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A revisão da condição de ser mulher no mundo estará esgotada? Estarão desconstruídos os velhos e engessados padrões sociais de masculinidade e feminilidade? Mesmo depois das muitas conquistas alcançadas pelas mulheres em todos setores da sociedade ocidental, devemos admitir, no entanto, que diante da visão androcêntrica que se impõe como neutra, da legitimação e naturalização dos discursos que ratificam a dominação masculina, ainda há questões pendentes? E a escola? Como tem sido a atuação dos professores, aqui especificamente, os da área artística nesta empreitada? Têm sido repensadas em suas práticas diárias e colocadas em ação certas questões que envolvem gênero e arte? Os (as) professores(as) têm estado atentos(as) à esta tendência de naturalização e ao condicionamento desta visão androcêntrica no ensino de arte, e refletido o quanto isto afeta a construção deste conhecimento? Qual seria o posicionamento da(o) professora(r) consciente e sensibilizada(o) por estas questões? O de propiciar ou facilitar a entrada da produção artística feminista na sala de aula, intencionando contribuir na formação do ser humano e na construção de um saber, pautados nas diferenças e não nas desigualdades de género também na Arte? Esta comunicação pretende além de levantar questões como estas, sensibilizar e provocar o debate acerca do tema, com a apresentação de um levantamento provisório das possíveis implicações entre Arte/Educação/Gênero. A partir da Proposta de Leitura de Imagens desenvolvida para o Ensino de Arte, é possível pensar em práticas alternativas e democráticas, ainda pouco exploradas em sala. Através das obras de arte das artistas feministas, pretende-se possibilitar aos alunos e alunas num primeiro momento, uma visualização desta produção específica na contemporaneidade e logo, abrir um espaço de discussão e reflexão entre os mesmos, sobre as desigualdades de género ainda existentes - numa interlocução entre arte e vida.

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Page 1: A PRODUÇÃO ARTÍSTICA DAS MULHERES E SUAS IMPLICAÇÕES NO ENSINO DE ARTE

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COUTINHO, A. (2007) A produção artística das mulheres e suas implicações no ensino de  arte.  In,  V.  Trindade,  N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora.  

 

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Segundo Loponte quando se refere à escolha, por exemplo, de obras de arte para os livros didáticos e livros de história da arte, “no discurso dominante sobre arte, as  imagens  selecionadas  afirmam  a  invisibilidade  da  mulher  como  criadora  [...] (Loponte,  2004),  a  própria  história  da  arte  oficial  negligencia  em  citá‐las.  Têm estado  os(as)  professores(as)  atentos(as)  à  esta  tendência  de  naturalização  e  ao condicionamento sofrido pela visão androcêntrica no ensino de arte? 

Não seria, então,  tarefa da(o) professora(r) – consciente e sensibilizada(o) por estas questões ‐ propiciar ou facilitar a entrada da produção feminista na sala de aula,  intencionando  contribuir  com  a  formação  do  ser  humano  pautada  nas diferenças e não nas desigualdades de gênero? Não seria importante dar um ponta‐pé inicial nesta direção? 

Segundo  a  historiadora  Joan  Scott,  na  efervescente  década  de  60,  “[...]  as ativistas feministas reivindicavam uma história que estabelecesse heroínas, prova da atuação das mulheres, e também explicações sobre a opressão e inspiração para a  ação”  (Scott,  1992:64).  Assim  se  fortaleceu  a  discussão  sobre  a  condição  da mulher,  motivada  pelos  crescentes  estudos  que  se  seguiram  ao  movimento feminista,  que  assinalou  o  início  da  luta  pelos  direitos  da  mulher  ocidental.  Os hábitos  e  costumes  femininos,  as  questões  de  gênero  de  lá  para  cá,  tornaram‐se objetos de pesquisa de inúmeras investigações, estando também incluídas, aquelas pesquisas que se interessam pela produção artística realizada particularmente por mulheres.  

