a importância do planejamento estético para a correção de deformidades dentofaciais

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Rev Clín Ortod Dental Press. 2013 ago-set;12(4):50-6 50 CASO CLÍNICO João Luiz CARLINI* Ivan Pedro TAFFAREL** Orlando TANAKA*** Guilherme STRUJAK**** * Mestre em Cirurgia de Cabeça e Pescoço pelo Hospital Heliópolis (USP). Doutor em Cirurgia Bucomaxilofacial pela UFRJ. Professor Adjunto de Cirurgia I da UFPR. Chefe do Serviço de Cirurgia Maxilofacial do CAIF (Centro de Atendimento Integral ao Fis- surado Lábio-Palatal). ** Especialista em Ortodontia pela ABO-PR. Professor de Ortodontia Clínica pela EAP ABO-PR. *** Pós-doutorado, Saint Louis University. Pós-doutorado, UFJF. Mestre e Doutor em Ortodontia pela UFRJ. Professor Titular de Ortodontia na PUCPR. **** Especialista, Residente em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, UERJ. Mem- bro do Serviço de Cirurgia Maxilofacial do CAIF (Centro de Atendimento Integral ao Fissurado Lábio-Palatal, Curitiba/PR). Aluno do mestrado em Odontologia da UFPR. The importance of esthetic planning when correcting dentofacial deformities A importância do planejamento estético para a correção de deformidades dentofaciais Resumo Abstract Palavras-chave: Cirurgia bucal. Retratamento. Ortodontia. Keywords: Orthognathic surgery. Retreatment. Orthodontics. Orthognathic surgery aims at es- tablishing masticatory function and improving facial esthetics. Esthetics certainly is the most important issue for the patient because it is usually the chief complaint. This paper will pres- ent a case of a patient unsatisfied with orthognathic surgery out- come, as treatment plan focussed only at correcting the Class III malocclusion with no attention to the esthetic side-effects. De- spite the occlusion was treated, the patient had to be reoperated to give her what she expected A cirurgia ortognática tem como objetivos estabelecer a função mastigatória e melho- rar a estética facial, dando har- monia e proporcionalidade à face. A estética, sem dúvida, é a questão mais importante para o paciente, pois geralmente é a queixa principal para o trata- mento. No presente trabalho, será apresentado um caso de uma paciente que se apresen- tou insatisfeita com o resul- tado da cirurgia ortognática, pois o planejamento foi feito priorizando apenas a correção from the first procedure. For this reason, in orthodontic-surgical patients, we should carefully ob- serve their main complaint and facial problems, and do not pay attention only to the occlusion, because the patient is more con- cerned with the face appearance than the teeth position da má oclusão de Classe III, sem atentar-se à repercussão estética. Apesar da oclusão tra- tada, a paciente foi submetida a nova cirurgia, para dar-lhe o resultado que esperava no primeiro procedimento. Com isso, percebemos que, em pa- cientes ortodôntico-cirúrgicos, devemos observar com atenção a queixa principal e os proble- mas faciais, e não ater-se so- mente à oclusão, pois o pacien- te está mais preocupado com a aparência da face do que com a posição dos dentes. Como citar este artigo: Carlini JL, Taffarel IP, Tanaka O, Strujak G. A importância do pla- nejamento estético para a correção de deformidades dentofaciais. Rev Clín Ortod Dental Press. 2013 ago-set;12(4):50-6. » Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financei- ros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo. » A paciente que aparece no presente artigo autorizou previamente a publicação de suas fotografias faciais e intrabucais.

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correção de deformidades

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Page 1: A Importância Do Planejamento Estético Para a Correção de Deformidades Dentofaciais

Rev Clín Ortod Dental Press. 2013 ago-set;12(4):50-650

CASO CLÍNICO

João Luiz CARLINI*

Ivan Pedro TAFFAREL**

Orlando TANAKA***

Guilherme STRUJAK****

* Mestre em Cirurgia de Cabeça e Pescoço pelo Hospital Heliópolis (USP). Doutor em Cirurgia Bucomaxilofacial pela UFRJ. Professor Adjunto de Cirurgia I da UFPR. Chefe do Serviço de Cirurgia Maxilofacial do CAIF (Centro de Atendimento Integral ao Fis-surado Lábio-Palatal).

** Especialista em Ortodontia pela ABO-PR. Professor de Ortodontia Clínica pela EAP ABO-PR.

*** Pós-doutorado, Saint Louis University. Pós-doutorado, UFJF. Mestre e Doutor em Ortodontia pela UFRJ. Professor Titular de Ortodontia na PUCPR.

