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SÉRGIO ANTONIO THOMÉ
A PRIMEIRA ESCOLA PRIMÁRIA EM CASCAVEL
UNIOESTE – UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ CASCAVEL
2005
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SÉRGIO ANTONIO THOMÉ
A PRIMEIRA ESCOLA PRIMÁRIA EM CASCAVEL
Monografia apresentada ao Curso de Especialização em História da Educação Brasileira do Colegiado de Pedagogia da Unioeste – Universidade Estadual do Oeste do Paraná – como exigência parcial para a obtenção do título de Especialista, sob a orientação do Profº Mestre André Paulo Castanha.
UNIOESTE – UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ CASCAVEL
2005
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BANCA EXAMINADORA Professor Dr. Paulino José Orso. Examinador Professor Ms. João Carlos da Silva Examinador Professor Ms. André Paulo Castanha. Orientador
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DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a meu pai Darci e minha mãe Marlene, minha esposa
Denise e aos meus filhos Állef e Érick. Principalmente aos meus dois filhos, pelos
momentos em que estive ausente como pai e companheiro, mas que são a força que me
impulsiona para a luta do cotidiano.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, por fazer parte do grupo de especialização em
História da Educação Brasileira, numa instituição tão importante para a busca de novos
conhecimentos como é a Unioeste. Agradeço também, toda a minha família que sempre
me apoiou na trajetória de estudante, a todos os meus professores desde a primeira
professora que com muito empenho e dedicação colocou-me frente a frente com o
mundo da leitura e da escrita, a professora Adriana Pinto professora da disciplina de
História da Educação da Unipar que despertou em mim o gosto por tão nobre disciplina.
Aos professores Antonio Bosco Lima e Marlene Lúcia Siebert Sapelli por terem
orientado e acreditado no meu trabalho e esforço, ainda na graduação no curso de
Pedagogia. E por fim a todos os professores do CURSO DE HISTÓRIA DA
EDUCAÇÃO BRASILEIRA da UNIOESTE, em especial ao professor orientador
André Paulo Castanha e com grande respeito e admiração ao primeiro orientador deste
trabalho, professor João Carlos da Silva que acreditou na possibilidade de um trabalho
como o que nos propusemos a realizar e a todas as pessoas que contribuíram direta ou
indiretamente com meu trabalho.
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O passado não deve ser estudado como um objeto morto, como uma ruína, nem
como uma autoridade, mas como uma experiência. Uma experiência aprendida e
consolidada. Por mais arrogante que seja o presente, nele se inserem forças do
passado, sem cujo conhecimento a compreensão do presente é incompleta. (José
Honório Rodrigues, 1980).
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SUMÁRIO
Introdução................................................................................................................... 08
CAPÍTULO I - SOCIEDADE E EDUCAÇÃO: UM PANORAMA DAS AÇÕES
DO ESTADO BRASILEIRO E PARANAENSE ENTRE 1920 A 1950.
1.1 Da Crise dos Anos 20 a Revolução de 1930 .......................................................... 12
1.2 As Reformas Educacionais nos Estados ................................................................ 14
1.3 O Chamado Entusiasmo pela Educação e Otimismo Pedagógico .......................... 15
1.4 O Sistema Educacional no Contexto da Industrialização ....................................... 19
1.5 Origem e Organização dos Grupos Escolares ....................................................... 23
1.6 Implicações da Reforma Educacional no Paraná ................................................... 27
1.7 As Reformas no Ensino Primário Paranaense ....................................................... 29
1.8 O Estado Novo e a Marcha para o Oeste ............................................................... 31
CAPÍTULO II - COLONIZAÇÃO E EDUCAÇÃO NO OESTE PARANAENSE
ATÉ A DÉCADA DE 1950.
2.1 Ocupação do Oeste Paranaense: Colônia Militar de Foz do Iguaçu ....................... 35
2.2 Atividades Econômicas: a exploração da erva-mate e da madeira ......................... 37
2.3 O Tipo de Colonização: o colono ideal ................................................................. 40
2.4 As Experiências com Escolarização na Região Oeste ........................................... 44
CAPÍTULO III – A PRIMEIRA ESCOLA DE CASCAVEL – 1932 – 1952.
3.1 Cascavel: da Chegada dos Primeiros Moradores, à Criação do Município ............ 48
3.2 O Comércio em Cascavel ...................................................................................... 50
3.3 Da Criação da Primeira Escola Isolada ao Grupo Escolar ..................................... 52
3.4 Método de Ensino e Disciplina Escolar ................................................................. . 61
CONCLUSÃO............................................................................................................ . 68
BIBLIOGRÁFIAS ..................................................................................................... . 70
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho é resultado de pesquisa para atender requisitos do curso de
especialização em História da Educação Brasileira da Universidade Estadual do Oeste
do Paraná, durante os anos de 2004 e 2005. O objetivo do curso é desenvolver e
estimular a pesquisa sobre a história da educação na região Oeste do Paraná. Diante de
tal propósito, resolvemos recuperar um pouco da história da primeira Escola Primária de
Cascavel, no período de 1932 até 1952.
Buscamos fazer uma retomada da história do Brasil, do estado do Paraná, da
região Oeste do Paraná e do município de Cascavel, considerando os aspectos de
ocupação e colonização, bem como os principais fatores que contribuíram para que
ocorresse a fixação dos migrantes na região, os aspectos culturais que viabilizaram a
constituição de locais de instrução para seus filhos, o valor dado à educação formal,
como possibilitadora de ascensão social, econômica e cultural objetivando com isso
melhores empregos, principalmente os cargos públicos. Neste sentido, buscamos
organizar as informações que conseguimos ao longo da pesquisa sobre a história da
primeira escola primária de Cascavel, que deu origem mais tarde ao Colégio Eleodoro
Ébano Pereira.
Este trabalho inicia fazendo uma análise do sistema nacional de educação,
levando em consideração aspectos políticos, econômicos e sociais que quase sempre se
relacionam com o pensamento educacional. Analisamos o processo de formação dos
Grupos Escolares no Brasil, qual era o pensamento em relação a esses espaços, bem
como sua estrutura e organização assim como o surgimento do modelo de escola que
temos até hoje, modelo este organizado, a partir do Período Republicano. Procuramos
trazer alguns elementos da educação no Estado do Paraná, mostrando a trajetória do
processo educacional até metade do século XX, levando em consideração as reformas
educacionais, em especial a da educação paranaense. Dentro desse contexto procuramos
buscar alguns elementos importantes para compreender o processo de formação do
município de Cascavel, bem como os elementos que contribuíram para o
desenvolvimento da educação do município.
A problemática que procuramos desenvolver na pesquisa sobre a história da
educação local e regional partiu da seguinte questão: como ocorreu o processo de
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formação e institucionalização da primeira escola de Cascavel, e sua transformação em
grupo escolar?
Portanto neste trabalho pretende-se compreender a origem e a constituição da
primeira escola pública primária do município de Cascavel a partir de 1932 até a
transformação em grupo escolar e a emancipação do município, relacionando com as
questões políticas econômicas sociais e culturais da época. Além disso, pretende-se:
levantar, catalogar e organizar fontes primárias e secundárias acerca do processo de
ocupação e colonização de Cascavel e registros educacionais, principalmente da
primeira escola; Contextualizar o início do processo de escolarização em Cascavel,
articulando com as transformações ocorridas na região Oeste, no Paraná, e no Brasil;
Analisar e compreender as múltiplas relações presentes na formação do Oeste do
Paraná, a partir dos determinantes econômicos, políticos e sociais, cujos aspectos
influenciaram diretamente na constituição da escola em Cascavel; Contribuir com os
estudos acerca da história da educação brasileira, a partir da pesquisa da história
educacional, regional e local.
Para realizar a pesquisa, fizemos levantamento do acervo bibliográfico
encontrado nas bibliotecas da prefeitura de Cascavel, na biblioteca pública Municipal,
na biblioteca da Unioeste, no Museu da Imagem e do Som de Cascavel no (Centro
Cultural Gilberto Mayer). Realizamos pesquisa oral e levantamos outros documentos
bibliográficos, junto a professores do Colégio Eleodoro Ébano Pereira de Cascavel e
pioneiros.
Consideramos importante destacar as dificuldades e conquistas realizadas
durante a pesquisa, bem como dar alguns indicativos do que ainda é possível avançar
sobre o assunto. Quando iniciamos o trabalho de pesquisa sobre a origem da história da
educação de Cascavel, começamos fazendo um levantamento bibliográfico sobre o que
já foi escrito a respeito do tema, logo percebemos, que esta é uma parte da história
pouco contada (escrita). Quem mais escreve sobre a educação de Cascavel é o professor
Ivo Oss Emer, que por sinal escreve sobre vários aspectos da região Oeste, porém, seu
foco central não é, a nosso ver, a escola primária unicamente, nem tão pouco a educação
exclusivamente. Lembrando que a educação está inserida em todo um contexto, social,
econômico e político.
Nas publicações sobre Cascavel e a Região Oeste percebe-se que ainda são
poucas as referências sobre a educação no município, ou seja, há muito, a ser
pesquisado e escrito sobre a história da educação em Cascavel.
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Após o levantamento bibliográfico, iniciamos a busca de fontes primárias e
secundárias a respeito do assunto e posso dizer que este é um trabalho árduo, cansativo,
e que exige persistência, pois muitas pessoas dos órgãos públicos não demonstram
interesse em ajudar, então quando encontrava alguém disposto a nos atender, tudo o que
conseguia era preciso aproveitar. Outra dificuldade é a falta de tempo disponível para
realizar a pesquisa, pois seria necessário maior disponibilidade para irem busca das
fontes, o que não foi possível devido ao meu trabalho.
Nesse trabalho a proposta principal foi à busca informações sobre a história da
educação de Cascavel, de 1932 até 1952 quando o município se emancipa politicamente
de Foz do Iguaçu. Nesse momento o Colégio Eleodoro Ébano Pereira aparece como a
primeira escola urbana de Cascavel. Na busca por informações na prefeitura de Foz, fui
informado por uma funcionária da biblioteca pública de Foz, de que lá não há nada
sobre o tema. Na prefeitura de Cascavel, apesar da boa vontade e empenho do
Secretário de Educação Valdecir Antonio Nath, nada conseguimos sobre o colégio e o
período em estudo. Na biblioteca Pública não encontramos nada além dos livros que
tratam sobre Cascavel, trabalho este já feito no levantamento bibliográfico. No Núcleo
Regional de Educação, encontramos livros com atas de notas da escola Carola Moreira e
de outras escolas e períodos posteriores, mas estavam em péssimo estado de
conservação. No Museu da Imagem e do Som, fomos bem atendidos pelos funcionários,
onde conseguimos as fotos referentes ao Grupo Escolar, e foi lá que consegui contato
com o professor Adalberto Pompeu que gentilmente foi comigo até a casa do senhor
Edjas Santetti Siqueira para realizar uma entrevista com o mesmo.
Conseguimos documentos relacionados ao Nhô Jeca e a professora Dilair
Silvério Fogaça com a professora Nelci, que é filha da professora Dilair e neta de Nhô
Jeca, são recortes de jornais, documentos oficiais e cartas endereçadas a Nhô Jeca,
cartas que vinham de Clevelândia para Guarapuava onde este morava, as cartas datam
de 1919. Fizemos um levantamento na biblioteca da Unioeste, onde encontramos, além
dos livros sobre Cascavel e a dissertação de mestrado do professor Ivo Oss Emer,
artigos sobre a história de Cascavel, de modo geral, em revistas publicadas na cidade,
como a revista Oeste. Fomos informados de que, na Catedral Nossa Senhora Aparecida
poderia encontrar documentos sobre o assunto, então conversei com o padre
responsável, mas este nos informou que não havia nada sobre educação nos arquivos.
Na Câmara de vereadores de Cascavel, estive vendo as atas das primeiras reuniões da
câmara, mas estas datam apenas de 1956 em diante.
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No Colégio Eleodoro Ébano Pereira, fui várias vezes, outras vezes mantive
contato através de telefonemas, mas consegui ter acesso aos livros atas das décadas de
40 e 50. A diretora da escola e outras funcionárias gentilmente me atenderam na medida
do possível.
Para conseguir os dados e documentos que consegui foi necessário, dedicação,
tempo que nem sempre tinha, e insistência para ser atendido e ouvido sobre o que estava
pesquisando.
O trabalho está organizado em três capítulos, sendo que o primeiro trata da
sociedade e da educação brasileira e paranaense entre os anos de 1920 a 1950, onde
fizemos um breve resgate histórico da crise dos anos vinte, da revolução de 1930, além
de contextualizar o sistema educacional do período com o processo de industrialização
do país. Ainda neste capítulo descrevemos alguns tópicos relacionados às reformas
educacionais e a relação do Estado Novo com a Marcha para o Oeste.
No segundo capítulo discutimos algumas questões sobre a colonização e o
processo de escolarização no oeste paranaense, bem como as atividades econômicas que
viabilizaram a fixação dos colonizadores da região além das experiências com a
escolarização na Região Oeste.
No último capítulo, tratamos da chegada dos primeiros moradores até a criação
do município de Cascavel, sobre o comércio como atividade econômica que auxiliou no
desenvolvimento da cidade, assim como a criação da primeira escola isolada até o
momento em que esta passa a grupo escolar, fazendo algumas considerações sobre
como era o seu funcionamento, sua origem e que é esta primeira escola que mais tarde
passa a chamar-se Colégio Eleodoro Ébano Pereira que ainda hoje atua na cidade. Por
fim, fizemos algumas considerações sobre o assunto pesquisado.
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CAPÍTULO I
SOCIEDADE E EDUCAÇÃO: UM PANORAMA DAS AÇÕES DO ESTADO
BRASILEIRO E PARANAENSE ENTRE 1920 A 1950.
Da Crise dos anos 20 à Revolução de 1930.
A Revolução de 1930 no Brasil foi um marco na modernização e no progresso
do país. Ela ocorreu devido às disputas políticas relacionadas à eleição presidencial na
qual estavam polarizados oligarquias e grupos políticos de diversas regiões do Brasil. O
grupo derrotado nas eleições contou com o apoio de setores emergentes, os industriais e
camadas sociais formadas por militares de baixa patente, funcionários públicos,
profissionais liberais, pequena burguesia e proletariado. Estes grupos entraram em luta
contra as oligarquias agrárias que visavam defender seus próprios interesses,
principalmente os ligados à economia do café. As camadas médias queriam remover as
oligarquias do poder. Seus principais líderes foram os tenentes que desencadearam uma
série de movimentos armados, tais como: a Coluna Prestes, rebeliões militares, greves
operárias etc. Estes lutavam por um ideário liberal: voto secreto, moralização das
eleições, e reformas sociais, etc.
A economia brasileira até as décadas de 20 e 30, baseava-se basicamente na
agropecuária, modelo econômico conhecido como agrário-exportador. Com as crises
econômicas de 29 e 30, o Brasil inicia um novo processo econômico baseado numa
economia, urbanizada e industrializada. O setor agropecuário, porém, não deixou de ser
um importante gerador de lucros. A industrialização tinha por objetivo, substituir as
importações de produtos manufaturados da qual o país era muito dependente. Outro
fator importante a ser considerado é o aumento do êxodo rural.
A partir da crise do café em 29, a economia brasileira começa tomar novos
rumos.Com isso evitou entrar em decadência total. A partir do novo modelo econômico,
as relações entre o setor agropecuário e a indústria ganharam novos vínculos e, mais
tarde, muitos dos produtos industrializados aqui no Brasil começaram a usufruir, de
matérias primas da agropecuária. Com relação a isso Nagle diz que:
Alguns estudiosos da história econômica e social brasileira apontam a década dos anos vinte como o período de passagem de um sistema econômico do tipo colonial,
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induzido, para um outro autônomo; constituiu essa década a fase de instalação do capitalismo no Brasil, e, portanto, se define como período intermediário entre o sistema agrário-comercial e o urbano industrial, os dois grandes ciclos da economia brasileira1.
Porém, mesmo com a mudança no modelo econômico, a agropecuária brasileira
continuou sendo importante, pois atendia a população rural em suas necessidades,
abastecia as pequenas cidades, e passou a atender o setor industrial interno que estava
em plena expansão em grandes cidades, onde estes produtos estavam voltados para sua
transformação industrial.
Segundo Xavier, o complexo cafeeiro auxiliou no processo da industrialização
do país:
O complexo econômico gerado pelo núcleo cafeeiro, onde incluíam desde as estradas de ferro aos bancos, o grande comércio de exportação e importação, assim como a própria mecanização crescente da produção, havia constituído a base de um crescimento industrial tímido e descontínuo, verificado desde o nascimento da ‘sociedade do café’. Germinava, assim, o processo brasileiro de industrialização, favorecido pela ruptura que a expansão cafeeira representara em relação às formas tradicionais de dominação e de reprodução do capital 2.
O processo de industrialização, neste sentido está intimamente ligado com a
economia cafeeira, mesmo que a industrialização não tenha sido diretamente financiada
por esta, mas sim, indiretamente pela mesma, assim como por comerciantes, pelo capital
estrangeiro e por imigrantes, difundindo inclusive a ação do Estado brasileiro.
As novas forças emergentes sob a liderança de Getúlio Vargas, tomam o poder
político em 1930 e inauguram um novo modelo econômico político e social, no qual o
Estado passa a ter um papel fundamental.
