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A MENTALIDADE ADMINISTRATIVA CHARLES E. SUMMER JR. "Tendo em vista que por "boa" administração se entende aquêle comportamento que é objetivamente adequado aos seus fins [... ] uma teoria das deci- sões edministt1!ltivas, terá. forçosamente, de preo- cupar-se de certa maneira com os aspectos racionais da escolha." - HERBERT SIMON. A maneira de pensar dos administradores de emprêsas pode ser caracterizada por qualidades e atitudes bem de- finidas, a exemplo do que ocorre com cientistas, advogados e outros profissionais? No que se assemelha a mentalidade administra,tiva à mentalidade científica ou profissional, ao lidar com fatos, números, teorias, coerência interna, mudanças, riscos e outras questões? '. No que difere a mentalidade administrativa das qua- lidades intelectuais que usualmente associamos aos mé- dicos, advogados ou cientistas, ou quais as limitações dessa mentalidade? Qual o significado de tais semelhanças e diferenças para os homens de negócio e para os professôres de admi- nistração? Encontramos de maneira clara na filosofia das ciências, artes e profissões, dados sôbre as qualidades da "menta- CHARLES E. SUMMER JR. - Professor-Adjunto de Administração da Columbia University. Nota da Redaçãc: Traduzido ao original publicado na Herverâ Business Review, janeiro/fevereiro de 1959, por OLINDA V. MALMEGRIN, e reprodu- zido sob autorização.

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A MENTALIDADE ADMINISTRATIVACHARLES E. SUMMER JR.

"Tendo em vista que por "boa" administração seentende aquêle comportamento que é objetivamenteadequado aos seus fins [... ] uma teoria das deci-sões edministt1!ltivas, terá. forçosamente, de preo-cupar-se de certa maneira com os aspectos racionaisda escolha." - HERBERT SIMON.

• A maneira de pensar dos administradores de emprêsaspode ser caracterizada por qualidades e atitudes bem de-finidas, a exemplo do que ocorre com cientistas, advogadose outros profissionais?• No que se assemelha a mentalidade administra,tiva àmentalidade científica ou profissional, ao lidar com fatos,números, teorias, coerência interna, mudanças, riscos eoutras questões?'. No que difere a mentalidade administrativa das qua-lidades intelectuais que usualmente associamos aos mé-dicos, advogados ou cientistas, ou quais as limitações dessamentalidade?• Qual o significado de tais semelhanças e diferençaspara os homens de negócio e para os professôres de admi-nistração?Encontramos de maneira clara na filosofia das ciências,artes e profissões, dados sôbre as qualidades da "menta-

CHARLES E. SUMMER JR. - Professor-Adjunto de Administração da ColumbiaUniversity.Nota da Redaçãc: Traduzido ao original publicado na Herverâ BusinessReview, janeiro/fevereiro de 1959, por OLINDA V. MALMEGRIN, e reprodu-zido sob autorização.

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Iidade científica", da "mentalidade criadora", da "menta-lidade técnica, legal ou jurisprudencial". O mE143monão sedá, contudo, com referência à "mentalidade administra-tiva". Todavia, os homens que dirigem assuntos mundiaisna indústria, no govêrno e nos serviços militares não sãocientistas, artistas ou médicos. Destarte, pelo fracasso emestabelecer com alguma clareza as qualidades da "menta-lidade administrativa", estaremos negando, tanto aos admi-nistradores individualmente, como à sociedade, vantagenspositivas de ordem prática.

Enquanto outros enumeram as nobres qualidades da "men-talidade científica ou artística", o administrador profis-sional permanece à margem, não se considerando que atomada de decisões administrativas pode apresentar-secomplexa e intelectualmente difícil. Ao contrário do queocorre nas demais profissões, há pouco reconhecimentopelos padrões que estimulam a competição na administra-ção, sobrecarregando os esforços de treinamento de homensem tal campo. Ademais, as escolas de administração nãoapresentam aquêle conceito claro e equilibrado de obje-tivos que têm sido de grande valor para as escolas pro-fissionais em geral.

Friso que não estou escrevendo sôbre habilidade, nemsôbre aptidões para formular decisões. Qualquer pessoa -mesmo um novelista - reconhece que um bom adminis-trador as possui. Estou, na verdade, principalmente inte-ressado nas qualidades comuns de pensamento, nas atitu-des, inclinações, predisposições, em suma, nos padrões deraciocínio que nos permitem caracterizar o administradore predizer, se não como resolverá um problema, pelo menoscomo se portará na sua condução.

Para os propósitos que tenho estabelecidos, não é necessá-rio definir tôdas as facêtas da "mentalidade profissional".Basta que admitamos ser o profissional um homem queutiliza os seus conhecimentos e das demais pessoas paraobter resultados no mundo da ação real. Empenha-se nacompreensão do ambiente ou da ordem natural, prevendoo que ocorrerá durante sua atuação e, em muitos casos,

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controlando tais ocorrências. É essa orientação para açãoe resultados, e, para problemas de resolução da ação, queidentifica as qualidades intelectuais de um profissional.

A questão de saber se a administração está ou não se tor-nando uma profissão, fica também colocada fora dos pro-pósitos dêste artigo. É evidente, todavia', que se qualidadesmentais semelhantes às aqui apresentadas forem aperfei-çoadas e aceitas como padrões, a administração estarámuito mais próxima do status de profissão. Não será, po-rém, igual a nenhuma das profissões que' conhecemos atu-almente. A mentalidade administrativa está desenvolvendomuitas semelhanças com as mentalidades científica, técni-ca, médica e legal, mas apresenta também algumas dife-renças. Está percorrendo caminho próprio, trabalhandonuma direção. independente. Isto é óbvio e deveria mesmoocorrer; mas, o fato de apresentar nesta evolução um pa-drão desconhecido, explica porque tantas pessoas demo-ram em reconhecer a nova dimensão intelectual da admi-nistração.

