a “libertação de demônios” como cotidianidade: esboço de um estudo etnográfico

Upload: ypuangarcia1079

Post on 07-Mar-2016

11 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Libertação de Demônios

TRANSCRIPT

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    4

    revista de recerca i formaci en antropologia

    A libertao de demnios como cotidianidade:

    esboo de um estudo etnogrfico

    Ypuan Garcia Universidade de So Paulo1

    Resumo

    O objeto deste artigo o conceito nativo de libertao de demnios, tal como se articula em um grupo de catlicos renovados da Regio Oeste da cidade de So

    Paulo, no Brasil. Seu propsito apresentar uma primeira anlise da libertao como cotidianidade, argumentando que as noes nativas de abertura, caminhada e Verdade so centrais para o entendimento das formas pelas quais se evita, diariamente, a cativao por seres malignos. Inicio de uma abordagem

    terica baseada na etnografia e exponho, em seguida, que a ausncia de uma

    reflexo sobre a cotidianidade dos encontros com o mal pode levar

    sobreinterpretao na anlise acerca da libertao.

    Palavras-chave: Libertao, Cotidianidade, Abertura, Caminhada, Verdade

    Abstract

    The object of this article is the native concept of deliverance from demons as articulated in a group of renewed Catholics in the Western Region of the city of So

    Paulo, Brazil. The purpose is to present an initial analysis of deliverance as ordinariness, arguing that native notions of openness, walk and Truth are central to understanding the ways in which the persons daily avoid to be tempted

    by evil beings. I start from the theoretical approach grounded in the ethnography

    and then show that the absence of a reflection on the ordinariness of the

    encounters with the evil can lead to overinterpretation in the analysis about

    deliverance.

    Key words: Deliverance, Ordinariness, Openness, Walk, Truth

    1 Enviar correspondencia a Ypuan Garcia, bolsista da Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So

    Paulo, no endereo eletrnico: [email protected]

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    5

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Introduo:

    Este artigo se prope a debater o argumento oriundo de uma etnografia, ainda se

    fazendo, segundo o qual a libertao2 de demnios, ou cura espiritual

    (doravante, libertao) seria diria3. O delivramento, na teoria nativa, suporia

    basicamente uma necessidade motivada pelas implicaes para os humanos da

    rivalidade entre seres agentivos no-humanos, Deus e o Diabo, que esto no

    mundo. O mal, por isso mesmo, no seria especulado atravs da excepcionalidade,

    mas pela cotidianidade (Veyne 1996). Essa imagem contrape-se fico

    analtica que incide sobre a transcendncia/sacralidade do coletivo e a

    imanncia/profanidade do individual (Csordas 1990; Asad 1993; Bialecki 2011).

    Paul Veyne reala que sobreinterpretar, ao revs da cotidianidade, interpretar

    exageradamente, tornando o exotismo um ponto de partida, uma teoria, que (...)

    2 Preferi traduzir o termo libertao, para o leitor espanhol, inicialmente, como librarse de, em lugar

    de libercion: Librar (verbo transitivo): 1. (Com de) Salvar o preservar alguien de algo que se

    considera difcil, perjudicial o negativo: La influencia de su famlia l libr de la crcel por lo menos

    quince veces. (Gran Diccionario de Uso del Espaol Actual, 2001). No se perde o seu sentido geral na

    teoria nativa: A libertao o ato da pessoa ser livre. s o nome que d para o que acontece () A

    libertao estar sendo liberto de algo: de um vcio, de um trauma, de um demnio.... Em suma, a

    livrana tem a ver com a dissoluo de alguma forma de cativeiro, um desembaraar-se de

    (desembarazarse de). Mais adiante, veremos que a libertao, diferentemente do exorcismo,

    menos a extrao do demnio do que uma maneira de mant-lo afastado, evitar a sua aproximao.

    Avizinho-me, com o desenrolar do texto, da traduo, mais do que perspicaz, que a profa Virginia Fons,

    no Congresso de Antropologia UAB-USP, em abril do ano de 2014, deu ao termo, libercion. Este teria

    a ver com a educao da ateno (Ingold 2001) do humano que se encontrava cativo. Agradeo

    referida profa por ter suscitado tanto a importncia de esclarecer a noo para um pblico no brasileiro

    quanto pelos inmeros comentrios. A escrita, em ampla medida, repercute sua valiosa contribuio e

    generosidade, embora no esteja altura de todas as suas sugestes por causa da incipincia da

    anlise.

    3 Apresento uma abreviao brusca dos dados etnogrficos. As designaes do tipo os nativos dizem...

    ou conforme os nativos... atendem ao esforo deliberado para o funcionamento da economia do

    argumento. As interpolaes das falas nativas, na escrita, so abundantes. As tradues dos textos e

    dos termos, que, na bibliografia, constam no original, so de inteira responsabilidade minha.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    6

    revista de recerca i formaci en antropologia

    consiste em fabricar falsas intensidades (...) Imaginando que a intensidade o

    regime de cruzeiro da cotidianidade, ofuscada pelo brilho do extico (Veyne 1996:

    250-251).

    Pretendo discutir a provvel banalidade (Veyne, 1996) da libertao atravs dos

    conceitos de um coletivo4 de catlicos no-cessacionistas, qual seja, que

    defende a ininterrupo da proliferao dos dons do Esprito Santo mesmo depois

    do perodo apostlico (Bonfim 2012: 54)5. O coletivo com quem estive por sete

    meses, durante os anos de 2013 e de 2014, foi a Misso Eucarstica Crculo do Po

    e os seus afluentes, que so os seguintes: o grupo de orao Santssima Trindade6,

    o mais antigo da regio; a Parquia de Cristo Operrio, onde se realizam as Missas

    de Cura e Libertao7 e os encontros do Grupo de Adorao Eucarstica Crculo do

    Po. O padre Joo conduz ambos. Em um recanto mais afastado, no Bairro da

    Pedra Grande, est a Casa de Acolhimento da Misso Eucarstica Crculo do Po,

    4 O conceito de coletivo um emprstimo de Bruno Latour (2001) e tem como desgnio sublinhar, para

    alm da noo de sociedade, um cosmo habitado por meio das associaes entre humanos e no-

    humanos.

    5 Tendo em perspectiva que algumas das pessoas com quem convivo me pediram para no serem

    identificadas, utilizarei nomes fictcios para humanos, lugares e coletivos com o propsito de preservar

    aquilo que me foi solicitado.

    6 A fundao do grupo remonta a vinte e cinco anos. O grupo integrou a Renovao Carismtica

    Catlica; afastou-se dela; e foi renomeado como Santssima Trindade. A sala em que ocorrem os

    encontros ornada com quadros de imagens de santos, alm de uma pequena capela, protegida por

    portas corredias de madeira, que aberta para as oraes individuais e para a adorao do

    Santssimo, a hstia consagrada no ostensrio. A Misso Eucarstica Crculo do Po possui quatro anos

    e tem aproximadamente 400 missionrios. Dezessete destes, excetuando-se os casados e os solteiros,

    so celibatrios, isto , fizeram votos de castidade, de pobreza e de obedincia.

