a engenharia da arca de noÉ

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148 Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178 | Via Teológica A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ The Noah´s Ark Engineering Leonardo Pedro Wichert Neto. 1 Resumo O presente artigo pretende fazer uma abordagem do relato bíblico de Gênesis 6:11-8:3, a partir da ótica da moderna engenharia, levantando dados e compilando análises que mostrem quais eram as reais características da embarcação de Noé, bem como seu desempenho esperado para as condições de maré que possivelmente ocorreram durante o dilúvio. Com esse trabalho espera-se trazer uma imagem mais real dos acontecimentos da grande inundação relatada em gênesis. É importante destacar que esse trabalho não tem a intenção de tentar provar ou não a existência da arca ou do dilúvio. Parte-se do princípio de que o dilúvio e a arca incontestavelmente aconteceram. Palavras-chave: Arca de Noé; Dilúvio; Engenharia Naval; Gênesis. Abstract This article intends to approach the biblical story of Genesis 6:11-8:3 from the perspective of modern engineering, collecting data and compiling analysis that show what were the actual characteristics of Noah’s vessel, as well as its desired 1 Engenheiro Civil graduado pela Universidade Federal do Paraná e aluno do curso de Bacharelado em Teologia da Faculdade Teológica Batista do Paraná. E-mail: [email protected].

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Page 1: A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

148 Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178 | Via Teológica

A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

The Noah´s Ark Engineering

Leonardo Pedro Wichert Neto.1

Resumo

O presente artigo pretende fazer uma abordagem do

relato bíblico de Gênesis 6:11-8:3, a partir da ótica da moderna

engenharia, levantando dados e compilando análises que mostrem

quais eram as reais características da embarcação de Noé, bem

como seu desempenho esperado para as condições de maré que

possivelmente ocorreram durante o dilúvio. Com esse trabalho

espera-se trazer uma imagem mais real dos acontecimentos da

grande inundação relatada em gênesis. É importante destacar

que esse trabalho não tem a intenção de tentar provar ou não a

existência da arca ou do dilúvio. Parte-se do princípio de que o

dilúvio e a arca incontestavelmente aconteceram.

Palavras-chave: Arca de Noé; Dilúvio; Engenharia Naval; Gênesis.

Abstract

This article intends to approach the biblical story of

Genesis 6:11-8:3 from the perspective of modern engineering,

collecting data and compiling analysis that show what were

the actual characteristics of Noah’s vessel, as well as its desired

1 Engenheiro Civil graduado pela Universidade Federal do Paraná e aluno do curso de Bacharelado em Teologia da Faculdade Teológica Batista do Paraná. E-mail: [email protected].

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performance in the sea conditions that possibly occurred during

the flood. With this work it is expected to bring a truer picture of

the events of the great flood described in Genesis. It is important

to highlight that this work has no intention of trying to prove or

disprove the existence of the ark and the flood. It starts from the

principle that the flood and the ark undeniably happened.

Keywords: Noah’s Ark; Flood; Marine Engineering; Genesis.

IntRodução

Quando se pensa na Arca de Noé, a primeira imagem que

vem a cabeça de muitos é a de um barco de madeira, com a forma

semelhante a uma banheira, com um telhado em cima e cheia

de animais. Bem provavelmente também estarão presentes na

cena um casal de elefantes e um de girafas olhando pelas janelas

e Noé e sua família parados sobre o convés, acenando. Essa é a

imagem típica da Arca, com a qual estamos familiarizados desde

que éramos crianças.

Contudo, ao estudarmos os relatos apresentados na bíblia,

logo percebemos que essa imagem usual não é fiel à realidade.

Apesar do relato bíblico não conter informações detalhadas

sobre o projeto da Arca, podemos utilizar as informações de

Gênesis como base para inúmeros cálculos e testes sobre a Arca.

No decorrer desse artigo, pretende-se mostrar, com base

nas Escrituras, e sob a luz da engenharia moderna, através de

cálculos, testes e comparações com embarcações modernas, quais

eram as características de forma, tamanho e navegabilidade da

Arca de Noé, trazendo assim uma imagem mais real dos fatos do

dilúvio, de forma a criar para o leitor uma imagem verossímil dos

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acontecimentos da grande inundação relatada em Gênesis.

