a exclusão de sócios na sociedade limitada de acordo com o código civil de 2002
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A Exclusão de Sócios Na Sociedade Limitada de Acordo Com o Código Civil de 2002TRANSCRIPT
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DANIEL DE AVILA VIO
A EXCLUSO DE SCIOS
NA SOCIEDADE LIMITADA
DE ACORDO COM O CDIGO CIVIL DE 2002
Dissertao apresentada Faculdade de
Direito da Universidade de So Paulo, sob a
orientao do Prof. Dr. Haroldo Malheiros
Duclerc Verosa, como requisito parcial para a
obteno do ttulo de Mestre em Direito
Comercial.
FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SO PAULO
So Paulo
2008
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AGRADECIMENTOS
Ao Professor Haroldo Malheiros Duclerc Verosa pela oportunidade e pela valiosa
orientao. Aos Professores Marcos Paulo de Almeida Salles e Francisco Satiro de Souza
Junior pelo precioso debate durante o exame de qualificao. Aos meus colegas tantos,
mas em especial Daniel, Joana e Juliana , pelo inestimvel apoio.
A meus pais, minha irm e Anna, por tudo.
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NDICE ANALTICO
INTRODUO....................................................................................................................3 1. HISTRICO E DIREITO ESTRANGEIRO........................................................8 1.1. Perodo Romano e Medieval .............................................................................8 1.2. A Positivao do Instituto ...............................................................................12 1.2.1. Alemanha e ustria ........................................................................................12 1.2.2. Frana..............................................................................................................15 1.2.3. Espanha...........................................................................................................18 1.2.4. Itlia ................................................................................................................20 1.2.5. Portugal...........................................................................................................29 1.2.6. Common Law ..................................................................................................31 1.3. Desenvolvimento do Instituto no Brasil .........................................................34 2. FUNDAMENTO TELEOLGICO DA EXCLUSO DE SCIO...................50 2.1. A Excluso de Pleno Direito............................................................................51 2.1.1. A Liquidao da Quota em Funo de Dvida Particular do Scio ................51 2.1.2. A Excluso do Scio Falido............................................................................62 2.2. A Excluso Facultativa ....................................................................................68 2.2.1. Excluso e Preservao da Empresa...............................................................68 2.2.2. Excluso de Scio e Propenso a Investir ......................................................72 2.2.3. O Sentido da Excluso Extrajudicial de Scio ...............................................75 3. FUNDAMENTO DOGMTICO .........................................................................80 3.1. Disciplina Legal Taxativa................................................................................80 3.2. Poder Corporativo Disciplinar .......................................................................83 3.3. Resoluo do Contrato por Inadimplemento ................................................86 3.4. Inadequao da Unicidade de Fundamento Dogmtico...............................91 4. A SOCIEDADE LIMITADA NO CDIGO CIVIL DE 2002 ...........................95 4.1. Nota Crtica ao Cdigo Civil de 2002 em Matria de Sociedades ...............95 4.2. Normas Aplicveis Sociedade Limitada ...................................................102 4.3. A Sociedade Limitada entre as Sociedades de Pessoas e de Capitais........112 5. AS CAUSAS DE EXCLUSO............................................................................118 5.1. Crtica Doutrina do Rompimento da Affectio Societatis .........................127 5.2. Violao do Dever de Colaborao ..............................................................137 5.2.1. No Integralizao da Quota Social..............................................................138
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5.2.2. Incapacidade Superveniente e no Prestao de Servio..............................141 5.3. Violao do Dever de Lealdade ....................................................................146 6. O PROCEDIMENTO DE EXCLUSO ............................................................151 6.1. A Excluso de Pleno Direito..........................................................................151 6.2. A Excluso Facultativa ..................................................................................155 6.2.1. Titularidade do Direito Material de Excluso e Legitimidade Ativa............155 6.2.2. Prazo para a Excluso e para a Reao Excluso ......................................159 6.2.3. Excluso Judicial ..........................................................................................163 6.2.4. Excluso Extrajudicial ..................................................................................166 6.2.4.1. Previso Contratual Expressa ....................................................................167 6.2.4.2. Reunio e Assemblia de Excluso e Defesa do Excluendo..................172 7. ASPECTOS CONTROVERSOS DA EXCLUSO DE SCIO .....................184 7.1. A Clusula de Vedao da Excluso de Scio .............................................184 7.2. A Excluso do Scio Administrador ............................................................188 7.3. Excluso em Sociedade com Dois Scios......................................................190 7.4. A Excluso do Scio Majoritrio..................................................................195 7.5. Excluso de Scio na Sociedade em Liquidao .........................................197 8. EFEITOS DA EXCLUSO DE SCIO............................................................202 8.1. O Momento da Excluso ...............................................................................202 8.2. Apurao dos Haveres e Destino das Quotas do Excludo.........................206 8.3. Responsabilidade Residual do Scio Excludo ............................................211 8.4. Modificao da Firma Social ........................................................................212 CONSIDERAES CONCLUSIVAS ..........................................................................215 BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................219 RESUMO ..........................................................................................................................228
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INTRODUO O presente estudo tem por objetivo analisar a atual disciplina do instituto da excluso de
scios no Direito brasileiro, tomando em considerao o impacto da promulgao do
Cdigo Civil de 2002 (Lei Federal n 10.406/02).
A primeira e necessria delimitao do tema investigado decorre do prprio conceito de
excluso, entendido para os fins do trabalho como a perda da qualidade de scio
contrariamente vontade do prprio quotista, ou a prescindir desta ltima. Dessa maneira,
afastam-se do escopo da anlise hipteses como, por exemplo, a morte do scio na qual
este, obviamente, j no mais existe como centro de imputao de direitos e obrigaes ou
titular de vontade ou o seu afastamento em funo de exerccio de opo de compra.
Neste ltimo caso, ainda que exista oposio no momento de concretizao da venda, h
uma manifestao de vontade anterior que impede a caracterizao do negcio como
excluso.
Alm disso, tambm fogem ao foco principal da presente investigao as hipteses em que
a perda compulsria da qualidade de scio o resultado de foras externas e estranhas
sociedade. Pode-se citar, por exemplo, a hiptese em que as autoridades de defesa da
concorrncia determinem a venda obrigatria da participao em determinada sociedade,
como condio aprovao de uma operao de fuso. Uma outra possibilidade de tal
gnero a expropriao pelo Estado de quotas ou aes em funo de questo de interesse
pblico.
O instituto da excluso de scio, tal qual abordado na presente anlise, figura tpica do
Direito Privado e, no mbito deste, interessa ao Direito Societrio. Nesse sentido, um dos
objetivos do trabalho ser justamente o de sublinhar as diferenas estruturais entre os casos
de excluso de pleno direito, novidade introduzida no ordenamento brasileiro por
inspirao da lei italiana, e a excluso facultativa, tradicional objeto de anlise da doutrina
brasileira.
Um outro importante fator de restrio do escopo da pesquisa o tipo societrio objeto do
estudo. A anlise concentra-se exclusivamente nas sociedades limitadas, conforme
disciplinadas no Cdigo Civil de 2002, e as referncias a outras espcies de sociedade ou
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s associaes so feitas apenas para fins de comparao, analogia e suporte ao trabalho
principal.
Por fim, o terceiro elemento de delimitao do tema temporal, na medida em que o cerne
da pesquisa a disciplina contempornea da matria. Isso no significa que a anlise
histrica no seja relevante. Em razo da construo predominantemente doutrinria e
jurisprudencial do instituto da excluso de scios no Brasil, pode-se afirmar que a
investigao histrica possui importncia redobrada. Um dos propsitos do trabalho
inclusive apontar como a doutrina da dissoluo parcial continua a ecoar em nossos
tribunais, com reflexos negativos, a despeito da promulgao de novas normas societrias
que com todos os seus inegveis defeitos despiram tal tese de sentido, uma vez que
eliminaram disposies individualistas do Cdigo Comercial de 1850, as quais
determinavam a dissoluo (total ou strictu sensu) da sociedade em razo de causas
atinentes pessoa de um dos scios.
Com efeito, o trabalho se inicia com um sucinto exame do tratamento normativo atribudo
excluso de scios no Direito estrangeiro, para sucessivamente se debruar sobre o longo
percurso de incorporao do instituto no Direito ptrio. De qualquer modo, importante
sublinhar que o levantamento histrico possui carter meramente ancilar, servindo apenas
para contextualizao e suporte da discusso da disciplina contempornea do instituto.
No que diz respeito s justificativas para a escolha do tema, possvel identificar inmeras
razes aptas a confirmar sua relevncia e sua atualidade. A excluso de scio possui
enorme importncia, tanto sob uma perspectiva estritamente conceitual e terica, quanto
em termos prticos e sob um ponto de vista scio-econmico.
Sob a tica dogmtica e conceitual, j dizia Arturo Dalmartello, autor de uma das mais
importantes obras sobre tema, que a excluso representa uma lente de aumento que permite
avaliar detalhadamente todos os aspectos e contornos do fenmeno societrio1. Com efeito,
a excluso uma questo transversal a todo o Direito Societrio. O estudo de tal instituto
impe uma investigao da prpria natureza dogmtica do conceito de sociedade, das
1 Listituto dellesclusione fornisce, per cos dire, la lente dingrandimento che rivela, in ogni suo contorno e in ogni suo dettaglio la vera essenza giuridica della collaborazione sociale. in A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 161.
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correlaes entre empresa e sociedade, das diferenas estruturais entre os diversos tipos
societrios e das obrigaes atribuveis aos scios em cada um deles.
A esse respeito, importante mencionar que se adota como premissa para o estudo a
natureza contratual das sociedades, com plena adeso tese do contrato plurilateral
tambm dito associativo ou de comunho de escopo , consolidada pelo ilustre e saudoso
Professor Tullio Ascarelli2. Em tal mbito, o instituto desponta, de fato, como um elemento
de reafirmao da especialidade e autonomia da categoria dos contratos plurilaterais, na
medida em que, como se argumenta a seguir, representa uma forma peculiar de incidncia
do preceito da resoluo dos contratos por inadimplemento, antes tido como
exclusivamente aplicvel aos contratos bilaterais. Os Captulos 2 e 3 do estudo so
dedicados justamente investigao do sentido e da natureza jurdica do instituto da
excluso de scios.