    7 O que a distancia das missas dirias que o Santssimo levado para a nave da Igreja. O padre

    acompanhado pelo Ministrio de Msica. Cantam-se louvores at que o Esprito Santo seja ativado. O

    sacerdote, ento, comea a enumerar o que est sendo curado e o motivo dos mal-estares,

    ocasionados, por um demnio, um objeto consagrado (uma comida), a ida a lugares em que se

    cultuam divindades no catlicas etc.. A procisso com Jesus Sacramentado o pice da missa,

    momento em que se abenoa todo o tipo de objeto.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    7

    revista de recerca i formaci en antropologia

    destinada a receber irmos de rua, sendo prxima da Casa Feminina, no mesmo

    bairro. A Casa Masculina, no bairro da Pedra Grande, encontra-se interposta Casa

    de Acolhimento8.

    * * *

    Pretendia, inicialmente, estudar a libertao e me baseei no trabalho de Thomas

    J. Csordas (1990, 1994, 2002). A definio primeira da libertao era a seguinte:

    uma modalidade de cura ritual em que a existncia de aflies proporcionadas por

    entidades malignas seria central.

    O desenvolvimento da pesquisa, todavia, me levou a considerar uma mudana no

    sentido daquilo que designara por cura ritual em direo aos seus aspectos

    discursivos9, em lugar de centralizar a anlise de prticas e performances. O acento

    nessas condies procedeu de um tipo de dificuldade que se apresentou ao

    mencionar o substantivo libertao: a maneira como se evita falar dele quando se

    est com algum que vem da universidade. Os nativos receavam que estivesse

    em busca do sensacionalismo, do show, que a acompanha, isto , que a

    confundisse com o que se passa nas denominaes pentecostais. A preocupao

    com o aspecto extravagante do mal seria, em tese, uma projeo da disciplina.

    O equvoco na minha observao levou-me inveno de um impasse que, em

    alguma medida, era a decorrncia da minha pouca intimidade com aquelas

    pessoas. Fiquei paralisado pelo movimento pendular das duas maneiras de tecer

    uma trama persuasiva. A primeira, j mencionada, provinha das referncias a

    Csordas (1994); a segunda remetia a algo que Edward E. Evans-Pritchard (2005)

    8 Os trajetos podem ser feitos a p. A maior distncia percorrida no consome uma hora.

    9 A noo de discurso empregada no sentido daquilo que se diz sobre algo, sem que esse algo esteja

    presente. Redunda de um lugar-comum do trabalho de campo. No o resultado de qualquer orientao

    terica. De certa maneira, evito lanar mo de um conceito que no est, por ora, no meu horizonte

    terico.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    8

    revista de recerca i formaci en antropologia

    se deparara entre os Azande, devido opacidade emprica da feitiaria, uma vez

    que a excrescncia seria constantemente um atributo alheio, do outro (Favret-

    Saada, 1990). Ou bem me atinha s presenas (prtica), ou bem me ligava s

    ausncias (discurso). Nossa tentativa foi escapar da atrao pela extravagncia e

    da decepo pela falta dela.

    O texto subdividido em cinco tpicos, pois desfia aspectos da etnografia que

    trouxeram alguma especificidade para a argumentao. O primeiro a admisso de

    que o aspecto movente da libertao precipitou a reconceptualizao da cura

    ritual, obrigando a fazer uma discusso sobre a nfase dada fenomenologia nos

    processos sade-doena. O segundo descreve a ateno destinada libertao,

    em vez do exorcismo. Em acrscimo, delimita que a libertao opera atravs de

    uma abertura para que o nativo se deixe agenciar pela divindade. O terceiro, uma

    expanso do segundo, aborda, de forma principiante, que a precauo10 o

    aspecto ordinrio da libertao, o que diminui a inquietao inicial da pesquisa

    com a performance e com o ritual. O quarto vai ao encontro do segundo, pois

    insiste que a abertura uma forma especfica de conceptualizar a Verdade, que,

    segundo os nativos, uma pessoa. O quinto esboa que a precauo e a

    Verdade se juntam a um terceiro aspecto da libertao, a caminhada,

    rascunhando, em um esforo deliberado de acopl-los, uma ideao abdutiva11 da

    10 O conceito de precauo no trai as maneiras de estar atento, estar acordado no mundo nativo.

    De preferncia, uma reminiscncia ao Evangelho de Marcos: Vigiai, pois, visto que no sabeis quando

    o senhor da casa voltar, se tarde, se meia-noite, se ao cantar do galo, se pela manh, para que,

    vindo de repente, no vos encontre dormindo (Marcos, 13, 35-36).

    Aps algumas conversas, durante a pesquisa de campo, sobre a precauo, decidi incorpor-la a um

    dos aspectos gerais da libertao. A traduo indica, neste caso, uma traio mnima s ideaes

    nativas. Essa pequena toro foi importante, pois esvaziou, no seio da prpria etnografia, a importncia

    do conceito de ritual.

    11 A incompletude, a parcialidade e o inacabamento da natureza humana (Sahlins, 2004) tornam, por

    dois motivos, uma sequncia ritual da libertao, mesmo que por um esforo deliberado, improvvel

    entre esses cristos. No primeiro, a pessoa, essencialmente, fraca, alm de possuir trs instncias:

    fsica, mental e espiritual. A pessoa concebida enquanto um compsito de mente, corpo e

    esprito, correlatos respectivos da tripartio (Csorda, 1994) da divindade entre o Pai, o Filho e

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    9

    revista de recerca i formaci en antropologia

    livrana abdutiva porque admite que (...) h relaes de comunicao, de

    conexo que ns precisamos tentar identificar (Velho 2007: 328).

    Cabe ressaltar que este artigo no comparar reflexes distintas sobre a

    libertao no cosmo cristo brasileiro, porm suscitar, a partir de uma pesquisa

    em andamento, algumas implicaes tericas para a uma provvel

    conceptualizao da libertao como cotidianidade.

    1. O problema da cura ritual

    Quando iniciei a pesquisa, a definio de antropologia das terapias vinculava-se

    ao modo que a eficcia da cura ritual operaria de maneira decisiva, porque

    concedia uma traduo doena nos termos da relao entre humano e sagrado

    (Lvi-Strauss 1967; Montero 1985; Favret-Saada 1989, 1990; Desjarlais 1992;

    Csordas 1990, 1994, 2004). O acento era na ao transformadora da terapia sobre

    os estados desordenados e confusos caractersticos da aflio (Csordas 1990). A

    reduo que se segue das inmeras teorias dos processos de sade-doena, alm

    de empobrecer o debate, manejada em conformidade com os interesses do texto.