1 o PRojeto

Numa referência bíblica, podemos ler:

A terra, porém, estava corrompida diante da face de Deus; e encheu-se a terra de violência. E viu Deus a terra, e eis que estava corrompida; porque toda a carne havia corrompido o seu caminho sobre a terra. Então disse Deus a Noé: O fim de toda a carne é vindo perante a minha face; porque a terra está cheia de violência; e eis que os desfarei com a terra. Faze para ti uma arca da madeira de gofer; farás compartimentos na arca e a betumarás por dentro e por fora com betume. E desta maneira a farás: De trezentos côvados o comprimento da arca, e de cinqüenta côvados a sua largura, e de trinta côvados a sua altura. Farás na arca uma janela, e de um côvado a acabarás em cima; e a porta da arca porás ao seu lado; far-lhe-ás andares, baixo, segundo e terceiro. Porque eis que eu trago um dilúvio de águas sobre a terra, para desfazer toda a carne em que há espírito de vida debaixo dos céus; tudo o que há na terra expirará. Mas contigo estabelecerei a minha aliança; e entrarás na arca, tu e os teus filhos, tua mulher e as mulheres de teus filhos contigo. E de tudo o que vive, de toda a carne, dois de cada espécie, farás entrar na arca, para os conservar vivos contigo; macho e fêmea serão. Das aves conforme a sua espécie, e dos animais conforme a sua espécie, de todo o réptil da terra conforme a sua espécie, dois de cada espécie virão a ti, para os conservar em vida.2

A narrativa nos mostra como Noé, sua família e todas as

espécies de animais da terra foram salvos quando Deus decidiu

destruir o mundo por conta da maldade humana.

Deus deu a Noé instruções para a construção da Arca.

Deveria ser feita de madeira, com três “decks” e com medidas

2 ALMEIDA, João Ferreira (Trad.). Bíblia Apologética de Estudo. 2. ed. Jundiaí: ICP, 2005. Gênesis 6:11-20, pag. 13-14.

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totais de 300 côvados de comprimento, 50 côvados de largura e

30 côvados de altura. Também deveria ter um telhado (janela) em

cima, de um côvado.

1.1 A foRmA dA ARcA

O relato bíblico não nos dá uma descrição exata da forma

da Arca.

Ao longo da história muitos artistas ao redor do

mundo representaram a embarcação de Noé em pinturas e

desenhos diversos. Apesar de diferenças existirem entre essas

representações, a grande maioria delas tende a adotar uma

forma similar para a Arca.

Em grande parte das representações que encontramos da

história do dilúvio, a Arca aparece como um grande barco de

madeira, com casco bastante curvo e com uma proporção entre

comprimento e altura muito menor do que o descrito na bíblia.

Outra diferença marcante presente em muitas representações é

o telhado, que sempre se parece com uma casa colocada sobre

a Arca.

figura 1 - Ilustração da Arca de noé

clássica (worldwideflood, 2012)

No texto original hebraico, a palavra usada para se referir

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à embarcação é tbat=Ii3 (tebat), a qual ocorre apenas duas vezes em

toda a bíblia: na narrativa do dilúvio e no livro de Êxodo, quando

é usada para descrever o cesto em que Moisés foi colocado por

sua mãe.

A enorme diferença entre os dois objetos torna difícil a

tarefa de determinar o significado dessa palavra.

Algumas fontes indicam que essa palavra não seria de

origem hebraica, mas sim derivada da palavra egípcia db’at, que

significa caixa, baú ou arca, sugerindo uma forma quadrangular.

Contudo, quando o texto original faz referência à Arca

da Aliança, a palavra utilizada não é tebat, mas sim NwOr)j4 (aron).

A primeira tradução a utilizar a mesma palavra para se referir à

Arca de Noé e à Arca da Aliança é o texto grego da septuaginta5,

onde ambas são chamadas de kibotój (kibotos). Nessa tradução,

diferentemente do texto hebraico, a palavra utilizada para

descrever a Arca de Noé não é a mesma usada para o cesto de

Moisés, que aqui é chamado de qibin (thibin).

Outra hipótese com relação á tradução da palavra tebat

é que essa signifique “salva-vidas”, o que daria uma explicação

cabível tanto no relato do dilúvio quanto no relato de Moisés.

O que fica claro é que a palavra tebat não pode significar

especificamente nem barco (em hebraico hyf@ni)f6 – oniyah), nem

3 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Gênesis 6:14, pag. 8.4 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Êxodo 25:10, pag. 126.5 The Septuagint Version of the Old Testament. 8. ed. Grand Rapids: Zondervan Publishing House, 1976.6 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Jonas 1:3, pag. 930.

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cesto (em hebraico lsa7 – sal, ou dw@d@8 – dud), como a maioria das

traduções nos traz. Isso faz com que a forma da Arca seja ainda

um mistério. Talvez tebat nem mesmo faça menção a uma forma

específica, e sim à função da Arca (se usarmos a interpretação de

salva-vidas).

Com a aparente falta de pistas sobre o texto bíblico,

precisamos investigar outros fatores para tentar chegar a uma

forma mais próxima a da Arca real.

