a divisão da lógica

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UNIDADE 5: A divisão da lógica Raciocínio Lógico Profª Carmen Suely Cavalcanti de Miranda Profº Ivickson Ricardo de Miranda Cavalcanti Raciocínio Lógico Profª Carmen Suely Cavalcanti de Miranda Profº Ivickson Ricardo de Miranda Cavalcanti

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1 Raciocínio Lógico - Unidade 3

UNIDADE 5: A divisão da lógica

Raciocínio Lógico Profª Carmen Suely Cavalcanti de Miranda

Profº Ivickson Ricardo de Miranda Cavalcanti

Raciocínio Lógico Profª Carmen Suely Cavalcanti de Miranda

Profº Ivickson Ricardo de Miranda Cavalcanti

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2 Raciocínio Lógico - Unidade 3

A divisão dA lógicA

UnidAde 5

3.1 contextualizando

Até aqui você vem sendo apresentado à lógica e pode conhecer sua definição e seu desenvolvimento na história. estes são conteúdos indispensáveis para que você possa avançar na compreensão e uso desse conhecimento. Pode perceber que a preocupação com a lógica não é atual, já estava presente entre os gregos, e que a lógica é um instrumento bastante utilizado pela ciência, na medida em que todo conhecimento para ser científico tem que ser lógico.

É muito importante, ainda, que você possa ter percebido, que a lógica deve ser aplicada na procura e demonstração da verdade. Quando falamos em procura da verdade, devemos ter claro que esse é um processo que envolve a relação do pensamento com a realidade. É exatamente em função destes elementos que se estabelecem as duas grandes divisões da lógica: a lógica formal e a lógica material – objeto desse capítulo.

Quando falamos em verdade no campo da ciência, nos referimos ao mundo fenomênico, ou seja, à realidade concreta, aquilo que aparece a cada um que busca a verdade. no entanto, a definição/conceituação dos fenômenos, liga-se necessariamente a operações mentais. Assim, é necessária a observação do pensamento, a forma pela qual ele deve se apresentar para que possua validade.

em outras palavras, a validade de um argumento deve ser considerada no conjunto das operações do qual resultou. desde o momento de formulação da ideia até a construção do novo conhecimento com a formulação do argumento. veja que este processo implica uma reflexão em dois níveis: o nível das operações mentais, que se inicia com a formulação da ideia, e o nível da articulação do pensamento com a realidade, que se efetiva na formulação do argumento. são esses os problemas que se explicitam na aplicação da lógica e em decorrência dos quais são definidas as duas

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divisões da lógica: a lógica formal e a lógica material.

Ao final deste capítulo esperamos que você esteja apto a:

• identificar as duas grandes divisões da lógica; • conceituar a lógica formal e a lógica material.

3.2 conhecendo a teoria

3.2.1 A lógica formal

como você pôde ver nos capítulos anteriores, a lógica, sobretudo no que diz respeito à sua origem, configura-se como um instrumento que busca fazer com que nossas operações intelectuais sejam corretas e de acordo com a realidade.

essa busca se inicia com uma primeira preocupação: o acordo do pensamento consigo mesmo, para que não apresente contradições. esta deve ser a primeira condição de nossas operações intelectuais na busca pela verdade. estamos falando do campo de atuação do que chamamos de lógica formal, que é responsável pelo estudo das leis gerais do pensamento.

observe o exemplo a seguir:

Todos os mamíferos têm asas – premissa 1o gato é um mamífero – premissa 2

o gato tem asas – conclUsão

Temos duas premissas e uma conclusão.

no que diz respeito ao pensamento em relação a si mesmo, ao seu aspecto formal, a conclusão deste argumento é deduzida corretamente das premissas, o que garante a sua validade. confira o que estamos dizendo: da afirmação de que todos os mamíferos têm asas e da classificação do gato como mamífero, é lógica a conclusão de que o gato (uma vez tendo sido afirmado que é um mamífero) tem asas. essa lógica se efetiva no campo formal. não obstante, se recorrermos à realidade material, saberemos que a primeira premissa – todos os mamíferos têm asas - é falsa, o que faz com que, consequentemente, a conclusão a que se chega também seja falsa.

