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A Formação do Proletariado e o Movimento SindicalTRANSCRIPT
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A Formação do Proletariado e o
Movimento Sindical
Por Claudio Blanc*
século XIX assistiu a uma transformação na maneira
de se produzir bens e serviços, iniciada na Europa no
final da década de 1780 e batizada, por causa da
incrível transformação que trazia, de Revolução Industrial. No
* Claudio Blanc é escritor e tradutor, autor, entre outros, dos livros O
Homem de Darwin, O Lado Negro da CIA e Tempos de Luta e de Glória – A História do Sindicato dos Padeiros de São Paulo
O
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Brasil, como sociedade escravocrata baseada na agricultura
voltada para exportação, esse processo foi mais lento, mas
não deixou de influenciar as suas relações sociais. A abolição
da escravatura, em 1888, é uma dessas mudanças
importantes na sociedade brasileira. A constituição do
proletariado, outra.
A partir de 1850 a economia cafeeira começa a gerar capital
para iniciar o processo de industrialização no Brasil,
transformando e modernizando o país. A produção e
exportação do café trouxe a necessidade de construção de
infraestrutura. Nos últimos trinta anos do século XIX, são
implantadas ferrovias, aumentam o número de bancos, o
comércio de varejo se expande, o trabalho livre do imigrante
é introduzido e as primeiras indústrias são instaladas. Com
toda essa mudança, surgem novas categorias profissionais,
bem como novas classes sociais. Os operários entram em
cena. Inicia-se um movimento de urbanização crescente que
aumenta o tamanho e o número das cidades.
Esse processo de mudanças, que encerra em si as
contradições entre os interesses dessas novas classes sociais
(militares, a burguesia urbana em formação, o proletariado,
entre outras), acaba por abalar a monarquia que, tendo a
escravidão como elemento de unidade e base de sustentação,
acaba se isolando e, emaranhada em crises políticas, é
abolida um ano depois da libertação dos escravos.
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A abolição da escravidão foi fundamental na transformação
do Brasil. Durante 388 anos, a sociedade girava em torno da
posse de escravos. Na época da Independência, essa
atividade estava em franca expansão: a cada ano, até 40 mil
escravos africanos eram introduzidos no Brasil – além dos
índios que continuavam a ser capturados. E a mudança foi tão
grande que o Império, que era sustentado principalmente
pelos proprietários de escravos, caiu.
Com a República, as instituições que constituem o Estado
foram reorganizadas sobre novas bases. Entre outras
medidas, foi instituído o federalismo, isto é, o sistema político
pelo qual várias províncias (mais tarde estados) autônomas e
com governo próprio se reúnem para formar um Estado
federal; o Estado se desvinculou completamente da Igreja; e
o voto universal, embora restrito, foi introduzido. Esse
processo abriu espaço para a constituição do proletariado no
Brasil.
O crescimento do país e a falta de escravos demandavam
mais mão de obra. Por outro lado, a Europa passava por
convulsões sociais e políticas. Esse cenário atraiu um número
cada vez maior de imigrantes. Assim, o trabalhador imigrante
passou a entrar, cada vez em maior número no país. De
acordo com o pesquisador José Antonio Segatto, entre 1871 e
1880 entraram 220 mil; na década seguinte, 1881 a 1890,
passaram para 530 mil; nos anos entre 1891 e 1900 mais do
que dobraram, chegando a mais de 1 milhão e 100 mil. Entre
1901 e 1930, entraram mais de dois milhões de imigrantes, a
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maioria italianos, portugueses, espanhóis, alemães, eslavos,
árabes (sírios e libaneses) e japoneses.
Os imigrantes não apenas forneceram mão de obra e capital
para o processo de industrialização, mas também novos
hábitos e know how – “saber como (fazer)”, isto é
conhecimento e tecnologia. Com o tempo, vieram a formar os
grandes contingentes de trabalhadores urbanos, dedicando-
se ao comércio, artesanato ou atividades industriais, fosse
como proprietários, fosse como trabalhador. Fundaram várias
indústrias, quase sempre de gêneros de consumo de pouca
duração e de alimentos – tecidos, massas, bebidas, chapéus,
calçados entre outros. A grande maioria desses imigrantes
formou o proletariado, tanto nas indústrias como nas
fazendas de café, dando um perfil ideológico característico a
esses primeiros trabalhadores na indústria nascente. Em
1901, 90% dos operários das fábricas em São Paulo eram
europeus, principalmente italianos. De acordo com Segatto,
em 1913, essa proporção era ainda de 82% caindo, em 1920,
para 40%.