Alm de sua relevncia estritamente conceitual, convm recordar que, em termos scio-
econmicos, a grande difuso das sociedades limitadas no Brasil faz com que todas as
questes que possuam um relevante impacto sobre a sua estabilidade e preservao
categoria na qual o instituto da excluso inequivocamente se enquadra tenham
igualmente uma grande importncia para a realidade das atividades econmicas no pas.
Com efeito, levantamento do Departamento Nacional de Registro Comrcio DNRC
indica que entre o perodo de 1985 a 2003, as sociedades limitadas (ento regidas pelo
Decreto 3.708/19) representaram mais de 99,9% das sociedades constitudas no Brasil3.
A defesa da atualidade de um tema objeto de pesquisa jurdica, por outro lado, requer a
percepo de que o debate doutrinrio que o cerca no se encontra totalmente esgotado,
que as opinies dos estudiosos no foram definitivamente decantadas pela jurisprudncia,
existindo ainda dvidas a serem dirimidas, posies discordantes e questes em aberto.
Tambm sob esse aspecto, uma investigao dedicada ao instituto da excluso de scios
revela-se mais do que justificada. No Brasil, o debate em torno dos aspectos polmicos do
mecanismo da excluso nunca foi definitivamente superado. Mesmo s vsperas da
2 T. ASCARELLI, O Contrato Plurilateral, p. 256. 3 De acordo com as estatsticas divulgadas pelo Departamento Nacional de Registro do Comrcio DNRC, no perodo compreendido entre 1985 e 2003 foram constitudas no pas 4.300.257 sociedades limitadas, 20.080 sociedades annimas e apenas 4.534 sociedades classificadas sobre a rubrica outros tipos, que exclui as sociedades cooperativas (www.dnrc.gov.br).
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promulgao do Cdigo Civil de 2002, nossos tribunais produziam decises contraditrias
e a doutrina se debatia em relao a questes como a necessidade de justa causa (e o seu
contedo) e a possibilidade de excluso extrajudicial na presena de clusula restritiva de
deliberao majoritria.
Com a promulgao do novo diploma, entretanto, multiplicam-se as questes que exigem
interpretao e anlise. O Cdigo Civil de 2002, com efeito, introduz em nosso
ordenamento o primeiro tratamento minimamente pormenorizado e sistemtico do regime
da excluso de scios, antes relegado a normas relativas ao Registro do Comrcio, que
apenas tangenciavam a matria. Ao faz-lo, contudo, o novo diploma valeu-se de um
intrincado e confuso sistema de remisses. Nesse sentido, natural e inevitvel que
proliferem opinies divergentes na doutrina sobre os mais variados aspectos da nova
norma, fato que por si j tornaria o tema da excluso merecedor de uma anlise mais
detida.
por essa razo que o Captulo 4 do presente trabalho dedica-se a traar um breve
panorama das novas normas societrias introduzidas pelo Cdigo Civil de 2002, avaliando-
as criticamente. O foco principal de tal passagem do estudo reconstruir o perfil elementar
da atual sociedade limitada, o qual, no sem grande esforo hermenutico, emerge da
confusa e intrincada rede de remisses normativas e referncias estabelecida pelo novo
diploma.
Tendo j apontado as diferenas estruturais entre as hipteses de excluso de pleno direito
e excluso facultativa e eleito a tese da resoluo contratual como fundamento deste ltimo
instituto, o passo seguinte evidentemente examinar os deveres atribudos ou atribuveis
aos quotistas, nos termos da lei ou consoante o contrato social, cujo inadimplemento
poderia ensejar a aplicao da expulso de scio. Desse modo, o Captulo 5 destina-se
anlise das principais causas de excluso.
No Captulo 6, trata-se dos procedimentos de excluso, identificando trs vias principais
estabelecidas, ainda que nebulosamente, pelo Cdigo Civil de 2002: a excluso de pleno
direito, a excluso judicial e a excluso extrajudicial estas duas ltimas, formas de
excluso facultativa. Enfrentam-se, no Captulo 7, algumas questes particularmente
controversas em matria de excluso, tal como a excluso em sociedade com dois scios.
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O Captulo 8 aborda, enfim, as principais conseqncias decorrentes da efetivao da
expulso de um quotista, sem contudo aprofundar-se nos detalhes da questo da apurao
de haveres.
Em relao s fontes doutrinrias consultadas, de se apontar o nmero relativamente
pequeno de monografias, publicadas no Brasil, dedicadas especificamente excluso de
scios, o qual no parece estar altura da relevncia do tema. Convm recordar que a
interpretao prevalente do artigo 18, do revogado Decreto 3.708/19, tornou aplicvel
antiga sociedade por quotas a maior parte dos institutos tpicos das sociedades annimas.
Este fato, somado ao prprio laconismo do Decreto 3.708/19, permitia a transposio
quase direta s sociedades por quotas da maior parte das concluses obtidas no mbito das
sociedades annimas e compeliu os doutrinadores a se dedicarem quase exclusivamente a
estas ltimas, a despeito da maior difuso do primeiro tipo societrio. Assim, determinados
temas, como a prpria questo da excluso de scios, tornaram-se em certa medida
rfos da devida ateno dos estudiosos, os quais acabaram dedicando-se com maior
nfase a temas que eram, concomitantemente, relevantes tanto para a sociedade annima
quanto para a antiga sociedade por quotas, tal como o direito de recesso.
No que diz respeito ao exame do Direito estrangeiro e, em particular, anlise de Direito
Comparado, merecem destaque sem dvida alguma a jurisprudncia e a doutrina italianas.
Tal ateno especial se justifica pelo papel pioneiro exercido pelos juristas italianos nesta
matria, mesmo antes da promulgao do Cdigo Civil de 1942, mas tambm pela
inegvel inspirao de tal diploma na elaborao das normas societrias do Cdigo Civil
Brasileiro de 2002. De qualquer forma, ocorre assinalar que, enquanto a anlise
panormica do Direito estrangeiro foi sobreposta ao levantamento histrico, no Captulo 1,
o trabalho no contm um captulo dedicado especificamente investigao de Direito
Comparado. Esta ltima est disseminada nas demais passagens do estudo, mas apenas
pontualmente, em suporte a anlise do prprio ordenamento brasileiro.
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1. HISTRICO E DIREITO ESTRANGEIRO
Nem os Romanos tivero commercio qual oje se
pratica, e usa, e entende, e conhece, nem o commercio
doje ja o commercio do seculo passado.
Jos Ferreira Borges, Londres, 18301 1.1. Perodo Romano e Medieval
O objetivo essencial do instituto da excluso de scios conciliar uma mudana no quadro
de scios com a sobrevivncia e permanncia da sociedade, enquanto centro de imputao
de direitos e obrigaes. este dado elementar que liga umbilicalmente, tanto em termos
de fundamentos dogmticos, quanto no que tange o seu desenvolvimento histrico, a
excluso de scios a outras hipteses de resoluo do vnculo social limitadamente a um
dos scios, tais como o recesso, a retirada unilateral de scio ou a substituio de scio
falecido.
A despeito da ampla naturalidade com a qual tais conceitos so aceitos na atualidade, a
preservao da sociedade ante uma alterao na composio do quadro de scios encerrou
uma profunda transformao e uma verdadeira ruptura em relao aos paradigmas
clssicos que orientaram os caminhos do Direito Societrio durante sculos e, mesmo hoje,
ainda fazem sentir seu peso. Com efeito, sob influncia direta do Direito Romano,
defendeu-se por geraes a idia de que a retirada de qualquer scio, a qualquer ttulo e por
menor que fosse a sua participao proporcional, acarretaria inelutavelmente o fim da
respectiva sociedade2.
Em Roma, a societas possua uma natureza personalssima e a ela aplicavam-se os cnones
gerais do direito contratual daquele perodo (o qual era estranho noo de contrato
plurilateral ou associativo). Como conseqncia, enquanto modificao de um dos dados
elementares da avena, o afastamento de uma das partes seja por morte, ausncia,
1 J. BORGES, Jurisprudencia do Contracto-Mercantil, e Arestos dos Codigos e Tribunais das Naes mais Cultas da Europa, p. VIII. 2 M. PERRINO, Le Tecniche di Esclusione del Socio dalla Societ, p. 60. H. ESTRELLA, Apurao dos Haveres de Scio, p. 25.
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incapacidade superveniente ou simples ato (discricionrio) de vontade tinha como
resultado inevitvel a dissoluo completa de todo o respectivo arranjo contratual3. A
continuao das mesmas atividades pelos scios remanescentes era sempre vista como a
formao de um contrato de sociedade absolutamente novo e no como sobrevivncia do
contrato original.
Foi apenas no perodo de Justiniano que se admitiu algum temperamento ao rigor de tal
postulado, com o reconhecimento da possibilidade de continuao de uma sociedade em
caso de acordo entre os herdeiros do scio falecido (que assumiriam seus direitos e
obrigaes) e os scios suprstites4.
Assim, os estudiosos da matria afirmam que o Direito Romano no teria conhecido sequer
formas preliminares do instituto da excluso de scio, em nenhuma de suas fases5. Isso no
significa, naturalmente, que a tradio romana no tenha exercido um relevante papel no
desenvolvimento da excluso de scio. Ocorre, entretanto, que tal influncia foi
essencialmente negativa e conservadora, quase que invariavelmente colocando-se como
um obstculo admisso doutrinria de solues de cunho prtico, forjadas no quotidiano
da atividade comercial (entre as quais a excluso de scio).
De fato, toda a histria da excluso de scios marcada por um permanente embate entre,
de um lado, a viso formalista e conservadora, que propugnava pelo trmino da sociedade
como conseqncia lgica e necessria do afastamento de qualquer dos scios, e, do outro
lado, um entendimento pragmtico, com origem predominantemente na prtica contratual
quotidiana dos mercadores e em sua jurisprudncia corporativa, as quais atentavam mais
soluo de dificuldades concretas do que reverncia aos preceitos clssicos.