Esta  área  de  pesquisa  nas  artes  plásticas  vem  dialogando  com  as transformações ideológicas provenientes das mudanças sociais nas últimas quatro décadas do século passado, com influências recíprocas entre a produção artística e o  feminismo.  Os  resultados  destas  investigações  têm  deixando  muitas contribuições para a sociedade num todo e não somente para o circuito artístico, entre elas, podemos citar: a recuperação histórica de nomes de mulheres artistas ocultos,  marginalizados  ou  esquecidos,  através  de  publicações  e  exposições  (a partir  dos  anos  70);  o  crescimento  da  produção  de  obras  de  arte  que  revelam  a preocupação  com  a  desconstrução  dos  padrões  tradicionais  e  estereótipos  de feminilidade/masculinidade (anos 80); a adoção de estratégias para potencializar a voz e dar maior visibilidade às mulheres, em busca de novos paradigmas através da arte (anos 90) (Martinez, s/d:16‐23). 

As  artistas  feministas3,  como  ficaram  conhecidas  a  partir  da  década  de  60  do século XX, são mulheres engajadas na crítica ao poder falocrático também na arte.  

“Nos museus e academias, as mulheres artistas protestavam, requerendo direitos  iguais.  Elas  organizavam  as  suas  próprias  exposições,  galerias auto­geridas  e  aulas  de  arte  autônomas.  Além  disso,  buscavam  meios 

3  Arte  Feminista  é  uma das  correntes  de  produção  da  contemporaneidade.  Tendo  como precursoras  Frida Kahlo,  Judy  Chicago,  Eva  Hesse  e  Louise  Bourgeois.  Atualmente,  esta  tendência  possui  adeptas  por  todo  o mundo. Estas artistas feministas objetivam alertar e dar voz às mulheres através de suas obras de arte. 

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COUTINHO, A. (2007) A produção artística das mulheres e suas implicações no ensino de  arte.  In,  V.  Trindade,  N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora. 

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políticos  de  romper  com  as  estruturas  dominadas  pelo  homem” (Grosenick, 2001:7).  

Passaram,  então,  a  formar  um  grupo  coeso  de  pensamento  e  produção, direcionando suas obras para as questões do feminino e do feminismo, produzindo imagens  e  representações  do  universo  singular  da  mulher  pelo  ponto  de  vista feminino, criando uma arte feita por e a propósito de mulheres. 

O  tema  mulher  por  vezes  quer  representar  ou  evocar  simbolicamente  as experiências  corporais  e  rituais  femininos  (artistas  sensualistas  como  Antoni, Sylvie Fleury, etc), outro grupo, de ordem mais conceitual, direciona sua produção para as questões políticas e sociais, sendo contra o racismo, a violência e todas as imposições  sofridas  pelas  mulheres  (Beecroft,  Paula  Rego,  Adrian  Piper,  Beth Moysés, Rosana Paulino, etc). Na linha autobiográfica, as obras revelam a história de vida da própria artista, as vivências pessoais e a intimidade são transformadas em experiência estética (Calle, Marina Abramovic e outras). Os meios expressivos mais utilizados são o vídeo, as instalações, fotografia, novas tecnologias, realização de performance, além dos tradicionais como a gravura, a escultura, o desenho e a pintura. 

As  inúmeras  facetas  de  ser  mulher  estão  eternizadas  nas  obras  de  pioneiras como  Frida  Kahlo  (México),  Eva  Hesse  (Alemanha),  Ana  Mendieta  (Cuba),  Judy Chicago  (USA),  Louise  Bourgeois  (França),  hoje  somadas  às  obras  de  Cindy Sherman  (USA),  Maya  Goded  (México),  Vanessa  Beecroft  (Itália),  Sophie  Calle (França),  Janine  Antoni  (Bahamas),  Grupo  Guerrilla  Girls  (USA),  entre  outras  do cenário  artístico  atual.  Fazendo parte do perfil  eclético do pensamento  feminista na  arte  contemporânea,  estão  também  as  artistas  brasileiras  Beth  Moysés  (SP), Rosana Paulino (SP) e Paula Rego (Portugal), as quais este estudo quer enfocar. 

No entanto, mesmo que a produção dessas artistas e muitas outras não citadas neste  trabalho  já  estejam  legitimadas  ou  reconhecidas  pela  crítica  e  o  circuito artístico  oficial,  mesmo  que  o  currículo  previsto  para  o  ensino  de  arte  não determine quais artistas devam ser mencionados e/ou  trabalhados com alunos e alunas,  as  artistas  parecem  estar  passando  à  margem  das  salas  de  aula.  Se  na formação acadêmica se faz notar que estas produções feministas estão geralmente à  deriva,  isto  é,  são  pouco  ou  nada  discutidas,  todo  este  antecedente  acaba  por reforçar  e  naturalizar  a  invisibilidade  das  obras  produzidas  pelas  artistas mulheres. 