Último lembrete: nesta discussão, ater-nos-emos exclusi-vamente às qualidades intelectuais do administrador.Apesar de serem de vital importância, deve-se, todavia,lembrar que outros atributos são também importantes:qualidades morais, estéticas e criativas - ou conheci-mento e sabedoria advindos da experiência. Em verdade,algumas vêzes, essas qualidades não intelectuais podemser bem mais importantes que as primeiras, seja do pontode vista da emprêsa, ou da sociedade.

ATRIBUTOS EMPÍRICOS

Os atributos empíricos, intrínsecos e extrínsecos da men-talidade administrativa não constituem novidade. Porém,apresentam-se combinados de maneira diferente, e a êlesé atribuída uma ênfase distinta da vigente na mentalidademédica ou técnica.

O fato mais notório é que o administrador não conduznenhum tipo particular de raciocínio empírico a extremos.

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Aqui, como em qualquer outro ponto dessa discussão, ve-remos que não existe preponderância de uma única atitudeou predisposição. Cada qual parece ser seguida com mo-deração, enfatizando a "integração" - um modo de pensarglobal, ao invés de repartido entre ingredientes individuais.

Atitude Factual

ALFREDNORTH WHITEHEAD,grande filósofo e matemá-tico, diz-nos que os cientistas sempre se limitaram à obser-vação e à experimentação.'

A insistência de GALILEOsôbre "fatos irredutíveis e imutá-veis" levou a um descrédito do raciocínio, a ponto de, aindahoje, existir entre alguns cientistas a impressão de quesão "melhores" aquêles cujos métodos envolvem umaobservação paciente dos fatos através da experiênciaou de análises da experiência passada, em detrimentodaqueles cujos métodos dependem essencialmente da razãoe da lógica.

Êsse primeiro atributo empírico, que pode ser denominadoatitude factual, é particularmente válido no campo daação administrativa, onde o administrador tem que pro-vocar ou controlar eventos específicos num contexto pro-blemático. É péssimo que conclusões apressadas ou espe-culações imaginativas produzam decisões em desacôrdo.com o mundo real de problemas e fatos.

A atitude factual é recorrente nos anais da administração.Por exemplo, quando a "General Motors" decidiu pelaprimeira vez entrar no ramo de motores Diesel, a admi-nistração recolheu grande número de fatos sôbre qualtipo de locomotiva de pequeno porte seria necessário equais os passos para projetar, produzir e vender tal pro-duto. Passou-se então a um procedimento metódico, ba-seando-se as ações nas evidências obtidas. Atualmente, o

1) Science tmd the Modem World, Nova Iorque: New American Library,1948, págs. 9 e. 17.

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cuidadoso planejamento a longo prazo de várias com-panhias atesta a importância da atitude factual,"

Em oposição encontramos vários exemplos de resultadosinsatisfatórios quando os fatos não são reunidos com muitocuidado antes da tomada da decisão. Por exemplo, umasérie de estudos mostra que a razão primordial do fracassode novos negócios é a especulação otimista de seus pro-prietários, que negligenciam a atitude factual com respeito'à previsão das vendas, problemas operacionais, necessida-des de capital etc..

Entretanto, a atitude factual pode conduzir a exageros.Se o administrador estiver preocupado em excesso com anecessidade de coletar "todos" os dados, poderá falhar emdois aspectos: 1) em muitas decisões os fates referentes aum problema não podem ser conhecidos; 2) mesmo quese conheçam as várias espécies de fatos necessários, podenão haver tempo suficiente para sua obtenção.

Portanto, é necessária uma forma modificada da atitudefactual, que diga, com efeito: "Ser paciente e querer obteros fatos, relutar quanto a eonclusões apressadas, mas nãohesitar em aplicar o raciocínio e o julgamento quando ne-cessário, se a falta de fatos OU de tempo impedirem inteira-mente a pesquisa de um problema."

A êsse respeito, a mentalidade administrativa não difereda mentalidade médica ou legal. Às vêzes, o médico éobrigado a tomar decisões rápidas, o advogado tem deaconselhar seu cliente antes que uma questão seja solu-cionada pelo tribunal. Todavia, uma atitude factual mo-dificada seria irrelevante para um engenheiro ou pesqui-sador químico. Em outras palavras, temos aqui a primeirade uma série de semelhanças e contrastes entre a admi-nistração e as demais profissões.

2) Para documentação da experiência de várias ccmpanhias, veja-se Long--RlsnAe Planning for Mana,ement, editado por DAVID W. EWING, NovaIorque: Herper anel Brothers, 1958.

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Atitude Quantitativa

o segundo atributo empírico pode ser chamado de atitudequantitativa. Os filósofos da ciência dizem-nos que oscientistas contam com um "pré-juízo", inato e distinto,para selecionar, dentro do ambiente, apenas aquêles fatosque podem ser mensurados. Um escritor salientou:"A convicção mais profunda de KEPLER era de que a na-tureza é essencialmente matemática, e tôda sua vida cien-tífica foi um esfôrço para descobrir as harmonias mate-máticas da natureza. Também GALILEO não tinha dúvidasde que a matemática é uma das chaves verdadeiras dosfenômenos naturais." O fato de que essa preferência existemarcadamente, ainda hoje, é atestado pelos biólogos, fí-sicos, antropólogos e outros.

A atitude quantitativa satisfaz duas importantes necessi-dades do cientista: ajuda-o a ser objetivo e capacita-o a"provar" suas relações ou leis. Por exemplo, o que acon-tecerá a x unidades da variável y se a variável b se trans-forma por z unidades.

Essa predisposição matemática também pode ser valiosapara o administrador, conduzindo a formas mais eficazesde realizações. O orçamento é um exemplo, uma vez queaqui estão envolvidos os problemas de custo-padrão e índi-ces financeiros. A pesquisa operacional, os computadoresdigitais, a teoria das' probabilidades e dos jogos, a teoriade sistemas, a automação e as ciências sociais, como aantropologia aplicada, têm aumentado as possibilidadesde proceder' cientificamente no sentido de medir as con-seqüências das decisões administrativas.