3 Se cierra de esta manera el paso a toda possibilidad de salida o, incluso, sustitucin de un socio de la sociedad, con la consequencia de que sta permanezca subsistiendo entre los restantes. in R. VILLAVERDE, La Exclusion de Socios Causas Legales, p. 30. 4 Lunico temperamento che il tardo diritto romano port al rigore di questa disciplina [dissoluo da sociedade por questes particulares a um dos scios], quello daver riconosciuto la validit dei patti di non scioglimento pel caso di morte del socio. in A. DALMARTELLO, LEsclusione del Socio dalle Societ Commerciali, p. 7. No mesmo sentido, R. VILLAVERDE, La Exclusion de Socios Causas Legales, p. 31. 5 Listituto della esclusione dei soci non ha traccia nel diritto privato romano, in A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 2.
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Inicialmente, em um tempo em que as sociedades no possuam personalidade jurdica
prpria e, sequer, formas preliminares de autonomia patrimonial, a aplicao dos preceitos
clssicos romanos no representaria uma dificuldade insupervel. Com efeito, se a
existncia de uma determinada sociedade projeta efeitos predominantemente na esfera
patrimonial interna do prprio grupo de scios (tal como a moderna sociedade em conta de
participao), o seu trmino e sua substituio por outra sociedade representam uma
operao no sujeita a maiores dificuldades, extremamente prxima a um simples acerto de
contas.
Tratava-se, efetivamente, de uma operao com conseqncias lgicas e formais mais
vistosas do que seus desdobramentos concretos e materiais; uma questo mais relevante e
interessante para o jurista do que para o comerciante. Em tal hiptese, o recurso ao
arcabouo terico e normativo aplicvel aos contratos bilaterais o qual determina o
trmino do vnculo em funo da perda de um de seus elementos essenciais: (in casu) uma
das partes no traria inconvenientes especialmente graves.
Entretanto, na medida em que se intensifica a projeo dos efeitos externos da sociedade
(projeo esta que seria eventualmente consagrada com a atribuio de personalidade
jurdica prpria e autonomia patrimonial perfeita), a necessria extino do ente societrio
em funo de qualquer alterao em seu quadro de scios se demonstra uma resposta cada
vez mais indesejada e problemtica.
Neste segundo cenrio, o trmino da sociedade deixa de ser uma mera questo de
reorganizao de vnculos internos entre os scios remanescentes, um simples acerto de
contas entre particulares, mas passa a afetar as relaes da sociedade com seus clientes,
parceiros e credores. Com efeito, a sociedade personalizada age e comparece no mercado
em nome prprio, obrigando e vinculando seu patrimnio exclusivo, distinto daquele dos
scios, ainda que existam hipteses de comunicao entre ambas as esferas. Desse modo,
as relaes com terceiros se formam diretamente com a prpria sociedade e no, como
ocorria anteriormente, com um dos scios, que age em nome e no lugar da coletividade de
conscios, amparando-se em uma comunho especial de bens inter partes.
Em tal novo cenrio, a imposio do trmino da sociedade e sua substituio por outra tm
como resultado a extino de um ente ativo, cuja prpria presena no mercado possui um
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valor econmico a ser tutelado pelo Direito. A principal conseqncia, portanto, que a
sobrevivncia e a permanncia do revestimento jurdico ou, melhor, ente titular da empresa
coletiva a sociedade passaram a influir na continuidade e sucesso da atividade
desenvolvida a empresa propriamente dita.
A estreita vinculao entre a atividade empresarial e os efeitos nocivos da extino da
sociedade somada ao espao propcio que o ordenamento corporativo dos mercadores
oferecia para a atividade criadora e pragmtica de novos institutos jurdicos, margem e
muitas vezes em coliso com os postulados clssicos explica a razo pela qual o
desenvolvimento do instituto da excluso de scios ocorreu quase que exclusivamente no
mbito da sociedade comercial. Na maioria dos ordenamentos, no se reconheceu
expressamente a possibilidade de excluso de scios no mbito da sociedade civil salvo
por emprstimo e transposio do Direito Comercial , sendo possvel citar como exemplo
a prpria experincia brasileira anterior vigncia do Cdigo Civil de 2002.
No perodo medieval, por outro lado, j no era tanto o peso da herana romanstica que
impedia a aceitao do remdio da excluso, mas o escopo e uso das sociedades que no
eram com ele de todo compatveis, no favorecendo a sua aplicao ou desenvolvimento.
As sociedades em tal perodo eram, efetivamente, ou a continuao econmica de vnculos
familiares tais como as embrionrias sociedades em nome coletivo , ou ento, estruturas
destinadas a camuflar sob as vestes de lucro a vedada usura ou simplesmente encobrir o
exerccio da atividade comercial por parte daqueles para quem esta era vedada ou tida
como indigna caso das primeiras sociedades em comandita6.
Na primeira hiptese, estavam marcadas por forte vnculo pessoal entre os scios7,
enquanto na segunda os vnculos entre o comerciante que assumia a frente do negcio e o
membro do clero ou da nobreza que figurava como capitalista oculto poderiam ser
desfeitos de acordo com as regras aplicveis aos contratos bilaterais.
Os primeiros passos em favor da explcita e irrestrita aceitao do instituto da excluso de
scios foram tomados no universo do Direito Comercial germnico, ao final do perodo
medieval, primeiramente em mbito contratual, mas com subseqente chancela da
6 F. GALGANO, Lex Mercatoria, p. 44. 7 A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 5-6.
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jurisprudncia. Dalmartello afirma que o pioneirismo germnico nesse campo se deve
viso menos rgida e cristalizada dos cnones do Direito Romano que ento prevalecia
naquela regio8.
1.2. A Positivao do Instituto
1.2.1. Alemanha e ustria
No perodo de consolidao dos estados nacionais europeus, institutos jurdicos como a
excluso de scio, nascidos no seio do direito corporativo mercantil, foram absorvidos pelo
ordenamento estatal e plasmados por algumas das primeiras codificaes. Nesse sentido,
os primeiros diplomas a admitirem expressamente o instituto da excluso de scio foram o
Cdigo Territorial Prussiano (Allgemeines Preuisches Landrecht) de 1794 e o Cdigo
Civil Austraco de 18119.
De fato, os pargrafos 273 e 274 da Parte I, Seo VII, Captulo I, do Cdigo Territorial
Prussiano j estabeleciam a possibilidade de expulso, sempre sob superviso de
autoridade estatal, dos scios que: (i) intencional e repetidamente agissem de forma
contrria aos interesses sociais, (ii) atuassem de forma fraudulenta contra a sociedade, (iii)
fossem condenados criminalmente ou (iv) fossem declarados ausentes10. Na mesma esteira,
o pargrafo 1.210 do Cdigo Civil Austraco de 1811 admitia expressamente a hiptese de
excluso de scio nos casos de: (i) inadimplemento de obrigaes essenciais estabelecidas
no contrato social, (ii) falncia e (iii) quebra de confiana em relao a um dos scios,
resultante de ao penal por crime doloso que pudesse sujeit-lo a pena superior a um
ano11.
8 Un ambiente giuridico del tutto diverso si venne, invece, creando nel moderno diritto germanico, in cui, com noto, gli istituti romanistici non furono accolti in forma rigida e cristallizzata, ma, per ragioni storiche e scientifiche particolari, vennero abbandonati a quella naturale evoluzione che trasforma listituto stesso e lo adatta alle sempre nuove esigenze pratiche. in A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 9. Miguel Reale tambm identifica a origem germnica do instituto, in M. REALE, A excluso de Scio das Sociedades e o Registro do Comrcio, p. 286. 9 M. PERRINO, Le Tecniche di Esclusione del Socio dalla Societ, p. 69. 10 273. Ein Mitglied, welches sich der Erfllung seiner Pflichten beharrlich entzieht, kann noch vor Ablauf der Zeit, oder vor Beendigung des Geschfts, von der Gesellschaft ausgeschlossen werden e 274. Noch mehr ist die Gesellschaft dazu berechtigt, wenn ein Mitglied betrglich gegen dieselbe gehandelt hat, als ein Verbrecher bestraft, oder zur einen Verschwender gerichtlich erklrt worden ist. 11 1210. Wenn ein Mitglied die wesentlichen Bedingungen des Vertrages nicht erfllt; wenn es in Konkurs verfllt; wenn es durch eine oder mehrere gerichtlich strafbare Handlungen, die nur vorstzlich begangen werden knnen und mit mehr als einjhriger Freiheitsstrafe bedroht sind, das Vertrauen verliert; so kann es
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Contudo, a positivao inicial do instituto da excluso de scio no marcou a definitiva
superao da herana formalista e personalista do perodo romano. A melhor ilustrao
possvel para a resistncia de tais cnones na cultura jurdica europia reside no fato de as
normas que sucederam a Lei Territorial Prussiana e o Cdigo Civil Austraco serem, quase
sem exceo, mais conservadoras e restritivas em relao admisso da excluso de scio
do que aqueles primeiros e inovadores diplomas.
Nesse sentido, verifica-se que a admissibilidade da excluso nos Cdigos Comerciais
alemes de 1861 e 189712 no apenas foi enquadrada como subespcie e alternativa
subsidiria da dissoluo total, negando-se assim a sua qualidade de instituto autnomo13,
como submetida ao requisito de entendimento unnime dos scios remanescentes. Este
retrocesso normativo se explica em grande parte pela crescente influncia do movimento
pandectista, que passou a orientar a formulao de vrias codificaes de tal perodo, em
prejuzo da simples absoro das normas costumeiras e jurisprudenciais anteriormente
vigentes.
Ainda dentro do universo normativo germnico, a lei alem relativa s sociedades de
responsabilidade limitada (GmbhG), de 20 de abril de 1892, tratou apenas da possibilidade
de excluso do scio remisso (na forma de caducidade das quotas, conforme previsto no
pargrafo 21) e da hiptese de resgate ou amortizao de quotas, quando expressamente
prevista no contrato social (nos termos do pargrafo 34), sem tratar das questes do recesso
ou da excluso por justa causa. Karsten Schmidt, baseando-se na exposio de motivos da
referida lei, afirma que a ausncia de referncias s possibilidades de excluso e recesso
no foi o resultado de desateno ou omisso acidental do legislador alemo, mas reflexo
do deliberado propsito dos autores do respectivo projeto de lei de no conceder aos scios
das sociedades limitadas a prerrogativa de unilateralmente romper os vnculos
societrios14.
vor Verlauf der Zeit von der Gesellschaft ausgeschlossen werden. Vale notar que o artigo no em questo no fala em efetiva condenao e refere-se apenas a ameaa de aplicao da pena de privao de liberdade, ao que tudo indica em violao do princpio de presuno de inocncia do ru. 12 Pargrafo 140, em combinao com o pargrafo 133. 13 A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 12. 14 Dagegen enthlt das Gesetz keine Vorschriften ber den Austritt von Gesellschaftern. Das ist kein Versehen, sondern gezetzgeberische Absicht. Die Begrndung von 1891 sagt: Den Gesellschaftern kann zwar nicht das Recht eingerumt werden, das Gesellschaftsverhltnis einseitig aufzukndigen und aus der Gesellschaft auszutreten in K. SCHMIDT, Gesellschaftsrecht, p. 797.