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o exemplo acima deixa evidente que o objetivo da lógica formal não é avaliar o conteúdo em si, mas se o argumento apresentado foi bem construído.

Partes e bases da lógica formal

Para que você possa compreender o campo de reflexão da lógica formal é importante que possa saber identificar suas partes constitutivas. são elas:

• ideia, juízo e raciocínio – como elementos do pensamento; • termo, proposição e argumento – como representação concreta dos elementos

do pensamento.

de forma esquemática temos:

ideia TeRMo

Juízo PRoPosiÇão

Raciocínio ARgUMenTo

A ideia e o termo

A primeira operação do intelecto na busca da verdade é a apreensão dos fatos, momento em que introjetamos em nós um conhecimento que vem da realidade. esse conhecimento possibilita a formação da ideia. É este o ponto de partida da lógica formal: a ideia. Podemos defini-la como a representação intelectual de um objeto (homem, Brasil, Pedro, entre outros).

Toda ideia apresenta uma compreensão e uma extensão.

1) A compreensão de uma ideia diz respeito ao seu conteúdo, ao conjunto dos elementos que a compõe. Assim, a ideia de HoMeM supõe uma série de elementos para sua compreensão: ser, sensível, racional, bípede, entre outros.

2) A extensão diz respeito à quantidade de indivíduos que podem ser depreendidos da ideia. da ideia de animal, por exemplo, participam uma grande quantidade de indivíduos: vertebrados, invertebrados, celenterados, e até mesmo o próprio homem.

Quanto mais compreensiva uma ideia, menos extensa e vice-versa. Por exemplo,

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quando nos referimos à ideia de animal, podemos imaginar a partir dela todos os animais, e ao mesmo tempo não teremos condições de especificar nenhum. sua extensão é ampla, ao mesmo tempo, sua compreensão é limitada. Fica difícil compreender plenamente o que uma pessoa quer dizer quando pronuncia a palavra animal.

Já, se pensarmos a ideia de homem, esta se aplica a uma categoria de animal e traz consigo uma série de elementos que contribuem à sua compreensão. Tal ideia é mais compreensível do que extensa.

As ideias podem ser divididas considerando a capacidade que têm de representar o objeto, a compreensão e a extensão.

a) Quanto à perfeição, as ideias podem ser:

à Adequadas – quando são esgotadas as possibilidades de conhecimento da coisa (ex.: relâmpago, Marco Polo). Quando as possibilidades não são esgotadas e as ideias podem referir-se a mais de uma coisa, elas classificam-se como inadequadas (ex.: clarão, som, vulto).

à claras – quando os elementos percebidos são suficientes para distingui-la de outras (ex.: homem, peixe), ela nunca será confundida com outra. Quando falta clareza de seus elementos é classificada como obscura (ex.: objeto voador, animal peludo).

à distintas – quando todos os seus elementos são suficientes para torná-la clara, apresentando dados significativos individualizantes (ex.: relógio-pulseira de ouro, marca ômega). Quando não há clareza, a ideia é classificada como confusa (ex.: relógio, veículo).

b) Quanto à compreensão, as ideias podem ser classificadas como:

à simples – quando é composta por um só elemento significativo sua compreensão é imediata (ex.: ser, ente).

à compostas - quando é composta por mais de um elemento significativo, sua compreensão implica vários elementos (ex.: homem, animal).

c) Quanto à extensão, por sua vez, as ideias podem ser classificadas como:

à singulares - quando se referem a um determinado ser ( ex.: este lápis, o primeiro satélite espacial).

