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A questão nacional no projeto político de Carlos Fonseca Amador FERNANDA FELTES * Em 19 de julho de 1979, as forças revolucionárias nicaraguenses, lideradas pela Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), irromperam nas ruas de Manágua para enfim dar fim à ditadura somozista. Para propor a ruptura política, social e econômica, os sandinistas recorreram a projetos que incluíam a adoção de uma economia mista, expropriação de latifúndios e medidas para sanar problemas crônicos no país, como o analfabetismo. Neste trabalho, pretende-se abordar não os produtos da Revolução Nicaraguense, mas os antecedentes que determinaram e direcionaram o processo revolucionário. Assim também se procura refletir sobre o período de formação do projeto político revolucionário do principal articulador da FSLN na fase pré-revolucionária, Carlos Fonseca Amador. Como defensor da importância de reformular e definir uma estratégia política que pudesse ampliar a base da FSLN e como seu primeiro secretário-geral, Carlos Fonseca Amador foi também o responsável pela inclusão do componente “sandinista” na sigla e pela estruturação teórica e programática do movimento, tarefa que lhe foi atribuída até sua morte em combate, em 1976. Mais do que uma visão panorâmica sobre o projeto político de Fonseca Amador, a análise interessa-se por abordar o tratamento da questão nacional nesse projeto. A discussão em torno da questão nacional, na América Latina, revestiu-se historicamente de um significado particular referente a uma oposição entre o nacionalismo de origem popular, de reivindicação do acesso das classes dominadas à esfera de decisão política e econômica, e o nacionalismo burguês de consolidação de um Estado nacional alinhado aos interesses das classes dominantes. Assim, Vilas (1987) considera a questão nacional como fator desencadeador de processos revolucionários na história da América Latina, o que justifica o interesse analítico nesse aspecto particular. O conflito em torno da nação assumiu a faceta de um embate popular contra o Estado, este o eixo condensador da dominação de classe interna e da subordinação ao exterior. Conforme Vilas, a questão nacional dispôs sobre o enfrentamento *Mestranda em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bolsista CNPq. E-mail: [email protected]

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A questão nacional no projeto político de Carlos Fonseca Amador

FERNANDA FELTES*

Em 19 de julho de 1979, as forças revolucionárias nicaraguenses, lideradas pela Frente

Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), irromperam nas ruas de Manágua para enfim

dar fim à ditadura somozista. Para propor a ruptura política, social e econômica, os sandinistas

recorreram a projetos que incluíam a adoção de uma economia mista, expropriação de

latifúndios e medidas para sanar problemas crônicos no país, como o analfabetismo. Neste

trabalho, pretende-se abordar não os produtos da Revolução Nicaraguense, mas os

antecedentes que determinaram e direcionaram o processo revolucionário. Assim também se

procura refletir sobre o período de formação do projeto político revolucionário do principal

articulador da FSLN na fase pré-revolucionária, Carlos Fonseca Amador. Como defensor da

importância de reformular e definir uma estratégia política que pudesse ampliar a base da

FSLN e como seu primeiro secretário-geral, Carlos Fonseca Amador foi também o

responsável pela inclusão do componente “sandinista” na sigla e pela estruturação teórica e

programática do movimento, tarefa que lhe foi atribuída até sua morte em combate, em 1976.

Mais do que uma visão panorâmica sobre o projeto político de Fonseca Amador, a

análise interessa-se por abordar o tratamento da questão nacional nesse projeto. A discussão

em torno da questão nacional, na América Latina, revestiu-se historicamente de um

significado particular referente a uma oposição entre o nacionalismo de origem popular, de

reivindicação do acesso das classes dominadas à esfera de decisão política e econômica, e o

nacionalismo burguês de consolidação de um Estado nacional alinhado aos interesses das

classes dominantes. Assim, Vilas (1987) considera a questão nacional como fator

desencadeador de processos revolucionários na história da América Latina, o que justifica o

interesse analítico nesse aspecto particular. O conflito em torno da nação assumiu a faceta de

um embate popular contra o Estado, este o eixo condensador da dominação de classe interna e

da subordinação ao exterior. Conforme Vilas, a questão nacional dispôs sobre o enfrentamento

*Mestranda em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bolsista CNPq. E-mail:

[email protected]

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entre a nação como forma ideológica da articulação entre a classe dominante local e a

dominação internacional e a nação defensora da ideia de soberania nacional como atributo da

emancipação social interna e externa. Noutros termos, a questão nacional popular expressa

reação e ruptura a uma dupla articulação entre dependência e assimetria social, situada no

interior do território e em sua relação com o exterior.

Especificamente na Nicarágua da década de 1960, a disputa pela nação combatia o

projeto político somozista, que Rodrigues (1991) qualifica como o projeto político do capital.

