a doutrina das causas finais na antiguidade. 1. a ... · entender os fenômenos naturais...

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Filosofia e História da Biologia, v. 8, n. 1, p. 107-132, 2013. 107 A doutrina das causas finais na Antiguidade. 1. A teleologia na natureza, dos pré-socráticos a Platão Roberto de Andrade Martins * Resumo: Da Antiguidade até o século XIX foi muito comum procurar-se entender os fenômenos naturais (especialmente os biológicos) através de causas finais. Este artigo analisa um dos períodos de formação dessas con- cepções, na Antiguidade, dando especial atenção às contribuições de Sócra- tes e Platão. Estes introduzem a ideia de uma divindade inteligente e bondo- sa, que planeja a estrutura do universo e de todos os seres da melhor forma possível. Essa concepção teve grande influência, no período posterior. Palavras-chave: causas finais; teleologia; pré-socráticos; Anaxágoras; Dió- genes; Sócrates; Platão; filosofia da biologia The doctrine of final causes in Antiquity. 1. Teleology in nature, from the Presocratics to Plato Abstract: From Antiquity to the 19th century it was very common to ex- plain natural phenomena (especially biological ones) through final causes. This paper analyses one of the periods of development of this concept, in Antiquity, with special emphasis upon the contributions of Socrates and Plato. They introduced the idea of an intelligent and beneficial god, who plans the structure of the universe and of all beings in the best possible way. This concept was strongly influential in later periods. Key-words: final causes; teleology; Presocratics; Anaxagoras; Diogenes; Socrates; Plato; philosophy of biology * Grupo de História, Teoria e Ensino de Ciências (GHTC), Universidade de São Paulo; Grupo de História da Ciência e Ensino (GHCEN), Universidade Estadual da Paraíba; Professor Visitante do Departamento de Física, Universidade Estadual da Paraíba. E-mail: [email protected]

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  • Filosofia e Histria da Biologia, v. 8, n. 1, p. 107-132, 2013. 107

    A doutrina das causas finais na Antiguidade. 1. A teleologia na natureza, dos pr-socrticos a

    Plato

    Roberto de Andrade Martins *

    Resumo: Da Antiguidade at o sculo XIX foi muito comum procurar-se entender os fenmenos naturais (especialmente os biolgicos) atravs de causas finais. Este artigo analisa um dos perodos de formao dessas con-cepes, na Antiguidade, dando especial ateno s contribuies de Scra-tes e Plato. Estes introduzem a ideia de uma divindade inteligente e bondo-sa, que planeja a estrutura do universo e de todos os seres da melhor forma possvel. Essa concepo teve grande influncia, no perodo posterior. Palavras-chave: causas finais; teleologia; pr-socrticos; Anaxgoras; Di-genes; Scrates; Plato; filosofia da biologia

    The doctrine of final causes in Antiquity. 1. Teleology in nature, from the Presocratics to Plato

    Abstract: From Antiquity to the 19th century it was very common to ex-plain natural phenomena (especially biological ones) through final causes. This paper analyses one of the periods of development of this concept, in Antiquity, with special emphasis upon the contributions of Socrates and Plato. They introduced the idea of an intelligent and beneficial god, who plans the structure of the universe and of all beings in the best possible way. This concept was strongly influential in later periods. Key-words: final causes; teleology; Presocratics; Anaxagoras; Diogenes; Socrates; Plato; philosophy of biology

    * Grupo de Histria, Teoria e Ensino de Cincias (GHTC), Universidade de So Paulo; Grupo de Histria da Cincia e Ensino (GHCEN), Universidade Estadual da Paraba; Professor Visitante do Departamento de Fsica, Universidade Estadual da Paraba. E-mail: [email protected]

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    1 INTRODUO A teleologia1 consiste no uso de causas finais para explicar os

    fenmenos. O uso de argumentos teleolgicos para explicar as carac-tersticas dos seres vivos era muito comum, antes da aceitao da teoria da seleo natural. Ele estava fortemente associado a ideias religiosas. Ernst Mayr apresentou o seguinte comentrio a esse respei-to:

    Quando o leitor moderno estuda as obras dos pensadores dos scu-los XVII e XVIII, ele acha quase incompreensvel at que ponto Deus era parte de toda explicao. Argumentos que nos sculos XIX e XX teriam sido cientficos ou puramente filosficos, eram teolgi-cos no sculo XVIII e nos anteriores, e mais frequentemente eram francamente antropomrficos. Tal viso do mundo centrada em Deus no era de modo algum peculiar cristandade, mas tambm es-tava refletida nos escritos de Plato e Ccero. Havia muitas verses diferentes de tal viso de mundo, como veremos, mas todas concor-davam que este mundo, e tudo nele, tinham um significado ou pro-psito porque, como Aristteles havia dito, a natureza no faz nada em vo, nem Deus, como diria um cristo. Deus, o todo-poderoso, no faria nada que no fosse perfeito, ou pelo menos to perfeito quanto possvel dentro da estrutura das leis da natureza. Se h, ou houve, alguma mudana no mundo, esta mudana era devida a causas finais, movendo o objeto ou fenmeno particular para um objetivo ltimo. Acreditava-se universalmente que as coisas no mundo emp-rico se esforam para atingir finalidades. (Mayr, 1988, p. 233)

    Como Mayr indicou, Aristteles foi um dos mais importantes de-fensores da teleologia. No entanto, ao contrrio do que a citao acima sugere, a viso teleolgica de Aristteles no estava associada aos aspectos religiosos indicados por Mayr, nem era antropomrfica,

    1 Atribui-se o primeiro uso da palavra teleologia ao filsofo Christian Wolff, em sua obra Philosophia rationalis sive logica, publicada em 1728. Ele a definiu como a parte da filosofia natural que explica os fins das coisas (Johnson, 2005, p. 30). Embora possa ser considerado anacrnico utilizar tal denominao para descrever as ideias da Antiguidade, o termo bastante til, e ser utilizado ao longo deste artigo.

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    nem pressupunha que as coisas se esforam para atingir finalidades. As ideias de Aristteles sero estudadas em um prximo artigo2.

    A busca de explicaes finalistas para os fenmenos naturais se inicia no pensamento grego antes de Aristteles, culminando com a obra de Plato. muito importante compreender esse perodo inicial, pois ele teve grande influncia no apenas na obra aristotlica, mas tambm no perodo posterior3.

    Assim, este artigo apresentar alguns aspectos do desenvolvimen-to da ideia de causas finais (ou seja, da teleologia) na Antiguidade grega, focalizando principalmente seu uso no estudo dos seres vivos e dando especial ateno s contribuies de Scrates e Plato.

