a implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

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Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)Av. Augusto Severo, 84 - Glória - CEP: 20021-040Rio de Janeiro - RJ

Disque-ANS: 0800 701 [email protected]

Page 2: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

Organização Panamericana de Saúde - OpasAgência Nacional de Saúde Suplementar - ANS

1ª Edição - 2009

A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Page 3: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

Ficha Catalográfica

Agência Nacional de Saúde Suplementar (Brasil).A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil / organizado pela Organização Pan-Americana da Saúde, Agência Nacional de Saúde Suplementar – Brasília, DF : OPAS ; Rio de Janeiro : ANS, 2009. 132 p.ISBN: 978-85-63059-00-0 1. Saúde Suplementar. 2. Atenção à Saúde. 3. Guias de Prática Clínica como Assunto.I. Organização Pan-Americana da Saúde. II. Título.

CDD – 610

Catalogação na fonte – Biblioteca ANS – Coordenação de Documentação e Biblioteca (CODOB)

Elaboração, distribuição e informações:

MINISTÉRIO DA SAÚDEAgência Nacional de Saúde Suplementar – ANSDiretoria de Normas e Habilitação dos Produtos – DIPROAvenida Augusto Severo, 84 - GlóriaCEP 20021-040Rio de Janeiro, RJ - BrasilTel.: +55 (21) 2105 0000Disque-ANS: 0800 701 [email protected]

1ª Edição - 2009

Diretoria Colegiada da ANS - DICOL

Diretor-Presidente da Agência Nacional de Saúde SuplementarDiretor de Normas e Habilitação dos Produtos - DIPROFausto Pereira dos Santos

Diretor de Gestão - DIGESDiretor de Fiscalização - DIFIS (interino)Hésio de Albuquerque Cordeiro

Diretor de Normas e Habilitação de Operadoras - DIOPEDiretor de Desenvolvimento Setorial - DIDES (interino)Alfredo Luiz de Almeida Cardoso

Secretário-Executivo da ANS Diretor-Adjunto de Normas e Habilitação dos Produtos - DIPRO Alfredo José Monteiro Scaff

Gerente-Geral Técnico-Assistencial dos Produtos - GGTAP/DIPROMartha Regina de Oliveira

Gerentes da Gerência-Geral Técnico-Assistencial dos Produtos - GGTAP/DIPROKarla Santa Cruz Coelho e Kylza Aquino Estrella de Souza

Gerente de Comunicação Social - GCOMS/DICOLRachel Crescenti

Elaboração técnica:Ana Paula da Silva Cavalcante, Bruna Alessandra Vale Delocco, Brunno Vieira Teixeira de Carvalho, Cristiane Branco Vidal Bustamante dos Santos, Fábio de Freitas Guedes Junqueira, Flávia Helena Cosmo Vieira da Silva, Jeane Regina de Oliveira Machado, Jorge Luiz Carvalho, Karla Santa Cruz Coelho, Luciana Massad Fonseca, Maria de Fátima Medeiros de Cerqueira, Martha Regina de Oliveira, Rochele A. M. Santos, Silvana do Bomfim Oliveira.

Projeto Gráfico:Eric Estevão (coordenação/capa) e Bruno Peon (diagramação) - GCOMS/DICOL

Fotografia (capa): Getty Image

Apoio Bibliotecário: Iara Vidal Pereira de Souza - CODOB/DIGES Revisão Ortográfica e Gramatical:Ana Flores - GCOMS/DICOL

Coordenação de tradução:Milko Hernán Montellano

Tradução:Milko Hernán Montellano (Espanhol)Joana Pereira (Inglês)

Colaboração:Maristela Bernardi

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

Page 4: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Page 5: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde
Page 6: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

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Lista de TabelasTabela 1 Receita de contraprestações das operadoras de

planos de saúde, segundo a modalidade da operadora ___________ 24

Tabela 2 Despesa assistencial das operadoras de planos de saúde, segundo a modalidade da operadora ___________________ 24

Tabela 3 Taxa de sinistralidade das operadoras de planos de saúde, segundo a modalidade da operadora ___________________ 25

Tabela 4 Eventos e beneficiários, segundo o tipo de evento _______________ 25

Tabela 5 Taxa de internação de beneficiários e gasto médio por internação, por tipo de contratação, segundo a modalidade da operadora ________________________________ 26

Tabela 6 Força de Evidência segundo o Centro de Medicina Baseada de Oxford _____________________________________ 59

Tabela 7 População segundo o seguro de saúde _______________________ 63

Tabela 8 Tipo de seguro segundo o salário ___________________________ 65

Tabela 9 Distribuição dos benenficiários (Fonasa) ______________________ 65

Tabela 10 População potencial demandante de prestadores privados _____________________________________________ 65

Tabela 11 Composição do lucro no sistema público (Fonasa) _______________ 66

Tabela 12 Composição do lucro no sistema privado (Isapres) ______________ 66

Tabela 13 Composição das perdas no sistema público (Fonasa) ____________ 66

Tabela 14 Composição das perdas no sistema (Isapres) __________________ 66

Tabela 15 Despesas em serviços de saúde e despesas de administração (Fonasa) __________________________________ 67

Tabela 16 Despesas em serviços de saúde e despesas de administração (Isapres) __________________________________ 67

Page 7: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

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Tabela 17 Despesa pública com saúde em 2005 _______________________ 68

Tabela 18 Despesa total do sistema de saúde como percentual do PIB ______________________________________________ 69

Tabela 19 Tipo de prestadores privados ______________________________ 70

Tabela 20 Número de clínicas particulares por regiões ___________________ 70

Tabela 21 Total de leitos particulares ________________________________ 71

Tabela 22 Distribuição de leitos particulares por região __________________ 71

Tabela 23 Origem de atendimentos realizados por prestadores privados (Percentual) ____________________________________ 72

Tabela 24 Montante faturado por prestadores privados segundo a origem _____________________________________________ 72

Tabela 25 Atendimentos totais nos sistemas privado e público no ano de 2005 em atenção primária ________________________ 73

Tabela 26 Critérios usados para construir a pontuação de prioridade sanitária _____________________________________ 75

Tabela 27 Prioridade Sanitária, Financeira, Capacidade de Oferta e Ajustes _______________________________________ 77

Tabela 28 Características demográficas e clínicas dos pacientes no período pré-AUGE e período AUGE ________________________ 91

Tabela 29 Características clínicas dos pacientes submetidos à trombólise e de pacientes sem nenhum procedimento de reperfusão nos períodos pré-AUGE e AUGE _______ 92

Tabela 30 Odds ratio e redução do risco de morte em grupos de interesse nos períodos pré-AUGE e AUGE _____________________ 93

Tabela 31 Algumas organizações que elaboram NOCs em Portugal ____________________________________________ 114

Tabela 32 Temas mais frequentes nas NOCs no Sistema Nacional de Saúde - SNS português ________________________ 116

Page 8: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

7

Tabela 33 Estrutura da “Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica” do CEMBE da FML _____________________ 119

Tabela 34 Grade para avaliação crítica de um artigo descrevendo um ensaio clínico ___________________________ 122

Tabela 35 Níveis de evidência e graus de recomendação terapêutica ou preventiva _______________________________ 124

Tabela 36 Exemplo de um estudo incluído ___________________________ 125

Tabela 37 Exemplo de um estudo excluído ___________________________ 125

Tabela 38 Recomendações práticas para a cessação tabágica ____________ 126

Tabela 39 Relações entre disseminação e implementação de NOCs ______________________________________________ 130

Lista de GráficosGráfico 1 Taxa de crescimento anual do número de

beneficiários, por cobertura assistencial ______________________ 23

Gráfico 2 Beneficiários de planos de saúde por cobertura assistencial do plano ____________________________________ 23

Gráfico 3 Sistema previsional de saúde da população chilena _____________ 64

Gráfico 4 Consultas por tipo de estabelecimentos ______________________ 71

Gráfico 5 Procedimentos de reperfusão nos períodos pré-AUGE e AUGE ______________________________________________ 92

Gráfico 6 Mortalidade intra-hospitalar segundo os procedimentos de reperfusão empregados e por sexo, nos períodos pré-AUGE e AUGE ________________________ 93

Gráfico 7 Odds ratio de mortalidade para cada ano comparando com o ano de 2001 ___________________________ 94

Page 9: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

8

Lista de FigurasFigura 1 Fluxograma das etapas do Projeto Diretrizes __________________ 30

Figura 2 Sequência utilizada na capacitação das oficinas de trabalho _____________________________________________ 48

Figura 3 Algoritmo de Priorização Plano Auge ________________________ 74

Figura 4 Equipe do CEMBE da FML _______________________________ 117

Figura 5 Algoritmo clínico para cessação tabágica ____________________ 127

Lista de abreviaturas e siglas ACES Agrupamentos de Centros de Saúde

ACS Alto Comissariado da Saúde

AHCPR Agency for Health Care Policy and Research

AHRQ Agency for Healthcare Research and Quality

AMB Associação Médica Brasileira

ANS Agência Nacional de Saúde Suplementar

AVC Acidente Vascular Cerebral

AVISA Años de Vida Saludables

AUGE Acceso Universal de Garantías Explícitas

CD Compact Disc

CD-ROMs Compact Disc Read-Only Memory

CEMBE Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência

CFM Conselho Federal de Medicina

CINAHL Cumulative Index to Nursing & Allied Health Literature

COMPIN Comisión de Medicina Preventiva e Invalidez del Servicio de Salud

CONSU Conselho de Saúde Suplementar

DGS Direcção Geral de Saúde

DIOPs Documento de Informações Periódicas das Operadoras de Planos de Saúde

DIPRO Diretoria de Normas e Habilitação dos Produtos

DINRED División de Inversiones y Desarrollo de la Red Asistencial

Page 10: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

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EACs Ensaio(s) Aleatorizado(s) e Controlado(s)

EBM Evidence-based Medicine

EMBASE Excerpta Medica Database

EPC Evidence-based Practice Centers

EUA Estados Unidos da América

FFAA Forças Armadas Chilena

FML Faculdade de Medicina de Lisboa

FONASA Fondo Nacional de Salud

GCOMS Gerência de Comunicação

GDR Grupos Relacionados por el Diagnóstico

GES Garantías Explícitas en Salud

GETEC Grupo de Trabalho de Gestão de Tecnologia

GGTAP Gerência-Geral Técnico-Assistencial dos Produtos

GIN Guidelines International Network

GPC Guías de Prática Clínica

HIV Human Immunodeficiency Virus

IAM Infarto Agudo do Miocárdio

INP Instituto de Normalizacion Previsional

INS Inquérito Nacional de Saúde

ISAPRES Instituciones de Salud Previsional

MBE Medicina Baseada na Evidência

Medline Medical Literature Analysis and Retrieval System Online

MCPS Missão para os Cuidados Primários

MINSAL Ministerio de Salud de Chile

MLE Modalidade de Livre Eleição

MS Ministério da Saúde

NHS National Health Service

NICE National Institute of Clinical Excellence

NOC Norma de Orientação Clínica

OMS Organização Mundial de Saúde

Opas Organização Pan-americana da Saúde

OR Odds Ratio

PAD Pago asociado a diagnóstico

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PAC Programa de Aceleração do Crescimento

PIB Produto Interno Bruto

PICO Paciente/População, Intervenção, Comparação/Controle e Outcome

POS Programa Obligatorio de Salud

POS-C Plan Obligatorio de Salud del régimen contributivo

POS – S Plan Obligatorio de Salud del régimen subsidiado

PRESI Presidência

QALYs Quality Adjusted Life Years

RCTs Randomized Controled Trials

RS Revisões Sistemáticas

RN Resolução Normativa

SDRA Síndrome do desconforto respiratório agudo

SDST Supra-desnível do segmento ST

SGSSS Sistema General de Seguridad Social en Salud en Colombia

SIDA Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

SIGN Scottish Intercollegiate Guidelines Network

SNC Sistema Nervoso Central

SNS Serviço Nacional de Saúde

SNSS Sistema Nacional de Serviços de Saúde

SIL Subsidio por incapacidad laboral

SUS Sistema Único de Saúde

TSN Terapêutica de Substituição Nicotínica

UK United Kingdom

UPC Unidad de Pago por Capitación

US United States

USF Unidades de Saúde Familiar

UTI Unidade de Terapia Intensiva

WHO World Health Organization

Para melhor compreensão dos capítulos que compõe este livro, esclarecemos que são termos sinônimos comumente utilizados pela área de saúde nos idiomas Português, Espanhol e Inglês : Diretrizes Clínicas, Normas de Orientação Clínica (NOC), Guidelines e Guías de Prácticas Clínicas (GPC).

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Sumário

I. Diretrizes clínicas e a busca da qualidade da atenção na saúde suplementar ___21

1. A Agência Nacional de Saúde Suplementar e a cobertura mínima obrigatória __21

2. Um grande desafio para a ANS: estimular a promoção da saúde com qualidade e eficiência ______________________________________________22

3. O convênio entre a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a Associação Médica Brasileira (AMB) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) ____28

4. Priorização de temas para as diretrizes _________________________________31

5. Metodologia ________________________________________________________32

6. Sensibilização, busca de apoio e discussão do projeto ____________________33

7. Produção de diretrizes clínicas pelas sociedades _________________________34

8. Validação técnica pelo grupo técnico da AMB e validação da implementação e monitoramento ________________________________________34

9. Implementação para o sistema de saúde suplementar ____________________35

10. Uma proposta inovadora: grandes desafios e expectativas _______________36

11. Referências _______________________________________________________37

II. Diretrizes clínicas baseadas em evidência________________________________41

1. Definição __________________________________________________________41

2. Objetivo ____________________________________________________________42

3. Métodos de elaboração ______________________________________________42

4. História ____________________________________________________________43

5. Trajetória no Brasil __________________________________________________45

6. Atualidade do Projeto ________________________________________________56

7. Referências ________________________________________________________60

III. Setor privado chileno e as diretrizes clínicas _____________________________63 Sum

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Page 13: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

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1. Sistema de saúde chileno ____________________________________________63

1.1. Demanda por serviços de saúde ________________________________________63

1.2. Distribuição percentual por sistema previsional _____________________________65

1.3. Despesa em saúde __________________________________________________65

1.4. Oferta de serviços de saúde ___________________________________________70

1.5. Distribuição de prestadores de saúde ____________________________________71

2. A reforma da saúde e as diretrizes _____________________________________73

2.1. Priorização de doenças _______________________________________________74

2.2. Análise da Capacidade de Oferta ________________________________________76

2.3. Definição de garantias do Plano AUGE ___________________________________80

2.4. Garantia de Acesso __________________________________________________80

2.5. Garantia de Qualidade ________________________________________________80

2.6. Garantia de Oportunidade _____________________________________________82

2.7. Garantias Financeiras ________________________________________________84

2.8. Lista de patologias GES (Lei AUGE) ______________________________________89

2.9. Efetividade das diretrizes clínicas AUGE __________________________________90

3.Os desafios que deverão enfrentar as diretrizes clínicas ___________________94

4. Links informativos sobre saúde _______________________________________96

5. Referências ________________________________________________________97

IV- O sistema de saúde na Colômbia e o papel das diretrizes clínicas baseadas em evidência – uma visão atual __________________________________99

V- Elaboração, disseminação e implementação de Normas de Orientação Clínica (guidelines) em Portugal - o papel de um centro universitário ___________________________________________________________111

1. Introdução ________________________________________________________111

Sum

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13

2. As normas de orientação clínica como instrumentos de qualidade em saúde __113

3. Quem elabora as NOCs em Portugal? _________________________________114

4. Que tópicos são selecionados? _______________________________________115

5. O papel de produção de NOCs por um centro universitário: o exemplo da “Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica” do Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência da Faculdade de Medicina de Lisboa _______________________________________116

5.1. Seleção do tema ___________________________________________________117

5.2. Estrutura da NOC __________________________________________________118

5.3. Objetivos da NOC __________________________________________________120

5.4. Metodologia da NOC (seleção, avaliação, hierarquização da evidência) __________120

5.4.1. Metodologia de seleção da evidência científica _______________________120

5.5. Avaliação crítica da evidência científica __________________________________122

5.6. Hierarquização da evidência científica ___________________________________123

5.6.1. Base de evidência para construção da NOC _________________________125

5.6.2. Recomendações principais da NOC (alguns exemplos) _________________126

5.6.2.1. Exemplo de intervenções farmacológicas __________________________127

5.6.2.2. Exemplo de intervenções não-farmacológicas ______________________128

6. Que tipo de disseminação de NOCs em Portugal? _______________________129

7. Que tipo de implementação de NOCs em Portugal? ______________________130

8. Conclusões ________________________________________________________131

9. Referências _______________________________________________________132

Sum

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Page 16: A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde

á é claramente reconhecida em todo o mundo a necessidade de utilização de diretrizes clínicas baseadas em evidências científicas para qualifica-ção da atenção à saúde prestada. A adoção de pro-

tocolos respaldados e definidos a partir da melhor evidência científica disponível contribui para a obtenção de melhores resultados de saúde na população, como já demonstrado em vários estudos, assim como para fazer frente ao crescente custo da assistência médica e à incorporação tecnológica acrítica e permeada por conflitos de interesses.

A presente publicação, fruto da parceria entre a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e a Organização Pan-Americana da Saúde - OPAS apresenta não só o convênio estabelecido entre aquela agência reguladora, a Associação Médica Brasileira - AMB e o Conselho Federal de Medicina - CFM para a elaboração de diretrizes clínicas voltadas à qualificação da atenção prestada aos benefici-ários de planos de saúde no Brasil, como também experi-ências internacionais de elaboração e implementação de diretrizes clínicas, discutidas durante o seminário ocorrido em abril do presente ano, apoiado pela Opas.

Dessa maneira, o capítulo I, elaborado pela ANS, traz a caracterização do convênio anteriormente citado: os temas prioritários, a metodologia utilizada, os desafios já superados e as expectativas dos atores envolvidos.

No capítulo II, o Dr. Wanderley Bernardo, Coordenador do Núcleo de Medicina Baseada em Evidência da Faculdade de Medicina da USP e Coordenador do Programa Diretrizes da AMB e CFM, apresenta um histórico sobre o trabalho de elaboração e disseminação de diretrizes clínicas iniciado pela AMB no Projeto Diretrizes, e seu desenvolvimento, que culminou no convênio entre esta entidade e a ANS. Este convênio, que inclui a capacitação de profissionais para a elaboração, revisão e disseminação de diretrizes clí-nicas no setor suplementar de saúde, visa a elaboração de Pr

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diretrizes voltadas ao tratamento/diagnóstico dos problemas de saúde que mais afetam os beneficiários de planos de saúde no Brasil.

A primeira das experiências internacionais apresentada é a do Chile, descrita no capítulo III pelo Dr. César Cárcamo Quezada, diretor médico do Hospital Mutual de Seguridade de Santiago. A partir da Reforma Sanitária implementada naquele país, o governo definiu, por meio da Lei Auge (2003), a instituição de diretrizes clínicas como prática dese-jável para garantir qualidade na atenção à saúde. Hoje, as cerca de 63 diretrizes construídas para intervenção sobre os problemas de saúde epidemiologicamente mais relevantes têm impactado de forma positiva os resultados de saúde da população chilena.

No capítulo IV, o Dr. Rodrigo Pardo Turriago, do Instituto de Investigações Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Nacional de Colombia, apresenta a experiência da Colômbia onde, desde 2006, vem sendo discutida e planejada a elaboração de guias clínicas para algumas condições de saúde definidas. O processo vem sendo aprimorado e estas ferramentas têm sido importantes para a reforma do sistema de saúde colombiano, apesar de ainda existirem vários desafios a serem enfrentados.

Visando aproveitar os caminhos já trilhados e bem sucedidos internacionalmente, no capítulo V a experiência de Portugal de ela-boração e disseminação das Normas de Orientação Clínica (NOCs) é apresentada pelo Dr. Antonio Vaz Carneiro, do Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência, da Faculdade de Medicina de Lisboa. Vale destacar os avanços deste processo, tais como o envolvimento de atores estratégicos na elaboração das diretrizes clínicas referentes aos principais problemas de saúde daquele país, e os desafios ainda exis-tentes, relacionados à disseminação e implementação das mesmas.

Todas essas experiências e iniciativas reforçam a importância da introdução do tema na agenda prioritária do governo, visando munir de ferramentas os atores dos sistemas de saúde, sejam eles públicos ou privados, para qualificação da prática clínica e melhor cuidado à saúde dos seus usuários. Nesse sentido, a presente publicação deve ser saudada e acolhida por todos os atores da área de saúde que, no cotidiano de seus serviços, têm se desdobrado para construir um sis-tema de saúde de qualidade, resolutivo e que efetivamente atenda às necessidades da população brasileira.

Alzira de Oliveira Jorge

Ex- secretária executiva da ANS e Atual assessora da Secretaria Municipal de Saúde de Belo HorizontePr

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implementação de diretrizes clínicas é uma das metas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Mais Saúde. Para atingir esse objetivo, a Agência Nacional de Saúde

Suplementar (ANS) firmou convênio com a Associação Médica Brasileira (AMB) e com o Conselho Federal de Medicina (CFM) em 2008. Esse convênio, em fase de implementação, tem permitido que as diretrizes sejam distribuídas entre as linhas de atenção à saúde e prio-rizadas de acordo com as necessidades do sistema de saúde brasileiro.

No ano de 2009, foi realizado o Seminário: “A imple-mentação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: expe-riências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil” com o apoio da Organização Pan-americana da Saúde (Opas). Foi um importante passo para todos os países presentes: Brasil, Chile, Colômbia e Portugal e, ao mesmo tempo, demonstrou que a organização e utiliza-ção de diretrizes clínicas continuam como um desafio. Este livro nos permite conhecer as experiências nesses países, com destaque para o caso brasileiro.

O resultado de utilização das diretrizes clínicas con-tribuirá para a melhoria da qualidade da atenção à saúde de todo o sistema de saúde brasileiro, não apenas para o sistema de saúde suplementar.

Fausto Pereira dos Santos

Diretor - Presidente da ANS

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egundo as estatísticas mais recentes (2009), mais de 41 milhões de brasileiros são benefici-ários de algum plano de saúde. Dez anos atrás, não chegavam a 30 milhões. No ano de 2007, a

saúde suplementar realizou 4,5 milhões de internações hospitalares e 192 milhões de consultas médicas. São números extremamente importantes, mesmo compara-dos com os dados do SUS, que fechou o ano de 2007 com 10,8 milhões de internações e 610 milhões de con-sultas médicas.

Vale ressaltar que a gestão desses enormes volumes de procedimentos e práticas da saúde suplementar acontece em ambientes sociais e econômicos em rápida transfor-mação por causa de fatores não controláveis, como, por exemplo, o envelhecimento da população ou a crescente disponibilidade de tecnologia avançada em todas as áreas da atenção à saúde.

O setor da saúde suplementar opera, portanto, num contexto de extrema complexidade, e, consequentemente, tem que enfrentar enormes desafios de gestão. Esses desafios requerem respostas organizacionais e soluções técnicas inovadoras, que visem à eficiência no uso dos recursos, numa lógica orientada à contínua melhoria da qualidade da atenção.

Nessa perspectiva, a estratégia da ANS de orientar o funcionamento do sistema da saúde suplementar a partir de Diretrizes Clínicas baseadas na evidência é absolu-tamente central. Esse instrumento é fundamental para orientar de forma racional as decisões clínicas, garan-tindo uma alocação de recursos ética e tecnicamente correta, por ser baseada em evidências científicas e no consenso das comunidades profissionais.

Ao mesmo tempo, é importante enfatizar que este livro nos confirma que a estratégia das Diretrizes Clínicas está sendo adotada em muitas experiências de saúde suplemen-

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20

tar em outros países, o que demonstra que a Opas está certa quando apóia e promove essa linha de trabalho entre os países da região.

Diego Victoria Mejía

Representante da Opas (Organização Pan-americana da Saúde)OMS (Organização Mundial de Saúde) no Brasil.

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Gerência-Geral Técnico Assistencial dos Produtos - GGTAPDiretoria de Normas e Habilitação dos Produtos - DIPRO

Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)

1. A Agência Nacional de Saúde Suplementar e a cobertura mínima obrigatória

Com o objetivo de oferecer à população um serviço de saúde gratuito e integral, o Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado a partir da Lei Orgânica da Saúde nº 8.080/1990. Entretanto, garantir universalidade e integralidade num país desigual e com recursos orçamentários e financeiros escassos constitui-se em tarefa árdua 1,2.

Como são muitos ainda os desafios a serem enfrenta-dos na consolidação do SUS, aproximadamente um quarto da população vem buscando a contratação de planos de assistência à saúde privados, com vistas a garantir uma cobertura assistencial de qualidade 3.

Ainda de acordo com a Constituição, a iniciativa privada é livre para prestar assistência e estabelece, dessa forma, uma interface com o SUS. Assim, o que se pode observar em nosso país é um modelo de atenção à saúde, caracteri-zado pela dicotomia entre o setor público e o privado 4.

O grande crescimento do setor de saúde suplementar ocorreu no final dos anos 80 e na década de 90. A partir daí, operadoras de planos e seguros, prestadores e beneficiários passaram a conviver nem sempre de maneira harmoniosa 4,5. Grandes distorções em relação à assistência prestada aos beneficiários, bem como a prática de reajustes muito superiores à inflação e a falência de seguradoras ou ope-radoras de planos de saúde, questões que frequentemente eram resolvidas pelo judiciário, levaram à mobilização de

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vários grupos sociais e surgiram propostas para regulamentação do setor que tramitaram durante vários anos no Congresso Nacional.

Assim, na tentativa de minimizar esses conflitos, a Lei nº 9.656 foi aprovada em 1998, seguida da Lei nº 9.961/2000, que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar. A primeira teve como objetivo esta-belecer normas para os contratos de planos de saúde e coberturas. A segunda criou a ANS, com o objetivo de regular, normatizar, controlar e fiscalizar as atividades do setor de assistência suplementar à saúde 5,6.

Dentre os objetivos da regulação do mercado de saúde suplementar, consta garantir, à população coberta por planos de saúde, cobertura assistencial integral e regular as condições de acesso. Cabe, portanto, à ANS desenvolver mecanismos regulatórios capazes de promover garantias assistenciais 7,8.

Antes da Lei nº 9.656/98, o acesso aos procedimentos era definido através de contratos firmados entre operadoras de planos de saúde e beneficiários. Assim, não havia cobertura mínima obrigatória definida e tratamentos de alto custo, doenças crônico-degenerativas, doenças infec-ciosas, dentre outras, eram excluídas dos contratos pelas operadoras 8.

Dentre os avanços relevantes conquistados a partir da normati-zação do setor, destaca-se a definição de róis de procedimentos. No que tange à regulação assistencial, o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde é o instrumento que define a cobertura mínima obrigatória que todos os planos de saúde regulamentados devem oferecer a seus usuários, tendo em vista a segmentação contratada5. O rol é revisto periodicamente para possibilitar a incorporação de novas tecnologias, cuja eficácia e segurança sejam comprovadas, e a exclusão daquelas que já se tornaram obsoletas. A última revisão ocorreu em 2008 com a edição da Resolução Normativa nº167 9.

Além do rol de procedimentos, de cunho obrigatório, a Agência também atua de forma indutora, estimulando a criação de projetos de promoção e prevenção em saúde e ações voltadas à melhoria da qualidade da atenção prestada aos beneficiários.

2. Um grande desafio para a ANS: estimular a promoção da saúde com qualidade e eficiência

O setor privado de assistência à saúde vem crescendo muito no Brasil. O número de beneficiários vem aumentando nos últimos anos,

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23A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

e nos planos de assistência médica, esse número cresceu 5,3% de 2008 a 200910 (gráfico 1).

Gráfico 1 - Taxa de crescimento anual do número de beneficiários, por cobertura assistencial (Brasil – março/2001-março/2009)

Fonte: Sistema de Informações de Beneficiários - ANS/MS - 03/2009

O número absoluto de beneficiários de planos com assistência médica passou de 41 milhões e 300 mil, em 2008, para 41 milhões e 400 mil, em 2009 10 (gráfico 2).

Gráfico 2 - Beneficiários de planos de saúde por cobertura assistencial do plano

(Brasil 2000-2009)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

55

Total

Exclusivamente odontológico

Assistência médica com ou sem odontologia

(milh

ões)

jun/09dez/08dez/07dez/06dez/05dez/04

33,5 34,4 35,0 35,939,0

41,744,9

48,3

52,4 52,7

30,7 31,2 31,1 31,433,4 35,2

37,1 39,041,3 41,4

2,8 3,2 3,8 4,5 5,6 6,5 7,7 9,311,1 11,3

dez/03dez/02dez/01dez/00

Fonte: Sistema de Informações de Beneficiários - ANS/MS - 03/2009 Nota: O termo “beneficiário” refere-se a vínculos aos planos de saúde, podendo incluir vários vínculos para um mesmo indivíduo

A receita das operadoras também apresentou crescimento e nos anos de 2007 a 2008 cresceu 14%, o que pode ser observado na tabela 1. Contudo, a despesa assistencial apresentou o mesmo crescimento (tabela 2), enquanto a taxa de sinistralidade, que é a relação da receita das operadoras com a despesa assistencial, manteve-se estável nesse mesmo período (tabela 3)10.

