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A LEITURA COMO PROCESSO DE COMPREENSÃO E

CONSTRUÇÃO SOCIAL

OLIVEIRA, Eunice de1

JOANILHO, Mariângela Peccioli Galli2

Resumo

Este artigo apresenta os resultados alcançados de uma produção didático-

metodológica do projeto de intervenção denominado “A leitura como processo de compreensão e construção social”; tem portanto, o propósito de concluir os estudos

referentes ao PDE 2010. Deste estudo, cujo enfoco fundamental é a busca de novas estratégias para o incentivo e aperfeiçoamento da leitura, infere-se a metodologia orientada pela pedagogia histórico-crítica, cujos conteúdos são trabalhados de forma

contextualizada. Desta maneira, o trabalho sucede utilizando o texto literário como material de estudo, visando o conto, com o intuito de sensibilizar o educando,

estimular a imaginação, a capacidade de reflexão assim como tornar a leitura uma prática prazerosa e, a partir dela, aprender a produzir significados levando a um conhecimento maior que propicie de fato a transformação dos sujeitos envolvidos,

sendo estes, alunos do primeiro ano do Ensino Médio, leitores em formação.

Palavras-chave: leitura; interação; sujeito; discurso; aprendizagem.

1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste artigo é expor os resultados de uma experiência realizada por meio

de uma proposta de trabalho na qual a leitura é vista como um ato dialógico, interlocutivo, envolvendo os acontecimentos sociais, a política, a economia, a

ideologia de determinado momento. Logo, se faz necessário alternativas que possibilitem aos alunos a superação das dificuldades, abrangendo movimentos de leitura que visem o domínio da língua, para que o educando possa atuar na

sociedade com mais segurança e interagir com a diversidade de elocução nos diferentes suportes.

1 Professora de Língua Portuguesa graduada na Universidade Estadual de Londrina (UEL), pós

graduada em Metodologia e Didática em Ensino Superior e Gestão Escolar e participante do Programa de Desenvolvimento da Educação do Paraná – PDE, 2010. E-mail:<[email protected]> 2 Professora Drº Orientadora IES (Instituto de Ensino Superior) UEL (Universidade Estadual de

Londrina).E-mail <.

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Compreender a linguagem como interação é considerá-la em funcionamento

em distintas situações, sujeita a códigos sociais a partir dos quais os interlocutores

obrigatoriamente são coprodutores de sentido. Sendo assim é competência da

escola aprimorar a capacidade leitora e discursiva do aluno, conforme afirma Silva

(2002, p. 07):

A qualificação e a capacitação contínua dos leitores ao longo das séries escolares colocam-se como uma garantia de acesso ao saber sistematizado, aos conteúdos do conhecimento que a escola tem de tornar

disponíveis aos estudantes.

No entanto, percebemos que o trabalho tradicional que vem sendo realizado

na escola, no que se refere à leitura não está garantindo a formação deste aluno

leitor, pois cada vez mais se percebe o afastamento e o desinteresse do aluno pela

leitura, impedindo a escola de cumprir a sua função. Desta maneira, surge uma

questão: Que estratégias são eficazes para despertar no aluno o gosto pela leitura,

assim como levá-lo a perceber sua importância para a formação individual e para a

aquisição de novos conhecimentos?

A partir desta reflexão é possível chegar ao entendimento de que o papel do

professor é buscar renovações no ensino de língua, repensar os objetivos de tal

ensino e adotar novas práticas em sala de aula conforme variem a finalidade

pretendida com a leitura. Neste sentido, justifica-se o trabalho de leitura com contos

literários, objetivando suscitar no educando o prazer em ler, transformando a

obrigação em prática social, fazendo uso da língua em real situação de uso por meio

de atividades que valorizem a compreensão, interpretação, produção de textos e

análise linguística.

As atividades que compõem a produção referente ao projeto de intervenção

pedagógica foram determinadas a partir de estudos realizados recentemente cujos

“conteúdos são sempre uma produção histórica de como os homens conduzem sua

vida nas relações sociais de trabalho em cada modo de produção” (Gasparin, 2003,

p.2), proposta esta que será explicitada brevemente, assim como a concepção de

leitura e a sua relação com o gênero escolhido, o conto literário. Serão destacados

também os resultados alcançados por meio do emprego dos pressupostos teóricos

ponderados na ordenação das ações e nas considerações finais deste trabalho.

1.1 Concepção de leitura, texto/contexto e ensino

3

O ensino da leitura na escola continua sendo um assunto iminente e

necessário, é possível perceber isto através dos resultados negativos em provas

educacionais e exames que constantemente são mostrados. Ser um bom leitor trata-

se do sujeito que compreende o que o texto diz, ou seja, o que está escrito, e o que

está implícito, não está na margem do texto, mas faz parte de sua significação.

Sendo assim não basta apenas decodificar o texto, apreender somente o sentido

existente nele, é necessário perceber que outros sentidos são viáveis, desde que

sejam significativos para o contexto.

Conforme afirma Orlandi (2004, p.12) “o(s) sentido(s) de um texto está (ão)

determinado(s) pela posição que ocupam aqueles que o produzem” (os que emitem

e o leem). Para garantir a prática de leitura entre nossos alunos, é necessário que

sejam oferecidos a eles, leitores em formação, livros próximos de sua realidade e

que trabalhem questões expressivas, pois a familiaridade do leitor com o texto é o

que gera predisposição para a leitura, independentemente de ser uma leitura

informativa ou recreativa o interesse pela leitura exerce papel favorável ao texto,

tornando a leitura um ato espontâneo e estimulante, quebrando o sentido da

obrigatoriedade e transformando-a em verdadeiros momentos de prazer.

Vale ressaltar, no entanto, que o ato de ler não está obrigatoriamente

vinculado ao prazer momentâneo, tido como satisfação ou divertimento, pois alguns

fatores relativamente importantes interferem na produção da leitura, como: as

condições em que ela acontece e a forma de como o sujeito-leitor está inserido na

sociedade.

Neste sentido, ler pode ser algo complexo, que demanda esforço mental, é

extrair e ao mesmo tempo atribuir significados ao texto, é ativar conhecimentos

prévios a fim de promover a compreensão, então, para que esta ocorra de fato é

necessário que haja certa relação do indivíduo com a história e com a cultura, uma

vez que a leitura envolve saberes acumulados ao longo da vida.

Todavia, a leitura pode tornar-se interessante e prazerosa, à medida que for sendo

orientada por novas práticas no contexto escolar, com o propósito de fruição

significativa do texto, levando à reflexão e à produção de novos significados, este foi

o nosso intuito neste plano de trabalho. No entanto é necessário abolir determinados

comportamentos rotineiros no que se refere à leitura: pretexto para se ensinar a

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língua culta, aspectos gramaticais, exercício de interpretação (respostas contidas no

texto) e outros, que pouco contribuem para o desenvolvimento intelectual do aluno.