    2 A NATUREZA E AS CAUSAS ENTRE OS PR-SOCRTICOS

    As obras gregas mais antigas que chegaram at ns so as de Ho-mero e Hesodo. Nesses textos encontramos meno aos deuses gregos tradicionais, como Zeus, que interferem diretamente no funci-onamento do universo e na vida humana. Essa era a base da cultura tradicional; mas o pensamento grego posterior procurou se emanci-par dessa base mitolgica.

    De um modo geral, o pensamento dos filsofos pr-socrticos no era teleolgico. Ele se caracterizava pelo fato de no se submeter autoridade religiosa e por procurar explicar os fenmenos naturais com base em fatos e analogias, assumindo a constncia da natureza e a existncia de regularidades que depois foram denominadas leis naturais (Heidel, 1910, pp. 90-91). Pode-se dizer que os filsofos dos sculos VI e V a.C. transferiram funes e atributos dos antigos deuses para a natureza (). Esta passou a ser concebida como o

    2 MARTINS, Roberto de Andrade. A doutrina das causas finais na Antiguidade. 2. A teleologia na natureza, segundo Aristteles (a ser publicado). 3 O perodo posterior a Aristteles ser abordado em outro artigo: MARTINS, Roberto de Andrade. A doutrina das causas finais na Antiguidade. 3. A teleologia na natureza, de Teofrasto a Galeno (a ser publicado).

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    poder que produz todos os eventos que constituem a totalidade da experincia. Ela substituiu a ideia de deuses que criam e/ou gover-nam o mundo. No entanto, a natureza em si era concebida como privada de razo e de propsito (ibid., pp. 94-95).

    2.1 O conceito de physis importante esclarecer, primeiramente, o prprio conceito de na-

    tureza na Grcia antiga. O termo grego que se costuma traduzir por natureza physis (). Graas aos estudos de lingustica compa-rada desenvolvidos desde o sculo XIX, podemos discutir com bas-tante segurana a origem dessa palavra. Ela se origina da raiz verbal proto-indo-europia *bheu- ou *bhu-, que tinha o provvel significado original de crescer, florescer (Shipley, 2011, p. 38; Snyder, 2001, p. 86; Meierding, 2005, p. 114). A partir dessa raiz proto-indo-europia surgiu o verbo grego phyein, que significa gerar, fazer crescer, produ-zir. Assim, em grego, phyo () significa eu gero, eu produzo, eu fao crescer; e phyomai () significa eu creso, eu me torno. Desse verbo se originaram muitos substantivos gregos, como phyton (planta, crescimento), phylon (tribo, raa, grupo)4, phyma (excrescncia, tumor) e physis.

    O significado primrio de physis seria crescimento, associado ao verbo phyo-phyomai, crescer, sendo aplicado particularmente vegeta-o. Esse o nico sentido em que a palavra utilizada, nas obras de Homero (Naddaf, 2005, p. 12). O prprio Aristteles estava ciente dessa relao entre physis e o verbo phyo-phyomai, pois a menciona na sua Metafsica, ao explicar os significados da palavra: Natureza () significa a origem das coisas que crescem

    4 Pode parecer, primeira vista, que o significado de phylon no se encaixa na etimo-logia indicada. Mas esse termo significa, etimologicamente, uma ramificao (como em uma planta) proveniente de um tronco comum, passando a indicar, por analogia, um grupo de pessoas (ou outros seres) com uma origem comum (Fawcett, 2011, pp. 18-19).

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    (Aristteles, Metaphysica, V.4, 1014b16).

    Como as palavras gregas terminadas em -sis significam um proces-so concebido como uma realizao objetiva e completa, physis pode ser interpretada como o processo e completamento do nascimento, crescimento ou produo de uma coisa (Fawcett, 2011, p. 19).

    A partir de seu significado original e etimolgico de crescimento, entre os pr-socrticos a palavra physis assume o significado mais geral e abstrato de um processo, mantendo entretanto associaes com as ideias de crescimento natural (de um vegetal ou animal), movimento, desenvolvimento, vida. Segundo William Arthur Heidel, physis podia significar um processo como um todo, ou seu incio, ou seu desen-volvimento, ou seu fim. Era utilizado para indicar um desenvolvi-mento ou crescimento a partir de dentro, obediente s suas prprias leis (autnomo), e no dirigido por fora ou poder externo (Heidel, 1910, pp. 96-99). Uma interpretao semelhante adotada por G-rard Naddaf:

    Phusis deve ser entendido dinamicamente como a constituio real de uma coisa, conforme ela realizada do incio ao fim, com todas as suas propriedades. Este o significado que encontramos praticamen-te todas as vezes que o termo phusis empregado nos escritos dos pr-socrticos. Nunca empregado no sentido de algo esttico, em-bora a nfase possa ser ou a phusis como origem, a phusis como pro-cesso, ou a phusis como resultado. Todos os trs, claro, esto com-preendidos no significado original da palavra phusis. (Naddaf, 2005, p. 15)

    John Burnet interpretava physis como sinnimo de arch () ou substncia primordial, entre os pr-socrticos (Heidel, 1910, pp. 79-80; Naddaf, 2005, p. 17). Pode-se aceitar que arch um dos significa-dos que eles associavam a physis, mas no como um sinnimo. Pois a substncia primordial, ou princpio material, apenas o ponto de partida de um processo de crescimento ou desenvolvimento, mas no o processo todo. O princpio material uma das respostas que os

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    pr-socrticos encontraram na busca de explicaes para o desenvol-vimento da natureza. Mas no a nica resposta.

    2.2 O conceito de aition Isso nos remete a outro ponto importante: o conceito de causa, na

    Antiguidade. A palavra grega que costuma ser traduzida por causa aition (). Aition um substantivo neutro derivado do adjetivo aitios, que era aplicado apenas a pessoas e significava originalmente ser culpado ou responsvel por alguma coisa. Esse termo era utilizado por Homero (sculo VIII a.C.) e outros autores antigos no sentido de culpa ou louvor em relao ao que uma pessoa fez; e esse sentido de responsabilidade por alguma coisa era empregado no sculo V a.C. nos campos de medicina, direito e literatura histrica (Hankinson, 2009, p. 213; Johnson, 2005, p. 40). Aitia, por sua vez, era a acusao daquilo por que a pessoa seria responsvel. Posteriormente, o signifi-cado de aition se modificou, tornando-se mais geral e abstrato e assu-mindo o sentido de qualquer coisa que possa ser considerada como responsvel por uma outra coisa.

