a expectativa dos alunos da educao de jovens e adultos

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A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino que nasceu da clara necessidade de oferecer uma melhor chance para pessoas que, por qualquer motivo, não concluíram o ensino fundamental e/ou o médio na idade apropriada.Surge como uma ação de estímulo aos jovens e adultos, proporcionando seu regresso à sala de aula. Esta modalidade respeita às características desse alunado, dando oportunidades educacionais adequadas em relação a seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames próprios.

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  • A expectativa dos alunos da Educao de Jovens e Adultos (EJA) com

    relao educao para o trabalho

    Shirley ngela da Silva1

    Shirley Lopes Ferreira2

    Daniela Maria Ferreira3

    Resumo Esse estudo trata da expectativa dos alunos da Educao de Jovens e Adultos (EJA) com relao educao para o trabalho, na tentativa de observar aspectos e concepes inerentes realidade

    vivenciada pelos alunos pesquisados. Como base terica, nos apoiamos a princpio na Leis de

    Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN), Lei n 9394/96, que fundamenta essa modalidade de ensino. Posteriormente, utilizamos o documento base da Secretaria de Educao do Estado do

    Mato Grosso (SEDUC MT), a respeito das funes e objetivos da EJA. Ainda fizemos meno aos seguintes autores: CHIZZOTTI (1998), a respeito da pesquisa de cunho qualitativo; COURA (2008); GUIMARES e DUARTE (2008); PAIXO (2005); e BRASIL (2001; 2009), todos nos demais

    pressupostos da pesquisa. Atravs da observao e de entrevista semi-estruturada, pesquisamos o

    mdulo inicial da EJA na Escola Municipal Darcy Ribeiro, em Recife-PE. Os pontos observados nos

    levaram a perceber a importncia do trabalho e do processo de socializao para os dez jovens e adultos de nosso estudo e como estes aspectos esto relacionados s suas trajetrias e de suas

    famlias.

    Palavras-Chave: Trabalho, Educao, Socializao, Educao de Jovens e Adultos.

    1. Introduo

    Essa pesquisa trata de entender a expectativa dos alunos da Educao de Jovens e

    Adultos (EJA) com relao educao para o trabalho. Nossa familiaridade com a Educao

    de Jovens e Adultos se deu a partir das observaes feitas durante a disciplina de Pesquisa e

    Prtica Pedaggica (PPP), surgindo desde ento o interesse pela modalidade e pelos sujeitos

    que fazem parte dela, em especial pelas expectativas desses alunos com relao as suas

    passagens pela modalidade.

    A necessidade de observar e entender questes que para os alunos da EJA so de

    grande relevncia, como o trabalho e a educao que lhes oferecida foi o que nos levou a

    1 Concluinte do curso de Pedagogia do Centro de Educao da Universidade Federal de Pernambuco.

    [email protected] 2 Concluinte do curso de Pedagogia do Centro de Educao da Universidade Federal de Pernambuco.

    [email protected] 3 Professora Adjunta do Departamento de Psicologia e Orientao Educacional do Centro de Educao da

    Universidade Federal de Pernambuco, tendo sido orientadora das autoras deste artigo.

    [email protected]

  • 2

    questionar a respeito de suas trajetrias sociais e culturais na tentativa de compreender as

    condies objetivas que influenciam a escolarizao desses alunos.

    Considerando esses aspectos, esta pesquisa buscou, em termos gerais, identificar e

    analisar a expectativa dos alunos da EJA com relao educao oferecida nesta modalidade

    no que diz respeito possvel modificao social ou econmica em suas vidas. De modo

    especfico, identificar os motivos que levam o aluno jovem e adulto a procurar a escola; listar

    e avaliar o valor atribudo educao e escola pelos alunos da EJA; verificar a relevncia do

    trabalho para esses alunos e suas expectativas com relao ao trabalho, diante dos seus

    recentes acessos educao; relacionar os motivos e os valores atribudos por eles com dados

    a respeito de suas origens sociais e culturais.

    A pesquisa ocorreu em uma escola municipal da cidade do Recife e foi realizada

    atravs da utilizao de entrevistas semi-estruturadas com dez alunos regularmente

    matriculados na modalidade Educao de Jovens e Adultos, entre os quais, seis mulheres e

    quatro homens, com idades entre quinze e sessenta e quatro anos, foram entrevistados

    individualmente.

    Este estudo est divido em quatro partes. Na primeira apontamos algumas

    caractersticas da EJA e de seus sujeitos e as funes e objetivos da modalidade. As demais

    partes, nas quais analisamos nossos dados, esto intitulados como: Quem so os alunos da

    EJA, em que tratamos a relevncia atribuda pelos alunos questo do trabalho e a relao

    disso com a procura por esta modalidade de ensino. Os alunos e a escolarizao na famlia,

    em que relacionamos o grau de escolaridade dos pais de nossos entrevistados, a escolarizao

    de seus irmos e de seus filhos para tentar compreender o que eles esperam da Educao de

    Jovens e Adultos. E por ltimo, a socializao na EJA: expectativas dos alunos. Nessa parte

    analisamos a socializao dos alunos na modalidade de ensino e, consequentemente, o valor

    atribudo escola.

