano provocado por um produto

colocado em circulação, para ser indenizada, não fosse obrigada a demonstrar

que o fabricante, produtor, construtor ou importador, agiu com culpa.

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O fornecedor passou assim a ser responsabilizado pelo “fato do produto”

que ele tenha fabricado, produzido, construído ou importado.

Sendo que a expressão “fato do produto” significa o dano provocado

(fato) por um produto. “Em outras palavras, (...) fato do produto é a

manifestação danosa dos defeitos juridicamente relevantes, que podem ser de

criação, produção ou informação (defeito), atingindo (nexo causal) a

incolumidade patrimonial, física ou psíquica do consumidor (dano), ensejando a

responsabilização delitual, extracontratual, do fornecedor, independentemente

da apuração da culpa (responsabilidade objetiva)”.

Rosco e POUND, jurista americano, citado por José Reinaldo de Lima

LOPES, ao justificar a questão da responsabilidade civil do fornecedor

consagrada no já citado artigo 12, coloca que o bem que deseja-se proteger

está acima da intenção de quem o viola, pois tem-se de escolher entre a

segurança geral, que exige responsabilidade absoluta, e a vida individual, que

exige responsabilidade somente na ocorrência de culpa.

Também o fornecedor de serviços que cometer acidente de consumo,

responderá pelo dano provocado, pois trata-se este de elemento gerador da

Responsabilidade Civil e que, por sua vez, tem origem em um defeito ou vício

no serviço.

Assim, em relação ao “fato do serviço” e a responsabilidade que daí

emana, pode-se desde já, apoiada nos ensinamentos de Tereza Ancona

LOPEZ, afirmar-se “que o sistema do consumidor é um só e que as normas

jurídicas se intercambiam de acordo com a necessidade do intérprete. Dessa

forma, não existe uma divisão rígida entre o fato do produto e do serviço, sendo

que as normas específicas existem mais por necessidade didática do que por

necessidade de exclusão”.

É importante frisar que a responsabilidade imposta no Código de Defesa

do Consumidor, embora dispense a prova da culpa do fornecedor, e, portanto,

caracterize-se como objetiva, não trata-se de responsabilidade por risco da

empresa, nem é como esta absoluta, pois admite prova liberatória.

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1.2. O Consumidor

O artigo 2º da Lei nº 8.078/90 define como consumidor “toda pessoa

física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário

final”.

Pelo referido artigo, mister se faz a presença de duas condições:

primeiro, a aquisição ou a utilização de um bem ou serviço; segundo, a

cessação de toda a atividade de produção, transformação ou distribuição do

bem, já que o bem adquirido ou utilizado deve ser destinado ao uso privado.

A segunda condição, a do uso particular, que é a mais importante, pois

ela restringe a finalidade dos bens ou serviços adquiridos e exclui do conceito

de consumidor o industrial, o comerciante, o intermediário ou atravessador.

Em relação ao conceito de consumidor retirado do artigo 2º, ensina

James MARINS que mesmo a doutrina pátria divide-se entre os estudiosos que

entendem que o legislador não limitou o conceito senão pela destinação da

fruição que deve ser final, e aqueles que entendem que o conceito teria

limitações implícitas. Esta segunda corrente, inspirada em doutrinadores da

Europa Ocidental, atribui conteúdo subjetivo ao conceito, subjetividade esta

não acolhida pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o legislador

brasileiro ao elaborá-lo preferiu, porém, uma definição mais objetiva de

consumidor. Logo a única característica restritiva seria a aquisição ou utilização

do bem como destinatário final. Então, de acordo com a opinião de James

MARINS, para o artigo 2º, o importante é a retirada do bem de mercado (ato

objetivo) sem se importar com o sujeito que adquire o bem, profissional ou não

(elemento subjetivo).2

O mesmo autor acima citado não concorda com a equiparação que se

quer fazer de uso final com uso privado pois que tal equiparação não está

autorizada na lei e não cabe ao intérprete restringir aonde a norma não o faz, e,

ademais, é inegável que nem todo uso final é privado.

O consumidor pode ser pessoa física ou jurídica. A dúvida surge em

relação a entes despersonalizados, como o condomínio horizontal, e se a

2 MARINS, op. cit., p. 65.

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proteção concedida ao adquirente alcança ao grupo de condôminos. A resposta

é afirmativa e é dada pelo verbo utilizar mencionado no referido diploma legal,

que, por si, dispensa a necessidade de vínculo contratual entre as partes.

Ugo CARNEVALLI, citado por Sílvio Luís Ferreira da ROCHA,

comentando o assunto, esclarece que as pessoas legitimadas a agirem para

obter o ressarcimento dos danos são obviamente o adquirente final do produto

defeituoso, ou, “aqueles que, usando a qualquer título o produto defeituoso,

sofreram danos”.3

Há cogitações no sentido de que o termo “utiliza” constante do artigo 2º

se refere somente a serviços e o termo “adquire” somente se refere a produtos.

Isto significaria que apenas é “consumidor” de produtos quem os adquire, não

os usuários, que aparecem ulteriormente à aquisição.

Esta interpretação acima não condiz com a dicção da norma nem com o

sistema do Código de Defesa do Consumidor, por diversas razões básicas

expostas pelo autor James MARINS:4

1º) O usuário ou “utente” é o destinatário final do produto, não apenas o

seu “adquirente”.

2º) O “consumo” propriamente dito, se perfaz não apenas com a

aquisição dos produtos mas também, e até principalmente, com sua fruição.

3º) O Código de Defesa do Consumidor, em diversos dispositivos

referentes ao vício do produto se refere a “consumo”, e visa a assegurar que os

produtos possam ser “utilizados” que é atividade própria do usuário, adquirente

ou não.

4º) O artigo 2º não autoriza a distinção que se pretende ao dizer é

consumidor quem “adquire ou utiliza produto ou serviço”, se quisesse distinguir

as situações teria que prescrever que é consumidor quem “adquire o produto e

utiliza o serviço”.

5º) Se se entender que os “usuários” não estão protegidos pelas

disposições referentes ao vício do produto, ter-se-iam situações comuns de

consumo excluídas da abrangência protetiva do Código, o que não se coaduna

3 ROCHA, op. cit., p. 67. 4 MARINS, op. cit., p. 68-69.

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com o sistema de proteção ao consumidor (assim um cidadão que adquira,

p.ex., um “forno de microondas” com o objetivo de emprestá-lo a um amigo

familiar, é considerado “consumidor”, ao passo que os novos utentes, ao se

“utilizarem” do produto e constatarem um vício de qualidade terão que se

socorrer do direito comum, pois não seriam consumidores, porque não

abrangidos pelos conceitos do Código).

6º) Sob o prisma processual, para a hipótese do exemplo, há, em

verdade, legitimação ordinária concorrente, pois tanto podem solicitar a tutela

jurisdicional do Estado o primitivo adquirente, na qualidade de proprietário do

bem defeituoso, como aquele que recebeu o bem em empréstimo, na

qualidade de usuário do bem. Esta dúplice legitimação é inequívoca

decorrência do conceito de consumidor do artigo 2º da Lei 8.078/90.

