À espera da gravidez - medicina reprodutiva · apetrechos do universo mater-no. assim, elas...

4
dos casos de infertilidade são exclusivamente femininos exclusivamente masculinos À espera da gravidez Como a medicina reprodutiva é capaz de ajudar cada vez mais casais a conquistar o grande sonho de ser pai e mãe texto DANIELA BARROS D esde cedo, muitas garotinhas vivem cercadas por bonecas, mamadeiras e tantos outros apetrechos do universo mater- no. Assim, elas mimetizam as atitudes da mãe junto aos próprios “filhos” e seguem adotando objetos e pessoas a quem dedi- cam o seu afeto ao longo da vida. Com o passar dos anos, já mulheres, vão transferindo essa necessidade de cuidar para o “projeto gravidez”. Mas, e se esse momento não chega? É um balde de água fria. Fria não, congelante! E aconteceu comigo. Quando me casei, aos 25 anos de idade, já sabia que meu marido era portador de vari- cocele, uma dilatação anormal das veias tes- ticulares. Nós só não sabíamos ainda se isso poderia interferir em sua fertilidade. Como eu ainda era muito jovem e estava com a car- reira a pleno vapor, não dei muita importân- cia para isso na época. Porém, no ano de 2009, triiiimm! O meu relógio biológico tocou. Era chegada a hora de deixar um pouco os planos profissionais de lado e priorizar o nosso baby. A hora dos exames O primeiro passo foi conversarmos com um urologista especializado em medicina reprodutiva, que recomendou ao Vinicius, meu marido, a realização de um espermogra- ma. Esse exame,feito em laboratório,analisa a qualidade do esperma do homem a partir de uma amostra de sêmen. Mas, em nosso caso, o resultado não foi nada animador. Ele possuía anormalidades em todos os itens, como mor- fologia, mobilidade etc. O médico nos alertou que as perspectivas de engravidar por vias naturais eram mínimas, quase nulas. Então eu fiz os exames de praxe (veja a seguir) e, práti- cos que somos, partimos para a nossa primei- ra fertilização in vitro (FIV). DADOS: ORGANIZAçãO MUNDIAL DA SAúDE (OMS) dos casais em idade reprodutiva enfrentam a infertilidade 15% 35% 35%, 86 VIVASAÚDE WWW.REVISTAVIVASAUDE.COM.BR

Upload: truongdien

Post on 10-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: À espera da gravidez - Medicina Reprodutiva · apetrechos do universo mater-no. Assim, elas mimetizam as atitudes da mãe junto aos próprios “filhos” e seguem ... mos uma melhora

dos casos de infertilidade são

exclusivamente femininos

exclusivamente masculinos

À espera da gravidez

Como a medicina reprodutiva é capaz de ajudar cada vez mais casais a conquistar o

grande sonho de ser pai e mãetexto Daniela Barros

Desde cedo, muitas garotinhas vivem cercadas por bonecas, mamadeiras e tantos outros apetrechos do universo mater-

no. Assim, elas mimetizam as atitudes da mãe junto aos próprios “filhos” e seguem adotando objetos e pessoas a quem dedi-cam o seu afeto ao longo da vida.

Com o passar dos anos, já mulheres, vão transferindo essa necessidade de cuidar para o “projeto gravidez”. Mas, e se esse momento não chega? É um balde de água fria. Fria não, congelante! E aconteceu comigo.

Quando me casei, aos 25 anos de idade, já sabia que meu marido era portador de vari-cocele, uma dilatação anormal das veias tes-ticulares. Nós só não sabíamos ainda se isso poderia interferir em sua fertilidade. Como eu ainda era muito jovem e estava com a car-reira a pleno vapor, não dei muita importân-cia para isso na época. Porém, no ano de 2009, triiiimm! O meu relógio biológico tocou. Era chegada a hora de deixar um pouco os planos profissionais de lado e priorizar o nosso baby.

a hora dos examesO primeiro passo foi conversarmos com

um urologista especializado em medicina reprodutiva, que recomendou ao Vinicius, meu marido, a realização de um espermogra-ma. Esse exame,feito em laboratório,analisa a qualidade do esperma do homem a partir de uma amostra de sêmen. Mas, em nosso caso, o resultado não foi nada animador. Ele possuía anormalidades em todos os itens, como mor-fologia, mobilidade etc. O médico nos alertou que as perspectivas de engravidar por vias naturais eram mínimas, quase nulas. Então eu fiz os exames de praxe (veja a seguir) e, práti-cos que somos, partimos para a nossa primei-ra fertilização in vitro (FIV). D

aD

os:

org

an

izaç

ão M

un

Dia

l Da

saú

De 

(oM

s)

dos casais em idade reprodutiva enfrentam a

infertilidade

15%

35%

35%,

86 vivasaúDe www.revistavivasaude.com.br

Page 2: À espera da gravidez - Medicina Reprodutiva · apetrechos do universo mater-no. Assim, elas mimetizam as atitudes da mãe junto aos próprios “filhos” e seguem ... mos uma melhora

As evidências científicas revelam que em quase 1/3 das vezes, não é possível determinar uma causa específica para a infertilidade