De acordo com a DCE (2008, p.53), “..o estudante precisa conhecer e

ampliar o uso dos registros socialmente valorizados da língua , como a norma

culta....Contudo, a escola não pode trabalhar só com a norma culta, porque não

seria democrática, seria a - histórica e elitista ¨.

Objetivando então a transformação dos alunos-leitores para melhor interagir

na sociedade na qual estão inseridos, faz-se necessário uma metodologia inovadora, que se propõe a ensinar e a criar condições para que haja melhoria na produção da leitura, pois a maioria dos nossos alunos, hoje,

não são capazes de ler, ou seja, a escolarização, no caso da nossa sociedade, não está levando à formação de leitores e produtores de textos eficazes.

Convém salientar que, de acordo com as DCE (2008, p. 4):

Mesmo vivendo numa época denominada “era da informação”, a qual possibilita acesso rápido à leitura de uma gama imensurável de informações, convivemos com o índice crescente de analfabetismo

funcional, e os resultados das avaliações educacionais revelam baixo desempenho do aluno em relação à compreensão dos textos que lê.

É preciso esclarecer que o analfabeto funcional é aquele indivíduo que

passou vários anos de sua vida nos bancos escolares, e não lhe foi dada a condição

de ascensão na sociedade, pois este se sente incapaz de interagir e participar

ativamente no processo social. A conclusão que podemos chegar diante do exposto

acima é que a leitura cotidiana, na escola, de textos diversificados, é um valioso

instrumento na busca de sanar tal dificuldade, e que a escola, da maneira como

está, não fornece requisitos para solucionar este problema.

Há de se entender que tal fato vem ocorrendo devido ao artificialismo com

que a leitura é trabalhada em sala de aula, privilegiando a prática mecânica e sem

sentido, desconsiderando a experiência que a criança traz do seu cotidiano, sendo

que a construção da aprendizagem da leitura como função social acontece quando

existe um contexto que, além de fornecer informações específicas, também motiva e

dá sentido à leitura.

Desta maneira, um aspecto importante a ser colocado e que remete a

compreensão de textos é a relevância do contexto, levando em consideração o leitor

ativo, na concepção interacional da língua, na qual, segundo Koch (1997) os sujeitos

são vistos como atores/construtores sociais e o texto o próprio lugar da interação,

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sendo assim para que a compreensão se realize é indispensável a mobilização de

um conjunto de saberes e sua reconstrução no interior do evento comunicativo.

Afirma Koch (1997, p.17):

O sentido de um texto é, portanto, construído na interação texto-sujeito (ou texto-co-enunciadores) e não algo que preexista a essa interação. Sendo a língua vista como algo incompleto, o contexto permite completar os vazios

deixados pelo texto, assim como modificá-lo ou justificá-lo. É necessário, no entanto, atentar para a escolha apropriada do contexto, a fim de dar a significação adequada ao texto em estudo, uma vez que o próprio texto

fornece pistas para a depreensão da significação esperada pelo autor.

Ainda assegura Koch (1997, p.31):

Postula-se que os interactantes desenvolvem estratégias para o processamento eficaz do texto e para a seleção apropriada do contexto, em

particular. A investigação de tais estratégias, sem dúvida, traz subsídios, importantes quer para a produção, quer para a compreensão de textos.

Conforme as DCE: Ao ler, o indivíduo busca as suas experiências, os seus

conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as várias

vozes que o constituem (DCE, 2008, p.56). Neste dado momento o indivíduo

necessita mobilizar seus conhecimentos, a fim de confrontá-los com o novo, na

busca da preparação do sentido do texto, onde de fato a leitura se efetiva.

Assim, para Silva (2005, p.13) “é preciso que se saiba traduzir essa

concepção da leitura em programas significativos de ensino, que resultem na

transformação, na emancipação, na libertação dos leitores”. Neste processo de

libertação dos leitores, tão importante quanto à leitura são os momentos propiciados

para a fala, o debate, a reflexão, a escrita, na busca de maior interlocução entre os

participantes da esfera escolar. Sendo estes, alunos, professores, equipe

pedagógica, o ideal é romper, porém de forma saudável e proveitosa, com o

autoritarismo presente nas nossas instituições escolares e fazer com que haja uma

troca de conhecimentos, de comportamentos, enfim que ocorra a influência mútua, a

partir das experiências compartilhadas de leituras.

Silva (2005, p.115) destaca que “uma escola aspirante à mudança social

espera que a leitura dos textos propostos constitua, antes de tudo, um instrumento

de conscientização e libertação dos leitores”, reforçando então a ideia de leitura à

libertação para os que dela se apropriam com eficiência.

Deste modo, um dos aspectos a ser considerado para facilitar o trabalho

com a leitura em sala de aula é dar importância aos assuntos que para os alunos

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são considerados interessantes, levando-se em conta a faixa etária, a série e o nível

intelectual dos leitores pretendidos.

Sabendo-se que o principal material escrito a que o aluno da escola pública

tem acesso é o livro didático, muitas vezes a complexidade dos textos nele

presentes traz o desinteresse do aluno pela leitura, sem distinção, independente da

disciplina, o que causa grande prejuízo ao aluno e evidencia o fracasso na leitura,

vetando este indivíduo de enxergar nela informações importantes, não só para a

escola como para a vida. Ensinar a ler, portanto, é um desafio que deve ser

encarado pelos professores como algo primordial a ser realizado.

Outro aspecto importante a ser considerado em se tratando de leitura em

sala de aula, além da seleção de textos, é a figura do professor, este pode fazer um

convite à leitura através de sua fala, de seu comportamento como leitor, antes do

educando o professor deve ser um assíduo leitor, a partir daí terá capacidade de

seduzir o aluno e exercer o papel de mediador neste processo.

Conforme afirma Silva (2002, p.22) o ensino da prática de leitura requer um

professor que além de posicionar-se como um leitor assíduo, crítico e competente,

entenda realmente a complexidade do ato de ler.

Diante do momento social que estamos vivenciando, o acesso à leitura é que

vai garantir ao indivíduo o conhecimento e o uso da linguagem em diferentes

contextos, permitindo assim sua integração efetiva na sociedade em que se

encontra inserido.

De acordo com Solé (1998, p.142) há necessidade de se ensinar a ler e a

manejar diversos tipos de textos, dotando os alunos de estratégias de compreensão

úteis, generalizáveis e transferíveis. As táticas utilizadas objetivam capacitar o aluno

a se responsabilizar por sua compreensão, levando-o à resolução individual das

próximas tarefas propostas, como um leitor independente, que sabe o que faz e a

sua razão.