Ainda sobre o mesmo assunto, a própria prática da responsabilidade do

fabricante, nos Estados Unidos, vem firmando a expressão “consumidor” ou

“usuário final”.

O consumidor é o trabalhador fora da fábrica. Não dispõe de poder

sobre a produção. Não pode decidir a respeito do processo produtivo. Podem-

se encontrar, individualmente, aqueles que são consumidores numa

oportunidade, exercendo em outras oportunidades um papel de fornecedores.

Resta salientar que aqueles que estão na relação de consumo, no papel de

consumidores, definem-se por uma disparidade que possuem no poder de

barganha.

Consumir é o contrário de investir e produzir. Daí a expressão da lei

8.078/90: destinatário final. O que o consumidor adquire é para seu consumo,

estes produtos não são bens de capital.

É fato que aquele que entra diretamente numa relação jurídica para

obter um bem ou produto pode não ser necessariamente o usuário final. Há os

que adquirem alguma coisa para fazer um presente. A posse ou o uso é que

definem propriamente o consumidor. Nesse caso fica evidente que a relação de

consumo independe da participação em contratos. Por isso a disciplina da

responsabilidade do fabricante é uma disciplina extracontratual.

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Como comenta José Reinaldo de Lima LOPES, pode até parecer

excessiva a extensão das vítimas participantes das relações de consumo,

prescrita na lei brasileira. Mas o fabricante ou fornecedor que se volta para o

mercado assume de fato uma obrigação perante qualquer um: o mercado é,

por definição, anônimo. O fornecimento no mercado é despersonalizado. Além

desta anonimidade característica - pela qual o fornecedor não sabe quem é ou

quem será o destinatário final de seu produto ou serviço - compreende-se que

é o produto mesmo que, sendo defeituoso, causa dano. A periculosidade não

está nas pessoas, mas nas coisas. O usuário seja ou não adquirente jurídico

da coisa, é que sofre o dano. Costuma-se dizer que a garantia de bom

funcionamento adere-se à coisa, segue-a aonde quer que ela se encontre. Em

outras palavras, o fabricante garante a coisa erga omnes.5

A ação de reparação de dano cabe, pois, não apenas ao adquirente mas

também ao usuário dos produtos. Isto não significa multiplicação de

responsabilidade, mas apenas sua determinação. A ação não é cumulativa mas

é dada ao lesado. Diante de qualquer usuário o fabricante disporá das defesas

normais, ou seja, poderá tentar eximir-se da responsabilidade se provar que a

culpa foi exclusiva da vítima, que o defeito inexistia, ou que não colocou o

produto no mercado (cf. artigo 12, § 3º, I, II e III da Lei nº 8.078/90).

As causas de exclusão da responsabilidade serão analisadas em um

capítulo próprio deste trabalho.

Concluindo então, o consumidor, pelo artigo 2º, é o usuário final, não

apenas o adquirente. A responsabilidade do fornecedor é, pois, nitidamente

aquiliana e não contratual. O lesado está dispensado, portanto, de fazer uma

cadeia de regresso entre todos os que fizeram o produto chegar até seu

destino final.

Na responsabilidade pelo fato do produto, no artigo 17 do Código de

Defesa do Consumidor, encontra-se o segundo conceito de consumidor. No

citado artigo o conceito é alargado para acolher todas a vítimas do evento.

Justifica-se tal alargamento pelo fato de nas relações de consumo existirem

intermediários dos produtos, como por exemplo os revendedores e

5 LOPES, op. cit., p. 81.

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comerciantes, que também devem se ver possibilitados de invocarem em seu

favor os dispositivos que tratam da responsabilidade pelo fato do produto ou do

serviço, uma vez que eles também estão sujeitos a sofrerem danos

decorrentes do fato do produto.

Não admitir tal hipótese, seria discriminar o intermediário, uma vez que

ao mesmo não seria permitido socorrer-se do artigo 12, já que este

responsabiliza algumas espécies de fornecedores, independentemente de

culpa, “pela reparação dos danos causados aos consumidores”.

Determinado alargamento do conceito justifica-se também pela

gravidade dos acidentes de consumo, que acarretam riscos à saúde e à

integridade física de consumidores e terceiros.

Estes terceiros são vítimas que não participam das relações de

consumo, denominados pela doutrina e jurisprudência americanas de

bystanders, mas que gozam de uma tutela objetiva pelo fato de terem se

envolvido em um acidente de consumo. Um exemplo seria o caso de um

pedestre que se envolve num acidente com um veículo que apresentou

defeitos de fabricação nos freios. O fabricante terá que indenizar tanto o

condutor como o pedestre.

“Assim, diante do disposto no artigo 17 do Código de Defesa do

Consumidor, na responsabilidade pelo fato do produto todas as vítimas do

evento, consumidores, comerciantes, intermediários ou terceiros (bystanders)

poderão acionar o fornecedor pelos prejuízos causados pelo produto

defeituoso”.6

Evidencia James MARINS que o alargamento do conceito de

consumidor não ocorre na responsabilidade por vício do produto. Nesta,

aplicável o conceito previsto no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor,

de modo que o comerciante e intermediário não poderão utilizar-se dos meios

previstos no citado diploma legal contra o fabricante ou produtor, quando se

6 ROCHA, op. cit., p. 68.

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tratar de vícios de qualidade ou quantidade, devendo, para tanto, recorrerem à

disciplina prevista no Código Civil e Código Comercial.7

Extensão conceitual de mesma natureza vem colocada no artigo 29 da

Lei 8.078/90, que equipara a consumidores todas as pessoas expostas às

práticas comerciais e à publicidade. Esta exceção está relacionada com oferta,

informação, publicidade enganosa ou abusiva, práticas comerciais e

contratuais abusivas, cobrança de dívidas e contratos de adesão, ou seja,

valores que, à vista do sistema protetivo deste Código, merecem tratamento

mais cuidadoso, no sentido de aumentar o âmbito da proteção legislativa, em

virtude de sua maior valoração e relevância em termos sociais.

1.3. O Fornecedor

O Código de Defesa do Consumidor, artigo 3º, definiu a figura do

fornecedor: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada,

nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que

desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção,

transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de

produtos ou prestação de serviços”. Tal conceito é bastante amplo e significa,

de modo mais conciso, que fornecedor é todo ente que provisione o mercado

de consumo, de produtos ou serviços.

Fornecedor então, de acordo com o artigo 3º, é a denominação genérica

e abrange, entre outros, o conceito de fabricante e produtor.