    Verificou-se, entre outros resultados encontrados em nossa pesquisa, que durante o

    processo educacional, alm do desejo de crescer profissionalmente, os alunos demonstraram

    satisfao de estar na escola. Isso decorrente do processo de socializao que acontece na

    mesma.

    2. A EJA: caractersticas, funes e objetivos

    A Educao de Jovens e Adultos uma modalidade de educao que est

    fundamentada a partir das Leis de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN), na Lei

  • 3

    n 9394/96, sendo destinada aos alunos jovens e adultos que no tiveram acesso ou

    continuidade de estudos no Ensino Fundamental e Mdio na idade prpria, fazendo parte do

    Ensino Bsico, mas no havendo para a EJA a obrigatoriedade existente no mesmo.

    De acordo com o artigo 37, 2 da LDBEN O poder pblico viabilizar e estimular

    o acesso e permanncia do trabalhador na escola, mediante aes integradas e

    complementares. Essas aes esto relacionadas aos cursos e exames que habilitaro os

    alunos para a continuidade dos estudos na educao regular aps sua passagem pela Educao

    de Jovens e Adultos, alm de considerar as caractersticas sociais deles, tais como: serem

    alunos de baixa renda, trabalharem durante o dia, etc.

    Uma caracterstica bastante importante nas escolas que oferecem a EJA est

    direcionada necessidade das mesmas em ter seus horrios de aula reduzidos. Em alguns

    casos isso acontece pelo fato de que existem instituies de ensino situadas em reas de risco

    prximas ao trfico de drogas, seja venda ou consumo, com riscos de assaltos, e a

    comunidade escolar, na tentativa de se prevenir a esse respeito, torna o horrio noturno ainda

    menor que o habitual, j reduzido em comparao com os horrios da manh e tarde. Assim,

    os alunos que cursam a Educao de Jovens e Adultos costumam ser prejudicados ainda nas

    suas necessidades de frequentar a modalidade, pois o fazem no horrio noturno, e tm as

    horas reduzidas para estudar, alm de alguns trabalharem durante o dia.

    Neste contexto, o prejuzo ocasionado pela diminuio de carga horria recai

    diretamente sobre o aluno que tem perspectivas de melhorar de vida, terminar os estudos,

    ensinar a tarefa dos filhos, deixar de ser ignorante, no precisar sujar o dedo para

    assinar. Estas so expresses usadas por alguns alunos da EJA que tivemos a oportunidade

    de conhecer durante as observaes da disciplina Pesquisa e Prtica Pedaggica no ano de

    2009 e confirmadas no atual estudo, justamente na escola na qual realizamos a pesquisa.1

    Para muitos alunos, o fato de no saber ler e escrever se constitui como algo que

    incomoda e causa vergonha Existem os que acreditam que se sentiriam melhor em

    conseguir apenas assinar o nome. As opinies dos entrevistados requerem maior reflexo,

    pois possivelmente no costumamos estabelecer grandes diferenas entre o analfabeto e

    algum que apenas consegue reproduzir seu nome com dificuldade. Eles, porm, se percebem

    em patamares diferenciados. Sobre o assunto, Paixo (2005), em sua pesquisa com catadoras

    ________________________

    1 Expresses semelhantes so observadas em BRASIL (2001, p.42).

  • 4

    de lixo, estratgias de socializao: consonncias e dissonncias na relao escola-famlia,

    explica que:

    Trabalhando com outros grupos sociais, o pesquisador tende a aglutinar os

    indivduos que no sabem ler e escrever no mesmo bloco. Ao analisar as

    entrevistas, percebe-se que, para as entrevistadas, h outras distines. Ter aprendido a escrever o nome um ganho que evita a humilhao de assinar com o polegar. Para elas, h uma gradao entre ser analfabeto, saber escrever

    o nome, saber ler, saber ler e escrever. A escala outra. (p.6).

    Nesse sentido, os alunos que cursam a Educao de Jovens e Adultos costumam faz-

    lo por motivos variados, como por exemplo, para aprender a ler e escrever; para no ficarem

    sozinhos em casa (normalmente os idosos); para acompanhar algum filho ou neto; para

    conversar; lanchar/jantar; por acreditarem que futuramente podem conseguir um emprego

    melhor atravs da educao; ou mesmo pela socializao que acontece no ambiente escolar.

    A esse respeito, Paixo (2005), ainda em pesquisa com catadoras de lixo, demonstra

    que as mes catadoras enviam seus filhos escola com o intuito de lhes garantir a aquisio

    de comportamentos relativos ao convvio social. Esperam que a escola ensine seus filhos a

    serem polidos, educados, saber entrar em algum lugar e dele sair (p.10).

    O fato de adquirir bons modos ou educao domstica na escola mostra-se

    significativo tambm para os alunos da Educao de Jovens e Adultos, pois mesmo no sendo

    mais crianas que precisem ser educadas por seus professores, alguns desses alunos se

    colocam tambm na situao de aprendizes de educao domstica ou bom comportamento

    em sociedade. Seus pais, que normalmente trabalharam desde muito cedo e tiveram prole

    numerosa, nem sempre tinham condies ou tempo para investir na educao domstica e isso

    passou a ser destinado escola a que poucos chegaram a frequentar, favorecendo a espera dos

    sujeitos de nossa pesquisa por esse tipo de educao.