    Quando os pr-socrticos comearam a tentar estabelecer qual era o princpio material (arch) de todas as coisas por exemplo: a gua, segundo Thales de Mileto (aprox. 624-546 a.C.); o ar, segundo Ana-xmenes de Mileto (585-528 a.C.); ou o apeiron, segundo Anaximandro (aprox. 610-546 a.C.). Eles estavam procurando um tipo de causa ou explicao para tudo o que existe no universo. Como veremos mais adiante, o que eles tentavam estabelecer pode ser considerado como um tipo de causa material, dentro da classificao aristotlica. No en-tanto, como o prprio Aristteles comentou posteriormente, indicar um princpio material no proporciona uma explicao adequada para os fenmenos (Hankinson, 2009, p. 214):

    Toda gerao e destruio pode bem provir de um ou mais elemen-tos; mas por que isso ocorre, e por que causa (aition)? Pois no pode ser que o prprio substrato mova a si prprio. Quero dizer, por exemplo, que nem a madeira nem o bronze so responsveis (aitios) por qualquer de suas mudanas: no a madeira que faz a cama, ou o

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    bronze a esttua, mas alguma outra coisa a causa da mudana em cada caso. Investigar isso investigar a outra causa, aquela da qual provm a origem da mudana. (Aristteles, Metaphysica I.3 984a19-27)5

    Os prprios pr-socrticos haviam percebido a necessidade de in-troduzir outros tipos de explicaes. Alguns deles haviam feito uso no apenas dos elementos, mas tambm de um dinamismo. Segundo Aristteles,

    Pode-se suspeitar que Hesodo foi o primeiro a procurar tal coisa, ou algum outro que colocou amor ou desejo como um princpio entre as coisas que existem, como Parmnides tambm o fez. [...] o que impli-ca que entre as coisas existentes deve haver desde o incio uma causa que mova as coisas e as rena. (Aristteles, Metaphysica I.4, 984b23-30)

    Empdocles (aprox. 490430 a.C.), por sua vez, defendia a exis-tncia de quatro princpios materiais bsicos (terra, gua, ar e fogo) e de duas foras csmicas, amor e luta (Hankinson, 2009, p. 214).

    Aristteles comentou que Estes pensadores [...] evidentemente captaram duas das causas ( ) que distinguimos na [obra] Sobre a natureza ( ), a matria e a fonte do movimento6, mas de um modo confuso e vago (Aristteles, Metaphysica I.4 985a11-13).

    A tendncia geral, entre os pr-socrticos, era a de encontrar cau-sas naturais para os fenmenos, afastando-se assim das explicaes religiosas. O mesmo tipo de atitude pode ser encontrado, por exem-plo, em Hipcrates de Cs (aprox. 460-370 a.C.), que foi contempo-rneo de Scrates (aprox. 469-399 a.C.). Duas das obras do Corpus Hippocraticum discutem doenas que eram consideradas sagradas, em

    5 Utilizo neste artigo o modo padro de identificao de trechos dos escritos de Aristteles, atravs do nmero de Bekker, que se baseia na paginao, coluna e linhas da edio grega das obras de Aristteles publicada em 1831-1870 por August Immanuel Bekker (17851871). 6 Esses so os dois tipos que posteriormente foram denominados causa material e causa eficiente.

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    seu tempo: a impotncia dos eunucos Citas, e a epilepsia. Nos dois casos, Hipcrates adotou uma outra posio, conforme mile Littr descreveu:

    A passagem do livro Sobre os ares, as guas e os lugares assim: Quanto a mim, penso que esta doena [a impotncia dos Citas] divina como todas as doenas; que nenhuma mais divina do que outra, mas que todas so semelhantes e todas so divinas. Cada doena tem, como esta, uma causa natural, e sem causa natural nenhuma se produz. E um pouco mais abaixo: Assim como eu disse, tudo isso divino como o restante; cada coisa produzida conforme as leis naturais, e a doena de que eu falo nasce, entre os Citas, da causa que indiquei. Um texto semelhante se l no livro Sobre a doena sagrada: Essa doen-a [epilepsia] no me parece mais divina do que o resto; mas ela tem a mesma natureza que as outras doenas, e a causa de que cada uma provm. [...] Essas passagens excluem completamente a ideia de um castigo divino como causa de doena, e colocam todas as afeces patolgicas na classe dos efeitos provenientes de causas naturais. (Lit-tr, em Hipcrates, 1853, vol. 8, pp. 530-531)

    2.3 Causas formal e final Embora procurassem se afastar do pensamento religioso tradicio-

    nal, os pr-socrticos encontraram uma dificuldade: como explicar a ordem, a beleza e o bem existentes no universo? Seria possvel dar conta disso apenas com os dois tipos de causas naturais j indicados acima? Vrios deles concluram que no; e procuraram introduzir novos tipos de explicaes. Aristteles considerava que foram os Pitagricos que introduziram a ideia daquilo que depois foi chamado de causa formal (Hankinson, 2009, p. 214). Depois de se referir aos filsofos pr-socrticos que fizeram uso daquilo que chamamos cau-sas material e eficiente, Aristteles comentou:

    Contemporaneamente com esses filsofos e antes deles, os chama-dos Pitagricos, que foram os primeiros a abordar a matemtica, no apenas proporcionaram avanos a esse estudo, mas tambm, tendo sido educados dentro dele, pensaram que seus princpios eram os princpios de todas as coisas. Como os nmeros so, por natureza, os primeiros desses princpios [da matemtica], e nos nmeros eles vi-

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    ram muitas semelhanas s coisas que existem e que se transformam, mais do que no fogo e na terra e na gua tal e tal modificao dos nmeros sendo a justia, uma outra [sendo] alma e razo, outra sendo a oportunidade e de modo semelhante quase todas as coisas podendo ser expressas por nmeros e como eles viram que as modificaes e as razes das escalas musicais podiam ser expressas por nmeros; e como, ento, todas as outras coisas pareciam ter toda sua natureza modelada sobre nmeros, e os nmeros pareciam ser as primeiras coisas em toda a natureza, eles supuseram que os elementos dos n-meros eram os elementos de todas as coisas, e que todo o cu era uma escala musical e numrica. (Aristteles, Metaphysica I.5, 985b23-986a2)

    Os nmeros, evidentemente, no so agentes nem matria. Todos os entes matemticos e, em particular, os nmeros so imateriais, eternos, imutveis. Eles no podem servir nem como matria pri-mordial nem como causas eficientes. Eles funcionam como modelos para as coisas naturais. So exemplos daquilo que posteriormente foi denominado causa formal um tipo de causa muito importante no pensamento de Plato (424-348 a.C.).