De acordo com a autora, o somozismo ganhou força num país cuja burguesia abriu mão da

participação direta na esfera política dirigente, contrariando a tendência verificada noutros

países latino-americanos de uma direção burguesa do projeto que conformou o Estado

nacional. Somou-se a isso o não-ajuste entre elementos arcaicos e modernos que limitou o

aburguesamento das elites do campo, gerando um fenômeno incompleto de modernização e

afetando substancialmente a forma da burguesia nicaraguense. A autora diz ainda que, nesse

ínterim, os EUA se responsabilizaram pela instituição dos “alicerces políticos da nação

nicaraguense” (RODRIGUES, op. Cit., p. 13).

Sob o somozismo, o quadro de dependência e assimetria, além da pressão sobre a

população socialmente diferenciada, se agravaram pelo processo de expansão da produção

agroexportadora e de integração ao capitalismo monopólico (BAMBIRRA, 2015). A

vinculação se deu por meio da exportação de produtos primários: primeiro o café e, a partir da

década de 1950, o algodão, que consolidou a integração da Nicarágua ao mercado

internacional. Após um processo de extensa expulsão da população camponesa, em função da

concentração fundiária para a produção de algodão e da pecuária, ambas para exportação,

houve sensível deslocamento populacional em direção às zonas urbanas e às fronteiras

agrícolas. A população em êxodo não pôde ser absorvida pelo incipiente setor industrial e o

quadro era de proletarização, por meio do emprego em atividades sazonais e não-produtivas

(VILAS, 1986). Nesse ínterim, a produção de alimentos para consumo interno e a tecnologia

voltada ao setor estancaram – processo fortalecido pela concentração de terras para o cultivo

do algodão ou para a pecuária extensiva. Em resumo, viveu-se um quadro de superexploração

da força de trabalho e severa precarização das condições de vida nas décadas de 1950 e 1960.

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A fase final da ditadura somozista foi marcada também pela intensificação das práticas

repressivas apoiada em organismos como o Conselho de Defesa Centroamericano – Condeca

- e pelo intervencionismo outorgado pela Aliança para o Progresso, além de se fortalecer pela

via do anticomunismo. Finalmente, percebia-se também a reorganização da oposição, que

contou com o impulso cedido às mobilizações populares pela morte de Somoza García pelas

mãos de Rigoberto Pérez Lopez, em 1956, e pela eclosão da Revolução Cubana. A fase de

organização que culminou na formação da Frente foi contemporânea de um momento de

ascensão do movimento estudantil na Nicarágua (LOZANO, op. Cit.), ao passo que a

organização sindical e a consolidação de uma classe operária no país foram historicamente

dificultadas pela desarticulação econômica (VILAS, 1986) e pela negação da condição de

classe ao trabalhador (RODRIGUES, 1991). Também se intensificaram e organizaram os

intentos guerrilheiros na Nicarágua, sob a influência do sucesso cubano.

Assim, acredita-se que nesse período houve condições para a articulação da

contestação e da resistência popular, ainda que a desarticulação econômica e a diferenciação

social tenham sido obstáculos persistentes à consolidação de uma contraposição articulada.

Essa última característica, aliás, em muito se relacionou aos reveses enfrentados pela FSLN

antes de explicitar sua diretriz programática, no fim da década de 1960. Da mesma forma, a

discussão sobre estratégias adequadas à ampliação das bases dos movimentos antissomozistas

e anti-imperialistas foi constantemente expressada nos textos que compuseram o projeto

político de Fonseca Amador.

Esse foi também o período em que Fonseca Amador destacou-se como líder político e

intelectual de característica nacionalista, marxista e radical. O sandinista advogava pela

adoção de um projeto político socialista em que se reconhecesse o legítimo homem

nicaraguense – para o que partia das reflexões de Sandino – e que se propusesse a combater os

problemas específicos da Nicarágua. Neste estudo, Fonseca Amador retém papel de sujeito

fundamental e fio condutor no esforço de entendimento do período que fundamentou a

Revolução.

Composição e conteúdo da nação: questões sobre o projeto político

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Tomando um projeto político como elemento organizador e expressão de princípios

orientadores da ação política dos sujeitos (DAGNINO, 2004, p. 98), assume-se sua função

articuladora e institucionalizadora (BARTZ, 2014), bem como de transformação, e sua faceta

de intervenção sobre as disputas de poder. A estruturação de um projeto decorre e é

dinamizada pelo acúmulo de prática política, assim como pelo avanço da autoconsciência

crítica do sujeito político representado nessa formulação. Dagnino (2006) sublinha a

importância de reconhecer as determinações estruturais que influem sobre a ação política do

sujeito e sobre o desenvolvimento de seu projeto político: “o reconhecimento do papel do

sujeito e da agência na política não deve ignorar os limites com que se confronta, sob pena de

confundi-lo como equivalente à mera afirmação do voluntarismo” (DAGNINO, op. cit., p.