    Isso se deve, possivelmente questo acima mencionada e referente ao pblico

    assistido pela EJA, j que os sujeitos que compem a Educao de Jovens e Adultos

    costumam ser alunos de baixa renda, pois a modalidade direcionada a esse pblico e

    tambm aos alunos que no tiveram acesso educao formal na idade prpria por vrias

    interrupes, seja por precisarem trabalhar, seja tambm por formarem famlias muito cedo,

    dificultando suas trajetrias escolares.

    O acesso educao institudo como direito constitucional (Art.208), mostra-se

    obrigatrio apenas no Ensino Fundamental. No entanto, no caso da EJA, a ausncia de

    polticas pblicas confere a mesma um carter paliativo que no consegue erradicar o

  • 5

    analfabetismo, pois no havendo a obrigatoriedade de cursar a EJA, seu pblico alvo

    permanece, muitas vezes, sem ter acesso modalidade, alm de influenciar na qualidade do

    ensino da Educao de Jovens e Adultos.

    Esses sujeitos normalmente costumam trabalhar em ocupaes no qualificadas, mal

    remuneradas e muitas vezes adquirindo um carter marginal perante a sociedade, como o

    caso de ambulantes, vendedores nas ruas e caladas, ou mesmo de profisses reconhecida

    socialmente mais que esto diretamente ligadas a moradores de bairros pobres e

    marginalizados e que devido as suas situaes financeiras, possivelmente so privados

    tambm de bens culturais. E nesse contexto que a Educao de Jovens e Adultos est

    inserida, para atender a esses trabalhadores.

    A EJA uma modalidade de ensino que, a princpio, possui trs funes bsicas:

    reparadora, que prev a insero do aluno jovem e adulto no meio escolar, inclusive

    oferecendo ensino de qualidade; a funo equalizadora, que prev oportunidades iguais para

    todos, inclusive tendo acesso a novas formas de trabalho e cultura; e a funo qualificadora

    que est ligada educao permanente, com base no carter incompleto do ser humano e

    sendo esta mais que uma funo, o prprio sentido da educao de jovens e adultos.

    (SEDUC MT, 2005, s/ p.)

    Nesse sentido percebemos o seu direcionamento para o mercado de trabalho como

    objetivado em documento da Secretaria de Educao do Estado do Mato Grosso (SEDUC

    MT). Segundo o referido documento os objetivos so:

    Promover a incluso social e a insero no mercado de trabalho de jovens e adultos que no tiveram acesso educao na idade prpria, proporcionar

    condies para que essa parte da populao construa sua cidadania e possa ter

    acesso qualificao profissional, aumentar as taxas de escolarizao. (2005,

    s/ p.)

    No entanto, na Educao de Jovens e Adultos oferecida pelo poder pblico no se

    percebe a articulao com a educao profissional, o que seria indispensvel para que a

    maioria dos alunos pudesse encarar a EJA como via de mobilidade social. Porm, dada a falta

    de articulao mencionada, o foco, pelo menos no mdulo inicial observado, est no processo

    de aprendizagem da alfabetizao. Por que ento alguns alunos acreditam que estudar vai

    faz-los ascender socialmente? Que mecanismos culturais esto atrelados ideia de que

    estudar faz crescer?

    A esse respeito, e comprovando a observao acima, Maria, 63 anos, aluna da EJA na

    Escola Municipal Darcy Ribeiro, que conversou conosco ainda durante as observaes de

  • 6

    Pesquisa e Prtica Pedaggica no ano de 2009, diz: Quando eu vejo as pessoas se dando

    bem nos estudos e conseguindo um bom emprego, que ganhe bem, d vontade de estudar

    muito para crescer na vida tambm. Tenho f em Deus que vou fazer uma faculdade. Vou

    ser assistente social.

    A prerrogativa da mudana de vida to sonhada por muitos se constitui como impulso

    para que esses alunos continuem sua trajetria escolar. H a esperana de que ao se tornarem

    alfabetizados, consigam um trabalho melhor; ou at uma profisso na qual tenham ousado

    sonhar. Tudo se passa como se a frequncia na EJA tornasse as dificuldades socioeconmicas

    menores e continuar os estudos at a universidade se constitui em algo mais provvel.

    3. Delineamento Metodolgico

    Nossa pesquisa ocorreu na Escola Municipal Darcy Ribeiro que funciona a treze anos.

    A instituio possui quinze salas de aula, sala de informtica, cozinha, refeitrio, rea de

    circulao descoberta, quatro banheiros, biblioteca, sala da diretoria, sala dos professores,

    secretaria e oferece o Ensino Fundamental I e EJA, mdulos I, II e III, ficando de fora, nesta

    escola, o mdulo IV, que junto com os anteriores correspondem ao Ensino Fundamental I e II.

    No setor administrativo conta com uma gestora, vice-gestora e secretrias. A escola funciona

    nos turnos da manh, tarde e noite em prdio prprio, construdo para este fim, ficando

    localizada no Bairro do Cordeiro, em Recife-PE.

    Em nossa pesquisa foram entrevistados 10 alunos regularmente matriculados na

    modalidade de ensino, Educao de Jovens e Adultos, que funciona no perodo noturno.