Assim, nos deparamos aqui com uma ausência e uma necessidade de revisão na área da formação educacional. Segundo Loponte (1998: 14), 

“(...) um estudo relacionando gênero e ensino de arte pode contribuir de forma relevante à pesquisa sobre ensino de arte e formação docente nesta área, bem como aos estudos relativos às questões de gênero e educação, já que este enfoque pouco ou nunca foi utilizado por pesquisadores (...)”. 

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COUTINHO, A. (2007) A produção artística das mulheres e suas implicações no ensino de  arte.  In,  V.  Trindade,  N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora.  

 

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Há uma carência comprovada no contexto brasileiro, e daí, a necessidade de se investigar  nesta  direção,  buscando  novas  frentes  que  propiciem  uma  maior abrangência do ensino de arte.  

Entendendo que, se a Escola é “responsável pela reprodução efetiva de todos os princípios de visão e de divisão fundamentais, e organizada também em torno de oposições  homólogas  poderá,  a  longo  prazo,  sem  dúvida,  [...]  contribuir  para  o desaparecimento  progressivo  da  dominação  masculina”  (Bourdieu,  2003:139)  e que se “[...] a história da arte e a apreciação artística, isto é, o ensinar a ver, não são mais  encaradas  na  escola  como  um  desvirginamento  da  expressão  infantil,  mas como um dos modos de iniciá‐la no conhecimento, na fruição e na comunicação do e com o mundo” (Barbosa, 1988:58), alicerçados por estes dois pilares, não caberia aos(as) professores(as) de arte, proporem uma mudança de paradigma?  

Em  posse  de  uma  proposta  de  leitura  de  imagens4  com  conteúdo feminino/feminista,  que  de  certa  forma  desconstrói  a  chamada  pedagogia  do feminino5,  é  possível  pensar  em  incluir  nas  práticas  diárias  “alternativas democráticas  que  poderão  dispor  para  divulgar  e  lutar  por  valores  ideais emancipatórios  e  não  discriminatórios”  (Mendes,  2005:9).  Propondo  “modos  de ver  menos  assépticos  [...]  ainda  pouco  explorados  no  ensino  de  artes  visuais”( Loponte,  2004),  o(a)  professor(a)  estaria,  através  das  obras  de  arte  das  artistas feministas,  possibilitando  aos  alunos  e  alunas  em  primeira  instância  uma aproximação com esta produção específica e logo, abrindo um espaço de discussão e reflexão sobre as desigualdades, criando uma interlocução entre arte e vida. 

Dando  conta  destes  instrumentos  que  abarcam  conhecimentos  sobre  Arte Feminista, Ensino de Arte e Relações de Gênero,  indago: Quais dentre as imagens de obras de arte, que se configuram dentro da chamada Arte Feminista, poderá ser tema  de  aula  de  arte?  Quais  artistas  mulheres  articulam  em  seus  trabalhos questões que podem auxiliar alunas e alunos na reconstrução de certos padrões? Quais  dessas  abordagens  poderão  efetivamente  criar  fissuras  ou  quem  sabe,  até mesmo, proporcionar um novo olhar e uma mudança de comportamento, que é a intenção  de  todo  processo  educativo?  Como  fazer  esta  transposição  da  teoria  e história da arte para a sala de aula? 

Mesmo  que  arte  contemporânea  seja  provocativa,  por  vezes  violenta  e  cruel, nada inofensiva, mesmo que esteja a acontecer...quais ganhos podemos tirar desta produção  inquietante  e  engajada,  tão  aproximada  do  cotidiano,  repleta  de intenções  de  transformações,  de  esperanças  de  um  mundo  melhor,  com  mais justiça  e  igualdade  nas  diferenças?  A  produção  dessas  artistas  toca  em experiências concretas, elas se utilizam da arte para tecer uma série de reflexões pautadas na vida  real. Esta  realidade  já não é percebida e vivenciada por muitas crianças e jovens que encontramos sentados nos bancos das escolas?   4 Proposta Triangular de Ensino de Arte: fazer, conhecer e criticar arte. 5  Segundo Loponte  (2002,  p.2),  pedagogia  do  feminino  é  “uma pedagogia  visual  que naturaliza  e  legitima o corpo feminino como objeto de contemplação [...]”. 