Já os textos europeus, segundo João Calvão da SILVA citado por Sílvio

Luís Ferreira da ROCHA, definem como principal responsável o produtor, isto

é, “o fabricante do produto acabado, de uma parte componente ou de matéria-

prima, e ainda quem se apresente como tal pela aposição no produto do seu

nome, marca ou outro sinal distintivo ou aquele que no exercício da sua

atividade comercial, importe produtos para venda, aluguel, locação financeira

ou outra qualquer forma de distribuição ou, ainda, qualquer fornecedor de

7 MARINS, James. Código do Consumidor Comentado. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1991, p. 16 e 50.

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produto cujo produtor comunitário ou importador não esteja identificado”.8

Observa-se que para os europeus, a denominação produtor tem o sentido

genérico.

Tanto na definição da Lei 8.078/90, quanto na definição européia, podem

ser detectadas três figuras: a) o fornecedor ou produtor real; b) o fornecedor ou

produtor aparente; c) o fornecedor ou produtor presumido.

O fornecedor ou produtor real é o realizador do produto, a pessoa física

ou jurídica que sob a sua responsabilidade participa do processo de fabricação

ou produção do produto, de uma parte componente ou de matéria-prima. Na

terminologia empregada no artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor

seriam o “fabricante, o produtor e o construtor, nacional ou estrangeiro”.

O fornecedor ou produtor aparente é aquele que, embora não tenha

participado do processo de fabricação ou produção do produto, se apresenta

como tal pela aposição no produto do seu nome, marca ou outro sinal distintivo.

O Código de Defesa do Consumidor é omisso em relação ao fornecedor

ou produtor aparente, pelo menos na responsabilidade pelo fato do produto,

porque o artigo 12 não faz menção àqueles que se apresentam como produtor

ou fabricante pela aposição no produto do seu nome marca ou outro sinal

distintivo.

Já o fornecedor ou produtor presumido é aquele que importou os

produtos, ou, ainda, vende produtos sem identificação clara do seu fabricante,

produtor, importador ou construtor (artigo 13, Lei 8.078/90).

Justifica-se a concentração da responsabilidade no fornecedor ou

produtor, pelo fato de ser ele, efetivamente, na medida em que se trate de

defeitos de fabricação, de concepção ou de informação, em última análise, a

fonte real do dano.

Partindo da definição genérica de fornecedor, tem-se que fabricante é

aquela pessoa física ou jurídica que coloca no mercado produtos

industrializados, manipulados ou processados, acabados ou semi-acabados.

8 ROCHA, op. cit., p. 71.

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15

Há, portanto, o fabricante final do produto, conhecido por assembler, isto

é, aquele que detém o controle do processo produtivo integrado e o fabricante

de fase, que produz matéria-prima, componentes e peças para serem

incorporados noutros produtos.

Uma das dificuldades que se poderia levantar em termos de

responsabilidade do fabricante, de acordo com o autor José Reinaldo de Lima

LOPES, está no grau de complexidade do processo produtivo moderno. Muitos

são os produtos apresentados no mercado em cuja produção comparecem

várias empresas, vários fabricantes.9

Dada a essa característica, a solução melhor é se dizer que no caso de

produtos compostos, a responsabilidade civil será do fabricante final ou

assembler, em razão dele controlar o processo produtivo integrado, não

podendo eximir-se da obrigação de indenizar provando que o defeito era do

produto incorporado ao produto final. Após indenizar, o fabricante final terá, de

acordo com as regras do direito comum, o direito de regresso contra seu

fornecedor.

“O fabricante final aparece, portanto, perante o consumidor e é o

responsável e réu na ação iniciada pelo usuário lesado em seu patrimônio,

pessoa ou com a perda da coisa. A razoabilidade desta solução está no fato de

que o consumidor não adquire ou não se utiliza de um componente, mas de

todo o produto, tomado unitariamente”.10

O elaborador do produto final deve ser identificável. Caso não seja

possível ao consumidor identificar o fabricante final, então a responsabilidade,

de acordo com a Lei 8.078/90, recai sobre o comerciante (artigo 13, I e II).

9 “Os veículos automotores são tipicamente fruto de um modo de produzir em que à indústria de automóveis (as unidades montadoras) em geral cumprem apenas duas fases do processo: o projeto do veículo e a montagem (assembly) das partes fabricadas alhures. É o caso também das confecções em que a manufatura muitas vezes faz apenas usar materiais alheios. O defeito apresentado por um componente, não fabricado pelo montador, reflete-se no conjunto. Assim, a despeito do cuidado que o fabricante montador demonstra na sua linha de montagem, o produto final pode vir a apresentar o defeito. Esta questão situa-se na perspectiva da responsabilidade do fabricante colocando o problema: quem deve ser responsabilizado? O montador, que leva o produto até o consumidor como uma unidade pronta para o consumo? Ou o fabricante da peça ou componente em particular defeituoso? Olhando-se do ponto de vista do consumidor, é claro que o fabricante, aquele que põe o produto em circulação, aquele que apõe à unidade, afinal consumida como um todo único, a sua marca, é o responsável”. (LOPES, op.cit., p.88). 10 LOPES, op. cit., p. 89.

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16

De acordo com Sílvio Luís Ferreira da ROCHA, primeiramente a

responsabilidade civil será do fabricante final (assembler), pelas mesmas

razões já acima expostas. Mas, segundo ele, o fabricante parcial ou de fase

será responsável solidário pelos danos produzidos, nos termos do artigo 25, §

2º, que dispõe o seguinte: “Sendo o dano causado por componente ou peça

incorporada ao produto ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante,

construtor ou importador e o que realizou a incorporação”.11

Assim, para a vítima abre-se a possibilidade de acionar o fabricante final

ou o fabricante de fase. O fabricante de fase não poderá exonerar-se da

responsabilidade demonstrando que o defeito da peça ou matéria-prima

fabricada por ele é devido à concepção do produto em que foi incorporado ou

às instruções dadas pelo fabricante final. Deverá, de acordo com o mesmo

autor acima citado, indenizar a vítima e, posteriormente, exercer o direito de

regresso contra o fabricante final (artigo 13, parágrafo único do Código de

Defesa do Consumidor).

1.4. Conceito de Serviço

A definição de serviço designa toda prestação que pode ser fornecida a

título oneroso, não sendo, entretanto, um bem corpóreo.

O § 2º do art. 3º dispõe que: Serviço é qualquer atividade

fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração,

inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e

securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter

trabalhista.”

A expressão “mediante remuneração” deve ser entendida não somente

como a remuneração efetuada diretamente pelo consumidor ao fornecedor.

Abrange também a remuneração o benefício comercial indireto advindo de

11 ROCHA, op. cit., p. 76.

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17

prestações de serviços supostamente gratuitos, a título de demonstração ou

promoção, bem como a remuneração embutida em outros custos.12

Para se caracterizar serviço basta que a atividade seja remunerada,

mesmo que esporádica e não habitual. A atividade denominada serviço público

está perfeitamente enquadrada no conceito geral de serviço, posto que é

atividade remunerada oferecida no mercado de consumo.

