a resistência e invisibilização das mulheres negras ... · foram se transformando em mulheres...

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Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as ABPN Núcleo de Estudos Afro-brasileiro e Indígenas NEABI MOCINHA (Maria Cezarina Cardoso) Universidade Federal do Pampa UNIPAMPA/CAMPUS JAGUARÃO A resistência e invisibilização das mulheres negras história brasileira: experiência didático-pedagógica Eliana Cristina Pereira SANTOS 1 Palavras-Chave: Feminismo negro; Formação de docentes, Interseccionalidade, mulheres negras. Resumo: Esta experiência didático pedagógica tem como objetivo apresentar um trabalho desenvolvido no ano de 2018, durante as aulas de Metodologia do Ensino de História, com duas turmas do curso de formação de docentes, cujo objetivo maior foi desenvolver ações afirmativas previstas na determinação legal da Lei 10.639/2003. O trabalho teve como foco as mulheres negras que fizeram e fazem história, que dão sentido as discussões do Movimento Feminista Negro. Para tal, os alunos foram divididos em duplas, e pesquisar as muitas heroínas negras, desde o Brasil colônia até os dias atuais. As mulheres selecionadas para a pesquisa foram: Aqualtune; Dandara dos Palmares; Tereza de Benguela; Maria Firmina do Reis; Antonieta de Barros; Laudelina de Campos Melo; Carolina de Jesus; Ruth de Souza; Marielle Franco ; Marta Vieira; Anastacia; Luiza Mahín; Zeferina; Maria Felipa de Oliveira; Carla Akotirene; Eva Maria de Bonsucesso; Tia Simoa; Joice Berth; MC Sofia; Aizita Nascimento; Xica da Silva; Taís Araújo; Elisa Lucinda; Djamila Ribeiro; Karol Conka; Iza; Theodosina Rosário Ribeiro; Benedita da Silva; Marina Silva; Leci Brandão; Elza Soares; Enedina Alves; Viviane dos Santos Barbosa; Maria Beatriz do Nascimento; Sonia Guimarães; Simone Maia Evaristo, Bia Ferreira. Para que a atividade tivesse significância foi necessário trabalhar com alguns conceitos básicos como preconceito, racismo estrutural, políticas públicas, interseccionalidade, sororidade, empoderamento, feminismo negro, afromisoginia, hegemonia, eurocentrismo, diáspora, entre outros conceitos. Como fundamentação teórica tivemos: Simone de Beauvoir (1980); Judith Butler(1987); Gayatri Spivak (2010), Djamila Ribeiro (2017), Lélia Gonzalez (1984), bell hooks (2015), Angela Davis (2016), Regina de Jesus (2010), Paulo Freire (1996), Carla Akotirene(2018), Kabengele Munanga (1980), entre outros autores e autoras. Para desenvolver um trabalho assim, demandou várias leituras e cursos para preencher com conhecimento cientifico as inquietudes dos alunos. Depois da pesquisa, os alunos elaboraram cartazes, apresentaram em sala para os colegas e colaram os cartazes pelo pátio da escola. Todo esse trabalho resultou na contribuição para construção nos alunos de visões diferenciadas, de outra perspectiva sobre a identidade afro-brasileira. O curso de Formação de Docentes tem em sua maioria o gênero feminino e, por isso também contribuiu para mudar a lógica de ver as mulheres negras, principalmente as lideranças, e na representações nos meios de comunicação. 1 Doutoranda em Letras pela UNIOESTE- Cascavel, professora da rede pública estadual do Paraná (Foz do Iguaçu), professora e coordenadora do Curso de Pedagogia da FAFIG- Faculdades de Foz do Iguaçu. Formação em Pedagogia (UNESP/Marilia- 1996) Letras- Espanhol e Literaturas hispânicas (UFSC-2015) Mestrado em Letras (UNIOESTE/Cascavel) e-mail: [email protected].

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Núcleo de Estudos Afro-brasileiro e Indígenas – NEABI MOCINHA (Maria Cezarina Cardoso) Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA/CAMPUS JAGUARÃO

A resistência e invisibilização das mulheres negras história brasileira: experiência didático-pedagógica

