a discussão histórica da informalidade: significados e...
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INSTITUTO UNIVERSITÁRIO DE PESQUISAS DO RIO DE JANEIRO
MARCIA COELHO DE SEGADAS VIANNA
A Discussão Histórica da Informalidade:
Significados e Formas de Representação
Rio de Janeiro 2006
MARCIA COELHO DE SEGADAS VIANNA
A Discussão Histórica da Informalidade:
Significados e Formas de Representação
Tese apresentada ao Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro como requisito parcial para a obtenção do grau de Doutor em Ciências Humanas: Sociologia
Rio de Janeiro 2006
DEDICATÓRIA
“Há quem diga que todas
as noites são de sonhos.
Mas há também quem garanta
que nem todas,
só as de verão.
No fundo, isso não tem importância.
O que interessa mesmo não é
a noite em si, são os sonhos.
Sonhos que o homem sonha sempre,
em todos os lugares,
em todas as épocas do ano,
dormindo ou acordado”.
Shakespeare
Sonhos de uma noite de verão
Ao meu pai, Manoel (in memoriam), e à minha mãe, Thereza, por terem
sempre me estimulado a cursar o Doutorado.
Ao José, por me apoiar e partilhar comigo esta realização de estudo,
importante para a minha vida e para o meu aprimoramento profissional.
AGRADECIMENTOS
De início, quero manifestar o meu agradecimento a todas as pessoas que me
auxiliaram, não só na área do conhecimento técnico, mas também com a compreensão e
o carinho tão necessários nesta etapa importante da minha vida.
De forma especial, à minha orientadora, Maria Celi Scalon, por ter inicialmente
me aceito como sua orientanda, permitindo a minha inscrição no IUPERJ, em função do
aval dado ao meu projeto, e a possibilidade de concorrer a uma vaga nesta Instituição,
sonho sempre acalentado e julgado por mim como improvável, até então. Reitero o meu
reconhecimento à Celi, pela percepção fornecida através de seu “olhar”, sempre com
uma leitura crítica e atenta, de questões muitas vezes por mim julgadas como claras e
definitivas.
A todos os professores do IUPERJ, que tive a oportunidade de conhecer e de
quem pude obter contribuições e críticas, permitindo o meu conhecimento e
aprimoramento na Sociologia, que, embora não seja a minha área de formação
profissional, com certeza, o é de coração, pela afinidade com seu objeto de estudo.
Aos professores que participaram da defesa do projeto de tese, Luiz Antônio
Machado da Silva (IUPERJ) e Jane Souto de Oliveira (FUNDAÇÃO IBGE), que,
contribuindo com as suas sugestões e críticas, permitiram a minha reflexão sobre o tema
da tese, liberando-os, é claro, do meu livre arbítrio de muitas vezes decidir sobre os
caminhos adotados em sua realização.
De novo, ao professor Luiz Antônio Machado da Silva, pelas aulas
enriquecedoras, além de agradáveis, e por muito ter me ajudado com a sua experiência
no tema em pauta, sempre me alertando, nas disciplinas ministradas, para os pontos
importantes no desenvolvimento do problema de investigação por mim considerado.
Aos professores Maria Alice Rezende de Carvalho e Nelson do Valle Silva, que
em muito contribuíram para a reflexão dos capítulos da tese, com seus comentários e
críticas, no curso das disciplinas referentes aos seminários de tese cursados.
A todos os funcionários do IUPERJ, que são decididamente atentos, eficientes e
carinhosos com o conjunto dos alunos e que tornam esta Casa mais agradável. Sem
poder enumerar todos com os quais tenha tido contato, gostaria de citar aqueles com
quem tive uma maior proximidade, sendo sempre gentis e eficazes em sua tarefa de nos
auxiliar, quais sejam, Valéria de Souza (que, embora não esteja mais trabalhando no
IUPERJ, está sempre presente em nosso coração) e Lia Gonzalez, da Secretaria da Pós-
Graduação.
À Sebastiana Rodrigues de Brito e à Zuleica Lopes Cavalcanti de Oliveira, por
muito ter aprendido com a sua convivência, em termos pessoais e profissionais, e pelo
veemente incentivo à realização do curso de Doutorado.
À Fundação IBGE, pela concessão da licença em tempo parcial; e à
Coordenação de Emprego e Rendimento, então ocupada por Ângela Filgueiras Jorge,
pelo reconhecimento da importância da realização do curso, quando da solicitação do
meu afastamento, e à gerente do Grupo de Estudos e Análises, Marília Biangolino
Chaves, pela compreensão recebida, sobretudo durante a preparação da tese.
À Biblioteca Setorial da Unidade Chile da Fundação IBGE, por ter atendido
sempre com presteza, eficiência e empenho às solicitações por mim efetuadas,
permitindo a obtenção, com agilidade, de estudos necessários à realização da tese. A
equipe da referida Biblioteca tem conseguindo feitos “heróicos”, mesmo enfrentando
dificuldades com a interrupção do serviço de empréstimo entre bibliotecas, realizado
através do “moto-boy”, tão importante para o enriquecimento das solicitações dos
pesquisadores desta Instituição. Em função deste fato, viu-se obrigada a criar outras
soluções, para manter, com desvelo, este tipo de atendimento. A toda a sua equipe,
constituída por Odicéa Arantes Matos, Deyse Ferreira Alves, Isa Ribeiro Soares de
Souza, Heloísa Helena Ribeiro Guedes e José Rosa dos Santos, agradeço, esperando que
esta Biblioteca seja não só preservada como reconhecida em importância com um
desejado, esperado e necessário aprimoramento de sua tecnologia e acervo bibliográfico
disponível. À Odicéa agradeço, ainda, a revisão e a correção minuciosas das referências
bibliográficas da tese.
Ao Arquivo Técnico da Coordenação de Emprego e Rendimento (COREN) da
Fundação IBGE, representados por Luiz Carlos Ferrer Cardoso e Rodrigo Mariano
Brito, o empréstimo e a preservação das pesquisas de trabalho e rendimento, tais como
os referentes à Revisão da PNAD, da década de 1990, bem como de questionários e
manuais da PNAD desde a sua criação.
À Vandeli dos Santos Guerra, da Fundação IBGE, que, com carinho, gentileza e
eficiência, me atendeu nos esclarecimentos das PNADs, sobretudo as anteriores à
década de 1990, sendo ela um ícone fundamental na memória desta pesquisa.
Ao Antônio de Ponte Jardim que, além de me apoiar na realização do curso de
Doutorado, procurou me auxiliar no decorrer da realização da tese não só com indicação
de bibliografia, bem como em caminhos importantes a adotar no decorrer desta.
À Lucília de Fátima Rocha Valadão, sempre muito presente, me estimulando na
realização do Doutorado e que, à época da defesa do projeto de tese, muito me auxiliou
com a sua experiência no tema.
À Maria Cristina Moreira Safadi que sempre me apoiou e a quem recorria nos
momentos de aperfeiçoamento da redação da tese, em função da extrema facilidade e
clareza presentes nos textos por ela redigidos.
Ao Miguel Farah Neto, pela atenção e gentileza na colaboração expressiva da
revisão da tese.
À Iêda Siqueira, pelo auxílio nas dúvidas de tradução dos textos em francês.
À Sandra Helena de Souza Barros, pela presteza e eficiência nos trâmites
administrativos na renovação da licença parcial de Doutorado.
A todos os demais amigos e colegas de trabalho que me apoiaram na realização
do curso de Doutorado.
À Dra Tereza Neuman Alvear, por me estimular nesta fase importante,
equilibrando a todo o momento o sentido de atingir a plenitude, lembrando-me de que,
como a perfeição não existe e um trabalho nunca é completo, realizamos o que é
“possível”.
Às minhas amigas Monteiro de Barros (Clara, Maria das Graças e Marília) e
minha prima Regina, que são irmãs de coração, pelo constante carinho e estímulo nesta
etapa e em minha vida.
À minha família, agradeço pelo incentivo recebido durante a elaboração da tese
e ao longo da minha vida profissional, em especial aos meus irmãos, Claudia, Manoel e
Teresa, e aos meus cunhados, Ana Vitória e Marco Aurélio.
À minha mãe, Thereza, e ao meu pai, Manoel (in memoriam), eternos
estimuladores deste curso e do meu estudo, obrigada pela educação, carinho e
oportunidades em minha vida.
À querida Madame Suzana Célia Guthman Mesquita (in memoriam), com quem
tive aulas particulares de francês. A ela devo muita gratidão, respeito e admiração, pois
me forneceu exemplos, em função de sua longa vida (105 anos de idade), demonstrando
a importância de estar atualizada, por meio do trabalho e das amizades, que eram
inúmeras.
Ao José Rosa dos Santos, com quem tenho compartilhado os momentos da
minha vida, por estar sempre ao meu lado, me apoiando na realização dos meus sonhos.
Reconheço a calma e a paciência para me estimular e auxiliar nas inquietações e
angústias vividas durante o curso, sobretudo na fase de elaboração da tese. A ele, o meu
carinho.
RESUMO
O objetivo desta tese é a análise da metodologia da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (PNAD), sobre a investigação do problema da informalidade,
impondo o desafio de interligar as concepções teóricas deste fenômeno às
representações concretas realizadas.
As dificuldades de absorção da mão-de-obra no mercado de trabalho e o
afastamento do paradigma de emprego capitalista tornam hoje, de suma importância, a
discussão da informalidade nos estudos referentes à inserção dos grupos de
trabalhadores no mercado de trabalho.
A tendência crescente da informalidade e as novas questões revelam a utilização
do conceito, como o de empregabilidade / empreendedorismo, em função dos novos
significados da informalidade face às transformações no mundo do trabalho, provocadas
pela globalização do capital
As estatísticas da PNAD utilizadas são as da década de 1990, comparadas às das
décadas anteriores. A avaliação da pesquisa tem cunho teórico-analítico, tendo em vista
a necessidade de as opções metodológicas adotadas na produção de dados sobre a
realidade brasileira estarem em sintonia com suas especificidades, de forma a
contribuírem para o seu desvelamento.
A partir desta análise, tornou-se clara a importância de uma reflexão sobre as
evidências empíricas oficiais do país no que concerne às novas questões sobre o tema de
investigação.
Palavras-chave: trabalho informal, empregabilidade e PNAD.
SUMÁRIO Pg.
INTRODUÇÃO 1
CAPÍTULO I: ORIGEM DO DEBATE DA QUESTÃO DA INFORMALIDADE 10
1. O estudo sobre as atividades informais em Gana 15
2. O Informe do Quênia: um estudo de evidência do informal e
contrapontos apresentados 18
3. Evidência da informalidade na década de 1970 no Brasil: mercado de
trabalho metropolitano manual e marginalidade 26
4. Considerações sobre a origem do debate da informalidade 36
CAPÍTULO II: CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA INFORMALIDADE 38
Considerações sobre as perspectivas teóricas da informalidade e sua
representação ao longo do tempo 69
CAPÍTULO III: NOVOS SIGNIFICADOS DA INFORMALIDADE OU
RECONSTRUÇÃO DE UM TEMA HISTÓRICO? 72
Considerações sobre os significados da informalidade 100
CAPÍTULO IV: A INVESTIGAÇÃO DA INFORMALIDADE: A ANÁLISE
DA PRODUÇÃO DE EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS 104
1. A Produção do Questionário: Um Instrumento de Análise 106
1.1 - Processo de Reformulação da Pesquisa: histórico da sua construção 107
1.2 - As inovações da PNAD no tema “Trabalho” e suas contribuições para a
percepção da informalidade 113
1.3 - A busca da captação de uma produção de evidência empírica mais
adequada da informalidade na estrutura da PNAD 124
1.3.1 - Relevância do quesito Posição na Ocupação na apreensão da
informalidade 135
1.3.2 - Relevância do quesito Local de Trabalho na apreensão da informalidade 143
1.3.3 - Relevância do quesito Tamanho do Empreendimento na apreensão da
informalidade 147
1. 4 - Considerações sobre a atualidade da investigação da informalidade na
PNAD da década de 1990 150
CONSIDERAÇÕES FINAIS 153
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 165
ANEXOS
ANEXO I - POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO E RAMOS DE ATIVIDADE 172
ANEXO II - ESTRUTURA DO QUESTIONÁRIO DA PNAD 178
ANEXO III - JUSTIFICATIVAS DAS VARIÁVEIS DA PNAD 188
QUADROS
Quadro I - Estudos sobre o Setor Informal Urbano na América Latina 56
Quadro II - Variáveis: Posição na Ocupação, Local de Trabalho e Tamanho do
Empreendimento, importantes para a captação da produção de evidências empíricas
sobre a informalidade na PNAD 130
1
INTRODUÇÃO
A configuração de uma nova ordem político-econômica internacional, a
reestruturação produtiva e as inovações tecnológicas em curso desde meados dos anos
1970 traduziram-se, em termos das relações e processos de trabalho, em significativas
mudanças no paradigma do emprego.
É justamente este ponto que confere à discussão da informalidade acentuada
importância no cenário atual dos estudos que focalizam a inserção dos grupos de
trabalhadores no mercado de trabalho.
Assiste-se hoje a um intenso debate que aponta para um grande contingente de
trabalhadores engajado na denominada informalidade. Acrescente-se a este fato o
reconhecimento que atualmente existe, qual seja, o de que os campos formal e informal
não são dissociados, mas se encontram estreitamente interligados. As questões hoje
discutidas mostram que a citada informalidade é objeto de estudo importante na
Sociologia, como também na Economia e no Direito e, muitas vezes, necessita do inter-
relacionamento destas ciências, entre outras, na busca de uma compreensão mais
adequada de sua complexidade.
Este tema tem sido alvo de vários estudos, desde final dos anos 1960, mas a sua
investigação continua sendo relevante e instigante, não só pela dimensão crescente da
absorção de um conjunto de população ativa na denominada informalidade como
também pela sua continuidade, independente da conjuntura econômica do país.
A dinâmica observada para o fenômeno tem levado ao questionamento de
pressupostos anteriormente formulados, como o que relaciona o seu crescimento
associado, sobretudo, aos períodos de crise econômica, quando haveria a expulsão de
determinados segmentos da população do mercado denominado formal. A tendência de
contínuo crescimento da informalidade não só contraria esta hipótese como indica a
necessidade de se repensar as teorias existentes a este respeito e pesquisar os novos
rumos adquiridos por este fenômeno.
Em linhas gerais, na década de 1980, a idéia que prevalecia, a respeito do
conceito de informalidade, era a de que este setor seria formado como resultado da
exclusão de um determinado contingente da população do mercado de trabalho formal.
Neste caso, a dinâmica do processo informal de trabalho esteve sempre associada àquela
do mercado de trabalho capitalista que, em momentos de crise econômica, expulsava
2
uma parcela da população das relações de trabalho denominadas formais. A partir deste
processo, este segmento da força de trabalho foi visto como marginalmente inserido na
economia capitalista, bem como no processo de integração social.
Na década de 1990, tem-se ainda o fato de que o informal demonstrou estar
crescendo mesmo em períodos de crescimento econômico, evidenciando que outros
fatores devem ser buscados como explicativos para este fenômeno. Hoje, assiste-se a
um aumento das denominadas relações de trabalho parcial, por tempo determinado, sub-
contratadas ou terceirizadas, que nem sempre - mas muitas vezes - significam perdas de
direitos dos trabalhadores em relação às garantias legais e de cobertura social.
Em função de novos dispositivos capitalistas, existe atualmente uma ameaça da
dimensão securitária, que constitui a identidade social das formas capitalistas de
acumulação. Há uma permanente tensão para o trabalhador referente à expectativa de
segurança que espera obter associada ao desejo de autonomia.
Em um mundo macro-econômico, idealmente constituído por uma sociedade de
pleno emprego, a expectativa era, dentro de uma perspectiva de progresso, de um futuro
mais adequado para os trabalhadores e suas famílias, tendo em vista que, através do
reconhecimento público das desigualdades sociais, estas poderiam ser dirimidas por
meio do acesso ao sistema escolar, que possibilitaria uma ascensão social igualitária.
Houve um movimento que mostrou, no entanto, uma direção contrária entre o
desenvolvimento do capitalismo e o da sociedade, na medida em que esta última foi
afetada por um quadro desfavorável, que se manifestou por meio do empobrecimento da
população, do crescimento do desemprego e da precariedade do trabalho, com aumento
de mão-de-obra com contratos temporários e horários flexíveis e diminuição de custos
despendidos com a proteção social, entre outros fatores.
De um lado, as mudanças ocorridas tanto na vida econômica quanto na vida
privada fazem com que o mundo familiar pareça, cada vez menos, capaz de funcionar
como um espaço de proteção, tornando-se mais difícil aos pais assegurar aos filhos
posições equivalentes às suas por meio da educação, instância que teve papel importante
nesta reprodução, na década de 1960. Por outro lado, existem esquemas ideológicos que
estão sendo mobilizados para justificar as transformações no âmbito familiar e na
adaptabilidade nas relações de trabalho.
Lautier (1991, p.49) destaca que o debate sobre o denominado ‘setor informal’
tem, talvez, escondido o essencial, qual seja, o fim do sonho, do mito, e da possibilidade
3
mesmo de generalizar que o modelo de cidadania, que há quarenta anos surgia como se
estivesse ao alcance de todos, reservava-se tão somente aos assalariados das empresas
importantes. Desde o início dos anos 1980, não somente houve redução do emprego nas
grandes empresas, como também da parte estatutária destas. O autor aponta que este
fato fez com que, tanto em nível ideológico quanto político, estivessem reunidos não só
os assalariados “precários” das grandes empresas e dos que os sub-contratam, como
também os assalariados de micro-empresas, os autônomos sem garantia de continuidade
em sua atividade e os desempregados. “A assistência social não tem mais capacidade
econômica, nem a capacidade política (já que ela é voltada em direção aos ‘excluídos’,
enquanto que neste caso se trata de assalariados de firmas grandes ou médias) de
reintegrar no modelo de socialização que veicula estes assalariados, que são ao mesmo
tempo dentro e fora das normas”.
Oliveira (1990b, p.42) enfatiza que as várias formas de organização de produção
de situações de trabalho percebidas na informalidade revelam um denominador comum,
qual seja, “o de não se enquadrarem nos moldes de produção capitalista, quer por razões
de ordem econômica, propriamente dita, quer jurídica. Ou seja, o que aglutina essas
atividades em torno de um mesmo conceito não é a proximidade que guardam entre si,
mas o afastamento que todas mantêm do modelo de organização capitalista. Em termos
das relações de trabalho, isso se traduz, basicamente, pela não correspondência ao
‘modelo de emprego total’ que, tendo nascido com a grande indústria, se desenvolveu
pari passu à ação sindical e à legislação do trabalho”.
O interesse pela economia informal, conforme destaca Oliveira (1990a, p.16),
“transcendeu os circuitos acadêmicos para se inscrever nos debates ligados à esfera de
planejamento e execução das políticas econômicas nacionais”. A autora segue
ressaltando que “daí parece ter resultado a preocupação, crescente e generalizada, com
os sistemas de informação estatística: em que medida estariam eles aptos a captar as
mudanças que vêm se processando na base produtiva e na configuração dos mercados
de trabalho?”.
A diversidade existente na conceituação da informalidade e as dificuldades de se
obter um consenso a este respeito já vem sendo apontadas, ao longo do tempo. Um
primeiro aspecto importante deste estudo torna-se, mais do que verificar a diversidade
existente na conceituação do informal, desvendar os novos significados, as
categorizações e as articulações que estão presentes no debate sobre o tema, tendo
4
sempre presentes as transformações provocadas no mundo do trabalho pela globalização
do capital.
Como um segundo aspecto importante, subsidiando o problema central da
conceituação do informal, pretende-se observar como as estatísticas oficiais do país, que
vêm sendo muito utilizadas nos estudos que visam à captação deste fenômeno,
particularizam e determinam o objeto de análise.