à Particulares - quando designam parte de uma classe ou gênero de seres

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(ex.: muitos soldados, alguns livros, várias televisões). à Universais - quando designam todos os seres de uma mesma espécie ou

gênero de seres (ex.: animal, racional, homem).

como a lógica formal estuda as regras do pensamento correto, regras estas que estão sustentadas pelos três princípios aristotélicos, vistos no capítulo 2, principalmente no princípio da não-contradição, essas regras devem estar presentes desde o primeiro momento do pensamento que é a apreensão da ideia. A regra básica, no que diz respeito a este momento, é de que a ideia não pode conter nenhum elemento contraditório; em outras palavras, para que uma ideia tenha sentido e seja válida, ela não deve ser composta por elementos que se excluam. explicitando: não podemos idealizar um círculo quadrado, um deus mal, um sol sem luz, entre outros.

Uma vez estabelecida uma ideia é necessário que ela seja comunicada. Passamos a falar do termo como expressão material da ideia, que permite que esta seja transmitida de uma pessoa para outra. Assim, o termo é a representação concreta de uma ideia.

da mesma forma que a ideia, o termo também se classifica a partir da capacidade que tem de representar o objeto, sua extensão e sua compreensão.

a) Quanto à capacidade que apresenta de representar o objeto, o termo pode ser classificado como:

à Unívoco – quando se aplica a uma única ideia, designando sempre a mesma coisa, possui sempre o mesmo significado. exemplos: deus, casa, cadeira.

à equívoco – quando se aplica a ideias diversas, possui duas ou mais significações completamente diversas entre si. exemplos: manga (de camisa, fruta), vela (de barco, de acender).

à Análogo – quando possui vários significados que, apesar de se diferenciarem, guardam entre si alguns nexos. exemplos: visão/olho = intelecção/inteligência.

b) Quanto à extensão, o termo pode ser:

à singular – quando se refere a um único indivíduo. É exemplo: este livro. à Particular – quando se refere a certo número de indivíduos. exemplo:

alguns homens. à Universal – quando representa uma ideia universal. exemplo: homem.

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c) Quanto à compreensão, o termo pode ser:

à incomplexo – quando o termo é composto por um só elemento vocabular. exemplo: casa, árvore.

à complexo – quando é composto por mais de um universo vocabular. exemplo: guarda-roupa, navio-escola.

PRATicAndo

Agora teste sua compreensão sobre os termos classificando-os quanto à capacidade de representar o objeto, quanto à extensão e quanto à compreensão.

Termo

QuanTo à capacidade de represenTar o

objeTo

QuanTo à exTensão

QuanTo à compreensão

cadeira

quadro negro

animal

comunidade alemã

A explicação da ideia e do termo, de tal forma que não se estabeleça a contradição, remete-nos à exigência da definição. na sua vida acadêmica, você, vez por outra, é solicitado a definir alguma coisa. Por exemplo, se está cursando direito é solicitado a definir JUsTiÇA; se faz odontologia, deve saber definir sAÚde; se é aluno de pedagogia, deve definir edUcAÇão e assim por diante.

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deFiniÇão

Apesar de muitas vezes usados como sinônimos, os termos deFiniR e conceiTUAR têm significados diferentes. Assim:

conceiTo – “instrumento mental que nos serve para pensar as diversas realidades, representando-

as no nosso espírito. Por ele nós pensamos um conjunto de propriedades (formando a sua compreensão) como realizadas num conjunto de objectos (constituindo a sua extensão) (M. gex). o conceito reúne as características comuns ao conjunto de seres da mesma espécie, distinguindo-os dos seres constitutivos de outra(s) espécie(s). enquanto representação mental, o conceito distingue-se do termo, a sua expressão verbal. Assim, o conceito de ser humano (animal racional) pode exprimir-se pelos termos homem, hombre, homme...” (dicionÁRio, 2011).

deFiniR – “enunciar os atributos, as características específicas de uma coisa (objeto, ideia, ser) de tal modo que ela não se confunda com outra. dizer exatamente, explicar a significação de. demarcar, fixar” (dicionÁRioWeB, 2011).