Esforços para quantificar complexos problemas adminis-trativos têm sido tão freqüentemente bem sucedidos quequase todos os homens de negócio estão familiarizadospelo menos com alguns dêles. Exemplificando:

3) J. W. N. SULLIVAN, The .Limitations oi Science, Nova Iorque: NewAmerican Library, 1949, pág. 128.

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• O trabalho realizado na indústria química para pro-gramar complexos fluxos de subprodutos por meio deequações lineares.

I. OS esforços de THOMASMALONE,um meteorologistada "The Travelers Insurance Companies", e dos gruposda indústria petrolífera, para mostrar o que a quantifi-cação pode fazer quando aplicada a contrôle de estoquesde combustíveis à programação do refino, aos embarquesde subprodutos e aos problemas de orçamento de capital.

A maioria dos homens de negócio tem tido ensejo deaprender o que pode ocorrer se a administração não tiveruma predisposição quantitativa - casos como o do nôvodono de um grande jornal do meio-oeste quando descobriuque seu antecessor deixara de obter lucro durante 15 anoscom anúncios, simplesmente porque "detestava cifras" enão separava, de maneira quantitativa, a parte de anúnciosda redatorial. Outros exemplos de companhias quemantêm linhas não lucrativas, ou que continuam a servirterritórios e clientes cuja contribuição para os lucros émenor que seu custo, simplesmente porque ninguém temtempo de se preocupar com cifras, quando há coisas maisfascinantes para fazer.

É particularmente interessante notar que a atitude quan-titativa pode ser de grande ajuda nas relações humanasdo administrador'. A objetividade dos números, mais quea emoção subjetiva, é uma maneira pela qual o indivíduopode ser entendido e influenciado por outros. Isto temsido ressaltado pelos cientistas sociais e parece ajustar-seaos fatos do mundo dos negócios, como se evidencia, porexemplo, pela ênfase da "General Motors" sôbre "a autori-dade dos fatos" em contraste com a "autoridade decomando".

Diversamente do que ocorre com a mentalidade científica,a mentalidade administrativa tem que operar seletiva-mente com os números. A beleza e a precisão da mensu-ração podem ser admiradas somente até um certo ponto.Caso contrário aquêle que toma decisões pode rotardar

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as coisas enquanto o paciente morre, perde-se a guerra,ou a firma deixa passar sua oportunidade.As organizações de negócios podem precisar de pessoasque são profundas, zelosamente interessadas em quanti-ficação, mas aquêles que recebem fatos quantitativos etêm que incorporá-los a ações decisórias, em tempo limi-tado, não deveriam possuir tal temperamento em graumuito. elevado. Talvez a predisposição modificada para oadministrador pudesse Ser qualquer coisa como: "tentar,paciente e criativamente provar o resultado de sua deci-são, pela procura de variáveis que possam ser mensuredes,mas não se deixer levar pelos sistemas matemáticos, aponto de adiar ou evitar a decisão, quando a ação é ne-cessária" .A propósito, temos aqui uma diferença interessante entrea mentalidade administrativa e a da maioria dos gruposprofissionais. Alguns setores da organização podem estartão fortemente entregues às técnicas quantitativas comoqualquer cientista, e o próprio administrador que formuladiretrizes pode participar vez ou outra de tais projetos;mas, quando está tomando decisões como um membro daalta administração, deve resistir vigorosamente à tentaçãode se submeter, de maneira estrita, a qualquer uma dasvárias posições setoriais.

Êsse é um problema geralmente insignificante para cien-tistas, advogados, médicos etc., que trabalham em gruposhomogêneos. Todavia a heterogeneidade de uma organi-zação empresarial requer do administrador um julgamen-to preciso e grande disciplina mental. Tal atitude, além denão impedir sua paridade com outras profissões, poderáser ainda de grande valia para justificar o status profis-sional do administrador.

ATRIBUTOS LÓGICOS

Se bem que a limitação ao factual entre os homens deciência possa parecer uma deformação, a maior parte doscientistas reconhece a necessidade de uma delicada inte-

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ração e equilíbrio entre experimentos e observação, de umlad9' e especulação e raciocínio, do outro. O cientista es-peculará e teorizará nos mesmos têrmos físicos e mate-máticos com que observa e prova, mas com abordagensdiversas,

Atitude TeóricaO primeiro atributo da inteligência dedutiva é a ciênciana similaridade e na harmonia dos acontecimentos atra-vés dos tempos. Concomitantemente surge um interêsseem descobrir conceitos que classifiquem êsses aconteci-mentos dentro de um mesmo significado e em inferir leisque governam o que acontece a um conceito quando umoutro se transforma.Essa é a atitude teórica, e apesar de na mentalidade po-pular estar mais freqüentemente associada à ciência, ébastante usada nos negócios. Por exemplo, temos um con-ceito denominado "estoque" e outros como "ativo circulan-te", "passivo circulante", "índice de liquidez comum" e"empréstimos bancários". O administrador financeiro sabeque quando o estoque aumenta e é pago com empréstimosbancários, o índice de liquidez baixa, uma vez que o ativoe passivo circulante são igualmente aumentados. Podededuzir dessa relação outros acontecimentos futuros, comoos seguintes: quando o estoque é vendido e o caixa é usadopara construção de um edifício, transforma-se o ativo cir-culante em ativo fixo, e o índice de liquidez diminui. De-duz então o que acontecerá às outras partes do negócio,quando o índice de liquidez cai. Como vemos, todo êsseraciocínio procede através de uma cadeia de causas eefeitos.

Há centenas de conceitos e relações dessa natureza nasfuncões de finanças, vendas, pessoal, fabricação etc.. Assimsendo, os espíritos matemáticos e físico-dedutivos real-mente grandes, são aquêles que têm uma predisposiçãopeculiarmente forte dessa natureza. ALBERTEINSTEINtornou isso bastante claro quando disse: "Acredito comoSHOPENHAUERque um dos mais fortes motivos que leva

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o homem à arte e à ciência é a fuga da vida cotidiana,com sua dolorosa crueza e monotonia desesperançada, dospróprios desejos sempre mutáveis."!

Em outras palavras, inventando novos conceitos, abstra-indo-se dos problemas, acontecimentos e situações do mun-do real que nos cerca, o cientista foge para o que é paraêle um mundo mais agradável de teoria e razão.