Reurbanização
O novo quadro de progresso e modernização impulsionou um
grande esforço de reurbanização. Em busca de ocupar
posição de destaque no cenário mundial, o governo federal
criou programas de saneamento, de alargamento de avenidas
e de aberturas de novos bairros, os quais foram prioridade no
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início da República. De fato, o Rio de Janeiro e outras capitais
brasileiras precisavam ser reurbanizados.
O jornalista Luis Edmundo retratou em crônica o Rio de
Janeiro dessa época:
“A cidade é um monstro onde as epidemias se albergam
dançando sabats magníficos, aldeia melancólica de prédios
velhos e acaçapados, a descascar pelos rebocos, vielas
sórdidas cheirando mal, exceção feita da que se chama rua do
Ouvidor, onde (...) o homem do ‘burro-sem-rabo’ (um
vendedor ambulante que puxava um carrinho de mão) cruza
com o elegante da região tropical, que traz no mês de
fevereiro sobrecasaca preta de lã inglesa, e (...) dilui-se em
cachoeiras de suor”.
O lixo se acumulava pelas ruas, cruzadas por bondes que
ligavam o centro da cidade aos subúrbios. A sujeira e a
insalubridade eram tais que, normalmente, os viajantes
apreciavam as belezas da Baía da Guanabara do navio. Não
desembarcavam, temendo contrair doenças como cólera e
febre amarela. Na Europa, algumas agências de viagens
anunciavam que dispunham de passagem com “trânsito
direto para Buenos Aires, sem passar pelo Brasil e pelos
perigosos focos de febre amarela da cidade do Rio de
Janeiro”. Apesar do cenário maravilhoso, a cidade era
maldita.
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Por essas e por outras, as maiores cidades, São Paulo e Rio de
Janeiro, então capital federal, buscavam se modernizar,
adotando fachadas mais europeias. Novos bairros surgiram e
os primeiros serviços de bonde foram inaugurados. O estilo
art nouveau, importado da França, dominava a arquitetura da
cidade. Foram construídos serviços de abastecimento de
águas, canais de drenagem e de esgotos. São instaladas as
primeiras hidrelétricas - contemporâneas às dos grandes
centros mundiais.
Com esse grande impulso, diversas indústrias se estabelecem.
Não é, porém, um processo que acontece de uma única vez,
nem de modo uniforme.
Novos Tempos, Novas Formas de Organização
Com todas essas alterações na maneira de produzir
determinadas pela Revolução Industrial, não só as relações
entre capital e trabalho se transformaram, mas as formas de
os trabalhadores se organizarem também mudaram
radicalmente. Se até o século XVIII os trabalhadores se
organizavam em confrarias, guildas e irmandades que
controlavam seu negócio, a partir do início do século XIX, a
industrialização obrigou os trabalhadores a rever sua forma
de organização.
“O capitalismo é um sistema de ordenamento social no qual
as relações entre os homens organizam-se em função do
dinheiro investido na produção de mercadorias, o capital”,
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define o historiador Jorge Caldeira. Para funcionar
plenamente, o capitalismo determina que os trabalhadores
não tenham outra opção a não ser a venda da sua força de
trabalho por um salário. Dessa forma, o novo sistema
econômico promoveu o fim das relações de trabalho até
então em vigor.
Foi uma transformação radical. Na Europa, os trabalhadores
foram expropriados de seus meios de trabalho – terras
comunais e ferramentas, no caso da agricultura; monopólio
das corporações, no caso do artesanato –, até que ficassem
disponíveis para serem contratados, em troca de salários, por
empresários que lhes forneciam os meios de trabalho. Com
isso, aumentou muito a produtividade. Na Inglaterra, que
estava na linha de frente dessas mudanças, a produção de
tecidos saltou de duas mil toneladas em 1800 para 110 mil
em 1830.
Mas para os trabalhadores as coisas pioraram demais. Na
época da Independência do Brasil, a imensa maioria dos
operários ingleses vivia em condições quase tão precárias
quanto os escravos da América. Na verdade, sua situação era
ainda pior, pois, nas fábricas inglesas, os operários
trabalhavam de catorze a dezesseis horas por dia – mais até
do que muitos cativos. Entretanto, ao contrário dos donos de
escravos, os capitalistas não precisavam alimentar nem cuidar
dos inválidos e podiam demiti-los quando quisessem. Essa
possibilidade era outra vantagem do sistema: enquanto uma
plantação escravista precisava manter, o tempo todo, gente
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suficiente para tocar a produção na época de pico, nas
fábricas contratava-se ou demitia-se conforme a necessidade.