Assim, para Solé (1998, p. 142) são aspectos imprescindíveis para a

compreensão de textos:

Discutir com os alunos os objetivos da leitura; trabalhar com materiais de dificuldade moderada que representam desafios, mas não tarefas pesadas

para o aluno; proporcionar e ajudar a ativar os conhecimentos prévios; ensinar-lhes a inferir, a fazer conjeturas, a se arriscar e a buscar verificação para suas hipóteses; explicar às crianças o que podem fazer quando se

deparam com problemas no texto.

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A estas estratégias devem ser somadas às questões referentes à Análise

Linguística, as Práticas Discursivas e o trabalho com a gramática. Desta maneira,

conforme sugestão de Antunes (2007, p. 134), seguem algumas propostas

focalizando o texto como parte da atividade discursiva, tais como análise:

Dos recursos gráficos e efeitos de uso, como: aspas, travessão, negrito,

itálico, sublinhado, parênteses, etc.;

Da pontuação como recurso sintático e estilístico em função dos efeitos de

sentido, entonação e ritmo, intenção, significação e objetivos do texto;

Do papel sintático e estilístico dos pronomes na organização, retomadas e

sequenciação do texto;

Do valor sintático e estilístico dos modos e tempos verbais em função dos

propósitos do texto, estilo composicional e natureza do gênero discursivo;

Do efeito do uso de certas expressões que revelam a posição do falante em

relação ao que diz: expressões modalizadoras (ex: felizmente,

comovedoramente, etc.);

Da associação semântica entre as palavras de um texto e seus efeitos para

coesão e coerência pretendidas;

Dos procedimentos de concordância verbal e nominal;

Da função da conjunção, das preposições, dos advérbios na conexão do

sentido entre o que vem antes e o que vem depois de um texto (DCE, 2008,

p. 80).

1.2 O gênero “conto literário”

Segundo Reis (1984), uma das funções do conto nas sociedades primitivas

é sua atuação como válvula de escape, suprindo a necessidade básica de sonho e

fantasia, evasão e retorno ao espaço idealizado de um paraíso perdido. Acredita-se

que os tempos são outros, mas estas necessidades permanecem somando-se a

novas preocupações que afligem o nosso cotidiano.

O gênero conto apresenta como forma inicial a narrativa oral, onde há

sempre a presença de espectadores e daquele que conta a história. No início do

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século XIX o conto aparece com mais frequência na imprensa, embora seja de

forma escrita, com preocupações estilísticas, conserva marcas do “contar”.

Uma das características do conto que justificou seu trabalho de leitura em

sala de aula foi o caráter de concisão, não menosprezando seu aspecto qualitativo,

embora seja curto, por si só possui infinita riqueza, por meio da leitura de um conto

se pode sentir emoções, enxergar com olhos do imaginário, descobrir outros

lugares, outras maneiras de agir, enfim vem colaborar com o crescimento interior do

indivíduo.

Para Reis (1984, p. 24)

Um conto parece ser, a partir de um fragmento da realidade, a partir de um Episódio fugaz, a partir de um dado extraordinário mas muitas vezes

despercebido do real,a partir de um fato qualquer e, por que não?,a partir de fato nenhum, a construção de um sentido que produza no leitor algo como uma explosão, levando as comportas mentais a expandirem-se, projetando

a sensibilidade e a inteligência a dimensões que ultrapassem infinitamente o espaço e o tempo da leitura.

Sendo assim, o texto foi o nosso objeto de trabalho, dentro da concepção

interacionista da língua e da linguagem, no qual os sujeitos fazem parte do processo

de compreensão e da produção de sentido, o que denominamos leitura, que

segundo Orlandi (2001): “Leitura, vista em sua acepção mais ampla, pode ser

entendida como “atribuição de sentidos”.

A proposta deste trabalho foi o envolvimento do aluno com o conto literário.

Gênero este capaz de levar o leitor ao entendimento das condutas humanas,

movidas pelo amor, pelo ciúme, pelo desejo e até mesmo pelo egoísmo, e ao

mesmo tempo é capaz de seduzi-lo através de sua beleza e sensibilidade. A leitura

literária segundo Ricardo Azevedo (2005) é:

São temas que não se constituem em conteúdos didáticos, mas que nos são dados a conhecer e discutir através da leitura de obras literárias clássicas e contemporâneas. É pela e na literatura que escritor e leitor

realizam sonhos, alimentam fantasias, desejos e utopias, prefigurados em seus enredos, personagens e cenários, catalisadores das polaridades e ambiguidades humanas.

O intento, portanto, foi o de oportunizar a interação texto/leitor,

proporcionando ao aluno a liberdade de realizar uma leitura onde ele pudesse

preencher os vazios, característicos dos textos literários, a partir de seus

conhecimentos prévios e sua imaginação.

Há de se considerar que, ao escrever, o escritor utiliza artifícios próprios que

marcam determinada época, ideias e conhecimentos de acordo com a sua visão de

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mundo, é durante a leitura que surgem as indagações do outro, ou seja, do leitor em

questão, não importando com o contexto de produção. Neste sentido, conforme

afirma Cordeiro (2003), o fato de um texto literário conter, por natureza, vazios,

reforça suas virtualidades, cabendo ao leitor ou à geração de leitores preenchê-los

conforme as inquietações de sua época e de sua sensibilidade.

Kaufman e Rodriguez (1995, p. 20) descrevem o texto literário como:

“... opacos, não explícitos, com muitos vazios ou espaços em branco,

indeterminados. Os leitores, então, devem unir todas as peças em jogo: a trama, as personagens e a linguagem; têm de preencher a informação que falta para construir o sentido, fazendo interpretações congruentes com o

texto e com seus conhecimentos prévios do mundo”

Desta maneira, o texto literário força o leitor a descobrir o significado dos

recursos utilizados pelo autor, sendo: a linguagem figurada, a comparação, os

símbolos (aspas, parênteses, reticências, etc.), enfim, marcas deixadas no texto

para evidenciar a intenção de determinado autor.

Segue abaixo a definição (didática) de conto por Kaufman & Rodriguez

(1995, p.21):

É um relato em prosa de fatos fictícios. Consta de três momentos

perfeitamente diferenciados: começa apresentando um estado inicial de equilíbrio; segue com a intervenção de uma força, com a aparição de um conflito, que dá lugar a uma série de episódios; encerra com a resolução

desse conflito que permite, no estágio final, a recuperação do equilíbrio perdido.

