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1 A EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA DA SOJA NO MUNICÍPIO DE SANTARÉM (PA) E SUAS TRANSFORMAÇÕES SOCIOESPACIAIS Bárbara Eleonora Santos Teixeira 1 Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA [email protected] Igor Montiel Martins Cunha 2 Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA [email protected] Ademir Terra 3 Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA [email protected] Resumo O agronegócio no Brasil surge como uma alternativa de desenvolvimento rápido através da agricultura mecanizada, tendo a necessidade de se expandir para outras regiões do país com intuito de expandir a produção e também desenvolver as regiões menos desenvolvidas economicamente. É através de incentivos governamentais que o agronegócio da soja ultrapassa barreiras “criadas pela sociedade local’’ tendo este mecanismo para enraizar suas práticas mercantis, com o intuito de explorar a área em seu entorno. Desta forma destacaremos como essas práticas se deram no Brasil e qual o contexto socioeconômico em que esta cultura se instalou no país e em particular no município de Santarém, oeste do Pará. Palavras-chave: Fronteira. Agronegócio. Soja. Santarém. Introdução A discussão apresentada neste artigo é parte das reflexões preliminares que desenvolvemos no nosso Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), do curso de Geografia na Universidade Federal do Oeste do Pará, no qual abordamos a dinâmica da fronteira agrícola da soja na região norte do Brasil, mas precisamente no município de Santarém, Oeste do Pará. Partimos da hipótese de que a expansão da soja no mercado mundial iniciou-se na década de 1970 visando atender a grande demanda européia e norte-americana de proteína de origem vegetal para suprir a necessidade de alimento dos seus rebanhos bovinos alavancando a produção de soja. Diante disso, os países subdesenvolvidos veem neste cenário uma oportunidade de desenvolvimento econômico através da produção de grãos para o abastecimento do mercado mundial. A produção desta leguminosa cresce em vários países, como nos Estados Unidos, Argentina e Brasil. No

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A EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA DA SOJA NO MUNICÍPIO DE SANTARÉM (PA) E SUAS TRANSFORMAÇÕES SOCIOESPACIAIS

Bárbara Eleonora Santos Teixeira1 Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA

[email protected]

Igor Montiel Martins Cunha2 Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA

[email protected]

Ademir Terra3 Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA

[email protected]

Resumo O agronegócio no Brasil surge como uma alternativa de desenvolvimento rápido através da agricultura mecanizada, tendo a necessidade de se expandir para outras regiões do país com intuito de expandir a produção e também desenvolver as regiões menos desenvolvidas economicamente. É através de incentivos governamentais que o agronegócio da soja ultrapassa barreiras “criadas pela sociedade local’’ tendo este mecanismo para enraizar suas práticas mercantis, com o intuito de explorar a área em seu entorno. Desta forma destacaremos como essas práticas se deram no Brasil e qual o contexto socioeconômico em que esta cultura se instalou no país e em particular no município de Santarém, oeste do Pará. Palavras-chave: Fronteira. Agronegócio. Soja. Santarém. Introdução A discussão apresentada neste artigo é parte das reflexões preliminares que

desenvolvemos no nosso Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), do curso de

Geografia na Universidade Federal do Oeste do Pará, no qual abordamos a dinâmica da

fronteira agrícola da soja na região norte do Brasil, mas precisamente no município de

Santarém, Oeste do Pará.

Partimos da hipótese de que a expansão da soja no mercado mundial iniciou-se na

década de 1970 visando atender a grande demanda européia e norte-americana de

proteína de origem vegetal para suprir a necessidade de alimento dos seus rebanhos

bovinos alavancando a produção de soja. Diante disso, os países subdesenvolvidos

veem neste cenário uma oportunidade de desenvolvimento econômico através da

produção de grãos para o abastecimento do mercado mundial. A produção desta

leguminosa cresce em vários países, como nos Estados Unidos, Argentina e Brasil. No

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território brasileiro a produção deste grão teve um maior crescimento na década de

1970, nos estados da região Sul, em face do domínio morfoclimático propício a

implantação dessa monocultura.

Nas décadas seguintes em virtude de melhoramentos genéticos e tecnológicos

propiciando a expansão da soja no cerrado e atualmente nas áreas do ecossistema

amazônico onde os grandes protagonistas da marcha da soja no Brasil são os produtores

sulistas, genericamente denominados “gaúchos”.