    Por ser um recorte, um exerccio parcial. Daqui alarguei as referncias, pois era

    fundamental situar a importncia destinada ao sujeito no trabalho de Csordas.

    o Esprito Santo. No segundo, se lanssemos mo da temporalidade baseada no ritual, nos veramos s

    voltas com mais um obstculo terico, pois teramos de enfrentar o kairos, o qual denota tanto um

    momento oportuno em que se fixa um compromisso com Deus quanto, segundo Bruno Latour, (...) uma

    alterao da pulsao e do andamento da experincia (...) a palavra que os gregos teriam empregado

    para designar esse sentido novo de urgncia (Latour 2004: 351). O kairos se oporia a qualquer

    ritualizao ou transio ritualstica, porque o movimento do Paracleto imprevisvel: O Vento Santo

    [Esprito Santo] sopra onde quer (...) (Joo, 3, 8). Em sntese, o conceito de pessoa no corresponde

    imediatamente ao divisor entre mente e corpo, e a moo divina no uma ocorrncia antecipvel.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    10

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Paulo C. Alves (2006)12 pontua que uma das principais preocupaes nos estudos

    scio-antropolgicos da sade se relaciona com a emergncia, na dcada de 1980,

    de pesquisas voltadas para a experincia da doena. As anlises partem do enlace

    metodolgico entre hermenutica e fenomenologia, um dos motores principais do

    paradigma do embodiment (Csordas, 1990). Elas criam deliberadamente um

    distanciamento em relao s ditas teorias sistmicas, elaboradas a partir da

    dcada de 1950. Exageram uma diferena para constituir outras.

    Por teorias sistmicas, considero as analogias empregadas com a pretenso de

    explicitar as qualidades socioculturais das enfermidades. A teoria de Talcott Parsons

    foi a primeira grande narrativa sobre o tema. A sade era um pr-requisito

    funcional (Alves 2006: 1548) para a manuteno da estrutura social, ao passo que

    a doena precipitava uma anormalidade que deveria ser corrigida pelo sistema.

    Notemos que a analogia parsoniana era um emprstimo da biologia. A sociedade

    seria, ento, um organismo e seu bom funcionamento dependeria dos papis que

    enfermos e mdicos adotariam com a finalidade de restaurar esse equilbrio. Dito

    de outra forma, as condutas ideais do paciente e do terapeuta preexistiriam s suas

    relaes.

    A dicotomia entre disease (to cure) e illness (to heal)13 foi o produto implcito da

    formulao parsoniana. Ela ampliou o escopo das anlises e gerou um solo frtil

    para a teoria do conflito, uma ramificao da teoria sistmica, que no

    12 A escolha de Alves uma dentre das inmeras possveis, medida que essas coletneas e revises

    tericas so abundantes e funcionam como verbetes acerca do tema (ver Frankenberg, 1980; Langdon,

    1994; Langdon & Fller, 2012).

    13 No dispomos, na lngua portuguesa, de correspondncias etimolgicas para desobscurecer a

    distines entre illness (teoria leiga) e disease (teoria oficial) e seus respectivos pares verbais

    correspondentes, to heal (subjetivao da aflio) e to cure (objetivao da aflio) (sobre

    exposies mais esquemticas e fundacionais dessas distines, ver Kleinman (1978); Lieban (1977);

    Frankenberg (1980)).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    11

    revista de recerca i formaci en antropologia

    questionava a preeminncia cognitiva14 da sociedade, mas as discrepncias pelas

    quais os grupos sociais lidavam com o princpio hegemnico e regulador da

    medicina no mundo ocidental ao revs do sistema leigo. Em geral, a medicina

    continuava a ser vista como um subsistema autocorretivo da sociedade. Soma-se

    teoria do conflito, a propagao, no final da dcada de 1950, de pesquisas

    intituladas de illness behaviour, interessadas no comportamento do doente.

    Esses estudos avanaram internamente com uma diviso que introduz uma

    metade, complementar e inversa, estrutural-coletivista. Esta baseada nas

    variantes etrias e sociais; aquela, nas motivaes individuais (Alves 2006: 1049).

    A totalidade dos pressupostos supracitados agrupou-se, posteriormente, nos

    estudos de representao social da doena. A sociedade era o manancial

    cognitivo, um mapa, que nortearia as interpretaes, a comunicao e as condutas

    que os sujeitos interiorizavam em consonncia com o grupo a que pertenciam

    (Alves 2006: 1550).

    Arthur Kleinman, no nicio da dcada de 1980, estabeleceu a teoria dos modelos

    explicativos. Sups a tripartio dos sistemas de cuidados sade (health care

    systems): o profissional (biomedicina), o folk (a terapia religiosa) e o popular

    (leigos). O ltimo era o principal, porque concentrava a maioria dos saberes e

    prticas em relao ao fenmeno sade e doena (Alves 2006: 1550). Os modelos

    explicativos seriam comparveis entre si, proporo que o saber popular da

    doena era transcultural.

    Embora mantenha o ato de pensar como um corolrio da vida coletiva, a teoria

    dos modelos explicativos concebeu uma fresta para a construo de uma visada

    fenomenolgica da doena por causa da valorizao da experincia da

    enfermidade e da transculturalidade (Alves 2006: 1551), opondo-se teoria

    sistmica. A guinada fenomenolgica auxiliada pela hermenutica. O primeiro

    passo considerar que a teoria representacional produzia explicaes. O segundo

    14 Em suma, no se opunha assero de que a natureza do pensamento indubitavelmente social, o

    que atravessa a antropologia britnica, inspirada na sociologia durkheimiana, e a antropologia norte-

    americana, por meio das asseveraes de Clifford Geertz (Ingold 2000).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    12

    revista de recerca i formaci en antropologia

    passo, baseado na hermenutica, introduz a interpretao de interpretaes, pois

    s o nativo tem acesso em primeira mo sua experincia (Geertz 1989). No

    surpreende que a doena tenha no sistema cultural um nvel de complexidade

    mais abrangente. Cria as possibilidades de comparar transculturalmente os

    sistemas de cuidados sade e de opor a subjetividade objetividade nesses

    sistemas (Alves 2006: 1551).

    Byron J. Good baseado em Clifford Geertz, Peter Berger e Thomas Luckman

    concede estatuto interpretativo doena. A introduo da fenomenologia15 tem a

    ver com um novo resgate do sujeito enquanto locus de agentividade, e, desse

    modo, escapa da perspectiva em que a ao a atualizao da mente coletiva e

    no meramente uma inconstncia da mente individual. Ao e experincia se

    equivalem e resgatam o sensvel, os sentimentos16. O mundo da vida

    (Lebenswelt), do plano perceptivo, uma construo humana. A especulao de

    que a sociedade explica a natureza das relaes, ao contrrio das aparncias,

    ampliada porque os sentimentos so do domnio da cultura, assim como as

    modalidades intersubjetivas do mal-estar, da aflio e da enfermidade. O desenlace

    disto a manuteno da hermenutica, uma tentativa terica de no perder a

    estabilidade da significao. O modelo o da cultura como se fosse um texto (Alves

    2006: 1552; Asad 1993). A doena uma ruptura no campo intersubjetivo, onde o

    outro quase um eu mesmo. No surpreende que o no-eu, o totalmente

    outro, o demnio, (Csordas, 1990), seja, frequentemente, posicionado como uma

    15 O antroplogo norte-americano A. Irving Hallowell, conforme Good (2012), foi quem elaborou uma

    teorizao, no sentido forte, da fenomenologia cultural atravs de suas anlises sobre o meio ambiente

    comportamental do self entre os Ojibwa. As descries de Hallowell contrastavam-se, ressalva Good,

    com as posies racionalistas de seus contemporneos na antropologia britnica. Clifford Geertz (1989)

    seguiu esse deslocamento. Tornou-se o grande proponente da tradio fenomenolgica, no obstante

    uma sociologia fenomenolgica inspirada em Alfred Schutz.