Essa atitude especulativa é de grande valia para o pro-fissional na "linha de fogo". Atravessando dificuldadescomplexas de dirigir uma emprêsa ou um exército, qual-quer um estará perdido se não puder catalogar a confusãodos fatos ou problemas em uma forma de compreensãomais simplificada" de maneira que sua mente possa ma-nejá-los. Ao invés de tomar as teorias de alguém como"fantasias", ou dizer apressadamente "dê-me fatos e nãoteorias", muitos homens de negócio têm considerado útilponderar sôbre o "Modêlo" do pesquisador operacional dafirma, as "leis" dos economistas para a economia, e as hi-póteses dos cientistas sociais sôbre a relação entre moral,participação e descentralização.

Acredito que os líderes empresariais e as escolas de admi-nistração deveriam incentivar um tipo de treinamento,tanto em lógica como em semântica, que desenvolva ointerêsse pela "formulação de teorias" e pela aplicaçãode quadros teóricos à prática empresarial.

Desejando, contudo, evitar que o administrador profissio-nal permaneça mais tempo nas nuvens do que no mundoreal, a atitude teórica terá de sofrer modificações. Talvezpudesse ser enunciada assim: ° raciocínio e o pensamento,bem como o uso de teorias alheias poderão ser válidospara a prática profissional, desde que se mantenha umadesconfiança saudável e um desejo de abandonar os con-ceitos teóricos, se não se ajustarem a um problema es-pecífico.

4) ALBERT EINSTEIN. Essays in Science, Nova Iorque: Philosophica1 Li-brary, 1934, pág. 2.

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Predisposição para à Verdade

O segundo atributo lógico que é útil ao administradorpode ser denominado "predisposição para a verdade" ..

A atitude da lógica aristotélica é aquela que diz: "Devodefinir meus têrmos de maneira precisa, e verificar cadaafirmação antes de usá-Ia como premissa na discussão eelaboração de quaisquer conclusões." Os semânticos mo-dernos que desenvolveram um método suplementar, de-clararam: "Só saberemos o que é a verdade quando cadapalavra iôr verificada e a idéia das características abstra-tas que estabelecem uma conexão entre a palavra e oobjeto que representa no mundo reel iôr formada,"

A qualidade e a exeqüibilidade das idéias de um admi-nistrador dependem da verdade e da precisão das premis-sas com as quais êle raciocina. Assim, o conceito deverdade não é tão obscuro quanto parece. Sôbre êle re-pousam as possibilidades de serem ou não efetivas asdecisões do administrador.Como os outros atributos da, inteligência tomados da ciên-cia e da lógica, essa atitude deve sofrer modificações parapoder ser utilizada pelo administrador. Muitas vêzes, temque tratar com conceitos vagos e não pode retirar-se para.um claustro e reduzir seu problema à verdade fundamen-tal. O lógico, deparando com um objeto ambíguo e inca-paz de identificá-lo, pede recusar-se a aceitá-lo.

Por outro lado, o administrador tem que considerar todoe qualquer conceito que possa ser fator para elucidaçãode seu problema. Essa atitude modificada com relação àverdade poderia ser expressa da seguinte maneira: "Devoser tão preciso em raciocinar sôbre fatos e pesquisas, quan-to o tempo me permita, e devo procurar premissas e con-'clusõee que sejam verdadeiras, mas não devo afastar oproblema porque algumas afirmações não são passíveis dedefinição precisa." O conceito de "moral", por exemplo,é suficientemente fluido para que possamos utilizá-lo antesque se proceda a uma exaustiva investigação sôbre suanatureza.

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Suponhamos que o presidente de uma pequena companhiaem fase de crescimento depare com o problema de con-tratar mais pessoas e atribuir-lhes tarefas, as quais devemser coordenadas de maneira a atingir os objetivos de seuflorescente negócio. Ao prescrever um padrão de trabalhoe de tomada de decisão, êle raciocina que deve criar de-partamentos para as várias operações (planejar e decidirsôbre pormenores de tarefas, explicar e esclarecer o tra-balho, a avaliação de resultados, o recebimento de infor-mações dos empregados para avaliação etc.). Ou decide--se pela contratação de assistentes ou, ainda, delega essastarefas ao departamento em questão. Pode mais tardeperceber que a escolha de uma dessas alternativas poderáser feita em função dos seguintes fatôres: necessidadeshumanas, rapidez necessária para decisão, coordenaçãonecessária entre as partes do fluxo de trabalho etc..

Alguns autores deram alguma precisão ao significado dostêrmos acima usados: departamento, planejamento, assis-tentes etc.. Mas, semântica e outros especialistas obrigamo administrador a procurar e usar cuidadosamente têrmosmais precisos e fundamentais, que dariam uma realidadeconcreta, claramente definida, à espécie de descentraliza-ção, à autoridade do homem de assessoria"ao papel do de-partamento no quadro revisado da organização e assimpor diante. Obviamente isso seria um empreendimentomuito importante e impraticável, especialmente nesse es-tágio do desenvolvimento da administração.

Em conclusão, a atitude modificada com relação à verdadelevaria o administrador a realizar o melhor nos limites desua capacidade e no período de tempo disponível, utili-zando para tanto os têrmos que se tivessem provado comoos mais úteis. Êle não poderia abandonar temporàriamen-te suas atividades a fim de elaborar modelos dedutivos, oupara buscar premissas diversas.

A fluidez de muitos têrmos e conceitos em administraçãomostra uma falha da inteligência administrativa que nãoencontra paralelo nas ciências e demais profissões, compossível exceção de certas áreas do Direito. A situação

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sugere que um dos objetivos mais impo-rtantes do ensinode administração seria aumentar tanto o nosso conheci-mento experimental como o dedutivo, sôbre práticas ediretrizes administrativas, de medo que as palavras queusamos simbolizem a realidade, mais acuradamente doque agora.Imagino, por exemplo, se membros das faculdades deadministração não deveriam dispor de algum tempo, oude mais tempo para construção de modelos, e para cole-tar fatos "reais" do mundo dos negócios. Como ambos ostipos de conhecimento tornam-se disponíveis através dosanos ao futuro administrador, o compromisso com a pre-disposição científica para a verdade se tornará menospronunciada.