Alicerçados em várias políticas públicas de incentivos fiscais implementados pelos

governos federal e estadual investiram em grandes empreendimentos econômicos que

trouxeram consigo uma nova dinâmica às populações locais.Um dos grandes projetos

implantados nesta região foi a BR-163, ligando Cuiabá (MT) a Santarém (PA),

objetivando a ligação da Amazônia ao Centro-Sul do país, constituindo-se assim, em

uma nova rota de escoamento da produção regional propiciando maior lucratividade,

uma vez que a integração desta rodovia ao transporte fluvial existente no Pará de acordo

com Schlesinger e Noronha (2006) representaria uma economia de cerca de US$ 25 por

tonelada de soja transportada, ou US$ 150 milhões/ano. Estas vantagens econômicas

incentivaram a expansão da fronteira da soja na Amazônia criando uma nova dinâmica

territorial através da apropriação privada de áreas de chapadas, campos abertos e de

matas, inserindo a região às redes de modernização agrícola globalmente conectadas,

vinculadas às práticas das corporações do agronegócio.

Tais dinâmicas territoriais repercutem no cotidiano das populações locais,

desorganizando e reorganizando os territórios preexistentes com vistas a atender tão

somente a lógica dos circuitos mercantis, produtivos e financeiro alheio à dinâmica das

populações tradicionais locais. Expropriação, conflitos agrários e êxodo rural são apenas

alguns aspectos que podem se destacar neste cenário de embate entre grandes

empresários agrícolas e pequenos proprietários rurais, os quais se pode notar no

município de Santarém-PA. Neste município, a influência da soja trouxe avanços

econômicos e estruturais, assim como tensões sócio-espaciais entre estas duas classes de

produtores rurais com claras desvantagens aos camponeses em virtude dos distintos

interesses.

O grande capital agrícola tende a obedecer a dinâmica do mercado, e assim, transformar

as questões sociais como a questão da propriedade da terra em meros obstáculos a serem

transpostos com vistas à maximização dos lucros. São estas questões que permearão

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nossas reflexões neste artigo, para tanto, nos serviremos de uma ampla revisão

bibliográfica acerca de tal problemática, como levantamento de dados quantitativos nos

arquivos de órgãos oficiais e ONG’s, entre outros estudos realizados pela comunidade

acadêmica e movimentos sociais.

Soja: origem, características e sua inserção no Brasil Segundo Missão (2006), a soja é uma leguminosa proveniente da região chinesa de

Manchúria, sendo uma das culturas mais antigas do mundo e plantadas há mais de cinco

mil anos. Seu cultivo espalhou-se pelo mundo através de viajantes europeus e

imigrantes asiáticos. Da China também provém a mais antiga referência sobre a origem

da soja, na qual o Imperador Shennong (cuja tradução literal de seu nome significa

“Fazendeiro Divino”) estudou o cultivo de cinco grãos: arroz, cevada, soja, trigo e

milheto. Por tal feito, Shennong ficou conhecido como o “Imperador dos Cinco Grãos”.

A soja (Glycine Max (L.) Merril) é uma leguminosa herbácea que possui alto valor

proteico e grande adaptabilidade climática, tornando-se assim uma das oleaginosas mais

consumidas e cultivadas no mundo. Seus derivados servem para os consumos humano e

animal, e para a elaboração de protetores solares e em diversos estudos médicos.

A soja, foi um dos principais produtos agrícolas incentivado pela Revolução Verde e

esta alterou significativamente a agricultura de países subdesenvolvidos como o Brasil

na década de 1970, pois, através de pacotes tecnológicos, e estudos biotecnológicos que

visavam o aumento da produção e da produtividade, a soja expandiu-se para as diversas

regiões do Brasil e passou a figurar como um dos mais importantes produtos do

agronegócio brasileiro. Os investimentos governamentais sempre estiveram voltados

para as técnicas de produção em larga escala principalmente após a Revolução Verde, a

partir da qual se criou possibilidades de cultivar esta monocultura em regiões com

condições inicialmente desfavoráveis.

De acordo com Batistaet al (2011), durante a década de 1990, a agricultura brasileira foi

impulsionada através do investimento em tecnologia, e a cultura da soja teve sua cadeia

produtiva reestruturada, tornando-se ainda mais importante para o agronegócio

brasileiro. Essa revisão histórica da soja nos ajuda a entender porque o Brasil é

apontado como um grande exportador mundial, como afirma Batistaet al (2011) “O

Brasil é o segundo maior produtor, processador mundial da soja em grão do mundo e o

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segundo exportador mundial de soja, farelo e óleo, garantindo ao país um papel de

grande potencial para o produto.”