    Observamos alguns momentos de socializao entre os alunos e os profissionais desta

    modalidade de educao ainda na disciplina de Pesquisa e Prtica Pedaggica, que nos ajudou

    para que hoje pudssemos desenvolver nossa pesquisa juntamente com as nossas entrevistas,

    onde verificamos a opinio dos nossos entrevistados a respeito de temas como, o trabalho e

    sua importncia; a educao e as expectativas deles, agora que esto se inserindo no mundo

    letrado; e suas trajetrias familiares.

    A pesquisa, de abordagem qualitativa, nos permitiu trabalhar melhor os resultados

    que obtivemos, na tentativa de compreender como se processavam os pressupostos de nossa

    investigao. A respeito da pesquisa qualitativa, Chizzotti (1998) explica:

    A abordagem qualitativa parte do fundamento de que h uma relao dinmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependncia viva entre o

    sujeito e o objeto, um vnculo indissocivel entre o mundo objetivo e a

  • 7

    subjetividade de sujeito. O conhecimento no se reduz a um rol de dados

    isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito-observador parte

    integrante do processo de conhecimento e interpreta os fenmenos,

    atribuindo-lhes um significado. O objeto no um dado inerte e neutro; est possudo de significados e relaes que sujeitos concretos criam em suas

    aes. (p.79).

    Dessa forma, ao observarmos os momentos de socializao e entrevistarmos os alunos

    pesquisados pudemos verificar essa relao citada por Chizzotti (1998) e suas implicaes em

    nosso processo de anlise dos dados coletados. As entrevistas foram do tipo semi-estruturada

    e tiveram como pontos principais: conhecer o perfil desses entrevistados; os valores

    atribudos educao, os motivos que os levaram a frequentar a escola na modalidade de

    EJA, buscando cruzar os dados para analisar as relaes existentes entre a escolarizao da

    famlia desses alunos e sua interferncia nas expectativas que eles tm no que diz respeito aos

    estudos.

    Esse tipo de abordagem fez-se necessria para direcionar os assuntos referentes aos

    objetivos desse estudo, de modo que no se tornasse tambm um sistema de perguntas

    fechadas, sem margem a outros possveis e relevantes questionamentos relacionados ao

    contexto de cada aluno, sujeito de pesquisa.

    Para a realizao do referido estudo foram necessrias trs visitas escola. A escolha

    da turma para nossas entrevistas foi feita aleatoriamente com os alunos que estavam presentes

    e que se dispuseram a participar. Foram 10 estudantes entrevistados, numa sala na qual esto

    matriculados 46 alunos, com 25 frequentando regularmente e os demais, so 21, provveis

    desistentes. Porm no primeiro dia de nossas visitas, havia 12 presentes.

    Ao chegarmos, os alunos j haviam realizado uma atividade escolar por recomendao

    da professora. As entrevistas foram realizadas em sala de aula, individualmente e com certa

    distncia entre um aluno e outro para no ocorrer interferncia nas respostas de cada

    entrevistado. Antes de iniciarmos com as perguntas, propusermos a gravao das entrevistas

    com o uso de um MP3, mas os alunos no concordaram e tivemos que tomar nota das

    informaes.

    Os sujeitos entrevistados so adultos, em sua maioria, com idades entre 15 e 64 anos.

    Foram utilizados nomes fictcios para identificar os participantes que sero representados por:

    Csar, 15 anos; Wiliam, 15 anos; Andr, 29 anos; Leonardo, 31 anos. Sendo estes os mais

    jovens. As demais, mulheres: Luzia, 40 anos; Marieta, 47 anos; Sofia, 48 anos; Antnia, 57

    anos; Selma, 61 anos; Marta, 64 anos.

  • 8

    4. Quem so os alunos da EJA

    A educao de jovens e adultos, modalidade de ensino na qual ocorreu nossa pesquisa,

    tem por caracterstica marcante a evaso escolar. Essa evaso provocada, sobretudo, pela

    necessidade de cumprir com as obrigaes de sobrevivncia. O ingresso precoce no mundo do

    trabalho influenciou alguns dos alunos pesquisados a abandonar a escola ainda crianas ou

    jovens.

    No caso de algumas alunas, essa evaso se deu na juventude porque constituram

    famlia e precisaram cuidar dos filhos. A evaso tambm se processou para alguns, depois do

    ingresso na EJA, sendo uma caracterstica recorrente a cada ano. No caso da turma

    pesquisada, dos 46 alunos matriculados apenas 25 esto chegando ao final do mdulo I, o que

    comprova o problema da desistncia.

    Associado ao fato de se ter comeado a trabalhar muito cedo, est o fator idade como

    questo considerada pelos alunos para planejar seu futuro e suas metas. A idade relevante

    para o aluno da Educao de Jovens e Adultos, pois o permite controlar/ direcionar suas

    expectativas com relao ao seu futuro nos prximos mdulos da EJA e aps sua passagem

    por esta modalidade de ensino.

    Os alunos mais jovens costumam ter maiores expectativas com relao educao e

    normalmente almejam um futuro mais promissor, a saber, a insero no mercado de trabalho.

    Para os mais velhos, sobretudo os aposentados, a expectativa principal outra. Ela est

    relacionada aquisio de conhecimentos bsicos, como ler e escrever, j que mencionam a

    idade avanada como um empecilho para desejar algo mais que apenas se alfabetizar.