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Como conseqncia, a confirmao da legitimidade da excluso por justa causa no mbito
das sociedades limitadas alems ocorreu apenas por via de construo jurisprudencial,
respeitando essencialmente dois caminhos diversos.
O primeiro deles consistiu no reconhecimento judicial da validade da clusula de resgate
explicitamente construda como clusula de excluso. Ou seja, graves violaes dos
deveres de scio so estipuladas como uma condio suspensiva, cuja verificao enseja o
nascimento do direito de a sociedade exigir o resgate da participao do scio
inadimplente15. Em tal hiptese, em regra, deve-se seguir o procedimento para a
amortizao de quotas, conforme disciplinado na lei alem, mas existem julgados que
reconheceram a possibilidade de se efetivar a excluso de um scio por meio da compra
compulsria da respectiva participao societria, desde que com base em expressa
previso contratual16.
Mais tardiamente, parte da jurisprudncia passou tambm a admitir, entre as sociedades
limitadas alems com traos de sociedades de pessoas, a excluso de scios mesmo ante a
ausncia de clusula expressa de resgate no contrato social17. Em tal caso, contudo,
aplicam-se rgidos requisitos para a admisso do remdio da expulso, a qual deve se
configurar como nico e ltimo recurso possvel, prefervel apenas em relao dissoluo
da sociedade. A excluso deve ser o resultado de falta grave, atinente pessoa do scio,
capaz de impossibilitar ou prejudicar gravemente a persecuo do objeto social18. Alm
disso, entende-se que a deliberao de excluso deve ser aprovada por scios detentores de
ao menos trs quartos do total de votos (no computados os votos do scio a ser excludo,
nos termos da 4 alnea do pargrafo 47 da GmbhG). Chegou-se a tal critrio por analogia
ao quorum exigido para a aprovao de alteraes no contrato social19 ou determinao da
prpria dissoluo da sociedade20.
15 Der Gesellschaftsvertrag kann also wie geschildert durch eine Einziehungsklausel dafr Sorge tragen, dass ein Gesellschafter, in dessen Person ein wichtiger Grund liegt, aus der GmbH ausgeschlossen werden kann in B. GRUNEWALD, Gesellschaftsrecht, p. 398. 16 K. SCHMIDT, Gesellschaftsrecht, p. 798-799. 17 besteht aber Einigkeit darber, dass auch dann, wenn der Gesellschaftsvertrag keine entsprechende Regelung enthlt, ein Ausschluss mglich ist, wenn in der Person eines Gesellschafter ein wichtiger Grund liegt. in B. GRUNEWALD, Gesellschaftsrecht, p. 398. 18 K. SCHMIDT, Gesellschaftsrecht, p. 799. 19 K. SCHMIDT, Gesellschaftsrecht, p. 800. 20 De acordo com acrdo 173/02 da 2 Cmara Civil do Tribunal Federal Alemo (Bundesgerichtshof BGH II ZR 173/02).
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15
1.2.2. Frana
Uma dos diplomas legais europeus que mais influenciaram os esforos de codificao de
outros pases e que se ateve mais fielmente aos cnones do pandectismo em matria de
excluso , foi o Cdigo Civil Napolenico de 1804. De fato, a legislao francesa
simplesmente desconsiderou o instituto da excluso de scio e adotou regime praticamente
anlogo ao vigente nos tempos romanos. Mesmo para o caso da morte de um dos scios, o
Cdigo Napolenico admitiu a continuao da sociedade somente mediante expressa
conveno entre os remanescentes e os herdeiros do falecido (artigo 1.868). Ou seja,
tratou-se meramente de repetir a soluo originalmente formulada pelo direito justinianeu.
A valorizao do indivduo presente nos ideais revolucionrios, alinhada e somada com os
cnones herdados do direito romano, fez com que o elemento personalista prevalecesse
sobre o interesse coletivo de continuidade da sociedade (em prejuzo, conseqentemente,
da preservao da empresa), nas hipteses de modificao superveniente e involuntria do
quadro de scios.
Apenas muitos anos mais tarde, com a promulgao da Lei de 24 de julho de 1867, que
introduziu no Direito Francs o conceito de sociedade com capital varivel, verificou-se
um reconhecimento expresso da possibilidade de excluso. Ainda assim, a permisso legal
se restringiu apenas s prprias sociedades de capital varivel. Estas ltimas no
representam propriamente um tipo societrio em separado, mas antes uma caracterstica
com a qual uma sociedade qualquer (artigo 48 da referida lei) pode se revestir por meio de
expressa estipulao em seu estatuto21, nos termos da permisso legislativa.
A variabilidade do capital faz com que o ingresso e a sada de scios tenham lugar de
forma similar ao que ocorre em uma sociedade cooperativa brasileira, dotada de capital
social. Ao se adotar estatutariamente o princpio da variabilidade, o ingresso de um
membro implica emisso de uma nova quota e aumento do capital social, enquanto a
retirada do scio acarreta uma correspondente e automtica reduo do capital. As
referidas operaes ocorrem sem a necessidade de alterao do contrato social ou expressa
21 B. CAILLAUD, LExclusion dun Associ dans les Socits, p. 20-21.
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aprovao dos demais scios e sem que ocorram quaisquer transaes de compra, venda ou
cesso de quotas, de forma que o capital social pode variar constantemente.
Nos termos do artigo 52 da lei de 1867, o estatuto social pode autorizar a assemblia geral
de uma sociedade com capital varivel a, motivadamente, excluir scios da sociedade22. A
sociedade de capital varivel representa evidentemente uma estrutura jurdica interessante,
porm incompatvel com inmeros modelos de negcios e empreendimentos que exigem
um mnimo de estabilidade do capital e nos quais os scios almejam certo controle sobre a
circulao das participaes e sobre a identidade e qualidades de seus conscios. Por esta
razo, trata-se de uma forma jurdica com reduzida aplicao prtica.
Desse modo, a autorizao expressa para a admisso da excluso de scios no mbito das
sociedades com capital varivel esteve longe de representar uma soluo definitiva para o
problema no Direito Francs23; a despeito ser relevante para a construo da doutrina sobre
o tema, na medida em que indica claramente que o legislador no repudia em absoluto o
conceito de expulso de scios em si.
Ante a inexistncia de amparo normativo expresso para a excluso de scios entre as
sociedades com capital fixo, a doutrina francesa trilhou um caminho muito similar quele
seguido pelos juristas brasileiros, buscando refgio no princpio da liberdade contratual.
Defende-se, assim, a idia de que no havendo vedao explcita, no se poderia negar aos
scios o direito de estipular a possibilidade de excluso por justa causa no contrato
social24. Este entendimento parece ser compartilhado pela maioria dos autores franceses,
ainda que no seja de todo pacfico25.
22 Seules, peu importe leurs forme, les socits qui adoptent la variabilit du capital peuvent prvoir dans leurs status lexclusion de certains associes plus ou moins fautifs. in B. CAILLAUD, LExclusion dun Associ dans les Socits, p. 15. 23 Para um interessante e peculiar lamento sobre a situao geral do instituto da excluso de scios no Direito Francs: Dans les clubs et les associations, il existe des procdures dexclusion lencontre des membres devenus indsirables. Lglise nhsite ps excommunier ceux de se fidles quin et se plient pas sa doctrine. Ltat lui-mme peut retirer sa nationalit un citoyen titre de sanction dans des circonstances exceptionnelles. Peut-on de la mme faon retirer sa qualit de citoyen un associ ? La loi est muette sue ce point. in M. COZIAN, A. VIANDIER, F. DEBOISSY, Manuel Droit de Socits, p. 148. 24 Lorsque les fondateurs dune socit dsirent introduire dans les statuts un texte permettant lexclusion de certains associs dans de cas expressment dsigns, deux questions sont rsoudre : lexclusion est-elle valable et, cette validit admise, en quels termes doit-on rdiger la clause ? [...], le point central du dbat concerne linterprtation du silence du lgislateur ce sujet. Ce mutisme suscite des ractions contradictoires et catgoriques mais, pour notre part, nous estimons quil laisse aux associs le libre choix dans la rdaction de leurs conventions. (sem grifo no original) in B. CAILLAUD, LExclusion dun Associ dans les Socits, p. 239. No mesmo sentido e mais recentemente: Rien ninterdit dinsrer dans les status une clause
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Muito mais delicada e problemtica, entretanto, a questo da excluso de scios sem o
respaldo de clusula estaturia expressa. Bernard Caillaud confirma o entendimento
essencialmente unnime dos juristas franceses no sentido de negar a pura e simples
atribuio de tal prerrogativa maioria ou mesmo totalidade dos scios remanescentes,
fora do amparo de explcita disposio do contrato social26. Ainda assim, restaria aberta
uma possibilidade de excluso, na forma do recurso ao artigo 1.184 do Cdigo Civil
Francs, que trata do princpio geral da resoluo contratual por inadimplemento27. De
forma anloga doutrina brasileira da dissoluo parcial, os scios prejudicados pelo
inadimplemento de um conscio poderiam solicitar em juzo o trmino no do vnculo
contratual como um todo, mas apenas limitadamente a este ltimo, tendo em vista as
caractersticas especficas do contrato de sociedade e a necessidade de preservao da
empresa.
