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A fraternidade do fole: uma história do esforço de guerra britânico no Brasil na Segunda Guerra Mundial (1940-1945) Joselia de Castro Silva 1 Resumo: O presente texto aborda a criação da Fraternidade do Fole, uma organização não governamental de caráter transnacional, constituída no decurso da Segunda Guerra Mundial. A mesma tinha como objetivo a arrecadação de fundos financeiros para auxílio ao esforço de guerra dos britânicos, especificamente para a compra de aviões. A organização surgiu na Argentina em outubro de 1940, chegando ao Brasil no mês seguinte. A partir de 1942, as arrecadações passaram a ser divididas igualmente entre a Royal Air Force e a Força Aérea Brasileira. A base fundamental desta pesquisa foi a documentação existente no National Archives UK, no Royal Air Force Museum e periódicos brasileiros entre os anos 1942 e 1945. A origem da organização En origen de la gran idea Era una noche del mes de Setiembre de 1940, y tres jóvenes britânicos, en la vecina capital de Buenos Aires reunidos para tomar un aperitivo, discutian como se podria poner fin a las incursiones diurnas como se podria poner fin a las incursiones diurnas y nocturnas del arma aérea de un enemigo inescrupuloso que se descargaba su bombas mortiferas sobre ciudades densamente pobladas, cone el único fin de aterrorizar a las mujeres y niños britânicos, especialmente a los de Londres. Y es el domínio de todos la resistencia heroica y estoica de esas poblaciones, y el fracaso rotundo de la Luftwaffe de ganhar la Batalla de Gran Bretaña de ese modo. Pero en aquellos 1 Doutoranda CPDOC/FGV. O texto aqui apresentado constitui uma parte da tese de doutorado intitulada “A Fraternidade do fole: uma história social e transnacional do esforço de guerra britânico no Brasil (1940-1945), em desenvolvimento e orientada pelo Prof. Dr. Alexandre Moreli.

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Page 1: A fraternidade do fole: uma história do esforço de guerra ... · que soma 6.000 libras. 21 O comitê da comunidade britânica do Rio Grande do Sul compreendia o Rio Grande, Pelotas,

A fraternidade do fole: uma história do esforço de guerra britânico no Brasil na

Segunda Guerra Mundial (1940-1945)

Joselia de Castro Silva1

Resumo: O presente texto aborda a criação da Fraternidade do Fole, uma organização não

governamental de caráter transnacional, constituída no decurso da Segunda Guerra

Mundial. A mesma tinha como objetivo a arrecadação de fundos financeiros para auxílio

ao esforço de guerra dos britânicos, especificamente para a compra de aviões. A

organização surgiu na Argentina em outubro de 1940, chegando ao Brasil no mês

seguinte. A partir de 1942, as arrecadações passaram a ser divididas igualmente entre a

Royal Air Force e a Força Aérea Brasileira. A base fundamental desta pesquisa foi a

documentação existente no National Archives UK, no Royal Air Force Museum e

periódicos brasileiros entre os anos 1942 e 1945.

A origem da organização

En origen de la gran idea

Era una noche del mes de Setiembre de 1940, y tres jóvenes

britânicos, en la vecina capital de Buenos Aires reunidos para

tomar un aperitivo, discutian como se podria poner fin a las

incursiones diurnas como se podria poner fin a las incursiones

diurnas y nocturnas del arma aérea de un enemigo inescrupuloso

que se descargaba su bombas mortiferas sobre ciudades

densamente pobladas, cone el único fin de aterrorizar a las

mujeres y niños britânicos, especialmente a los de Londres.

Y es el domínio de todos la resistencia heroica y estoica de esas

poblaciones, y el fracaso rotundo de la Luftwaffe de ganhar la

Batalla de Gran Bretaña de ese modo. Pero en aquellos

1 Doutoranda CPDOC/FGV. O texto aqui apresentado constitui uma parte da tese de doutorado intitulada

“A Fraternidade do fole: uma história social e transnacional do esforço de guerra britânico no Brasil

(1940-1945), em desenvolvimento e orientada pelo Prof. Dr. Alexandre Moreli.

Page 2: A fraternidade do fole: uma história do esforço de guerra ... · que soma 6.000 libras. 21 O comitê da comunidade britânica do Rio Grande do Sul compreendia o Rio Grande, Pelotas,

momentos de dura prueba, estoso jóvenes se perguntaban: ¿

Como se podrían contener estos ataques ? y llegaban a la única

y únanime solucion que era preciso crear MAS FUERZA AEREA,

- pero ¿como? ... ¡Con un fuelle! fué la contestación de uno, con

la flema característica de su Pueblo, pues es la forma más

sencilla y más a mano para crear fuerza de aire (en inglês AIR

FORCE)2

Assim nascia a Fraternidade do Fole, uma organização não governamental de

caráter transnacional, criada com o objetivo de auxiliar os britânicos na luta contra a

aviação alemã nos céus da Europa durante a Segunda Guerra Mundial, através da

arrecadação de fundos financeiros que seriam doados para a Royal Air Force pois muitos

aviões britânicos estavam sendo derrubados. A organização adotou como símbolo um

fole, que, de acordo com seus organizadores, assopraria os céus auxiliando na derrubada

dos aviões inimigos.3 Na Argentina, sua inauguração ocorreu em 14 de outubro de 1940

na cidade de Buenos Aires e a ideia logo se espalhou por diversos outros países da região,

alcançando primordialmente membros da comunidades britânicas existentes na América

Latina.

Outra versão para o surgimento da Fraternidade na Argentina é a de que a mesma

se originou quando foi realizada a primeira reunião geral extraordinária no Clube Inglês

argentino. Outra versão aponta para sete membros originais da organização argentina que

estariam no anonimato e um deles, servindo como piloto oficial da RAF. 4 Enfatiza-se

ainda o caráter voluntário da organização – a Argentina, assim como todos os países do

Continente Americano, havia adotado a postura de neutralidade no conflito – e o valor

arrecadado por cada avião derrubado, que seria o equivalente a 5 pesos (aproximadamente

6 shillings). As contribuições eram efetuadas por argentinos e cidadãos das nações aliadas

que residiam na Argentina e pagas diretamente às sedes de foles em Buenos Aires ou

através de um dos duzentos e cinquenta agentes do fole, ou “bolsas de ar” espalhados por

2. RAFM, Fellowship of the Bellows. El origen de la Gran Idea. X001 – 3521/0001 – 025. 3 Idem, p.1 4 Cf. AIR 27.1158. The Fellowhip of the Bellows. p.4

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toda a República da Patagônia até a fronteira boliviana. 5 Em 1943 a organização contava

com aproximadamente 50.000 membros. 6

Born at the time England so terribly short of Air Force and the

Battle of Britain was raging the fellowship of the bellows blew

itself into existence with the sole object of collecting funds to be

remitted to the Minister of Aircraft production for the purpose of

purchasing aircfat. The slogan adapted by6 the found Committee

was, of course, “More Air Force” – and thus it was that a humble

pair of Bellows became the emblem of this airy idea.7

As contribuições eram determinadas a partir do número de aviões alemães

abatidos pelos britânicos durante a guerra e para cada avião derrubado, o membro da

organização efetuaria uma doação correspondente. Mensalmente o quantitativo de aviões

abatidos seria anunciado e, assim, o contribuinte calcularia o valor que repassaria à

fraternidade.

Havia ainda uma hierarquia dentro da Fraternidade do Fole e conforme o valor das

doações, o associado “subiria” degraus dentro da organização até alcançar o grau da

Ordem do Fole, o grau mais alto da organização, que também se desmembrava em três,

A iniciativa nascida na Argentina logo se espalhou para outras regiões da

América do Sul. No Uruguai, foi inaugurada uma fraternidade idêntica em 12 de

dezembro de 1940 8 e contava com diversos voluntários que faziam o atendimento aos

colaboradores, diminuindo os custos para a manutenção da organização. Cada sócio

recebia um pequeno livreto, que contava a história da fraternidade e onde eram anotadas

suas contribuições. No mesmo, constavam informações básicas dos participantes tais

como seu nome, domicílio e seu número de sócio.9 Circulares e insígnias também eram

5 Idem. 6 Ibidem. 7 Cf. RAFM – Fellowship Archives. The Air-Nonymous society of The Fellowship of the Bellows.

Founded 14 th October 1940 (Still blowing strong) 8 Idem, p.2 9 Idem, p. 11.

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disponibilizadas aos participantes e a organização contava com o apoio espontâneo da

imprensa e do rádio para a divulgação da causa.