Total

Assistência médica

Exclusivamente odontológicos

-5

0

5

10

15

20

25

30

mar/09mar/08mar/07mar/06mar/05mar/04mar/03mar/02

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24 A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Tabela 1 - Receita de contraprestações das operadoras de planos de saúde, segundo a modalidade da operadora (Brasil - 2003-2009)

Modalidade da operadora

2003 2004 2005 2006 2007 2008 (2)2009

(2º trimestre)

Total 28.485.485.795 32.213.731.248 37.115.756.529 41.987.294.255 51.757.966.246 60.340.019.686 28.995.201.546

Operadoras médico-hospitalares

28.014.761.445 31.619.718.183 36.373.157.129 41.111.274.498 50.686.440.441 59.180.046.949 28.995.201.546

Autogestão (1) 533.986.730 655.892.077 768.172.132 887.569.521 6.281.299.728 6.908.079.185 3.481.747.066

Cooperativa médica

10.613.942.396 12.163.851.797 13.989.222.898 16.427.043.182 18.183.202.630 21.254.917.270 10.200.238.848

Filantropia 864.327.484 868.818.355 1.079.015.202 1.189.206.431 1.925.933.929 2.197.375.082 650.911.181

Medicina de grupo

9.301.199.758 10.408.605.873 12.624.257.513 13.857.515.799 15.687.580.405 17.765.340.632 8.724.719.732

Seguradora especializada em saúde

6.701.305.077 7.522.550.081 7.912.489.383 8.749.939.565 8.608.423.749 11.054.334.780 5.937.584.718

Operadoras exclusivamente odontológicas

470.724.351 594.013.065 742.599.400 876.019.757 1.071.525.805 1.159.972.737 517.857.095

Cooperativa odontológica

153.760.104 211.717.782 246.802.425 249.336.442 320.920.840 357.994.563 153.033.128

Odontologia de grupo

316.964.247 382.295.283 495.796.974 626.683.315 750.604.965 801.978.175 364.823.967

Fonte: Diops - 10/09/2009 e FIP - 12/2006

Nota: Dados preliminares, sujeitos a revisão

(1) As operadoras da modalidade autogestão passaram a informar suas receitas, obrigatoriamente, a partir de 2007.

(2) Para as operadoras que não enviaram Diops no quarto trimestre (correspondente a 5,6% dos beneficiários), foi utilizada a receita informada no terceiro trimestre (3,8% dos beneficiários).

Tabela 2 - Despesa assistencial das operadoras de planos de saúde, segundo a modalidade da operadora (Brasil - 2003-2009) (R$)

Modalidade da operadora

2003 2004 2005 2006 2007 2008 (2)2009

(2º trimestre)

Total 23.043.973.951 26.057.907.316 29.981.219.564 33.185.466.052 41.350.560.487 48.141.935.671 23.873.219.169

Operadoras médico-hospitalares

22.784.352.955 25.754.801.297 29.615.426.841 32.779.765.810 40.836.493.850 47.571.327.200 23.626.928.115

Autogestão (1) 441.709.994 596.180.386 681.347.357 738.472.023 5.513.398.343 6.352.384.350 3.061.473.163

Cooperativa médica

8.869.493.804 10.097.592.332 11.449.167.783 13.260.743.955 14.482.374.798 17.282.102.132 8.262.235.584

Filantropia 633.490.700 670.288.462 792.974.416 899.286.964 1.030.464.258 1.157.092.758 521.857.119

Medicina de grupo

7.060.027.483 7.828.390.298 9.572.041.626 10.533.969.108 12.088.499.137 13.772.393.536 6.850.856.180

Seguradora especializada em saúde

5.779.630.973 6.562.349.818 7.119.895.660 7.347.293.760 7.721.757.314 9.007.354.424 4.930.506.070

Operadoras exclusivamente odontológicas

259.620.996 303.106.019 365.792.723 405.700.243 514.066.637 570.608.471 246.291.054

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Modalidade da operadora

2003 2004 2005 2006 2007 2008 (2)2009

(2º trimestre)

Cooperativa odontológica

117.318.415 141.011.501 162.137.862 157.373.064 208.388.416 233.710.821 95.008.033

Odontologia de grupo

142.302.581 162.094.518 203.654.862 248.327.178 305.678.221 336.897.650 151.283.021

Fonte: Diops - 10/09/2009 e FIP - 12/2006

Nota: Dados preliminares, sujeitos a revisão.

(1) As operadoras da modalidade autogestão passaram a informar suas receitas, obrigatoriamente, a partir de 2007.

(2) Para as operadoras que não enviaram Diops no quarto trimestre (correspondente a 5,6% dos beneficiários), foi utilizada a despesa informada no terceiro trimestre (3,8% dos beneficiários).

Tabela 3 - Taxa de sinistralidade das operadoras de planos de saúde, segundo a modalidade da operadora (Brasil - 2003-2009)

Modalidade da operadora

2003 2004 2005 2006 2007 20082009

(1º trimestre)

Total 80,9 80,9 80,8 79,0 79,9 79,8 82,3

Operadoras médico-hospitalares

81,3 81,5 81,4 79,7 80,6 80,4 81,5

Autogestão 82,7 90,9 88,7 83,2 87,8 92,0 87,9

Cooperativa médica 83,6 83,0 81,8 80,7 79,6 81,3 81,0

Filantropia 73,3 77,1 73,5 75,6 53,5 52,7 80,2

Medicina de grupo 75,9 75,2 75,8 76,0 77,1 77,5 78,5

Seguradora especializada em saúde

86,2 87,2 90,0 84,0 89,7 81,5 83,0

Operadoras exclusivamente odontológicas

55,2 51,0 49,3 46,3 48,0 49,2 47,6

Cooperativa odontológica

76,3 66,6 65,7 63,1 64,9 65,3 62,1

Odontologia de grupo 44,9 42,4 41,1 39,6 40,7 42,0 41,5

Fonte: Diops - 10/09/2009

Nota: Dados preliminares, sujeitos a revisão.

A taxa de internação de beneficiários manteve-se estável (tabela 4), porém o gasto médio de internação no setor passou de R$ 3.238,32, em 2007, para R$ 3.480,75, em 2008, representando um crescimento de 7% no período (tabela 5)10.

Tabela 4 - Eventos e beneficiários, segundo o tipo de evento (Brasil - 2007-2008)

Tipo de evento 2007 2008

Internações

Eventos 4.490.471 4.809.734

Beneficiários 33.903.299 36.495.609

Taxa de internação de beneficiários (%) 13,2 13,2

Consultas

Eventos 192.548.117 211.531.655

Beneficiários 37.057.955 39.840.542

Consultas por beneficiário 5,2 5,3

Fontes: Sistema de Informações de Beneficiários - ANS/MS - 06/2009 e Sistema de Informações de Produtos - ANS/MS - 05/06/09

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Tabela 5 - Taxa de internação de beneficiários e gasto médio por internação, por tipo de contratação, segundo a modalidade da operadora (Brasil - 2007-2008)

Modalidade da operadora

Taxa de internação (%) Gasto médio (R$)

Total (1) Coletivo Individual Total (1) Coletivo Individual

2007

Total 13,2 13,3 16,0 3.238,32 3.129,57 3.516,41

Autogestão 13,5 13,5 - 3.493,08 3.493,08 -

Cooperativa Médica 15,4 15,5 17,9 2.287,12 2.138,84 2.598,05

Filantropia 15,1 14,2 18,9 2.176,81 1.884,55 2.451,71

Medicina de Grupo 11,7 11,7 14,6 2.824,88 2.720,56 3.000,37

Seguradora Especializada em Saúde

13,0 12,3 16,4 6.963,91 6.012,73 10.535,55

2008

Total 13,2 13,1 16,2 3.480,75 3.397,01 3.700,99

Autogestão 15,3 15,3 - 3.555,78 3.555,78 -

Cooperativa Médica 15,7 15,3 19,4 2.686,52 2.594,90 2.888,16

Filantropia 14,5 13,9 17,6 2.421,85 2.153,88 2.711,60

Medicina de Grupo 11,0 10,7 13,8 3.093,92 3.107,10 3.072,36

Seguradora Especializada em Saúde

11,7 10,9 17,3 7.246,68 6.167,27 11.665,24

Fontes: Sistema de Informações de Beneficiários - ANS/MS - 06/2009 e Sistema de Informações de Produtos - ANS/MS - 05/06/09

(1) Inclui internações de beneficiários em planos com tipo de contratação não identificado.

O Brasil investe cerca de 8% do PIB no setor de saúde. Nas últimas décadas, esse gasto vem crescendo muito. Isso é bastante significativo quando analisados os investimentos dos países desenvolvidos nesse setor. Nos anos 1960, países como Canadá, França, Suíça, Austrália, Itália e Estados Unidos gastavam cerca de 4-5% do PIB em saúde. No final dos anos 1980, esse custo havia aumentado para 8-9%. Já em 2004, os gastos em saúde dos Estados Unidos eram cerca de U$ 1.7 tri-lhão, ou 15,3% do PIB11. Diante da perspectiva de escassez de recursos em nosso país, vê-se a extrema necessidade de melhorar a eficiência do sistema, diminuindo custos, desperdícios e melhorando a qualidade da assistência.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (World Health Organization – WHO), alguns descritores de qualidade do cuidado em saúde são: efetividade, eficiência, aceitação/centrado no paciente, equidade e segurança12. Essas características devem nortear as políticas de saúde, sejam elas públicas ou privadas.

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O grande aumento do número de tecnologias, produzidas e incor-poradas nas últimas duas décadas, tem sido associado à queda na mor-talidade, que se deve também ao aumento do volume de informação produzida a respeito de tecnologias médicas e ao acréscimo no custo da assistência. Isso é especialmente significativo em áreas como medi-cina perinatal e cardiovascular 13,14 .

Contudo, ainda existem diversas discrepâncias entre a prática clí-nica e a medicina baseada em evidência, o que pode ser observado em diversos estudos internacionais que não encontraram evidência científica para procedimentos larga e longamente utilizados e outros que mostraram grande variação no uso de tecnologias sem variação no resultado obtido15,16,17,18,19,20,21. Em outros casos, mostrou-se que tecnologias comprovadamente sem efeito, ou com efeito deletério, continuavam sendo amplamente utilizadas, ao passo que aquelas com-provadamente eficazes apresentavam baixa utilização22. Outra questão bastante frequente é a utilização de tecnologias fora das condições nas quais se mostraram eficazes 23,24.

Há anos os médicos vêm utilizando ferramentas para nortear a prática clínica, entre elas se encontram os guidelines, definidos como “afirmações sistematicamente desenvolvidas para subsidiar as decisões do médico e do paciente acerca do cuidado de saúde apropriado para circunstâncias clínicas específicas”. Essa definição ratifica seu papel em apoiar decisões clínicas para pacientes individuais, embora também atue como instrumento para avaliar e assegurar a qualidade da atenção e como guia para alocação de recursos, por exemplo, para decisões sobre cobertura 25. Seus objetivos principais seriam melhorar a qualidade e o resultado do cuidado prestado ao paciente, sintetizar os achados das pesquisas de forma a fundamentar as decisões clínicas, reduzir a varia-ção de condutas na prática clínica, identificar lapsos de conhecimento e priorizar atividades de pesquisa 26,27. Por isso, durante as últimas décadas, ocorreu um grande movimento de produção dessas guias.

Em uma revisão sistemática de 87 estudos sobre o uso dos guide-lines, concluiu-se que em 81 deles havia evidências de melhora do atendimento dos pacientes 28.

Há hoje um consenso, em âmbito internacional, de que a imple-mentação de diretrizes para a prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação de doenças, definidas a partir das melhores evidências científicas disponíveis, acerca da eficácia e efetividade de interven-ções, produz melhores resultados na população assistida do que a sua não utilização 29,30. Dessa forma, inúmeras organizações, em diversos

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países do mundo, têm se dedicado à sistematização de diretrizes para a assistência à saúde. Merecem destaque algumas agências governamen-tais que, atuando isoladamente ou em conjunto com sociedades pro-fissionais, instituições acadêmicas e organizações não governamentais desempenham um importante papel nesse contexto. Com menor nível de independência de interesses, listam-se ainda organizações privadas, entre as quais as próprias operadoras de planos de saúde.

3. O convênio entre a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a Associação Médica Brasileira (AMB) e o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Alguns anos após a edição da Lei nº 9.656 e Lei nº 9.961, a ANS ganhou experiência, adquiriu cada vez mais conhecimento sobre o setor regulado e trouxe para a discussão a demanda pela melhoria da qualidade da assistência. A partir desse novo paradigma, iniciou-se um processo de avaliação técnica, visando identificar algumas dificuldades e estabelecer soluções para que o objetivo principal fosse alcançado.

No Brasil, a maioria das diretrizes clínicas, sejam elas formalizadas ou não em protocolos, tratam de questões ou tecnologias assistenciais e são definidas a partir de consensos e opiniões de especialistas e/ou conformações à pressão de determinados grupos de interesse, caracte-rizando-se, assim, pela ausência de método para sua definição.

Embora no setor suplementar de saúde diversas operadoras de planos e prestadores de serviços já venham produzindo protocolos clínicos, as metodologias utilizadas são muito variáveis, seja do ponto de vista da pesquisa e avaliação das evidências, seja da validação, formatação ou mesmo da utilização das diretrizes.

Ao editar o novo Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde (RN nº 167/08), a ANS introduziu protocolos de utilização para procedimentos específicos. Esses protocolos tinham como foco principal coibir o mau uso de algumas tecnologias, imputando obrigatoriedade de cobertura apenas nos casos em que houvesse indicação prevista em Lei (como é o caso da indicação da laqueadura tubária), portarias governamentais ou diretrizes clínicas já produzidas.

Devido à sua simplicidade, a aplicação desses protocolos pelas auditorias médicas realizadas pelas operadoras foi muito bem aceita. Contudo, apesar de terem sido o primeiro passo para a melhoria da

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qualidade assistencial no setor e para a utilização racional dos recur-sos, tais protocolos tratavam de aspectos pontuais dentro da cobertura obrigatória de determinadas tecnologias e não respondiam satisfa-toriamente à demanda por qualificação da assistência prestada aos beneficiários de planos de saúde.

Sob este pano de fundo, verificou-se a necessidade de elaboração de diretrizes que, por sua abrangência, impactassem positivamente os indi-cadores de saúde dos usuários de planos de saúde e visassem não somente à indicação correta da utilização de determinadas tecnologias em saúde, mas fornecessem parâmetros clínicos para o tratamento, a reabilitação e o diagnóstico das principais patologias que acometem esta população.

O desenvolvimento do projeto que aqui apresentamos inclui a ela-boração e implementação na prática clínica de diretrizes e protocolos baseados em evidências científicas de qualidade, dentro de um modelo que auxilie a tomada de decisão clínica e o cuidado aos pacientes, e que contemple os temas relacionados aos principais problemas de saúde que afetam a população atendida pelos planos de saúde no país.

Através da análise de estudos internacionais, identificaram-se alguns fatores facilitadores do uso de diretrizes clínicas, entre eles o fato de sua aplicação ser mais bem sucedida em áreas específicas da atenção médica, tais como a cardiologia, a oncologia e a oftalmologia. Ademais, verificou-se a necessidade de as diretrizes clínicas serem atu-ais, simples, precisas, não controversas e não demandarem mudanças importantes na prática cotidiana 31,32. Por fim, devem ser desenvolvidas ou endossadas por organizações profissionais e por médicos reconhe-cidos como líderes nas áreas em foco 33.

Com o respaldo desta análise da bibliografia, foram iniciados os primeiros contatos com a Associação Médica Brasileira (AMB) e o Conselho Federal de Medicina (CFM), com o objetivo de discutir a necessidade de se estabelecer critérios baseados em evidências cientí-ficas para utilização de determinadas tecnologias e o tratamento das patologias mais prevalentes entre os usuários de planos de saúde.

O reconhecimento da importância do tema culminou na assinatura de um convênio entre a ANS e as entidades anteriormente citadas com vistas à elaboração de diretrizes para a assistência prestada no âmbito do setor suplementar de saúde, com duração de 18 meses.

A escolha de tais entidades como parceiras no projeto deu-se devido à legitimidade e prestígio que possuem e à penetração junto à classe médica, essencial para que as diretrizes elaboradas fossem adotadas e disseminadas e os resultados fossem alcançados. Em relação à AMB,

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ainda é digna de nota a experiência técnica prévia na elaboração de diretrizes clínicas.

Observa-se na literatura algumas premissas que indicam a qualidade de uma diretriz clínica, entre elas, a clareza de linguagem e nas recomenda-ções, reprodutibilidade, aplicabilidade clínica, flexibilidade, transparência no que se refere aos elaboradores e aos métodos utilizados 34. Dessa forma, tentou-se respeitar essas características durante todo o processo.

Para a otimização dos recursos, do tempo empenhado no projeto e a eficiência em relação aos resultados, todas as etapas de implementação do projeto foram previamente definidas, assim como as metas a elas relacionadas ( figura 1)

A partir daí, ANS, AMB e CFM passaram a concentrar esforços na sen-sibilização das sociedades médicas e operadoras de planos de saúde em relação à relevância do projeto, a partir da realização de diversas oficinas.

Neste processo integrado em busca da melhoria da qualidade assistencial do setor, as sociedades médicas passaram a ter um papel fundamental e tornaram-se as responsáveis pela elaboração das dire-trizes. Um grupo de revisores treinados pela AMB é o responsável pela validação técnica e um grupo de técnicos da ANS faz a validação da implementação e monitoramento.

A implementação deve ser feita através da divulgação, seminários em congressos, entre outras ações. Todo o processo será monitorado, com indicadores previamente definidos. Figura 1 - Fluxograma das etapas do Projeto diretrizes.

Definição das Prioridades

Construção da Metodologia

Sensibilização / Apoio / Discussão do Projeto com asSociedades Médicas e Grupo de Operadoras (GETEC)

Produção de Diretrizes pelas Sociedades (com metodologia científica, formato, temas prioritários)

Validação Técnica pelo Grupo Técnico da AMB (metodologia científica, formato, temas prioritários)

Validação da Implementação e Monitoramento (ANS)

Implementação para o Sistema de Saúde Suplementar

Seminários/Divulgação (indicadores de monitoramento)

Monitoramento e Implementação

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4. Priorização de temas para as diretrizes

Após a assinatura do convênio, o primeiro passo foi o estabele-cimento de temas prioritários para os quais seriam desenvolvidas as diretrizes clínicas. Nessa etapa, foi crucial a participação dos repre-sentantes dos diversos setores envolvidos, que encaminharam suas sugestões referentes à utilização de tecnologias no tratamento/diag-nóstico de patologias. Também foram realizadas diversas oficinas com representantes de operadoras, sociedades médicas, técnicos da ANS e da AMB para estabelecer os temas.

Algumas estratégias foram utilizadas com o objetivo de conhecer essas demandas. As diretrizes têm como foco principal a doença e o paciente. Durante o processo, observou-se que cada grupo tinha inte-resses específicos e, principalmente para as operadoras, a demanda era baseada no procedimento e não na patologia em que determinado procedimento seria empregado.

Assim, inicialmente, foi solicitado que esses representantes enca-minhassem suas demandas em forma de tópicos prioritários. Como os tópicos referiam-se a tecnologias que poderiam ser utilizadas em diversas patologias, optou-se por alterar a estratégia e solicitar que fossem enviadas perguntas, de tal forma que a tecnologia selecionada fosse atrelada a determinada doença. Essa metodologia mostrou-se extremamente interessante, uma vez que, dessa forma, foi possível identificar com maior precisão qual era a demanda desses atores.

Posteriormente, os temas encaminhados foram agrupados e adicio-nados àqueles já identificados pela ANS, provenientes dos questiona-mentos encaminhados por diversos atores e da consulta pública feita durante a última revisão do rol de procedimentos.

A priorização dos temas, ainda que adequada às peculiaridades do setor suplementar, obedeceu aos seguintes critérios, adotados pelo Ministério da Saúde (MS) e por agências internacionais de avaliação de tecnologias em saúde:

1. Relevância epidemiológica e importância clínica, com vistas a priorizar patologias mais prevalentes na população-alvo.

2. Complexidade do tema e diversidade de condutas, avaliando de que forma as decisões tomadas na prática clínica são divergentes entre si ou em relação às evidências encontradas na literatura.

3. Impacto na eficiência do sistema, isto é, qual o potencial que a diretriz tem em reduzir os custos desnecessários e possibilitar a apli-

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cação de recursos em práticas realmente efetivas, melhorando a quali-dade da assistência e ampliando o acesso ao sistema.

4. Relevância na Saúde Suplementar/políticas de saúde do MS, ou seja, de que maneira o tema encaminhado foi demandado entre os atores e como se relaciona com as políticas de saúde parametrizadas pelo Mistério da Saúde.

5. Fase do conhecimento, isto é, se há ou não disponibilidade de evidência científica sobre a questão a ser desenvolvida.

6. Viabilidade de implementação, isto é, quais são as barreiras à implementação da diretriz (custo de aplicação, necessidade de altera-ção da estrutura do sistema, aceitabilidade das recomendações pelos usuários, viabilidade de aplicação na prática clínica e possíveis confli-tos de interesses)

Neste processo, foram escolhidos 80 temas ordenados de acordo com os critérios estabelecidos. Os temas são pequenos tópicos de inte-resse dentro de determinada patologia ou síndrome. Eventualmente, foi priorizado um tema que contemple o diagnóstico de determinada doença e não seu tratamento, por aquele merecer maior atenção segundo os critérios determinados.

5. Metodologia

A metodologia foi construída pela Associação Médica Brasileira e aperfeiçoada visando à sua utilização pelas sociedades médicas. Tentou-se desenvolver uma metodologia simplificada, de fácil aplica-ção e entendimento. Após o treinamento dos médicos com experiência na prática clínica, representantes da sociedade de especialidade, esses profissionais iniciaram o processo de busca de evidência.

A grande vantagem desse tipo de estratégia é a possibilidade de disseminação entre os profissionais, para que sejam capazes de desen-volver diretrizes baseadas em evidência de qualidade e de forma siste-mática. A meta principal é a multiplicação do conhecimento para que o processo de desenvolvimento de diretrizes baseadas em evidência tenha continuidade e se perpetue, não necessitando mais de gran-des investimentos financeiros, onde a própria sociedade demande a necessidade de um processo contínuo de produção e implementação de diretrizes clínicas.

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Outra grande contribuição dessa metodologia é a uniformização da busca de evidência. Dessa forma, as diversas sociedades de especiali-dades utilizarão o mesmo método de produção de diretrizes clínicas, o que permitirá minimizar as distorções que ocorrem quando cada diretriz é produzida utilizando uma metodologia diferente.

6. Sensibilização, busca de apoio e discussão do projeto.

A implementação de diretrizes é um processo complicado, durante o qual diversas barreiras se impõem. A administração dos interesses envolvidos, a desconfiança da classe médica e a adaptação do sistema dependem de grande empenho dos interessados na sua implementação. Por isso, as entidades envolvidas passaram a concentrar esforços na sensibilização das sociedades médicas e operadoras de planos de saúde em relação à relevância do projeto.

Foram realizadas diversas reuniões com as sociedades de especiali-dades médicas para esclarecer os objetivos e as metas a serem alcan-çadas. Um temor importante desses atores era a influência na prática médica. O grande receio era que, uma vez que fossem implementa-dos protocolos clínicos, o médico não poderia mais avaliar a melhor conduta respeitando as características específicas de cada paciente. A superação desse obstáculo demandou grande discussão, visando escla-recer que as diretrizes clínicas, de forma alguma, engessam a prática médica. Ao contrário, são guias que serão utilizadas para a maioria dos pacientes, com evidências consistentes que permitam saber os benefí-cios reais de determinada conduta.

Organizou-se um seminário internacional com a presença de repre-sentantes de Portugal, Chile e Colômbia, com o objetivo de conhecer os êxitos e desafios encontrados durante a implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde e buscar, nessas experiências, elementos que auxiliem na construção desse processo no setor suplementar de saúde do Brasil. Esse encontro também foi importante para aprofun-dar a discussão entre operadoras, prestadores de serviços e a agên-cia reguladora sobre a implementação de diretrizes clínicas na saúde suplementar.

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7. Produção de diretrizes clínicas pelas sociedades

Entre as principais barreiras para o uso das diretrizes pelos médicos, estão: o desconhecimento de sua existência, a falta de familiaridade com o tema, a falta de concordância e a inércia à mudança de conduta 35.

Para minimizar essas barreiras, as sociedades médicas foram as res-ponsáveis pela produção das diretrizes clínicas. No treinamento feito pela AMB, para os representantes indicados por cada sociedade de espe-cialidade, buscou-se a padronização da metodologia que seria aplicada para a busca de evidência, formatação das diretrizes e linguagem a ser utilizada. Para isso, foram realizadas seis oficinas de trabalho com diver-sas sociedades onde estiveram presentes 69 participantes indicados.

Alguns temas abordam questões referentes a mais de uma especiali-dade. Dessa forma, a especialidade principal ficou responsável pela pro-dução da diretriz, que após a revisão, foi submetida à análise e à suges-tões das outras sociedades, que puderam fazer suas contribuições.

8. Validação técnica pelo grupo técnico da AMB e validação da implementação e monitoramento

Foram selecionados seis revisores com expertise na elaboração e revisão de diretrizes e vasta experiência acadêmica. Esses revisores contratados pela AMB ficaram responsáveis pela validação técnica.

Após a produção pelas sociedades de especialidades, foram encami-nhadas para as devidas considerações dos revisores e, posteriormente, devolvidas para as adaptações necessárias.

Essa segunda validação foi realizada pelo grupo técnico, constitu-ído por onze técnicos da ANS e seis representantes de operadoras. Ela foi realizada após a entrega das primeiras 20 diretrizes clínicas.

O grupo técnico avaliou oito perguntas:

1. O tema da diretriz é relevante para a saúde suplementar?

2. As perguntas formuladas são relevantes?

3. As perguntas estão redigidas de forma adequada?

4. Existem perguntas relevantes que não foram contempladas?

5. As respostas são claras?

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6. Existem repostas controversas?

7. A recomendação responde claramente à pergunta?

8. A recomendação é implementável?

Através da consolidação das respostas, observou-se a necessidade de algumas adequações, tais como a explicitação da recomendação, maior clareza e especificidade de algumas recomendações e aborda-gem de alguns detalhes relevantes dentro de determinadas diretrizes.

9. Implementação para o sistema de saúde suplementar

Um estudo nacional sobre a percepção de gestores de operadoras de planos de saúde sobre a utilização de diretrizes na saúde suplementar mostrou o perfil de utilização de diretrizes nas operadoras de planos de saúde, permitindo a sistematização dos tipos, fontes, nível de funda-mentação da evidência científica e a identificação dos desafios e estra-tégias para a sua implementação. Em apenas 32,3% das operadoras de planos de saúde e 51,6% dos hospitais prestadores no país, os gestores relataram o uso de diretrizes, havendo variação entre regiões e entre segmentos do mercado. As operadoras do segmento filantrópico (6,5%) e das seguradoras (7,7%) tiveram a menor taxa de utilização 36.

Nessa mesma perspectiva, foram realizadas entrevistas com pro-fissionais de alguns centros médicos internacionais, com o intuito de avaliar as diferenças nos serviços de auditoria e de feedback em locais com alta e baixa aderência a seis guidelines. Constatou-se que em ins-tituições de alto desempenho, as atividades da auditoria caracteriza-vam-se pela oportunidade, individualização, pelo caráter não punitivo e capacidade de adaptação a cada paciente 37.

Outros estudos indicam a maior efetividade de estratégias de disse-minação ativa de guidelines, calcadas em intervenções multifacetadas, incluindo a auditoria e feedback, consensos locais ou propaganda, e encontros educacionais interativos, ou ainda outras práticas de gestão da clínica, tais como a gestão do caso 38.

No contexto da saúde suplementar no Brasil, algumas metas foram traçadas para propiciar o adequado uso das diretrizes. Nesse sentido, serão realizadas cinco oficinas de trabalho regionalizadas, com foco no treinamento dos profissionais de saúde responsáveis pela assis-

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tência e objetivando a divulgação da metodologia, a abordagem de fatores que podem dificultar a implementação e a busca de soluções para os possíveis problemas. Outras cinco oficinas serão voltadas para monitorização e avaliação da utilização das diretrizes, identificando as dificuldades encontradas para aperfeiçoamento do processo. Também será instituído um programa piloto de implementação de diretrizes, com aplicação de questionário voltado aos profissionais de saúde antes e após o início do processo, com escolha de indicadores específicos para avaliar a adesão dos profissionais à utilização das diretrizes e seu impacto na qualificação da assistência.

Em paralelo às ações citadas, serão ministrados 12 cursos pré-con-gressos em todo o Brasil para que a classe médica se familiarize com os conceitos da medicina baseada em evidências e com a metodologia utilizada na produção das diretrizes.

Por fim, para uma ampla divulgação do conteúdo das diretrizes pelo público em geral, será desenvolvida página na web contendo ferramenta de pesquisa por palavras-chave que permitirá acesso fácil aos conteúdos referentes a diversas patologias e tecnologias em saúde. Além disso, está prevista a publicação de livretos contendo todas as diretrizes elaboradas, de forma que ocorra a disseminação entre os especialistas que, eventualmente, não participem das oficinas regiona-lizadas anteriormente citadas.

10. Uma proposta inovadora: grandes desafios e expectativas

Além de servirem como orientação aos profissionais de saúde, as diretrizes clínicas também são um poderoso instrumento para a gestão e a regulação dos sistemas de saúde, com o potencial de reduzir confli-tos entre prestadores, provedores e recebedores de cuidados, tanto nas esferas administrativa e judicial 34. Constituem-se em importante fer-ramenta para redução de eventos adversos e, portanto, para garantir a segurança do paciente. Podem ainda proporcionar aos pacientes dados de qualidade a respeito de sua saúde ou doença, notadamente em um momento em que existe enorme facilidade de acesso a todo o tipo de informação, seja ela confiável ou não.