**** Especialista, Residente em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, UERJ. Mem-bro do Serviço de Cirurgia Maxilofacial do CAIF (Centro de Atendimento Integral ao Fissurado Lábio-Palatal, Curitiba/PR). Aluno do mestrado em Odontologia da UFPR.

The importance of esthetic planning when correcting dentofacial deformities

A importância do planejamento estético para a correção

de deformidades dentofaciais

Resumo Abstract

Palavras-chave:Cirurgia bucal. Retratamento. Ortodontia.

Keywords:Orthognathic surgery. Retreatment. Orthodontics.

Orthognathic surgery aims at es-tablishing masticatory function and improving facial esthetics. Esthetics certainly is the most important issue for the patient because it is usually the chief complaint. This paper will pres-ent a case of a patient unsatisfied with orthognathic surgery out-come, as treatment plan focussed only at correcting the Class III malocclusion with no attention to the esthetic side-effects. De-spite the occlusion was treated, the patient had to be reoperated to give her what she expected

A cirurgia ortognática tem como objetivos estabelecer a função mastigatória e melho-rar a estética facial, dando har-monia e proporcionalidade à face. A estética, sem dúvida, é a questão mais importante para o paciente, pois geralmente é a queixa principal para o trata-mento. No presente trabalho, será apresentado um caso de uma paciente que se apresen-tou insatisfeita com o resul-tado da cirurgia ortognática, pois o planejamento foi feito priorizando apenas a correção

from the first procedure. For this reason, in orthodontic-surgical patients, we should carefully ob-serve their main complaint and facial problems, and do not pay attention only to the occlusion, because the patient is more con-cerned with the face appearance than the teeth position

da má oclusão de Classe III, sem atentar-se à repercussão estética. Apesar da oclusão tra-tada, a paciente foi submetida a nova cirurgia, para dar-lhe o resultado que esperava no primeiro procedimento. Com isso, percebemos que, em pa-cientes ortodôntico-cirúrgicos, devemos observar com atenção a queixa principal e os proble-mas faciais, e não ater-se so-mente à oclusão, pois o pacien-te está mais preocupado com a aparência da face do que com a posição dos dentes.

Como citar este artigo: Carlini JL, Taffarel IP, Tanaka O, Strujak G. A importância do pla-nejamento estético para a correção de deformidades dentofaciais. Rev Clín Ortod Dental Press. 2013 ago-set;12(4):50-6.

» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financei-ros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.

» A paciente que aparece no presente artigo autorizou previamente a publicaçãode suas fotografias faciais e intrabucais.

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INTRODUÇÃO

Os objetivos da cirurgia ortognática são estabelecer a função mastigatória com equilíbrio oclusal, muscular e articular, além de melhorar a estética facial, dando harmo-nia e proporcionalidade à face. A estética, sem dúvida, é o fator mais importante para o paciente, pois geralmente é a queixa principal que faz com que o paciente busque o tratamento. Mesmo sendo de grande importância para o paciente, muitas vezes o profissional, no anseio de operar o paciente, não da a devida importância e deixa de escu-tar o que o paciente espera do tratamento.

Independentemente da técnica utilizada para o tratamen-to, o diagnóstico da deformidade dentofacial é o passo prin-cipal1,2. Segundo Arnett e McLaughlin2, a má oclusão indica o problema e a face indica como tratar o problema. Para isso, um exame detalhado do paciente (incluindo análise facial, radiográfica e dos modelos, exame intrabucal, avaliação das articulações temporomandibulares e avaliação psicológica do paciente) é necessário para se realizar o plano de tratamento1.

A maioria dos pacientes que procuram a cirurgia or-tognática são aqueles que possuem discrepâncias ante-roposteriores com repercussão na estética facial. Quando nos deparamos com esses casos, devemos ter em mente que a decisão de intervir em um ou em ambos os maxi-lares está no resultado estético que será obtido. Ou seja, mesmo podendo tratar o caso operando-se só a maxila ou só a mandíbula, podemos não dar ao paciente um resul-tado compatível com sua queixa, devendo, assim, lançar mão de cirurgias combinadas e mentoplastias.

Um momento muito importante para o tratamento, como um todo, dos pacientes ortodôntico-cirúrgicos é o diagnósti-co. Nessa etapa inicial, o ortodontista e o cirurgião já devem fazem o plano de tratamento considerando os prós e os con-tras para atingir o objetivo que o paciente espera.