Havia ainda um conjunto de hábitos que logo se tornavam comuns a todos os

participantes da organização e que consistiam em ter um bom gênio, saber soprar o fole,

usar a insígnia do fole na lapela de seus trajes, querer ser sempre o primeiro a obter a nova

insígnia, saber o significado da letra V, que significava vitória e era uma das formas que

os membros da fraternidade utilizavam para se cumprimentar, recordar as palavras da

Rainha Vitória de que não lhes interessava a possibilidade de derrotas porque elas não

existiam, saber rir quando as notícias não fossem aparentemente favoráveis, saber fazer a

saudação da fraternidade, recordar seu número de sócio, que constava na caderneta

recebida quando da entrada na fraternidade, e trazer mais amigos para o grupo de forma

a criar mais força aérea. 10

A circulação da ideia de auxílio ao esforço britânico ocorreu em grande parte da

América do Sul envolvendo vários países da região tais como Bolívia, Chile, Colômbia,

México, Brasil, Peru, Uruguai, Venezuela, Guatemala, Equador, Paraguai, Curaçau e

Aruba11 e os países envolvidos adotavam os mesmos critérios para a colaboração, gerando

a formação de fraternidades em diferentes países, o que não significa que havia

comunicação entre as mesmas.12 Em julho de 1942, 20 aviões de combate foram

incorporados à RAF sob o nome de Fellowship of the Bellows.13

É importante destacarmos que a criação da Fraternidade do Fole originou-se do

Sptifire Fund, fundo financeiro criado à época da Batalha da Inglaterra com o objetivo de

auxiliar os britânicos na aquisição de aviões para lutarem contra as forças alemãs. Após

o fim da guerra, iniciou-se uma competição para estabelecer quem foi o autor da proposta

para a criação desse fundo e quem ficaria com os créditos por essa criação, principalmente

pelo fato de que a iniciativa se espalhou não só pelas colônias britânicas como para

10 Cf. El origen de la Gran Idea. X001 – 3521/0001 – 025. Op Cit, p. 12. 11 Cf. NAUK, AIR 2.5480. ROYAL AIR FORCE. CS 17184, Fellowxhip of the Bellows Brazil, Gift of

Aircraft. Secret Cypher Q. T. P. Telegram. To: Air Ministral Whitehall, From Buenos Aires. 21 july 1943.

“The standard” Buenos Aires. July, 3 rd 1943. Sinclair greets the Bellows. 12 Até o momento não encontrei informações sobre comunicação entre os membros de Fraternidades dos

países da América Latina. 13 Idem.

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diversas partes do mundo. Não havia dúvida de que a primeira contribuição foi recebida

pelo periódico Jamaica Gleaner14 e que indivíduos do país colaboraram com os britânicos

mesmo sendo os jamaicanos muito pobres.15 Existem dois nomes por trás da criação da

ideia original, Reggie Matcham e Alexander Gordon. De acordo com uma carta enviada

ao segundo secretário do Ministério da Produção Aeronáutica,16 Reggie Matcham sugeriu

a ideia para a criação do fundo e Alexander Gordon foi o doador primeiro cheque enviado

para o jornal alguns meses depois.

Fraternidade do Fole na América do Sul

As arrecadações de fundos na América do Sul estavam se estruturando de forma

organizada. Na Colômbia formou-se um comitê Central que estava sob a liderança de

Paske Smith, até aquele momento Ministro britânico de Bogotá, arrecadando recursos

para a Cruz Vermelha e outros fins bélicos. Este comitê opera em Barranquila, Bogotá,

Cali, Cucuta, Maizeles, Mariquite, Medelin, Santa Maria e no Centro. As remessas eram

feitas em cheques com valores em dólares estadunidenses, canadenses e esterlinos. As

remessas geralmente eram feitas através de escritórios estrangeiros, mas algumas vezes,

direto para as próprias organizações, incluindo a Cruz Vermelha. Também haviam

remessas para a M.A.P. (Ministry Production Aircrafts)17 de 8.000 libras incluindo 5.400

da Fraternidade do Fole.18

Na Venezuela, os colonos britânicos de Caracas têm enviado presentes em poucas

quantidades através do Bank of London e South America. Também 4.800 libras recebidas

pelo Ministério da Produção Aeronáutica. Os funcionários britânicos da Caribean

14 Cf. NAUK, AVIA 15.2486. Ministry of Aircraft Production. Mr. G. Calder, PAS (L) . through PS6.

Recognition of work by organizer of Spitifire Fund. 15 Idem. 16 Second Secretary. 12.7.45. NAUK, AVIA 15.2486. 17 Ministério da Produção Aeronáutica. 18 Cf. NAUK, T 160.1125. Financial Assistance to U.K. by British Communities Abroad. 12582 086

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Petrolium Co. fizeram contribuições para o erário público e remessas também foram feitas

através da Parent Co. e da Anglo – Saxon Petroleum Co. London.19

No Brasil, tivemos em São Paulo a criação do Fundo Patriótico formado pelo

Conselho da Comunidade Britânica. Esperava-se coletar 12.000 libras no primeiro ano.

Os fundos estavam sendo usados tanto quanto possível para salvar as remessas para

dentro. Alguns pagamentos aqui também foram feitos ao Ministério da Economia de

Guerra, etc.. M.A.P. (Ministry Aircraft Production) recebeu 1.200 libras.20

No Rio de Janeiro, a comunidade britânica organizada sob o Consulado Geral H.

M.. enviou remessas para compra de aeronaves e consideráveis valores eram utilizados

para reparos em navios e pagar voluntários e eram feitas através do Royal Bank of

Canadá. O Ministério da Produção Aeronáutica recebeu remessas cariocas com montante

que soma 6.000 libras. 21

O comitê da comunidade britânica do Rio Grande do Sul compreendia o Rio

Grande, Pelotas, Bagé, Rosário e Livramento. As contribuições coletadas eram baseadas

nas porcentagens dos salários e remessas em dólares eram feitas através do Bank of

London and South America em cheques de dólares e contas. 22

Também existiu o fundo da comunidade britânica de Santos e remessas também

eram feitas através do Bank of London & South America em cheques de dólares e

depósitos em contas.

No Uruguai, a comunidade patriótica de britânicos de Montevideo abriu um

Fundo da Vitória antes de junho de 1940, contando com contribuições voluntárias de

membros da comunidade britânica do país. As remessas foram realizadas por um tempo

devido as dificuldades de câmbio. A primeira remessa de 7.000 libras recebida em

setembro de 1940 foi enviada para o Ministério da Produção Aeronáutica. Outros

19 Idem. 20 Ibidem. 21 Ibidem. 22 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. F. 12582/054/2. 10th october, 1941.

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montantes totalizando 10.767 libras, enviados igualmente entre 10 de outubro de 1940 e

abril de 1941. Remessas, aparentemente em libras esterlinas, foram enviadas ao MAP.

A comunidade britânica da Argentina também organizou um fundo britânico

patriótico e as remessas eram feitas através do Tesouro para diversos fins e em dado

momento ultrapassaram 260.000 libras. Os valores eram depositados em pesos no Banco

da Argentina e transferidos para libras esterlinas através do Banco da Inglaterra.

No Chile, a comunidade britânica em Concepcion também formou um fundo

patriótico. O Consul H.M. (não sei quem é) disse que os presentes eram muito generosos

em vista das circunstâncias da comunidade. Os pagamentos eram feitos em cheques de

libras esterlinas e, também, no Ministério das Relações Exteriores e também um crédito

através do departamento de fundo no exterior. A comunidade de Valparaiso também

remeteu cheques em libras através do departamento de comércio exterior e o MAP

recebeu desse grupo a quantia de 6.500 libras. Na cidade de Antofagasta, situada ao norte

do Chile, o Comitê do Serviço Nacional Britânico doou 1.100 libras e 665 libras foram

enviadas ao MAP em julho de 1940. O Ministro britânico falou disto como um esplêndido

presente da pequena e declinada colônia britânica naquela cidade. Ainda no Chile, a

cidade de Santiago também efetuou doações, remetendo 300 libras para o MAP.

Da Bolívia, o MAP recebeu remessas no valor de 5.500 libras esterlinas,

provenientes das cidades de Oruno e La Paz.

No Peru, o cônsul H. M. em Iquitos coletou 4.700 soles (moeda peruana), para a

compra de spitfires pelos membros da comunidade britânica e amigos de outras

nacionalidades. A quantidade foi, aparentemente, direcionada ao MAP. Também uma

remessa de 10.000 libras foi recebida pelo MAP proveniente de Lima.

Em 01 de agosto de 1940, a comunidade britânica de Salvador enviou 2.080 libras

para adquirir um avião de caça.

Em Cuba, uma comissão britânica de emergência esteve trabalhando desde

setembro de 1939 e lá existiu um mecanismo de contribuições mensais sobre uma base

de renda. O fundo pagava cerca de metade das despesas do bureau de informações

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britânico. 5.000 dólares foram recebidos pelo Tesouro cubano e o MAP recebeu 8.400

libras.

O Paraguai não registrou doações ao MAP e nem ao Tesouro britânico.23

Quito, no Equador, enviou remessa de 1.500 libras para o MAP.24

A Patagônia enviou ao MAP uma remessa de 1.000 libras.25

A Costa Rica enviou remessa de 1.788 libras para o MAP.26

O Panamá enviou uma remessa de 100 libras para o MAP.27

Os registros acima efetuados chamam atenção para os esforços organizados em

todos os países da América do Sul, com exceção do Paraguai, e algumas repúblicas da

América Central e antes do levantamento de fundos para aquisição de aviões, os recursos

arrecadados eram destinados ao reparo de navios e a aquisição de provisões para os

mesmos.