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COUTINHO, A. (2007) A produção artística das mulheres e suas implicações no ensino de  arte.  In,  V.  Trindade,  N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora. 

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Na  tentativa  de  travar  um  diálogo  com  as  inúmeras  questões  apresentadas, proponho  algumas  metas  norteadoras  diante  do  problema  levantado,  que poderiam ser sintetizadas da seguinte forma: 

1‐ Selecionar  as  imagens  produzidas  por mulheres  artistas  na  atualidade  ‐ cuja  temática  das  obras  estejam  diretamente  relacionadas  com  algumas questões  do  universo  feminino‐,  tentar  traçar  o  “como”  inseri‐las  no contexto escolar e, simultaneamente, valorizar o papel social das mesmas e  o  seu  potencial  educacional  junto  aos  professores  de  Arte.  Com  a catalogação e a contextualização das obras de arte das artistas, será dada maior  visibilidade  a  esta  importante  produção  da  contemporaneidade, quando sistematizada para o contexto escolar. 

2‐ Esta  gama  de  conhecimentos,  ao  chegar  à  sala  de  aula,  objetiva  tocar  e sensibilizar as  crianças/jovens e abrir espaço para: discussão dos papéis engessados de mulheres e homens, a importância das mulheres artistas e de suas práticas, quais as relações existentes entre as imagens produzidas por  elas  e  a  vida  cotidiana,  quais  interseções  consistentes  coabitam  a produção artística de mulheres e a própria realidade. 

3‐ Utilizar  a  Proposta  Triangular  de  Ensino  de  Arte  que  segundo  Ana Mae Barbosa (1997:10 e 11)  

“As  metodologias  que  orientam  o  ensino  de  arte  nos  anos  80, denominadas ensino pós­moderno  [...] ou ensino de arte contemporâneo [...],  consideram a arte não apenas  como  expressão, mas  também  como cultura, apontando para a necessidade da contextualização histórica e do aprendizado da gramática visual […]” 

A proposta didática escolhida requer atividades que perpassam por três etapas: o Conhecer, o Criticar e o Fazer arte (não necessariamente na ordem apresentada). O núcleo das teorias sobre ensino de arte, hoje, está em torno da idéia de arte como experiência  cognitiva,  isto  significa,  que  influir  ou  afetar  o  desenvolvimento cultural  (o  Conhecer)  do  alunado,  potencializando  sua  produção  (o  Fazer)  e  sua recepção/capacidade  de  análise  (o  Criticar),  são  as  metas  almejadas  nesta proposta. Segundo Barbosa (2005: 100) “Através da Arte, é possível desenvolver a percepção  e  a  imaginação  para  apreender  a  realidade  do  meio  ambiente, desenvolver  a  capacidade  crítica,  permitindo  analisar  a  realidade  percebida  e desenvolver  a  capacidade  criadora  de  maneira  a  mudar  a  realidade  que  foi analisada”. 

Sob esta perspectiva teórica, serão inseridas as obras das artistas selecionadas e sua aplicação didática em sala, quando pretendo observar para depois descrever, interpretar, na tentativa de apresentar alguns dados que auxiliem na compreensão do impacto das mesmas num grupo de alunos e alunas. 

A  partir  deste  confronto  esperamos  ser  possível,  junto  de  um  público  muito jovem, tirar substratos para o incremento de uma nova consciência acerca do que é 

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COUTINHO, A. (2007) A produção artística das mulheres e suas implicações no ensino de  arte.  In,  V.  Trindade,  N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora.  

 

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feminino  e masculino,  das  diferenças  e  das  desigualdades  entre  gênero,  além de fomentar para aquilo que a crítica da arte feminista vem lutando desde a década de 60: desestabilizar os lugares fixos, aquecer o debate frente ao poder patriarcal na arte  e  na  vida,  corrigir  e  reformular  pendências  e  principalmente  fortalecer  o “olhar” próprio da mulher sobre o mundo.  