    16 Jack Katz e Thomas J. Csordas (2003) pontuam que a fenomenologia cultural surge no seio da crise

    da representao ou da etnografia inserida no perodo modernista da disciplina. Pode ser definida como

    (...) a preocupao em sintetizar a imediatidade da experincia encorporada (embodied) com a

    multiplicidade do significado cultural em que estamos sempre e inevitavelmente imersos (Csordas

    1994: VII; grifos nossos).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    13

    revista de recerca i formaci en antropologia

    construo cultural para agrupar as perturbaes que so supostamente o

    resultado de um comportamento anti-social17. A libertao, que se refere frao

    espiritual do conceito nativo de pessoa, esvaziada.

    A problematizao da alteridade, da presena de um outro, nos levou a repensar

    a argumentao de Csordas. Ela no avanaria porque o conceito de cultura seria

    relativisticamente empregado, uma vez que ele neutralizaria a perturbao advinda

    de algo central: demnios existem, quer se acredite neles ou no. A discusso da

    existncia desse ser da ordem da Verdade18. A limitao de Csordas pode ser

    delineada, uma vez que o deslocamento do eu origina-se (...) da emoo e do

    comportamento intratveis (...) como interpessoais [intersubjetivos] (Csordas

    1997: 187). Caso fosse por a, acabaria por evocar uma narrativa analtica que

    suscitaria as metforas de ausncia de comunicao/relao em situaes de

    aflio. Ficariam, assim, circunscritas tenso entre processos internos e externos

    (emocionais/sociaisespirituais) dos afligidos.

    No haveria como se desviar das paralisias da explicao social (como funciona,

    denncia dos verdadeiros motivos) e da interpretao cultural (verses alternativas

    de um mesmo mundo). As duas no ajudam a lidar com a libertao e possuem

    como eixo comum inventar um cosmo exclusivamente humano. A retrica

    sociolgica colocaria o demnio na posio de uma representao coletiva da

    pessoa como um repertrio de atributos negativos (Csordas 1994: 185). A

    interpretao cultural conduziria aos processos em que o mal internalizado pelo

    indivduo no sentido csordiano. Nas duas dimenses, atribui-se importncia

    construo e criao de uma realidade humana (Csordas 1994: 165) para o

    sofrimento, codificando-o na cura ritual.

    17 A herana do argumento durkheimiana (Durkheim 1996) e tem uma longa carreira na disciplina

    (Douglas 1970; Berger 1973; Geertz 1989). Ainda assim, se desdobra em monografias mais recentes e

    que abordam, explicitamente, a relao entre representao e emoo (Desjarlais 1993; Csordas

    1994), sendo pensada menos por um divisor radical do que pela evocao de complementaridades

    analticas entre semitica e fenomenologia, por exemplo.

    18 Adiante, voltaremos questo.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    14

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Para finalizar este tpico, vale mencionar que, ao longo da pesquisa, a posio do

    no-eu, do demnio, na libertao, era de um Ele, isto , o ser maligno tinha

    a designao pronominal da terceira pessoa com quem mantm algum tipo de

    conexo, no mnimo, familiar. As sentenas so inmeras: Ele gosta da confuso;

    Ele vai tentar te seduzir; Ele o pai da mentira; Ele te pega na sua fraqueza

    etc.. O mal-estar um momento de ampliao das relaes com um mundo que

    gera valor (Velho 2001: 136).

    No cosmo nativo, a raiva pode se tornar um Esprito de Raiva/dio quando

    excessiva. O que caracteriza um ataque maligno no uma insuficincia relacional,

    mas uma superabundncia desta. Clara, uma missionria bastante requisitada por

    causa da uno das suas oraes, em uma conversa no grupo de orao, chega a

    dizer que

    (...) a raiva ruminada vira dio. O dio se transforma em um esprito e toma

    conta. A raiva momentnea. O dio maquina. V que isso acontece quando

    algum mata a mulher [esposa]. A bulimia e a anorexia so um exemplo. O

    olhar maligno est ali para destruir a pessoa.

    A transformao de um sentimento em um demnio no fixa a sua inexistncia

    inicial, pois Ele est presente19 no dia a dia.

    19 A nomeao dos demnios por emoes, comportamentos e padres negativos de pensamento tem

    trs implicaes: a primeira o discernimento, um dom do Esprito Santo, dos domnios humanos e

    no-humanos do tormento, posto que, em muitas ocasies, como dizem os nativos: do psicolgico da

    pessoa. Amplia, por conseguinte, o alcance da libertao, pois abre a possibilidade da pessoa lanar

    mo da psicoterapia. No observei, entretanto, uma relao direta entre o mal-estar e a nomeao do

    demnio. O esprito de Rancor pode causar dor nas costas. O esprito de adultrio pode levar ao

    alcoolismo e mitomania. A segunda uma limitao imposta pelo demnio, dado que, por sua

    natureza ativa e inteligente, estrategicamente, mantm-se sorrateiro. A falsa aparncia assumida

    intencionalmente o deixa vontade para agir. A terceira que a qualidade da ao do demnio importa

    mais do que o seu nome verdadeiro. H, assim, um demnio que responsvel por investir na luxria.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    15

    revista de recerca i formaci en antropologia

    2. Libertao, e no exorcismo: a questo da abertura

    Poderia estudar o exorcismo, porm, como afirmara o padre Joo, em uma Missa

    de Cura e Libertao, na cidade de Ourinhos/SP: O exorcismo uma beno do

    padre concedida a uma pessoa por meio da aprovao do Bispo. A libertao um

    carisma da comunidade para a comunidade, no uma comunidade estritamente

    humana, mas de vnculos constitudos entre seres com naturezas distintas. Um

    caso de possesso excepcional, uma situao quase mortal, pois ser tomado por

    um demnio tem a ver com a desabitao de si por Deus: A libertao (...) evita a

    necessidade de uma longa investigao psiquitrica e da longa aprovao

    eclesistica que precede o exorcismo (Csordas 1994: 195).

    A importncia atribuda libertao, a pesquisa indica, emprica em relao ao

    exorcismo. Digo emprica porque a libertao conceitualmente junta as peas

    do quebra-cabea (Bateson 2006: 306) de maneira mais extensiva em termos

    etnogrficos, ao passo que o exorcismo teria o efeito contrrio. O aprendizado da

    libertao tem a ver com estar atento quilo que importa para os nativos: Deixar

    Deus trabalhar, mas no h como conter essa laboriosidade. A abertura no

    uma brecha. Nesta o demnio age; naquela, deve-se estar aberto para que

    Jesus faa algo. Os dois ocupam a posio de possveis outros, embora atuem de

    maneira distinta: o demnio, indiscriminadamente; Deus, apenas quando a pessoa

    quer, embora este querer seja algo do corao, que esquenta, trepida, acelera.