Uma boa definição deve estabelecer o gênero próximo e a diferença específica. como exemplo, podemos citar a definição de Homem, seu gênero próximo é animal e a diferença específica é que o Homem é racional.

Assim, temos como exemplo de uma possível deFiniÇão de homem: o homem é um animal racional.

segundo nerici (1988, p. 40), uma boa definição deve ser orientada por algumas regras, a saber:

1. “A definição deve convir somente ao definido.” Assim sendo, será possível substituir a definição pelo definido, sem possibilidade de equívoco. [...]

2. “deve ser curta para ser memorizada.” É desejável que assim seja mas nem sempre isso é possível. [...]

3. “deve ser clara e precisa.” esta é uma exigência fundamental para a definição e, de certo modo, encerra as duas regras anteriores. [...]

4. A definição não deve ter elementos supérfluos. [...]5. A definição não deve ser negativa quando pode ser positiva. o objeto

deve ser definido, preferencialmente, pelo que é, e não, pelo que não é.6. A definição não deve ser tautológica, isto é, não deve ser mera repetição

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do definido.

com esta orientação é possível construir uma boa definição, capaz de possibilitar a compreensão do que a coisa é. Quando definimos, estamos também delimitando.

o juízo

depois de formadas, as ideias passam a se relacionar entre si. desta relação surge o juízo. ou seja, depois que o espírito apreende as ideias, o próximo passo consiste em compará-las e, consequentemente, produz-se um julgamento de inconveniência ou conveniência entre as mesmas. Temos assim um juízo. É através dele que tornamos as ideias falsas ou verdadeiras. o juízo, portanto, pode ser definido como “o ato em que o espírito ‘afirma ou nega uma coisa de outra’” (neRici, 1988, p. 43).

Quando um juízo é expresso verbalmente, temos a proposição. sobre a proposição estudaremos no capítulo 5.

A proposição é um enunciado no qual afirmamos ou negamos um termo (um conceito) de outro. no exemplo “Todo cão é mamífero“ (Todo c é M), temos uma proposição em que o termo “mamífero” afirma-se do termo “cão” (ARRUdA; MATins, 2010, p. 131).

se o juízo ou proposição é fruto da correlação entre ideias, e se esta relação acaba por se estabelecer como um julgamento, cada ideia ou parte que compõe esta proposição deve ter uma função determinada. estamos falando nas partes de um juízo, a saber:

• o sujeito – a ideia da qual se afirma alguma coisa; • o predicado – a ideia que afirma alguma coisa do sujeito; • o verbo – a afirmação em si, une o predicado ao sujeito.

exemplo:

Maria está grávida

(ideia/sujeito) (verbo) (ideia/predicado)

Um juízo pode ser classificado como analítico ou sintético.

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• Juízo analítico - aquele em que o predicado está contido na noção do sujeito. exemplo: o leite é branco.

• Juízo sintético – aquele em que o predicado não está contido na noção do sujeito. exemplo: Maria está doente.

Kant, filósofo alemão, já precisava a especificidade dos juízos analíticos e sintéticos.

em todos os juízos, nos quais se pensa a relação entre um sujeito e um predicado [...], esta relação é possível de dois modos. ou o predicado B pertence ao sujeito A como algo que está contido (implicitamente) nesse conceito A, ou B está totalmente fora do conceito A, embora em ligação com ele. no primeiro caso chamo analítico ao juízo, no segundo, sintético (KAnT, 1997 apud FeRReiRA, 2011).

segundo Kant, o juízo analítico independe da experiência, por isso é a priori; por sua vez, o juízo analítico é a posteriori, isto é, empírico – depende da experiência.