Eliana Cristina Pereira SANTOS1 Palavras-Chave: Feminismo negro; Formação de docentes, Interseccionalidade, mulheres negras. Resumo: Esta experiência didático pedagógica tem como objetivo apresentar um trabalho desenvolvido no ano de 2018, durante as aulas de Metodologia do Ensino de História, com duas turmas do curso de formação de docentes, cujo objetivo maior foi desenvolver ações afirmativas previstas na determinação legal da Lei 10.639/2003. O trabalho teve como foco as mulheres negras que fizeram e fazem história, que dão sentido as discussões do Movimento Feminista Negro. Para tal, os alunos foram divididos em duplas, e pesquisar as muitas heroínas negras, desde o Brasil colônia até os dias atuais. As mulheres selecionadas para a pesquisa foram: Aqualtune; Dandara dos Palmares; Tereza de Benguela; Maria Firmina do Reis; Antonieta de Barros; Laudelina de Campos Melo; Carolina de Jesus; Ruth de Souza; Marielle Franco ; Marta Vieira; Anastacia; Luiza Mahín; Zeferina; Maria Felipa de Oliveira; Carla Akotirene; Eva Maria de Bonsucesso; Tia Simoa; Joice Berth; MC Sofia; Aizita Nascimento; Xica da Silva; Taís Araújo; Elisa Lucinda; Djamila Ribeiro; Karol Conka; Iza; Theodosina Rosário Ribeiro; Benedita da Silva; Marina Silva; Leci Brandão; Elza Soares; Enedina Alves; Viviane dos Santos Barbosa; Maria Beatriz do Nascimento; Sonia Guimarães; Simone Maia Evaristo, Bia Ferreira. Para que a atividade tivesse significância foi necessário trabalhar com alguns conceitos básicos como preconceito, racismo estrutural, políticas públicas, interseccionalidade, sororidade, empoderamento, feminismo negro, afromisoginia, hegemonia, eurocentrismo, diáspora, entre outros conceitos. Como fundamentação teórica tivemos: Simone de Beauvoir (1980); Judith Butler(1987); Gayatri Spivak (2010), Djamila Ribeiro (2017), Lélia Gonzalez (1984), bell hooks (2015), Angela Davis (2016), Regina de Jesus (2010), Paulo Freire (1996), Carla Akotirene(2018), Kabengele Munanga (1980), entre outros autores e autoras. Para desenvolver um trabalho assim, demandou várias leituras e cursos para preencher com conhecimento cientifico as inquietudes dos alunos. Depois da pesquisa, os alunos elaboraram cartazes, apresentaram em sala para os colegas e colaram os cartazes pelo pátio da escola. Todo esse trabalho resultou na contribuição para construção nos alunos de visões diferenciadas, de outra perspectiva sobre a identidade afro-brasileira. O curso de Formação de Docentes tem em sua maioria o gênero feminino e, por isso também contribuiu para mudar a lógica de ver as mulheres negras, principalmente as lideranças, e na representações nos meios de comunicação.

1 Doutoranda em Letras pela UNIOESTE- Cascavel, professora da rede pública estadual do Paraná (Foz do Iguaçu), professora e coordenadora do Curso de Pedagogia da FAFIG- Faculdades de Foz do Iguaçu. Formação em Pedagogia (UNESP/Marilia- 1996) Letras- Espanhol e Literaturas hispânicas (UFSC-2015) Mestrado em Letras (UNIOESTE/Cascavel) e-mail: [email protected].

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PALAVRAS INTRODUTÓRIAS As mulheres negras da história brasileira são invisibilizadas nos livros didáticos

de História e nas aulas de Histórias. Este trabalho específico tem por objetivo apresentar uma das micro ações afirmativas desenvolvidas anualmente com alunos do curso de formação de docente, nível médio, antigo Magistério. Eu, enquanto, professora negra, da disciplina de Metodologia do Ensino de História, e, também, outras disciplinas que a minha formação pedagógica permite atuar nos cursos de formação de professores, ocupo de todas as maneiras os espaços para inserir a participação e contribuição do nosso povo preto em todos os espaços. Por mais que, alguns alunos me classifiquem de “a professora das minorias”, “a professora e sua fala sobre os negros”, eu me apego à lei 10.639/03 e respondo com a obrigatoriedade de todos professores fazerem o mesmo. Essa minha prática legalizada é a lei 10639/2003 e em sua alteração em 2008 com a lei 11.645, como reconhecimento e reparação das desigualdades sociais, tão urgentes e atuais. Nas redes básicas de ensino, o docente, tem “com o desafio de disseminar, para o conjunto da sua população, num curto espaço de tempo, uma gama de conhecimentos multidisciplinares sobre o mundo africano.” (WEDDERBURN, 2005, p.133).

Neste trabalho utilizei como base a complexidade do conceito de interseccionalidade, racism estrutural e feminismo negro, entre outros, para mostrar aos estudantes que nossas mulheres negras foram e são resistentes na sociedade brasileira, tirar do anonimato figuras ilustres, que se destacaram como lideres nas lutas em favor do povo negro. Foi uma forma de problematizar a temática das lutas afrodescendentes por direitos, por valorização étnica e pela manifestação de consciência de pertencimento e resistência.