    O corao um rgo da vontade, onde, tambm, habita o Esprito Santo.

    A disjuno sugestiva para a argumentao. Permite vislumbrar outra. A

    inimizade cosmolgica, certa vez disse-me uma nativa, no centro da cidade de So

    Paulo/SP, no permite que Jesus compactue com nenhum esprito do mal. Se a

    pessoa fica diante dele na Igreja e est com um esprito [maligno], ele [o demnio]

    tem que sair. O verbo sair no se restringe binariamente ao verbo entrar, isto ,

    sair no corresponde, imediatamente, distino entre interior e exterior, mas

    sair de perto, parar de ficar ali em volta. Uma manifestao, ela continua, pode

    acontecer porque as misturas no se completam, as pessoas vo a vrios

    lugares e depois vm para a Igreja. Ocorre, ento, aquela gritaria porque

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    16

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Jesus passa com vrios anjos, e aquilo que t ali fazendo mal para a pessoa no

    aguenta, manifesta de algum jeito. As misturas so interrompidas, cortadas, no

    momento que ocorre esse choque ou combate, dois substantivos centrais na

    teoria nativa. A incompatibilidade proveniente, entre outras coisas, da

    contaminao, que pode acontecer por meio de um objeto material, de um

    alimento, de uma pessoa. A renncia liberta da contaminao, no obstante haja

    prevenes eficazes que permitem manter o Inimigo afastado, segundo Clara.

    A manifestao, todavia, no o fim ltimo da libertao, mas uma absoro

    momentnea (Veyne 1996: 251), o um pouco (Veyne 1996: 259-265). A

    salvao, em geral, a causa final e torna necessria a renovao [diria] do

    preenchimento pelo bem (Sales 2003: 76). A teoria nativa no produz um chavo

    acerca da libertao, pois a batalha pode acontecer silenciosamente no

    repouso no esprito, na genuflexo, nas lgrimas, olhos, confisso,

    comunho, perdo, louvor, pela boca, ouvidos etc..

    3. Libertao e precauo

    As inmeras situaes propcias para efetuar a libertao, conforme delineado no

    fim do ltimo tpico, alcanam as relaes mais corriqueiras da vida nativa. No

    me esqueo do constrangimento que passei no Ginsio do Ibirapuera, ao ajudar

    Maria, uma missionria solteira. Ela me ofereceu um biscoito, que aceitei. Ao

    devolver o pacote, ela traou o sinal da cruz em si prpria. Aquilo me perturbou.

    Nesse mesmo dia, vi outro nativo fazer o mesmo, to logo lhe ofereceram um

    bombom. No me contive e perguntei do que se tratava: Para descontaminar, o

    mesmo que evitar que se abra uma brecha, dois termos nativos conexos. Naquele

    evento, guloseimas podem estar consagradas20. A pequena precauo adere-se

    a inmeras que so feitas para impedir o comeo de um ataque do Inimigo.

    20 O adjetivo consagrado uma estenografia nativa para inmeros artefatos e pessoas que so

    dotados alguma agncia malfica ou benfica. Consagra-se uma pessoa ao demnio. Consagra-se

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    17

    revista de recerca i formaci en antropologia

    No trnsito, um movimento brusco de outro motorista pode ter como resposta uma

    jaculatria: Passa na frente Maria. Todas as vezes que se sai de casa, a p ou de

    carro, ora-se o Pequeno Exorcismo de So Leo XIII, reza-se o rosrio

    individualmente, com os familiares e para algum ausente. Quando ocorre um

    desentendimento domstico ou no trabalho, canta-se, mesmo que silenciosamente,

    um louvor. Ora-se, sem rancor, por algum, pois do contrrio a prece no tem

    efeito. Pede-se perdo a algum mesmo que no haja motivo aparente para tal.

    Se ocorrer um pesadelo, reza-se um Pai Nosso ou se l um salmo. Repete-se,

    com frequncia, nos louvores, que a divindade, na Consagrao Nossa Senhora,

    torne-se a proprietria do fiel, dos seus ouvidos, boca, olhos, do pensar, do

    falar etc.. Tornar-se precaucionado um elemento recorrente e habitual (Veyne

    1996) da libertao.

    No Retiro de Carnaval, da Misso Eucarstica Crculo do Po, j no ano de 2014,

    reencontrei-me com Paulo, que sentia dores do corpo e dormncia toda vez que

    ficava na presena do ostensrio com Jesus Sacramentado. Poucos meses antes,

    ele me contara que o abatimento era uma decorrncia de sua passagem por outras

    religies, tais como o Candombl, a Umbanda e o Espiritismo. Paulo no tem

    dificuldade em salientar que

    o cara que no vive, que no est na uno, vivendo as coisas de Deus, o

    seu corpo no vai estar imune s coisas de l. Pode ter certeza. Se voc no

    vive as coisas de Deus, no est em comunho, o seu corpo t aberto para

    Ele [o demnio] tumultuar. De alguma forma, voc vai sentir. Isso, a, eu vi

    bem claro quando larguei as coisas.

    Por esse motivo, ele se refugiava quando Jesus estava presente no ostensrio. No

    Retiro sobredito, Paulo ressalta que o estreitamento da sua relao com a divindade

    uma pessoa a Deus. Consagra-se o po e vinho na Eucaristia, assim como se consagra um

    brigadeiro para enfeitiar algum. Em muitas ocasies, contudo, a pessoa no sabe que algo dado,

    ofertado, consagrado. Clara, aps as oraes na capela, vira que uma pessoa, presente no grupo,

    estava muito contaminada porque procurara o espiritismo vrias vezes. Outra foi contaminada porque

    aceitou um sorvete, daqueles de bola, que vem no copinho. Estava preparado [consagrado].

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    18

    revista de recerca i formaci en antropologia

    no o fim, mas intensifica a inquietao do Caador, uma das alcunhas do

    demnio, que ataca principalmente aqueles que ficam mais prximos de Deus:

    Quanto mais entrega Eu [o demnio] ver, mais caa vai ter.

    Essas palavras de Paulo so ditas no momento em que parece mais confiante. No

    demora que desfie o nvel de precauo com o qual se refere s suas agonias:

    Muitas das vezes, o que Ele [o demnio] faz para te confundir? Quando voc acha

    que a sua dor fsica, ele que est cutucando. A questo como diferenciar, o

    que no lhe passa despercebido:

    (...) eu tenho que distinguir com orao (...) Se voc sabe que uma coisa

    espiritual, se entregue em orao porque voc vai sentir que o negcio vai

    embora. Se partir, voc sabe que espiritual. Quando voc sabe que fsico,

    quando ela persiste em voc (...) Hoje, de manh, eu estava passando mal

    porque eu no tinha me alimentado. Eu comi o po (...) No me fez bem.

