a importância dos recursos pedagógicos na...
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Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti
Mestrado em Educação Pré-Escolar
A importância dos recursos
pedagógicos na dinamização da hora do
conto
Por Diana Rute Leite Pinto
Sob a orientação de Mestre Maria Ivone Couto Monforte das Neves
Relatório de Estágio apresentado à Escola Superior de Educação de
Paula Frassinetti para obtenção do grau de Mestre em Educação Pré-
Escolar.
junho 2015
Aos meus pais.
Às minhas irmãs.
Ao André.
À Beatriz.
“Pedras no caminho? Guardo-as todas e um dia vou construir um castelo.”
Fernando Pessoa
RESUMO
O presente documento resulta da intervenção educativa levada a cabo
pela estagiária no contexto de Educação Pré-Escolar, no âmbito do mestrado
em Educação Pré-Escolar.
Este trabalho, cujo tema aborda “o impacto dos recursos pedagógicos na
dinamização da hora do conto”, pretende mostrar diferentes formas de
dinamizar a hora do conto, salientando a importância das histórias no
desenvolvimento global da criança.
Um dos objetivos da hora do conto é contar histórias de forma alegre e
agradável, a fim de cativar a criança para o universo da literatura, fomentando
nela o gosto pela mesma e ajudando-a no seu desenvolvimento.
Para isso, e para realizar a investigação proposta, no decurso da prática
profissional, procedeu-se a um estudo qualitativo. Como instrumentos de
investigação foram utilizados uma entrevista semi-estruturada realizada à
educadora cooperante e o método de análise empírica entrevista-conversa às
crianças da sala, constituindo, assim, os sujeitos em estudo.
Importa assim referir que este estudo permitiu concluir que apesar dos
recursos utilizados terem constituído um impacto positivo no desenvolvimento
do grupo, os que mereceram maior destaque foram as dramatizações
realizadas pelas crianças, assim como o uso do fantocheiro e do flanelógrafo.
Estes permitiram às crianças fortalecer as amizades, a cooperação, o trabalho
em equipa, assim como o desenvolvimento da imaginação e criatividade.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Pré-Escolar, hora do conto, histórias,
estratégias
ABSTRACT
This document results from the educational intervention carried out by a
trainee in the context of pre-school education under the master's degree in
Preschool Education.
This work addresses the theme "the impact of pedagogical devices in
boosting tale hour", aims to show different ways of stepping up storytelling,
emphasizing the importance of stories in the child's overall development.
One of the storytelling goal is to tell stories with a cheerful way in order to
captivate the child to the world of literature, fostering in them a taste for it and
helping it in its development.
For this, and to take carry out the proposed research in the course of
professional practice, we proceeded then to a qualitative study to realize
mentioned. As a research tool used the semi-structured interview to the
cooperating teacher and the empirical analysis method interview-conversation
to the children, constituting the subject under study.
It is therefore important to note that this study found that despite the
resources used have made a positive impact on the development of the group,
who deserved more prominent role plays were performed by children, as well as
the use of Puppeteer and flannel. These allowed children strengthen
friendships, cooperation, teamwork, and the development of imagination and
creativity.
KEYWORDS: Preschool Education, storytelling, stories, strategies
AGRADECIMENTOS
Este relatório foi o culminar de uma longa jornada, percorrida com muito
esforço e dedicação. Dela fizeram parte pessoas especiais, sem as quais nada
disto seria possível. Quero, assim, agradecer:
À Mestre Ivone Neves pelo saber partilhado, pela ajuda e orientação ao
longo deste percurso.
À Educadora Mónica e auxiliar Marisa pelo carinho, pela paciência e
pela disponibilidade, por nunca terem desistido de mim.
Às crianças de 3 anos, por todos momentos, todos os sorrisos e todos
os carinhos de uma amizade sincera. Por me terem feito crescer.
Á minha família pelo apoio incondicional, por acreditarem em mim.
Ao André por estares sempre ao meu lado e por todo amor.
À Beatriz por ser a melhor afilhada do mundo.
À Fátima, Marina e Joana por me terem acompanhado neste caminho,
por me terem feito rir e pela amizade.
À Cecinha pelo sonho realizado.
Ao Ruben e à Bina porque fizeram com que eu chegasse até aqui, pela
amizade sincera, por acreditarem que sou capaz.
Aos melhores amigos de sempre, por serem a minha família de coração.
(Ivo, Carolina, Isabel, João, Ana, Bruno, Teresa, Daniel, Moreira)
“O sonho comanda a vida”
António Gedeão
Índice
INTRODUÇÃO ......................................................................................... 9
CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO ..................................... 10
1.1 O sentido de Educar ..................................................................... 10
1.2 Referenciais pedagógicos que promovem práticas de qualidade 12
1.3 A importância de contar histórias ................................................. 15
1.4 A Hora do Conto ........................................................................... 17
1.5 O papel do educador .................................................................... 18
1.6 Dinamização da hora do conto: os recursos e estratégias
pedagógicas .................................................................................................. 19
1.7 Contributo de alguns estudos pertinentes sobre a temática ......... 21
CAPÍTULO II – METODOLOGIAS DE INVESTIGAÇÃO ....................... 23
2.1. Opções metodológicas ................................................................ 23
2.2. Pertinência do tema ..................................................................... 24
2.3. Sujeitos de estudo ....................................................................... 25
2.4. Instrumentos metodológicos e procedimentos ............................ 25
2.4.1. Observação ....................................................................... 25
2.4.2. Entrevista .......................................................................... 26
2.4.3. Entrevista-conversa ........................................................... 27
2.4.4. Análise do conteúdo .......................................................... 27
2.5. Análise e tratamento de dados .................................................... 27
CAPÍTULO III – CONTEXTO ORGANIZACIONAL ................................ 31
3.1. Caracterização da instituição....................................................... 31
3.2. Caracterização do meio, famílias e crianças ............................... 35
3.2.1 Caracterização do meio envolvente ................................... 35
3.2.2 Caracterização das famílias ............................................... 36
3.2.3 Caracterização do grupo de 3 anos .................................... 37
3.3. Traçado de prioridades de intervenção conjunta ao nível da
instituição e da comunidade ......................................................................... 47
CAPÍTULO IV – INTERVENÇÃO E EXIGÊNCIAS PROFISSIONAIS ... 49
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 53
BIBLIOGRAFIA ...................................................................................... 57
ÍNDICE DE ANEXOS
ANEXO 1 – REGISTO FOTOGRÁFIO
ANEXO 2 – REFLEXÕES
ANEXO 3 – EXEMPLOS DO PORTEFÓLIO DE CRIANÇAS
ANEXO 4 – PROJETO “OS ANIMAIS DA SELVA”
ANEXO 5 – PROJETO “A NOSSA CASINHA”
ANEXO 6 – INSTRUMENTOS DE INVESTIGAÇÃO
ANEXO 7 – GRELHAS DE OBSERVAÇÃO DA HORA DO CONTO
ANEXO 8 – REGISTOS DE OBSERVAÇÃO
ANEXO 9 – GRÁFICOS DE CARACTERIZAÇÃO SÓCIOFAMILIAR DO
GRUPO
9
INTRODUÇÃO
O relatório aqui apresentado foi realizado para a aquisição do grau de
Mestre em Educação Pré-Escolar. O estágio ocorreu na valência de jardim-de-
infância, numa sala de três anos, no ano letivo de 2014/2015, sob orientação
da Mestre Ivone Neves.
No início desse percurso, foram evidenciados as finalidades e os
objetivos da realização desta prática. Assim, neste escrito, consta o relato
desses momentos vivenciados na valência do jardim-de-infância, articulando-os
com os objetivos pretendidos, de salientar a caracterização da instituição
através da análise dos documentos de gestão, a aplicação de forma integrada
os conhecimentos necessários para a concretização da intervenção educativa
e o domínio e a utilização de métodos e técnicas relacionadas e adequadas ao
processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças.
No sentido de plasmar o trabalho desenvolvido, o presente relatório
encontra-se dividido em quatro capítulos.
No primeiro capítulo, procede-se ao enquadramento teórico, os
pressupostos teóricos em que se apoia o estágio e o levantamento de toda a
revisão da literatura que sustenta a investigação.
No segundo capítulo, apresentam-se os objetivos da pesquisa, a
metodologia e procedimentos de recolha e análise dos dados adquiridos.
No terceiro capítulo, de modo a perceber de que forma se organiza a
instituição, analisou-se os documentos de gestão da mesma, apresentando-se,
assim, a caracterização do contexto organizacional, a análise da intervenção
educativa, tendo em conta as características do grupo e das famílias, traçando
ainda as prioridades de uma intervenção conjunta ao nível da instituição.
No quarto e último capítulo, evidencia-se a prática pedagógica
desenvolvida em estágio no que se refere aos projetos lúdicos vivenciados e a
intervenção realizada ao nível das histórias, sendo explicitadas algumas
intervenções da equipa pedagógica ao longo do ano.
10
Por fim, são apresentadas as considerações finais, nas quais se
destacam os aspetos mais relevantes do trabalho desenvolvido, aludindo a
fatores que, proporcionaram o desenvolvimento pessoal e profissional.
O relatório completa ainda um conjunto de anexos, que evidenciam todo
o trabalho descrito.
CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO
1.1 O sentido de Educar
Ao atendermos ao conceito de educar denotamos que este deriva do
latim educare e educere que significa, especificamente, alimentar, assim como
“fazer sair, tirar de…” ou “tornar explicito”.
Este conceito é visto por Cabanas (2002: 52) como um “poliedro” de
várias fases onde se mobilizam “(…) uma dimensão pessoal, uma dimensão
social, uma dimensão relacional, uma dimensão cultural (…) uma dimensão
artística (…) uma dimensão psicológica, (…) uma dimensão afectiva”. Desta
forma, a educação é o resultado de uma ação praticada, na qual devem ser
criadas as condições necessárias para que a criança se desenvolva em todas
as dimensões e nas demais áreas do saber.
Neste sentido, o relatório apresentado pela Unesco apresenta os quatro
“pilares da educação” essenciais para o desenvolvimento de cada individuo:
Aprender a conhecer, isto é adquirir os instrumentos da compreensão; aprender a fazer, para poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver em comum, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades humanas; e finalmente aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes. (Delors, 1996: 77)
Sendo a educação, um conceito em constante alteração, cada vez mais
o jardim-de-infância tem um lugar de destaque na sociedade atual. Desta
forma, o capítulo II da Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar estabelece que:
A educação pré-escolar é a primeira etapa da educação básica no processo de educação ao longo da vida, sendo complementar da acção educativa da família,
11
com a qual deve estabelecer estreita cooperação, favorecendo a formação e o desenvolvimento equilibrado da criança, tendo em vista a sua plena inserção na sociedade como ser autónomo, livre e solidário. (Lei nº5/97, de 10 de fevereiro)
Neste sentido, entendesse que o processo educativo não é isolado,
sendo resultando da interação e comunicação dos demais intervenientes deste
processo.
Na Lei de Bases do Sistema Educativo, meio pelo qual se executa o
direito à educação, são estabelecidos um conjunto de oito objetivos dirigidos à
Educação Pré-Escolar (EPE), que o Educador de Infância deverá ter em conta
na sua intervenção, de onde se salienta o seguinte “estimular as capacidades
de cada criança e favorecer a sua formação e o desenvolvimento equilibrado
de todas as suas potencialidades” (Lei nº46/86, de 14 de outubro)
Para além de seguir estes objetivos, deverá reger-se ainda pelo exposto
nas Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE) “(…) a
organização do ambiente educativo, as áreas de conteúdo, as suas
intencionalidades educativas, nomeadamente o observar, planear, agir, avaliar,
comunicar e articular” (1997:14). É, ainda da competência do Educador
observar e escutar cada criança para que conheça os seus interesses e
necessidades, pois como refere o mesmo documento “observar cada criança e
o grupo para conhecer as suas capacidades, interesses e dificuldades (…) são
práticas necessárias para compreender melhor as características das crianças
e adequar o processo educativo às suas necessidades.” (1997:25)
Neste sentido, Oliveira-Formosinho (2000), afirma que a ação
profissional do educador de infância interliga conceitos como educar e cuidar,
tendo o dever de se orientar de acordo com as necessidades e interesses de
cada criança, gerindo o currículo de forma flexível e transdisciplinar.
Tal é consignado pelo DL n.º 241/2001, de 30 de agosto, onde se alude
que na EPE, o educador de infância “concebe e desenvolve o respectivo
currículo, através da planificação, organização e avaliação do ambiente
educativo, bem como das actividades e projectos curriculares, com vista à
construção de aprendizagens integradas.”
A criança é reconhecida, segundo as OCEPE (1997), como sendo o
sujeito do processo educativo por excelência e, por isso, deve-se partir do que
12
a criança já sabe, valorizando os seus saberes, como fundamento de novas
aprendizagens.