1 NAGLE, Jorge. Educação e sociedade na Primeira Republica. São Paulo, EPU: 1976. p. 12. 2 XAVIER, Maria Elizabete Sampaio Prado. Capitalismo e escola no Brasil: a constituição do liberalismo em ideologia educacional e as reformas do ensino (1931-1961). Campinas, Papirus, 1990. p. 31.
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As Reformas Educacionais nos Estados
Como se sabe a década de 20 foi marcada pelas reformas educacionais que
ocorreram em muitos Estados brasileiros, reformas estas que estavam inseridas dentro
de uma proposta de modernização do país. O primeiro Estado a realizar tal reforma foi o
Estado de São Paulo e a segunda ocorreu no Paraná no ano de 1920, iniciada por Prieto
Martinez. Portanto, é a partir deste momento que a educação brasileira assim como a
paranaense começa ganhar maior sentido, ou seja, inicia-se um processo de
direcionamento da educação, ou seja, é o momento em que esta é responsabilizada por
grandes tarefas educacionais perante a sociedade brasileira.
No que se refere às reformas educacionais, Fernando de Azevedo, afirma que:
“(...) tais reformas estaduais não traduziam uma política educacional orgânica em nível
nacional, mas tendências pessoais de intelectuais que buscavam, com idéias novas,
propagar um movimento cultural e educacional”3.
Neste momento a educação não poderia mais apenas voltar-se para a instrução,
mas sim começava a fundamentar-se numa base tríplice: de ordem moral, higiênica e
econômica que juntamente com a alfabetização e a transmissão de outros
conhecimentos, formariam o que se chamava de educação integral na época. Portanto,
estava posto um projeto que visava uma maior unidade nacional. Para Miguel:
As idéias renovadoras, relacionadas ao projeto de nacionalidade, tinham sua razão de ser, não no conjunto das vontades individuais daqueles que lideravam o movimento, como queria Azevedo, mas decorria do próprio desenvolvimento do capitalismo que, ao transformar o capital agrícola (gerado pela lavoura cafeeira) em capital industrial, tinha necessidade de funcionários e de trabalhadores mais qualificados ou, ao menos alfabetizados4.
Ao nosso ver, fica cada vez mais claro, à medida que vamos estudando e
aprofundando as leituras, o verdadeiro papel da educação desse período, uma vez que o
setor econômico busca aliar-se firmemente com a educação primária para levar adiante
seus ideais capitalistas, atendendo desta forma as indústrias que se expandiam no país,
3 AZEVEDO, F. de. Citado por MIGUEL, Maria Elizabeth Blanck. A formação do professor e a organização social do trabalho. Curitiba: UFPR, 1997. p. 16. 4 Idem, p.17.
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além do interesse em acabar com o analfabetismo em detrimento da política que exigia
eleitores que soubessem ao menos assinar o nome para poderem votar.
O Chamado Entusiasmo pela Educação e o Otimismo Pedagógico
Segundo a tese de Nagle, o entusiasmo pela educação e o otimismo pedagógico,
formaram a base necessária para que a burguesia nacional colocasse em prática seu
projeto de um Brasil novo, moderno, voltado para a formação de um novo homem
“brasileiro”, com um espírito de nacionalidade, um homem mais voltado para o civismo
e o patriotismo, etc. E como se sabe a escola tinha a incumbência de criar através de
seus currículos, este homem sonhado pelas elites dominantes, que se adaptasse as
mudanças do mundo moderno, à vida urbana, que valorizasse o sentimento nacional,
além de ter o preparo necessário para o trabalho nas grandes indústrias no que diz
respeito ao cumprimento de horários e de sua função e posição de exploração pelos
donos dos meios de produção. As mudanças educacionais, ocorridas nesse período, na
verdade, nunca passaram da expansão ou de mera remodelação no sistema escolar. O
ideário liberal sempre foi instrumento “privilegiado de mediação política”.
É devido a esses e outros fatores, que as décadas de 20 e 30 são conhecidas
principalmente por uma forte “efervescência ideológica no país”, ao instaurar um novo
patamar de modernização econômica da sociedade brasileira. Devido a toda uma
situação de expectativas criadas pelas classes dirigentes, em torno de possíveis
mudanças, educacionais, sociais e econômicas, contribuíram para criar um quadro de
disputas políticas formado pelos revolucionários representados pela grande massa de
trabalhadores, mas sem representatividade política. As classes reacionárias lideradas
pelas oligarquias tradicionais, mas que cada vez mais dependiam do apoio das classes
emergentes, e por último as forças reformistas que de um jeito ou de outro lutavam sem
medir esforços para ascenderem ou continuar no poder e aumentando ainda mais sua
participação política e econômica no país. A partir de todos estes movimentos é que
surge um forte movimento nacionalista chamado de “entusiasmo pela educação e
otimismo pedagógico”, embasados na crença da construção de um novo Brasil, com
mudanças profundas na sociedade brasileira, através da escola. Nagle define o otimismo
pedagógico e o entusiasmo pela educação como sendo:
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(...) uma atitude que se desenvolveu nas correntes de idéias e movimentos políticos-sociais e que consistia em atribuir importância cada vez maior ao tema da instrução, nos seus diversos níveis e tipos. É essa inclusão sistemática dos assuntos educacionais nos programas de diferentes organizações que dará origem àquilo que, na década dos vinte, está sendo denominado de entusiasmo pela educação e otimismo pedagógico5
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É com base no entusiasmo pela educação e no otimismo pedagógico através da
escola que no final da Primeira República já está delineado, no Brasil uma série de
transformações nos setores, econômico, político e sociais, assim como no setor cultural,
o que acaba por interferir no sistema de ensino nacional.
É a partir da crença de que, com o aumento no número de instituições escolares e
da disseminação da educação escolar, que se irá incorporar na grande maioria da
população o espírito, a vontade e o desejo de luta pelo progresso nacional e assim
colocar o Brasil em condições de se comparar aos grandes países do mundo. Além do
pensamento de que só através da escolarização se formaria um novo homem, isto é, a
partir de concepções do escolanovismo. A escolarização apresenta-se como
insubstituível e como instrumento decisivo formar o homem brasileiro responsável pelo
crescimento do país. Para Xavier:
Quer se tratasse de difundir a escola primária para ‘redimir os analfabetos’ e criar uma nova ordem econômico-social, estava subjacente a idéia de que o progresso possível dependia das vontades e das consciências. O futuro estava em aberto e tudo era possível; era superar o passado e começar uma nova história, projeto do intelecto e obra da escola6.
Esta afirmação deixa clara a responsabilidade repassada para a escola, e a visão
de que as transformações econômicas e sociais ocorreriam através do ensino, não
esquecendo-se de que a questão do analfabetismo estava ligado diretamente às questões
políticas, ou seja, intimamente ligadas a questão do voto, mais uma vez atendendo aos
interesses burgueses, pois para exercer o direito ao voto era preciso saber, ao menos
assinar o nome, então a alfabetização da população subalterna estava muito ligada ao
“saber assinar o nome”, para poder votar. Quanto a frase, “(...) dependia das vontades e
das consciências”, nos parece estar muito ligada ao fato de que no liberalismo, está
5 NAGLE, Op. Cit. p. 101. 6 XAVIER, Op. Cit. p. 65.
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implícito para a grande massa trabalhadora, que se o indivíduo não tem sucesso no
trabalho ou não progride socialmente, a culpa é única e exclusivamente sua, pois através
da escola todos tiveram as mesmas oportunidades, e se não conseguiram um nível de
vida melhor, é porque não foram capazes, portanto estão condenados ao fracasso por
sua própria culpa, pois a sociedade lhe deu as oportunidades de que ele precisava,
oferecendo acesso à escola.
Todo o clima de efervescência educacional da década de 30 se resumiu, em
“algumas reformas experimentais de caráter estadual, em sua maioria inconsistentes
teórica e programaticamente, e de resultados inexpressivos7”. Porém como marca forte
desse período ficaram as características da ideologia educacional, postas pelo
liberalismo nacional. Ideologia, que acaba por se incorporar na “consciência pedagógica
nacional”, refletindo no direcionamento do avanço do capitalismo no Brasil.
Em relação à ideologia educacional e a disseminação da escola primária no
Brasil durante as primeiras décadas do século XX, Nagle, explicita que: “O que
interessa é a disseminação da escola primária, nível essencial do sistema escolar, que
proporciona a aquisição dos direitos políticos”8. A importância da educação neste
momento está diretamente ligada ao setor político, assim tanto a educação como a
política, passam a ter destaque em nível nacional. A escola, nesse momento de
mudanças de paradigmas econômicos, políticos e culturais recebe a atribuição, a
incumbência de servir a toda uma rede de interesses de natureza política, tendo como
propósito atender muitas questões que estavam alheias a sua função, mas devido as
ligações que a sociedade consegue estabelecer com a escola, esta tornou-se, a forma
mais eficaz para se alcançar os objetivos estabelecidos pela elite dominante no sentido
de alavancar o progresso da sociedade brasileira e transformar o Brasil num país
civilizado. Nagle nos mostra que os discursos da época afirmavam que:
A educação do povo é a pedra angular sobre que repousa a estrutura toda da organização social. Sem educação do povo não há estabilidade nem solidez em nada. Resolvido o problema da educação do povo, todos os mais se resolverão automática e espontaneamente, pela ação natural das inteligências9.
7 Idem, p. 65. 8 NAGLE, Op. Cit. p. 102. 9 Idem, p. 110.
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Aqui a educação é posta como a “salvadora da Pátria”, a redentora de todos os
problemas do país. Em consonância com o pensamento liberal e com o ideário
escolanovista que vinha sendo posto em prática no Brasil, surge em 1932, o Manifesto
dos Pioneiros da educação ou Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova10.
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova propunha que, a cada indivíduo
fosse dado o direito à educação integral, cabendo a organização e criação dos meios,
para tal, ao Estado. Tornando a escola acessível a todos os cidadãos, em todos os graus
de escolaridade, para que os mesmos tivessem o máximo desenvolvimento, de acordo
com suas aptidões vitais, mesmo com as diferentes situações econômicas existentes
entre os educandos do país.
O documento visava uma escola única e oficial, onde todas as crianças de 07 a
15 anos tivessem garantido o direito à escola pública comum, igual para todos.
Desejavam que a escola, além de gratuita e obrigatória, fosse também laica, ou seja, que
ela estivesse acima dos dogmas, disputas e crenças da igreja.
Como escreve Xavier, o Manifesto, “(...) pretendia superar o empirismo das
reformas parciais efetuadas, através da definição clara dos seus pressupostos.
Justificava-o, acima de tudo, a preocupação confessa dos seus signatários com o
labirinto de idéias vagas em que se arrastavam os espíritos” (...)11.
Quanto às finalidades da educação o Manifesto dizia que a questão primordial da
educação gira, pois, em torno de uma concepção de vida, de um ideal, a quem devem
conformar-se os educandos, e que uns consideram abstrato e absoluto, e outros,
concreto e relativo, variável no tempo e no espaço12.
A Educação Nova alargando a sua finalidade para além dos limites das classes
assume com uma feição mais humana, a sua verdadeira função social, preparando-se
para formar “a hierarquia democrática pela hierarquia das capacidades”, recrutadas em
todos os grupos sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educação. Ela tem,
por objeto organizar e desenvolver os meios de ação durável com fim de “dirigir o
desenvolvimento” natural e integral do ser humano em cada uma das etapas de seu
crescimento de acordo com uma certa concepção de mundo.13
10 Um longo documento dedicado ao governo e a nação que pautou-se, em linhas gerais, pela defesa da escola pública obrigatória, laica e gratuita e pelos princípios pedagógicos renovados inspirados nas teorias de Dewey, Kilpatrick e outros, tendo Fernando de Azevedo como relator final. 11 XAVIER, Op. Cit. p. 66. 12 GHIRALDELLI Junior, Paulo. História da Educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994. p. 59. 13 Idem, p. 61.
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Segundo Xavier, em momento algum o movimento renovador questionara, mas
ao contrário reforçará em seu Manifesto, o princípio de que os melhores e os mais
capazes, por seleção devem formar o vértice de uma pirâmide de base imensa14.
Podemos perceber que nas décadas de 20 e 30 havia todo um movimento em busca de
mudanças para a educação no país. Na verdade vivia-se a fase do “entusiasmo pela
educação”, acreditava-se que só através da educação o indivíduo atingira sua plenitude.
O Sistema Educacional no Contexto da Industrialização
Com o processo de industrialização do país, vem a possibilidade e a necessidade
de uma modernização da mão-de-obra, frente às novas tecnologias impostas pelas novas
exigências do capitalismo internacional, ou seja, há a necessidade de pessoal capacitado
para trabalhar com as máquinas. Nesse processo, para que o país tivesse autonomia em
sua modernização era necessário, conforme as palavras de Xavier, uma base científica, e
educacional, mínima que dê ao país a capacidade de adquirir uma progressiva
autonomia de conhecimentos científico-tecnológicos. Caso contrário o país estaria à
mercê da produção científica de segunda mão15.
Enquanto houve o predomínio da economia agroexportadora, a educação
brasileira esteve sempre muito voltada para a formação das elites dominantes, para as
profissões liberais, seguindo um padrão de ensino humanístico. Este direcionamento
educacional se dava porque o pensamento era o de que, quem necessitava de educação
eram os comandantes da sociedade brasileira e seus filhos, futuros governantes, e os
participantes das camadas superiores futuros ocupantes das atividades políticos –
burocráticas. Até então as camadas populares estavam à margem da educação formal,
não que não houvesse educação para essas camadas, mas não havia uma luta expressiva
por parte da classe trabalhadora por escola e nem um a política educacional voltada para
o atendimento das chamadas classes “inferiores”, que se preocupasse com a real
formação de uma escola que atendesse à demanda populacional, muito menos, os
interesses dessa classe. A pressão por escolas aumentou de forma significativa, por parte
das diferentes classes populares, a partir do início do processo de industrialização e
urbanização no Brasil.
14 XAVIER, Op. Cit. p. 87. 15 Idem. p. 58.
20 20
Xavier parte do princípio de que antes do início da instalação e do
fortalecimento das indústrias no Brasil e do processo de modernização das mesmas, não
havia necessidade de instrução, ficando assim a instrução em segundo plano. Com a
nova situação surgem as aspirações educacionais junto ao “discurso e a ação do
Estado”. Para compreendermos este processo de luta por educação que passa por alguns
momentos, vejamos as considerações de Xavier:
O primeiro, que se constitui na fase da expansão da demanda social e da gestação de idéias reformistas, ainda no bojo da economia agroexportadora em crise. O segundo, momento de reformulação efetiva do sistema educacional pelo Estado, consubstanciado na Reforma Francisco Campos (1931 – 1932) e nas Leis Orgânicas do Ensino (1942-1946). E finalmente chegaremos à fase crítica do renascimento dos debates pós 46, momento privilegiado do questionamento das verdadeiras funções da escola dentro da ordem econômico-social que se definia com maior clareza. É quando se dá a definição, a avaliação e a correção dos rumos tomados, ao longo de treze anos de debates em torno dos projetos de Lei de diretrizes e Bases da Educação Brasileira 16.
A expansão da demanda social e a luta por escola pelos trabalhadores e pela
elite, brasileira nas décadas de 20 e 30, fizeram com que o Brasil, por ser um país que
dependia em vários setores da economia internacional, como não poderia deixar de ser,
na área cultural, também sofria uma forte influência da cultura européia principalmente,
em seus aspectos do modo de comportamento, ideal de homem e na forma de vida
urbana. Era por meio das elites intelectuais que as camadas menos favorecidas sofriam a
influência de ideologias, criadas e propagadas no contexto avançado da classe
dominante. Neste contexto as ideologias, eram traduzidas e articuladas conforme os
interesses da burguesia por meio da sua doutrina liberal. No que diz respeito mais
especificamente à educação,
(...) o discurso liberal, que desde então assumiu importância decisiva na legitimação das novas instituições políticas e eficiência extraordinária na cooptação das camadas médias da população, especialmente sensíveis às promessas de participações e ascensão, não afetou significativamente as instituições educacionais e mesmo as expectativas sociais quanto à escolarização 17.
16 Idem. p. 59. 17 Idem, p. 60.
21 21
Por outro lado nas camadas hegemônicas, onde o pensamento liberal fundava-se
nos princípios da liberdade, da igualdade, da individualidade e da democracia, as
conseqüências educacionais do pensamento liberal foram bastante expressivas, isto
porque nessas camadas haveria uma possibilidade bem maior de mobilidade social, ou
seja, havia uma maior possibilidade dos filhos dessas camadas ascenderem socialmente,
portanto a luta por escola e por ensino ganhava força entre seus interessados, uma vez
que esta sociedade, também valorizava muito a capacidade individual de cada um.
Segundo Xavier, (...) o pensamento liberal desembocou na defesa da ‘Escola Pública,
Universal e Gratuita’, como condição indispensável para a garantia da igualdade de
direitos e oportunidades que justificava, em última instância, a desigualdade social
‘justa’ porque ‘natural’18.
Mesmo com o início da industrialização e apesar do discurso em favor da
ampliação do acesso à escola, o regime republicano continuou oferecendo e garantindo
o acesso ao ensino à elite, e mesmo com o setor industrial em expansão, a demanda de
mão-de-obra “era atendida basicamente por imigrantes”, assim não haveria necessidade
de investimento em educação para formar o trabalhador, pois o imigrante dispensava
este trabalho porque já vinha com o preparo necessário para trabalhar nas indústrias. O
grupo escolar foi o modelo de escola urbana, formulado e encaminhado, de acordo com
as necessidades da época. Com relação ao crescimento industrial e suas relações com a
escolarização, Xavier afirma que ele:
(...) não acarretava por si mesmo a exigência de qualificação para o trabalho, mas que representava um salto qualitativo no avanço das relações de produção no país, acabou por fortalecer a difusão da ilusão liberal de ascensão social pela escolarização, que a própria aceleração do progresso imigratório estimulava 19.