Levando-se em conta a tecnologia disponível na época da

construção da Arca, as condições de navegação às quais ela foi

exposta e a finalidade à qual ela se propunha, podemos chegar

a algumas conclusões que nos ajudam a definir uma possível

forma preferível.

Primeiramente, pensando-se nas tecnologias e ferramentas

disponíveis na época da construção deve-se ter em mente que

quanto mais simples a forma da embarcação, mais fácil seria a

sua execução. Sabemos que formas quadradas e ângulos retos são

muito mais fáceis de construir do que curvas e formas complexas.

Outro fator importante é o fim a que se destinava a Arca.

Como deveria funcionar apenas como uma balsa flutuante e sem

propulsão, viajando a deriva, e não como um navio propulsionado,

a melhora do desempenho do casco através de formas mais

complexas, tais como extremidades afiladas ou arredondadas, que

visam diminuir o arrasto e melhorar o deslocamento, seriam de

pouca importância, ainda mais se considerarmos o aumento da

7 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Levítico 8:26, pag. 155.8 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Jeremias 24:2, pag. 749.

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dificuldade na construção que essas formas acarretariam.

Muitos estudos modernos apontam para a Arca tendo

uma forma de paralelepípedo, com uma claraboia longitudinal

no centro do convés, não tendo nenhuma curva em suas

extremidades, conforme se pode ver na Figura 2. Essa é uma

forma que facilitaria a construção e maximizaria o espaço interno,

algo que também era importante para Noé.

figura 2 - Arca de noé nas proporções

bíblicas (modelwarships, 2012)

Neste trabalho, estudaremos mais a fundo esta forma de

paralelepípedo. Explicações mais detalhadas com relação à forma

do casco, sua estabilidade e resistência, bem como as condições

de navegabilidade a que a Arca foi exposta, serão abordadas na

sequência do trabalho, dando maior embasamento a essa teoria.

1.2 o mAteRIAl

É fato incontestável que a Arca era feita de madeira, já que

o texto bíblico nos diz que a arca deveria ser feita com madeira

de gofer9.

9 ALMEIDA, João Ferreira (Trad.). Bíblia Apologética de Estudo. 2. ed. Jundiaí: ICP, 2005. Gênesis 6:14, pag. 13.

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Contudo, não se sabe com certeza o que significa gofer. Não

se conhece nenhuma madeira chamada de gofer, nem atualmente

e nem na antiguidade.

A palavra utilizada no texto original é rpego10 (gofer). Essa

palavra aparece apenas nesse texto, não se repetindo mais durante

toda a bíblia.

Alguns dizem que essa palavra seria resultado de um erro

de grafia da palavra rpeko%11 (kofer), que pode ser traduzida como

betume ou resina. Isso faria com que a tradução da passagem fosse

madeira de betume ou madeira resinosa, referindo-se ao tipo da

madeira ou ao tratamento dado a ela, mais do que à sua espécie.

Visto que na sequência do mesmo versículo Deus faz referência

novamente a esse processo de tratamento da madeira, a teoria tem

grande probabilidade de ser correta.

Já Kidner12 considera “cipreste” uma conjectura mais

plausível para essa passagem. Essa hipótese foi a utilizada na

tradução da NVI13, onde o texto de Gênesis 6:14 diz que a Arca

deve ser feita com madeira de cipreste.

De todas as maneiras, o texto bíblico não é claro com relação

ao tipo de madeira que foi utilizado na Arca.

Para esse trabalho, adotou-se como referência de cálculo

valores de densidade da madeira de 600 kg/m3, como no estudo

10 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Gênesis 6:14, pag. 8.11 KITTEL, Rudolf (Org.). Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5. ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. Gênesis 6:14, pag. 8.12 KIDNER, Derek. Gênesis: Introdução e Comentário. 2 ed. São Paulo: Editora Mundo Cristão, 1981, pag. 83.13 BARKER, Kenneth (Org.). Bíblia de Estudo NVI. 1. ed. São Paulo: Editora Vida, 2003. Gênesis 6:14, pag. 16.

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de Hong14. Isso equivaleria aproximadamente à densidade da

madeira de cedro ou cerejeira.

1.3 As dImensões

As dimensões da Arca, dadas por Deus, estão descritas no

texto bíblico da seguinte forma:

E desta maneira a farás: De trezentos côvados o comprimento da arca, e de cinqüenta côvados a sua largura, e de trinta côvados a sua altura. Farás na arca uma janela, e de um côvado a acabarás em cima; e a porta da arca porás ao seu lado; far-lhe-ás andares, baixo, segundo e terceiro. 15

Nesse ponto nos deparamos com outra incerteza. O texto

bíblico original traz suas medidas em côvados, mas qual é a

medida do côvado em unidades modernas?

