a energia renovada pela ética social

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Nesse artigo, abordei uma preocupação sobre o potencial ambiental do Brasil, tratado com seriedade e respeito à natureza.

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de abastecimento de energia – sobretu-do fósseis – abasteciam as instalações industriais vorazes por suprimento de energia. Ao mesmo tempo, a figura do capital financeiro precisava de tentá-culos para crescer e se firmar intrinse-camente como parte inexorável da nova oferta de bens e serviços que tinham o condão de facilitar a vida das pessoas em termos de comodidade e facilidades.

No século XXI essa questão se apro-funda com a necessidade de se ofertar, cada vez mais, bens e serviços para uma população cada vez maior, mais globa-lizada e economicamente ativa, ávida por consumo. Dessa forma, ficam mais acalorados os debates sobre as maiores questões que têm grande impacto geopo-

No século passado, o desenvolvimen-to de novos métodos de administração e gestão da produção foi estruturado de modo a permitir maiores quantidades de produtos por trabalhador, implicando significativas transformações no modelo de competição que, no entanto, se res-tringiu à redução de preços unitários dos produtos, com predominância de técnicas caracterizadas pelo uso inten-sivo de materiais, energia e capital fixo.

Trata-se da maior alteração já vista em termos de substituição de energia ao introduzir, no desenvolvimento indus-trial, a troca de fonte de energia, em que a energia utilizada pela ação humana voltada à produção perdeu espaço para a produção mecânica com utilização de

energia para movimentação de máqui-nas e para a produção em maior escala e maior padronização.

Criou-se uma cultura da abundân-cia, um pressuposto que permitia que ineficiências e desperdícios no processo produtivo fossem suportados pelo ganho de escala e transferência dos impactos para a sociedade em geral e para o meio ambiente. Essa falta de necessidade de preocupação com custos de materiais, energia e recursos naturais permitiram a adoção dos sistemas de produção industrial que conhecemos ainda hoje.

Os países ricos, já que industriali-zados, alcançaram altos patamares de desenvolvimento dentro desse modelo, em que o domínio sobre fontes seguras

A energia renovada pela ética social

O Brasil precisa repensar o seu planejamento energético sob a ótica da energia renovável, contemplando políticas socialmente justas, ambientalmente amigáveis e, ao mesmo tempo, com garantia de retorno ao investimento. As descobertas do pré-sal e o aumento da produção sugerem um uso racional e mais nobre para o petróleo, como a petroquímica, abrindo espaço para outras fontes energéticas para combustíveis.

ANtoNio CArlos Porto dE ArAujo

Especialista em estratégia de Energia renovável e sustentabilidade da trevisan

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lítico, que são energia, água e alimento.Para o Brasil, esses temas ganham

uma dimensão enorme, já que o país tem capacidade de autossuficiência e grande potencial exportador, seja em commodities alimentares, seja em agroenergia. Evidentemente que isso se torna possível graças às enormes fontes de água doce, amplamente necessárias para todo o ciclo agrícola de produção de alimentos e de agroenergia com os combustíveis renováveis, como o etanol de cana-de-açúcar e o biodiesel.

O biodiesel tem atratividade am-biental importante. Uma tonelada do óleo evita a produção de 2,5 toneladas de CO

2; reduz as emissões de materiais

particulados; apresenta significativa redução de hidrocarbonetos não quei-mados; além de ser biodegradável e melhorar a lubricidade do motor.

O fato é que nosso país precisa de mais fornecimento de energia, seja agrí-cola, hídrica ou fóssil, para combustí-vel ou eletricidade. Segundo relatórios recentes, já atingimos em 2010 um recorde de consumo de eletricidade em qualquer período da nossa história. Pro-jetando o crescimento do Brasil para os próximos dez anos, teremos de dobrar a capacidade de oferta de energia para algo em torno de 200.000 MW, contra os atuais 100.000 MW aproximadamente. Porém, em termos de cuidados ambien-tais, imprescindível se torna a análise correta dos impactos ambientais e so-ciais advindos das construções de obras e instalações de geração de energia.