Uma outra ideia: Empréstimos livres de juros na comunidade britânica

Outra forma encontrada pela comunidade britânica na Argentina para arrecadar

fundos no país para auxiliar o Reino Unido na guerra foi a confecção de uma nota de

crédito, um tipo de empréstimo livre de juros e que seria disponibilizado para todos que

desejassem contribuir com o governo britânico, reembolsáveis três meses após o fim da

guerra e o estabelecimento de tratados de paz. O certificado seria pagável no Banco da

Inglaterra, em Londres ou no Bank of the London and South America Limited e seu valor

23 Idem. 24 Idem. 25 Idem. 26 Idem. 27 Idem.

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era de 10 libras esterlinas.28 O pagamento seria feito por meio de um cheque emitido à

ordem da pessoa indicada no certificado e seria enviado pelo correio para endereço do

beneficiário 29 e esse seria mais um reforço financeiro para o Reino Unido.

O Ministério das Relações Exteriores Britânico resolveu solicitar a todas as suas

embaixadas no estrangeiro que analisassem a possibilidade de implantação de

empréstimo sem juros como o proposto na Argentina, e articular a aplicação dos mesmos

nos respectivos países onde estivessem. Assim, a Embaixada britânica em Bagdá, em

resposta a Circular W 12244/271/4930 de 28 de outubro de 1941, informou que a

comunidade de descendentes britânicos lá existente não podia ser comparada em números

ou recursos aos argentinos e que já estava contribuindo suficientemente para instituições

de caridade de guerra britânicas, para o fundo sptifire local e para todo o conforto e apoio

às tropas britânicas estacionadas no Iraque e isso já seria suficiente para demonstrar o

apoio do país aos britânicos.

O embaixador britânico em Washington, R. I. Campbell respondeu a circular

anteriormente citada sugerindo que outras comunidades, e a estadunidense poderia ser

uma delas, também fizesse uma campanha semelhante à Argentina com empréstimos sem

juros reembolsáveis três meses após a conclusão dos tratados de paz e feitos em moeda

local.31

A embaixada britânica em Ancara, Turquia, também respondeu ao despacho

anteriormente citado informando que todos os esforços estavam sendo feitos no sentido

de organizar um fundo patriótico naquela localidade. Alguns súditos britânicos estariam

segurando libras esterlinas para, possivelmente emprestar ao governo britânico, o que

necessitaria do aval do governo e o embaixador não tinha muita certeza se isso ocorreria.

28 Idem. 29 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/080. Foreign Office, October 28, 1941, enviada para

Anthony Edden. 30 A mesma circular foi enviada para todas as embaixadas pois todas as respostas das embaixadas

mencionadas na documentação analisada fazem menção à mesma. 31 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Foreign Office, British Embassy, Washington

D.C. , 07 th, january, 1942.

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Ele termina sua circular afirmando que a organização de um fundo patriótico não seria

possível no país.32

Em San José, na Costa Rica, o embaixador britânico informa que não visualiza

quaisquer possibilidades de oferta de empréstimo sem juros devido a “smalness and

relative poverty of the local British community”33. Apesar disso, a comunidade da Costa

Rica organizou um sistema de contribuições semanais e mensais que operou

continuamente e com sucesso. Remessas periódicas foram feitas a organizações tais como

a Cruz Vermelha e o Fundo St. John, que recebeu 1935 libras e para a Santa Casa de

Dunsta’s para cegos, que recebeu 37.10 libras.34 Cerca de um ano antes (1940), a

comunidade britânica criou o Fundo Winston Churchill e patrocinou uma noite de evento

social onde arrecadou cerca de 7.000 dólares.35 A Companhia United Fruits & Pacific

Coast também colaborou com a realização de festas sociais, doações para instituições de

caridade e donativos em espécie tais como sucatas de ferro e 200 sacas de café.36 O

embaixador britânico no país, G. Lyall, destaca ainda que presentes oriundos de trabalhos

patrióticos eram mais adequados à realidade do país do que empréstimos aos moldes dos

que ocorriam na Argentina. 37

Em Madri, na Espanha, o embaixador britânico Arthur Ferdinand Yencken

informou que a possibilidade de criação de um fundo patriótico britânico no país

esbarrava no fato de haver muitos prisioneiros de guerra britânicos em solo espanhol e a

necessidade de fornecer suprimentos para seu conforto durante tanto tempo de detenção

em campo espanhol. Yencken destacou ainda que a organização britânica de caridade de

guerra lida de forma muito eficiente com os vários problemas de fornecimento de

suprimentos para as necessidades desses prisioneiros na Espanha e recebeu o apoio

generoso e constante da comunidade britânica tanto em Madri quanto em outras

32 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Foreign Office, British Embassy, Angara,

December, 19th, 1941. 33 “Pequenez e pobreza da comunidade britânica local”. 34 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Nº 109. Foreign Office, British Legation, San

José, Costa Rica, December, 26th, 1941. 35 Idem 36 Ibidem. 37 Ibidem.

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províncias. Além disso, destacou que foram feitas valiosas contribuições para o Fundo

Sptifire e alguns empréstimos e presentes foram recebidos. 38 A proposta seria

apresentada mas Yencken duvidava da possibilidade de implementação da mesma no

país.39

No Chile, a embaixada respondeu a circular informando que a principal

dificuldade de adaptar a proposta argentina ao país era porque, diferente da Argentina,

onde não havia dificuldades no controle de câmbio, no Chile até aquele momento, era

impossível obter permissão da comissão de controle de câmbio para remessas ao Reino

Unido para empréstimos de guerra. O embaixador informou que seu conselheiro

comercial recebeu algumas subscrições ocasionais de súditos britânicos, mas nenhuma

publicidade foi dada sobre isso e nem foi organizada uma campanha em grande escala. 40

Uma alternativa seria aceitar pesos da comunidade britânica no Chile para a manutenção

dos serviços da embaixada e em troca emitir declarações semelhantes aos certificados

argentinos, usando-os como referência. Tecnicamente, isso seria uma violação dos

regulamentos de controle cambial e acabou não se concretizando. 41

A embaixada britânica em Montevideo, no Uruguai, respondeu a circular sobre a

proposta argentina de empréstimos afirmando que era consenso entre eles que devido ao

tamanho reduzido e a falta de riqueza da comunidade britânica naquele país, a resposta a

ser dada era de que a implantação desse esquema poderia levar a uma diminuição no ritmo

razoavelmente satisfatório de contribuições para fundos de guerra operantes no país. O

embaixador britânico Ralph Skrine Stevenson recomendou então que nenhuma tentativa

de dar início ao esquema fosse feita naquele país.42

Na Guatemala, o embaixador britânico, após ponderar por vários meses,

considerou que as condições locais não eram adequadas a proposta de estabelecimento de

38 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Nº 117. British Embassy, Madrid, April 10,

1942. 39 Idem. 40 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Nº 16. British Embassy, Santiago, January,

20th, 1942. 41 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. British Embassy, Santiago, January, 20th, 1942. 42 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Nº 25. British Legation, Montevideo, 20th March,

1942.

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empréstimos tais como o argentino e que o país continuaria efetuando contribuições

adequadas as suas condições. 43

No Nepal, conforme relato do embaixador britânico no país, Geoffrey Betham, a

comunidade britânica era muito pequena consistindo dele, sua esposa e alguns

funcionários, que doavam aproximadamente 10% de seus salários. Alguns deles

encaminham suas doações ao governo da Índia, para que fossem repassadas aos

britânicos, outros preferiam doar diretamente ao Reino Unido. Segundo o embaixador,

não existiam outros meios de levantar dinheiro no Nepal além de uma aproximação com

o Marajá e essa abordagem gerou resultados positivos tais como doações para a Cruz

Vermelha indiana, britânica e chinesas, para o fundo de fins bélicos do vice-rei, fundos

de apoio aos órfãos de soldados do exército indiano mortos durante a guerra e aquisição

de armamentos leves. 44

Um panorama geral da possibilidade de empréstimos sem juros na América

Central e do Sul revelou dificuldades para a efetivação dessa proposta devido,

principalmente, ao fato de que em vários dos países da região a comunidade britânica era

pequena ou pobre ou os mesmos já estavam colaborando com outras campanhas, o que

inviabilizava sua inclusão em novas propostas de auxílio. No caso do Brasil, aponta-se

que o fato de o reembolso ocorrer em libras esterlinas acabou sendo um empecilho para

a concessão dos empréstimos. 45

Destaca-se que diante dos limitados recursos financeiros que os países da América

do Sul e Central possuíam e do tamanho reduzido da comunidade britânica na região, a

possibilidade de criação de um esquema de arrecadação próprio em cada país seria mais

adequado do que a aplicação de um, como o da Argentina, para toda a região. 46

43 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Nº 8. Departamental nº 1. From Guatemala to

Foreign Office. 29th April 1942. 44 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Circular F12582/086. Despatch nº 15 (271/W/1). The British Legation,

Nepal, 30th April, 1942. 45 Idem. 46 Cf. NAUK, T 160.1125. Op. Cit. Bank of England. 11th May 1942 e To Foreign Office , 6642/411/49,

19th May, 1942

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O governo britânico buscava meios de estimular cada vez mais as doações pois

além de auxiliar financeiramente a RAF, elas consolidavam laços diplomáticos com os

países envolvidos na campanha. Uma das estratégias utilizadas era o envio de

informações sobre as ações dos esquadrões formados com os recursos oriundos das

doações como forma de mostrar como o dinheiro estava sendo empregado.47 Exemplo

disso foi a transmissão, via rádio, de uma entrevista com o piloto do Spitfire Fole Brasil

nº1. 48 Esse tipo de transmissão, do batismo de aviões adquiridos com recursos da

Fraternidade brasileira, era uma estratégia utilizada para ganhar cada vez mais a simpatia

dos doadores e aumentar sua colaboração para a causa. 49 Sempre que uma nova aeronave

era incorporada ao Esquadrão de foles brasileiros, seu batismo era irradiado para a

América do Sul e anunciado nos jornais para que todos pudessem acompanhar.