O côvado é determinado como a distância entre o cotovelo e

a ponta dos dedos da mão aberta, ou seja, o tamanho do antebraço

somado ao tamanho da mão, conforme mostra a Figura 3.

figura 3 - o côvado (worldwideflood, 2012)

Nas civilizações antigas, o côvado era uma medida

corrente, porém existiam diferenças entre as medidas adotadas

por cada civilização.

14 Hong, S. W. [et al]. Safety Investigation of Noah’s Ark in a Seaway. Creation Ex Nihilo Technical Journal 8, 1994, pag. 26-35.15 ALMEIDA, João Ferreira (Trad.). Bíblia Apologética de Estudo. 2. ed. Jundiaí: ICP, 2005. Gênesis 6:15-16, pag. 14.

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A Tabela 1 mostra uma lista com algumas das medidas

mais prováveis para o côvado.

GRUPO CÔVADO mm

Côvados Curtos

Hebraico curto 445 mm

Egípcio curto 447 mm

Comum 457 mm

Côvados Longos

Babilônico real 503 mm

Hebraico longo 518 mm

Egípcio real 524 mm

Côvado Extra Longo Babilônico longo 610 mm

tabela 1 - Referências para a medida do côvado (morris, 1971)

Utilizando a referência de cada um dos côvados, a Arca

teria seu tamanho de acordo com a Tabela 2.

GRUPO CÔVADO mm Comp. da Arca % Acréscimo

Côvados Curtos

Hebraico curto 445 133m 100%

Egípcio curto 447 134m 102%

Comum 457 137m 109%

Côvados Longos

Babilônico real 503 151m 145%

Hebraico longo 518 155m 158%

Egípcio real 524 157m 164%

Côvado Extra Longo Babilônico longo 610 183m 258%

tabela 2 - comprimento da Arca de noé com

relação a cada côvado (morris, 1971)

Adotando-se como referência o côvado Comum, o qual

mede 45,7 cm, a Arca mediria 137 m de comprimento, 22,85 m

de largura e 13,7m de altura.

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158 Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178 | Via Teológica

1.4 As PRoPoRções

O modo como as embarcações reagem ao vento e às ondas é

chamado de “comportamento no mar” e, entre outras coisas, está

relacionado com suas proporções.

Um navio proporcionalmente mais comprido é mais

confortável, porém mais vulnerável a alquebrar, ou seja, quando

suspenso a partir do centro por uma onda, as extremidades da

embarcação tendem a flexionar, criando o risco de partir o casco

ao meio. – Figura 4.

figura 4 - Aumento do conforto (lovett, 2006)

Para se evitar o problema do alquebramento e construir

um casco mais resistente, pode-se optar por um formato

proporcionalmente mais alto. Esse casco é mais resistente, porém

mais vulnerável ao emborcamento, ou seja, à rolagem do barco

em torno de seu eixo longitudinal, fazendo com que o mesmo vire

de boca para baixo – Figura 5.

figura 5 - Aumento da resistência (lovett, 2006)

Para que um casco seja mais estável ao emborcamento é

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possível aumentar sua largura. Um navio proporcionalmente mais

largo é mais estável ao emborcamento, porém menos confortável e mais vulnerável ao movimento das ondas. – Figura 6.

figura 6 - Aumento da estabilidade (lovett, 2006)

É possível notar que esses três parâmetros de conforto,

resistência e estabilidade estão competindo um com o outro,

sendo impossível se atingir o máximo dos três parâmetros em um

mesmo caso. É como se os três estivessem dispostos graficamente

em um triângulo, onde cada uma das três dimensões ocuparia um

dos vértices, conforme a Figura 7.

figura 7 - Parâmetros de conforto, Resistência e estabilidade dispostos graficamente (lovett, 2006)

Page 13: A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

160 Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178 | Via Teológica

No ano de 1992, um time de nove pesquisadores do Instituto

Coreano de Pesquisas Navais e Engenharia Oceânica (Korean

Research Institute of Ships and Ocean Engineering-KRISO) em

Daejeon, Coréia, liderados pelo Dr. Seon W. Hong16, a pedidos de

um grupo de criacionistas coreanos, iniciou um extensivo estudo17

partindo de uma análise detalhada das proporções bíblicas da

Arca e comparando-a com diversos formatos de cascos diferentes.

Durante esse estudo, a Arca de Noé18 foi analisada através da

comparação com 12 diferentes proporções de casco19, todos com

o mesmo volume, conforme nos mostra a Tabela 3. Diferentes

comprimentos, alturas e larguras foram sendo combinados para

criar os 12 cascos fictícios.

Os resultados desse estudo definiram parâmetros ótimos de

estabilidade, resistência e conforto para uma embarcação.