Em relação à captação do tema informal, no referido campo das informações
estatísticas, são estabelecidos desafios constantes, tendo em vista que estas tomam como
referência, de um modo geral, o modelo de emprego tipicamente capitalista. A inserção
da população no campo do informal aparece como oposição, ou por assim dizer, como
contraponto. Mas, como já observamos, no mundo atual está se processando um
afastamento do modelo de emprego, que se constitui no parâmetro, em geral, utilizado.
Neste sentido, devem ser estabelecidas novas medidas para que possamos nos
aproximar, cada vez mais, de uma adequada produção empírica a este respeito, por
intermédio dos instrumentos utilizados para esta finalidade.
Como dispositivo político-econômico de representação do fenômeno, as
estatísticas oficiais sobre trabalho produzidas em uma pesquisa abrangem, de um lado,
os aspectos gerais do mesmo, buscando aliá-los às recomendações internacionais, tendo
em vista a sua comparabilidade com os diversos países. Por outro lado, em sua
finalidade, são necessários ajustes para fornecer um quadro de evidências empíricas,
satisfatório ou não, embora parcial, sobre a realidade nacional.
A mensuração da informalidade não é uma tarefa fácil, por várias razões. Entre
elas, encontram-se não só a sua composição bastante heterogênea, os limites entre
trabalho e não-trabalho, difíceis de serem delimitados, e um leque de situações que
estão no limite entre o formal e o informal, como também a qualidade dos instrumentos
utilizados nesta produção.
Ao longo do desenvolvimento do objeto de análise, qual seja, o problema de
investigação da informalidade, serão apresentados diferentes enfoques adotados em seu
estudo, que se refletem, em termos concretos, nas variáveis utilizadas para compor as
evidências empíricas a este respeito. Nesse sentido, entende-se como importante buscar
a associação do sentido lógico-formal às tentativas de caracterização desta questão, que
é vista, dentre as fontes de dados existentes, através das estatísticas oficiais do país.
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O desafio que se estabelece, em um campo que nos parece pouco explorado, é a
tentativa de interligar os novos significados, as categorizações e as articulações no
debate da informalidade - tendo sempre presentes as transformações provocadas no
mundo do trabalho pela globalização do capital - às categorias de análise até então
adotadas, contidas nas fontes de informações estatísticas.
A produção de evidência empírica, eleita como base de avaliação para o alcance
dos objetivos citados, é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD),
desenvolvida na Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Fundação
IBGE). A escolha da avaliação da qualidade desta pesquisa, pretendendo ser de cunho
teórico-analítico, reside no fato de que esta se constitui como uma das fontes estatísticas
oficiais do país mais utilizadas por estudiosos na área social, em função de sua
abrangência geográfica e temática, além de sua periodicidade anual. Destaca-se também
a relevância deste tema para a comunidade acadêmica, bem como para os formuladores
de políticas publicas na área do trabalho.
A proposta de estudo da informalidade, com base na PNAD, uma importante
fonte de dados para as Ciências Sociais, sobretudo no tema trabalho, nos parece ser
oportuna em razão da mudança do paradigma produtivo que provocou profundas
transformações no mundo do trabalho.
Pressupõe-se que, em fontes de informações estatísticas oficiais como a PNAD,
ainda permaneçam resquícios da herança de padrões estabelecidos em outros países,
com formações sociais distintas de nossa sociedade, os quais estabelecem, como modelo
vigente, a inserção da população no trabalho assalariado.
Aliado ao fato de nossa experiência histórica, diferenciada da vivida por outros
países mais desenvolvidos economicamente, incorporar um padrão de referência que
não correspondia à realidade observada, acresce-se o de que esta é hoje também atingida
por mudanças, que estão provocando, cada vez mais, a diminuição da inserção da
população no referido modelo de emprego.
Atualmente, são anunciadas novas questões sobre o trabalho, que mostram as
dificuldades crescentes de absorção de mão-de-obra, em função das complexas
transformações ocorridas no mercado de trabalho, provocadas pela globalização do
capital. Tal fato nos leva a repensar a adequação destas estatísticas ao problema de
investigação considerado, qual seja, o da informalidade, pois, embora as referidas
questões não sejam determinantes do mesmo, o acentuam e fazem surgir novas
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demandas ao trabalhador para a sua inserção no referido mercado. Acrescente-se que
não se pode perceber o problema da informalidade dissociado do denominado campo
formal de trabalho.
A hipótese central desta tese aponta que as profundas mudanças no mundo do
trabalho afetam cada vez mais a absorção da mão-de-obra, acrescendo a estas o ritmo no
qual estas estão sendo processadas. Tal fato traz obstáculos nas evidências empíricas
geradas das estatísticas oficiais, como a PNAD, destinadas ao entendimento do
crescimento/dinâmica da informalidade.
Tendo em vista os aspectos anteriormente discutidos, o problema, desenvolvido
nesta tese relaciona-se a investigar: em que medida as novas questões postas na
discussão pública, sobre as dificuldades de absorção do trabalho, podem ser abordadas
com base nas classificações oficiais nacionais, que buscam se adequar aos parâmetros
indicados nas recomendações internacionais? Uma vez detectada a existência destas, ao
se observar as mudanças ocorridas nas relações de trabalho na sociedade contemporânea
e suas conseqüências para o trabalhador, é necessário analisar a sua representação e/ou
viabilidade através de estatísticas oficiais, como a PNAD.
Reconhece-se que descobertas importantes podem surgir da análise e
interpretação dos motivos ou das justificativas, explicitados ou subjacentes,
apresentados nas mudanças de variáveis nas estatísticas oficiais. Nesse sentido, aquelas
que são consideradas, em geral, essenciais na definição da informalidade, bem como as
justificativas apresentadas por estarem inseridas nesta pesquisa, constituem caminhos
fundamentais nesta comprovação.
Nas estatísticas oficiais, é preciso verificar que tipo de categoria estaria
representando o funcionamento do conceito e retratando o desenvolvimento da
conjuntura, estando permeadas, nesta discussão, as classificações adotadas. Esta tarefa
torna-se crucial, pois, por um lado, a construção destas classificações pode não estar
abrangendo as situações limiares que são estabelecidas ao se tentar delinear o campo do
informal; por outro lado, a seleção de indicadores deve ser capaz de operacionalizar o
conceito.
Têm sido apontadas como variáveis indicadas para o estudo das novas
tendências do informal, entre outras, aquelas relacionadas às mudanças no mercado de
trabalho, provocadas pelas alterações qualitativas da demanda por força de trabalho,
pela tendência de queda do emprego industrial e pelas formas de terceirização. As
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transformações no processo de trabalho e no gerenciamento da força de trabalho
parecem ter como conseqüências, entre outras, um aumento do trabalho domiciliar,
daquele exercido em tempo parcial e da terceirização.
A pesquisa básica utilizada como base é a PNAD da década de 1990, em função
da ampla revisão realizada neste período, que visa captar a diversidade das relações de
trabalho no país, gerando um amplo e diferenciado leque de variáveis, constantes do
questionário, para o alcance deste objetivo. Além do mais, as questões discutidas, a
partir dos anos 1990, têm um cenário diverso do que prevalecia em períodos de tempo
anteriores, sendo importante observar este tema em suas mudanças de conteúdo. A
produção das estatísticas da PNAD até a década de 1980 será utilizada
comparativamente, quando for o caso, para destacar os possíveis avanços apontados em
relação à questão investigada.
A estruturação dos caminhos adotados para o alcance dos objetivos
estabelecidos culminou no desenvolvimento de quatro capítulos: 1) Origem do Debate
da Questão da Informalidade; 2) Construção Histórica da Informalidade; 3) Novos
Significados da Informalidade ou Reconstrução de um Tema Histórico?; 4) A
Investigação da Informalidade: a Análise da Produção de Evidências Empíricas.
No primeiro destes, pretende-se destacar os estudos que detêm a primazia em
sua abordagem, realizados na década de 1970. O debate apresentado não esgota as
questões existentes, em seus primórdios, sobre o tema da informalidade. Foram
abordados alguns trabalhos pioneiros, tidos como precursores a este respeito.
O objetivo é verificar como era analisada esta questão, entendendo-se que traços,
em sua origem, podem ser comuns na atualidade, perpassando diversos períodos
analisados, além daqueles que se reportam especificamente a realidades diferenciadas
no tempo. Os valores e representações, recebidos de nossa herança cultural, estão
presentes, sendo também agregados na passagem e/ou transformação de novas formas
capitalistas de acumulação.
No segundo capítulo, ao se discutir historicamente a informalidade, tem-se como
propósito não só apresentar uma análise estruturada que vem sendo realizada ao longo
do tempo como também apontar as questões fundamentais sobre este tema. As
perspectivas teóricas que têm sido historicamente adotadas mostram-se como ponto
relevante para o entendimento dos rumos deste fenômeno. Procurar-se-á associá-las às
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representações concretas que são realizadas, pois estas constituem, em nosso caso
específico, um importante objeto de análise.
O propósito é o estudo desta questão em cada período, à luz de vários autores,
destacando-a sob diferentes enfoques, metodologias de análise, variáveis utilizadas e
controvérsias correntes. Ao longo do tempo, a percepção da informalidade vem sendo
apreendida por meio de perspectivas teóricas distintas, que resultam em uma variedade
de estudos, com objetivos diferenciados.
É preciso destacar que o termo “informal” é mencionado, nesta parte, sob várias
denominações - setor informal, mercado não formalizado, setor não estruturado, entre
outras -, de acordo com a nomenclatura atribuída pelos autores que o analisam. Esta, por
sua vez, está relacionada, muitas vezes, às percepções diferentes que são atribuídas a
este fenômeno no tempo.
No terceiro capítulo, é percebido que, a partir dos anos 1980, em função de
mudanças mundiais, entre outras, relacionadas às dificuldades de absorção da força de
trabalho, que se refletem em nosso país, provocando, cada vez mais, um afastamento do
modelo de pleno emprego. A noção de informalidade, sempre percebida como um
contraponto a este padrão estabelecido, adquire novos significados, que, por vezes, são
agregados na compreensão de seu conteúdo, ao mesmo tempo em que pode demonstrar
a manutenção de antigas questões nesta discussão ou mesmo uma mescla de ambas as
situações.
A finalidade de reunir os citados significados é verificar, posteriormente,
sobretudo diante das novas questões postas na discussão pública sobre a absorção dos
diversos segmentos de trabalhadores, a adequação atual e a possibilidade das estatísticas
oficiais, como a PNAD, na captação do problema de investigação considerado.
No quarto capítulo, entende-se como importante buscar a associação do sentido
lógico-formal às tentativas de caracterização da informalidade, que pode ser vista,
dentre as fontes estatísticas oficiais do país, na PNAD. Foram apresentados, até então,
diferentes enfoques adotados em seu estudo, que se refletem, em termos concretos, nas
evidências empíricas utilizadas para a consecução deste objetivo.
É importante se apreender como é construída a captação deste problema de
investigação da informalidade, na referida fonte de dados, constituindo-se em matéria
fundamental nesta comprovação, tanto as variáveis como os motivos de estarem
inseridas nesta pesquisa.
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A PNAD da década de 1990 será confrontada, por vezes, com às das décadas
anteriores, sobretudo em termos conceituais, com o intuito de se comprovar não só o
avanço qualitativo realizado na abordagem deste tema, como também - quando este fato
ocorrer - a sua atualidade ou a necessidade de fazê-lo, face às novas questões referentes
à absorção dos trabalhadores no mercado de trabalho.
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CAPÍTULO I
ORIGEM DO DEBATE DA QUESTÃO DA INFORMALIDADE
Ao se discutir o debate da informalidade desde a sua origem, tem-se como
propósito não só realizar uma análise estruturada a este respeito ao longo do tempo
como também apontar as questões relevantes sobre o tema. Procurar-se-á associar as
concepções teóricas deste fenômeno às representações concretas realizadas sobre o
mesmo. Em nosso caso específico, foram eleitas as estatísticas oficiais do país, como
um significativo alvo de estudo.
As dificuldades de absorção da mão-de-obra potencialmente produtiva, no
mercado de trabalho, já se constituíam em pontos de partida dos estudos desenvolvidos
no final da década de 1960 e no início dos anos 1970. A falta de uma produção de
evidência empírica capaz de retratar de forma mais adequada o problema da
informalidade está presente nos estudos realizados na origem do debate sobre o tema.
Assim, tal questão nos aproxima do problema a ser desenvolvido nesta tese, que implica
observar em que medida as novas questões postas na discussão pública sobre as
dificuldades de absorção do trabalho podem ser discutidas com base nas classificações
oficiais, nacionais, presentes nas estatísticas oficiais do país, que procuram seguir
recomendações internacionais a este respeito.
As perspectivas teóricas historicamente adotadas constituem um ponto relevante
para o entendimento dos rumos deste fenômeno. Entende-se que devem ocorrer traços
comuns, que podem perpassar diversos períodos analisados, além daqueles que se
reportam especificamente a realidades diferenciadas no tempo. Isto porque não se pode
esquecer que valores e representações, recebidos de nossa herança cultural, estão
presentes e são também agregados na passagem e/ou transformação de novas formas
capitalistas de acumulação. Apesar de a ideologia dominante ser a do capitalismo, o
sentido ou a natureza do fenômeno pode ser alterado, na medida em que o status que lhe
é atribuído tende a se modificar: o que em uma fase é principal, na outra pode ser
secundário.
Este debate não esgota as questões a serem ressaltadas, em seus primórdios,
sobre o tema da informalidade e nem mesmo todos os pontos analisados por seus
11
autores. Foram abordados apenas alguns trabalhos iniciais, publicados no início da
década de 1970, tidos como precursores.
Desde o final dos anos 1960, a questão da informalidade constitui-se em objeto
de preocupação, nos denominados países do Terceiro Mundo, sendo relacionada,
conforme ressalta Oliveira (1990a, p.3), à presença de um significativo excedente de
mão-de-obra e à dimensão da pobreza urbana. A autora observa que “foi exatamente o
reconhecimento da importância que a pequena produção mercantil assumia nas
economias do 3º Mundo, a que se associava uma preocupação crescente com a dimensão
da pobreza, em especial da pobreza urbana, nessas economias, o que, ao longo dos anos
70, levou diversos estudiosos e instituições de pesquisa a se debruçarem mais
detidamente sobre o tema”. Enfatiza ainda que, tal investigação, ”afora cunhar o termo“ 1, concretizou um amplo debate do “setor informal”, “através do qual diversas correntes
de pensamento procuravam explicitar seus mecanismos de organização e funcionamento
e marcar as diferenças com o ‘setor formal’” (OLIVEIRA, 1990a, p.3).
Oliveira salienta que, em torno deste debate, estabeleceu-se uma revisão crítica
que procurou contemplar a negação do caráter “dual” entre os setores formal e informal,
segundo o qual estes eram vistos como estanques, sem apresentar interligação entre si,
estabelecendo-se a existência de uma articulação entre ambos, em diferentes graus, mas
subordinando-se o segundo ao primeiro. Um outro ponto central constituiu-se na
verificação de que este setor informal apresentava uma acentuada heterogeneidade, no
sentido de que absorvia diferentes formas de produção, bem como de trabalhadores.
O setor informal passou a ser visto como um conjunto de formas de produção
não-capitalistas, ocupando um espaço intersticial econômico, determinado pela
expansão do capital, ainda não preenchido ou abandonado pela produção capitalista. Ao
mencionar o caso da centralização dos capitais ou da atração do capital pelo capital,
Marx (1990, p.727) já destacava que “os capitais grandes esmagam os pequenos.
Demais, lembramos que, com o desenvolvimento do modo de produção capitalista,
1 A este respeito, reproduzo a nota 3, constante no trabalho de OLIVEIRA, Jane Souto de – O Espaço Econômico das Pequenas Unidades Produtivas: uma tentativa de delimitação. Rio de Janeiro: IBGE, Diretoria de Pesquisas, fevereiro de 1990. 67 p. (Textos para discussão, n.27): “é comum atribuir-se a Keith Hart, o emprego, pela primeira vez do termo ‘setor informal’ no artigo ‘Informal Income opportunities and urban employement in Ghana’, apresentado na Universidade de Sussex, em setembro de 1971 e reproduzido no Jounal of Modern African Studies em março de 1973. Contudo, a distinção estabelecida por Machado da Silva (1971) entre os ‘mercados formal e não formalizado’, em sua tese de mestrado Mercados Metropolitanos de Trabalho Manual e Marginalidade deveria, a rigor, garantir-lhe a precedência, o que provavelmente deixou de ser feito, em função da circulação mais restrita de seu trabalho”. págs. 49-50.
12
aumenta a dimensão mínima do capital individual exigido para levar avante um negócio
em condições normais. Os capitais pequenos lançam-se assim nos ramos de produção de
que a indústria se apossou apenas de maneira esporádica ou incompleta. A concorrência
acirra-se então na razão direta do número e na inversa da magnitude dos capitais que se
rivalizam. E acaba sempre com a derrota de muitos capitalistas pequenos, cujos capitais
ou soçobram ou se transferem para as mãos do vencedor”.
Marx (1990) apontava ainda que, em um momento histórico, é possível a
convivência de ambos os processos de produção simples de mercadorias e de produção
de capital. Neste sentido, uma determinada estrutura produtiva pode refletir um
processo, aparentemente contraditório, não só de concentração e centralização do
capital, como de existência de outras formas que são denominadas de não-capitalistas.
Existe um movimento do capital, segundo o autor, que age ao mesmo tempo dos dois
lados. “Se sua acumulação aumenta a procura de trabalho, aumenta também a oferta de
trabalhadores, ‘liberando-os’, ao mesmo tempo que a pressão dos desempregados
compele os empregados a fornecerem mais trabalho, tornando até certo ponto
independente a obtenção, a oferta de trabalho da oferta de trabalhadores” (p.742).
A estruturação de um mercado de trabalho é continuamente afetada em sua
configuração a partir desse movimento de atração e de repulsão da força de trabalho. Há
a questão da formação de uma população trabalhadora excedente, que se constitui em
um exército industrial de reserva disponível e que, se esta “é produto necessário da
acumulação ou do desenvolvimento da riqueza no sistema capitalista, ela se torna por
sua vez a alavanca da acumulação capitalista, e mesmo condição de existência do modo
de produção capitalista” (MARX, 1990, p.733).
Um ponto interessante é o de que o autor, que viveu no século XIX, já
destacava, ao mencionar o caso da centralização dos capitais ou da atração do capital
pelo capital, a concorrência existente com os capitais grandes esmagando os pequenos,
ao mesmo tempo em que apontava ser possível, em um dado momento histórico, a
convivência de ambos os processos de produção simples de mercadorias e de produção
de capital. Tal fato demonstra que uma determinada estrutura produtiva pode refletir um
processo, aparentemente contraditório, não só de concentração e centralização do capital
como de existência de outras formas, que são denominadas de não-capitalistas.
Em um momento atual, se, por um lado, continuamos a viver a concorrência dos
grandes capitais que esmagam os pequenos, por outro, assistimos ao fato de que, de
13
certa forma, esses ainda subsistem, seja em articulação com os grandes, muitas vezes
por meio de novas práticas, como a subcontratação de determinados serviços das
pequenas unidades produtivas pelas grandes, seja nos mostrando a necessidade de
pesquisar a abertura ainda existente, atualmente, para as atividades autônomas. Estas
podem estar sendo estabelecidas em função da configuração de uma nova ordem
político-econômica internacional, da reestruturação produtiva e de inovações
tecnológicas que, em curso desde os anos 1970, se traduziram, em termos das relações e
dos processos de trabalho, em significativas mudanças do paradigma do emprego.
Melo e Telles (2000, p. 6) destacam que “o debate sobre a questão da
informalidade iniciou-se na literatura das ciências sociais na década de 70, com o
programa de pesquisa da OIT. Este se desenvolveu com o estudo sobre o Quênia
[(1972)] e, na América Latina, com o trabalho sobre o emprego na República
Dominicana [OIT (1973)], prosseguindo com os trabalhos do Programa Regional del
Empleo para América Latina y el Caribe (Prealc) que, a partir de meados dos anos 70,
dedicou-se ao estudo da questão [ver Prealc (1974)]”. A missão de emprego da OIT
(Organização Internacional do Trabalho) marcou, pela primeira vez, o surgimento do
termo setor informal em um documento oficial.