    Estava at com tontura (...) Eu fui na padaria, fiz [pedi] um suco de morango

    com leite e comi duas coxinhas. Na hora, passou. Eu poderia achar que era

    espiritual, mas, no, era fsico. Eu no tinha me alimentado bem e era

    realmente isso (...) s vezes, no . s vezes, estou alimentado bem, e Ele

    vem e ataca.

    A libertao acontece continuamente, pois reanima a intimidade com a divindade

    crist. A teraputica nativa parece exibir aqui sua forma mais rotineira. Isso se

    daria naquela abertura para que Deus trabalhe. A salubridade espiritual no

    procede, na maioria das vezes, de uma ocasio especial, do que se chama na

    literatura antropolgica, classicamente, da performance de um ritual (Turner 1974),

    mas do desenvolvimento de habilidades21 (Ingold 2000) precaucionais

    aprendidas por meio do envolvimento contnuo com o mundo.

    21 Os conceitos de embodiment (1990) e de enskilment (Ingold 1993, 2000) so distintos. O primeiro

    opera, exclusivamente, em um meio ambiente cultural, enquanto o segundo abrange os constituintes

    humanos e no-humanos do meio ambiente (sobre a discordncia de Ingold quanto ao embodiment, ver

    Ingold 2000: pp. 170-171).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    19

    revista de recerca i formaci en antropologia

    4. Libertao e Verdade

    As precaues so postas em movimento atravs do relacionamento com a

    divindade. No se deve negligenciar, portanto, aquilo que aparenta ser um dos

    problemas centrais da libertao, da cura espiritual. Ouve-se com frequncia no

    campo que a Verdade uma pessoa22 e que a Verdade liberta. Ypuan, isso

    bvio para quem cr23. A pessoa o prprio Jesus Cristo, o Cordeiro imolado,

    consumido diariamente na missa. Conferir alguma ateno aos dois enunciados

    enreda-nos em proposies que no so redutveis forma proposicional

    corriqueira, norma de coerncia. Exagero intencionalmente a diferena. preciso

    assinalar que no so assimilveis a no-contradio24.

    Ao decompor apenas o primeiro enunciado predicativo, devido presena do

    copulativo ser, flexionado como , deparamo-nos com a juno, desde sempre

    contra-intuitiva, em termos representacionais (cognitivistas25), porque no coloca

    alguma conformidade entre sujeito e predicado. Em outras palavras, coloca a

    22 O Evangelho de Joo acionado de forma visceral: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ningum

    vem ao Pai, seno por mim (Joo, 14, 6). Em todo caso, as consideraes sobre a Bblia Sagrada

    podem ser exibidas de maneira diferencial, nem sempre to intensamente vida cotidiana (Bonfim 2012).

    23 A crena no um conceito do antroplogo, tampouco uma razo de segunda classe, desqualificvel

    (Latour, 2004), mas sim inalcanvel pela razo, conforme a teoria nativa.

    24 Enfim, no articulvel por meio do princpio da identidade porque rene juzos dspares que esto

    diludos nos enunciados nativos: Jesus livre na cruz; Ser livre ser obediente; O mal uma

    pessoa etc..

    25 Pascal Boyer entende que os conceitos religiosos transgridem as determinaes do conhecimento

    intuitivo, sendo, ento, contra-intutivos. Opem-se a expectativas intuitivas desenvolvidas desde a

    infncia - tais como a estabilidade das distines entre plantas, animais e pessoas - porque misturam as

    qualidades inerentes a cada um desses seres: espritos, ento, podem ser materializados, os objetos

    materiais espiritualizados, os animais podem comportar-se como pessoas etc. (Boyer 2001: 57-

    60).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    20

    revista de recerca i formaci en antropologia

    pessoa como atribuio da Verdade. Dizer que se cr, ou no, um trusmo que

    chega a ofender os nativos. A Verdade uma verdade necessria, em lugar de

    uma verdade contingente. A primeira no pode ser diferente do que , qual seja,

    no depende da nossa vontade. A segunda pode ser diferente do que (Holbraad

    2003). A etnografia acirrou uma questo que no esperava confrontar. A

    libertao seria, entre os missionrios, um encontro pessoal com a Verdade, os

    passos no caminho da Verdade.

    O ceticismo do antroplogo embota as prticas descritivas dos nativos (Holbraad

    2003), o que as torna intimidantes quando o par verdade/mentira encontra-se em

    seres que no so humanos: Deus, Jesus Cristo, o Esprito Santo, os anjos, os

    Santos, o Diabo, os demnios etc.26. A questo no pode ser neutralizada por meio

    de uma argumentao moral, racionalizadora e tica (Mariz 1997). Tentaremos nos

    afastar dela. O conceito nativo de verdade seria irredutvel razo, enquanto uma

    pretenso de explicar aquilo que inexplicvel ou infinito, o que no foi, o que

    no ser, mas o que , tal como repetido pelo padre Joo. A libertao diz algo

    sobre conceitos, (...) descries de processos de conhecimento (Bateson 2006:

    306).

    A Verdade aparece com um aspecto relacional, j que se defronta continuamente

    com a mentira. Carlos Roberto F. Nogueira, no por acaso, recorda que o Livro

    de J (...) coloca o grande problema do mal e da dvida (Nogueira 1987: 16). A

    dvida e a desconfiana so estados aflitivos que os nativos narram com

    26 No trabalho de campo, a referncia ao demnio no se circunscreve imoralidade, mas a toma como

    aspecto secundrio. A matriz a disputa, ao redor da humanidade, que se desenrola entre os dois seres.

    Lembro-me que a primeira pregao que ouvi no Santssima Trindade tinha o seguinte tema: A Verdade

    que liberta, sendo iniciada por Dora, uma nativa de outra Comunidade, a partir do Evangelho de

    Joo:conhecereis a verdade, e a verdade vos livrar (...) Em verdade, em verdade vos digo: todo

    homem que se entre ao pecado seu escravo. Ora o escravo no fica em casa para sempre, mas o filho

    sim, fica para sempre. Se, portanto, o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres (...) Vs tendes

    como pai o demnio e quereis fazer os desejos de vosso pai. Ele foi homicida desde o princpio e no

    permaneceu na verdade, porque a verdade no est nele. Quando diz a mentira, fala do que lhe

    prprio, porque mentiroso e pai da mentira (Joo, 8, 32, 34-36, 44).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    21

    revista de recerca i formaci en antropologia

    frequncia quer quando so atormentados por algo na famlia, no trabalho, nas

    relaes sentimentais, quer quando so vtimas de alguma fatalidade. O incio e a

    persistncia de uma atribulao so ocasies privilegiadas para que o nativo

    questione Deus. O desafio confiar na Verdade em meio dor 27.

    A queixa e o murmrio so ocasies usuais para a ao demonaca. Deus se

    torna o culpado pelo infortnio. Abrem-se brechas para o ressentimento e

    para o afastamento: O que o encardido quer que as pessoas sintam raiva de

    Deus [da Verdade] e das outras. A raiva uma cilada do encardido: Ele ataca

    onde no h o perdo, lembra Clara. O distanciamento, nesse caso, da ordem do

    caminho que se trilha. A querela Deus e o Diabo criaria uma multiplicao

    inevitvel dos caminhos que algum seguiria.