Comp. Larg. Alt. Elevação frontal e lateral do casco Resultado

135 22,5 13,5 OK

135 15 20,3Instável ao

emborcamento

135 18,8 16,2 Pouco estável

135 27 11,25Mais fraco e menos suave

135 33,8 9,0

Muito fraco e baixo

(risco de inundação)

16 Dr. Hong era o cientista chefe da pesquisa que investigou a de Arca de Noé. É licenciado em arquitetura naval pela Universidede Nacional de Seoul e PhD em mecânica aplicada pela Universidade de Michigan.17 Esse estudo resultou no artigo Safety Investigation of Noah’s Ark in a Seaway.18 O trabalho desenvolvido pelo KRISO considerou um formato de paralelepípedo para a Arca.19 O trabalho desenvolvido pelo KRISO levou em conta um côvado de 45 cm.

Page 14: A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

161Via Teológica | Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178

90 22,5 20,3Pior

navegabilidade

112,5 22,5 16,22ª pior

navegabilidade162 22,5 11,3 3º mais fraco

202,5 22,5 9,0O mais fraco de

todos

90 33,8 13,5Navegabilidade

difícil

112,5 27 13,5Navegabilidade

difícil

162 18,8 13,5Fraco e pouco

estável

202,5 15 13,5

2º mais fraco, instável,

boa navegabilidade

tabela 3 - Análise da estabilidade de 13

diferentes formatos de casco (Hong, s. W. et al, 1994)

A Figura 8 mostra as proporções de conforto, estabilidade e

resistência para um navio nas proporções da Arca de Noé obtidas

a partir dos resultados dos testes feitos pelo KRISO.

figura 8 - Gráfico de equilíbrio para um casco com

as proporções da Arca (lovett, 2006)

Page 15: A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

162 Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178 | Via Teológica

Como já foi dito, as dimensões da Arca eram 300 côvados

de comprimento, 50 de largura e 30 de altura. É incrível que,

levando-se em conta os três parâmetros da pesquisa, a Arca de Noé

enquadra-se exatamente no ponto médio do gráfico, apresentando

um balanço perfeito entre as três dimensões.

As proporções da Arca se mostraram excelentes para a

estabilidade de um navio, além de proporcionar um comportamento

no mar muito satisfatório, proporcionando resistência e conforto.

Em outras palavras, as dimensões da Arca são próximas ao ideal,

não sendo possível, segundo os pesquisadores, fazer mudanças

significativas para a melhoria do desempenho.

Muitos pesquisadores tendem a dizer que as proporções da

Arca eram as mais estáveis possíveis, O estudo do KRISO mostra

que isso não é verdade, porém a forma da Arca é a que melhor

combina resistência, estabilidade e conforto para as condições de

mar enfrentadas por Noé e sua família

Os resultados desse estudo também nos ajudam a entender

o porquê de Deus ter mandado Noé construir um navio tão

longo. Se Deus estivesse planejando intervir durante a viagem e

miraculosamente livrar a Arca dos efeitos das ondas, a melhor

forma para a embarcação de Noé seria um cubo, pois é a forma que

demanda menos material para sua construção. Adicionalmente a

isso, quanto mais longo é o casco, mais resistente precisa ser sua

construção para resistir às forças de alquebramento que tendem a

flexionar o casco.

1.4.1 A ARcA e os nAvIos modeRnos

A grande revolução na engenharia náutica moderna

Page 16: A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

163Via Teológica | Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178

ocorreu com o início dos navios fabricados com casco de aço.

Na segunda metade do século 19, a necessidade por navios

maiores e com a redução do custo do aço, os grandes navios

deixaram de ser construídos com madeira.

Contudo, algumas características dos navios se

mantiveram, mesmo com a introdução do aço. Entre elas estão

a proporção comprimento x altura e a proporção comprimento

x largura.

Deus disse a Noé que usasse uma proporção entre

comprimento e altura de 10 por 1. Só mais tarde os construtores

de navios aprenderiam a muito custo que essa relação permite

suportar grandes pressões em mares agitados.

Já o comprimento da Arca de Noé era seis vezes a sua

largura, uma relação comprimento x largura = 6.

Muitos navios modernos têm proporções semelhantes,

embora hoje em dia a escolha da relação comprimento x

largura seja feita levando-se em conta a potência necessária

para navegação. Um típico navio de transporte moderno

possui uma relação entre 6 e 8. Essa relação pode chegar a

10 para navios de alta velocidade. Como a Arca só precisava

flutuar, a propulsão não era fator importante para ela.

A Figura 9 mostra a comparação em escala real da Arca

de Noé ao lado do navio de cruzeiro P&O Pacific Sky. O

navio de cruzeiro tem aproximadamente as dimensões do

Titanic, com capacidade para 1550 passageiros, 11 “decks” e

240 m de comprimento.

