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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
A PONTE SOBRE O RIO SERGIPE:METAMORMOSES PAISAGISTICAS, TERRITORIAIS
E SOCIOGEOGRÁFICAS NO MUNICÍPIO DEBARRA DOS COQUEIROS, SERGIPE, BRASIL
Max Alberto Nascimento Santos
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
INTRODUÇÃO
Ao longo da sua evolução histórica, o município de Barra dos Coqueiros, situado
no estado de Sergipe, região Nordeste do Brasil, também conhecido como Ilha de Santa
Luzia, enfrentou um certo isolamento geográfico que dificultou sua ocupação territorial mais
intensa.
Porém, no ano de 2006, esse isolamento foi quebrado por conta da inauguração
da Ponte Construtor João Alves, interligando a cidade de Aracaju, capital do estado, ao
município de Barra dos Coqueiros. A ponte facilitou e diversificou os fluxos geográficos e a
partir de então, o município de Barra dos Coqueiros passou a conhecer os reflexos, em
vários dos seus segmentos territoriais, dessa interligação realizada sem o devido
planejamento.
A Barra dos Coqueiros, integrante da região metropolitana de Aracaju, apresenta
um cenário territorial diversificado, mostrando ao mesmo tempo características rurais e
urbanas.
Na realidade atual, não é difícil identificar no citado município, intervenções
antrópicas sem o devido respeito às legislações pertinentes e sem algum tipo de
planejamento, colocando em risco, o desejado equilíbrio ambiental. Para Penna (2002), a
análise da expansão e do crescimento territorial sobre áreas de proteção ambiental, de
mananciais e bacias hidrográficas, expõe os conflitos e contradições presentes na realização
deste processo. As áreas de proteção ambiental, reservas ambientais, até então pouco
transformadas pela ação social, ainda objetos da política de preservação, estão presentes no
território como um dado significativo para o entendimento do processo de fragmentação,
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expansão e uso da terra.
Nesse sentido, o presente trabalho traz uma discussão a respeito da dinâmica
geográfica atual e do cenário futuro do município de Barra dos Coqueiros, Estado de
Sergipe, Nordeste do Brasil, emergida das preocupações que se deram a partir de uma
intervenção antrópica de grande magnitude, como é o caso da construção da ponte sobre o
rio Sergipe, justificada pelo discurso de desenvolvimento do turismo.
Esse conjunto de novos elementos de transformação e alteração das regras da
produção do espaço mostra as novas articulações em torno dos interesses fundiários, para
o jogo de interesses políticos e sociais sobre o território. Essas articulações revelam a
contradição em relação ao uso e à apropriação da terra, entendida, simultaneamente, como
valor de troca (mercadoria) e valor de uso (CARLOS, 2001). E a Barra dos Coqueiros parece
funcionar a partir dessa lógica de apropriação desigual do espaço, agravada pela
intensificação da ocupação mais recente.
Nesse sentido, as atuais intervenções públicas no município de Barra dos
Coqueiros, executadas na figura do governo estadual, nesse caso o poder oficialmente
instituído, não deixam claras quais são as verdadeiras intenções desses investimentos,
podendo, dessa forma, contribuir de maneira direta para o agravamento da atual situação
socioeconômica e ambiental municipal.
A preocupação aqui apresentada é de tentar vincular a problemática ambiental
urbana e rural por intermédio das questões de uso e ocupação do solo e do crescimento
urbano através da expansão das áreas periféricas. Estas dimensões da realidade urbana e
rural têm sido tratadas separadamente, permanecendo uma dicotomia, ao serem
abordadas fora da questão da produção social do espaço e da natureza. Este estudo
preocupa-se com a questão ambiental numa totalidade municipal, como produto da
intervenção da sociedade sobre a natureza, acentuando as contradições da produção,
consumo e apropriação social do espaço.
Nesse sentido, o presente artigo, tem como objetivo principal analisar as
metamorfoses paisagísticas, territoriais e sócio-geográficas que vêm se processando no
município de Barra dos Coqueiros a partir do início das obras de construção da ponte.
Desde os primórdios da sistematização da Geografia como ciência no século XIX,
a preocupação com o entendimento da relação homem-meio ou sociedade-natureza, faz
parte da temática central da nossa disciplina.
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Segundo Silva (1978), as categorias fundamentais do conhecimento geográfico
são: espaço, lugar, região, território, paisagem, que definem o objeto da geografia.
Entretanto, a compreensão da metamorfose do espaço habitado da Barra dos Coqueiros a
partir da construção da ponte sobre o Rio Sergipe, encontra um campo fértil na discussão de
três dessas categorias: Espaço geográfico, território e paisagem.
Numa apreciação histórica da relação na qual podemos chamar sociedade e
natureza podem-se observar em todos os espaços habitados do planeta, a mudança de um
meio natural para um meio cada vez mais artificial, isto é, para um meio que a todo o
momento recebe intervenções do homem auxiliado pelo avanço da ciência, da tecnologia e
da informação. Dessa forma, as alterações no espaço habitado, as metamorfoses
paisagísticas e os impactos gerados por essas mudanças são constantes e não acontecem
apenas nos grandes centros urbanos. Com a difusão das técnicas, num mundo cada vez
mais globalizado, municípios de pequeno porte, como por exemplo, Barra dos Coqueiros, no
litoral sergipano, está susceptível a alterações de grande magnitude no seu espaço.
Para a presente análise, discutir o conceito de espaço e toda a sua complexidade
é, acima de tudo, fazer Geografia, pois dentre os conceitos geográficos discutidos é ele, sem
sombra de dúvidas, o mais debatido, e por conta de sua complexidade é o que mais desafia
os pesquisadores e ainda pode ser considerado como um conceito central desta ciência.
Para Smith (1999), no processo de desenvolvimento capitalista, o espaço
tornou-se uma preocupação cada vez maior no que diz respeito à sobrevivência do sistema.