1.5. Princípios Fundamentais do Direito do Consumidor

A Constituição Federal de 1988 demonstrou a grande preocupação do

legislador constituinte com o consumidor, resgatando um atraso considerável

em nossa legislação, ao contrário de outros países em que a força do

consumidor é visivelmente maior, apoiado por entidades públicas e privadas,

vivamente interessadas em sua proteção efetiva e permanente.

A defesa do consumidor nos é mostrada no texto constitucional entre os

direitos e deveres individuais e coletivos, com a enunciação de que “o Estado

promoverá na forma da lei, a defesa do consumidor” (art. 5º, XXXII). No art. 24,

VIII estabeleceu a competência da União, Estados e Distrito Federal para

legislarem, concorrentemente, sobre a responsabilidade por dano ao

consumidor. Outras disposições acerca do consumidor encontram-se nos

artigos 150, § 5º e 170, VI (princípio geral da atividade econômica), ao lado dos

princípios da soberania, da propriedade privada, da livre concorrência e outros.

Finalmente, previu-se nas Disposições Constitucionais Transitórias (art.

48) a elaboração do Código de Defesa do Consumidor, no prazo de 120 dias,

tendo sido promulgado em setembro de 1990.

Na visão de Maria Helena Diniz:

12 Sílvio Luiz Ferreira da Rocha, ob. cit. p. 73.

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O CDC é o mais moderno do mundo, por conter normas de ordem pública, pretendendo equilibrar as relações entre fornecedores de produtos e serviços e consumidores, outorgando instrumentos de defesas idôneos à satisfação de seus interesses, sancionando as práticas abusivas, impondo a responsabilização objetiva dos fornecedores. Diz ainda que sua elaboração é indubitavelmente uma conquista constitucional para proteger os interesses patrimoniais dos adquirentes de produtos e serviços, mediante a imposição de responsabilidade civil, penal e administrativa para os fornecedores, sejam fabricantes, vendedores ou prestadores de serviços.1

A Política Nacional das Relações de Consumo rege-se por uma série de

princípios e, segundo o art. 4º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor,

“tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o

respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses

econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e

harmonia das relações de consumo”.

Tais princípios constituem-se em número de seis, quais sejam:

“I - Princípio da vulnerabilidade

II – Princípio do dever governamental;

III – Princípio da garantia de adequação;

IV – Princípio da boa-fé nas relações de consumo;

V – Princípio da informação;

VI – Princípio do acesso efetivo e diferenciado e efetivos à justiça;”13

1.6. Princípio da vulnerabilidade do consumidor

A primeira justificativa para o surgimento da tutela do consumidor se dá

através do reconhecimento de sua vulnerabilidade perante a figura do

fornecedor.

De acordo com Nelson Nery Júnior, possui este princípio fundamental

importância para o nosso sistema consumerista, emanando dele todo o Código,

13 SOUZA, James J. Marins de – Responsabilidade da Empresa pelo Fato do Produto – São Paulo: Editora RT, 1993, pág. 37.

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19

posto que a vulnerabilidade é um traço universal de todos os consumidores,

ricos ou pobres, educadores ou ignorantes, crédulos ou espertos.14

Desse modo, houve a crescente necessidade de correção jurídica para

minimizar a disparidade entre os sujeitos da relação de consumo. O Código, ao

dar tratamento diferenciado aos sujeitos da relação de consumo, conferindo

maiores prerrogativas ao consumidor, nada mais fez do que aplicar e obedecer

ao princípio constitucional da isonomia, tratando desigualmente partes

desiguais.

1.7. Princípio do dever governamental

Este princípio deve ser entendido sob dois pontos de vista distintos:

a) na responsabilidade atribuída ao Estado em prover o consumidor dos

mecanismos suficientes que propiciem a sua efetiva proteção contra os abusos

do mercado de consumo, de acordo com o art. 4º, II, VI e VII, do CDC;

b) no dever do Estado de otimizar os serviços públicos, promovendo sua

racionalização e melhoria, conforme o art. 4º, VIII;

1.8. Princípio da garantia de adequação

Implica em dizer que todos os produtos e serviços devem atender

adequadamente às necessidades dos consumidores em segurança e

qualidade, respeitando sua saúde, segurança, dignidade e interesses

econômicos.

De acordo com o doutrinador James J. Marins, o cumprimento desse

princípio é o objetivo de todo o sistema de proteção do consumidor, estando a

cargo do fornecedor essa tarefa, que será oficialmente coadjuvado pelo

Estado, a quem cabe o dever de fiscalização. 15

14 Nelson Nery Junior, Código de Defesa do Consumidor: Comentado pelos Autores do Anteprojeto, Ada Pelegrini Grinover...[et al]. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993, pag. 84/5. 15 Nelson Nery Junior, ob. cit., p. 320.

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1.9. Princípio da boa-fé nas relações de consumo

Os sujeitos da relação de consumo devem objetivar a melhor e mais

eficiente circulação de mercadorias e serviços, gerando riquezas e benefícios a

todos os participantes do mercado de consumo. As relações de consumo que

possam estar sujeitas a influências malignas decorrentes da prática de

concorrência desleal, abuso de poder econômico ou violação ilícita das regras

sobre propriedade industrial ou direito sobre marcas e patentes são repudiadas

pelo princípio da boa-fé.16

1.10. Princípio da informação

Este princípio revela a preocupação do legislador com que o consumidor

seja informado e educado para exercer seus direitos, fazendo com que se torne

eficaz e completa a vigência do CDC.

A tarefa é de todos: Estado, empresas, órgãos públicos e entidades

privadas de defesa ou proteção do consumidor.

“Experiências pioneiras, do ponto de vista formal, têm sido constatadas, sobretudo nos Estados do Rio Grande do Sul e Goiás, onde as respectivas secretarias de educação já têm programas próprios de educação de alunos do ensino fundamental e médio, inseridos nas disciplinas afins (...) como também se tem feito na educação relativa ao meio ambiente e sua preservação.”17

1.11. Princípio do acesso à justiça

Mostra a necessidade de facilitar o acesso à Justiça e efetivar o

processo, criando meios de desobstruir o acesso à ele e o tratamento coletivo

de pretensões individuais, ainda como a possibilidade de inversão do ônus da

prova.

16 James J. Marins, ob. cit. p. 40. 17 José Geraldo de Brito Filomeno, in Código de Defesa do Consumidor: Comentado pelos Autores do Anteprojeto, Ada Pelegrini Grinover...[et al]. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993, p. 44-45.

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Este princípio está explícito em um grande número de dispositivos do

CDC que, na busca de dar efetividade ao processo e facilitação do acesso à

justiça, exigiu o fortalecimento do consumidor com a criação de mecanismos de

ordem processual que realmente representassem a desobstrução do acesso à

justiça e o tratamento coletivo de pretensões individuais que, isoladamente,

poucas condições teriam de adequada solução.18

Desse modo, vemos a preocupação do legislador pátrio em criar meios

de disponibilizar uma melhor proteção dos direitos do consumidor quando o

mesmo se sentir neles lesados.