    Contudo, aprender a ler e escrever importante para que essas pessoas possam ter maior

    autonomia em suas vidas, como por exemplo, o simples fato de pegar um nibus, ler uma

    placa, etc. As falas abaixo traduzem a relao entre a idade dos alunos e suas expectativas:

    Quero aprender a ler a escrever, arrumar um emprego. (Wiliam, 15 anos).

    Quero passar no concurso da polcia civil. (Csar, 15 anos).

    Quero aprender a assinar o nome, saber pegar nibus, ler as placas dos nibus. muito feio voc est numa parada e pedir para algum ler a placa do nibus.

    J passei muito por isso. (Marieta, 47 anos).

    Quero continuar aprendendo mais, para no depender de ningum. (Sofia, 48

    anos).

  • 9

    A pesquisa de Coura (2008) Entre medos e sonhos nunca tarde para estudar: A

    terceira idade na educao de Jovens e Adultos mostra como a idade pode interferir na

    formao dos sonhos dos alunos com idades mais avanadas presentes na EJA, por eles

    acreditarem que pelo fato de estarem velhos no podem almejar a realizao de seus sonhos

    Ao envelhecerem, muitas pessoas chegam a creditar que realizar seus sonhos no mais

    possvel, que o tempo que tem pela frente no sria suficiente para concretizar seus desejos

    (p. 2). Em concordncia com o que afirma a autora, isso presente no meio de nossos dez

    entrevistados, pois os alunos mais jovens (Csar e William, 15 anos; Andr, 29 anos;

    Leonardo, 31 anos) tm maiores expectativas comparadas as das alunas mais velhas (Luzia,

    40 anos; Marieta, 47 anos; Sofia, 48 anos; Antnia, 57 anos; Selma, 61anos; Marta, 64 anos).

    Percebemos a observao da Coura (2008) presente na fala de muitos dos

    entrevistados, principalmente dos mais velhos quando enfatizam que no podem alcanar

    muito mais do que ler e escrever e atribuem suas expectativas questo da idade, vista como

    empecilho para desejar sonhos maiores.

    Dessa forma, os alunos da EJA at desejam algo maior para seu futuro, mas costumam

    faz-lo com cautela, j que consideram que tm pouco tempo para viver e tentar realizar o que

    realmente almejam. Talvez numa tentativa de no se frustrarem, acreditam que o que der

    tempo para fazer, ser feito. Assim tambm costumam pensar os adultos de nossa pesquisa,

    como podemos perceber na fala de Selma, ao dizer que quer [...] aprender a ler, escrever... J

    t perto de morrer, no vou fazer mais nada. J t velha, no d tempo de fazer vestibular,

    crescer. Mesmo assim, essa senhora ainda acredita que a educao vai mudar sua vida.

    4.1. Os alunos e a escolarizao na famlia

    Uma das principais causas da entrada precoce no mercado de trabalho est ligada s

    dificuldades financeiras presentes na realidade dos sujeitos de nossa pesquisa desde a

    infncia. Estas dificuldades somadas ao grau de escolaridade dos pais, dos irmos e dos filhos

    dos nossos entrevistados ajudam a compreender o que os alunos esperam da Educao de

    Jovens e Adultos. Assim, podemos observar no quadro 1 da pgina seguinte:

  • 10

    Quadro 1- Caractersticas dos entrevistados

    Nome Lugar de origem

    Idade Profisso escolarizao dos

    pais

    Ocupao Objetivos

    Csar

    Recife-PE

    15 anos

    Pai: autnomo

    alfabetizado; Me: domstica

    alfabetizada.

    Lavador de carro

    Fazer concurso da policia civil.

    Wiliam Recife-PE 15 anos

    Pai: conserta

    cadeiras; Me: domstica.

    Ambos sabem ler e

    no escrevem bem.

    Estudante

    Estudar para

    arrumar um emprego melhor,

    comprar uma

    casa melhor.

    Andr Glria do Goit-PE

    29 anos

    Pai: comerciante que cursou1 ano do

    Ensino Mdio; Me: agricultora

    analfabeta.

    Vigilante Abrir um

    negcio prprio.

    Leonardo Recife-PE 31 anos

    Pai: motorista que

    concluiu o ensino

    mdio; Me: cozinheira que

    concluiu o Ensino

    Fundamental I.

    Biscateiro Arrumar um

    trabalho melhor.

    Luzia Paudalho-

    PE 40 anos

    Pais analfabetos e

    agricultores Dona de Casa

    Abrir o prprio

    negcio (salo de beleza).

    Marieta Recife-PE 47 anos

    Pai: pedreiro

    analfabeto; Me: dona de casa

    alfabetizada.

    Domstica Fazer curso de cozinheira ou

    confeiteira.

    Sofia Recife-PE 48 anos Me: pescadora

    analfabeta Desempregada

    No depender de ningum;

    arrumar um

    trabalho.

    Antnia Feira Nova-

    PE 57 anos

    Pais: agricultores

    analfabetos .

    Domstica aposentada

    Aprender a ler e

    escrever para pegar nibus e

    assinar o nome.

    Selma Itamb-PE 61 anos

    Pais: agricultores

    analfabetos

    Cozinheira

    Aprender a ler.