Ainda, de acordo as mesmas autoras, os contos possuem ações centrais,

núcleos narrativos que se relacionam entre si promovendo o suspense, os

personagens realizam as ações em determinado tempo, espaço e lugar fazendo uso

de recursos descritivos. Os tempos verbais atuam com grande importância na sua

construção e na interpretação, o tempo presente é mais usado nas descrições e nos

diálogos, enquanto que os pretéritos perfeito e imperfeito aparecem com frequência

nas narrações. Quanto ao narrador, é ele quem vai apresentar os fatos que

constituem a trama, é a voz que conta o que está acontecendo, pode ser a voz de

uma primeira pessoa que também participa dos acontecimentos, ou de uma terceira

pessoa que apenas relata o que acontece, podendo ou não conhecer tudo das

personagens, os narradores que tudo sabem das personagens são denominados

oniscientes.

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Sendo a leitura um processo sucessivo de elaboração de expectativas e

previsões que vão sendo averiguadas, é importante que os alunos conheçam as

superestruturas dos diferentes tipos de textos, pois tendo este conhecimento são

levados a criarem expectativas adequadas em relação ao texto proposto, tornando a

leitura ágil e bem sucedida. Não desconsiderando as características formais do

conto e levando em conta a nova maneira de viver dos tempos atuais, é necessário

abrir nossa visão em relação às novas produções literárias e incorporar ao conceito

pré-estabelecido as inovações em relação ao conto moderno, conforme a

caracterização de Reis(1984, p. 85):

Descontinuidade; quebra de sequência previsível; utilização de todas as linguagens (inclusive diálogo entre o texto e a tipografia ou entre o texto e

as ilustrações, alterando-se até mesmo a forma convencional do livro); incorporação, num mesmo texto, de fragmentos diversos, de vários autores, estilos e épocas, etc., realizando o que se chama “intertextualidade;

simultaneidade de cenas, imitando procedimentos do cinema moderno; introdução, na prosa, de técnicas da construção de poemas; inclusão, na composição do texto, de posicionamentos autocríticos, ou seja, textos que

refletem e questionam seu próprio processo de construção. Estes são alguns dos procedimentos formais que encontramos presentes na narrativa moderna, logo, também no conto moderno (REIS, 1984, p. 85)

Para usufruir do prazer que uma boa leitura pode proporcionar é necessário

estar atento aos acontecimentos artísticos do momento, pois estes influenciam

também nas produções literárias de determinada época. Temos em Gotlib (1990, p.

76) três qualidades de contistas para Quiroga: “sentir com intensidade, atrair a

atenção e comunicar com energia e sentimentos”.

Neste sentido, foram selecionados três contos para compor o caderno

pedagógico, sendo: “O Primeiro Beijo” de Clarice Lispector3, o segundo conto

trabalhado foi de Moacyr Scliar4, “O conto se apresenta”. O último conto estudado

3 Conceituada escritora brasileira, seu primeiro romance foi publicado em 1944, “Perto do Coração

Selvagem”. No próximo ano a escritora ganhou o prêmio Graça Aranha, da Academia Brasileira de Letras. “Seu primeiro livro de contos foi publicado em 1960, “Laços de Família”, seguido de” A Legião

Estrangeira” e de “A Paixão Segundo G.H.”, considerado um marco na literatura brasileira. Seu último romance foi “À Hora da Estrela”, adaptado para o cinema em 1985. Clarice morreu de câncer, na véspera de seu aniversário de 57 anos.(O Pensador. Disponível em:<

http://pensador.uol.com.br/autor/Clarice>. Acesso em: 15.06.2011) 4 O autor foi romancista, cronista, contista e autor de livros infantis e juvenis, publicou mais de setenta

livros, entre crônicas, contos, ensaios, romances e literatura infanto-juvenil. Em 2003 foi eleito para a

Academia Brasileira de Letras, tendo recebido antes uma grande quantidade de prêmios literários. (disponível em:<http://pt.wikipedia.org/wiki/Moacyr_Scliar#Biografia, 2011>. Acesso em 15.06.2011).

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foi “Soluções para o terceiro andar” de Índigo, uma das mulheres que está fazendo a

nova literatura brasileira. Seu nome é Ana Cristina Araújo Ayer de Oliveira5.

As atividades propostas para os contos literários escolhidos foram

elaboradas de acordo com o Plano de trabalho Docente, sugerido por Gasparin

(2003), o qual será detalhado a seguir:

1.3 Plano de Trabalho Docente

Após discorrer sobre o conto literário e suas dimensões de ensino, será

explicitado o Plano de Trabalho Docente, proposto por Gasparin (2003), cuja teoria

orientou a produção Didático-pedagógica de maneira eficiente. Assim, seguem as

fases que compõem o material produzido com base na pedagogia histórico-crítica:

Na primeira fase, segundo Gasparin (2003), o professor anuncia os conteúdos que

serão trabalhados e estabelece um diálogo com os alunos sobre o assunto,

privilegiando a vivência cotidiana do que vai ser tratado, é a Prática Social Inicial.

Na segunda fase, ocorre a teorização metodológica do processo de

desdobramento e análise do conteúdo escolar, integrado à prática inicial, é neste

momento que se dá a Problematização, de acordo com a visão do aluno e a

transformação do conteúdo em desafios.

Finalizado o levantamento das investigações, faz-se necessário a mediação

do professor, é o que consiste em Instrumentalização, trata da formação dos

conceitos na criança, as diferentes abrangências dos conceitos cotidianos e

científicos, assim como a construção dos conceitos científicos e seu respectivo

sistema através das ações didático-pedagógicas mediadas pelo professor.

Ainda no processo de teorização realiza-se a Catarse, na qual a operação

fundamental é a síntese, ou seja, é o momento de reunir teoria e prática, cotidiana e

científica, demonstrando a nova postura mental que o aluno alcançou.

Na terceira fase, que corresponde à última etapa do trabalho, explicita em

que consiste o novo agir do educando, após os estudos teóricos, implica uma nova

forma de ação, novas atitudes que serão incorporadas no seu cotidiano, revelando

suas intenções e os compromissos sociais a partir da apreensão do novo conteúdo.

5 Começou a escrever aos 13 anos, com um diário que mantém até hoje. Em 1998, publicou seus

primeiros contos na internet, tem seis livros publicados, entre eles Saga Animal, Perdendo Perninhas e Como Casar com André Martins. A escritora tem um blog(disponível

em:<http://diariodaodalisca.zip.net.> Acesso em 15.06.2011), no qual escreve diariamente e que serve de canal de comunicação com leitores e de laboratório para novos textos (INDIGO, 2006).