Até o final do século XIX, aproveitando um mercado para os seus produtos e um modelo de
circulação organizado em escala mundial, o capitalismo procurou universalizar o seu modo
de produção. A partir do século XX, a expansão econômica e a produção do espaço se dão
mais pela diferenciação interna do espaço global.
De acordo com Santos (1985), o espaço é uma instância da sociedade, por isso
ele contém e está contido na economia, na política, na cultura e não deve ser pensado
apenas como objeto, porque ele também está na essência, é o princípio ativo das coisas.
Desta forma, o espaço é a parte e o todo. É o conjunto das coisas, somado a sociedade que
o modifica e o transforma. Portanto, cada parte da natureza abriga, necessariamente, uma
parte da sociedade.
Em sua preocupação pelas metamorfoses do espaço habitado, Milton Santos
(1988) destaca as mudanças do meio geográfico ao longo do tempo histórico. Para esse
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grande geógrafo brasileiro, o espaço habitado se tornou um meio geográfico
completamente diverso do que fora na aurora dos tempos históricos. Não pode ser
comparado, qualitativa ou estruturalmente, ao espaço do homem anterior à Revolução
Industrial, pois a articulação tradicional e histórica da comunidade com o seu quadro
orgânico natural foi então substituído por uma vasta anarquia mercantil.
Nos dias atuais, com o avanço da tecnologia, o homem consegue dominar áreas
de seu interesse, que anteriormente se apresentavam de difícil intervenção, tornando-as
sítios comercializáveis, respaldados pelo marketing e também de um apelo ecológico de
empreendimentos em harmonia com a natureza. Entretanto, Santos (1988, p. 44) destaca
que
Agora, o fenômeno se agrava na medida em que o uso do solo se torna
especulativo e a determinação de seu valor vem de uma luta sem trégua entre
os diversos tipos de capital que ocupam a cidade e o campo. O fenômeno se
espalha por toda a face da Terra e os efeitos diretos e indiretos dessa nova
composição atingem a totalidade da espécie. Senhor do mundo, patrão da
Natureza, o homem se utiliza do saber científico e das invenções tecnológicas
sem aquele senso de medida que caracterizara as suas primeiras relações com o
entorno natural. O resultado, estamos vendo, é dramático.
Santos (1996) afirma que o espaço é a totalidade verdadeira, semelhante a um
matrimônio entre a configuração territorial, a paisagem e a sociedade. As formas podem,
durante muito tempo, permanecer as mesmas, mas como a sociedade está sempre em
movimento, a mesma paisagem e a mesma configuração territorial nos oferecem, no
transcurso histórico, espaços diferentes, significados, representações, valores e esquemas
de percepção também variados. Esses espaços diferenciados, essas espacialidades
singulares, são resultados das articulações entre a sociedade, o espaço e a natureza, por
isso revelam toda uma complexidade enquanto categoria analítica.
Toda essa dinâmica é considerada por Milton Santos (1996, p. 52), como um
conjunto que neste caso é caracterizado como sistema.
Sistema de objetos e sistema de ações interagem. De um lado, os sistemas de
objetos condicionam a forma como se dão as ações e, de outro lado, o sistema
de ações leva a criação de objetos ou se realiza sobre objetos preexistentes. É
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assim que o espaço encontra a sua dinâmica e se transforma.
As ações são cada vez mais estranhas aos fins próprios do homem e do lugar.
Daí a necessidade de operar uma separação entre a escala de realização das ações e a
escala de seu comando. Esta distinção se torna fundamental no mundo de hoje: muitas das
ações que se exercem num lugar são produtos das necessidades alheias, de funções cuja
geração é distante e das quais apenas a resposta é localizada naquele ponto preciso da
superfície da Terra. Fato esse que pode ser vivenciado na escala do município, trazendo à
tona a necessidade da análise do seu espaço habitado.
a sua geografia pode ser construída a partir da consideração do espaço como
um conjunto de fixos e fluxos. Os elementos fixos, fixados em cada lugar,
permitem ações que modificam o próprio lugar, que recriam as condições
ambientais e as condições sociais, e redefinem cada lugar. Os fluxos são um
resultado direto ou indireto das ações e atravessam ou se instalam nos fixos,
modificando a sua significação e o seu valor, ao mesmo tempo em que, também
se modificam (...) os fixos são cada vez mais artificiais e mais fixados ao solo, os
fluxos são cada vez mais diversos, mais amplos, mais numerosos, mais rápidos.
Toda esta efervescência nos leva ao debate de uma outra categoria chave da
ciência geográfica na busca de bases teóricas para o entendimento das novas dinâmicas que
ocorrem no município em análise, o conceito de território.
De acordo com Machado (1997), a discussão a respeito do significado do
território emerge na obra de Ratzel que dirige sua argumentação a partir de força do
Estado-Nação e também de estudos que predominaram até a década de 1960 na chamada
Geografia Clássica. Tais estudos tinham como centro da atenção a temática territorial vista
através da esfera nacional, enfatizando tanto questões políticas e econômicas quanto
ideológicas e culturais. O poder e a atuação do Estado Nacional definiam o território a ser
investigado, através da fixação de capital e de trabalho materializado no solo que, por sua
vez, marcavam os limites políticos-territoriais. Tal situação, para a citada autora, levou a uma
marginalização da temática territorial nas discussões acadêmicas.
De acordo com o pensamento de Souza (1995, p. 84),
O território surge na tradicional Geografia Política, como espaço concreto em si
que é apropriado, ocupado por um grupo social. A ocupação do território é vista
como algo gerador de raízes e de identidade: um grupo não pode mais ser
compreendido sem o seu território, no sentido de que a identidade
sócio-cultural das pessoas estaria inarredavelmente ligada aos atributos do
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espaço concreto.
Porém, existe uma retomada da discussão do conceito por conta de uma nova
lógica de organização sócio-espacial em esfera planetária a partir da década de 70,
passando o território a ser utilizado associado à noção pós-moderna de transnacionalização,
trazendo a tona toda uma nova complexidade. Desta forma, o território passa a ter,
segundo Souza (1995, p. 86), uma flexibilização e passa a fazer parte do conjunto de
conceitos híbridos, tão comuns na ciência geográfica.