Depois da queixa principal, mas não menos importante, vem o exame clínico. Esse exame fornece a maioria das infor-mações para fazer o diagnóstico e o planejamento. Entre as características mais marcantes em paciente com discrepân-cias anteroposteriores, encontramos as descritas a seguir. Pacientes com atresia maxilar apresentam a região paranasal apagada, nariz proeminente e com a ponta posicionada para baixo, lábio superior sem suporte e sulco nasolabial profun-do; o inverso notamos em pacientes com protrusão maxilar. Já os pacientes com deformidades mandibulares podem ser prognatas ou retrognatas; nos primeiros, encontramos a região do mento proeminente, apagamento do sulco lábio--mental, região submentoniana alongada e ângulo cervical fechado. Por outro lado, os pacientes com retrognatismo

apresentam características contrárias às citadas para os prog-natas1. Essas características nos dão um grande indicativo de em qual maxilar devemos intervir; contudo, se com a cirurgia isolada não alcançarmos a harmonia facial que o paciente deseja, devemos propor cirurgia em ambos os maxilares.

Portanto, para se evitar o comprometimento do re-sultado estético, é comum que seja necessário realizar a cirurgia combinada de maxila, mandíbula e mento, mes-mo em discrepâncias que, funcionalmente, poderiam ser corrigidas somente em um dos maxilares.

RELATO DO CASO CLÍNICO

História e etiologia

A paciente, do sexo feminino, com 38 anos de ida-de, apresentou-se ao consultório de Cirurgia Bucomaxi-lofacial, encaminhada pelo ortodontista, com a seguinte queixa: “Estou insatisfeita com o meu rosto”. A pacien-te relatou que foi submetida a cirurgia ortognática para correção de deformidade dentofacial, e que estava com aproximadamente 5 meses de pós-operatório.

No exame facial, observou-se uma projeção exagerada da maxila, alargamento da base alar e projeção da ponta do nariz, dificuldade no selamento labial, falta de harmonia na face e edema residual da cirurgia (Fig. 1).

Ao exame clínico intrabucal, observou-se uma boa rela-ção oclusal dos dentes, estando os caninos e primeiros mo-lares em relação de Classe I e com boa estabilidade (Fig. 2).

Foram solicitadas novas radiografias panorâmica e telerradiografia de perfil, onde observou-se a presença de quatro miniplacas e parafusos na região maxilar, indi-cando que a paciente havia sido submetida a cirurgia de maxila. Na análise cefalométrica, verificou-se SNA = 92o, SNB = 83o e profundidade maxilar = 96o.

Para avaliar o resultado da primeira intervenção, solicita-mos ao ortodontista as fotografias e radiografias pré-opera-tórias (Fig. 3). Com esses exames, pudemos perceber que a paciente apresentava o lábio superior e a ponta do nariz com bom suporte, região paranasal com bom preenchimento, mordida aberta anterior, região submentoniana alongada e região mentual proeminente. Os dados fornecidos pela cefa-lometria demonstraram SNA = 84o, SNB = 83o e profundidade maxilar = 90o. Esses dados, em conjunto com a análise facial, sugeriam que a cirurgia mais adequada para a paciente seria um recuo mandibular para corrigir a má oclusão de Classe III associado ao avanço do mento, para melhorar o selamento labial, e não a cirurgia de maxila, como a que fora executada.

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Figura 1 Fotografias extrabucais após a primeira cirurgia à qual a paciente fora submetida.

Figura 3 Fotografias extrabucais e telerradiografia cefalométrica antes da primeira cirurgia.

Figura 2 Fotografias intrabucais após a primeira cirurgia.

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Carlini JL, Taffarel IP, Tanaka O, Strujak G

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Figura 4 Traçado original (A) e traçado preditivo provável (B). Figura 5 Novo traçado preditivo.

Plano de tratamento

As opções de tratamento foram discutidas com o or-todontista e, entre elas, a extração dos primeiros pré-mo-lares superiores para criar overjet negativo e viabilizar o recuo mandibular. Contudo, isso prolongaria o tratamento e submeteria a paciente a uma nova intervenção cirúrgica. Outra opção seria uma nova intervenção cirúrgica imedia-ta, que, apesar de ser mais invasiva, abreviaria o tratamen-to e teria um resultado estético mais próximo do ideal. As opções foram apresentadas à paciente, a qual acabou escolhendo a intervenção imediata.