É preciso enfatizar que o termo “informal” é aqui mencionado sob várias
denominações (setor informal, mercado não-formalizado, setor não-estruturado), pois
não se pretende, neste momento, modificar a nomenclatura atribuída pelos autores que o
analisam, a qual se relaciona, freqüentemente, às percepções diferentes deste fenômeno
no tempo. O conceito do informal, como ressalta Cacciamali (1999, p.1), tem sido
objeto de análise diferenciada e alvo de muitos debates. A percepção da informalidade
pode ser apreendida, desta maneira, por meio de marcos teóricos distintos que, com
objetivos diferenciados, podem levar a objetos múltiplos de estudo.
Em relação à noção de informalidade, Silva (2002, nota 1, p.81) ressalta que,
apesar deste estudo da OIT ter tornado esta noção canônica e muito difundida, “Peattie
(1987:853), entre outros, atribui a criação a Keith Hart, que a gerou durante suas
pesquisas em Gana (cfr. também Miras, 1991). Creio, porém, que a noção se desenvolve
ao mesmo tempo na América Latina e desde o início esteve, em ambos os continentes,
ligada ao reconhecimento das restrições de capital no processo de mobilização
produtiva do trabalho e suas conseqüências. Eu próprio, em longa pesquisa concluída no
início de 1971, falava de ‘mercado formalizado’ e ‘mercado não formalizado’ com um
14
sentido próximo ao produzido a partir dos estudos de países africanos (Machado da
Silva, 1971)”.
Silva (1971), já destacava o surgimento deste setor, através da análise de
“mercado formalizado” e “mercado não-formalizado”, abordando, na época, um tema
de presença constante no pensamento sociológico latino-americano, qual seja, a
marginalidade ou o processo de marginalização. A partir deste, o modo de inserção dos
trabalhadores envolvidos no sistema global era visto segundo as condições do mercado
de trabalho. Aqueles trabalhadores que não conseguiam ser inseridos no processo
produtivo eram vistos como alijados desse processo produtivo, denominados de
marginalizados e, nesse sentido, eram vistos como os não-integrados à sociedade.
Silva (2002, p.83) enfatiza que “desde sua origem, ‘informal’ tem sido uma
noção orientada para discutir ‘o outro lado’ da problemática, se não exatamente do
emprego, ao menos da mobilização ativa do trabalho – ou seja, ela foi proposta para
analisar as dificuldades e distorções da incorporação dos trabalhadores ao processo
produtivo em contextos onde o assalariamento era pouco generalizado. Em
conseqüência, sempre tendeu a focalizar prioritariamente seus estratos mais
desfavorecidos e a desenvolver, em torno deles, um debate sobre a natureza, as
condições e os limites de sua integração econômica, lidos como adaptação desses
grupos à estrutura social à qual pertencem, isto é, de seu papel (ou função, ou
necessidade) na produção da riqueza”.
O enfoque da informalidade, em sua origem, tinha como ponto central desvendar
a estratégia de sobrevivência utilizada por uma camada da população que se encontrava
em condições sociais e econômicas desfavoráveis. Aliado a este fato, que dificultava a
sua inserção no processo produtivo, acrescia-se que, em muitos países, o assalariamento
não era majoritário no mundo do trabalho. Neste sentido, procurou-se entender como se
estabelecia o ingresso de uma parcela de trabalhadores não englobados no contexto
“formal” do mercado de trabalho.
Entende-se que, também no caso do Brasil, se, de um lado, a inserção dos
trabalhadores em um mercado formalizado não contempla, historicamente, um
contingente significativo destes, de outro, na atualidade, este padrão se torna cada vez
mais distante da realidade do país. Isto porque as mudanças observadas no paradigma
produtivo ocasionaram, cada vez mais, um afastamento do modelo de emprego.
15
Cabe destacar que não só a questão do desemprego, que ainda se configura como
objeto de inquietação no mundo de hoje, mas também as dificuldades de absorção da
força de trabalho, objeto do estudo em pauta, já se constituíam em pontos de partida
nestas análises desenvolvidas no final da década de 1960 e no início dos anos 1970.
1. O estudo sobre as atividades informais em Gana
É também atribuída a Hart (1973), antropólogo britânico, conforme já
mencionado, a criação do termo “setor informal”. Peattie (1987, p.853), interpretando
Hart, destaca que este “começa dizendo que os ganhos e as despesas em tal cidade não
prontamente se encaixam nas categorias usadas pelos economistas, e que a política de
governo voltada para a economia urbana não tem funcionado em seu desempenho”.
Hart estuda um grupo de migrantes, situado na parte setentrional de Gana,
originário de Frafa, que se desloca para as áreas do sul deste país. Muitos dos migrantes
moram em áreas pobres do norte, cujo centro é Nima. Nesta cidade, segundo o Censo de
População de 1960, 40% dos homens ativos e 95% das mulheres ativas não se
encontravam engajados em um emprego assalariado.
O objetivo de Hart (1973, p.61) é o de ”descrever as atividades econômicas de
uma parte da força de trabalho de baixa renda em Acra, qual seja, o sub-proletariado
urbano no qual a maioria dos migrantes de Frafa não qualificada e sem instrução está
representada”. O período analisado, conforme observado, refere-se à década de 1960,
sendo Acra uma cidade antiga, sem um desenvolvimento industrial significativo. A
questão factual a ser respondida pelo autor é a seguinte: “o ‘exército de reserva de
desempregados urbanos e subempregados’ de fato constitui um passivo, uma maioria
explorada em cidades como Acra, ou suas atividades econômicas informais possuem
alguma capacidade autônoma para gerar crescimento nos rendimentos do pobre urbano
(e rural)?”.
Segundo Peattie (1987, p.853), Hart (1973, p.65) responde a esta questão
basicamente de forma afirmativa, quando ressalta que “’o desequilíbrio crônico entre o
rendimento do emprego assalariado e as necessidades de consumo’ é encontrado em
uma variedade de expedientes classificados desde um capitalismo primitivo ao furto os
quais, tomados em conjunto, podem ser tratados como ‘setor informal’. (Na visão de
Hart, ‘a distinção entre as oportunidades de rendimento do formal e do informal está
16
baseada essencialmente naquelas entre os ganhos salariais e os do auto-emprego’)”. A
variável principal, neste caso, segundo o autor, é o grau de racionalização de trabalho,
ou seja, o fato de que o trabalho pode ou não ser estabelecido com o recebimento de
uma base permanente e regular de rendimentos fixos.
No estudo de Gana, é ressaltado que muitos trabalhadores se encontram fora da
força de trabalho organizada, mas que os serviços por estes desempenhados são
extremamente essenciais para a cidade na qual são ofertados.
Hart apresenta uma tipologia que distingue atividades legítimas e ilegítimas do
setor informal, enfatizando que esta enfoca as atividades e não as pessoas. Os
indivíduos podem ser encontrados não só em múltiplas atividades, muitas vezes,
trabalhando em uma jornada intensa, como também, concomitantemente, engajados ou
não, como força de trabalho organizada, entendida como uma relação formal de
trabalho.
O informal é também visto como substituto ou, ainda, como uma possibilidade
desta população urbana sub-proletariada complementar formas de emprego nas quais
recebem baixos salários. No entanto, podem ocorrer situações nas quais os rendimentos
das atividades desenvolvidas no informal sejam elevados, mas, freqüentemente, estes
são combinados com aqueles obtidos em um trabalho formal.
O emprego assalariado representa a segurança almejada pelo trabalhador em sua
atividade. Por um lado, no entanto, alguns indivíduos almejam ingressar no informal ou
gostariam de aí permanecer em função de rendimentos, muitas vezes, mais elevados,
sem, no entanto, abandonar o emprego assalariado. É raro encontrar um indivíduo que
detenha uma só fonte de renda, em função não só da insegurança no trabalho
desenvolvido como também pelo fato de os rendimentos serem variáveis ou irregulares.
Deste modo, é comum para os trabalhadores o recebimento de várias fontes de
rendimentos, por meio do desenvolvimento de atividades combinadas, como uma
estratégia mais segura de sobrevivência.
Por outro lado, é salientada, ainda, a importância do grau de regularidade com o
qual os trabalhadores se encontram engajados nas atividades informais. É enfatizado
que, somente no caso de um envolvimento regular de trabalho, poder-se-ia estar diante
de um denominado “emprego informal”, que seria distinto de uma relação de trabalho
casual com rendimentos obtidos também de forma esporádica (Hart, 1973, p.69).
17
Peattie (1987, p.853) acrescenta que, segundo Hart (1973, p.84), o ponto em
debate do desemprego, em sua totalidade, perde a sua proeminência quando se observa
que tanto há pessoas que, não tendo trabalhos assalariados, obtêm o seu sustento, por
longos períodos, através de arranjos “informais” de rendimento quanto o típico baixo
salário recebido pode também ser complementado por uma variedade de outras
atividades. E ainda destaca que, no estudo de Gana, “a questão da pobreza e dos níveis
de rendimento em geral torna-se mais relevante do que a definição de subemprego”.
Em suma, o informal é visto como importante segmento de trabalho e não deve
ser pensado que os trabalhadores que aí se inserem somente o fazem em função de não
terem sido bem-sucedidos na obtenção de um trabalho assalariado. O rendimento
assalariado constitui somente parte da estrutura de oportunidades urbanas. O informal é
visto como provedor de oportunidades de trabalho, tanto para os que estão aí inseridos
como para aqueles que estão desempregados, que o encaram como uma possibilidade de
sobrevivência.
A cidade possui uma força magnética, que “pode estar derivada da
multiplicidade de oportunidades de rendimentos mais do que simplesmente por níveis
de assalariamento. Uma decisão de migrar para a cidade pode então ter algum motivo
racional objetivamente se, a despeito da escassez de oportunidades de emprego formal e
do baixo teto de remunerações de salário, o migrante pode vislumbrar uma perspectiva
de acumulação, com ou sem um trabalho (assalariado) 2, na economia informal de áreas
mais pobres urbanas” (HART, 1973, p.88). Nesse sentido, a cidade é vista pelos
migrantes como um local propício que pode lhes fornecer uma possibilidade mais
adequada de sobrevivência
O citado autor responde, em relação à questão factual por ele apresentada, que o
exército de reserva de subempregados e de desempregados nas cidades pode ou não ser
o desastre econômico, como é freqüentemente pensado. Isto porque o entendimento é de
que o informal pode ser uma estratégia de sobrevivência tanto para os que já estão
inseridos como para os sem-trabalho, que poderão nele obter a sua possibilidade de
subsistência.
2 O termo assalariado foi por mim incluído para melhor entendimento da tradução apresentada.
18
2. O Informe do Quênia: um estudo de evidência do informal e contrapontos
apresentados
O relatório do Quênia (EMPLOYMENT..., 1972) foi produzido pela
Organização Internacional do Trabalho, devendo-se ressaltar, inicialmente, que o
Programa de Emprego Mundial da referida Organização foi lançado, em 1969, na
Conferência Internacional do Trabalho. Como parte do Programa, as missões-piloto dos
países visavam estudar, com a ajuda de outras agências no sistema das Nações Unidas,
as causas do desemprego naqueles (denominados de Terceiro Mundo) com tipos de
problemas específicos e ressaltar o que necessitava ser feito, tanto em nível
internacional quanto nacional.
Na década de 1970, o desemprego já vinha sendo apontado como crônico e
intratável em quase todos os países em desenvolvimento. De um lado, podia-se destacar
que, em geral, os países industriais teriam conseguido reduzir o desemprego aberto
(entendido como ausência de postos de trabalho) em torno de 3% a 6% de sua força de
trabalho. De outro, em outras partes do mundo, este se situava freqüentemente com
percentuais acima de 10%, acrescidos de uma série de outros problemas graves de
emprego. Além disso, o relatório aponta que parte da dificuldade era estrutural, no
sentido de que muitos destes problemas não seriam sanados simplesmente pela
aceleração da taxa de crescimento.
Este trabalho enfatiza o fato de que, no processo de acumulação dos anos 1960,
percebia-se que tais problemas de emprego estavam estreitamente relacionados às
desigualdades de renda e de oportunidades, que não se situavam apenas entre suas
conseqüências, mas também entre suas causas. Tal fato constituía-se, em parte, no
aprofundamento e, freqüentemente, no crescimento dos contrastes entre as
oportunidades e os padrões de vida rurais e urbanos. Na estrutura de renda urbana, este
é o fator explicativo apontado não só para o grande movimento de migração em direção
às cidades como também para as altas aspirações entre os jovens educados e o esforço
na procura de um trabalho mais bem remunerado.
O problema principal refere-se ao emprego mais do que ao desemprego. Ao lado
das pessoas que não recebem nenhum rendimento, constata-se um grupo de pessoas, em
maior número, que são, por estes autores, denominadas de “os pobres que trabalham”,
possivelmente exaustivamente, mas percebendo uma baixa remuneração.
19
Neste relatório, a crença é de que não há somente uma causa do problema do
emprego, mas várias A maior parte destas revela, de uma maneira ou de outra, aspectos
de desequilíbrios “entre o crescimento da força de trabalho, a população urbana e a
educação e o crescimento como um todo da economia, e o desequilíbrio entre as
aspirações e as expectativas de trabalho das pessoas e a estrutura de rendas e de
oportunidades existentes” (p.2).
Estes tipos de desequilíbrio estão relacionados às tendências básicas e às
características da economia do Quênia. O ponto de partida do relatório é o da pobreza
como um todo deste país e de sua estrutura produtiva, inevitavelmente ainda
influenciada pela era colonial.
Embora os laços coloniais estivessem sendo rompidos, a influência mundial se
fez sentir, sob várias maneiras, mais acentuadamente desde a independência do Quênia.
Esta influência exerceu um desejo de “modernização”, particularmente entre as pessoas
mais jovens, mas por extensão em toda a população, mesmo para aquelas situadas em
áreas remotas do país. No entanto, esta foi acompanhada de expectativas de melhoria,
nem sempre alcançadas, pela falta de um suporte necessário para atingir tal intento,
embora o Quênia tenha sido foco de ajuda internacional e de investimento estrangeiro
privado.
A ênfase deste relatório é não só a busca de correção dos desequilíbrios, mas
também a da eqüidade, em substituição às flagrantes desigualdades encontradas, entre
outras, nas rendas, na educação e, espacialmente, entre regiões e distritos, bem como
entre os indivíduos (p.3).
No Quênia, na época estudada, com 90% da população total originária de área
rural, a questão crucial passava a ser, mais do que a existência de trabalho remunerado
realizado para outras pessoas, a disponibilidade de terra, aliada ao conhecimento e aos
serviços de suporte, no sentido de obter uma renda razoável. A realidade dos habitantes
deste país, principalmente dos que dependiam da agricultura, era diferente
regionalmente, além do fato de os ganhos provenientes de uma atividade estarem
freqüentemente associados à natureza sazonal da demanda.
Alguns trabalhadores procuravam um trabalho assalariado, em função da falta de
colheitas para poderem realizar suas vendas. Para os que não conseguiam subsistir
nestas áreas, em função da falta de oportunidades de emprego ou por terem outras
aspirações de vida, a alternativa era migrar para as cidades. Em geral, os que o faziam
20
eram particularmente os jovens e educados (estas duas categorias tendiam a coincidir),
em busca de trabalhos nas cidades, para acrescentar outros ganhos de salários urbanos,
mantendo ainda a maior parte destes grupos laços estreitos com o seu meio rural. Havia
um grande movimento de migração em direção às cidades, onde ambos os setores da
economia formal e informal ofereciam oportunidades de obtenção de rendimentos.
Neste trabalho sobre o Quênia, é observado um extremamente importante ponto
em comum com o problema investigado neste estudo, qual seja, a realidade observada e
as estatísticas que procuram retratar a mesma. Ao ressaltar a divisão do trabalho por
sexo, assinala-se que o quadro existente neste país contrasta profundamente como as
aproximações estatísticas sobre esta questão. Era apontado, através do Kenya Statistical
Digest, June, 1971, que 45% das mulheres encontravam-se engajadas regularmente em
atividades econômicas. É observado que, quando estas não o faziam, deveriam ser
consideradas usualmente ativas, pois realizavam tarefas domésticas em seus domicílios.
Os autores constatam que, na mensuração do emprego, “as estatísticas são
incompletas, cobrindo a maior parte do emprego assalariado e do auto-emprego nas
firmas mais organizadas, mas omitindo uma série de assalariados e de pessoas auto-
empregadas, tanto homens como mulheres, que denominamos como ‘setor informal’”
(p.5).
“A visão popular das atividades do setor informal é a de que estas são
primariamente as de pequenos comerciantes, vendedores ambulantes, meninos
engraxates e outros grupos ‘subempregados’ nas ruas das grandes cidades. As
evidências, apresentadas neste relatório, sugerem que a maior parte do emprego no setor
informal, longe de ser somente marginalmente produtivo, é economicamente eficiente e
rentável, embora pequeno em escala e limitado por uma tecnologia simples, pouco
capital e falta de laços com o outro setor (‘formal’)” (p.5). Dentro da parte mais recente
do informal, citam que se encontra uma variedade de carpinteiros, pedreiros, alfaiates e
outros comerciantes, como os cozinheiros e os taxistas, que, por meio de suas
habilidades, procuram prover bens e serviços para um amplo, embora pobre, segmento
da população.
Freqüentemente, as pessoas terminam por perceber a dimensão da produção
eficiente, em termos econômicos, no setor informal, em função dos rendimentos baixos
recebidos pela maior parte dos trabalhadores aí inserida. Uma interpretação comum das
causas destes baixos rendimentos (em comparação com a média dos níveis de salários
21
no setor formal) tem sido presumir que o problema encontra-se dentro do setor informal.
Segundo esta perspectiva, o informal é assumido como estagnado, não-dinâmico, além
de se constituir como uma rede para os desempregados e os ociosos, disfarçados de uma
forma sutil, como não tendo outra opção do que nele permanecer.
Os autores deste relatório surpreendem-se sobre o modo como esta visão foi
disseminada e fortalecida no meio acadêmico. Entretanto, este informe sobre o Quênia
alerta para o fato de que se deve perceber o setor informal como sendo uma atividade
econômica próspera, além de uma fonte de futuro bem-estar deste país.
Há ainda o destaque de que este relatório não deve ser encarado como uma
tentativa de solucionar o problema de emprego deste país, mas é inteiramente voltado
para a evidência do setor informal. Esta revela que, provavelmente, o informal tem
crescido, em grande parte, mais rapidamente do que o emprego no setor formal.
Este estudo enfatiza, de forma marcante, a alardeada importância da ligação
entre as atividades informais e formais. No entanto, a idéia presente é a de que as
atividades informais não estão confinadas à periferia das grandes cidades, mas
correspondem a ocupações específicas, ou mesmo a determinadas atividades
econômicas. Neste sentido, mais do que atividades informais que representam um modo
de produzir, estas apresentam as seguintes características: (a) facilidade de entrada; (b)
apoio em recursos próprios; (c) empresas de propriedade familiar; (d) operação
realizada em pequena escala; (e) trabalho intensivo e tecnologia adaptada; (f)
habilidades adquiridas fora do sistema formal de ensino e (g) mercados não regulados e
competitivos.
Em relação às características das atividades do setor formal, são apontadas: (a)
dificuldade de entrada; (b) freqüente apoio com recursos externos; (c) propriedade
corporativa; (d) operação realizada em grande escala; (e) capital intensivo e,
freqüentemente, tecnologia importada; (f) habilidades adquiridas formalmente,
freqüentemente repatriadas e (g) mercados protegidos (por meio de tarifas, quotas e
licenças comerciais).
