a polêmica do ajuste a valor presente

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A polêmica do Ajuste a Valor Presente Curitiba, 14 de julho de 2011. 1 INTRODUÇÃO As atuais mudanças no campo de atuação contábil, advindas das inovações da regulamentação contábil no Brasil, têm trazido consigo certas dúvidas e receios referentes a alguns assuntos específicos. Uma dessas dúvidas tem sido a aplicação do Pronunciamento Conceitual nº 12 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), que tem por objetivo “(...) estabelecer os requisitos básicos a serem observados quando da apuração do Ajuste a Valor Presente de elementos do ativo e do passivo quando da elaboração de demonstrações contábeis, (...)”. Assim sendo, este artigo tem como objetivo geral demonstrar o conceito e aplicabilidade prática do ajuste a valor presente previsto no CPC 12. Para tanto, a base teórica para a elaboração do presente artigo serão livros publicados, bem como o próprio pronunciamento CPC 12, referente ao assunto. O trabalho está estruturado, conforme apresentado, primeiramente por uma introdução; posteriormente é desenvolvido um referencial com base no assunto a ser desenvolvido. A seguir, é apresentada a aplicação do CPC 12 em um evento simulado, de forma a tornar possível a compreensão sobre a forma de aplicação do Ajuste a Valor Presente. Por fim, são apresentadas as conclusões. 2 MARCO TEÓRICO 2.1 LEI 11.638/2007 6.404/1976 Atualmente, a legislação societária sofreu algumas mudanças que impactaram diretamente na profissão contábil, principalmente em função a Lei 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e a Lei 11.941, de 27 de maio de 2009.

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Page 1: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

A polêmica do Ajuste a Valor PresenteCuritiba, 14 de julho de 2011.

1 INTRODUÇÃO

As atuais mudanças no campo de atuação contábil, advindas das

inovações da regulamentação contábil no Brasil, têm trazido consigo

certas dúvidas e receios referentes a alguns assuntos específicos.

Uma dessas dúvidas tem sido a aplicação do Pronunciamento

Conceitual nº 12 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), que

tem por objetivo “(...) estabelecer os requisitos básicos a serem

observados quando da apuração do Ajuste a Valor Presente de

elementos do ativo e do passivo quando da elaboração de

demonstrações contábeis, (...)”.

Assim sendo, este artigo tem como objetivo geral demonstrar o

conceito e aplicabilidade prática do ajuste a valor presente previsto

no CPC 12. Para tanto, a base teórica para a elaboração do presente

artigo serão livros publicados, bem como o próprio pronunciamento

CPC 12, referente ao assunto.

O trabalho está estruturado, conforme apresentado, primeiramente

por uma introdução; posteriormente é desenvolvido um referencial

com base no assunto a ser desenvolvido. A seguir, é apresentada a

aplicação do CPC 12 em um evento simulado, de forma a tornar

possível a compreensão sobre a forma de aplicação do Ajuste a Valor

Presente. Por fim, são apresentadas as conclusões.

2 MARCO TEÓRICO

2.1 LEI 11.638/2007 – 6.404/1976

Atualmente, a legislação societária sofreu algumas mudanças que

impactaram diretamente na profissão contábil, principalmente em

função a Lei 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e a Lei 11.941, de

27 de maio de 2009.

Para o assunto em questão, duas alterações trazidas pela Lei

11.638/07 precisam ser destacadas, a começar, conforme art. 5º, da

previsão quanto a criação do CPC, conforme segue:

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Art. 5o A Lei no 6.385, de 7 de dezembro de 1976, passa a vigorar

acrescida do seguinte art. 10-A:

“Art. 10-A. A Comissão de Valores Mobiliários, o Banco Central do

Brasil e demais órgãos e agências reguladoras poderão celebrar

convênio com entidade que tenha por objeto o estudo e a divulgação

de princípios, normas e padrões de contabilidade e de auditoria,

podendo, no exercício de suas atribuições regulamentares, adotar, no

todo ou em parte, os pronunciamentos e demais orientações técnicas

emitidas. (BRASIL, 2010)

Esta alteração, promovida com vistas à implementação do processo

de convergência com as normas internacionais, além de prever a

criação do CPC, permite que a este seja atribuída autoridade de

estudar elaborar procedimentos, que, como conseqüência, que sejam

observados pela classe contábil de forma de forma efetiva.