Para Souza (1995, p. 81), é imperioso que se saiba despir do manto de
imponência com qual se encontra revestido, via de regra, o conceito de território porque a
palavra normalmente evoca a noção de território nacional:
A bem da verdade, o território pode ser entendido também à escala nacional e
em associação com o Estado como grande gestor. No entanto, ele não precisa e
não deve ser reduzido a essa escala ou à associação com a figura do Estado (...),
territórios existem e são construídos (e desconstruídos) nas mais diversas
escalas, da mais acanhada à internacional; territórios são construídos (e
desconstruídos) dentro de escalas temporais as mais diferentes: séculos,
décadas, anos, meses ou dias; territórios podem ter um caráter permanente,
mas também podem ter uma existência periódica, cíclica.
Porém, mesmo com esta diversidade de situações, o conceito ficou, por parte do
senso comum e da maior parte da literatura científica, restrito a carga ideológica de
território nacional.
Para Souza (1995, p. 86), o território é visto como um campo de forças, uma teia
ou uma rede de relações sociais, que, a par da sua complexidade interna, define, da mesma
forma, um limite, uma alteridade.
Como se vê, da mesma forma que a noção de espaço, o território se reveste de
grande complexidade. Entretanto, Haesbeart (2006), a partir de um levantamento detalhado
das diversas concepções de território, consegue agrupá-lo dentro de dois grandes
referenciais teóricos:
a) o binômio materialismo e idealismo, desdobrado depois em duas outras
perspectivas, a visão mais totalizante e a visão mais parcial do território em
relação a: i) o vínculo sociedade-natureza; ii) as dimensões sociais privilegiadas
(econômica, política e/ou cultural);
b) a historicidade do conceito, em dois sentidos: i) sua abrangência histórica – se
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é um componente ou condição geral de qualquer sociedade ou se está
historicamente circunscrito a determinado(s) período(s) ou grupo(s) sociais; ii)
seu caráter mais absoluto ou relacional: físico-concreto ( como “coisa”, objeto), a
priori ( no sentido do espaço Kantiano) ou social-histórico ( como relação).
No entendimento de Haesbeart (2004), a ênfase ao “uso” do território a ponto de
distinguir entre o “território em si” e o “território usado”, ao mesmo tempo em que explicita
uma priorização da sua dimensão econômica, estabelece uma distinção discutível entre o
território como forma e o território usado como objeto e ações, sinônimo de espaço
humano.
Dentre as categorias da ciência geográfica eleitas para explicar as metamorfoses
do espaço litorâneo da Barra dos Coqueiros a partir da construção da ponte sobre o
estuário do Rio Sergipe, a última a ser abordada para a conclusão deste tópico é a da
paisagem.
De acordo com Sousa (2004), a paisagem habitualmente tratada pelo senso
comum (materializada, concreta, mais natural) surge no século XVI, manifestada,
principalmente, na pintura, quando os grandes artistas materializavam as lindas e às vezes
idealizadas imagens do meio natural. Como as paisagens representadas eram,
normalmente, do meio rural (entendido como mais natural) ou do meio urbano (entendido
como uma construção cultural) nasce a dicotomia paisagem natural e paisagem cultural.
Analisando esse tema, Heasbeart (2002), discute esses dois modos distintos de se ver a
paisagem. Para esse geógrafo a paisagem, numa visão naturalista, assume uma dimensão
objetiva, visível e concreta. Nessa perspectiva, tem-se a paisagem mais conhecida do senso
comum, aquela constantemente enfocada pelas câmeras dos turistas. Numa dimensão
culturalista, ela se subdivide em objetiva, que prioriza as formas construídas culturalmente
pelos homens, da percepção que prioriza o olhar individualizado. Neste segundo caso, o
elemento paisagem é abstrato, percebido apenas pelos sentimentos, seria um estado da
arte.
Para a geógrafa espanhola Bolós i Cappdevila (1992), a partir do século XIX, o
termo paisagem é profundamente utilizado em geografia e, em geral, se concebe como
conjunto de formas que caracterizam um setor determinado da superfície terrestre.
Ao referir-se à paisagem, Troll (1982) concebia-a como o conjunto das interações
homem e meio. Tal conjunto apresentava-se sob dupla possibilidade de análise: a da forma
(configuração) e da funcionalidade (interação de geofatores incluindo a economia e a cultura
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humana). Ao propor o estudo de Geografia Física Global, Bertrand (1972, p. 56) definiu a
paisagem da seguinte forma:
É uma porção do espaço caracterizado por um tipo de combinação de dinâmica,
e portanto instável, de elementos geográficos diferenciados – físicos, biológicos,
antrópicos – que, ao atuar dialeticamente uns sobre os outros, fazem da
paisagem um conjunto geográfico indissosiável que evoliu em bloco, tanto sob
efeitos das interrações entre os elementos que a constituem como sob efeito da
dinâmica própria de cada um dos elementos considerados separadamente.
A paisagem tem, pois, um movimento de transformação ou de mudança que
pode ser mais ou menos rápido ou se processar muito lentamente. As formas não nascem
apenas das possibilidades técnicas de uma época, mas dependem também das condições
sociais, econômicas, políticas e culturais atuais. A técnica tem um papel importante, mas não
tem existência fora das relações sociais. Nesse contexto, paisagem deve ser pensada
paralelamente às condições políticas, econômicas e também culturais onde foi formada.
Desvendar essa dinâmica social é fundamental, pois as paisagens restituem todo um
cabedal histórico de técnicas, cuja era revela; mas ela não mostra todos os dados, que nem
sempre são visíveis (SANTOS, 1988).