PRATicAndo

vamos praticar?identifique as partes dos juízos abaixo e classifique-os (analíticos ou sintéticos):

1. cláudia estudou a matéria da prova.2. o círculo é redondo.3. A casa é de taipa.

o argumento e o raciocínio

chegamos ao momento da lógica formal, que pode ser considerado a síntese de todo processo sobre o qual ela se debruça e que, ao mesmo tempo, se constitui o ponto de partida para o desenvolvimento da lógica material: estamos falando do argumento. Recapitulemos o que foi dito até então sobre o processo intelectivo. em primeiro lugar, o nosso intelecto apreende as ideias, logo depois, relaciona-as formando os juízos que são ordenados de forma a se chegar a uma conclusão sobre determinado assunto, produzindo novo conhecimento. Todo esse percurso constrói um argumento. É fundamental que tenhamos argumentos convincentes, argumentos capazes de garantir

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o nosso ponto de vista.

veja o caminho que vai da ideia ao argumento: o primeiro momento é a apreensão dos fatos e a formação das ideias, que são enunciadas através do termo; a seguir, da relação das ideias entre si formula-se o juízo. A enunciação do juízo através da palavra falada ou escrita recebe o nome de proposição. A formulação de juízos nos encaminha para conclusões. Toda essa operação mental recebe o nome de raciocínio, cuja enunciação, através da palavra escrita ou falada, recebe o nome de argumento. o argumento pode ser definido como “um discurso em que encadeamos proposições para chegar a uma conclusão” (ARRUdA; MARTins, 2010, p. 133). o argumento é, ainda, o meio utilizado para convencer alguém acerca de algo

Podemos inferir que o raciocínio, e sua enunciação através do argumento, é o remate final de todo o processo do pensamento.

Quando você estudou a história da lógica pôde conhecer sobre o silogismo aristotélico, que não é outra coisa senão a maneira mais básica de se demonstrar um argumento. o silogismo é a fórmula que possibilita analisar, por meio do argumento, o grau de perfeição e validade do raciocínio.

você também viu que o silogismo é um argumento formado por dois antecedentes e uma conclusão. os antecedentes são chamados de premissas. A veracidade da conclusão do silogismo é orientada por duas regras fundamentais:

1) se as premissas forem verdadeiras, a conclusão será verdadeira.

veja o exemplo:

Todo metal conduz energia

antecedente vPReMissAs

o bronze é um metal antecedente v

logo,

o ouro conduz energia consequente F conclUsão

2) se as premissas foram falsas, a conclusão será falsa.

veja o exemplo:

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Todo animal voa antecedente FPReMissAs

o homem é um animal antecedente F

logo,

o homem voa consequente F conclUsão

Afinal, o que significa argumentar?

de forma sintética podemos afirmar que argumentar é apresentar uma proposição como sendo uma consequência de duas ou mais proposições. de modo geral, um argumento é constituído por premissas (p, p1, ..., pn) nas quais nos baseamos para afirmar outra premissa que é a conclusão.

Um argumento pode ser apresentado de duas formas:

1) A forma simbólica

p1, p2, ..., pn c

premissas conclusão

2) A forma padronizada

P1premissas

P2

...

Pn

c conclusão

Um argumento válido é aquele cuja conclusão decorre do que foi afirmado nas premissas. É preciso, ainda, que as premissas e a conclusão estejam relacionadas corretamente. neste sentido, quando a conclusão é uma consequência necessária das premissas, dizemos que o argumento é válido. Quando a conclusão não é uma consequência necessária das premissas, dizemos que o argumento é inválido.

veja o exemplo:

Bruno é uma pessoa que tem boa memória para fatos ou objetos vistos

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anteriormente, pois é paranaense e todo paranaense tem boa memória para fatos ou objetos vistos anteriormente.

veja agora a forma lógica desse argumento:

Bruno é paranaense PReMissA 1

Todos os paranaenses têm boa memória para fatos ou objetos vistos anteriormente.

PReMissA 2

logo,

Bruno é uma pessoa que tem boa memória para fatos ou objetos vistos anteriormente.

conclUsão

neste caso, a conclusão decorre necessariamente das premissas 1 e 2. Portanto, podemos afirmá-lo como argumento válido.