O relatório busca realizar uma “estratégia de redistribuição de crescimento com
o propósito de estabelecer laços que estão atualmente faltando entre os setores formal e
informal. Uma transferência de rendas de grupos de rendimentos mais elevados para os
pobres que trabalham poderia resultar em novos tipos de investimentos de trabalho
intensivo em ambas as áreas urbana e rural. Isto deve não somente gerar demanda de
22
produtos do setor informal, mas também encorajar inovações em técnicas de trabalho
intensivo neste setor. As recomendações constantes deste relatório têm intenção de
reduzir o risco e incerteza dos que estão engajados no setor informal e assegurar um
crescimento dinâmico deste amplo segmento da economia do Quênia” (p.6).
O desemprego é freqüentemente analisado apenas como o resultado de um
desequilíbrio básico, entre um crescimento muito rápido da força de trabalho,
acompanhado por outro, mais lento, do número de oportunidades de trabalho. Mas,
mesmo com uma igualdade perfeita, o desemprego pode surgir.
Em relação ao Quênia, os autores destacam que devem ser consideradas algumas
questões primordiais, quais sejam: (1) a maior parte da população do Quênia trabalha na
terra e não em trabalhos com ganhos salariais; (2) enquanto o emprego, citado na
afirmação acima, diz respeito às estatísticas de crescimento do emprego no setor formal,
ignora-se aquele que abrange um contingente amplo e, aparentemente, crescente,
inserido no “setor informal” e (3) as oportunidades, através das quais possam ser
obtidos rendimentos razoáveis, devem ser consideradas como um ponto importante ao
invés da ênfase atribuída exclusivamente aos trabalhos (p.7).
Sem dúvida alguma, são várias as desigualdades existentes no mundo do
trabalho citando-se, entre outras, as de sexo e idade, além das regionais e sazonais.
Podem ser apontadas também aquelas entre “a relativa segurança e níveis de rendimento
daqueles com trabalhos assalariados em grandes empresas e aqueles ocupados no setor
informal. Estas profundas desigualdades inevitavelmente criam fortes ambições para
que as pessoas migrem em direção às cidades, esforçando-se para atingir uma educação
mais elevada, tendo em vista obter um trabalho. Tanto mais estes desequilíbrios
extremos persistam, o mesmo sucederá ao desemprego, uma vez que grandes
diferenciais irão atrair uma margem dos que procuram por trabalho em direção às
cidades, próximas das chances de bons trabalhos, com a esperança de consegui-lo. Isto
explica porque a análise da desigualdade é fundamental para a explicação dos
problemas de emprego no Quênia” (p.7-8).
Neste trabalho, percebe-se que vigora a "teoria da modernização". Esta, como
ressalta Silva (2002, p.86), “sublinhava que o baixo nível de capitalização dos países
subdesenvolvidos desequilibrava a estrutura do emprego urbano. Esta era vista como
uma situação transitória, caracterizando uma espécie de pré-incorporação ao trabalho
assalariado dos contingentes migrantes, cujas atitudes e modos de vida ainda não eram
23
adequados aos padrões moderno-industriais, mas também já não eram inteiramente
tradicionais”.
No âmbito acadêmico, Tokman destaca que o informe do Quênia “foi o primeiro
a introduzir o setor informal e sua principal inovação foi o conceito dos pobres que
trabalham. Em certo sentido consistiu em uma análise da força de trabalho como
unidade de produção e sua articulação com o resto da economia” (1987, p.513). O
principal argumento sobre a origem do setor foi o excedente de mão-de-obra, ou seja,
“em sua maioria indivíduos que emigravam de zonas rurais às urbanas e que não
podiam encontrar trabalho nos setores modernos. Enfrentada a necessidade de
sobreviver tinham que desempenhar qualquer atividade que os permitisse obter um
rendimento”.
Tokman ressalta que, neste trabalho, foi visto que a massa dos subempregados,
que trabalhava em múltiplas atividades, tinha conseguido sobreviver em condições
desfavoráveis. A partir deste fato, procurou-se examinar não só o tipo de trabalho
realizado, mas também a sua constituição, que ocorria, sobretudo, em operações
unipessoais. Em suma, o trabalho passou a ser identificado como a unidade de
produção.
Um outro ponto importante, conforme salientado por Tokman, é a suposição de
que existia uma relação funcional com o resto da economia, “baseada no fato de que os
trabalhadores informais poderiam proporcionar bens e serviços, ainda que sob severas
formas de persecução. Daí se postulou que se não existisse esta interferência seria
possível elevar o nível de rendimentos das pessoas ocupadas no setor informal” (1987,
p.513).
No estudo em pauta, devem ser ressaltados pontos abordados por Tokman que,
no nosso entender, são atuais e comuns com as preocupações e conclusões em pauta
ainda hoje. O primeiro deles diz respeito ao setor informal ser extremamente importante
na sobrevivência das pessoas.
O segundo ponto relaciona-se à questão do trabalho ser visto como unidade de
produção, constituindo-se, sobretudo, daquelas unipessoais. Sob este aspecto, são
enfatizadas as particularidades e a forma de organização da produção, ao invés da ótica
da inserção do indivíduo no mercado de trabalho, que está contida nos conceitos sobre
emprego, desemprego ou subemprego.
24
O terceiro está centrado na relação deste setor com o restante da economia. Este
último ponto é baseado no fato de que os trabalhadores podiam proporcionar bens e
serviços no mercado, ainda que enfrentando formas desfavoráveis para atingir este
objetivo. Ao supor a relação deste setor com o restante da economia, estar-se-ia
constatando não só a inter-relação do informal no funcionamento da economia como um
todo como também a constatação da sua importância neste contexto.
A principal desvantagem do estudo do Quênia, segundo Tokman, foi a falta de
um marco conceitual para definir o setor. Este foi definido em oposição às atividades
formais e, em particular, por sua falta de acesso aos recursos produtivos e aos mercados
(1987, p.514).
Em relação a este ponto acima citado, deve-se destacar que, de um lado, persiste
até hoje uma falta de consenso na definição da informalidade. Silva (2002, p.84-85)
salienta que “o ‘quase-conceito’ desempenha uma função de mediação que, de um lado,
realiza a crítica interna (ou, como se verá, o simples ajustamento), motor da trans-
formação de modelos conceituais formais, obrigando-os a incorporar novos fenômenos
não como ‘acontecimentos’ singulares -- portanto descartáveis como excepcionais e/ou
negadores do esquema teórico --, mas como ‘variações’ típicas; e, de outro, fornece
referências cognitivas mais ou menos estabilizadas (pela formalização conceitual),
capazes de influir sobre a percepção orientada para as atividades práticas. É esse papel
poroso, a meio caminho entre a percepção social típica de cada conjuntura e a reflexão
conceitual mais abrangente e rigorosa, que pode explicar por que a noção de
informalidade, empiricamente tão confusa e analiticamente tão ambígua3, sobreviveu,
com popularidade crescente, por mais de uma década”.
Por outro lado, esta oposição entre as atividades formais e as informais, vista no
informe da OIT sobre o Quênia, pode ser ainda observada, através das décadas, em
grande parte dos estudos acadêmicos. No entanto, a percepção da relação entre estas foi
sendo alterada, ao longo do tempo. Hoje se reconhece tanto uma forte ligação entre
3 A seguir, reproduzo a nota 5 de seu trabalho: Pode-se ter uma idéia desta confusão somando à citação de Miras (1991) incluída na nota 2 com o que diz L. Gallino, em trabalho sobre a Itália no início dos anos 1980: “... a difusão de atividades informais é simultaneamente: a) um resultado inescapável do desenvolvimento da economia capitalista avançada; b) uma escolha livre e criativa de inovação social; c) um conjunto de pequenas receitas de sobrevivência; d) um retorno a relações sociais pré-modernas com o suporte de modernas tecnologias” (L.Gallino apud Mingione, 1991:91, tradução minha). E, mais recentemente: “Mesmo sendo uma realidade imprecisa, com contornos incertos, suas [da informalidade] manifestações intuitivas podem ser vislumbradas nos dois hemisférios, nos países desenvolvidos do Norte ou nas nações subdesenvolvidas do Sul (Malaguti, 2000, grifo meu)”.
25
estas como o fato de o informal se articular com o formal, mas não no sentido de
subordinação a este segmento de mercado.
Certamente, o requisito mais importante é a facilidade de entrada no setor, que
determina as características com relação à organização da produção e à inserção no
mercado. Tokman ressalta que, em sua origem, era destacada a falta de capital físico e
humano tanto dos migrantes como dos que ingressavam, pela primeira vez, no mercado
de trabalho.
O referido autor aponta que tal fato tem, como conseqüência, o seguinte fluxo de
características:
a) o tipo de atividade;
b) a facilidade de entrada no setor, apontada como o requisito mais importante;
c) as características da organização da produção e a inserção no mercado,
determinada pela facilidade de entrada no setor.
d) a organização rudimentar: sem clara divisão de trabalho, nem de propriedade
dos meios de produção, pouco capital comprometido e com poucas exigências em
termos de habilidades por parte dos grupos aí envolvidos.
No nosso entender, esta facilidade de entrada no setor, em momentos de crise
econômica, permanece ainda hoje como um fator importante, utilizado pela população
desfavorecida que, muitas vezes, nele reconhece uma estratégia possível para a sua
sobrevivência. Esta apontada facilidade de entrada estaria sendo determinada,
sobretudo, não apenas pelo fato de este setor ser composto por atividades com baixa
exigência de capital, mas também, freqüentemente, por operar com tecnologia simples.
Atualmente, ocorre uma relativização destas condições de funcionamento do
informal, apontadas pelo informe do Quênia. Cacciamali (1993. p.218) aponta que os
estudos empíricos realizados sobre este tema revelam que “cada uma dessas condições
pode vir a criar um conjunto de atividades informais, cujas características
organizacionais e de funcionamento podem não cumprir as demais condições
enunciadas”. Destaca que “é a partir dessas condições que se pode afirmar, por
exemplo, que a hipótese de facilidade de entrada quase sempre não se realiza em sua
totalidade; que a participação em mercados supostamente não regulamentados ocorre,
muitas vezes, com o fito precípuo de evadir impostos e/ou outros custos; que a
propriedade familiar não é unívoca; que os recursos utilizados podem não ser totalmente
próprios; e assim por diante”.
26
Tal argumento é também corroborado por Peattie (1987, p.855), sobre o referido
relatório, ao questionar “como é possível determinar, sem uma pesquisa extensiva e
complicada, que tipos de ocupações são atualmente caracterizados por uma ‘facilidade
de entrada’?”.
3. Evidência da informalidade na década de 1970 no Brasil: mercado de
trabalho metropolitano manual e marginalidade
O estudo do Quênia (EMPLOYMENT..., 1972) foi bastante divulgado como
sendo o primeiro documento oficial que procurou mostrar evidências da existência do
denominado “setor informal”. Além disso, como já mencionado, foi atribuída também a
Keith Hart a criação da noção de informalidade, no início dos anos 1970.
A primazia do pioneirismo deste termo “setor informal” é compartilhada com
outros autores, igualmente importantes, que, na década de 1970, realizaram estudos
sobre este tema, mas, como destaca Oliveira (1990a), devido à circulação mais restrita
de seu trabalho, não obtiveram tal distinção à época. Neste sentido, insere-se o trabalho
de Silva (1971), publicado anteriormente ao informe do Quênia, que em muito
contribuiu para a elucidação de um tema importante que, então, começava a despontar.
O próprio Silva (2002), conforme já visto anteriormente, destaca que a noção de
informalidade, no início, esteve ligada ao reconhecimento das restrições de capital no
processo de mobilização produtiva do trabalho e suas conseqüências. Cita que ele
mesmo se referia ao ‘mercado formalizado’ e ao ‘mercado não formalizado’ com um
sentido próximo ao produzido a partir dos estudos de países africanos.
Nesta dissertação, Silva (1971) aborda um tema de presença constante no
pensamento sociológico latino-americano: a marginalidade, ou o processo de
marginalização. Sobre a delimitação do universo de análise, trata-se do trabalho manual
urbano (“metropolitano”), qualificado e não-qualificado. De forma extremamente
sucinta, pode-se dizer que o trabalho qualificado constitui-se aquele no qual o
treinamento formal (curricular) não é condição indispensável para a formação técnico-
profissional do trabalhador.
O “trabalho manual urbano” é investigado tendo como finalidade as questões
relacionadas à marginalidade, de modo que está centrado, conforme ressalta o autor, não
só sobre os setores menos “sofisticados” da mão-de-obra (o trabalho pouco ou nada
27
qualificado), como também sobre a atividade econômica em geral (a que se caracteriza
pela reduzida formalização jurídico-institucional).
Considera-se importante ressaltar que determinados trabalhadores se inserem em
atividades consideradas “marginais”, apesar de serem essenciais, sobretudo em países
que apresentam não só um menor nível de desenvolvimento, como também de
independência econômica. O próprio autor, em uma de suas conclusões, ressalta que
“nem todas as atividades do mercado não-formalizado podem ser vistas como
marginais, tanto em termos de sua importância para o sistema quanto em relação ao
nível de controle do mercado de trabalho dos trabalhadores delas dependentes” (SILVA,
1971, p.132).
O autor explica que o material empírico sobre o tema se encontrava praticamente
baseado em dados censitários, cuja análise “não se fundava no conhecimento direto do
cotidiano dos grupos envolvidos; e, nos poucos trabalhos de campo, o distanciamento
entre o observador e os grupos observados era total, havendo sempre a mediação de
instrumentos formais de coleta” (p.5).
De um lado, o tema da marginalidade, ou do processo de marginalização,
naquela época estudada, era muito complexo, em função, entre outros fatores, de se
constituir em uma recente área particular de preocupação. De outro, segundo Silva (p.3),
“a bibliografia a respeito é quase inesgotável (e em boa parte de difícil acesso), não
obstante a escassez de dados estatísticos fidedignos e a insuficiência de investigações
empíricas, lamentados por quase todos os que tratam do tema”.
O modelo do estudo esteve referido às grandes cidades brasileiras, quais sejam,
Recife, Salvador, Fortaleza e, em especial, Rio de Janeiro, na qual foi realizada a maior
parte das investigações, contemplando determinados problemas da marginalidade, como
o modo de inserção dos trabalhadores envolvidos no sistema global, a partir das
condições do mercado de trabalho. Segundo o autor, o referido modelo “assume uma
perspectiva que enfatiza o consenso (integração – não-integração, participação no
sistema)” (p.12). Conforme ressaltado por Coelho e Valadares (1982, p.19), este modelo
serviu como base analítica para uma série de outros estudos, desenvolvidos ainda na
década de 1970.
Percebeu-se que havia uma discordância das formulações em pauta, que deveria
ser atribuída a uma distorção da ‘ótica’ que presidia certas interpretações e não ao
28
conteúdo dos modelos apresentados. Nestes, havia uma completa falta de vivência da
realidade estudada.
Silva (1971) destaca que, quando o seu estudo salienta “o ponto de vista dos
trabalhadores”, esta afirmativa ”só pode ser entendida analiticamente, isto é, que os
trabalhadores são tomados como referência no contexto de uma análise sócio-
antropológica”. Enfatiza que era preciso conhecer o significado das condições de
mercado para os grupos envolvidos, ou seja, “era preciso conhecer como estes
percebiam o setor da realidade que era objeto de análise” (p.8). Acrescenta que os
depoimentos pessoais “não podem ser vistos como ‘dados’ (‘provas’), mas sim como
ilustrações que buscam tão somente esclarecer e facilitar a compreensão dos problemas
apresentados” (p.10).
Ao analisar a estrutura dos mercados metropolitanos de trabalho manual, o autor
(p.13) ressalta enfoques importantes e diferenciados no estudo da informalidade. Tendo
em vista “os modos de atuação por parte do trabalhador, isto é, de suas manipulações no
sentido do ‘controle do emprego’ (atual ou potencial), o mercado apresenta uma
diferenciação básica, determinada por dois tipos polares de empregador: a ‘firma’ e o
‘indivíduo’. Por indivíduo, entende-se o agente econômico (pessoa, família, etc.) que é
antes ‘consumidor’ de serviços que ‘empresário’, e que portanto não tem existência
jurídica como empregador. Por firma, entende-se a empresa registrada, cuja atuação se
orienta em consonância com o aparato legal vigente: legislação trabalhista, tributária,
etc. “
Destaca-se que, em torno desses pólos, anteriormente mencionados, “o mercado
de trabalho organiza-se em dois sub-sistemas, aqui denominados, por oposição,
‘mercado formal’ (MF) e ‘mercado não formalizado’ (MNF). Ambos os sistemas são
altamente institucionalizados, de modo que a dicotomia formal/informal indica neste
contexto apenas a explicitação ou não das alternativas de comportamento sob a forma
de normas jurídicas. Esta explicitação é importante porque implica numa menor
flexibilidade dos modos de conduta nos empregos ligados ao MF” (p. 13, grifo nosso).
Em termos do mercado formalizado, as características básicas são a proteção e a
legalização do emprego. Os trabalhadores que assim se enquadram estão vinculados a
um único empregador tendo a posse de carteira de trabalho assinada (contrato assinado
pelo empregador e registrado no Ministério do Trabalho). O empregado com carteira de
trabalho assinada possui uma série de benefícios ligados à previdência social. No caso
29
dos funcionários públicos, não há a posse de carteira de trabalho assinada. No entanto,
determinados direitos são garantidos a estes trabalhadores, em função da contribuição
que realizam para a previdência social.
Silva já ressaltava, na década de 1970, aspectos atuais neste tema, quais sejam, a
heterogeneidade existente dentro do que se denomina como o emprego típico do
mercado formalizado e a tendência de não se cumprir determinadas exigências para a
legalização de algumas firmas, sobretudo daquelas de pequeno porte, em função do
ônus embutido neste procedimento.
O referido autor destaca que “em resumo, o emprego típico do MF proporciona,
através da carteira assinada, proteção legal e ‘reconhecimento social’. No entanto, não
se pode dizer que o MF compõe-se exclusivamente de empregos desse tipo. Isto porque,
mesmo considerando apenas o empregador tipicamente capitalista do MF - ou seja, a
firma registrada -, o volume de irregularidades jurídicas nas relações de trabalho é
enorme. Quanto menor o porte da empresa e mais deficientes seus métodos de
administração, maior a tendência de burla à legislação, que serve de recurso para
problemas os mais diversos do empregador: aumento da margem de lucro, dificuldades
financeiras, etc. Todas essas irregularidades provavelmente têm origem no fato de que o
ônus com os encargos trabalhistas chega a equivaler a 50% sobre a folha de pagamentos
da empresa, o que provoca fortes repercussões sobre os custos de produção” (p. 18).
São ressaltadas as categorias de emprego que compõem o MF. Em primeiro
lugar, o emprego público, depois, a categoria de empregos privados, que é muito ampla
e variada, existindo subtipos como os empregos em grandes empresas ou pequenas
empresas. No entanto, é enfatizado que, embora estes termos façam um apelo direto ao
tamanho da empresa, este possui importância muito reduzida para o problema. “A
própria noção de ‘tamanho’ é ambígua, pois não há relacionamento necessário entre, por
exemplo, o valor da produção, a área do estabelecimento e o volume de capital, ou entre
este e o número de empregados, etc” (nota 9, p.25).
Embora adotado, até hoje, em vários estudos sobre este tema e passando sua
divisão pelo número de pessoas ocupadas, o tamanho de um empreendimento pode ser
considerado também um corte arbitrário. Reconhece-se, como destaca Valadão (2000,
p.3), “que o caráter informal de uma determinada atividade não é dado apenas por seu
tamanho, mas, principalmente, pela particular divisão técnica e social do trabalho, que
ali se estabelece”. Ou seja, pode ocorrer muitas vezes, em uma unidade produtiva do
30
setor informal, a utilização de instrumentos de trabalho que não pertençam
exclusivamente à empresa, mas sejam instrumentos pessoais do proprietário, não se
podendo definir, neste caso, uma nítida divisão entre o capital e o trabalho.