Tal possibilidade existiria apenas nas sociedades com claro carter contratual e, mesmo
entre estas, acarretaria um grave risco para a continuao da sociedade. Com efeito,
entendem os doutrinadores franceses que, em tal hiptese, sempre caberia ao juiz a
faculdade de determinar a efetiva dissoluo e liquidao da sociedade, nos termos do
artigo 1.871 do Cdigo Civil Francs28.
autorisant lexclusion dun associ si certains vnements nettement prciss lavance vienent se raliser. in M. COZIAN, A. VIANDIER, F. DEBOISSY, Manuel Droit de Socits, p. 148-149. 25 A este respeito, Rafael Garcia Villaverde realizou extensa anlise de Direito Comparado e cita como autores franceses favorveis ao reconhecimento da validade da clusula de excluso o prprio Bernard Caillaud, alm de Escarra e Ripert (entre outros). Entre os contrrios validade da disposio, contudo, estariam Pic e Thaller. R. VILLAVERDE, La Exclusion de Socios Causas Legales, p. 60-61. 26 En labsence de clause statutaire prvoyant une telle mesure, un associ peut-il tre menac dexclusion dans une socit capital fixe ? Tous les auteurs sont daccord, et nous sommes avec eux, pour interdire aux seuls coassocis, mme unanimes, de prendre une dcision dexclusion, quelle que soit la gravit de la faute. Malgr ses graves inconvnients, la seule action possible de leur part demeure la demande en dissolution juduciaire de larticle 1871 du Code civil. (sem grifo no original) in B. CAILLAUD, LExclusion dun Associ dans les Socits, p. 261. 27 Cdigo Civil Francs, artigo 1184: La condition rsolutoire est toujours sous-entendue dans le contrats synallagmatiques, pour le cas o lune des deux parties ne satisfera point son engagement. Dans ce cas, le contract nest point rsolu de plein droit. La partie envers laquelle lengagement na point t excut a le choix ou de forcer lautre lexcution de la convention lorsquelle est possible, ou den demander la rsolution avec dommages et intrts. La rsolution doit tre demande en justice , et il peut tre accord dfendeur un dlai selon le circonstances. A aplicao do referido artigo ao contrato de sociedade, exige naturalmente uma compreenso ampla e no tcnica do termo signalgmatico empregado em tal artigo, entendendo-o no em distino e oposio aos contratos plurilaterais ou associativos, mas no sentido de oneroso. A este respeito B. CAILLAUD, LExclusion dun Associ dans les Socits, p. 262. 28 Cdigo Civil Francs, artigo 1871: La dissolution des socits terme ne peut tre demande par lun ds associs avant le terme convenu, quautant quil y en a de justes motifs, come lorsquun autre associ manque ses engagements, ou quune infirmit habituelle le rend inhabile aux affaires de la socit, ou autres cas semblable, dont la lgitimit et la gravit son laisses a larbitrage des juges. A este respeito,
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importante, de qualquer modo, registrar uma tendncia do Direito francs
contemporneo de favorecer a excluso de scios, como se verifica na disciplina dos tipos
societrios mais recentes. Uma perfeita ilustrao de tal movimento a sociedade por
aes simplificada (socit par actions simplifie ou S.A.S.), instituda pela Lei n 2001-
420, de 15 de maio de 2001. De fato, graas redao imposta pela referida lei, os artigos
227-16 e 227-17 do Cdigo de Comrcio Francs atribuem expressamente aos scios de
uma sociedade por aes simplificada o poder de disciplinar, por meio do estatuto social:
(i) a venda obrigatria de aes e (ii) a suspenso de direitos no-pecunirios do scio, (iii)
bem como a sua excluso.
A validade da clusula de excluso de scio tambm expressamente reconhecida no
mbito da socite dexercice liberl ou S.E.L., uma sociedade de natureza civil que, como
o prprio indica, destina-se ao exerccio coletivo das profisses liberais, e da socit
europene, tipo societrio estabelecido pelas normas comunitrias29.
1.2.3. Espanha
O Direito Comercial espanhol destaca-se como um interessante exemplo histrico
intermedirio entre os sistemas germnicos e a experincia francesa30. Por um lado, o
Cdigo Comercial Espanhol de 1829 no privilegiou a continuao da sociedade,
tampouco a preservao da empresa, ao arrolar como hipteses de dissoluo diversos
fatos atinentes exclusivamente pessoa de um ou alguns dos conscios, tais como: morte,
doena, interdio e falncia de scio, ou mesmo a mera vontade de um deles, no caso das
sociedades constitudas por prazo indeterminado (artigos 329 e 333). Nesse aspecto,
seguiu-se claramente o exemplo do artigo 1.865 do Cdigo Civil Napolenico.
Caillaud afirma que Jusquici, lventualit dune exclusion en labsence de clause statutaire existe seulement dans les socits caractre contractuel, la suite dun manquement grave commis para un membre vis--vis de ses obligations sociales. Lapprciation souveraine appartient aux juges qui restent toujours libres de choisir entre lexclusion, vritable dissolution partielle fonde sur larticle 1184, et la dissolution totale de la socit, dissolution pour justes motifs de larticle 1871 du Code Civil qui demeure la solution de principe. in B. CAILLAUD, LExclusion dun Associ dans les Socits, p. 263. 29 M. COZIAN, A. VIANDIER, F. DEBOISSY, Manuel Droit de Socits, p. 149. 30 El Cdigo de comercio espaol de 1829, recibe probablemente influencia mltiple. En primer lugar, la francesa puede deducirse del vasto catlogo de causas de disolucin de la sociedade que se recogen en los textos legales, [...] Parece, por otra parte, que la influencia germnica puede haber determinado la acogida, haciendo excepcin a la lnea mantenida por el Derecho francs, de la institucin de la exclusion del socio. in R. VILLAVERDE, La Exclusion de Socios Causas Legales, p. 82.
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Por outro lado, ao reconhecer expressamente a possibilidade de excluso de scios, o
ordenamento espanhol aproximou-se da sistemtica prussiana. Nesse sentido, previu-se a
possibilidade de excluso para os casos de: (i) uso de fundos da sociedade em interesse
prprio, (ii) exerccio de poderes de administrao por parte de scio no autorizado
contratualmente a faz-lo, (iii) fraude na administrao ou contabilidade da sociedade, (iv)
no integralizao da prpria quota (aps ser instado a faz-lo), (v) concorrncia ilcita
com a sociedade e (vi) ausncia injustificada do scio obrigado a prestar servios
sociedade (aps ser instado a retornar)31.
Um relevante passo adiante para a consolidao do instituto da excluso de scios na
Espanha seria dado com a promulgao do Cdigo Comercial de 1885, o qual foi alm da
fixao de um rol delimitado de hipteses de excluso, incluindo uma norma aberta,
referente a quaisquer causas graves justificadoras da aplicao do remdio extremo da
expulso, nos termos do pargrafo 7 do artigo 21832.
Atualmente, porm, os dois principais tipos societrios espanhis sociedade annima e
limitada so regulados por leis especiais. A sociedade annima regulada pela Lei n 19,
de 25 de julho de 1989, que em seus artigos 43 a 45 estabelece as conseqncias da no
integralizao de aes, prevendo a suspenso dos direitos do acionista remisso, a
sucessiva tentativa de venda de suas aes (em bolsa, com interveno de corretor ou
tabelio, conforme o caso) e, somente aps o eventual fracasso desta ltima, a amortizao
das aes em questo.
A disciplina das sociedades limitadas espanholas encontra-se na Lei n 2, de 23 de maro
de 1995. O artigo 98 de tal lei prev a excluso do scio inadimplente em relao a
obrigaes acessrias33 e do scio administrador que competir com a sociedade ou for
condenado definitivamente a indeniz-la por perdas neste ltimo caso, os danos causados
sociedade devem ser resultantes de (i) violao da lei ou do (ii) contrato social, ou (iii)
desdia do administrador. Para scios com participao inferior a um quarto do capital 31 Artigos 300, 307, 312, 323, 316 e 326. 32 R. VILLAVERDE, La Exclusion de Socios Causas Legales, p. 87-88. interessante notar que se trata de movimento simetricamente contrrio quele verificado na Itlia, onde a referida norma aberta, presente no Cdigo Comercial de 1865, foi suprimida no Cdigo Comercial Italiano de 1882. 33 O artigo 22 da referida lei define obrigaes acessrias como todas aquelas estipuladas pelo contrato social que no se refiram integralizao de quotas.
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20
social, a excluso pode ser pronunciada diretamente em juzo. Caso a participao seja
superior, dever ocorrer por meio de deciso judicial, precedida de aprovao da
assemblia geral (artigo 99).
Ressalvada a rara possibilidade de acordo entre os scios remanescentes e o excludo, a lei
espanhola atribui ao auditor de contas da sociedade o dever de avaliar os haveres do
quotista expulso, ainda que a norma em questo no determine de antemo o mtodo a ser
empregado em tal tarefa. Os haveres devem ser pagos em dinheiro pela sociedade, dentro
do prazo de dois meses a contar do trmino da avaliao. Os honorrios do avaliador
devem ser pagos pela sociedade, mas podem ser compensados do valor devido ao excludo.
interessante notar que a lei espanhola determina expressamente a reduo do capital
como parte da liquidao da participao e impe ao scio excludo (bem como ao que
exerce o recesso), por remisso expressa, o mesmo regime de responsabilidade aplicvel
hiptese de reduo do capital social com restituio de bens ou dinheiro aos scios (artigo
103).
Cabe observar, por fim, que a lei espanhola adotou disciplina relativamente branda em
relao aos scios remissos, na esfera das sociedades limitadas. A alnea d do artigo 16
da Lei n 2, de 23 de maro de 1995, estabeleceu que a falta de plena integralizao do
capital social da sociedade limitada em constituio representa causa de nulidade desta
ltima. Em relao a aumentos do capital social de sociedade j constituda, o artigo 77 da
mesma lei prev meramente a decadncia das quotas no integralizadas ou, caso a plena
integralizao tenha sido expressamente colocada como condio prvia, o cancelamento
da operao de aumento. No se coloca, portanto, como alternativa para a sociedade e para
os demais scios, as clssicas opes de excluir o remisso, reduzir sua participao ou
cobrar judicialmente o valor ou os bens prometidos por meio da subscrio.
1.2.4. Itlia
Na Itlia cuja evoluo normativa merece uma anlise relativamente menos apressada,
no apenas pela relevncia e preponderncia que couberam a sua doutrina no
desenvolvimento geral do instituto34, mas tambm pela influncia que exerceu sobre a
34 Apenas como exemplo: El estudio del Derecho comparado presenta por una parte la possibilidad de empleo de legislaciones y doctrina bsicamente italianas como instrumento imprescindible de ayuda a la
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formulao da legislao brasileira contempornea35 , o reconhecimento legal expresso do
instituto da excluso de scios ocorreu com a promulgao do Cdigo Comercial de 1865.