A criança tem um papel ativo na construção do seu desenvolvimento e
aprendizagem sendo, por isso, fundamental partir do que já sabem, respeitar e
valorizar as suas características particulares, para que através do que adquiriu
da família se possa desenvolver a todos os níveis.
Torna-se, desde então, essencial que o Educador seja um investigador
por excelência conhecendo bem o grupo de crianças bem como cada criança
individualmente, contribuindo para que cada criança se transforme “num ser
capaz de aceitar e respeitar o outro a partir da aceitação e do respeito de si
mesma.” (Maturana, 2002:29)
Devemos, portanto, considerar a criança como um ser competente,
capaz de construir conhecimento através das situações de aprendizagem
criadas. Assim, é de extrema importância que o Educador crie e proporcione
atividades e experiências significativas capazes de orientar e promover o
desenvolvimento, a aprendizagem e crescimento harmonioso da criança.
1.2 Referenciais pedagógicos que promovem
práticas de qualidade
Com a finalidade de apoiar o educador na organização da sua
intervenção educativa agindo com intencionalidade onde oferece
aprendizagens significativas para as crianças, existem vários modelos
curriculares para a EPE.
Como refere Oliveira-Formosinho (2007), o conceito de modelo
pedagógico refere-se a um sistema educacional compreensivo que se
caracteriza por culminar num quadro de valores, numa teoria e numa prática
fundamentada.
No decorrer deste ano de profissionalização, foram utilizados vários
modelos que funcionaram como suporte e fundamentaram a prática
profissional. Dois deles encontravam-se estipulados pelo Projeto Educativo
13
(PE) da Instituição sendo eles: Trabalho de Projeto (TP) onde se “pressupõe
uma visão da criança como um ser competente e capaz, como investigador
nato, motivado para a pesquisa e resolução de problemas” Vasconcelos,
1998:133); e o High-Scope pretendendo “reduzir o papel do adulto e conceber
à criança maior acção, maior iniciativa e maior decisão”. (Formosinho, 1998:60
in PE, 2014/2017: 15). Porém, na sala dos 3 anos a equipa pedagógica apoiou-
se também no Movimento da Escola Moderna (MEM).
O modelo High-Scope é regido por uma perspetiva construtivista onde o
indivíduo é visto como “o criador do seu próprio conhecimento, ao processar a
informação obtida pela experiência” (Spodek e Saracho, 1998:73). Assim, e
como preconiza Hohman e Weikart (2011) é através da ação com os objetos e
da interação com as pessoas, ideias ou acontecimentos que a criança constrói
o seu entendimento sobre as coisas, cabendo ao educador desempenhar as
funções de observar, planificar, documentar, avaliar e interpretar estas ações
inferindo as suas necessidades e interesses. Desta forma, tornou-se essencial
criar um ambiente organizado, que estimule e desafie o grupo, já que “num
contexto de aprendizagem ativa as crianças necessitam de espaço que sejam
planeados e equipados para que essa aprendizagem seja efectuada”
(idem:161). Foi notável a preocupação na organização do espaço e dos
materiais, mantendo a sala dividida em áreas de interesse específicas: área
dos jogos, das construções, da casinha, da biblioteca, da expressão plástica e
do fantocheiro, onde os materiais estavam expostos e disponíveis para usufruto
de todos, consoante os seus interesses. (Cf. Anexo 1 – Fotografias da sala e
Anexo 2 – reflexão sobre o espaço).
Também a rotina diária se baseou neste pressuposto, já que permite
uma estruturação para os acontecimentos do dia, pois “saber aquilo que espera
em cada parte do dia ajuda as crianças a desenvolver um sentido de
segurança e controlo” (Idem: 225). Este estabelecimento da rotina não implica
que esta não seja reestruturada consoante as necessidades do grupo,
adotando um carácter flexivo. (Cf. Anexo 2 – Rotina da sala). Esta rotina foi
criada com o objetivo de apoiar a iniciativa da criança, valorizando o processo
de planear-fazer-rever. Os momentos de assembleia são exemplo desse
14
processo, onde eram proporcionados às crianças momentos para planificar e
avaliar a semana identificando o que fizeram e o que queriam fazer na semana
seguinte. (Cf. Anexo 1 – fotografia 7)
Como instrumento de avaliação por parte da criança, foi criado o
portefólio onde são expostos trabalhos desenvolvidos pela criança, divididos
pelas diferentes áreas de conteúdo. Desta forma e, como referem Shores &
Grace (2001) damos a possibilidade à criança de analisar a qualidade do
trabalho realizado assim como participar na avaliação do mesmo. (Cf. Anexo 3)
A Metodologia de Trabalho de Projeto, surge da necessidade sentida
em envolver o grupo num processo de ensino-aprendizagem, que valorizasse a
participação das crianças e da equipa pedagógica num projeto comum. Neste
sentido, Katz e Charad (1997:3) mencionam que "um projeto é um estudo em
profundidade de um determinado tópico que uma ou mais crianças levam
acabo” tópico esse que parte dos interesses da criança. A autora defende
ainda que este não tem um tempo específico e determinado para se
concretizar, já que uma das suas principais características é a construção
progressiva, dado que se vai “concretizando através de um processo que tem
uma evolução que pode não ter sido inteiramente prevista, desde o início”
(Vasconcelos, 1998:94). Neste sentido, a autora defende que a construção do
projeto como possuidor de quatro fases, sendo estas: a definição do problema,
a planificação e lançamento do trabalho, a execução e por fim a avaliação e
divulgação do projeto. Durante a prática profissionalizante os projetos
vivenciados na sala foram “A Selva dos Animais” e “A Nossa Casinha” que
surgiram do interesse e curiosidade das crianças, pois o projeto “deverá
corresponder a uma iniciativa das crianças, tendo como ponto de partida os
seus interesses ou decorrendo de uma situação imprevista que desperta a sua
curiosidade.” (idem:102) (Cf. Anexo 4 e 5)
Por último, o Movimento da Escola Moderna assume uma perspetiva
social, onde o desenvolvimento é construído através das práticas sociais.
Segundo este modelo, o espaço educativo é visto como um local de iniciação
às práticas de cooperação e de solidariedade de uma vida democrática. De
acordo com Niza (1996:141) “(…) os educandos deverão criar com os seus
15
educadores as condições materiais, afetivas e sociais para que, em comum,
possam organizar um ambiente institucional capaz de ajudar cada um a
apropriar-se dos conhecimentos, dos processos e dos valores morais e
estéticos gerados pela humanidade no seu percurso histórico-cultural.
Desta forma, na sala, foram utilizados alguns instrumentos de
organização, de forma a coadjuvar o dia-a-dia do grupo, como o quadro dos
aniversários, o mapa de presenças e o registo das assembleias semanais. (Cf.
Anexo 1 – fotografias 7,8,9). Todos estes instrumentos têm como finalidade
organizar socialmente o trabalho e a vida comum do grupo, sendo manipulados
pelas crianças. Nas assembleias semanais, as crianças têm a possibilidade de
avaliarem a semana que terminou e planificar a seguinte.
Neste modelo, dá-se também importância ao envolvimento entre a
instituição, a comunidade e os pais, sendo que o educador deve estabelecer
uma relação entre a escola e a realidade. Desta forma, as escolas “devem ser
promotoras de políticas/estratégias que possibilitem um maior envolvimento
das famílias na vida escolar do filho. Os pais podem ser envolvidos de
diferentes formas, cabe à escola proporcionar uma diversidade de modalidades
de envolvimento parental” (Barros, 2008:148 in Carvalho, Samagaio, Trevisan,
Neves e Brás, 2011: 140). Na sala de atividades também foi possível observar
esta preocupação, já que existiram pais que se disponibilizaram a desenvolver
atividades com o grupo, assim como em realizar pesquisas e trabalhos que
foram sendo solicitados. (Cf. Anexo 1 – fotografia 10 à 17)
1.3 A importância de contar histórias
A criança vê a literatura como uma fantasia muito próxima da realidade,
um fervilhar de sentimentos e de saberes, que lhe permite recriar, inventar,
renovar e discordar sobre diversas temáticas. Desta forma, a leitura ou audição
de textos infantis permite à criança participar e opinar, estimulando-a no uso de
infindas capacidades cognitivas.
16
A literatura é, de facto, um excelente meio para promover o
desenvolvimento das potencialidades da criança, bem como das várias etapas
do crescimento.
Podemos ver a literatura como um espaço em que as crianças, de uma
forma ativa, vão-se acomodando da realidade em que se inserem,
desenvolvendo a criatividade; é um espaço imaginário, onde cada uma se
desenvolve. Esta é um lugar mágico, onde a criança amplia o seu mundo,
tornando-se alguém com capacidades criativas e estéticas.
Quem ouve histórias desenvolve a capacidade de entender e imaginar enriquecendo a sua leitura do mundo. Criam-se condições para que (…) amplie o seu mundo simbólico e desenvolva a consciência das suas emoções, vivenciando o conto como fazendo parte dele. (Jolibert, 2003 in Costa, 2012:56).
Através da audição e leitura de histórias as crianças tem a oportunidade
de enriquecer e sustentar a sua imaginação, alargar o seu vocabulário,
construir a sua própria autoidentificação, fortalecer o pensamento lógico assim
como a memória e o espírito crítico, experienciar momentos de humor e
diversão adquirindo, assim, valores que as sustentará para toda a vida.
De acordo com Cavalcanti (2005), as histórias são um fator de
desenvolvimento para as crianças, pois permite-lhes o conhecimento de si
mesmas, quer sendo através dos diálogos entre a realidade e a ação, quer nas
relações entre a família e o mundo, relacionando-se, desta forma, com o
mundo interior desenvolvendo a personalidade. Deste modo, a criança é cada
vez mais capaz de enfrentar os desafios que a vida lhe coloca, já que:
O conto contém mensagens secretas […] dialoga com a criança a um nível que não entendemos completamente, que não conseguimos justificar […] mas é um diálogo conseguido […] que a atinge na sua interioridade e que lhe permite proceder à arrumação da casa em desordem. (Costa, 1997:170).
No sentido em que ajuda a criança a compreender-se a si própria
promovendo o desenvolvimento e todos os aspetos da sua personalidade,
Bettelheim afirma que:
Para que uma história possa prender verdadeiramente a atenção de uma criança, é preciso que ela a distraia e desperte a sua curiosidade. Mas, para enriquecer sua vida, ela tem de estimular a sua imaginação; tem de ajudá-la a desenvolver seu intelecto e esclarecer as suas emoções; tem de estar sintonizada com suas angústias e as suas aspirações; tem de reconhecer plenamente suas dificuldades
17
e, ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam. (1985:11)
A leitura de histórias permite a exploração das emoções e sentimentos
fazendo com que as crianças se sintam cada vez mais confortáveis na sua
expressão e comunicação aos outros (Depondt, Kot & Moons, 2004:9).
Da mesma maneira, as histórias são necessárias na medida em que
auxilia a criança a desenvolver aspetos interiores como a construção dos
valores, do raciocínio, estimula a imaginação, a criatividade, a curiosidade, o
senso crítico e a disciplina que “é entendida como aceite e praticada
espontaneamente pela criança e não como algo imposto” (Dohme, 2011:18-
19). Para além disso comportam diversas vantagens nomeadamente:
desenvolvimento do sentido estético, do esquema temporal e espacial, o
autoconceito, a noção de “eu” e “o outro” e ainda da linguagem, enriquecendo o
repertório e o vocabulário, constituindo-se, também, fonte de conhecimento do
mundo.
1.4 A Hora do Conto
A Hora do Conto é um momento de diversão, alegria, fantasia, partilha,
imaginação, exploração e descoberta. Neste sentido, Taquelim (2011)
menciona que “contar histórias é dar colo”, já que a criança não esquece a voz
e o olhar de quem as conta, apreciando bastante destes momentos únicos e
inesquecíveis, recordando-os ao longo dos tempos.
No seu artigo, a autora distingue leitura em voz alta da atividade de
contar histórias. A primeira é realizada pelo adulto-mediador quando o texto já
é dominado, permitindo a este olhar quer para o livro, quer para as crianças
“abraçando com os olhos todo o grupo” (Taquelim, 2011:3). Já a atividade de
contar é equivalente ao ato de narrar sem utilizar o livro, onde o adulto pode
“manter ou abandonar um elemento, um gesto ou uma imagem quando conta”
(idem:4). Neste caso o adulto consegue contar de cor a narração entregando-
se totalmente a este momento.
18
Analisando a perspetiva de José António Gomes (1997), a hora do conto
ocupa um lugar de extrema importância na sala do ensino Pré-Escolar, sendo
esta a atividade capaz de proporcionar o desenvolvimento do prazer pela
leitura, que resulta da simples satisfação que as crianças sentem ao ouvir
contar histórias.