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Sinteticamente foi apresentada a proposta metodológica que direcionou o

referido trabalho, fazendo-se as adaptações julgadas necessárias, com o intuito de

levar o educando a conhecer os mecanismos que envolvem o ato de ler, para que a

leitura seja valorizada como processo de compreensão e construção social.

O Caderno já mencionado foi composto por textos teóricos, considerando a

concepção interacionista da linguagem e sua decorrência pedagógica sistematizada

em um plano de trabalho docente, privilegiando o gênero textual conto. E através de

encaminhamentos metodológicos, foram apresentadas sugestões de atividades

referentes a práticas discursivas e análise linguística.

As atividades mencionadas foram planejadas e desenvolvidas com alunos

do primeiro ano do Ensino Médio, devido à necessidade de intensificar a leitura

nesta fase em que se dá mais ênfase aos estudos literários, buscou-se um fazer

dinâmico, que tornasse a leitura prazerosa, despertando a beleza e a emoção que

existe no ato de ler, fatores que permitirão ao educando tomar gosto pela leitura e

formar seu senso crítico.

2 SISTEMATIZAÇÃO DAS AÇÕES DESENVOLVIDAS NA IMPLEMENTAÇÃO DA

PROPOSTA

As ações foram produzidas no período de agosto de 2011 a novembro do

mesmo ano. Elas foram implementadas conforme a proposta já mencionada

anteriormente.

Nesta etapa do trabalho, procurou-se aplicar tudo aquilo que estudamos na

teoria, de acordo com as possibilidades proporcionadas. Neste sentido, iniciamos a

apresentação das ações e o relato do desenvolvimento processual do trabalho

praticado.

Ação 1 - Apresentação da Produção Didático-Pedagógica para a Direção,

Equipe Pedagógica e professores.

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Antes de iniciar o referido trabalho com os alunos, o projeto foi apresentado

aos Professores, Equipe Pedagógica e Direção. Expus a proposta que seria

desenvolvida, com o gênero conto, empregando a metodologia sugerida no Plano

de Trabalho Docente. Esclareci certas particularidades relevantes para o bom

andamento das atividades e também coloquei a seriedade com que tudo foi pensado

e elaborado a partir das pesquisas realizadas, proporcionadas pelo PDE.

Ação 2 - Apresentação do projeto aos alunos enfatizando a importância de sua

participação efetiva. Sessão de vídeos abordando o valor da leitura e da

literatura; análise dos conceitos didáticos de literatura e sua função.

Sondagem sobre a leitura dos alunos e as principais dificuldades; discussão

oral sobre questões relacionadas à leitura e literatura; definição didática de

“conto”.

Apresentei meu projeto aos alunos, destacando as etapas obrigatórias para

cumprir com as determinações do programa (PDE), assim como ressaltando a

importância da participação efetiva de cada aluno envolvido.

Inicialmente os alunos tiveram a oportunidade de saber um pouco mais

sobre a literatura, sua função e a importância da leitura, por meio de vídeos e

pesquisa em livros didáticos. Em seguida foi feita a investigação a respeito da leitura

dos alunos por meio de questões propostas, que eles responderam oralmente.

Houve participação ativa da maioria dos alunos, percebi sinceridade em seus

depoimentos, não houve inibição ou qualquer outro empecilho, foi muito proveitoso.

Após este momento foi solicitado que relatassem por escrito suas maiores

dificuldades em leitura, muitos citaram a falta de concentração, preguiça, textos

longos, falta de compreensão do “contexto” e barulho. Na época (agosto/2011),

de acordo com o levantamento, dez alunos da referida turma (1ºA) estavam lendo

com certa frequência, quatorze não liam há algum tempo, e apenas cinco estavam

lendo no momento atual, referindo-se a livros de contos ou romances. Após a

investigação sobre a leitura, foi exposto a definição “didática” de conto e alguns

esclarecimentos sobre o referido gênero. Vale ressaltar que, quando temos um

roteiro a seguir, um objetivo e o material organizado, as aulas são mais agradáveis,

tanto para os alunos como para o professor.

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Ação 3 - Exibição do filme “Escritores da Liberdade”; discussão oral e escrita

sobre as ideias contidas no filme; reflexão. Visita à biblioteca, leitura livre (de

contos).

Dando continuidade às ações realizadas, exibiu-se o filme “Escritores da

Liberdade”, foi impactante, os alunos assistiram com muita atenção, do início ao

final, o objetivo foi alcançado, houve atividade para reflexão e discussão em círculo,

as colocações feitas pelos alunos foram surpreendentes, conseguiram relacionar o

conteúdo do filme com o cotidiano e perceberam aspectos interessantes como a

importância da leitura e da escrita para a transformação ocorrida na vida daqueles

adolescentes. A pedido da equipe pedagógica o filme foi exibido para outras turmas

da escola. Encerrando a atividade relacionada ao filme, aproveitando a motivação

em que se encontrava a turma, os alunos foram conduzidos à biblioteca para leitura

livre, onde, alguns fizeram empréstimos, contaram-me sobre o livro com entusiasmo

(por vontade própria), outros leram apenas naquele momento.

Ação 4 - Leitura e análise do conto “O primeiro beijo” de Clarice Lispector;

questões orais para abordagem do assunto; características do conto;

Interpretação do texto; estudo das marcas de linguagem que envolvem o

texto; informações explícitas e implícitas, inferências a partir de pistas textuais.

Estas ações iniciam a unidade dois, a leitura e análise do conto “O primeiro

beijo”, seguindo a metodologia proposta, buscando sempre a participação do aluno,

por escrito e oralmente. Durante a abordagem do assunto a participação ocorreu de

forma plena, todos queriam falar, isto é estimulante, comprovou-se que a conversa

inicial, colhendo expectativas é muito importante, o aluno se empolga para a leitura.

Quanto ao estudo do texto, fizeram com autonomia, houve mais dificuldade na

análise linguística, que os auxiliei, revisando alguns aspectos gramaticais, tempo e

modo verbal, linguagem figurada, recursos gráficos, outra dificuldade para eles foi

delimitar as partes que compõem o conto, leva algum tempo para a compreensão,

apesar de saberem quais são as partes, sentem dificuldade perante um texto. A

problematização foi realizada em grupos, como atividade extraclasse, pois envolveu

15

trabalho de pesquisa, apenas alguns alunos entregaram em atraso, mas o resultado

foi excelente, formou-se um mural na sala de aula para apreciação de todos.