Portanto, é imprescindível à realização do estudo de campo desta investigação, alguns procedimentos anteriores que comportam a catalogação e seleção junto ao acervo de obras das artistas brasileiras Beth Moysés e Rosana Paulino e da artista portuguesa  Paula  Rego  (produção  da  arte  contemporânea  selecionada  para  esta pesquisa), avaliando que  imagens poderão de  fato ser utilizadas para alcançar os objetivos  propostos.  Através  de  entrevistas,  visitas  aos  ateliês,  uso  de  material impresso sobre a produção das mesmas (folders, catálogos, impressos, citações em revistas,  livros,  jornais) para a elaboração da biografia das artistas,  será possível fazer  uma  observação mais  direta  do  processo  de  construção  das  obras  de  arte além  do  contato  com  as  reais  intenções,  inquietações  inerentes  ao  processo  de concepção e criação das artistas, permitindo uma contextualização desta produção artística. 

As  artistas  Paula  Rego  (1935),  Beth Moysés  (1962)  e  Rosana  Paulino  (1967) encontram‐se  em  plena  produção  e  são  hoje,  exemplos  de  engajamento  pelas causas  femininas/feministas  nas  artes,  quando  em  suas  obras  discutem abertamente  os  tabus  sociais  fortalecidos  pelo  engessamento  dos  papéis estereotipados do feminino (Rego), a violência sofrida pelas mulheres (Moysés) e a discriminação racial (Paulino). 

Em  Rego,  encontraremos  um  trabalho  de  raízes  portuguesas,  repleto  de memórias  pessoais,  onde  a  artista  também  coloca  seu  ponto  de  vista  feminino sobre  um  grande  tabu  social  que  envolve  e  gera  inúmeros  sofrimentos  às mulheres: o aborto. A clandestinidade, a angustia, a vergonha, a solidão, o medo e a humilhação  são  alguns  dos  sentimentos  que  provocam  grande  impacto  nas imagens  que  a  artista  produz.  Soam  como  gritos  de  alerta  e  revolta.  Já  Moysés afirma  que  suas  obras  estão  em  torno  do  universo  feminino,  da  discriminação  e violência  dirigidas  contra  a  mulher.  Ela  entende  que  a  arte  é  uma  forma  de confrontar  estas  questões.  Busca  não  apenas  transformar  seu  trabalho  em denúncia  social,  mas  uma  forma  de  modificar  as  consciências.  Paulino,  artista negra, encara e trata os temas como violência, racismo, sexo e feminilidade através de desenhos,  objetos  e  instalações, num processo de  reflexão  sobre a  escravidão que envolve os padrões de beleza socialmente impostos e a discriminação por raça, ainda forte pelo mundo.  

Sendo  estas  representações  do  feminino/feminismo  ‐  na  pluralidade  da produção  artística  contemporânea  ‐  entendidas  como um efeito  de  reverberação recíproca entre mulher‐sociedade, estas passam a se constituir como referência de um  contexto  vivido,  experimentado  ou  simplesmente  observado  em  nosso cotidiano. Estas produções  inseridas como estão na cena social e cultural, podem 

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COUTINHO, A. (2007) A produção artística das mulheres e suas implicações no ensino de  arte.  In,  V.  Trindade,  N.  Trindade  &  A.A.  Candeias  (Orgs.).  A  Unicidade  do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora. 

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ser  consideradas  como  representantes  de  uma  visão  coletiva,  feminina  ou  não. Logo,  as  obras  de  arte  engajadas  às  questões  da  mulher  nas  obras  de  Rosana Paulino, Beth Moysés e Paula Rego “elaboram um código específico que possui um significado  dentro  de  um  contexto  social  e  histórico  circunstancial  e  tecem  a cultura artística de uma cidade, de uma região ou de um país” (Ribeiro, 1993: 128‐136). 

Estas produções  artísticas  foram produzidas por  artistas mulheres  e  são  a  re‐apresentação  das  inúmeras  facetas  de  ser  e  estar  no  mundo  como mulher.  São imagens que,  intrinsecamente,  revelam a  relação das artistas  com a  realidade de seu tempo, de onde tiram o substrato, o entusiasmo e a coragem para a criação.  

Segundo  o  filósofo  Gaston  Bachelard  (1997:2)  “[...]  tentar  encontrar,  por  trás das imagens que se mostram, as imagens que se ocultam [...]”, é tentar entender a produção artística mais como resquícios da experiência e da própria vida do que como um objeto tangível apenas aos olhos.  