    Acha feio

    quando as pessoas que no

    sabem ler so

    chamadas de

    analfabetas

    Marta guas

    Belas-PE 64 anos

    Pais: agricultores

    analfabetos

    Aposentada Maior

    recuperao da

    sade

  • 11

    Ao observar o quadro na pgina anterior, Antnia, 57 anos, filha de pais analfabetos,

    acredita que a grande contribuio da Educao de Jovens e Adultos em sua vida aprender a

    ler para poder pegar nibus e assinar seu nome. Algo semelhante acredita Selma, aos 61 anos,

    filha de pais tambm analfabetos, e que se aborrece quando as pessoas pedem para que leia e

    ela no consegue. Nestes casos, aprender a ler e escrever so os maiores bens que elas podem

    adquirir na EJA, na opinio das mesmas.

    J para os alunos cujos pais tiveram o mnimo acesso ao universo letrado, o que

    possibilitou para alguns o ingresso na escola, mesmo tendo evadido posteriormente, a

    expectativa para o ensino da EJA vai alm da aquisio da leitura e escrita. Leonardo, 31

    anos, cujo pai concluiu o ensino mdio e a me, o Ensino Fundamental I, pretende depois da

    concluso da EJA arrumar um emprego melhor. Expectativa semelhante tem Wiliam, 15

    anos, filho de pais que sabem ler, pretende estudar para arrumar um emprego melhor e

    comprar uma casa melhor.

    Ainda com relao escolarizao da famlia, o nvel escolar dos irmos de alguns

    sujeitos de pesquisa, constituiu-se como importante incentivo para esses alunos buscarem a

    educao na modalidade EJA, mesmo que muitos dos entrevistados no tenham informaes

    sobre seus irmos ou seus graus de escolarizao. No caso especfico de Andr de 29 anos,

    vigilante, filho de pai que estudou at o 1 ano do ensino mdio, alm do pai ter tido acesso

    escola, informou que possui trs irmos dos quais, uma estudante de medicina, outro

    policial civil e outro estudante e possui negcio prprio. A familiaridade que este aluno

    possui com a escola, j que quando criana concluiu o Ensino Fundamental I no interior do

    estado, ajuda-o a acreditar na possibilidade de abrir seu prprio negcio e at mesmo criticar

    o curso e o sistema escolar. Como explica:

    Eu parei de estudar pra trabalhar. Fiz at a 4 srie, mas esqueci quase tudo, doze anos sem estudar... Agora o trabalho exige que eu tenha mais estudo. [...]

    Eu quero estudar, melhorar de vida, s que eu acho que aqui (capital) fica

    difcil, porque o ensino muito fraco. Eu quero trabalhar pra mim. [...] Meus irmos estudaram. Um policial civil e outro comerciante e estuda, e minha

    irm estudante de medicina [...] Sinceramente, acho que com a educao que

    estou tendo... O professor tem que puxar pelo aluno e eu no vejo isso. s vezes eu penso em pagar a algum pra me ensinar. (Andr, 29 anos).

    Aliada escolarizao dos pais e dos irmos dos alunos pesquisados, a escolarizao

    de seus filhos tambm influencia nas expectativas dos entrevistados em relao Educao de

    Jovens e Adultos. Alguns desses filhos incentivam seus pais a ingressar ou retornar escola.

    Pelo fato de estarem tendo acesso educao, suas proles, que conhecem de perto os

  • 12

    problemas e as dificuldades de seus pais com relao aos seus baixos graus de escolarizao

    ou ao analfabetismo presente, procuram instigar esses pais a se matricular e prosseguir com os

    estudos. Podemos perceber isso na fala de Luzia, 40 anos, cujos quatro filhos frequentam

    regularmente os Ensinos Fundamental e Mdio:

    Eu sempre quis estudar, mas tive que trabalhar, depois casei e tive quatro filhos. Agora eles j so grandes, esto estudando... Eu me matriculei por

    causa dos meus filhos que me incentivaram a estudar. (Luzia, 40 anos).

    Dessa forma, percebe-se que a escolarizao dos filhos pode impulsionar seus pais

    para que estes se dediquem ao que muitos alunos da Educao de Jovens e Adultos almejaram

    por vrios anos de suas vidas, mas que apenas agora podem realizar: sua insero no mundo

    letrado.

    Apesar de alguns dos entrevistados terem permanecido por muitos anos longe do

    universo escolar, no desejam que seus filhos tenham a mesma realidade. A este fato pode-se

    associar a questo da obrigatoriedade do ensino fundamental, como fator da escolarizao de

    seus filhos, pois as famlias dos alunos pesquisados, normalmente de baixa renda, necessitam

    do auxlio do governo atravs do programa assistencial Bolsa Famlia. Esse programa

    corresponde a uma complementao da renda familiar, sendo este auxlio adquirido mediante

    a frequncia dos alunos s aulas, o que faz com que nossos entrevistados assegurem a

    assiduidade dos filhos na escola para garantir o referido benefcio.

    possvel acompanhar que, uma vez incentivados por seus filhos, os entrevistados

    tambm passam a alimentar o prolongamento da escolaridade das suas proles. Dessa forma,

    existe uma reciprocidade de estmulos entre pais e filhos. Os pais querem que seus filhos

    estudem para que a famlia consiga ter um futuro mais promissor. E os filhos instigam os pais

    ao retorno ou busca da educao por estarem tendo contato com a educao formal instituda

    na escola, como pressupe as imposies da vida em sociedade.