Ação 5 - Avaliação e exposição dos trabalhos relacionados ao texto “O

primeiro beijo” (Socialização); leitura na biblioteca

As atividades referentes à Catarse, que abrange a interação texto/leitor, teve

o objetivo alcançado de maneira satisfatória, conforme depoimento de uma das

professoras da escola, nas discussões proporcionadas pelo GTR, Grupo de

Trabalho em Rede, realizada durante a implementação do projeto, Luciana Pereira

Tabosa destaca,

“Achei muito apropriado o conto escolhido para ser trabalhado com os alunos da

professora Eunice: “O Primeiro Beijo”, de Clarice Lispector. Como trabalho na mesma escola

onde o projeto já está sendo desenvolvido, percebo que o trabalho está sendo muito bem

feito e os resultados já são visíveis à comunidade escolar: a representação do conto que os

alunos fizeram em forma de cartazes, histórias em quadrinhos e outros mostra que

realmente eles conseguiram atribuir um sentido a essa leitura e que a mesma foi conduzida

de forma prazerosa.”

Devido ao tempo disponível que era escasso, pois há muitos imprevistos no

dia a dia escolar, considerei que seria difícil cobrar dos alunos a “Prática Social

Final”, porém ao apresentar-lhes as sugestões, houve interesse, formaram os

grupos e a atividades foram realizadas e expostas no tempo determinado, inclusive

um grupo de alunos pesquisou e expôs um cartaz detalhando a vida e as obras de

Clarice Lispector de “1920” a “1985”, por meio deste trabalho, o qual foi manuscrito,

eles puderam falar da autora com autonomia, de uma maneira espontânea e natural.

Concluída a exposição, os alunos foram conduzidos à biblioteca para leitura.

Segundo a bibliotecária mais alunos fizeram empréstimos para leitura extraclasse,

sendo esta uma prática constante, eles adquirem o hábito.

Ação 6 - Texto “O conto se apresenta”; revisar características do gênero

conto; leitura e produção escrita. Apresentação do texto e do autor – Moacyr

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Scliar, leitura e estudo do conto em questão; exposição dos trabalhos no

mural da escola.

Prosseguindo os relatos, foi trabalhada a unidade 3 “O conto se apresenta”,

por ser um texto longo optei por recortá-lo para então distribuir aos grupos para

ordená-lo, para minha surpresa não houve dificuldade na montagem do texto, após o

tempo necessário para a realização da atividade, foi feita a leitura, um trecho por

grupo, depois houve a leitura dramatizada, auxiliei os alunos para que encontrassem

no texto características do próprio conto, o que o torna interessante. Foi feito um

questionamento a fim de verificar as impressões e as inferências que os alunos

tiveram, assim como comparar as ideias surgidas com o enredo do texto. Uma das

perguntas foi:

- Vocês gostaram do texto? Por quê?

Algumas respostas obtidas:

“Sim, porque é um texto diferenciado, o conto de uma certa maneira se apresenta no

texto mostrando suas características e citando algumas histórias que ele se encontra.”

“Sim, porque é uma forma de expressar as características de um conto,

transformando-o em um personagem.”

Alguns alunos, no entanto, acharam-no cansativo, por ser um texto extenso:

“Não, porque achamos muito extenso, isso dificultou a leitura e interpretação, o

texto extenso deixa a leitura pesada.”

O mesmo grupo, ao responder a questão sobre adequação da linguagem ao

tema tratado, colocou:

“...nós achamos dificultoso, mas a linguagem do texto está sim de acordo com o

tema, o texto está em uma linguagem neutra, onde todos podem entender.” Então não foi

tão dificultoso assim, conclui-se.

Outra resposta obtida:

“Sim, porque é um texto claro, está em primeira pessoa, e isso ajuda para um melhor

entendimento e compreensão pois ele “conversa” com a gente, nos deixando envolvido com

a história.”

Após esclarecimentos às dúvidas que surgiram sobre o determinado texto, foi

proposto aos grupos que representassem o texto “O conto se apresenta” em forma

de slides, para que todos pudessem ver na TV, ou que montassem um painel

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coletivo, por meio de desenhos ou colagens, como forma de expor a leitura e

socializar o conhecimento, pois desperta o interesse dos envolvidos e dos demais

alunos da escola.

Pode-se dizer que o resultado foi positivo, o objetivo foi alcançado tendo em

vista os trabalhos que foram produzidos. Porém devido a problemas técnicos ou de

formatação não foi possível visualizar todos os pen drives na TV, optei por vê-los no

computador. Os cartazes foram bem criativos, mostraram-se fieis ao texto,

comprovando que, de fato, houve compreensão da leitura. Segundo a professora

Luciana Pereira Tabosa “Os cartazes que os alunos produziram sobre o conto “O conto se

apresenta” ficaram encantadores”.

Ação 7- Organização do grupo de alunos para leitura de contos no período

vespertino; relato, por escrito, da experiência dos alunos ouvintes e dos

alunos que leram as histórias.

Para finalizar esta unidade, houve a leitura proposta, um grupo de alunas da

manhã foi no período vespertino, de maneira bem espontânea, para a realização da

atividade, as meninas fizeram leitura dramatizada de um livro escolhido por elas,

peça teatral (“Família Composta” de Indigo) e vários contos do livro “Cobras em

Compota” da mesma autora. As quintas séries ficaram atentas, colaborando para o

sucesso do trabalho. Eu estava um pouco preocupada porque, normalmente, os

alunos das quintas séries são bem agitados, mas a leitura foi realizada com

tranquilidade (duas aulas em cada turma). Pelos depoimentos dos alunos, gostaram

da experiência:

“Eu achei muito legal, engraçado e muito divertido... Porque ensina a gente ficar

mais atento com a nossa vida, que tem que ser bem mais velho para ser mãe e tem que

aproveitar a nossa vida que pode ser bem curta.” (referência ao livro Família Composta).

“Adorei as histórias, principalmente a primeira história, foi muito engraçado e legal,

eu gostei da parte da briga.”

“ Eu gostei muito!! Só não gostei do namorado poeta!! Mas foi maravilhoso...”

“ Foi boa essa experiência,... achei interessante a mensagem que elas queriam

passar...”

“Sim eu gostei porque foi legal e foi igual como tivesse na vida real”.

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Pelos detalhes que alguns alunos colocaram em suas respostas percebe-se

que realmente participaram da “leitura”, houve interação texto/leitor/ouvinte. Foi uma

experiência bastante produtiva, considero objetivo alcançado.

Ação 8 - Texto “Soluções para o terceiro andar”; revisar características do

conto. Apresentação do (a) autor (a) Índigo. Leitura do texto; estudo das

marcas de linguagem; das informações implícitas e explícitas; inferências;

produção textual. Exposição dos cartazes produzidos, no mural da escola.