A outra questão ser destacada trata-se, conforme comentam Braga e

Almeida (2008), que um dos grandes problemas que a contabilidade

vem enfrentando com a lei 11.638/07 consiste no tratamento dos

juros embutidos nas operações de venda a prazo. Para estas, era

utilizado o mesmo tratamento contábil das operações a vista,

deixando de reconhecer despesas e receitas financeiras incluídas nas

transações e apurando resultados distorcidos.

Com base neste assunto, o novo inciso VIII do art. 183 da lei 6.404/07

traz em sua redação que “Os elementos do ativo decorrente de

operações de longo prazo serão ajustados a valor presente, sendo os

demais ajustados somente quando houver efeito relevante.” (BRASIL,

2010) 

Também a nova redação da lei 6.404/76 em seu inciso III do art. 184

é a seguinte:

As obrigações, encargos e riscos classificados no passivo exigível a

longo prazo serão ajustados ao seu valor presente, sendo os demais

ajustados quando houver efeito relevante.”Algumas empresas já

Page 3: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

trabalhavam neste contexto com a correção monetária integral

disciplinada pela instrução CVM 64/87. A nova legislação adotada nos

conceitos das normas internacionais em especial o IASB, transcreve

que somente devem trazidos a valor presente aqueles elementos do

Ativo e Passivo não circulante e aqueles que estiverem dentro grupo

circulante com valores relevantes. (BRASIL, 2010)

É de se observar, portanto, que a própria legislação prevê a utilização

do ajuste a valor presente, quando a contabilidade estiver

trabalhando com valores de longo prazo, ou de curto prazo, quando

seu efeito for relevante.

Com isto, inicia-se uma nova situação de como operacionalizar estes

lançamentos, considerando a atual infra-estrutura em relação a

sistemas contábeis tradicionais e os ERPs (Enterprise Resource

Planning). Em se tratando de uma regulamentação legal, porém, é

necessário a observância deste procedimento, a fim de não se

incorrer em um procedimento que pode ser considerado ilícito.

2.2 CPC 12 – AJUSTE A VALOR PRESENTE

Para começar a falar a respeito da regulamentação que

especificamente trata do Ajuste a Valor Presente, é importante

relembrar da incumbência prevista pela Lei 11.638/07 ao Comitê de

Pronunciamentos, que consiste em estudar e divulgar procedimentos

contábeis. Esta delegação de poder, posteriormente, foi confirmada

pelos principais órgãos regulamentadores da contabilidade, ou seja, o

Conselho Federal de Contabilidade (CFC), e a Comissão de Valores

Mobiliários (CVM), em função de terem aceitado o Pronunciamento

Conceitual Básico do CPC na Resolução 1.221 e Deliberação 539,

respectivamente.

Com isso, estando amparado por força de lei e em função dos órgãos

que disciplinam a regulamentação contábil, o CPC atualmente é a

entidade com autoridade para emitir regulamentações, que devem

ser efetivamente observadas pelos profissionais contábeis, como se

equiparada a uma lei.

A seguir são apresentadas as principais características do CPC 12 –

Page 4: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

Ajuste a Valor Presente.

2.2.1 Objetivos

Pronunciamento emitido pelo CPC, que trata especificamente do

ajuste a valor presente é o CPC 12 – Ajuste a Valor Presente, que tem

por objetivo “(...) estabelecer os requisitos básicos a serem

observados quando da apuração do Ajuste a Valor Presente de

elementos do ativo e do passivo quando da elaboração de

demonstrações contábeis (...)” (COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS

CONTÁBEIS, 2010).

Dado o objetivo apresentado, o pronunciamento deixa claro tratar-se

exclusivamente da questão da mensuração dos itens a valor

presente, e não das diretrizes de reconhecimento deste, sendo esta

última característica tratada por outro pronunciamento. Além disso,

considerando o objetivo apresentado, é importante destacar a

diferença entre o chamado “Valor Presente” e o “Valor Justo”,

conforme segue.

Valor justo (fair value) - é o valor pelo qual um ativo pode ser

negociado, ou um passivo liquidado, entre partes interessadas,

conhecedoras do negócio e independentes entre si, com a ausência

de fatores que pressionem para a liquidação da transação ou que

caracterizem uma transação compulsória. 

Valor presente (present value) - é a estimativa do valor corrente de

um fluxo de caixa futuro, no curso normal das operações da entidade.

(COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2010).