1.12. Direitos e Deveres de Conduta do Consumidor

Os direitos básicos dos consumidores elencados no art. 6º do Código de

Defesa do Consumidor seguem uma orientação internacionalmente aceita, que

mantém correlação com os direitos básicos dos consumidores aprovados pela

Assembleia Geral das Nações Unidas. Nele, podemos identificar, de modo

sintético, os seguintes preceitos:

1.13. Direitos Básicos dos Consumidores

1.13.1. Direito à saúde e à segurança

É um dos direitos mais importantes que se deve assegurar aos

consumidores. Fundamentado nele, José Geraldo de Brito Filomeno considera

que não devem os mesmos ser expostos a perigos que atinjam sua

incolumidade física, os consumidores e terceiros não envolvidos em uma

relação de consumo, perigos tais representados por práticas condenáveis no

fornecimento de produtos e serviços.19

Desse modo, serviços que possam apresentar riscos, devem vir

necessariamente acompanhados de informações a respeito de tal fato, ou,

18 James J. Marins, ob. cit. p. 46 19 José Geraldo de Brito Filomeno, ob. cit. pag. 66.

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simplesmente, não serem colocados no mercado de consumo se as dimensões

de tais riscos não puderem ser previamente determinadas. Caso o serviço já

esteja disponibilizado no mercado de consumo, é dever dos prestadores retirar

do mercado aqueles que apresentem riscos aos consumidores ou terceiros,

mesmo que alheios à relação de consumo, comunicando às autoridades

competentes a ocorrência de tal fato.

Cite-se como exemplo, o recall de peças automotivas.

Observada a existência de algum defeito em tais peças que possam

comprometer a integridade física do proprietário do veículo ou mesmo diminuir

o desempenho do automóvel, deverá a empresa fabricante convocar todos os

clientes a fim de fazer a substituição das peças defeituosas.

1.13.2. Direito à informação

Quanto mais verídica, completa e eficiente a informação sobre os

produtos e serviços à sua disposição, mais seguro estará o consumidor,

devendo o mesmo conhecer os dados indispensáveis sobre eles para atuar

conscientemente no mercado de consumo.

“Trata-se do dever de informar bem o público consumidor sobre todas as características importantes de produtos e serviços, para que aquele possa adquirir produtos, ou contratar serviços, sabendo exatamente o que poderá esperar deles.”20

1.13.3. Direito à proteção contra práticas desleais e abusivas

Refere-se à proteção contra a publicidade enganosa e abusiva e

métodos comerciais coercitivos e desleais. Tais práticas representam um

obstáculo à transparência das relações de consumo que é um dos objetivos

centrais colimados pela Política Nacional das Relações de Consumo.

20 José Geraldo de Brito Filomeno, ob. Cit. Pág. 67/68

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Com base nesse direito conferido aos consumidores em geral, preceitua

José Geraldo Brito Filomeno que a oferta é tida como um dos aspectos mais

relevantes no mercado de consumo, possuindo caráter vinculativo, ou seja,

toda informação a respeito de um produto ou serviço deverá corresponder

exatamente à expectativa do público consumidor.

Nesse aspecto englobam-se também os “contratos de adesão”, sendo

nulas de pleno direito as chamadas cláusulas abusivas, conforme dispõe o art.

51 do CDC.

1.13.4. Direito à proteção contratual

A lei consumerista reprime taxativa e exaustivamente a violação desse

direito. Rompendo com a regra milenar do pacta sunt servanda, o CDC atribui

ao consumidor o direito de alterar cláusulas contratuais que possam causar-lhe

lesão, restabelecendo o equilíbrio entre as partes.

Estabeleceu ainda a teoria da imprevisão ou cláusula rebus sic

stantibus, tida como a superveniência de onerosidade excessiva,

sobrecarregando o consumidor, em virtude de acontecimentos sucessivos à

contratação e imprevisíveis.

Caso haja alguma desavença sobre os ditames do contrato pactuado

entre as partes, será resolvida preferencialmente em comum acordo pelos

participantes da relação de consumo. Todavia, em sendo necessária a

provocação jurisdicional do Estado, deverá ser feita por meio de ação própria

com fundamento no art. 51, I, que determinará as modificações contratuais que

julgar necessárias para o restabelecimento do equilíbrio entre as partes.

1.13.5. Direito à concreta reparação dos danos e facilitação da defesa

judicial

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Esta é a premissa básica para que o consumidor tenha integralmente a

reparação devida por danos morais ou patrimoniais que possa sofrer, visando

ainda, por diversos modos, prevenir a ocorrência de danos ao consumidor.

Principalmente sobre este direito básico do consumidor é que se

fundamenta o objeto finalístico dessa monografia, qual seja a responsabilidade

civil do fornecedor de serviços. O CDC arma o consumidor de instrumentos

processuais modernos e eficazes para que se dê a prevenção do dano bem

como sua reparação.

O direito à reparação está diretamente relacionado ao direito de acesso

à Justiça e à Administração, devendo o Estado criar mecanismos que facilitem

a defesa do consumidor em juízo, certo que a própria lei já define dois desses

mecanismos: a inversão do ônus da prova no processo civil e a assistência

judiciária.21

Merecem destaque, além das ações individuais, as ações coletivas

propostas pelo Ministério Público que visam à proteção do interesses difusos

dos consumidores, interesses coletivos propriamente ditos e individuais

homogêneos de origem comum. Temos visto, conforme se demonstrará

adiante, uma atuação constante e eficaz do Ministério Público, especialmente

no âmbito estadual, na busca de proteção dos direitos básicos de consumidor

assegurados a toda sociedade.

1.4. Deveres de Conduta dos Consumidores

Se de um lado o CDC trouxe inovações e garantiu direitos, de outro, o

consumidor não estava preparado para assimilá-los. Apesar de tais direitos

terem sido efetivamente tutelados pelo Código, é inegável que a iniciativa

precisa partir não apenas da lei, mas sim da própria coletividade, através de

grupos de indivíduos, organizações, bem como de associações civis. Desse

modo, a lei teria maior eficácia, e o interesse social seria valorizado, se a

21 ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 38.

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própria sociedade se insurgisse diretamente contra as ofensas praticadas em

desrespeito a seus direitos.

Embora o Código tenha sido criado para a defesa do consumidor, não se

pode analisar a questão de forma unilateral, como se os consumidores fossem

sujeitos apenas de direitos. Não podemos nos afastar do princípio de que,

embora as relações tenham se tornado de consumo, não deixam de ser

bilateral, o que implica obrigações para ambas as partes.

Também o consumidor possui deveres inerentes a sua qualidade de

parte na relação contratual de consumo, os quais devem ser observados, de

modo a garantir um perfeito equilíbrio entre as partes, assegurando-se a

equidade das relações, e que poderíamos denominar de deveres de conduta

do consumidor.