Era março de 2010, o começo de nossa jor-nada. Eu imaginava que já sairia do consul-tório grávida, até de gêmeos. Logo de cara o tratamento da FIV falhou. Eu precisei inter-romper o ciclo, pois não respondi adequa-damente aos hormônios e formei um cisto. Nossa, que frustração! Não fazíamos ideia de que isso poderia acontecer.

após quatro tentativas...Respiramos fundo, nos recuperamos, e par-

timos para a próxima. Negativa. Tudo bem, acontece. Vamos de novo? Sim! Novamente, não deu. Conversamos com o médico e per-guntamos o que poderia melhorar aquele ce-nário. Ele indicou a cirurgia para varicocele. O Vinicius, mesmo morrendo de medo, to-pou. O procedimento foi bem-sucedido, mas ainda poderia levar um tempo até observar-mos uma melhora no espermograma.

Tentamos pela quarta vez, agora em outra clínica. Nada. Então mudamos de novo, e até, de cidade. Foi quando engravidei. Nossa, foi maravilhoso! Era agosto de 2012 e estáva-mos em estado de êxtase. Contudo, não du-rou muito tempo. Oito semanas depois, um aborto retido levou a nossa alegria.

Este tipo de abortamento, para explicar a vocês, acontece quando a paciente não apresenta sintomas da ameaça de aborto, contudo, há sinais de que o embrião não está mais vivo. Esses indícios podem ser clínicos, quando, por exemplo, a mulher não sente mais em seu corpo as mudanças que a gravidez havia provocado. Ou, ainda, ao exame físico nota-se que o útero não cresceu. Outra forma de constatá-lo é pelo sonar (aparelho que verifica os batimen-tos cardíacos fetais), quando o médico não consegue ouvir o coração do feto, ou pelo ultrassom, que comprova a ausência de

crescimento do feto e de seus batimentos cardíacos. Em meu caso, aconteceu justa-mente durante um exame de ultrassono-grafia. Eu achei que não me recuperaria. Mas aprendi que quando a gente quer mui-to algo, aquilo não fica bem resolvido em nosso coração até conseguirmos. E lá fo-mos nós para mais uma tentativa frustrada. Senti que era hora de mudar novamente de médico. Em junho de 2013, dois dias antes do meu aniversário de 33 anos, eis que eu recebia o maior presente: positivo! Dessa vez, apesar de todas as intercorrências que enfrentei na gestação, passando a maior parte dela em repouso, a Maria Luisa che-gou. No dia 28 de janeiro de 2014 a nossa princesa veio completar o pedacinho que faltava em nossas vidas.

Falar sobre infertilidadeExistem vários fatores que podem impedir

uma gestação. Daniel Suslik Zylbersztejn, médico do Setor de Reprodução Humana do Hospital São Paulo e responsável do Laboratório de Análise Seminal do Laboratório Fleury, explica que quando um casal não consegue engravidar, deve-se sem-pre iniciar a consulta médica perguntando a frequência das relações sexuais que eles apresentam. “Embora pareça ser uma per-gunta um tanto prosaica, vemos na prática que muitos casais não têm contatos sexuais frequentes e bem distribuídos durante o ciclo menstrual”, comenta. Outro fator observa-do é que muitos casais estão postergando as tentativas para engravidar, esquecendo-se de que a mulher tem um tempo de vida re-produtiva limitada por sua própria biologia. Após os 35 anos, ela corre o risco de seu po-tencial reprodutivo estar reduzido, além de aumentar os riscos de síndromes genéticas.

isCa É o nome dado ao diagnóstico de infertilidade sem causa aparente: todos os exames do casal não demonstram alterações que expliquem a dificuldade em engravidar naturalmente

Menos de 15% dos casais têm como diagnóstico uma infertilidade sem causa aparente.

vivasaúDe 87www.revistavivasaude.com.br

Page 3: À espera da gravidez - Medicina Reprodutiva · apetrechos do universo mater-no. Assim, elas mimetizam as atitudes da mãe junto aos próprios “filhos” e seguem ... mos uma melhora

a investigação essencial do potencial reprodutivo feminino pode ser realizada, na grande maioria dos casos, dentro de um único ciclo menstrual. isso gera um dinamismo maior na avaliação clínica e uma consequente redução de ansiedade e estresse conjugal.

Considera-se como infértil um casal que não consegue a gestação após um ano de tentativa.

ser Mãe

alimentação saudável, boas horas de sono, exercícios regulares e lazer contribuem para a saúde geral, refletindo no potencial de fertilidade.

PerFil HorMonal: entre o 2º e o 4º dia do ciclo menstrual.

UltrassoM transvaginal (entre o 10º e o 14º dia do ciclo menstrual): sua realização na fase folicular final do ciclo menstrual favorece uma melhor observação da cavidade endometrial e a constatação de presença ou ausência de folículo dominante.