41). Estes limites são perceptíveis, conforme a autora, na relação conflitiva travada por

projetos em disputa e também por condições estruturais, recursos e oportunidades. Dagnino

defende também a compreensão de um projeto como resultado de ações políticas específicas

e, portanto, não como um processo natural e inexorável. De acordo com a autora, afirmar a

agência do sujeito é importante para demonstrar sua influência na dimensão política e acenar

para a existência de opções e alternativas construídas historicamente.

Tendo em vista a síntese produzida pelas determinações estruturais, condições de

organicidade e pela agência de sujeitos é que se pretende avaliar alguns pontos sobre o projeto

político analisado, especialmente seu conteúdo no que tange à questão nacional. O estudo está

amparado em 23 textos de autoria de Carlos Fonseca Amador, veiculados entre 1968 e 1976.

Para definir este recorte temporal, considerou-se a nomeação de Fonseca

Amador como secretário-geral da FSLN e o momento de formalização programática da

Frente, ambos situados em 1968. A data final do recorte, 1976, refere o ano em que o

sandinista foi morto em combate. As fontes foram qualificadas como textos que refletem a

expressão do projeto político de Fonseca Amador já articulado à FSLN, ou seja, não como

referente único da FSLN, mas como importante representante e articulador de sua atividade. A

opção pela produção de Fonseca Amador corresponde, assim, à recepção de seu projeto pela

Frente Sandinista: líder formador do movimento, Fonseca Amador foi desde o início

reconhecido organizador de sua atuação.

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Em 1968, ano em que foi nomeado secretário-geral da FSLN, Carlos Fonseca Amador

postulou a necessidade de uma mudança radical do sistema capitalista. O caráter

revolucionário do projeto político propugnado pelo autor previa fundamentalmente a

libertação da Nicarágua de sua condição neocolonial. Essa característica era

assumida por ele enquanto produto de uma ininterrupta condição de dominação estrangeira: a

continuidade na transposição do domínio colonial espanhol pela intervenção estadunidense

embasava a declaração de Fonseca de que a libertação da Nicarágua nunca havia ocorrido.

Como solução ao problema, o sandinista propunha o desencadeamento de uma revolução:

No momento atual se faz necessário que proponhamos com grande ênfase que nosso

magno objetivo é a revolução socialista, uma revolução que se propõe a derrotar o

imperialismo ianque, seus agentes locais, os falsos opositores e os falsos

revolucionários. Esta propaganda, com o respaldo consequente da ação armada,

permitirá à Frente ganhar o apoio de um setor das massas populares que seja

consciente de toda a profundidade da luta que realizamos. (Nicaragua Hora Cero,

1969, in: FONSECA, 1982, p. 93)

O modelo revolucionário defendido por Fonseca Amador era o de um processo

nacional, anticapitalista e anti-imperialista, liderado pelo instrumento político-militar de

vanguarda das massas, a Frente Sandinista de Libertação Nacional, cuja composição não

poderia prescindir de estudantes revolucionários, por sua “rica experiência política” (Mensaje

del FSLN, 1968, in: FONSECA, op. Cit., p. 70). A FSLN seria o organismo capaz de prover a

reunião popular fundamental ao êxito revolucionário: “Só o povo e seus representantes

revolucionários; só um movimento como este, que agrupa operários, camponeses, jovens,

mulheres, na mesma acometida, pode assegurar o porvir da Nicarágua” (El FSLN, 1971 in:

FONSECA, op. Cit., p. 366). A libertação e a justiça eram, de acordo com Fonseca, a

encarnação do ideal da revolução: a libertação nos termos da superação do sistema capitalista

e na conquista da soberania nacional. A defesa dessa libertação guardava estreita relação com

a evocação dos “heróis nacionais” nicaraguenses, e fundamentalmente Augusto Sandino,

tomado como um líder libertador da pátria. A defesa desses heróis contribuiu, no bojo desse

projeto, à reivindicação de um processo que expressasse as características nicaraguenses,

previsse soluções aos problemas desse território, e que, por operar sob o método da luta

armada, não se filiasse irrestritamente aos postulados do internacionalismo marxista.

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A perspectiva nacional contida nesse projeto imbricava-se às reivindicações de

emancipação social pela via socialista, política externa independente e solidariedade entre os

povos. Observa-se aqui um vínculo indissolúvel entre a revolução e a questão nacional, que

Vilas (1987) atribui à extrapolação da questão nacional nos países subordinados ao

imperialismo: onde a independência política foi um fenômeno insuficiente do ponto de vista

popular, a questão nacional tornou-se um aporte significativo à defesa da soberania nacional.

Também a característica popular do processo é considerada pelo autor como intrínseca a seu

componente nacional – no marco do referencial marxista, o futuro revolucionário só é

possível pelas mãos das classes exploradas.