Esse é o primeiro projeto que reúne entidades com reconhecida legi-timidade perante a sociedade em torno da produção e da implemen-

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tação de diretrizes clínicas na assistência suplementar à saúde. Ainda que a iniciativa tenha se dado no setor suplementar, o sistema de saúde como um todo se beneficiará com a publicização de tais protocolos, que estarão disponíveis para consulta e pesquisa pelo grande público, por meio de página na web especificamente desenvolvida para esse fim e da distribuição de material impresso entre os profissionais de saúde, muitas vezes atuantes em ambos os sistemas, público e privado.

A participação das sociedades médicas na produção de diretrizes, a qualificação dos membros dessas sociedades, a simplificação da metodo-logia buscando a continuidade do processo, também são características que tornam esta uma experiência única no setor de saúde brasileiro.

Dessa forma, a avaliação crítica do próprio trabalho e a visão de longo prazo, orientada na busca paulatina, porém sustentável de melhorias nas condições de saúde da população também podem ser citados como pontos críticos de sucesso.

11. Referência

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Wanderley Bernardo*

*Coordenador Técnico do Programa Diretrizes AMB-CFM

Professor de Graduação e Pós Graduação em Medicina Baseada em Evidência na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

(FMUSP) e Universidade Lusíada de Santos

Médico - Cirurgião Torácico

1. Definição

O termo, diretrizes clínicas, pode levar a conceitos que vão desde um conjunto de informações teóricas para o atendimento de saúde de qualidade a uma forma de con-trolar e limitar as decisões clínicas, reforçando o conceito da “medicina receita de bolo”.

O termo mais conhecido representativo de diretrizes é guidelines, mas em alguns países de língua espanhola, são denominadas de guias de prática clínica (GPC) ou em Portugal, conhecidas por normas de orientação clínica (NOC). São muitas vezes denominadas impropriamente de protocolos clínicos, que na verdade poderá ser um produto gerado a partir de diretrizes já elaboradas.

Podemos defini-las como um conjunto de recomenda-ções estruturadas, submetidas à atualização periódica à luz das evidências científicas disponíveis, a fim de produzir ações de melhor qualidade. Procuram integrar a experiên-cia à melhor evidência clínica externa avaliável, visando o cuidado ao paciente individual.

A expressão diretriz relacionada a políticas de prática clí-nica leva-nos a considerar que as decisões ou recomendações deverão ser direcionadas a um grupo de pacientes, ao invés de a um paciente individual. Entretanto, as diretrizes são o caminho para se estender o melhor cuidado dado ao paciente individual, à coletividade, a fim de melhorar a prática clí-nica, atendendo aos conceitos de equidade sustentável.

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2. Objetivo

Há algumas variações de objetivos motivadores da elaboração de diretrizes, os quais podem ou não ter como centro o paciente:

1. Permitir que os resultados da pesquisa clínica sejam mais rapida-mente utilizados e traduzidos para a prática diária;

2. Reduzir a variação da prática clínica no manuseio de situações clínicas semelhantes;

3. Controlar os custos do sistema de saúde;

4. Auditar a prática clínica.

3. Métodos de Elaboração

As diretrizes podem ser elaboradas por métodos variados, que con-ferem nível de qualidade também variado:

1. Opinião acrítica: método rápido e barato, mas extremamente suscetível a conflitos pessoais de interesse;

2. Consenso: pode ser informal ou formal. O informal é o mais utilizado, caracterizando-se por ausência de método pré-esta-belecido, por ser sensível à dinâmica do grupo, e por ser deter-minado por convicções. O consenso formal apresenta um plano pré-definido para que as convicções possam ser coletadas de maneira estruturada e organizada;

3. Baseadas em evidências científicas: segue um passo a passo, que pode ser resumido da seguinte forma: dúvida clínica, estru-turação da pergunta, busca da evidência, seleção crítica da evi-dência a ser utilizada para auxiliar a resposta, e utilização de linguagem apropriada que considera a evidência obtida à luz da experiência clínica e dos valores dos pacientes, permitindo a aplicação da resposta obtida para a prática clínica real.

O desenvolvimento de diretrizes por consenso foi um método utili-zado no passado, quando então, devido a limitações de acesso e de crítica à evidência científica, essa metodologia tinha seu lugar. Atualmente, a utilização desse método não é justificável, e aspectos de natureza ética podem ser os verdadeiros fatores motivadores de sua utilização, em detrimento à informação científica, ou ausência desta, disponível na

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atualidade. Explicitamos aqui alguns desses fatores motivadores:

1. Relacionados à liberdade do caráter não explícito da utilização da informação científica no documento final;

2. A possibilidade de, em havendo discordância entre os espe-cialistas sobre a indicação de determinadas condutas, esta seja resolvida através da dominância de um determinado grupo;

3. O recurso da base do fundamento científico utilizado ser vari-ável, podendo ir da opinião acrítica ao ensaio clínico randomi-zado, com o mesmo peso no documento;

4. A presença de fontes de financiamento pessoais ou do grupo, que podem interferir na geração do conteúdo, já que os critérios de seleção da informação científica não são explícitos.

4. História

Podemos considerar que o conceito de diretrizes clínicas surgiu nos EUA, com o objetivo inicial de contenção do custo médico e para controlar o gasto geral com a saúde após a introdução dos progra-mas Medicaid e Medicare1. Nessa época, foi identificada também uma grande variação no cuidado aos pacientes, o que marcadamente tra-zia impacto à qualidade, ao custo e à responsabilidade da atenção em saúde. Esse último diagnóstico determinou a formação de grupos encarregados de diferenciar a prática efetiva da não efetiva, procu-rando reduzir a variabilidade profissional (“effectiveness initiative”)2. Foi então criada a “Agency for Health Care Policy and Research – AHCPR”, com a atribuição de desenvolver diretrizes de prática clínica, motivando, também, o envolvimento das sociedades acadêmicas e de especialidade americanas 3.

Diferente fenômeno ocorreu na Grã-Bretanha, quando, em 1993, com a visão de impactar a qualidade da atenção à saúde, o Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN) iniciou suas atividades de desenvolvimento de diretrizes 4. Logo em seguida, no ano de 1996, o National Health Service (NHS) britânico foi reforçado pela criação do National Institute of Clinical Excellence (NICE), com a proposta de elaborar diretrizes baseadas em evidência científica 5.

É interessante que descrevamos um pouco mais detalhadamente algu-mas dessas organizações internacionais, que tanto impactaram a trajetó-ria mundial da elaboração de diretrizes clínicas baseadas em evidência:

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1. Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN)6

Organização sediada na Escócia, que tem um programa de guideli-nes clínicos baseados em evidências, publicados, em desenvolvimento, ou sob revisão. Fazem parte do programa de qualidade do National Health System (NHS) escocês. Tem como objetivo principal melhorar a qualidade dos cuidados em saúde, reduzindo a variação na prática e nos desfechos, através do desenvolvimento e disseminação de guideli-nes clínicos nacionais, contendo recomendações para a prática efetiva, baseada nas evidências atuais.

2. National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE)7

Organização independente, sediada em Londres e em Manchester, responsável por desenvolver guias nacionais, na promoção de saúde e na prevenção e tratamento da doença. Elaboram diretrizes utilizando a metodologia da medicina baseada em evidências, recomendando segundo os graus de Oxford EBM Centre. Sinteticamente, a sequên-cia utilizada na elaboração das diretrizes é: o departamento de saúde refere ao NICE os tópicos das diretrizes clínicas; grupos de interesse (stakeholders) são consultados durante o processo de elaboração; o centro de colaboração nacional comissionado para elaborar o guideline prepara o escopo; esse grupo é constituído por profissionais de saúde, representantes de pacientes e grupos envolvidos com cuidados em saúde e técnicos especializados. Para produzir uma primeira versão da diretriz, o grupo acessa a evidência disponível e faz as recomendações. Há disponível um período de tempo para que os grupos de interesse possam comentar a primeira versão da diretriz. Depois que o grupo elaborador finaliza as recomendações, o centro colaborador produz o guideline final. O NICE formalmente aprova a diretriz final e relaciona suas guias ao NHS.

Podemos ainda citar uma das primeiras diretrizes nacionais, desen-volvida no Canadá, na década de 90, a fim de reduzir as taxas de cesá-rea, o que foi obtido com sucesso, reforçando a concepção de diretrizes com o objetivo de assistir ao processo de qualidade em saúde8.

Apesar do início do desenvolvimento de diretrizes ter tido como principal fator motivador a redução da variabilidade da prática médica e dos custos, o conceito dominante mundial, nos meados do ano de 1990, era de que o único objetivo de diretrizes baseadas em evidência é o de assistir aos profissionais de saúde com relação à tomada de deci-

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são no cuidado aos pacientes, em circunstâncias clínicas específicas, a fim de aperfeiçoar esse cuidado.

Com a introdução, nessa mesma época, dos princípios de medicina baseada em evidências, alguns centros elaboradores (UK e Canadá) vol-taram sua atenção metodológica para a aplicação desses princípios na geração de diretrizes baseadas em evidência. Entretanto, só a partir de 2000, o sistema que desencadeou o processo (EUA) muda seus rumos, e através da Agency for Healthcare Research and Quality – AHRQ, desen-cadeia o processo denominado de Evidence-based Practice Centers – EPC, através do qual são elaboradas as diretrizes nacionais americanas9.

3. Evidence – based Practice Centers (EPC)10

Este é um programa da “Agency for Healthcare Research and Quality” (AHRQ), com o objetivo de melhorar a qualidade e efetividade da aten-ção em saúde, facilitando a tradução dos achados da pesquisa baseada em evidências, para a prática clínica, bem como do estabelecimento de políticas de saúde. Centros (EUA e Canadá) de medicina baseada em evidências, sob contrato com a AHRQ, produzem sínteses da infor-mação científica – relatórios baseados em evidências e avaliação em tecnologia – provendo os sistemas público e privado dos EUA com os fundamentos necessários para que possam elaborar e implementar seus próprios guidelines.

5. Trajetória no Brasil

No Brasil, o processo de elaboração de diretrizes clínicas nacio-nais baseadas em evidência foi desencadeado pela Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina, denominado “Projeto Diretrizes”. Vale lembrar que esse projeto teve início a partir de um encontro realizado em dezembro de 1999, em Brasília, reunindo toda a diretoria da AMB e conselheiros regionais do CFM, no qual todos se pronunciaram unanimemente em favor da parceria entre as duas enti-dades, delineando uma política de atuação conjunta. Posteriormente, no ano seguinte, o planejamento estratégico realizado pelas duas entidades ratificou em detalhes os objetivos principais e as áreas de atuação.

Os primórdios técnicos do projeto foram definidos por comitê médico especialmente formado, no segundo semestre de 2000, o qual encami-nhou um conjunto de recomendações às Sociedades de Especialidade, relativas à metodologia de elaboração:

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O “Projeto Diretrizes” da Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina divulgou, no final de setembro de 2000, as seguintes normas básicas à elaboração das diretrizes pelas Sociedades de Especialidades:

1. A composição das diretrizes deverá conter orientação diagnós-tica, terapêutica e, quando aplicável, prevenção;

2. Não é atributo da diretriz definir a doença, sua etiologia e fisiopatologia;

3. As diretrizes devem ser baseadas em Evidências Científicas;

4. Entende-se por nível de Evidência Científica o método utilizado na obtenção da informação ou decisão recomendada na diretriz, dando maior ou menor credibilidade científica a esta;

5. O nível recomendado para a elaboração da diretriz é aquele baseado em revisões sistemáticas e/ou meta-análise de estudos controlados e aleatorizados;

6. Na impossibilidade do uso de revisões sistemáticas e/ou meta-análise como base de elaboração, o nível de evidência deve estar baseado em estudos controlados aleatorizados isolados;

7. Na ausência das anteriores, são aceitáveis estudos observacio-nais, do tipo coorte, transversal ou caso-controle;

8. Embora não se recomende a utilização de estudos não con-trolados, em caráter excepcional poderá ser utilizada “série de casos”;

9. Diretrizes com nível de Evidência baseado exclusivamente na opinião de especialistas não poderão ser incluídas neste projeto;

10. A bibliografia utilizada deverá ser clara e acessível;

11. As diretrizes devem tornar mais fáceis as decisões médicas na prática diária;

12. Devem ser concretas e precisas, descrevendo em que situação e em que grupo de pacientes aplicá-las;

13. Devem alertar para os riscos, limitações, possíveis prejuízos e benefícios de sua aplicação;

14. Devem ser aplicáveis em todo o território nacional, de maneira mais uniforme possível, com equidade social;

15. As diretrizes não devem exigir aquisição impraticável de equi-

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pamentos e nova tecnologia, recursos humanos extras etc., levando em consideração os custos de sua implementação;

16. Devem ser éticas, não gerando conflito entre o médico e o paciente ou produzindo reações negativas entre colegas, por pontos de vista diferentes;

17. Devem contemplar eventuais opções, permitindo ao médico usar de sensibilidade e bom senso, na preservação de sua autonomia na tomada de decisões clínicas.

Apesar das orientações enviadas, a grande maioria das diretrizes recebidas até novembro de 2000 não atendeu às necessidades de padronização. Fato que levou a se realizar a I Reunião de Padronização do Projeto Diretrizes, no dia 8 de dezembro de 2000, com a finalidade de serem esclarecidas eventuais dúvidas. Como resultado da reunião de padronização, ficou estabelecido que as diretrizes devessem ser elabo-radas de forma a atender os seguintes itens:

1. O texto deve ser escrito de forma afirmativa, no sentido de recomendar ou contraindicar condutas, evitando frases que descaracterizam a orientação e geram dúvidas. Estas últimas podem ser substituídas por afirmações do tipo: não há evidên-cia científica que fundamente uma conduta nessa situação;

2. O texto deve conter o número de citação bibliográfica que possibilite ao leitor identificar em cada afirmativa a referência bibliográfica que a fundamenta;

3. Deverá acompanhar o texto da versão integral outro texto, em versão resumida, com o máximo de 20.000 caracteres, segundo modelo que pode ser requisitado através do email [email protected];

4. Para cada número de citação que fundamenta a afirmação feita no texto da versão resumida, acrescentar o grau de recomenda-ção com as letras A, B, C ou D que correspondem aos seguintes níveis de evidência científica:

A: Grandes ensaios clínicos aleatorizados e meta-análises.

B: Estudos clínicos e observacionais bem desenhados.

C: Relatos e séries de casos.

D: Publicações baseadas em consensos e opiniões de especialistas.

Se a Sociedade de Especialidade preferir, a comissão técnica do Projeto Diretrizes pode acrescentar o grau de recomendação, contanto

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que nos sejam enviadas todas as referências bibliográficas, na íntegra.

Após um ano de trabalho em conjunto com 24 Sociedades de Especialidade, foram lançadas, em Manaus, no mês de outubro de 2001, as primeiras 40 diretrizes, quando então já estavam em anda-mento mais 20 diretrizes.

Durante todo o momento, investiu-se na capacitação dos especialis-tas nos conceitos e princípios, de prática clínica baseada em evidência, aplicado à elaboração de diretrizes, de várias formas, meios e métodos: reuniões virtuais e presenciais, palestras e simpósios, artigos publica-dos e oficinas de trabalho, sendo que a esse último método podemos atribuir muitos dos resultados obtidos ao longo do tempo.

No ano de 2002, parte do comitê técnico teve a oportunidade de participar de curso no Centro de Medicina Baseada em Evidência da Universidade de Oxford, o que influenciou fortemente na trajetória da metodologia utilizada de elaboração das diretrizes no projeto, sobre-tudo na capacitação e no relacionamento com os elaboradores.

Todos os passos do processo de elaboração foram desenvolvidos de forma constante e sistemática através de Oficinas de Trabalho envol-vendo as sociedades de especialidade, durante cerca de 5 anos. Foram desenvolvidas cerca de 30 oficinas, só até o ano de 2006, com média de 15 participantes por oficina.

A sequência utilizada é resumidamente a exposta na Figura 2.

Figura 2 - Sequência utilizada na capacitação das oficinas de trabalho

Diretrizes Baseadas em Evidência

Cenário Clínico - Pergunta Bem Construída

Busca da Melhor Evidência - Bases Primárias

Busca da Melhor Evidência - Bases Secundárias

Desenho de Estudo e Medidas de Associação

Avaliação Clínica - Grau de Recomendação

Elaborar Resposta à Questão Inicial

Resposta 1 + Resposta 2 + .... + Resposta n =

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Essa sequência de passos na elaboração de diretrizes baseadas em evidência está de acordo com a metodologia recomendada pelo pro-grama americano “Evidence-based Practice Centers” (EPC), da “Agency for Healthcare Research and Quality” (AHRQ)10; pelo programa inglês do “National Institute for Clinical Excellence” (NICE), do National Health Institute (NHS)7; e pelo Oxford Evidence-based Medicine Centre11.

Antes da abordagem, a partir do cenário clínico, é recomendado que alguns passos sejam atendidos:

1. Nomear ou escolher um tópico ou tema: Sociedades de espe-cialidade (Projeto Diretrizes), Sistemas de saúde (público ou privado), ou outros Grupos consumidores são estimulados ou encorajados a sugerirem ou proporem tópicos para diretrizes. Esses tópicos devem abordar temas prevalentes ou prioritários ao Sistema de Saúde (regional ou nacional), em diagnóstico, terapêutica ou prevenção;

2. Para cada tópico ou tema, devem ser identificados cenários reais, a partir dos quais serão geradas questões relevantes a serem respondidas pela diretriz;

3. A questão deverá ser estruturada na forma PICO, a partir da qual será elaborada estratégia de busca para a revisão sistemá-tica da literatura;

4. A revisão será realizada inicialmente nas bases primárias, podendo até haver consulta nas bases secundárias, a fim de complementar a avaliação crítica da informação obtida. Extrapolação ou versão de guidelines internacionais ou con-sensos de especialidade, abordando o mesmo tema, não devem ser realizadas;

5. Após a avaliação crítica (medidas, grau de recomendação e apli-cabilidade) das evidências obtidas, iniciamos o processo de tra-dução da evidência em diretriz clínica ou recomendações. Alguns tópicos, então, devem ser obedecidos. O texto deve: ser objetivo e afirmativo; recomendar ou contraindicar; apontar claramente benefícios, riscos e danos; apontar controvérsias; fornecer opções; informar a ausência de evidências consistentes; explicitar possí-veis conflitos de interesse, tendo independência editorial; definir recomendações de fácil identificação, as quais devem estar vin-culadas à evidência que lhes dá suporte, bem como ao grau de recomendação; ser atualizável, com o processo de atualização explicitado; o texto não deve utilizar nomes comerciais da tecno-logia utilizada nas intervenções diagnósticas ou terapêuticas.

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Podemos ainda definir outros critérios de qualidade (os mesmos utilizados em instrumentos de avaliação, como no “Agree Instrument” - www.agreecollaboration.org/instrument):

1. Público-alvo e objetivo da diretriz: clara e especificamente defi-nidos; e as questões clínicas respondidas, explicitadas;

2. Participação dos grupos de interesse (stakeholders): o grupo de desenvolvimento deve incluir todos os profissionais de saúde envolvidos; as preferências dos pacientes devem ser atendidas; a diretriz deve ser testada, previamente, em um grupo de leito-res bem definidos, que vão utilizar a diretriz;

3. A elaboração deve considerar possíveis barreiras de implementa-ção relacionadas ao sistema de saúde, no qual irão ser utilizadas;

4. Devem contar com ferramentas de aplicação que permitam a rápida e ágil disseminação;

5. O processo deve incluir formas de auditoria.

Em relação ao Agree Instrument, a AMB teve oportunidade de apresentar no 2nd International Conference of Evidence-based Health Care Teachers & Developers, em Palermo/Itália, no ano de 2003: CRITICAL APPRAISAL OF 28 GUIDELINES DEVELOPED BY BRAZILIAN MEDICAL ASSOCIATION, o que contribuiu muito para o amadurecimento do projeto.

Ainda nas oficinas, alguns conceitos sustentados no projeto quanto aos graus de recomendação também foram abordados:

1. Toda recomendação de uma diretriz baseada em evidência pro-vém de uma informação científica. Toda informação científica pode ou não advir de um desenho de estudo e, portanto possuir a propriedade crítica. Entretanto, mesmo a informação baseada em desenho epidemiológico possui suas limitações, seus “defeitos”, sua força. Denominamos esse conceito de força da evidência;

2. Para a recomendação da diretriz, a força da evidência que lhe dá suporte confere um grau, uma medida de qualidade, que denomi-namos “grau de recomendação”. No entanto, diferentemente de outros sistemas de classificação da força da evidência, não uti-lizamos o conceito de força de evidência dissociado do conceito de grau de recomendação, sendo este último diretamente relacio-nado à qualidade do desenho de estudo ou à opinião acrítica.

O sistema que recomendamos a ser adotado tem sido disseminado a partir do Centro de Medicina Baseada em Evidências de Oxford (Centre for Evidence-based Medicine)11. Historicamente, a base desses níveis de

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evidência é originária do trabalho de Suzanne Fletcher e Dave Sackett, há mais de 20 anos, quando trabalhavam na “Canadian Task Force on the Periodic Examination”. Eles, então, desenvolveram níveis de evidência para classificar a validade da evidência sobre intervenções em prevenção, atrelando esses níveis a graus de recomendação, para a recomendação dada na publicação.

À medida que o processo de elaboração de diretrizes passou a gerar uma demanda crescente, as questões clínicas a serem recomendadas passaram do mesmo modo a serem estendidas de recomendações em prevenção, somente para recomendações em diagnóstico, terapêutica, prevenção, etiologia e dano. Surge a versão do Oxford EBM Centre, que atualmente utilizamos, disposta na Figura 2.

O fruto direto dessas iniciativas foi a elaboração de 240 diretrizes até o ano de 2007, em crescente aprimoramento e qualidade. A par-ticipação era heterogênea, cinco sociedades eram responsáveis pela elaboração de 146 diretrizes, e dez novas estavam se envolvendo na elaboração de 120 diretrizes novas.

Além do desafio de melhora progressiva da qualidade, surgiam outras metas e necessidades, como a atualização e a construção de processo de disseminação e implementação.

Quanto à atualização, muitas diretrizes estavam permanentemente sendo atualizadas, mas um processo sistemático deu início à aborda-gem de todo o material elaborado até o ano de 2003, com a meta de atualizações a cada dois anos.

Finalizada a diretriz, esta deverá ser utilizada, e existem dois pro-cessos distintos, que se confundem como se fossem um só: dissemi-nação e implementação. Os resultados obtidos e esperados de ambos também são distintos. Os processos podem ser aplicados na assistência, na educação, na auditoria, e na política em saúde.

A disseminação tende a estar restrita à esfera assistencial dentro dos grupos específicos de profissionais, tendo custo muito menor que aquele necessário para processos estruturados de implementação, como também resultados autolimitados ao tempo de sua aplicação. A disseminação permite a utilização, a implementação culmina com a adoção. Os principais métodos de disseminação que podem ser utili-zados são12:

1. Distribuição das diretrizes aos clínicos, aos pacientes, ao sis-tema de saúde, via Internet, CD ou na forma impressa;

2. Publicação em periódicos de pares ou em material público;

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3. Descritas em conferências, ou encontros de especialistas.

Os principais resultados esperados do processo de disseminação são: Impacto nos padrões de prática clínica; Credibilidade entre os pacientes, com adoção de comportamento em saúde baseado nas reco-mendações; Mudanças na cobertura do sistema de saúde; Mudanças nos desfechos clínicos.

Como nesse processo não há auditoria e monitoramento, os resulta-dos são estimados, podendo ser comprovados através de estudos antes/depois.

Nessa fase do projeto, já estava presente a participação ativa da AMB/CFM em duas organizações internacionais. A primeira como fun-dadores e participantes do comitê organizador:

Rede Iberoamericana – Guias de Práticas Clínicas (GPC)

Rede de guias de prática clínica e melhoria na qualidade dos cui-dados de saúde, que congrega países da América Latina (incluindo o Projeto Diretrizes, do Brasil), Portugal e Espanha, numa iniciativa de cooperação na sistematização, de comunicação e de intercâmbio do conhecimento científico, voltada também para a transferência da pesquisa e para a inovação da eficiência e eficácia na prática clínica, atuando como uma comunidade virtual. Pretendem compartilhar informações de metodologias, instrumentos e experiências para a ela-boração, disseminação, implantação e avaliação de guias de prática clínica, aproveitando a vantagem idiomática.

E a segunda organização, com permanente apresentação de traba-lhos científicos e desenvolvimento de atividades didáticas e de traba-lho nos encontros anuais:

Guidelines International Network (GIN)

O Guidelines International Network é uma associação de organi-zações e pessoas envolvidas em guidelines de prática clínica. GIN já contava com 67 organizações membros, representando 34 países da América do Sul (incluindo o Projeto Diretrizes, do Brasil) e da América do Norte, Ásia, Europa e Oceania, como também a Organização Mundial de Saúde. Tem como objetivo melhorar a qualidade da aten-ção à saúde, promovendo o desenvolvimento sistemático de guidelines de prática clínica, bem como sua aplicação na prática diária, através de suporte à colaboração internacional. A biblioteca de guidelines do

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GIN contém informação regularmente atualizada sobre guidelines dos membros do GIN. Em março de 2006, mais de 3.000 documentos já estavam disponíveis.

Retomando as questões relacionadas à diferença entre disseminação e implementação, podemos definir que o processo de implementação é um conjunto de medidas estruturadas, sequenciais e interligadas, visando à adoção de diretrizes baseadas em evidência, gerando uma demanda e expectativa do sistema de saúde, que passa a assistir, edu-car, pesquisar e governar, utilizando essas diretrizes. Esse processo tende a ser perene, e a se retroalimentar. Produz, ainda, barreiras frente aos diversos grupos de interesse, as quais devem ser considerados na elaboração e desenvolvimento das recomendações. Os métodos de implementação são aplicados na assistência, na educação, na auditoria e na política de saúde13:

1. Distribuição de material educativo (recomendações focais, diretrizes resumidas ou textos completos) de forma pessoal ou através de mala direta a grupos focais;

2. Utilização das diretrizes em programas de educação médica continuada, recertificação e em programas acadêmicos;

3. Eventos educacionais, utilizando o conteúdo das diretrizes, como conferências, oficinas de trabalho e treinamentos;

4. Visitas pessoais ao profissional de saúde, em seu local de traba-lho, incluindo o retorno de resultados clínicos;

5. Auditoria e resposta: resumos de resultados de cuidado em saúde, obtidos através de registros médicos, questionários ou da observação de pacientes;

6. Estabelecimento de novas medidas de resultados clínicos, que serão divulgadas aos profissionais de saúde, pacientes e sistema de saúde;

7. Lembretes eletrônicos, contendo recomendações indicando ou contraindicando, que são sistematicamente enviados ao público leitor alvo, com objetivo educacional.

Os resultados obtidos tendem a ser duradouros, mas requerem, ainda, algumas medidas para reduzir as barreiras naturalmente criadas. Temos, então, uma expectativa de resultados do processo de implemen-tação que pode ser resumida nas palavras: adoção e incorporação:

1. Todos os impactos obtidos no processo de disseminação, ten-dendo à manutenção desse efeito ao longo do tempo;

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2. Avaliação de barreiras à aderência, permitindo reavaliar o pro-cesso de desenvolvimento das diretrizes;

3. Uso rotineiro de recomendações, acompanhado da identificação e da correção educativa, de desvios da prática;

4. Impacto no currículo de graduação e em programas de educa-ção continuada;

5. Mudanças nas ações do sistema de saúde, com impacto medido nos custos, através de estudos de custo/efetividade;

6. Avaliação dos resultados e desfechos clínicos, com o uso das diretrizes, aprimorando o processo de elaboração.

Alguns fatores podem determinar barreiras à implementação das diretrizes, podendo ser didaticamente divididos em barreiras: relacio-nadas à aderência, externas, relacionadas à diretriz, ao paciente ou à necessidade de aquisição de tecnologia14:

Barreiras relacionadas à aderência

1. Falta de conhecimento: devido à expansão na produção de diretrizes, muitos profissionais desconhecem sua existência;

2. Falta de familiaridade: apesar do conhecimento sobre a exis-tência, a familiaridade depende de vivência com a linguagem baseada em evidências, levando à dificuldade de interpretação;

3. Discordância: em relação a diretrizes específicas, ela é menor entre os profissionais. Redução à autonomia, cookbook, não prático;

4. Falta de eficácia pessoal: a falta de confiança na habilidade ou no preparo para a execução das ações recomendadas pode produzir barreiras nos profissionais;

5. Falta de expectativa: quando os profissionais acreditam que as recomendações não produzirão melhoria nos resultados, seja devido a características próprias do paciente, seja por expe-riências pessoais anteriores, tendem a não aderir à diretriz. Benefícios demonstrados a populações podem ser barreiras para o uso individual;

6. Inércia da prática: a falta de motivação para a adoção de con-ceitos novos, mudanças e atualização.

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Barreiras externas

1. Consumo excessivo de tempo;

2. Falta de recursos (de informática ou tecnológicos) ou suporte para programas de implementação educacional;

3. Legislação rígida e desatualizada.

Barreiras relacionadas à diretriz

1. Conteúdo complexo e de difícil utilização prática. Falta de fluxogramas baseados em evidências. Dificuldade de vencer a barreira, onde eliminar uma conduta já em uso regular é mais difícil do que adicionar um novo conceito. Informação científica não consistente, intervenções inefetivas ou maléficas, recomen-dações desatualizadas, recomendação ambígua ou insuficiente.