Entender a paisagem é procurar compreender como as forças e processos
econômicos, políticos e sociais atuam e atuaram sobre aquele determinado ambiente. São
estas forças e processos que se apresentam na sua configuração paisagística atual, isto é, na
construção e reconstrução da paisagem que acontece a cada momento. É neste
entendimento que estão os dados, situações e processos não visíveis, mas que estão
presentes na paisagem.
Para Santos (1996, p. 83), “paisagem é o conjunto de formas que, num dado
momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre
o homem e a natureza. Ou ainda, a paisagem se dá como conjunto de objetos reais
concretos”.
De acordo com Holzer (1999), a paisagem em conjunto com outros conceitos
como o de ecossistema, território ou de ambiente, ganharam destaque nas páginas da mídia
e na boca dos cidadãos preocupados com o seu bem-estar, desvelando significados
complexos que antes estavam restritos à conversas dos especialistas e agora passaram para
o âmbito do varejo das redes mundiais de comunicação, onde os gostos, senão as atitudes
culturais, se reciclam rapidamente. Nesse sentido, a paisagem não pode ser vista apenas
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como realidade objetiva, contém também uma carga cultural e deve ser um elo entre o
estático e o dinâmico, entre o físico e a cultura.
De acordo com Santos (1998), são diferentes os conceitos de paisagem e de
configuração territorial. A configuração territorial pode ser entendida como o território
somado ao conjunto de objetos existentes sobre ele, que são objetos naturais ou objetos
artificiais que a definem. Para o autor, seja qual for o estágio de desenvolvimento de um
determinado país, haverá sempre nele uma configuração territorial formada pelo conjunto
de recursos naturais, lagos rios, etc. e de recursos criados como pontes, estradas de ferro,
de rodagem, barragens, açudes, cidades, etc. É essa constelação de todas as coisas
arranjadas em um sistema que forma a configuração territorial, cuja realidade e extensão se
confundem com o próprio território de um país. A configuração territorial, todavia, é um
todo, é um conjunto total, integral de todas as coisas que formam a natureza em seu
aspecto superficial e visível. Nas palavras de Santos e Silveira (2001, p.248), “As
configurações territoriais são o conjunto dos sistemas naturais, herdados por uma
determinada sociedade, e dos sistemas de engenharia, isto é, objetos técnicos e culturais
historicamente estabelecidos”.
De acordo com o pensamento de Silva (2007), a complexa interconectividade das
variáveis espaciais e sua dinâmica, através de redes e fluxos de ordem econômica, política,
social e cultural, possibilitam ao espaço geográfico a busca do equilíbrio tanto nas relações
sociedade-natureza quanto nas relações sociais de poder na organização do território,
conferindo aos sistemas, características como mutação, resistência e resiliência.
No pensamento de Santos (1996), os movimentos da sociedade, atribuindo
novas funções às formas geográficas, transformam a organização do espaço, criam novas
situações de equilíbrio e ao mesmo tempo novos pontos de partida para um novo
movimento. Por adquirirem uma vida, sempre renovada pelo movimento social, as formas
podem participar de uma dialética com a própria sociedade e assim fazer parte da própria
evolução do espaço.
Na atual fase capitalista, as práticas econômicas, um aspecto particular das
demais práticas sociais, modificam o espaço físico na condição do valor de uso e de valor de
troca, gerando uma dinâmica de mercado em torno do próprio espaço, dinâmica essa que
inclui a produção de bens materiais e a adequação do meio ambiente circundante às
necessidades sociais.
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Santos (1996) assinala que nunca houve na história do mundo um subsistema de
técnicas tão invasor, com tal capacidade de se difundir e de se impor aos lugares e aos
homens, sendo que também é a primeira vez na história que o subsistema técnico tende à
unidade. Os agentes que utilizam os subsistemas mais novos são hegemônicos, enquanto
os agentes homogeneizados utilizam subsistemas técnicos não hegemônicos. Entretanto, o
envelhecimento do patrimônio técnico é rápido, logo substituído por outro de maior
capacidade operacional, em função da competitividade, fazendo com que equipamentos,
infra-estrutura e lugares envelheçam rapidamente.
Para reiterarmos a idéia da força do espaço e da materialidade geográfica nas
mudanças geográficas e na configuração do território, é conveniente enfatizar o
pensamento de Moraes (2002, p. 51): “toda sociedade para se reproduzir cria formas, mais
ou menos duráveis, na superfície terrestre” Ainda para o referido autor, essas formas
obedecem a um dado ordenamento sociopolítico do grupo que a constrói, e respondem
funcionalmente a uma sociabilidade vigente a qual regula também o uso dos espaços e dos
recursos nele contido. Tais formas – que expressam uma quantidade de valor incorporado
ao solo – substantivam na paisagem relações sociais específicas.
Para Moraes (2002), um espaço produzido herdado é que sobredetermina
continuamente o uso dos lugares, concebendo através da história, de uma forma geográfica,
uma progressiva transformação do planeta, resultando numa cumulativa
antropomorfização do espaço terrestre.
Desta forma, o processo de valorização do espaço pode ser desdobrado em
alguns processos geográficos mais específicos que de acordo com Moraes (2002) podem ser
assim agrupados: Da apropriação dos meios naturais, aparecendo a superfície terrestre
para as sociedades como um celeiro dos meios de subsistência e trabalho; a transformação
dos meios naturais, a partir de certo grau de intervenção põe novas qualidades e novas
relações; e de reapropriação dos meios já transformados, em que grupos sociais se vêem
envolvidos com espaços já qualificados como segunda natureza. Nesses três universos a
relação da sociedade com o espaço pode ser confundida com o seu relacionamento com a
natureza, porém, ainda de acordo com o citado autor, existem relações não naturais entre a
sociedade e o espaço, pois seres humanos constroem ambientes artificiais, cuja
naturalidade se limita à origem dos materiais empregados.
Diante dessa complexidade conceitual, pode-se afirmar que mesmo com todo o
avanço da técnica no espaço habitado e metamorfizado pelo homem, faz-se necessário uma
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reflexão sobre os limites e possibilidades de planejamento, da gestão e do ordenamento
territorial, pois quando essas intervenções são realizadas em nome do capital e não são
bem sucedidas têm conseqüências negativas e assumem uma força destrutiva no espaço.