Como princípio fundamental e principal dever de conduta está a boa fé.

O consumidor, nas suas relações de mercado, deve agir com lealdade,

dignidade e transparência, nunca tentando se prevalecer de prerrogativas que

possui enquanto parte hipossuficiente. Além desse princípio basilar, é possível

ainda se destacar outros deveres de conduta do consumidor, os quais emanam

de uma análise sistemática e abrangente do CDC, tendo sempre em vista as

práticas e funções do mercado, de modo a estabelecer um certo equilíbrio e

coerência: dever de inteligência, dever de pesquisa, dever de educação para o

consumo e de conhecimento do que está contratando, dever de boicote, dever

de ação, etc.

É um erro o consumidor esperar tão somente pelos governos,

condicionando as transformações e decisões a planos e reformas econômicas,

pois estas tem caráter transitório e encobrem vários interesses que não são,

com certeza, os de proteção aos indivíduos. A defesa do consumidor surge

como uma necessidade sócio-política, voltada para o renascimento de um

Brasil economicamente democrático, onde a justiça social seja feita de atos

concretos, com a participação direta dos cidadãos.

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CAPÍTULO II

2. A RESPONSABILIDADE CIVIL NO CDC

O nosso atual Código Civil, prevê, em seu artigo 927, a possibilidade de

reparação do dano em virtude da prática de ato ilícito. Vejamos: "Art. 927.

Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica

obrigado a repará-lo."

Complementando, segue a norma legal: "Parágrafo único. Haverá

obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos,

especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo

autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem."

O referido parágrafo único está justamente inserido de forma a

representar o Código de Defesa do Consumidor, em sua previsão legal, ao

mencionar que o causador do dano deve reparar a lesão independentemente

de culpa, nos casos previstos em lei. Esta Lei, no presente caso, é justamente

o CDC.

O Código de Defesa do Consumidor disciplina a responsabilidade pelos

vícios de segurança, sob o título "Responsabilidade pelo Fato do Produto e do

Serviço" (artigos 12; 13; 14; 17 e 27) e a responsabilidade pelos vícios de

adequação, sob o título "Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço"

(artigos 18; 19; 20; 26).

A Responsabilidade por Fato do Produto ou do Serviço ocorre quando o

mesmo gera danos ao consumidor ou a terceiros (vítimas by stander), o que se

chama de acidente de consumo ou defeito de consumo, prescrevendo em

cinco anos o prazo para a reparação do dano.

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O Vício do Produto ou do Serviço por sua vez, é a quebra da expectativa

gerada pelo consumidor quando da utilização ou fruição, afetando, assim, a

prestabilidade, tornando inadequados (Teoria da Qualidade). Na ocorrência de

vícios aparentes ou de fácil constatação a parte tem o direito de reclamar em

trinta dias tratando-se de fornecimento de serviço e de produto não durável e

noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produto durável. Na

ocorrência de um vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em

que ficar evidenciado o defeito aplica-se aqui a Teoria da Vida útil do Produto.

A forma objetiva, ou seja, independente de culpa é a regra no presente

Código, excetuando-se a da profissional liberal que será verificada mediante a

comprovação de culpa. Também se pode afirmar que a regra no CDC é a da

responsabilidade solidária entre os participantes da cadeia de consumo,

excetuando-se a do comerciante na responsabilidade pelo Fato do Produto,

que será condicionada a certas circunstâncias. Diante de tais circunstâncias a

doutrina majoritária entende que o comerciante responde subsidiariamente

pelos danos ocorridos, por outro lado alguns doutrinadores entendem ser a

responsabilidade solidária, em razão da menção no seu texto, vejamos: "o

comerciante é igualmente responsável nos termos do artigo anterior" (regra do

artigo 13 do CDC).

Ao contrário do que exige a lei civil, quando reclama a necessidade da

prova da culpa, na relação entre consumidores esta prova é plenamente

descartada, sendo suficiente a existência do dano efetivo ao ofendido.

Isso porque, os artigos da Lei assim o determinam. Vejamos:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e

o importador respondem independentemente da existência de culpa, pela

reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de

projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação,

apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por

informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

[grifamos]

Dessa forma, constatado o fato que gerou o dano, proveniente da

relação de consumo, e o dano à parte mais fraca, caberá ao responsável a sua

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reparação, não havendo necessidade do consumidor apresentar prova da

culpa.

Nesse mesmo sentido, a redação do art. 14 do CDC é clara:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da

existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por

defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações

insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [grifamos]

Tais artigos visam como as demais normas previstas no código

consumerista, proteger, de forma privilegiada, a parte mais fraca da relação de

consumo, visando evitar, claramente, abusos dos comerciantes e fabricantes,

ou prestadores de serviços, estes visivelmente mais fortes em relação àqueles.

Por tal motivo, qualquer produto posto no mercado de consumo deve

atender as mínimas exigências de qualidade e quantidade, para que não venha

o consumidor a sofrer prejuízos. Se isso ocorrer, pode valer-se dos arts. 12 e

14 do CDC.

Assim, o fornecedor responde independentemente de culpa por qualquer

dano causado ao consumidor, pois que, pela teoria do risco, este deve assumir

o dano em razão da atividade que realiza. Vejamos o ensinamento de Cavalieri:

Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco do negócio. Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa.22

Assim sendo, verifica-se que a Lei nº 8.078/90 estabeleceu a

responsabilidade objetiva dos produtores e fornecedores da cadeia produtiva,

não levando em consideração a existência da culpa frente aos danos

provenientes de acidentes de consumo ou vícios na qualidade ou quantidade

dos mesmos ou na prestação dos serviços.

22 FILHO, Sérgio Cavalieri. O direito do consumidor no limiar século XXI. Revista de Direito do Consumidor. Revista dos Tribunais, nº 35, jul/set. 2000, p. 105.

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Nesse sentido, acompanhemos o seguinte julgado do Tribunal de Justiça

do RS:

Resta caracterizada a falha da ré, na prestação de serviço, sendo caso

de aplicação do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual

os fornecedores respondem, independentemente de culpa, pela reparação dos

danos causados aos consumidores por defeitos relativos aos serviços

prestados, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua

fruição e riscos.23

O entendimento supra é pacífico no poder judiciário, restando

consagrada a determinação expressa da norma legal do Código de Defesa do

Consumidor.

Por fim, o doutrinador Nelson Nery ensina:

A norma estabelece a responsabilidade objetiva como sendo o sistema

geral da responsabilidade do CDC. Assim, toda indenização derivada de

relação de consumo, sujeita-se ao regime da responsabilidade objetiva, salvo

quando o Código expressamente disponha em contrário. Há responsabilidade

objetiva do fornecedor pelos danos causados ao consumidor,

independentemente da investigação de culpa.