Por tudo isso, é possível afirmar que o projeto de Fonseca Amador visava direcionar a

ruptura em dois sentidos articulados entre si: o fim da dinastia somozista e da política de

acordos entre conservadores e liberais (que o autor considerava falsos opositores); e a

supressão da intervenção estadunidense, em suas facetas militar, política e econômica. A

projeção relacionava-se centralmente aos intentos de soberania nacional e demonstrava a

intenção de ruptura desse projeto com as duas faces da dependência: a interna, representada

pelas classes dominantes alinhadas ao somozismo, e a externa, identificada com o

intervencionismo e imperialismo estadunidenses.

Também em sua faceta anti-imperialista Fonseca Amador buscava mediar as possíveis

aproximações de seu projeto com um horizonte de internacionalismo ou, no mínimo, de

regionalização da luta popular revolucionária. Ao explicitar sua perspectiva nacional, não

negava a validade do modelo internacional e internacionalista de luta. O enfoque da

solidariedade e da irmandade, por exemplo, eram enfatizados pelo sandinista e reforçados

diante das tentativas somozistas de transformar a Nicarágua em base para agressões a Cuba. O

combate ao imperialismo estadunidense era tratado em termos de luta internacionalista (Por

un Primero de Mayo guerrillero y victorioso, 1969; Juramos cobrar venganza..., 1969 in:

FONSECA, op. Cit.) e assim também a oposição ao modelo liberal e imperialista de

integração centroamericana firmado pelo Condeca – Conselho de Defesa Centroamericano -

(Por un Primero de Mayo guerrillero y victorioso, 1969; Síntesis de algunos problemas

actuales, 1975 in: FONSECA, op. Cit.). Nesse mesmo âmbito, aliás, aventava-se a

possibilidade de “centroamericanização” da luta (Síntesis de algunos problemas actuales,

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1975 in: FONSECA, op. Cit., p. 111) como atitude em defesa de uma integração regional

alinhada ao interesse popular e revolucionário. A conclamação à segunda independência

referida pelo autor e característica na América Latina nesse período, atravessava portanto o

sentido nacional e atingia o sentido internacional da luta por meio de sua reivindicação anti-

imperialista. Acredita-se, por conseguinte, na ocorrência de um internacionalismo latente no

projeto político de Fonseca Amador, quer fosse para validar sua integração ao campo

socialista, expressar e referendar o princípio marxista que o mobilizava, quer fosse para

sustentar a solidariedade internacional. Mas a questão nacional, e consequentemente uma

perspectiva nacional de luta, permaneceu como foco desse projeto.

Em virtude da necessidade de difusão do projeto revolucionário que Fonseca Amador

percebia naquele momento, o autor reivindicava o estabelecimento de um

programa objetivo e explícito em suas influências e em sua finalidade revolucionária, de

modo a não confundir a população de “baixo nível político” (Nicaragua Hora Cero, 1969, in:

FONSECA, op. Cit., p. 67). Esse programa criaria condições para o desenvolvimento de uma

força política independente dos partidos políticos tradicionais e capitalistas da Nicarágua, e

sua aplicação culminaria no êxito revolucionário. A ameaça de manipulação da massa pelos

partidos políticos tradicionais – assim considerados fundamentalmente por sua perspectiva

capitalista – e os riscos de distorção de uma insurreição sem um projeto definido manifestados

por Fonseca Amador determinavam a urgência no trabalho de comunicação da FSLN e de

educação política da população.

No bojo da crítica aos partidos tradicionais, Fonseca Amador adjetivou o Partido

Socialista Nicaraguense (PSN) como “pseudo-marxista”. A crítica do sandinista às escolhas

do PSN relacionava-se a um cenário mais amplo, que extrapolava a própria Nicarágua e

referia a relação dos partidos comunistas e movimentos marxistas com as diretrizes

recomendadas pela União Soviética. Para ele, a ortodoxia assumida pelo PSN, que envolvia a

conciliação com a classe capitalista e o rechaço à luta armada, era causa de “violação dos

princípios proletários” (Síntesis de algunos prolemas actuales, 1975, in: FONSECA, op. Cit.,

p. 107). Além disso, era antinacional ao não corresponder aos desafios particularmente

nicaraguenses e limitava sua ação por mera fraseologia revolucionária. A análise do autor foi

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contundente ao avaliar que, por seu posicionamento, o setor pseudo-marxista serviu aos

propósitos somozistas (Nicaragua Hora Cero, 1969, in: FONSECA, op. cit).

A crítica à ortodoxia comunista de matriz soviética foi um dos nexos que permitiu a

Fonseca Amador avançar na reflexão em torno de uma revolução genuinamente nicaraguense.