Ao adotar este procedimento de análise das pequenas unidades produtivas, as
hipóteses centrais que, em geral, se encontram embutidas, pelos estudiosos, pressupõem
que nestas unidades produtivas prevalece o fator trabalho em relação ao capital,
tecnologia nacional e relações de trabalho, estabelecidas com base em laços pessoais,
familiares ou de amizade, que se sobrepõem, muitas vezes, à busca de racionalidade
econômica tão esperada em uma organização produtiva que vise maximizar a obtenção
de lucros.
Lautier (1991, p.25) aponta ser este critério puramente empírico, sendo
considerado, no cômputo geral, o conjunto das unidades de menos de onze pessoas
ocupadas e, às vezes, menos de seis. No entanto, a sua proposição pelas organizações
regionais da Organização Internacional do Trabalho (como o Programa Regional de
Emprego para a América Latina e o Caribe – PREALC) fez com que a maior parte dos
institutos nacionais de estatísticas, seguindo estas normas internacionais, procurasse
adotá-lo4.
Silva (1971, p. 27) ressalta que existe uma tendência à concentração dos
empregos “típicos” do MF - os “empregos regulares e permanentes” - nas grandes
empresas. Mas, identificando este fato, alertou para a questão de que não se pode
ignorar que, paralelamente, existe uma quantidade ponderável de “casos desviantes” nas
grandes firmas, em especial nos níveis mais baixos de qualificação, como também é
grande o número de “empregos regulares e permanentes” em firmas menores e/ou
“quase-familiares”, inclusive as que não têm existência jurídica. Alerta para este fato,
pois, muitas vezes, há um desconhecimento desses problemas, o que leva a uma
simplificação exagerada.
A falta de inserção plena no sistema jurídico-institucional em empregos (que
poderiam ser incluídos no MF) em firmas não-registradas constitui-se em um sério
4 No Brasil, o conceito de setor informal, adotado pela Pesquisa da Economia Informal Urbana (ECINF) da Fundação IBGE, em 1997, refere-se às características das unidades produtivas (empresas), nas quais as atividades se desenvolvem, abrangendo os trabalhadores por conta própria e os empregadores com até cinco empregados, seguindo recomendações da OIT (Statistical of employment in the informal sector – fifteenth international conference of labour statisticians – Report III - 1993. Genebra: International Labour Organization, 1993).
31
obstáculo, tanto para a estabilidade de funcionamento das mesmas quanto pelos reflexos
equivalentes sobre os empregos que são gerados por estas.
O caráter familiar ou “quase familiar” desses estabelecimentos, com ligações
pessoais do trabalhador com o empregador (que tem neste o seu único patrão), além do
envolvimento deste no desempenho da própria firma, permite ao trabalhador a
manutenção do emprego, desde que esta esteja apresentando condições plausíveis de
sobrevivência. Quando não há um funcionamento adequado da mesma, o trabalhador
acaba substituindo, muitas vezes, a relevância da proteção legal do emprego que, neste
caso, se situa no limiar entre o MF e o MNF, dada sua ambigüidade.
Ao analisar o mercado não formalizado, Silva (p.29) salienta que, por oposição
ao MF, “depreende-se que este sub-sistema é ‘invisível’, no sentido de que existe à
revelia do aparato jurídico-institucional. Portanto, é num contexto sem qualquer tipo de
reconhecimento oficial que as ocupações do MF devem ser entendidas”. Neste caso,
entende-se que “a procura de amparo legal proporcionado pela carteira assinada, como
modo de produção de emprego, é substituída no MNF pela distribuição de riscos,
através da diversificação de patrões”. Destaca que “não se deve esquecer que o traço de
‘invisibilidade’ jurídico-institucional de boa parte desses contingentes e das próprias
atividades aumenta sua viabilidade econômica. Em certos casos, é esta condição de
‘invisibilidade’ que responde pelas possibilidades de competição no mercado” (nota de
pé de página, p. 130).
Na situação acima descrita, o patrão seria um consumidor de serviços pessoais,
uma vez que contrata não um empregado, mas uma tarefa específica e determinada (em
geral de curta duração). Os laços entre o patrão e o trabalhador são finalizados ao
término da tarefa.
É enfatizado que, apesar desta relação ser, em princípio, interpessoal, o
trabalhador acaba se esforçando para criar os denominados laços “de clientela”, “a fim
de obter uma posição segura no mercado, isto é, de evitar períodos em que seja incapaz
de encontrar trabalho remunerado”. Segue o autor, destacando que esta “personificação”
da atividade econômica é a característica fundamental do MNF. Estes laços de clientela,
embora em caráter mais restrito, são também encontrados no mercado formalizado, tais
como os que são estabelecidos entre o empregador (ou chefe imediato) e o empregado.
No entanto, a situação de emprego submete-se às normas gerais, que se abstraem do
caráter impessoal, sendo universalistas, estando representadas pelo sistema legal, e a
32
burocratização da atividade econômica encontra-se representada pela “firma” como
instituição (p.30).
O autor ressalta que “o que se afirma como típico do MNF é, em primeiro lugar,
o forte significado econômico das relações pessoais, e em segundo que o trabalhador
torna-se cliente de um número variável de patrões, embora estes não sejam os únicos
consumidores de seus serviços. Os laços de clientela são cruciais, na medida em que
proporcionam uma garantia de venda mínima da força de trabalho -, e porque trazem
uma série de outras vantagens econômicas (pequenos empréstimos, alimentos, roupas,
apresentação a novos consumidores, etc.) que constituem uma importante fonte
subsidiária de remuneração” (p.31).
Em função das características citadas, percebe-se que cabe ao próprio
trabalhador um papel fundamental de atuação, que irá respaldar a sua inserção no
mercado de trabalho. Silva (p.31) aponta que “a invisibilidade legal aliada à
‘personificação’ da atividade econômica, concorrem para a extrema flexibilidade que o
MNF apresenta”. Acrescente-se ainda que esta flexibilidade do MNF se encontra
expressa por variações relacionadas à criação de vínculos indiretos e informais de
trabalho. Estas dizem respeito, de um lado, à segurança da ocupação (ou seja, a
estabilidade) do trabalhador, que está relacionada ao fato de se poder assegurar
compradores para os bens e/ou serviços produzidos. Por outro lado, o trabalhador
“acumula a responsabilidade de ‘comercializar’ a mercadoria de que dispõe, isto é, de
julgar e influenciar pessoalmente o preço de seu trabalho, para o que necessita de
informações de toda espécie sobre as condições de mercado” (p.34).
Ressalta ainda que, “de modo geral, pode-se dizer que existe no MNF uma
relação inversa sobre a segurança da ocupação, entre a influência da qualificação
profissional e das variáveis ligadas à ‘personificação’: quanto maior a habilidade técnica
necessária ao desempenho da ocupação, menor a importância relativa das relações
pessoais” (p.36).
A análise do MNF diz respeito, em resumo, às: (a) ocupações não-reconhecidas;
(b) exercidas e controladas individualmente e (c) ligadas ao setor de serviços - isto é, às
ocupações “típicas” do MNF. Silva (1971) descreve os tipos de ocupações pertencentes
ao MNF:
1) O primeiro é o dos trabalhadores “por conta própria” (p.42) que o autor adota
em diferenciação ao de “trabalhador autônomo” (que seria o trabalhador por conta
33
própria com situação regularizada, que, no seu entender, é um caso-limite desta
categoria de ocupações). O trabalhador autônomo é definido como aquele que paga o
imposto sobre serviços (ISS), qual seja, uma taxa anual fixa que incide sobre qualquer
tipo de atividade não-assalariada. O pagamento do ISS “proporciona um certo
reconhecimento legal e social: o trabalhador pode filiar-se ao INPS5, a polícia aceita o
recibo como substituto da carteira de trabalho” (p.23).
“As ocupações por conta própria referem-se aos casos de ‘auto-emprego’, ou
seja, aqueles em que o trabalhador dispõe de um certo grau de independência no
mercado, tanto de empregadores (firmas) quanto de patrões (rede de contatos). Embora
sua atuação se situe no contexto do MNF, a subordinação aos laços de clientela é menos
marcante que nas demais categorias desse sub-sistema, uma vez que as habilidades
profissionais e a posse dos instrumentos de trabalho colocam-no numa posição
vantajosa no mercado (o trabalhador por conta própria está sempre nos níveis mais
qualificados de sua profissão, embora esta possa ser relativamente ‘rudimentar’ - no
sentido, por exemplo, de que exige pouca ou nenhuma escolarização, não requer
treinamento formal, etc.)” (p. 43). Destaca ainda que estes trabalhadores apresentam um
alto grau de estabilidade, pois se ocupam em tempo integral e ininterruptamente e o
nível de renda é, muitas vezes, superior ao daqueles que se encontram no MF.
2) O segundo é o do biscateiro que, em geral, pode ser descrito como aquele que
“não dispondo de instrumentos de trabalho e/ou tendo um nível de qualificação mais
baixo ou inexistente, sua dependência da ‘personificação’ das relações econômicas é
muito grande, e quase sempre a única forma de controle do mercado” (p.44). A sua
inserção permanente no mercado de trabalho não ocorre de forma freqüente, devido à
concorrência existente. Neste sentido, a manutenção de sua clientela e de contatos
pessoais é extremamente importante para a segurança de sua ocupação. Mas, entre os
biscateiros, há casos em que muitos conseguem obter uma remuneração mais elevada
que a dos empregados no MF com nível de qualificação equivalente.
3) O terceiro seria composto pelas atividades domésticas, que se enquadram em
um tipo de serviços pessoais, desagregando-se em duas categorias de ocupações: (a)
“serviços domésticos” e (b) ”empregos domésticos” (p. 44-45).
5 INPS – Instituto Nacional de Previdência Social hoje denominado de INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social.
34
Nos serviços domésticos, destaca-se o fato de este segmento estar constituído,
basicamente, pelas mulheres, além de, muitas vezes, poder exercer as tarefas no próprio
domicílio. Existe um número limitado de patrões e a duração das tarefas é indefinida, de
modo que deixa a possibilidade de ocorrer uma longa e contínua relação de trabalho,
diferente das outras categorias, limitadas à duração da tarefa (p. 45).
No caso dos empregos domésticos, o trabalhador (embora seja em maioria do
sexo feminino, não o é exclusivamente), além de ter um único patrão, é muito freqüente
que tenha a obrigação de dormir no local de trabalho. “Com isso, fica eliminada a
oportunidade de as tarefas serem executadas na residência do trabalhador, bem como
reduzem-se as possibilidades de distribuição dos riscos pela diversificação de patrões”
(p. 46). No entanto, o nível de remuneração pode aumentar quando a alimentação está
incluída, bem como “presentes” e outros itens. Nesta relação de trabalho, o autor
ressalta que há uma relação que, estabelecida face-a-face, estimula a “intimidade” do
contato entre o trabalhador com o patrão, podendo se tornar bem aprofundada.
As características particulares descritas distinguem os dois subsistemas
(mercado formalizado e mercado não-formalizado), diferenciando-se as diversas
situações de trabalho entre e dentre estes, mas é destacado que as condições do mercado
metropolitano de trabalho criam esses dois subsistemas, dotados de vantagens e
desvantagens relativas, que, na verdade, configuram um todo único.
O próprio autor aponta que a análise não ficaria completa sem algumas
referências às respectivas articulações. Neste sentido, enfatiza “o imenso turnover de
mão-de-obra entre os tipos de emprego/ocupação no interior de cada um, de que apenas
se excluem os empregos públicos. (Quanto a estes, o alto grau de segurança e o nível
relativamente alto de renda proporcionam vantagens que colocam seus ocupantes em
posição privilegiada; uma vez obtido um emprego público, normalmente ele só é
abandonado por aposentadoria)” (p. 47).
Há ainda um outro aspecto, a ser considerado, que se relaciona à possibilidade
de concomitância existente entre ocupações/empregos que oscilam, de um lado, na
estabilidade de um determinado emprego e, por outro lado, na complementação de
renda fornecida por outro tipo de ocupação/emprego, tais como os casos existentes de
“empregados (públicos e privados) que fazem biscates, trabalhadores por conta própria
que fazem biscates em outras profissões ou ‘empregadas domésticas’ que executam
‘serviços domésticos’ à noite ou nos fins de semana, etc.” (p. 51-52).
35
Esta oscilação entre a inserção dos membros da família alternando-se entre estes
dois subsistemas, bem como a concomitância de atividade em ambos, revela uma
estratégia de sobrevivência dos trabalhadores, pois, neste caso, do ponto de vista
orçamentário, a unidade econômica básica não é o indivíduo, mas a família. A tentativa
por parte da família é no sentido de garantir a sua reprodução, diminuindo possíveis
riscos existentes entre algumas situações de trabalho e auferindo ganhos maiores ou
complementares proporcionados por outras.
“Não há dúvida de que, do ponto de vista da situação de trabalho, há sempre um
salto implicado na passagem de uma para outra, mas ele é amortecido pelas condições
existentes no que se chamou aqui de ‘espaços limiares’ - cujo conceito procura
exatamente apreender essa interpenetração de situações de trabalho diversas. Esse
aspecto é um tanto menor no interior do MF e na passagem deste para o MNF, devido às
definições formais-legais das categorias, mas a limiaridade permanece por intermédio
dos diversos níveis e tipos de irregularidades e situações semi-legalizadas” (SILVA, p.
52).
Na distinção dos contextos diferenciados do MF e do MNF pode-se dizer ainda,
de forma simplista, que se encontra, de um lado, no MF, a questão da estabilidade e de
uma renda determinada por normas jurídicas e, de outro, no MNF, a tensão permanente
em busca de uma constante atividade e o nível de renda limitado pela habilidade
pessoal.
Ao discutir o modelo apresentado em sua utilidade e no significado do mesmo, o
citado autor destaca a distinção existente entre os campos do MF e do MNF e dentro
destes sub-campos, que seriam as categorias de emprego/ocupação, cujos contornos
estão caracterizadas por situações limiares, ou seja, pouco diferenciadas entre si.
Acrescenta que a caracterização destes campos é fornecida pela importância relativa de
certas características do mercado. “O fato de determinados traços definirem um
segmento ou um grupo de trabalhadores não implica necessariamente que é aí que eles
se manifestam. Assim, por exemplo, os laços de clientela não são exclusivos do MNF,
mas apresentam maior importância na maior organização e na dinâmica deste setor; por
outro lado, uma certa formalização jurídico-institucional não está ausente do MNF,
embora nele seja periférica, ao passo que essencial no MF” (p. 109-110).
Em suas conclusões, em relação à noção de estabilidade/instabilidade, é
observado que esta não pode ser entendida em termos jurídicos e formais, uma vez que
36
ocupações ‘inexistentes’ do ponto de vista jurídico-institucional podem ser estáveis, e
vice-versa. Desta forma, “a estabilidade do emprego/ocupação pouco tem a ver com os
níveis diferenciais de formalização nas diversas áreas do mercado de trabalho” (p.132).
4. Considerações sobre a origem do debate da informalidade
Em suma, ao se recapitular sobre a origem do tema da informalidade, percebe-se
que, desde o final dos anos 1960, esta questão constituía-se em objeto de preocupação
nos denominados países do Terceiro Mundo, sendo o principal ponto de debate o nível
de pobreza.
No início da década de 1970, já era salientado o papel desempenhado pelo setor
informal na sobrevivência da população pobre, sobretudo de áreas subdesenvolvidas.
Neste sentido, encontram-se os estudos produzidos no início da década de 1970, sobre o
Quênia e sobre Gana.
Foi verificado que as oportunidades de sobrevivência para a população menos
capacitada, em geral residente em áreas rurais, eram propiciadas, muitas vezes, nas
cidades, em ocupações específicas ou em determinadas atividades econômicas que
foram denominadas de “informais”. Estas podiam ocorrer ou como atividade principal
ou secundária de trabalho, constituindo-se em formas vitais de sustento de um
expressivo número de famílias.
Em estudo pioneiro no Brasil, sobre a informalidade, Silva destaca que, em sua
tese, referia-se ao ‘mercado formalizado’ e ao ‘mercado não-formalizado’ com um
sentido próximo ao produzido a partir dos referidos estudos de países africanos. A
perspectiva adotada enfatiza a participação e a integração ou não no sistema. A
dicotomia formal/informal indica a explicitação ou não das alternativas de
comportamento sob a forma de normas jurídicas, o que se traduz em uma menor
flexibilidade nos empregos ligados ao mercado formalizado. Em relação ao mercado
não-formalizado de emprego, um ponto importante apontado é a sua característica de
“invisibilidade”, pois existe independente do aparato jurídico-institucional, o que
aumenta a sua viabilidade econômica.
A oscilação da inserção das pessoas que compõem a família entre os
subsistemas, o formal e o informal, bem como o exercício concomitante de atividade em
ambos, revela uma estratégia familiar de sobrevivência dos trabalhadores que indica, de
37
um lado, a procura de estabilidade de um determinado emprego e, de outro, a
complementação de renda fornecida por outro tipo de ocupação/emprego.
Estas questões podem ser consideradas recorrentes, no cenário de hoje, quando
se constata a permanente tensão na vida do trabalho entre a autonomia, que se espera
obter, associada a uma expectativa de segurança. Acrescente-se ainda a permanência, na
atualidade, da existência de situações de trabalho, observadas no debate da origem da
informalidade, que se encontram no limiar entre os denominados campos
formal/informal.
Na PNAD atual, permanecem traços comuns, evidenciados no debate sobre a
origem da informalidade, em suas evidências empíricas a este respeito, referentes às
citadas estratégias de sobrevivência dos trabalhadores e à interligação entre as
atividades formais e informais. Entre outras questões, podem ser apontados não só a
investigação das pessoas em uma relação de trabalho formal ou informal, tarefa, muitas
vezes, não tão simples, como também o exercício de atividade em mais de um trabalho.
Além do mais, os tipos de ocupações dos trabalhadores por conta própria e os das
atividades domésticas, constantes das referidas estatísticas e objeto de estudo em estudo
pioneiro sobre a informalidade no país, constituem hoje, junto com outras categorias de
posição na ocupação, objeto importante para o entendimento do tema.
38
CAPÍTULO II
CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA INFORMALIDADE
Neste capítulo, busca-se discutir as formas como, ao longo do tempo, o
fenômeno da informalidade vem sendo estudado por vários autores, sob diferentes
enfoques e metodologias de análise, além das controvérsias suscitadas pelo tema.
É preciso destacar que o termo “informal” é aqui mencionado sob várias
denominações - setor informal, mercado não-formalizado, setor não-estruturado, entre
outras -, de acordo com a nomenclatura atribuída pelos autores que o analisam, a qual,
por sua vez, está freqüentemente relacionada às diferentes percepções que lhe são
atribuídas ao longo do tempo. Entende-se também que, além destas, traços comuns
perpassam os diversos períodos analisados, por meio de valores e representações que,
estando presentes, se agregam na passagem e/ou transformação de novas formas
capitalistas de acumulação.
Ao se procurar discutir historicamente a informalidade, tem-se como propósito
não apenas apresentar uma análise estruturada sobre o que vem sendo realizado ao
longo do tempo, mas também apontar as questões relevantes sobre este tema. Procurar-
se-á associar as concepções teóricas deste fenômeno às suas representações concretas,
que se constituem, em nosso caso específico, em um significativo alvo de análise.
No decorrer do tempo, tem se verificado que a percepção da informalidade vem
sendo apreendida através de marcos teóricos distintos, que, com objetivos diferenciados,
geram múltiplos objetos de estudo. Cacciamali (1999, p.1) enfatiza que os debates
teóricos e técnicos sobre a informalidade, embora possuam enfoques diversos, não
divergem nas suas áreas de domínio.
O primeiro deles está centrado na dinâmica capitalista da economia
contemporânea, suas mudanças estruturais e a geração de um processo de informalidade
que se manifesta de duas formas: (a) novas e recriadas articulações entre grandes
empresas e pequenos negócios e (b) manutenção de um espaço intersticial ocupado por
pequenos negócios e trabalhadores por conta própria para aqueles excluídos da nova
dinâmica. O segundo mostra aspectos relativos às diferentes manifestações de pequenas
unidades produtivas que, por operarem com pouco capital, além de outras restrições,
apresentam baixo nível de produtividade. Na verdade, estes dois enfoques se inserem
39
em uma única problemática, que, como ressalta a autora, é o cenário econômico
contemporâneo, com seu processo de acumulação, em sua dinâmica e características.