De acordo com o dicionário Aurélio (2001 p. 544), ponte é uma “construção
destinada a ligar margens opostas duma superfície líquida qualquer”. A definição é simples,
entretanto, ao analisarmos as margens que foram interligadas com a edificação da ponte
Construtor João Alves, unindo os municípios de Aracaju e Barra dos Coqueiros, a realidade
encontrada torna o conceito um elemento complexo, carregado de outros significados, de
conflitos e de metamorfoses territoriais nas margens do rio Sergipe, com maior magnitude
na Ilha de Santa Luzia que compreende o município de Barra dos Coqueiros, um espaço
com ambientes urbanos e rurais, inclusive com espaços relativamente pouco ocupados.
Em meio a inúmeros embates políticos propagados com justificativas
governamentais sem base de sustentação, a obra foi ganhando forma e juntamente com
ela, a paisagem estuarina urbana do rio Sergipe foi sofrendo a sua maior intervenção. Nesse
sentido, o resultado de dois anos e um mês de trabalho está visualmente disposto como
novo elemento paisagístico componente de um antigo cenário. Entretanto, não somente a
paisagem estuarina foi alvo dessa intensa modificação, dentre os municípios influenciados
pela obra, a Barra dos Coqueiros se tornou um dos principais palcos de metamorfoses que
em diferentes níveis de intensidade, alteram a sua paisagem, seu território e a sua
sociedade como um todo.
As primeiras transformações paisagísticas no município se deram a partir do
início das obras de construção da ponte construtor João Alves, em setembro de 2004. Com a
chegada de grandes máquinas e a instalação do canteiro de obras, o antigo cenário
geográfico começou a ser modificado, este fato se tornou mais visível, quando se fez
necessária a desapropriação de algumas casas e também a supressão de boa porção de
vegetação de mangue que estavam no traçado escolhido para a rodovia que
complementaria a cabeceira da ponte. De acordo com o EIA elaborado em 2004 para a
construção da ponte, as desapropriações que foram efetuadas no lado da Barra dos
Coqueiros envolveram residências de baixo padrão e mesmo invasões. Essas alterações
iniciais não só contribuiram para mudança causadas pela realocação, causando dessa forma
uma desterritorialização, mas também pela alteração no modo de vida dessas famílias.
No que se refere às alterações que puderam ser observadas na zona urbana, foi
possível constatar que algumas foram aflorando de maneira gradual em paralelo com a
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edificação da ponte e outras puderam ser observadas com a efetiva operação desse
equipamento.
Durante a fase final de construção da ponte, no ano de 2006, quando ainda não
dava para serem observados os reais impactos decorrentes do empreendimento, a
prefeitura de Barra dos Coqueiros iniciou a realização de pequenas obras de urbanização no
núcleo central do município, como a reforma da praça da matriz e uma pequena
intervenção na orla fluvial, inauguradas em julho de 2007.
No que se refere à praça da matriz, tornou-se um lugar visualmente aprazível e
mais uma opção de lazer para a comunidade local e visitantes, porém houve uma
descaracterização do patrimônio histórico por conta da retirada do antigo coreto, marco
histórico de um período.
Já a intervenção ocorrida na orla fluvial modificou o aspecto do local, porém os
estabelecimentos ali existentes não conseguiram dinamizar o seu comércio, visto que, desde
a inauguração da ponte houve uma significativa diminuição do fluxo de veículos, que era
justificada pela travessia da balsa para Aracaju.
Na medida em que se deu a efetiva ligação entre os dois municípios, alguns
conflitos sociais se processaram, resultando também em alterações na paisagem urbana da
sede municipal. Por conta da facilitação do acesso rodoviário, o setor de transportes foi,
naquele momento, o principal elemento modificador dessa paisagem.
No dia seguinte a inauguração da ponte, o serviço de transporte de automóveis
por meio de balsas teve a sua operação suspensa. A paisagem fluvial deixou então de contar
com um dentre os vários elementos paisagísticos artificiais, as balsas operavam desde a
década de 80.
Com o acesso efetivamente pronto, os ônibus do transporte intermunicipal
metropolitano deram início à prestação desse serviço entre a capital e o município de Barra
dos Coqueiros. É valido ressaltar que a regulamentação deste tipo de serviço ainda não
estava oficializada e desta forma, veio desencadear diversos conflitos entre os trabalhadores
do setor de transporte a as empresas de ônibus da capital. O reflexo dessa desavença
inovou mais uma vez a paisagem, com a construção do Terminal de Integração Rodoviário,
inaugurado em setembro de 2007. Além de descompor a paisagem fluvial através do vai e
vem das lanchas. As alterações também puderam ser percebidas no terminal hidroviário de
transporte de passageiros e em suas imediações que polarizavam uma dinâmica de
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pequenos comércios, vendedores ambulantes e outros serviços de transporte oferecidos
em carrinhos de mão, charretes e táxis, onde atualmente se encontra uma zona comercial
estagnada.
A partir de então, com essa nova forma de interligação entre o município e a
zona metropolitana de Aracaju, o aumento dos fluxos refletiu nos diversos segmentos
socioeconômicos municipais, e conseqüentemente na intensificação de modificações
paisagísticas a partir de novos cenários que trazem inovações à população local.
Contribuindo para mais uma nova remodelação da paisagem, o atual governo
estadual autorizou em setembro de 2007, obras de alargamento e reestruturação da
Rodovia SE-100. É digno de registro que esse trecho sempre foi bastante problemático e
perigoso, nele aconteciam diversos acidentes e devido a edificação da ponte e
conseqüentemente o aumento no fluxo de veículos, a tendência desse cenário era tornar-se
mais complexa. Porém, essa melhoria tem como principal objetivo facilitar o acesso para o
novo resort e futuros empreendimentos previstos para esse trecho, ficando a população
local como segunda beneficiária.