Aí desvelou-se um dos elementos centrais da caracterização da questão nacional no projeto

político do sandinista. De acordo com ele, em texto de 1975,

Declamar o nome do socialismo e o título das mais conhecidas teorias

revolucionárias, não garante a profundidade das transformações a que nos

propomos. (…) a fraseologia revolucionária não garante a profundidade da

mudança (…) Podemos encontrar palavras no nosso vocabulário histórico

tradicional e na própria riqueza do idioma, para dar a imagem do caráter radical

de nosso processo, sem necessidade de apelar aos mais conhecidos clichês. (Síntesis

de algunos problemas actuales, 1975, in: FONSECA, op. Cit., p. 98, grifos meus)

A defesa do autor era de que se utilizassem as “leis universais que conduzem à transformação

da sociedade capitalista em uma sociedade de homens livres” (Síntesis de algunos problemas

actuales, 1975, in: FONSECA, op. Cit., p. 98) em benefício do tratamento particular e

nacional dos fatores mobilizadores da revolução na Nicarágua. Finalmente, o nacionalismo e

o patriotismo eram considerados imprescindíveis ao avanço do socialismo no país, uma vez

que neles estava contida a defesa do direito à soberania nacional e o combate ao imperialismo.

Cabe aqui sublinhar o atrelamento entre a defesa de uma perspectiva nacional e a

relação de antagonismo com a classe política tradicional nicaraguense e a elite dirigente

somozista. Tais sujeitos, qualificados como antinacionais por Fonseca, seriam opositores do

patriotismo com que o sandinista identificava as massas e os nicaraguenses honestos.

Conforme o autor, só poderiam participar do esforço da luta popular os indivíduos

provenientes das classes exploradas. Essas considerações demonstram que também o ideal de

honestidade defendido nesse projeto político integrava uma acepção de patriotismo que era

necessariamente anticapitalista.

A adesão e a liderança na fase de organização do processo revolucionário, como já

mencionado, deveriam ser mobilizadas pela fração estudantil da sociedade, organizada como

a vanguarda sandinista. A extensão da opção revolucionária a estudantes correspondia ao

interesse em estimular sua vinculação orgânica à causa revolucionária e também em efetivar

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sua integração na vanguarda. O protagonismo estudantil seria produto de fatores como o

interesse em precaver o movimento da manipulação ideológica dos partidos políticos

capitalistas, por meio da educação política, e a opção por iniciar o processo no ambiente

urbano, onde se situavam os grupos estudantis atrelados à universidade, para somente a seguir

partir na direção do ambiente rural. Fonseca Amador assumia, assim, a centralidade do meio

urbano como eixo articulador do movimento e a preponderância do espaço rural para o

desenvolvimento tático da ação revolucionária1. A atitude que propiciaria o vínculo real

desses estudantes com o movimento era a proletarização e a vivência na guerrilha, esta última

considerada por Fonseca como determinante na conquista da disciplina adequada à revolução.

Para além disso, é perceptível que a valoração da experiência estudantil – e particularmente

acadêmica – ocorreu em detrimento da valoração da experiência de operários e camponeses,

num contexto em que se enfatizou também a potencialidade da vanguarda na correção dos

desvios do movimento popular2.

Na direção da crítica a esse ponto, é importante retomar o argumento de

Vilas (1986), segundo o qual a profunda desarticulação econômica na Nicarágua somozista

implicou a significativa desmobilização popular, principalmente no âmbito da organização

sindical. Eram reiteradas as críticas de Fonseca Amador à desorganização sindical e

camponesa na Nicarágua, o que refletia em sua preocupação com a organização e

institucionalização da luta popular por meio da vanguarda revolucionária. Acredita-se que o

“baixo nível político das massas” (Nicaragua Hora Cero, 1969, in: FONSECA, op. Cit.) tenha

sido, por um lado, elemento de uma visão cristalizada de classe, na qual não estavam

presentes componentes particulares da Nicarágua e, por outro, uma leitura imediata da

condição desarticuladora da distribuição dos trabalhadores no país. De qualquer modo, é

possível afirmar que Fonseca Amador identificou uma imaturidade política dos trabalhadores

1 A proposta de Fonseca Amador remetia às orientações guevaristas de instalação do núcleo guerrilheiro

em terreno favorável, interposição das forças urbanas como proteção do ambiente rural e potencial do meio

urbano na estruturação do aparelho revolucionário (GUEVARA, 2012, p. 301). Tal ordenação atribuía a tarefa de

orientação estratégica do movimento aos grupos provenientes do meio urbano, ao passo que dispunha do

ambiente rural como o meio no qual as atividades deveriam ser desenvolvidas. 2 Observe-se que Fonseca Amador eventualmente desqualifica as ações e a situação política das massas

antes da centralização sob a liderança da FSLN. É importante ressaltar essa percepção por suas consequências

sobre o projeto político do autor, que incorre numa perspectiva mecanicista sempre que deixa de abordar as

especificidades de classe na Nicarágua.

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– ou a não-expressão de seus interesses de classe, conforme Vilas (1987) – no que se referia à

proposição de um projeto político.