Coerência

Um terceiro atributo lógico do administrador é a versãomodificada da atitude de "validez" da lógica formal. Nósjá tratamos da "veracidade" e de "falsidade" das propo-sições no raciocínio do administrador. Agora, pergunta-mos se os argumentos em seu mecanismo são válidos ounão - ou seja, se as premissas, como enunciadas, SQOcoerentes entre si em vez de contraditórias - e se o enun-ciado das conclusões e decisões é coerente com o enun-ciado das premissas.Um excelente exemplo de forma lógica na indústria éa maneira pela qual as decisões para ação são prepara-das pelo conselho de diretores da "Standard Oil NewJersey". Os projetos são geralmente preparados sob formade propostas, com enunciados apresentando os resultadospositivos e negativos da ação. Essa é uma forma dedutivae é o reverso de uma outra seqüência usada comumente_ a forma clássica de argumento indutivo onde uma sériede enunciados é construída com proposições de ordemCEdavez mais alta, baseadas em fatos, seguindo-se entãouma conclusão.As razões pelas quais o administrador deve manter coe-rência dentro de limites são semelhantes àquelas meneio-

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nadas em conexão com a atitude sôbre a verdade. Tanto alógica como a semântica, como disciplinas do espírito, de-mandam reflexão larga e paciente, desligada das pressõesrotineiras das decisões operacionais. E muito freqüente-mente êsse tempo necessário simplesmente não existe.

A disciplina do espírito que o administrador necessita deveser qualquer coisa parecida com isto: "É necessário ra-ciocínio claro e preciso das premissas à conclusão, paraque minhas decisões profissionais e ações propostas sejampraticáveis. Entretanto, não posso esperar descobrir leiscientíficas em tôdas as decisões através de argumentosestritamente válidos, e algum8s vêzes será necessário subs-tituir a precisão silogística de pensamento, por racionali-dade no sentido amplo."

Em Defesa da Modificação

Muitas vêzes não é claro ao observador porque o homemde negócio é obrigado a modificar as atitudes lógicastradicionais, da maneira como fazem. Por exemplo, se oadministrador demorasse e insistisse em mais verdade ecoerência, não poderia, afinal, poupar tempo? Pessoal-mente, duvido. Deixe-me ilustrar.

No ano passado tomei parte em uma jornada programadapara administradores de alto nível, tanto de emprêsascomo de administração pública. Um especialista em lógica,nacionalmente conhecido, estava discutindo as ciladas eenganos, que são comuns quando não se faz uso adequadoda técnica silogística. Sua tese parecia ser uma exortaçãoaos administradores para que usassem tal raciocínio.

No período de debates que se seguiu, o conferencista foiapanhado pela audiência, em dois erros graves em seupróprio modo de pensar, erros de "generalização", e pare-ceu bastante despreparado para defender sua posição.

A razão foi que êle não percebeu que, ficando em pé di-ante de um grupo, respondendo perguntas, transformara-sede um lógico e pensador em um homem de ação. Viu

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que era necessário agir, respondendo tão jeitosamentequanto possível, e agiu.

Se êle tivesse permanecido, antes e acima de tudo, apenascomo um lógico, ao invés de tomar-se um lógico interes-sado em auxiliar o grupo de administradores, ter-se-ia ne-gado a responder perguntas até que pudesse enunciá-lasclaramente. Abandonaria a tribuna por um perícdo tãolongo quanto necessário, e pensaria numa resposta ade-quada. No caso em pauta, êle tentou ser um pensador eum homem de ação ao mesmo tempo, daí seu problema.

A lição que se pode tirar dêsse episódio é clara. Se asdecisões são formuladas superficialmente, com baixo graude validez e verdade, o administrador consegue tomá-lasno tempo requerido, porém, poderiam então ficar inapro-veitáveis. Por outro lado, se insiste em níveis elevadosde validez e verdade, de maneira que seja levado a deixarseu trabalho para longos períodos de elaborações mentaisabstratas, deverá permanecer na tribuna e dizer "não sei"a tôdas as perguntas e, afinal, nunca iniciar qualquer ação.Existe um ponto intermediário, que é o único procedimen-to prático, mas, isso requer: um nôvo conjunto de atributostotalmente diferentes.

ATRIBUTOS DA AÇÃO

Voltamo-nos agora para um grupo de atributos, centrali-zados na ação, que disciplinam o espírito administrativo.Quem está acostumado a pensar de maneira científicaopõe-se imediatamente a êsses atributos e diz: "Elas nãosão intelectuais." Visto que essa concepção errônea é umadas que impedem, tanto os profissionais, como os profes-sôres universitários, de ver a importância das qualidadescentralizadas na ação, e de tentar desenvolvê-las conscien-temente, torna-se necessário explicar porque são de natu-reza intelectua1.

Qualquer crença ou predisposição que influencie o modode pensar de uma pessoa, as seqüências implícitas nas

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elaborações mentais, ou a maneira pela qual ela ataca umproblema, pode ser considerada como uma atitude intelec-tual. Êsse éum dos significados da frase "maneira disci-plinada de pensamento". Um cientista tem um conjuntode predisposições ou crenças, um artista outro, o professorum terceiro, e assim por diante. Na discussão que se seguevamos focalizar um conjunto de atitudes que influenciamo modo como trabalha a inteligência centrada na ação ecomo tenta ser factual e racional. Veremos grandes varia-ções entre a mentalidade administrativa e a científica,mas também importantes semelhanças nas tendências in-telectuais dos administradores, advogados e médicos.

o Desejo de Transformar Coisas

Relembrando a afirmação de EINSTEIN, anteriormentecitada, sôbre como o cientista e o artista tentam fugir domundo da ação rotineira', podemos dizer que o profissionaltem um desejo em parte oposto ao de empreender açõesque apresentem resultados. 'O advogado deseja ganharcausas, tanto quanto apresentar uma argumentação bri-lhante. 'Ocirurgião deseja curar as pessoas, e também co-nhecer anatomia. 'O arquiteto quer levantar edifícios, oengenheiro construir pontes, o general do exército vencerbatalhas. 'O administrador deseja obter resultados.