Escolhi as várias mulheres desde Dandara à MC Sofia para que aos pares os alunos realizassem suas pesquisas, considerando que a maioria dos alunos do curso são meninas. Ao mesmo tempo, trabalhei com aulas expositivas sobre conceitos como chaves para entender do porque existe essa luta constante: racismo estrutural, interseccionalidade, feminismo negro, sororidade, entre outros.

ALGUNS CONCEITOS ESSENCIAIS

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Para trabalhar com a temática em sala de aula, faz-se necessário um base teórica que sustente os argumentos que se vai usar com os alunos, além de ter a humildade de dizer que não sabe sobre aquilo, mas vai pesquisar, trazendo a resposta em outro momento. O que não pode, em hipótese alguma, é trazer informações equivocadas pautadas no senso comum. A que se lembrar que a escola é espaço de conhecimento científico.

O conhecimento cientifico deve ser apropriado pela classe trabalhadora de forma rápida, o mais amplo possível, para que possa utiliza-la como meio de transformação do seu meio social. Nas palavras de Lígia Klein (2003, p.49), “o domínio do conhecimento científico histórica e criticamente acumulado e sistematizado” deve ser uma prática constante, dentro de uma perspectiva marxista, ou seja, consciência de classe trabalhadora

O racismo estrutural, debatido e pesquisado por vários autores e autoras corresponde a opressão sistematizada, configurada, na sociedade de forma naturalizada, ou seja, ele transcende todas as instituições públicas ou privadas por meio das relações sociais estabelecida na sociedade de forma geral. É possível reconhecer nos privilégios de alguns grupos, nos locais de moradias, nos tipos de trabalhos desenvolvidos em grande maioria por pretos, na perseguição da polícia em jovens negros, o número de pessoas pretas em lugres de “prestigio social”, cargos de chefias. Bem, os exemplos são inúmeros, mas o que interessa aqui, são as formas da resistência durante a história.

O conceito de interseccionalidade é essencial para compreender a não presença da mulheres negras dentro deste racismo estrutural, ou entender onde estavam as mulheres negras durante o Movimento Feminista Universal e Hegemônico. Para o conceito interseccional não há como estudá-lo fora do Movimento Feminismo Negro.

O Feminismo Negro é uma concepção complexa e abrangente porque envolve três conceito que estão atrelados: raça, gênero e classe socioeconômica. Esses conceitos dentro do movimento possui funcionamento intrínseco ao outro. Não é possível estudar as questões de gênero, sem abordar o conceito de raça, o conceito de mulher negra: quando nominamos com a palavra negra, pontuamos o lugar não-branco, um lugar marginalizado social e economicamente, devido ao racismo estrutural. O Feminismo Negro, é o carro-chefe dessa atividade realizada, afinal, são as mulheres negras as fascinantes que deixaram suas marcar na história, pela resistência.

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Segundo Ina Kerner (2012, p.51) “a interseccionalidade do racismo e do sexismo como fenômenos de poder complexos e entrelaçados empiricamente de múltiplas formas, com uma dimensão epistêmica, uma institucional e outra pessoal.” O racismo e o sexismo são relações de poder, essa é a dimensão epistêmica porque perpetua por meio de inúmeros discursos sociais correspondentes. Na dimensão institucional, como o próprio nome, são as maneiras presentes e naturalizadas nas mais diversas instituições. E a dimensão pessoal, perpassa pelo sujeito, sua subjetividade e identidade.

Os alunos ao pesquisarem e apresentarem seus trabalhos, foram além da produção de cartazes. Muitos trouxeram poemas, músicas e até fizeram performance durante as apresentações. EXEMPLOS DA PRÁTICA

As mulheres selecionadas para a pesquisa foram: Aqualtune (c.1600-?) - princesa e comandante militar; Dandara dos Palmares (? - 1694) - esposa de Zumbi; Tereza de Benguela (?-1770) - rainha do Quilombo de Quariterê; Maria Firmina do Reis (1822-1917) - escritora e professora; Antonieta de Barros (1901-1952) - professora, jornalista e deputada; Laudelina de Campos Melo (1904-1991) - empregada doméstica e ativista política; Carolina de Jesus (1914-1977) – escritora; Ruth de Souza (1921) – atriz; Marielle Franco (1979-2018) - socióloga, ativista e vereadora; Marta Vieira (1986) - jogadora de futebol; Anastacia; Luiza Mahín; Zeferina; Maria Felipa de Oliveira; Acotirene; Eva Maria de Bonsucesso; Tia Simoa; Joice Berth; MC Sofia; Aizita Nascimento; Xica da Silva; Taís Araújo; Elisa Lucinda; Djamila Ribeiro; Karol Conka; Iza; Theodosina Rosário Ribeiro; Benedita da Silva; Marina Silva; Leci Brandão; Elza Soares; Enedina Alves; Viviane dos Santos Barbosa; Maria Beatriz do Nascimento; Sonia Guimarães; Simone Maia Evaristo, Bia Ferreira.