A reiterada defesa ao protagonismo estudantil encaminha outro questionamento

analítico: quais as atribuições de operários e camponeses no projeto político de Fonseca

Amador? Em 1968, ao analisar as condições específicas da Nicarágua, o sandinista assinalava

a desorganização sindical. Em relação aos camponeses, Fonseca Amador considerava também

recente a ocorrência de reivindicações de teor classista. Essas conclusões contribuíam à defesa

de uma vanguarda eminentemente estudantil em seu projeto político, mas atrelada à fase

preliminar de organização da luta revolucionária. Essa fase caracterizava-se, conforme

Fonseca Amador, especialmente pelo provimento da educação política de operários e

camponeses e pela manifestada preocupação do autor com a difusão do projeto revolucionário

entre a classe proletária, necessidade constatada pela experiência do movimento

contemporâneo de libertação nacional (Mensaje del FSLN, 1968, in: FONSECA, op. Cit.).

Ao analisar a classe operária nicaraguense, Vilas (1986) sustenta o argumento do

desenvolvimento desigual para abarcar particularidades da Nicarágua em relação à região

centro-americana. Dentre as características desse desenvolvimento, o autor menciona a

instabilidade ocupacional e a sazonalidade como fundamentos do processo de proletarização

que se consolidou pela expansão da cultura algodoeira. O setor rural foi o mais afetado pela

proletarização, em função da intensa expulsão dos camponeses pela ampliação das terras para

cultivo de algodão e da expansão do auto-emprego como consequência da exígua capacidade

de emprego da força de trabalho existente em termos gerais. Concorreu para isso também uma

situação de hibridização, relacionada ao processo inconcluso de separação de bens e

meios de produção, conformando um semi-proletariado que não podia viver do produto de sua

propriedade, era obrigado a vender sua força de trabalho e correspondia à parte significativa

do campesinato nicaraguense. A subordinação ao capital por esses grupos, conforme Vilas, se

deu de maneira formal mais do que de maneira real, ou seja, mais no âmbito das alternativas

de subsistência do que no processo de assalariamento.

As considerações de Vilas contribuem à reflexão sobre os fatores que motivavam

Fonseca Amador a insistir no “baixo nível político e ideológico das massas”. Contudo,

também permitem que se verifique os limites desse projeto político no que dizia respeito à

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compreensão e reconhecimento do camponês como sujeito político e precisamente como

sujeito nacional. Soto (1985) defende que

Se os camponeses nunca estiveram desligados da política, a política tampouco pode

estar desligada dos camponeses, trate-se da política eleitoreira dos partidos

tradicionais ou trate-se da política revolucionária, os primeiros sempre entenderam

assim, os segundos muitas vezes se aferram a um obreirismo que impede incorporar

o camponês às lutas libertárias de nossos povos (SOTO, 1985, p. 117)

Fonseca Amador tardiamente assumiu postura de valorização da potência política dos

camponeses: em 1976 elogiou qualidades que se vinculavam a seu menor grau de exposição à

penetração ideológica capitalista e pseudo-opositora, às virtudes revolucionárias legadas pela

memória da experiência de Sandino e à aguda mentalidade de guerra própria dessas

populações (Notas sobre la montaña y algunos otros temas, 1976, in: Fonseca, op. Cit., p.

138). Persistia, no entanto, a defesa do obreirismo e da vanguarda para provimento da

educação política:

as virtudes revolucionárias do camponês de nossas comarcas e montanhas, estão

condenadas à letargia de não estar presente o guerrilheiro operário procedente das

grandes explorações capitalistas do país, sem excluir o estudante de extração

proletária ou devidamente proletarizado (Notas sobre la montaña y algunos otros

temas, 1976, in: Fonseca, op. Cit., p. 137)

A leitura de Fonseca Amador para os movimentos liderados por camponeses estava

vinculada à crítica da falta de reivindicações classistas nessas ações (Mensaje del FSLN,

1968, in: FONSECA, op. Cit.). Por outro lado, o autor recomendava o contato com os

camponeses como fator de proletarização e de fortalecimento dos desejos de luta por meio da

proximidade com a “miséria que padecem os camponeses” (Nicaragua Hora Cero, 1969 in:

FONSECA, op. Cit., p. 93). Ou seja, Fonseca Amador atribuía especificidades à população

camponesa, mas a valoração de sua participação na ação revolucionária era restrita. Também é

possível sugerir que os processos de proletarização da população camponesa e significativo

êxodo rural consolidados pela expansão da propriedade algodoeira a partir da década de 1950

contribuam à preponderância de operários sobre camponeses no projeto de Fonseca Amador.

De acordo com Zimmermann (2012), aproximadamente metade da população nicaraguense

vivia na zona urbana nesse momento.