    A noo de um propsito ou finalidade parece estar ausente nos pr-socrticos, antes de Anaxgoras (Hankinson, in Galeno, 1998, p. 11). Anaxgoras (aprox. 510-428 a.C.) foi outro pr-socrtico que se preocupou com a explicao do surgimento da beleza e da bondade no mundo, propondo outro tipo de causa: a presena da inteligncia ou razo (). Aristteles elogiou esse filsofo por ter dado tal con-tribuio:

    Pois no provvel que o fogo, a terra ou qualquer elemento seme-lhante pudesse ser a causa [] das coisas que possuem bondade e beleza [...] nem se poderia atribuir isso espontaneidade ou ao acaso. Ento, quando um homem afirmou que a inteligncia [] existe no apenas nos animais, mas em toda a natureza, sendo a causa da ordem e do arranjo de tudo, ele pareceu muito superior fala casual de seus predecessores. E sabemos que Anaxgoras certamente abor-dou esse tipo de viso, embora se atribua a Hermotimus de Clazo-menae ter mencionado isso antes. Os que assim pensaram afirmaram que existe um princpio explicativo das coisas que ao mesmo tempo

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    a causa da beleza e a partir do qual as coisas adquirem seu movimen-to. (Aristteles, Metaphysica I.3, 984b1122)

    Tambm se atribui a Digenes de Apollonia (sc. V a.C.) o mes-mo tipo de ideias, mas Aristteles no o mencionou a esse respeito (Johnson, 2005, p. 114). Como veremos, Digenes adquiriu a fama de ter sido um dos primeiros pensadores finalistas gregos, mas sua repu-tao se baseia em um nico fragmento, que no muito claro (Se-dley, 2005, p. 462).

    Esses seriam os primeiros filsofos que teriam utilizado aquilo que posteriormente foi denominado causa final.

    As poucas informaes que chegaram at ns a respeito do pen-samento de Anaxgoras no nos permitem compreender claramente o que ele pensava. As informaes mais importantes a respeito de sua doutrina a respeito da razo ou inteligncia () nos foram transmi-tidas por Simplicius (aprox. 490-560 d.C.), em seu Comentrio Fsica de Aristteles.

    Tudo tem uma poro de tudo, exceto a mente, que sem limite e independente; no est misturada com nada, mas est isolada, sozi-nha. Se no estivesse isolada, mas estivesse misturada com alguma outra coisa, participaria de tudo [...] e as coisas misturadas com ela impediriam seu domnio sobre tudo, do modo como ela faz por estar isolada e por si mesma. Pois ela a mais refinada e pura de todas as coisas, ela tem todo conhecimento sobre tudo e o maior poder. E a mente controla toda criatura viva, por maior ou menor que seja. A mente tambm controlou toda a rotao, no sentido de que foi res-ponsvel por iniciar a rotao. [...] A mente decide sobre a combina-o, a separao e a disperso de todas as coisas. A mente ordenou todas as coisas que deviam ser (as coisas que existiram antes mas no existem agora, as coisas que existem agora, e as coisas que existiro no futuro) [...] (Simplicius, apud Waterfield, 2000, p. 125; Kirk & Ra-ven, 1957, pp. 372-373)

    Pode-se dizer que a mente ou inteligncia ou razo () de Anaxgoras imaterial, algo distinto das outras coisas do universo, e tem conhecimento e poder. A descrio apresentada por Simplicius

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    faz com que ela se assemelhe mais a uma divindade do que a um poder natural.

    Aristteles considerava que Anaxgoras havia dado um passo im-portante ao introduzir a razo ou inteligncia em sua anlise sobre as causas do universo, para poder dar conta de como as coisas so ou se tornam boas ou belas, algo que no podia ser explicado pelo acaso ou pela pura sorte. No entanto, seguindo Plato, Aristteles avaliou que a posio de Anaxgoras era insatisfatria, pois utilizava essa ideia de uma forma ad hoc, para se livrar de dificuldades, mas sem empreg-la sob a forma de um princpio geral (Hankinson, 2009, p. 214).

    No Comentrio Fsica de Aristteles, Simplicius tambm descreveu o pensamento de Digenes nesse caso, de uma forma mais completa e compreensvel. Digenes defendeu a existncia de uma nica subs-tncia primordial; terra, fogo, gua e ar seriam iguais em essncia, adquirindo temporariamente aparncias distintas e retornando mesma matria primordial. Essa substncia primordial seria o ar, que atravs de condensao e rarefao produz todas as mudanas da matria. Digenes tambm afirmou a existncia de uma inteligncia fundamental no universo:

    Pois, ele diz, sem inteligncia no seria possvel que ela se dividisse e produzisse as medidas de todas as coisas do inverno e do vero, noite e dia, chuvas e ventos e tempo bom. Se quisermos considerar as outras coisas tambm, encontraremos que esto dispostas do me-lhor modo possvel. (Simplicius, apud Waterfield, 2000, p. 197; Kirk & Raven, 1957, p. 433)

    Em seguida, Digenes relacionou o princpio material (ar) com vi-da e inteligncia:

    Alm disso, h estas outras importantes indicaes. Os homens e as outras criaturas animadas vivem por causa do ar, atravs da respira-o. E isso para eles tanto a vida quanto a inteligncia, como ser mostrado claramente nesta obra; e se isso for retirado, ento eles morrem e a inteligncia desaparece. (Simplicius, apud Waterfield, 2000, p. 197; Kirk & Raven, 1957, pp. 434-435)

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    E parece-me que o que tem inteligncia aquilo que as pessoas cha-mam de ar, e que todos os homens so dirigidos por isso e que isso tem poder sobre todas as coisas. Pois essa coisa me parece ser um deus () e ter atingido todos os pontos e organizar todas as coisas e estar em tudo. (Simplicius, apud Waterfield, 2000, p. 197; Kirk & Raven, 1957, p. 435)

    Ao contrrio das coisas que surgem e desaparecem, esse princpio csmico descrito por Digenes como eterno e imortal, sendo tambm caracterizado como sbio (Waterfield, 2000, p. 198; Kirk & Raven, 1957, p. 436). Assim como a mente de Anaxgoras, tem grande semelhana com a ideia de uma divindade imanente ao uni-verso, um poder divino que est presente em tudo.