Tais atividades que iniciam a unidade 4 começam a ser desenvolvidas no

mês 11/11, praticamente no final do período letivo, o que dificultou a execução de

todas as tarefas propostas para esta unidade, porém as atividades que envolvem

leitura e escrita foram realizadas com resultado satisfatório.

Foi muito interessante a conversa inicial com os alunos, a busca de

expectativas, eles ficaram motivados para a leitura, inclusive observaram que se

trata de um conto moderno, diferente dos outros já estudados, por meio do título do

texto, muitos conseguiram aproximá-lo do seu conteúdo, porém nenhum dos alunos

conhecia-o, foi surpresa para todos. Quanto ao questionamento inicial, temos as

seguintes respostas, quanto às expectativas dos alunos em relação ao título do

conto (Soluções para o terceiro andar):

“... algum morador incomodando os vizinhos, ou problemas na estrutura do prédio”.

“...em um prédio, no terceiro andar, em um apartamento, uma família que está

sendo atormentada por alguns vizinhos, e por isso chamaram o síndico para solucionar o

problema”.

“Ao ler o título do texto nós imaginamos que é um prédio, e que no terceiro andar

está acontecendo alguma coisa que está atrapalhando.... Pode ser um vazamento no

encanamento, ou até mesmo um grupo de amigos que ali habitam e que fazem muita festa

com som alto, até altas horas da noite”.

Percebi que a maioria dos alunos fez com mais autonomia as questões que

envolvem o conteúdo temático, a construção composicional e as marcas linguístico-

enunciativas. Alguns alunos não perceberam, de início, que o texto é construído em

cima de fatos e hipóteses (possíveis soluções para o caso), consideraram as

soluções como fatos também, houve necessidade de uma releitura, após

19

analisarmos os recursos utilizados pelo autor, como o uso dos “dois pontos“, por

exemplo, conseguiram compreender. Daí a obrigação de enfatizarmos aos alunos a

importância das marcas da linguagem presentes nos textos. Um dos fatores que

colaborou para a realização desta atividade, apesar do breve espaço de tempo que

tínhamos, foi a sua qualidade de conto moderno, curto, imprevisível, de leitura

rápida, um conto que se desvia das regras do convencional. Como se aproximava o

final do ano letivo, conforme já foi mencionado, a alternativa foi encaminhar as

atividades visando a produção final, de acordo com a proposta, produzir uma notícia,

pelas características semelhantes ao conto estudado, e a ampliação do mesmo,

para avaliar o aprendizado em relação às marcas textuais do gênero em questão,

estas atividades serão discutidas a seguir.

Ação 9 - Leitura de notícias enfatizando as características deste gênero.

Produção de texto- transformação do conto em uma notícia; correção e

reestruturação.

Para realização da atividade, foram coletadas algumas notícias e

distribuídas aos alunos a fim de que percebessem as características do gênero

“notícia”, após a leitura dos textos, foram trabalhados os principais elementos de

uma notícia de jornal, a objetividade da linguagem, enfatizando a distinção entre

este tipo de texto e um conto. Com as orientações e o auxílio da professora, foi

solicitado então a transformação do conto “Soluções para o terceiro andar” em uma

notícia. Houve o empenho da maioria dos alunos, a tarefa foi realizada em duplas,

as quais fizeram leitura oral para a classe, os próprios alunos teceram comentários a

respeito dos textos dos colegas, fazendo observações relevantes, seguem alguns

títulos e fragmentos dos textos produzidos:

“ Morte de mãe e filha”

“Em Londrina, na Garagem do Edifício Santa Bárbara, foram mostrados dois corpos,

um era de Laura dos Santos, de 37 anos, o outro de Kelly Pereira dos Santos, de 10 anos, ao

investigarem a polícia descobriu que as vítimas eram mãe e filha, e que moravam no apto

130, 3º andar.

“Ontem a noite quando cheguei... mas conformado fui dormir”. Diz Carlos de

Andrade de 20 anos, vizinho das vítimas... por isso a polícia continua a investigar o caso.”

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“Filha e mãe morrem após brigas diárias”

“ Equipe da Folha

Londrina - José Eduardo, morador do Condomínio Residencial Bela Vista, relatou na

manhã de ontem, que as brigas e discussões entre a mãe, Laura de Melo, de 37 anos, e a

filha, Beatriz de Melo, de apenas 8 anos de idade, eram frequentes, resultando em um

acontecimento trágico.... Esse fato deixou a família abalada e ninguém prestou

esclarecimento”.

O texto a seguir não apresenta título.

“Ontem dia 23 de novembro, no Condomínio Rockfeller, no apartamento 101, no

terceiro andar, a Senhora Felícia Wikipedia, foi acusada de maus tratos a sua filha Laura

Wikipedia de 9 anos de idade, segundo testemunhas, a filha havia pedido para sair, e sua

mãe não deixou...Felícia foi presa, e perdeu a guarda da menina...Felícia disse que foi um

acidente doméstico.”

Considerando a época em que tal atividade foi desenvolvida (24/11/11), não

foi possível fazer a correção e reestruturação de todos os textos, visto que

apresentam problemas de pontuação, ortografia, porém, percebe-se que

apresentam a estrutura e os elementos principais de uma notícia, gênero este que

pode ser aprofundado num outro momento, sendo que a prioridade foi dada ao

Conto, a intenção foi aproveitar o estilo usado pela autora no conto “Soluções para o

terceiro andar” para mostrar a versatilidade da língua, e os recursos que podem ser

utilizados para cada tipo de texto, dependendo da intenção do escritor, do público

que se pretende atingir, do veículo de comunicação responsável em propagar o

material escrito. Neste sentido, o objetivo foi alcançado.

Ação 10 - Leitura na biblioteca; produção final-conto; correção e

reestruturação.

Os alunos foram encaminhados à biblioteca para leitura, preferencialmente,

de contos, nesta época do ano, final do 4º bimestre, não há empréstimos, a

preocupação é com a devolução dos livros emprestados. Ocorreu a leitura de

maneira satisfatória, os livros de contos curtos são ideais para estes momentos,

inclusive “Cobras em compota” de Índigo, entre outros escritores tradicionais. A

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tarefa final da unidade 4 foi ampliar o conto estudado, foi sugerido que fizessem

individualmente ou em duplas.