Através do exposto acima podemos perceber, que este foi um fenômeno que
influenciou uma maior pressão social na luta e busca pela difusão do ensino, mesmo que
a mobilidade social fosse um engodo posto pela elite dominante, até porque a
mobilidade social tinha suas limitações devido ao sistema econômico vigente no país.
Este momento em que se aspirava maior difusão do ensino, “(...) deve ser
atribuída menos às exigências concretas, econômicas ou sociais de expansão da escola e
18 Idem, p. 61. 19 Idem, p. 62.
22 22
mais à instabilidade política da fase de transição que se iniciava e que inaugurava
formas mais avançadas de dominação capitalista” 20.
Para as classes dominantes era cômodo continuar a situação de exploração das
classes subalternas assim como já vinha sendo feito, visto que a classe subalterna vivia,
e vive momentos de insatisfação, que nunca foram compreendidos, ou resolvidos de
forma concreta, diante do quadro vivido pelo proletariado brasileiro ficou fácil
introduzir nas classes dominadas o ideário, de que através da educação haveria
igualdade de oportunidades entre as classes sociais e que ela garantiria ascensão social.
Isto prova, que as camadas sociais dirigentes do país estavam mais uma vez enganando
as classes dominadas com a ilusão de que a educação seria a redentora dos problemas
sociais do Brasil. Como se sabe mesmo havendo por parte das camadas pobres da
sociedade uma inquietação em relação às diferenças sociais existentes no país, não
havia movimentos de lutas por mudanças devido ao fato de que a grande maioria dessa
população carente vivia na ignorância, ou seja, não tinham participação nenhuma nas
decisões políticas e sociais do país, ficando assim todos os privilégios para a classe
dominante. Segundo Xavier:
(...) expandir as oportunidades educacionais ou reformar as instituições escolares representava um custo menor que alterar a distribuição de renda e as relações de poder. Além disso, atendia parcela significativa das aspirações da fração mais representativa das camadas médias, aquela que mediatizava política e ideologicamente o confronto entre dominados e dominantes, as suas elites intelectuais 21.
Desta forma, a classe dominante mantinha a classe média sonhando e aspirando
o embate político e ideológico, como forma de atingir um nível social mais elevado
através da educação, assim como a classe mais oprimida também teria a ilusão de lutar
por melhores condições de emprego e de ter uma vida mais digna.
Em relação à reformulação do sistema educacional, como já foi citado
anteriormente, podemos destacar o Manifesto dos Pioneiros de 1932, a reforma
Francisco Campos e a reforma Gustavo Capanema que, por meio de decretos, visava
uma organização para o ensino, superior, médio, secundário, primário, normal e
profissional. Para Xavier, a reforma frustrou a propalada renovação científica do
20 Idem, p. 63. 21 Idem, p. 63.
23 23
sistema educacional brasileiro, representou a concretização do discurso renovador,
enquanto versão nacional da proposta escolanovista22. As tentativas de reforma dos
anos 30 e 40 acabaram gerando um grande debate educacional, principalmente a partir
da Constituição de 1946, que obrigava a União a fixar as diretrizes e bases da educação
Nacional. O projeto de LDB desencadeou um forte embate em torno das questões
educacionais, entre liberais e católicos, fato que postergou a aprovação da LDB até
1961.
Outro fator que caracterizou este período foi a forte centralização do governo
Vargas durante o chamado Estado Novo (1937 – 1945), onde o poder passa a se
concentrar no executivo, que organiza reformas centralizadoras em todos os setores.
Origem e Organização dos Grupos Escolares
No projeto de sociedade Republicano, a educação primária pública
desempenhou um papel de grande importância, ao tornar-se uma das principais
divulgadoras dos valores republicanos. Para consolidar tal projeto, foram criados os
Grupos Escolares. Os primeiros grupos escolares surgiram no Estado de São Paulo, a
partir de 1890.
Para Souza a criação dos grupos escolares, trouxe uma série de inovações e
implicações na educação pública do país, ajudando a construir uma cultura escolar
diferente, principalmente no meio urbano, além de generalizar no âmbito do ensino
público muitas práticas escolares em uso nas escolas particulares e que estavam
circunscritas a um grupo social restrito – as elites intelectuais, políticas e econômicas23.
Segundo Souza,
(...) na origem da escola graduada encontra-se um processo de profundas transformações sofridas pela escola primária: da existência de um conjunto de escolas sem uniformidade para um sistema mais ordenado, estandardizado e de caráter estatal; de uma escola de ler-escrever-contar para uma escola de educação integral com um programa enriquecido e enciclopédico; uma escola de acesso restrito para uma de acesso obrigatório, generalizado e universalizado.
22 Idem, p. 84. 23 SOUZA, Rosa Fátima de. Templos de civilização: a implantação da escola primária graduada no Estado de São Paulo: (1890-1910). São Paulo: UNESP, 1998. p. 30 e 31.
24 24
Este modelo de escola estava sendo implantado na maioria dos países, por isso
foi aproveitado pelos republicanos com o objetivo de difundir nas grandes massas
populares os ideais republicanos, através da educação. Esses ideais estavam
basicamente voltados para o controle da vida urbana, para a prática do civismo, para a
valorização do nacionalismo. A preocupação central voltava-se para a criação de uma
identidade nacional tendo como guia os ideais burgueses, e como meta a integração do
Brasil no sistema industrial capitalista mais desenvolvido. A escola graduada ou grupo
escolar facilitava esse processo na medida em que um número muito maior de crianças
seriam atendidas nas escolas, tornando o controle por parte do Estado mais eficiente,
diminuindo gastos financeiros e possibilitando educação de melhor qualidade.
Um grupo escolar caracterizava-se primeiramente pela reunião de várias classes
na mesma escola com a introdução do sistema seriado, a separação dos alunos pelo
sexo, a preocupação com a arquitetura desses prédios nas grandes cidades e
especialmente pela definição de um novo método de ensino, baseado no método
intuitivo (também conhecido como Lições de Coisas), que valoriza a intuição como o
fundamento de conhecimento por meio dos sentidos e da observação.
A escola graduada, ou grupo escolar que se difundiu no Brasil principalmente,
após a chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930, teve sua razão de ser, pois, era
explícito neste governo a manutenção da ordem social a criação de uma identidade
nacional além da implantação de um modelo econômico urbano-industrial. Portanto, a
escola reproduz inconscientemente as características da fábrica, na qual também
surgiram funções como: do diretor, supervisor de ensino, inspetor de ensino e outras
designações, reproduzindo a divisão social do trabalho dentro das escolas. Sobre esta
questão Souza afirma o seguinte:
Quanto maior for a divisão do trabalho, mais homogeneidade terão as operações, de forma que quanto maior for o número de seções da escola graduada menor desigualdade haverá nas condições das crianças de cada seção, porém, o número de seções depende principalmente do número de mestres, do local e do número de crianças que disponham para formar a escola graduada. (...) Os argumentos favoráveis a essa forma escolar ressaltavam a economia de custos e a racionalização, tendo em vista a aplicação dos princípios da divisão do trabalho e dos critérios de administração científica24.
24 Idem, p.30 e 37.
25 25
Quanto aos conteúdos trabalhados nos grupos escolares, estes tinham um caráter
enciclopédico bastante amplo, para a escola primária e os alunos eram separados por
sexo, ou seja, meninos e meninas estudavam em salas diferentes.
Essas escolas tinham toda uma organização própria, intercalando o ensino das
matérias com marchas, cantos e exercícios ginásticos, mostrando assim que a escola
tinha uma organização sistemática, primando pela disciplina como uma forma de manter
a ordem da clientela escolar.
Com o intuito de criar no povo brasileiro uma identidade própria, um espírito de
nacionalidade, enfim de formar uma nova mentalidade na sociedade brasileira, os
republicanos repassaram grande parte desta responsabilidade à escola, dando assim uma
importância maior à educação, e com isso, a responsabilidade e missão do professor
passa a ser maior. Cabia a ele fazer acontecer às mudanças educacionais, que
resultariam numa mudança no modo de vida de toda a população menos favorecida e
criar uma sociedade mais interessada em defender os interesses da “Pátria brasileira”.
Segundo a autora mencionada acima,
A valorização social do professor e o início da profissionalização do magistério primário constituem dois aspectos significativos das transformações educacionais. A importância dada à educação popular nesse período propiciou a constituição de representações sobre a profissão docente nas quais o professor passou a ser responsabilizado pela formação do povo, o elemento reformador da sociedade, o portador de uma nobre missão cívica e patriótica. Era pelo professor que se poderia reformar a escola e levá-la a realizar as grandes finalidades da educação pública25.
O projeto de instrução ao qual os grupos escolares foram projetados, tinha como
pressupostos civilizar, criar a moral nas crianças e, por intermédio delas civilizar e
moralizar suas famílias. Para tanto uma grande preocupação dos preceptores dos grupos
era com a arquitetura dos prédios, onde eram pensados todos os aspectos da construção
para que tivessem o melhor aproveitamento dos espaços e o melhor desempenho dos
alunos. As escolas primárias do período baseavam-se principalmente nos princípios da
racionalidade funcional e da disciplina. A arquitetura dos grupos escolares mereceu não
só a atenção de arquitetos, mas de educadores, médicos e higienistas que pensavam as
condições ideais de ar, luz, mobiliário e postura dos alunos em sala de aula. Tudo era
pensado com a intenção de garantir a concentração dos alunos e para que realmente se
ocupassem dos estudos e das tarefas que deveriam desenvolver.
25 Idem, p. 61.
26 26
Nesta época, médicos e fisiologistas tiveram a incumbência de pensar até no
mobiliário dos grupos, tudo para que as crianças tivessem maior rendimento escolar.
Sobre esta questão escreve Souza:
As carteiras individuais foram enfatizadas como as melhores do ponto de vista pedagógico, moral e higiênico. Num processo de escolarização em massa ao qual correspondia adequadamente a escola graduada (grupos escolares), a padronização e a homogeneização combinavam paradoxalmente com a individualização do aluno. A carteira individual constituía um dispositivo ideal para manter a distância entre os alunos, evitando o contato, a brincadeira, a distração perniciosa26.
A partir do exposto acima fica transparente a preocupação com a garantia da
disciplina, a busca da garantia da moral e o asseio dos alunos. É a partir dos grupos
escolares que se começa a organização escolar que até hoje, encontramos bem presente
em nossas escolas, pois com os grupos escolares também surgiram as subdivisões
escolares tais como: o gabinete para diretor de escola, sala dos professores e outros,
onde as relações de hierarquia e de poder dentro do espaço escolar ganham relevância.
Toda a organização do espaço escolar considera, a ordem e a disciplina como dois
comportamentos indissociáveis da cultura escolar, principalmente quando a instrução
passou a ser ministrada de forma mista, ou seja, meninos e meninas na mesma sala.
Portanto, o método utilizado para a instrução, deveria ser seguido rigidamente
conforme era determinado pelos reformuladores da educação, tanto o método como os
programas deveriam ser cumpridos a risca, com isto o Estado interferia e orientava o
processo de ensino aprendizagem controlando também a formação dos professores e a
prática pedagógica.
Nesse período a educação visava principalmente a educação moral e cívica e
exigia uma formação para o trabalho dos educandos. O projeto previa a educação
integral do homem compreendendo a educação física, a educação moral e intelectual,
com isso poderia garantir a homogeneização cultural e a civilização das massas
populares.
26 Idem, p. 140.
27 27
Implicações da Reforma Educacional no Paraná
A concepção educacional que orientava a educação paranaense nas primeiras
décadas do século XX, como dissemos anteriormente, era uma concepção
racionalizadora, a qual estava baseada no modelo de nacionalidade que se manifestou na
Associação Brasileira de Educação, assim como nas demais reformas estaduais. Os
mecanismos de controle da sociedade eram traduzidos pela organização escolar, na
quantificação estatísticas dos dados e no controle das atividades disciplinares dos
educandos. Segundo Miguel:
Apesar de as modificações estarem inscritas no projeto político de nacionalidade presente nos Estados nos quais ocorreram as reformas, com relação ao ensino primário os dados nos indicam que as modificações foram implantadas sem o empenho das camadas citadinas paranaenses mais privilegiadas, ocupadas em discussões que não envolviam o problema da escolaridade básica das classes trabalhadoras27.
Portanto, a educação paranaense ficou muito mais a cargo da boa vontade do
inspetor em realizar a instrução das populações pobres do que pelo empenho da
sociedade como um todo. Era notório que a burguesia defendia seus interesses em todos
os momentos, mas não se ocupou das questões educacionais para a grande massa
trabalhadora, para eles irrelevantes, a cargo de alguns políticos, e da própria
organização da classe trabalhadora. Em relatórios do inspetor encontram-se citações em
que ele próprio escreve dizendo que era comum, em pequenos povoados, os próprios
moradores construírem à sua custa a sala de aula, também devido ao baixo custo da
madeira na época. E quando esses moradores solicitavam ao Estado um professor, o
inspetor solicitava que os moradores arranjassem casa para o professor e sala de aula, e
que não cobrassem o aluguel da casa do professor. Segundo o próprio inspetor, quando
era possível o governo auxiliava em tais empreendimentos.
A precariedade da instrução no Paraná e a atribuição do fracasso escolar é bem
esclarecida em um trecho do relatório do inspetor Martinez, referindo-se a situação
educacional da década de 20. O relatório diz que algumas escolas: “(...) mantém apenas
alguns alunos porque os pais, desanimados com o mau ensino resultante da falta de
assiduidade do professor, tiram os filhos e preferem pagar, com sacrifício embora, 27 MIGUEL, Maria Elizabeth Blanck. A formação do professor e a organização social do trabalho. Curitiba: Ed. Da UFPR, 1997, p.45.
28 28
mandando-os para a escola particular, ainda que seja estrangeira”28. O inspetor também
comenta que a luta por escolas era grande, e que ninguém queria deixar os filhos sem
instrução, pois em alguns casos as famílias saiam do local em que moravam, e que não
tinha escola, para irem morar em centros maiores onde havia escola.
Porém, mesmo o Inspetor anunciando que havia a falta de escolas no Estado,
para atender a demanda da população, colocava-se a favor do governo ao atribuir o
fracasso do trabalho escolar como sendo de única e exclusiva responsabilidade do
professor. Um dos fatores levado em consideração quanto ao fracasso da educação, é o
fato de que a grande maioria dos professores, não tinham formação adequada para o
exercício do magistério, motivo pelo qual foram criadas novas escolas normais como
em Ponta Grossa e Paranaguá.
Miguel destaca que, mesmo com baixa qualidade de ensino, com falta de
professores habilitados:
A expansão do ensino primário representava a solução encontrada pelas classes citadinas mais privilegiadas no processo de conquista das classes trabalhadoras para o projeto urbano-industrial. As soluções eram muitas vezes utópicas e não correspondiam às necessidades educacionais populares29.
As mudanças que ocorreram no ensino primário no Paraná não chegaram a ser
uma reforma propriamente dita, porém fizeram parte de um modelo voltado para o
nacionalismo, organizaram o atendimento racional da educação e auxiliaram a
resistência às pressões da classe trabalhadora, mesmo que sendo realizada uma
educação em termos mínimos nesse Estado, assim também como em termos de Brasil.
As reformas na verdade visavam a formação através do que chamavam de uma boa
escola, “o hábito do trabalhador produtor”, dentro do direcionamento que vinha se
delineando no Brasil no projeto da industrialização do país, visando pela educação a
formação da moral, do civismo, do patriotismo e do trabalho manual. Ainda segundo a
mesma autora,
A educação escolar aparecia no discurso governista com concessão da elite, das pessoas mais bem posicionadas socialmente e era percebida como instrumento para disciplinar moralmente a população, afastando-lhe a indolência e preparando-a para atividades produtivas. A função da escola primária era explicita: dar aos alunos o mínimo de conhecimentos úteis, além de ensiná-los a ler e escrever, através do
28 Martinez. Citado por Miguel. Idem, p. 46. 29 Idem, p. 46.
29 29
hábito da leitura, formar-lhes os “hábitos morais e mentais” que, ao lado da educação “concreta e útil, veiculada pelos trabalhos manuais”, conduzissem ao bem estar individual e coletivo30.
A escola deveria formar o educando para o trabalho, mas, não para determinado
trabalho e sim para o trabalho produtivo, juntamente com a formação da moral. Porém,
para a educação popular não havia a necessidade do professor ter seu intelectual muito
aprimorado, bastava conhecer um pouco do que iria ensinar e saber o modo como iria
ensinar e pronto. Interessava, incutir nos educandos, através do exemplo, o hábito da
ordem, do respeito mútuo, da disciplina e do respeito às leis e instituições nacionais.
Segundo Miguel:
Após 1930, as medidas de racionalização e reorganização tomadas em relação às demais instâncias administrativas do Estado, nas quais se inseria as referentes à educação, foram impulsionadas por dois fatores:1º) o aumento da população e da demanda escolar; 2º) a concepção, por parte do governo, de que a instrução pública deveria organizar-se de acordo com os princípios de moralização e racionalização para a administração do Estado31.