    5. Libertao, caminhada e cativeiro

    Alm da Verdade e da precauo, h, por assim dizer, outro aspecto da

    libertao: a caminhada, uma noo crist que vincula um deslocamento que se

    propaga nos atos de seguir, de dar um passo, de carregar a sua cruz,

    encontrar, retornar etc.. Caminhar precipita a necessidade de escapar do

    cativeiro.

    Se a libertao tem uma relao intensa com o caminhar, as maneiras

    derivadas dela requerem uma educao. A Verdade, entre os nativos, um ser

    com quem se caminha pelas ruas do centro de So Paulo/SP, durante a procisso

    de Corpus Christi, que caminha pela nave da igreja, que se segue, do qual se

    alimenta, de quem se amigo etc.. Da a importncia terica atribuda a um

    27 No demasiado recordar que Otvio Velho (2007) atentara que, na travessia do deserto, o povo se

    mostrava ressentido e lembrava (...) do peixe que comamos no Egito, dos pepinos, dos meles, das

    verduras, das cebolas e dos alhos. Agora estamos definhando. Privados de tudo; nossos olhos nada

    vem seno este man! (Nmero, 11, 5-6 apud Velho: 109, n. 4).

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    22

    revista de recerca i formaci en antropologia

    modo de conhecimento, no qual as peas so juntadas de forma que se

    precaucione contra o cativeiro e a escravido. As ciladas demnio impedem

    a existncia de coisas que nada fazem (Latour 2001)28. A aposta na imanncia

    dos objetos sublinha a importncia que as formas materiais assumem a ponto de

    fazerem divindades e espritos malignos circularem pelo mundo (Robbins 2011:

    24). O aspecto sensorial da verdade pem em relao pensamentos, artefatos

    materiais, coincidncias, pessoas, imagens, seres espirituais etc.. Todos podem

    produzir efeitos uns sobre os outros etc..

    Tornar-se oprimido pelo demnio, nas especulaes nativas, ceder tentao.

    Ocorre um desgarre e se capturado. Passa-se da condio de ovelha para a

    condio de escravo29. Afasta-se do caminho. O apresamento se d pela

    seduo, pela cativao. Um aspecto fundamental acerca do demnio o

    reconhecimento da sua astcia, da sua habilidade, para conhecer a fraqueza da

    pessoa. Ele age naquilo que pode abrir uma brecha no cativado.

    Uma das questes fundamentais da libertao e da captura pelo demnio que

    as duas so ordem do caminhar, uma coisa geral da vida: do que se faz com os

    ps, com ouvidos, com a boca, com os olhos, com as mos, com o nariz. Um

    nativo, em uma animada conversa na Casa Masculina, fez a seguinte exposio:

    Eu gosto de tnis e vejo tnis bonitos todos os dias. O demnio sabe que gosto do

    tnis. Ele vai me fazer ver os tnis. Posso ver, mas se no consigo parar de pensar,

    ele comea a me atacar. A, eu posso fazer de tudo para ter aquilo. O demnio,

    por conseguinte, ele acrescenta, sempre se apresenta de uma forma sedutora,

    pois se mostrasse como Ele , de verdade, ningum ia se aproximar Dele.

    28 Para o leitor mais atento, a juntura de Ingold e Latour pode parecer forosa e descuidada. Ingold

    (2007, 2008), apesar da sua crtica teoria do ator-rede (Jones, 2002), chega a sublinhar que ambos

    esto seguindo questes que sugerem mais aproximaes do que diferenas radicais, as quais no

    impediriam de coloc-los em uma mesma composio.

    29 A ao maligna possui uma sucesso especfica para escravizar: seduz, ou cativa, aprisiona, ou

    escraviza e, por fim, destri a pessoa.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    23

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Otvio Velho destacou que as tentativas dos pesquisadores para descobrir, no

    caso do campesinato, o que , afinal, cativeiro ordenaram uma cesura pela qual

    se percebiam os informantes vivendo com extremado realismo, ao passo que os

    analistas, por sua vez, buscavam uma chave analgica explicativa que permitisse

    sua traduo (Velho 2007: 105). A explicao, por conseguinte, suprimiu um

    fenmeno que terminou por ser associado expropriao e proletarizao na

    Amaznia Oriental (Velho, 2007: 105).

    O cativeiro, nas palavras de Velho, emanaria da escravido histrica ocorrida no

    Brasil, porm haveria uma cosmologia que mobilizaria essa noo, atravs de uma

    cultura bblica em um sentido forte, atingindo um nvel de atitudes profundas

    (Velho 2007: 106). Velho nota que, (...) desde pelo menos o xodo, o

    deslocamento representa uma fuga ao cativeiro (2007: 120). A escravido

    consiste, entre os missionrios, em no se libertar daquilo que se v e julga.

    Tornar-se escravo das coisas do mundo. O cativeiro, a escravido, um

    problema do mal que est presente nas relaes nativas com o caminho, a

    fuga, as pedras, os espinhos, a tortuosidade, a queda, a Cruz que deve

    ser carregada, a peregrinao, o tropeo, as idas e vindas.

    * * *

    A vivificao da Verdade no ato de caminhar e a precauo, enquanto se

    desloca, exigem, talvez, outra maneira de analisar a libertao. Devemos

    considerar que caminhar, fugir do cativeiro, no se faz na ordem da

    excepcionalidade. O envolvimento perceptivo imediato a forma que o demnio

    toma, onde ele se revela-oculta. A pessoa aprende a educar a ateno, uma

    educao do sensorial (Gibson apud Ingold 2000: 21-22) para as Suas [do

    maligno] armadilhas. Quem de caminhada, que j caminha h muito tempo,

    detecta os rastros sutis deixados pelo demnio no plano da cotidianidade. A

    probabilidade de evitar o cativeiro aumenta e limita a sobreinterpretao do

    analista.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    24

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Bibliografia

    Alves, Paulo C. (2006). A fenomenologia e as abordagens sistmicas nos estudos scio-antropolgicos da doena: breve reviso crtica. Cadernos de Sade Pblica, vol.22, no. 8, pp. 1547-1554.

    Asad, Talal (1993). Towards a genealogy of the concept of ritual. In: Asad, Talal Genealogies of Religion: Discipline and Reasons of Power in Christianity and Islam.

    Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press, pp. 55-82.

    Bateson, Gregory (2006) Eplogo de 1958. In: Bateson, Gregory. Naven: um esboo dos problemas sugeridos por um retrato compsito, realizado a partir de

    trs perspectivas, da cultura de uma tribo da Nova Guin. So Paulo: Editora da

    Universidade de So Paulo, pp. 305-323.

    Berger, Peter & Luckmann, Thomas (1973). A Construo social da realidade:

    tratado de sociologia do conhecimento. Petrpolis: Vozes.