O artigo 124 do referido diploma reconhecia a possibilidade de excluso de scios nas
hipteses de: (i) uso da firma ou do capital da sociedade pelo scio administrador para fins
particulares, (ii) fraude na administrao da sociedade ou em sua contabilidade, (iii)
ausncia injustificada do scio administrador, mesmo aps ser intimado a retornar, (iv)
ingerncia do scio no administrador sem que tal prerrogativa esteja prevista nos atos
constitutivos, (v) no integralizao de quotas, mesmo aps a devida constituio em mora,
(vi) falncia do scio e (vii) qualquer situao de grave inadimplemento dos deveres de
scio.
O prprio artigo 124 ressalvava ainda o fato de que a consumao da excluso no isenta o
scio excludo do dever de indenizao pelos danos que tenha causado sociedade. O
artigo 125, a seu turno, afirmava expressamente com o presumvel intuito de impedir
qualquer interpretao conservadora que levasse a um retorno ao sistema anterior, de
inspirao romana que a excluso no implicava dissoluo da sociedade. O artigo 125
tratou tambm, ainda que de forma sucinta, da apurao de haveres, imputando ao scio
excludo a participao nas perdas sociais verificadas at a data da excluso e assegurando
sociedade a possibilidade de reter os lucros a ele atribuveis at o levantamento do
balano social sucessivo.
Existem dois aspectos especialmente notveis no tratamento dado ao instituto da excluso
de scios pelo Cdigo Comercial Italiano de 1865. O primeiro consiste na autonomia
atribuda questo, dentro da organizao do texto do Cdigo. Ao invs abordar a
excluso como parte do tema da dissoluo da sociedade por fatos atinentes pessoa de
um dos scios, o legislador italiano no apenas tratou da excluso como um instituto em si,
como tambm lhe atribuiu uma seo prpria no corpo de tal diploma legal (Ttulo VII,
Captulo I, Seo IV). Para o Professor Dalmartello, tais fatos demonstram o inequvoco
interpretacin directa de nuestros textos legales debido al paralelismo con los espaoles. (sem grifo no original) in R. VILLAVERDE, La Exclusion de Socios Causas Legales, p. 25. 35 W. BULGARELLI, A Teoria Jurdica da Empresa Anlise Jurdica da Empresarialidade, p. 7.
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reconhecimento da importncia e da autonomia conceitual do instituto da excluso pela
nova legislao36.
Alm disso, e certamente com maior relevncia prtica, ocorre observar que o Cdigo de
1865 (tal como o Cdigo Espanhol de 1885, mencionado anteriormente) continha uma
norma aberta em relao excluso. Ao admitir o afastamento do scio por qualquer
inadimplemento grave de seus deveres em relao sociedade37, o Cdigo de 1865 no se
restringiu a um nmero predeterminado de possibilidades de excluso. Concedeu-se,
assim, grande flexibilidade para a identificao do que seria inadimplemento grave
dentro de cada realidade societria concreta, em uma clara valorizao do princpio da
conservao da empresa.
O Cdigo Comercial Italiano de 1882, entretanto, refletindo o fenmeno anteriormente
mencionado de crescente influncia dos cnones romanistas e clssicos, recuou nesta
matria e aboliu a norma que expressamente previa a excluso como um remdio genrico
para quaisquer hipteses de inadimplemento grave, caminhando, portanto, na direo de
um regime numerus clausus de hipteses de afastamento dos scios.
Em seu artigo 186, o Cdigo de 1882 admitia a excluso de scios, nas sociedades em
nome coletivo ou em comandita, nas hipteses de: (i) no integralizao de quotas, aps a
constituio em mora do scio, (ii) ausncia injustificada de scio administrador que no
retorna aps ser instado a faz-lo, (iii) fraude contbil ou na administrao por parte do
scio administrador, (iv) uso indevido da firma ou de capitais da sociedade por parte do
scio administrador, (v) ingerncia na administrao por parte do scio com
responsabilidade ilimitada (desde que houvesse administrador nomeado), (vi) o no
ressarcimento de danos ou diviso de vantagens conseguidas com o uso no autorizado da
firma ou dos capitais sociais, por parte de scio no administrador com responsabilidade
ilimitada e (vii) falncia, interdio ou inabilitao do scio.
36 A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 15-16. 37 O artigo 124 do Cdigo Comercial Italiano de 1865 estabelecia, de fato, que: Pu essere escluso dalla societ: il socio amministratore, che si vale della firma e dei capitali sociali ad uso proprio, che commette frodi nellamministrazione o nella contabilit, che si assenta ed intimato non torna, n giustifica le ragioni dellassenza; il socio che prende ingerenza nellamministrazione senza averne facolt dallatto di societ; il socio che costituito in mora, non eseguisce il pagamento della sua quota sociale; il socio caduto in fallimento, e in generale quando concorrano fatti che costituiscono grave inadempimento delle obbligazioni del socio (sem grifo no original).
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Especificamente no caso das sociedades em nome coletivo, representava ainda uma
hiptese de excluso a concorrncia desleal ou a participao em sociedades concorrentes
na qualidade de scio de responsabilidade ilimitada. Nas sociedades em comandita, a
participao ainda que indireta (por exemplo, por meio de procurao) do comanditrio
na administrao tambm ensejaria a sua excluso. A despeito da extensa lista de
possibilidades de excluso e provavelmente em funo dela , a norma aberta de
admisso expressa da excluso por inadimplemento grave teria sido considerada
desnecessria pelos membros da comisso responsvel pela formulao do novo cdigo
Comercial Italiano e simplesmente suprimida da legislao de tal pas38.
Poderia ter ocorrido, desse modo, um marcante retrocesso na admissibilidade da excluso,
similar ao que ocorreu entre as primeiras legislaes germnicas e aquelas promulgadas na
segunda metade sculo XIX. Esta opo legislativa do Cdigo Comercial Italiano de 1882,
primeira vista absolutamente restritiva, motivou, contudo, uma ampla discusso sobre o
fundamento jurdico da excluso de scios39 que ecoou em inmeros estudos posteriores
sobre o tema.
O aspecto central de tal debate doutrinrio residia no fato de que, conforme o entendimento
que se adotasse, seria ou no possvel admitir hipteses de excluso no expressamente
previstas pelo Cdigo Comercial de 1882. Nesse contexto, seguindo a classificao que ao
que tudo indica foi inicialmente formulada por Dalmartello, surgiram trs grupos principais
de explicaes ou, teorias bsicas para a excluso de scio: (i) disciplina legal taxativa,
(ii) poder corporativo disciplinar e (iii) resoluo do contrato por inadimplemento40.
A primeira delas no representava mais do que a confirmao da interpretao mais
restritiva possvel das disposies do Cdigo Comercial de 1882. A teoria da disciplina
legal taxativa escorava-se no artigo 4 das disposizioni sullapplicazione delle leggi do
Cdigo Civil de 1865 norma equivalente Lei de Introduo ao Cdigo Civil brasileira
para afirmar que a excluso de scios, pelo seu carter punitivo e excepcional, apenas
38 A. DALMARTELLO, LEsclusione dei Soci dalle Societ Commerciali, p. 18. 39 Tale mancata previsione e, per contro, la elencazione delle cause di esclusione nellart. 186 fecero sorgere, nel vigore del codice di commercio del 1882, un vivace dibattito in merito alla tassativit o meno delle cause di esclusione e alla possibilit per la societ di prevedere ulteriori ipotesi di applicazione dellistituto. in B. ACQUAS, C. LECIS, LEsclusione del Socio nelle Societ di Persone, p. 9. 40 Os argumentos de cada uma dessas teorias e seus desdobramentos so discutidos de forma mais detida no Captulo 3 do presente estudo.
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poderia ter lugar quando explicitamente prevista pela legislao e sempre nos estritos
limites desta.
As duas outras posies doutrinrias, ainda que sob fundamentos marcadamente diferentes,
concebem um campo muito mais amplo para a aplicao do remdio da excluso. Nos
termos da teoria do poder disciplinar corporativo, a prerrogativa de excluir um scio seria
intrnseca e inerente a todos os entes associativos, uma suposta decorrncia lgica do
direito da sociedade de preservar a prpria existncia. Seria, assim, uma verdadeira
expresso de uma ascendncia hierrquica ou poder da sociedade sobre a pessoa do scio.
A explicao contratualista, a seu turno, identifica os fundamentos dogmticos da excluso
de scio como uma forma muito peculiar de incidncia da regra geral da resoluo do
contrato por inadimplemento grave de uma das partes. Nessa esteira, uma vez que se
entendesse a sociedade como um contrato, seria possvel aplicar a ela a regra geral de
trmino por inadimplemento, ainda que a falta do scio concretamente verificada no
estivesse expressamente compreendida no rol de possibilidades de excluso do artigo 186
do Cdigo Comercial de 1882.
Exatamente pela necessidade de se dobrar s caractersticas prprias dos contratos
plurilaterais ou associativos, o preceito geral deve ser de aplicado de forma particular aos
vnculos societrios. Desse modo, ao invs de ter como conseqncia o rompimento
completo do contrato, tal como naturalmente se verifica quando se recorre resoluo por
inadimplemento em um contrato bilateral, o inadimplemento de um dos scios levaria ao
trmino parcial do contrato de sociedade, afetando somente os vnculos entre um dos
scios e a sociedade.
Ainda que confrontada com a posio inicialmente contrria da maior parte da doutrina, a
jurisprudncia italiana colocou-se a favor da interpretao extensiva das hipteses de
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excluso, desde que houvesse previso contratual expressa a respeito41. Eventualmente, a
viso contratualista da excluso de scios acabaria por prevalecer42.
Cumpre observar, de qualquer modo, que apesar das mencionadas crticas o Cdigo
Comercial Italiano de 1882 tambm introduziu relevantes avanos em matria de excluso
de scios. De fato, a nova legislao estabeleceu o conceito de liquidao da quota e
determinou o pagamento dos haveres devidos ao scio excludo unicamente em dinheiro43.
Dessa forma, esclareceu-se definitivamente que ao excludo no caberia nada mais do que
um crdito pecunirio contra a sociedade, sendo-lhe vedado exigir a entrega ou restituio
de qualquer bem ou direito especfico com o qual tivesse contribudo para a formao do
capital social. Trata-se de expresso do princpio da conservao da empresa, pois se
impede assim que a sociedade seja privada de bens ou direitos essenciais sua atividade.