No que se refere a intervenções imobiliárias que atualmente modificam e
futuramente modificarão mais ainda a paisagem do município, é possível destacar a
instalação de inúmeros empreendimentos na zona urbana e em setores de loteamentos na
zona rural. Esses investimentos são executados pela iniciativa privada, com capital nacional
e estrangeiro e tem alterado sensivelmente a paisagem municipal.
Os rumores da construção da ponte trouxeram uma efervescência na atividade
imobiliária da Barra dos Coqueiros. Com o início dessa grande obra, o governo estadual fez
a contratação de um Plano Diretor Municipal para o município de Barra dos Coqueiros. Este
instrumento foi apontado como medida compensatória exigida no EIA/RIMA para o
licenciamento da referida edificação. O Plano Diretor foi elaborado, entretanto as suas
considerações destoavam e apontavam medidas completamente inexeqüíveis à realidade
municipal. Nesse plano, o zoneamento territorial era apresentado numa formatação
tradicional, composto somente de zona urbana e rural. A zona urbana se limitava ao antigo
núcleo residencial e a zona rural estava composta por oito povoados.
Nesse sentido, vários debates foram travados na Câmara Municipal de Barra dos
Coqueiros que tiveram como conseqüência a revogação deste antigo plano e a realização de
um novo, atendendo as conformidades exigidas pelo Ministério das Cidades. Esse novo
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documento apresenta uma nova proposta de ordenamento territorial do município. A partir
da análise dessa cartografia é possível projetar cenários que irão compor o território
municipal.
Ao analisar parte da cartografia disponível no Plano Diretor municipal, torna-se
possível então apresentar uma síntese da nova realidade territorial do município.
No mapa intitulado de Perímetro Urbano, foi possível observar a nova divisão
territorial do município: Zona Urbana, Zona de Expansão e Zona Rural. Esse novo
zoneamento, proporcionado como conseqüência da construção da ponte, expressa as
metamorfoses brutais do território, visto que dá nova funcionalidade a uma antiga
disposição geográfica. Em decorrência desse fato, poderão a médio e longo prazos, ocorrer
processos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização, já que essas
alterações influenciarão nas relações sociais por meio da classificação das novas áreas
componentes dessas zonas.
Da observação do mapa de macrozoneamento, foi possível descrever a
classificação dessas novas áreas componentes das três grandes zonas já citadas. Nessa
análise foi possível detectar que a Zona Urbana está dividida em quatro bairros. Apesar de
estar caracterizada como zona urbana, este setor apresenta um cenário territorial
diversificado, onde é possível encontrar sítios, chácaras e fazendas, com um modo de vida
tipicamente rural e uma situação de difícil interpretação como resultado da junção desses
dois modos de ocupação do solo, que geograficamente pode ser chamado de rurbano.
Ainda de acordo com o Plano Diretor, a Zona Rural do município está situada fora da
linha limítrofe definida pela lei de perímetro urbano, onde há ocupação rarefeita, atividades de
produção da agricultura e preservação da biodiversidade nativa, favorecendo a manutenção do
ambiente natural.
O município de Barra dos Coqueiros já sente as conseqüências do aumento do
fluxo urbano proveniente da capital e deve com bastante pressa implementar a criação de
um órgão fiscalizador para exigir as premissas indicadas em seu Plano Diretor. Somente
desta maneira será possível proporcionar um crescimento equilibrado e, sobretudo, se
estará contemplando as reflexões da comunidade inseridas nessa nova realidade.
Partindo-se das principais metamorfoses paisagísticas e territoriais,
anteriormente apontadas, pretende-se aqui, apresentar as mais significativas mudanças
sócio-geográficas ocorridas no município em decorrência dessas metamorfoses.
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Com o anúncio da construção da ponte, toda uma inquietação pôde ser
observada entre os moradores do município de Barra dos Coqueiros, as dúvidas sobre o
futuro do município e as conseqüências da construção da ponte só não eram maiores que
os entraves políticos a respeito das justificativas para a realização desse projeto.
Quando do efetivo início das obras, foi possível constatar as primeiras
modificações que influenciaram o meio sócio-geográfico municipal: aproximadamente 130
famílias tiveram que ser indenizadas e transferidas de local, por conta da construção da
rodovia que complementaria a cabeceira da ponte. De acordo com o D.E.R. (2004), 50 dessas
unidades residenciais estavam em área de invasão junto ao manguezal e a construção dessa
rodovia serviria como um divisor, impedindo futuras ocupações e a conseqüente
degradação do manguezal. Porém, muitas dessas famílias atingidas pela construção da
ponte ao receberem as indenizações referentes à desapropriação de suas moradias,
migraram para outras áreas de invasão e ocuparam também outros assentamentos
irregulares, já que, de acordo com informações da prefeitura municipal, não houve
nenhuma política de inserção social para essas pessoas. A conseqüência desse fato foi o
aumento do número de barracos na invasão às margens do Canal do Guaxinim, que
atravessa boa parte do município e da sede municipal. Mesmo antes da construção da
ponte, já havia grande número de barracos às margens desse canal, porém, nos dias atuais,
é possível observar que o seu traçado serviu de eixo balizador dessa ocupação irregular.
Com o início de operação da ponte e a extinção do serviço de travessia de
automóveis por meio de balsa, os reflexos no segmento econômico municipal foram
desencadeados. Primeiramente, houve a demissão de 30 funcionários da empresa H.
Dantas ocupados nessa atividade. Em seguida, foi possível observar o fechamento de três
dos cinco bares existentes na orla fluvial, no trecho onde era feita a espera para a travessia
da balsa. No que se refere ao setor de transporte de passageiros, com o início da operação
da ponte e conseqüentemente a travessia rodoviária de passageiros, o serviço oferecido
pelas lanchas, a partir dos hidroviários, não resistiu a essa nova concorrência. Segundo o
Cinform on-line (2006), “esse transporte será extinto por causa da baixa lucratividade, já que
com a inauguração da ponte em setembro, e o conseqüente aumento de opções de
transporte, o fluxo de passageiros reduziu cerca de 70%...”. Ainda de acordo com o citado
noticiário, com a inauguração da ponte, a H. Dantas, empresa que administrava o serviço,
reduziu gradualmente a frota, a ponto de deixar somente uma balsa operando, das seis que
anteriormente funcionavam.