Observa-se considerável diferença entre os dois termos, uma vez que

o diz respeito à percepção do comprador e do vendedor, em

determinada transação, enquanto que o segundo diz respeito ao valor

de fluxos de caixa futuros, trazidos a valor presente. O que se pode

notar é que o valor justo pode ser adotado em casos específicos,

porém, o valor presente é mais amplamente utilizado, ou pelo menos

é buscado uma maior aproximação a este valor (o registro a valor de

custo é um exemplo deste fato).

Page 5: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

2.2.1 Diretrizes de Mensuração

O Pronunciamento CPC 12, em sua primeira designação inerente a

mensuração, traz que a questão mais importante a ser observada, em

se tratando das características deste princípio (essência sobre a

forma), não está na enumeração minuciosa e exaustiva dos itens

patrimoniais passíveis de mensuração a valor presente, mas

principalmente no estabelecimento de dois fatores: diretrizes gerais e

metas a serem alcançadas.

Quanto às diretrizes gerais, o CPC destaca que serão avaliados a

valor presente os itens que apresentarem as seguintes

características:

a) Transações que provoquem alterações no patrimônio empresarial,

seja no resultado ou diretamente no Patrimônio Líquido, que

impliquem recebimento ou pagamento em data diferente a data de

reconhecimento nas demonstrações;

b) Reconhecimentos periódicos de mudança de valor, utilidade ou

substância;

c) Conjunto particular de fluxos de caixa estimados associados a um

ativo ou passivo.

Com relação à meta a ser alcançada, o CPC (2010) afirma que os

itens a serem mensurados a valor presente devem ter em sua base

de mensuração a reflexão do valor do dinheiro no tempo e as

incertezas a ele associados. Observa-se que, quando da colocação

destes elementos, está sendo feito referencia à expectativa de

inflação, bem como em relação a uma taxa de desconto que reflita

esta incerteza relativa ao tempo, por algum denominada “custo de

oportunidade”.

Além da diretriz apresentada anteriormente, que compreende uma

abordagem mais generalista, outros pontos podem ser destacados,

conforme apresentado pelo CPC 12:

Ativos e passivos monetários, como juros implícitos ou explícitos

embutidos, devem ser mensurados pelo seu valor presente quando

do seu reconhecimento inicial, por ser este o valor de custo original

Page 6: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

dentro da filosofia de valor justo (fair value). 

Por isso, quando aplicável, o custo de ativos não monetários deve ser

ajustado em contrapartida; ou então a conta de receita, despesa ou

outra conforme a situação. A esse respeito, uma vez ajustado o item

não monetário, não deve mais ser submetido a ajustes subseqüentes

no que respeita à figura de juros embutidos. Ressalte-se que nem

todo ativo ou passivo não-monetário está sujeito ao efeito do ajuste a

valor presente; por exemplo, um item não monetário que, pela sua

natureza, não está sujeito ao ajuste a valor presente é o

adiantamento em dinheiro para recebimento ou pagamento em bens

e serviços. (COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS, 2010).

Na pratica o ajuste a valor presente reflete o ajuste para demonstrar

o valor presente de um fluxo de caixa futuro. Esse fluxo de caixa pode

estar representado por ingressos ou saídas de recursos (ou montante

equivalente; por exemplo, créditos que diminuam a saída de caixa

futuro seriam equivalentes a ingressos de recursos). Para determinar

o valor presente de um fluxo de caixa, três informações são

requeridas: valor do fluxo futuro (considerando todos os termos e as

condições contratados), data do referido fluxo financeiro e taxa de

desconto aplicável à transação. 

Definido estes itens, o Ajuste a Valor Presente, bem como posteriores

apropriações, devem ser realizadas em base exponencial “pro rata

die”, o que significa dizer que, em base de dias, o desconto seja

realizado baseado no conceito de juros compostos, visto que este é o

modo como se comporta a inflação do decorrer do tempo. Assim,

como é de se supor, as reversões advindas do Ajuste a Valor Presente

devem ser reconhecidas em contas de resultado, em contas de

receitas ou despesas financeiras, a não ser que haja a possibilidade

de justificar o reconhecimento como despesas operacionais, conforme

afirma o CPC (2010).

Por fim, as mensurações de ajuste a valor presente devem ser

evidenciadas em Notas Explicativas, de forma inequívoca a fim de

que o usuário entenda a aplicação dos procedimentos em questão,

bem como consiga realizar inferências em relação ao item avaliado.