    Esse fenmeno tambm observado por Paixo (2005) em sua pesquisa Estratgias

    de Socializao: Consonncias e dissonncias na relao escola-famlia". A autora, ao analisar

    as estratgias de socializao da realidade de mes catadoras de lixo, a respeito do desejo de

    escolarizao de seus filhos, observa na fala de uma dessas mes que, mesmo considerando

    suas condies sociais, acredita que a escola provavelmente permitir a realizao de certos

    sonhos com relao ao nvel escolar da sua prole. Isso acontece tambm por no conhecerem

    bem o sistema escolar, como afirma a prpria autora:

  • 13

    Como conhecem pouco o sistema escolar e a relao entre emprego e

    requisitos escolares, suas expectativas no contemplam certificaes

    especficas. O diploma superior, mas como sonho irrealizvel, apareceu em

    apenas um discurso, acompanhado de reflexes realistas sobre sua viabilidade. Muitas vezes vai das condies. Porque s vezes a gente quer uma coisa, mas num tem condies pra aquilo. Mas se fosse assim um caso, por exemplo, deu poder manter os meus filhos, eles estudariam at se formarem. Eu formaria eles um advogado, um mdico, entendeu? (p. 7, 8).

    O investimento na escolarizao dos seus filhos tambm se explica pela tentativa de

    nossos entrevistados de garantir um destino diferente do que tm grande parte dos jovens que

    habitam prximo ao local onde residem. Esse medo tambm recorrente na pesquisa de

    Paixo (2005) com mes catadoras, pois quase todas expressam o medo de que os filhos

    caiam na vida de bandidagem, que se tornem um cara da vida (p. 10).

    Esse investimento se d tambm em funo da satisfao que os alunos pesquisados

    sentem em ver que seus filhos esto estudando ou fazendo cursos que possam ajud-los no

    mbito profissional ou cognitivo, como relata Luzia quando se refere aos filhos, todos

    estudantes, e filha que estuda e j fez vrios cursos: Meus filhos esto estudando. Dois

    fazem o 1 grau e um faz o 2 grau. So inteligentes [...] Minha filha j fez curso de

    cabeleireira, de computao... e estuda o 2 grau. (Luzia, 40 anos, quatro filhos). Essa

    satisfao revela-se bastante comum entre nossos entrevistados, que se sentem realizados

    atravs de seus filhos.

    Nesse contexto, muitos dos alunos participantes de nossa pesquisa atribuem escola

    sentidos semelhantes tambm ao comportamento social e educao domstica, como saber se

    expressar, falar corretamente, ser educado com os outros, aprender a respeitar.

    Contudo, alguns acreditam que atravs da Educao de Jovens e Adultos podero melhorar

    suas vidas e de seus familiares, visto que a educao para estes pode promover uma

    determinada mudana na vida futura. (entrevista, setembro de 2011).

    Alguns entrevistados tambm opinam que a escola tem o cunho formativo,

    considerando o aprendizado do aluno. Delegam escola atitudes de ensinar, incentivar o

    aluno, ajudar a melhorar de vida e tambm se referindo educao que os conduza a um

    trabalho, que, na verdade desejo de muitos. (entrevista, setembro de 2011).

  • 14

    4.2. A socializao na EJA: expectativas dos alunos

    Associado escolarizao da famlia extensa, importante considerar o aprendizado

    dos alunos da EJA no mdulo inicial desta modalidade de ensino. No decorrer deste primeiro

    ano de contato com a educao oferecida a eles, crucial entender que o que os alunos

    conseguem aprender no mdulo I servir tambm como impulso para quererem continuar suas

    trajetrias escolares. A partir do momento no qual tentam aprender a ler e escrever, almejando

    um futuro profissional relativamente melhor do que esto tendo agora, e no veem isso

    acontecer com a rapidez necessria, torna-se desestimulante continuar na incerteza, no

    havendo motivao para a permanncia deles na escola. Essa motivao necessria buscada,

    ento, nos momentos de socializao.

    A socializao dos alunos se inicia desde a chegada escola, a partir do momento em

    que encontram com os colegas e seguem at a cantina para jantar, antes do incio da aula. Esta

    a hora em que eles se renem ao redor das mesas, em pequenos grupos e ficam conversando

    at o momento de entrarem na sala. J nas salas, iniciam as atividades da noite e quem

    termina mais rpido passa a ajudar os que ainda no concluram a tarefa proposta pela

    professora, aumentando, assim, os perodos de interao entre os alunos.

    A satisfao em estar na escola, descobrindo novas coisas, aprendendo aos poucos a

    ler e escrever, vendo os colegas de outros mdulos e sentindo-se mais estimulados a continuar

    refora o desejo de se alfabetizar e continuar cursando a Educao de Jovens e Adultos,

    considerado o recorrente problema da evaso nessa modalidade de ensino, como explica a

    aluna Sofia:

    Eu me matriculei aqui no ano passado, mas desisti logo. [...] Tenho vontade de

    aprender, no depender de ningum. [...] Quando a gente v os colegas aprendendo, passando de srie, fica com vontade de aprender mais. (Sofia, 48

    anos).