Há várias maneiras pelas quais os administradores foramobservados para demonstrar êsse atributo. Alguns deixamposições confortáveis seguras e de alto nível em uma com-panhia bem organizada: para aceitar uma posição numacompanhia, que está em dificuldades, atrasada em relaçãoaos seus concorrentes ou falida. Essas situações proble-máticas, difíceis, podem ser vistas como um desafio. Damesma forma, um administrador que tem prazer em daratenção aos departamentos confusos de sua seção, podeestar mostrando essa qualidade. Ela aparece também, emplano mais modesto, no desejo de introduzir melhoramen-tos em uma situação já boa, ou no "desejo de fazer algonôvo". Freqüentemente, isso conduz a inovações que re-velam resultados imediatos - como comprova" por exem-

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pio, o registro da "Prudential Insurance Company", nosúltimos anos.

Na verdade, o desejo de mudar coisas pode ser mais ca-racterístico dos "caciques" do que dos "índios". Por exem-plo, WILLIAMH. WHYTEJR. diria que o "homem de or-ganização'" não se sente muito a vontade partindo deexperiência comprovada, e CHRIS ARGYRIS,que pessoasque partem saudàvelmente com vontade de crescer e pro-duzir inovações, ao contrário, tendem a adaptar-se à orga-nização, tornando-se apáticos e desinteressados da com-panhia e de seus objetivos 6. Ambos são provàvelmenteum exagêro, mas a advertência é legítima. Certamente, éa administração em todos os níveis que necessita de umadisposição para a ação, uma vez que pequenas melhoriasrios processos e técnicas podem somar o equivalente a"grandes" inovações.

Êsse desejo de mudar as coisas no mundo real é talvezcompletamente diverso daquele do cientista puro, que querser básico, factual, lógico e contribuir para a verdade evalidez do conhecimento. O cientista pode, de fato, querertransformar as coisas mas, não se preocupa demasiada-mente com o momento. Pode mesmo ser em um futurobastante remoto. POTexemplo, ARTHuR BURNS, ex-as-sessor do Presidente dos Estados Unidos, enunciou suapreferência por resultados a longo prazo alcançados atra-vés de idéias sofisticadas, em lugar dos resultados co-muns obtidos pelo trabalho do economista profissional noGovêrno'.

Ação Oportuna

Os administradores de alto nível, além do desejo de trans-formar coisas no mundo real, deveriam ter uma predispo-

5) The organisation Man, Nova Iorque: Simon and Schuster Inc., 1956.6) Personality and Organi!ation: the Conilict Bdw~n the System and the

Individual, Nova Iorque: Herper and Brothers, 1957; e The Organisation:What Ml3k.es tt Hea1thy?, H. B. R., novembro/dezembro de 1958,pág. 107.

7) . An Economist in Government, Columbia University !i'9rum, inverno çl~19!7, pág. 4.

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siçao para a ação oportuna. JOHNL. BURNS,presidenteda "Rádio Corporation of America" (RCA) e doutor emfísica, colocou a atitude da seguinte maneira: "Prefiro serpresidente do que estar certo" - querendo simplesmentedizer que, quando oportunidade e presteza de decisão sãonecessárias, a verdade e a validez devem ficar em segundoplano.

Parece haver pelo menos duas maneiras pelas quais oadministrador manifesta sua incapacidade para a açãooportuna:

1) Insistir num dilúvio de fatos sem que chegue a con-clusão alguma. Exemplos são comuns na maioria das em-prêsas, ainda que raramente lembrados. É interessantenotar que a história militar está cheia de casos em quecomandantes se recusaram agirporque queriam mais fatos.O general MCCLELLAN,por exemplo, errou quando seguiuLEE para a Virgínia.

2) O administrador pode adiar a ação por longo temposob alegação de que "devemos esperar para ver". o quena verdade êle mostra é temor de introduzir uma modi-ficação até que tenha todos os fatos em seu poder. Quandotiver todos, será provàvelmente um pouco tarde para serealizar muita coisa.

Capacidade de Julgamento

O têrmo "julgamento" tem causado muita confusão. Usu-almente é descrito apenas em têrmos mais gerais. F. R.COLLBOHN,presidente da "Rand Corporation", por exem-plo, disse recentemente: "O que é julgamento? Julga-mento nada mais é que experiência." Na verdade, o jul-gamento baseia-se em grande parte na experiência, masdescrevê-lo de maneira tão simples não faz, na minhaopinião, justiça ao têrmo. O papel do julgamento podetornar-se mais significativo se a palavra fôrdesmembradae analisada.Os administradores e todos os homens de ação têm, muitasvêzes, de tentar extrair significado de seus problemas e

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resolvê-los, sem fazer certas coisas que o cientista ou lógicofaz em sua paciente procura da verdade e validez. Paracada um dos instrumentos científicos pelos quais os eru-ditos eliminam o risco de seu modo de pensar, há umjulgamento ou risco correspondente, que o homem de açãotem de assumir muitas vêzes, se pretende conseguirresultados no.mundo real. Essas várias formas de julga-mento podem ser consideradas como: julgamento concei-tual, julgamento de quantidade, julgamento de pondera- .ção, julgamento global.

O julgamento conceitual resulta do fato de que o admi-nistrador não pode reduzir a conceitos fundamentais, nempela ciência (experimentação e generalização), nem pelalógica, as idéias com as quais trabalha. O físico lida comfôrças e massas, átomos e elétrons; o químico lida comátomos e moléculas; e o anatomista com corpúsculos ecélulas. Por outro lado, a administração de uma compa-nhia como a "General Motors" tem que lidar com símbolosmultifacetados tais como "serviço ao cliente", "linha deproduto", "tarefeiros", "duplicação de esforços" etc., com ofito de organizar sua diretriz para uma única fôrça devendas que vende uma linha de produtos aos consumidores.