Barreiras relacionadas ao paciente

1. Não conciliar as preferências dos pacientes com as recomendações;

2. Conteúdo da diretriz com recomendações ofensivas ou embaraçosas;

3. Não contemplar o individual ou pacientes especiais;

4. Não ser adaptável a circunstâncias.

Barreiras relacionadas à aquisição de tecnologia

1. A aquisição de novos recursos ou facilidades não está sob con-trole do médico ou profissional de saúde;

2. O sistema de saúde, público ou privado, com um entendimento puramente matemático, é uma barreira natural e intransponível se não tiver a coragem de mudar o paradigma: utilizar diretrizes baseadas em evidência avaliando no processo de implementa-ção o impacto, antes/depois, centrado nos resultados obtidos nos pacientes (as chamadas vidas) que estão sob sua responsa-bilidade e cuidado.

Como evolução histórica do projeto, com todas as suas fases, a imple-mentação no sistema de saúde nacional nesse momento configura-se como o principal anseio.

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6. Atualidade do projeto

Atendendo, então, à possibilidade de utilização disseminada no Sistema de Saúde Nacional das Diretrizes do Projeto, no ano de 2009 é firmado convênio com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com a proposta de elaboração e implementação de 80 diretri-zes inicialmente.

Sabemos que o pilar central do Projeto da AMB está no fato dos elaboradores serem médicos indicados pelas Sociedades de Especialidade (atualmente na casa de milhares), que voluntariamente participam do processo após capacitação nos conceitos de elabora-ção de Diretrizes Clínicas Baseadas em Evidência, podendo, então, desenvolver diretrizes de qualidade. A comunidade internacional tem tido resistência à participação das Sociedades de Especialidade no processo de elaboração, mas nossa experiência de sucesso já tem chamado a atenção para a inclusão e liderança daqueles que cuidam dos pacientes no processo de elaboração. Podemos exemplificar com o seminário recente organizado no Rio de Janeiro pela ANS com adesão de Chile, Colômbia e Portugal; em seminário internacional na Universidade de Bogotá, e ainda com nossa passada e futura partici-pação nas redes internacionais neste e em outros anos.

Podemos descrever de maneira sintética a sequência de passos envolvida na elaboração de uma Diretriz Clínica Baseada em Evidência do Projeto da AMB/CFM na atualidade, atendendo também às necessi-dades do convênio ANS-AMB:

1. Tema de saúde, prevalente, relacionado a Diagnóstico, Terapêutica, Prevenção, Prognóstico, Etiologia ou Dano é sugerido ou solici-tado por stakeholders do Sistema de Saúde Nacional;

2. Mensagem eletrônica às Sociedades de Especialidades filiadas é enviada, consultando seu interesse em participar da elaboração da diretriz;

3. Reunião envolvendo as Sociedades de Especialidade relaciona-das é, então, desencadeada e conduzida pelo Comitê Técnico, que conta hoje com a participação de 5 médicos, treinados nos conceitos de Medicina Baseada em Evidência e na elaboração de Diretrizes Clínicas;

4. Essas reuniões são antecedidas pela elaboração, pelo comitê téc-nico e os especialistas das sociedades, das principais perguntas a

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serem respondidas em cada tema, tendo como meta 15 questões clínicas por diretriz, as quais serão finalizadas e distribuídas entre os elaboradores de cada sociedade durante a reunião;

5. As reuniões ainda definirão cronograma a ser cumprido pelas sociedades, contando com a participação constante do comitê, no estabelecimento da estratégia de busca da evidência, na obtenção da evidência, na avaliação crítica da evidência e na resposta às perguntas;

6. Além das reuniões, os elaboradores das sociedades continuam sendo capacitados e treinados na metodologia de elaboração através de Oficinas de Trabalho, de 12 horas de duração;

7. Nas Oficinas de Trabalho, os elaboradores recebem o seguinte aprendizado metodológico: a. Estruturação da questão clínica através do acrônimo PICO (Paciente, Intervenção, Comparação e Outcome); b. Acesso às bases de informação científica primária e secundária; c. Estratégia de busca da evidência; d. Busca na base primária; e. Obtenção da Evidência; f. Desenhos de estudo, Força da Evidência e Graus de Recomendação; g. Avaliação crí-tica de estudos observacionais e experimentais; h. Medidas de expressão na categoria de estudos diagnósticos, terapêuticos e prognósticos; i. Linguagem de Diretrizes Clínicas; j. Instrumento de avaliação crítica de diretrizes;

8. Após as reuniões, oficinas, elaboração das perguntas, divisão de trabalho e estabelecimento do cronograma, as respostas a cada questão e a elaboração da diretriz são estabelecidas, sob coor-denação do comitê técnico e os elaboradores das sociedades, através de meio virtual;

9. Cada diretriz elaborada é submetida ainda à avaliação final quanto ao conteúdo, linguagem e graus de recomendação, e atualmente nos temas apropriados ao Convênio AMB/ANS, na sequência, submetida à avaliação da Agência Nacional de Saúde Suplementar quanto à aplicabilidade no sistema de saúde;

10. As modificações sugeridas são inseridas e a diretriz é finalizada para editoração.

Como já descrito anteriormente, atendendo parcialmente a essa metodologia, pôde-se produzir 280 diretrizes até o ano de 2008, já divulgadas através do site da AMB e de 7 livros, com envolvimento

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crescente e homogêneo das Sociedades de Especialidade. Entretanto, só no ano de 2009, com essa metodologia, foram elaboradas em torno de 60 diretrizes, com mais de 100 temas em andamento.

Também, como forma de implementação, oficinas de trabalho têm sido realizadas em congressos e em várias regiões do país, além de oficinas junto à ANS e a operadoras de planos de saúde. Ainda, no pró-ximo ano, o projeto prevê a avaliação da implementação de algumas diretrizes do convênio AMB/ANS, em alguns serviços de de saúde, por meio de indicadores.

Entende-se por uso de recomendações a oportunidade para a intro-dução de uma prática clínica baseada em evidências, e para influenciar o estabelecimento de cuidados de saúde realmente efetivos. As dire-trizes baseadas em evidência podem ser utilizadas como ferramentas de otimização de recursos, mas nunca poderão ser instrumento de um injustificado racionamento de dinheiro, disfarçado de revisão sistemá-tica da literatura repleta de conflitos de interesse44.

Diretrizes baseadas em evidência representam o estado da arte, da efetiva atenção e cuidado ao paciente, no momento de sua criação. A decisão de seguir ou não seguir as recomendações de diretrizes deve ser feita em bases de atendimento individual, levando em consideração a específica condição do paciente. Diretrizes podem ser consideradas como um caminho que auxilia a separar as práticas desnecessárias das necessárias. Diretrizes não devem ser consideradas como uma forma de restrição à liberdade de conduta, mas como uma chance de orientar a prática, em um sistema de saúde caracterizado pela racionalização e o racionamento15.

O Projeto Diretrizes da AMB e CFM representa uma iniciativa genui-namente nacional, desenvolvida e sustentada pela comunidade médica brasileira. O aprendizado de todos tem sido fundamental na mudança de paradigmas e conceitos, sobretudo à luz dos princípios da Prática Clínica Baseada em Evidência. A sensibilidade do Sistema de Saúde Nacional a esses princípios através da iniciativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar concretiza a existência do elemento que trans-forma a associação da evidência e experiência médica presente nas diretrizes, de conteúdo teórico para prático, produzindo melhora na qualidade do cuidado à saúde do paciente brasileiro.

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Tabela 6 – Força de evidência segundo o Centro de Medicina Baseada em Evidências de Oxford

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7. Referências

1. LEE, P. R.; GINSBURG, P. B. Building a consensus for physician pay-ment reform in Medicare: the Physician Payment Review Commission. West J Med, n.149, p. 352-358, 1988.

2. ROPER, W. L.; HACKBARTH, G. M. HCFA’s agenda for promoting high-quality care. Health Aff, Millwood, n. 7, p. 91-98, 1988.

3. WOOLF, S. H. Practice guidelines: a new reality in medicine. Arch Intern Med, n. 150, p. 1811-1818, 1990.

4. PETRIE, J. C.; GRIMSHAW, J. M.; BRYSON, A. The Scottish Intercollegiate Guidelines Network Initiative: getting validated guide-lines into local practice. Health Bull, Edinburgh, n. 53, p. 345-348, 1995.

5. HORTON R. NICE: a step forward in the quality of NHS care. Lancet, n. 353, p. 1028-1029, 1999.

6. Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN). “Disponível em: <http://www.sign.ac.uk>. Acesso em: 28 de julho de 2009”.

7. NICE guidance. National Health Institute. “Disponível em: <http://www.nice.org.uk/>. Acesso em: 20 de agosto de 2009”.

8. INDICATIONS for cesarean section: final statement of the panel of the National Consensus Conference on Aspects of Cesarean Birth. CMAJ, n. 134, p. 1348-1352, 1986.

9. ATKINS, D.; FINK, K.; SLUTSKY, J. AGENCY FOR HEALTHCARE RESEARCH AND QUALITY; NORTH AMERICAN EVIDENCE-BASED PRACTICE CENTERS. Better information for better health care: the Evidence-based Practice Center program and the Agency for Healthcare Research and Quality. Ann Intern Med., v. 142, n. 12, pt. 2, p. 1035-1041, 21 June 2005.

10. EPC Evidence Reports. Agency for Healthcare Research and Quality. “Disponível em: <http://www.ahrq.gov/clinic/epcindex.htm>. Acesso em: 10 de agosto de 2009”.

11. Levels of Evidence and Grades of Recommendation. Centre for Evidence-Based Medicine. Oxford. Disponível em: <http://www.cebm.net/>. Acesso em: 15 de agosto de 2009”.

12. CABANA M. D. et al. Why don’t physicians follow clinical practice guidelines? A framework for improvement. JAMA, n. 282, p. 1458-1465, 1999.

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13. GRIMSHAW, J. M. et al. Effectiveness and efficiency of guideline dissemination and implementation strategies. Health Technol Assess, v. 8, n. 6, p. iii-iv, 1-72, 2004.

14. WOOLF, S. H.; GROL, R.; HUTCHINSON, A. ECCLES, M. GRIMSHAW, J. Clinical guidelines: potential benefits, limitations, and harms of cli-nical guidelines. BMJ, n. 318, p. 527-530, 1999.

15. GUYATT, G. et al. Grading strength of recommendations and qua-lity of evidence in clinical guidelines: report from an American College of Chest Physicians task force. Chest, n. 129, p. 174-181, 2006.

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César Cárcamo*

* Diretor Médico do Hospital Mutual de Seguridad C.Ch.C.

Santiago, Chile

1. Sistema de Saúde Chileno

O setor de saúde chileno está integrado por institui-ções, organismos e entidades pertencentes ao setor público e ao setor privado, constituindo um sistema de saúde misto. O subsetor público é representado principalmente pelo Fonasa (Fondo Nacional de Salud), em seu aspecto financeiro, e pelo Sistema Nacional de Serviços de Saúde (SNSS), em seu componente de prestação de serviços. O subsetor privado está principalmente representado pelas Isapres (Instituciones de Salud Previsional), em seu aspecto financeiro previsional, e pelos profissionais e centros assistenciais privados, em seu componente de prestação de serviços. Também fazem parte do setor de saúde os sistemas fechados das Forças Armadas e Carabineros, e as Mutuales, organismos voltados ao tratamento das patolo-gias de origem trabalhista e acidentes de trabalho.

1.1 Demanda por serviços de saúde

Como um dado geral necessário à avaliação do tema, abaixo apresentamos a participação da população chilena em cada subsetor do sistema de saúde:

Tabela 7 - População segundo o seguro de saúde

Sistema Público Sistema Privado Outros Total

11.479.384 2.684.554 2.351.436 16.515.374

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Fonte: Estatísticas Fonasa

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A distribuição das pessoas pelos subsetores público e privado reflete o tipo de sistema previsional a que se vinculam. No grupo “Outros” encontram-se as pessoas que pertencem aos sistemas fechados (Forças Armadas e Carabineros) e particulares, sem nenhum tipo de vínculo com o sistema de saúde previsional.

Esses dados são relativamente coincidentes com os apresentados na Casem 2003, pesquisa realizada pelo Ministério do Planejamento desde 1985 para caracterização socioeconômica do país, detalhados no gráfico abaixo.

Gráfico 3 – Sistema previsional de saúde da população chilena

De acordo com esses números, em 2003, 7,2% da população do país (não enquadrada como indigente pela classificação chilena) não contava com um sistema previsional de saúde.

A demanda potencial por prestadores privados teoricamente divi-de-se nos seguintes grupos:

1. Beneficiários do sistema privado de saúde (Isapres);

2. Beneficiários do sistema público com direito a usar a moda-lidade de livre eleição do Fonasa (grupos B, C e D, que são aqueles com rendimento tributável maior que US$ 135.000,00 - cento e trinta e cinco mil dólares);

3. Pessoas com renda suficiente para pagar pelo atendimento com prestadores de saúde privados.

Dados da pesquisa Casem 2003 indicam que o grupo que mais demanda atendimento por prestadores privados está no quintil de ren-dimento mais alto (5º), equivalente a 1,9% do total da população.

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Tabela 8 - Tipo de seguro segundo o salário

1º 2º 3º 4º 5º

Sistema Público 91,2 85,4 76,3 60,6 33,6

ISAPRE 1,6 5,6 11,2 24,0 50,5

Nenhum (particular)

5,9 6,3 7,3 8,3 9,2

Forças Armadas 0,6 1,6 3,9 5,5 5,1

Outro sistema 0,1 0,1 0,2 0,2 0,4

Não sabe 0,6 1,0 1,1 1,4 1,2

Total 100 100 100 100 100 Fonte: Casem 2003

1.2. Distribuição percentual por sistema previsional (Quintis de rendimento)

As tabelas a seguir mostram a distribuição dos beneficiários Fonasa por grupo de rendimento (Fonte: Fonasa) e indicam aqueles que poten-cialmente optarão pelo atendimento com prestadores privados em fun-ção dos critérios definidos previamente.

Tabela 9 - Distribuição dos beneficiários Fonasa, ano: 2005

Grupo A Grupo B Grupo C Grupo D

3.818.768 3.449.513 1.876.586 1.976.227 Fonte: Fonasa

Tabela 10 - População potencial demandante de prestadores privados, ano: 2005

Sistema Público Sistema Privado Outros Total

7.302.326 2.684.554 313.792 10.300.672

71% 26% 3% 100% Fonte: Fonasa

1.3. Despesa em saúde

São três as fontes de financiamento da despesa em saúde:

• Contribuições Previsionais;

• Contribuição Fiscal;

• Despesas Diretas.

Os dados dos sistemas de seguridade social pública e privada (Fonasa e Isapres) e os de contribuição fiscal são de fácil acesso. De acordo com essas fontes, as cifras correspondentes ao ano de 2005 (último ano com dados disponíveis para ambos os sistemas) são as seguintes:

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66 A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Tabela 11 - Composição do lucro no sistema público (Fonasa)

Fontes Milhões $ Porcentagem

Gasto Fiscal 979.928 54,0%

Contribuição 644.295 35,4%

Receita Operacional 82.745 4,6%

Copagamentos (MLE) 108.946 6,0%

Total 1.815.914 100,0% Fonte: Boletim Estatístico FONASA 2004-2005

Tabela 12 - Composição do lucro no sistema privado (Isapres)

Fontes Milhões $ Porcentagem

Contribuição Legal 624.031 72,3%

Contribuição Volunt. 220.786 25,6%

Aporte Empregador 18.591 2,2%

Total 863.408 100,0%

Fonte: Superintendência Estatística de Saúde

Esses dados têm como contrapartida natural uma distribuição de despesas onde se destaca o financiamento dos serviços de saúde, tanto do sistema público como privado.

Tabela 13 - Composição das perdas no sistema público

Fontes Milhões $ Porcentagem

Modalidade Institucional 1.142.376 62,9%

Modalidade Livre Escolha 253.924 14,0%

Gastos Administrativos 27.111 1,5%

SIL 126.184 6,9%

Atendimento a Particulares 53.343 2,9%

Programas de Saúde Pública 104.641 5,8%

Gastos Outras Instituições Autônomas 108.335 6,0%

Total 1.815.914 100,0%

Fonte: Boletim Estatístico FONASA 2004-2005

Tabela 14 - Composição das perdas no sistema privado, Isapres, 2005

Fontes Milhões $ Porcentagem

Atendimentos em Serviços de Saúde 553.973 64,2%

SIL 121.005 14,0%

Gastos Administrativos Vendas 125.517 14,5%

Outros Custos 12.598 1,5%

Res Operacional 50.315 5,8%

Total 863.408 100,0%

Fonte: Superintendência Estatística de Saúde

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67A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Ao comparar as cifras do setor, chama a atenção a diferença na participação relativa das despesas de administração do setor público e privado, observando-se uma despesa muito superior no segundo. No entanto, algumas considerações são importantes:

• Formalmente, as despesas de administração do sistema público de saúde incluem as despesas de administração do Fonasa e a despesa do módulo de informática (arrecadação, afiliação, intermediação, compra e controle). As despesas do setor privado correspondem à administração e vendas, sendo o componente “despesas de venda” equivalente a aproximadamente 30% do custo total.

• Ao comparar o gerenciamento dos setores público e privado, é necessário destacar que as cifras do Fonasa comparáveis com Isapres correspondem às de Modalidade de Livre Eleição (MLE). Essa modalidade de atenção é a que concentra a maior parte das despesas administrativas do Fonasa, já que a despesa por atenção institucional é um repasse de fundos aos estabe-lecimentos do SNSS, não requerendo o detalhe exaustivo que implica o registro de beneficiários e prestadores e a conces-são e pagamento dos serviços prestados. Nesse contexto, é razoável assumir que aproximadamente 80% das despesas de administração do Fonasa se relacionam com a Modalidade de Livre Eleição.

Se incorporarmos à análise os argumentos assinalados previamente, a relação entre despesa em serviços de saúde e despesas de administra-ção nos sistemas público e privado é ajustável.

Tabela 15 - Despesas em serviços de saúde e despesas de administração

Fonasa (Milhões $)

Modalidade Livre Escolha FONASA 253.924 92,0%

Gastos Administrativos 21.689 8,0%

Fonte: Fonasa

Tabela 16 - Despesas em serviços de saúde e despesas de administração

Isapres (Milhões $)

Gastos em Atendimentos de Saúde ISAPRES 553.973 86,0%

Gastos Administrativos (sem gastos vendas) 87.862 14,0%

Fonte: Isapres

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Ainda que se elimine da análise as despesas de venda, as despesas de administração de ambos os sistemas não são diretamente compará-veis. Dentro das despesas de administração das Isapres, os processos de controle de arrecadação, avaliação de riscos ao rendimento, controle de benefícios de prestações de saúde e licenças médicas são muito relevantes. O mesmo não ocorre dentro das despesas de administração diretas do Fonasa, já que estes processos são assumidos por outras entidades como INP (Instituto de Normalizacion Previsional), COMPIN (Comisión de Medicina Preventiva e Invalidez del Servicio de Salud) ou, no caso específico da avaliação de riscos ao rendimento, não fazem parte do seu gerenciamento.

Outro dado utilizado para caracterizar a despesa em saúde de um país é a participação desta despesa como percentual do PIB (Produto Interno Bruto). A tabela abaixo mostra o percentual observado no ano 2005.

Tabela 17 - Despesa pública com saúde em 2005 (MM$ DIC2005)

PIB Gasto Público Total Gasto Público/Pib Gasto Fiscal Gasto Fiscal/Pib

64.549.137 1.883.103 2,9% 1.016.185 1,6%

Fonte: Boletim Estatístico FONASA 2004-2005

Esses dados, apesar de muito utilizados, têm a limitação de não considerarem importantes componentes de alta incidência na despesa total do país, tais como:

• Despesa do sistema previsional privado (Isapres);

• Despesa dos outros sistemas de saúde existentes: Mutuales e Forças Armadas;

• Despesa daqueles que não pertencem a nenhum sistema de provisão;

• Despesa privada com copagamentos de serviços de saúde e des-pesa direta com serviços não cobertos (sendo o mais incidente o que se refere às despesas com medicamentos).

Durante o ano de 2001, um estudo Fonasa-Ops mensurou essas variáveis, observando que no ano 2000 a despesa total de saúde foi aproximadamente 7,6% do PIB, dos quais 5,5% no sistema de segu-ridade social de saúde (Isapres e Fonasa) e o restante nos sistemas complementares das Mutuales, Forças Armadas, particulares e outros.

A seguinte tabela mostra os resultados do estudo, os quais diferen-ciam fontes e uso dos fundos.

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Tabela 18 - Despesa total do sistema saúde como percentual do PIB

Contribuições Financiamento Fiscal

Pagamento Direto

Total % PIB

FONASA

Atendimentos em Serviços de Saúde

313.841 463.377 110.502 887.720 2,4%

SIL 72.598 72.598 0,2%

Gastos de Farmácia 127.361 127.361 0,3%

Administração 12.467 12.467 0,0%

Total Fonasa 398.906 463.377 237.863 1.100.146 2,9%

Porcentagens 36,3% 42,1% 21,6% 100,0%

ISAPRE

Atendimentos em Serviços de Saúde

412.631 9.255 200.916 622.802 1,70%

SIL 105.430 105.430 0,30%

Gastos de Farmácia 121.805 121.805 0,30%

Administração 124.218 2.818 127.036 0,30%

Total Isapre 642.279 12.073 322.721 977.073 2,60%

Porcentagens 65,7% 1,2% 33,0% 100,0%

Total Isapre + Fonasa 1.041.185 475.450 560.584 2.077.219 5,50%

Porcentagens 50,1% 22,9% 27,0% 100,0%

OUTROS

Bens Públicos 159.732 159.732 0,4%

Mutuales 184.311 2.023 186.334 0,5%

Forças Armadas 45.416 18.102 9.032 72.550 0,2%

Outros (sem seguros) 900 366.974 367.874 1,0%

Total Outros 229.727 178.734 378.029 786.490 2,1%

Porcentagens 29,2% 22,7% 48,1% 100,0%

TOTAL CHILE 1.270.912 654.184 938.613 2.863.709 7,60%

Porcentagens 44,4% 22,8% 32,8% 100,0%

% PIB 3,4% 1,7% 2,5% 7,6%

Fonte: Monitoramento e Seguimento da Reforma, Proteção Financeira e Financiamento, Dep. de Estudos, Superintendência de Saúde, Fev 2006

Em relação a essas cifras, destaca-se a importância da despesa pri-vada como fonte de financiamento da despesa em saúde. No entanto, este tema foi pouco aprofundado ao longo do tempo. A Pesquisa de Satisfação e Despesa em Saúde, aplicada a cada três anos a uma amos-tra representativa da população, gerou seus primeiros resultados em

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maio de 2007, estabelecendo em 8,6% o impacto da despesa privada sobre a despesa total em saúde, sendo o tema medicamentos o mais relevante, flutuando entre uma participação de 39% e 57,2% no 1º e 5º quintil, respectivamente.

Esses novos dados, somados àqueles provenientes da pesquisa de orçamentos familiares realizada em 1997, que estabeleceu em aproxi-madamente 5,5% a participação da despesa privada sobre o total de despesa em saúde, enfatizam a importância do tema.

1.4. Oferta de serviços de saúde

Uma avaliação relevante a ser feita sobre o tema “despesa em ser-viços de saúde” é a análise das características dos prestadores de saúde que a população utiliza. Esta análise é particularmente interessante em um mercado de saúde como o chileno, onde a presença do setor privado é bastante incidente.

Tabela 19 - Tipo de prestadores privados

Nº Instituições Porcentagem

Clínicas Privadas 81 44,0%

Mutuales 29 16,0%

Clin. Psiquiat. Geriatria. Recuperação 47 25,0%

Institucionais 16 9,0%

Outros (Conin, Teleton, Etc) 11 6,0%

Total Instituições 184 100,0%

Fonte: C&E

Na Região Metropolitana concentra-se 46% da infraestrutura clí-nica privada. Se a análise restringir-se aos estabelecimentos com mais de 200 leitos, esta concentração sobe para 86%.

Tabela 20 - Número de clínicas particulares por regiões

RM 5ª Região 8ª Região Restante Total

Instituições < 100 leitos 19 13 7 25 64

Instituições entre 100 e 199 leitos 7 1 1 3 12

Instituições > 200 leitos 5 0 0 0 5

Total 31 14 8 28 81

Percentual 38,27% 17,28% 9,88% 34,57% 100%

Fonte: C&E

As tabelas a seguir mostram a distribuição de leitos nos diferentes sub-sistemas de saúde e nas diferentes regiões.

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Tabela 21 - Total de leitos particulares

Nº Leitos Porcentagem

Sistema Público 26.956 70,0%

Mutuales 1.090 3,0%

Clin. Psiquiat. Geriatria, Recuperação 1.544 4,0%

Institucionais 3.413 9,0%

Outros (Conin, Teleton, etc.) 392 1,0%

Clínicas Privadas (mínimo 10 leitos) 5.076 13,0%

Total Leitos País 38.471 100,0%

Fonte: C&E

Tabela 22 - Distribuição de leitos particulares por regiões

Nº Leitos Porcentagem

Total Leitos RM (Região Metropolitana) 2.789 54,9%

Total Leitos - 5a. Região 582 11,5%

Total Leitos - 8a. Região 431 8,5%

Leitos - Restante do País 1.274 25,1%

Total Leitos 5.076 100,0%

Fonte: C&E

1.5. Distribuição de prestadores de saúde

Não existe informação sistemática que permita fazer comparações sobre a participação dos prestadores públicos e privados na assistência prestada. Como primeira aproximação, os seguintes gráficos mostram a presença relativa de cada tipo de prestador observada nas pesquisas Casem 2000-2003. Tais dados foram obtidos solicitando-se às pessoas que informassem o tipo de prestador demandado nos últimos meses.

Gráfico 4 - Consultas por tipo de estabelecimentos

Como podemos observar, a oferta de serviços privados é de aproxi-madamente 30%. Como é esperado, a participação dos estabelecimen-tos particulares é maior no quinto quintil de rendimento (36,8%).

14,2%

27,8%

5,0%

36,8%

0%

10%

20%

30%

40% 5º Quintil

4º Quintil

PrivadoPúblico

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Através dos estudos da Superintendência de Saúde e do Fonasa, pode-se observar com maior detalhe a atividade dos prestadores priva-dos. Para complementar os dados relativos aos gastos dos prestadores privados, deveriam ser incluídas a compra de serviços realizada através da modalidade institucional, e a compra de serviços diretamente dos prestadores. No entanto, não existe informação disponível a este respeito, e pelo baixo volume relativo desses grupos, não se considera relevante sua participação na quantidade total de serviços privados demandada.

As seguintes tabelas mostram a distribuição dos serviços realizados pelos prestadores privados durante o ano de 2005, de acordo com o sistema previsional dos usuários:

Tabela 23 - Origem de atendimentos realizados por prestadores privados (Percentual)

Atendimentos em serviços de saúdeFonasa

ISAPRES TotalAt. Institucional

FONASA MLE

Atenção Médica 0 49% 51% 100%

Dias/Leito 0 32% 68% 100%

Exames Diagnósticos 0 45% 55% 100%

Intervenções Cirúrgicas (incl. PAD) 0 35% 65% 100%

Proc. Apoio Clínico e Terapêutico 0 43% 57% 100%

Total 0 46% 54% 100%

Fonte: C&E, elaborado em função de valores da Fonasa e Superintendência de Saúde - Chile.

Como podemos observar, os beneficiários do sistema público de saúde através do Fonasa geraram uma importante demanda de servi-ços privados, especialmente nos serviços ambulatoriais, representando 46% do total de prestações de serviços de saúde.

Com o objetivo de complementar tal avaliação, é importante obser-var a participação dos gastos dos beneficiários do sistema público, refle-tidos em valores absolutos e relativos. Nas tabelas abaixo, ao serem considerados os montantes faturados no setor privado, provenientes de beneficiários do sistema público e privado, a participação dos primeiros é mais baixa do que a dos últimos, respectivamente 32% e 68%.

Tabela 24 - Montante prestadores privados segundo a origem

Atendimentos em serviços de saúdeFonasa

ISAPRES TotalAt. Institucional

FONASA MLE

Atenção Médica 0 33% 67% 100%

Dias/Leito 0 2% 98% 100%

Exames Diagnósticos 0 37% 63% 100%

Intervenções Cirúrgicas (incl. PAD) 0 30% 70% 100%

Proc. Apoio Clínico e Terapêutico 0 40% 60% 100%

Total 0 32% 68% 100%

Fonte: C&E, elaborado em função de valores da Fonasa e Superintendência de Saúde - Chile.

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Um outro dado importante para a análise é a participação relativa do setor privado dentro do total de serviços de saúde ofertados no país. A seguir, é apresentada a distribuição da oferta de serviços públicos e privados por modalidade de atenção. A esse respeito, é importante diferenciar os percentuais incluindo e excluindo atenção primária do sistema público, já que o tipo de atenção prestada (por exemplo, em atenção médica) não é diretamente comparável com os dados da aten-ção médica da MLE, do Fonasa e dos Isapres. Nestes últimos casos, refere-se estritamente às consultas realizadas por médicos. No entanto, a atenção em saúde no nível primário inclui atendimentos realizados por outros profissionais da saúde. Ambos os resultados são apresenta-dos nas tabelas a seguir:

Tabela 25 - Atendimentos totais nos sistemas privado e público no ano de 2005 em atenção primária

Atendimentos Em Serviços de SaúdePrestadores

PrivadosPrestadores

PúblicosTotal C/ At.