Page 17: A ENGENHARIA DA ARCA DE NOÉ

164 Leonardo Pedro Wichert Neto, Vol. 13, n.26, dez.2012, p. 148 - 178 | Via Teológica

figura 9 - Replica em escala real da Arca ao lado

de um navio de cruzeiros (lovett, 2004)

1.4.2 A ARcA e outRAs HIstóRIAs AntIGAs de

dIlúvIos

Histórias de dilúvio podem ser encontradas na mitologia

de vários povos do Pacífico, das Américas, do sul da Ásia e do

Oriente Próximo.

Existem diversas narrativas mesopotâmicas antigas que

descrevem a grande inundação, todas com muitos pontos em

comum com o relato bíblico.

A mais próxima da narrativa bíblica é o Épico de Gilgamesh,

que data de cerca de 1600 a.C., e chegou até nós através de 12

tabletes de argila encontrados nas escavações da livraria palaciana

da antiga capital assíria, Nínive, em 1853.

O tablete de número 1120 nos conta a história desse dilúvio

da seguinte forma:

Oh! homem de Shuruppak, filho de Ubartutu: Demolí a casa e construí um barco! Abandona a fartura e procura seres vivos! Despreza possessões e mantém vivos esses seres! Faz todos os seres vivos entrarem no barco. O barco que constróis, suas

20 The Epic of Gilgamesh, Tablete XI.

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dimensões devem ser iguais umas às outras: seu comprimento deve corresponder à sua largura,” Utnapishtim obedeceu: “Um acre (inteiro) era o espaço do seu chão. Dez dúzias de côvados a altura de cada uma de suas paredes, dez dúzias de côvados cada canto do convés quadrado,Eu sulquei a forma de seus lados e os juntei, dei a ela seis conveses, dividindo-a (assim) em sete partes,”…

Apesar das inúmeras semelhanças com a narrativa bíblica

do dilúvio, existe no épico de Gilgamesh uma sutil diferença, que

diz respeito às dimensões das arcas.

Segundo o relato do tablete 11, a arca de Utnapishtim,

grande herói do dilúvio, era um cubo com os lados medindo

aproximadamente 55m cada.

Diferentemente da Arca de Noé, que mostrou ter proporções

extremamente estáveis, mesmo contra ondas muito grandes, a

arca cúbica teria girado em torno do seu próprio eixo ao menor

distúrbio das ondas, ficando sem controle e fazendo com que os

animais e tripulantes passassem mal.

2 o desemPenHo dA ARcA

2.1 estAbIlIdAde

O emborcamento é um dos acidentes mais comuns que um

barco pode sofrer. De acordo com estatísticas da Comissão de

Investigação e Prevenção de Acidentes de Navegação – Cipanave

– da Diretoria de Portos e Costas da Marinha Brasileira, o

emborcamento é a forma mais comum de acidente em águas

brasileiras. O emborcamento é especialmente perigoso para uma

embarcação que está viajando de lado para as ondas e, entre

outras coisas, pode ocorrer devido a ondas altas ou ventos fortes.

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Com certeza, a estabilidade ao emborcamento era uma

característica fundamental para o bom desempenho da Arca.

Levando-se em conta mais uma vez as dimensões geométricas

da Arca, a Figura 10 nos mostra que ela poderia sofrer uma

rotação de até 31º em torno do seu eixo longitudinal sem que

a água atingisse a altura do convés superior, gerando o risco de

inundação.

Esses valores são obtidos através da interpretação de Gênesis

7:2021, que diz que quinze côvados acima prevaleceram as águas;

e os montes foram cobertos. Acredita-se que quinze côvados era

o calado da Arca, ou seja, o quanto dela ficou submerso depois

de carregada. Assim, como ela não tocava mais no solo após as

chuvas, havia ao menos quinze côvados de água acima da terra

mais alta. Caso contrário, o seu fundo tocaria em algo.

figura 10 - estabilidade ao emborcamento sem inundação (morris, 2002)

21 ALMEIDA, João Ferreira (Trad.). Bíblia Apologética de Estudo. 2. ed. Jundiaí: ICP, 2005. Gênesis 7:20, pag. 15.

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Como mostrado na Figura 11, oriundo dos estudos de

emborcamento realizados pelo KRISO, a Arca poderia resistir

a ondas de até 47,5 m sem ser rotacionada a 31º. Ondas desse

tamanho jamais foram registradas nos oceanos atuais, onde a

onda mais alta já medida chegou a 26m, no Atlântico Norte.