De acordo com o mesmo autor, a hora do conto deverá ser uma prática
diária no jardim-de-infância, destacando-se dos demais. Neste sentido,
Taquelim refere que estes momentos,
Podem ser muito variados, dependendo da natureza do grupo, da sensibilidade e perícia comunicativa do mediador e será importante que caminhem no sentido de possibilitar a construção de relações com e entre os livros, permitindo à criança, condicionada pela sua maior ou menor competência leitora, uma maior liberdade na projecção sobre o livro ou um texto em particular e a criação de um vínculo que faça regressar, mais tarde, à relação direta com a leitura (2011:1)
Merege (2005 in Moreno 2007:642) salienta que é importante que o
adulto se aproprie da história que vai contar, criando um ambiente de
encantamento para as crianças e recorra a comportamentos não-verbais (a
postura, a expressão facial, gestos), a entoação e expressividade na leitura, de
forma a que este momento seja verdadeiramente experienciado pelas crianças.
A hora do conto, sendo convenientemente concebida e planificada, onde
o livro é escolhido de uma forma criteriosa constitui a base da preparação da
criança para uma vivência onde a leitura é realizada com prazer.
1.5 O papel do educador
A escola é um dos locais onde o encontro da criança com o livro se
concretiza de uma forma mais cativante e lúdica. Para Mata (2008), ouvir
histórias está associado, quer aos conhecimentos em literacia, quer à
compreensão em leitura. Quanto maior a exposição à literatura infantil mais
desenvolvidas serão as concepções/ conhecimentos emergentes de literacia.
Atualmente são os educadores e os professores, os adultos, a quem
cabe o privilégio de estarem mais tempo com as crianças devendo, por isso,
fomentar o interesse pela literatura (Martins, 2004). Neste sentido, considera-se
que cabe ao jardim-de-infância proporcionar experiências literárias
19
diversificadas e ricas para a construção de leitores ativos. Desta forma, a hora
do conto é vista como um tempo onde se pode trabalhar a leitura nas suas
múltiplas vertentes devendo, por isso, fazer parte da rotina no jardim-de-
infância.
O educador deve utilizar diferentes estratégias para cativar a atenção da
criança e motivá-la. Assim, segundo Cavalcanti (2006) a hora do conto deverá
ser um momento harmonioso preparado com rigor e acolher a criança na sua
totalidade.
O educador deve promover estes momentos recorrendo a diversas
estratégias e recursos, com “toques especiais” de luz, cor, sons e cenários
capazes de prender a atenção da criança e transportá-los para a fantasia. Deve
igualmente preparar-se para este momento criando o ambiente e organizando
o espaço, sentar-se ao nível das crianças, cativá-las e seduzi-las. (Sim-Sim,
2007; Silva, 2002; Dohme, 2011).
O educador deve seguir alguns critérios na seleção das histórias que lê
sendo que a seleção da história deve estar de acordo com a idade e interesses
[e necessidades] das crianças e preparar a hora do conto (Ramos & Silva,
s/d:6).
1.6 Dinamização da hora do conto: os recursos e
estratégias pedagógicas
Para que o momento da hora do conto seja mais rico e vantajoso, pode-
se recorrer a diferentes estratégias utilizando os mais variados recursos
pedagógicos. Neste sentido e segundo Eiterer e Medeiros (2010) um recurso
pedagógico é um material que é construído para assegurar a adaptação
recíproca dos conteúdos e serem conhecidos por indivíduos que procuram
conhecer ou seja, aqueles materiais criados especificamente para um
determinado fim e aqueles que, apesar de não terem sido criados para tal
função, podem vir a adquirir o carácter pedagógico nos diferentes processos
educativos. Assim, segundo os mesmos, recurso pedagógico é “o que auxilia a
20
aprendizagem intencionalmente organizados por educadores na escola e fora
dela” (Eiterer e Medeiros, 2010)
A leitura ou a narração de histórias pode ser acompanhada de vários
recursos, tornando esta leitura mais agradável e cativante para as crianças.
Quando a leitura de uma história é dinamizada pelo educador/contador
de histórias através da interação da narrativa com a dramatização, os
adereços, a música e os cenários, pretende-se facilitar o melhor entendimento
do texto, facilitando o processo de aprendizagem da criança (Costa, 2012)
Segundo a opinião de Albuquerque (2000) quando o livro é utilizado
somente como meio de narração de histórias, está-se a limitar a imaginação e
a criatividade da criança, no sentido em que, através do livro, os cenários são
descritos bem como o retrato das personagens, fazendo com que a criança
seja obrigada a manter-se dentro dos limites das figuras incluídas no texto.
Por tal motivo, torna-se essencial dinamizar estes momentos, recorrendo
a diferentes técnicas de animação de leitura, indo para além da leitura
simplista. Desta forma, está-se a valorizar, não só o conteúdo da história, mas
também se promove o envolvimento das crianças na história, a motivação para
a hora do conto, a criatividade e a imaginação e o contacto com diferentes
manifestações artísticas.
Sempre que contamos uma história é essencial termos em conta, tal
como defende Marques (1988: 34) “a necessidade de construir um ambiente
familiar, no qual a leitura das histórias tenha lugar, evitando as situações
artificiais, as perguntas fora do contexto e a presença de estranhos que
intimidem a criança”.
Atendendo ao que é dito por Sim-Sim (2008) é essencial a criação de
uma rotina que inclua ouvir, ler ou narrar histórias. Deve, então, estabelecer-se
um momento específico na rotina diária do jardim-de-infância para ler histórias
ao grupo, escolhendo um sítio acolhedor e confortável para todos. Desta forma
a autora sugere ler “histórias servindo-se de material diverso: livros com
diferentes formatos e tipos, histórias gravadas em cassetes de áudio e vídeo,
álbuns de imagens, objetos reais, etc.” (2008:39).
21
Como referido, na animação da leitura, são utilizadas algumas técnicas
que complementam a história narrada e que devem ser adaptadas às idades
das crianças. Algumas dessas técnicas são:
“o auxílio do livro, utilizado durante a leitura e valorizando as suas ilustrações; a produção de sons que pretendem trazer para a realidade alguns momentos da narrativa; o convite a imaginar uma realidade ou a recordar uma memória no sentido de envolver o ouvinte; a associação com atividades de pintura ou canções; a utilização do flanelógrafo como suporte de imagens pertencentes à história; a utilização de fantoches dos personagens, entre outros” (Mata, 2008).
Em suma, existem inúmeras estratégias às quais se pode recorrer. De
entre eles salienta-se o recurso ao livro, ao flanelógrafo, ao fantocheiro ou às
novas tecnologias como o computador com projetor e tela, dramatizações feitas
pelo adulto, desenhos, histórias dramatizadas pelas crianças ou outras técnicas
proporcionem às crianças momentos de descontração, onde a fantasia se
mistura com a realidade.
1.7 Contributo de alguns estudos pertinentes
sobre a temática
Para além da pesquisa bibliográfica realizada anteriormente, foi
realizado o levantamento de investigações e estudos realizadas no âmbito
desta temática e que contribuíram para uma maior perceção da mesma.
Desta forma, um estudo realizado por Juliana Rodrigues da Escola
Superior de Educação Paula Frassinetti no ano de 2013, no qual se pretendia
perceber qual a importância e o impacto causado pela dinamização da hora do
conto nas crianças, foram entrevistadas 21 crianças de uma sala de jardim de
infância com idades compreendidas entre os 3 e os 4 anos, assim como a sua
educadora. Desta investigação surtiu que a educadora cooperante considera
importante a dinamização da hora do conto, sendo que esta deveria acontecer
nas salas pelo menos uma vez por semana. A mesma considera que este
momento é essencial para o desenvolvimento cognitivo e linguístico das
crianças, auxilia na concentração e na criatividade. No que se refere à técnica
que causou maior impacto no grupo esta considera que o conto redondo, o
22
teatro de sombras, o flanelógrafo e a mala das histórias fruíram mais impacto
nas crianças. Já as crianças, quando questionadas sobre a mesma temática,
revelaram que o momento da hora do conto que maior impacto teve para elas
foi aquando uma dramatização realizada pelo adulto.
Outro estudo realizado por Daniela Silva da Escola Superior de
Educação de Lisboa no ano de 2014, onde o objectivo era refletir sobre a
importância atribuída à hora do conto no desenvolvimento global da criança, foi
utilizada a técnica do focus group a uma grupo de 25 crianças de uma IPSS
com 3 anos de idade e um questionário e uma entrevista à educadora da sala.
Assim, foi possível concluir que 100% das crianças inquiridas gosta de ouvir
histórias, sendo que 71% prefere ouvir histórias com recurso a fantoches e que
29% prefere ouvir histórias com recurso ao livro. A educadora afirma que, na
sua prática, proporciona às crianças momentos de dinamização da hora do
conto, recorrendo às mais variadas técnicas, nomeadamente: com auxilio a
fantoches, a bonecos, ao teatro de sombras, imagens e recurso ao livro,
considerando de grande importância estes momentos para o desenvolvimento
da criança.
Numa investigação levada a cabo por Joana Maciel, em 2013, pela
Escola Superior de Educação Paula Frassinetti, onde o objetivo era
compreender a visão dos pais sobre a importância das histórias na vida dos
seus filhos, foram inquiridos através de um inquérito por questionário, 17 pais
de uma sala de crianças de 3 anos. As conclusões retiradas do estudo
efetuado são as seguintes: todos os pais consideram que as histórias permitem
à criança compreender o mundo que as rodeiam, sendo a relação estabelecida
com a criança fortalecida, acontecendo pela possibilidade de criação de uma
relação de amizade e intimidade com elas mais forte. Quando questionados
sobre o facto de as histórias permitirem à criança conhecer-se a si mesma, 6%
dos pais consideram que não permite e que 94% acredita que sim. No que se
refere ao lugar das histórias no dia-a-dia das crianças, 94% dos pais assume
que se deva contar histórias diariamente, sendo que 6% considera suficiente
realizá-lo uma vez por semana. Aquando o questionamento sobre conhecerem
estratégias para se contar histórias e à sua importância 94% dos pais
23
revelaram conhecer estratégias para o efeito, sendo que 88% destes considera
importante o uso destas e 6% pouco relevante. Estes justificam ainda as suas
opções referindo que são um instrumento que promove o desenvolvimento da
criança, já que permite a consolidação da expressividade, da imaginação, da
criatividade, no domínio do concreto e do absoluto.
O levantamento destes estudos foi bastante benéfica para a
investigação, pelo que foi possível compreender que a hora do conto é vista
como um momento de extrema importância quer pelos educadores, crianças e
pais. Todos consideram que este ato deva acontecer diariamente na vida das
crianças pois auxilia no desenvolvimento cognitivo e linguístico, na
concentração e na criatividade. Os recursos pedagógicos facilitam estes
momentos dando-lhes um “toque especial”, tornando-se evidente o seu uso.
Pelos estudos realizados, é possível concluir que os recursos mais utilizados e
que mais interesse provocam às crianças são: conto redondo, o teatro de
sombras, o flanelógrafo, a mala das histórias e a dramatização realizada pelo
adulto.
CAPÍTULO II – METODOLOGIAS DE
INVESTIGAÇÃO
2.1. Opções metodológicas
A experiência e a vivência que cada criança faz do processo de
socialização no jardim-de-infância são decisivas, não sendo, por isso, possível
realizar nenhum estudo de caráter pedagógico nem investigativo, sem se
conhecer o campo onde se irá intervir. O objetivo deste estudo de investigação
é perceber qual a importância que a narração de histórias tem num grupo de 3
anos e quais os recursos pedagógicos de animação da hora do conto que têm
mais impacto no desenvolvimento da criança.
24
Definida a temática a abordar e os objetivos tornou-se essencial definir
que tipo de metodologia que se deve utilizar. Metodologia que, ao ser
escolhida, “deve depender da orientação do investigador, das suas crenças, da
sua preferência e, sobretudo, da questão colocada” (Fortin, 2009:37).
Tendo em conta os objetivos definidos, considerou-se adequado a
utilização de um método de análise intensiva, já que permite realizar uma
abordagem qualitativa da realidade.
Desta forma, o estudo de caso é a metodologia de investigação mais
adequada já que se “procuram analisar, descrever e compreender
determinados casos particulares” constituindo assim “uma técnica apropriada
para procurar explicar os aspetos pertinentes de um dado acontecimento ou
situação.” (Lessard-Hébert et al, 1994 in Morgado, 2012:57)
É evidente que a teoria constitui um papel importante nos distintos
momentos da investigação. Neste sentido, Quivy & Campenhoudt, salientam a
necessidade de “explorar teorias, de ler e reler as investigações exemplares e
de adquirir o hábito de refletir antes de se precipitarem sobre o terreno ou
sobre os dados, ainda que seja com as técnicas de análise mais sofisticadas.”