O uso dessas variáveis imprecisas ou mal cuidadas em umproblema é uma tentativa do espírito administrativo decriar grandes instrumentos de pensamento, a fim de incluiruma porção de outras variáveis menores. Se o problemapudesse ser desmembrado em variáveis fundamentais, oque é impossível, tornar-se-ia tão complexo que não po-deria ser resolvido.A natureza do julgamento de quantidade e do julgamentode ponderação já foi mencionada. A administração da"Du Pont" e da "General Motors" não podem dizer: "'Sedescentralizarmos 68 mil decisões para as divisões, a moralsubirá em 5 graus, a rapidez de decisão aumentará de 35milhas por hora, ou o treinamento de administradores debaixo nível será acelerado à razão de 16 libras por minuto."Ao contrário, o espírito administrativo estima o custo deemprêgo de administradores gerais para a direção de di-

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visoes dependentes, em segundo lugar considera o efeitoda proposta sôbre a rapidez da decisão, o aumento de mo-tivação etc. e, só então, procura decidir.

a julgamento global resulta do fato de que o administra-dor não pode eliminar todos os milhares de fatôres de umproblema, reduzi-lo a dois ou três fatôres, e então, triun-falmente, dizer que o valor dessa ou daquela diretriz oucurso de ação pode ser provado.

Pouco depois da guerra da Coréia, a "International Busi-ness Machine Corporation" (IBM), defrontou-se com umproblema: se devia, inicialmente, produzir um pequenoou grande número de computadores modêlo 650. Se opresidente da "Companhia Thomas Watson" fôsse umcientista, ao invés de um administrador, poderia ter pro-vado que "permanecendo constantes o custo de fabricação,o custo do capital investido, os métodos de venda e pro-paganda, o número de empregados da fábrica, o preço dosmateriais, uma mudança de 180 na produção de compu-tadores daria 5 milhões nas vendas"," Mesmo que isso fôsseuma verdade triunfante e 180 computadores fôssem ven-didos por 5 milhões, a descoberta seria quase inútil, se ocusto de produção por unidade caísse, o número de em-pregados variasse e assim por diante.

Dessa maneira, o administrador tem que tentar lutar comos milhares de efeitos em cadeia, tanto internos como ex-ternos, quando toma uma decisão importante. Ao fazê-lo,corre um risco decisório .de estar errado na avaliação dasrelações.

Desconfiança da Ciência

Um dos equilíbrios mais difíceis de se manter na menta-lidade administrativa é aquêle entre o respeito pela teoriacientífica e a desconfiança sadia em relação a ela. Há nosnegócios uma longa história de "modas" que vêm e vão.

8) Scientilic Aids to Decision.makin~: a Perspective, American ManagementAssociaticn, General Management seríes, n.? 187, 1957, pág. 43

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Evidenciam que tanto a boa como a má ciência são ofere-cidas aos homens de ernprêsa e que a boa ciência podeser usada, gerando eficiência, bem como ineficiência. Paraindicar a série de possibilidades, listamos as seguintesexemplos:

• Em 1850 aproximadamente, ]EREMYBENTHAMten-tou ajudar o Govêrno inglês a estabelecer políticas paradiretriz do país, através dos seus "cálculos de felicidade".Seu objetivo era capacitar o Parlamento a escolher entreas diferentes leis, pela mensuração dos prazeres e afliçõesque cada uma infligiria à população.

• A administração científica de TAYLORvem sendoabandonada por muitas companhias. No passado umgrande número aplicou-a como fórmula absoluta para so-lucionar seus problemas.

• Pouco antes da Segunda Guerra Mundial, um consul-tor, CHARLESE. BEDEAUX,convenceu à administração deum grande número de emprêsas que o sistema Bedeaux,de administração salarial poderia equacionar esfôrço hu-mano e "repouso" com tecnologia e produção. Entre ascempanhias que fazem uso de sua teoria estão: a "Ame-rican Rolling Mills", "Campbell Soup", "Diamond Match","General Electric", "Du Pont", "Eastman Kodak", "Swift","Postum" e "Gocdrich"."

Hoje, muitos cientistas sociais e matemáticos competen-tes estão tentando ajudar os administradores a resolverproblemas. Lemes sôbre estudos que indicam que a pro-dutividade pode ser aumentada se os empregados "parti-ciparem"; ou que o moral pode ser aumentado com menorautoridade e pressão por parte dos supervisores. Alémdisso, conheço uma companhia onde foi feito e publicadoum estudo dêsse tipo e que atualmente crê que há "algode errado" em tais fórmulas.

9) The New Yorker, 22 de setembro de 1945, pág, 30.

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Talvez a chave dêsses mal-entendidos, entre cientistas eprofissionais, esteja o conceito de "sistema fechado" emcontraposição ao conceito de "problema global".

Freqüentemente os cientistas sociais enfatizam que suamissão é ajudar o administrador a entender o seu proble-ma, e não lhe dizer o que fazer 10. Não estão física e men-talmente mais capacitados para dizer ao administrador oque fazer, do que o próprio administrador. Mas, os cien-tistas do comportamento podem ajudar a esclarecer asvariáveis humanas, da mesma forma que o engenheiro, ocontador, o pesquisador mercadológico e outros, isolam asvariáveis ligadas à tecnologia, custos, consumidor, prefe-rência e os numerosos fatôres que aparecem associados noquadro da tomada de decisão. O que estou dizendo é quetanto os cientistas como os administradorea deveriam re-lutar em pensar que formulações científicas podem resol-ver os problemas de ação em tôda a sua complexidade. Oadministrador erra se se empolga pela "participação", "ad-ministração científica", ou pelo sistema Bedeaux e em-prega-o como uma fórmula para um problema de ação. Oscientistas também erram se escrevem suas publicações demaneira a querer dizer que seus conhecimentos serão vá-lidos em uma base ampla e geral, sem ajustes ou modifi-cações no mundo da ação. Uma razão para uma suspeitasaudável em relação à teoria é ser usualmente impossívelou impraticável quantificar as variáveis de uma decisão.Certamente, "moral" e, como muitos administradores nãoignoram, mesmo o lucro não podem ser mensurados comprecisão.Em pesquisas avançadas efetuadas com computadores, nasformas econométricas mais sofisticadas e nos modelos depesquisa operacional, o matemático em geral ou: 1.0)seleciona somente algumas variáveis, que podem ser men-suradas e deixa as outras variáveis ao executivo para jul-gamento; 2.°) inclui mais variáveis, mas pondera-as arbi-tràriamente, como é feito em alguns jogos de ernprêsas,

10) Veja-se Oportunities for Persuasion, EDWARD C. BURSK, H. B. R.,setembro/outubro de 1958, pág. 111.