Mesmo ondas de Tsunamis não chegam a essa grandeza. A onda de

Tsunami mais alta já registrada ocorreu em Hokkaido, no Japão,

e chegou a 30m, provocada por um terremoto de magnitude 7,6

na escala Richter. Contudo, os tsunamis não são perigosos para

embarcações em alto mar, pois são perceptíveis apenas próximo

à costa.

figura 11 - Gráfico de resposta ao emborcamento

da Arca (Hong, s. W. et al, 1994)

Caso não levemos em conta o nível de inundação,

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considerando que a água poderia atingir o nível do convés superior

da embarcação sem inundá-la, o ângulo de emborcamento sobe

para 60º (Figura 12).

figura 12 - estabilidade ao emborcamento total (morris, 2002)

Segundo Collins22, mesmo ventos de 210 nós, o que representa

três vezes a força de um furacão, não poderiam inclinar a Arca

muito além de 3º.

2.2 confoRto

A Arfagem, movimento extremo gerado quando as ondas

fazem uma extremidade da embarcação subir e depois descer

abruptamente, seria muito desconfortável para as pessoas e os

animais a bordo da Arca.

A medida do nível de conforto de uma embarcação com

relação à arfagem é calculada levando-se em conta a aceleração

22 Collins, D,H. Was Noah’s Ark stable? Creation Research Society Quarterly 14. 1977, pag. 83.

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vertical em suas extremidades.

A Figura 13 nos mostra o gráfico do cálculo de aceleração

vertical nas extremidades para a Arca de Noé. Considerando-se o

limite de aceleração vertical para um navio de passageiros como

sendo 0,34 a aceleração da gravidade, vemos que a Arca poderia

enfrentar ondas de até 43 metros sem extrapolar os limites de

conforto para os passageiros.

figura 13 - Gráfico de aceleração vertical para a Arca (Hong, s. W. et al, 1994)

2.3 ResIstêncIA

Para suportar vários meses em mar aberto, o casco de

madeira da Arca de Noé deveria ter uma resistência mínima.

Fatores como a distribuição de cargas móveis no interior da

embarcação, grande comprimento e forma de bloco acentuam a

necessidade de um casco forte.

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Para uma embarcação longa, como a Arca de Noé, o maior

perigo para a resistência da estrutura ocorre quando se viaja na

direção das ondas, tentando cortá-las. No momento em que o

barco encontra-se no topo da onda, o casco é suspenso pela sua

parte central, deixando as extremidades suspensas (Figura 14).

Esse esforço é o alquebramento e, como já foi dito, gera o risco do

casco se partir ao meio.

figura 14 - movimento de Alquebramento (worldwideflood, 2012)

Para calcular o limite da Arca a partir do ponto de vista da

estrutura, o grupo de pesquisadores do KRISO plotou a espessura

necessária da madeira para diferentes alturas de onda.

A Figura 15 mostra que o limite estrutural da Arca era de

mais de 30 metros se a espessura da madeira fosse de 30 cm, o que

é uma suposição bastante razoável.

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figura 15 - limite estrutural para a Arca (Hong, s. W. et al, 1994)

2.3.1 As ondAs do dIlúvIo

A Bíblia diz que o aguaceiro que originou o Dilúvio foi muito

grande e também diz que Deus, mais tarde, fez com que soprasse um

vento para secar as águas.

O relato bíblico fala de um vento enviado por Deus para secar

a terra. O texto nos diz:

E lembrou-se Deus de Noé, e de todos os seres viventes, e de todo o gado que estavam com ele na arca; e Deus fez passar um vento sobre a terra, e aquietaram-se as águas. Cerraram-se também as fontes do abismo e as janelas dos céus, e a chuva dos céus deteve-se. E as águas iam-se escoando continuamente de sobre a terra, e ao fim de cento e cinqüenta dias minguaram. 23

Quanto mais o vento sopra e quanto maior é a sua força, maior

23 ALMEIDA, João Ferreira (Trad.). Bíblia Apologética de Estudo. 2. ed. Jundiaí: ICP, 2005. Gênesis 8:1-3, pag. 15.

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é a altura e a força das ondas. As Escrituras não especificam a força

do vento e das ondas, mas é provável que devido à falta de obstáculos

naturais, tais como montanhas e árvores, eles fossem muito fortes.

Embora as informações sobre o dilúvio não sejam suficientes para

prever com precisão a forma e a altura máxima das ondas, podemos

utilizar as dimensões da Arca e as suas especificações comparadas a

um navio de passageiros moderno para inferir as características das

águas em que Noé deve ter navegado.

Se as águas fossem calmas, a Arca poderia ter sido construída

mais baixa, empregando-se menos madeira e menos tempo para

construção. Caso as ondas fossem confusas, vindo de todos os lados,

a Arca deveria ser mais curta. De acordo com os resultados obtidos

pelos pesquisadores do KRISO24, a Arca de Noé parece ter sido

projetada para grandes ondas geradas por um vento unidirecional,

porém com uma estabilidade suficiente para lidar com um mar

ligeiramente confuso e ondas em outras direções.