Outro exemplo foi a proposta de envio, para Buenos Aires e Rio de Janeiro, de

duas porções de asas de uma aeronave alemã destruída para que a mesma fosse utilizada

como estímulo para o aumento das arrecadações. As duas peças tinham aproximadamente

3,6 x 3,6 polegadas e permaneceram por algum tempo aguardando instruções para o envio

às capitais. 50 As peças foram despachadas para Buenos Aires e, posteriormente, foi feita

uma solicitação para que as mesmas também pudessem vir para o Rio de Janeiro.

A Fraternidade do Fole desembarca no Brasil

A Fraternidade do Fole chegou ao Brasil a partir de uma visita de Tom Sloper à

Argentina onde conheceu a iniciativa51, um mês após sua criação naquele país. Sloper era

47 NAUK – AIR 2.5480 - Fellowship of the bellows in Brazil. Gift of Aircraft. From H. M. Attaché, Britsh

Embassy, Rio de Janeiro To Assistent Chief of Air Staff. (Inteligence) Air Ministry, London, Subject

Fellowship of the Bellows. 48 “FRATERNIDADE DO FOLE” – Irradiação da entrevista do piloto do nosso “Spitifire” Fole Brasil nº1”.

Correio da Manhã, 06 de janeiro de 1943 e RADIO, Várias. Correio da Manhã, 08 de janeiro de 1943. 49 “FRATERNIDADE do Fole. Aviso a todos os felobelistas”. Correio da Manhã, 10 de abril de 1943. 50 Cf. NAUK, AIR 2.5480. ROYAL AIR FORCE. CS 17184. 5 th July, 1943. Fellowship of the Bellows

in Brazil and Argentina. Não temos certeza se as peças foram realmente embarcadas. Informação ainda a

ser conferida. 51 Cf. Aviões para a RAF e para a FAB. Correio da Manhã, 05 set 1942.

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um proeminente comerciante carioca, dono das Casas Sloper, famosa loja de

departamentos no Rio de Janeiro. Descendente de britânicos, TomSloper se identificou

com a proposta e, assim que retornou ao país, iniciou campanha semelhante.

Devido ao momento político da época, - o Brasil adotara a política de neutralidade

na Segunda Guerra, - o começo da organização foi um pouco difícil, mas ainda assim, o

esquema foi desenvolvido entre membros da comunidade britânica brasileira e seus

amigos, que incluía muitos proeminentes cidadãos. 52 Sloper uniu-se a Lionel Cole e

Thomas Impey, ambos membros da diretoria da Companhia Telefônica Brasileira (CTB)

e juntos, começaram a divulgar a campanha e angariar cada vez mais adeptos no país. I

Em janeiro de 1942, o Brasil rompeu relações diplomáticas com a Alemanha e a

Itália e a situação da organização também começou a mudar. Em abril daquele mesmo

ano, a Fraternidade do Fole requeria seu status de sociedade civil, obtido com a aprovação

do governo brasileiro e em abril de 1942 foi publicado no Diário Oficial da União os

Estatutos de formação da Fraternidade do Fole, conforme informação abaixo.

Sociedade Civil fundada em 20 de abril de 1942, com sede e foro nesta

cidade do Rio de Janeiro, por tempo indeterminado de duração e

número de sócios não limitado. Tem por fim angariar fundos para

aquisição de aviões destinados à defesa da Grã-Bretanha, sendo a

receita constituída pelas contribuições expontâneas (sic) das pessoas

que se inscreverem na Sociedade. A Sociedade tem um Conselho de

Administração permanente, constituído de dez membros, dentre os

quais é escolhida a Diretoria, composta no mínimo de três e no máximo

de seis diretores, funcionando os restantes membros do Conselho como

fiscais. A assinatura de dois diretores obriga a sociedade para todos os

efeitos, não respondendo os associados subsidiariamente pelas

obrigações contraídas pela mesma. Os estatutos não poderão ser

reformados antes de cinco anos, salvo para atender exigências legais

ou motivo de absoluta força maior. Em caso de dissolução, o

patrimônio social será doado a um instituto brasileiro de caridade, a

critério da diretoria. A diretoria atual consta dos estatutos.

Rio de Janeiro, 22 de abril de 1942. – T. E. R. Impey. – T. W. Sloper

Junior. – Lionel Robert Crosbie Cole.

52 Cf. AIR 271158. London, 6th February, 1943. Relatório sobre as atividades da Fraterinidade do Fole

Brasil.

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(N. 6697 – 24-4-42 – 28$6).53

Ao registrar seu Estatuto, a organização tornava-se oficial e atraía ainda mais

participantes para sua causa. Até então, operava sem esse status e isso deveu-se a

recomendações do Consul Geral britânico, pois devido a política de neutralidade

brasileira, era recomendável que não houvesse publicidade na imprensa ou através da

BBC de Londres, que transmitia informações para o Brasil dos trabalhos efetuados pelo

que ele denominou de conselhos comunitários. As informações deveriam seguir para o

escritório de assuntos estrangeiros. 54

Para tornar-se sócio, o futuro contribuinte deveria comparecer à sede da

organização, na Travessa do Ouvidor, e adquirir uma caderneta da sociedade, que custava

5$000 (cinco mil réis).55 Na mesma constavam informações sobre o associado tais como

seu nome e endereço e nela todos os valores doados eram devidamente registrados.

As contribuições para a Fraternidade ocorriam em nosso país da mesma forma

que em todos os outros: para cada avião derrubado, o membro da fraternidade efetuava

uma doação. Mensalmente, jornais de grande circulação56 noticiavam o número de aviões

abatidos, também chamados de SCORE (placar) e informavam acerca dos valores que

deveriam ser doados e a data limite para o recolhimento das doações. Os contribuintes se

dirigiam à instituição e efetuavam seus pagamentos, consolidando suas doações para

aquele período. Inicialmente, a proposta era ter apenas súditos britânicos entre os

doadores, mas as dimensões adquiridas pela campanha e o desejo de angariar mais

recursos fez com que a mesma fosse disponibilizada para adesão por qualquer cidadão

que desejasse contribuir. 57 A mudança de categoria na Fraternidade do Fole acontece da

53 Cf. FRATERNIDADE DO FOLE. EXTRATO DOS ESTATUTOS. Diário Oficial (Seção) Sábado 25

Abril de 1942. 54 Cf. NAUK T 160.1125 – Financial Assistance to U.K by British Comunities Abroud. 55 Cf. Soprando, os felobelistas trabalham pela democracia. Diretrizes, 15 out 1942, p.11 56 Como exemplo podemos citar o Correio da Manhã, Diário de Notícias, Diário de Notícias, Folha de

São Paulo, Voz do Povo, O Globo, 57 Cf. A Aviação. Heróis que falam de si mesmos. Correio da Manhã, 11 de abril de 1943.

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seguinte maneira: após o indivíduo entrar na organização e um determinado quantitativo

de aviões fossem derrubados e o mesmo tiver contribuído com o valor pertinente a esse

quantitativo de aeronaves, ele alcançaria um determinado posto na organização. 58

A primeira doação era de 5.000 cruzeiros e correspondia a filiação dos

contribuintes à organização e ao preço da caderneta. Ao comprar, o felobelistas tornava-

se um SOPRO, seguindo-se a ordem abaixo:

QUANTIDADE DE AVIÕES

ABATIDOS

GRAU NA ORGANIZAÇÃO

1000 SOPRO

2.500 VENDAVAL

5.000 FURACÃO

6.500 TORNADO

8.000 TUFÃO

10.000 ORDEM DO FOLE

Após chegar a ordem do fole, o contribuinte subia mais degraus até atingir o grau

ouro, material do qual seu pin, uma espécie de broche a ser colocado de forma visível em

sua vestimenta, era confeccionado. Ao alcançar determinado número de contribuições,

o membro da Fraternidade mudava de status e recebia um novo pin para colocar em sua

lapela, que o identificava entre seus pares. O pin usado por homens e mulheres era

diferente devido a forma como ele era preso na vestimenta, mas a mudança de status e o

recebimento de novos pins funcionava da mesma forma tanto para um grupo quanto para

outro.