Primária

Atenção Médica 26% 74% 100%

Dias/Leito 10% 90% 100%

Exames Diagnósticos 32% 68% 100%

Intervenções Cirúrgicas (incl. PAD) 29% 71% 100%

Proc. Apoio Clínico e Terapêutico 75% 25% 100%

Total 33% 67% 100%

Fonte: C&E, elaborado em função de valores da Fonasa e Superintendência de Saúde

Em suma, é possível observar que a participação dos prestadores privados na oferta total de serviços no sistema de saúde flutua, em nível global, entre 33% a 42% se não forem considerados na análise a assistência de nível primário.

2. A reforma da saúde e as diretrizes

Entre os anos 2003 e 2005, foram publicados quatro normativos que reformaram o sistema de saúde chileno, dentre os quais destaca-se a Lei nº 19.966 - Regime de Garantias em Saúde (Auge).

Os objetivos sanitários da reforma eram:

1. Melhorar os resultados sanitários atingidos;

2. Enfrentar os novos desafios derivados do envelhecimento popu-lacional e das mudanças na sociedade;

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3. Reduzir as desigualdades nas condições de saúde;

4. Prover serviços de saúde conforme as necessidades e expectati-vas da população.

A Lei nº 19.966 (Auge) estabeleceu o Regime Geral de Garantias em Saúde. Em 2005, entrou em vigor o Primeiro Regime que continha as Garantias Explícitas em Saúde relativas a acesso, oportunidade, qua-lidade e proteção financeira de 25 condições de saúde, priorizadas de acordo com critérios sanitários e de impacto financeiro.

2.1. Priorização de doenças de acordo com critérios sanitários e impacto financeiro

Um primeiro requisito da priorização é a relação entre a doença ou condição de saúde e os objetivos sanitários nacionais. Todos os proble-mas incluídos na proposta do plano são expressamente mencionados nos objetivos, e na maioria dos casos possuem uma meta sanitária específica, com exceção de algumas condições que foram incluídas porque já faziam parte do Programa de Prestações Valorizadas (p.ex. o Programa do Idoso), tais como a hemofilia, a fibrose cística, a escoliose e o transplante hepático.

Com o objetivo de ajustar o Plano Auge aos recursos disponíveis, estabeleceu-se uma priorização das doenças e condições de saúde e, para tal, elaborou-se um algoritmo de priorização, como descrito na figura 3.

Figura 3 - Algoritmo de Priorização - Plano Auge

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PONDERAÇÃO: SEQUENCIAL E SIMULTÂNEA

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Seguindo o algoritmo, construiu-se uma escala de pontuação de prioridade sanitária, considerando critérios de magnitude (número de casos ajustados pela qualidade do dado), repercussão (Avisa, mortali-dade, equidade e preferência dos usuários) e existência de intervenção efetiva. Com respeito à magnitude ou número de casos, não foi possível obter dados para todas as doenças ou condições de saúde. Em conside-ração a essas limitações, optou-se por ponderar o dado de magnitude pela qualidade do dado. Depois ordenou-se a listagem de doenças por magnitude, agrupando-as em quatro categorias, atribuindo um valor entre 0,25 (menor magnitude) a 1 (maior magnitude). Na tabela 26, apresentam-se os critérios usados para a pontuação de prioridade sani-tária, o valor e o alcance atribuído.

Tabela 26 - Critérios usados para construir a pontuação de prioridade sanitária

Critério Valor Pontuação

Magnitude Dado quantitativo calculado para cada enfermidade com ponderação por qualidade do dado

Ordenamento em quatro grupos de > (1) a < (0,25)

Repercussão (Avisa)

Dado quantitativo de % de Avisa do total, para a maioria das enfermidades

Ordenamento em três grupos de > (1) a < (0,5). Atribuiu-se valor 0,25 a enfermidades sem cálculo de Avisa

Repercussão (Mortalidade)

Dado do ranking de mortalidade Ordenamento em quatro grupos de > (1) a < (0,25). Sem pontuação se a enfermidade não leva à morte

Repercussão (Equidade)

Identificação de enfermidades com lacunas de mortalidade por extremos socioeconômicos

Atribuição de 0,25 para enfermidades com essas lacunas

Repercussão (Preferência dos Usuários)

Identificação de enfermidades que os usuários consideram prioritárias, segundo a Pesquisa de Feedback

Atribuição de 0,25 para enfermidades com preferência

Efetividade Identificação qualitativa de evidência de efetividade e/ou eficácia, levando em conta a possibilidade de alcançar uma cobertura adequada no curto prazo

Atribuição de pontuação entre 0 e 1

Ao não dispor de dados quantitativos para construir a pontuação de prioridade sanitária, optou-se por um ordenamento em grandes grupos. Também se utilizaram diferentes esquemas de ponderação dos critérios assinalados, os quais foram revisados por profissionais do Ministério da Saúde e do Fonasa. As doenças foram classificadas em três grupos de prioridade sanitária: alta (1), intermediária (2) e baixa (3). Também foi possível identificar doenças com informação insufi-ciente para estabelecer uma prioridade sanitária, tanto com respeito à magnitude, repercussão e efetividade. Nestes casos, recomenda-se postergar a incorporação dessas doenças como prioridades do Plano Auge, e manter as condições atuais de atenção.

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Também se identificou o ônus financeiro para os domicílios, medido pelo custo ao ano de cada doença. A listagem de doenças, ordenadas por esse valor, foi agrupada em três categorias de prioridade de prote-ção financeira: alta, intermediária e baixa.

A tabela 27 apresenta o ordenamento das patologias por pontuação sanitária versus ônus financeiro da doença.

2.2. Análise da Capacidade de Oferta

Continuando com o algoritmo, o próximo passo foi analisar a capa-cidade do sistema de saúde, considerando tanto o setor público como o setor privado para responder à demanda com a qualidade requerida. Esta análise foi realizada pelo Departamento de Investimento (Dinred) da Divisão de Planejamento Estratégica do Minsal, com relação ao setor público. O Departamento de Comercialização do Fonasa estimou a capacidade de oferta global do sistema de saúde, e o Departamento de Estudos do Minsal reuniu informação parcial sobre listas de espera no setor público para prestações críticas do Auge.

De acordo com os técnicos do Fonasa, em geral a oferta pública complementada pela privada é suficiente, salvo para consultas com especialistas e alguns procedimentos de traumatologia, oftalmologia e saúde mental. No setor público, o fator limitante é o recurso humano, e às vezes equipamento, mais que infraestrutura. Por exemplo, para cirurgia existe oferta de pavilhões, mas não há recursos humanos sufi-cientes, particularmente anestesistas, para fazê-los funcionar 24 horas. Em procedimentos diagnósticos, de imagem e terapêuticos complexos, como angiografias, mamografias e biópsias esterotáxicas, ainda que existam restrições no setor público, em muitos casos a oferta é sufi-ciente devido à possibilidade de compra de serviços no setor privado.

Levando-se em conta a estimativa do Fonasa sobre a capacidade de oferta do sistema, apresentada na tabela 27, os experts dos programas do Ministério de Saúde analisaram possíveis ajustes na demanda espe-rada ou outro mecanismo, fundamentado em critérios clínicos, com o fim de incluir o maior número de doenças prioritárias possível na proposta do Auge no ano-base, sem gerar dificuldades para sua abor-dagem dentro do marco de garantias exigíveis.

Algumas das doenças ou condições classificadas com uma oferta de atenção insuficiente apresentam risco vital ou funcional de dano que impede ajustar a demanda (por exemplo, grandes queimados, poli-traumatizados, acidentes que requeiram UTI, descolamento de retina e

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trauma ocular). A solução proposta para essas patologias é estabelecer ou fortalecer redes de encaminhamento a centros de referência espe-cializados a fim de assegurar uma oferta oportuna e de qualidade.

Em resumo, a priorização sanitária e financeira, com a análise de capacidade de oferta, permite:

a) Identificar prioridades sanitárias factíveis de implementar no curto prazo.

b) Orientar ajustes de acordo com critérios sanitários (foco em gru-pos de maior risco, em serviços mais efetivos e mais caros).

c) Identificar prioridades de incremento orçamental para financiar o Plano Auge.

d) Identificar prioridades de investimento do setor para melhorar a cobertura do Plano Auge no médio e curto prazo

Tabela 27 - Prioridade Sanitária, Financeira, Capacidade de Oferta e Ajustes

Priorização das Enfermidades e Condições de Saúde no Plano Auge para a Proposta do Ano-Base

Ordenamento das Enfermidades e Condições de Saúde Auge

PRIORIDADE SANITÁRIA 1: Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Asma brônquica Baixa SUFICIENTE

IRA em < 15 anos Baixa SUFICIENTE

Atenção à gestação e parto

Intermediária SUFICIENTE

Cardiopatia congênita operável

Alta SUFICIENTE

Saúde bucal integral Baixa SUFICIENTE

Todas as neoplasias infantis

Alta SUFICIENTE

Câncer cervicouterino Alta SUFICIENTE

Doença Isquêmica (Infarto do miocárdio)

Alta SUFICIENTE

Depressão Baixa INSUFICIENTE População Alvo - Mulheres 20 – 44

Hipertensão Arterial Baixa SUFICIENTE

Insuficiência renal crônica Alta SUFICIENTE

Câncer de mama Alta SUFICIENTE

Anomalias do tubo neural Alta SUFICIENTE

Catarata Intermediária SUFICIENTE

Transtornos Psiquiátricos graves (Psicoses)

Intermediária INSUFICIENTE População Alvo - Jovens 15 – 29

Urgências com risco de morte e atendimento pré - hospitalar

Intermediária SUFICIENTE

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PRIORIDADE SANITÁRIA 1: Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Leucemia Alta SUFICIENTE

Linfoma Alta SUFICIENTE

Tumores e cistos SNC Alta SUFICIENTE

Câncer terminal (cuidados paliativos)

Intermediária SUFICIENTE

Acidente vascular encefálico

Intermediária SUFICIENTE

Grandes Queimados Alta INSUFICIENTE (Requer encaminhamento a

serviços de referência)

Prematuros Alta SUFICIENTE (Requer encaminhamento a

serviços de referência )

Lábio leporino e fissura palatina

Intermediária SUFICIENTE

Pneumonias no idoso Intermediária SUFICIENTE

Diabetes Mellitus, Tipo I e II

Baixa SUFICIENTE

Plano de Saúde Familiar (APS)

Baixa SUFICIENTE

PRIORIDADE SANITÁRIA 2: Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Câncer de Testículo Alta SUFICIENTE

Câncer de Próstata Intermediária SUFICIENTE

DPOC Baixa SUFICIENTE

Distúrbios refrativos Baixa INSUFICIENTE População-alvo: idosos. Crianças têm cobertura por Junaeb

Síndrome da Angústia respiratória em recém- nascidos

Intermediária SUFICIENTE

Artroses Baixa INSUFICIENTE Cobertura a 70% dos casos, focada nos casos mais graves

Câncer gástrico Alta SUFICIENTE

Câncer de vesícula e vias biliares

Intermediária SUFICIENTE

Aneurismas Alta SUFICIENTE

Retinopatia diabética Baixa INSUFICIENTE Cobertura a diabéticos em tratamento

Epilepsia Baixa SUFICIENTE

HIV/SIDA Alta SUFICIENTE

Politraumatizado com e sem lesão medular

Alta INSUFICIENTE (Requer encaminhamento a

serviços de referência )

Perda de dentes no idoso Baixa SUFICIENTE

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PRIORIDADE SANITÁRIA 2: Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Urgências odontológicas Baixa SUFICIENTE

Estrabismo Intermediária INSUFICIENTE Pesquisa precoce (antes de 4 anos),

consulta inicial com especialista e manejo

do tratamento no nível primário, cirurgia

quando necessária

Artrite Reumatóide Intermediária INSUFICIENTE Cobertura a 70% dos casos, focada nos casos mais graves

PRIORIDADE SANITÁRIA 3: Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Hiperplasia Benigna da Próstata

Intermediária INSUFICIENTE Foco nos casos de obstrução severa do

fluxo urinário

Trauma ocular Baixa INSUFICIENTE (Requer encaminhamento para

cirurgia )

Retinopatia do prematuro Baixa SUFICIENTE (Requer encaminhamento a

serviços de referência )

Cirurgia que requeira prótese

Intermediária SUFICIENTE

Transtornos de condução Alta SUFICIENTE

Dependência de álcool e Drogas

Intermediária INSUFICIENTE População-alvo: jovens de 15 – 24 anos

Descolamento de retina Intermediária INSUFICIENTE Requer encaminhamento a

serviços de referência

Hemofilia Alta SUFICIENTE

Hipoacusia Intermediária SUFICIENTE

Hérnia de disco Alta INSUFICIENTE Focar nos casos com sintomas graves

Fibrose cística Alta SUFICIENTE

Acidentes com internação em UTI

Intermediária INSUFICIENTE Requer encaminhamento a

serviços de referência

Órtese do idoso Baixa SUFICIENTE

Escoliose Alta SUFICIENTE

FALTA INFORMAÇÃO QUE FUNDAMENTE A PRIORIDADE SANITARIA:

Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Insuficiência hepática crônica (transplante)

Alta Sem definição de população-alvo e sem

efetividade

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FALTA INFORMAÇÃO QUE FUNDAMENTE A PRIORIDADE SANITARIA:

Carga Financeira (Custo caso/ano)

Capacidade de Oferta (Estimativa Fonasa)

Ajustes do Plano por Oferta

Glaucoma Intermediária Efetividade questionada, pendente

de revisão pelo NIH dos EEUU

Insuficiência cardíaca crônica (transplante)

Alta Sem definição de população-alvo e sem

efetividade

Prioridade Sanitária = Ordenar em três grupos por critérios técnicos de priorização por impacto na saúde e efetividade de intervenção

Carga Financeira = Ordenamento em três grupos de acordo com o custo/ano de um caso

Capacidade de Oferta = Estimativa da suficiência da oferta de especialistas e a necessidade de ajuste

2.3. Definição de garantias do Plano Auge no Ano-Base

Com o objetivo de definir as garantias do Plano Auge Ano-Base, foram analisadas as garantias atuais de acesso, qualidade, oportuni-dade e proteção financeira.

O critério geral que orientou o trabalho é o enfoque incremental, que implica em estabelecer, de maneira gradual e de acordo com os recursos disponíveis,, mais garantias nas prioridades do Plano Auge. As garantias se dão nos seguintes âmbitos: acesso para a população-alvo (em alguns casos focalizados em grupos de risco); qualidade, que implica em melhorar a gama de serviços associados às doenças e definir algorit-mos de execução e oportunidade, tais como o tempo máximo de espera clinicamente aceito; e adoção de copagamentos diferenciados por faixas de rendimento com deduções anuais sobre os quais se ofertará cobertura completa (os rendimentos baixos não têm copagamentos).

2.4. Garantia de Acesso

O acesso universal é definido como o direito de receber as ações de saúde na forma e condições estabelecidas no Plano Auge.

Em relação ao regime de prioridades sanitárias, o acesso às garantias explícitas é direcionado à população portadora da doença ou condição de saúde. Em alguns casos, por problemas de oferta, foi necessário realizar ajustes, tais como focar a atenção em grupos prioritários, de acordo com critérios clínicos estabelecidos pelos experts do Ministério da Saúde.

2.5. Garantia de Qualidade

A qualidade, sob a perspectiva técnica, é entendida como o con-junto de atributos com os quais os serviços de saúde aumentam a pro-

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babilidade de obter os resultados desejados, incluindo nestes a maior satisfação do usuário. Também contempla outros requisitos que os esta-belecimentos de saúde devem cumprir para que os serviços prestados sejam avaliados como de qualidade. O Auge considera que a garantia de qualidade permite assegurar a equidade nos resultados de saúde, independentemente do nível de renda apresentado pelo indivíduo.

As atividades para melhorar a qualidade de atenção são múltiplas, como assinala a estratégia nacional descrita nos Objetivos Sanitários Nacionais: uso da metodologia epidemiológica e sistemas de informa-ção para fortalecer a capacidade de diagnóstico e intervenção; uso da medicina baseada em evidência; padronização de procedimentos pela autoridade sanitária, e adoção de sistemas de acreditação.

A reforma da saúde considera todas essas atividades, mas sua fer-ramenta principal é a padronização da qualidade do conjunto de serviços associados à resolução integral das doenças ou condições de saúde incluídas no Plano Auge, mediante o desenvolvimento de algo-ritmos de execução.

A qualidade, nesse contexto, adaptada da definição de Roemer e Montoya, refere-se ao desempenho da atenção que tem a capacidade de gerar um impacto ou resultado positivo na saúde da população. É um conceito relativo, determinado por condições socioculturais, eco-nômicas e pelo desenvolvimento da ciência e da tecnologia.

O Ministério da Saúde é responsável pela definição dos protocolos que farão parte do Plano Auge. As revisões justificam-se à medida que aparece nova evidência da eficácia ou efetividade das ações ou serviços propostos ou de acordo com a disponibilidade de recursos, sendo desejável uma análise de custo/efetividade.

O Auge reforça a prática do uso de evidência científica para definir os serviços garantidos, detalhados nos algoritmos de execução. Tais algoritmos são fluxogramas de decisão que orientam os profissionais e os usuários sobre as ações e serviços, necessários e efetivos, para resolver integralmente um problema de saúde no nível apropriado de atenção, incluindo os sistemas de referência e contra-referência, segundo as condições de qualidade e oportunidade garantidas.

O algoritmo é entendido como um marco orientador ao qual se associam instrumentos financeiros (PAD - Pagamento associado a diagnóstico ou outro) e instrumentos técnicos, tais como normas téc-nicas, guias de prática clínica e protocolos de atenção.

Quanto à garantia de qualidade e também de oportunidade, é o

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algoritmo o instrumento que define o conteúdo preciso desses direitos. Com respeito à qualidade, são definidos equipamento, insumos, infra-estrutura e recursos humanos adequados para a prestação do serviço no nível de atenção correspondente. Sobre a oportunidade, o algoritmo determina os tempos de espera e o momento de sua partida que com-promete o sistema, e define caso suspeito (que requer confirmação diagnóstica) e caso confirmado (que requer tratamento).

A implementação exitosa das garantias do Auge, mediante a aplica-ção dos algoritmos de execução, requer o detalhamento de estratégias e iniciativas em torno de três fatores:

1. Definição dos padrões de qualidade e oportunidade, de maneira sistemática e participativa

2. Oferta de atenção oportuna e qualitativamente congruente com tais padrões

3. Monitoramento para assegurar a obtenção de um nível de qualidade uniforme com o padronizado e dentro dos prazos estabelecidos.

2.6. Garantia de Oportunidade

No setor público, observam-se tempos prolongados de espera para atenção em algumas especialidades e também para procedimentos diagnósticos.

As listas de espera são um reflexo do racionamento dos recursos, mecanismo utilizado no setor privado e na Modalidade de Livre Eleição do Fonasa. Cabe assinalar que existem custos reais, não reconhecidos, associados ao tempo de espera, como a ausência trabalhista, diminui-ção de produtividade associada à deficiência física, angústia, dor e sofrimento, tanto físico como psicológico. Além destes custos, as listas de espera tendem a desestimular a demanda mesmo quando esta é necessária, o que impacta negativamente a saúde da população.

Garantir tempos razoáveis de acesso à atenção à saúde é, portanto, um dever do assegurador e um elemento orientador para o prestador no desenvolvimento e priorização de seu trabalho.

A garantia de oportunidade toma a forma de tempos máximos de espera para a obtenção da atenção à saúde. Para as doenças de resolução complexa, como são as doenças prioritárias do Plano Auge, o tempo de espera é composto por dois componentes: o primeiro é o tempo entre a consulta e suspeita diagnóstica no nível primário, e a interconsulta a um especialista (confirmação diagnóstica); e o segundo é o intervalo

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entre a consulta de especialista e o começo do tratamento.

O estabelecimento do tempo máximo de acesso deve contemplar os mecanismos pelos quais as pessoas obtêm a atenção se o prestador atribuído ou preferencial não pode ofertá-la. Para efetivar a garantia de oportunidade, é necessário assegurar que as pessoas conheçam e exijam seus direitos assistenciais, aceitem tempos de espera razoáveis e respeitem os fluxos e procedimentos estabelecidos na rede assistencial pois a adequação exata entre a oferta e a demanda é complexa e não só não se justifica, como ainda se torna mais difícil em redes fechadas. Por isso, nas estimativas de recursos deverá ser considerada a utiliza-ção média mais do que as demandas máximas.

O critério geral para definir o período de espera (da confirmação diagnóstica ao tratamento) é o tempo máximo considerado tecnica-mente aceitável, que varia de acordo com o grau de urgência para diferentes grupos de problemas.

Em alguns casos, o acesso imediato ou dentro de períodos máximos é necessário para impactar positivamente o resultado de saúde (por exemplo, atenção ao recém-nascido), para evitar o agravamento da doença ou para respeitar a percepção de urgência do demandante, estreitamente relacionada ao funcionamento do restante do sistema e à facilidade de acesso por outras vias.

Estabeleceram-se os seguintes grupos de problemas para os quais diferentes tempos de acesso são requeridos:

• Percepção de urgência ou necessidade das pessoas

• Problemas de saúde cuja demora na atenção provoca danos importantes

• Problemas de saúde declarados prioritários

• Atividades preventivas prioritárias

Respeitando-se os grupos anteriores, foram definidas as seguintes categorias gerais de tempos de acesso:

Atenção imediata

• Problemas de saúde que, ao não receberem atenção imediata, geram risco vital ou sequelas graves e irreparáveis

Atenção dentro de 24 a 48 horas

• Consulta de morbidade aguda

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• Problemas de saúde priorizados que, como estratégia de inter-venção, definem momentos específicos e impostergáveis para sua atenção preventiva ou curativa (Ex.: atenção ao recém-nascido, calendário de imunizações)

Atenção dentro de 7 a 30 dias

• Consulta de morbidade não aguda

• Controles de terapia e de pacientes saudáveis

• Consultas de patologia crônica não reagudizada

• Consulta à especialista e acesso a procedimentos diagnósticos

• Avaliação de estudos clínicos

• Início de tratamento quando a espera não prejudica o resultado

A atenção deve ser ofertada respeitando-se as particularidades do problema de saúde apresentado, considerando-se que o tempo de espera máximo:

• Não agrave sintomas nem origine complicações ou sequelas (Ex.: cirurgia eletiva de patologia não grave atualmente incluí-das em POA: colelitíases e hiperplasia da próstata atenção den-tro de 1 a 3 meses).

• Permita que a terapia seja efetiva (cardiocirurgia, correção de malformações, hérnia de disco, terapia antiretroviral para HIV/Sida), segundo a gravidade.

• Não afete o cumprimento do objetivo de ações preventivas (Ex.: periodicidade do exame de saúde preventivo do adulto)

• Não afete o desenvolvimento e funcionalidade das pessoas no caso de apoio à faculdades sensoriais fundamentais (Ex.: lentes, aparelhos auditivos, cirurgias de catarata)

2.7. Garantias Financeiras

Os copagamentos em saúde não só constituem uma fonte de finan-ciamento da atenção curativa, como também incentivam o uso mais eficiente dos recursos e geram um maior impacto em saúde. Os copa-gamentos podem aumentar a quantidade de recursos disponíveis no setor, liberando fundos públicos para os mais pobres e para ações de saúde pública de alto impacto sanitário e direcionar o usuário para a

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atenção mais custo/efetiva no nível de atenção mais apropriado. No entanto, deve-se evitar que barreiras financeiras inibam as pessoas de requerer atenção.

A efetividade do sistema de copagamentos para arrecadar mais fun-dos depende da disposição dos indivíduos de pagar para obter serviços de melhor qualidade. Isto supõe que ao menos uma parte dos recursos arrecadados se destinem a melhorar a qualidade da atenção, por exem-plo, aumentando a disponibilidade de medicamentos. A utilização dos serviços é reduzida pela alta de preços e aumentada quando há um acréscimo qualidade dos mesmos. Quanto menor for a variação de preço da demanda por atenção e maior a variação de qualidade, maior será a arrecadação de copagamentos.

No entanto, a liberação de subsídios públicos, induzida por uma menor taxa de utilização, é maior quanto for a variação de preço da demanda. Os copagamentos devem ser suficientemente baixos para reduzir somente a utilização desnecessária de serviços médicos ou para induzir os indivíduos a utilizarem serviços privados em lugar de públi-cos, mas sem afetar seu acesso à atenção.

A maior parte dos estudos empíricos para medir variação de preço da demanda por atenção à saúde conclui que a demanda efetiva-mente se reduz diante de uma alta de preços, mas moderadamente (elasticidade-preço menor que um). Isso implica que um aumento de copagamentos permite mobilizar recursos privados, mas seu impacto na flexibilidade para direcionar subsídios públicos é limitada, já que a utilização por parte das pessoas que pagam varia muito moderada-mente. Outro achado dos estudos empíricos é que a elasticidade-preço é maior entre os pobres, portanto um aumento de preços tende a reduzir relativamente mais a utilização desse grupo. Finalmente, a demanda por atenção ambulatorial é mais elástica que a demanda por atenção em regime de internação e os preços afetam mais a decisão de buscar atenção que a de seguir um tratamento uma vez iniciado. Em atenção ambulatorial, a elasticidade-preço é maior para as doenças crônicas que para as agudas.

O efeito de um aumento em copagamentos nos serviços públicos não necessariamente reduz o acesso à atenção de saúde, mas desvia a demanda para prestadores privados ou não adscritos ao seguro. O impacto na demanda total é maior quanto menos prestadores existam em uma determinada localidade, portanto, as zonas rurais e afastadas tendem a sofrer uma deterioração no acesso maior em relação às gran-des cidades frente a um aumento nos preços. Os preços dos prestadores

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privados também aumentam ante à maior absorção da demanda e à menor concorrência.

Os copagamentos são um instrumento para modificar os padrões de utilização de serviços de saúde e aumentar a disponibilidade de recursos para atividades e grupos prioritários. Tanto a utilização como a despesa em saúde pública têm um impacto no estado de saúde da população. Para que esse impacto seja positivo, a fixação dos copaga-mentos deve ser menor:

1. Para serviços onde a provisão substituta é de pior qualidade.

2. Para serviços cuja demanda é mais elástica, tanto no setor público como no privado, e para serviços que têm maior impacto em saúde (ex. vacinação).

3. Para indivíduos cuja demanda é mais elástica ao preço (ex. os pobres). A eliminação de copagamentos nesses casos não só melhora a equidade como também os resultados em saúde.

4. Para serviços e áreas onde existem poucos prestadores. O impacto em saúde será limitado se uma maior proteção financeira no setor público não aumentar a demanda global (pública + privada) pelo serviço que se quer estimular, mas que só desvia demanda do setor privado ao público. Se o setor privado oferece serviços de qualidade comparável ao público e os indivíduos estão dispostos a pagar os preços do setor privado, então uma maior bonificação não terá impacto algum na saúde (utilização global).

Do ponto de vista da equidade, a necessidade de proteção finan-ceira fundamenta-se no fato de a doença constituir-se num impacto imprevisível para os indivíduos, afetando seus rendimentos de maneira importante e reduzindo sua capacidade de consumo de outros bens essenciais. A sociedade não deveria tolerar que os lares sofressem uma deterioração significativa de seu consumo como consequência da doença. Quando os pagamentos de particulares são excessivos, impõe-se um “imposto” às pessoas justo no momento em que a utili-dade marginal do consumo é máxima.

Existem dois enfoques em relação à equidade no financiamento da saúde. O primeiro baseia-se na noção de igualitarismo específico e sustenta que os pagamentos devem ser independentes do uso efetivo dos serviços e se relacionar, ao invés disso, com a capacidade de paga-mento dos indivíduos. O segundo não está centrado na desigualdade, mas na relação dos pagamentos com um regular mínimo, no sentido que os lares não devem comprometer mais de um determinado mon-

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tante absoluto ou percentagem de seus rendimentos, com a finalidade de evitar que as despesas em saúde os empobreçam ou os mantenham na pobreza. Qualquer despesa em excesso, além do regular, é conside-rada catastrófica.

Além dos objetivos de mobilização de recursos e impacto em saúde, a fixação de copagamentos deve considerar os seguintes prin-cípios de equidade:

1. Os eventos pouco frequentes e de alto custo implicam uma catástrofe financeira para a maioria das famílias. Os seguros devem proteger os lares da perda financeira gerada por essas doenças. A doença não só afeta o orçamento familiar devido ao alto custo do tratamento, como também reduz a capaci-dade do indivíduo de gerar rendimentos. Esse é o caso dos cânceres, das doenças neurológicas e da doença isquêmica. Usualmente define-se operacionalmente como catastróficas aquelas despesas particulares que superam os 10% do rendi-mento bruto do lar.

2. Preços diferenciais por nível de serviço e auto-seleção: Os copa-gamentos devem ser menores para aqueles serviços cuja elasti-cidade-rendimento é baixa. Isso significa que a demanda não aumenta com o rendimento e que os serviços são mais intensa-mente utilizados pelos pobres. Os copagamentos devem ser meno-res naqueles estabelecimentos frequentados pelos pobres, por exemplo, os estabelecimentos de atenção primária municipal.

Considerando esses dois princípios de equidade e as quatro situa-ções nas quais os copagamentos devem ser menores, enunciados ante-riormente, estabeleceram-se as seguintes regras para a definição das garantias de proteção financeira do Plano Auge:

1. Grupos A e B receberão atenção gratuita em todos os níveis de atenção, exceto nas prestações odontológicas para o Grupo B. Qualquer alta de preços para os grupos pobres (A e B) poderia reduzir significativamente o nível atual de utilização de servi-ços e deteriorar os resultados em saúde.