O planejamento cirúrgico foi feito, inicialmente, levando a maxila à sua posição original, ou seja, antes da primeira cirurgia. Para isso, sobrepusemos as radiografias de antes e após a primeira intervenção. Notamos que a maxila foi posicionada 7mm à frente e sofreu 3mm de rebaixamento (Fig. 4). Com isso, planejamos um recuo maxilar de 7mm e uma impacção de 3mm. Para terminarmos com a oclusão em Classe I, a mandíbula seria recuada os mesmos 7mm que a maxila; e o mento seria avançado 5mm, para melhorar o selamento labial e corrigir o perfil. Todo o planejamento foi determinado por meio do traçado preditivo (Fig. 5).

A preocupação maior foi a cirurgia de recuo da ma-xila, pois trata-se de um movimento de difícil execução. A  necessidade de fraturar a lâmina do processo pteri-góideo aumenta o risco, como o de sangramento. Além disso, a fratura indesejável da base do crânio, resistência

mecânica da reposição posterior da maxila e alterações no espaço orofaríngeo tornam a cirurgia complexa. En-tretanto, na avaliação radiográfica da telerradiografia de perfil, observou-se espaço na região da tuberosidade que permitiria realizar o movimento de retrusão da maxila.

Durante o preparo pré-operatório, fizemos a monta-gem do articulador semiajustável e determinamos a po-sição dos maxilares com o auxílio da plataforma de Erick-son, como preconizado por Epker e Wolford3. Após isso, confeccionamos os guias cirúrgicos.

A cirurgia foi iniciada com a osteotomia do mento e, em seguida, fizemos a marcação da osteotomia vertical intrabu-cal dos ramos mandibulares. Dando sequência, realizamos o acesso em fundo de vestíbulo maxilar. Removemos as mini-placas e parafusos, instalados na primeira cirurgia, e iniciamos uma nova osteotomia Le Fort I (com dificuldade, pois havia muita fibrose cicatricial). Soltamos as uniões da maxila com o processo pterigoide e com o septo nasal, e osteotomizamos a parede lateral da fossa nasal abaixo da concha nasal inferior, separando a maxila da base do crânio (down fracture). Remo-vemos a fibrose presente e controlamos o sangramento com eletrocautério. Em seguida, mobilizamos a maxila.

Para realizar o movimento proposto para a maxila, reali-zamos a remoção das interferências ósseas. Com uma broca troncocônica #703, iniciamos um sulco nas lâminas pterigoides e, com cinzel reto, promovemos a fratura, deslocando os seg-mentos para posterior. Para remover as interferências da re-gião de tuberosidade maxilar, utilizamos uma serra oscilatória.

A B

7

3

5

3

7

7

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Essa serra possui uma lâmina que realiza seu corte em um ângulo de 90º com seu longo eixo, assim facilitando o aces-so à região posterior da maxila (Fig. 6).

Utilizando o guia cirúrgico, reposicionamos a maxila e, com uma pinça goiva, removemos as interferências ósseas. A grande preocupação nesse momento foi manter os côndi-los mandibulares nas respectivas fossas mandibulares, pois é comum, nessas situações, os côndilos se deslocarem da fossa e assim fixarmos a maxila em uma posição errada4. Após a fi-xação da maxila com quatro miniplacas e parafusos, abrimos o bloqueio maxilomandibular e checamos a nova posição da maxila. Partimos para a conclusão da osteotomia vertical da mandíbula e instalação do guia cirúrgico final na maxila.

Após novo bloqueio maxilomandibular, realizamos a fixação do mento e sutura das feridas. O bloqueio maxilo-mandibular rígido foi mantido por 21 dias. Após esse tem-po, recomendamos uso de elásticos e fisioterapia; após 60 dias, a paciente retornou ao tratamento ortodôntico para a finalização. O regime de elástico foi mantido por 6 meses pós-cirurgia, sendo diminuído com o tempo. A Figura  7 demonstra o aspecto facial após a segunda intervenção cirúrgica. Na Figura 8, constam as radiografias cefalomé-tricas em perfil inicial, após a primeira cirurgia e após a segunda cirurgia, evidenciando as mudanças no perfil e no selamento labial (valores finais de SNA = 85o, SNB = 82o e profundidade maxilar = 90o.

Figura 6 Serra oscilatória removendo parte da tuberosidade e o cinzel posicionado para a fra-tura da lâmina pterigoide.

Figura 7 Vistas de perfil e frontal após a segun-da cirurgia.