PRATicAndo

considerando a forma simbólica e a forma padroniza de apresentar um argumento, exercite sua compreensão sobre o assunto colocando o argumento acima na forma simbólica e na forma padronizada.

Até aqui falamos da validade formal de um argumento, torna-se necessário agora assegurar a validade material, esse é o campo de ação da lógica material.

3.2.2 A lógica material

Até aqui, você foi apresentado à lógica formal, responsável pelo estudo das leis gerais do pensamento. convidamos você, agora, a pensar a relação do nosso pensamento com os fatos da realidade. este é o campo da lógica material.

A lógica material se desenvolveu com as transformações no conceito de ciência. Momento em que se passou a exigir a comprovação empírica do conhecimento produzido para explicar a realidade. sabe-se que a partir do séc. Xvi, com a consolidação

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da revolução científica, a ciência, até então um conhecimento voltado à explicação da realidade, passou a ser um conhecimento experimental voltado à transformação da natureza.

A verdade e o erro

A relação pensamento/realidade move o homem a estabelecer juízos sobre a realidade do mundo. esse processo pode se desenvolver em duas perspectivas: a da verdade lógica – quando se verifica a correspondência do pensamento com a realidade; ou a do erro, quando não há essa correspondência. Apesar do conhecimento dos princípios do raciocínio correto, postulados pela lógica formal, o homem continua sujeito ao erro, tomando o falso como verdadeiro.

você pode perceber que a lógica, como todo conhecimento filosófico e científico, constrói-se tendo como referência a verdade. o que é a verdade? Podemos elencar uma série de definições. veja algumas:

1. correspondência entre o conhecimento e o objeto – É o conceito mais antigo e que pode ser expresso como ‘o acordo do pensamento com seus objetos’.

2. coerência lógica – segundo este conceito, a verdade exclui o objeto, que não pode ser conhecido em sua essência, em si [...]. logo, um juízo será verdadeiro quando se ajustar às normas e leis do pensamento.

3. Utilidade prática – É o conceito de funcionalidade, de utilidade que vai prevalecer (neRici, 1988, p. 17-8).

Podemos definir duas perspectivas de verdade: a verdade ontológica e a verdade lógica.

Jolivet (2011) define as duas perspectivas de verdade afirmando que:

1) A verdade ontológica exprime o ser das coisas, enquanto corresponde exatamente ao nome que se lhe dá, enquanto, por conseguinte, é conforme à ideia divina de que procede. As coisas, com efeito, são verdadeiras enquanto são conformes às ideias segundo as quais foram feitas. conhecer esta verdade, quer dizer, conhecer as coisas tais quais são, é tarefa de nossa inteligência.

2) A verdade lógica exprime a conformidade do espírito às coisas, isto é, à verdade ontológica. desde que eu afirme: “este ouro é puro”, enuncio uma verdade, se verdadeiramente a pureza pertence a este ouro, isto é, se meu julgamento está

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conforme ao que é.

Ainda segundo Jolivet (2011), diante do verdadeiro, o espírito humano pode se apresentar em quatro estados diferentes:

1) ignorância – caracteriza-se pela ausência de conhecimento do objeto.

2) dúvida – caracteriza-se pelo estado de equilíbrio entre afirmação e negação do objeto, levando a uma suspensão de juízo.

3) A opinião – consiste na afirmação ou negação acerca do objeto com medo de estar equivocado.

4) A certeza e a evidência – enquanto a certeza é a adesão a uma verdade sem temor de engano; a evidência é o que fundamenta nossa certeza.

Uma vez explicitada a compreensão de verdade, é fundamental também dizer alguma coisa sobre o seu oposto: o erro.

segundo o filósofo Régis Jolivet (apud coTRiM, 1989) o erro tem causas lógicas, psicológicas e morais. em lógica, o erro se chama falsidade, em moral chama-se mentira.

• As causas lógicas ligam-se à falta de inteligência.

• causas psicológicas ligam-se à falta de atenção e de memória.