Foi principalmente nas décadas de 40 e 50, que se acentuou no Estado a
demanda por escolas, conforme ia se consolidando o processo de ocupação e
colonização das terras paranaenses juntamente com a reivindicação da classe
trabalhadora para que participasse efetivamente dos bens culturais e sociais, nos núcleos
urbanos que cresciam consideravelmente. É neste contexto que as lutas por escolas se
tornaram mais veementes.
As Reformas no Ensino Primário Paranaense
No ensino primário as reformas educacionais no Paraná, iniciaram pela
realocação de escolas. Muitas escolas estavam mal situadas e isto dificultava o acesso
dos alunos à escola. Com isto, as crianças deixavam de ir para a escola devido as
grandes distancias, por este fato explicava-se o desinteresse pela mesma. A partir das
realocações das escolas a freqüência dos alunos melhorou. Com a reforma, os
30 MIGUEL, Op. Cit. p.48. 31 Idem, p. 50.
30 30
professores não puderam mais ser, transferidos durante o período letivo e “(...) ao
mesmo tempo, o ensino sofreu transformações: reorganização de programas e horários e
adoção de uniforme e de livros didáticos na rede estadual de ensino”32.
Outras reformulações foram realizadas com o intuito de melhorar a alfabetização
dos alunos para assim diminuir os índices de analfabetismo, como por exemplo, a
criação de um programa bem simples de alfabetização, seguido de instruções aos
professores, principalmente no que diz respeito aos cuidados com as crianças
analfabetas. Foram proibidas matrículas para a quarta série, fazendo assim as matrículas
da primeira série atingirem 60% do total das matrículas.
Ainda, nos grupos escolares, o terceiro e o quarto ano foram reunidos em uma só
sala de aula e os primeiros anos (1ª série) foram desdobrados. Os alunos poderiam ser
promovidos em qualquer época do ano, e as classes de primeiro ano, passaram a ser
exclusiva para alunos analfabetos. Os alunos menores de sete anos não podiam ser
matriculados e os acima de catorze anos só eram matriculados se tivessem excelente
comportamento. Segundo relatório do Estado:
Os alunos que já sabiam ler e escrever passaram a aprender a redação de cartas e bilhetes, pois o Inspetor observou que os mesmos, quando alfabetizados, ficavam apenas nas cópias e contas. Os trabalhos dos alunos passaram a ser colecionados pelos professores como forma de avaliar o progresso de cada um e registrar ‘o dia de trabalho que ocorreu para esse progresso33.
Conforme Nagle, a ênfase na alfabetização, contida nas modificações do
ensino primário no Paraná, não acompanhavam a reforma paulista que tornou
obrigatório e gratuito apenas os dois primeiros anos escolares, embora a escola primária
fosse dos sete aos catorze anos34.
No pensamento de Martinez o analfabetismo só teria sua vitória se a escola fosse
uma verdadeira escola, em que não se ensinasse apenas ler escrever e contar, porém
como não se conseguia fazer muito, além disso, o que era oferecido já estava de bom
tamanho, ficando para os grandes centros urbanos uma instrução de melhor qualidade.
Sobre isto dizia o autor:
32 Idem, p. 30. 33 Idem, p. 30. (Paraná, Relatório, 1921, p.10). 34 NAGLE, Op. Cit. p. 209.
31 31
Não nos sendo possível, porém, levar a todos os pontos uma instrução completa, consigamos ao menos ensinar a ler, a escrever e a contar, onde não pudermos fazer mais. Somos contrários a idéia de se reduzirem as séries do ensino pois, quanto mais pudermos ensinar, tanto melhor para o futuro das nossas gerações. Nos grandes centros, onde nos é mais fácil manter e fiscalizar as escolas, o povo deverá ser contemplado com uma instrução inteiramente gratuita35.
Com isto a instrução nos lugarejos ou lugares menores poderia ser simplificada.
Conforme o tempo ia passando, o analfabetismo continuava aumentando, devido ao
crescimento dos centros urbanos, motivo pelo qual as reformas educacionais, paulista e
paranaense, trataram de intensificar e privilegiar medidas na temática da alfabetização,
pois, a população analfabeta crescia constantemente. Segundo Nagle, “(...) a montagem
de um aparelho administrativo e técnico foi realizada com o propósito de criar as
condições necessárias para a perfeita execução desta tarefa: distribuir a escola primária
para a massa da população em idade escolar36”. Portanto o governo preocupava-se em
organizar todos os detalhes para por em prática o modelo econômico que se
vislumbrava para o país.
O Estado Novo e a Marcha para o Oeste.
Antes de 1930, quem detinha o poder no Paraná, assim como no país inteiro,
eram as oligarquias agro-exportadoras que estavam diretamente ligadas a indústria e ao
comércio da erva-mate no caso do Paraná, e ainda solidárias com as oligarquias
cafeeiras paulistas, que foram derrotadas com a chegada de Getúlio Vargas ao poder.
Sobre o governo de Vargas, faz-se necessário lembrar que durante o período
entre 1937 – 1945, no chamado Estado Novo há um desdobramento por parte do
governo por uma política territorial que se materializa na chamada Marcha para Oeste,
visando o controle do espaço geográfico, e da população brasileira nos seus limites
nacionais e internacionais, evitando assim que colônias de estrangeiros (italianos,
alemães, japoneses, etc) habitassem os espaços vazios, e passassem a viver conforme
suas tradições e costumes de seus países de origem. As várias colônias que existiam no
sul do país foram desmanteladas e obrigada a viver conforme queria o governo
35 Citado por Miguel, p. 31. 36 Nagle, Op. Cit. 206.
32 32
brasileiro, principalmente em relação a educação. Esse interesse pela política
migratória, compreende também o processo de ocupação da região Oeste do Paraná, por
isso é necessário ter claro seus objetivos. Freitag ao estudar a migração e colonização do
extremo oeste paranaense, faz a seguinte afirmação:
Em 1937, foi criado mais um órgão, o Sistema Federal de Segurança e a ele foi acrescida a Comissão Especial da Faixa de Fronteiras. Francisco Campos, seu ideólogo, ao incluir na Carta Estadonovista a chamada “Lei de Fronteiras” a qual estabelecia em 150 km a largura da faixa limítrofe, (bem maior que as definidas pelas cartas anteriores), determinava que essa área deveria ser ocupada somente por pessoas e empresas brasileiras37.
A política do governo Vargas visava, a criação de uma unidade e de uma
identidade nacional, que poderia ser resumida conforme Freitag, como: “a Pátria Unida
e Forte”, com um só hino, bandeira, escudo, e com um só espírito; o nacional. Segundo
a autora:
Esse slogam, Marcha para o Oeste, foi elaborado no ano de 1937 e teve seus objetivos insistentemente retrabalhados nos anos seguintes. Através das mais variadas técnicas de propaganda, construiu a imagem da população marchando em direção da grande obra de construção da unidade nacional38.
Todo este movimento da marcha, do patriotismo e de nacionalismo, visava em
primeiro momento defender as estratégias de manipulação dos interesses das políticas
do Estado Novo, a qual conforme Freitag, envolveu a difusão da cultura e do espírito
cívico, mediante três tarefas básicas, o saneamento, a educação e o povoamento das
regiões despovoadas.
No que diz respeito à educação, este espírito de patriotismo e nacionalismo
estava muito presente nos migrantes que vinham para a Região Oeste do Paraná. Prova
disso, é o que encontramos em documentos da Escola Eleodoro Ébano Pereira de
Cascavel, onde em atas de exposição de trabalhos dos alunos no final de cada ano, os
visitantes das mostras registravam suas impressões sobre a mostra. Nesses registros
pode-se verificar que as ideologias do governo se faziam muito presentes naquilo que as
pessoas escreviam enaltecendo a escola e os professores (o que não estamos criticando), 37 FREITAG, Liliane da Costa. Fronteiras perigosas: Migração e brasilidade no extremo-oeste
paranaense (1937 – 1954). Cascavel: EDUNIOESTE, 2001. p. 29. 38 Idem, p. 40.
33 33
mas também deixavam transparecer o espírito de brasilidade, o seu dever cívico e o
respeito à Pátria.
Com relação ao processo de industrialização no Paraná, Miguel afirma que:
(...) os agentes sociais no Paraná que assumem tanto na teoria como na prática a questão da industrialização, já partem de condições históricas pré-determinadas no campo político-cultural que, desde os anos 20, remodelam e também criam as esferas do público e do privado a partir do marco da indústria. O discurso e a prática industrializante no Paraná seguem o projeto político do empresariado paulista que privilegia abertamente o capital. ‘Industrializar significa, a partir dos anos 20, universalizar no espaço nacional um projeto político de uma fração do empresariado brasileiro, representado pela fração do grande capital39.
Na década de 30, reiniciava-se a colonização do Estado, onde destacamos a
colonização do Oeste paranaense e junto com esta a demanda por escolas e professores.
Conforme Miguel: Em janeiro de 1932, no Decreto nº 271, de 27/01/1932, o Interventor
Federal interino, João David Perneta, em função da demanda, criou as escolas
complementares para integralizar o curso elementar e preparar professores para as
escolas rurais40.
Em 1932, instalou-se a interventoria definitiva de Manoel Ribas, que deu
continuidade a administração racionalizadora, esta racionalização foi responsável por
fazer funcionar a máquina do Estado e também inspirou medidas relativas a educação,
sendo que esta caracterizou-se por uma forte centralização e pelo controle do Estado
sobre as questões educacionais.
O controle era o meio encontrado para que a educação atingisse os objetivos
traçados pelos políticos, portanto o controle foi a forma encontrada para que o trabalho
nas escolas fossem ativados e para tanto foram criadas cinco inspetorias regionais para
realizarem os serviços de inspeção nas escolas.
A educação no Estado do Paraná a partir de 1930, estava portanto fundada na
centralização racionadora e permeada pelos ideais da Educação Nova, dentro do projeto
de construção de uma identidade nacional, sendo realizada não só através dos métodos e
técnicas que eram desenvolvidas em sala de aula, como também pelas idéias
educacionais renovadoras, com franca expansão.
39 MIGUEL, Op. Cit. p. 51. 40 Idem, p. 54.
34 34
A educação no Paraná, também era entendida como forma de preparar os
educandos para o trabalho na sociedade industrial, mesmo não havendo um forte
processo de industrialização no Estado, preparava-se os alunos para a vida urbana. A
Pedagogia era identificada como sendo a ciência pedagógica e fundamentava-se na
Psicologia, na Biologia e na Sociologia, utilizando-se da Estatística para quantificar o
processo educativo e auxiliar a racionalização do sistema educacional. A educação dava
ênfase à observação e experimentação no processo ensino-aprendizagem, e segundo
Miguel, neste momento identifica-se forte presença da Psicologia Diferencial, dando os
fundamentos para a aplicação de métodos e técnicas de aprendizagem e para a
homogeneização das turmas41.
41 Idem, p. 61.
35 35
CAPÍTULO II.
COLONIZAÇÃO E EDUCAÇÃO NO OESTE PARANAENSE ATÉ A
DÉCADA DE 1950.
A Ocupação do Oeste Paranaense
A ocupação da Região Oeste do Paraná, foi marcada por vários momentos de
grandes significados dentro da História Paranaense. No início, a região era habitada por
milhares de índios. Em seguida passou por várias ações envolvendo índios, colonos
espanhóis, os padres jesuítas e os bandeirantes paulistas. Depois foi a vez das
expedições militares que percorreram a região entre 1761 e 1780. Outro momento foi a
luta travada entre os tenentes e as tropas oficiais, quando da passagem da Coluna
Prestes pela região.
Nas primeiras décadas do século XX, a economia da região, girava praticamente
em torno da exploração da erva-mate. Toda a sistemática de produção da erva-mate
pode ser descrita da seguinte forma: os argentinos eram os maiores consumidores e os
donos das obrages42, a mão-de-obra era paraguaia e a matéria prima (erva-mate)
brasileira. Toda a erva-mate produzida na Região Oeste era transportada por barcos a
vapor pelo Rio Paraná, onde seria industrializada e comercializada na Argentina. Aqui
nos cabe uma interrogação: como é que os Argentinos tinham tanta facilidade em
penetrar nas matas nativas da região e explorar tão livremente o mate? Emer apresenta
uma explicação:
A facilidade de acesso dessas empresas argentinas ao território brasileiro foi determinado por diversos fatores históricos. Como havia necessidade de livre trânsito pelos rios da bacia do Prata para chegar à Província do Mato Grosso, logo depois da Independência (1822), o Brasil estabeleceu acordos de navegação com os países vizinhos, inclusive com o Paraguai. O livre acesso aos navios argentinos acima da foz do rio Iguaçu era garantido pelos acordos de navegação de 1856. No período de 1865 a 1870, em razão da necessidade de deslocamento de tropas
42 A obrage foi uma propriedade e / ou exploração típica de regiões cobertas de matas subtropicais em território argentino ou paraguaio. O interesse de um obragero não era a colonização em regime de pequena ou média propriedade, nem o povoamento de suas vastas terras. Seu objetivo precípuo era a extração de erva-mate, nativa da região, bem como a madeira em toros, abundantes no mato nativo subtropical. A obrage, portanto, estava ligada ao binômio extrativista: mate-madeira. Esta exploração, típica desde o início do século passado na Argentina e no Paraguai, penetrou de forma natural e espontânea, pelos vales navegáveis do Paraná e Paraguai. (Sperança 1992, p. 34).
36 36
brasileiras durante o conflito com o Paraguai, a movimentação de navios argentinos era intensa em toda a extensão dos grandes rios, também em regiões em que a fronteira nem sequer era compartilhada entre Brasil e Argentina, como era o caso do trecho da foz do rio Iguaçu até as Sete Quedas, em Guairá43.
Portanto em Cascavel, assim, como em toda a Região Oeste, a erva-mate
representou a base de sustentação para a economia da cidade, mesmo que de certa forma
ilegal e de maneira que mais uma vez o Brasil tem suas riquezas naturais exploradas
sem o controle interno e também pela exploração do mate é que se torna possível à
ocupação do espaço regional claro, guardadas as proporções dessa contribuição neste
sentido, uma vez que a ocupação do Oeste Paranaense também está ligado ao incentivo
do Governo Federal em proteger as fronteiras do País.
Entre os assuntos discutidos neste trabalho, vale ressaltar o que foi a criação do
território Federal do Iguaçu. Entre as medidas de nacionalização da chamada fronteira
guarani, que reuniria as terras do oeste de Santa Catarina, sudoeste e oeste do Paraná,
formando assim outra unidade da federação. Este plano fazia parte do pensamento de
Vargas e dos capitalistas gaúchos que planejavam obter muitas vantagens com negócios
imobiliários, além do escoamento da mão de obra agrícola excedente no Rio Grande do
Sul para esta região. Segundo Wachowicz:
Seria portanto o Território Federal do Iguaçu uma extensão cultural do próprio Rio Grande do Sul. Seria também um mercado garantido para os produtos industrializados naquele Estado da federação. A justificativa para criar o Território Federal do Iguaçu era nacionalizar a chamada “fronteira guarani”. Mas, na realidade, Getúlio Vargas queria subtrair vastas extensões de terras do Estado do Paraná e Sta. Catarina, para melhor atender aos interesses oriundos do Rio Grande do Sul44.
O Território Federal do Iguaçu foi criado pelo decreto lei 5.812 de 1943. Tendo
caído a ditadura do Estado Novo em 1945, em 1946 a constituinte dissolveu o Território
Federal do Iguaçu juntamente com o território de Ponta Porã.
A colonização de Foz do Iguaçu inicia-se com a fundação da Colônia Militar
ainda em 1889, quando o Ministério de Guerra designou um tenente e um sargento de
artilharia para junto com uma comissão comandarem a fundação da Colônia militar na
43 EMER, Ivo Oss. Alguns aspectos da história econômica de Cascavel. O ciclo da erva mate. Cascavel, s.d. p. 1. Mímeo. 44 WACHOWICZ, Ruy Chistovam. História do Paraná. 6ª ed. Curitiba: Vicentina, 1988. p. 237.
37 37
fronteira com Argentina e Paraguai. Segundo Sperança, na passagem pela mata, a
missão encontra sinais de civilização: roças e depósitos de erva-mate, além de com
surpresa, encontrarem ervateiros paraguaios em trânsito procurando utilizar a própria
trilha aberta pelos militares45.
Quando em 1889 os militares fundaram a colônia militar de Foz do Iguaçu,
realizaram um levantamento da população que habitava a região das margens do rio
Paraná. Constataram a existência de 324 indivíduos, assim discriminados: 212
paraguaios, 95 argentinos, 5 franceses, 2 espanhóis, 1 inglês e apenas 9 brasileiros46.
Logo apo a revolução de 30, a região já contava com cerca de dez mil habitantes, sendo
que desses apenas 500 eram brasileiros. Já nas décadas de 40 e 50 a população da região
Oeste muda completamente, pois as frentes de ocupação (colonização) passam a ocupar
definitivamente a região. Estas frentes de ocupação estão diretamente ligadas ao
incentivo do governo na “marcha para o oeste”, conforme já discutido no capítulo
anterior.
Conforme Lazier:
Entre 1950 e 1970 foi o auge da colonização. Foram vendidos cerca de 10.000 lotes, com tamanhos entre 10 e 25 hectares. Portanto na região predominava a pequena propriedade. A ocupação foi rápida, chegavam diariamente 50, 100 e até 200 pessoas, principalmente do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina47.
Os dois principais pólos de ocupação da Região Oeste foram onde hoje fica a
cidade de Toledo, com a predominância de colonos católicos de origem italiana e onde
hoje é Marechal Candido Rondom, sendo que aí predominavam os alemães protestantes.