A soja gerou emprego e renda no Brasil. No entanto, o número de empregos é diminuto

se comparado com outros setores da economia brasileira, e como característica histórica

da formação territorial do Brasil, a renda gerada pela soja fica concentrada nas mãos de

poucos brasileiros. Além desses problemas, podemos citar a concentração de terras, o

enfraquecimento da agricultura familiar (e consequentemente o êxodo rural e oaumento

da pressão social sobre a cidade), a subjugação do conhecimento tradicional em relação

ao avanço tecnológico, a contaminação dos recursos pedológicos e hídricos, etc.

Os imigrantes japoneses são considerados figuras importantes quando estudamos alguns

produtos da agricultura no Brasil, a soja não é exceção. Segundo os estudos de Barreto

(2004), esta leguminosa começou a ser cultivada no Brasil em 1908 por imigrantes

japoneses, nos estados da região Sul: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Poerschke&Prieb (2005), explicam a expansão da soja no Sul do Brasil. Inicialmente, o cultivo de soja no estado se deu por meio de uma opção de rotação de cultura com o trigo.Partindo daí, começa a saga do grão – Período de Euforia – onde o cultivo começou sua expansão.Crescendo década a década, em 1950 já eram 60 mil hectares cultivados, passando para 100 mil hectaresem 1960, alcançando, assim, posição crescente e de destaque na economia gaúcha, tanto em área decultivo quanto em volume e em valores de produção. Em 1970 o tamanho da produção gaúcha representava 65% do total produzido no Brasil. (POERSCHKE & PRIEB, 2005, p. 5)

A Revolução Verde alterou significativamente o espaço rural de diversos países com a

adoção de produtos biotecnológicos para a elevação da produtividade agrícola mundial.

No Brasil, a soja tornou-se um dos maiores símbolos dessa revolução no campo, pois a

tecnologia aplicada no seu cultivo, viabilizado por tal revolução, permitiu o cultivo em

outras regiões brasileiras.Os investimentos governamentais sempre estiveram voltados

para as técnicas de produção em larga escala, criando possibilidades de cultivodesta

monocultura em regiões nas quais as condições inicialmente eram desfavoráveis. A partir da década de 1980, a soja se expandiu para os estados de Goiás, oeste de Minas Gerais, Bahia, sul do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, dentro do movimento agropecuário em direção ao oeste brasileiro. Atualmente, áreas da Amazônia Legal (região Norte, Mato Grosso e oeste do Maranhão) também estão sendo alvo do avanço do cultivo de soja. (IGREJA, 1988; MUELLER & BUSTAMANTE, 2002apud BARRETO, 2004, p. 2)

O Brasil é reconhecido por ser um grande exportador de produtos agrícolas, e essa

característica tem impulsionado seu desenvolvimento econômico nos últimos anos, pois

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o setor agropecuário brasileiro possui um nível de competitividade elevado no mercado

mundial, desta forma, o agronegócio brasileiro é responsável por 24% do seu Produto

Interno Bruto segundo dados da Confederação Nacional da Agricultura de 2008.

Devido à modernização do cultivo da soja e o empenho do Estado e dos grandes

latifundiários em suprir o mercado exterior com a soja brasileira, este produto tornou-se

um dos maiores símbolos do agronegócio brasileiro.

Apesar de proporcionar crescimento econômico para o país, a soja tornou-se um alvo de

protestos deboa parte dos movimentos sociais, ONG’s, cientistas sociais e para

Ministério Público, pois tornou-se uma constante as denúncias e os estudos sobre os

efeitos deletérios do cultivo da soja no Brasil, seja para as populações tradicionais, os

pequenos agricultores ou simplesmente as parcelas da sociedade civil que foram

afetadas de algum modo pelo cultivo da soja.

A começar pelo enfraquecimento dos pequenos produtores e a submissão dos

conhecimentos tradicionais dessas populações. Sistemáticas vantagens financeiras e

técnico-assistenciais são oferecidas pelo Estado brasileiro para os grandes sojicultores; o

mesmo não ocorre com os pequenos produtores, que não conseguem espaço para se

inserir no mercado, em função das suas especificidades, como também diante da

tecnologia e da mecanização presentes no cultivo da soja.