Tratando-se de um conto moderno, “Soluções para o terceiro andar”

apresenta poucos personagens, ação limitada a poucos lugares, tempo limitado a

um período significativo na vida dos personagens, focaliza um momento importante,

conflituoso, aborda episódios do cotidiano. Foram ressaltadas as características

essenciais do gênero conto, com referência à linguagem, a estrutura e os recursos

utilizados para evidenciar a intenção daquilo que se quer dizer. Para realização

desta atividade, foram dadas algumas sugestões, como: caracterizar os

personagens física e psicologicamente, dar nome e outras informações a respeito

deles, envolver outras pessoas na história; descrever o lugar; dar resolução ao

conflito e criar um novo desfecho. Esta atividade compreendeu a Prática Social

Final, os contos foram produzidos na sala de aula, foi uma atividade enriquecedora,

houve envolvimento dos alunos, as dúvidas eram sanadas, pelo menos em parte,

durante o ato da escrita. Percebeu-se que mesmo se aproximando o final do ano

letivo, visto que era 02/12/11, os alunos mostraram-se empenhados em concluir a

atividade, foi impossível fazer a correção e reestruturação de todos os textos,

mesmo porque é uma atividade que demanda tempo, e há alunos com mais

facilidade, tanto na escrita como em relação à criatividade, outros são mais lentos,

percebeu-se que muitos alunos ainda tem o vício da repetição de palavras ou

expressões, apresentam dificuldades no discurso direto e indireto, no uso dos

conectivos, não usam a vírgula adequadamente, são aspectos que deverão ser

trabalhados constantemente nas produções. Os contos foram concluídos, dentro das

possibilidades foram corrigidos e reestruturados, houve socialização dos trabalhos

entre os próprios alunos, por meio da leitura oral dos textos produzidos. O resultado

foi satisfatório, como pode ser verificado nos textos a seguir.

22

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25

Ação 11 - Digitação e encadernação dos textos produzidos; organização do

varal para exposição dos contos produzidos.

Tal ação não foi realizada plenamente devido ao tempo insuficiente, foi

impossível fazer a digitação e encadernação dos textos conforme a proposta, no

entanto, os contos ficaram à disposição na biblioteca da escola, para que outros

alunos pudessem ler e apreciar os trabalhos dos colegas. Como os alunos da

referida turma estavam sobrecarregados de trabalhos e avaliações com o término do

ano letivo, considerei tarefa cumprida e objetivo alcançado, pois a turma se mostrou

empenhada e motivada na realização das atividades, entendo que a digitação e a

encadernação não interferiu de maneira negativa no ensino-aprendizagem, algo que

poderá ser realizado em outro momento.

Diante do método proposto para a Implementação do Projeto de Intervenção

Pedagógica na Escola, constatamos que levar o aluno a ler é uma tarefa intensa, é

necessário grande estímulo por parte do professor no sentido de fazê-lo

compreender a necessidade de ler.

Ler e escrever são práticas diárias na escola, no entanto, exigem-se certas

técnicas para que isto aconteça de forma significativa, precisa ser “interessante”

para envolvê-los, o aluno que lê um texto e não o entende sente-se desmotivado e,

muitas vezes, desiste da leitura, é necessário que o professor seja o mediador nesta

tarefa. Outro aspecto importante que deve ser ressaltado é o estudo gramatical por

meio do texto, favorece o raciocínio e a assimilação dos conteúdos torna-se mais

acessível ao educando.

Com relação à aplicação da proposta, o material preparado antecipadamente foi

um fator positivo que contribuiu para a concretização da mesma, embora a

necessidade constante de intervenções, correções por parte do professor,

reestruturações dos trabalhos produzidos, pois destes dependeram as notas

bimestrais, a situação, durante o percurso, ocorreu de forma tranquila, tendo em

vista as atividades já organizadas, o objetivo traçado, o bom relacionamento com os

alunos, textos adequados ao perfil da turma, são elementos essenciais para se

conseguir um bom resultado.

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Quanto ao gênero escolhido, conto literário, o mesmo abre um leque de

possibilidades que favorece a leitura, a reflexão, aguça a curiosidade, levando o

educando a um envolvimento espontâneo com o texto, as aulas assim se tornam

mais descontraídas e o aprendizado mais eficiente, sem a cobrança do livro didático,

que é o material comumente requisitado para realização das lições, onde se

mesclam diversos gêneros impossibilitando o aprofundamento de um gênero

específico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A leitura é o elemento básico para a ampliação do conhecimento do

indivíduo e a sua libertação, porém na maioria das vezes o aluno lê, mas não

compreende, portanto o nosso objetivo maior é fazer com que um determinado texto

faça sentido ao nosso aluno leitor e que ele faça uso desta leitura em sua vida diária,

nas mais diferentes situações.

Desta maneira é primordial que se crie estratégias para seduzir os

educandos nesta busca, é uma tarefa incessante, contudo, deve ser encarada com

otimismo, pois analisando os resultados do trabalho em questão entendemos que é

possível amenizar esta grande dificuldade que aflige a maioria dos profissionais

envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, principalmente quando nos é

dada a oportunidade e as condições de realizar algo diversificado em sala de aula,

como nos foi proporcionado por meio do PDE (Plano de Desenvolvimento

Educacional).

Ressaltamos também a importância do GTR (Grupo de Trabalho em Rede)

que foi uma das atividades realizadas durante a implementação do projeto na

escola, visando a interação virtual do professor PDE e professores da Rede Pública,

a participação efetiva dos cursistas nos debates e suas colocações fundamentadas

foram de grande importância para todos nós, mostrou a real preocupação com a

falta de leitura dos educandos e o comprometimento de cada um com o trabalho na

busca de incentivar a leitura.

Assim foi possível divulgar a proposta e desenvolver o conhecimento a

respeito do referido tema por meio das diversas estratégias utilizadas e sugeridas

pelo grupo para sanar tal dificuldade. De certa forma o GTR colaborou e muito para

27

a realização do método proposto. O gênero “conto” proporciona uma riqueza infinita

de detalhes, capazes de atrair a atenção do educando para desvendar as teias que

envolvem o texto, foram momentos prazerosos e enriquecedores os vividos durante

as leituras e discussões dos contos estudados, assim como de grande aprendizado

no que se refere ao uso da língua, às marcas utilizadas pelos escritores, o valor dos

conectivos, enfim todos os mecanismos que facilitam a compreensão de um texto.

Apesar dos imprevistos que envolvem o cotidiano escolar, foi possível

concretizar nosso intento. É possível avaliar que quando uma tarefa é realizada com

seriedade e responsabilidade o retorno é positivo e o efeito causado nos impulsiona

cada vez mais a acreditar num trabalho diferenciado em sala de aula, propiciando ao

aluno a descoberta de seu potencial e o prazer em saber que há possibilidade de

“aprender” por meio da leitura, e que esta proporciona o conhecimento que o levará

a um mundo, até então, pouco explorado mediante a sua dificuldade. Certamente, a

intervenção realizada por meio do gênero “Conto” foi muito importante para o

contexto escolar.

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