Atividades Econômicas: A Exploração da Erva-Mate e da Madeira.
Devido ao fato de a Argentina ter plantado grande número de ervais artificiais, e
a erva-mate nativa da Região Oeste não ser mais de fundamental importância, é que
45 SPERANÇA, Alceu A. Cascavel a história. Curitiba: Lagarto, 1992. p. 49
46 WACHOWICZ, Ruy Chistovam. Obrageros, mensus e colonos: história do oeste paranaense. 2ª ed.- Curitiba: Vicentina, 1987. p. 182. 47 LAZIER, Hermógenes. Paraná de todas as gentes e de muita história. Francisco Beltrão, Grafit 2003 p. 43.
38 38
durante a década de 30, houve a decadência das exportações de erva-mate, pois a
Argentina já conseguia abastecer-se de matéria prima do mate de sua própria produção.
Segundo Lazier:
Enquanto o Governo do Paraná tomava medidas a respeito da exportação de erva-mate pelos portos marítimos, os argentinos, com seus ‘obrageros’ e, utilizando trabalho escravo, extraiam no Oeste do Paraná grande quantidade de erva-mate, sem nenhum controle pelo Brasil48.
As obrages eram empresas que exploravam erva-mate nas matas tropicais no
território Argentino e Paraguaio, cujo objetivo era única e exclusivamente a exploração
do produto e não a colonização da área. Foi a partir de 1881, que os obrageros
começaram a exploração da erva-mate na região Oeste do Paraná. As empresas
exploradoras do mate construíram portos às margens do Rio Paraná, entre Guairá e Foz
do Iguaçu, para que pudessem transportar o produto.
No que diz respeito à exploração da erva-mate nas terras que hoje pertencem ao
território de Cascavel, Emer assim escreve:
No território que mais tarde viria a constituir o enorme município de Cascavel, e localidades próximas, a erva-mate era explorada, por diversas empresas estrangeiras, entre elas a empresa de Julio Tomaz Allica, que atuou no período de 1902 a 1940. Em 1902 Allica adquiriu do Estado 558 hectares de terras nas margens do rio Paraná, onde construiu o porto Artaza. Essa empresa tinha características diferenciadas das demais. Seus trabalhadores colhiam erva-mate a longas distâncias em ervais arrendados ou simplesmente invadidos; colhiam erva-mate nas terras da concessão da Empresa Brasileira de Viação e Comércio – Braviaco até Campo Mourão, onde a empresa de Allica tinha fazendas de criação de gado e de animais de tração para as carroças. Para vencer as distâncias e administrar os trabalhadores, Allica organizou inúmeros postos, controlados a partir da Central Santa Cruz, situada no atual território do município de Cascavel49.
Como o ciclo da erva-mate entra em declínio, parte dos obrageros da região
Oeste, iniciam a exploração da madeira para a manutenção econômica da região.
Entre 1881 e 1930, as terras da região Oeste foram exploradas pelos obrageiros,
sendo que a partir da década de 40 ocorreu a ocupação efetiva, com a colonização da
Industrial Madeireira Colonizadora Rio Paraná S/A (MARIPA).
48 Idem. p. 146.
49 EMER, Op. Cit. p. 2.
39 39
Foi na década de 40, que a empresa MARIPA, iniciou a extração de madeira, na
região, onde extraia principalmente o cedro, utilizando-se de mão-de-obra paraguaia. A
madeira era exportada para o mercado platino.
As madeiras de lei eram cortadas nas matas da Região Oeste, transportadas até
as barrancas do rio Paraná, e daí desciam rio abaixo para serem serradas em Posadas,
em Encarnación e outros locais. Ao estudar a exploração da madeira na região assim
escreve Emer:
No tempo em que as companhias estrangeiras atuavam na região Oeste do Paraná, as madeiras mais exploradas eram o cedro e o ipê, comumente chamado de “lapacho”. Esse período era a época da exploração de madeiras de folha. Essa preferência se justificava não porque as companhias estrangeiras desconhecessem o valor do pinho nativo – Araucaria angustiae folia, mas porque as madeiras de folha se encontravam nos vales dos rios e nas terras baixas, na floresta subtropical úmida. A proximidade dessas madeiras do rio Paraná e de seus principais afluentes facilitava a exploração e o transporte no sistema de marombas pelos rios até as serrarias instaladas na Argentina, especialmente em Corrientes e Entre Rios50.
Com a crise de 1929, o Brasil passou por sérias dificuldades econômicas o que
gerou novas políticas no cenário nacional como “a substituição das importações e a
diversificação das exportações”. Essas políticas não tiveram grande impacto devido à
situação de conflito que rondava a Europa antes da Segunda Guerra Mundial, e segundo
Emer, as novas políticas surtiram poucos efeitos, e o já existente movimento
populacional das migrações internas mesmo incentivado pela política do Estado Novo,
de ‘Marcha para o Oeste’ (1938), perde a anterior intensidade51.
Ainda segundo o autor:
Em termos de mercados internacionais, a Europa passa a ser grande consumidora de madeira para a reconstrução do pós-guerra. Este fato repercutiu significativamente na forma de ocupação e colonização do Oeste do Paraná, especialmente na região de Cascavel. Empresas madeireiras passam a instalar-se no Oeste do Paraná e as empresas colonizadoras passam a ser também madeireiras e diversas delas só vendiam as terras aos colonos das frentes migratórias internas após a retirada da madeira de valor econômico, retardando a transferência de famílias migrantes para a região52.
50 EMER, Ivo Oss. Alguns aspectos da história econômica de Cascavel. O ciclo da madeira. Cascavel, 2002. p. 1. Mímeo. 51 EMER, Ivo Oss. Aspectos históricos da educação regional. Cascavel, 2004. p. 7. Mímeo. 52 Idem, p. 8.
40 40
A madeira foi explorada durante muitos anos na Região Oeste e muita madeira
foi desperdiçada até pelo fato de haver grande quantidade de madeira de lei, o que de
certa forma estimulou a formação e crescimento do comércio em Cascavel e também o
surgimento da agricultura e da própria industrialização de Cascavel e região.
O Tipo de Colonização: O Colono Ideal.
A ocupação e a colonização do Oeste do Paraná e por conseqüência, a formação
do município de Cascavel, está ligada às colônias de imigrantes de origem européia, que
vieram para a Região Sul do Brasil. Devido ao aumento populacional passaram a buscar
novas terras, uma vez que essas colônias tinham como prática histórica a produção de
excedentes agrícolas com a finalidade de comercialização e acumulação de capital.
Conforme Emer:
Com o dinheiro conseguido com a venda de excedentes da produção rural seria paga a terra e supridas outras necessidades do grupo familiar recém instaladas no território brasileiro. (...) A realização econômica desta população dependia de terra para a produção e de mercados consumidores para o consumo de seus excedentes53.
Portanto estava já na perspectiva dos colonos vindos do sul do país, a conquista
de novas terras como principal elemento cultural. Atendida esta necessidade aí viriam as
outras preocupações.
Após a Primeira Guerra Mundial e especialmente após 1930, ocorrem no Brasil
mudanças nas políticas econômicas, sendo que as importações são substituídas, por
produtos fabricados no país. Este momento é considerado como primeiro passo para a
viabilização do processo de industrialização e início da saída da população do campo
para a cidade. Com estes processos os mercados consumidores crescem, aumentando
assim o consumo de alimentos o que impulsiona a implantação e o crescimento da
indústria no Brasil, além de aumentar a comercialização dos excedentes alimentícios das
colônias agrícolas.
Nas décadas de 1920 e 1930 surgem as primeiras correntes migratórias que
começavam a se distanciar das antigas colônias. A partir da metade da década de 1930
53 Idem, 2004, p. 7.
41 41
essas correntes saíram dos estados de origem e atingiram regiões mais distantes como é
o caso da Região Oeste do Paraná.
Sobre a questão da colonização da região Oeste do Paraná nos parece não ser a
retirada da madeira a única responsável pelo tardeamento da vinda das famílias
migrantes para a região de Cascavel, mas como nos coloca Schneider, a respeito da
colonização da região Oeste do Paraná, quando empresas particulares iniciam o
processo de ocupação do Oeste a partir de objetivos traçados politicamente, o autor
escreve:
Sob os auspícios do governo e pela iniciativa de empresas particulares de colonização, tal espaço regional – que até então se apresentava coberto por um adensa floresta, explorado por empresas estrangeiras e escassamente ocupada por índios – conheceu um movimento de reordenação sócio-ambiental irreversível. Caracterizou-se, sobretudo, pelo movimento de ocupação empreendido por empresas particulares, responsáveis, entre outras coisas, pelo re-ordenamento populacional daquele espaço, bem como pela dinamização agrícola – cujo suporte estava na policultura. O plano de colonização empreendido pela empresa MARIPÁ no território adquirido no Paraná insere-se neste movimento54.
Neste livro o autor citado acima, faz uma análise da estrutura desta empresa e
mostra como se dava à escolha das famílias que deveriam compor o cenário
populacional da região, sendo que o interesse era por famílias alemãs e italianas que
tivessem o espírito comunitário, com sonhos, coragem para enfrentar as dificuldades
iniciais, que tivessem o espírito de aventura entre outros a fim de formar o melhor
colono do Brasil, pessoas trabalhadoras capazes de desenvolver na região uma forte
agricultura. As ações desenvolvidas pela MARIPÁ estavam atreladas a um programa
nacionalista, objetivando entre outros aspectos a colonização de fronteiras ainda pouco
exploradas. Tal projeto acaba vindo de encontro com as intenções dos colonos sulistas
de buscarem novas terras devido as suas necessidades, o que facilita a transferência
dessas famílias à região. Conforme Schneider:
Ao longo da construção narrativa produzida pelos dirigentes da MARIPÁ, o colono migrante do Sul do Brasil é assinalado favoravelmente no que se refere ao dinamismo e empenho, indispensáveis para um projeto deste porte. Esta caracterização – utilizada por vários emissores oficiais – aparece intimamente atrelada ao sucesso econômico e social da área colonial. Isto se deve ao fato de que
54 SCHNEIDER, Cláudio Ivan. Os senhores da terra: Produção de consensos na fronteira Oeste do Paraná, 1946 – 1960. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 2002. p. 27.
42 42
o colono ideal para ocupar as terras do Oeste do Paraná deveria se enquadrar nos moldes sugeridos pela empresa: trabalhador, honesto, experiente e de espírito empreendedor55.
Segundo Schneider a empresa MARIPÁ seguia alguns critérios para que as
famílias viessem para a região, como ser de procedência de colônias do Sul, ser colono
de bom valor produtivo, ou seja, que fosse bom produtor rural, e por último ser pessoa
honesta. Aqui nos parece estarem os requisitos muito ligados à questão da preocupação
da empresa em não ter prejuízos com as vendas das terras.
A preferência por colonos de origem alemã e italiana, ao se considerar estes
como “predestinados, elementos de inestimável valor”, estão implícitas as preocupações
com a produção de gêneros alimentícios e a importância de o projeto dar o retorno
esperado, tanto para a empresa, como para os objetivos governantes, por isso era
necessário ressaltar o espírito colonial dessas duas etnias. Para Schneider ao,
Considerar válidos somente os colonos ‘euro-brasileiros’ – descendentes em sua maioria de alemães e italianos, com dedicação ao cultivo e produção agroalimentares – significa conferir a estes a capacidade de colaboração com o desenvolvimento e a integração do Oeste paranaense ao restante da nação. Aqueles que não se ajustassem a estas características, representavam, de certo modo, um a ameaça ao controle dos poderes público e privado, este último, desempenhado pela empresa colonizadora56.
Portanto podemos entender que o processo de colonização do Oeste do Paraná
não foi pura e simplesmente uma obra casual, mas sim um acontecimento planejado, a
partir de um projeto nacional de ocupação das terras de fronteiras e de grande potencial
produtivo, que foram elaborados também com o apoio do governo estadual, que através
de uma empresa particular pôs em prática o projeto de forma pensada e ordenada. A
primeira vista nos parece que a colonização ocorre por acaso, porém no contato com
diversas pesquisas que tratam das questões da colonização da região, vão sendo
construídas teias que deixam transparecer a realidade dos acontecimentos, ou seja,
buscava-se um tipo de colono ideal para colonizar as terras da região Oeste do Paraná.
Essa questão ganha relevância principalmente na obra de Schneider, que ao estudar o
papel da empresa MARIPÁ nos mostra, também, qual era a ordem de organização
55 Idem, p.56. 56 Idem, p.57.
43 43
cultural das duas etnias que tiveram a preferência para colonizarem esta região.
Segundo o escritor os grupos tinham não na mesma ordem, mas ambas a mesma
preocupação com a escola e a igreja, ou seja, estas duas instituições tinham papel
importantíssimo na formação dos grupos de colonizadores, que vinham para a região,
uma vez que:
Na organização das comunidades, a escola e a igreja assumiram um papel fundamental. Estas instituições garantiriam a continuidade da tradição cultural, ao mesmo tempo em que tinham a função aproximar os indivíduos e as famílias. Integrando-os em torno de valores, representações e aspirações comuns. A unidade de princípios, as práticas comuns e a educação para os valores do cristianismo e para o senso de dever representavam o fundamento da forte coesão social das comunidades. Neste sentido, a família e a escola foram consideradas de certa forma, como uma extensão da Igreja, possibilitando ao individuo uma representação ideal para sua conduta no cotidiano. A escola assumiu nas comunidades, evangélicas um papel preponderante, uma vez que a leitura e a interpretação da Bíblia eram básicas para a sobrevivência religiosa, o que pressupunha a escolarização57.
Isto posto podemos perceber a forte influência que escola e igreja tiveram na
formação da sociedade da Região Oeste do Paraná. Estas duas instituições estiveram
sempre presentes no início dos grupos de colonizadores, uma vez que em todos os
momentos na história brasileira, as mesmas fizeram parte das ideologias das classes
dominantes, não seria diferente na Região Oeste do Paraná.
Os colonos de toda a região, seja durante o período Imperial ou após a
Proclamação da República, continuavam sem poder contar com o apoio dos
governantes, sendo assim, eles próprios ficavam como responsáveis pela abertura de
estradas e pelas construções necessárias para a sobrevivência do grupo, inclusive pela
organização da instrução dos filhos dos colonos. Para Emer:
O Estado brasileiro relutava em assumir o compromisso com a educação onde o serviço público já se fazia presente. Muito mais complicado era o Estado estender a escola nas áreas rurais e particularmente nas áreas afastadas onde tinham sido assentadas as colônias de imigrantes europeus58.
57 SCHALLENBERGER, Erneldo; COLOGNESE, Sílvio Antonio. Citado por Schineider, p. 71. 58 Idem, Emer, 2004, p. 9.
44 44
Devido ao fato dos colonos europeus já terem construído uma visão diferente em
relação a experiências de lutas e buscas de seus direitos, esses colonos entendiam que a
educação tinha um papel fundamental na vida das comunidades, ou seja, a escola era um
meio de inclusão e ascensão social. Conforme Emer os migrantes europeus trouxeram
consigo o apreço pela escola e a firme convicção da necessidade da escolarização para
seus filhos.
As colônias de migrantes que vieram para o território brasileiro construíam suas
escolas e escolhiam para ser o professor uma pessoa do próprio grupo, nessas escolas os
conhecimentos ou conteúdos eram trabalhados a partir do interesse do próprio grupo, ou
seja, a escola estava a serviço do grupo colonial e de sua cultura. Portanto assim como
ocorreu com os migrantes internos as frentes migratórias na região Oeste do Paraná
também buscavam solucionar seus problemas de sobrevivência, e após, resolvidos os
problemas relacionados a este fator, o passo seguinte era construção da escola, a
chamada “escola dos colonos”.
As Experiências com Escolarização na Região Oeste.
A escola na Região Oeste do Paraná não inicia com a educação formal em seus
moldes tais como conhecemos hoje, mesmo que por mais rudimentar que fosse.
Conforme Emer, a escolarização na Região Oeste do Paraná, passou por quatro estágios,
que são: escolarização particular domiciliar, casa escolar particular, casa escolar pública
e grupo escolar.
O primeiro, foi a escolarização particular domiciliar: este tipo de instrução era
realizada por uma pessoa do grupo que apresentasse condições mínimas de ensinar
algumas crianças a ler, escrever e calcular. Sendo que os objetivos dessa educação eram
traçados pelos pais dos alunos. Segundo Emer, esta prática de escolarização não pode
ser confundida com a instrução dada pelos pais59. Esses quando sabiam ler e escrever,
ensinavam os filhos escrever o próprio nome, isto quando tinham tempo principalmente
nos dias de chuva, não havia uma seqüência nos ensinamentos, eram esporádicos.
A segunda forma de instrução, a casa escolar particular: caracterizou-se como
uma escola construída e mantida por um grupo de pioneiros. Este tipo de instrução era
59 Idem, Emer, 2004, p. 9.
45 45
parecido com a anterior em suas práticas educacionais e ambas não tinham o cunho de
oficial. Neste tipo de escolarização o professor deveria ter uma melhor qualificação.
Como escreve Emer:
Na ocupação e colonização do Oeste do Paraná, a Casa Escolar Particular mais comum foi a ESCOLA DOS COLONOS. Os grupos sociais não esperavam que o poder público resolvesse o problema de educação, eles construíam sua escola, contratavam e pagavam seu professor e produziam a educação por eles percebida como necessária60.