O Cdigo Civil Italiano de 1942 disciplinou, em seu artigo 2.286, a possibilidade de
excluso de scios de sociedades de pessoas nos casos de (i) grave inadimplemento de
obrigaes derivadas da lei ou do contrato social, (ii) interdio e inabilitao de scio ou
(iii) sua condenao a pena que vedasse o acesso a cargos pblicos. relevante o fato de
que, nos termos do artigo 2.287, atribuiu-se maioria dos scios o poder de pronunciar a
excluso extrajudicialmente44. Adicionalmente, o artigo 2.288 qualificou os eventos de
falncia do scio ou liquidao de sua quota para a satisfao de credores pessoais como
eventos de excluso de pleno direito45. A excluso de scios entre as sociedades
cooperativas, por seu turno, foi regulada pelo artigo 2.533 do mesmo diploma.
41 Esclarece Corrado Lecis a esse respeito que: La giurisprudenza formatasi nel vigore del codice di commercio del 1882 interpret le norme in modo difforme dallorientamento dottrinario richiamato segnalando come gli statuti sociali potessero aggiungere altri motivi di esclusione a quelli previsti dalla legge che, pertanto, non erano da considerarsi tassativi. in B. ACQUAS, C. LECIS, LEsclusione del Socio nelle Societ di Persone, p. 9. 42 possvel citar como exceo o trabalho de Innocenti, que entende que a excluso fundamenta-se em disciplina legal taxativa. O. INNOCENTI, LEsclusione del Socio, p. 190. 43 M. PERRINO, Le Tecniche di Esclusione del Socio dalla Societ, p. 71. 44 Qui [Cdigo de 1942] basti sottolineare come unautentica svolta [] lattribuzione alla maggioranza dei soci del potere di dar direttamente luogo allesclusione, rinviando lintervento giudiziale allaccertamento successivo, su opposizione dellescluso, delleffettiva ricorrenza delle cause addotte a giustificazione del provvedimento... in M. PERRINO, Le Tecniche di Esclusione del Socio dalla Societ, p. 74. 45 cause di esclusione di diritto, in cui cio l'esclusione conseguenza automatica del verificarsi di determinati fatti a carico del socio, senza necessit del ricorso all'autorit giudiziaria, n di una manifestazione di volont sociale. in M. PERRINO, Le Tecniche di Esclusione del Socio dalla Societ, p. 74.
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O Cdigo Italiano serviu de evidente inspirao para as normas de Direito Comercial e, em
especial, de Direito Societrio contidas no Cdigo Civil Brasileiro de 2002. Basta
mencionar, como exemplos de maior destaque, a unificao parcial do Direito das
Obrigaes, a adoo da Teoria da Empresa, a criao do tipo societrio sociedade
simples e a organizao do texto tomando este ltimo como regime de base para as
demais formas de sociedade.
Contudo, exatamente em funo da influncia que a experincia italiana exerceu sobre a
nova legislao brasileira, importante salientar tambm algumas das grandes diferenas
que existem nos fundamentos do Direito Societrio em ambas as jurisdies, as quais
limitaram sobremaneira a aplicao do instituto da excluso na Itlia ao longo do sculo
XX.
Em primeiro lugar, observa-se como a diviso entre sociedades de pessoa e de capitais
possui, na Itlia, conseqncias muito mais profundas do que no ordenamento brasileiro,
na medida em que no se atribui ou reconhece personalidade jurdica prpria no mbito das
primeiras (sociedades simples, em nome coletivo e em comandita simples), mas apenas
entre estas ltimas (sociedade annima, em comandita por aes e limitada, bem como as
cooperativas). De fato, para os doutrinadores italianos, a imperfeita autonomia patrimonial
existente nas sociedades simples, em nome coletivo e em comandita simples decorrente
da responsabilidade ilimitada de ao menos parte dos scios em relao s dividas sociais
impede que sejam consideradas entes plenamente dotados de personalidade jurdica
prpria.
Para explicar a separao e especializao do patrimnio social em tais casos, mas tambm
a prpria possibilidade de as mencionadas sociedades despersonalizadas atuarem no
mercado sob a prpria denominao, os estudiosos italianos recorreram ao conceito de
autonomia patrimonial imperfeita ou subjetividade jurdica46; que se pode
grosseiramente traduzir como o reconhecimento normativo da sociedade de pessoas como
46 Il codice attuale, [], ha distinto fra le societ di persone e le societ di capitali. Alle prime ha riconosciuto la semplice autonomia patrimoniale, in quanto ha reso il patrimonio sociale insensibile (in maggiore o minore misura a seconda dei casi) alle vicende relative ai patrimoni individuali dei soci; alle seconde invece ha mantenuto la personalit giuridica. in F. CORSI e F. FERRARA JR., Gli Imprenditori e Le Societ, p. 194.
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um centro autnomo de interesses somado a um patrimnio separado, mesmo que
desprovida de plena e perfeita personalidade jurdica.
Mais importante para a presente anlise, entretanto, o fato de que a sociedade limitada
italiana, nos anos sucessivos promulgao do Cdigo de 1942, ter sido tratada como uma
mera verso simplificada da sociedade por aes, pertencendo expressamente ao universo
das sociedades de capitais. Ocorre que a aplicao do remdio da excluso no Direito
italiano, ressalvado o afastamento do scio remisso, era limitada esfera das sociedades de
pessoas. Desse modo, no se admitiu durante longo perodo a hiptese de excluso de
scios por justa causa nas sociedades limitadas, mas somente a decadncia de quotas por
falta da devida integralizao. A sociedade limitada italiana foi inicialmente concebida
como uma verso simplificada da sociedade annima47 e, portanto, a ela no se estendeu o
instituto da excluso de scios, tido como ferramenta tpica das sociedades de pessoas.
Admitia-se a excluso na sociedade limitada, portanto, somente em relao ao scio
remisso, nos termos do artigo 2.466 do Cdigo Civil de 1942.
Como conseqncia, a maior parte do debate sobre o instituto da excluso de scios no
Direito italiano girou, durante longo tempo, em torno das sociedades com regime de
responsabilidade ilimitada de ao menos parte dos scios.
De qualquer modo, importante ressaltar que, como resultado da fixao de valores
mnimos de capital social e patrimnio lquido para a constituio e operao das
sociedades de capitais48, as sociedades baseadas no regime de responsabilidade ilimitada
dos scios existem em grande nmero na Itlia e tm efetiva e ampla aplicao prtica ao
contrrio do Brasil, onde possuem uma existncia substancialmente legislativa e terica.
Assim, foi possvel a formao de um relevante arcabouo jurisprudencial e doutrinrio
sobre o tema da excluso, ainda que tal hiptese no estivesse aberta s sociedades
limitadas.
47 La societ a responsabilit limitata era, nelloriginario disegno del codice civile, una sorta di societ per azioni in piccolo, diversa da questa, come si esprimeva la relazione ministeriale (n. 1015), per la struttura pi intima. in F. GALGANO, Le Nuove Societ di Capitali e Cooperative, p. 483. 48 As sociedades annimas italianas devem ter um capital social mnimo de cento e vinte mil euros, enquanto para as sociedades limitadas vigora o piso de dez mil euros (respectivamente artigos 2.327 e 2.464, pargrafo 4, do Cdigo Civil Italiano). Alm disso, caso se verifiquem perdas superiores a um tero do capital social, este deve ser obrigatoriamente reduzido e, atingindo patamar aqum dos limites mnimos da lei, deve ser imediatamente recomposto (artigo 2.446). Caso contrrio, a sociedade deve ser transformada em tipo societrio que admita aquele valor de capital social ou, alternativamente, ser dissolvida (artigo 2.447).
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Foi apenas com a ampla reforma do Direito Societrio italiano, realizada por meio do
Decreto Legislativo n 6, de 17 de janeiro de 2003, o qual introduziu o artigo 2.437-bis no
Cdigo Civil Italiano49, que finalmente se admitiu a excluso de scios por justa causa
entre as sociedades limitadas italianas. Por meio da referida reforma, reconheceu-se o
carter intermedirio da sociedade limitada italiana (societ a responsabilit limitata),
entre as sociedades de capitais e de pessoas50, e se promoveu deliberadamente uma
aproximao entre e o regime destas ltimas e a disciplina da sociedade limitada51.
Ainda assim, a possibilidade de excluso nas sociedades limitadas est sujeita a duas
graves restries. A primeira evidentemente a necessidade de clusula expressa para a
deliberao da excluso52. Alm disso, no que tange a apurao de haveres, o artigo 2.437-
bis faz remisso ao regime fixado pelo artigo 2.437, concernente o direito de recesso, mas
expressamente afasta a possibilidade de liquidao da quota do scio excludo por meio da
reduo do capital social. A excluso de scio na sociedade limitada italiana, portanto,
apenas poder ser consumada por meio uma das duas outras formas de liquidao da quota
previstas para hipteses de recesso, quais sejam: a aplicao de reservas disponveis para a
aquisio da quota do excludo pela prpria sociedade ou a aquisio da participao do
scio excludo por outros scios ou por terceiros pelo valor fixado para o reembolso53.