(2008:50)
2.2. Pertinência do tema
Através das histórias, a criança enriquece e alimenta a sua imaginação,
desenvolve o seu vocabulário, desenvolve o pensamento lógico e a memória,
satistaz a sua curiosidade e adquire valores essenciais para a vida. Para além
disso, vive momentos de humor e diversão.
Neste sentido e, segundo Parafita (2007):
“A Hora do Conto é uma valiosa atividade de animação à volta das histórias, sejam elas lidas ou narradas oralmente. O seu objetivo é despertar nas crianças o gosto e o prazer da leitura a partir da magia dos contos e, ao mesmo tempo, exercitar a expressão oral, a capacidade de retenção de informação e a criatividade. Lidas ou contadas, depois exploradas e dramatizadas consoante o nível etário das crianças, as histórias voam nas asas da sua imaginação, estimulando nelas a curiosidade pelos saberes, o gosto pela descoberta.”
25
2.3. Sujeitos de estudo
Para a realização deste trabalho de investigação a amostra é composta
por 19 crianças da sala dos 3 anos contando com a colaboração da educadora
cooperante.
O grupo de crianças tem idades compreendidas entre os 3 e os 4 anos
de idade e é constituído, maioritariamente, por crianças do género masculino,
havendo 5 crianças do género feminino e por 14 do género masculino.
2.4. Instrumentos metodológicos e procedimentos
Tendo consciência de que as pesquisas qualitativas se conciliam de
diversos métodos que sustentam a recolha de informação, cabe ao
investigador selecionar os que mais se adaptam ao que pretende compreender
e investigar. Desta forma, foram selecionados alguns instrumentos
metodológicos para intervir da forma mais eficaz possível, sendo eles: a
observação, a entrevista semi-estruturada (Cf. Anexo 6 – 1) e a entrevista-
conversa. (Cf. Anexo 6 – 2)
2.4.1. Observação
A observação foi a principal técnica de recolha de informação utilizada,
já que facilita a compreensão direta dos vários fenómenos decorrentes do
contexto, ou seja, que permite conhecer o contexto e as interações das
pessoas que aí se encontram integradas. Neste sentido e, para que esta
técnica resultasse foi fundamental estabelecer, com os participantes, uma boa
relação e ganhar a sua confiança, para que se sentissem o mais à vontade
possível, fazendo confidências que de outro modo seriam impossíveis.
(Morgado, 2013). Esta observação considera-se de caráter participante já que
permite “estudar uma comunidade durante um longo período, participando na
sua vida coletiva” (Quivy & Campenhoudt, 2008: 197). Assim, a técnica
qualitativa é a que mais de adequa já que se deseja “compreender um meio
26
social que, à partida, lhe é estranho ou exterior e que lhe vai permitir integrar-
se progressivamente nas atividade das pessoas que nele vivem” (Lessard-
Hébert, Goyette e Boutin, 1994:155)
Esta observação foi acompanhada por fotografias e por diversos
registos, já que “a observação direta pode assumir diversos formatos” (Oliveira-
Formosinho, 2002:180). Neste sentido, Bogdan e Biklen consideram que “a
fotografia está intimamente ligada à investigação qualitativa” (1994: 183). Desta
maneira é possível analisar situações que em observação direta não nos
despertam a atenção. Foram produzidos registos de incidentes críticos, que
“(…) são breves relatos narrativos que descrevem um incidente ou
comportamento considerado importante para ser observado e registado.”
(Oliveira-Formosinho, 2002: 181); listas de verificação, que “…ajudam a
focalizar a atenção do observador, particularmente quando são muitos os itens
a ser observados.” (Oliveira-Formosinho, 2002:187) e ainda grelhas de
observação.
2.4.2. Entrevista
A entrevista também foi uma das técnicas que sustentou esta
investigação, sendo realizada à educadora cooperante.
Neste sentido e tendo em conta o defendido por Máximo-Esteves (2008:
92),
A entrevista é um acto de conversação intencional e orientado, que implica uma relação pessoal, durante a qual os participantes desempenham papéis fixos: o entrevistador pergunta e o entrevistado responde. É utilizada quando se pretende conhecer o ponto de vista do outro.
A entrevista à educadora cooperante teve caráter semiestruturado já que
a realização da mesma deve ter como “ponto de partida um guião mais
estruturado, que versa um leque de tópicos previamente definidos pelo
entrevistador.” (idem: 96), sendo possível valorizar a presença do investigador
de modo a que o entrevistado tenha a liberdade de responder de modo natural
e sincero.
27
2.4.3. Entrevista-conversa
As entrevistas realizadas às crianças foram de índole entrevista-
conversa de grupo, também esta uma técnica qualitativa. Este tipo de
entrevista caracteriza-se por ser
“orientado por grandes blocos temáticos intercomunicáveis que permitem uma deambulação temática que se afigura constantemente pertinente e lógica, porque todos os temas planeados têm pontos de comunicabilidade, mais ou menos evidentes e mais o ou menos fáceis de conduzir e orientar.” (Saramago, 2001:14)
Devido ao imprescindível cuidado na realização deste tipo de
entrevistas, utilizou-se uma linguagem simples e cuidada, de modo a que as
crianças entendessem tudo o que se ia perguntando. A entrevista foi realizada
em grupos 6/7 crianças sendo explicado às crianças, no início de cada
entrevista, qual a finalidade das suas respostas. Para facilitar a resposta às
questões colocadas, foi mostrado aos grupos algumas imagens das histórias
contadas, refrescando a memória de cada criança.
2.4.4. Análise do conteúdo
Depois de terminada a recolha de informação é importante proceder à
análise qualitativa do conteúdo. Segundo Bardin (1995, in Morgado, 2012:102)
a análise de conteúdo é “um conjunto de técnicas de análise utilizadas para
examinar e efetuar inferências sobre o significado da informação previamente
recolhida”. Esta é uma técnica para o tratamento de dados que se propõe a
identificar o que é anunciado acerca de um assunto (Vergara, 2005). Esta
análise está relacionada com a análise temática, visto ter como princípio
revelar as representações sociais ou os juízos dos locutores a partir de em
exame de certos elementos constitutivos do discurso (Quivy & Campenhoudt,
2009:228).
2.5. Análise e tratamento de dados
Correspondendo a investigação a um estudo explicativo acerca do
impacto das estratégias utilizadas na dinamização da hora do conto e da
28
importância que contar histórias adquire num grupo de crianças de três anos,
houve a necessidade de recorrer à utilização do método de análise do
conteúdo, nomeadamente na análise das entrevistas realizadas à educadora e
às crianças da sala. (Cf. Anexo 6 – 5/6)
Atendendo à entrevista realizada à educadora cooperante, no que se
refere à categoria da dinamização da hora do conto pode-se concluir que esta
considera importante a contemplação do momento da hora do conto, quer no
PAA, “no sentido de promover que todas as valências se juntem e também
dinamizem o conto”, quer na planificação semanal devendo “ser promovido,
pelo menos, uma vez por semana utilizando diferentes técnicas” uma vez que
“são importantes para o desenvolvimento das crianças já que para além de
divertir a criança, ajuda as crianças a crescer e a desenvolver-se em muitas
área.” (Cf. Anexo 6 – quadro 1). Esta ideia corrobora com o que é defendido
por Sim-sim (2008) que salienta a necessidade de se criar uma rotina que
abarque ouvir, ler e narrar histórias, sendo que esta deva acontecer pelo
menos uma vez por semana na sala de atividades. De igual modo, o mesmo é
comprovado pelo estudo de Rodrigues (2013).
Remetendo agora para a importância deste momento na educação pré-
escolar a educadora considera que as histórias “servem para falar de diversos
temas, diversos objetivos” salientando que “se a hora do conto for vivida,
sentida e com entusiasmo por parte [do adulto], conseguimos trabalhar e
transmitir esse entusiasmo para a criança”. (Cf. Anexo 6 – quadro 2)
A ideia apresentada por Dohme (2011) de que as histórias alcançam
vários fins nomeadamente a construção dos valores, do raciocínio, estimula a
imaginação, a criatividade, a curiosidade e o senso crítico. Esta é atestada pela
educadora que partilha da mesma opinião “desenvolvem a imaginação, a
linguagem, o falar oralmente em público, na articulação de ideias, na
criatividade, na dramática e também serve para diversas aprendizagens.” (Cf.
Anexo 6 – quadro 2)
À posteriori tentou-se entender, tendo por base a categoria das
estratégias de dinamização da hora do conto, e de entre as técnicas utilizadas
ao longo do ano, qual teria sido a que despoletou mais interesse e
29
entusiasmado às crianças, contribuindo positivamente para o seu
desenvolvimento. A educadora reconhece que todas as técnicas utilizadas
foram importantes, porém considera que “as dramatizações com as crianças
foram as que mais impacto tiveram” sendo que “o teatro de fantoches ou de
sombras é sempre um momento especial para eles porque não é todos os dias
que têm” (Cf. Anexo 6 – quadro 3). Remetendo este aspeto ao estudo
desenvolvido por Rodrigues (2013) verificámos que também nele se considera
que o flanelógrafo, os fantoches e as sombras chinesas são técnicas
adequadas e entusiasmantes para as crianças.
Já na opinião das crianças quando confrontadas com a mesma questão,
a grande maioria referiu as dramatizações feitas por elas na história do
“Cuquedo” e “Todos no sofá” e ainda o fantocheiro com a história dos três
porquinhos. (Cf. Anexo 6 – quadro 7). Por seu torno, o estudo realizado por
Rodrigues mostra que a técnica preferencial foi a dramatização realizada pelo
adulto.
Com o uso destas técnicas, denota-se que as crianças não ficaram
somente pelo interesse e entusiasmo no momento da hora do conto,
procurando o espaço da biblioteca, o fantocheiro e as máscaras nos momentos
de atividade livre, tal como menciona a educadora “eu penso que sim (…)
depois de implementarmos técnicas (…), como o flanelógrafo, as máscaras
para dramatizar, o fantocheiro, viu-se que as crianças começaram a procurar
mais esse espaço”. (Cf. Anexo 6 – quadro 4; Anexo 8 – descrições diárias 3, 7,
10, 11,12)
Remetendo a análise para o impacto que estas técnicas tiveram no
cultivo do gosto pela leitura e na sua influência nos comportamentos da criança
e educadora denota que “notei nas crianças mais tímidas que se sentiram mais
à vontade e conseguiram vestir a personagem” além disso “ao nível do trabalho
em equipa entre eles se conseguiram organizar” e também “notei uma certa
autonomia, uma boa disposição e uma cedência de personagens entre eles”.
(Cf. Anexo 6 – quadro 4). Neste sentido Bettelheim (1985) sustenta que uma
história que prenda verdadeiramente a atenção da criança, faz com que esta se
30
sinta mais segura de si própria promovendo o seu desenvolvimento e o da sua
personalidade.
Aludindo-se agora à entrevista-conversa realizada com as crianças onde
aquando questionadas sobre o interesse em ouvir histórias, foi unanime todas
apreciarem este momento diversificando os motivos: “porque me fazem rir”,
“porque depois posso contar aos outros”, “porque eram engraçadas”, “porque
eram divertidas”, “porque algumas tinham animais” e “porque se faziam vozes
giras” remetendo para a expressividade que o leitor faz das mesmas. (Cf.
Anexo 6 – quadro 6). Tal como é exposto por Cavalcanti (2006) a hora do conto
deve ser um momento proporcionado com rigor e acolher a criança na sua
totalidade.
Ao serem questionados sobre o facto de após a audição das histórias
procurarem o espaço da biblioteca, do fantocheiro ou das máscaras para
brincarem nas atividades livres. Das respostas apresentadas é possível
ressaltar que as crianças consideram que depois de ouvir as histórias
procuravam mais estas áreas. Estes justificam esta atitude “eu ia porque
gostava de ler as histórias”, “eu ai porque gostava de brincar com os fantoches”
e “eu também ia porque gosto de tirar e pôr as imagens no fanógrafo”. Apesar
disso ainda existiram crianças que preferiam outras áreas. (Cf. Anexo 6 –
quadro 7).
No que se refere ao envolvimento das famílias a educadora considera
que as famílias tivessem aderido mais à iniciativa, mas que os que
participaram, fizeram-no de forma positiva, respeitando a imaginação e
trabalhando em conjunto com a criança. (Cf. Anexo 6 – quadro 5)
Por seu torno as crianças, deparadas com a mesma questão
mencionaram ter gostado deste momento, pois foi bom ter a participação dos
pais nesta dinâmica já que estes os ajudaram muito e que foi divertido. Após
estas apresentarem aos amigos o trabalho realizado, estes consideram ter
curiosidade em experimentar os fantoches e, por isso, procuravam mais esta
área. (Cf. Anexo 6 – quadro 8)
Relativamente às grelhas de observação (Cf. Anexo 7) dos momentos
da hora do conto dinamizados, a maioria das crianças manifestou-se atenta e
31
entusiasmada durante a leitura, sendo rara a que tinha uma atitude de
abandono da mesma, expressaram de forma coerente a sua opinião quer no
decorrer, quer no final da história, respondendo às questões colocadas e
recontando-a de forma sequenciada. Muitas vezes pedem para voltar a ouvir as
narrativas contadas.