Desse modo, nas épocas de baixa produção, não se gastava
além do necessário.
Com isso, as formas de organização dos trabalhadores
mudaram não só no mundo todo, mas igualmente no Brasil. O
início da mudança na forma de os trabalhadores brasileiros se
organizarem começou antes mesmo da industrialização e
formação do proletário no país. De fato, esse processo teve
início logo após a Proclamação da Independência, quando o
novo país elaborou sua Primeira Constituição.
A Constituição do Império do Brasil, de 25 de março de 1824,
foi motivo de disputa entre o imperador D. Pedro I e a
Assembleia Constituinte. Como os constituintes queriam
maior autonomia frente ao poder central, o imperador
dissolveu a Assembleia e encarregou um Conselho de Estado
de elaborar a Carta Magna. Assim, nossa primeira
Constituição foi marcada pelo centralismo e pelo
autoritarismo.
Uma das medidas que determinava o início da transformação
na maneira como os trabalhadores passaram a se organizar
podia ser vista no artigo art. 179, parágrafo XXV, da
Constituição, o qual abolia as corporações de ofícios. A
medida proibia assim as organizações que reuniam mestres e
oficiais e que constituíram a primeira forma de organização
trabalhista do país – modelo herdado da Europa medieval.
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Por um lado, o imperador temia o poder político que essas
sociedades detinham. Várias sociedades secretas e a
maçonaria se infiltraram nas corporações buscando
conquistar direitos, e Pedro I não queria correr riscos. Mas a
medida também refletia uma nova tendência trazida pela
Revolução Industrial. A Constituição do Império seguia a
legislação de outros países que também haviam proibido as
corporações em nome da liberdade do mercado, uma vez que
o controle exercido pelas corporações sobre o trabalho era
incompatível com a nova era do capitalismo que se
inaugurava.
Contudo, apesar de ter proibido as corporações, a
Constituição de 1824 não tornou ilegal as irmandades a elas
ligadas. Ao longo do século XIX, as irmandades relacionadas
aos ofícios foram sendo substituídas no exercício dessas
atividades por sociedades de auxílio mútuo. O pesquisador
Claudio H. M. Batalha afirma que essas sociedades eram
organizações voluntárias voltadas para a prestação de auxílios
diversos, como o auxílio doença, o auxílio funeral, o auxílio
desemprego, pensões para as viúvas. Na prática, porém,
entre as sociedades desse tipo que tinham por base ofícios,
várias delas buscavam perpetrar funções que haviam sido
exercidas por corporações, como o controle do processo de
aprendizagem por parte dos mestres do ofício.
Mas as sociedades mutualistas por ofícios também
introduziram aspectos novos na organização dos
trabalhadores. Há características dessas sociedades que as
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aproximam das práticas posteriores do sindicato, como a luta
por melhores condições de trabalho e salários dignos. Batalha
observa que uma das primeiras greves de trabalhadores no
Brasil, a greve dos tipógrafos de 1858, no Rio de Janeiro,
contra três grandes jornais por melhores salários foi
conduzida pela Associação Tipográfica Fluminense, uma
sociedade mutualista fundada cinco anos antes.
Os Primeiros Sindicatos
Com o início do processo de industrialização e a formação do
proletariado no Brasil, a forma de organização dos
trabalhadores sofreu novas mudanças. As condições do
proletariado no Brasil do início do século XX eram
impensáveis hoje. A industrialização se deu em condições
bastante desfavoráveis para os trabalhadores: a remuneração
do trabalho era reduzida sempre que as empresas
enfrentavam alguma crise ou sempre que havia muita oferta
de mão de obra; as condições de trabalho eram
extremamente precárias e as jornadas muito longas; não
havia nenhum tipo de previdência social; e os salários eram
baixos.
Um informe ao Congresso Operário de 1913 comentava:
“Imaginem-se em um lugar onde trabalhem centenas de
operários sem sequer uma janela para abrir. Pois isto é o que
há em quase todas as fábricas. As que têm janelas não as
abrem por não quererem que seus escravos percam tempo
olhando a rua”.
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Não existia legislação trabalhista nem indenização por
acidentes de trabalho. Ao envelhecer, o trabalhador não
contava com aposentadoria. Além disso, grande parte da
força de trabalho era constituída por crianças, muitas com
cinco anos de idade ou até menos. Na verdade, o trabalho
infantil era normal e até estimulado.