Não obstante, a produção de soja em larga escala no Brasil pode ser associada ao

conceito de modernização da agricultura que está relacionada diretamente com a

modernização das bases técnicas e de lucratividade, diferente da perspectiva de

modernização que prioriza a análise das relações sociais no processo produtivo. É interessante notar que as transformações que ocorrem no agro, a partir da segunda metade dos anos 60, fortemente pressionada pela expansão do capital industrial, promovem uma reviravolta muito grande em toda a extensão da sociedade brasileira. Ao lado das violentas transferências de populações para o setor urbano, que é promovido por amplo conjunto de fatores, tais como mecanização, a substituição de culturas intensiva em mão-de-obra pela pecuária, o fechamento da fronteira, a aplicação da legislação trabalhista no campo, ou simplesmente pelo uso da violência, etc., ocorre também uma reformulação na mão-de-obra restante no interior das propriedades, com eliminação dos parceiros, agregados, etc., pela disseminação do trabalho assalariado, sobretudo nas grandes propriedades, que se modernizam e se transformam em empresas. Restou às pequenas propriedades a possibilidade da subordinação ao capital industrial, a marginalização, o esfacelamento ou a venda e migração para os centros urbanos. (GONÇALVES NETO, 1997, p. 109)

Neste contexto, a agricultura camponesa não se encaixa no modelo de desenvolvimento

idealizado pelo neoliberalismo e implantado pelo Estado. Tal como assevera

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Gonçalves(2004) ao afirma que essa modernização acontece apenas do ponto de vista

econômico. Para CastrillonFernandéz (2010), o desenvolvimento das relações de

produção é ínfimo, ocasionado principalmente por falta de incentivos governamentais

voltados para o campesinato, com isso ocorre um novo reordenamento do uso dos

territórios rurais, por disputas entre o agronegócio e o campesinato, pelo domínio da

produção de alimentos. São duas coisas completamente contraditórias, o governo estabelece uma politica agrária para o pequeno, e ao mesmo tempo atrai o grande capital [...] com incentivos fiscais e garantias necessárias para obtenção dos grandes financiamentos. (BARATA, 2000, p. 186).

Esses fatores provocam uma série de efeitos deletérios que aumentam a pressão social

nos espaços urbano e rural brasileiro, como o êxodo rural e a utilização de trabalho

escravo. A contratação de trabalhadores em condições análogas ao trabalho escravo é recorrente,sobretudo na abertura de novas áreas para o plantio da soja, em que há maior demanda por mão-de-obra. Entre 1995 e 2004, foram resgatados cerca de 12 mil trabalhadores rurais em condições análogas ao trabalho escravo, dos quais 2.400 foram contratados temporariamente para a abertura de áreas para o plantio da soja no Mato Grosso. (FOCUS, 2010, p. 4)

Um argumento dos setores favoráveis ao cultivo da soja é a geração de emprego e

renda. No entanto, estudos comprovam que a mecanização intensiva do cultivo da soja

faz com que os empregos gerados nesse setor sejam bastante diminutos se comparados

com outros setores da economia brasileira, pois, segundo a FOCUS (2010) “Enquanto a

produção de soja cresceu mais de 2,8 vezes entre 1985 e 2006, a oferta de postos de

trabalho ficou quatro vezes menor nesse período.” E apesar do cultivo da soja gerar

renda, ela não é distribuída, visto que o seu cultivo dá-se em áreas de grandes extensões

territoriais, cujos proprietários devem possuir um elevado poder aquisitivo para

investimento em tecnologia.

Noronha e Schelesinger(2006)analisam a violação aos direitos humanos e alguns

aspectos políticos da expansão da fronteira da soja no Brasil. A expansão da soja é responsável por uma série de violações dos direitos humanos, incluindo assassinatos de lideranças rurais, expulsão de agricultores familiares, desaparecimento de comunidades rurais, desmatamento, contaminação das águas, dentre outros. (NORONHA&SCHELESINGER, 2006, p. 8)

A soja é uma leguminosa (em grande parte transgênica)que emprega grande quantidade

de agrotóxicoscomprometendo o meio ambiente e a saúde humana a nível local, como

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constatado na reportagem de Vezzali (2006), relatando que na região Sul do estado do

Piauí,vários trabalhadores de fazendas produtoras de soja da região foram contaminados

por não possuírem equipamentos de proteção, bem como, por desconhecerem técnicas

adequada no trato com os agrotóxicos. Na mesma reportagem, o pesquisadorJorginei

Morais da Universidade Federal do Piauí afirma que: Os agrotóxicos mais utilizados na lavoura de soja contêm organofosforados, carbamatos ou piretróides. De acordo com dados da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) do Estado de São Paulo, esses três tipos de substâncias podem intoxicar o trabalhador se houver contato do produto com a pele - por respingos ou pelo uso de objetos contaminados - ou ainda por via respiratória e ingestão acidental. Se o nível de intoxicação é agudo, os sintomas surgem logo após a exposição ao produto e podem levar o trabalhador à morte. Dependendo do nível de contaminação, podem aparecer sintomas como dor-de-cabeça, fraqueza, náuseas, tremores no corpo ou dor de estômago. Como esses produtos químicos se acumulam no organismo, após um longo prazo, podem ocorrer câncer, doenças renais ou lesão hepática.(VEZZALI, 2006, p. 2)

Além desses efeitos no organismo humano, o cultivo da soja é responsável por

gravíssimos problemas ambientais, como por exemplo: a erosão do solo, como também

consumo excessivo de água em seu processo produtivo - cerca de dois mil litros de água

para cada quilo de soja (FOCUS, 2010, p. 6).