    David Sedley considera que esses fragmentos no permitem atri-buir uma concepo teleolgica a Digenes, j que os nicos fen-menos que so explicitamente associados inteligncia so atmosfri-cos (envolvendo o prprio ar), como chuvas e vento (Sedley, 2005, pp. 463-464). Mas a opinio de Sedley no parece adequada; pois no ltimo fragmento citado acima, vemos que Digenes indica que o ar, que inteligente e comparado a um deus, tem poder sobre todas as coisas e capaz de organizar todas as coisas. O prprio Sedley considera que Digenes introduziu dois aspectos novos e importan-tes na filosofia grega: a ideia de que o princpio material do universo deve ser considerado como inteligente; e que a inteligncia se mani-festa organizando as coisas do modo mais belo e melhor possvel (Sedley, 2005, p. 464).

    3 TELEOLOGIA EM SCRATES E PLATO Entre os pr-socrticos, embora a nfase principal fosse a busca

    de explicaes puramente naturalsticas (causa material e eficiente) para os fenmenos, comearam a surgir outros tipos de explicaes, para dar conta da ordem e da beleza presentes no universo.

    Na poca de Scrates, a ideia de que tudo no mundo foi planejado para algum propsito j era comum. Plato apresenta Scrates criti-

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    cando Anaxgoras por no ter utilizado as noes de finalidade com frequncia, ou de forma adequada. O prprio Plato desenvolveu uma cosmologia e teologia que atribui a primazia determinao do propsito das coisas, de acordo com as intenes de um planejador inteligente e providente (Johnson, 2005, p. 35).

    3.1 Scrates e a teleologia De acordo com Xenophon (aprox. 430-354 a.C.), em sua obra

    Memorabilia, Scrates argumentava que os seres do universo so o produto de um planejamento inteligente e que, por isso, deve existir um deus sbio e amoroso, responsvel por todas as coisas (McPher-ran, 2006, p. 253). Nesta obra j aparece o termo demiourgos (), que significa arteso, para indicar essa divindade. Tal denominao foi utilizada depois por Plato, no Timeu.

    Xenophon relata um dilogo entre Scrates e Aristodemus (Xe-nophon, Memorabilia, I.4). Este ltimo no orava nem fazia sacrifcios aos deuses e zombava dos que faziam isso. Scrates, ento, o questi-onou, perguntando inicialmente se admirava alguma pessoa por sua sabedoria. Aristodemus responde que sim e indica o nome de poetas e artistas. Scrates, ento, lhe pergunta:

    E quem lhe parece mais digno de admirao: aqueles que criam imagens sem sentidos nem movimento, ou aqueles que formam ani-mais dotados de sentidos, vida e inteligncia?

    Por Zeus, aqueles que formam animais, se eles no so produzidos pelo acaso, mas pela inteligncia.

    Suponhamos que impossvel adivinhar o propsito da existncia de uma criatura, e que seja bvio que uma outra serve para uma fina-lidade til; qual das duas voc diria que foi um produto do acaso, e qual da inteligncia?

    Sem dvida, aquelas que existem para algum propsito til devem ser produto da inteligncia.

    E no lhe parece ento que aquele que fez inicialmente os homens lhes deu por algum propsito til essas partes pelas quais eles perce-bem diferentes objetos, os olhos para ver o que deve ser visto, os ou-

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    vidos para ouvir aquilo que deve ser ouvido? Para que nos serviriam os odores, se no tivssemos sido dotados de narinas? Que percep-o poderia haver do doce e do amargo e de todas as coisas agrad-veis ao paladar, se no tivesse sido formada uma lngua na boca para perceb-los? Alm disso, no lhe parecem existir outros arranjos que parecem ser o resultado de planejamento, como a proteo do olho, que fraco, com as plpebras, como portas, de tal modo que, quando necessrio usar a viso, so abertas, mas no sono so fechadas? E fazer clios crescerem como uma cortina, para que os ventos no possam feri-los? E fazer uma cobertura acima dos olhos com as so-brancelhas, para que o suor da cabea no possa nos incomodar? Os ouvidos captam todos os sons, mas nunca so obstrudos. Os incisi-vos em todos os animais so adaptados para cortar, e os molares para receberem alimentos deles, e tritur-los. E a boca, atravs da qual en-tra o alimento que eles querem, est colocada perto dos olhos e das narinas; mas como aquilo que sai desagradvel, os canais atravs dos quais isso passa so desviados e afastados tanto quanto possvel dos rgos dos sentidos. Com tais sinais de providncia7 nesses ar-ranjos, voc pode ter dvidas se eles so obra do acaso ou da inteli-gncia?

    No, claro que no. Para quem examina essas coisas desse modo, elas parecem a obra de um arteso sbio que se preocupou com o bem estar dos animais.

    E quanto ao desejo natural de gerar filhos, e nas mes um desejo de cuidar dos descendentes, e nas crianas um desejo pela vida e um for-te temor da morte?

    Sem dvida esses parecem arranjados por algum que deliberada-mente desejou a continuidade da existncia dos animais. (Xe-nophon, Memorabilia, I.4, 4-7)

    7 A palavra providncia, em grego, prnoia (), que significa pr-conhecimento, ou planejamento. O autor mais antigo conhecido que utilizou essa palavra foi Herdoto, que comentou sobre a providncia do divino, que podia ser notada no fato de que os lees possuem um nico filhote de cada vez, mas os ani-mais que eles predam se multiplicam rapidamente. (Burkert, 1985, p. 319). Scrates est aqui argumentando que a constituio do corpo humano s poderia ser a obra de uma prnoia, do planejamento de uma mente divina que claramente se importa com os seres humanos.

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    Notemos que Scrates adota uma abordagem teleolgica, conside-rando que os vrios rgos e partes do corpo do homem e dos ani-mais so feitos para determinadas finalidades, e que foram planejados para isso por uma divindade (Johnson, 2005, p. 116).

    No prosseguimento do dilogo, Scrates apresenta vrios argu-mentos a Aristodemus para procurar convenc-lo de que essa divin-dade que planejou todos os seres vivos se preocupa especialmente com os seres humanos, e que por isso devem ser respeitados e cultu-ados. Voc encontrar que a divindade to poderosa e de tal natureza que capaz de ver todas as coisas e ouvir todas as coisas ao mesmo tempo, de estar presente em todos os lugares, e de cuidar de todas as coisas ao mesmo tempo (Xenophon, Memorabilia, I.4, 18).

    Aceitando o relato de Xenophon, podemos considerar que Scra-tes apresenta um argumento teolgico a partir do planejamento do universo; e apresenta uma divindade imanente, onipresente, cuidando permanentemente de todas as coisas (Frede, 2002, p. 86).

    Em um outro captulo da mesma obra, Xenophon apresenta ou-tros argumentos importantes. Scrates indica que h fenmenos co-mo a sucesso do dia e da noite, o ciclo das estaes e a abundncia de gua que beneficiam tanto os animais quanto os seres humanos; e que um grande nmero de animais existe especificamente para o uso dos homens, o que mostra que a divindade se preocupa especifica-mente conosco (Sedley, 2005, p. 465). Assim, podemos considerar que a teleologia de Scrates explicitamente antropocntrica.