As informações referentes aos valores doados e grau do contribuinte na

Fraternidade eram anotados na caderneta que o mesmo adquiria, bem como lhe era

entregue seu pin, que conforme citado anteriormente, deveria estar sempre visível e ser

motivo de orgulho para o participante e status na organização.

58 Idem, p.7

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A partir daquele momento e diante do bom desenvolvimento e aceitação da

organização, toda a campanha, que até então havia sido conduzida em inglês, passou a

ser feita em língua portuguesa. Ao invés de simples imitações dos folhetos argentinos, a

Fraternidade do Fole brasileira criou folhetos com linguagens próprias. Foi iniciada toda

uma propaganda direcionada para a sociedade brasileira e vários centros de operação

foram criados em diferentes cidades do Brasil.59

Em agosto de 1942, submarinos alemães e italianos torpedearam navios de

passageiros na costa brasileira, causando grande número de mortos e intensa comoção

nacional (SILVA, 2005). Em 25 de agosto de 1942, a diretoria da organização se reuniu

e decidiu alterar seus estatutos. Os recursos arrecadados passariam a ser divididos em

partes iguais entre a RAF e a Força Aérea Brasileira. Ao final daquele mês, o Brasil

declarou estado de guerra em território nacional.60

A decisão de dividir as contribuições entre a RAF e a FAB foi considerada um

bom método para promover ainda mais a campanha. Os pedidos de adesão aumentaram

para a casa das centenas ao dia, alcançando um público cada vez maior. Em fevereiro de

1943, a Fraternidade do Fole contava com aproximadamente 28.000 membros e a

Comunidade da Campanha do Fole, em São Paulo, tinha 11.500 membros, totalizando

aproximadamente 40.000 membros. 61

As remessas brasileiras para a RAF eram feitas mensalmente em forma de cheques

e algumas dessas entregas eram fotografadas e enviadas ao Brasil para que fossem

disponibilizadas à imprensa. Cem por cento do dinheiro arrecadado era aplicado no “Mais

Força Aérea” e também para pagamento de todas as despesas como livretos, emblemas,

pagamento de salários, etc.62 As prestações de contas da organização eram apresentadas

em forma de balancete e anualmente publicados no Diário Oficial da União. Incluíam os

custos com a organização, confecção de emblemas, folhetos, de brindes para serem

59 Ibidem. 60 Cf. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 10 setembro 1942. 61 Cf. AIR 271158. London, 6th February, 1943. Op. Cit. 62 Idem.

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vendidos, gastos com propaganda, salários, aluguéis, material de consumo e despesas

mensais, e, também, havia a receita decorrente de juros bancários, o que lhes garantia

razoável soma de recursos.

Com a declaração de guerra do país ao Eixo, o entusiasmo dos brasileiros

aumentou significativamente e a organização se aproveitou disso. Os jornais foram

apontados como a melhor ferramenta de propaganda para a disseminação da proposta de

contribuições. A imprensa foi de grande ajuda assim como o Departamento de Imprensa

e Propaganda, junto com estações de rádio e imprensas locais. Essas atividades e as que

ocorriam de forma esporádica, no entanto, não foram consideradas suficientes para a

organização. Era necessário que todos os contribuintes sentissem o desejo de pagar sua

contribuição mensal porque eles, ao mesmo tempo formavam a base da organização e

eram a causa dela. Estas duas condições eram as premissas básicas de todo o esforço de

propaganda do esquema. 63

O número de sócios da organização no Brasil cresceu mensalmente e, após a

entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, o número de contribuintes aumentou ainda

mais. Isso pode ser explicado pelo elevado grau de comoção da sociedade brasileira diante

dos atentados ocorridos no país em agosto de 1942 e que estamparam as capas dos

principais jornais do país. Nota-se ainda que, aos membros da Fraternidade do Fole do

Rio de Janeiro somavam-se os de outros Estados enquanto os de São Paulo apresentam-

se separados. 64

As cadernetas

63 Cf. AIR 271158. London, 6th February, 1943. Relatório sobre as atividades da Fraterinidade do Fole

Brasil. Op. Cit. 64 Idem, p. 7

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Os valores doados eram anotados em uma caderneta de acordo com o mês, o placar e

a posição que o doador alcançava dentro da organização e a partir dessas informações,

sua colocação dentro da Fraternidade passava por avanços. Através da caderneta,

identificamos que a organização objetivava estimular o felobelista a manter suas doações

sempre, ainda que não pudesse, por questões financeiras, os valores pertinentes ao score

daquele período. Também reforçava que o contribuinte não deveria deixar de contribuir

mesmo que não fosse com os valores pertinentes ao score do referido mês.

Uma das cadernetas utilizadas nessa pesquisa estava inglês e trazia um conjunto de

dicas para futuros contribuintes, denominados Furacões. Inicialmente, era um

cumprimento pela entrada em um seleto grupo que estava sobre as nuvens e sua altitude

era de 5000 cents acima dos outros. Afirmava-se que holofotes estariam direcionados para

os participantes e um bom fellowship faria de tudo para alcançar a ordem do fole. O

contribuinte então deveria estar atento à pontuação (scores –número de aviões abatidos)

e continuar sua escalada. A ideia de que a contribuição de centavos era extremamente

importante tornou-se um argumento forte para os felobelistas, estando presentes na

caderneta de forma clara e precisa.

Também a astronomia e astrologia foram utilizadas como forma de inserir ainda

mais o contribuinte no universo da organização. No caso da astronomia, havia o estímulo

para que os contribuintes adquirissem um telescópio e observassem o céu, enxergando a

luz da lua, a aurora boreal e quaisquer outros corpos celestes. Igualmente importantes

eram os estudos de astrologia, uma ciência de saber o que estava no vento e que consistia

em ter nascido sob uma estrela da sorte. Devido à grande expansão dos céus, astrólogos

seriam geralmente homens do time do colégio e, as vezes, vulgarmente referidos como

neckromancers65.

Havia ainda referência aos signos do zodíaco, apontando as características de cada

um, suas possíveis profissões e sugestões de vida para os participantes, mas sem fazer

menção direta às doações. Acreditamos que essa era uma forma de tornar o processo de

participação na fraternidade mais “divertido”, atraindo também os mais jovens e

65 De necromancia, arte de adivinhação.

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reforçando o hábito da leitura. A caderneta apresentava-se em dois idiomas, com o

objetivo de alcançar os que dominassem o inglês e os que compreendiam o espanhol.

Utilizando uma linguagem simples, mas carregada de simbologias para que o

contribuinte se sentisse parte do grupo, os “agentes do fole” alertavam constantemente

para a necessidade de manutenção das contribuições, uma forma de não deixar que os

valores “despencassem para o abismo, engatando os foles ao furacão”.

Os felobelistas – denominação dada aos que participavam da organização - tinham

uma forma de saudação muito peculiar, utilizada sempre que os mesmos se encontravam

em quaisquer ocasiões. Giravam o dedo indicador da mão direita rapidamente para cima

numa série de parafusos dos Spitfires”, afim de evitar qualquer similaridade com os

cumprimentos fascistas e arranjado de modo que o braço não subisse muito alto. 66

As primeiras publicações sobre o número de aviões inimigos abatidos pelos

ingleses começaram a aparecer na imprensa brasileira em junho de 1942, seguindo-se mês

a mês de forma a divulgar os scores publicamente. Essas publicações eram uma forma de

dar visibilidade à organização e ao mesmo tempo, informar para os contribuintes a

quantidade de aviões derrubados e permitir que ele calculasse o valor de suas

contribuições. Ao se dirigir à sede da organização, o felobelista já sabia o valor que

deveria levar. Destacamos que até abril de 1943, a Fraternidade do Fole havia doado cerca

de 250 mil libras esterlinas somente para a RAF, o que demonstra o alcance da

organização entre os membros brasileiros.67

A primeira contribuição para a FAB ocorreu em 13 de outubro de 1942, em

cerimônia ocorrida na nova sede da organização, situada no Edifício da Associação dos

Empregados do Comércio. A mesma iniciou-se com o Brigadeiro Armando Trompovsky,

chefe do Estado Maior da Aeronáutica, sendo convidado à cortar as fitas com as cores da

bandeira nacional, seguindo-se um discurso de Edgar Beauclair, um dos organizadores da

Fraternidade do Fole, onde o mesmo reforçou os objetivos da organização e sua luta pela

66 Idem. 67 Ibidem.

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liberdade e paz. Logo após o Visconde Carlow, adido aeronáutico da Embaixada

Britânica no Rio de Janeiro, entregou ao brigadeiro Trompovsky um cheque no valor de

60.000 cruzeiros e o mesmo agradeceu. 68

A organização passou a atuar abertamente e dialogava com diversos atores estatais

e figuras importantes da sociedade brasileira. Foi ofertado à Darcy Vargas um broche

emblema da organização feito em platina e ouro e lhe entregue pela esposa do Ministro

da Aeronáutica, Salgado Filho69, agraciando-lhe com o título de sócia honorária da

organização, que passou a contar com três pessoas nessa condição: Franklin Delano

Roosevelt, Winston Churcill e Darcy. Na cerimônia de entrega, a mesma fez questão de

afirmar que, como todos os sócios da organização, contribuía todo mês com valor

correspondente ao número de aviões abatidos. 70

A homenagem concedida a Darcy é importante para dimensionarmos o papel

ocupado pela Fraternidade do Fole do Brasil diante das outras fraternidades e o caráter

“oficial” que a organização passa a ter afinal, Darcy Vargas era esposa de Getúlio e sua

presença como sócia honorária era o que podemos caracterizar como o mais alto grau

alcançado dentro da fraternidade e que não dependia de valores de contribuição. Na época

de sua condecoração, o jornal A Cruz relatou que o número de contribuintes da

organização aumentava na proporção de 100 novos associados por dia.