Trago aqui alguns exemplos do meu arquivo pessoal, tiradas com meu celular.

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Figura 1: arquivo pessoal Figura 2: arquivo pessoal

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Figura 3: arquivo pessoal Figura 4: arquivo pessoal

Figura 5: arquivo pessoal Figura 6: arquivo pessoal

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Em uma das apresentações duas alunas fizeram a performance da música de

“Bia Ferreira”, Não precisa ser Amélia (2018). As alunas passaram o clipe no fundo e foram se transformando em mulheres empoderadas, elas começam a performance com roupas mais simples e fazendo trabalhos domésticos, representando nas figuras 7 e 8 “uma mulheres que não tinha conhecimento do seu valor, do seus direitos” assim afirmou uma das alunas. Quando inicia o refrão da canção “Não precisa ser Amélia pra ser de verdade. Cê tem a liberdade pra ser quem você quiser” elas começaram a se “transformar” no sentido de arrumar-se para sair, colocar outra roupa, maquiar-se, auxiliar a outra amiga nesse processo de empoderamento. Para mim pode ser aplicado aqui o conceito de sororidade, tão necessário nos dias atuais.

As mulheres negras do passado, sao espelhos que vemos nos dias atuais, como MC Soffia (2016), uma criança rapper, cantora e compositora, com a música “Menina Pretinha” de (Denna Hill, James Bantu e Mc Soffia) uma garota toda empoderadas, falando com propriedade para outras crianças negras ou não-negras, pelas letras de suas canções, das distorções sociais graves geradas pelo preconceito e racism, além de incentivar as crianças a se amarem do jeito que são. Também visibiliza conceitos como “exótica não é linda” que as nenhuma criança negra é exotica, nem tão pouco somente bonitinhas, elas são rainhas. Afirma que para brincar prefere a boneca “Makena africana”, embora a boneca Barbie seja legal. Makena é o nome de origem do Quênia, com siginificado de “A Feliz”,uma boneca preta feita de pano diferente da Abayomi, além de preferir histórias de griô, outro conceito africano, os griôs são os mestres que transmitem os sabers e fazeres da cultura de forma oralizada. Alem de orgulhar-se da sua raça e sua cor.

A sororidade é essa aliança entre as mulheres, são as relações harmônicas e fraternas. Que perpassa pelas dimensões políticas, éticas e própria do feminismo. É de fato se compadecer com seus iguais de forma positiva, solidarizando em defesa do gênero feminino, para que uma mulher não seja apenas uma, mas, um grupo forte para lutar contra o patriarcado, as agressões. Uma empatia das mulheres para com as outras. Elemento essencial para que permanecemos vivas, resistindo e lutando.

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Figura 7: arquivo pessoal Figura 8: arquivo pessoal

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para finalizar, esse texto, pois houveram outras ações que não cabem apenas nessas páginas, tenho consciência que de algum modo toquei em alguns alunos, fiz uma micro diferença com essas atividades. Problematizei a categoria mulher negra, como sujeito de resistência na História, mas estabeleci “interseções com modalidades raciais, classistas, étnicas, sexuais e regionais de identidades discursivamente constituídas.” (BUTLER, 2003, p. 20) Acrescentei mais dois elementos nessa constituição: politicamente e culturalmente, porque essa é a forma que somos produzidos e produzimos História.

Desta forma, quando vamos trabalhar com a temática em nossas aulas é fundamental nos munirmos da complexidade de conceitos, para que não seja feito um desserviço em relação as temáticas étnico raciais. Em outras palavras, não reproduzir conceitos e práticas racista, já estruturada e naturalizada. É sempre um processo de

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desconstrução, na perspectiva antirracista. Uma educação desta forma permite construir brechas, fissuras, micro ações, enfim, espaços que permitem a superação do racismo, e a desambiguação em relação a Histórias eurocêntricas que invisibiliza a presença do negro e fundamentalmente das mulheres negras.