Após a leitura, os materiais usados eram colocados à disposição das
crianças para que estas pudessem usá-los nas atividades livres. Como
podemos observar pelos registos de observação, após as estratégias
implementadas, as crianças sentiram-se mais predispostas, motivadas e
interessadas em frequentar estes espaços enriquecendo as suas brincadeiras,
fortalecendo os laços de amizade, cooperação e trabalho em equipa. Para
além disso, auxiliaram as crianças no seu crescimento e desenvolvimento
como no enriquecimento da imaginação, da criatividade, da linguagem (quer ao
nível do repertório quer ao nível do vocabulário), fortalecimento do pensamento
lógico, da memória e do espírito crítico. (Cf. Anexo 9)
Através desta análise foi possível apurar a perspetiva da educadora
quanto à temática em estudo e ainda conhecer qual a estratégia ou estratégias
que conseguiram causar maior impacto para o grupo. Assim verificou-se que
quer a educadora, quer as crianças consideram que a técnica que mais
despertou o interesse foi as dramatizações realizadas pelas crianças, sendo
que para estas o fantocheiro também as motivou.
CAPÍTULO III – CONTEXTO
ORGANIZACIONAL
3.1. Caracterização da instituição
Para realizar a caracterização da realidade da instituição, recorreu-se à
análise dos seguintes documentos reguladores da atividade da mesma: Projeto
Educativo (PE), Plano Anual de Atividades (PAA) e Regulamento Interno (RI).
32
De igual modo, considera-se relevante a análise de algumas informações
recolhidas a partir de conversas informais e observações efetuadas.
Entende-se por Projeto Educativo o
“documento que consagra a orientação educativa da escola, elaborado e aprovado pelos seus órgãos de administração e gestão para um horizonte de três anos, no qual se explicitam os princípios, os valores, as metas e as estratégias segundo os quais a escola se propõe cumprir a sua função educativa” (ME, DL nº 75/2008,
Artigo 9º).
Por outras palavras, é o documento regulador de toda a atividade do
Centro Educativo, assim como as suas práticas. Este pretende definir uma
linha de ação para a instituição, identificando o centro educativo e os seus
atributos e nomeando um conjunto de metas a atingir para o período de tempo
que é estipulado.
Segundo Costa (1991: 32), o Projeto Educativo deve responder a quatro
questões fundamentais “quem somos?”, “onde estamos?”, “que pretendemos?”
e “de que meios dispomos?” obedecendo ainda a um determinado conjunto de
indicadores a ter em conta na sua elaboração. Este deve espelhar tudo o que
constitui a escola nomeadamente: as estruturas físicas e humanas,
possibilitando que a escola conheça bem toda a comunidade educativa, bem
como do seu meio envolvente; a identificação dos seus recursos humanos e
materiais e a construção colectiva de um plano de atividades que vai tentar dar
resposta aos problemas detetados.
De acordo com Costa (1991) a construção de um Projeto Educativo deve
obedecer a um conjunto de critérios próprios.
Primeiramente pode-se salientar que o primeiro ponto a que se refere o
autor, nota prévia, não se encontra neste documento, sendo substituído por
uma introdução onde é descrito o conceito de projeto educativo e não
apresenta qual a sua importância para a instituição.
O segundo tópico deve assentar na definição de escola que nos é
apresentado por uma definição da fundadora da instiuição como sendo “um
espaço em permanente mudança, em permanente movimento” e devendo ser
encarada “através da leitura atenta do nosso tempo” (PE, 2014/2017:26). Neste
documento não se encontra qualquer referência feita ao posicionamento
metodológico salientando apenas que a instituição assenta em três dimensões
33
principais: a humano-espiritual, a social e a vocacional-pastoral, tendo como
finalidade educativa a “promoção global e harmoniosa da pessoa para que,
através de relacionamentos positivos, amadureça no conhecimento e na estima
de si e da realidade que circunda”
O segundo tópico diz respeito a caracterização contextual, ou seja a
análise do seu meio circundante, o enquadramento legal, os elementos
materiais e humanos da instituição. Neste sentido, podemos constatar que
existe no documento a referência aos elementos humanos (idem:17-18). No
que se refere aos materiais, constata-se que não existe qualquer tipo de
referência feita, nem aos materiais que existem nas salas nem no exterior.
Pode ainda acrescentar-se que o PE da instituição menciona características do
seu meio circundante assim como descreve as suas infra-estruturas (idem: 19-
20).
A definição de objetivos gerais também se encontra presente neste
documento, incluindo todos os pontos sustentados pelo autor referido. Apesar
de se encontrar referência feita às estruturas organizacional e funcional da
instituição (idem: 11-12), este deveria conter uma melhor explicação sobre a
forma como se estruturam os órgãos de gestão, organização académica e
administrativo-financeira.
No que se refere às disposições finais, divulgação do projeto, avaliação
e revisão, apenas é referida a avaliação.
Neste sentido, pode-se concluir que este documento deve ser revisto e
analisado com maior frequência pela comunidade educativa, a fim de o
melhorar.
O Regulamento Interno (RI) é o “documento que define o regime de
funcionamento da escola, de cada um dos seus órgãos de administração e
gestão, das estruturas de orientação e dos serviços de apoio educativo, bem
como os direitos e os deveres dos membros da comunidade escolar” (DL nº
75/2008, Art 9º).
Este documento surge na sequência do PE, já que se trata de um
instrumento de sistematização da organização escolar (Antunéz, 1987: 12).
34
Existem várias estruturas que orientam a organizar um Regulamento
Interno, nomeadamente: generalidades, organização funcional e administrativa
da instituição, da convivência na instituição, regime económico, regime de
disciplina e alterações ao RI. (Costa, 1991:32)
Partindo para uma análise mais profunda do RI e, tendo por base a
estrutura definida anteriormente, pode-se referir que este se encontra dividido
em capítulos, sendo que muitos dos itens sustentados não são comtemplados
no documento da instituição.
É importante referir que no documento não são evidenciados diversos
pontos como: a identificação dos órgãos de gestão, identificação da associação
de pais e a associação de estudantes (talvez por não se aplicar nesta
realidade). Também não faz referência a aspetos como a convivência nas
salas, saída/entrada de um edifício; material escolar disponível (somente refere
o material que cada criança deve possuir marcado com o seu nome),
biblioteca, refeitório, pavilhões, locais específicos, serviço sociais e
assistenciais e técnicas pedagógicas.
Podemos ver que o regulamento interno faz referência aos direitos e
deveres das crianças, colaboradores e encarregados de educação ainda que
de uma forma muito vaga e também refere as normas gerais de regime interno.
Após esta análise pode-se concluir que, na sua grande maioria, este
documento não possui os requisitos definidos por Costa (1991).
O Plano Anual de Atividades é definido como um dos “documentos de
planeamento, que definem, em função do projeto educativo, os objetivos, as
formas de organização e de programação das atividades e que procedem à
identificação dos recursos necessários à sua execução” (DL nº 75/2008, Art9º).
Neste sentido, na elaboração deste documento, deverão ser tidos em
conta três aspetos fundamentais: “os princípios apresentados e os objetivos
propostos pelo PE da Escola; as orientações decorrentes da análise do
Relatório Anual de Atividades da Escola do ano letivo anterior; um
levantamento das necessidades a partir de um diagnóstico da situação real
(comunidade educativa, recursos materiais, quadro legal, …) do ano letivo a
que o plano se refere.” (Costa, 1991:27-28).
35
Este documento encontra-se bem estruturado, apresentando um
conjunto de atividades a realizar no decorrer do ano letivo, pelas diferentes
valências, sendo distribuídas por onze meses (setembro a julho). Para cada
mês são apresentadas as atividades, os objetivos, estratégias e recursos que
auxiliam o desenvolver das atividades para esse mês. Apresenta ainda uma
breve caracterização do grupo-alvo assim como uma lista das identidades que
desenvolve parcerias e que tipo de intervenção faz com elas.
São delineados no início de cada ano letivo as parcerias e as atividades
que são de carácter “obrigatório” na instituição e estão descritos no PAA.
Neste documento, podemos ter uma visão geral das atividades a realizar
durante o ano, sendo importante salientar os dias da família, pai e mãe, o natal,
a páscoa e, de forma particular, o dia da padroeira da Instituição que é vivido
com grande alegria por todos.
Estes documentos são de extrema importância para cada instituição,
pois determinam o bom funcionamento de uma instituição e o caráter eficaz da
mesma pela intervenção que terá junto dos diversos elementos da comunidade
e estruturas educativas sendo encarado como um benefício do processo
ensino-aprendizagem.
3.2. Caracterização do meio, famílias e crianças
3.2.1 Caracterização do meio envolvente
Conhecer o contexto onde está inserida a Instituição possibilita, à
comunidade escolar, o desenvolvimento de ações que dêem resposta às
necessidades e interesses das crianças que nela se encontram. Normalmente,
o meio é possuidor de recursos que podem e devem ser aproveitados para fins
educativos, com vista a alargar o conhecimento dos alunos e potenciar o
desenvolvimento das várias competências, aproximando-os da comunidade em
que estão inseridos e que não devem ser descurados pela instituição escolar
(DL nº 241/2001).
36
Esta instituição pertence ao distrito do Porto situada, segundo o PE
(2014/2017), na zona mais antiga da cidade. Tem localização privilegiada, já
que se encontra numa zona onde o movimento turístico é forte e, por isso tem
ao seu dispor inúmeras entidades. Todos estes espaços têm imenso potencial
educativo, e se forem bem aproveitados podem fornecer às crianças da
instituição uma educação de qualidade. Por terem uma localização próxima da
instituição permite com que as crianças se possam descolar a pé, não
necessitando de transporte, podendo assim ter um contacto mais próximo com
o meio que a rodeia.
3.2.2 Caracterização das famílias
Sabe-se que a família é o primeiro modelo das crianças. Assim, a
comunicação verbal e não verbal entre pais e filhos, as vivências de amor e
respeito e os valores, constituem aspetos importantes para o desenvolvimento
e formação da personalidade e de aprendizagem das crianças. Nesta linha de
pensamento, Hohmann e Weikart (2009), diz-nos que “é obvio que o impacto
da vida familiar – em toda a sua complexidade – afeta todos e cada um dos
aspectos de desenvolvimento da criança”. Desta forma, torna-se indispensável
o conhecimento das famílias das crianças.
Considera-se que a projeção de uma qualidade educativa por parte do
educador é mais significativa quando aplicada a um contexto que pressupõe o
conhecimento das vivências das crianças, nomeadamente, no seu meio
social/familiar, na comunidade e no meio envolvente (ME, 2007).
No que se refere à zona de residência das crianças é possível constatar
que as famílias das crianças da sala dos três anos pertencem ao distrito do
Porto, distribuindo-se pelos mais variados concelhos sendo estes concelho do
Porto, Vila Nova de Gaia, Gondomar e Matosinhos. (Cf. Anexo 9 – gráficos 1 e
2)
No que concerne à distribuição das famílias por freguesia, podemos
verificar que a freguesia predominante é Massarelos, sendo as outras famílias
distribuídas pelas mais variadas freguesias. Pode-se ainda salientar que com
37
esta diversidade de freguesias, e avaliando pela sua distância da Instituição, a
maioria das crianças têm de se deslocar de carro ou de transportes públicos
para as instalações. (Cf. Anexo 9 – gráfico 3)
No que respeita às habilitações literárias dos pais, são um dado
igualmente importante para a caracterização das famílias, já que nos dão pistas
e indicadores relativos ao nível social e económico. A maioria das mães
concluiu o ensino secundário, sendo que a maioria dos pais possuem
licenciatura ou o ensino secundário. (Cf. Anexo 9 – gráficos 4 e 5)
Relativamente às profissões, as mães apresentam uma grande
variedade, sendo que quatro mães trabalham na área de loja/comércio/balcão
e na área do secretariado e administração; os pais trabalham essencialmente
na área de loja/comércio/balcão, na área da saúde e comercial de vendas e
nas áreas de gestão, educação, restauração e informática. (Cf. Anexo 9 –
gráficos 6 e 7)
Pode-se constatar através desta análise que na sua maioria as crianças
ou são filhos únicos e que as restantes têm apenas um irmão ou mais. (Cf.