HisterossalPingograFia: único exame capaz de avaliar a função tubária e estimar a competência do trato reprodutivo feminino para alcançar uma gravidez natural ou indicar tratamento com inseminação intrauterina.

exaMe FísiCo DetalHaDo

esPerMograMa: nessa etapa é preciso realizar dois exames. Caso comprove-se alterado, exames de avaliação hormonal e até genética podem ser solicitados para completar a avaliação do homem.

os exames que mudam tudo

seU estilo De viDa aFeta a FertiliDaDe. QUer ver só?

embora haja indícios de que o uso de certas vitaminas e minerais benefíciam a qualidade dos gametas, ainda não se sabe o verdadeiro papel deles nesse processo.

o uso de drogas ilícitas pelo homem, como a maconha e a cocaína, afeta a fertilidade e compromete a qualidade do espermatozoide.

Para elas: Para eles:

Quando o auxílio médico é

bem-vindo

o tempo cai para seis meses quando a mulher tem 37 anos ou mais.

88% dos casais irão engravidar naturalmente dentro do primeiro ano.

sabe-se que nos primeiros seis meses de tentativas mais de 60% dos casais irão engravidar naturalmente e o restante, nos outros seis meses.

Por isso, em casais em que a mulher tenha 35 anos ou mais, é recomendada uma avaliação depois do 6º mês de tentativa sem sucesso.

88 vivasaúDe www.revistavivasaude.com.br

Page 4: À espera da gravidez - Medicina Reprodutiva · apetrechos do universo mater-no. Assim, elas mimetizam as atitudes da mãe junto aos próprios “filhos” e seguem ... mos uma melhora

Dificuldades masculinasOs homens apresentam inúmeros agravos

à fertilidade. A varicocele, doença que afeta 15% da população masculina, ainda pouco diagnosticada, é a causa tratável mais fre-quente. O aparecimento dessa doença ocor-re durante a puberdade e seu tratamento é realizado por meio de um procedimento cirúrgico. “Mas os homens precisam ficar atentos e procurar ajuda médica, pois quanto mais tempo for ativa a varicocele, mais pre-juízos ela acarreta à fertilidade masculina; o diagnóstico e uma avaliação precoce podem permitir a preservação do potencial fértil do homem”, recomenda o médico Zylbersztejn.

o uso de anabolizantes, a depender da dose e do tempo, pode suprimir a produção de espermatozoides até de uma forma irreversível.

o tabagismo pode levar a mulher a uma menopausa precoce, além de aumentar os riscos de uma gravidez ectópica (desenvolvida nas trompas).

Há ainda os riscos para o desenvolvimento fetal nas mães tabagistas, como a restrição do crescimento intrauterino e baixo peso ao nascer.

no homem, a deposição de cádmio e outras substâncias tóxicas no testículo provenientes do cigarro afetam a redução de espermatozoides.

embora a ansiedade, o nervosismo e a depressão sejam relatados como causas de infertilidade feminina, dificilmente serão capazes de tornar um indivíduo infértil.

impeditivos femininosDe acordo com o ginecologista Edson

Borges Junior, coordenador do curso de pós-graduação em Reprodução Humana Assistida do Instituto Sapientiae e diretor científico do Fertility Medical Group, as disfunções ovulatórias, sendo a principal delas a síndrome dos ovários policísticos, as obstruções tubárias (causadas por la-queadura ou por processos infecciosos) e a diminuição da reserva ovariana, reflexo do aumento da idade da mulher, constituem os principais motivos impeditivos da ges-tação por parte da mulher.

o fator endometrioseZylbersztejn comenta que as mulheres,

classicamente, apresentam três grandes fatores de infertilidade, distribuídos da se-guinte maneira: 30%, fator tubário, gerado principalmente por doenças sexualmente transmissíveis (DST); 30%, por problemas em ovular; e 30%, por endometriose, uma doença caracterizada pela presença de te-cido endometrial fora dos limites uterinos.

A especialista explica que a endome-triose, por ser uma doença de caráter pro-gressivo, prejudica a integridade de todo o sistema reprodutivo feminino, e de outros órgãos próximos, como bexiga e intestino. Outras causas menos frequentes, mas com grande repercussão para o potencial de fertilidade feminino, são a falência ovaria-na prematura, alterações genéticas (como a síndrome do X frágil), tabagismo, além dos tratamentos com quimioterapia e ra-dioterapia contra um câncer.

CaUsas Da inFertiliDaDe neles a varicocele é a responsável em 40% dos casos.

Já aqueles que se deparam com infertilidade secundária (já têm um filho), a varicocele afeta 80% deles.

outros fatores importantes: tabagismo; uso de drogas (maconha, cocaína, crack); criptorquidia (testículo não descido para a bolsa testicular); torção de testículo; orquite por caxumba (inflamação do testículo pelo vírus Paramyxovirus); obesidade.

e nelas 30%, fator tubário, gerado principalmente por (DsT).

30%, por problemas em ovular.

30%, por endometriose, uma doença caracterizada pela. presença de tecido endometrial fora dos limites uterinos.

outros fatores importantes: síndrome do ovário policístico; falência ovariana prematura; alterações genéticas (como a síndrome do X frágil); tabagismo.

vivasaúDe 89www.revistavivasaude.com.br