Portanto, a intenção subjetiva pouco importa quando enfrentamos

questões que envolvem relações de consumo, pois esta não faz parte dos

critérios determinantes no momento de se condenar à reparação do dano, pois

que, havendo ou não a pretensão de lesar, o que interessa é apenas a

existência do prejuízo, e por isso, o causador é obrigado a repará-lo.

2.1. Evolução histórica

23 Apelação Cível nº 70015092034. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Décima Câmara Cível. Des. Relator Luiz Ary Vessini de Lima. Julgado em 22/06/2006. Disponível em: http://www.tj.rs.gov.br/site_php/consulta/consulta_processo.php?

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Anteriormente ao advento do CDC havia imensa dificuldade em se impor

a responsabilidade ao fornecedor com relação ao consumidor, em virtude do

princípio existente de que o contrato só produz efeito entre as partes.

Desse modo, o fabricante só poderia ser acionado se fosse, ao mesmo

tempo, o vendedor. E ainda assim, se o vendedor estivesse de boa-fé, o

consumidor poderia pedir a restituição do preço ou ajuste do preço (arts. 1.101

e 1.103, 2ª alínea, CC), mas se estava de má-fé, poderia pleitear o que

recebeu com perdas e danos (art. 1.103, 1ª alínea).

A ação que o consumidor porventura viesse a impetrar contra o

fornecedor de serviço defeituoso deveria fundar-se no contrato, baseando-se

não somente no dever de responder pelos vícios, como também na obrigação

de segurança existente no contrato. O fornecedor deveria garantir que o

serviço prestado não danificaria o consumidor

Todavia a ação contra o fabricante ou produtor da mercadoria nociva não

encontrava fundamento na responsabilidade contratual, já que o mesmo não

fora parte no contrato que transmitiu o produto defeituoso ao consumidor, mas

na responsabilidade extracontratual, fundamentada no art. 159 do CC:

“Art. 159 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a

outrem, fica obrigado a reparar o dano.”

Mas, seguindo esse caminho, deveria o consumidor provar a culpa do

fabricante para obter o ressarcimento do dano. Em determinadas situações

poderia a vítima ser favorecida por presunções que inverteriam o ônus da

prova, cabendo ao produtor provar que não deu causa ao dano, sendo essa

prova muito difícil, levando-se em conta que quem exercia atividade com

habitualidade deveria conhecer a fundo as técnicas de fabricação, montagem,

distribuição, etc.

Assim, o fornecedor ou fabricante tornava-se responsável por danos que

o produto ou serviço causasse desde que tivesse agido com dolo ou culpa.

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Como principais regras em que se baseia o sistema da responsabilidade civil

fundado na culpa, podem ser enumeradas as seguintes:

a) não existe responsabilidade onde não há culpa provada ou presumida

do agente;

b) o conceito de culpa relaciona-se com o comportamento subjetivo

caracterizado pela negligência, imprudência ou imperícia, ou havendo dolo;

c) somente o ato ilícito culposo pode ensejar a reparação do dano

ocasionado;

d) somente o sujeito culpado pode ser sancionado.

Somando-se as incontáveis dificuldades inerentes a esse sistema de

responsabilidade civil, que exigiam grande esforço probatório por parte do

lesado, com a intensificação das atividades coletivas que, muitas vezes, não

possibilitavam identificar o autor do dano, resultou, ao longo dos anos, na

insuficiência do sistema tradicionalmente adotado para a responsabilidade

extracontratual, mostrando-se necessária à adoção de uma forma de

responsabilização mais eficaz a fim de proteger a saúde e a segurança do

consumidor e facilitar a defesa do mesmo.

O caminho encontrado foi a responsabilidade objetiva. Em relação ao

tratamento a ser deferido às hipóteses de responsabilidade civil, o CDC

estabeleceu alterações radicais, donde acreditamos que o Código Civil vigente

dificilmente poderá ser adotado e aplicado subsidiariamente às relações de

consumo.

2.2. A Responsabilidade Civil Objetiva nas Relações de Consumo

A Revolução Industrial, fenômeno iniciado na segunda metade do Século

XVIII, que significou o aumento potencial da capacidade produtiva das

empresas, o início da fabricação em série de todos os tipos de bens e a

consequente introdução de mudanças no sistema distributivo dos produtos,

particularmente na relação revendedor adquirente, acentuada de forma

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decisiva pela revolução tecnológica, promoveu uma crescente

desindividualização do produto e de forma paralela, do consumidor ou usuário.

Para Sílvio Luís Ferreira da ROCHA, o número maior de produtos

colocados em circulação significou um aumento dos riscos ao público

consumidor em razão dos erros técnicos e falhas no processo produtivo.24

“A experiência de todos os países industrializados demonstrou que a

revolução industrial veio acompanhada pela aparição de novos danos,

causados pelas condições defeituosas dos produtos, que devido a produção

em série, podem configurar verdadeiras catástrofes”.25

Deste modo, os riscos introduzidos no mercado pelo fenômeno de

produção e distribuição de massa resultaram num elevado custo social. Fazia-

se necessário assegurar, de um lado, o completo ressarcimento àqueles que

sofreram o prejuízo e, de outro lado, distribuir racionalmente os custos desses

danos. Entretanto, a disciplina então vigente não era suficiente e precisava

adequar-se a esse novo fenômeno.

Nessa época a noção de responsabilidade civil era estudada numa dupla

perspectiva: responsabilidade civil contratual e extracontratual. A primeira tinha

como pressuposto a existência de um contrato e a obrigação de reparar os

prejuízos decorria do inadimplemento da obrigação assumida. A segunda tinha

como único fundamento admissível a comprovação da culpa.

“A teoria da culpa, resumida com alguma arrogância por Von Ihering na

fórmula, ‘sem culpa, nenhuma reparação’, satisfez por dilatados anos à

consciência jurídica”.26

Com as inúmeras dificuldades inerentes ao sistema de responsabilidade

civil baseado na culpa, frequentemente encontravam-se situações carecedoras

de tutela jurídica que não logravam ultrapassar as barreiras do sistema, a exigir

grande esforço probatório por parte do lesado, ou ainda situações comuns

aonde o tênue laço de culpabilidade jamais poderia ser captado em condições

normais.

24 ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Responsabilidade Civil do Fornecedor pelo Fato do Produto no Direito Brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1992, p. 13. 25 ROCHA, op. cit., p.13. 26 ROCHA, op. cit., p. 15.

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Os tempos atuais são caracterizados pelo desenvolvimento de

atividades coletivas, nas quais muitas vezes é impossível individualizar-se o

autor do dano; pelo permanente emprego de coisas que geram riscos, pela

realização de atividades que guardam em si mesmas uma sensível

potencialidade danosa para terceiros.

2.3. Prescrição

Estabelece o Código o prazo de 5 anos para a prescrição da ação tendo

por objeto a reparação de danos causados pelo fato do produto ou do serviço.