• As causa morais, para este pensador, verdadeiras causas do erro, são basicamente de três ordens: a vaidade, o interesse e a preguiça.

como remédios contra o erro, o filósofo aponta:

• os remédios lógicos – constituem-se em uma higiene intelectual, estimulando-se a memória, controlando-se a imaginação.

• os remédios morais – que podem ser sintetizados no amor à verdade, que nos impulsiona a julgar com imparcialidade, paciência e perseguição da verdade.

Pode ocorrer de um raciocínio sobre a realidade se apresentar com aparência de

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16 Raciocínio Lógico - Unidade 3

verdade. neste caso estamos diante de um sofisma.

deFiniÇão

soFisMA – “não é mais do que um raciocínio falso. esta falsidade pode nascer da má aplicação do raciocínio em premissas certas ou do raciocínio certo em premissas falsas. o sofisma pode ou não ser empregado com intenção de enganar” (neRici, p. 77).

vejamos agora quais os tipos mais frequentes de sofisma.

a) equívoco e ambiguidade – este sofisma resulta do emprego de uma mesma palavra em dois ou mais sentidos.exemplo: Toda barata é um inseto. esta flor é barata. logo, esta flor é um inseto.

b) ignorância da causa – este sofisma resulta daquelas inferências cotidianas, quando concluímos que um fato foi causado por circunstâncias acidentais que o antecederam, e que não necessariamente sejam a causa verdadeira. exemplo: não levo meu primo em jogo do meu time, porque das vezes em que levei, meu time perdeu: ele é pé frio.

c) comparação indevida – este sofisma resulta das semelhanças que estabelecemos entre objetos, sem, no entanto, preocuparmo-nos com as diferenças dos mesmos.exemplo: os animais são seres vivos como os vegetais. os animais se locomovem. logo, os vegetais também se locomovem.

d) Petição de princípio – este sofisma ocorre quando resolvemos tomar como verdade demonstrada aquilo que já está em discussão. exemplo: Tal ação é injusta porque é condenável; e é condenável porque é injusta.

superar o erro é, portanto, o que o ser humano almeja. essa superação implica distingui-lo da verdade. Acima falamos conceitualmente sobre o erro, agora vamos entender conceitualmente a verdade.

Page 17: A divisão da lógica

17 Raciocínio Lógico - Unidade 3

A lógica, seja na reflexão sobre as operações do pensamento (lógica formal), seja na reflexão sobre a relação deste com a realidade (lógica material), persegue o raciocínio correto, buscando superar o erro. Para finalizar, veja que esta é uma preocupação presente em cada um de nós, descrita em ditos populares:

errar é humano, persistir no erro é burrice.

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18 Raciocínio Lógico - Unidade 3

3.3 Aplicando a teoria na prática

veja o que afirmamos abaixo e pense em uma situação em que você já foi convencido, em algum momento, a partir do argumento dado por alguém.

A formulação de argumentos válidos em nossa vida pessoal ou profissional possibilita levarmos adiante nossos projetos. saber argumentar é uma forma efetiva de inserção na realidade. É tão evidente o valor da boa argumentação que, em muitas situações, uma disputa é vencida pelo que chamamos de argumento de autoridade. ou seja, a conclusão de um argumento se sustenta no conhecimento, ou reputação de uma autoridade.

essa autoridade pode ser uma pessoa, uma instituição. no entanto, é importante destacar que um argumento de autoridade apenas é um bom argumento se a autoridade em causa é realmente qualificada em relação ao assunto acerca do qual desejamos provar a conclusão.

Por exemplo, quando afirmamos que segundo órgãos de defesa ambiental há 90% de probabilidade de o aquecimento global ter uma causa humana, estamos afirmando que é muito provável que o aquecimento global tenha sido causado pelos seres humanos. neste caso, procura-se provar a participação do homem no aquecimento global recorrendo à autoridade dos órgãos responsáveis pelo meio ambiente. se aceitarmos que estes órgãos são qualificados, temos um bom argumento.