Nota-se, então, a introdução de um novo discurso e de um novo modelo de gestão no qual a questão ambiental passa a ser protagonista e interfere na tomada de decisão nas esferas políti-cas, sociais e comerciais. Parece que a cultura da abundância passou a ser questionada e as conclusões levam à ruptura dos modelos até aqui adotados e impõem novos marcos como regulações; pressões sociais e comerciais; e adequa-

ções legais. Sem percorrer esse novo caminho, também o acesso ao capital fica dificultado.

Alterações no clima do planeta são observadas desde a Revolução Indus-trial. As mudanças, contudo, vêm se aprofundando e se manifestam de di-versas formas, com destaque para o aquecimento global, maior frequência e intensidade de eventos climáticos ex-tremos, alteração no regime de chuvas, entre outros.

FrAGilidAdEsA questão dos impactos do aque-

cimento global na vida das pessoas é matéria cotidiana nos principais meios de comunicação e nas discussões entre empresas, governos e cidadãos.

No Brasil, essa questão também tem tido expressão. Repercutem os estudos e ensaios sobre o problema, com os con-sequentes riscos e prejuízos. Biólogos alertam para a perda da biodiversidade, uma ameaça cada vez mais presente, com graves resultados, já que a qua-lidade da biodiversidade no Brasil é incomparável à do redor do mundo.

Os ambientalistas alertam que o aquecimento pode provocar alterações na estrutura do nosso clima, com pos-sibilidade de aparecimento de fenôme-nos como furacões e tufões, até então praticamente desconhecidos no nosso território.

Os sanitaristas se preocupam com as epidemias que podem ser potencia-lizadas com as enchentes e inundações decorrentes das grandes chuvas. O Bra-sil ainda é vítima de um sistema de sa-neamento e esgoto altamente ineficiente – quando não inexistente – e em caso de inundações os riscos de proliferação de pragas e desencadeamento de doenças são exponencialmente provocados. Para os catadores de lixo, então, a questão é ainda mais explosiva.

Nesse conjunto de fragilidades, o Brasil é obrigado a manter programas

emergenciais para minimizar os sinto-mas e efeitos da devastação ambiental provocada essencialmente por ações antrópicas do homem moderno.

Poderíamos continuar a elencar todo tipo de preocupação que cada profissio-nal convive no seu dia a dia em razão da deterioração da qualidade ambiental e climática no mundo e, em especial, no Brasil.

Ocorre que, como toda a questão envolve diretamente impactos financei-ros e econômicos, devemos ao menos assumir que a falta de investimentos na infraestrutura do país, cujo prejuízo já é notório, fica ainda mais sensível com os fenômenos climáticos adversos, oca-sionando consequentemente prejuízos econômicos maiores.

Não se trata de deixar de lado a questão social, nem de discutir qual assunto merece maior preocupação. Trata-se de articular as discussões e procurar um equacionamento economi-camente viável, ambientalmente ami-gável, politicamente exequível, social-mente justo.

O chamado “Custo Brasil” é aumen-tado pela maior demanda por serviços públicos de saúde em decorrência do aumento da temperatura, da diminuição da qualidade do ar, das epidemias etc., poderá chegar a criar necessidades de gastos anuais da ordem de R$ 8 bilhões.

A quebra de produção agrícola com secas e enchentes, a perda em armaze-nagem e transporte deve gerar prejuízos no PIB agrícola de cerca de R$ 10 bi-lhões. Fazendo um cálculo conservador, no Brasil os prejuízos decorrentes das alterações climáticas e a perda de ge-ração de receita nos diversos setores produtivos poderão representar um montante de cerca de R$ 47 bilhões durante o ano de 2010, igual a todo o PIB do Uruguai e do Paraguai somados.

Se essa ineficiência pudesse ser evitada, os benefícios seriam percebidos distributivamente. Melhor qualidade no

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emprego das receitas públicas, maior capacidade de investimento na produção – viabilidade de retorno ao investimento prudente – enorme poder de geração de emprego e renda.

A solução, então, é enfrentar esse desafio com esforços conjuntos da so-ciedade e com o fomento do governo nas três esferas, para que a questão ambiental seja trabalhada dentro do conceito empresarial de geração de grandes negócios.