Desde 1980, a região Centro-Oeste vem se destacando na produção de grãos, e no início

dos anos 1990, esta passou a ser a maior produtora de soja do país, principalmente o

estado do Mato grosso, passando a ser o principal pólo de produção agrícola. No

entanto cabe destacar que este Estado também tem o maior índice de desmatamento do

país, estudos realizados mostram a estreita relação existente entre o desmatamento e o

cultivo da soja. Paralelamente, a área plantada com soja noEstado aumentou constantemente no período considerado, passando de 2,8 milhões dehectares em 2000 para cerca de 5,9 milhões em 2006, equivalendo a um crescimento de110,4%. Nesse caso, a produção de soja avançou sobre áreas já desmatadas em função dapecuária extensiva, muito desenvolvida na região. Ou seja, na prática, o primeiro motivoeconômico do desmatamento local é a pecuária de corte a qual, na maior parte dos casos dá lugar, posteriormente, à produção de soja. Um processo que se reproduz para o norte do país,avançando sobre o Pará e o Amazonas. (BRUM et al, p.13)

A monocultura da soja associada à pecuária extensiva vem abrindo novas fronteiras e

remanescente do Cerrado nordestino e na região amazônica,e nesta, tem como eixo

principal as rodovias e hidrovias que facilitam a penetração na região como também

viabiliza o escoamento da produção, a exemplos podem ser citadas as BR-163,BR-363 e

BR- 320. Lavorente (2011) explica a utilização de hidrovias para o escoamento da soja.

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Para o escoamento da soja, a hidrovia do Rio Madeira é utilizada entre os trechos de Porto Velho/RO até o terminal de Itacoatiara/AM, ou até o Porto de Manaus/AM, ou até o Porto de Santarém/PA. A soja segue das regiões do Mato Grosso até Porto Velho/RO via modal rodoviário, onde ocorre a troca do modal rodoviário para fluvial. (LAVORENTE, 2011, p. 22)

A questão ambiental é agravada na região quando essa monocultura é cultivada em

grandes áreas de origem devolutas ou ate mesmo em áreas de florestas.Sua expansão

inicialmente se justificava pelas áreas de cerrado, campos naturais eáreas degradadas

pelo uso da pecuária. O discurso utilizado era de que não se desmatava novas áreas na

Amazônia, apenas reutilizava as áreas com pouco suporte para a criação de animais. No

entanto pesquisas feitas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais mostram que as

áreas que mais sofreram com o desmatamento foram as áreas que hoje estão sendo

cultivados pela soja (LIMA & MAY, 2005), mesmo que não houvesse esta

comprovação, ainda assim, poderíamos afirmar que uma prática comum é a introdução

da soja em áreas ocupadas pela pecuária, empurrando esta para novas áreas de floresta,

ou seja, a pecuária teria um papel de abrir fronteira para a introdução da sojicultora.

Neste contexto, a Amazônia passa a ser a mais nova fronteira a ser transposta pelo

agronegócio. E na Amazônia a mais nova área a serocupada por esse tipo de

empreendimento é no entorno do município de Santarém na região Oeste do Estado do

Pará.

Desde as décadas de 1980 o governo paraense vem viabilizando infraestrutura e

incentivos fiscais para a implantação do agronegócio na região, este empreendimento,

sempre foi visto pelo Estado como um meio de integração e desenvolvimento

econômico da região. A partir de então asregiões nordeste, sudeste e oeste paraense

foram alvos de investimentos governamentais para que o agronegócio da soja se

instalasse nesta unidade da federação em áreas estrategicamente pensadas pelo

capital.Taisincentivos podem ser notados no próprio PPA (Plano Plurianual) do governo

Estadual. Tais elementos serão elencados a seguir com mais clareza, assim como as

rodovias e incentivos ao crédito, que serviram de base para esse novo modo de

produção em largara escala.

A fronteira do agronegócio em Santarém-PA O município de Santarém é o segundo maior centro socioeconômico do Pará, e localiza-

se no oeste desse estado, às margens do rio Tapajós, no bioma amazônico. Segundo

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dados do censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de

2010, Santarém possui aproximadamente 294.580 habitantes e uma área de 22.887 km2

(Mapa 1).