Anexo 9 – gráfico 8)
Pode-se ainda referenciar que as mães são na sua maioria os
encarregados de educação das crianças e que todas as crianças frequentaram
a creche, sendo que só treze crianças frequentaram a creche da Instituição em
questão. (Cf. Anexo 9 – gráfico 9 e 10)
3.2.3 Caracterização do grupo de 3 anos
“Todas as crianças nascem com potencialidades peculiares a cada uma
delas. Cada criança tem um esquema de desenvolvimento único, determinado
por essas potencialidades e pelo seu meio ambiente” (Gesell, 1996:23).
Quando nos referimos à caracterização de um grupo de crianças, para a
sua análise torna-se importante “observar cada criança e o grupo para
conhecer as suas capacidades, interesses e dificuldades, recolher as
informações sobre o contexto familiar e o meio em que as crianças vivem”
(ME:1997:25). Neste sentido, as características do grupo de crianças surgiu da
38
observação atenta do grupo, do diálogo através do qual expunham os seus
interesses e necessidades, de conversas informais com os diversos
intervenientes e, ainda, da recolha de dados das fichas de caracterização e
inscrição preenchidas pelos pais, no período inicial do presente ano letivo.
Importa, assim, caracterizar o grupo de crianças com o qual trabalhamos, ao
longo da ação educativa, nas diferentes dimensões.
O grupo de crianças com o qual foi possível interagir, brincar,
acompanhar e trabalhar é constituído por dezanove crianças, com três anos de
idade, das quais catorze são do sexo masculino e cinco do sexo feminino,
todas elas vindas da creche, porém só treze delas frequentaram a creche da
Instituição.
Duas crianças estão sinalizadas com NEE, possuindo uma um atraso a
nível do desenvolvimento da linguagem, precisando de ajuda de uma terapeuta
da fala, sendo acompanhada uma vez por semana na sala de atividades por
uma educadora de ensino especial. Segundo Papalia et al (2001:323) “a
terapia da fala e da linguagem para crianças com atraso no desenvolvimento
deve começar com uma avaliação profissional tanto da criança como da
família”. A outra criança tem problemas a nível de comportamento e atenção,
sendo acompanhado por uma psicóloga que vai á sala mais ou menos uma vez
por mês e a acompanha periodicamente fora da instituição. Existe ainda uma
criança que foi recentemente encaminhada para uma equipa de profissionais
(que estabelecem protocolo com a instituição) a fim de fazerem uma avaliação
diagnóstica mais pormenorizada. De modo a realizar uma caracterização mais
atenta do grupo, esta irá abranger o desenvolvimento cognitivo, da linguagem,
psicossocial e psicomotor.
“ (…) Dar voz à criança é, ao mesmo tempo, uma expressão da opção pedagógica em curso, a qual encerra uma imagem de criança competente e com direito à participação, e também uma estratégia de aprimoramento da prática docente, de melhoria da qualidade dos contextos educativos.” (Formosinho, 2008:79)
No que se refere ao desenvolvimento cognitivo e de acordo com
Papalia, Olds e Feldman (2001:314), “a perspectiva cognitiva enfatiza os
processos de pensamento e o comportamento que reflecte esses processos.
Essa perspectiva inclui as teorias influenciadas pelas abordagens organísmica
39
e mecanicista.” Ela inclui a teoria dos estágios cognitivos defendidos por Piaget
e a teoria sociocultural de Vygotsky sobre o desenvolvimento cognitivo.
Segundo Piaget, as crianças em idade pré-escolar encontram-se no
estádio pré-operatório onde “as crianças tornam-se gradualmente sofisticadas
no uso do pensamento simbólico, mas só pensam logicamente no estádio das
operações concretas” (Papalia et al, 2001:312). Uma das características deste
estádio é o jogo simbólico onde “as crianças evidenciam a função simbólica
através da imitação diferida, do jogo simbólico e da linguagem” usando
“símbolos ou representações mentais – palavras, números ou imagens aos
quais a pessoa atribui significado.” (idem:312-313). O grupo desempenha o
jogo simbólico, interpretando diversos papéis sociais e recorrem a todos os
materiais que possuem na Área da Casinha, recriando experiências do
quotidiano, nomeadamente a preparação do almoço/jantar, o lavar a loiça ou
deitar os “bebés” a dormir e levá-los a passear.
Brazelton (2001) salienta que nesta idade a criança começa a observar
todos os que a rodeiam de um modo diferente. A aprendizagem que deles faz
baseia-se não só na sua observação, mas também na sua inserção em
cenários que ela própria imagina. As crianças revelam grande interesse em
mimar canções, emoções e imitar animais. “Ter símbolos para as coisas ajuda
a criança a pensar acerca delas e das suas qualidades, a recordá-las e a falar
sobre elas, sem que estejam fisicamente presentes.” (Papalia et al, 2001:312-
313).
O jogo, mais do que qualquer outra conduta, altera a realidade por
apropriação direta às necessidades das crianças. Essa apropriação é reforçada
pela linguagem simbólica (risos, frases que a criança construi, etc). Neste
grupo o jogo simbólico aparece, essencialmente, na Área da Casinha onde as
crianças reproduzem nas suas brincadeiras atitudes/ações que vêem nos
adultos com quem interagem. Desta forma cada vez mais utilizam expressões
que são ditas pelo adulto, quer na hora das refeições, quer nos momentos de
atividades livres quando o adulto as chama a atenção por algum motivo.
As crianças deste grupo revelam algum egocentrismo (característica
própria da idade), ou seja “a incapacidade para ver as coisas de um ponto de
40
vista que não o próprio. Não é egoísmo, mas sim compreensão centrada no
self e, de acordo com Piaget, é fundamental para a caracterização do
pensamento limitado das crianças mais novas” (idem: 316). Só pensam em si,
querem sempre ser os primeiros em tudo e têm dificuldade na partilha dos
brinquedos com os pares. Este egocentrismo está presente por exemplo em
expressões como “isso é meu”, “agora sou eu”, “agora é para mim”. Tal como
refere Piaget “as crianças de 3 anos não são, evidentemente tão egocêntricas
como os bebés (…) elas ainda pensam que o universo está centrado nelas
próprias”. (idem:316) Manifestam alguma dificuldade em respeitar as regras da
sala, sendo necessário estar constantemente a lembrar-lhes, e saber esperar
pela sua vez de falar pois a sua vontade de mostrar que sabe e a necessidade
de se afirmar é tão grande que não se conseguem controlar, sendo, por isso
necessário intervir neste sentido.
Durante este período de intervenção foi notória alguma evolução neste
sentido. O grupo já se revela menos egocêntrico conseguindo partilhar com os
pares os brinquedos da sala porém, ainda existem algumas crianças que
manifestam dificuldade em partilhá-los, fazendo frente aos pares dizendo “eu
tenho isto e tu não”. Nas atividades livres já é visível a brincadeira entre pares,
onde na mesma área as crianças brincam juntas à mesma brincadeira onde
frequentemente dizem “queres brincar comigo?” ou “vamos fazer uma
construção juntos”. Considero que o grupo está mais organizado nas suas
brincadeiras pois já não espalha os brinquedos pela sala fazendo com que os
brinquedos, por exemplo, da casinha fiquem na casinha e os das construções
permaneçam nas construções. A maior parte das crianças, quer nos momentos
de atividade livre, quer nos momentos de atividade orientada, já conseguem
respeitar os pares não os interrompendo enquanto falam e quando querem
falar colocam o dedo no ar.
Concordando com o defendido por Piaget este grupo consegue fazer a
distinção do que é real daquilo que é fantasia, sendo que entendem quando
uma pessoa está a fazer de conta, conseguindo elas próprias fazer de conta.
Muitas vezes na área da casinha dizem “vamos fazer de conta que eu sou o
pai” ou “vamos fazer de conta que estamos a fazer um piquenique”.
41
Outra característica, considerada importante, mas difícil para as
crianças, relaciona-se com a noção de tempo. Embora pareçam diferenciar o
“ontem”, o “hoje” e o “amanhã”, como “têm um curto passado do qual se
lembram, quase não possuem bases para (…) compreender “as noções do
passado, presente e futuro” (Delmine & Vermeulen, 2001:106). Estas questões
têm vindo a ser adquiridas ao longo dos tempos e que a introdução do quadro
de presenças ajudou bastante na assimilação destes aspetos. Ainda não
reconhecem os dias da semana pelo nome, mas identificam que, por exemplo,
o dia azul é o dia da música e que o cor de rosa é o dia das histórias. Ainda é
bastante frequente dizerem “eu amanhã fui à praia” ou “eu ontem vou à
ginástica”
Ao nível do raciocínio lógico-matemático as crianças conhecem as cores
primárias (azul, vermelha, azul e verde) assim como as secundárias (castanho,
laranja, rosa, etc) conseguindo identifica-las e nomeá-las sem dificuldade.
Conseguem também identificar e nomear as formas geométricas (triângulo,
quadrado, círculo e retângulo) associando-as, muitas vezes a objetos do
quotidiano. Todas as crianças sabem contar pelo menos até cinco sem
saltarem números, sendo que algumas já vão um pouco mais além
conseguindo contar até dez. No momento do acolhimento este aspeto foi
trabalhado, já que se contam as fotografias das crianças que ainda não
chegaram à escola e as que já se encontram na escola. Conseguem fazer
conjuntos com dois atributos (tamanho e cor). Este último ponto Papalia
(200:313) refere que “por volta dos 4 anos, muitas crianças conseguem
classificar utilizando dois critérios, como a cor e a forma”, porém este grupo de
crianças já conseguem fazê-lo. Manifestam bastante interesse na montagem
de puzzles e na construção com legos e cubos.
Em relação à expressão artística Papalia et al (2001:290) diz-nos que
“por volta dos 3 anos, o estádio da forma aparece. Agora a criança desenha
diagramas em 6 formas básicas: círculos, quadrados, retângulos, triângulos,
cruzes, Xs e formas irregulares”. Já é bastante visível a utilização destas
figuras nos desenhos do grupo e já conseguem desenhar a figura humana com
olhos, boca, nariz, cabelo, tronco e membros. Algumas crianças já atentam a
42
outros pormenores como o pescoço, a barriga, os dedos, as sobrancelhas e as
pestanas. A grande maioria do grupo verbaliza as suas produções, ou seja
explica ao adulto aquilo que desenhou ou pintou sem dificuldade. O grupo de
crianças gosta de experimentar novas técnicas de pintura, mostram muito
interesse pela plasticina e pela pasta de farinha. A pintura também é algo
fascinante para o grupo, gostando de misturar as cores criando verdadeiras
obras de arte.
No domínio da expressão musical o grupo revela muito interesse em
conhecer e aprender novas canções, sendo um dos pedidos mais frequentes
nos momentos de assembleia. Conseguem escutar as canções e sons
apresentados em silêncio, fazer a distinção entre silêncio e ruído e acompanhar
as músicas com batimentos corporais batendo o seu ritmo.
Relativamente ao desenvolvimento da linguagem,
Adquirir e desenvolver a linguagem implica muito mais do que aprender palavras novas, ser capaz de produzir todos os sons da língua ou de compreender e de fazer uso das regras gramaticais. É um processo complexo e fascinante em que a criança, através da interacção com os outros, (re)constrói, natural e intuitivamente o sistema linguístico da comunidade onde está inserida, apropriando-se da sua língua materna. (Sim-Sim et al, 2008:12).
Segundo Piaget, citado por Sprinthall (1993) nos três anos de idade “o
desenvolvimento do vocabulário, incluindo a capacidade de compreender e
usar as palavras, é especialmente notável.” Dessa forma, o adulto deve ter
consciência que a forma como comunica com a criança é marcante para o
desenvolvimento da linguagem, uma vez que “a aquisição de um maior domínio
da linguagem oral é um objetivo fundamental da Educação Pré-Escolar (ME,
1997:66).
Neste sentido, as crianças mostram saber manter um diálogo coerente,
constroem frases simples. Porém manifestam algumas dificuldades na
pronunciação de certas palavras. Um dos problemas que manifestam é ao nível
dos processos de estruturação silábica, ou seja reduzem a sílaba ao formato
“consoante-vogal” ou a simplificar o número total de sílabas que compõe uma
palavra por exemplo em /sodado/ em vez de soldado ou /pota/ em vez de porta.