Ao mesmo tempo, por razões da atual geopolítica mundial, o Brasil deve se manter aberto para todas as possi-bilidades justas de aproveitamento de suas condições geológicas e geográficas na geração e oferta de energia líquida ou elétrica. Nesse sentido, vemos até mesmo como razão de soberania, que precisamos criar mecanismos públicos e privados para o fomento de intensivos investimentos nessa área, com pers-pectivas em energia eólica, hidrelétrica, biomassa, carvão, petróleo, urânio, gás natural etc.

No planeta se cobram posições ins-titucionais de uso de matriz energéti-ca limpa, ao mesmo tempo em que o Brasil desponta como ator importante no cenário da exploração de petróleo, sobretudo em razão do início da retirada na plataforma Cidade de São Vicente, do óleo pré-sal, implicando uma série de reflexões.

Além disso, com as descobertas de petróleo na camada pré-sal no Brasil, o potencial de estoque desse combustível assume proporções suficientes para o

consumo externo e grande excedente para exportação, aliado às característi-cas do óleo tipo leve, com melhor acei-tação em termos de preços no mercado internacional.

Não se pode no mundo se abster da utilização do petróleo como fonte importante de energia. Ocorre que com a possibilidade de se chegar ao chamado “Pico de Hubbert”, ou “Peak Oil”, tem-se de valorizar cada vez mais sua utiliza-ção, preferencialmente direcionando-o para finalidade mais nobre como a pe-troquímica, por exemplo, substituindo a queima para geração de energia e com-bustão de automóveis por outra matriz que seja renovável. O mais importante é que ao ser imprescindível a utilização do petróleo, cabe tomarem-se medidas aptas a promover correta destinação de seus gases emitidos nos processos de queima e utilização.

Por essas razões são direcionadas pesquisas com objetivo principal de mi-tigar as causas, reduzindo a provocação e emissão de gases vilões do aquecimen-to global. O sucesso da mitigação e do sequestro desses gases poderá permitir a manutenção da qualidade de vida como se conhece hoje, evitando, prin-cipalmente, os custos econômicos, am-bientais e sociais de uma necessidade de adaptabilidade de vida em condições climáticas resultantes de um aumento médio da temperatura global.

Consenso entre os pesquisadores indica que a discussão passa necessa-riamente pela questão da inovação tec-nológica e da fonte e do uso de energia.

Nesse sentido, coloca-se a questão da carbonização da matriz energética como ponto fulcral dos debates. A utilização dos combustíveis fósseis no mundo é questionada por ambientalistas, em choque com o setor produtivo que do-mina a tecnologia de exploração e pode contar com um abastecimento regular e oferta segura.

Como a questão envolve visões mul-tidisciplinares do problema, precisamos ao menos indicar fatos importantes para subsidiar novos debates e contribuir, não para um convencimento, mas, so-bretudo, para o conhecimento e enca-minhamento do problema.

Diariamente no mundo se consomem quase 14 bilhões de litros de petróleo. Comparativamente todo o etanol pro-duzido no Brasil em um ano equivale a cerca de 50 horas de exploração e consumo de petróleo no planeta.

Ou seja, não se trata de reduzir o problema climático à substituição dos combustíveis fósseis, principalmente pela evidente questão matemática, já que não há oferta equivalente de substitutos.

Dessa forma, enquanto o mundo assiste à situação da limitação dos es-toques de petróleo nos campos conheci-dos, as descobertas do pré-sal no Brasil e as possibilidades tecnológicas e econô-micas de sua exploração tomam forma grandiosa. Permite a ampliação da par-ticipação do país no clube de nações na vanguarda de oferta dessa commodity, com o diferencial geopolítico de regio-nalmente se situar em zona ausente de conflitos, com plena democracia.

Todo o etanol produzido no Brasil em um ano equivale a cerca de 50 horas de exploração e consumo de petróleo no planeta

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Evidentemente que essa disponibi-lidade de novos campos deve fomentar novos debates, principalmente de ordem institucional, com modelos regulatórios eficientes; ambientais, com mecanismos de controle de emissões e resíduos; sociais, com geração e distribuição de emprego e renda; tecnológicos, com ins-trumentos de inovações para exploração em áreas difíceis e profundas.