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O que se pode depreender dessas considerações é que o tratamento cedido por Fonseca

Amador à participação de camponeses e operários na luta revolucionária imbricava-se na

necessidade de educar esses setores para o desenvolvimento da revolução e situá-los num

modelo revolucionário balizado pela existência da vanguarda e pela necessidade de criar as

condições para a emergência de uma liderança operária. As preocupações do autor com os

riscos de uma insurreição desorganizada e espontaneísta se relacionavam a suas constatações

em torno da imaturidade política percebida em camponeses e operários, o que limitava o

entendimento do sandinista sobre a participação desses sujeitos na composição da nação e na

estruturação do movimento revolucionário. Apesar de especificar atitudes e objetivos voltados

especificamente para esses setores da população, a centralidade cedida por Fonseca Amador

ao tratamento das atribuições de estudantes contribui a que se conclua que este projeto

político teve como finalidade fundamental a organização preliminar, ou, dito de outro modo, a

institucionalização da luta revolucionária. As demandas elencadas em Por un Primero de

Mayo guerrillero y victorioso (1969, in: FONSECA, op. Cit.), por exemplo, não continham

postulados propriamente revolucionários, mas cabíveis à tarefa de educação política que daria

as condições para a estruturação da luta popular. Ao se voltar a objetivos tão específicos como

a redução nos impostos de água e luz, ou a redução no valor do aluguel, Fonseca Amador

investia em reivindicações com potencial organizador sobre o conjunto das lutas populares.

Acredita-se, por isso, que a expressão dessas demandas possuía finalidade educativa e

institucionalizadora ou, nos termos gramscianos, de elaboração da consciência (GRAMSCI,

1978, 1980).

A questão indígena, especialmente em relação a misquitos, sumus e ramas, que

ocupavam a costa Atlântica nicaraguense, também foi pouco detalhada no projeto político de

Fonseca Amador. Acredita-se que, além da defesa do obreirismo, tenham concorrido para isso

obstáculos à aproximação entre os misquitos e outros setores da população (MOLIERI, 1986).

Dentre as dificuldades pontuadas por Molieri, destacam-se o isolamento geográfico e a pouca

representatividade numérica dos misquitos sobre o conjunto da população, que se aproximaria

dos 4% da população total, além do “desconhecimento recíproco dos modos de vida” (idem,

ibidem, p. 3).

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Analisar essa característica do projeto político é uma tarefa informada pela

importância concedida por Fonseca Amador à questão nacional e à valorização do “sujeito

nicaraguense”. Considerando estes aspectos, sugere-se que poderiam ter sido abordados

elementos também subjacentes ao componente indígena da população. Entretanto, ao não

aplicar aos misquitos, sumus e ramas o pertencimento à nação, Fonseca Amador dissociou o

componente patriótico e nacional da dimensão classista e revolucionária em função de uma

perspectiva de revolução centrada na vanguarda e no operariado. A exclusão da dimensão de

classe nos desafios impostos aos indígenas não era inevitável diante da intensa exploração

econômica dessa população pelas empresas inversionistas. Um acercamento ancorado nas

dimensões nacional e de classe seria possível, por exemplo, considerando que,

ao mesmo tempo em que a forma capitalista de mercado se impunha em nível

internacional, novas relações sociais se conformavam na Mosquitía como resultado

da incorporação progressiva dos indígenas às novas formas de exploração, que

atentavam sem respeito algum contra suas tradições e costumes (MOLIEIRI, op.

Cit., p. 6)

O que se pretende identificar, ao abordar o enfoque dessa questão no projeto de

Fonseca Amador, é um ponto-limite de sua formulação. A pouca atenção do autor em relação

às questões indígenas é notável se cotejada com discussões que lhe eram contemporâneas. Em

publicação cuja primeira edição foi lançada em 1974, o também sandinista Jaime Wheelock

criticou a desvalorização histórica do índio em consequência de caracterizações que

enfatizavam seu caráter de “ator abjeto do processo colonialista” e seu “atraso cultural”

(WHEELOCK, 1985, p. 9). Assinale-se que, mais do que o período onde Wheelock localiza a

crítica, que refere o domínio colonial espanhol, interessa o tratamento despendido pelo autor à

questão no momento em que escreve. Entretanto, nesse ponto pode-se sublinhar também a

pouca influência que tiveram sobre o projeto de Fonseca Amador outras propostas latino-

americanas de filiação marxista que trataram da participação dos povos autóctones nos

processos revolucionários3.

Considerações finais

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No caso do projeto político de Fonseca Amador, postula-se que a questão nacional

indicava o sentido desse projeto e fortalecia a defesa de uma acepção de revolução

entrelaçada às características do território que seria por ela afetado. A questão nacional era a

ênfase escolhida para conclamar a população à unidade: a nacionalidade era assimilada pela

unidade de classe. Conforme esse entendimento, a questão nacional beneficiava um projeto

que pretendia exercer uma defesa popular da nação e afirmar suas características e

necessidades particulares em oposição ao interesse externo. Ao invocar a “amargura de deixar

a terra natal” e qualificá-la como um traço essencial do drama nicaraguense (Mensaje al

pueblo, 1970, in: FONSECA, op. Cit., p. 273) ou ao expressar especificamente a relação de

filiação dos nicaraguenses com o país (Carta a los nicaraguenses residentes em Estados

Unidos, 1973, in: FONSECA, op. Cit.), Fonseca Amador pretendia incentivar a coesão e a

unidade na defesa patriótica da nação.