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muito em voga atualmente; ou, 3.°) procura e ataca sóaquêles problemas que se prestam a um alto grau de quan-tificação. Em qualquer um dêsses três casos, tanto o cien-tista como o administrador poderiam entender-se melhorse avaliassem o uso adequado e a limitação da ciênciaquantitativa.Não quero dizer que o administrador deva ter uma visãopessimista do progresso da ciência social e da pesquisaoperacional. A identificação demorada, paciente, das va-riáveis fundamentais, sua quantificação e o ajustamentoda teoria, levarão, através dos anos à melhor solução dosproblemas, mas devemos ser pacientes e perceber que em-bora estejamos em movimento, há um longo caminhoainda à frente.

Objetividade e Valôres

o cientista luta, acima de tudo, por algo chamado "obje-tividade". Esta consiste na crença de. que sua missão éo estudo paciente e desapaixonado do meio ambiente -dos fatos básicos da natureza e da maneira pela qual osvários fatôres se influenciam mutuamente. O administra-dor profissional também procura objetividade, mas sobcondições diferentes. Por exemplo, a procura da verdadefactual e lógica não é o mais alto objetivo que o governa,quando a oportunidade e resultados da ação são tambémimportantes. Aqui também, diversamente da maioria doscientistas, êle está pronto a entrar arrojadamente em de-bates sôbre questões éticas a ter a pesquisa influenciada,paralisada e modificada por fatôres subjetivos.

Por que o administrador e o advogado se permitem sermais influenciados por considerações morais e éticas doque os cientistas? A resposta, ao que me parece, não temmuito a ver nem com personalidades e tradição, nem coma dimensão do tempo em que êsses homens trabàlham.Na maioria das profissões aquêles que as exercem defron-tam-se imediatamente com os resultados de suas decisões;por isso são naturalmente impelidos a levar em conside-

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ração valôres morais e éticos, juntamente com fatosobjetivos. A título de ilustração:

• O médico, acreditando no valor da vida humana, com-serva o paciente vivo em meio aos sofrimentos.

'. O advogado, acreditando no direito que tôdas as pes-soas têm de ver seu caso apresentado, e defendido, defendeo criminoso.

• O administrador, acreditando na dignidade do indiví-duo, pode abster-se de despedir um operário idoso.

Em contraste, os cientistas não têm de se defrontar comresultados imediatos. Sejam quais forem os frutos de suaspesquisas, só adquirem caráter bom ou mau, decorridos,às vêzes, muitos anos. Aquêles que trabalharam com ateoria "quântica" e cem a relatividade, não sabiam se abomba atômica seria usada em Hiroshima, ou se as usinasde energia atômica seriam construídas para aquecer eiluminar os lares da- humanidade.

Se o progresso da ciência chegasse a tal ponto que umcientista trabalhando no seu laboratório num dia visseos resultados dêsse trabalho aplicados à atividade coti-diana, já no dia seguinte, talvez êle também fôsse obriga-do a incorporar valôres não racionais às suas pesquisas.

CONCLUSÃO

Uma melhor compreensão dos atributos da mentalidadeadministrativa deve estimular o ensino de administraçãoe o treinamento dos administradores. Para o administra-dor no Eeucargo, isso daria significado e,nobreza de obje-tivo às tarefas de realizar coisas por intermédio de pessoas.E ajudaria na cristalização de padrões com os quais oshomens de negócio possam ser comparados.

Como uma pessoa poderá desenvolver as qualidades des-critas neste artigo?

De maneira geral, parece-me que alguém se aproxima doque foi exposto quando pode:

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1) Familiarizar-se com o conhecimento substancial dis-ponível e com as atitudes e predisposições específicas quedistinguem o administrador bem sucedido.

2) Observar os erros que os administradores cometemquando não aplicam essas qualidades.3 ) Experimentar por si pr6prio sucessos e fracassos empresença de seus colegas e superiores.Como método formal de treinamento, a administraçãopode tirar exemplos dos cursos jurídicos.

No desenvolvimento dos atributos da mentalidade legal,os júris simulados e o estudo do precedente foram muitovaliosos nas Faculdades de Direito. Igualmente, no trei-namento da metalidade administrativa, o diálogo socrático,juntamente com hábil ensino da teoria, seriam úteis.' Oestudo de casos é excelente, visto que expõe o administra-dor ou estudante aos três caminhos acima mencionados.

O tipo de exame oral, comumente usado para debate deteses nas escolas superiores, sugere uma espécie de dis-cussão que pode forçar efetivamente o pensamento atravésdo fluxo da ação, criando uma prevenção em relação aoserros, baseada nos fatos e na lógica. Finalmente, os jogosde emprêsa devem ser úteis no desenvolvimento de qua-lidades lógicas, empíricas, bem como qualidades de açãoanteriormente discutidas 11.

Naturalmente, não há nada tão coator, como o exemplodos próprios líderes administrativos em ação. Quantomais puderem demonstrar pessoalmente os atributos damentalidade administrativa, e quanto mais puderem tor-ná-los uma realidade viva, mais significativos serão os es-forços de cada um para aumentar o cabedal de conheci-mentos administrativos.

11) Veja-se Business Games - Pllly 0nB!, G. R. ANDLINGER, H. B. R.,março/abril de 1958, pág. 15; W.hat Çan Business Game DO?I H. B, R.,julho/agÔst9 de 1958, pág, 147,

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