3. DESENVOLVIMENTO

Page 7: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

3.1 Modelo Apresentado pelos autores.

Uma empresa efetuou uma venda a prazo em 10-04-2010, no valor

de R$ 100.000,00 com vencimento da duplicata para 20-05-2010, a

taxa de 5% a.m. Abaixo os cálculos e contabilização são:

Tabela 01 – Cálculo do Valor Presente

Tabela 02- Demonstração das fórmulas do Excell

Page 8: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

Tabela 03- Plano de Contas

Tabela 04 – Lançamentos Livro Diário

Tabela 05 – Balanço Patrimonial

3.2 Exemplo: Modelo apresentado no Item 12 do pronunciamento CPC

12 do Comitê de pronunciamentos Contábeis

Como se contabilizam a compra e venda de bens a prazo cuja

contrapartida requeira o ajuste a valor presente? 

No caso de venda, por exemplo, de imóvel a prazo, por valor nominal,

sem especificação de juros, após os procedimentos de determinação

do ajuste a valor presente dever esse ajuste retificar o ativo realizável

e a receita de venda, podendo o ajuste ao ativo realizável ser feito

em conta retificadora. Conta essa que deverá ser apropriada como

Page 9: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

receita financeira até o vencimento. No comprador o ajuste retifica o

custo do ativo imobilizado que deve ser registrado Pelo seu valor

presente e a retificação do passivo pode também contar com conta

redutora a gerar despesa financeira até o vencimento. 

Exemplo: suponha-se uma venda de imóvel por $ 10.000 mil, pago

com entrada de $4.000 mil em dinheiro e 3 (três) notas promissórias

anuais de $ 2.000 mil cada uma, sem juros, efetuada num momento

em que a taxa de juros, para o tipo de vendedor e comprador, seja,

para ambos, de 18% ao ano (essas taxas podem ser diferentes para

eles). 

O vendedor, na transação, registra: 

D – Caixa $ 4.000.000

D – Notas Promissórias a Receber $ 6.000.000

C – Juros a Apropriar $ 1.651.454

C – Receita de Venda de Imóveis $ 8.348.546

O comprador: 

D – Imóveis $ 8.348.546

D – Juros a Apropriar $ 1.651.454

C – Caixa $ 4.000.000

C – Notas Promissórias a Pagar $ 6.000.000

Em ambas as Notas Promissórias aparecerão (em um no seu ativo; no

outro, no seu passivo) pelo seu saldo líquido constituído do valor

nominal diminuído dos Juros a Apropriar, e esse saldo irá crescendo

pela apropriação dos juros ao resultado, até que no vencimento essas

contas retificadoras zerem. 

4. CONCLUSÃO:

Tomando como base a lei 11.638/07 e o pronunciamento emitido pelo

CPC, que trata especificamente do ajuste a valor presente é o CPC 12

– Ajuste a Valor Presente, que tem por objetivo demonstrar os

requisitos básicos do ajuste de valor presente. Apresentamos neste

artigo algumas das maneiras de calcular e realizar os ajustes

contábeis para que estes se atenham com modelos e estudos

contábeis futuros que estão sendo apoiadas pelas regras das normas

do IFRS.

REFERENCIAS

Page 10: A polêmica do Ajuste a Valor Presente

BRAGA, Hugo Rocha; ALMEIDA, Marcelo Cavalcante. Mudanças

Contábeis na Lei Societária. Lei nº 11.638/07.

BRASIL. Lei Nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Altera e revoga

dispositivos da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e da Lei no

6.385, de 7 de dezembro de 1976, e estende às sociedades de grande

porte disposições relativas à elaboração e divulgação de

demonstrações financeiras. Planalto. Disponível em: . Acesso em: 14

abr. 2010.

_______. Lei Nº 6.404, de 15 de Dezembro de 1.976. Dispõe sobre a

Sociedade por Ações. Planalto. Disponível em: . Acesso em: 14 abr.

2010.

COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÂBEIS. Pronunciamento técnico

CPC 12: Ajuste a Valor Presente. Disponível em: <

http://www.cpc.org.br/pdf/ CPC_12.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2010

Autores:

Rosenei Novochadlo da Costa: Mestre em Ciências Contábeis e

Controladoria pela FURB. Professor IBPEX, FAEC, UEPG. Sócio da Zoing

Auditores Independentes S/C Ltda.(e-mail:

[email protected])

Jocelino Donizetti Teodoro. Contador, mestrando da Universidade

Federal do Paraná., Graduação do curso de Ciências Contábeis da FAE

Business School"(e-mail: [email protected])