Resta claro que o mundo precisa de segurança na oferta de energia, seja líquida ou elétrica. Nesse contexto avan-çamos em duas frentes principais, seja o desenvolvimento de energias renováveis ou descoberta economicamente viável de novos campos para exploração de combustíveis fósseis.

sistEMA HidrÁuliCoEm relação à energia hidrelétrica,

recentemente a licitação para cons-trução da Usina de Belo Monte, no Rio Xingu, no Estado do Pará, tem ocupado espaço importante nos meios de co-municação e nos debates entre vários interlocutores.

Essa exposição e os debates acabam por despertar interesse sobre a questão, sob a ótica do Modelo Institucional do Setor Elétrico, sobretudo após 2004, quando se inicia a implantação do novo modelo no Brasil. O Conselho Nacional de Política Energética ganhou então prerrogativa para proposição da lici-tação individual de projetos especiais do Setor Elétrico, recomendados pelo Ministério de Minas e Energia (MME).

No Brasil, o sistema é predominan-temente de base hidráulica, envolvendo intercâmbios expressivos de energia entre as regiões do país. Até pouco tempo, vivenciamos ainda uma temerá-ria ausência de termelétricas próximas aos centros de consumo; obsolescên-cia tecnológica das usinas existentes. Esses fatores implicam a necessidade de transferência de grandes blocos de energia por meio de interligações entre os sistemas regionais que, combinados com o envelhecimento dos equipamentos da rede básica das concessionárias, causam alguma insegurança no abas-tecimento. O último blecaute ilustrou a situação.

Sob o aspecto econômico há enorme dificuldade na obtenção de recursos financeiros (custo/maturidade) e ve-mos que a construção de mecanismos financeiros implicou a composição de consórcios para as recentes licitações altamente engenhosos para conseguir atender ao crescimento e à elasticidade da demanda. Nesse ponto, vê-se a alta posição do BNDES para garantir cerca de 80% dos recursos, em condições customizadas – incentivos.

Os fundamentos do modelo institu-cional e de gestão até então em vigor foram estabelecidos na década de 1990, com a instituição do PND (Programa Na-cional de Desestatização), no âmbito da redefinição do papel do Estado na eco-nomia e, ao longo do final do século XX, muitas das tentativas de reestruturação setorial não determinaram as condições

necessárias para o atendimento de al-guns princípios gerais, que se pretendeu proporcionar com o novo modelo, apro-vado em votação em 11 de março de 2004 nas Medidas Provisórias 144, que estabeleceu as novas regras do setor elétrico, e 145, que criou a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), convertidas respectivamente na Lei 10.848 e na Lei 10.847, ambas de 15 de março de 2004.

Esse novo modelo passou a deter-minar a volta do poder concedente ao Ministério de Minas e Energia, que era exercido pela Agência Nacional de Ener-gia Elétrica (Aneel). Ao MME coube, portanto, a formulação e implementação de políticas para o setor energético e o planejamento setorial. Nesse momento, passou a receber críticas de concen-tração das diretrizes do setor nas mãos do órgão, defendida pelo governo com alegações de que não significava uma reestatização, mas uma retomada de serviços de caráter público.

O importante é que esse modelo defendia a segurança de suprimento e modicidade tarifária, em ambientes de contratação e competição da geração. Passamos a contar com a chamada contratação de nova energia em ambien-te de contratação regulado (ACR) e a possibilidade de contratação de energia existente no ACR, consumidores livres, acesso a novas hidrelétricas por produ-tores independentes de energia e novos agentes institucionais.

O Modelo Institucional do Setor Elétrico redefiniu as premissas opera-

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Até pouco tempo, havia ainda uma temerária ausência de termelétricas próximasaos centros de consumo e obsolescência tecnológica das usinas

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cionais prometendo sanar os proble-mas vivenciados na época. A promessa era arrojada, pois pretendia garantir a segurança de suprimento de energia elétrica com modicidade tarifária, além de promover a inserção social do setor elétrico e manter estável o marco regu-latório. Esses foram os princípios gerais do modelo.