Inicia-se a contagem, não a partir da tradição ou da ocorrência do defeito, mas

do conhecimento que dele teve o consumidor e de sua autoria (art. 27), pois só

com a ciência do defeito e do seu causador é que o interessado poderá valer-

se da via judicial. Tal prescrição está sujeita às causas de suspensão e

interrupção (arts. 168/176 do CC).

2.4. Responsabilidade do comerciante pelo fato do produto e do serviço

(art. 13 do CDC).

No art. 12 do CDC, temos que a responsabilidade dos fornecedores,

exceto o comerciante, é objetiva, respondendo por danos causados

independentemente de culpa, ressalvados as hipóteses dos incisos I a III do

art. 13. O comerciante tem responsabilidade subsidiária nos acidentes de

consumo, pois os obrigados principais são os fabricantes, produtores,

construtores e os importadores, com a ressalva destes incisos acima citados.

Antes de analisar o art. 13, temos uma observação que achamos útil seu

friso [5]: quem coloca sua própria marca de comércio é fabricante ou

comerciante? Nesta questão, se o comerciante põe sua marca precedida da

expressão distribuída por ou equivalente, será ele responsável nos termos do

art. 12, CDC. Se não, ocorrendo a aposição de sua marca ou outro sinal

distintivo, ocultando o verdadeiro fabricante, será ele responsável nos termos

do art. 13.

O caput do art. 13 traz que o comerciante é igualmente responsável, nos

termos do artigo anterior, passando a enumerar três hipóteses. O professor

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Rizzato Nunes ressalta que o vocábulo igualmente tem duplo sentido, de modo

que "o comerciante tem as mesmas responsabilidades firmadas no artigo

anterior e que o comerciante é solidariamente responsável com os agentes do

art. 12.”

2.5. Quando o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não

puderem ser identificados (art. 13, I)

Observa a doutrina que não quer dizer que há "impossibilidade de

identificar o fabricante, produtor, etc." É o caso do comerciante que vende

produtos a granel, expostos em feiras e supermercados, que não teve como

identificar qual dos produtores forneceu a ele o produto gerador de acidente de

consumo. Frise-se que a norma permite a venda de produto sem identificação

é exceção a regra geral do dever de informar no ato da oferta, conforme art. 31,

CDC, que trata do dever de o fornecedor informar, entre outras especificações

do produto, a sua origem.

2.6. Quando o produto for fornecido sem identificação clara do seu

fabricante, produtor, construtor ou importador (art. 13, II)

O inciso II faz menção ao caso do comerciante que tem condições de

identificar o produtor, mas mesmo assim não o faz [8]. Diferentemente do item

anterior, o comerciante fere o art. 31 do CDC quando pratica tal ato. Aqui

merece atenção às consequências geradas pelos incisos I e II: No primeiro,

nem a autoridade fiscal nem a judiciária pode realizar a apreensão dos

produtos sem identificação, diferente ocorre com segunda hipótese, já que o

elemento essencial da informação foi omitido.

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CAPÍTULO III

3. CAUSAS DE EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE.

A Lei 8.078/90 prevê nos arts. 12. § 3º e 14, § 3º as causas excludentes

de responsabilidade. Todo produto ou serviço, por mais seguro e inofensivo

que seja traz sempre uma margem de insegurança para o consumidor,

podendo inclusive culminar em dano para o mesmo, gerando prejuízo a ser

apurado em conformidade com cada caso, em favor da relação jurídica de

consumo que pode ser ou não contratual.

O CDC em seus arts. 12 e 14, preferiu adotar a unificação das

responsabilidades contratual e extracontratual, em prol da proteção às vítimas

expostas aos riscos de consumo, adotando-se a responsabilidade objetiva,

independentemente da existência de culpa pela reparação dos danos causados

aos consumidores.

Apesar da responsabilidade ser objetiva, o Código do Consumidor

ressalvou algumas causas de exclusão da responsabilidade, permitindo a

previsão de algumas excludentes, tais como inexistência do defeito de produto

ou serviço (art. 12 § 3º II e art. 14 § 3º I) e ainda a culpa exclusiva do

consumidor (art. 14 § 3º II).

Entretanto, as hipóteses elencadas no CDC não são taxativas. Outras

são admitidas, recorrendo-se, para tanto, às regras de interpretação

sistemática e lógica.

A primeira hipótese de exclusão da responsabilidade do fornecedor,

disposta no art. 14, §, 3º, I, é a inexistência do defeito. Contudo, a prova da

inexistência do defeito compete ao fornecedor. Para exonerar-se da

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responsabilidade deverá demonstrar a inexistência do defeito por ocasião da

colocação do serviço em circulação. Em tese, caberia ao consumidor provar a

existência do defeito no momento de sua aquisição, mas, de acordo com o

princípio da vulnerabilidade do consumidor, o Código impõe que se faça a

inversão do ônus da prova em favor do consumidor.

Depois de analisadas todas as circunstâncias é que o Juiz poderá

abrandar ou não a prova a ser realizada pelo fornecedor em relação à

inexistência do defeito.

A segunda causa de exclusão é a culpa exclusiva do consumidor ou de

terceiro, elencada no art. 14, § 3º, II, do CDC. No caso de culpa concorrente, a

excludente não seria aplicável permanecendo íntegra a responsabilidade do

fornecedor.

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CONCLUSÃO

A evolução da proteção do consumidor no âmbito da responsabilidade

pelo fato do serviço foi lenta e gradual. Indo da responsabilidade subjetiva,

baseada na culpa à responsabilidade objetiva independente de culpa foram-se

muitos anos.

A partir daí a proteção do consumidor torna-se mais efetiva,

necessitando, porém, de uma atividade mais constante e ativa dos órgãos e

associações de defesa do consumidor, pois, somente da união de forças da

massa consumidora é que se poderá lutar contra o poderio dos grandes

fornecedores de serviços.

O CDC estabelece, em relação ao tratamento a ser deferido às

hipóteses de responsabilização civil, alterações radicais, donde podemos

concluir que o Código Civil Brasileiro vigente dificilmente poderá ser adotado e

aplicado subsidiariamente nas relações de consumo. A matéria há de ser

tratada unicamente com fundamento no CDC, encarado como sistema de

prevenção e reparação de danos acidentais inevitáveis, em que a avaliação da

conduta do fornecedor conta pouco ou simplesmente não conta

Na proteção do consumidor não só o Estado deve reprimir o abuso do

poder econômico. Indiretamente os consumidores, através de sua organização

para fins de reivindicação e utilizando-se de instrumentos adequados, podem

fazer sua parte, levando-se em conta que o interesse de proteção é público,

não estatal. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor tem ao longo dos

anos buscado a transformação do consumidor em cidadão, senhor de suas

escolhas e ciente de seus direitos.

Todavia devemos ter em mente que somente uma parcela de nossa

população está integrada ao mercado de consumo, vivendo a outra de sobras,

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favores, etc. Assim, sem uma integração social maior o Código pouco fará em

termos de cidadania.

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