Cacciamali (1999, p. 2) aponta para o fato de que os anos 1970 mostraram,
sobretudo no caso brasileiro, que o crescimento econômico, ao mesmo tempo em que é
fundamental para ampliar as oportunidades econômicas e sociais dos mais
desfavorecidos, é, entretanto, insuficiente na criação de empregos e de circunstâncias
adequadas de trabalho e de renda para todos. A autora destaca a necessidade de
implementação, paralelamente ao crescimento econômico, “de um conjunto amplo de
programas sociais complementares e articulados entre si, como educação e capacitação
profissional; habitação e saneamento, saúde preventiva e higiene, etc.”.
A partir do reconhecimento da importância deste tema em economias como a
nossa, a discussão sobre o “mercado informal” esteve no centro das preocupações dos
estudiosos do mercado de trabalho no Brasil, sobretudo na década de 1970 (SILVA,
1971 e SOUZA, 1978), conforme já observado anteriormente e apontado em estudos
desenvolvidos sobre a questão do emprego, subemprego e desemprego no país, tais
como o de Rinaldi et alli (1991) e constantes do anteprojeto de revisão da Pesquisa
Nacional de Amostra por Domicílios (RINALDI; VIANNA; BRITO,1990.
Na década de 1970, Prandi (1978), ao analisar o trabalhador por conta própria,
procura entender o sentido desta categoria no contexto do processo de transformação da
sociedade, que é determinado pelas regras fundamentais da acumulação capitalista. No
seu entender, as relações de produção de molde tipicamente capitalista, bem como as
que não são assim de todo caracterizadas como tal, ou seja, não tipicamente capitalistas,
não se constituem como duas realidades independentes, operando conjuntamente. “Uma
não independe da outra na determinação de sua existência. Ambas estão determinadas
num só processo, que é o processo de acumulação do capital. Não é legítimo afirmar
que o trabalho por conta própria faz parte das relações de produção capitalista nem que
aquele tipo de relação de produção esteja fora do circuito capitalista de produção” (p.
155). Esta afirmação pode parecer paradoxal, na medida em que se afirma que o
trabalho por conta própria é um elemento de reprodução do capital, pois o contraponto,
normalmente considerado como expressão das relações capitalistas, é o trabalho
assalariado. A solução do paradoxo é apontada pelo autor, quando destaca que “o
trabalhador por conta própria não produz somente bens e serviços para o mercado de
bens e serviços mas produz também força de trabalho barata para o capital, colaborando
40
para a produção e reprodução do proletariado em geral. Sua participação na produção
capitalista não é imediata, da mesma maneira que não o é a participação de assalariado
não produtivo” (p. 156).
Ao comparar, em sua tese, a categoria de trabalhador assalariado, que aparece
como a expressão das relações capitalistas por excelência, com a de conta própria, que
não é identificada com o capitalismo, destaca que esta última: “não pode ser pensada
como algo anormal, impróprio, estranho às relações sob o capital, a menos que se
imaginasse que a única forma de exploração do trabalho pelo capital se desse através da
extração da mais-valia. Ora, a extração da mais-valia é a forma capitalista por
excelência da exploração do trabalho e o mecanismo fundamental para a acumulação
capitalista. Sendo, no entanto, fundamental, há que se investigar que outras formas de
exploração permitem uma melhor e mais rentável maneira de acumulação pela extração
do produto do sobretrabalho; e que relações de trabalho permitem e propiciam os
modelos de expansão da exploração capitalista do trabalho” (p. 156-157). Neste sentido,
é enfatizada a importância desta categoria não como algo “anormal”, mas inserida nas
relações sob o capital. “O problema do significado do trabalho autônomo deve ser visto
como elemento propiciador, não somente da acumulação em si, mas da reprodução da
sociedade brasileira como sociedade capitalista” (p. 35).
Prandi (p. 85) enfatiza que “na impossibilidade de vir a se transformar em
empregador, o trabalho autônomo traz em si a oportunidade de negar, pelo menos, a
condição de assalariado. Mas o trabalho por conta própria significa também a
possibilidade de trabalho para os que não conseguem ser assalariados”. Segue
concluindo que, no primeiro caso, o agente sai do mercado de trabalho por opção e, no
segundo caso, dele é expulso, sendo que, na prática, estes dois processos ocorrem
freqüentemente conjugados, o que, de modo simplificado, indica que a expulsão pode
estar mascarada pela opção, sendo que esta última só é possível se o trabalho específico
for socialmente útil. A possibilidade de opção, segundo o autor, assim é determinada.
“Quando o trabalho deixa de ser socialmente útil, ele é destruído ou coagido a se
deslocar para uma outra região em que ainda possa ser aproveitado”.
A distinção dos dois processos, quais sejam, a transferência do agente para o
trabalho por conta própria, seja esta caracterizada como “por opção” ou como “por
expulsão” - que parece ser mais facilmente identificada em um plano analítico -, não o
é, da mesma forma, na prática, com a conjugação destes processos que, conforme já
41
visto, aparecem, com freqüência, interligados. Isto porque, “muitas vezes, um deles
consiste na situação de fato, enquanto o outro atua como suporte ideológico daquele
fato” (p. 86), o que significa reforçar o fato de que a expulsão pode estar mascarada pela
opção. Além do mais, a transferência por opção só pode ser observada entre aqueles que
possuem algum treinamento profissional em atividades consideradas socialmente
necessárias.
A parte teórica de seu trabalho trata “do problema da articulação do trabalho
autônomo à estrutura das classes sociais, analisando-se seu significado no contexto das
mudanças sociais que redefinem as relações de trabalho e os mecanismos de
expropriação no capitalismo periférico, não se perdendo de vista que as mudanças
sociais são expressão do processo de acumulação do capital, e que este vem se dando no
Brasil por meio de uma estratégia definida através do rebaixamento do preço da força de
trabalho” (p. 20).
Na análise desenvolvida, a sociedade brasileira é o ponto de referência empírico,
considerando-se, em sua visão, que as próprias relações que ela pressupõe são
observáveis, ou seja, concretas. Como fontes de informação oficiais, foram utilizadas o
Censo Demográfico (1940, 1950 e 1970) e a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios) de 1972 e de 1973, além de pesquisa realizada em Salvador, em 1971.
Durante o trabalho, “certos achados empíricos vão dando melhor suporte às idéias
anteriormente postas” (p. 20), mas, à medida que novos problemas de ordem teórica são
introduzidos, torna-se necessário articular novos pontos de reflexão com a perspectiva
inicialmente assumida.
As variáveis que foram trabalhadas nas três pesquisas acima mencionadas
referem-se, somente à primeira ocupação, embora disponham de resultados sobre a
segunda ocupação. Cabe ressaltar que existem critérios para se determinar o trabalho
principal (nomenclatura utilizada na PNAD, atualmente, para denominar a primeira
ocupação) ou o secundário (nomenclatura utilizada para a segunda ocupação) de cada
pessoa e, dentro destes, localiza-se a ocupação exercida pela mesma. Como ressalta o
autor, o simples fato de um indivíduo exercer mais de uma ocupação já reforça, por si,
as teses defendidas ao longo da sua investigação. A idéia central desta tese é a de que “o
trabalhador por conta própria não produz somente bens e serviços para o mercado de
bens e serviços mas produz também força de trabalho barata para o capital, colaborando
para a produção e reprodução do proletariado em geral” (p. 156).
42
Nas estatísticas oficiais do país, tais como a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD), o trabalhador por conta própria é considerado como unidade de
análise, a qual é expressa como uma “empresa” sem empregados. Mas o que Prandi
pretende revelar é o fato de que esta categoria de autônomo expressa um trabalhador
que se insere no mercado de trabalho em busca de sobrevivência e na forma possível
que encontra para tal. Em termos bio-psico-sociais, este pode ser visto como a mesma
entidade encontrada quando se analisa a “empresa” sem empregados; no entanto, as
perspectivas, por vezes, nos parecem distintas e difíceis de serem conciliadas. O ponto
central da análise de Prandi - e que deve sempre ser ressaltado - é do trabalhador que,
apesar de seu papel de produtor de bens e serviços para o mercado, o faz em condições
desfavoráveis, sendo sua participação na produção capitalista não-imediata.
Um ponto de vista importante, também destacado pelo referido autor, ao se
referir à figura do trabalhador por conta própria como agente poupador e empreendedor,
é o de que este “faz parte tanto da própria história do capitalismo como da ideologia
motivadora para o trabalho empreendedor em si, mesmo hoje quando as condições
necessárias para permitir o acúmulo de um pecúlio como capital inicial se
transformaram profundamente. Em termos de volume deste capital inicial necessário ao
empreendedor, as possibilidades de realização como proprietário-empregador de um
trabalhador por conta própria são, na melhor das hipóteses, remotas. Sua negação
concreta como conta própria se realiza muito mais via assalariamento, o que não impede
que certos ideais de trabalho independente persistam. Na impossibilidade de vir a se
transformar em empregador, o trabalho autônomo traz em si a oportunidade de negar,
pelo menos, a condição de assalariado. Mas o trabalho por conta própria significa
também a possibilidade de trabalho para os que não conseguem ser assalariados” (p.
85).
Cacciamali (1990, p.834) enfatiza que, em relação a este período inicial de
estudos sobre o informal, as maneiras de mensuração divergiram, apoiando-se “tanto na
escolha da unidade de análise – ocupados ou estabelecimentos produtivos -, como nas
normas adotadas para extrair o setor informal a partir dessas duas categorias”. São
apontadas, entre estas, a diferenciação na análise segundo a contraposição de tipos de
atividade tradicionais/modernos, o tamanho do empreendimento determinado pelo
número de empregados (de 3 a 22) e da seleção das pessoas ocupadas por níveis de
rendimentos baixos (de ½ a 2 salários mínimos). Como ressalta a autora, “o setor
43
informal era caracterizado a priori e referido exclusivamente, e de uma forma agregada,
aos segmentos mais pobres da população ocupada”.
Em relação a este ponto, qual seja, o da pobreza urbana associada ao mercado de
trabalho, Coelho e Valladares (1982) realizaram uma análise bibliográfica na qual
destacam a trajetória de pensamento sobre esta questão nas grandes cidades latino-
americanas. Nesta, é destacada a influência sofrida em vários estudos do denominado
“modelo dualista” e da teoria da marginalidade, sobretudo até o início da década de
1970 e posteriormente à teoria da acumulação capitalista, que procurou compreender o
processo econômico por meio das formas de organização social da produção. O
principal foco de interesse desta resenha bibliográfica salienta os aspectos do mercado
de trabalho urbano ligados às atividades de tipo “informal” e ao trabalho não-
assalariado.
As referidas autoras destacam que, inicialmente, a temática do emprego, que
esteve centrada, nos estudos realizados, na discussão dos setores “tradicional” e
“moderno” do mercado de trabalho urbano, foi modificada, tendo-se como objeto as
diferentes formas de inserção desta população pobre em setores da economia. Esses
foram posteriormente denominados de “formal” e “informal”. “Uma nova linha de
estudos é paralelamente inaugurada, abordando a problemática do ângulo do trabalho e
das distintas formas de organização da produção. Tal perspectiva implicou no abandono
da idéia de setores e no privilegiamento da análise das formas produtivas e das relações
de trabalho ‘não tipicamente capitalistas’” (p. 5-6).
A concepção do setor informal surgiu, sobretudo, a partir das críticas a respeito
de um modelo dualista, que apontava a existência de setores diferenciados na economia
urbana de países menos desenvolvidos, e também das dificuldades de mensuração e de
explicação dos determinantes da pobreza urbana.
Sobre a perspectiva dualista, nos estudos realizados nas décadas de 1960 e 1970,
Silva (2002, p. 86) destaca que existiam duas variantes. A primeira delas, a “teoria da
modernização”, concebia o setor informal como aberto, apesar da maior facilidade de
entrada do que de saída. A segunda, surgida um pouco mais tarde, denominada de
“teoria da marginalidade”, destacava o setor informal como fechado, ou seja, algumas
categorias de trabalhadores terminavam por ter uma inserção produtiva marginal de
mais longo prazo.
44
Na "teoria da modernização", a situação de desequilíbrio, apresentada na
estrutura do emprego urbano dos países subdesenvolvidos, era percebida como
transitória, e o setor informal visto como tendo um importante papel na absorção da
mão-de-obra migrante. Esperava-se que esta população, deslocando-se para as cidades,
incorporasse paulatinamente os padrões moderno-industriais baseados em um trabalho
assalariado, abandonando, cada vez mais, os seus, mais tradicionais.
Silva (2002, p. 86) salienta que “um pouco mais tarde, as dificuldades do
processo de substituição de importações produziram uma versão menos otimista que, no
entanto, utilizava o mesmo quadro de referência e se concentrava nos mesmos
problemas. Tratava-se da ‘teoria da marginalidade’ que enfatizava as conseqüências
sobre a estratificação social, das dificuldades de superação dos desequilíbrios estruturais
identificados (Quijano, 1969, 1998; Machado da Silva, 1971; Kovarick, 1975; Germani,
1975)”. 6
Sem pretender esgotar a literatura existente sobre esta temática e nem mesmo
retornar a algumas questões já enfatizadas sobre a origem deste debate na década de
1970, cabe reforçar que, a partir deste período, a interpretação dualista incorpora, de um
lado, o reconhecimento de que estes dois setores, denominados como “tradicional” e
“moderno”, são inter-relacionados e interdependentes e, por outro, revela, em cada um
destes, uma acentuada heterogeneidade interna de sua estrutura produtiva. Coelho e
Valladares (1982, p. 6) ressaltam que “esta nova concepção fundamentou as noções de
Pobreza Urbana e de Setor Informal, que a partir de então dominaram a literatura sobre
o mercado de trabalho”.
Cabe ressaltar que esta discussão da abordagem dualista reflete a questão da
integração vis-à-vis àquela da não-integração das unidades produtivas na estrutura
econômica. Não se pode, assim, deixar de mencionar que, seguindo esta linha de análise
econômica, se situaram as pesquisas voltadas para a questão do subemprego, sobretudo
até o final dos anos 1960. Estas procuravam ressaltar, em linhas gerais, a questão da
6 Os trabalhos citados são: QUIJANO, Aníbal. “Notas sobre el concepto de marginalidad social”. Santiago, CEPAL, Comissão Econômica para a América Latina, Divisão de Assuntos Sociais, 1966; QUIJANO, Aníbal.“‘Marginalidad’ e ‘informalidad’ en debate”, in La economia popular y sus caminos en America Latina. Lima, Mosca Azul, 1998; SILVA, Luiz Antonio Machado da. “Mercados metropolitanos de trabalho manual e marginalidade”. Dissertação de mestrado, Museu Nacional/UFRJ, 1971, mimeo; KOVARICK, Lúcio. Capitalismo e marginalidade na América Latina. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975; GERMANI, Gino. El concepto de marginalidad. Buenos Aires, Ediciones Nueva Vision, 1973.
45
subutilização da mão-de-obra, especialmente aquela inserida no mercado de trabalho
urbano nos países que tiveram um processo de industrialização tardia.
O relatório do Quênia (EMPLOYMENT..., 1972), elaborado no início da
década de 1970, como destacam Coelho e Valladares (1982, p. 9) “recomendou a
transferência da temática do Subemprego para a de Pobreza Urbana ao se analisar a
economia dos países subdesenvolvidos. Esta alternativa ganhou relevância uma vez que
o conceito de Pobreza Urbana se mostra mais abrangente e menos limitado teoricamente
que o de subemprego”. Isto porque esta concepção traz implícito que “os pobres que
trabalham”, como observado no estudo do Quênia, não só o fazem em condições acima
de níveis ideais de utilização da mão-de-obra como também porque considera que estes
percebem remunerações consideradas abaixo do mínimo necessário para a sua
sobrevivência.
Seguindo este raciocínio anterior, a substituição de um conceito (subemprego)
por outro (pobreza urbana) visava ampliar a captação de várias situações indicativas de
um quadro de subutilização, bem como de sub-remuneração da mão-de-obra. Nesta
linha de análise, este novo conceito, o da pobreza urbana, teria que contemplar, além de
políticas, como a do combate do subemprego, que abrangiam o setor informal, as que
buscassem considerar casos existentes no setor formal, que incluem um contingente
expressivo de mão-de-obra considerada subutilizada.
Sobre a existência de ‘espaços limiares’, ou seja, pouco diferenciados entre si,
vale lembrar Silva (1971), destacando que este conceito procura apreender a
interpenetração de situações de trabalho diversas. Estas se revelam, conforme ressalta o
autor, em menor intensidade no interior do denominado mercado formalizado (MF) e na
passagem deste para o mercado não-formalizado (MNF), em função das definições
formais-legais das categorias, que são essenciais neste mercado formalizado, mas não
exclusivas deste. No entanto, “a limiaridade permanece por intermédio dos diversos
níveis e tipos de irregularidades e situações semi-legalizadas” (p. 52).
Segundo Coelho e Valladares (1982, p. 10), “as pesquisas e estudos realizados
por técnicos da OIT e PREALC na África e América Latina e por economistas do IPEA
e do INPES no Brasil deram status a essa nova abordagem”. As autoras destacam que a
problemática do setor informal, discutida pelos economistas do IPEA e do INPES, teve
a sua origem no interesse destes na questão da distribuição de renda e emprego, que se
46
constituía em objeto central de estudo pelos economistas, na década de 1970, vinculados
ao Ministério do Planejamento.
Sob o patrocínio do Instituto de Planejamento da Fundação IPEA, do Programa
Regional de Emprego para a América Latina e Caribe (PREALC) e da Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, “representantes dessas e de outras
entidades governamentais e universitárias do Brasil, de organizações internacionais e de
diversos países latino-americanos participaram em Brasília, em setembro de 1974, de
um encontro em que discutiram temas ligados às políticas de emprego e analisaram
metodologias e conceitos atualmente utilizados na obtenção de informações sobre a
situação do emprego” (SEMINÁRIO SOBRE SISTEMAS DE INFORMAÇÃO...,
1975, p. III).
A coletânea de trabalhos apresentados apontou a necessidade da informação
adequada, confiável e periódica para o planejamento e tomada de decisões na área do
emprego. Entre eles, encontrava-se uma síntese dos estudos realizados no PREALC,
sobre a medição da subutilização da mão-de-obra urbana em países da América Latina,
além de estudo sobre a figura do "biscateiro", associada à "marginalidade" e ao
"subemprego".
Os trabalhos relativos ao Brasil, constantes no referido Encontro, procuraram
avaliar o Sistema de Informações existente, quanto à sua adequação para a prática de
emprego, seguindo o desenvolvimento de estudos e pesquisas que revelassem mais
sobre a situação da força de trabalho num contexto em rápida transformação.
A estratégia do governo brasileiro, adotada no 2o Programa Nacional de
Desenvolvimento (PNUD), tinha como instrumentos principais a política de emprego e
a salarial, com o objetivo de alcançar a promoção do bem-estar e a construção de uma
sociedade mais igualitária. A perspectiva, conforme anunciada por Élcio Costa Couto,
então presidente do IPEA e secretário-geral da Secretaria de Planejamento da
Presidência da República, era de que novos empregos fossem gerados distribuídos
setorialmente e regionalmente, “de forma a reduzir tanto o ritmo da migração rural-
urbana como também aumentar as oportunidades de trabalho no Nordeste, região que
sabidamente concentra os maiores problemas sociais do País. É de se esperar, também,
que em resposta a esta demanda de mão-de-obra, eleve-se a taxa de atividade na
população brasileira reduzindo, portanto, a subutilização de mão-de-obra que
47
certamente existe em parcelas da população inativa” (SEMINÁRIO SOBRE
SISTEMAS DE INFORMAÇÃO.., 1975, p. 3).