    Alguns alunos mostraram-se surpresos com o que esto conseguindo aprender na EJA,

    e se dizem satisfeitos por frequentar a escola, pois obtiveram no apenas o benefcio de

    aprender a ler e escrever, mas fizeram amizade com os colegas e com os profissionais da

    educao. Os idosos comentam que no precisam ficar em casa, noite, vendo televiso, pois

    agora vo escola nesse horrio. Para estes, o carter de socializao que acontece na turma

    de Educao de Jovens e Adultos, os traz satisfao em estar ali, tendo contato com pessoas

  • 15

    de idades e interesses diferentes, mas com a vontade comum de aprender a ler e escrever,

    porm mostrando atravs de suas falas, a socializao na escola:

    Eu em casa, essa hora, tava sem fazer nada. Eu no gosto de televiso. (Marta, 64 anos).

    Pra mim, um divertimento vir pra escola. (Selma, 61 anos).

    A esse respeito, Guimares e Duarte (2008) em sua pesquisa Jovens da Educao de

    Jovens e Adultos (EJA): escola e o trabalho na mediao entre o presente e o futuro

    apresentam que, um coordenador pedaggico participante do estudo considera natural o

    espao escolar ser mais aproveitado para a socializao do que para o ensino e aprendizagem

    (p. 5), confirmando a importncia da escola no processo de socializao vivenciado pelos

    alunos.

    De fato, o problema do horrio noturno oferecido principalmente aos que trabalham

    durante todo o dia e ainda no concluram seus estudos, sejam eles, fundamental, mdio ou

    superior, tenta compensar a necessidade de iniciao ou complementao da educao. Por

    causa desse problema, de cunho poltico, social e econmico, tenta-se, de certa maneira

    oferecer uma oportunidade de ensino, mas em defasagens quantitativa e qualitativa em relao

    s classes diurnas. Nos casos dos alunos da EJA, este o nico horrio de funcionamento, no

    dando opes de escolha aos aposentados e jovens menores de idade que ainda no trabalham.

    Talvez por isso, o espao seja percebido por alguns, como local de socializao. A esse

    respeito, os alunos explicam que:

    Olhe, eu gosto muito de estar aqui. A gente conversa, faz tarefa em grupo...

    muito bom. (Marta, 64 anos).

    Eu venho pra c, vejo os colegas, fao as tarefas... Eu gosto. (Sofia, 48 anos).

    O contato social importante entre os alunos que formam um grupo de pessoas que

    no se envergonham tanto diante uns aos outros, pois o mundo letrado preconceituoso com

    quem no atende as suas exigncias, no se enquadra nos seus padres. O nico preconceito

    percebido foi observado com relao idade, na fala de Marta, de 64 anos, ao dizer que a

    pessoa pra se educar depois de idoso mais complicado. Demora mais pra aprender.

    Diante da opinio de Marta, podemos esperar que entre os alunos de EJA mais velhos,

    possivelmente podem existir perspectivas semelhantes fala de nossa entrevistada, mesmo

  • 16

    que em nossa pesquisa nenhum outro aluno tenha demonstrado isso. Nesse contexto

    percebemos o processo de socializao como algo que contribui para a permanncia e o gosto

    pela escola. Isso refora a vontade de prosseguir com os estudos na tentativa de realizar seus

    sonhos atuais e levando-os, no futuro, a ter objetivos maiores.

    5. Consideraes Finais

    A ideia de melhoria de vida em decorrncia de um possvel crescimento

    cognitivo/intelectual aps o acesso ao mundo letrado bastante comum entre os alunos. E, a

    partir dessa evoluo galgar uma oportunidade profissional que os retire da situao social,

    econmica e cultural em que se encontram. Acreditam que atravs do processo de

    alfabetizao, as etapas de ensino-aprendizado sigam acontecendo at culminar num emprego

    melhor, no sonho do negcio prprio ou da profisso desejada. Porm, no decorrer dessa

    sequncia eles encontram na escola, pessoas procurando as mesmas coisas e oportunidades.

    Pessoas que saem todas as noites de suas casas para encontrar os colegas e conversar.

    Portanto, reiteramos a importncia da socializao vivida pelos alunos da EJA no ambiente

    escolar, pois alm de aprender a ler e escrever, os momentos de interao so considerados

    para eles, de grande valia.

    Em nossa pesquisa foi possvel perceber que os valores atribudos pelos alunos

    educao e sua relao com o mundo do trabalho esto, em suas opinies, na oportunidade

    que aquela pode fornecer para os que realmente prosseguirem com os estudos, mesmo que as

    expectativas se diferenciem proporcionalmente a idade de cada. Mas, vale salientar, que

    mesmo com as diferenas de idades, as expectativas resistem apesar de todas as dificuldades

    existentes.

    Esse estudo serviu para mostrar os problemas da EJA e as dificuldades educacionais

    pelas quais passam esses alunos, alm da necessidade de incentivo (normalmente por parte de

    familiares, atravs das suas escolarizaes) para sua permanncia na escola, influenciando,

    consideradas tambm as idades dos alunos, as suas metas educacionais. As expectativas dos

    alunos com relao aos objetivos desse artigo, provavelmente sero diferentes ao chegarem ao

    ltimo mdulo da Educao de Jovens e Adultos, favorecendo uma pesquisa futura em

    continuao a esta.

  • 17

    Referncias

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