Esta  produção  feminista  da  arte  e  suas  implicações  e  usos  no  ensino  de  arte podem ser encaradas como uma potente “arma simbólica”6, capaz de colaborar na minimização  dos  conflitos  de  gênero  ainda  existentes,  na  vida  e  na  arte.  Para  a artista feminista brasileira Beth Moysés a arte é um meio de comunicação coletiva e pode servir como um veículo de conscientização.  

Definidos,  pois,  as  artistas,  imagens  de  obras  de  arte  e  contextualização  das mesmas,  segue o  trabalho de  campo que nos  servirá  à  verificação dos  efeitos da arte  feminista  sobre  os(as)  professores(as)  e  posteriormente,  desta  sobre  as crianças e/ou jovens.  

Selecionados e organizado o grupo de professores  (as) de arte,  será  feita uma formação específica sobre arte feminista, onde surgirão questões que envolvem a teoria, a prática e a história da arte contemporânea atreladas às questões sociais como:  gênero,  discriminação,  papéis  masculinos  e  femininos,  estereótipos, padronização,  etc.  Posteriormente  serão  observadas  algumas  aulas  que  estes professores(as)  formandos(as)  vão  lecionar,  para  análise  dos  resultados  obtidos com a formação de que foram alvo. 

No  campo  será  aplicada  uma  análise  qualitativa,  quando  se  pretende “compreender  o  processo  mediante  o  qual  as  pessoas  constroem  significados  e descrever  em  que  consistem  estes  mesmos  significados”  (Bogdan  &  Biklen, 1994:70).  A  descrição  do  problema,  interpretação  dos  dados  observados  e colhidos,  fazem  parte  de  um  esforço  de  compreender  o  dinamismo  e  a multiplicidade dos grupos  sociais  e mais,  contribuir,  com certas  intervenções, no processo de mudança e de transformação. 

6 Bourdieu, 2003 

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Há  um  modo  diferente  de  investigar,  próprio  dos  estudos  feministas,  que segundo Cao  (2002:148), propõe uma metodologia auto‐reflexiva, orientada pelo âmbito social, que incorpora uma crítica ao racismo, ao androcentrismo, intenta o fortalecimento das mulheres. Além de selecionar temas e métodos que assinalam problemas  ligados  à  experiências  do  imediato,  do  cotidiano,  valorizando  a interdisciplinaridade,  a  colaboração  inter‐pessoal  e  se  adaptam  a  outras metodologias já existentes. 

Em  termos  epistemológicos,  a  teoria  interpretativa  se  alia  a  teoria  crítica, quando  “enfatiza  a  abertura  à  novas  formas  de  conhecimento,  apóia  o desvelamento de modos ocultos de opressão, contesta a cultura positivista e aceita a idéia de que ações e valores são indissolúveis.” (Cao, 2005: 195) 

Como  estratégia,  optamos  neste  momento,  pelo  estudo  de  caso  por  ser  um “estudo  empírico  que  investiga  um  fenômeno  atual  dentro  do  seu  contexto  de realidade, quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não são claramente definidas  e  no  qual  são  utilizadas  várias  fontes  de  evidência.”  (Gil,  1999:73).  O estudo de  caso permitirá uma observação detalhada dos  indivíduos envolvidos e do  contexto  escolhido,  o  “como”  e  o  “por  quê”  destes  fenômenos  como acontecimentos atuais que fazem sentido dentro de uma realidade específica. 

Na parte documental deste estudo estão sendo realizadas buscas que envolvem Arte Feminista (Arte Contemporânea)/ Gênero / Educação. A partir dos binômios Arte/Feminismo,  Arte/Educação,  Educação/  Gênero,  serão  utilizados  na  área artística  os(as)  teóricos(as)  como Griselda  Pollock,  Linda Noclin, Marília  Andrés, Kátia Canton, Lucy Lipard, Ronaldo Brito, e outros. Os autores e autoras com livros e artigos importantes sobre gênero e história das mulheres, entre eles, Maria Izilda Matos, Rachel Sohiet, Guacira Lopes Louro, Pierre Bourdieu, citando apenas alguns, buscas em revistas como Estudos Feministas e Cadernos Pagu (SP). Sobre Ensino de Arte:  Ana Mae Barbosa,  Lucia Gouvêa  Pimentel,  Luciana  Loponte, Marián  L.  Cao, Elliot Eisner, Edmund Feldman, Robert Saunders e outros (as). 

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