De fato, as condições de vida dos trabalhadores eram
incrivelmente precárias. Na esfera política, o único direito dos
operários era votar, por ocasião de eleições, em candidatos
que representassem os interesses das oligarquias.
Em 1917, ano da primeira grande paralisação geral da
indústria e comércio em todo o país, o jornal Correio da
Manhã reconhecia que “por mais que obtusamente o neguem
os conservadores, é lamentável a situação do nosso
proletariado. (...) Os tecelões percebem 4$000 [4 000 réis]
por dia de dez horas. Nas fábricas que melhor pagam, as
crianças recebem o salário de 840 réis por dia de sete horas,
ou seja, (...) o filho de um operário ganha num mês aquilo que
o filho de seu patrão gasta em duas horas de passeio de
automóvel”.
Por conta da situação insustentável dos trabalhadores, a
direção assumida pelo movimento operário resultou nas
chamadas Sociedades de Resistência, as quais exerciam
funções claramente sindicais: campanhas por melhores
salários, pela diminuição da jornada e por melhores
condições de trabalho.
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De acordo com Claudio Batalha, “existiram,
fundamentalmente, três tipos de sindicatos ou sociedades de
resistência durante a Primeira República, que se
diferenciavam pela abrangência do seu recrutamento: as
associações pluriprofissionais, reunindo operários de
diferentes ofícios e diferentes setores de produção; as
sociedades por ofício, reunindo unicamente operários de
determinado ofício e, quando muito, de alguns
ofícios afins”.
Os sindicatos por ofício representavam principalmente as
profissões mais qualificadas ou com maior tradição de
organização. Essas associações formavam a base da
organização operária na Velha República.
Sindicatos, Ideologias e Ações
As concepções da organização sindical foram consolidadas no
Primeiro Congresso Operário Brasileiro, realizado em abril de
1906, no Rio de Janeiro. O modelo de sindicato adotado nessa
ocasião tinha como principal apelo a reivindicação por meio
da greve.
Apesar de seu um marco no movimento sindical, o Primeiro
Congresso Operário Brasileiro confirmou a divisão do
movimento em duas áreas de atuação: o sindicalismo de ação
direta e o sindicalismo reformista, abordagens que
continuariam até o início da década de 1920.
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O sindicalismo de ação direta, ou sindicalismo-revolucionário,
rejeitava os intermediários no conflito entre trabalhadores e
patrões. Com forte influência do anarquismo, lutava por uma
sociedade futura fundada em unidades produtivas
autônomas. Essa corrente sustentava que o sindicato devia
ser o embrião da sociedade futura e que a greve geral era o
único instrumento para a realização da revolução social.
O grande apelo dos anarquistas que se organizavam nos
sindicatos de ação direta era a negação radical do Estado e o
recurso à ação direta. Rejeitando qualquer forma de
organização política para a conquista da igualdade e da
liberdade, os anarquistas enfatizavam a atitude libertária
individual e a espontaneidade absoluta do movimento
operário. Para eles, a modificação fundamental a fazer na
estrutura da sociedade seria a destruição do Estado, que
deveria ser substituídos por uma federação de comunas
livres, onde não existiria a propriedade privada.
Já o sindicalismo reformista reunia uma corrente ideológica
composta por diferentes matizes: positivistas, republicanos
sociais, sindicalistas. O cientista político Bóris Fausto foi dos
primeiros a usar, para caracterizar esse grupo, a expressão
“trabalhismo”. Situados à direita dos socialistas, os
trabalhistas não questionavam a ordem social, restringindo-
se a reivindicações para a melhoria da condição operária.
Assim, esses sindicalistas acreditavam que a ação do sindicato
deveria se limitar ao problema salarial e da jornada de
trabalho. Para eles, a greve era o último recurso e, para
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conquistar suas reivindicações, aceitavam a intermediação de
advogados, políticos e autoridades.
Embora as elites brasileiras procurassem reduzir o problema
do proletariado, a pressão do movimento operário começou,
lentamente a surtir efeito. No ano seguinte à realização do
Primeiro Congresso Operário, a Primeira República fez, por
meio do decreto 1.637, de 5 de janeiro de 1907, sua única
tentativa legislar sobre organização dos trabalhadores. O
decreto dispõe sobre os sindicatos profissionais e
cooperativas, mas foi um fracasso, pois a maioria das
sociedades operárias preferiu ignorar a nova legislação e
continuou a se organizar sob antigas legislações que regiam o
funcionamento das sociedades civis.