A questão nacional nesse projeto era também a justificativa para a adesão crítica ao

referencial marxista, o que propiciava seu posicionamento numa disputa interna e legitimava a

opção sob a perspectiva externa. Como já se mencionou, a questão nacional atuava sobre dois

âmbitos: no âmbito interno, tencionava romper com a dinastia somozista e a estrutura estatal

sobre a qual repousava o somozismo. No âmbito externo, insurgia-se contra o

intervencionismo estadunidense que colocara a Nicarágua em situação de neocolonialismo,

conforme Fonseca Amador. Ambos, somozismo e imperialismo, eram identificados com o

capitalismo, sistema a ser superado pela revolução.

O conjunto de problemas que afetava a população foi situado sob a dimensão de classe

quando o autor, por exemplo, reuniu as debilidades debaixo do signo da “exploração conjunta

do povo”. Essa exploração era partilhada entre a classe capitalista governante e a classe

capitalista opositora, por isso caracterizadas como antinacionais e antipatrióticas. A

elaboração dos valores intrínsecos ao temperamento antinacional contribuiu na caracterização

da unidade do setor antissomozista.

No momento de estruturação do projeto de Fonseca Amador, a Nicarágua vivia trinta

anos de uma ditadura particularista, atrelada aos interesses estadunidenses, e protegida por

uma estrutura repressiva e pelo bipartidarismo formal dos partidos Conservador e Liberal. O

projeto político do capital encarnado pelo somozismo (RODRIGUES, 1991) determinou o

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modelo de modernização capitalista na Nicarágua, que implicou a expulsão massiva de

camponeses, em virtude da concentração fundiária, e a proletarização. O projeto político de

Fonseca Amador dialogou com esses fatores, especialmente no que dizia respeito à condição

antinacional da economia vigente e às implicações dessa desarticulação econômica para a

organização da população. Fonseca Amador não tratou do assunto nesses termos, e não é

possível afirmar que sua análise tenha explicitado uma relação de causalidade entre a

desarticulação econômica e a desorganização sindical. O autor explorou mais os problemas

provenientes do que ele concebeu como desorganização sindical e “baixo nível político” do

que as causas desse fenômeno, ainda que a manipulação por “falsos revolucionários” e

“pseudo-opositores” tenha sido elencada como componente da origem do problema.

Ao abordar as particularidades da Nicarágua, o sandinista pontuou a injusta

distribuição de terra, as debilidades extremas nas áreas de saúde e educação, a longevidade

das agressões externas, a tirania e o peculato impetrados pelo regime somozista. Somoza era

identificado por Fonseca Amador como articulador do capitalismo na Nicarágua, ainda que

em grande medida influenciado pelos interesses estadunidenses. O início do período

somozista era abordado como marco para o estabelecimento do neocolonialismo na Nicarágua

e para a ampliação da “entrega das riquezas nacionais aos monopólios ianques” (Nicaragua

Hora Cero, 1969, in: FONSECA, op. Cit., p. 75). O tratamento da questão nacional por

Fonseca Amador, no que concernia a Somoza e seus aliados, reforçava a necessidade de se

pontuar uma distinção objetiva entre quem integrava a nação e quem dela não participava.

Nesse ponto, o projeto político de Fonseca referia as mesmas acusações de traição da pátria

que, quarenta anos antes, haviam mobilizado Sandino. Essa distinção entre o elemento

nacional e o antinacional foi, portanto, uma das bases da disputa entre os projetos políticos

revolucionário e somozista.

Alguns limites são perceptíveis no projeto político de Fonseca Amador, e destacam-se

aqui as lacunas na identificação das características próprias de operários e camponeses

nicaraguenses, a dificuldade em superar uma visão mecânica no tratamento desses sujeitos, a

escassa menção ao componente indígena da população e daí também os obstáculos à

apresentação de propostas estruturadas para o diálogo com esses sujeitos. Essas constatações

revelam indícios que apontam para os limites da organicidade desse projeto político e

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contribuem inclusive para entender o conteúdo assumido pela Revolução Nicaraguense após

sua eclosão. Por outro lado, é precisamente nessa relação com o que veio a ser a Revolução

que reside a importância de se perceber a influência do projeto político traçado por Fonseca

Amador sobre a conformação do processo. Além disso, as conclusões prévias indicam o modo

como este sujeito lidou com as condições que lhe foram contemporâneas e demonstram seu

diálogo com outros projetos latino-americanos postos em prática no período, contribuindo

para apreender suas aproximações e seu compromisso com as revoluções que se colocavam

no horizonte.

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