2. Na atenção odontológica mantem-se as percentagens de copa-gamentos atuais para todos os grupos, exceto para as urgências, onde essas diminuem.

3. Grupos C e D terão copagamentos de montante fixo para consulta de morbidade geral, de especialista e de urgência. Calcularam-se os montantes de copagamentos de $500 para o Grupo C e de

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$1.000 para o Grupo D com base no custo da consulta geral de nível primário Esses montantes corresponderiam a 10% e 20% do valor da consulta, respectivamente. Para consulta de espe-cialidade, fixaram-se copagamentos de $1.000 para o Grupo C e $2.000 para o D, levando em consideração um custo médio da consulta de $7.500. Além disso, fixou-se um copagamento que fosse menor que o valor do bônus de livre eleição nível 1, que atualmente atinge a $2.060 em consulta geral ou de urgência, e $3.150 em especialidades. Em urgências de baixa complexi-dade, estabeleceu-se um copagamento de $2.500 para o Grupo C e de $5.000 para o Grupo D, com o fim de desestimular o uso indiscriminado desses serviços.

4. Promoção, prevenção e diagnóstico precoce serão gratuitos para todos os grupos, com o fim de estimular um maior consumo. A cobrança pode levar os indivíduos a consumirem um nível subótimo do ponto de vista social, já que se trata de ações com características de bem público ou altas externalidades.

5. Grupos C e D terão copagamentos diferenciados segundo nível de atenção, fase de tratamento e cumprimento de programas (ex. PAP), com o fim de direcionar demanda ao nível apropriado e incentivar o tratamento oportuno.

6. Existirão tetos de copagamento anual por doença equivalente a 10% do rendimento familiar anual, definido como os aquele proveniente do trabalho. Dessa forma, evita-se uma redução significativa da capacidade de consumo do domicílio, já que é possível suavizar o impacto mediante o endividamento da família no sistema financeiro.

7. Para as patologias que atualmente não possuem copagamentos, propõe-se conservar gratuidade para os grupos A, B e C. Para o grupo D, sugere-se gratuidade quando o limite de rendimento per capita do domicílio for de até $100.000 mensais, que cor-responde ao limite máximo do terceiro quintil segundo Casem 2000. Para renda per capita acima deste valor, aplicar o critério geral de 20% de co-pagamentos com teto de 10% do rendi-mento anual.

8. Copagamentos de 100% para Grupos C e D se acessada a atenção por vias diferentes das primariamente definidas (nível primário e urgência). Também terá que estabelecer uma sanção ao prestador.

Os grupos C e D atualmente pagam ou estão dispostos a pagar uma quantia moderada pela atenção ambulatorial no setor privado (MLE).

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A gratuidade na atenção ambulatorial para os grupos não-pobres (C e D), em um contexto de melhor qualidade de serviços, só levaria a desviar demanda do setor privado (MLE) aos consultórios e hospitais, aumentando o congestionamento do sistema público de saúde. O efeito na demanda global seria nulo e, pelo mesmo motivo, também seria nulo o impacto em saúde. Por outro lado, copagamentos moderados permitem regular a demanda, reduzindo o problema de risco moral que geram os seguros.

Na proposta priorizou-se que os copagamentos fossem menores para aqueles tratamentos mais custo/efetivos e nos níveis mais apropriados. Assim, para os grupos C e D se fixou um copagamento moderado, porém maior que o do nível primário para a consulta de morbidade ofertada nos serviços de urgência. A demanda por atenção, quando a doença é mais severa, é menos elástica no preço e um copagamento moderado não deveria inibir o acesso aos serviços de urgência quando isso é necessário; no caso de doenças comuns não urgentes, deve-se induzir a atenção no nível primário e não no hospital.

No desenho da estrutura de copagamentos, tentou-se desestimular a utilização da MLE em sua versão atual, fazendo-a menos atraente do ponto de vista dos preços que a “modalidade” Auge. No entanto, também não seria conveniente transferir a demanda para os estabeleci-mentos públicos, altamente congestionados. O recomendável é estudar alternativas de gerenciamento para a MLE que estimulem uma maior eficiência e impacto sanitário, entre eles, pagamentos captados de pres-tadores privados ou pagamentos por patologia resolvida e obrigação dos filiados de optarem anualmente por uma ou outra modalidade.

2.8. Lista de patologias GES (Lei Auge)

Decreto 170 (2005): 25 problemas de saúde

Insuficiência renal crônica terminal, Cardiopatias congênitas operá-veis, Câncer de colo do útero ou cervical, Alívio da dor, Infarto agudo do miocárdio (IAM), Diabetes mellitus tipo 1, Diabetes mellitus tipo 2, Câncer de mama, Disrafismo Espinal, Escoliose, Catarata, Artrose de quadril, Fissura labiopalatina, Câncer em menores de 15 anos, Esquizofrenia, Câncer de testículo (adultos), Linfoma em adultos, HIV (Tratamento com triterapia), Infecção respiratória aguda, Pneumonia, Hipertensão arterial essencial ou primária, Epilepsia não refratária, saúde bucal, Prematuridade, Marcapasso.

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Decreto 288 (2006): 15+

Colecistectomia preventiva, Câncer de estômago, Câncer de próstata, Erros de refração, Estrabismo, Retinopatia diabética, Descolamento da retina, Hemofilia, Depressão, Próstata com Hiperplasia Benigna, Órtese, Acidente vascular cerebral, Doença pulmonar obstrutiva crônica, Asma brônquica, Síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).

Decreto 44 (2007): 16+

Tratamento médico da artrose de quadril leve ou moderada, Tratamento médico da artrose do joelho leve ou moderada, Acidente vascular cerebral hemorrágico secundário a aneurisma, Tumores primá-rios do SNC (sistema nervoso central), Hérnia de disco lombar, Leucemia aguda em adultos, Leucemia crônica em adultos, Urgências odontoló-gicas, Saúde bucal do adulto, Politraumatizado grave, Traumatismo cranioencefálico moderado ou grave, Trauma ocular grave, Fibrose cística, Artrite reumatóide, Dependência de álcool e drogas, Analgesia de parto, Grandes queimados, Hipoacusia bilateral.

2.9. Efetividade das diretrizes clínicas Auge

Em 2005, entrou em vigência o Primeiro Regime que continha as Garantias Explícitas em Saúde relativas a acesso, oportunidade, quali-dade e proteção financeira de 25 condições de saúde.

Uma grande preocupação das autoridades consistiu em conhecer o impacto sanitário da implementação dessa Lei, especificamente nas patologias onde se implementaram diretrizes.

Um grupo de pesquisadores (1) estudou a mudança no manejo intra-hospitalar e a evolução da mortalidade de pacientes com infarto agudo do miocárdio com supra-desnível do segmento ST (SDST) em um grupo de hospitais públicos chilenos, após ser instaurado o Regime de Garantias Explícitas em Saúde (Lei Auge).

Analisaram-se 3.547 pacientes com IAM com SDST que ingressaram nos hospitais selecionados entre janeiro de 2001 e dezembro de 2006. Destes, 2.623 pacientes (74%) ingressaram entre 1º de janeiro de 2001 e 30 de junho de 2005 (período pré-Auge) e 924 pacientes (26%), entre 1º de julho de 2005 e 31 de dezembro de 2006 (período pós-Auge).

Características basais e manejo intra-hospitalar.

A amostra incluiu 2.640 homens (74,5%) e 907 mulheres (25,5%)

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com idade média de 62 ± 12 anos. Quarenta por cento dos pacientes foram tratados em 2 centros de Santiago, e os 60% restantes em hospi-tais de diferentes regiões. A tabela 28 mostra as características demo-gráficas e clínicas dos pacientes em ambos os períodos, com poucas diferenças significativas entre eles.

Tabela 28 – Características demográficas e clínicas dos pacientes no período pré-Auge e período Auge

Características % Pré-AugeN=2.623

AugeN=924

P

Idade (média + DS) 62 + 12 62 + 12 ns

Sexo (% mulheres) 25,8 24,7 ns

Hipertensão Arterial 55 58 ns

Dislipidemia 27 28 ns

Diabetes 24 26 ns

IAM anterior 52 53 ns

IAM previo 11 9 ns

Killip III/IV 6/3 4/4 ns

Em relação ao emprego de procedimentos de reperfusão, a indicação de trombólise aumentou de 50% a 60,5% (p <0,001) e a percentagem de pacientes submetidos à angioplastia primária de 2,3% a 7,3% (p <0,001) (Gráfico 5). O tempo médio entre o início dos sintomas e a internação no hospital pode ser obtido em 3.161 pacientes (89%) e foi de 4 h (percurso interquartílico 3 e 8 h) tanto no período pré como no período Auge Em 90% dos pacientes obteve-se o tempo médio entre a internação e o início da trombólise, sendo de 31 min (percurso inter-quartílico 15 e 60 em pré-Auge, 18 e 60 em Auge, p =ns). Em 4% dos pacientes, realizou-se trombólise após 12h, percentagem que foi maior durante o período Auge (3,8% versus 5%). Em ambos os períodos, a principal causa de não utilização de trombólise foi o rendimento tardio: 47% e 49%, respectivamente (p =ns). Na tabela nº 29, são apresentadas as características dos pacientes que não receberam nenhum procedi-mento de reperfusão, observando-se que estes têm um perfil de risco mais alto. No período Auge, não foi registrado nenhum caso em que o motivo de não utilização de trombolíticos tenha sido indisponibilidade do medicamento, diferentemente do período prévio à implementação da referida Lei.

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Gráfico 5 – Procedimentos de reperfusão nos períodos pré-AUGE e AUGE

Tabela 29 – Características clínicas dos pacientes submetidos à trombólise e de pacientes sem nenhum procedimento de reperfusão nos períodos pré-Auge e Auge

Características % Pré-Auge Auge

TrombóliseN=1.418

Sem reperfusão TrombóliseN=559

Sem reperfusãoN=298

Idade (média + DS) 60 + 11 64 + 14* 60 + 12 64 + 13*

Sexo (% mulheres) 23,4 28,8* 22,4 28,9*

Hipertensão Arterial

50,5 60,5* 53,7 64,7*

Diabetes 24 25,0 24,1 32,2*

IAM prévio 9,2 11,7 9,4 8,3

Killip III/IV 6,7 11,4* 4,6 11,7

*p < 0,01 para comparação de pacientes com e sem trombólise.

Análise de mortalidade.

Houve uma redução significativa da mortalidade intra-hospitalar entre os períodos pré-Auge e Auge, respectivamente 12% e 8,6% (Gráfico 6). Esta foi estatisticamente significativa nos pacientes sub-metidos à trombólise e nas mulheres. Não foram observadas diferenças significativas nos diferentes períodos na mortalidade em homens (9,4%

Auge

Pré-Auge

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Nenhumn=1.144/95

Angioplastia 1º

60/67Trombólise

n=1.418/559

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e 7,5%), nos pacientes que não receberam terapia de reperfusão (13,9% e 12,4%), nem nos pacientes que ingressaram com insuficiência cardí-aca Killip III/IV (46% e 45%). Nos pacientes diabéticos, a mortalidade diminuiu de 18% para 13% com significado estatístico (p <0,06).

Gráfico 6 – Mortalidade intra-hospitalar segundo os procedimentos de reperfusão empregados e por sexo, nos períodos pré-Auge e Auge

A análise univariada de mortalidade mostrou um efeito protetor do período Auge (OR 0,68; IC 95% 0,53-0,88). No modelo de regressão logís-tica multivariada ajustando por idade, sexo, fatores de risco, antecedente de infarto e Killip de rendimento, mantém-se a associação já citada (OR 0,64; IC 95% 0,47-0,86). A tabela 30 apresenta os riscos de morte da cada período (OR) em mulheres, em pacientes que receberam trombólise, em diabéticos e em maiores de 75 anos, e a percentagem de redução de risco obtido em cada grupo. No Gráfico 7, apresenta-se a comparação dos odds ratio de mortalidade para cada ano; tomando como referência o ano 2001, estes não diferem de forma significativa, exceto para 2006 (OR 0,58; IC 0,38-0,67), ano de plena aplicação do Auge.

Tabela 30 – Odds ratio e redução do risco de morte em grupos de interesse nos períodos pré-Auge e Auge

Pré-Auge Auge Diminuição deRisco

OR IC 95% OR IC 95%

Trombólise 0,73 0,58-0,93 0,58 0,36-0,91 -26%

Mulheres 2,39 1,87-3,08 1,65 1,01-2,71 -45%

Idade >75 4,13 3,18-5,36 2,99 1,77-5,04 -38%

Diabetes 2,03 1,58-2,59 2,03 1,26-3,27 0,3%

12*

8,610,6*

6,8

14

6

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Gráfico 7 – Odds ratio de mortalidade para cada ano comparando com o ano de 2001

O estudo mostrou uma forte associação entre a implementação do Auge e a diminuição da mortalidade intra-hospitalar no grupo de hos-pitais públicos selecionado (OR ajustado 0,64; IC 0,47-0,86). Esta é a primeira avaliação que se realiza sobre o tema.

3. Os desafios para a implementação das diretrizes clínicas

São numerosos os desafios a serem enfrentados:

1. Melhorar a qualidade do desenho das diretrizes;

2. Melhorar a aceitação das diretrizes pelos médicos;

3. Incorporar a opinião dos pacientes;

4. Publicar as diretrizes em formatos eletrônicos;

5. Avaliar o impacto sanitário que a implementação das diretrizes causará

Em relação à não aceitação das diretrizes pelos médicos, alguns pontos merecem destaque.

Durante os últimos 25 anos, as diretrizes clínicas converteram-se em um instrumento aceito de assistência médica. Em teoria, as diretrizes têm

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2004

2003

2002

2001

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OR, IC 95%

Odds ratio de mortalidade para cada anocomparando com o ano 2001

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o potencial de melhorar o cuidado, promovendo intervenções de benefí-cio comprovado e descartando as inefetivas. No entanto, seu processo de desenvolvimento, difusão e implementação têm custos associados.

Em alguns casos, estes custos superam os potenciais benefícios. As estratégias de difusão passiva são baratas, mas inefetivas. As ativas são caras, mas de baixa efetividade. Por quê?

Um problema frequente é o baixo nível de aceitação e implementa-ção das diretrizes pelos médicos. É necessário identificar quais são as barreiras locais e instaurar estratégias eficazes de intervenção sobre as mesmas. Caso contrário, as diretrizes não modificarão a prática clínica nem melhorarão os indicadores sanitários.

Cabana et al (1999) revisaram 76 artigos sobre o tema e encontra-ram 293 barreiras ao uso das diretrizes pelo médico, assim divididas:

1. Desconhecimento do médico (desconhecimento da existência das diretrizes; falta de familiaridade e de concordância, resis-tência à mudança de conduta);

2. Atitudes do médico;

3. Fatores externos.

Tradicionalmente, o problema na implementação das diretrizes é visto como “externo” às pessoas, “está lá fora”, “é objetivo” e sua supe-ração só dependeria de encontrar a solução “adequada”.

Mas não se pode resolver os problemas sob a mesma perspectiva em que foram criados.

Quais são as emoções do médico?

1. Desconhecimento da existência das diretrizes: Desinteresse.

2. Falta de familiaridade com as diretrizes: Desconfiança

3. Falta de acordo com as diretrizes: Desacordo.

4. Resistência à mudança de conduta: Desânimo, Apatia.

Estas emoções permitem envolver os médicos na gestão de qualidade? De onde surgem elas surgem?

O poder dos médicos na organização está fundamentado no fato de seu trabalho não poder ser controlado burocraticamente. Seus objeti-vos principais são a autonomia individual e coletiva, a correta realiza-ção do trabalho e o prestígio de sua especialidade. Esses objetivos têm

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consequências para a organização e a conservação da autonomia faz com que os profissionais resistam aos controles. Mas, o que os médicos querem conservar é uma pergunta não trivial que deveria ser feita.

Um novo gerenciamento das pessoas deve desenhar a estratégia de relacionamento com os médicos segundo sua resposta. As bases teóricas desse novo gerenciamento encontram-se na “Biologia do Conhecer”.

Quais são as emoções da administração?

A organização pode impor controles quantitativos, mas este é sem-pre contestado pelos experts, que alegam dificuldade em medir seu trabalho, inclusive nesses termos. Mas se a organização quer assegurar certos resultados, cumprir certas metas, pode gerar exigências tirânicas e “cegas ao outro”.

Quais são os desafios que deverá enfrentar o gerenciamento clínico?

Primeiro, desenhar uma nova perspectiva de gerenciamento de pessoas. Segundo, entender que as condutas dos médicos definem o sistema social do qual fazem parte.

Devido ao caráter conservador deste sistema social, toda inovação é, ao menos inicialmente, resistida, às vezes de maneira extrema. Por isso, uma inovação social só se impõe por sedução ou porque os novos membros não podem evitá-la.

Por último, só há mudança genuína em uma sociedade se há mudança real na conduta de seus membros, já que toda mudança social é uma mudança cultural.

O gerenciamento das pessoas deve, em primeiro lugar, estabelecer relações de confiança com os médicos pois não é possível construir acordos num contexto de relações de exigência e desconfiança. Só numa relação de confiança pode surgir uma realidade como projeto compartilhado, pois assim legitimamos o outro e não o julgamos segundo a nossa razão ou exigência. A relação existente não pode basear-se em que o outro deva sempre ceder.

O futuro deveria ser um espaço de colaboração e confiança.

4. Referências

1. CABANA, M. et al. Why don’t physicians follow clinical practice guidelines. JAMA, n. 282, p. 1458-1465, 1999.

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2. GROL, R.; GRIMSHAW, J. From best evidence to best practice: effec-tive implementation of change in patients’ care. Lancet, n. 362, p. 1225-1230, 2003.

3. MATURANA, H. The biological foundation of self conscious ness and the physical domain of existence. In: CAIANIELLO, E. R. (Ed). Physics of cognitive processes. Singapore: World Scientific, 1987. p. 324-379.

4. NAZZAL N, Carolina et al. Impacto del plan AUGE en el tratamiento de pacientes con infarto agudo al miocardio con supradesnivel ST, en hospitales chilenos. Rev. méd. Chile, Santiago, v. 136, n. 10, p. 1231-1239, oct. 2008.

5. Links informativos sobre saúde

Ministério da Saúde

http://www.minsal.cl/

Diretrizes Clínicas AUGE

http://www.minsal.cl/ici/guias_clinicas.html

Superintendencia de Saúde

http://www.supersalud.cl/568/channel.html

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Rodrigo Pardo Zurriago *

* Médico, Mestre e Professor Associado. Instituto de Pesquisa Clínica Faculdade de Medicina. Universidade Nacional de Colômbia.

Bogotá

Apresentamos a seguir um ensaio crítico da política oficial do Ministério de Proteção Social da Colômbia (anteriormente o Ministério da Saúde), consagrado no documento de Avaliação do Plano Obrigatório de Saúde nos regimes contributivo e subsidiado no sistema geral de previdência social de saúde da Colômbia e diretrizes para a sua reforma. Este documento foi elaborado em 20091 pela Direção Geral de Tecnologia em Saúde do Ministério de Proteção Social.

Desde a sua entrada em vigor com a Lei nº 100, de 1993, o Sistema Geral de Previdência Social de Saúde Colombiana (SGSSS) considerou, como meta, a realização do seguro universal, para melhorar a eficiência e aumen-tar a qualidade do serviço de saúde2. A lei consagrou dois regimes de seguro para a prevenção e gestão dos riscos associados às doenças em geral e maternidade: um para os trabalhadores e suas famílias, chamado regime contri-butivo, e outro para as pessoas sem condições de pagar, chamado regime subsidiado.

O primeiro é financiado por uma taxa de 12,5% prove-niente da folha de pagamento, enquanto o segundo é reali-zado por meio de uma tributação geral e de outros recursos. No intuito de moderar a procura de serviços, todos os asso-ciados do sistema têm que fazer copagamentos ou taxas moderadoras quando recebem os serviços de saúde.

A fim de garantir o atendimento de qualidade nos ser-viços e a melhoria contínua, o sistema adota a estratégia da concorrência de qualidade através da livre escolha

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pelo usuário da organização ou empresa que irá fornecer o seguro e das instituições ou fornecedores responsáveis pela prestação direta de serviços de saúde. O fundamento dessa estratégia é que o conteúdo dos serviços do programa e o valor da contribuição não poderão ser alterados devido a essa escolha.

A lei estabelece, também, um pacote de benefícios para cada regime financiados pela Unidade de Pagamento por Captação (UPC) ou pelo prêmio de seguro. Este prêmio está sujeito ao ajuste pela idade, gênero e localização geográfica. Tanto o conteúdo dos programas de benefí-cios como o valor da unidade de captação, são definidos pelo Conselho Nacional de Seguro Social. Assim, as empresas que fornecem esses seguros estão sujeitas ao mesmo quadro de referência, sem a opção de concorrência desleal ou especulação.

São estes os critérios de fixação do valor da UPC: o perfil epide-miológico da população, a cobertura dos riscos e os custos de pres-tação de serviços em condições médias de qualidade, tecnologia e capacidade instalada.

Há um número maior de benefícios no regime contributivo, com relação ao regime subsidiado, no qual existe uma área de cuida-dos sem cobertura, especialmente no segundo e terceiro níveis de complexidade.

A reforma do sistema de saúde na Colômbia tem conseguido resul-tados importantes em termos de cobertura e de recursos financeiros para o setor, introduzindo uma dinâmica nos componentes de despesa, com um declínio significativo nos gastos privados, que passou de 3,3% do PIB em 1993 para 1,2% em 2003, enquanto a despesa pública total em saúde aumentou de 1,4% para 3,1% do PIB no mesmo período3.

Os estudos e as informações disponíveis com relação aos efeitos da reforma na melhoria de qualidade dos serviços de saúde e estado de saúde da população não são tão consistentes em relação às variáveis de financiamento, acesso, utilização e proteção financeira, devido à ausência de dados confiáveis. A reforma teve seu avanço na criação do Sistema Obrigatório de Garantia de Qualidade, que visa apoiar as insti-tuições para atingir níveis mais elevados de desempenho na prestação dos seus serviços e acompanhar o rendimento de qualidade no sistema.

No entanto, o Ministério reconhece que os planos de benefícios, como elemento central do sistema, têm pontos fracos que podem ser relacionados à dificuldade de fazer progressos nos resultados de qua-lidade e estado de saúde.

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Dado o seu crescimento e sua importância relativa (a despesa obrigatória no Programa de Saúde é responsável por 3,8% do PIB em 2003), o Ministério de Proteção Social propõe o Plano Obrigatório de Saúde (POS) como o principal instrumento estratégico para atender à carga de doenças na Colômbia.

Essa estratégia pressupõe que o POS defina os serviços de saúde recebidos pela população colombiana e que delimite as tecnologias de saúde seguradas. Essa decisão estratégica terá uma influência decisiva na abrangência que se pretende dar às diretrizes clínicas, como um instrumento central dessa política e nas adaptações técnicas, econômi-cas e atuariais de saúde.

O ponto central da proposta é atualizar o Plano Obrigatório de Saúde e a Unidade de Pagamento por Captação, priorizando as doenças rele-vantes na Colômbia. O objetivo é modificar a estrutura, a linguagem do Plano Obrigatório de Saúde e alinhar os incentivos dos diversos participantes no sistema através do desenvolvimento e da utilização de diretrizes clínicas baseadas em evidência, avaliações econômicas, estu-dos sobre o impacto financeiro das recomendações das diretrizes sobre o Sistema de Previdência Social em Saúde e os respectivos cálculos e ajustes para Unidade de Pagamento por Captação.

O raciocínio implícito nessa estratégia reside na opção de atualizar e melhorar a compreensão do POS e o conhecimento dos direitos dos asso-ciados por meio de diretrizes clínicas baseadas em evidência e ao mesmo tempo dar aos usuários diretrizes que possam ser entendidas por todos os setores envolvidos no sistema. Isso visa também à redução da assimetria de informações entre os associados, seguradoras e prestadores.

A justificativa para tal orientação estratégica tem foco nos critérios erráticos que conduzem à atualização e aos ajustes ao plano de benefí-cios do POS, afastando-se dos critérios originalmente propostos (perfis demográficos, epidemiológico, relação custo-efetividade das tecno-logias e proteção financeira), procurando combinar os avanços das tecnologias biomédicas com a rigorosa evidência científica e as suas consequências financeiras que podem dar suporte para recomendações claras e bem fundamentadas.

O Ministério da Proteção Social da Colômbia (anteriormente Ministério de Saúde Pública) entende que a atualização dos planos de benefícios dos programas de saúde obrigatória, tanto no regime contributivo como no subsidiado deve ser melhorada através de uma forma mais orientada e de uma abordagem estratégica definida. Além dos critérios que deverão comunicar as alterações na Lei de Segurança

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Social, identifica-se também um espaço para que as atualizações dos programas acompanhem um plano bem estruturado e orientado por evidências científicas e diretrizes clínicas. Esses elementos não se refletiram na versão original da lei na sua forma explícita.

Essa decisão tem consequências previsíveis e imprevisíveis sobre a eficiência do sistema: em primeiro lugar, é atribuído às diretrizes clíni-cas um papel central que procura definir os seus padrões mínimos de qualidade, enquanto o outro lhes oferece uma abrangência que pode ir além do valor real, já que não enriquecem a estratégia com outros elementos adicionais que a potencializem. Assim, não se estimulam as iniciativas para o desenvolvimento de centros de avaliação tec-nológica, revisões sistemáticas de inserções em redes internacionais que aumentam o trabalho e proporcionam uma organização central flexível ao modelo.

Da mesma forma, a estratégia tem como objetivo continuar forta-lecendo os princípios de cobertura e proteção financeira, como tem feito até agora, e aposta incluir, por intermédio das diretrizes clínicas, o elemento de qualidade.

Precisam ser resolvidas algumas questões fundamentais já reconhe-cidas no subsistema de controle de qualidade. Primeiro, as informações relativas sobre estes componentes - registradores, indicadores, audito-rias de acompanhamento -, embora reconhecendo as novas variáveis emergentes da dinâmica social que exigem a inclusão de considerações de equidade, reconhecimento das minorias, atendimento à população vítima do deslocamento, aos grupos vulneráveis e à harmonização das recomendações dentro de um contexto político administrativo que permita criar formas para implementar as diretrizes. Isto exigirá um grande esforço.

Há outros grandes desafios que exigem um desenvolvimento simul-tâneo e paralelo dos outros componentes do sistema que constituem uma ameaça para a estratégia.

O grupo responsável por essa iniciativa está ciente das ameaças e questiona a capacidade do atual Ministério para resolver alguns pro-blemas específicos, como:

I) Monitorar as mudanças no perfil demográfico e epidemiológico da população;

II) Realizar estudos rigorosos de custo-efetividade das tecnologias contidas no POS, bem como aqueles que não foram incluídos;

III) Produzir ou fazer uma revisão das melhores evidências científi-

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cas disponíveis sobre tecnologias em saúde, incluídas e excluídas do plano de benefícios;

IV) Combinar o item anterior com uma análise do nível de pro-teção financeira que uma ou outra tecnologia oferece aos seus associados;

V) Monitorar o dinâmico mercado das tecnologias de saúde para propor e estudar novas tecnologias para incluir no Plano Obrigatório de Saúde ou reavaliar a inclusão de outras com base em nova evidência disponível.

Desde 2006, a inclusão no plano de benefícios vem sendo apoiada nas diretrizes clínicas construídas a partir da melhor evidência cien-tífica para os casos de HIV/SIDA, doença renal crônica, planejamento familiar e, sob princípios semelhantes, foram atualizadas as diretrizes e os benefícios para a diabetes tipo 2 e hipertensão; nesse último caso, incluindo considerações de impacto na unidade de captação para os novos serviços oferecidos.

Nos primeiros anos, os procedimentos de inclusão dos medicamen-tos ou de procedimentos obrigatórios em saúde no Plano Obrigatório de Saúde Contributivo e no Plano Obrigatório de Saúde Subsidiado não foram suficientemente apoiados por evidências científicas, e o Conselho Nacional de Saúde e Segurança Social não contava com um comitê consultivo como o atual Comitê dos Medicamentos e Avaliação das Tecnologias, nem teve a capacidade técnica e operacional para rea-lizar os estudos necessários. Essa capacidade técnica e operacional tem que se fortalecer e dar espaço às evidências sólidas que a investigação fornece em diferentes campos.

Na Colômbia, procura-se atualizar os planos de benefícios, priori-zando as doenças e desenvolvendo de forma paralela ferramentas de gestão, para conseguir um atendimento integral e uma maior cobertura, dentro dessas ferramentas, incluem-se as diretrizes clínicas. Da mesma forma, ocorre nos sistemas de saúde com mais solidez e desenvolvi-mento, os quais procuram a qualidade do atendimento e, por outro lado, buscam racionalizar, de forma eficaz, as despesas na saúde.

A estratégia global planejada pelo Ministério de Proteção Social da Colômbia visa modificar e melhorar os planos de benefícios dos planos de saúde e considera:

• Dar prioridade aos problemas de saúde diante das limitações dos recursos disponíveis;

• Rever e atualizar o conteúdo dos planos, em função das evidên-cias científicas e diretrizes clínicas;

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• Responder às mudanças epidemiológicas e demográficas da população colombiana, às mudanças em seus hábitos, ao efeito do aumento da expectativa de vida e lento envelhecimento da população, com o consequente aumento de doenças crônicas;

• Desenvolver avaliações econômicas para as doenças prioritárias e o impacto financeiro da implementação das recomendações sobre a Unidade de Pagamento por Captação.