Este processo acontece também em palavras polissilábicas como em “telefone”
passando a /tefone/. Outra questão diz respeito ao processo de reduplicação
43
de uma sílaba (Lima, 2006) por exemplo em “sapato” que passa a /papato/. O
processo de substituição é aquele que se encontra mais presente no grupo
onde temos por exemplo “janela” é substituída por /xanela/ ou “sopa” ser
substituído por /xopa/. Outro caso de substituição refere-se às consoantes
líquidas /l/ e /lh/ sendo substituídas pelas semi-vogais quer /u/ quer /i/, ou então
pela sua omissão. Podemos encontrar este processo por exemplo nas palavras
“bola” e “folha” sendo substituídas por /boua/ e por /foia/ respetivamente ou
então de omissão em “Luísa” passa para /Uísa/. Encontramos ainda processos
de metátese, ou seja, a mudança de lugar de um fonema ou sílaba ocorrido
dentro da palavra que é o caso de “Mónica” passar a /moquina/. Assim,
encontramos erros de sobregeneralização, sendo também bastante comum
neste grupo, estando presente, por exemplo em “eu já fazi” ou “ele já fazeu”.
No que se refere a esta última questão “dizer /fazi/ em vez de “fiz” é um sinal
normal de progresso linguístico (…) quando as crianças descobrem uma regra
tendem a generalizar, usando-a mesmo quando as palavras não seguem a
regra.” (Papalia et al, 2001:322)
Apesar de todos os casos acima referenciados ainda se verificarem,
considero que o grupo tem evoluído muito nesta área do desenvolvimento. O
seu discurso é cada vez mais percetível, falam com mais calma e utilizam cada
vez melhor o vocabulário. Também são claras algumas evidências na
linguagem onde utilizam diferentes adjetivos, palavras mais complexas
dizendo. Mostram curiosidade em saber o significado de palavras que não
conhecem.
O grupo de crianças mostra bastante interesse em ouvir histórias e em
recontá-las, identificam os personagens e as ações pela ordem em que
acontecem, porém não procuram muito a área da biblioteca nas suas
brincadeiras. Mostram especial interesse por histórias de animais. Interessam-
se por fantoches e por tudo o que seja palpável e manipulável.
Relativamente ao desenvolvimento psicomotor,
O corpo que a criança vai progressivamente dominando desde o nascimento e cujas potencialidades vai tomando consciência, constitui o instrumento de relação com o mundo e o fundamento de todo o processo de desenvolvimento e aprendizagem. (ME, 1997:67)
44
Assim, as crianças ao longo do seu desenvolvimento vão estabelecendo
reações com o seu próprio corpo e aprendem a utilizá-lo para comunicar.
Apesar de não possuírem a perícia de um adulto, a criança já adquiriu
alguns automatismos, a locomoção e a preensão, a aptidão de imitar e criar
novos movimentos. Este conjunto de domínios não se desenvolvem de igual
forma em todo o grupo. Assim, é notória a existência de algumas competências
básicas a serem desenvolvidas nesta idade, sendo elas: motricidade grossa e
fina, esquema corporal e orientação espacial.
Relativamente à motricidade grossa, o grupo move-se livremente usando
diferentes movimentos de locomoção nomeadamente andar, correr de forma
rápida e lenta, gatinhar, saltar quer a pés juntos quer levantando os joelhos.
Sobem e descem escadas alternando os dois pés, sem dificuldade. Conhecem
as partes do seu corpo, nomeadamente a cabeça, tronco e membros assim
como identificam os órgãos dos sentidos, boca, nariz, olhos, ouvidos e mãos,
começando agora a identificar também as sobrancelhas, as pestanas, os dedos
e as unhas. Atentam também a pormenores como a cor do cabelo, da pele e
dos olhos. Fazem referência aos “acessórios” como o usar óculos e o usar
laços e ganchos no cabelo. Conseguem manipular uma bola colocando-a em
diferentes posições nomeadamente em cima, em baixo, a frente, atrás e ao
lado, dar-lhe um chuto e ir atrás dela. Participam e realizam jogos de
movimento conseguindo entender as suas regras.
As competências motoras finas “como apertar os cordões dos sapatos,
cortar com uma tesoura, desenhar e pintar, envolvem a coordenação óculo-
manual e de pequenos músculos” (Papalia et al, 2001:287). Desta forma é
visível que a maioria das crianças já conseguem fazer o correto manuseio do
lápis ou do pincel, movimento em pinça, sendo que já definiram a mão
predominante. Conseguem fazer enfiamentos e, no seu geral usam
corretamente os talheres (garfo e colher em simultâneo), porém, ainda não
sabem apertar os cordões. Algumas crianças já conseguem manusear a
tesoura cortando livremente, sem linhas orientadoras. Os ganhos nestas
45
competências permitem às crianças assumirem uma maior responsabilidade
pela sua própria pessoa e desenvolverem a sua imaginação.
Importa mencionar que as crianças são, na sua maioria, autónomas, vão
à casa de banho sozinhas, precisando de ajuda em casos específicos, lavam
as mãos, comem e tiram a bata sozinhos, procurando cada vez menos o adulto
para as ajudarem.
De salientar que “a lateralidade, preferência pelo uso de uma mão sobre
a outra, é em geral evidente por volta dos 3 anos”. (idem:288) De acordo com a
mesma, é visível que as crianças já têm a sua lateralidade definida revelando-
se, na sua maioria, destro.
Por fim, focalizando o desenvolvimento psicossocial
“As relações sociais que as crianças em idade pré-escolar formam, bem como a sua capacidade de iniciativa, estão apoiadas na sua competência crescente em representar ideias através da linguagem e das brincadeiras” (Hohmann, 2011:572).
Seguindo a linha de pensamento de Freud, vemos que também a nível
afetivo a criança passa por cinco fases do desenvolvimento da sua
personalidade. Desta forma, o grupo de três anos encontra-se na fase fálica
(Delmine & Vermeulen, 2001:62). De acordo com Freud, durante esta fase, as
crianças estão mais atentas às diferenças entre os sexos, à relação entre o pai
e a mãe. Isso pôde-se constatar sobretudo na área da casinha, onde as
crianças assumem diferentes papéis e assim reproduzem o que observam no
seu dia-a-dia. Esta fase é cada vez mais visível já que o grupo tem uma grande
preferência por esta área sendo que nela, brincam imitando, muitas vezes o
adulto, onde usam as suas expressões, as suas falas e os seus gestos. É uma
área onde o grupo tem a possibilidade de interagir e brincar com os pares
encarando diferentes personagens.
Durante as brincadeiras, as crianças ainda demonstram dificuldade em
gerir emocionalmente os seus sentimentos, pois sempre que alguma criança se
magoa recorre de imediato ao adulto a chorar, mesmo quando a situação não
justifica, pois muitas das vezes, é suficiente um pequeno empurrão para as
crianças recorram ao adulto.
46
São crianças sensíveis que gostam de ouvir reforços positivos, ficando
orgulhosos das suas conquistas, porém ficam frustrados quando são
reprendidos pelo adulto, por exemplo quando batem a um amigo, chegando por
vezes a chorar. Esta emoção é perfeitamente normal pois “apesar de as
crianças mais novas conseguirem fazer julgamentos acerca da sua
competência em várias atividades (…) tendem a aceitar o julgamento dos
adultos, que frequentemente lhes dão um feedback positivo ou negativo”
(Papalia et al, 2001:356).
No seu geral, as crianças são bastante carinhosas, mostrando muitas
vezes preocupação quando um amigo está triste ou a chorar perguntando “o
que tens?” e dando um beijo ou um abraço. Manifestam cada vez mais vontade
de ajudar o outro, criança ou adulto, perguntando se precisam de ajuda para
realizar alguma tarefa.
Segundo Erikson, as crianças do pré-escolar encontram-se no estádio
de desenvolvimento iniciativa versus culpa onde as crianças “conseguem fazer
– e querem fazer – mais e mais. Ao mesmo tempo, elas estão a aprender que
algumas das coisas que querem fazer vão ao encontro do que é socialmente
aprovado, enquanto com outras tal não acontece” (Papalia et al, 2001:355). O
grupo tem-se mostrado cada vez mais responsável e observador. Começam a
entender o que é correto fazer e o que não é em determinado local,
reconhecendo quando fazem algo de mal e menos apropriado.
Ao nível do desenvolvimento moral, é importante termos em conta o
que nos diz Kohlberg (In Sprinthall, 1993:171), que assim como os autores
mencionados anteriormente dividiu o desenvolvimento moral por estádios. As
crianças de três anos encontram-se no estádio pré-convencional, uma fase na
qual as crianças manifestam uma grande preocupação, pois têm medo de ser
punidas, uma vez que já têm consciência do mal que fizeram. Só assim se
entende o porquê de tentarem omitir, esconder o erro que cometeram, e por
vezes culpa o outro.
O grupo possui capacidade de observação, porém algumas crianças
revelam dificuldades em estar atenta. Têm curiosidade em saber o porquê das
coisas e desejam saber sempre mais. Exploram de diferentes formas o meio
47
que as rodeia, gostam de experimentar coisas novas e reconhecem elementos
do meio ambiente. Reconhecem os diferentes momentos da rotina diária e
muitos já são capazes de expressar a sua opinião com clareza.
Considero que as características deste grupo de crianças, vão ao
encontro das várias linhas de pensamento dos autores citados anteriormente,
nunca esquecendo que “todas as crianças são únicas, mas todas elas são
também membros duma só espécie humana” (Gesell, 1997:58)
3.3. Traçado de prioridades de intervenção
conjunta ao nível da instituição e da comunidade
Com o objetivo de se definir as prioridades que existiam ao nível da
instituição e da comunidade, reuniu-se com a equipa educativa a fim de se
apresentar uma proposta de intervenção.
Assim, e depois de apresentadas as propostas, ficou decidido e
acordado com a direção da Instituição que a intervenção seria no âmbito da
criação de um espaço de biblioteca comum a toda a comunidade educativa, já
que não existia nenhum espaço destinado à mesma, sendo considerado um
espaço essencial. A criação deste espaço surgiu também da necessidade que
se sentiu em realizar pesquisas com os grupos sobre os seus projetos, já que
muitas vezes setinha de levar livros de casa para que os grupos pudessem
pesquisar sobre os mais variados temas ou pedir às crianças que realizassem
as pesquisas em casa.
Neste sentido, os objetivos para esta intervenção são: a identificação de
alguns cuidados a ter com o manuseamento dos livros; conhecimento dos
materiais que fazem parte da biblioteca, assim como a sua utilidade; saber
utilizar os livros emprestados; respeitar as escolhas dos colegas quanto aos
livros; executar atividades que potenciem a imitação, a comunicação e a
expressão; desenvolver a capacidade de atenção e de permanecer em silêncio;
desenvolver a socialização com outras crianças e adultos, respeitando as
diferenças e manusear os materiais sem a presença do adulto.
48
Para se conseguir levar a cabo estes objetivos torna-se importante
recorrer a diversas estratégias. Desta forma, e como ponto de partida para a
criação deste espaço, realizar-se-á a leitura do livro “ler doce ler” seguido de
um diálogo com os grupos pedindo a sua opinião sobre a criação de uma
biblioteca na Instituição e posteriormente a construção de uma chuva de ideias
sobre como organizar o espaço. De forma a criar um espaço acolhedor,
confortável e alegre, ficou decidido que cada grupo do pré-escolar irá ser
responsabilizado por uma parte da organização/decoração do espaço. Assim,
ao grupo dos três anos caberá a decoração do espaço e os grupos dos quatro
anos e cinco anos encarregar-se-á da catalogação dos livros. Todos os objetos
de decoração e áreas do espaço serão discutidas e apresentadas a todos os
grupos, tal como se referiu anteriormente.
Torna-se imprescindível na dinamização da biblioteca, a distribuição de
tarefas e responsabilidades por todos os adultos. Assim, a estagiária da sala
dos 3 anos ficará encarregue de redigir uma carta aos pais com o pedido de
livros e da receção dos mesmos, assim como a preparação de uma
dramatização com o seu grupo a fim de ser apresentada aos restantes grupos.
À estagiária da sala dos 4 anos caberá a tarefa de preparar as fichas de
requisição de livros, quer sejam para levar para as salas de atividade, quer
sejam para levar para casa e ainda preparará com o seu grupo um teatro de
sombras chinesas para apresentação aos restantes grupos. A estagiária da
sala dos 5 anos irá contactar o contador de histórias e convidá-lo para
participar na dinamização deste espaço, assim como organizará um teatro de
fantoches com o seu grupo de forma a apresenta-lo aos demais. Claro que a
distribuição das tarefas não significa segmentação, havendo sempre
colaboração e espírito de equipa, que se traduzirá, na responsabilidade
conjunta de várias atividade, sendo elas: garantir e acompanhar a entrega dos
livros que as crianças trouxeram de casa para a biblioteca, a interação com as
famílias para a dinamização da hora do conto, realizar um teatro de sombras
chinesas para apresentar aos três grupos, a criação de um flanelográfo gigante
para servir como um recurso para a leitura de histórias e o apoio às pesquisas
a realizar pelos grupos consonante as apetências e as suas necessidades.