O terceiro modelo foi a casa escolar pública. Esta modalidade de instrução se
deu principalmente nos núcleos urbanos, e nas comunidades rurais e já apresentava a
presença de serviço público. Segundo Emer:
Esta modalidade escolar criada por ato oficial do poder público municipal assumindo a casa escolar existente, ou construindo onde não existisse e em ambos os casos, pagando o professor. Como uma escola oficial, os alunos das Casas Escolares Públicas eram submetidos aos exames públicos elaborados pelos órgãos educacionais públicos para comprovação de escolaridade primária. Se comprovasse escolarização de nível primário, recebia o diploma – uma garantia de conquista de espaço de trabalho, especialmente no serviço público. Desde essa época, um certificado de escolarização contribuía para conquista de espaço social, no contexto já da ampla divisão do trabalho61.
A partir desta citação, nos vem a lembrança de que este tipo de procedimento em
relação à instrução e ao serviço público já estava posto muito antes a nível de país
anterior à Proclamação da República, na época do Império quando os filhos dos que
tinham acesso a educação eram preparados para exercer funções nos cargos de
confiança no serviço público.
O quarto estágio foi o grupo escolar, modalidade de ensino que se distingue das
demais, por fazer parte de um projeto nacional de educação, baseado principalmente nos
moldes europeus e americanos de instrução e de difusão da educação popular sendo esta
uma das várias medidas de reforma da instrução pública que teve início no Estado de
São Paulo e que se expandiu pelos outros Estados como no Paraná, por exemplo, porém,
com proporções bem reduzidas em relação ao projeto elaborado para o Estado de São
Paulo. Os grupos escolares eram construídos em núcleos urbanos, onde a concentração
60 Idem, Emer, p. 10. 61 Idem, Emer, 2004, p. 10.
46 46
de pessoas era maior também pelo modo como funcionava, ou seja, é a partir dele que
temos o ensino simultâneo e com várias classes, o sistema de séries etc.
As modalidades acima citadas, não estão ligadas diretamente ao tempo
cronológico, mas são determinados pelas questões sociais, pela presença ou não do
poder público, além da satisfação ou não dos grupos sociais em relação ao tipo de
instrução que recebiam em cada momento histórico.
Foz do Iguaçu foi a primeira localidade na região Oeste do Paraná a ser ocupada
por funcionários da Colônia Militar, e também foram os funcionários dessa colônia os
primeiros a terem a preocupação com a instrução dos filhos uma vez, que esses
poderiam vir a exercer um cargo no serviço público. Em relação ao interesse das
famílias pela instrução dos filhos na colônia de Foz do Iguaçu, Emer diz que:
O interesse dessas famílias em contratar os serviços de escolarização de seus filhos revela o desejo de reprodução de suas condições sociais e um nível de consciência de classe na perspectiva da ideologia liberal, isto é, na luta de conquista de espaço social, venceria quem tivesse melhores condições, a partir da escolarização, mesmo que realizada a nível doméstico e informal62.
Aliás, nesse período a educação era vista como redentora dos problemas sociais
em todo o país, ideologia esta semeada em todo o território brasileiro pelos grupos
liberais.
Até o fim da Colônia Militar de Foz em 1912, os filhos de famílias brasileiras
tinham que ir estudar em outras cidades ou até nos países vizinhos, (os que tinham
condições financeiras). Após 1914, começam ocorrer transformações no que diz
respeito ao campo da instrução em Foz do Iguaçu e região. Entre 1915 e 1916 começou
a Casa Escolar Pública em Foz, paralelo a Casa Escolar continuou existindo a instrução
domiciliar até o momento da instalação do Grupo Escolar no ano de 192863.
Já em Santa Helena, apesar de colonos residirem desde o início da década de 20,
devido a uma série de fatores, a escolarização para os filhos dos colonos só foi possível
a partir da década de 30, mas logo se desfez, retornando o processo de escolarização
naquele local, somente na década de 1950, agora num movimento amplo de
colonização, conforme apresentado anteriormente.
Em Catanduvas, conforme Emer:
62 Idem, Emer, 2004 p. 10. 63 Idem, Emer, 2004, p.11.
47 47
(...) embora lá tenha se estabelecido população desde a época da criação do posto de abastecimento dos militares fundadores da Colônia Militar de Foz do Iguaçu (1889), só passou a existir alguma forma de escolarização no final da década de 1920, com peculiaridades, até certo ponto, inéditas, em toda a região Oeste do Paraná64.
O fato inédito, conforme Emer é a construção em Catanduvas de uma Casa
Escolar por uma Célula de Ação Integralista, que fornecia material didático e
supervisionava o trabalho nesta escola e pagava a professora. Porém em 1931 esta
escola parou de funcionar porque a professora do local abandonou o trabalho na escola,
além da mudança do traçado da estrada (rodovia BR 35), que deixou o município de
Catanduvas, mais afastado desta rodovia.
64 Idem, Emer, 2004, p.14.
48 48
CAPÍTULO III
A PRIMEIRA ESCOLA DE CASCAVEL: 1932 – 1952.
Cascavel: da Chegada dos Primeiros Moradores, à Criação do Município.
A história de Cascavel tem seu início como registro historiográfico, no século
XIX, conforme escreve Sperança:
Em 06 de junho de 1893 ocorreu o primeiro registro de acontecimento que, no futuro, teria relação direta com a formação de Cascavel. Um novo decreto promoveu a transferência na ocasião de todos os direitos concedidos ao engenheiro João Teixeira Soares (1848 – 1928) para a Companhia Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande. Essa empresa possuía, via concessão, terras na região da atual cidade de Cascavel, mais tarde transferidas à Empresa Brasileira de Aviação e Comércio (Braviaco)65.
É em parte dessas terras que em 1922, Antonio José Elias passa a residir, e que
mais tarde José Silvério funda a cidade de Cascavel, em março de 1930. A primeira
atividade econômica desenvolvida na Região Oeste, assim como em Cascavel, foi a
exploração da erva-mate, sendo que a exploração deste produto se deu até
aproximadamente o ano de 1936.
Os primeiros colonos sulistas chegaram na região Oeste ainda na década de 20 e
começaram a se espalhar pelo interior do município da futura Cascavel. São estas
primeiras famílias juntamente com as que vêm nos anos subseqüentes que participam
ativamente dos movimentos para a colonização da região. Novas levas de colonos
sulistas chegam na região Oeste nas décadas posteriores contribuindo assim para o
aligeiramento do desenvolvimento econômico, político, social e porque não educacional
de Cascavel e região.
O início da colonização de Cascavel está também ligado ao ciclo da madeira,
pois, para as construções das moradias dos pioneiros a madeira apresentava grande
importância para os que aqui chegavam, construírem suas casas. Segundo Emer:
65 SPERANÇA, Op. Cit. p. 52.
49 49
Quando a população inicial, que deu origem à cidade de Cascavel aqui chegou, suas primeiras residências foram construídas com madeira de pinho lascado. A cobertura também era feita com tabuinhas de pinho lascadas e plainadas manualmente com uma ferramenta chamada ferro de fazer tabuinhas. Diversos pioneiros da cidade de Cascavel, em depoimentos gravados, explicaram o processo utilizado na produção de tábuas lascadas para a construção das primeiras residências. Primeiro escolhiam e derrubavam um pinheiro, serravam toras de dois metros, dois metros e meio e partiam em quartos e dos quartos tiravam as tábuas. Eram tábuas curtas66.
Estes fatos nos mostram as dificuldades enfrentadas pelos pioneiros em construir
suas moradias, uma vez que no inicio praticamente tudo era realizado manualmente.
Conforme as leituras dos textos de Emer, após a Segunda Guerra Mundial, a
exploração da madeira em Cascavel, juntamente com outros fatores históricos, tanto a
nível nacional como internacional, contribuíram para uma nova realidade, ou seja, para
mudanças no progresso de Cascavel. Segundo Emer, em 1945, já havia em Cascavel,
três serrarias, o que demonstra o aumento da produção de madeira o que contribui para
o progresso da localidade.
Até a metade da década de 1940, as serrarias instaladas em Cascavel cumpriam a
finalidade de serrar a madeira, para abastecer a população local, na construção de suas
casas e instalações necessárias à subsistência da família. Com o avanço científico e
tecnológico, o ciclo da madeira toma outro direcionamento, pois com motores e energia
elétrica, as madeireiras passaram a beneficiar a madeira em escala industrial e
comercial, assim como a conquista de novos mercados consumidores. É a partir do
ciclo da madeira, que se inicia na região Oeste e em Cascavel, a exploração sistemática
da terra através de uma agricultura mecanizada e planejada, dentro de um projeto de
ocupação de toda a região, e com o intuito de trazer os agricultores do Rio Grande do
Sul e Santa Catarina.
Portanto, percebe-se que a exploração da madeira no município de Cascavel, e
em toda a região após a exploração da erva-mate, representou a abertura de novas
possibilidades econômicas, estimulando a vinda dos primeiros colonos para povoar os
municípios, e explorar economicamente a terra, principalmente através da agricultura.
Os pioneiros iniciaram a criação de animais, mas, principalmente implantaram no
66 EMER, Op. Cit 2002. p. 2.
50 50
município a agricultura, com a produção de diversas culturas, como milho, feijão, trigo,
arroz e posteriormente a soja entre outros.
O Comércio em Cascavel
Com a vinda de famílias para a região de Cascavel, devido a exploração de erva-
mate e depois com a exploração da madeira, fazia-se necessário suprir as necessidades
básicas da população, e para isto precisava-se do comércio, para facilitar a vida dos
moradores. Sabemos a partir de várias fontes que José Silvério de Oliveira, o Nhô Jeca,
foi o primeiro comerciante de Cascavel, pois no inicio da década de 1930, instalou aqui
o primeiro estabelecimento comercial do município. Sobre o comércio em Cascavel,
assim escreve Emer:
José Silvério de Oliveira, também citado pela alcunha, pelo cognome de Nhô Jeca Silvério, em 1930, instalou uma bodega nas proximidades da atual Praça Getúlio Vargas, marco zero da Cidade de Cascavel. Na época, aí era um entroncamento da estrada estratégica com inúmeras outras picadas que davam acesso aos portos do rio Paraná, usados pelas companhias estrangeiras que exploravam erva-mate e madeira. Conforme descrições de antigos moradores, o estabelecimento comercial de Nhô Jeca Silvério era tipicamente uma bodega67 de chão batido, com poucas mercadorias que servia muito mais como local de encontro dos primeiros moradores de Cascavel68.
Nhô Jeca já havia percorrido em outras ocasiões a região, e quando em 1930,
instalou-se com sua bodega em Cascavel, ou seja, no atual perímetro urbano do
município, diversas pessoas que trabalhavam para ele aqui se fixaram e segundo Emer:
“(...) conviveram com funcionários e gerentes das empresas estrangeiras de exploração
de erva-mate, que, por diversas razões conjunturais nacionais e internacionais, já se
encontravam desativadas ou em difíceis condições econômicas”69.
Com a chegada de outros grupos de moradores, houve a necessidade de aumento
do comércio local, uma vez que esses grupos tinham costumes e usavam diferentes
produtos para suprir necessidades básicas do dia-a-dia. Segundo Emer:
67 Taberna, botequim, bar (pequeno armazém, onde se compram produtos de primeira necessidade, muito comum em pequenas comunidades do interior). 68 EMER, Ivo Oss. Alguns aspectos da história econômica de Cascavel. O comércio. Cascavel, 2002. p. 2. Mímeo. 69 Idem, p. 2.
51 51
Ainda na década de 1930 já existiam algumas lojas em Cascavel. São citadas as casas de comércio de Manoel Silvério, de Miguel Wichoski Filho, de José Bartnik, de Horácio dos Reis e de Aníbal Lopes. Há amplos relatos de que o suprimento de mercadorias para as lojas eram buscados em Guarapuava e Ponta Grossa, nesse período, utilizando como meios de transporte os carroções dos poloneses. Alguns desses poloneses, entre eles Teodoro Tfardowski, Francisco Wichoski, Ladislau Boiarski, Francisco Batnik foram famosos carroceiros dos tempos de povoamento de Cascavel. Recebiam encomendas dos proprietários das pequenas casas de comércio e buscavam as mercadorias em Guarapuava e Ponta Grossa. De Cascavel os carroções não seguiam vazios – levavam banha em latas, charque de porco e couros de animais selvagens, especialmente de anta, de porco do mato e de onça. Diversos desses carroceiros, nos primeiros tempos que aqui residiam, chegaram a prestar serviços de transporte de erva-mate para a Companhia Mate Laranjeira70.
O senhor Edjas Santetti Siqueira71, em entrevista, nos contou que foi carroceiro,
aprendeu o ofício com seu pai, fazia viagens para Ponta Grossa e Guarapuava levando
milho, erva-mate, couro de caça e couro de gado e na volta trazia secos e molhados,
como: açúcar, tecidos, querosene, calçados e outros. Lembrou que as viagens eram
cansativas e que dependendo do clima demorava mais, ou menos tempo para fazer o
trajeto de ida e volta. Nos contou que recebiam 900 mil réis por viagem e que o valor
das prestações da carroça, enquanto estavam pagando, era de 500 mil réis, e disse que
neste tempo lhe parece que o “dinheiro tinha muito mais valor”.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e com a valorização do café no mercado
internacional, que ajudou no fortalecimento da economia brasileira, o governo Federal,
resolveu nacionalizar as fronteiras Oeste e com isto a estrada mais importante recebe
melhorias e passou a ser chamada de BR 35 (hoje BR 277). Com as obras na estrada foi
montado um acampamento para os trabalhadores, em Cascavel, o que contribuiu
significativamente aumentando assim a produção, o comércio e também o consumo no
município. Conforme escreve Emer:
O depoimento de outros pioneiros esclarecem, os diferentes estágios da história do desenvolvimento comercial de Cascavel. Na década de 1940 é que surgiram estabelecimentos comerciais maiores, com mais recursos financeiros e estoques mais diversificados, comparados com os estabelecimentos anteriores. Além das casas comerciais citadas, outras entraram em funcionamento, como a Casa Comercial de João Miotto e a de Adelino Cattani. Em 1944, Jacob Munhak abriu uma casa de comércio no Distrito de São João. Trabalhei na lavoura (em São João)
70 Idem, p. 2. 71 Morador ainda hoje (2005) em Cascavel e que veio para a cidade em 1931, que nos concedeu entrevista juntamente com o professor Adalberto Pompeu, no dia 05/01/2005. Seu Edjas prefere ser chamado pelo apelido de “Deja”, por isso a partir de agora em referencias a seu Edjas usaremos seu apelido.
52 52
de 1936 até 1944. No mês de agosto de 1944 abri uma bodega lá, um armazenzinho, porque lá não tinha comércio nenhum. Para comprar qualquer coisa tinha que ir para Cascavel. Já tinha comércio bom em Cascavel, naquela época. As mercadorias a gente ia buscar em Guarapuava de carroça, carroção com oito burros. Gastava dois meses, um mês e pouco, conforme o tempo corria, para ir e voltar e trazer as mercadorias com carroça. Abri o botequinho, e como fui bem72!(...)
Tratamos até aqui dos meios econômicos que possibilitaram o povoamento da
Região Oeste e de Cascavel, pois para que possamos falar da educação no município é
necessário entender ao menos em linhas gerais, como se deu o processo de exploração
econômico, ou seja, como os primeiros moradores da cidade se organizaram para prover
a subsistência das famílias pioneiras. Nosso objetivo foi mostrar quais os momentos e o
que se explorou no município para que a cidade se tornasse uma realidade.
Da Criação da Primeira Escola Isolada ao Grupo Escolar
Passaremos agora a tratar do processo de escolarização na Região Oeste e com
ênfase à educação no Município de Cascavel que é o nosso foco central. Nossa
pretensão neste trabalho não é trazer grandes novidades a respeito da educação no
município de Cascavel, ou de levantar questionamentos e críticas infundadas sobre o
que já foi escrito anteriormente por escritores e pesquisadores, sobre o assunto no
município e na região Oeste.
Porém o que queremos realmente é compreender a origem e a constituição da
primeira escola pública primária no município de Cascavel, fazendo uma análise das
transformações ocorridas com esta escola até tornar-se grupo escolar e receber o nome
de Eleodoro Ébano Pereira. Queremos compreendê-la desde sua criação até o momento
em que o município de Cascavel emancipa-se de Foz do Iguaçu contextualizando-a,
dentro das questões políticas, econômicas e sociais da época. Para tanto, vamos fazer
uma análise histórica, considerando as transformações sociais, em nível local, regional e
nacional. O que estamos tentando fazer é levantar e catalogar fontes primárias e
secundárias acerca do processo de colonização e escolarização de Cascavel e, dessa
forma, contribuir para um melhor conhecimento do processo histórico de nossa região.
72 Idem, p.3.
53 53
Destacamos também, como já dissemos anteriormente, que o material e as informações
levantadas por nós ao longo deste trabalho, sobre a educação de Cascavel, serão
organizadas e disponibilizadas para que outros estudantes pesquisem, a partir do que já
conhecemos, outros aspectos da educação do município, ou ampliem tais
conhecimentos.
E por fim queremos contribuir com os estudos acerca da história da educação
brasileira, a partir da pesquisa da história educacional regional e local, para que outras
pessoas, pesquisadores, e alunos dos diversos níveis de ensino do nosso município
conheçam um pouco mais da história da nossa educação, e que a partir do que já
sabemos e levantamos sobre o tema, outros tenham o interesse de buscar novas
informações para contribuir com o resgate da nossa história.