Um vento constante e sem barreiras naturais geraria ondas

maduras, com comprimentos de onda longos e, provavelmente,

todas na mesma direção. Para essas condições de vento e ondas,

as proporções da Arca são as melhores possíveis, aliando conforto,

estabilidade e resistência.

2.4 A cAPAcIdAde de cARGA

2.4.1 AnálIse volumétRIcA

Os pesquisadores da Arca são unânimes em assumir que as

medidas dadas por Deus referem-se à parte externa da Arca. Dessa

24 Hong, S. W. [et al]. Safety Investigation of Noah’s Ark in a Seaway. Creation Ex Nihilo Technical Journal 8, 1994, pag. 26-35.

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forma, o espaço líquido no interior da embarcação, aquele que

efetivamente poderia ser utilizado, fica reduzido devido à dimensão

das paredes e estruturas.

Levando-se em conta a descrição de Gênesis, a Arca teria um

volume bruto de: 300 x 50 x 30 = 450 000 côvados cúbicos

Em metros, esse volume seria: 137 x 22,85 x 13,7 =

42.887,17 m3

Para conhecer o volume líquido da Arca, devemos subtrair

das dimensões a espessura de suas paredes e “decks”. Considerando-

se quatro paredes laterais, três “decks” e o teto e assumindo uma

espessura de paredes e decks de 30 cm25, temos as seguintes medidas

para a arca: (137 - 0,6) x (22,85 - 0,6) x (13,7 - 1,2) = 37936,25 m3

(perda de 11,5%)

Na Figura 16, vemos uma réplica da arca de Noé ao lado de um

vagão de trem e da caravela Pinta, utilizada por Cristóvão Colombo

quando descobriu a América, todos na mesma escala.

figura 16 - Arca de noé, caravela Pinta e vagão de trem em modelo reduzido. (biblestudy, 2012)

25 De acordo com o estudo do KRISO – Abordado no item 2.3 deste trabalho.

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O volume real do vagão de trem mostrado na figura é cerca

de 75,6 m3. Um vagão como esse é capaz de transportar em torno

de 240 ovelhas. Considerando-se que o volume líquido da arca

é mais de 422 vezes maior do que o do vagão de trem, pode-

se concluir que seria possível carregar muito mais de 100.000

animais do tamanho de uma ovelha.

Utilizando-se outro critério de referência, podemos dizer

que a arca poderia transportar 2 aviões Boeing-747, com espaço

de sobra (Figura 17).

figura 17 - Arca comparada a um boeing 747 e a

diversos animais (fonte: considere a possibilidade)

2.4.2 AnálIse de cARGA

Considerando-se o calado da arca em 15 côvados,

conforme interpretação de Gênesis 7:20 abordada no item 2.1, e

uma densidade de 600 Kg/m3 a equipe do KRISO calculou que

o peso total que da Arca seria de 21.016 toneladas. Com base na

mesma referência de densidade da madeira e as dimensões do

côvado já descritas anteriormente, chegou-se a um peso próprio

do casco de 4000 toneladas. Isso daria uma carga útil para a

Arca de 17.016 toneladas.

Utilizando-se como referência o avião Boeing-747 citado

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anteriormente, o mesmo pode ter peso máximo na decolagem

de 396 toneladas, considerando-se tanque cheio, passageiros,

tripulação e carga.

Isso quer dizer que seria preciso empilhar mais de 42 aviões

Boeing-747 sobre a Arca para se atingir o calado de 15 côvados

descritos no relato bíblico.

Adotando-se outro critério de comparação, sabe-se que um

elefante africano adulto pesa em média 7 toneladas. Assim, seria

possível colocar o peso de mais de 2430 elefantes africanos no

interior da Arca.

conclusão

Ao estudarmos a Arca de Noé sob a ótica da engenharia

moderna, percebemos que a visão tradicional que temos dela

muitas vezes não condiz à realidade. Quando levamos em conta as

informações do relato bíblico, vemos que a Arca é bem diferente

das ilustrações que estamos acostumados a ver em livros e revistas.

Analisando-se as informações contidas na história bíblica

do dilúvio, vemos que o projeto entregue a Noé é perfeitamente

possível de ser realizado. Na verdade, ele segue padrões de proporção

e desenho muito próximos ao ideal para as condições do dilúvio.

Estudos realizados comprovaram que a arca era extremamente

resistente, estável e confortável para seus ocupantes, possuindo a

melhor relação possível entre esses três indicadores. Suas proporções

mostram que seria muito difícil virá-la ou quebrá-la, mesmo se

fosse submetida a ondas superiores a 30 m de altura. Além disso, a

capacidade de carga da Arca também seria suficiente para carregar

uma quantidade muito grande de animais e suprimentos.

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