    No dilogo Phaedo, de Plato, Scrates relata que, quando jovem, ele se interessava muito pela investigao da natureza, desejando sa-ber como as coisas surgem e perecem, e por que existem. Entre as questes que ele se colocava nessa poca, esto dvidas sobre como surge a organizao dos animais (Plato, Phaedo, 96B). Mas ele no conseguia avanar muito nessas pesquisas.

    Ento, um dia, ouvi um homem lendo de um livro de Anaxgoras, que dizia que a mente que arranja e causa todas as coisas. Essa teo-ria das causas me agradou, e me pareceu bastante correto que a men-

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    te deveria ser a causa de todas as coisas, e pensei: Se for assim, a mente, ao organizar as coisas, arruma tudo e estabelece cada coisa da melhor forma que pode. Assim, se algum quiser descobrir a causa da gerao ou destruio ou existncia de uma coisa em particular, ele deve encontrar que tipo de existncia, ou de estado, ou de atividade melhor para ela. (Plato, Phaedo 97C)8

    Assim, Scrates esperava que Anaxgoras pudesse lhe ensinar se a Terra era redonda ou achatada, se estava no centro do universo ou no, e explicasse sua resposta indicando por que motivo isso era o melhor possvel para a Terra. No entanto, em vez disso, Anaxgoras apenas escrevia sobre os elementos, como ar, ter e gua. E Scrates se decepcionou com a filosofia de Anaxgoras (Freeland, 2006, p. 201).

    Eu poderia compar-lo a uma pessoa que comeasse admitindo de forma geral que a mente a causa das aes de Scrates, mas que, quando tentasse explicar as causas de minhas vrias aes em detalhe, fosse mostrar que eu estou sentado aqui porque meu corpo feito de ossos e msculos; e os ossos, como ele diria, so duros e possuem juntas que os dividem, e os msculos so elsticos, e eles cobrem os ossos, que tambm tm uma cobertura ou envoltrio de carne e pele que os contm; e como os ossos so erguidos nas suas juntas pela contrao e relaxamento dos msculos, eu sou capaz de dobrar meus membros, e por isso que estou assentado aqui em uma postura en-curvada [...] H certamente uma estranha confuso entre causas e condies nisso tudo. Pode-se dizer, realmente, que sem ossos e msculos e as outras partes do corpo eu no posso executar os meus propsitos. Mas dizer que eu fao o que fao por causa deles, e que esse o modo pelo qual a inteligncia age, e no pela escolha do me-lhor, um modo descuidado e vazio de falar. (Plato, Phaedo 98C-99B)

    Na anlise da ao humana, era bvio para todos que devemos le-var em conta fatores como desejo, motivao e juzo, e no apenas a

    8 Utilizo neste artigo o modo padro de identificao de trechos dos dilogos de Plato, atravs do nmero Stephanus, que se baseia na paginao da edio grega das obras de Plato publicada em 1578 por Henri Estienne (1528-1598).

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    formao e ao das estruturas fsicas do corpo. Pode-se dizer que a explicao das aes exige o conhecimento da finalidade ou propsi-to. Mas como vemos, Scrates queria utilizar a busca da inteligncia em todas as coisas, como na forma e posio da Terra. Posteriormen-te, a busca da finalidade ou propsito acabou por dominar outros campos, como a biologia, especialmente sob a influncia de Aristte-les (Hankinson, in Galeno, 1998, p. 11).

    Para Scrates (e tambm para Plato), as questes adequadas a se-rem perguntadas no so: Do que feito tudo? ou Como os ele-mentos servem para explicar as propriedades da matria?, mas sim: Por que as coisas so organizadas do modo que so? E o nico tipo de resposta apropriada : Porque melhor assim (Hankinson, 2009, p. 214). No Phaedo ele identifica o erro dos materialistas que confun-dem meros pr-requisitos (a base material das coisas) com causas reais. Questes causais propriamente devem ser respondidas em ter-mos de forma e finalidade, estrutura e propsito. O papel do terico , ento, mostrar como as coisas so produzidas para o melhor, con-siderando vrias limitaes razoveis impostas pela natureza dos ma-teriais disponveis, e esboar uma explicao consistente com essas limitaes (ibid., p. 215).

    Outra obra (Leis), Plato procura tambm combater o atesmo re-correndo a um tipo de teologia natural, que tem a providncia divina para os seres humanos como um dos seus principais artigos de f (Frede, 2002, p. 89). Partindo do argumento de que a ordem celeste devida razo divina, ele defende que essa mesma providncia divina se estende aos nveis mais baixos da escala csmica, e que as divinda-des se interessam pelos seres humanos, pois seria incompatvel com a oniscincia divina se eles ignorassem os detalhes do universo (ibid., p. 92).

    3.2 A teleologia no Timaios de Plato A posio de Scrates (e que foi efetivamente adotada por Plato)

    a de que todas as explicaes anteriores indicavam apenas como as coisas aconteciam, mas no proporcionavam a razo pela qual elas

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    existiam ou aconteciam. E a resposta deveria ser teleolgica, mos-trando no apenas que cada coisa tem uma funo ou utilidade, mas mostrando que a melhor possvel (Annas, 1982, p. 314).

    A expresso mais madura desse ponto de vista aparece no dilogo Timaios () de Plato, onde ele tenta dar conta do programa ambicioso de apresentar uma viso teleolgica do universo compat-vel com esta herana socrtica, incorporando tambm sua teoria das formas (McPherran, 2006, p. 253).

    Antes de apresentar as ideias do Timaios, relevante mencionar que no se pode ter certeza de que essa obra apresenta realmente aquilo que Plato pensava, ou apenas ideias de outros autores (Lloyd, 1968, p. 84; Freeland, 2006, p. 199). Pois, nesta obra, quem expe todas as ideias relevantes o personagem Timeu de Locri (aprox. 420380 a.C.), que d o nome ao dilogo, e que um pitagrico; portanto, as concepes que ele expe poderiam no ser exatamente iguais quilo que Plato aceitava. Tambm no se sabe at que ponto a viso exposta no Timaios original, ou se baseou em obras perdidas de autores anteriores. Por fim, como Timeu afirma estar apresentan-do um mito, difcil saber at que ponto Plato aceitava realmente essas ideias.