Dado que o prazo de maturação de nova usina hidrelétrica é de cerca de cinco anos, a contratação de energia para atender ao aumento previsto da demanda deverá ser feita com a mesma antecedência. Sendo assim, em ambien-te de incerteza quanto à confirmação do cenário projetado, a teoria sugere que a contratação de energia para atender ao crescimento será mais bem equacionada sendo feita em duas licitações. Ocorre que devido a fatores diversos, como até mesmo gargalos na superação de desafios ambientais, essa métrica não se realiza a contento, tomando exemplos como as Usinas do Rio Madeira, UHE Jirau (3.300 MW) e UHE Santo Antônio (3.150 MW).

Em relação à compra, as distri-buidoras passaram a comprar energia por meio de leilão num pool de energia, formado por geradores e distribuidores.

Todas essas modificações redefini-ram as premissas operacionais e fize-ram do novo modelo energético do Brasil um sistema altamente regulado. Dessa forma, vemos que também para a Usina de Belo Monte a aplicação do modelo representa a consolidação de planeja-mento, cobrindo uma linha de tempo não inferior a dez anos, observando um ciclo de atividades anual, em que se determinam os planos de expansão dos sistemas elétricos.

Esse modelo altamente regulado fica claro também ao se observar a participação importante da CHESF no consórcio. Além disso, as recentes declarações do governo realçam essa premissa de que a obra será executada,

mesmo que sob todo tipo de acusações. Cabe, contudo, exigir que as acusações de interferência em direitos sociais e ambientais sejam muito bem apuradas, evitadas em sua maioria, ou mitigadas quando inevitáveis. Nesse sentido cabe a observação dos princípios democrá-ticos que para seu fortalecimento não basta a vontade da maioria, mas o direito de todos. Os atingidos têm, no mínimo, o direito de ver resguardado instrumentos de compensação satis-fatórios e proporcionais ao impacto sofrido.

Nesse momento é imprescindível que o Brasil adote medidas para geração de oferta de energia elétrica de várias fon-tes para atender ao aumento da deman-da, seja pelo crescimento econômico, seja pela inserção social de 20 milhões de brasileiros que ainda não têm acesso à energia.

A extensão continental aliada às maiores reservas de água doce dispo-nível em todo o mundo praticamente impôs a construção de usinas hidrelé-tricas. Ao mesmo tempo atendia a um projeto de desenvolvimento tecnológico da época que propunha também uma integração nacional e medidas de ocupa-ção do território capazes até mesmo de desestimular intervenções à soberania.

Atualmente, a questão das mudan-ças climáticas e o fenômeno do aqueci-mento global põem mais argumentos a favor da escolha. Enquanto nos Estados Unidos e na China, por exemplo, todas as novas plantas de geração de energia elétrica têm como base o carvão que emite enormes quantidades de CO

2, o

Brasil ainda tem um enorme potencial de geração de base hídrica, muito mais sustentável na comparação em termos de emissão de gases de efeito estufa.

Países como a França já ocuparam 100% da sua capacidade de geração hi-drelétrica, e no Brasil ainda se utilizou cerca de 28%, podendo crescer muito, mantendo nossa matriz energética a

mais limpa comparativamente em todo o mundo.

Também no segmento produtivo, a análise da estrutura industrial por segmento reforça a situação de grande produtor de commodities do Brasil em relação aos demais países do mundo, demandando grande oferta de energia. No Brasil, o agregado “metalurgia, mi-neração, papel e celulose e açúcar” – setores de baixa remuneração salarial e baixo nível de emprego – responde por 66% da energia industrial, enquanto que na OECD a participação é de 34% e nos demais países, de 29%.

iMPACto AMBiENtAlEvidentemente que a construção

civil gera impacto no meio ambiente. No caso da construção de usinas hidre-létricas, vários questionamentos são elencados e uma enorme quantidade de desafios deve ser superada. Haverá externalidades positivas na criação de novos empregos e geração de renda em todos os setores que poderão, de alguma forma, servir como infraestrutura para esse novo cenário. Desde a indústria de bens de capital até mesmo investimen-tos no desenvolvimento tecnológico e na formação de mão de obra. Na constru-ção civil será alavancada a instalação de ampla malha de modal logístico para servir à região e escoar a produção do refino, em grande parte também voltada ao mercado externo.

Não se pode, porém, em razão da justificativa de uma geração elétrica limpa, desqualificar ou desprezar os impactos. Trata-se de questões sociais sérias, como as comunidades e os povos atingidos pela barragem, na formação dos lagos. Não menos importantes são os próprios lagos e sua repercussão em toda a flora e fauna da região. No lado econômico, são racionalizadas as questões de capacidade de geração e transmissão dessa energia ao Sistema Interligado Nacional (SIN).