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A conseqüência desse fato foi a demissão de 110 funcionários e a extinção dos
serviços de transporte oferecidos por essa empresa, entre a capital e o município de Barra
dos Coqueiros. Com a sensível diminuição no fluxo de passageiros, foi possível observar que
também houve a estagnação do comércio nos arredores do terminal hidroviário local,
ocasionando dessa forma, o encerramento das atividades de alguns estabelecimentos
comerciais.
Outro fato observado foi a diminuição dos serviços formais e informais de
transporte complementares à travessia hidroviária. Dezenas de jovens e adultos tinham
como ocupação, o serviço de transporte das mercadorias e bagagens dos passageiros em
carrinhos de mão, charretes, popularmente conhecidos como carregos. Além disso, eram
oferecidos os serviços de moto-táxi e táxis. Com exceção do transporte realizado em
moto-táxi, houve uma migração dessa oferta de serviços para as proximidades do terminal
de integração rodoviário. Já o transporte feito pelos táxis bandeira sofreu uma dinamização
na sua função, passando para um transporte do tipo lotação interligado à zona
metropolitana.
Ainda nesse contexto, foi possível observar que a inauguração da ponte gerou
diversos conflitos entre os trabalhadores do transporte rodoviário de passageiros do
município de Barra dos Coqueiros e o órgão regulador do Transporte e Trânsito de Aracaju.
Várias manifestações foram realizadas, inclusive com o a obstrução das pistas de rolamento
da ponte impedindo o fluxo de veículos entre os municípios, para que houvesse a resolução
dos problemas que afloraram no setor de transporte e a regulamentação no serviço.
No que pode ser observar a respeito das alterações na infra-estrutura básica do
município de Barra dos Coqueiros, foi possível constatar que houve um aumento
significativo na demanda. Porém, com a previsão da instalação de grandes e médios
empreendimentos e a migração gradual de novos moradores, a tendência dessa demanda é
crescer.
Em se tratando da dinâmica imobiliária surgida a partir da construção da ponte,
as conseqüências das novas ocupações são as que mais tem influenciado no modo de vida
da população local. É possível constatar em observação direta nas ruas do município, que
existe um grande número de residências colocadas à venda.
Observando a tendência atual de ocupação, é possível apontar dois cenários
diferenciados. O primeiro se refere aos assentamentos irregulares, ocupados na sua grande
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maioria pela população pobre, com forte tendência ao incremento do número de novas
invasões em áreas ambientalmente frágeis, como já é possível observar. O segundo se trata
da ocupação de alto poder financeiro que já está ocorrendo na área considerada
privilegiada do município, a linha de costa, e também do surgimento de condomínios
fechados de prédios de apartamentos residências na sede municipal.
De acordo com o Jornal Cinform (2008), grandes construtoras da capital estarão
investindo na construção de mais dois novos condomínios de prédios na Barra dos
Coqueiros. Ainda de acordo com o citado semanário, quando calculado o valor do metro
quadrado desses empreendimentos, chega-se a R$ 950,00, valor acima do que é praticado
para empreendimentos desse porte em Aracaju.
Outro fato que não pode deixar de ser considerado, é a descaracterização da
zona rural do município que atualmente não oferece tanta lucratividade na produção do seu
principal cultivo, o coco-da-baía. Por se tratar de uma área de localização privilegiada, com
paisagens cênicas de grande beleza e qualidades geográficas particulares, esses terrenos
oferecem maior rentabilidade quando se tornam mercadorias da especulação imobiliária.
Dentro desse contexto, é possível observar ao longo da Rodovia SE-100, principal eixo
indutor de ocupação no litoral de Barra dos Coqueiros, o parcelamento dessas pequenas
propriedades e o surgimento de alguns novos loteamentos, vem descaracterizando o antigo
ambiente e também os hábitos tradicionais rurais.
O fenômeno turístico imobiliário está se processando com tal rapidez na
localidade que nem mesmo a administração municipal consegue dar conta da instalação
desses novos empreendimentos. Movidos pelo discurso dos benefícios diretos gerados pelo
turismo, o próprio governo estadual incentiva a ocupação das áreas ainda desabitadas no
município.
Vislumbrando um futuro próximo, é possível afirmar que, caso não haja medidas
de controle para a ocupação dessas áreas, brevemente a orla marítima do município será
tomada por empreendimentos imobiliários voltados para a clientela internacional que
pretende ter no litoral sergipano, a sua residência de férias nos trópicos.
Inúmeros empreendimentos já foram anunciados para se instalarem no
território municipal de Barra dos Coqueiros e as conseqüências ao meio sócio-geográfico do
município serão inúmeras. A valorização do preço da terra, principalmente na zona costeira
do município impedirá o acesso à população local. Existe também a possibilidade do
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surgimento de áreas de conflitos de uso do solo, principalmente no que se refere ao acesso
à praia. Há ainda os problemas ambientais que poderão ser gerados pela ausência de
saneamento básico, pelo aumento do fluxo superficial de águas através de terrenos
impermeabilizados, pela diminuição da capacidade de infiltração, e intensificação da
ocupação de áreas ambientais protegidas, a exemplo das dunas e manguezais.
Conclui-se então, que a estrutura de desenvolvimento sustentável apresentada
como justificativa pelo idealizador da ponte, o ex-governador do Estado, não é visualizada
nas atuais atividades implementadas ou em fase de implementação no município.