    Neste dilogo, Timeu comea por estabelecer que o universo no eterno j que ele sensvel e mutvel; e discute sobre sua origem9. No Philebus (26E) Plato afirmou que todas as coisas que se transfor-mam deve ter alguma causa (), e que essa causa o agente ( ), que no Timaios denominado arteso ou demiurgo ( ) (Cornford, 1997, p. 25).

    Descobrir o arteso e pai deste universo uma tarefa difcil, e tendo-o encontrado seria impossvel declar-lo a toda a humanidade. Seja

    9 No vamos abordar aqui os aspectos astronmicos e fsicos do Timaios. Os interes-sados nesses aspectos podem consultar, por exemplo, a obra de Gregory Vlastos, Platos universe (Vlastos, 2005), que continua sendo uma tima introduo ao tema, embora sua primeira edio seja de 1975.

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    como for, devemos retornar a esta questo a respeito do mundo: a partir de qual dos dois modelos seu construtor o planejou: a partir daquilo que est sempre no mesmo estado imutvel, ou a partir da-quilo que se transforma? Ora, se este mundo bom e seu arteso bom, claramente ele deve ter contemplado o [modelo] eterno; pela suposio contrria (que no pode ser dita sem blasfmia), aquilo que se transforma. Todos, portanto, devem ver que ele contemplou o eterno; pois o mundo a melhor das coisas que surgiu, e ele a me-lhor das causas. Tendo surgido, ento, desta forma, o mundo foi construdo a partir do modelo daquilo que compreensvel pelo dis-curso racional e pela inteligncia e est sempre no mesmo estado. (Plato, Timaios, 28C-29A)

    Assim, o mundo visvel uma imagem mutvel, ou imitao (ei-kon) de um modelo eterno (Cornford, 1997, p. 23; Drozdek, 2007, p. 158). A descrio apresentada por Timeu utiliza a analogia de um arteso criando uma obra. Na Repblica (livro X) Plato fala sobre um carpinteiro que fabrica uma cama tomando para seu modelo a ver-dadeira cama, uma forma imaterial e eterna que ele no cria nem inventa, mas que existe na natureza das coisas (Cornford, 1997, p. 27). Esse modelo perfeito, e por isso a obra baseada nele tambm ser boa. O domnio das formas considerado o original; o mundo visvel, uma reflexo.

    Vamos, ento, apresentar por qual razo este universo e aquilo que se transforma foram estruturados por aquele que os estruturou. Ele era bom; e no bom no pode jamais surgir cime sobre qualquer ponto. Assim, sendo desprovido de cime, ele desejou que todas as coisas se aproximassem tanto quanto possvel de serem como ele prprio. [...] Desejando, ento, que todas as coisas fossem boas e, tanto quanto possvel, nada fosse imperfeito, o deus controlou tudo o que visvel - que no estava em repouso, mas em movimento discordante e de-sordenado e o levou da desordem para a ordem, pois julgou que a ordem era melhor, sob todos os aspectos. No era, nem mais ser permitido que a obra daquele que supremamente bom pudesse ser qualquer coisa diferente do que o melhor. (Plato, Timaios, 29D-30A)

    Aquilo que guia toda a estruturao do universo e de todos os se-res seria, ento, o desejo divino de produzir coisas to prximas de

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    sua prpria perfeio quanto possvel (Freeland, 2006, p. 205). Mais adiante, Timeu explicar que nem tudo possvel; que a matria im-pe limites perfeio das criaturas. Por isso, Timeu em muitos pon-tos indica que o demiurgo planejou as coisas para que fossem to perfeitas quanto possvel (Cornford, 1997, p. 36).

    Plato introduziu pela primeira vez, no pensamento grego, a ideia de um deus criador bondoso, perfeito, sbio e previdente (Cornford, 1997, p. 34; Drozdek, 2007, p. 164). Para ele, o demiurgo um rei e supervisor de todas as coisas e, em particular, do estado e perfeio do mundo. Ele produziu a natureza animada, e as mudanas que ocorrem nessa natureza provm de um conhecimento divino que vem dessa divindade. Ele um ser inteligente, que a causa do mo-vimento regular do mundo, e apenas por sua interveno a ordem da natureza pode ser restaurada, quando ela se desestrutura ao ser aban-donada a si prpria. Ele fez os cus, um arteso (demiurgo), sendo tambm chamado de pai (Drozdek, 2007, p. 152). Ele bondoso e se interessa pelo universo, sendo caracterizado pela providncia () ou pensamento prvio e planejamento (Plato, Timaios 30B-C; Sedley, 2002, p. 64).

    Essa viso muito diferente da concepo religiosa grega tradici-onal, repleta de deuses imperfeitos e movidos por emoes baixas, como o cime. O demiurgo do Timaios tambm no deve ser confun-dido com a concepo do deus judaico-cristo, nem se deve imaginar que o dilogo de Plato foi inspirado na Bblia. O deus bblico cria a partir do nada; o demiurgo utiliza uma realidade fsica preexistente e as formas eternas (Drozdek, 2007, p. 164; Freeland, 2006, p. 207). Desde a Antiguidade se percebeu a diferena entre essas ideias. Gale-no, por exemplo, afirmou:

    A doutrina de Moiss diferia daquela de Plato e de todos os gregos que abordaram corretamente o estudo da natureza. Para Moiss, deus precisa apenas desejar colocar a matria em ordem, e a matria fica ordenada imediatamente. No pensamos desta forma; dizemos que certas coisas so impossveis por natureza e que deus nem mesmo

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    tenta faz-las; ele apenas escolhe o melhor dentre as coisas que po-dem acontecer. (Galeno, apud Cornford, 1997, p. 36)

    De acordo com Timeu, depois de estrutura o universo como um todo, o demiurgo produziu um grande nmero de deuses celestes, associados s estrelas e aos planetas. O prprio universo, como um todo, um ser vivo e inteligente, sendo tambm um deus. impor-tante deixar claro que, no Timaios, o deus que uma causa primria o demiurgo no-imanente; a alma do mundo tambm um deus e ambos possuem inteligncia (nous); mas o deus-universo secundrio, criado pelo primeiro deus (Sedley, 2002, p. 63-64).

    Como o demiurgo um ser perfeito, tudo o que ele criasse seria tambm imortal. Assim, ele no podia produzir os seres inferiores (Freeland, 2006, p. 208). Por isso, ele criou os deuses celestes e os incumbiu de formar os demais seres do universo, incluindo os seres vivos da terra, da gua e do ar (Plato, Timaios, 39E-40A). Ou seja: o demiurgo no produziu todas as coisas e toda a ordem do universo. Ele apenas deu incio ao funcionamento do mundo e mantm sua existncia ordenada atravs dos deuses. Eles so incumbidos de reali-zar o resto do processo de ordenao do universo (Drozdek, 2007, p. 162).