Assim, a organização passou a envolver importantes atores da sociedade civil

brasileira e não apenas descendentes de britânicos. Qualquer um que desejasse, poderia

contribuir. Ofertar um pin especial para Darcy era o mesmo que falar com todas as

mulheres do país e usar a primeira dama como exemplo reforçava a ideia de que todos,

68 A Fraternidade do Fole coopera com a FAB. A entrega da sua primeira contribuição para a nossa

aviação. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 14 out 1942, pg 3. Disponível em

http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=089842_05&PagFis=13830 . Acesso em 03 fev 2016 69 Oferta do emblema da Fraternidade do Fole á sra. Darcy Vargas. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 08

dez 1942, p. 9. Disponível em

http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=089842_05&PagFis=14402. Acesso em 03 fev

2016. 70 Idem.

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sem distinção, deveriam se envolver na organização. O Brasil estava em guerra contra o

Eixo e as contribuições, a partir daquele momento, não eram apenas para auxiliar os

ingleses na luta mas, também, para fortalecer a luta dos brasileiros contra as agressões

ocorridas em águas nacionais contra navios de passageiros.

Para angariar novos membros, a organização utilizava propagandas em jornais e

revistas, enfatizando a importância da luta pela liberdade e o significado da contribuição

de cada indivíduo para a causa, o que aumentava consideravelmente o número de pessoas

envolvidas na campanha. Em reportagem de jornal O Globo Esportivo, vemos um convite

para a participação de voluntários na “Campanha do Goal”. A mesma funcionava dentro

do sistema da Fraternidade do fole e os que aderissem contribuiriam com cinco cruzeiros

para cada gol efetuado pelos jogadores durante a partida e o total obtido seria distribuído

entre os jogadores que participaram da partida. O uso da campanha como referência

demonstra o alcance da mesma na sociedade do Rio de Janeiro.

A Fraternidade do Fole do Rio de Janeiro não foi a única existente em nosso país,

conforme já citado anteriormente. A Comunidade do Fole de São Paulo também cresceu

e colaborou intensamente, conforme percebemos ao analisar a documentação britânica.

No entanto, nos balancetes oficiais apresentados nos DOUs, diversos Estados não citados

nos documentos britânicos aparecem como contribuintes também como contribuintes.

Doações foram efetuadas pelos Estados de Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais,

Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, sendo o total das

arrecadações distribuído entre a RAF e a FAB, o que aponta para uma interligação entre

os Estados e a Fraternidade do Rio de Janeiro. A de São Paulo recebeu o nome de

Comunidade do Fole e as pesquisas desenvolvidas até o presente momento apontam para

o fato de que as doações eram recolhidas dentro do próprio Estado e doadas para uma

comunidade central, que então efetuava o repasse para o comandante da 4ª Zona Aérea

de São Paulo, para que as doações fossem repassadas para a RAF e para a FAB. Em abril

de 1943, o então comandante da 4ª Zona Aérea, brigadeiro do ar Gervasio Duncan,

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recebeu da Comunidade do Fole paulista um cheque no valor de cento e vinte mil

cruzeiros, que foram doados para a FAB.71

Em reportagem do Diário de Notícias, datada de 11 de agosto de 1944, afirma-se

que a Fraternidade de São Paulo entregou ao ministro da Aeronáutica, Salgado Filho, sua

décima contribuição para a FAB, cento e sessenta mil cruzeiros, que somadas às

contribuições anteriores, perfez um total de um milhão, quatrocentos e setenta mil

cruzeiros. Uma outra quantia igual foi doada pela Fraternidade de São Paulo para a RAF.

O referido cheque foi entregue pelo Presidente da Fraternidade de São Paulo, R. M. Pryor,

constando ainda na reportagem os nomes de Odilon de Souza, C. O. Frank e T. W. S.

Inight, apontados como diretores do Fole de São Paulo.72 Em outra reportagem, sem data,

identificamos nova doação da Fraternidade de São Paulo à RAF e a FAB.

A Fraternidade de São Paulo apresentava diretores distintos da do Rio de Janeiro.

Junte-se à isso o fato de que essa fraternidade não consta dos balancetes dos Diários

Oficiais identificados nessa pesquisa ao lado de outros estados que colaboraram com o

esforço de guerra dos britânicos. Acreditamos que isso possa estar relacionado a um certo

grau de independência que o Estado de São Paulo procurava ter em relação ao governo

federal, montando uma estrutura de doações própria73 o que pode estar relacionado ao

contexto político da época e as divergências existentes entre o Estado de São Paulo e o

Governo Federal. Apesar disso, a parcela de arrecadação destinada à FAB foi entregue

diretamente nas mãos do Ministro da Aeronáutica, Salgado Filho, e do Brigadeiro

Trompovsky.

71 Cf. “Cr$ 120.000,00 do “Fole” paulista para a FAB. Diário da Noite, 02 abr 1943. 72 Cf. “MAIS cento e sessenta mil cruzeiros do Fole para a F.A.B – São Paulo”. Diário da Noite, 11 ago

1944. Na referida reportagem, aparece uma foto dos membros da Fraternidade de São Paulo entregando o

cheque ao Ministro Salgado Filho. 73 Em todos os periódicos consultados para essa pesquisa nos quais apareciam os nomes das regiões

brasileiras que contribuíam para a causa, São Paulo não aparecia.

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Em julho de 1942 o coronel Llowellin, Ministro da Produção Aeronáutica

britânica, recebeu da Fraternidade do Fole do Rio de Janeiro um cheque no valor de 2.500

libras esterlinas e em resposta enviou um telegrama acusando o recebimento do valor e

agradecendo a todos os sócios pelo apoio à causa.74 Em resposta, Llowellin enviou um

telegrama informando:

Grato, acuso o recebimento de sua primeira remessa direta de 2.500

libras para a produção aeronáutica. Queiram transmitir os meus mais

calorosos agradecimentos a todos os seus sócios pela sua generosidade,

a qual exprime a confiança no poder da “Royal Air Force” e nos anima

na nossa tarefa de lhe fornecer os aviões de que necessita.75

Em 22 de agosto de 1942, o jornal Correio da Manhã comentou acerca do envio,

para o Ministro da Produção Aeronáutica, Coronel Llowellin, o segundo cheque oriundo

das arrecadações da Fraternidade do Fole. Em resposta, o ministro enviou um telegrama

de agradecimento pela remessa de 2.500 libras para a organização, felicitando todos os

sócios pelo resultado da arrecadação. 76

Identificamos os primeiros pedidos de contribuições nos jornais para a RAF e a

FAB em agosto de 1942. A chamada afirmava o Brasil estava em guerra e que esse

acontecimento apressaria a vitória da causa de todos os homens livres a Fraternidade

havia alterado seus estatutos para contribuir com a RAF e a FAB. 77 No entanto não

podemos deixar de ressaltar, como colocado aqui em páginas anteriores, que o pedido

para alteração dos estatutos da Fraternidade é de abril de 1942 e não encontramos

explicações para o fato acima relatado.

Em dezembro de 1942, Stafford Cripps enviou à Fraternidade do Rio de Janeiro

um telegrama onde agradecia a contribuição de 2.500 libras ofertada para a RAF. Segundo

74 UM CHEQUE de 2500 libras esterlinos da “Fraternidade do Fole”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro,

29 jul 1942, pg. 3. 75 A PRIMEIRA contribuição dos brasileiros para a RAF. Folha da Manhã, São Paulo, 29 jul 1942.

Disponível em http://acervo.folha.uol.com.br/fdm/1942/07/29/1/. Acesso em 03 fev 1942. 76 NOVA contribuição dos amigos da RAF, no Brasil. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 22 ago. 1942,

pg. 5. 77 UNIDOS pelo mesmo ideal. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29 ago 1942, pg. não identificada.

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ele, essa era uma bela homenagem e uma inspiração para a continuidade na derrubada de

aviões. 78

Em 05 de setembro de 1942, uma ampla reportagem no jornal Correio da Manhã

procurava explicar detalhadamente o que era a organização, seus objetivos e os critérios

para a ascensão dentro da Fraternidade. A reportagem destacou que cerca de dez cidadãos

brasileiros e ingleses, quase todos ocupando posições de destaque no comércio, eram os

responsáveis por organizar os trabalhos e encaminhar as arrecadações para seu destino e

que nenhum deles recebia algum tipo de remuneração. Destacou ainda que o escritório da

organização se mantinha com a taxa de 5$000 (cinco mil réis) paga pelo sócio no

momento da inscrição na Fraternidade do Fole. As outras contribuições eram todas

destinadas à causa da organização.79 A mesma reportagem destacou ainda que a

Fraternidade do Fole era uma nova organização oficialmente legalizada no Brasil.80

Os recursos doados pelos brasileiros para a RAF foram utilizados na aquisição de

aviões, que posteriormente foram incorporados ao Esquadrão 193. A aquisição dessas

aeronaves e seu batismo foram amplamente noticiadas pela imprensa, tornando-se motivo

de orgulho para os felobelistas de nosso país.