Observa-se a intensificação do uso e ocupação do solo. A operação da ponte tem reflexos
positivos no que diz respeito à facilitação do transporte, à mobilidade das pessoas, ao
acesso para um comércio mais diversificado na capital, ao aumento do fluxo turístico e a
valorização imobiliária. Entretanto, se esses reflexos podem ser positivos para um
determinado segmento da população, para outros e também para o meio ambiente, podem
ser encarados como negativos. As conseqüências associadas a essa operação já estão sendo
assistidas e muito provavelmente serão intensificadas com a evolução do tempo.
Desde o início da construção da ponte, observa-se uma intensa valorização do
solo, que nos últimos vem se intensificando e se tornando mercadoria de grande valor. O
segmento imobiliário tornou-se uma das principais atividades econômicas do município
atualmente. Entretanto, o preço da terra ainda é baixo, quando comparados a outras áreas
de litoral no Brasil, o que favorece a intensificação da dinâmica imobiliária municipal.
A operação da ponte intensifica a dependência do município com a capital. A
ligação com a área metropolitana de Aracaju, por meio da construção da ponte, favorece a
pressão sob a terra, e dessa forma contribui para a descaracterização sóciogeográfica da
zona rural, influenciando na mudança do modo de vida de uma significativa parcela da
população que sobrevive da produção das pequenas propriedades, através da agricultura
familiar.
A ocupação rarefeita de baixa densidade é atrativo que proporciona a atual
intensificação do uso e ocupação do território municipal. Com isso, os reflexos territoriais e
paisagísticos são observados, especificamente na intensificação da degradação ambiental e
na qualidade de vida local.
A previsão da chegada de novos empreendimentos no município exigirá uma
qualificação da força de trabalho local para garantir inserção desse contingente. Tal fato
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será favorável para a dinamização da economia local, contribuindo para a diminuição da
dependência com Aracaju.
Outros impactos sóciogeográficos podem ser previstos com a intensificação da
chegada de novos empreendimentos quer residenciais ou industriais. É possível prever a
retirada da cobertura vegetal e dessa forma a alteração dos ecossistemas existentes,
influenciando na perda de habitats e redução da biodiversidade local. E ainda, o aumento do
tráfego, o crescimento urbano, o aumento do grau de atratibilidade turística do município, a
inquietação e expectativa da população para a admissão em postos de trabalho, o aumento
do custo de vida, alterações paisagísticas e no modo de vida da população local, a perda da
identidade cultural, o crescimento da violência e doenças sociais, o aumento da arrecadação
de impostos, a intensificação da especulação imobiliária e ainda a possibilidade de
dinamização do comércio e o surgimento de novos ramos da prestação de serviços.
A quebra do isolamento relativo em que se encontrava o município de Barra dos
Coqueiros realizada através da construção da ponte sobre o rio Sergipe, consolidará uma
nova realidade na ocupação urbana do município. O antigo núcleo urbano, isto é, a sede
municipal, manterá a sua atual configuração, visto que a sua disposição urbanística é de
difícil e onerosa intervenção. Os vazios intra-urbanos serão consolidados a partir de uma
dinâmica imobiliária especulativa voltada para a classe média e média baixa, sobretudo da
capital. Por fim, os terrenos situados entre a Rodovia SE-100 Norte e a linha de costa irão se
diferenciar de toda a realidade urbana do município, já que possivelmente serão ocupados
por empreendimentos internacionais compostos pela classe de alto poder aquisitivo,
principalmente estrangeiros de diversas partes do mundo.
O município de Barra dos Coqueiros já sente as conseqüências do aumento do
fluxo urbano proveniente da capital e deve com bastante pressa implementar a criação de
um sistema municipal para tratar das questões urbanas e ambientais, colocar em prática as
premissas indicadas em seu Plano Diretor Participativo, criar novas estratégias de resolução
dos atuais problemas encontrados no município, além de efetuar parcerias com outras
esferas de governo e também com a iniciativa privada. Somente dessa maneira será possível
proporcionar um crescimento equilibrado que leve a Barra dos Coqueiros a uma coesão
territorial que viabilize o seu desenvolvimento.
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A PONTE SOBRE O RIO SERGIPE: METAMORMOSES PAISAGISTICAS, TERRITORIAIS E SÓCIOGEOGRAFICAS NO MUNICÍPIO DE BARRA DOS COQUEIROS, SERGIPE, BRASIL
EIXO: Transformações territoriais em perspectiva histórica: processos, escalas e contradições
RESUMO
O município de Barra dos Coqueiros, estado de Sergipe, teve a partir do ano de 2008, com a
inauguração da ponte sobre o rio Sergipe, a efetivação da interligação rodoviária com a capital do
estado, Aracaju. Com essa interligação rodoviária direta, inúmeras metamorfoses em diversos
segmentos estão se processando. A instalação de crescente processo de especulação imobiliária,
aumento de ocupações irregulares, conflitos territoriais, supervalorização do preço da terra,
privatização de setores de praia e outras, que alteram o modo de vida dos moradores do
município, inclusive devido à perda de parte do espaço rural, decorrente do crescimento
desordenado da zona urbana e das proliferações de loteamentos e complexos residenciais de
luxo. Nesse sentido, o propósito central desse artigo fundamenta-se na análise das principais
metamorfoses paisagísticas, territoriais e sócio geográficas ocorridas no citado município, como
também, apresenta alguns problemas já existentes, reflexos desta “abertura” do território, que
passa por mudanças significativas, nem sempre desejáveis. Para o alcance dos objetivos,
utilizaram-se de distintos procedimentos metodológicos, dentre eles, levantamento bibliográfico,
pesquisa cartográfica e documental, observações em campo e entrevistas. Constatou-se, dentre
outros resultados, que a ponte desencadeou no referido município uma série de transformações
paisagísticas, territoriais e sociais que podem ser percebidas na geografia urbana e rural da Barra
dos Coqueiros e conclui-se que se faz necessário planejamento integrado entre as esferas de
governo e a iniciativa privada para contribuir com o tão almejado desenvolvimento.
Palavras-chave: Paisagem, Território, Ordenamento Territorial.
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