    Timeu s descreve de forma mais detalhada a produo dos seres humanos. Vejamos uma parte dessa descrio:

    Copiando a forma redonda do universo, eles [os deuses celestes] con-finaram as duas revolues em um corpo esfrico aquilo que cha-mamos de cabea que a parte mais divina em ns, e que domina todo o resto. A ela os deuses deram todo o corpo, quando o monta-ram, para seu servio, percebendo que ele possua todos os movi-mentos que precisavam existir. Assim, para que a cabea no rolasse pelo cho com seus altos e baixos de todos os tipos, sem meios para ultrapassar os primeiros e de subir para fora dos segundos, eles lhe deram o corpo como um veculo para facilidade de locomoo; e por isso que o corpo alongado e dele crescem quatro membros que podem ser esticados ou dobrados, que foram assim arranjados pelos deuses para sua locomoo. Prendendo-se e sendo suportado por es-ses membros, ele [o corpo] capaz de se locomover por qualquer re-

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    gio, carregando em nosso topo a habitao da parte mais divina e sagrada. Assim e por estas razes as pernas e os braos crescem so-bre todos ns. (Plato, Timaios, 44D-45A)

    Pode-se dizer que, neste pargrafo, Timeu est procurando res-ponder questo: por que temos braos e pernas?, e sua resposta de um tipo teleolgico: porque os braos e pernas servem para a lo-comoo; porque a cabea sozinha no conseguiria se mover pelo cho. Alm de apontar a finalidade dos membros, ele tambm indica que o corpo humano foi planejado e estruturado pelos deuses, ou seja, houve seres inteligentes que planejaram a nossa estrutura.

    Logo em seguida, Timeu descreve que os deuses produziram os olhos para nos trazer a viso, e comenta sobre o modo pelo qual enxergamos (adotando a antiga teoria dos raios visuais emitidos pelos olhos). Indica, tambm, que as plpebras so uma proteo para os olhos planejada pelos deuses (Plato, Timaios, 45B-E). Vemos, tam-bm nesses casos, que a explicao teleolgica proporcionada muito simplista. Mais adiante, Timeu comenta que o maior benefcio da viso (e a causa pela qual os deuses a inventaram) para que puds-semos observar os movimentos celestes inteligentes e perfeitos e a partir da desenvolver nosso prprio pensamento (Drozdek, 2007, p. 162); e no caso da audio, de forma anloga, para permitir que cap-tssemos a harmonia, cujos movimentos so semelhantes s revolu-es da alma dentro de ns (Plato, Timaios, 47B-D). Pode-se dizer que, neste ponto, Plato est apresentando uma concepo mais so-fisticada sobre a utilidade dos sentidos, mas no proporciona uma explicao mais adequada dos fenmenos naturais.

    Outro exemplo tpico do estilo das explicaes teleolgicas encon-tradas nesta obra a justificativa dos pulmes:

    Alm disso, para a palpitao do corao quando se prev um perigo ou surge a raiva, e prevendo que todos esses arroubos de paixo ocorreriam por meio do fogo, eles planejaram um alvio implantando a estrutura do pulmo, macio e sem sangue e alm disso com cavida-des perfuradas dentro dele como uma esponja, para que, recebendo alento e bebida, ele pudesse esfriar o corao e assim proporcionar

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    resfriamento e controle na queima10. Para esse propsito eles corta-ram os canais da traqueia para chegar ao pulmo, e colocaram o pr-prio pulmo em torno do corao como um tipo de amortecedor, pa-ra que, quando o esprito dentro dele estivesse no pico da paixo, o corao pudesse bater contra uma substncia macia e ser esfriado, e assim, menos perturbado, ficasse mais capaz de auxiliar o elemento do esprito a servio da razo. (Plato, Timaios, 70C-D)

    Veremos em outros artigos que a teleologia de Aristteles bem diferente da apresentada por Plato; mas que autores posteriores se inspiraram fortemente nas concepes apresentadas no Timaios.

    4 COMENTRIOS FINAIS A busca de explicaes para os fatos naturais levou a maioria dos

    filsofos pr-socrticos a afastar-se das explicaes religiosas, voltan-do-se para os princpios materiais e os princpios dinmicos do uni-verso aquilo que posteriormente foi denominado de causa materi-al e causa eficiente.

    No entanto, tais explicaes no proporcionavam uma compreen-so da ordem csmica, nem da evidente adaptao dos rgos dos animais para suas funes. A tentativa de dar conta desses aspectos da natureza levou os pitagricos a introduzirem a noo de que exis-tem realidades imateriais (os nmeros) que regem todas as coisas; e, posteriormente, concepo de Anaxgoras e Digenes da presena de uma inteligncia no universo.

    Abriu-se assim o caminho para a introduo de outros tipos de causas, que posteriormente foram denominadas causa formal e causa final. Estes dois tipos adquirem importncia fundamental, depois, graas a Scrates e Plato. O dilogo platnico Timaios procu-ra apresentar uma justificativa teleolgica para o surgimento do uni-verso e para as caractersticas dos principais seres que o constituem. Ao fazer isso, Plato reintroduz a ideia de uma divindade antropo-

    10 A ideia de que uma parte daquilo que bebemos vai para os pulmes era uma con-cepo comum na poca. Tambm era comum acreditar que os pulmes tinham a funo de resfriar o calor inato do corao, conforme havia sido ensinado por Philis-tion e Diocles (Cornford, 1997, p. 284).

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    mrfica, bondosa e ativa, que planeja racionalmente todas as coisas. No um retorno mitologia grega tradicional, j que se trata de uma divindade bem mais abstrata e justificada filosoficamente; mas, de certa forma, trata-se de um retorno ao passado, de um abandono da tentativa de compreender todo o universo despindo-o de deuses.

    No caso da teleologia de Scrates e Plato, est muito clara a as-sociao entre ideias teolgicas (caractersticas especiais da divindade, como sabedoria e bondade) e a teleologia na natureza. Veremos em um artigo futuro11 que a teleologia de Aristteles tem uma base com-pletamente diferente, estando associada ideia de uma divindade que no se interessa pelos seres do universo.

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    Data de submisso: 16/03/2013 Aprovado para publicao: 19/04/2013

    1 Introduo2 A natureza e as causas entre os pr-socrticos2.1 O conceito de physis2.2 O conceito de aition2.3 Causas formal e final3 Teleologia em Scrates e Plato3.1 Scrates e a teleologia3.2 A teleologia no Timaios de Plato4 Comentrios finaisReferncias bibliogrficas