Mapa 1: Município de Santarém

Iniciamos essa discussão com o conceito de fronteira do capital, para melhor

compreendermos a dinâmica que ocorre em nosso objeto de estudo: a cidade de

Santarém. Como é de sua lógica, o capital procura os lugares que proporcionam maiores lucros: força de trabalho mais barata; menores impostos; leis ambientais mais flexíveis; sindicatos mais fracos; legislações trabalhistas e fiscais mais dóceis; equipamentos públicos apropriados; boa infraestrutura de circulação e de comunicação, etc. É assim que o capital se aproveita da contingência de um espaço já construído para aprofundar as desigualdades e as diferenciações socioterritoriais, que por sua vez são o motor de novas compartimentações territoriais (CATAIA, 2007, p.s)

Assim, o território a ser transposto pela fronteira do agronegócio passa a ser o território

amazônico, pois esta região, além de possuir grandes extensões de terras economicamente

“desocupadas” que desde 1960 tornaram-se alvo de políticas estratégicas por parte do Estado,

para ocupar e assegurar o território, também é alvo do capital que explora seus recursos naturais

e desterritorializa populações tradicionais de seus lócus de vivência. Nesse período também

aconteceu a expansão da fronteira com os incentivos à migração nordestina e estímulos a

pecuária, tais como;

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Incentivos fiscais e créditos especiais a baixos juros são mecanismos seletivos que subsidiam a implantação dominante da empresa agropecuária vinculada a firmas nacionais e multinacionais. Além disso, o Estado desenvolve programas de distribuição de terras em locais estratégicos, de modo a atender a interesses de grupos sociais diversos e a cooptar massas de população rural. Os incentivos dados pelos militares serviram como um paraíso fiscal onde muitos projetos eram fantasmas e a deficiência de infraestrutura era latente.(ALMEIDA, 2010, p. 4)

Na década seguinte, a infraestrutura da região começa a ser modificada assim como sua

paisagem, neste contexto é criada aSuperintendência de Desenvolvimento daAmazônia

(SUDAM) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Estes

foram (e são) instrumentos do governo para uso e apropriação da terra pelo capital na

região. Neste contexto, a Amazônia e em especial o Pará, torna-se uma fronteira

agrícola do capital a ser transposta.A partir de 1997 o agronegócio da soja torna-se mais

incisivo na região do oeste do Pará, principalmente por incentivos governamentais e ao

crédito, como pode ser verificada na implantação do Banco da Amazônia (BASA) e seu

financiamento ao PRONAF, o qual trouxe uma política de financiamento de produção

agrícola. Porém, esse financiamento apóia apenas os grandes produtores rurais,

deixando à margem a agricultura camponesa. As diversas avaliações reconhecem que o Pronaf, sob a forma de crédito individual ou de subvenção para equipamentos coletivos, beneficiou sobretudo os agricultores familiares mais dotados de capital e melhor articulados com a rede bancária, essencialmente nos Estados do Sul. (ABRAMOVAY & VEIGA, 1999; ABRAMOVAY & PIKETTY, 2005; CARNEIRO, 1997; IBASE, 1999 apud SABOURIN, 2007, p. 723).

O Estado considera a agricultura familiar de grande extensão como um alicerce para o

agronegócio brasileiro, que ajuda a promover um saldo comercial positivo na balança

comercial. Através do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar -

PRONAF, o Estado incentiva o crescimento da agricultura nacional, para melhor

competitividade a nível mundial, com insumos aos pequenos e grandes produtores. No

entanto, o crédito é maior aos proprietários de grandes extensões, que exercem

atividades monocultoras, enquanto o camponês não consegue competir com os produtos

oriundos de grandes extensões. Essas considerações podem ser observadas no município

de Santarém, onde essa dinâmica torna-se mais incisiva a partir de 1997, com a chegada

de grandes sojicultores de origem mato-grossense e sulista.

As propagandas feitas pela Prefeitura do município, alardeava uma vantagem

pedológica sobre a fertilidade dos solos da microrregião de Santarém (Alenquer,Belterra,Curuá, Santarém, Monte Alegre, Faro, Juruti, Óbidos, Oriximiná e Prainha),

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em relação às outras microrregiões do estado. O grande entrave para o cultivo dessas

monoculturas nos solos da Amazônia é o fato de serem naturalmente ácidos. Este

fenômeno é explicado pela elevada e constante densidade pluviométrica, ocasionando

lixiviação dos solos, isto é, a matéria orgânica é constantemente levada pela água da

chuva, fazendo com que se tenha pouca fertilidade. Porém, as florestas densas são

mantidas pelos restos de matéria orgânica produzida pela própria floresta como folhas e

frutos, acontecendo amanutenção de nutrientes da biomassa do solo. Todavia, quando se

desmata para cultivos agrícolas, a acidez do solo aumenta ainda mais, pois o solo fica

sem a manutenção natural de sua biomassa, isso ocasiona uma lixiviação mais intensa,

pois não haverá interceptação da água no dossel das árvores caindo diretamente no

soloprovocando erosões. No entanto, a microrregião de Santarém é caracterizada por ter

uma considerável áreade várzea,que diminui a acidez do soloe atrai os interesses

sojicultores.