Silva (2002, p. 85) destaca, no entanto, que a noção de informalidade teve peso
expressivo de análises realizadas, sem necessariamente estarem vinculadas às propostas
de políticas públicas, estando sua importância na mediação entre a reflexão acadêmica e
a intervenção prática.
A abordagem do setor informal, segundo os economistas do PREALC, é vista
em termos de uma análise da estrutura econômica global, com a pressuposição de que o
seu surgimento pode ser relacionado ao modelo de desenvolvimento característico dos
países latino-americanos nas últimas décadas. Segundo este enfoque, as atividades
informais representam um modo de produzir, com características, em geral, como a
denominada “facilidade de entrada”; a presença de recursos próprios; as empresas de
propriedade familiar; a operação em pequena escala; a mão-de-obra pouco qualificada e
os mercados não-regulados e competitivos. Além do mais, o denominado setor informal,
neste entender, corresponde a ocupações específicas ou a determinadas atividades
econômicas.
Atualmente, existe, no entanto, a crítica relacionada ao fato de que deve ser visto
com um certo grau de relatividade as condições apontadas como importantes para o
funcionamento do informal. Pode ocorrer que cada uma destas não necessariamente se
cumpra em sua totalidade, como, por exemplo, a facilidade de entrada, a existência de
recursos próprios e assim por diante. Cacciamali (1993, p. 218) aponta que os estudos
empíricos, realizados sobre este tema, revelam que “cada uma dessas condições pode vir
a criar um conjunto de atividades informais, cujas características organizacionais e de
funcionamento podem não cumprir as demais condições enunciadas”.
Em estudo publicado no final da década de 1970, por meio do PREALC,
Raczynski (1977, p. 6) destaca que, nas áreas urbanas dos países pobres, um dos grupos
mais importantes, para o qual se deveriam destinar esforços, no sentido de desenvolver
as atividades que o constituem, deveria ser o denominado setor informal ou não-formal
urbano. Tal procedimento levaria “a um maior nível de emprego, uma distribuição mais
igualitária de rendimento e, em médio e longo prazo, uma melhor alocação de recursos”.
É ressaltado que, às vezes, este setor informal é denominado também como não-
protegido e não-estruturado.
48
Neste documento, um dos objetivos do referido autor é o de sistematizar as
perspectivas de investigações sobre o setor informal urbano, nas economias em
desenvolvimento, observando o conceito e as variáveis utilizadas para defini-lo. Isto
porque, entre estas, já havia não só contradições, como também imprecisão de
conceitos, ao se tentar postular a existência de um setor formal e de outro informal.
Aliado a este fato, há o de que algumas hipóteses cotejadas não apresentavam respaldo
empírico, não podendo ser consideradas, como de fato o eram, como comprovações
científicas. Tal procedimento suscitava dúvidas quanto à utilidade do enfoque,
dificultando a formulação de políticas eficazes.
As três perspectivas principais sobre este tema, encontradas por Raczynski, são
as de: (a) aparato produtivo; (b) emprego e mercados de trabalho e (c) rendimento e
bem-estar social. De acordo com estas, a unidade de análise adotada é, respectivamente,
a da empresa, a da força de trabalho e a da família. Os dois primeiros recortes (aparato
produtivo e emprego e mercados de trabalho) são os que mais se destacam, ao se
analisar a literatura internacional sobre o setor informal, constituindo-se, assim, em
nosso objeto preferencial de análise.
Sob o enfoque do aparato produtivo, o setor informal é definido como um
conjunto de unidades ou de empresas com determinadas características relacionadas à
unidade produtiva propriamente dita, como tamanho, forma de organização, além de
outras relacionadas à tecnologia, aos recursos humanos e à forma de inserção no sistema
econômico global. “O interesse recai sobre os fatores que limitam e aqueles que
estimulam o crescimento e contribuição destas atividades ao produto nacional” (p. 8).
Tokman (1987), referindo-se ao informe sobre o Quênia (EMPLOYMENT...,
1972), ressalta que as conclusões daquele estudo apontavam que um conjunto
significativo de subempregados trabalhava em múltiplas atividades, conseguindo
sobreviver em condições desfavoráveis. A partir desta constatação, procurou-se
examinar não só o tipo de trabalho realizado, mas também a sua constituição, que
ocorria, sobretudo, em operações unipessoais. O trabalho passou a ser identificado como
a unidade de produção.
Tendo em vista a perspectiva do aparato produtivo, “é empresa toda entidade
que produz, vende ou comercializa bens ou entrega serviços, emprega ou não mão-de-
obra, utiliza ou não bens de capital, dispõe ou não de um lugar determinado para
desenvolver suas atividades. Também é empresa a atividade que, produzindo para o
49
mercado, é realizada por um trabalhador independente ou por um grupo familiar”
(RACZYNSKI, 1977, p. 10).
Ao se discriminar as características apresentadas pelas unidades componentes do
informal, estar-se-ia procurando conceituar este setor a partir das mesmas e, por
conseguinte, estas seriam opostas àquelas pertencentes ao setor formal. No entanto,
pode-se questionar a pertinência dos elementos classificatórios adotados, usualmente, na
definição de unidade informal de produção.
O primeiro destes, tal como já relacionado, refere-se ao fato de que,
normalmente, seria denominado como informal, a empresa que fosse composta por um
trabalhador independente, ou seja, por trabalhadores por conta própria ou também
denominados autônomos, que não contratam mão-de-obra ou que, quando o fazem, é
somente em caráter esporádico. No entanto, este critério não pode ser considerado como
característica exclusiva de definição da unidade informal. Isto porque algumas empresas
compostas por trabalhadores independentes são também encontradas no âmbito das
atividades formais. Cabe ressaltar, ainda, que, nas estatísticas oficiais domiciliares do
país (tais como o Censo Demográfico, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
– PNAD, a Pesquisa Mensal de Emprego – PME e a Pesquisa Informal Urbana –
ECINF), da Fundação IBGE, este tipo de trabalhador pode ter sócios e/ou ajuda de
trabalhadores não-remunerados. Mas se, momentaneamente, na data da pesquisa,
contratar mão-de-obra (no caso, empregados), passa a ser considerado não mais como
trabalhador autônomo, mas como empregador.
Um segundo critério tido como definidor de uma unidade de produção informal,
seguida por vários estudos a este respeito, é o relativo ao tamanho ou escala de
operações de uma empresa. Segundo este, esta seria composta não só por trabalhadores
independentes (autônomos ou por conta própria), mas também por unidades de
produção pequenas (podendo ser considerada como pequena uma unidade que ocupe
entre 3 a 50 pessoas) 7.
Pode-se questionar que, dentro desta perspectiva do aparato produtivo, se o
citado critério é importante na classificação das unidades informais, a problemática
pode se reduzir, conforme destaca Raczynski (1977, p. 11), somente à concorrência
entre as grandes e pequenas empresas. Além do mais, deve-se ressaltar que esta noção
7 A classe de pessoas ocupadas em uma pequena unidade produtiva é também variável, como apontado por outros autores, como Cacciamali (1990), podendo se situar entre 3 a 22 pessoas.
50
de ‘tamanho’ é ambígua, pois, como bem enfatizado por Silva (1971, nota 9, p. 25) “não
há relacionamento necessário entre, por exemplo, o valor da produção, a área do
estabelecimento e o volume de capital, ou entre este e o número de empregados, etc.”.
É também apontada, além da forma de organização, a diferenciação existente entre as
unidades formais versus as informais, o fato de que nas organizações formais
predominam critérios de maximização de lucros, enquanto nas informais existe a
influência de considerações sócio-familiares.
Este critério de tamanho é utilizado, atualmente, em estatísticas oficiais do país,
como é o caso da Pesquisa da Economia Informal Urbana (ECINF) da Fundação IBGE,
na qual o conceito do informal adotado refere-se às características das unidades
econômicas, entendidas como unidades produtivas, seguindo recomendações
internacionais (CONFERENCIA INTERNACIONAL DE ESTADÍSTICOS DEL
TRABAJO, 1993). O setor informal é entendido como composto por todas as unidades
econômicas, as quais podem ser tanto a atividade principal como secundária de seus
proprietários (os trabalhadores por conta própria ou os empregadores com até cinco
empregados) moradores de áreas urbanas.
Uma terceira característica, considerada importante na unidade de produção
informal, é, em geral, a escassa qualificação profissional da mão-de-obra, que teria uma
associação direta com a tecnologia empregada. Além do mais, Raczynski (1977) aponta
que, para outros autores, o que está em pauta não é a qualificação ou a não-qualificação,
mas a sua natureza, que difere nas unidades produtivas informais e nas formais. Nas
unidades produtivas informais, o trabalho tende a ser artesanal na produção de um bem
e/ou prestação de serviço, envolvendo, de forma global, atividades não só de produção
como também as referentes, entre outras, à administração e à supervisão. Nas unidades
formais predominam os processos de produção em cadeia, com a especialização de
tarefas dentro de um conjunto, sendo as exigências requeridas na produção de um bem
e/ou prestação de serviço realizadas de forma excludente e diferenciada.
Outros critérios também são adotados para estabelecer a definição de uma
unidade de produção informal, em contraponto com a da unidade formal. Um deles diz
respeito, de um lado, ao fato de, na unidade informal, se ter uma organização muitas
vezes difusa, com um caráter pessoal, estabelecida por meio de relações, familiares, de
parentesco ou de amizade, o que se reflete em uma divisão do trabalho menos nítida.
Por outro lado, a unidade formal apresenta uma organização mais definida, com uma
51
clara divisão de trabalho e atribuições que refletem a organização hierárquica
estabelecida, sem a presença de traços pessoais, como pode ocorrer na unidade
informal. Em associação com este traço de definição, encontra-se aquele, já
mencionado, sobre a racionalidade econômica, que define para as unidades formais um
papel significativo na maximização de lucros, diferenciado do encontrado das unidades
informais, nas quais há a interveniência de fatores sócio-econômicos.
“Neste nível descritivo das unidades produtivas, a distinção formal-informal
representa formas organizativas específicas. Sem dúvida, a simples enumeração de
características, sem uma análise de como elas se inter-relacionam e condicionam, não é
suficiente para inferir a organização do trabalho típica de um e outro setor”. Segue
acrescentando, em função de estudos examinados na década de 1970, que “o estado
atual das investigações não permite ainda determinar as características organizacionais
necessárias e/ou suficientes para estabelecer a informalidade ou formalidade de uma
empresa” (RACZYNSKI, p. 14).
A preocupação em se delimitar, de modo claro, os critérios definidores da
formalidade ou da informalidade, tais como tamanho, mão-de-obra empregada,
tecnologia, qualificação da força de trabalho, estrutura organizacional e produtividade,
permanece até hoje nos estudos que tentam estabelecer, em função das variáveis
mencionadas, um quadro nítido a este respeito. Mesmo que, a partir desta década,
vários estudos tenham procurado analisar um perfil nítido do fenômeno da
informalidade, existem questões que persistem relacionadas ao inter-relacionamento
entre os campos formal e informal.
Esta inter-relação dificulta o delineamento dos contornos do formal e do
informal, estando referida não só às transações comerciais de bens e serviços, aos
deslocamentos de mão-de-obra entre estes, mas também à influência da estrutura do
rendimento de um setor sobre a do outro. Além deste fato, uma produção empírica
adequada será sempre um retrato parcial da realidade, satisfatório ou não, dependendo
da qualidade dos instrumentos utilizados nesta produção, que estão, por sua vez,
atrelados ao quadro de referência utilizado. Neste sentido, uma medição adequada deve
garantir uma correspondente produção de evidência empírica.
Em termos do enfoque do aparato produtivo, pode-se apontar que os critérios
normalmente usados para diferenciar o setor formal e o informal, dizem respeito: (a) ao
tamanho das unidades produtivas, distinguindo que as pequenas empresas são as
52
informais; (b) à legalização das empresas, entendendo que as que não estejam
registradas, sejam as informais; (c) ao salário pago nas empresas, concluindo-se que as
empresas são consideradas informais se este estiver situado abaixo do mínimo legal; (d)
à contribuição social, havendo a determinação de que as empresas que não a realizam
são as informais. É necessário destacar que estas características não têm sido
consideradas necessariamente aplicáveis como um todo, pois, conforme anteriormente
mencionado, há a necessidade de se verificar as inter-relações por estas apresentadas e
suas conseqüências para a delimitação da organização do trabalho que seria específica
de um e de outro setor.
Sob a perspectiva do emprego e dos mercados de trabalho, o setor informal é
definido, em geral, como um subconjunto da população economicamente ativa e/ou das
ocupações. Neste caso, o foco central é o do emprego e a absorção da mão-de-obra
aliada à distribuição das oportunidades existentes de ocupação e à adequação entre os
fatores condicionantes da oferta e da demanda de trabalho.
Tendo em vista o referido enfoque, o setor informal tem sido encarado como um
mercado de trabalho de fácil entrada, com uma força de trabalho percebendo baixos
rendimentos e com uma escassa qualificação. Entretanto, esta condição relacionada à
facilidade de entrada irá depender, no caso da contratação de mão-de-obra no setor
informal, não só de fatores associados à pressão da força de trabalho em busca de
emprego, como também dos interesses envolvidos por aqueles que são membros das
unidades produtivas informais. Além deste fato, a hipótese de facilidade de ingresso dos
trabalhadores no setor informal tem implícita uma associação entre a perspectiva de
emprego e dos mercados de trabalho com a exposta anteriormente, qual seja, a do
aparato produtivo, tendo em vista que as empresas informais absorveriam mão-de-obra
do mercado de trabalho correspondente. “No caso dos trabalhadores dependentes, a
facilidade de entrada encontra-se relacionada com a probabilidade de ser contratado;
depende, portanto, do ritmo de absorção da força de trabalho nestas atividades e dos
critérios de seleção ou discriminação dos empregadores. No setor formal, o ritmo de
contratação da mão-de-obra depende da demanda por produtos, da acumulação de
capital e da tecnologia das unidades produtivas” (RACZYNSKI, p. 20).
Em geral, os critérios operacionais mais adotados desde o início dos estudos da
informalidade, segundo a perspectiva do emprego e dos mercados de trabalho, são os
relacionados à classificação da força de trabalho em categorias, que dizem respeito ao
53
que seria hoje denominado pelas estatísticas como posição na ocupação (empregado,
trabalhador por conta própria, empregador, não remunerado etc.), a qual é, muitas vezes,
complementada com a informação sobre o tamanho da unidade produtiva na qual se
insere o trabalhador. Neste sentido, denominam-se como pertencendo ao mercado de
trabalho informal aqueles trabalhadores que são, em geral, por conta própria, não-
qualificados e vinculados às pequenas empresas; segundo o critério do nível de salários,
os com baixa remuneração, (ou seja, os que recebem abaixo de salário mínimo legal
estabelecido), bem como os que, segundo a condição de acesso à contribuição para a
previdência social e de benefícios sociais, não usufruem de tais benefícios.
Raczynski (p. 8) ressalta que as três perspectivas, quais sejam, (a) aparato
produtivo; (b) emprego e mercados de trabalho e (c) rendimento e bem-estar social “são
complementares, no sentido de que a segmentação da economia urbana em nível do
aparato produtivo condiciona a que se observa no mercado de trabalho, e vice-versa, e
estas duas por sua vez incidem sobre aquela que vigora na distribuição do rendimento e
do bem-estar social”.
Um ponto importante, que nos aproxima da questão investigada, ou seja, da
avaliação das variáveis estatísticas, que são selecionadas como importantes para uma
correspondente e adequada produção de evidência empírica, em relação ao problema da
investigação da informalidade, é o fato de que, de um lado, esses enfoques, muitas
vezes, se entremeiam ou se superpõem. Por outro lado, qualquer que seja a perspectiva
adotada, os critérios que permitem definir os contornos do informal, freqüentemente,
estão pouco explícitos, dificultando uma avaliação do que é e do que não é heterogêneo.
Na perspectiva que privilegia os mercados de trabalho (formal e informal),
muitas vezes, as variáveis ou dimensões que os delimitam, que estão relacionadas às
suas características, não são, com exatidão, configuradas. Da mesma forma, os fatores
que determinam a expansão ou não destes mercados, elos existentes entre estes etc. não
são, freqüentemente, conhecidos.
Ante os pontos levantados, cabe o questionamento das diferenças, que
demonstrariam, na verdade, a heterogeneidade e a segmentação nas diversas
perspectivas apresentadas: aparato produtivo, mercados de trabalho e rendimento e
bem-estar social. Raczynski considera que, mais importante do que verificar as
discrepâncias quantitativas entre estas, seria apurar as descontinuidades nítidas e
permanentes em cada uma destas. Tais análises implicariam em verificar o fenômeno
54
em um dado momento do tempo e a permanência de segmentos da população ao longo
do tempo. Destaca que uma outra versão se encontra expressa no debate ocorrido entre a
relação que deveria existir entre a variância dentro de cada setor (formal e informal) e a
variância entre os mesmos.
Sobre este aspecto, é preciso ressaltar estudo apresentado no início da década de
1980 (SOUZA; SILVA, 1981, p. 691), no qual os autores pretendem investigar duas
hipóteses comumente realizadas: “a primeira afirma que a mobilidade entre os setores
informal e moderno é negligível. Esta hipótese é comum a várias das teorias sobre
dualismo no mercado de trabalho. Mas não é essencial para caracterizar o dualismo,
pois este pode ocorrer devido apenas à rigidez salarial do setor moderno”. A segunda
delas refere-se à hipótese que “descreve o setor informal como tendo uma estrutura
ocupacional pouco diferenciada e, mais importante, cujos empregos são distribuídos
independentemente da educação e experiência dos trabalhadores. Estas variáveis seriam
irrelevantes, a primeira porque os empregos nunca requerem maior escolaridade e a
segunda porque a elevada rotatividade da mão-de-obra e a reduzida possibilidade de
promoção retiram as vantagens usualmente atribuídas à experiência”.
Souza e Silva (1981) utilizaram, para verificar estas hipóteses, no caso
brasileiro, os dados da PNAD de 1973, que contempla, em suplemento deste mesmo
ano, informações sobre o tema da mobilidade social. Em função dos resultados obtidos,
os autores ressaltam, em suas conclusões, que houve rejeição das hipóteses existentes na
literatura sobre o dualismo no mercado de trabalho. Isto porque se constatou, de um
lado, a existência de uma extensa mobilidade inter-setorial, o que, por conseguinte,
levaria “a rejeitar uma componente importante de algumas teorias, dualistas: a
segmentação dos mercados de trabalho”. Por outro lado, foi destacado que “não apenas
encontramos uma ampla diferenciação na estrutura ocupacional do setor informal como,
e mais importante, ficou patente que educação e experiência desempenham um papel
inequívoco na obtenção de maior status ocupacional dentro do setor informal” (p. 732).
A importância desses resultados para uma política educacional é enfatizada
pelos autores, tendo em vista que a educação é fundamental, no sentido de possibilitar a
ampliação das oportunidades individuais de trabalho, pois poderia propiciar a
mobilidade inter-setorial e um status ocupacional mais elevado para os que permanecem
no setor informal.
55
Souza e Silva fazem, ainda, considerações importantes, ao questionarem se serão
obtidos resultados semelhantes no futuro. Entre estas, enfatizam, de um lado, que, de
forma geral, a intensidade da mobilidade inter-setorial depende da taxa da urbanização e
da taxa e do padrão do crescimento econômico. Além do mais, afirmam que, em função
de o processo de urbanização encontrar-se atrelado à migração rural-urbana, a taxa de
urbanização deve diminuir, fazendo com que o mesmo ocorra, em termos relativos, com
os fluxos migratórios. De outro lado, salientam que a repercussão da introdução de
modernas tecnologias no campo pode trazer conseqüências, no sentido de acelerar a
liberação de mão-de-obra.
As citadas conclusões permanecem importantes e atuais, mostrando a
importância do denominado setor informal na absorção da mão-de-obra e a necessidade
imperiosa de uma política que procure contemplar, cada vez mais, a capacitação da
mão-de-obra, para que esta possa estar mais apta a ser inserida no mercado de trabalho,
como vemos a seguir: “de qualquer forma, deve-se esperar um menor crescimento do
setor moderno no futuro próximo. O crescimento do setor informal depende, de um
lado, dos fluxos migratórios e de outro da ampliação das vagas no setor moderno.