No final do mês de outubro de 1942, a imprensa brasileira noticiou a entrega dos

dois primeiros aviões adquiridos com os recursos arrecadados pela Fraternidade

brasileira. Eram duas aeronaves modelo Spitfire. A entrega dos aviões foi feita em uma

base da RAF nos arredores de Londres, estando presentes além do embaixador brasileiro

em Londres, vários oficiais superiores da RAF, todo o pessoal da embaixada e várias

autoridades britânicas. Ao chegar no local, o embaixador passou por uma guarda de honra

formada no local, a qual passou em revista, e, após, dirigiu-se para um grande hangar

78 STAFFORD Cripps agradece à Fraternidade do Fole do Rio. Folha da Manhã, São Paulo, 30 dez 1942.

Disponível em http://acervo.folha.uol.com.br/fdm/1942/12/31/1/. Acesso em 03 fev 2016. 79 Aviões para a FAB e para a RAF. A “Fraternidade do Fole”, uma campanha que se desenvolve na

proporção dos fracassos eixistas. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 05 set 1942, p. 3. Dispoível em

http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=089842_05&PagFis=13406. Acesso em 03 fev

2016. 80 Idem.

Page 26: A fraternidade do fole: uma história do esforço de guerra ... · que soma 6.000 libras. 21 O comitê da comunidade britânica do Rio Grande do Sul compreendia o Rio Grande, Pelotas,

onde os dois spitfires estavam postados para a cerimônia.81 Pilotos de caça de todo o

império britânico estavam no local, junto à vários outros oficiais superiores da RAF e

membros da delegação brasileira de imprensa que estavam no país 82. O embaixador,

falando em português declarou:

“Tenho novamente a honra de fazer entrega à RAF de dois aparelhos

construídos e adquiridos com o produto das subscrições feitas em meu

país. Este fato ainda uma vez causou agradável impressão na Inglaterra

e contribue para afirmar o nosso espírito de amizade e de colaboração

nesta campanha em que estamos empenhados contra o inimigo comum.

Estou certo de que esses aviões, da mesma forma que os precedentes,

inscrever-se-ão entre aqueles que honraram seus nomes heroicos (sic) e

gloriosos e no ardor das batalhas em curso, serão apontados como

símbolo da participação direta de nossa pátria, contribuindo

eficazmente para a vitória da causa que defendemos com todo

entusiasmo e que deve assegurar a liberdade do mundo. Esses

“Spitfires” representam mais um elo da verdadeira amizade e aliança

que une os nossos dois países nestes tempos duros. Que sejam

afortunados nos combates como seus predecessores e que seus pilotos

tenham sempre aterrisagens felizes. “83

Em resposta, o Comandante de Aeronáutica, Harccurt Smith, agradeceu ao

embaixador e aos doadores, pronunciando as seguintes palavras:

“Expresso o nosso grande apreço por estes presentes que representam

expressões da nossa antiga amizade e aliança. Estas unidades estão

agora nas mãos de uma famosa esquadrilha de caça, que possue uma

crônica magnífica e confio que hão de haver-se tão bem como os seus

predecessores nos combates que se nos anteparam. “84

A Fraternidade do Fole paulista doou dois aviões, o Bandeirantes e o Guarani. O

batismo acima citado é do Guarani. O bandeirante foi uma aeronave adquirida com

recursos oriundos da Comunidade do Fole de São Paulo.

81 Entregas á RAF de 2 “spitfires” oferecidos pelo Brasil. Correio Paulistano, São Paulo, 30 out 1942.

Disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=090972_09&PagFis=12797. Acesso

em 03 fev 2016. 82 Idem. 83 Ibidem. 84 ENTREGAS á RAF de 2 spitfires “oferecidos” pelo Brsil. Op. Cit.

Page 27: A fraternidade do fole: uma história do esforço de guerra ... · que soma 6.000 libras. 21 O comitê da comunidade britânica do Rio Grande do Sul compreendia o Rio Grande, Pelotas,

Acerca da Fraternidade, Alfredo Pessoa, chefe da delegação de jornalistas

brasileiros na Inglaterra, entregou à Churchill uma carta da organização e um exemplar

de seus estatutos. Churchill pediu detalhes sobre a instituição, que foram fornecidos tanto

por Pessoa quanto pelo embaixador Moniz Aragão.85 Os foles brasileiros começavam a

alçar novos voos.

As aeronaves doadas pela Fraternidade do Fole brasileira foram incorporadas ao

Esquadrão 193, cuja criação remonta aos anos finais da Primeira Guerra Mundial,

constituindo-se como um esquadrão de treinamento da RAF. Foi formado em Amriya, no

Egito, em 09 de agosto de 1917 e era equipado com os lentos, mas estáveis Airco DH¨,

aeronaves de treinamento e foi dissolvido um ano depois, em 22 de julho de 1919, sendo

oficialmente retomado em 18 de dezembro de 1942, em Harrowbeer, um campo de

aviação da RAF situado em Denvor, próximo a cidade de Yelvelton, na Inglaterra.

Em correspondência secreta enviada do Quartel General Grupo Nº 10 para o

Esquadrão 193, datada de 12 de outubro de 1943 e denominada “Presentation or

Aircfraft”, G. Rosullivan86 afirmou que recebeu informações do Headquartes, Fighter

Command, de que dois ramos da Fraternidade do Fole brasileiras, a de São Paulo e Rio

de Janeiro, teriam subscrições de fundos suficientes para alocar aviões em um esquadrão

e o selecionado seria o Esquadrão Nº 193. Informou ainda que seriam tomadas medidas

entre o Ministério do Ar e a Embaixada do Brasil para uma cerimônia que ocorreria no

sábado, 16 de outubro, em Harrowbeer, onde o subsecretário de Estado, Lord Sherwood,

apresentaria as aeronaves para a esquadra e o embaixador brasileiro seria convidado a

85 CHURCHILL interessado pela “Fraternidade do Fole” do Brasil. Correio Paulistano, São Paulo, 06 dez

1942. Disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=090972_09&PagFis=12870.

Acesso em 03 fev 1942. 86 Deduzimos ser este o nome que aparece assinando a carta. Pesquisas iniciais ainda não nos permitiram

confirmar essa informação.

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batizá-las. 87 No dia 16 de outubro, ocorreu a entrega de 9 Typhoons, identificados como

Bellows Brazil. Era o início da atividade dos foles brasileiros, que passaram a compor

oficialmente o Esquadrão 193. Os aviões doados foram assim identificados:

Bellows Fund, Brazil, South America. £45,000. [Presented 9 Typhoons to Nº193

(Fellowship of the Bellows) Sqn, Harrowbeer in 1943].

JP784 BELLOWS BRAZIL I

JP918 BELLOWS BRASIL II

? BELLOWS BRAZIL III TO VIII

EK172 BELLOWS BRAZIL IX 88

Rio de Janeiro Aircraft Fund, Brazil (British Community), South America. [The British

Community in Rio de Janeiro subscribed £40,137 for aircraft, including four from the

“Women’s War Effort”]

BM161 BOTAFOGO*

JG875 BEM-TE-VI*

? BELO HORIZONTE

? CARIOCA*

? CASCADURA*

? FLUMINENSE

? PALMEIRA

? SERRA DA CARIOCA89

Sobre o Bellow Brazil Nº 1, BS545, este foi a primeira aeronave doada pelos

brasileiros. Ele tinha a palavra Brazil sobre o símbolo do Fole. Após a guerra, a aeronave

passou por vários esquadrões até ser vendido para o Armée de l’Air em 24 de maio de

1946, servindo pelo BE708 Meknes (Código B), caindo em 19 de maio de 1949 e sendo

então destruído. 90

87 Cf. NAUK. AIR 27/1158. SECRET. From Headquarters, Nº10 Group. To Nº 193 Squadron, R.A.F.

Station, Harrowbeer. “Presentation of Aircraft”. 12 th October, 1943. Ref. 10G/S.9163/1/ORG/5. 88 BOOT, Henry, STURTIVANT, Ray, ISSO. Gifts of War. Spitifires and other Presentation Aircraft in

Two World Wars. Published in the United Kingdom by Air-Britain (Historians) Ltd, 2005, p. não

identificada. 89 Idem. 90 Ibidem, p. 62

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Acerca dos Bellows Brazil II e III, não conseguimos, até o presente momento,

encontrar informações que nos auxiliassem em suas identificações.