Impactos socioambientais da soja em Santarém Diante do panorama apresentado, Santarém tornou-se alvo de investimentos de grande e

médio porte, sendo estes, grandes causadores de degradação ambiental. Este fato pode

ser observado na mudança da paisagem decorrente dos últimos anos, sendo que essas

atividades econômicas acarretam prejuízos aos ecossistemas da região e aceleram

processoscomo erosão dos solos; contaminação de cursos d'água; destruição ou

fragmentação de "habitats" naturais e da vegetação;migrações quando localizadas em

áreas densamente povoadas podem resultar em desapropriações para manejo de

atividades econômicas.Santarém vem tendo suas características naturaismodificadas

através de investimentos econômicos de multinacionais instaladas na Amazônia. Sendo

que com o passar do tempo nenhum governo se preocupou com os impactos e mudanças

de paisagem que esses investimentos poderiam causar a esta região. Observa-se também

que não se tem um estudo mais aprofundado com o intuito de se saber quais as

características e modo de produção dos povos que já se situam nesta área e quais os

manejos adequados para se utilizar neste solo, já que o solo da Amazônia é

naturalmente ácido.

O discurso dos agentes hegemônicos é de que o cultivo em grandes extensões, e a

monocultura na Santarém só será feita em florestas secundárias, porém o que acontece

realmente é que tanto as florestas primáriase secundárias são degradadas por essas

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atividades, sendo que as florestas secundárias também são ricas em biodiversidade, e

servem como porta de entrada para a exploração das florestas primárias.

Apesar das áreas de várzea reduzir a acidez do solo, os produtores utilizam agrotóxicos

e fertilizantes para produzir nessas terras. Porém, o uso desses produtos provoca danos

ao ecossistema e ao modo de vida das populações locais.

Diante da necessidade de atrair investimentos para o Pará, o Estado, através de

mecanismos como o Plano Plurianual 2000-2003- Agronegócio, o Pará investe

nisso!(PPA), promoveu uma série de incentivos fiscais e estruturais para a instalação de

grandes companhias financeiras nacionais e internacionais no Pará. Um dos efeitos

desse incentivo estatal, foi a implantação do porto graneleiro da Cargill em Santarém,

com o intuito de transformar esse município em um grande centro exportador de grãos

de soja. Embora a mídia e os agentes hegemônicos repassem para a sociedade uma

visão romântica dos efeitos da soja em Santarém, a realidade denunciada por

movimentos sociais e ONG’s como o Greenpeace mostra os efeitos avassaladores sobre

a dinâmica fundiária no município.

Uma das características da organização agrária da Amazônia antes da década de 1970,

era a grande quantidade de posseiros, ou seja, caboclos, colonos, ribeirinhos, indígenas,

quilombolas, entre outros. Populações que viviam da exploração vegetal e animal da

Amazônia, em terras devolutas. Com a chegada da Cargill, ocorreu uma migração

desordenada de sojicultores de outras regiões do Brasil, que pressionaram posseiros a

deixarem seus lotes, com o apoio de órgãos estatais, como o Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária - INCRA.

Com uma política de colonização dos lotes “improdutivos”, o INCRA incentiva a

legalização e instalação desses novos agentes produtivos, os sojicultores, pois estes

produzem em larga escala um produto eu possui um grande valor econômico para a

exportação. Com essa visão precipitada de colonização, o INCRA atrasa ainda mais a

reforma agrária, pois ele incentiva o latifúndio, uma vez que o pequeno agricultor é

impulsionado a vender seu pequeno lote em decorrência de quantias tentadoras para o

pequeno produtor, e que na realidade, é bem menor que o valor real do terreno. Em

casos mais graves, quando o camponês se recusa a vender o lote, este passa a sofrer

ameaças todo tipo de ameaça. Como Noronha e Schlesinger (2006) explicam “Um

processo aparentemente legal, mas que contémelementos de violência e crueldade [...]

perda ou mudança de vizinhança.”