No caso de trabalhar a mulher negra, foi para mim, uma tentative de quebrar com o esteriótipos carregados de erotismo, submissão, escrava, amante, “a negra do samba”, “a negra fogosa” que muito me incomodava por ser uma mulher negra. Ao mesmo tempo, foi apresentar, ressaltar e reforçar positivamente a força, e todos outros fatores constitutivos da identidade da mulher negra. Mulheres pré e pós-abolicionistas que resistiram à inúmeras formas de preconceito, exploração, discriminação são verdadeiras heroínas negras retratadas também no livro “Heroínas negras do Brasil em 15 cordéis” da escritora cearense Jarid Arraes (2017).

Parafraseando o grande educador Paulo Freire (1996, p. 95-98), a escola como espaço de educação, deve intervir no mundo para além do conhecimento cientifico, eurocêntrico; é preciso desmascarar os conceitos prontos através da dialética e da contradição. E, para nós professors, é preciso primeiramente superar a minha ignorância, para auxiliar os educandos a superar as suas, porque não é possível ensinar o que não se sabe. E mais, devo entender que sou uma permanente educanda. E para isso, devo estar em permanente apendizado, principalmente das histórias não contadas.

Há que se considerar que muitas vezes a falta de conhecimento do professor, vai para além de apenas estudar, Eliana Santos (2013), em sua dissertação de mestrado sobre “A imagem dos professores na Revista Nova Escola”, aponta que o professor tem etnia majoritariamente branca, a profissão de educar tem gênero, e essa é mostrada no feminino, do mesmo modo, apresenta a docência baseada num discurso de semiprofissionalismo. Diantes desses discursos, trazidos pela autora, a implementação das ações afirmativas em relação a Lei 10.639/2003, dependeria somente e exclusivamente do professor separar um tempo para o estudo de bibliografias consistentes sobre as temáticas. No entanto, hoje, o que salva muitos educadores são os meios digitais, a internet, os grupos de debates, esses meios digitais permitem que os professores, a cada dia leiam algumas páginas de artigos científicos, assistam vídeo, promovidos para informar a temática Afrobrasileira e assim, esteja preparado para os desafios de aprender novos conceitos, novas formas de enxergar o mundo. Mudar o seu foco eurocêntrico, para o processo de descolinazação. Também podemos contar as

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Universidades Públicas na sua cidade, que possuem cursos e grupos de estudos sobre as temáticas Afro.

A título de encerramento, acredito que os alunos que participaram dessa atividade, a percepção sobre as mulheres negras mudaram, fez diferença, na forma de ver o Feminismo Negro. Muitos até confidencializaram: “nossa profe não sabia que tinha tantas mulheres negras que lutaram e corajosas no Brasil”. É um outro olhar, uma nova perspectiva de ver o quanto tivemos e temos mulheres guerreiras, na linha de frente, batalhando para que essa geração possa estar onde estamos, podendo falar, como falamos, nos empoderarmos, inclusive, podermos afirmar que estamos na quarta onda do feminismo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARRAES, Jarid. Heroínas Negras Brasileiras em 15 Cordéis. Editora Pólen Livros. São Paulo. 2017 BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de

Janeiro, Civilização Brasileira, 2003 [1990]. BRASIL. Lei Federal nº 10.639, de 09 de Janeiro de 2003. Altera a Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro - Brasileira", e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm . Acessado em 30 de abril de 2019. FERREIRA. Bia. Não Precisa Ser Amélia (Ao Vivo no Estúdio Show livre por Vento

Festival 2018), in: https://www.youtube.com/watch?v=eafn3B5KVII. Acesso em: 31/05/2018. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 3ª

edição. Ed. Paz e Terra. Rio de Janeiro RJ, 1996.

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KERNER, Ina. Tudo é interseccional? Sobre a relação entre racismo e sexismo, in: Novos Estudos CEBRAP, 93, julho, p. 45-58, 2012.

KLEIN, Ligia Regina. Fundamentos teóricos: os Ciclos de Aprendizagem e a qualidade da escola pública. In: Seminário de Educação e Políticas Públicas: Qualidade da Escola Pública e os Ciclos de Aprendizagem. Anais. Curitiba, 2003.

MC SOFFIA. Menina pretinha. Composicão de Denna Hill, James Bantu e Mc Soffia. 2016. In: https://www.youtube.com/watch?v=cbOG2HS1WKo . Acesso em 31/05/2018. SANTOS, Eliana Cristina Pereira. A imagem do professor nas capas da Revista Nova Escola: a circularidade do sentido. 148 f. Dissertação (Mestrado em Linguagem e Sociedade) - Universidade Estadual do Oeste do Parana, Cascavel, 2013.

WEDDERBURN, Carlos Moore. Novas bases para o ensino da história da África no Brasil. In: Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal nº 10.639/03 /

Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. 236 p. (Coleção Educação para todos)