A história da educação de Cascavel tem vários motivos que podem ter
determinado seu início, mas parece ser a mudança do traçado da rodovia BR 35, um dos
fatores que influenciaram mais diretamente na formação da cidade e, por conseqüência,
na busca por educação de seus moradores, segundo Emer:
Em decorrência do novo traçado da rodovia, os serviços públicos existentes em Catanduvas foram transferidos para Cascavel, onde foi instalada a Central de Correios e Telégrafos e foram divulgados planos de governo para o desenvolvimento da localidade. Quem tinha interesses em dedicar-se a atividades urbanas tratou de transferir-se de Catanduvas para Cascavel. Até famílias de agricultores, descendentes de poloneses, já instalados em Catanduvas, transferiram-se para Cascavel, onde já existia um grupo polonês radicado. ‘A escola de Catanduvas foi interrompida porque quem se interessava pela educação de seus filhos veio para Cascavel73.
Portanto, este parece ter sido um passo importante e decisivo para o início da
ocupação e colonização no município de Cascavel, além de diversos fatores esta estrada
passou a ser de fundamental importância para que o município começasse a tomar
consistência no seu âmbito populacional e organizacional.
Percebemos que em relação à educação, Cascavel demorou apenas dois anos
depois da chegada e fixação dos primeiros moradores (pioneiros), para construir sua
escola, diferente das demais localidades da região Oeste do Paraná que demoraram bem
mais tempo para terem escolas. A rapidez com que se constituiu a escola em Cascavel,
deve-se principalmente pelas características humano-culturais presentes na população
73 EMER, Op. Cit 2004. p. 14.
54 54
constituída no local. O grupo de moradores instalados no agrupamento de casa em
Cascavel, (na época Encruzilhada dos Gomes), era formado por comerciantes com suas
famílias, trabalhadores rurais e descendentes de imigrantes poloneses que praticavam
atividades diversificadas. Esses colonizadores viam a escolarização como um meio para
favorecer as relações sociais, humanizar a si próprios e de fortalecer a cultura do grupo.
Os moradores organizaram-se e construíram uma capela para homenagear Nossa
Senhora Aparecida e, em 1932, nesta capela passou a funcionar a escola da localidade.
Segundo Emer:
(...) a capela passou a ser utilizada para escolarização de crianças de maneira informal, na modalidade de Casa Escolar Particular. Nos três primeiros anos, a escola foi mantida pela população local e os professores (Aníbal Lopes da Silva, Sandálio dos Santos) tinham vínculos com a Comissão de Estradas ou eram funcionários públicos74.
Podemos perceber pela citação acima, a relação existente entre Igreja e escola
que havia na época e o interesse pela escolarização dos filhos dos primeiros moradores,
como forma de ascensão social, uma vez que a escola era vista como a redentora dos
problemas sociais, a instituição responsável pelo progresso do país e por criar uma
identidade nacional.
Conforme o que tem sido escrito sobre a história da educação de Cascavel, a
primeira escola aberta no ano de 1932, foi autorizada pelo Interventor Manuel Ribas.
Esta escola era um pequeno rancho construído com madeira de pinho lascado, que
segundo Sperança & Sperança, “também servia de capela religiosa, tendo entre seus
primeiros professores Orozendo Cordeiro de Jesus e as irmãs Genoveva e Estanislava
Boiarski”. Ainda segundo Sperança & Sperança esta escola:
Funciona até 1938 na Capela Nossa Senhora Aparecida, quando recebe prédio próprio, já na condição de Casa Escolar. Nesse período a direção do estabelecimento fica a cargo provisoriamente, entre 1932 e 1934, de Aníbal Lopes da Silva. Orozendo Cordeiro de Jesus permanece na direção somente no ano de 1934. A partir de 1935, por três anos a direção será confiada à professora Genoveva Boiarski75.
74 Idem, p.15. 75 SPERANÇA, Alceu. & SPERANÇA, Carlos. Pequena história de Cascavel e do Oeste. Cascavel –
PR: J. S. Impressora ltda. 1980. p. 18.
55 55
Como disse acima, não tenho a pretensão de fazer afirmações, nem tão pouco
duvidar ou contrariar informações já escritas por historiadores e escritores da nossa
cidade e região sobre a educação de Cascavel, até porque sou grande admirador dos
mesmos, porém, farei alguns apontamentos que encontrei em minha pesquisa e que
acabam por vezes trazendo novas informações consideradas. É o caso da entrevista que
realizei com o senhor Edjas ou seu “Deja” como gosta de ser chamado, quando disse
que estudou na primeira escola de Cascavel, e que seu pai não pagava para ele estudar,
ou seja, há ainda uma lacuna, uma informação a ser confirmada, se realmente a primeira
escola de Cascavel era pública ou particular. Relatam os registros que esta escola foi
construída de pinho lascado, tendo iniciado as aulas no ano de 1932. Seu “Deja” relata
que quando foi construída a primeira igreja, então na escola passou a funcionar a
delegacia e as aulas eram ministradas na igreja, imediações de onde hoje é a igreja Stº
Antonio que por muito tempo foi a igreja matriz de Cascavel. Sendo assim a escola que
funcionou junto à igreja foi a segunda escola e o terceiro prédio já recebia o nome de
grupo escolar, próximo de onde hoje, localizam-se as ruas Pio XII e Avenida Brasil. O
entrevistado disse que chegou com sua família em 1931 em Cascavel, iniciando assim
seus estudos em 1932, tendo estudado até os 16 anos, quando concluiu a 4ª série.
Segundo seu Deja, o primeiro professor da primeira turma de alunos da primeira
escola foi o senhor Inácio Ramos, e que na primeira escolinha este foi o único
professor. Aqui surge um fato novo, pois, pela primeira vez aparece o nome de um
professor até então não citado. Já na escola que funcionava dentro da igreja os
professores foram Orozendo Cordeiro de Jesus, “juntamente” com a professora
Genoveva Boiarski, conforme seu Deja nos relatou, o que coincide com o que tem sido
escrito pelos autores que usamos como referência para o presente trabalho.
Sem a pretensão de afirmar quem foi o primeiro professor de Cascavel, mas
apenas para mostrar uma conquista importante em termos de levantamento de fontes
primárias, consegui no Colégio Eleodoro uma foto do primeiro professor com sua
família, porém, não há a identificação de qual dos homens da foto é o professor, mas
conforme fui informado e segundo o que está escrito acima da mesma, ela é a foto do
primeiro professor de Cascavel juntamente com sua família.
56 56
Fonte: Arquivo do Colégio Eleodoro Ébano Pereira.
Dando prosseguimento ao estudo sobre a primeira escola de Cascavel, podemos
afirmar, segundo Emer que:
A partir de 1935, mesmo que a escola funcionasse no mesmo local e mantivesse as mesmas condições, assumiu uma professora, que passou a ser paga pelo município de Foz do Iguaçu, sem elevação da escola à condição de Casa Escolar Pública. Além dessa, houve outra particularidade: a professora era formada pela Escola Normal Regional Nossa Senhora do Belém de Guarapuava. A regra geral era de que apenas moças ricas, filhas de fazendeiros, estudassem em internatos. Genoveva Boiarski não era de família rica e foi a primeira filha de colonos radicados em Cascavel a cursar escola normal, no sistema de internato76.
Ao longo da década de 30, Cascavel foi contabilizando novas conquistas, o que
contribuiu para o crescimento da população da localidade e a luta de novos segmentos
sociais pela escolarização de seus filhos. No ano de 1938, Cascavel foi transformada em
distrito administrativo de Foz do Iguaçu, sendo criada também a Casa Escolar Pública.
Conforme diferentes fontes pesquisadas, como por exemplo, (Regimento Interno do
Colégio Eleodoro Ébano Pereira), em 1947 a Casa Escolar, foi transformada em Grupo
Escolar, sendo que a partir daí o Estado assumiu a manutenção da escola e o pagamento
dos professores.
76 Emer, Op. Cit 2001, p. 15.
57 57
Em relação à escolarização da época em que começou a funcionar a escola em
Cascavel, o senhor “Deja”, contou algumas histórias e deu outras informações sobre a
organização e funcionamento da escola.
Quando questionei o sr. “Deja” sobre um fato marcante sobre Cascavel na época
em que começou estudar, ele respondeu: “ Cascavel na época era uma pequena (...), não
era nada, tinha cinco ou seis casas, as casas ficavam entre onde hoje ficam as ruas Pio
XII até a Presidente Bernardes”.
Seguindo a trajetória da primeira escola de Cascavel, segundo Sperança &
Sperança: Em 1947, o governador Moysés Lupion determina a construção de um Grupo
Escolar e Escola Reunida a 03 de julho, datando sua instalação de 24 de setembro.
Desse período até 1953, serão diretores as professoras May Ross Ferreira, Dilair
Silvério Fogaça e Jaci Fagundes Almeida77. Podemos ilustrar o que vimos escrevendo
sobre a escola em Cascavel, com fotos do grupo escolar, na qual podemos ver a sua
localização e termos uma idéia de como era o grupo escolar de nossa cidade, naquela
época.
FONTE: Museu da Imagem e do Som.
77 SPERANÇA & SPERANÇA, Op. Cit.1980, p. 18.
58 58
Nesta foto podemos perceber que em relação à suntuosidade dos grupos
escolares das capitais, em Cascavel, era uma construção simples de madeira sendo
possível relacionar com os grandes grupos, somente as grandes janelas e o uniforme dos
alunos e professores tão comuns na época uma vez que o governo visava uma
uniformidade na população, era uma construção simples, de madeira, até porque esta era
abundante na Região Oeste do Paraná.
É preciso deixar claro e lembrar que o grupo escolar construído em Cascavel,
não seguia os moldes e a grandiosidade dos grupos escolares construídos em São Paulo,
por exemplo, que tinha toda uma arquitetura planejada para atender a demanda dos
grandes centros urbanos. O Grupo Escolar de Cascavel era uma casa simples, de
madeira, uma construção apenas um pouco maior, em condições de atender um número
um pouco maior de alunos, já no sistema de séries separadas umas das outras ou então
juntando terceira e quarta série e primeira e segundas série no início.
A foto seguinte, conforme explicação do senhor Airton Pompeu Reis, já é do
grupo escolar reformado, porém, não foi possível precisar a data, ou mesmo o ano da
mesma.
FONTE: Museu da Imagem e do Som. Cascavel.
59 59
Conforme Sperança &Sperança: Esse Grupo Escolar transfere-se à propriedade
do Município a 23 de outubro de 1953, passando a direção à professora Aracy Lopes
Pompeu até 30 de dezembro de 195678.
Para que possamos ter uma idéia da importância da construção do Grupo Escolar
para a população de Cascavel, destacamos a foto a seguir onde aparecem crianças que
participaram das festividades para a criação do mesmo, no ano de 1950. Este fato pode
ser considerado um marco histórico na educação da cidade. Podemos perceber a
importância da criação do Grupo Escolar para a população de Cascavel, pela alegria das
crianças na foto abaixo, e também pelo fato de ter sido organizado as festividades para a
comemoração desta conquista para a comunidade. Podemos perceber ainda a
simplicidade das construções da localidade, na época da criação do grupo escolar.
Fonte: Arquivo do Colégio Eleodoro Ébano Pereira
Ainda na década de 50, Cascavel recebeu novos estabelecimentos de ensino de
grande importância, sendo que, alguns ainda hoje atuam na cidade, foram inauguradas:
78 Idem, p. 118.
60 60
a Escola Normal Regional, o Colégio Auxiliadora, e o Colégio Rio Branco. Porém não é
nossa finalidade entrar em detalhes sobre estes estabelecimentos de ensino neste
trabalho, mas certamente a história dessas escolas merece ser contada. A título de
exemplo e ilustração, vamos reproduzir uma foto do Colégio Auxiliadora. Esta escola
continua ainda hoje atuando no ramo educacional em nossa cidade, já o colégio Rio
Branco, conforme Sperança, em 1962 que era de responsabilidade do Professor Antonio
Cid, é transferido para a prefeitura de Cascavel que em seguida entrega o mesmo à
iniciativa da Associação Brasileira de Educação e cultura, sendo criado o Colégio
Marista de Cascavel. Uma construção grandiosa para a época, também construída toda
em madeira, seguindo as tendências da época em relação ao número de janelas em
função da ventilação e iluminação dos ambientes de salas de aula.
Fonte: Museu da Imagem e do Som de Cascavel.
Dentro do que estamos nos propondo, que é tratar da primeira escola primária
pública no município de Cascavel, nos cabe considerar que através das várias leituras
sobre o tema, e como escreve Sperança & Sperança: A origem da Escola Eleodoro
Ébano Pereira está na primitiva escolinha criada em 1932, ocupando as dependências da
capela religiosa79.
A escola funcionou até 1947 sem ter autorização do governo, porém neste ano
recebe a autorização governamental e assim a Casa Escolar é elevada à categoria de
79 Idem, p. 19.
61 61
Grupo Escolar e assume efetivamente a direção da escola Theonilia Pompeu Girão.
Outro dado importante que ocorreu neste ano foi o fato de o Estado passar a manter a
escola e pagar os professores em Cascavel, quando ainda era distrito de Foz do Iguaçu.
O prédio do Grupo Escolar de Cascavel localizava-se, onde atualmente é a esquina das
ruas Pio XII e Avenida Brasil80, como é possível verificar na foto acima já mostrada.
Segundo Emer:
No Estado do Paraná era comum a principal escola de um núcleo urbano ser elevada a categoria de Grupo Escolar e estadualizada apenas por ocasião da emancipação, da elevação à categoria de cidade, de sede de município. Neste aspecto, Cascavel também foi diferente dos demais municípios da região. O grupo escolar foi instituído e estadulaizado antes da emancipação do município81.
A partir das leituras que fizemos e informações encontradas em diversos
materiais, além de conversas informais e das entrevistas, temos como afirmar que a
Escola Eleodoro Ébano Pereira, é a primeira escola formalizada dentro do perímetro
urbano de Cascavel, é o primeiro espaço de instrução institucionalizada do município e
que tem sua origem na primitiva escola de 1932, ou seja, esta é a extensão da primeira
escola do município.
Método de Ensino e Disciplina Escolar.
Quanto à discussão sobre os métodos de ensino e a forma de se trabalhar os
conteúdos no dia-a-dia da escola, vou me ater às entrevistas realizadas com ex-alunos da
primeira Escola de Cascavel. Em entrevista seu “Deja” disse que “a professora
explicava o conteúdo oralmente, depois passava as atividades no quadro, os alunos
copiavam e enquanto iam fazendo a professora passava nas carteiras e ia ajudando os
alunos nas suas dificuldades”. Percebe-se na fala do entrevistado que as aulas eram
basicamente expositivas, a professora não usava materiais concretos, ou seja, o método
baseava-se em o aluno decorar o que a professora ensinava. Lembrou seu Deja que ele
era muito bom e gostava muito das aulas de matemática e que conforme a professora ia
passando a atividade no quadro ele ia copiando e resolvendo, pois tinha facilidade nesta
80 Informações obtidas no regimento interno do Colégio Eleodoro Ébano Pereira, p. 01. 81 Emer, Op. Cit. 2003, p. 3.
62 62
disciplina e que quase sempre sua nota era dez, além de lembrar que seus colegas muitas
vezes copiavam as atividades matemáticas dele, e quando a professora ia corrigir os
cadernos deles, ela não dava dez para eles, porque sabia que tinham copiado de seu
“Deja”.
Quando perguntei para seu “Deja”, como era o relacionamento entre professor –
aluno, ele respondeu que: “quando o aluno era ruim, o professor não era muito amigo
desse aluno, e que os professores às vezes colocavam os alunos de castigo, mas que
também havia os momentos em que o professor era amigo, conversava e até brincava
com os alunos”. Na relação aluno-aluno, seu “Deja” disse: “dificilmente os alunos
brigavam, e se houvesse brigas já sabiam que ficariam de castigo, brincavam e
fumavam escondidos”. Lembrou seu “Deja” de uma vez que ele e alguns colegas foram
fumar escondidos próximos da escola, cada um levou alguma coisa para o cigarro, um
levou a palha, o outro o fumo e assim por diante, mas a professora Genoveva viu, e eles
ficaram de castigo.
Questionei seu “Deja”: Que meios eram utilizados como forma de avaliação dos
alunos? Ele respondeu que a professora dava a nota através das atividades
desenvolvidas no caderno no dia-a-dia pela leitura, a tabuada que a professora pedia de
cor (na seqüência) e salteada, além da tomada do “ponto” (o ponto era o questionário,
ou seja, a professora passava as perguntas sobre um determinado assunto, os alunos
respondiam e fazia-se a correção). Depois, como se fosse um dia de prova, a professora
fazia as perguntas oralmente para saber se os alunos tinham aprendido, isto era feito
principalmente com os conteúdos de história, disse seu “Deja”.
Perguntei para seu “Deja”, qual o fato marcante na sua escolarização? Seu
“Deja” respondeu que o professor brigava com os alunos, ele batia nos alunos e deixava
de castigo. Os alunos que brigavam ficavam na porta da sala de aula em pé abraçado
com o colega que havia brigado e outras vezes o professor deixava os alunos de castigo
ajoelhados.
Perguntei ao seu “Deja”: como era estudar naquela época, o que havia de
diferente da escola de hoje? Seu “Deja” respondeu que hoje a criança ‘não aprende’ o
“ABC” e “nós não, desde o primeiro dia, primeiro aprendia–se as letras, depois aprendia
juntar as letras para então começar a ler e escrever”. Ele lembra que aprendiam a ler,
“contar” números, e “fazer as contas” (técnicas operatórias). Ainda lembra-se da
cartilha que usava para aprender ler e escrever, pois, disse ele “cada letra tinha um
63 63
bichinho” (figura) a cartilha era seguida na sua ordem, os alunos liam o alfabeto cantado
a para ler as palavras era usado o método silábico (era soletrado para formar a palavra).