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No final de 2003, o Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras deSantarém (STTR) contabilizou a saída de 500 famílias do campo e, atualmente,calcula-se que esse número tenha triplicado. As comunidades do Paca e doPrata já desapareceram. A comunidade Boa Esperança, importante na produção de farinha de mandioca, também está em processo de desaparecimento,assim como Açaizal, que tinha 45 famílias e atualmente tem apenas sete.Esse processo de aquisição de terras no planalto santareno, maispróximo à sede do município e ao longo das rodovias, se diferencia do queocorre nas áreas de várzea, no oeste do município. Nessas áreas, onde selocaliza a produção extrativista de origem paraense, o Sindicato denuncia apressão do agronegócio sobre a terra com grilagem, expulsão de famílias equeima de casas e roçados, como ocorreu na Gleba Nova Olinda. (NORONHA &SCHELESINGER, 2006, p. 83-84)

Esses fatos agravam uma série de questões sociais em Santarém, pois a cidade não

estava preparada estruturalmente para comportar esta população oriunda do campo. O

êxodo rural provoca uma maior necessidadedo município fornecer saúde, educação,

infraestrutura, moradia digna, lazer, entre outras áreas que os santarenosnecessitam e

merecem. Depois da instalação do porto graneleiro da Cargill, vários agricultores

falidos por não conseguirem competir com os sojicultores viram-se obrigados a vir para

a sede do município à procura de emprego, que nem sempre encontram, e acabam

tornando-se não-cidadãos. O resultado de todos esses agravos é um espaço empobrecido e que também se empobrece: material, social, política, cultural e moralmente. Diante de tantos abusos, o cidadão se torna impotente, a começar pelas distorções da representação política. [...] A própria existência vivida mostra a cada qual que o espaço em que vivemos é, um espaço sem cidadãos. (SANTOS, 2007, p. 65)

Considerações finais A partir da revisão bibliográfica e documental sobre a soja, e os efeitos socioambientais

de seu cultivo no Brasil e em Santarém, destacamos alguns pontos relevantes. A soja é

muito importante para a balança comercial brasileira, masapesar de promover

crescimento econômico para o Brasil, a renda gerada não é distribuída equitativamente,

e sua quantidade de empregos é menor se comparada com outros setores da economia

nacional. A soja era cultivada no Brasil a partir do início do século XX, no entanto, seu

cultivo ganhou importância a partir da Revolução Verde e foi novamente impulsionada

na década de 90. Ela se tornou um dos maiores símbolos do agronegócio brasileiro, ao

mesmo tempo em que acelerou o desmatamento, a contaminação do solo e dos recursos

hídricos, e expropriou diversas populações após subjugar seus conhecimentos

tradicionais.

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O imediatismo típico da organização administrativa brasileira gerou uma necessidade do

Estado crescer economicamente em um curto espaço de tempo através dos incentivos à

instalação de grandes companhias nacionais e principalmente internacionais no espaço

amazônico, como a Cargill, que após receber incentivos estatais, se instalou em

Santarém e acirrando os conflitos fundiários e êxodo rural no município, agravando

ainda mais a precária infraestrutura de serviços públicos e impede uma condição digna

de vida aos santarenos oriundos do campo. Desta forma podemos dizer que o capital se

territorializa através do agronegócio, transpondo as barreiras sociais e ambientais que o

espaço oferece.

Os agentes hegemônicos desenvolvem mecanismos de infraestrutura para suprir as

necessidades do capital, como pode ser notado na construção da BR-163 E o porto da

Cargill na cidade de Santarém-PA. Apesar dos solos santarenos serem ácidos e

necessitarem de uma maior quantidade de agrotóxicos, e da logística oferecida não ser

de primeira qualidade, estas características são compensadas pelo fato do custo da terra

ser bem menor se comparado lotes de microrregiões vizinhas, e as leis ambientais são

mais frágeis. Isso tudo se reflete em conflitos pelo uso da terra como foram elencados

acima.

Vale ressalvar que os estudos feitos nesta região ainda são preliminares e que não

podemos apontar resultados e consequências mais precisos a respeito da área de estudo,

tendo em vista que nossa pesquisa ainda se encontra em andamento, todavia, a partir

destes dados preliminares, guardadas as especificidades da região alvo de nossa

pesquisa, podemos fazer um paralelo com outros municípios do país que passaram pelo

mesmo processo de modernização conservadora de sua agricultura através da produção

extensiva da soja, as consequências socioambientais decorrem nos mesmos moldes de

Santarém.

Notas ________________ 1 Acadêmica do 5° semestre do curso de Geografia pela Universidade Federal do Oeste do Pará - [email protected] 2Acadêmico do 5° semestre do curso de Geografia pela Universidade Federal do Oeste do Pará - [email protected] 3Professor Adjunto da Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA. [email protected]

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