O pacote incluía, porém, uma lei de expulsão dos
estrangeiros, conhecida como Lei Adolfo Gordo, em
homenagem ao deputado paulista que a propusera. Claudio
Batalha classifica a Lei Adolfo Gordo como “um poderoso
instrumento do Estado contra o movimento operário, uma
vez que, na São Paulo dessa época, cerca de nove entre dez
trabalhadores industriais eram estrangeiros”. Em 1920, 49,6%
(118.962) da população economicamente ativa do município
e 35,5% (205.245) da população total, era formada por
estrangeiros: italianos, portugueses, espanhóis, entre outros.
A exploração da mão de obra de forma abusiva estimulava o
crescimento do movimento operário. Os trabalhadores já
haviam marcado sua presença política em movimentos como
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a greve geral de São Paulo, em 1907. No plano sindical, a
atividade era intensa. Em 1912, a Confederação Operária
Brasileira (COB), fundada em 1908, contava com 22.500
associados em Santos (SP), 15.000 em Porto Alegre e Rio
Grande (RS), 10.000 em São Paulo e 5.000 no Rio de Janeiro.
Em maio de 1917, o Correio da Manhã calculava que a
Federação Operária do Rio de Janeiro reunia 30.000
membros. No Recife e em Salvador, foram criadas federações
de trabalhadores, em 1914 e 1920, respectivamente.
Contudo, no final dos anos 1910, a forte repressão aliada a
uma conjuntura econômica menos favorável enfraqueceu o
movimento operário. Isso acaba por provocar uma mudança
na natureza dos sindicatos que resulta no crescimento dos
sindicatos por indústria.
A década de 1920 foi varrida por turbulências. Os tenentes
lideram levantes militares no Rio de Janeiro, em São Paulo e
no Rio Grande do Sul. Depois de derrotados nessas cidades,
esses militares procuram iniciar, através da Coluna Prestes,
uma revolução armada no interior do país.
No movimento sindical, surgiu uma nova tendência política.
Em março de 1922, a fundação do Partido Comunista do
Brasil marcou uma crise ideológica no movimento sindical e a
busca de novos rumos para o sindicalismo. Logo, os
comunistas passaram a influenciar fortemente o movimento
operário, adotando uma política agressiva de luta pela
conquista dos sindicatos, provocando um rompimento
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ideológico entre eles e os anarquistas – as duas grandes
correntes que então conduziam o proletariado.
Nessa época, as disputas pelo controle dos sindicatos entre
comunistas e as demais correntes acabaram se tornando
assunto das páginas policiais dos jornais, pois
frequentemente acabavam em enfrentamentos físicos e até
mortes.
No início dos anos 1920, apesar do crescimento do
movimento operário, o problema do proletariado continuava.
Com a crise econômica que vinha desde os anos 1910, a
situação dos trabalhadores era lastimável. O custo de vida
aumentava muito, e os salários não aumentavam nada. A
família operária ganhava menos (mesmo com todos os seus
membros trabalhando) do que era necessário para a
subsistência. Em 1918, por exemplo, o salário máximo de um
trabalhador era 120 mil réis, mas a manutenção da casa
nunca, calcula-se, era inferior a 207$000. Nos bairros
operários não havia nem água encanada nem esgotos; em
10% dos cortiços onde esses trabalhadores moravam,
segundo sanitaristas da época, entre cem e duzentas pessoas
compartilhavam o mesmo banheiro. Nesse Brasil dos anos
1920, 65% da população maior de 15 anos de idade eram
analfabetos.
Os direitos dos trabalhadores também continuavam a ser
ignorados. Em 1924, em Niterói e no Rio, oitocentos
operários foram presos acusados de simpatizarem com o
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tenentismo e levado a Clevelândia. Menos de cem voltaram.
Os outros foram massacrados.
Para controlar o problema do proletariado – ou, melhor
dizendo, o problema das elites com o proletariado – em 1923,
foi instituído por decreto o Conselho Nacional do Trabalho
(CNT), órgão ligado ao Ministério da Agricultura, Indústria e
Comércio, que contava com representantes dos patrões e dos
trabalhadores. O CNT deveria tratar de questões como a
duração da jornada de trabalho, remuneração, contratos de
trabalho, o trabalho de mulheres e de crianças etc.
A partir de novembro de 1926, com o início do governo
Washington Luís, que anistiou sindicalistas e presos políticos
e extinguiu diversos presídios, o movimento sindical teve
maior liberdade para retomar seu crescimento.
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