49 Artigo 2.437-bis: Latto costitutivo pu prevedere specifiche ipotesi di esclusione per giusta causa del socio. In tal caso si applicano le disposizioni del precedente articolo [relativo ao direito de recesso], esclusa la possibilit del rimborso della partecipazione mediante riduzione del capitale sociale. 50 Dalla riforma del 2003 emersa una diversa concezione di questo tipo di societ, che si presta ad essere piuttosto considerato come un tipo intermediario fra le societ di persone e la societ per azioni. Di questa c, fondatamente, la disciplina dei rapporti esterni, mentre i rapporti interni fra soci si possono modellare secondo lo schema delle societ di persone. in F. GALGANO, Le Nuove Societ di Capitali e Cooperative, p. 483. 51 Il processo di personalizzazione della struttura societaria della nuova s.r.l. ha portato allintroduzione dellistituto dellesclusione facoltativa del socio, consentita prima della riforma soltanto per le societ di persone e le societ cooperative; per le s.r.l. era prevista solo lipotesi di esclusione del socio moroso nei versamenti, quando erano falliti i tentativi di procedere alla vendita coattiva per mancanza di compratori in G. LO CASCIO (Coord.), Societ a Responsabilit Limitata, p. 155. 52 previsto un solo caso legale di esclusione: a norma del comma 3 dellart. 2466, devessere escluso il socio moroso quando sono falliti i tentativi di vendita della quota. Ampio , invece, lo spazio concesso in questo campo allautonomia dei soci: la norma dellart. 2473-bis stabilisce, cos introducendo un istituto finora riservato alle societ di persone e, in limiti assai pi contenuti, alle societ cooperative, che latto costitutivo pu prevedere specifiche ipotesi di esclusione per giusta causa in V. BUONOCORE, La Riforma del Diritto Societario, p. 181. 53 A differenza che nel recesso, non invece possibile il rimborso della quota mediante la riduzione del capitale sociale. La preclusione diretta a tutelare la integrit del patrimonio sociale, ma il divieto vuole forse esercitare anche un effetto dissuasivo nei confronti dei soci in relazione ad iniziative che potrebbero pregiudicare la stessa sopravvivenza della societ, spingendoli a ricercare soluzioni in grado di risolvere i conflitti interni o comunque le difficolt di funzionamento interno della societ, senza pregiudicare i creditori sociali e terzi. in G. LO CASCIO (Coord.), Societ a Responsabilit Limitata, p. 159.
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1.2.5. Portugal
No perodo anterior promulgao do seu Cdigo Civil de 1867 conhecido como o
Cdigo Seabra , Portugal ainda estava sujeito s disposies de Direito Societrio das
Ordenaes Filipinas54. De fato, em obra cuja primeira edio foi lanada em 1830, Jose
Ferreira Borges denunciava exasperadamente o atraso das normas portuguesas em matria
de direito das sociedades55.
Contudo, no obstante o declarado propsito de aproximar o ordenamento lusitano da
disciplina das naes mais avanadas da Europa, Borges previu em seus arestos a
dissoluo da sociedade por questes pessoais dos scios, tais como morte, insanidade,
abuso, falncia, mau comportamento ou mesmo, nas sociedades por prazo indeterminado,
pela mera vontade de qualquer dos conscios56. O silncio do Cdigo Civil Portugus de
1867 sobre o tema veio apenas confirmar tal tendncia conservadora do Direito Societrio
portugus, relativamente ao instituto da excluso de scios. O Cdigo Comercial
Portugus, de 28 de Junho de 1888, tambm no reconheceu expressamente a possibilidade
de excluso por justa causa.
Portugal, por outro lado, foi um dos primeiros pases a seguir o exemplo alemo e a
instituir o tipo societrio das sociedades com regime de responsabilidade limitada,
denominadas sociedades por quotas, por meio da Lei de 11 de abril de 1901. O artigo 12
da referida lei estabeleceu regime extremamente rigoroso em relao ao scio remisso, ao
fixar no apenas a possibilidade de sua excluso, como tambm a perda em favor da
sociedade dos pagamentos parciais eventualmente realizados, sem prejuzo de sua
responsabilidade pelas perdas e danos causados pelo seu inadimplemento. Ainda sim, a lei
portuguesa das sociedades por quotas no previu a aplicao da excluso em outras
hipteses de violao dos deveres de scio.
54 Tais disposies so discutidas no prximo tpico deste captulo, relativo ao desenvolvimento histrico do instituto da excluso no ordenamento brasileiro. 55 Eu tenho pois trabalhado para fazer conhecer qual fosse este contracto no tempo dos Romanos; como delles para a nossa Ordenao, aonde ficou estacionario ate oje, em quanto que todas as mais naoens se avantajaro e desinvolvero. In J. BORGES, Jurisprudencia do Contracto-Mercantil, e Arestos dos Codigos e Tribunais das Naes mais Cultas da Europa, p. X. 56 J. BORGES, Jurisprudencia do Contracto-Mercantil, e Arestos dos Codigos e Tribunais das Naes mais Cultas da Europa, p. 150, 153 e 154.
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O silncio que ento prevalecia na legislao portuguesa em relao possibilidade de
excluso de scios por justa causa motivou a elaborao da notvel monografia do
Professor Avels Nunes sobre a matria57. Em sua obra, o autor construiu a tese de que o
direito de excluso seria uma clusula geral, implcita nos atos constitutivos de quaisquer
sociedades, uma vez que representa um instrumento de preservao da prpria sociedade e,
por desdobramento, da empresa.
De qualquer modo, o novo Cdigo Civil de Portugal, de 25 de novembro de 1966, superou
em grande parte a questo. A nova lei, em seu artigo 1.003, no apenas autorizou a
disciplina da excluso no contrato social da sociedade, como previu tal soluo para os
casos de: (i) grave violao do scio nas obrigaes com a sociedade, (ii) interdio ou
inabilitao, (iii) impossibilidade de prestao de servios, por parte do scio de indstria,
e (iv) perecimento de bem conferido ao capital da sociedade, por causa no imputvel aos
administradores.
O artigo 1.005 da mesma lei fixou o procedimento de excluso, estabelecendo o critrio da
deliberao majoritria, no computados os votos do excluendo. A eficcia da deliberao
de excluso ocorre somente aps o decurso do prazo de trinta dias aps a notificao do
scio que se busca excluir. Nesse perodo, cabe ao scio buscar a impugnao da deciso.
Como exceo via extrajudicial, na sociedade composta por apenas dois scios, a
excluso apenas pode ser solicitada em juzo.
Em 02 de setembro de 1986, por meio do Decreto-Lei n 262/86, foi promulgado o Cdigo
das Sociedades Comerciais Portugus, cujo artigo 186 tratou especificamente da excluso
de scios no mbito das sociedades comerciais. O tratamento do tema foi um pouco mais
extenso do que o do Cdigo Civil de 1966 e, alm das causas de excluso nele j previstas,
foram tambm arrolados como motivos de expulso do scio: (i) o afastamento da
administrao em funo de atos culposos prejudiciais sociedade, (ii) insolvncia e
falncia e (iii) violao do dever de no concorrncia com a sociedade. Em relao a este
ltimo ponto, convm observar que, de acordo com o artigo 180 do Decreto-Lei n 262/86,
vedado ao scio realizar seja em nome prprio, na posio de scio de responsabilidade
ilimitada de outra sociedade, ou como scio de responsabilidade limitada, mas com
57 A. NUNES, O Direito de Excluso de Scios nas Sociedades Comerciais, p. 69.
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participao superior a vinte por cento do capital atividade includa no objeto social da
prpria sociedade, ainda que de fato no exercida naquele momento.
O Cdigo das Sociedades Comerciais estabeleceu, outrossim, procedimento mais rigoroso
para a excluso de scio, exigindo quorum mnimo de trs quartos dos votos excluda do
cmputo, como de praxe, a participao do scio que se quer excluir. Alm disso, a lei
sujeitou a deliberao de excluso a um prazo decadencial de noventa dias, cuja contagem
inicia-se na data em que qualquer dos administradores tome cincia dos fatos capazes de
ensejar a respectiva expulso do scio. Trata-se de uma verdadeira presuno ipso iure de
tolerncia conduta do scio infrator.
Ainda que sob certos aspectos seja discutvel a fixao de prazo relativamente breve para
dar curso excluso58, foroso reconhecer que, se os scios e a sociedade podem tolerar
uma determinada conduta ou omisso do scio faltoso por trs meses, provavelmente o
fato no representa uma questo grave a ponto de justificar a aplicao de um remdio to
extremo quanto a excluso. Cumpre observar, ademais, que a regra em questo impede que
eventos antigos e j superados sejam, em outro momento e contexto, convenientemente
trazidos tona por outros scios, como mero pretexto e instrumento de presso.
1.2.6. Common Law
Apenas a ttulo de breve nota, tendo em vista os percursos histricos marcadamente
distintos, cumpre tambm fazer uma aluso aos traos mais relevantes do instituto da
excluso de scios nos pases em que prevalece o Common Law.
No Direito Societrio de tais jurisdies, existe uma diviso essencial, ainda que com
nuances e zonas de sobreposio, entre as partnerships, de um lado, e as registered
companies (Inglaterra) ou corporations (Estado Unidos), do outro. Grosso modo, tal
diviso corresponde, mutatis mutandis, separao presente no Direito continental entre
sociedades no-personificadas e sociedades personificadas, ou, ao menos no sentido
atribudo a tais termos na Alemanha e na Itlia, sociedades de pessoas e de capitais. As 58 Pode-se argumentar, por exemplo, que tal disposio inibe os demais scios a tentarem convencer o conscio infrator a reformular sua conduta e impede que entendimentos e negociaes para a composio amigvel de dificuldades possam se prolongar pelo prazo que eventualmente se mostra necessrio ou adequado.
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partnerships possuem estrutura institucional mais simples e presumem relaes mais
estreitas entre os scios, bem como o engajamento direto destes nas atividades
desenvolvidas59. no mbito destas ltimas, portanto, que a excluso de scios encontra
efetiva aplicao, j que nas companies ou corporations costuma prevalecer a aplicao de
instrumentos mais prximos aos da sociedade annima, tal a como a tutela do conflito de
interesse.
O Partnership Act britnico de 1890 permite em seu artigo 2560 via uma leitura contrario
sensu a excluso de associados por deliberao da maioria, desde que tal prerrogativa
lhes seja atribuda por prvia e expressa conveno61.
Nos Estados Unidos, a disciplina das partnerships tambm foi marcadamente orientada
pela promulgao de normas escritas expressas (diplomas legais ou statutes), fato peculiar
para ordenamentos baseados principalmente na regra do precedente e no direito
consuetudinrio62. Tratando-se, contudo, de matria sujeita majoritariamente
competncia legislativa dos Estados-membros (ressalvadas as normas atinentes ao
funcionamento do mercado de capitais), verificou-se um grande esforo na edio e
divulgao de leis uniformes.
Nesse sentido, merece destaque o Uniform Partnership Act - UPA, de 1914, que foi ao seu
tempo adotado por todos Estados-membros daquele pas, com a exceo de Louisiana63. O
referido diploma, que ainda se encontra em vigor em diversos Estados-membros, possui
regime bastante conservador em relao a mudanas no quadro de scios, prevendo que a
sada de qualquer scio da sociedade acarreta a sua dissoluo.
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