3.4 Para saber mais

Título: educando para a argumentação: contribuições do ensino da lógicaAutor: Patrícia del nero velasco editora: Autêntica editora Ano: 2010

este livro oferece uma introdução às noções elementares de lógica, possibilitando um contato com os seus conceitos fundamentais. Apresenta noções elementares da chamada lógica não formal, que independe da formalização e da simbologia típicas da matemática. com a utilização de fragmentos jornalísticos, quadrinhos e outras ferramentas que ilustram e dão suporte aos conceitos apresentados, possibilita uma incursão prazerosa ao universo da lógica.

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19 Raciocínio Lógico - Unidade 3

3.5 Relembrando

neste capítulo você aprendeu que a lógica apresenta duas grandes divisões:

a) lógica formal - trata do acordo do pensamento consigo mesmo e tem como ponto central de estudo o argumento e o raciocínio em si, especificamente os elementos básicos que o compõe: a ideia, a proposição e enfim ele mesmo, o argumento.

b) lógica material - trata do estudo do raciocínio em sua dependência em relação ao conteúdo material, aos objetos da realidade a que se dirige.

são partes constitutivas da lógica formal:

• ideia, juízo e raciocínio – como elementos do pensamento;

• termo, proposição e argumento – como representação concreta dos elementos do pensamento.

de forma esquemática temos:

ideia TeRMoJuízo PRoPosiÇãoRaciocínio ARgUMenTo

• A ideia é o ponto de partida da lógica formal. o termo é a representação concreta de uma ideia.

• o juízo pode ser definido como “o ato em que o espírito ‘afirma ou nega uma coisa de outra’” (neRici, 1988, p. 43). Quando um juízo é expresso verbalmente temos a proposição.

• A operação mental que vai da ideia ao argumento recebe o nome de raciocínio. A enunciação deste através da palavra escrita ou falada recebe o nome de argumento.

• A lógica, como todo conhecimento filosófico e científico, constrói-se tendo como referência a verdade.

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20 Raciocínio Lógico - Unidade 3

• o conceito de verdade é amplo, pode ser pensado em duas perspectivas: a verdade ontológica e a verdade lógica.

• o oposto da verdade é o erro.

• o erro tem causas lógicas e causas morais. em lógica, o erro se chama falsidade, em moral chama-se mentira.

• existem raciocínios que se apresentam com aparência de verdade – são os sofismas. os tipos mais frequentes de sofisma são: equívoco e ambiguidade; ignorância da causa; comparação indevida; petição de princípio.

3.6 Testando os seus conhecimentos

1) observe os sofismas i e ii e responda o que se pede:

i. Toda violeta é roxaToda violeta é florlogo, toda flor é roxa

ii. Alguns humanos são sábiosAlguns humanos não são inteligenteslogo, alguns sábios não são inteligentes

a) em cada um desses sofismas identifique as premissas e a conclusão.b) identifique os três termos que compõem o silogismo.

2) considerando os tipos mais frequentes de sofismas estudados neste capítulo, classifique-os:

a) o cigarro prejudica a saúde porque faz mal para o organismo.b) Toda barata é um inseto. esta flor é barata. logo, esta flor é um inseto.c) Maria viu um gato preto antes de cair da escada. logo, ela caiu porque viu um

gato preto.

onde encontrar

ARAnHA, M. l. de A.; MARTins, M. H. P. Filosofando. Rio de Janeiro: Moderna, 2010.

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21 Raciocínio Lógico - Unidade 3

coTRiM, g. Fundamentos da filosofia. são Paulo: saraiva, 1989.

dicionÁRio de Filosofia. sobre as definições de conceito. disponível em: <http://www.terravista.pt/ancora/2254/lexc.htm>. Acesso em: 12 abr. 2011.

dicionÁRioWeB. definir. disponível em: <http://www.dicionarioweb.com.br/definir.html>. Acesso em: 20 abr. 2011.

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