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A conjunção desses interesses so-ciais, ambientais e econômicos deve ser protegida sem menosprezo. Temos no Brasil grande potencial de geração desse tipo de energia, seja em grandes unidades de geração, seja também em projetos de Pequenas Centrais Hidre-létricas (PCHs). Embora a extensão das barragens das PCHs seja menor, a energia gerada também é de menor por-te, até 30MW. Menor porte, mas grande importância, pois tem o poder de, em conjunto, ofertar energia altamente demandada nesse momento de recupe-ração da economia nacional e mundial.

Infelizmente não há capacidade a curto e médio prazos para uma substi-tuição de fontes de energia. Em termos de comparação, o mundo adota 87% de toda sua matriz energética focada em combustíveis fósseis. Essa enorme car-bonização da matriz energética mundial é baseada em uma lógica química que compele ao petróleo um enorme po-tencial de energia por peso, altamente competitiva em termos de exploração e produção.

Ao mesmo tempo, o processo produ-tivo dominante no mundo também é ba-seado nesse tipo de energia. Uma alte-ração substancial está sendo feita, mas de maneira gradual, já que é intensiva em utilização de recursos financeiros.

Enquanto não se dá essa total mu-dança, esse modelo perdurará. Para se ter uma pequena ideia em termos de comparação, no mundo inteiro a parti-cipação da energia renovável na matriz energética é de 0,4%. Significa que, se nos próximos anos multiplicáramos por dez toda essa energia, ela ainda repre-sentará no máximo 4%. Lógico que no Brasil a equação é mais vantajosa, mas existem outros gargalos e desafios que devem ser vencidos.

O país passa por uma exigência da necessidade de repensar o planejamento energético. Não só repensar, mas tratar efetivamente a questão energética sob

a ótica do contexto do desenvolvimento econômico. Um desenvolvimento eco-nômico salutar que planeja e executa políticas socialmente justas, ambiental-mente amigáveis, com retorno ao inves-timento prudentemente realizado. Esse viés econômico deve permitir o pleno potencial de aproveitamento de preço ao mesmo tempo em que os recursos econômicos gerados possam ser indu-tores de uma distribuição justa, capaz de fomentar, também, a preservação ambiental.

iNtEGrAÇÃo VErtiCAlSe tomarmos esses fatos como pre-

missa verdadeira para a geração de energia no Brasil e seu contexto dentro do desenvolvimento econômico, social e ambiental, teremos de percorrer ainda algumas questões que imediatamente são suscitadas nesse debate. Essas questões perpassam avaliação sobre o potencial e os riscos da exploração do petróleo, ainda mais após o acidente na plataforma da BP no Golfo do México, provocando o maior desastre indus-trial da História dos Estados Unidos. A mancha de contágio ambiental assume proporções gigantescas, e os prejuízos ambientais põem sob suspeita a explo-ração de petróleo em águas profundas, um dos trunfos da Petrobras.

Nesse momento de discussão sobre a questão estratégica de fornecimento de energia, o combustível fóssil pe-tróleo também adquire prioridade, já que a questão do pré-sal ocupa espaço importante no meio político e industrial do país.

Uma das maiores importâncias para os investimentos na petroquímica na cadeia de petróleo e gás diz respeito ao melhor aproveitamento do petróleo em meio às discussões sobre aquecimento global e aumento dos preços do petróleo. Sendo assim, torna-se mais racional sua destinação para fins mais nobres como a petroquímica, abrindo espaço para

aproveitamento de outras fontes energé-ticas para combustíveis. Para o Brasil, que recentemente passou por um grande processo de consolidação da indús-tria petroquímica, isso significa grande avanço, com até mesmo impactos posi-tivos em relação a alguma dependência do polo petroquímico da Bolívia.

A Petrobras vem indicando que um caminho de integração vertical pode significar ganho de escala, ainda que eventualmente haja maior consolidação na exportação do óleo cru. Para o Brasil significa fonte segura de abastecimento de produtos refinados com folga para até a autossuficiência em diesel, além, claro, de servir com estabilidade de suprimento a indústria petroquímica.