    Bialecki, Jon (2011). Quiet deliverances. In: Lindhardt, Martin. Practicing The Faith: The Ritual Life of Pentecostal-Charismatic Christians. New York/Oxford:

    Berghan Books, pp. 249-276.

    Bonfim, Evandro (2012). A Cano Nova: Circulao de dons, mensagens e pessoas

    espirituais em uma comunidade carismtica. Tese de Doutorado em Antropologia

    Social. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Museu Nacional, Rio de Janeiro.

    Boyer, Pascal (2001). Cultural inheritance tracks and cognitive predispositions: the example of religious concepts. In: Whitehouse, Harvey (ed.). The debated mind: evolutionary psychology versus ethnography. Oxford/New York: Berg, pp. 57-89.

    Csordas, Thomas J. (1990). Embodiment as a paradigm for anthropology. In: Ethos, vol. 18, no. 1, March, pp. 5-47.

    -(1994). The sacred self: a cultural phenomenology of charismatic healing.

    Berkeley: University of California Press.

    -(2002). Somatic modes of attention. Body/meaning/healing. New York: Palgrave Macmillan, pp. 241-259.

    -(2004) Asymptote of the ineffable: embodiment, alterity, and the theory of religion. In: Current Anthropology, vol. 45, no. 2, pp. 163-185

    Douglas, Mary (1970). The two bodies. In: Douglas, Mary. Natural symbols: explorations in cosmology. London: Barrie & Rockliff: The Cresset Press, pp. 65-81.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    25

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Durkheim, mile (1996). As formas elementares da vida religiosa: o sistema

    totmico na Austrlia. So Paulo: Martins Fontes, 1996.

    Evans-Pritchard, Edward E. (2005). Bruxaria, Orculos e Magia entre os Azande.

    Rio de Janeiro, Zahar.

    Favret-Saada, Jeanne (1989). Unbewitching as Therapy. American Ethnologist, 16 (1), pp. 40-56.

    -tre Affect (1990). Gradhiva. Revue dHistoire et dArchives de lAnthropologie, no. 8, 3, pp. 3-9.

    Frankenberg, Ronald (1980). Medical Anthropology and Development: A Theoretical Perspective. Social Science and Medicine, pp. 197-207.

    Good, Byron J. (2012). Phenomenology, Psychoanalysis, and Subjectivity in Java. Ethos, vol. 40(1), pp. 2436.

    Holbraad, Martin (2003). Estimando a Necessidade: os orculos de If e a verdade

    em Havana. Mana, 9 (2), pp. 39-77.

    Ingold, Tim (2000). Culture, nature, environment: steps to an ecology of life. In: Ingold, Tim. The perception of the environment: essays in livelihood, dwelling and

    skill. London: Routledge, pp.13-26.

    -(2001). From transmission of representantions to the education of attention. In: Whitehouse, Harvey (ed.). The debated mind: evolutionary psychology versus

    ethnography. Oxford/New York: Berg, 2001, pp. 113-153.

    -(2005). Jornada ao longo de um caminho de vida mapas, descobridor-caminho e navegao. Religio e Sociedade, 25 (1), pp. 76-110.

    -(2007). Up, across and along. In: Ingold, Tim. Lines: a brief history. London: Routledge, pp. 72-103.

    -(2008). Bindings against boundaries: entanglements of life in an open world, Environment and Planning A, 40 (8), pp. 17961810.

    Jones, Andrew (2002). From the perception of archaeology to the anthropology of perception: an interview with Tim Ingold. Journal of Social Archaeology, vol. 3 (1), pp. 5-22.

    Katz, Jack & Csordas, Thomas J. (2003). Phenomenological ethnography in sociology and anthropology. In: Ethnography, 4 (3), 2003, pp. 275-288.

    Kleinman, Arthur (1978). Concepts and a Model for the Comparison of Medical Systems as Cultural Systems. Social Science and Medicine, 12, pp. 85-93.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    26

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Leiban, Richard W. (1997). The Field of Medical Anthropology. In: Landy, David (ed..). Culture, Medicin and Disease. New York: MacMillan, pp. 13-31.

    Latour, Bruno (2001). A esperana de Pandora: ensaios sobre a realidade dos

    estudos cientficos. Bauru, SP: EDUSC.

    -(2004). No congelars a imagem, ou: como no desentender o debate cincia-

    religio. Mana, 10 (2), pp. 349-375.

    Langdon, Esther J.. (1994). Langdon, Breve Histrico da Antropologia de Sade In A Negociao do Oculto: Xamanismo, Famlia e Medicina entre os Siona no

    Contexto Pluri-tnico. Trabalho apresentado para o Concurso de Professor Titular

    na UFSC.

    Langdon. Esther J. & Follr, Maj-Lis (2012). Anthropology of Health in Brazil: A Border Discourse. Medical Anthropology: Cross-Cultural Studies in Health and Illness, 31 (1), pp. 4-28.

    Lvi-Strauss, Claude (1967). Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro: Tempo

    Brasileiro.

    Mariz, Ceclia L. (1997). O demnio e os pentecostais no Brasil. In: Birman,

    Patrcia; Novaes, Regina & Crespo, Samira (orgs.). O mal brasileira. Rio de

    Janeiro: EdUERJ, pp. 45-61.

    Montero, Paula (1985). Da doena desordem: a cura mgica na Umbanda. Rio de

    Janeiro: Graal.

    Nogueira, Carlos R. F. (1987). O Diabo no Imaginrio Cristo. So Paulo: Editora

    tica, 1987.

    Robbins, Joel (2011). Transcendncia e Antropologia do Cristianismo: Linguagem,

    mudana e individualismo. Religio e Sociedade, 31(1), pp. 11-31.

    Sahlins, Marshal (2004). A tristeza da doura, ou a antropologia nativa da

    cosmologia ocidental. In: Sahlins, Marshal. Cultura na prtica. Rio de Janeiro:

    Editora da UFRJ.

    Sales, Llian (2003). Ou quente, ou frio, seno vomitar-te-ei: um estudo das

    prticas rituais da Renovao Carismtica Catlica. Dissertao de Mestrado. So

    Paulo: FFLCH/USP.

    Turner, Victor W. (1974). O processo ritual: Estrutura e Anti-Estrutura. Petrpolis,

    RJ: Ed. Vozes.

  • perifria

    Nmero 19 (1), Juny 2014

    revistes.uab.cat/periferia

    27

    revista de recerca i formaci en antropologia

    Velho, Otvio (2001). De Bateson a Ingold: Passos na Constituio de um Paradigma Ecolgico. Mana, 11 (1), pp. 297-310.

    -(2007). Mais Realistas do que o Rei: Ocidentalismo, Religio e Modernidades

    Alternativas. Rio de Janeiro: Topbooks, 2007.

    Veyne, Paul (1996). LInterpretation et LInterprte. A propos des Choses de La Religion. Enquet, 3, pp. 241-272.

    Documentos:

    Bblia Sagrada Ave Maria: edio de estudos (2011). So Paulo: Editora Ave-Maria,

    1o Edio.