Essa estratégia entende que as diretrizes clínicas são um instru-mento que oferece maior clareza conceitual para o seguro de saúde na Colômbia e um método para orientar o incentivo financeiro à Unidade de Pagamento por Captação. Assim, as diretrizes clínicas não seriam apenas um instrumento de melhoria da qualidade, mas também uma eficiente racionalização dos gastos com a saúde.

Em países como Holanda, Alemanha e Chile, a definição dos planos de benefícios é complementada mediante diretrizes clínicas baseadas em evidência. Da mesma forma, em países com sistemas nacionais únicos, como Inglaterra, Canadá e Nova Zelândia, que estão à frente, também se desenvolvem diretrizes para identificar as intervenções a serem financiadas com recursos públicos e associadas a um contexto clínico com as evidências científicas4.

Enquanto a Colômbia tem uma experiência bem-sucedida no desen-volvimento das diretrizes, a proposta do Ministério de Proteção Social é fortalecer o componente das diretrizes baseadas em evidência dos estudos econômicos e dos impactos financeiros gerados como uma solução pragmática diante da ausência de melhores alternativas.

Avaliar e atualizar, os procedimentos, medicamentos e interven-ções é um processo complexo e dispendioso. As diretrizes baseadas na evidência científica permitem uma definição mais clara das interven-ções (definida como um conjunto de procedimentos) associadas com a atenção de doenças ou problemas específicos, facilitando o inventário de intervenções com eficácia comprovada e orientada para as doenças prioritárias. Outro avanço nesse caminho deve-se aos grupos relacio-nados de diagnóstico com a expectativa de favorecer as seguradoras, os prestadores e os pacientes.

Um primeiro passo requer fixar e estabelecer os princípios de priorização. Claramente essa responsabilidade cabe ao Ministério de Proteção Social, que irá discutir os critérios que devem ser ampla-mente ilustrados para essa priorização. A Colômbia acompanha com bastante atenção o programa Auge, do Chile, e outros similares em que as doenças específicas são selecionadas para serem regulamen-

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tadas na prestação de serviços para aqueles que as sofrem, incluindo as diretrizes baseadas em evidência, para que exista um atendimento mais eficiente.

Tradicionalmente, na Colômbia, os critérios de carga de doenças de impacto na saúde pública de interesse nos grupos vulneráveis, como materno-infantil, doenças transmissíveis e tropicais, têm dominado a cena de priorização. Confrontados com essas entidades tradicionais, surgem novos problemas que devem entrar na agenda, tais como doenças crônicas e doenças de alto custo, mesmo que sua ocorrência não seja alta. O Ministério examina atualmente as abordagens e estra-tégias que irão priorizar os problemas que serão objeto de revisão no novo POS e procura um novo processo participativo através de vários meios para dar legitimidade social ao processo de priorização, sob o preceito de “tornar público o que é público”5. Assim, dá-se prioridade à primeira fase dessa estratégia, que é composta de três.

A primeira é precisamente a definição de orientações, avaliações econômicas e estudos sobre o impacto financeiro das recomendações. Essa fase exige uma metodologia explícita que permita responder a três perguntas: qual é a melhor evidência, a intervenção mais efetiva (ou custo-efetiva) e qual é o seu impacto financeiro sobre a UPC. O modelo adotado servirá como base para serem desenvolvidas e fornecidas as diretrizes para as doenças prioritárias nos próximos anos na Colômbia que receberão o apoio financeiro do Ministério.

O desenvolvimento deste modelo foi submetido à licitação, por ini-ciativa do Ministério da Proteção Social e do Instituto Colombiano para a Promoção da Investigação - Colciencias. Nessa licitação foram fixados os termos que devem satisfazer à proposta do manual meto-dológico. Depois de um concurso que recebeu observações dos partici-pantes, um consórcio da Fundación Santa Fe de Los Andes University, Harvard University (Escola de Saúde Pública) foi convidado a apresen-tar antecipadamente a proposta do manual metodológico num prazo de nove meses. Esse exercício testou as capacidades locais para o estudo crítico dos métodos e por meio de diversas estratégias participativas produziu alguns resultados que serão lançados em breve e que deverão tornar-se ferramenta de uso obrigatório para os que desenvolvem as diretrizes no país.

Surgem algumas dificuldades nessa estratégia, como a pouca capa-cidade local para desenvolver estudos de Economia da Saúde e análise atuarial em cada disciplina e para cada caso. O manual metodológico deve ser formado precisamente nesse contexto, na abordagem prática

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e funcional desses componentes, mas isso vai exigir a formação de equipes de profissionais com capacidade e experiência para apoiar o processo. Os recursos no país para esse fim não são abundantes.

A estratégia global, uma vez priorizadas as doenças, procura desen-volver três tipos de diretrizes baseadas em evidência, além da renova-ção de algumas já existentes e adotar diretrizes anteriores, nacionais ou internacionais.

A fase de priorização definirá os temas divididos em três grupos que serão desenvolvidos sequencialmente por intermédio das diretrizes. Essas fases devem ser vistas como circulares e não como um processo linear e essa priorização deve levar em conta a dinâmica do desenvol-vimento social e variáveis políticas que possam modificá-la.

A terceira etapa, logo a seguir, é o fortalecimento dos instrumentos de gestão e o avanço de ajustes normativos. Os focos de atendimento propostos são modelos de gestão (disease or case management), os cuidados de saúde primários, o fortalecimento de redes de serviços de saúde para o atendimento de doenças patológicas priorizadas, a concepção e o desenvolvimento de um sistema de informação e acom-panhamento da execução das diretrizes e grupos relacionados com o diagnóstico. Além disso, posteriormente análise da contratação, paga-mento e ajustes regulamentares (decretos e resoluções).

Na Colômbia, o desenvolvimento das diretrizes clínicas baseadas em evidência foi iniciativa dos grupos acadêmicos das universidades ou de institutos de pesquisa. O Ministério da Saúde da Colômbia desenvolveu e promoveu, na década de 1970, uma série de documentos técnicos, conhecidos como protocolos de gestão, para enfrentar os problemas prioritários de saúde no país, centrada na proteção de grupos vul-neráveis, doenças transmissíveis e tropicais. O Instituto Nacional da Saúde e o Laboratório Nacional de Saúde, da Universidade Nacional da Colômbia, da Universidade de Antioquia e Valle foram os autores desses documentos que formularam claramente as recomendações do ponto de vista de especialistas. O Ministério divulgou os materiais, a fim de torná-los obrigatórios para sua observação, especialmente no contexto da atenção primária.

A introdução da medicina baseada em evidência foi iniciativa dos grupos universitários, especialmente das unidades de epidemiologia clínica que, desde 1987, surgiram no país com o objetivo de reforçar a investigação em saúde na Colômbia e formar um grupo de profissio-nais com capacidade suficiente para apoiar esses processos.

A Universidade Javeriana, em Bogotá, foi pioneira nesse processo

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(1995-1997) e vinculada de forma ativa como consultora do primeiro exercício nacional para avançar nesta direção: as diretrizes baseadas em evidência do Instituto de Seguros Sociais e da Associação Colombiana de Faculdades de Medicina6. O consórcio apresentou um primeiro con-junto de diretrizes que foi amplamente difundido no país por meio de métodos impressos e eletrônicos, de cumprimento obrigatório pelas instituições de saúde vinculadas ao Instituto de Seguro Social. Com o resultado desse projeto, havia cerca de cinquenta diretrizes de diversas doenças e um menor número de diretrizes para enfermagem e odonto-logia. Sua metodologia incluiu a participação ativa de especialistas e a capacitação em métodos de leitura crítica. Os textos refletem o grau de desenvolvimento que as diretrizes tinham no momento da ocorrência.

Mais tarde, outros grupos universitários (Universidade Nacional, Universidade de Antioquia, do Valle e de Santander) e grupos de pes-quisa (Fesalud, Fundación Santa Fe, entre outros) se somaram à tarefa de preparar os seus especialistas, oferecendo capacitação na metodo-logia da leitura crítica e avaliação das evidências7. Rapidamente, tam-bém, se somariam os profissionais provenientes das sociedades cientí-ficas, que, com muito interesse, desenvolveram as diretrizes baseadas em evidência para as doenças específicas de cada especialidade, nem sempre de boa qualidade.

Os produtos assim construídos ainda precisam da opinião de espe-cialistas, como uma contribuição fundamental para a interpretação das evidências científicas, e não têm as ferramentas de monitoramento ou de mecanismos claros de atualização.

Nos últimos anos, a formulação de diretrizes clínicas baseadas em evidência foi ganhando terreno e já formou grupos capacitados para sua elaboração, acompanhando as linhas clássicas do método. As con-siderações econômicas, no entanto, são muito poucas e não contam com grupos suficientes de especialistas para acompanhar o desenvol-vimento das diretrizes com considerações de custo-efetividade.

No desenvolvimento da sua estratégia, o Ministério propõe um projeto mais ambicioso: promover o desenvolvimento das diretrizes baseadas em evidência para as doenças que serão objetos de prioriza-ção, adiantando os estudos de análise econômica por vários modelos aplicáveis, e uma análise atuarial de seu impacto na UPC.

Os objetivos são claros: por um lado, o reforço da qualidade do atendimento, e, por outro, o controle dos custos e despesas com a saúde cada vez maiores.

A estratégia menciona tangencialmente os problemas de equidade,

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mas não os interrompe e não dá ênfase a esse componente. Da mesma forma, as questões, como a atualização, o acompanhamento e a medi-ção do impacto recebem pouco espaço nas considerações.

Alguns desafios enfrentados: a pobre cultura de informações e regis-tro que dificulta a obtenção de dados válidos e confiáveis. Também a disponibilidade de equipes profissionais de economia da saúde com experiência nos modelos exigidos pelas diretrizes, bem como os atu-ários que possam enfrentar os três grupos de guias que fazem parte da estratégia de forma sequencial. Finalmente, a falta de aceitação real que as diretrizes têm no nosso meio e das barreiras para a sua implementação. A experiência anterior mostra que esse fator pode pre-judicar substancialmente o sucesso da proposta, a qual não se resolve somente com decisões regulamentares.

No entanto, é importante salientar que, através desse projeto, o Ministério reconhece o valor e a importância das diretrizes clínicas baseadas em evidência e interpreta essa ferramenta como um método não só para melhorar a qualidade e a contenção de custos, mas, tam-bém, como um elemento central na reforma do plano de saúde obriga-tório para a Colômbia nos dias de hoje.

Agradecimentos:

Dr. Leonardo Cubillos e Dra. Adriana Pulido, da Direção Geral de Tecnologia em Saúde, Ministério de Proteção Social, que, generosa-mente, forneceram os registros oficiais de circulação interna que for-maram a base para esta análise.

Referências:

1. CUBILLOS, L.; PULIDO, A.; ALFONSO, E. A.; BOLIVAR, M. C.; CASTRILLON, J. Revisão do plano de saúde obrigatória para regimes contributivo e subsidiado no sistema de segurança social na Colômbia e orientações para a reforma da saúde. Bogotá: Ministério da Proteção Social, 2009.

2. COLÔMBIA. Lei nº. 100, 1993.

3. BARON, G. Contas da Saúde na Colômbia 1993-2003: o gasto nacional em saúde e financiamento. Bogotá: Ministério da Proteção Social, 2006.

4. GEIDION, U.; PULIDO, A.. Programa de Apoio à Reforma da Saúde - Pars: experiências internacionais de priorização na saúde e planos de benefícios: documento de consulta. Bogotá: Ministério da Proteção Social, abr. 2008.

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5. Castano, R. A. Julgamentos justos, legitimidade e consenso contra os limites do direito à saúde. Bogotá, janeiro de 2009.

6. ASCOFAME; ISS. Orientações na prática clínica. Colômbia, Bogotá, 1996. Acessado em 20 de agosto de 2009:

http://www.ascofame.org.co/index.php?option=com_remository&Itemid=36&func=select&id=1.

7. PARDO, R. Guia de seleção da mama, na Colômbia. Bogotá: Universidad Javeriana, agosto de 2008.

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António Vaz Carneiro*

*Diretor, Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência

Diretor-Executivo, Instituto de Formação Avançada

Faculdade de Medicina de Lisboa, Portugal

1. Introdução

Portugal é um país atlântico, constituído por um ter-ritório continental e duas regiões insulares autônomas, Madeira e Açores. Em 2007, a população residente no país totalizava os 10,6 milhões de habitantes (10,1 milhões no continente e aproximadamente 500 mil nas ilhas).

O sistema de saúde português é constituído por três unidades coexistentes:

1. O Serviço Nacional de Saúde (SNS) propriamente dito, financiado através dos impostos e disponibi-lizado a todos os cidadãos através dos serviços de saúde públicos oferecendo cobertura universal;

2. Os subsistemas de saúde, que são sistemas espe-ciais de seguros de saúde sociais cobrindo certas profissões (25% da população) e

3. Os seguros privados de adesão voluntária indivi-dual ou através das entidades patronais (17% têm sistemas privados de seguro e 7% fundos mistos).

Segundo fonte do Alto Comissariado da Saúde (Estratégias de Saúde em Portugal – O Plano Nacional de Saúde 2004-2010):

• Em 2007 o número de nascimentos registrados em Portugal Continental foi, pela primeira vez, inferior ao número de óbitos: 96.925 nascimentos e 98.668 óbitos e o índice de envelhecimento (razão entre

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a população com 65 ou mais anos e a população dos 0 aos 14 anos) subiu entre 2004 e 2007 de 111,2 para 116,2 idosos por cada 100 jovens;

• Em 2007, existiam 36.844 médicos e 50.634 enfermeiros, cor-respondendo a 3,6 médicos e cinco enfermeiros por cada 1.000 residentes, com marcadas assimetrias geográficas na distribui-ção destes profissionais: maiores razões por 1.000 habitantes na Região de Lisboa (médicos: 5,2‰ e enfermeiros: 5,7‰) e os menores no Alentejo (médicos: 1,9‰ e enfermeiros: 4,1‰);

• No Serviço Nacional de Saúde (SNS) de Portugal Continental, prestavam serviço, em 2005, 126.257 profissionais, dos quais 23.125 médicos, 36.509 enfermeiros, 4.840 farmacêuticos e 7.715 técnicos de diagnóstico e terapêutica;

• Em 2006, existiam 185 hospitais (103 públicos e 82 privados), localizando-se cerca de 65% nas ARS do Norte e de Lisboa e Vale do Tejo. Ao incluir também a Região Centro, esta percen-tagem ascende a 90%;

• Os 347 centros de saúde em atividade em Portugal Continental foram recentemente organizados em 74 Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES). A reforma dos Cuidados Primários determinou a criação de Unidades de Saúde Familiares, unida-des operativas dos Centros de Saúde, com autonomia funcional e técnica, que contratualizam objetivos de acessibilidade, ade-quação, efetividade, eficácia e qualidade. Em Janeiro de 2009, existiam 160 USF no terreno, prestando cuidados a 1.969.755 habitantes;

• Em Outubro de 2008, estavam em funcionamento 2.769 respos-tas de internamento de Cuidados Continuados Integrados, 650 respostas domiciliares.

• Em Portugal, a despesa com a saúde totalizou (em 2004) 14,5 mil milhões de euros (9.8% do PIB), a que corresponde € 1.380 (US $ 1970) per capita.

• Em termos de qualidade global do SNS, segundo a OMS, Portugal está dentro dos 15 melhores países do mundo, com alguns indicadores (taxas de mortalidade infantil, por ex.) nos 3-4 primeiros em nível internacional.

Os inquéritos aos cidadãos portugueses confirmam de maneira con-sistente que mais de dois terços acham o SNS bom ou muito bom.

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É nesse contexto geral que importa discutir – de maneira necessa-riamente breve – o papel das Normas de Orientação Clínica – NOCs (guidelines) como instrumentos de qualidade em saúde nesse sistema de saúde sempre em mutação.

2. As normas de orientação clínica como instrumentos de qualidade em saúde

As Normas de Orientação Clínica (tradução por nós proposta da designação inglesa de guidelines) definem-se como um conjunto de recomendações clínicas, desenvolvidas de forma sistematizada, consti-tuindo um instrumento que se destina a apoiar o profissional de saúde e/ou o doente na tomada de decisões acerca de intervenções ou cuida-dos de saúde1.

As NOCs servem vários propósitos, quer para os profissionais de saúde, quer para os doentes, quer ainda para os sistemas de saúde2. Para os profissionais de saúde, disponibilizam e explicitam o princípio da Medicina Baseada na Evidência (Evidence-based Medicine – EBM); permitem o acesso fácil à síntese da informação relevante acerca de um conjunto de procedimentos ou intervenções eficazes numa con-dição e/ou grupo específico, em oposição àquelas que a evidência científica desaconselha, por serem inúteis ou perigosas; possibilitam uma melhoria da qualidade da decisão clínica, através da indicação de recomendações claras, diminuindo a variação da prática clínica e substanciando as opções técnicas com maior objetividade no contato com o doente; constituem uma base de referência para programas de qualidade em saúde; implementam uma divisão mais racional de tare-fas nas equipes médicas; identificam áreas necessitando de investiga-ção clínica apropriada e constituem um esquema referencial da melhor prática médica. Para os doentes, educam sobre as melhores práticas clínicas; melhoram os resultados e a qualidade em saúde, promovendo comportamentos eficazes e seguros e desaconselhando outros; dispo-nibilizam informação de boa qualidade, promovendo uma base segura para decisão consciente acerca da saúde de cada um e servem como instrumentos de alteração de políticas de saúde, com identificação de novas carências e distribuição mais justa dos recursos. Finalmente, para os sistemas de saúde, as NOCs melhoram a eficiência dos serviços, estabelecem padrões comparativos de qualidade dos cuidados e otimi-zam recursos com aumento das atuações custo-efetivas.

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As NOCs devem focar-se em resultados de saúde (outcomes), ou seja, nas consequências projetadas na saúde de um indivíduo, grupo ou população, gerada por uma intervenção, conjunto ou sequên-cia de intervenções. Uma NOC é válida se a sua aplicação induz as melhorias de saúde previstas, com um custo próximo ao previamente determinado.

As NOCs apresentam uma maior eficácia, caso as suas recomen-dações sejam baseadas em revisões sistematizadas da literatura (com ênfase para estudos que medem ou avaliam resultados clínicos rele-vantes); se forem produzidas por grupos nacionais ou regionais (que incluam representantes de todos os grupos interessados) e se a cone-xão entre as recomendações e a evidência científica for formalmente explicitada.

As NOCs podem servir de base a uma reforço da qualidade em saúde, definida como “…a oferta dos melhores cuidados possíveis e a obtenção dos melhores resultados de cada vez que o paciente contacta com o SNS…”3. As dimensões de qualidade em cuidados de saúde da OMS incluem a efetividade e eficiência, a acessibilidade, a aceitação e focalização no doente, a equidade e a segurança.

3. Quem elabora NOCs em Portugal?

Analogamente ao exemplo de outros países, em Portugal existem diversas entidades e organizações que, em graus diversos, elaboram, disseminam e implementam NOCs (tabela 31).

Tabela 31 – Algumas organizações que elaboram NOCs em Portugal

Médicos especialistas hospitalares

Enfermeiros/farmacêuticos

Médicos de cuidados primários

Sociedades profissionais médicas/farmacêuticas

Escolas médicas

Indústria farmacêutica

Governo (Ministério da saúde)

Direcção Geral de Saúde (DGS)

Alto Comissariado da Saúde (ACS)

Missão para os Cuidados Primários (MCPS)

Como se pode facilmente verificar, a variedade de stakeholders inte-ressados nesses instrumentos de promoção e manutenção da qualidade

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clínica em Portugal determina a natureza dos tópicos a tratar, assim como das metodologias de elaboração e a respectiva implementação.

Umas NOCs têm abrangência nacional – as que são produzidas por organizações de topo da saúde (DGS, ACS, etc.) – enquanto outras têm aplicação em contextos mais regionais ou locais. A natureza da obrigatoriedade de seguimento das recomendações é também variável, sendo a maior parte apenas de caráter consultivo, mas existindo algu-mas obrigatórias (nomeadamente as da DGS nas medidas preventivas, vacinação, etc.).

4. Que tópicos são selecionados?

As áreas gerais abrangidas pelas NOCs em Portugal são, em pri-meiro lugar, a terapêutica, depois o diagnóstico e finalmente a gestão. Neste ponto, o cenário é semelhante ao que se verifica noutros países, em que a terapêutica é de longe a área mais contemplada3. Este fato deve-se logicamente à importância desta área clínica, assim como à existência de um enorme número de ensaios clínicos que, quando comparados com os estudos diagnósticos, prognósticos, de etiologia, etc., apresentam uma qualidade metodológica francamente superior. Ou seja: a evidência científica sobre tratamento é maior e melhor, per-mitindo deste modo a construção de melhores documentos.

Em termos dos tópicos/temas selecionados, eles são muito variados e refletem naturalmente as características clinicamente mais relevan-tes. Como é sabido, um tema é considerado relevante quando4:

• Incide sobre um problema clinicamente significativo, que afeta um número considerável de indivíduos com morbidade e/ou mortalidade significativas;

• Os serviços que mobiliza são consumidores de recursos de gran-des dimensões (custo elevado/volume pequeno, custo elevado/volume elevado ou custo pequeno/volume elevado);

• Observam-se diferenças consideráveis na prática médica (a cha-mada variabilidade da prática clínica);

• Verifica-se sobreposição significativa entre áreas de intervenção profissional ou de serviços, duplicando a oferta específica;

• É possível estabelecer um consenso acerca da prática mais adequada.

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Uma pesquisa rápida sobre as NOCs produzidas nos últimos anos no SNS revela que os temas obedecem de fato aos critérios apresentados (tabela 32).

Tabela 32 – Temas mais frequentes nas NOCs no SNS português

Cuidados Primários Cuidados Hospitalares

Hipertensão Antibioticoterapia

Asma Uso de medicações antitrombóticas

Diabetes mellitus Infarto agudo do miocárdio

Osteoartrite Acidente vascular cerebral

Depressão Infecção pelo HIV

Doença péptica Uso de medicamentos biológicos

5. O papel de produção de NOCs por um centro universitário: o exemplo da “Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica” do Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência da Faculdade de Medicina de Lisboa

O número e o tipo de instituições com capacidades de elaboração de uma NOC são, como já foi dito, potencialmente muito elevado. Esta realidade deve-se ao fato de estes instrumentos poderem servir de base a sistemas de normalização de procedimentos, racionalização de recur-sos e organização de atos que são de fato universalmente comuns a muitas estruturas da saúde. Deste modo, é de esperar que um serviço hospitalar procure uniformizar através de uma NOC por exemplo, a abordagem das terapêuticas antitrombóticas nos seus doentes cirúrgi-cos ou que uma Direcção Geral da Saúde emita um documento sobre o diagnóstico e terapêutica da gripe A em nível nacional, com especifi-cações sobre as medidas de prevenção do contágio.

Os grupos acadêmicos das escolas médicas têm sido, ao correr dos anos, uma das fontes mais importantes na elaboração de NOCs. Com efeito, essas instituições universitárias constituem um contexto natu-ral para essa atividade técnico-científica, já que possuem os recursos humanos e científicos para poderem levar a bom termo a publicação desse tipo de documentos.

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O Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (Cembe) da Faculdade de Medicina de Lisboa (FML) tem-se vindo a destacar - quer nacional quer internacionalmente – pela publicação regular de NOCs abrangendo diversos temas (adesão terapêutica em patologias crônicas, manual de NOCs, insulinoterapia na diabete mellitus tipo 2, manual de prescrição racional - para só citar algumas).

Figura 4 – Equipe do CEMBE da FML

Como exemplo do que um centro universitário médico pode fazer em termos de elaboração de uma NOC, e a importância da metodologia no produto final, descreve-se em seguida a “Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica”, da autoria do Cembe (Inês Reis, Philip Fortuna, Raquel Ascensão, António Bugalho, João Costa e António Vaz Carneiro) e publicada em 2007 (a publicação original em pdf pode ser descarregada no site www.cembe.org na seção links).

5.1. Seleção do tema

A patologia a que se refere a NOC é a dependência de tabaco, inde-pendentemente da forma de utilização (cigarros, charutos, cigarrilhas, cachimbo, mascado, etc.). A razão da seleção da dependência de tabaco como tema desta NOC pode encontrar-se no fato de o tabagismo ser um fator de risco maior para doença cardiovascular, pulmonar, oncoló-gica, obstétrica, etc. É sabido que pelo menos um terço de todo o peso

Antônio Vaz Carneiro, MD, PhD, FACP (Diretor)Margarida Borges, MD (Subdiretora)João Costa, MD, PhD (Subdiretora)

ADMINISTRATIVASCristina MataSofia Mata

ÁREA MÉDICAH. Luz Rodrigues, MD, PhD

Isabel Soares, MDLucindo Ornomonde, MD

Ricardo Luz, MDRui Portugal, MDLuís Pinheiro, MD

ÁREA DAS NOCsInês Reis, MD

Philip Fortuna, MDRaquel Ascensão, MDAntônio Bugalho, MD

Miguel Julião, MD

ÁREA DE EDUCAÇÃO MÉDICAMadalena Patrício, MEdSc

ÁREA DE INVESTIGAÇÃOSérgio Paulo, MD

Domingos Vaz, MDFilipa Fareleira, MDLaura Santos, MD

Ricardo Vizinho, MDSusana Fernandes, MD

Andreia Roque, MDJoão Santos, MD

ÁREA ENFERMAGEMCândida Ferrito, RN, MEdSc

Equipe do CEMBE da FML

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da doença nos países industrializados da América do Norte, Europa e Ásia seja provocado pelo tabaco (5 milhões de mortes prematuras por ano), álcool, hipertensão arterial (7 milhões), aumento do colesterol (4 milhões) e obesidade. São atualmente consumidos mais de 15 bilhões de cigarros por dia e calcula-se que um terço da população mundial adulta possua hábitos tabágicos5.

O Relatório Europeu do Controle do Tabaco considera a prevalên-cia dos fumantes diários com idade superior ou igual a 15 anos em 28,6%, 40% no sexo masculino e 18,2% no sexo feminino. Nos indi-víduos com menos de 15 anos, a prevalência dos hábitos tabágicos (pelo menos um cigarro por semana) é estimada pela OMS, através do estudo Health Behaviour in School-aged Children (2001/2002)6, em 2% nas idades entre 11 e 13 anos, 8% aos 13 anos e 24% aos 15 anos. O tabagismo é o principal fator de risco para morte prematura na Europa, sendo responsável por cerca de 1,6 milhão de óbitos por ano. Estima-se que na região européia da OMS, o tabaco seja o segundo fator de risco mais importante, contribuindo, em 2000, para 12,3% do total de anos de vida perdidos por mortalidade prematura e anos vividos com incapacidade (QALYs), o que equivale a cerca de 18,6 milhões de anos de vida perdidos.

Em Portugal, os dados mais recentes provêm do 4º Inquérito Nacional de Saúde (INS) (realizado em 2005/2006), que estima a prevalência dos fumantes (diários, com idade superior a 10 anos) no continente em 19,6% (28,7% da população masculina e 11,2% da feminina). Em 2002, o tabaco foi também o segundo fator de risco mais importante, contribuindo para 10,4% dos QALYs7.

Pela carga e custo da doença ligada ao tabaco¹ a cessação tabágica deve constituir uma atividade clínica de primeira ordem no SNS por-tuguês, sendo esta NOC um instrumento de apoio aos profissionais que a ela se queiram dedicar e a dependência de tabaco - um tópico que apresenta as características de importância acima apresentadas.

5.2. Estrutura da NOC

A NOC da cessação tabágica, pela sua natureza e objetivos, possui uma estrutura própria, que está descrita na tabela 33.

1 Miguel Gouveia, Margarida Borges, Luís dos Santos Pinheiro, João Costa, Sérgio Paulo, António Vaz Carneiro. Smoking attributable mortality in Portugal. World Congress of Pulmonary Diseases, Seoul, September 2007.

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Tabela 33 – Estrutura da “Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica” do Cembe da FML

Secção Descrição

Título Identifica o título completo

Adaptação Esclarece se a NOC foi adaptada de outra e, no caso afirmativo, identificá-la

Responsáveis Identifica a organização responsável pela elaboração da NOC

Fontes de financiamento Indica as eventuais fontes de financiamento para elaboração da NOC e, no caso afirmativo, pormenoriza as condições contratualizadas

Comitês e grupo responsável Identifica formalmente os comitês e subcomitês dentro do grupo responsável e descreve a composição individual deste, incluindo graus profissionais, acadêmicos e afiliações existentes

Objetivos Descreve os objetivos gerais da NOC

Tópico/doença Identifica as áreas maiores de medicina clínica ou de cuidados de saúde sobre as quais incidirão as recomendações

Categoria Classifica a NOC em termos de tipo (ver atrás)

Utilizadores potenciais Identifica as categorias profissionais que poderão vir a utilizar a NOC (com ênfase no grupo-alvo)

População-alvo Descreve a população-alvo de doentes para os quais a NOC foi elaborada

Intervenções / Práticas Identifica as intervenções clínicas e as práticas específicas incluídas na NOC

Resultados (outcomes) Identifica os resultados (outcomes) mais importantes ou as medidas específicas da NOC

Métodos de seleção da evidência científica

Identifica com pormenor e classifica os métodos utilizados para selecionar a evidência científica que serviu de base à NOC

Fontes de evidência científica Descreve as fontes bibliográficas da evidência científica (bases de dados, CD-ROMs, WWW, etc.)