Sobre as aeronaves Bellow Brazil IV e V , as mesmas foram batizadas em abril

de 1943, contando com a presença do Ministro da Aeronáutica, Archibald Sinclair, e do

embaixador Moniz Aragão, que na ocasião enfatizou que o Brasil já havia contribuído

com a quantia de 250 mil libras esterlinas e naquela semana foram enviadas mais 4 mil

libras para a produção aeronáutica.91

Ainda nesse período foi inaugurada a nova sede da Fraternidade do Fole,

localizada no edifício da Associação dos Empregados do Comércio. A cerimônia contou

com a presença do Brigadeiro Armando Trowpovsky, do Ministro da Aeronáutica

Joaquim Pedro Salgado Filho, do diretor do DIP Major Coelho dos Reis e do capitão

Dutra Menezes, diretor da Divisão de Rádio.92 Cinejornal do DIP produzido em 194293,

registrou o evento e mostrou imagens da nova sede da organização. Na sala principal

havia uma foto do presidente Getúlio Vargas, um símbolo da RAF e um da FAB, junto a

imagens de aviões na parede, que cremos ser dos aviões doados à RAF e batizados na

Inglaterra. Nessa cerimônia foi entregue a primeira contribuição da Fraternidade à FAB.

Em outra cena do cinejornal vemos felobelistas contribuindo com a organização.

Identificamos também cadernetas em cima do balcão na sede e intenso movimento de

contribuintes.94

Em outro cinejornal, encontramos imagens do batismo do bombardeiro Britânia I,

doado adquirido com recursos oriundos da Fraternidade do Fole e doado para a Força

Aérea Brasileira. Seu batismo contou com a presença do embaixador britânico no Brasil,

Noel Charles, do ministro da Aeronáutica Salgado Filho, e autoridades da Força Aérea

91 BRAZILIAN bombed Berlin. Times, 10 apr 1943. Fellowship of the Bellows in Brazil. Gift or Aircraft.

C.S. 17184. NAUK AIR 2.5480 92 MAIS AVIÕES para a vitória. Diário de Notícias, 06 out 1942, pg 3 93 “O ESFORÇO para a vitória comum – Rio: A Fraternidade do Fole coopera com a F.A.B”.

CINEJORNAL Brasileiro. V. 2, Nº. 158, Cinejornal/Sonoro/Não ficção. 29 out 1942. Rio de Janeiro. DF.

Cinemateca de São Paulo. Filmografia ID=014327 94 Idem.

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Brasileira.95 Os aviões de tipo bombardeiros leves doados para a FAB seriam utilizados

para patrulhar as costas brasileiras em busca de submarinos inimigos.96

O registro das atividades da Fraternidade exibidas nos cinejornais era um

demonstrativo claro da intenção do governo de dar visibilidade a sua parceria com os

britânicos na luta pela vitória e consolidar a posição do governo brasileiro ao lado dos

aliados.

O envio de fotografias dos batismos das aeronaves para o Brasil era um meio de

reforçar a importância das contribuições, divulgar as ações do Ministério da Produção

Aeronáutica e, ao mesmo tempo, servir como elemento de propaganda para a organização.

Ao divulgar as imagens na imprensa, os organizadores reforçavam os fins aos quais o

dinheiro arrecadado era destinado.

Algumas destas fotografias eram enviadas diretamente para o embaixador Moniz

de Aragão. Em correspondência enviada ao líder o esquadrão 193 Petre, Aragão informou

que havia ficado muito satisfeito em receber uma carta escrita pelo tenente Beake a pedido

de Petre, incluídas na mesma três fotografias do Esquadrão e informando que duas delas

seriam enviadas para a Fraternidade do Fole do Brasil.97 Em outra correspondência.

Moniz de Aragão escreveu para David Ross, outro líder do esquadrão, lamentando saber

das perdas do 193 e informou saber ser impossível visitar o esquadrão em seu quartel.

Informou ainda esperar que mesmo diante das dificuldades ocasionadas pelas ações no

conflito, ele não deixaria de notificar sobre as atividades do esquadrão. O embaixador

encerrou informando estar ansioso para conhecê-lo em um futuro próximo e desejando

tudo de bom para o esquadrão. 98

95 “ASAS para o Brasil – Rio: o batismo do Bombardeiro Britania I. Cinejornal brasileiro. V. 2, Nº 190.

Cinejornal/Sonoro/Não ficção. Rio de Janeiro, 1943, DF. ID=014359. Disponível para consulta em

Cinemateca Brasileira. São Paulo. 96 Cf. CHRISTENING of aircraft by the secretary of State for air and his excellency the brazilian

ambassador at Hendon on April 10th 193. Fellowship of the Bellows in Brazil. Gift or Aircraft. C.S.

17184. Op Cit 97 Cf. AIR/27/1158. Londres, 08 dezembro 1943. Carta enviada pelo Embaixador Moniz de Aragão para

Squadron Leader G.W. Petre. 98 Idem. Londres, 03 abril 1944. Carta enviada por Moniz Aragão para Squadron Leader David G. Ross.

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A esposa de Moniz Aragão também escreve para Petre desejando-lhe feliz natal e

informando que estará enviando um pequeno presente de natal para o esquadrão e seus

melhors desejos e pensamentos. 99 Em fevereiro de 1944, nova carta de Isabel Moniz de

Aragão para Petre desejando tudo de bom e informando que envia uma caixa de vinho e

duas latas de café, desejando que esses presentes possam ajudar a dissipar as dificuldades

do mês de fevereiro. A embaixatriz se despede informando que seu marido se junta a ela

enviando-lhe calorosas saudações e aguardando novas notícias. 100 Em 08 de dezembro

de 1943, Petre envia uma carta para o tenente coronel Growdon informando que

finalmente as fotografias do esquadrão estavam em suas mãos e ele estava encaminhando

cinco cópias para uso. Informa ainda que se Growdon precisasse de mais cópias, o

avisasse que ele providenciaria. 101

Em 08 de dezembro de 1943, nova carta de Moniz de Aragão para Petre infomando

que havia ficado muito satisfeito em receber uma carta escrita pelo tenente Beake a pedido

de Petre, incluídas na mesma três fotografias do Esquadrão e informando que duas delas

seriam enviadas para a Fraternidade do Fole do Brasil. O embaixador continuou sua

escrita lamentando que o líder do Esquadrão não estivesse bem de saúde e informando

que estva muito interessado em receber novas informações sobre as missões aéreas

efetuadas pelo 193 e que apreciava a disponibilidade de Petre em mantê-lo informado dos

acontecimentos. 102

Ainda sobre o bombardeiro Britania, seu batismo ocorreu no Aeroporto Santos

Dumont, contando com a presença do embaixador britânico Noel Charles e Assis

Chateaubriand, representando os membros da Fraternidade do Fole. A cerimônia foi

presidida pelo ministro Salgado Filho e Noel Charles discursou acentuando o papel da

FAB no patrulhamento da costa brasileira contra os submarinos nazistas e enfatizou as

contribuições recolhidas pela organização e doadas para a RAF. 103 Na mesma cerimônia,

tivemos ainda o batismo de outra aeronave, o avião Embaixador Mello Franco, doado

99 Idem. Londres, 22 dezembro 1943. Carta de Isabel M. de Aragão para Squadron Leader G.W. Petre. 100 Idem. Londres, 03 de fevereiro 1944. Carta de Isabel M. de Aragão para G.W. Petre. 101 Idem. Nº 193 Squadron (Brazilian Bellows) Squadron. RAF Station. Harrowbeer. 08 dezembro 1943.

Carta de Petre para Wing Comander Growdon. 102 Idem, London, 08th december, 1943. Carta de Moniz Aragão para Squadron Leader G.W. Petre. 103 BATISADOS o “Britania I” e o “Embaixador Mello Franco”. Correio da Manhã, 03 abr 1943.

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pela Companhia Singer à Campanha Nacional da Aviação e destinado ao aeroclube de

Sergipe. O padrinho desse batismo foi o embaixador estadunidense Jefferson Caffery,

contando ainda com a presença do ministro Osvaldo Aranha, os brigadeiros Heitor

Varady e Newton Braga, além de várias outras autoridades civis e militares104.

Ainda sobre o batismo do Britânia I, o jornal Times mencionou o acontecimento e

informou sobre as contribuições oriundas do Brasil para a aquisição do aviões, afirmando

que as mesmas eram divididas entre a RAF e a FAB e comentando que desde os dias da

Batalha da Inglaterra, a guerra aérea tinha interessado muito ao Brasil pelo fato de que o

país, que estava usando o transporte marítimo em uma escala considerável para

transportar suprimentos às nações aliadas, temia a ação dos U-boats, que estariam

operando ao largo das costas. As aeronaves de comando da RAF auxiliariam os brasileiros

à manterem a integridade de suas mercadorias.105

Em 1945, com o término da guerra, a Fraternidade do Fole continuou ajudando

financeiramente britânicos e brasileiros até o final da guerra, quando encerrou suas

atividades no Brasil após fechar seu escritório.

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104 Idem. 105 Cf. BRAZIL’S part in the air war. Help for the RAF. Times, 10 apr 1943. Fellowship of the Bellows in

Brazil. Op. Cit.

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