49
CAPÍTULO IV – INTERVENÇÃO E
EXIGÊNCIAS PROFISSIONAIS
De forma a termos uma intervenção adequada ao grupo de crianças que
que nos encontramos a trabalhar, torna-se fundamental observar e conhecer o
grupo assim como cada criança individualmente. Sabendo, de antemão que “a
observação constitui […], a base do planeamento e da avaliação, servindo de
suporte à intencionalidade do processo educativo” (ME, 1997:25) numa
primeira fase, a intervenção desenvolvida, passou pela observação do grupo e
de cada criança em particular. A observação permitiu perceber quais os
principais interesses e necessidades do grupo, para posteriormente planear e
adequar a intervenção. Assim, foi através desta observação direta e dos
registos efetuados que surgiu na sala o projeto “os animais da selva” (Cf.
Anexo 4)
Este projeto teve como motivação a leitura da história “a que sabe a lua”,
lida pela educadora cooperante dias antes da estagiária ter chegado à sala.
Após este momento, durante as assembleias realizadas, as crianças
mostraram interesse em conhecer, de forma mais aprofundada, alguns animais
presentes na história.
Assim, foi necessário reunir com o grupo de forma a entender os seus
interesses e perceber se o tema era suficientemente estimulador para se
transformar num projeto lúdico. Desta forma foi proposto ao grupo a execução
de um projeto sobre os animais da selva e imediatamente a resposta foi
positiva. Realizou-se então uma chuva de ideias sobre o que queriam fazer e
de que forma o queriam executar. Desta chuva de ideias surgiu então a
proposta de elaboração de um ficheiro de imagens com as pesquisas
realizadas pelas crianças, assim como a construção de um canto da selva
onde, para ele, seriam construídos alguns animais e uma árvore utilizando
materiais reciclados.
Foi de igual modo pertinente selecionar os animais que as crianças
queriam pesquisar e estabelecer quem ficaria responsável pelas pesquisas.
Ficou também estipulado com o grupo pedir a colaboração dos pais na
50
realização de uma pesquisa prévia sobre o animal que cada criança escolheu.
Cada pesquisa realizada foi planificada e registada num instrumento de
planificação criada para o efeito, onde eram colocadas as fotografias das
crianças responsáveis pela pesquisa, assim como aquilo que queriam saber e
onde iriam recolher essa informação. Desta forma, foi-se estimulando o grupo
para a construção do seu próprio conhecimento, ou seja, foi-se desenvolvendo
o princípio da aprendizagem ativa e participativa da criança.
Paralelamente a estas pesquisas foram sendo construídos alguns
animais para o novo canto criado na sala dedicado à selva. Todas as
construções foram realizadas pelas crianças sendo escolhidos por elas os
materiais usados para a construção. Por se tratar de um grupo de crianças
pequeno, esta escolha, muitas vezes teve a intervenção do adulto. Também
aqui foi utilizado um instrumento de planificação onde as crianças que
participaram na construção de cada animal tinham de completar com os
materiais que iam ser utilizados e explicando a forma de os construir.
Desta forma foi-se criando e fomentando a autonomia e
responsabilidade do grupo através da planificação do que queriam descobrir e
como queriam construir.
Paralelamente a isto, foram dinamizadas atividades relacionadas com
todas as áreas do conteúdo. Assim, ao nível da matemática realizou-se
diferentes jogos como o comboio dos animais (trabalhando termos como à
frente, no meio e atrás), correspondências termo a termo, organização dos
animais segundo o tipo de revestimento e contagem e organização dos animais
pertencentes a cada casa segundo a espécie, o dominó; na expressão motora,
expressão musical e expressão dramática foram exploradas diferentes
músicas, exploração dos sons e locomoção dos animais da selva e jogos de
imitação e dramatizações realizadas aquando a leitura de algumas histórias e
em momentos de atividades livres; na expressão plástica a construção de todo
o canto dos animais; no conhecimento do mundo todas as pesquisas
realizadas e saberes adquiridos através dos jogos realizados; na linguagem
oral e abordagem à escrita, explorou-se diferentes lengalengas relacionadas
com os animais explorados, contadas histórias como “o cuquedo” e “todos no
51
sofá” que foram, posteriormente, dramatizadas pelo grupo, o jogo das letras do
nome dos animais.
Foi também apelada a colaboração das famílias neste projeto, sendo
desafiadas a criarem histórias sobre o animal favorito de cada criança e
posterior construção dos personagens sob forma de fantoche, dinamizando
desta forma o espaço do fantocheiro. Este projeto culminou com um safari
realizado pelos jardins da instituição onde o objetivo era encontrar os animais
que, misteriosamente, desapareceram da selva da sala. Para isso a estagiária
vestiu-se de exploradora e acompanhou o grupo nesta missão onde durante o
percurso foram sendo vencidas missões e ultrapassados obstáculos.
Paralelamente a este projeto, mas já no terceiro trimestre, surgiu um
novo projeto na sala designado de “a nossa casinha” (Cf. Anexo 5). Após se
observar que a área da casinha era cada vez mais procurado pelas crianças
nos momentos de atividades livre, foi questionado o grupo sobre aquilo que
gostava de ter na casinha, tornando as suas brincadeiras mais estimulantes e
desafiadoras. Assim, foi elaborada uma rede de ideias onde cada criança
expressou a sua opinião sobre o tema. Desta forma, dentro daquilo que foi
possível à equipa pedagógica, levou a cabo os desejos do grupo. Juntamente
com o grupo e partindo daquilo que já conheciam, foram construídos alguns
objetos para a casinha nomeadamente: as pinturas das paredes, com a divisão
do quarto e da cozinha, uma janela com cortinas, um frigorífico, um cabide com
roupas e acessórios, pedindo a colaboração das famílias para este
enriquecimento, alimentos em massa de farinha, uma televisão, candeeiros e
um tapete. Para além disso foi substituída a cama existente por uma maior.
Todas estas construções foram realizadas pelas crianças sendo da sua
responsabilidade a forma como as executar e o material a utilizar.
Responsabilizando a criança pelo planeamento de todos os objetos, também
aqui foi utilizado o instrumento de planificação falado anteriormente. No que se
refere às áreas de conteúdo foram realizadas atividades como a exploração
dos sons dos utensílios de cozinha e sequencias sonoras dos mesmos,
exploração de lengalengas, leitura de histórias a partir da televisão das
52
histórias, dramatizações constantes. Aprenderam ainda a fazer a cama e a
colocar a mesa corretamente.
Concluir que com o passar do tempo, graças ao trabalho em equipa e à
responsabilidade implicada, que cada criança aplicou nos projetos lúdicos e
também nas restantes atividades, tornou-se num grupo coeso, responsável,
empenhado, revelando preocupação e sensibilidade com os outros. São nestas
interações, que as crianças ensaiam os alicerces das relações humanas,
facilitando a formação de imagens construtivas de si próprios e dos outros.
Todas estas atividades proporcionaram o desenvolvimento das crianças em
diferentes áreas de desenvolvimento.
Para além dos projetos vivenciados na sala, os momentos de
dinamização da hora do conto também constituíram momentos essenciais e
especiais para o grupo, já que em todas as assembleias, mostravam interesse
e disponibilidade em conhecer novas narrativas.
Estes momentos serviram de ferramenta pedagógica essencial quer na
formação do carácter, na formação intelectual e social da criança. Desta forma,
tornou-se num pilar para despertar a criança para o desenvolvimento da
imaginação, da empatia, da criatividade, da concentração, do desejo e gosto
pela leitura.
Foram utilizadas diferentes estratégias pedagógicas e abordadas
diversas temáticas apartir delas como: os fantoches, o flanelógrafo, o conto
redondo, as projeções (no teto e na parede), o recurso ao livro, o livro pop-up,
as dramatizações, a mala que conta histórias e a criação de uma personagem
que conta histórias. Para além disso foi criado, como referido anteriormente,
um dispositivo de ligação com as famílias para a criação de histórias e
fantoches. Este momento acontecia uma vez por semana, às quintas-feiras,
sendo designado do “Dia das histórias”. Para além das histórias, foram também
exploradas lengalengas, trava-línguas e poemas.
Desta forma considera-se que sempre que as crianças ouvem uma
história, transborda a sua fantasia e além de incentivar a sua criatividade,
permite explicar a incutir modelos, que integra a sua relação com o meio social,
ao mesmo tempo que constrói conhecimentos. Assim, foi promovido no grupo
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uma assimilação do comportamento adequado na resolução de conflitos. O
discurso oral das crianças deste grupo também evoluiu significativamente. Foi
observável na aquisição de vocabulário novo.
No final do estágio, estas crianças apresentavam-se mais hábeis nas
conversas, conseguindo “captar a atenção do adulto, exprimir afetos, competir,
convercer e obedecer de forma socialmente mais adequada” (Sim-sim,
2008:24)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência vivida foi importante para o desenvolvimento profissional e
pessoal, no sentido em que foi possível observar e acompanhar o trabalho de
uma profissional de educação bem como, o quotidiano das crianças, adquirindo
conhecimento prático e pondo em prática todos os conhecimentos teóricos por
mim conhecidos.
No que concerne, primeiramente, ao trabalho de investigação realizado
no decurso deste ano, este contribuiu imenso para me tornar um educador
reflexivo cada vez mais consciente da realidade. O estudo realizado permitiu
perceber a importância que as histórias têm na vida de uma criança e quais as
estratégias que devemos utilizar de forma a cativá-las, contribuindo de forma
positiva para o seu desenvolvimento.
Ao longo do ano, fui adquirindo novas estratégias de acordo com as
situações e as características das crianças, questionando de forma consciente
a teoria por mim aprendida. A teoria foi algo que também fui aprimorando com
o passar do tempo realizando sempre a ligação entre a teoria e a prática.
Um dos fatores que mais contribuiu para o crescimento pessoal e
profissional, foi o apoio da equipa pedagógica, onde consegui, embora com
alguma dificuldade, criar uma relação assertiva de confiança e de apoio, o que
me valorizou e me levou a superar o passo que dei. A educadora cooperante,
revelou-se uma pessoa fundamental dado que me deu a oportunidade de
vivenciar experiências e formas de trabalhar muito ricas em diferentes níveis.
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O contacto com a supervisora de estágio foi também ele, um dos
grandes fatores que ajudaram a progredir e a querer ser sempre melhor. A
exigência da supervisora fez com que pudesse refletir de forma pertinente
sobre o seu percurso ao longo do ano e sobre aspetos que poderiam ser
melhores. Acompanhou todo o processo, tendo sempre o cuidado de valorizar
as minhas conquistas e desafiar-me para que pudesse superar-me fazendo um
trabalho cada vez melhor.
Tornou-se imprescindível apoiar a minha prática num processo
constante de planificação, ação e reflexão. Os conhecimentos adquiridos
através deste processo, contribuíram para o desenvolvimento profissional bem
como para proporcionar experiências significativas à criança.
Durante toda a prática combati todas as ansiedades e medos sentidos
no início. Desta forma acredito que cresci e me tornarei numa educadora por
excelência, que tenta todos os dias superar-se a si mesma para atingir os seus
fins. Estou consciente de que ainda tenho muito para aprender e sei que a
minha aprendizagem não termina por aqui.
Os momentos vividos até então, foram todos uma mais-valia para a
minha formação contudo, acredito que os momentos em pequeno grupo e a
pares foram os mais significativos, pois são nestes momentos em que as
crianças mais se revelam em todos os aspetos. Posso afirmar que me senti
integrada e feliz por saber que durante estes meses consegui estabelecer com
cada criança uma relação de carinho, confiança, cumplicidade e amizade. Hoje
sou capaz de ouvir cada criança, identificando os receios e valorizando cada
conquista sua. Hoje, sou capaz de entender cada criança como um ser único
que é, dotado de autenticidade, capacidades e de verdade.
Estou consciente de que devemos ser firmes com os valores e regras
que incutimos nas nossas crianças, mas essa firmeza de nada nos adiantará
se não formos suaves, pois só assim é que sentiremos o respeito e admiração
que elas demonstram ter todos os dias por nós. Vivenciar o desenvolvimento
de um grupo, exprime-se na responsabilidade de “olharmos para a criança
como uma pessoa única, traçando objectivos cada vez mais desafiantes e
procurando formas cada vez mais diversas para os atingir” (Papalia, 2001:31)
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sendo este um dos aspetos que mais contribuiu para o meu crescimento
pessoal.
Assumo que ainda tenho muito que batalhar para me tornar numa
educadora por excelência, com o pensamento que somos um ser em constante
desenvolvimento e que o ato de educar e o de aprender são indissociáveis.
Esta experiência foi muito significativa, gratificante, única e inesquecível,
tendo com ela vivido momentos para nunca mais esquecer. Assim, levo comigo
desta prática todos momentos, os sorrisos e os carinhos de uma amizade
sincera espelhada no olhar de cada criança. Estou certa de que este é o
caminho a seguir e não me revejo noutra profissão.
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