Metodologia de avaliação crítica da evidência científica

Descreve em pormenor os métodos utilizados para avaliar criticamente a evidência científica que serviu de base à NOC

Esquema de hierarquização da evidência científica

Descreve os esquemas de classificação da validade da evidência científica e a força das recomendações nela baseadas (se justificável)

Métodos de análise e validação da evidência científica

Descreve os métodos analíticos utilizados para os dados da evidência científica (RCTs, meta-análises, RS, estudos retrospectivos, etc.), incluindo a sua validação interna e externa

Apoiantes e subscritores Identifica as organizações que apoiam formalmente as NOCs e as suas recomendações depois de publicadas

Estratégia de implementação Descreve os planos práticos para a implementação da NOC: contextos, modalidades, avaliação

Recomendações principais Descreve as recomendações principais, resumidas das que estão incluídas no principal segmento do texto base

Algoritmo clínico Apresenta o algoritmo clínico que sintetiza as recomendações do texto

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A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Secção Descrição

Reservas qualitativas Descreve os problemas metodológicos identificados pelo grupo e identifica áreas de incerteza da evidência, assim como os passos que foram dados para a solucionar

Análise de custos Inclui análise econômica, se possível

Benefícios potenciais gerais e de sub-grupos

Identifica os benefícios antecipados da aplicação das recomendações em geral, assim como em subgrupos específicos (se se justificar)

Riscos potenciais e em sub-grupos Identifica os riscos antecipados da aplicação das recomendações em geral, assim como em subgrupos específicos (se se justificar)

Disponibilidade Descreve os meios em que a NOC será disponibilizada e a sua localização (material impresso, CD-ROM, Internet)

Documentação anexa Identifica os documentos extra classificados como importantes pelos responsáveis

Recursos de doentes Identifica os recursos referentes a doentes que serão necessários estar presentes para aplicação da NOC

Data de publicação Data em que foi disponibilizada publicamente

Revisões Datas em que estão previstas as revisões das recomendações

5.3. Objetivos da NOC

Os objetivos da NOC são os de disponibilizar recomendações basea-das na evidência científica sobre o tratamento do uso e dependência de tabaco. Trata-se, portanto, de uma NOC de efetividade terapêutica, que apresenta como alvo todos os consumidores ou indivíduos expostos ao tabaco, independentemente do sexo e idade.

5.4. Metodologia da NOC (seleção, avaliação, hierarquização da evidência)

Como documento científico baseado na evidência, esta NOC foi elabo-rada sob um conjunto de imposições metodológicas típicas da Medicina Baseada na Evidência (MBE), constituindo, por isso, não a opinião dos seus autores, mas sim o que a evidência publicada demonstra.

5.4.1. Metodologia de seleção da evidência científica

As fontes de evidência científica utilizadas na NOC incluíram arti-gos, revistas, livros e páginas na Internet de organizações específicas, sendo acima de tudo selecionados os principais ensaios clínicos ale-atorizados e controlados, meta-análises de ensaios clínicos, revisões sistemáticas e normas de orientação clínica.

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As bases de dados eletrônicas pesquisadas incluíram:

1. Medline (www.pubmed.com) (1966-3/2007)

2. Cochrane Central Register of Controlled Trials (in Cochrane Library issue 1, 2007)

3. Cochrane Database of Systematic Reviews (in Cochrane Library issue 1, 2007)

4. Database of Abstracts of Reviews of Effectiveness (in Cochrane Library issue 1, 2007)

A estratégia/filtro de pesquisa desenvolvida para as bases de dados mencionadas foi a seguinte:

#1. Smoking Cessation [MeSH]

#2. Tobacco Use Cessation [MeSH]

#3. Smoking/drug therapy [MeSH]

#4. Smoking/therapy [MeSH]

#5 OR/1-4

Aos resultados dessa busca foram aplicados filtros de pesquisa, de forma a identificar os ensaios clínicos aleatorizados, meta-análises de ensaios clínicos, revisões sistemáticas e normas de orientação clínica na população adulta (maior de 18 anos) e publicados em língua por-tuguesa, francesa ou inglesa. Foram obtidos os resumos dos estudos identificados pela estratégia de pesquisa, de forma a selecionar (por 2 pessoas) quais os estudos a serem incluídos na análise final, tendo igualmente sido pesquisadas as listagens de referências dos estudos identificados. Após decisão dos estudos a incluir, foram obtidas as publicações completas desses estudos para análise.

A seleção da evidência científica foi feita adicionalmente em fontes secundárias de informação² , que se definem como aquelas que, tendo selecionado os artigos, ensaios e estudos nas bases de dados primá-rias (Medline, Embase, Cinahl, por exemplo), fazem sobre eles uma avaliação crítica baseada na sua estrutura metodológica, selecionando apenas aquelas que, pela sua validade, importância e relevância para a prática clínica, constituem a evidência considerada a mais válida. O critério base foi o das referidas fontes de evidência científica secundá-rias serem inequivocamente baseadas na evidência científica e estarem disponíveis sob a forma impressa (artigos de revistas, livros) e/ou ele-trônica (Internet).

2 ACP Journal Club, ACP Medicine, Agency for Health Care Research and Quality, Bandolier, Clinical Evidence, DynaMed, Evidence-Based Medicine, Evidence Based Practice, Guideline International Network, InfoPoems, PIER do ACP, Scottish Intercollegiate Guidelines Network e UpToDate.

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5.5. Avaliação crítica da evidência científica

A avaliação crítica da evidência científica – em termos da vali-dade, importância e aplicabilidade dos resultados – constitui um passo essencial para a elaboração de uma NOC baseada na evidência. Para o conseguir, houve que avaliar criticamente cada estudo individual, através de quadros constituídos por questões - guias - (primárias e secundárias) - a cujas respostas os estudos em análise tiveram que res-ponder detalhadamente, para que pudessem ser incluídos (ou não) na análise final e, consequentemente, servirem de base científica à NOC. Cada artigo foi então classificado através de um score, constituído pela soma de todos os scores atribuídos às guias individuais, normalizado para o número de questões aplicáveis ao estudo específico, sendo a classificação final a razão entre o score total e o máximo aplicável.

A tabela 34 é a grade para avaliação crítica de um artigo descre-vendo um ensaio clínico prospectivo, aleatorizado e controlado (sendo que as revisões sistemáticas e as outras NOCs foram avaliadas com outras tabelas aqui não reproduzidas).

Tabela 34 - Grade para avaliação crítica de um artigo descrevendo um ensaio clínico

Validade dos resultados S ? N N/a

1. A gama de doentes foi bem definida? 2 1 0 n/a

2. O diagnóstico da doença estava bem caracterizado? 2 1 0 n/a

3. Os critérios de inclusão e exclusão são lógicos e claros? 2 1 0 n/a

4. Os doentes foram aleatorizados? 2 1 0 n/a

5. A aleatorização foi ocultada? 2 1 0 n/a

6. Os doentes foram analisados nos grupos para os quais tinham sido aleatorizados inicialmente (intenção-de-tratar)?

2 1 0 n/a

7. O método de aleatorização foi explicado? 2 1 0 n/a

8. A dimensão da amostra foi estatisticamente calculada? 2 1 0 n/a

9. Os doentes nos grupos em comparação eram semelhantes em termos dos seus fatores de prognóstico conhecidos?

2 1 0 n/a

10. Com exceção do tratamento em estudo, todos os doentes foram tratados da mesma maneira?

2 1 0 n/a

11. Foi ocultado aos doentes o grupo a que pertenciam? 2 1 0 n/a

12. Foram ocultados aos investigadores os grupos em estudo? 2 1 0 n/a

13. Foram ocultados aos analisadores dos dados os grupos em estudo?

2 1 0 n/a

14. O seguimento (follow-up) final foi superior a 80%? 2 1 0 n/a

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Importância dos resultados S ? N N/a

15. A dimensão do efeito terapêutico (RRR, RRA, NNT) foi importante?

2 1 0 n/a

16. A estimativa do efeito é suficientemente precisa (IC)? 2 1 0 n/a

17. Esse efeito tem importância clínica? 2 1 0 n/a

Aplicabilidade dos resultados S ? N N/a

18. Os doentes do estudo são semelhantes aos da prática clínica do médico individual?

2 1 0 n/a

19. Foram considerados todos os resultados clínicos importantes?

2 1 0 n/a

20. Os benefícios do tratamento sobrepõem-se aos potenciais riscos e custos da sua implementação?

2 1 0 n/a

5.6. Hierarquização da evidência científica

Os critérios de classificação qualitativa da evidência científica baseiam-se num conjunto de princípios metodológicos que se propõem definir a evidência mais correta (do ponto de vista científico) e útil ao profissional de saúde, no sentido de maximizar os aspectos positivos e minimizar os negativos das interações clínicas com os doentes (no caso de NOCs clínicas).

Este desiderato consegue-se (por exemplo, no caso de um esquema de tratamento), através da convicção de que uma revisão sistematizada demonstrando homogeneidade dos resultados de ensaios clínicos (ran-domized controlled trials – RCTs) de alta qualidade - que possuem ale-atorização ocultada, dupla-ocultação na colheita e análise dos dados, follow-up exaustivo dos sujeitos de estudo e com análise de intenção-de-tratar - fornece a evidência com o menor grau de erros aleatórios ou sistemáticos (viéses) na determinação do efeito de uma intervenção terapêutica (e apenas nesta, já que, por exemplo, no diagnóstico os estudos são diferentes).

Ao tipo de evidência apresentado atribui-se o nível 1 e as recomen-dações nele baseadas designam-se por grau A. Quando a evidência existente é de menor qualidade - revisões sistematizadas com elevada heterogeneidade, RCTs individuais com qualidade metodológica variá-vel, estudos de coorte, casos-controle ou opinião de peritos (designada por graus 2, 3, 4 e 5) - a graduação das recomendações reflete esse fato, sendo estas classificadas decrescentemente em níveis B, C e D. Deste modo, o nível A é mais sólido que o nível B e o nível C, que o D.

O sistema de hierarquização da evidência científica utilizada nesta

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NOC baseou-se nas recomendações do Centre for Evidence-based Medicine, de Oxford, Reino Unido8. É, no entanto, importante referir que esse sistema é algo diferente do que tem vindo a ser desenvolvido em nível internacional, designado como Grade9-12.

Na NOC utilizou-se uma adaptação que gradua as recomendações como de boa (grau 1) ou de má (grau 2) qualidade, conforme o tipo da evidência científica que lhe serve de base, sendo esta evidência por sua vez classificada com graus de qualidade decrescente de A a D (uma recomendação classificada como de grau A é considerada ser baseada em evidência de alta qualidade, enquanto uma de grau D apenas pos-sui evidência de baixa qualidade). A tabela 35 descreve os níveis de evidência e graus de recomendação sobre estudos de terapêutica ou de medidas preventivas.

Tabela 35 - Níveis de evidência e graus de recomendação terapêutica ou preventiva

Grau de recomendação

Nível de evidência

Análise metodológica

A 1a RS* (com homogeneidade† interna) de EACs§

1b EACs individuais (com IC# curtos)

1c todos ou nenhuns

B 2a RS* (com homogeneidade† interna) de estudos de coorte

2b estudos de coorte individuais (incluindo EACs§ de baixa qualidade, por ex. <80% de follow-up)

2c Investigação sobre resultados (“outcomes research”) §§ e estudos ecológicos

3a RS* (com homogeneidade† interna) de estudos caso-controle

3b estudos caso-controle individuais

C 4 Estudos de séries de casos (e também estudos coorte e caso-controle de baixa qualidade**)

D 5 Opinião de peritos sem explicitação prévia da metodologia de avaliação crítica da evidência, ou baseada em investigação básica (extrapolações), ou em “princípios primários” ††

NOTAS REFERENTES AO QUADRO

#IC: intervalos de confiança

§EAC: ensaio(s) aleatorizado(s) e controlado(s) (RCT: randomized controled trials)

§§a Investigação sobre Resultados (“outcomes research”) consiste nos estudos de coorte de doentes com idêntico diagnóstico (AVC, EAM, etc.) que relacionam os seus resultados clínicos (clinical outcomes), sejam eles a mortalidade, morbidade, eventos, etc., com os cuidados médicos recebidos (aspirina, cirurgia, reabilitação); este tipo de investigação não utiliza EACs pelo que se torna impossível a atribuição de efetividade a uma determinada manobra terapêutica. A vantagem dessa abordagem é que nos permite reconhecer se os outcomes esperados correspondem aos encontrados na clínica diária.

†Homogeneidade: baixo grau de heterogeneidade na direção e magnitude dos resultados dos estudos individuais nela incluídos

††por Princípios Primários entendem-se os conceitos fisiopatológicos que presidem a prática médica (controle da tensão arterial em doentes com dissecção da aorta, por exemplo); como é óbvio, estes princípios, se não testados em estudos rigorosos, podem conduzir por vezes a práticas erradas

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*RS: revisões sistematizadas. Uma RS é uma revisão bibliográfica e científica sobre um determinado tema, executada de tal maneira que os vieses se encontram reduzidos ao máximo. A característica fundamental de uma revisão sistematizada é a explicitação clara e não ambígua dos critérios utili-zados para a seleção, avaliação crítica e inclusão da evidência científica naquela. Desse modo, uma revisão sistematizada apresenta objetivos formais e precisos e os critérios de inclusão (e exclusão) dos estudos são explicitados detalhadamente. A revisão sistematizada não apresenta, habitualmente, nenhuma representação gráfica determinada.

quando todos os doentes faleciam antes do tratamento estar disponível, mas alguns agora sobrevivem com ele; ou quando alguns doentes faleciam antes do tratamento estar disponível, mas nenhum agora morre quando o faz.

**os estudos de coorte de baixa qualidade são os que não definiram claramente os grupos em comparação; e/ou não mediram as exposições e resultados (outcomes) de maneira objetiva (de preferência em ocultação) em ambos os grupos (expostos e não-expostos); e/ou não identificaram ou controlaram apropriadamente os fatores de confusão (confounders); e/ou não levaram a cabo um seguimento (follow-up) suficientemente longo e completo. Os estudos casos-controle de baixa qualidade são aqueles que não definiram claramente os grupos em comparação; e/ou não mediram as exposições e resultados (outcomes) de maneira objetiva (de preferência em ocultação) em ambos os grupos (casos e controles); e/ou não identificaram ou controlaram apropriadamente os fatores de confusão (confounders).

5.6.1 Base de evidência para construção da NOC

Para a análise final foram considerados – baseada nos critérios pre-viamente descritos - 88 estudos (todos revisões sistemáticas), Destas, após análise detalhada por pelo menos 2 autores, foram excluídas 34 (por diversas razões metodológicas), restando 54, que constituíram a base evidenciária da NOC. Destes 54 estudos, 13 incidiram sobre inter-venções farmacológicas, 11 sobre intervenções não-farmacológicas, 17 em populações especiais e 13 incidiram sobre tópicos especiais.

Todos os estudos foram resumidos e tabulados, tendo sido explicitadas as razões individuais para a sua inclusão ou exclusão (tabelas 36 e 37).

Tabela 36 – Exemplo de um estudo incluído

Etter JF, Stapleton JA. Nicotine replacement therapy for long-term smoking cessation: a meta-analysis. Tobacco Control 2006; 15(4):280-285.

Meta-análise, reunindo 12 EACs, que averiguou o efeito de um curso único de terapêutica de substituição com nicotina na cessação tabágica, ao fim de 2 a 8 anos. O OR a favor da terapêutica de substituição com nicotina, face ao controlo, foi de 1,99 (IC 95% 1,50 a 2,64). Não existiu evidência de que o efeito varie de acordo com o tempo do follow-up (mínimo 2 e máximo 8 anos) ou com a duração da terapêutica. A taxa de reincidência global após 12 meses foi 30,0% (IC 95% 23,5% a 37,5%) o que representa uma sobrestimativa do benefício e do custo/eficácia da terapêutica de substituição da nicotina quando se avaliam apenas as taxas de abandono aos 6 e 12 meses. A maioria da reincidência do consumo de tabaco, após os primeiros 12 meses de cessação, ocorreu durante o primeiro ou segundo ano, não sendo detectável posteriormente.

Tabela 37 – Exemplo de um estudo excluído

Rosen CS. Is the sequencing of change processes by stage consistent across health problems? A meta-analysis. Health psychology: official journal of the Division of Health Psychology, American Psychological Association 2000; 19(6):593-604

Esta revisão refere-se unicamente à análise do método de intervenção por etapas per si.

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5.6.2. Recomendações principais da NOC (alguns exemplos)

É naturalmente impossível apresentar neste texto as recomendações detalhadas da NOC, quer pela sua extensão, quer pela sua complexi-dade. Iremos apenas resumir alguns dados das orientações práticas recomendadas, disponibilizando um algoritmo de decisão simplificado. As recomendações práticas dividiram-se em quatro grandes grupos, com várias subdivisões e estão representadas na tabela 38.

Tabela 38 – Recomendações práticas para a cessação tabágica

FARMACOLÓGICAS

Substituição nicotínicaAntidepressivosAgonistas parciais dos receptores nicotínicosAnsiolíticosOutros

NÃO-FARMACOLÓGICAS

Terapêuticas complementares

acupunturahipnose

Intervenções comportamentais

autoajudaterapia de grupoapoio telefônicoaconselhamento individualintervenção comportamental por etapasprevenção das recaídas

Terapêuticas de aversão

POPULAÇÕES ESPECIAIS

Doentes cardiovascularesGrávidasPatologia psiquiátricaAdolescentesIdososFumantes hospitalizadosDoentes pré-cirurgiaDoentes com DPOCGrupos raciais e étnicos

TÓPICOS ESPECIAIS

Intervenções comunitáriasIntervenções no local de trabalhoDeterminação do risco biomédicoApoio do parceiroExercício físicoEnsino dos profissionais de saúdeTabagismo passivoAumento de peso após cessação tabágicaOutros produtos do tabaco

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Figura 5 – Algoritmo clínico para cessação tabágica

As recomendações em si foram descritas e desenvolvidas no texto, de modo sintético (para facilitar a aquisição dos conhecimentos), sendo exemplos os seguintes:

5.6.2.1. Exemplo de intervenções farmacológicas

• A terapêutica de substituição nicotínica (TSN) deve ser acon-selhada aos usuários que desejem deixar de fumar. (Grau de recomendação: A)

População Geral

Doente apresenta-se num contexto decuidados de saúde

Aconselhar a deixarde fumar

Pretende cessar o hábito?

Ex-Fumante?

Sim

Não Sim

NãoSim

Motivar (5Rs)

Proporcionar auxílio na

evitação tabágica

Avaliar grau de dependência (escala de Fagerström)Aconselhamento > 10 minutos a todos os fumantesFornecer materiais de autoajuda personalizadosFarmacoterapia de acordo com características individuais do fumanteOferecer intervenções intensivas (se possível)

Programarfollow-up

Algoritmo clínico

Fumante Ativo

Prevenção de recaídas

Reforço deabstinência

Não

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o Podem ser disponibilizadas quaisquer formas comerciali-zadas de nicotina, uma vez que são todas igualmente efi-cazes na cessação tabágica. (Grau de recomendação: A)

o A escolha do tipo de TSN deve ter em conta as necessidades do paciente, tolerância e custo. (Grau de recomendação: D)

o Em fumantes altamente dependentes (score de Fagerström ≥7) devem ser administradas pastilhas com a dosagem de 4 mg em detrimento das de 2 mg. (Grau de recomendação: A)

o Na população feminina é mais importante associar à TSN um apoio não farmacológico intensivo. (Grau de recomendação: B)

o A combinação de adesivos transdérmicos com uma forma autoadministrada de TSN pode ser recomendada em do-entes incapazes de abandonar o tabaco usando um único tipo de farmacoterapia. (Grau de recomendação: B)

• A bupropiona é um fármaco eficaz e deve ser aconselhado aos usu-ários que desejem deixar de fumar. (Grau de recomendação: A)

• A nortriptilina é um fármaco eficaz e deve ser aconselhado aos usuários que desejem deixar de fumar. (Grau de recomendação: A)

• A vareniclina é um fármaco eficaz e deve ser aconselhado aos usu-ários que desejem deixar de fumar. (Grau de recomendação: A)

• A terapêutica de substituição nicotínica, bupropiona, vareni-clina e nortriptilina devem ser todos considerados fármacos de eleição, a utilizar isoladamente (Grau de recomendação: A), tendo em conta, na escolha do fármaco, as necessidades do paciente, tolerância e custo. (Grau de recomendação: D)

• A clonidina é um fármaco de menor eficácia que os anteriores, podendo ser prescrito como segunda linha, aos usuários que desejem deixar de fumar. (Grau de recomendação: A). Os seus efeitos adversos importantes limitam a aplicabilidade clínica.

5.6.2.2. Exemplo de intervenções não-farmacológicas

• Devem ser disponibilizados materiais de autoajuda aos fuman-tes que não recebam outro tipo de intervenções para cessação tabágica. Aos fumantes que procuram ajuda é mais benéfico oferecer aconselhamento breve ou materiais de auto-ajuda individualizados. (Grau de recomendação: A)

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• Ao fumante motivado a abandonar o tabagismo, deve ser ofe-recida a possibilidade de frequentar grupos de terapia. (Grau de recomendação: A)

• Deve-se oferecer aconselhamento telefônico pró-ativo para ajudar os fumantes interessados em abandonar o tabagismo, havendo uma relação dose/resposta. O telefonema de resposta com aconselhamento aumenta a utilidade das linhas telefônicas de apoio. (Grau de recomendação: A)

• Deve-se oferecer aconselhamento individual fornecido por pro-fissionais treinados em cessação tabágica fora do âmbito da prática clínica habitual e com duração superior a 10 minutos. (Grau de recomendação: A)

• O exercício físico pode ser recomendado nos indivíduos com maior intolerância aos sintomas de abstinência e ao craving. (Grau de recomendação: D)

6. Que tipo de disseminação de NOCs em Portugal?

Como é sabida, a disseminação corresponde à comunicação da informação obtida aos diversos profissionais de saúde, aos administra-dores e gestores, assim como aos doentes, de maneira a contribuir para uma melhoria de conhecimento e capacidades práticas. Implica um ato específico e dinâmico, destinando-se a uma população-alvo bem selecionada, sendo superior ao da simples difusão da informação.

A distribuição da NOC deve, se possível, ser realizada gratuitamente. As técnicas de disseminação de NOCs em Portugal seguem os padrões recomendados:

1. Impressão em papel

2. Versão eletrônica (formato pdf)

3. Disponibilização online nos sítios (websites) das organizações

4. Ações de formação individual ou de grupos (cursos, workshops)

5. Publicação dos resultados em revistas científicas

6. Publicação em meios de comunicação social médica.

Por exemplo, a NOC da cessação tabágica incluiu todos os processos acima descritos, tendo atingido – por inquéritos realizados – mais de 50% dos profissionais de saúde envolvidos na cessação tabágica no SNS português.

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A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

7. Que tipo de implementação de NOCs em Portugal?

A implementação de NOCs consiste num conjunto de procedimentos específicos, que são utilizados com o objetivo de aumentar a adesão dos profissionais de saúde e (eventualmente) dos doentes às recomendações veiculadas. A implementação está intimamente ligada à disseminação, estando descritas na tabela 39 as respectivas complementaridades1.

Tabela 39 - Relações entre disseminação e implementação de NOCs

Disseminação Implementação

Aumentar a atenção para a investigação Aumentar a adoção dos dados da investigação

Facilitar a preparação para a mudança Facilitar a mudança prática

Ajudar a considerar as alternativas práticas Reforçar e apoiar a mudança na prática

É reconhecido que a implementação de NOCs deve ser conceituali-zada, tendo em mente três pontos estratégicos:

• O profissional de saúde e a população a que se destina a NOC;

• O sistema de saúde vigente, que incorpora as recomendações veiculadas;

• Os sistemas político e administrativo que preconizam medidas que reforçam o impacto da NOC.

Existem algumas variáveis ligadas à eficácia das diversas metodolo-gias de implementação utilizadas, como as especificidades das próprias NOCs (fatores relacionados com o tópico, natureza ou desenvolvimento das normas), as características do grupo de utilizadores (fatores ligados à sua natureza e cultura; a existência de inércia nos profissionais de saúde; utilidade das recomendações entendida como duvidosa pelo utilizador), a capacidade ambiental e organizacional para facilitar a mudança da prática (estruturas e agentes responsáveis), as infraes-truturas facilitadoras da implementação (complexidade e flexibilidade de base; acesso variável à NOC por parte dos potenciais utilizadores), o ambiente externo (restrições práticas, escassez de recursos, etc.) e, finalmente, as estratégias formais de implementação.

Essas estratégias de implementação são muito variadas no SNS português, sendo utilizadas, isoladamente ou em diversos graus de complementaridade, as seguintes:

1. Iniciativas com contato pessoal direto entre profissionais de saúde e a equipe que concebeu a NOC, ou outros agentes credí-veis que dominam os seus conteúdos;

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A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

2. Sistemas de memorandos, alertando e corrigindo gestos e atitu-des (nota num processo clínico ou um alerta informático numa ficha eletrônica, entre outros);

3. Encontros/sessões educacionais interativas com material didá-tico e apelativo, em que grupos pequenos desenvolvem sessões dinâmicas (aprendizagem por resolução de problemas, simula-ção de situações, discussão ativa...);

4. Auditorias e feedback;

5. Envolvimento dos líderes de opinião;

6. Influência e educação dos doentes;

7. Campanhas em meios de comunicação públicos (mass media).

O grau de obrigatoriedade de adesão às recomendações das NOCs varia em função dos temas e das instituições responsáveis pela sua implementação; por exemplo e como já foi dito, as NOCs de vacinação e de cuidados materno-infantis emanadas da Direcção Geral da Saúde são de seguimento obrigatório pelos médicos de cuidados primários, enquanto as NOCs do tratamento da hipertensão arterial elaboradas pela Sociedade Portuguesa de Cardiologia são de aplicação voluntária, servindo acima de tudo de instrumento de apoio à decisão clínica.

Com a recente reforma dos Cuidados Primários em Portugal, em que a organização dos médicos de família em Unidades de Saúde Familiar compostas por vários médicos, outros profissionais de saúde e admi-nistrativos, com um financiamento próprio dependente do atingimento de determinados objetivos e uniformização de procedimentos clínicos, criou um novo ímpeto para a utilização de NOCs nesse contexto, para servir de base a auditorias clínicas e reformulação de serviços e ativi-dades. Pensamos que essa nova realidade irá trazer para o centro do SNS a necessidade da criação de organismos dedicados à elaboração desses instrumentos de qualidade em saúde.

8. Conclusões

Neste capítulo procurou-se descrever, de forma sumária, a estrutura do Sistema Nacional de Saúde português e o papel atual e futuro que as Normas de Orientação Clínica podem desempenhar no seu seio.

Demos como exemplo paradigmático de um organismo elaborador des-ses instrumentos o Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (Cembe) da Faculdade de Medicina de Lisboa (FML), servindo-nos do exemplo da “Norma de Orientação Clínica para Cessação Tabágica” publicada em 2007.

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A implementação de diretrizes clínicas na atenção à saúde: experiências internacionais e o caso da saúde suplementar no Brasil

Acreditamos que as NOCs serão progressivamente mais importantes nos sistemas de saúde modernos, sendo disso já exemplos o Brasil e Portugal, com os seus programas estruturados de qualidade em saúde, em que as NOCs são prioritárias.

9. Referências

1. ROQUE, A.; BUGALHO, A.; CARNEIRO, A. V. Manual de elabora-ção, disseminação e implementação de normas de orientação clínica. Lisboa: FML, 2007.

2. USER’S Guides to the Medical Literature. 2nd ed. New York: McGraw-Hill; 2008.

3. DAVIS, D.; GOLDMAN, J.; PALDA, V. A. Handbook on clinical prac-tice guidelines. Ottawa: CMA, 2007.

4. REIS, I.; FORTUNA, P.; ASCENSÃO, R.; BUGALHO, A.; COSTA, J.; CARNEIRO, A. V. Norma de orientação clínica para a cessação tabá-gica. Lisboa: CEMBE da FML, 2008.

5. MACKAY, J.; ERIKSEN, M. Tobacco Atlas. Geneva: WHO, 2002.

6. CURRIE, Candace (Ed.). Young people’s health in context: Health Behaviour in School-aged Children (HBSC) study: international report from the 2001/2002 survey. Geneva: WHO, 2002. Disponível em: <http://www.euro.who.int/eprise/main/who/informationsources/publications/catalogue/20040518_1>. Acesso em: 18 de junho de 2009.

7. THE EUROPEAN tobacco control report 2007. Geneva: WHO, 2007. Disponível em: <http://www.euro.who.int/InformationSources/Publications/Catalogue/20070226_1>. Acesso em: 20 de maio 2007.

8. GUYATT, G. H. et al. Grading strength of recommendations and quality of evidence in clinical guidelines. Chest, n. 129, p. 174-181, 2006.

9. GUYATT, G. H. et al. GRADE: an emerging consensus on rating quality of evidence and strength of recommendations. BMJ, n. 336, p. 924-926, 2008.

10. GUYATT, G. H. et al. What is “quality of evidence” and why is it important to clinicians? BMJ, n. 336, p. 995-998, 2008.

11. GUYATT, G. H. et al. Going from evidence to recommendations. BMJ, n. 336, p. 1049-1051, 2008.

12. Schunemann H, Oxman AD, Brozek J et al. Grading quality of evidence and strength of recommendations for diagnostic tests and strategies. BMJ, n. 336, p. 1106-1110, 2008.

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