A escola segundo seu “Deja” era pública fato que pelo que vimos anteriormente
só aconteceu mais tarde, provavelmente mantida pelo Estado, pois seus pais não
pagavam para ele estudar e que os professores normalmente vinham de Foz do Iguaçu.
Sobre os móveis nos relatou que as carteiras eram de madeira com espaço para
dois alunos sentarem, lembra seu “Deja” que no meio da carteira, na parte superior tinha
um pequeno buraco para por o tinteiro, pois escreviam com caneta de pena, relembra
seu “Deja” que houve uma época que escreviam na lousa, um bloco retangular de pedra
onde se escrevia e em seguida apagava-se o que se havia escrito. Disse ele, que o lápis
não era muito usado. Para levar o material para as aulas usavam uma pequena bolsa que
chamavam de “bocó ou catarpasso”. Usavam um caderno de aritmética (matemática),
um de linguagem (língua portuguesa), e o caderno de caligrafia que, como falou seu
Deja “era para aparelhar a letra, para a letra ficar mais bonita e que o aluno que tivesse a
letra feia, já levava umas reguadas para caprichar mais”. Fala que os professores
usavam também uma régua grande, o quadro negro e giz.
No arquivo do Colégio Eleodoro, encontramos uma espécie de livros atas que
têm, variados tipos de registros, (os mais antigos, do ano de 1942), são livros bastante
deteriorados, bastante desorganizados, pois não seguiam normas rígidas apesar de ser de
um período histórico bastante rígido e polêmico, sendo que apresentam muitos espaços
em branco, folhas rasgadas e manchadas, além de serem atas de diferentes assuntos e até
mesmo servindo como registro de notas de alunos e livro ponto, tudo no mesmo livro.
Estes livros são documentos da antiga Casa Escolar e do Grupo Escolar período em que
Cascavel era distrito do município de Foz do Iguaçu. Os livros apresentam registros de
mostras de trabalhos realizados pelos alunos ao longo do ano em que os visitantes
assinavam o nome e teciam comentários sobre o que tinham visto, bem como outras
reuniões, anotações de livro ponto e atas de exames finais para os alunos e também as
notas finais e resultado de aprovação ou reprovação dos alunos.
O que mais nos chamou a atenção nestes livros, foram os registros que
demonstram todo o momento histórico do Estado Novo, representado nestas por um
forte simbolismo de amor a Pátria, muito sentimento de brasilidade e muita devoção em
relação à escola e até mesmo a religiosidade, o que era muito comum naquele momento.
O livro ata mais antigo da escola Eleodoro, contém registros de instalação da Legião
Brasileira de Assistência, que em seu conteúdo falam de religiosidade e de amor a
64 64
Pátria. Outras atas são de inauguração de exposições de trabalhos manuais, aliás, esta
era uma marca dos grupos escolares da época em que as exposições de trabalhos eram
uma forma de valorizar e avaliar os alunos, pelo trabalho realizado durante o ano letivo.
Os pais que visitavam a exposição assinavam e registravam suas impressões sobre o
trabalho das professoras e dos alunos, nestes também percebe-se o forte espírito de
esperança em relação à educação como redentora da sociedade, a “salvadora da Pátria”,
capaz de resolver todos os problemas da sociedade.
Outros aspectos interessantes, encontrados nos registros, feitos nas décadas de
40 e 50 são os de exames de final de ano letivo, onde fica muito clara a separação de
meninos e meninas até mesmo na hora do registro avaliativo sendo que os mesmos eram
registrados em duas colunas, uma para meninos e outra para as meninas, fato que era
comum neste período. Em entrevista realizada com o senhor Airton Pompeu Reis82, ele
lembrou da separação entre meninos e meninas que havia na escola, (grupo escolar em
1940 e 1941, anos que estudou em Cascavel) de um lado ficavam as meninas e de outro
ficavam os meninos. O prédio apresentava uma separação já na própria construção. Nas
listas de chamada, também separavam os nomes pelo sexo dos alunos. São atas de
exames de final de ano em que se percebe o forte caráter quantitativo das avaliações,
sem levar em consideração a caminhada e o progresso do aluno ao longo do processo
ensino-aprendizagem, além do número de alunos por turma não ser muito grande as
aprovações eram poucas, podemos dizer que a reprovação dos alunos era muito comum.
O senhor Airton Pompeu Reis, disse que estudou em Cascavel, nos anos de 1940 e
1941, fazendo a segunda e terceira séries na casa escolar. Ele relatou que morava em
Guarapuava, sua mãe era professora e seu pai trabalhava na empresa de telégrafos e que
vieram para Cascavel porque o seu pai foi transferido pra trabalhar aqui. Como sua mãe
era professora, foi ela quem o alfabetizou.
Depois dos dois anos que estudou em Aparecida dos Portos como era chamada a
localidade na época segundo ele, pois o nome Cascavel não era bem aceito por muitos e
principalmente pelos mais religiosos, voltou para Guarapuava onde precisou fazer um
exame e teve que fazer a terceira série novamente porque o “estudo daqui era muito
fraco”. Mostrei a ele a foto do grupo escolar e ele me explicou que esta é uma foto do
82 Airton Pompeu Reis. Data de nascimento: 21/04/1932. Estudou em Cascavel, no grupo escolar em 1941 e 1942. Data da entrevista, 08 de outubro de 2005.
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grupo já reformado, que o primeiro grupo era um pouco diferente na sua construção e
que o primeiro era coberto de tabuinhas e este último já era coberto com telhas de barro.
Na conversa com seu Airton, o mesmo disse que seu professor nos dois anos que
estudou em Cascavel, foi o senhor Sandálio dos Santos. Disse que o professor Sandálio
era uma pessoa muito respeitada não só pelos alunos, mas também por toda a
comunidade.
Seu Airton disse que estudar na época era um privilégio. Afirmou que a escola
era pública, que o professor explicava o conteúdo e que os alunos mais velhos e “mais
adiantados”, ajudavam os colegas na resolução dos exercícios, ou seja, formavam-se
pequenos grupos, onde esses alunos mais adiantados eram uma espécie de ajudantes do
professor, o professor era o supervisor geral da turma e os ajudantes os supervisores dos
grupos e que ensinavam os alunos mais novos. Seu Airton contou que no cabeçalho do
caderno escreviam o nome da comunidade (hoje Cascavel), Aparecida dos Portos83.
Disse que a relação professor-aluno era de muito respeito e que os alunos não tinham
muito contato direto com o professor porque o contato era maior com os colegas que
auxiliavam os alunos menores das séries anteriores. Na relação aluno-aluno relatou que
em seu tempo não havia brigas e que na hora do recreio, que era de aproximadamente
30 minutos ficavam brincando e realizando alguns jogos.
Em relação aos materiais que usavam seu Airton lembra pouco, mas falou do
caderno de aritmética e do caderno de caligrafia que era bastante usado e valorizado no
período. O professor avaliava os alunos pelo registro das atividades diárias realizadas
pelos alunos. O entrevistado lembrou que era muito difícil estudar naquela época,
alguns alunos vinham de longe para estudar, uns vinham a pé e outros vinham a cavalo.
Seu Airton contou que um dos alunos que supervisionava o trabalho do seu
grupo chamava-se Ernesto que é irmão de seu Deja que foi entrevistado por mim e nos
disse que seu “Deja” é uma das pessoas mais indicadas realmente para falar sobre a
educação em Cascavel e que algumas pessoas distorcem a realidade dos fatos sobre a
história de Cascavel. O entrevistado disse que chegou a usar a “lousa” para escrever, e
que usavam para carregar os materiais escolares uma espécie de bolsa chamada “bocó
ou cartapasso”.
Percebe-se que nesse período, os materiais ou recursos didáticos existentes na
escola eram poucos, e que os sacrifícios para os alunos conseguirem estudar também
83 Nessa época conforme seu Airton, o nome da localidade era Aparecida dos Portos.
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eram muitos, pois a distância também era um problema em alguns casos, além de todos
os outros complicadores que já haviam na época.
A foto a seguir, mostra o grupo escolar no ano de 1949, onde aparecem os
alunos e os professores em frente à escola, todos uniformizados, uma característica da
época; todos com uniforme branco e azul ou preto. Já podemos perceber um grande
número de alunos e até mesmo de professores o que mostra até mesmo o crescimento da
população. O fato interessante é a separação de meninos e meninas, isso demonstra a
divisão dos sexos na sala de aula, fato ainda comum naquela época e serve para provar a
afirmação de seu Airton.
Fonte: Arquivo do Colégio Eleodoro Ébano Pereira.
Portanto, o que tentamos fazer até aqui foi resgatar um pouco da história da
educação de Cascavel, através do estudo da primeira instituição educacional do
município. Isso só foi possível, pela leitura que fizemos da historiografia escrita e
publicada ou não, pelas entrevistas com duas pessoas que participaram ativamente da
história da educação e da história da cidade como um todo, pelos arquivos do Colégio
Eleodoro. Mesmo sabendo das limitações do nosso trabalho e do quanto ainda há para
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resgatar sobre nossa história espero, ao menos que este estudo possa contribuir para a
continuação de estudos sobre a história da educação da nossa cidade.
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CONCLUSÃO
Visamos com este trabalho, focalizar o processo educacional no Brasil, Paraná,
Região Oeste do Paraná e Cascavel, sempre relacionando o desenvolvimento da
educação permeado por setores da sociedade que influenciam diretamente no processo
educacional.
Nosso objetivo maior foi o de tentar compreender como ocorreu o processo de
formação e constituição da primeira escola pública primária em Cascavel, e sua
trajetória até o momento de emancipação política de Cascavel, fazendo uma análise dos
diferentes momentos pelos quais a educação brasileira viveu até a metade do século XX.
Conclui-se a partir dos estudos do presente trabalho, que para entender a história
da educação local, é necessário compreender as transformações sociais na sua totalidade
e no seu contexto local. Que a escola primária apesar de suas particularidades, tem
como base o projeto educacional republicano, colocado a partir do início do século XX
no Brasil, mas sobretudo, a partir de 1930 quando vemos, seu desenrolar mais efetivo ao
longo das décadas seguintes, dentro da lógica de construção de uma sociedade urbano-
industrial, ou seja, capaz de possibilitar aos alunos adaptar-se a um novo padrão de vida
e de sociedade marcada pela modernização econômica, política cultural e social. Que o
processo de ocupação e colonização de Cascavel e da região Oeste esteve associado ao
projeto chamado de Marcha para o Oeste, onde houve todo um planejamento adequado
para o sucesso do projeto, ou seja, a escolha dos colonos sulistas descendentes de
europeus, considerados os colonos ideais para ocupar a região.
Outro ponto a ser considerado, é o de que, o processo de ocupação e colonização
na Região Oeste do Paraná não foi uma obra do acaso, e sim um projeto de organização
política para atender as necessidades econômicas do momento em que foi posto em
prática tal projeto, e portanto a institucionalização da escola primária também não foi
um acaso e sim uma conseqüência a partir deste projeto formulado para desenvolver a
região oeste do Brasil e no nosso caso do Paraná. Podemos concluir também, que a
igreja assim como a escola, exerceram forte influência na formação da Região Oeste do
Paraná, pois eram duas instituições postas como primeiras necessidades na vida dos
colonizadores na época.
Podemos dizer do quanto é difícil fazer pesquisa sobre educação, pois não se
valoriza a educação e menos ainda os documentos relacionados a ela. É muito difícil
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encontrar documentos e pessoas que estejam dispostas a ajudar no levantamento de
documentos que permitam a busca da compreensão da história da educação regional e
local.
Percebi ao longo do trabalho realizado que temos muito, a avançar em termos de
conhecimentos reais sobre a história da Região Oeste e de Cascavel de modo geral, não
só em termos educacionais, uma vez que a história do nosso município é contada muitas
vezes a partir da visão dos vencedores ou se enaltecem os vencedores, ou seja, aquelas
pessoas que se deram bem, que ficaram ricas, esquecendo-se de ouvir e relatar, também
a história contada pelos que ajudaram a construir a história do município, mas que por
diversos motivos não ficaram ricos, e por isto, não tiveram e não têm voz nem vez,
sendo esquecidos sem poderem contar sua versão sobre a história desta cidade.
A partir do que nos propusemos pesquisar sobre a história da educação de
Cascavel neste trabalho, fizemos alguns levantamentos de fontes importantes para tentar
compreender melhor esta história, concluindo que realmente o Colégio Eleodoro Ébano
Pereira é a extensão da primeira escola do município, bem como percebemos que ainda
temos muito que pesquisar sobre a educação, uma vez que entendemos este trabalho
como um pequeno passo rumo ao resgate histórico da nossa história educacional.
Podemos concluir ainda, que precisamos aproveitar todos os tipos de fontes históricas,
mas principalmente as fontes orais, através dos pioneiros da cidade que ainda vivem em
Cascavel, e que muito têm a contribuir para o resgate histórico.
Além disso, temos plena convicção de que há a necessidade de darmos
continuidade em nosso trabalho com o levantamento de fontes e produção de outros
trabalhos sobre a história da educação de nosso município, bem como sabemos da
importância de outras pessoas pesquisarem este e outros temas para conhecermos
melhor nossa história local, neste caso o município de Cascavel.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS: Fontes primárias:
Fotografias – nos arquivos do Colégio Eleodoro Ébano Pereira e Museu da Imagem e do
Som, sem catalogação.
Livros de registros do Colégio Eleodoro Ébano Pereira: Colégio Estadual Eleodoro
Ébano Pereira. 04 Livros de registros diversos do período de 1942 a 1953.
Cartas: Origem de Clevelândia para José Silvério de Oliveira (Nhô Jeca) e para
Olímpia, nas cartas não consta local de destino, nem remetente. Os originais encontram-
se com a professora Nelci Fogaça.
Decreto de nomeação da Professora Dilair Silvério Fogaça em 1946, pelo Governador
do Território Federal do Iguaçu. Os originais encontram-se com a professora Nelci
Fogaça.
Portaria de contratação da professora Dilair Silvério Fogaça, em 1945. Documento
ainda do Território Federal do Iguaçu. Os originais encontram-se com a professora
Nelci Fogaça.
Entrevistas com:
Edjas Santetti Siqueira, aluno da primeira turma de alunos, na primeira escola primária
de Cascavel, no ano de 1932, (Cascavel pertencia à Foz do Iguaçu). Concedida em 05
de janeiro de 2005 em sua residência.
Airton Pompeu Reis. Aluno do grupo escolar de Cascavel nos anos de 1941 e 1942.
Concedida em 08 de outubro de 2005, em seu escritório.
Regimento Interno do Colégio Estadual Eleodoro Ébano Pereira. Parte do Histórico da
Escola.
Fontes secundárias:
EMER, Ivo Oss. Aspectos históricos da educação regional. Cascavel, 2004, Mímeo.
____. Alguns aspectos da história econômica de Cascavel. O comércio. Cascavel, 2002,
Mímeo.
____. Alguns aspectos da história econômica de Cascavel. O ciclo da erva mate.
Cascavel, Mímeo.
____.Alguns aspectos da história econômica de Cascavel. O ciclo da madeira.
Cascavel, 2002, Mímeo.
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FREITAG, Liliane da Costa. Fronteiras perigosas: Migração e brasilidade no extremo-
oeste paranaense (1937 – 1954) Cascavel. EDUNIOESTE, 2001.
GHIRALDELLI Junior, Paulo. História da Educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994.
Rev. (Coleção magistério. 2º grau. Série formação do professor).
LAZIER, Hermógenes. Paraná de todas as gentes e de muita história. Francisco
Beltrão, 2003. Grafit.
MIGUEL, Maria Elizabeth Blanck. A formação do professor e a organização social do
trabalho. Curitiba: Ed. Da UFPR, 1997.
NAGLE, Jorge. Educação e sociedade na Primeira Republica. São Paulo, EPU; 1976.
SCHNEIDER, Cláudio Ivan. Os senhores da terra: Produção de consensos na fronteira
(Oeste do Paraná, 1946 – 1960). Curitiba: Casa Editorial Tetraventos, 2002.
SOUZA, Rosa Fátima de. Templos de civilização: a implantação da escola primária
graduada no Estado de São Paulo: (1890-1910). São Paulo: UNESP, 1998.
SPERANÇA, Alceu A. Cascavel a história. Curitiba: Lagarto, 1992.
SPERANÇA, Alceu. & Sperança, Carlos. Pequena história de Cascavel e do Oeste.
Cascavel – PR: J. S. Impressora ltda. 1980.
XAVIER, Maria Elizabete Sampaio Prado. Capitalismo e escola no Brasil: a
constituição do liberalismo em ideologia educacional e as reformas do ensino (1931-
1961). Campinas, Papirus, 1990.
WACHOWICZ, Ruy Chistovam. Obrageros, mensus e colonos: história do oeste
paranaense. 2. ed.- Curitiba: Ed. Vicentina, 1987.
____. História do Paraná. 6ª edição ampliada.- Curitiba: Ed. Vicentina, 1988.
Acervos consultados:
Biblioteca da Unioeste - Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus Cascavel.
Biblioteca Pública Municipal.
Museu da Imagem e do Som de Cascavel – MIS.
Arquivos do Colégio Eleodoro Ébano Pereira de Cascavel.