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DISCUSSÃO

Os motivos que levam os pacientes a procurarem a ci-rurgia ortognática são variados, mas o desejo de melhorar a estética e corrigir problemas funcionais são as razões mais importantes5.

A percepção estética de um indivíduo é influenciada por suas experiências pessoais e pelo seu ambiente so-cial. Sendo assim, o profissional não deve usar ideias pre-concebidas e, sim, analisar a opinião individual de cada paciente, no momento de fazer o plano de tratamento5,6.

Portanto, devem ser considerados os valores indivi-duais, ou seja, o que realmente incomoda o paciente, e não somente a opinião da equipe que o está assistindo. Os aspectos psicológicos devem ser igualmente conside-rados no planejamento cirúrgico, sendo a estética e a fun-ção os fatores de maior satisfação do paciente7.

Johnston et al.8 demonstraram, em uma pesquisa envol-vendo 162 pacientes que necessitavam de cirurgia ortognáti-ca e 157 indivíduos no grupo controle, que os pacientes que necessitavam de cirurgia eram menos satisfeitos com seus aspectos de estética facial e dentária, quando comparados ao grupo controle, ficando ainda mais evidente essa insatis-fação em pacientes do sexo feminino e os com deformidade de Classe II, demonstrando que a queixa estética está nor-malmente presente nos pacientes cirúrgicos.

O índice de satisfação com a cirurgia ortognática nor-malmente é elevado, chegando a 84% um ano após trata-

Figura 8 Telerradiografias de perfil ao início do tratamento, após a primeira cirurgia, e após a segunda cirurgia.

mento com cirurgias bimaxilares9; contudo, uma minoria permanece insatisfeita com o resultado do tratamento. As razões para isso podem ser o preparo inadequado do pa-ciente ou a má compreensão desse quanto ao tratamento, motivação externa e expectativas não reais quanto ao tra-tamento6,10. O resultado estético pós-cirúrgico imediato é importante e, no presente caso clínico, a paciente não se sentiu confortável com a estética obtida — e, mesmo sen-do necessária nova cirurgia, buscou melhoras, visando sa-tisfação em longo prazo. Entendemos que, devido a esses fatos, é necessário incorporar a percepção do paciente no planejamento do tratamento, além de ajudar na avaliação dos resultados do tratamento11. Isso também ajuda na for-mulação do consentimento informado, abordando-se as necessidades do paciente, e na validação do resultado12.

As deformidades dentofaciais podem ter efeito nega-tivo sobre muitos aspectos da vida do paciente, como in-terações sociais, oportunidades de escolha de profissão, escolha de parceiro e características de personalidade. Tem-se conhecimento de que a insatisfação pós-operató-ria da paciente do presente caso clínico não está, necessa-riamente, relacionada com a perícia do cirurgião, mas com a falta de comunicação entre o cirurgião e a paciente.

Os pacientes ortodôntico-cirúrgicos devem estar cons-cientizados dos prós e contras das modificações na esté-tica dentofacial, inclusive dialogando com os seus familia-res mais próximos, acerca dessas modificações. Em geral, os pacientes cujos familiares ou amigos não aprovavam

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o tratamento, têm tendência à maior insatisfação com o resultado do tratamento, e os pacientes que têm expecta-tivas realistas são mais satisfeitos em longo prazo13.

Em geral, metade dos pacientes é influenciada, na deci-são pela cirurgia ortognática, pela família ou pelo ortodon-tista, em busca de melhoria na função e na estética facial14.

No presente caso clínico, observamos que a paciente, mesmo tendo corrigido a sua má oclusão de Classe III, esta-va insatisfeita com o resultado estético. Com base na queixa apresentada pela paciente, exames radiográficos e fotogra-fias, pudemos propor um novo tratamento, que alcançou os objetivos iniciais da paciente e a deixou satisfeita.

CONCLUSÃO

Na apresentação do presente caso, notamos que, nos pacientes ortodôntico-cirúrgicos, devemos observar com atenção redobrada a sua queixa principal e os problemas faciais, e não nos ater somente à oclusão do paciente, pois esse está mais preocupado com a aparência da face do que com a posição dos dentes.

O ortodontista e o cirurgião bucomaxilofacial devem se preocupar com a harmonia da face e com a estabilidade da oclusão; e a interação desses profissionais é imperativa para o sucesso do tratamento ortodôntico-cirúrgico.

REFERÊNCIAS

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Guilherme StrujakAv. 7 de Setembro, 4698 – Curitiba/PR – CEP: 80.240-000E-mail: [email protected]

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA

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