Com o desenvolvimento tecnológico para extração em águas profundas, a Petrobras passa a ser um líder impor-tante no cenário mundial para prover, com esse combustível, indústria e países petróleo-dependentes. Para se defender das suspeitas dos ambientalistas e dos questionamentos econômicos e suas implicações políticas, o Brasil deve adotar postura proativa, antes que um eventual risco sistêmico atinja nossa indústria petrolífera, ficando à mercê de ataques especulativos e debates com falsos dilemas habilmente postos em um mercado altamente beligerante.

Nesse mundo cada vez mais globa-lizado e competitivo, há também uma característica beligerante que impõe realidades que devem ser observadas na tomada de decisões sociais, econômicas e políticas equilibradas, promovendo um caráter estadista de maior ênfase, que pode supor a proteção federativa em detrimento da distribuição equitativa de recursos.

Na emblemática questão dos royal-ties e a consequente dimensão da dis-cussão sobre o pagamento dos royalties do petróleo no Brasil, sobretudo após a chamada Emenda Ibsen (Emenda 387 do PL 5.938/2009), cabe também uma

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breve análise, já que essa questão fica ampliada ao abarcar aspectos pouco divulgados.

Enquanto se discutem principal-mente a necessidade dos recursos já esperados pelos estados e os municípios produtores, e uma justiça distributiva ansiada pelos demais entes da Federa-ção, é imprescindível ponderar sobre a essência, a origem e a permissão para cobrança e pagamento dos royalties.

Em particular, para o Estado do Rio de Janeiro, é altamente temerária a insi-nuação de que a exploração de petróleo na chamada camada pré-sal ocorre em águas territoriais não circunscritas ao seu território, dando suporte à justificati-va para distribuição isonômica para todos os estados e municípios. Há uma eventual contradição com a constituição e a expan-são da fronteira marítima do Brasil – do mar territorial à “Amazônia Azul”.

Sob esse prisma, o problema pode surgir com a indagação sobre a capa-cidade de aproveitamento e controle da fronteira marítima brasileira, incluindo os meios militares de que dispõe nosso

país para dissuadir eventual ameaça externa a esse mar territorial. No ramo da indústria bélica, uma das maiores do mundo, o Brasil pode se preparar para uma retomada de posição ocupada de maneira importante no passado. Nossa indústria de defesa possui uma capaci-dade de mobilização importante, além de compatível quadro de disponibilidade de plantas industriais para fabricação de artefatos de guerra. A defesa do pe-tróleo brasileiro passa pela garantia da proteção de sua exploração.

O Brasil deve manter a postura ge-opolítica e estratégica de garantir a ampliação de sua soberania para além das duzentas milhas da costa, com-batida fortemente por outras nações, interessadas nos recursos naturais e de tráfego marítimo. Deve-se ter em lembrança que, em 1970, a ONU, em sua XXV Assembleia Geral, determinou que os fundos marinhos e subsolo, com seus recursos, constituíam patrimônio comum da Humanidade.

Se nosso Legislativo validar o con-ceito, a essência de que o petróleo do

pré-sal não se encontra em mar territo-rial do Estado do Rio de Janeiro poderá incutir pressuposto valioso para interes-ses externos daqueles que pretendem disputar a exploração desses recursos naturais cada vez mais escassos no mundo e frequentemente disponibili-zados em grandes zonas de conflitos e instabilidades institucionais.

Cabe ao país indicar ao mundo uma coesão de pensamento e atitude coeren-te com a opção de soberania e proteção de seu mar territorial, quantificando e mensurando seus recursos naturais, econômicos ou não, ao mesmo tempo em que dá claros sinais de sua competência na vigilância e proteção de seus mares.

Ou seja, a discussão mundial sobre energia, água e alimento requer ponde-rações racionais e suas ramificações, significando para o Brasil a abertura de uma grande janela de oportunidade para aproveitamento de seus recursos geográficos e naturais capazes de prover seu povo das vantagens no pleno apro-veitamento justo e igualitário desses recursos.

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O Brasil deve manter a postura geopolítica e estratégica de garantir a ampliação de sua soberania para além das duzentas milhas da costa

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