Portanto, não se deve esperar um decréscimo acentuado no seu tamanho relativo. Daí, a
importância de políticas que venham a aumentar a renda dos seus participantes como as
políticas educacional e de treinamento” (p. 733).
Na busca de se tentar compreender como os estudos realizados sobre a
informalidade vêm procurando associar as concepções teóricas às representações
concretas do mesmo, apresenta-se, abaixo, um quadro referente à década de 1970,
semelhante, de forma geral - mas não em todos os aspectos (tais como o peso do status
migratório, que era outrora fortemente associado à informalidade) - com o que é
utilizado, até hoje, como base de análise desta informação.
56
Quadro I - Estudos sobre o setor informal urbano na América Latina Definição operacional Variáveis consideradas Tamanho
do setor para caracterizar o do setor País, cidade Fonte de informação setor
Paraguai, Pesquisa Setor autônomo: Ramo de atividade. 57% dos Assunção de domicílios trabalhadores por Categoria na ocupados (PREALC, PREALC, 1973 conta própria; traba- ocupação, de
1974) lhadores em empresas idade, educação, Assunção com menos de 5 pessoas, status migratório, trabalhadores ocasionais rendimento. e domésticos Tipo de trabalhador (remuneração fixa, flutuante, ocasional)
República Censo de População Produtividade do Ramo de atividade, 22 a 24% Dominicana (1970) e pesquisa de setor econômico: ocupação, tipo de do
(OIT, mão-de-obra (1975) inferior a 50% da trabalhador emprego 1975) produtividade média (remuneração fixa, urbano do
flutuante, ocasional). país Rendimento-pobreza
El Salvador, Pesquisa demográfica Setor informal: ocu- Idade, sexo, 46% dos San Salvador e de mão-de-obra na pados no serviço educação, ocupados (PREALC, área metropolitana doméstico; trabalha- status migratório, de San
1975) de San Salvador, dores ocasionais; ramo de atividade, Salvador PREALC 1974, trabalhadores por rendimento. dados censais e um conta própria com Análise mais censo dos vendedores menos de 13 anos detalhada do centro da cidade de educação e ocu- de vendedores do pados em empresas setor informal. de até 4 pessoas
Peru Censos, pesquisas de Categoria na ocu- Rendimento, 53% da (Webb, mão-de-obra, contas pação e tamanho da tendências através PEA em 1975) nacionais e outras unidade produtiva: do tempo. Lima
fontes secundárias unidades com menos Ramo de atividade. 62% da PEA de 5 pessoas, traba- Categoria na em outras lhadores por conta ocupação, migração, cidades própria não profis- sexo, idade, 37% do ren sionais e técnicos educação. dimento to- tal de Lima 40%do ren- dimento total de 8 cidades
57
Equador Pesquisa de Rendimento: inferior Ramo de atividade. 52% da
(PREALC, Domicílios, 1968 ao salário mínimo Categoria na ocupação.PEA urbana 1976) Status migratório. algo maior
Idade, sexo, educação, nas cidades posição no domicílio, do interior tipo de trabalhador do que em (remuneração fixa, Guayaquil
flutuante, ocasional. e Quito Brasil, Pesquisa de mão-de- Setor não protegido: Posição no domicílio, 31% da
Belo Horizonte obra da área metropo- PEA total registrada idade, sexo. da PEA da (Merrick, litana especialmente no Censo menos os Taxa de participação cidade
1976) desenhada para estu- que trabalham nas econômica. dar a estrutura dos unidades produtivas Rendimento familiar. mercados de trabalho que contribuem para Status migratório. e tabulações espe- a seguridade social, Educação. ciais sobre migração os professores libe- História ocupacional e participação econô- rais, os empregados de chefes do domicílio mica do Censo de do setor público e os População de 1970 empregadores de uni- dades de mais de 5 pessoas
Argentina Entrevistas semiestru- Trabalhadores por Tamanho do capital. Não tem por Schmukler turadas a trabalha- conta própria Natureza dos vínculos objetivo
1976 dores por conta pró- somente do ramo têx- com empresários capi- estimar o pria na indústria têxtil til e de confecções talistas. tamanho e de confecções do setor
Venezuela Informe de uma Setor não-organizado: Atividade econômica, 44%da força (Pereira e Zink, missão organizada empresas com menos sexo, idade e de trabalho
1976) pelo Banco Mundial, de 5 pessoas empregadas; educação urbana total 1975 trabalhadores por conta 40% da ft de própria sem educação Caracas universitária e serviço 47% da ft doméstico de zonas
urbanas menores
Bogotá Pesquisa de Setor informal: ausência Análise comparativa 15% das (Ofisel, 1976) domicílios de ou quase inexistência dos 4 tipos tipos unidades de
rendimento de trabalho assalariado. de unidades produtivas. produção são sócioeconômico Classifica as unidades . Ramo de atividade. do tipo 1; 28% médio e baixo produtivas em que .Características da do tipo 2; 31% (menos de 500 pesos trabalha a PEA em estrutura ocupacional. do tipo 3 e de 1971) 4 tipos segundo tamanho . Especialização produ- 25% do tipo 4.
58
e grau de organização. tiva. Os tipos 1 e 2 .Divisão do trabalho. se aproximariam do . Intensidade de explo- setor informal. ração via fator trabalho. .Condições de trabalho. . Compra de insumos. . Venda de produtos. . Qualificação e salários.
Colômbia, Estudo antropológico Número e tipo de uni- Não tem por Bogotá de: dade; de onde obtém objetivo
(Peattie, 1976) a) Unidades produtivas insumos e preços estimar o em um bairro marginal. destes; a quem vendem tamanho do b) Ocupações especí- (mercado) e como fixam setor ficas típicas do setor: os preços. vendedores ambu- Formas de organização lantes do centro da e propriedade. cidade. Rendimento. Contabilidade-planifi- cação. Relação economia da empresa e economia familiar. Licenças. Organização-controle das ruas.
Chile Diversas fontes secun- Não explicita a definição Ramo de atividade. 42% do emprego
(Tokman, 1977) dárias: Contas Nacio- operacional do setor. Intercâmbios comerciais urbano nais, Censos de popu- entre setor informal, e 29% do
lação 1970, Censo formal e rural. emprego Industrial 1967, total do país. pesquisa na pequena 21% da indústria 1967, produção pesquisa de urbana e orçamentos familiares 17% da 1967 e de rendimentos produção total 1969 e outras. do país. Pesquisa em estabele- Estabelecimentos Competição entre os 19% do valor cimentos comerciais pequenos versus estabelecimentos. agregado. formais e informais de supermercados. Formas de organização produtos alimentícios e em Ñunoa, 1976. limitantes tecnológicas. Sálarios-rendimentos. Preços-insumos. Preços-produtos. Fonte: RACZYNSKI, Dagmar - El sector informal urbano: interrogantes y controversias. Santiago: PREALC 1977. 56p. págs. 40-43.
59
Em relação ao problema investigado, qual seja, a realidade observada e as
estatísticas que a procuram retratar, percebe-se em um dos estudos pioneiros
(EMPLOYMENT...,1972, p. 5) que o quadro existente no Quênia contrasta
profundamente com o que se traduz nas aproximações estatísticas. Os problemas
crescem, seja na mensuração da força de trabalho, seja na mensuração do emprego. Em
relação à força de trabalho, o problema reside em sua definição, tendo em vista ser esta
uma questão difícil, dado que as oportunidades são limitadas para o emprego,
particularmente para as mulheres. Nesse aspecto, as estatísticas são incompletas, pois,
apesar de abranger a maior parte do emprego assalariado e do auto-emprego nas firmas
mais organizadas, não contemplam uma série de assalariados e de pessoas auto-
empregadas, que são categorizadas como pertencendo ao ‘setor informal’.
Silva (2002, p. 90) salienta que “a configuração do debate sofre uma profunda
transformação ao longo dos anos 1980. O crescimento do desemprego e a crise da
social-democracia, a expansão de atividades empresariais e de uma economia de
mercado, já anteriores ao desmonte final da URSS, a acelerada expansão da força de
trabalho no setor de serviços e sua importância cada vez maior para a acumulação (Offe,
1989a e 1989b)8, tanto em âmbito global, quanto nacional, tudo isso vinha provocando
efervescência na controvérsia sobre os usos sociais do trabalho”.
O quadro, apresentado por Silva, ilustra que, na imagem da social-democracia,
havia uma evidência, baseada em uma tendência real, de que o pleno emprego seria uma
meta viável. No entanto, a noção da informalidade era retratada mais em função do que
não era, do que por uma unidade interna dos fenômenos aos quais esta categoria poderia
estar referida. A percepção sobre a realidade das social-democracias européias, que era
tomada como parâmetro, não o deveria ser, pois mesmo que a informalidade porventura
existisse nesses países, a realidade encontrada em países considerados
“subdesenvolvidos”, de “capitalismo dependente” ou “periféricos” era outra. Nestes
últimos, o assalariamento não se constituía no ponto central na inserção dos
trabalhadores na atividade econômica, sendo este restrito ou mesmo precário, não só do
ponto de vista da regulação e proteção estatal das relações de trabalho quanto em termos
de sua participação na produção econômica.
8 Os trabalhos citados são: OFFE, Claus. Capitalismo Desorganizado. São Paulo, Brasiliense, 1989a e Trabalho e sociedade. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1989b, 2 vols.
60
Silva (nota 43, p. 91) ressalta que se tratava “de uma construção coletiva que se
revelou tão complexa quanto frágil, tendo sido muito afetada pelo pessimismo que
marcou a experiência da crise dos anos 80. Em linhas gerais, as mudanças no
enquadramento analítico e na relevância cognitiva da informalidade estão relacionadas à
perda de confiança na viabilidade histórica do pleno emprego, tanto como um padrão
abstrato de referência para entender as formas de uso social do trabalho, quanto como
cimento ideológico da legitimidade política e como critério de planejamento. De fato, à
medida que os problemas de absorção produtiva do trabalho avolumavam-se nos países
centrais, estes deixavam de representar parâmetros, transformando-se, eles também, em
objeto de análise da ‘informalidade’ do trabalho. Retomando a metáfora do jogo de
espelhos, a noção de informalidade não se determinaria mais como uma imagem
invertida; trata-se, agora, de uma regressão de reflexos sobre reflexos que desfoca seu
conteúdo, ao mesmo tempo em que generaliza seu uso e multiplica as tematizações
particulares nas quais ela aparece”.
Em linhas gerais, na década de 1980, a idéia que prevalecia, a respeito do
conceito sobre informalidade, era a de que este setor seria formado como resultado da
exclusão de um determinado contingente da população do mercado de trabalho formal.
Neste caso, a dinâmica do processo informal de trabalho esteve sempre associada àquela
do mercado de trabalho capitalista, que, em momentos de crise econômica, expulsava
uma parcela da população das relações de trabalho denominadas formais. A partir deste
processo, tal segmento da força de trabalho foi visto como marginalmente inserido na
economia capitalista, bem como no processo de integração social.
Cacciamali (1990, p. 834) destaca, comparando com os primórdios dos estudos
realizados sobre o tema, que o conceito de dicotomia foi re-nominado, ou seja, de
tradicional/moderno para formal/informal, conforme foi anteriormente destacado. No
entanto, ressalta que “a maior parte das análises sobre o tema continuaram a adotar uma
abordagem dual-estática que confronta com os processos dinâmicos e muitas vezes
muito velozes, do produto e do emprego dos países em desenvolvimento. Muitos
estudos, além do mais, continuaram a interpretar os dois setores como sendo
independentes um do outro, o que nitidamente, contraria as observações do mundo real.
Neste contexto, o setor informal é ainda associado aos segmentos mais pobres da
população ocupada sem levar em conta as formas de inserção do trabalhador na
produção, o que violenta e descaracteriza o próprio conceito de informalidade exposto
61
no trabalho original 9. Assim, a maior parte das análises a partir, e em virtude, deste
quadro de racionalização concluía que o setor informal tendia a desaparecer com o
crescimento econômico”. Segundo a autora, conforme ressaltado neste estudo, tal
afirmação “não possui respaldo lógico ou sustentação empírica”.
Meneleu Neto (1993, p. 830), ao utilizar os dados da pesquisa do SINE/CE
(Sistema Nacional de Emprego/ Ceará), corrobora também este pensamento, quando
aponta um crescimento da ocupação informal já no período de 1986 a 1992, na medida
em que se expandia o desemprego, revelando que aquela apresentava um movimento
anticíclico ao da economia. Ao destacar que o crescimento do informal advinha não só
da crise como também da recuperação da economia, o autor ressalta que “esta aparente
contradição resulta, em grande parte, da atual amplitude do conceito do informal, que
engloba categorias típicas de estruturas ocupacionais com resquícios pré-capitalistas – o
informal tradicional – e novas categorias que, na ausência de caracterização mais
precisa, são colocadas no informal, e desse modo inflacionando os indicadores de
informalidade. No primeiro caso, o informal cresce com a crise, mas no segundo ele
cresce duas vezes: ou com a crise ou com a expansão”. O autor destaca, ainda, como
variáveis importantes para as novas tendências do informal, as mudanças no mercado de
trabalho, provocadas pelas alterações qualitativas da demanda por força de trabalho,
pela tendência de queda do emprego industrial e pelas formas de terceirização. Na
verdade, o autor ressalta que estas fronteiras dos denominados mercados de trabalho
formal/informal, de difícil delimitação, não estão se apresentando de forma tão rígida e
as transformações que estão ocorrendo no processo de trabalho e no gerenciamento da
força de trabalho parecem ocasionar um aumento do trabalho em tempo parcial, do
trabalho domiciliar, da terceirização, entre outras tendências.
Ao se analisarem, anteriormente, as principais perspectivas correntes, no que
tange à análise do informal, destacam-se aquelas que dizem respeito à unidade de
produção (enfoque da empresa) e a que se refere ao enfoque do ponto de vista do
trabalhador (da força de trabalho). Segundo as recomendações internacionais, foi
adotada como resolução a definição do setor informal a partir da organização e do
funcionamento do empreendimento econômico (CONFERENCIA INTERNACIONAL
DE ESTADÍSTICOS DEL TRABAJO, 1993).
9 A autora refere-se ao trabalho EMPLOYMENT, incomes and equality: a strategy for increasing productive employment in Kenya. Geneva: International Labour Office, 1972. 600 p.
62
Em estudo recentemente apresentado, Hussmanns (2001, p. 3) tem como
objetivo apresentar elementos de uma rede de conceitos que torne possível unir medidas
estatísticas do setor informal, ou de emprego no setor informal, com medidas estatísticas
de emprego informal. O autor pretende tornar mais claros os conceitos sobre setor
informal e emprego informal, entendendo que um não substitui o outro e que, por vezes,
a falta de compreensão, em relação a estes pode estar relacionada à dificuldade de
entendimento das diferentes unidades de observação que estão envolvidas (empresas ou
trabalhos).
O propósito é o de construir uma matriz que procurasse relacionar o emprego
total, buscando associar o setor de emprego (que poderia ser o informal ou outro setor) à
relação com o emprego, a qual, no caso brasileiro, é a variável posição na ocupação
(trabalhadores por conta própria que produzem para o mercado, trabalhadores voltados
para o autoconsumo, empregadores, não-remunerados e empregados). A matriz tem
como objetivo mostrar a relação entre o conceito de emprego no setor informal
(definido em termos das características das empresas) e o conceito de emprego informal
(definido em termos das características dos trabalhos).
O referido autor enfatiza que o limiar entre os setores formal e informal torna-se
cada vez menos nítido. O setor informal é considerado um segmento dinâmico da
economia e do mercado de trabalho. Diante de um contexto de crescimento econômico
sem emprego, com constantes crises e demanda por trabalho altamente qualificado pelas
empresas do setor formal, observa-se, em vários países, não só o crescimento do setor
informal como também alterações em suas características, visando a se adaptar às
mudanças ocorridas. Este tipo de explicação insere esta questão dentro de um raciocínio
mecanicista, no sentido de que o fenômeno estudado se altera para se adaptar a um
determinado contexto econômico.
Salienta ainda que a tendência ao aumento da informalização do setor formal se
processa de modo paralelo ao processo de transformação do setor informal e que este,
também conhecido como informalização do emprego, está estreitamente relacionado
com o aumento da globalização da economia. A necessidade das empresas do setor
formal de atender à competição estabelecida no mercado faz com que estas recorram a
diversos arranjos de trabalho, que mesclam a observância de formas regularizadas do
trabalho com a utilização daquelas que são atípicas, irregulares, precárias etc.
63
Na preparação da 15a Conferencia Internacional de Estadísticos del Trabajo
(1993), os especialistas destacaram, em Encontro realizado em 1992, que, em muitos
países, estava ocorrendo um crescimento intenso em várias formas do emprego
denominado não-estruturado, incluindo-se, como tal, trabalhos de pequeno porte,
trabalhos casuais, emprego precário, trabalho familiar não-remunerado etc. Este
aumento foi tido como estreitamente relacionado com o do setor informal.
Visando aplicar a metodologia desenvolvida por Hussmanns à realidade urbana
brasileira, Jorge e Valadão (2002) desenvolveram um trabalho, utilizando as estimativas
de pessoal ocupado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) para os
anos de 1997 e de 1999. As conclusões ratificaram as tendências de crescimento
significativo do total de emprego no setor informal, entre 1997 e 1999, o mesmo não se
verificando nos outros setores, pois, praticamente, não houve crescimento do total do
emprego nos mesmos.
Hoje, segundo Antunes (2001), as características principais da classe
trabalhadora apontam, em escala mundial, entre outras, para: (a) uma redução do
operariado fabril, estável, típico da fase taylorista e fordista e, de forma paralela a esta,
(b) um enorme aumento do assalariamento e do proletariado precarizado em escala
mundial (em regime de tempo parcial, terceirizado, subcontratado, vinculado à
economia informal, ao setor serviços, em trabalhos assalariados temporários, o que
ocorreu paralelamente à redução dos empregos estáveis) e, finalmente (c) um aumento
de seus níveis de desemprego, paralelo à expansão dos assalariados no setor de serviços
em geral. Verificou-se, portanto, o que este autor denominou de uma significativa
heterogeneização, complexificação e fragmentação do trabalho.
É importante entender quais são as transformações que estão acontecendo no
mundo contemporâneo do trabalho, seus significados e suas principais conseqüências.
“No que diz respeito ao mundo do trabalho, pode-se presenciar um conjunto de
tendências que, em seus traços básicos, configuram um quadro crítico e que têm sido
experimentadas em diversas partes do mundo onde vigora a lógica do capital”
(ANTUNES, 2001, p. 209).
O referido autor enfatiza que “a década de 80 presenciou, nos países de
capitalismo avançado, profundas transformações no mundo do trabalho, nas suas formas
de inserção na estrutura produtiva, nas formas de representação sindical e política”. Esta
foi uma fase de grande desenvolvimento tecnológico, caracterizada pela automação e
64
por mudanças na organização do mundo fabril, com repercussões nas relações de
trabalho e de produção do capital. Indica que “o fordismo e o taylorismo já não são
únicos e mesclam-se com outros processos produtivos (neo-fordismo e neo-taylorismo),
sendo em alguns casos até substituídos, como a experiência japonesa do ‘toyotismo’,
nos permite constatar”. As conseqüências deste processo apontam para formas
transitórias de produção, verificando-se, muitas vezes, de maneira drástica, repercussões
nos direitos do trabalho. “Estes são desregulamentados, são flexibilizados, de modo a
dotar o capital do instrumental necessário para adequar-se à sua nova fase” (p. 210).
Esse novo padrão de produção, denominado por alguns de modelo “pós-
fordista”, teve reflexos na forma de as empresas produzirem. Analisando a
reestruturação industrial nas principais economias do Norte, como Estados Unidos,
Canadá etc., Villela (1994, p. 5) aponta que este modelo se caracteriza “por uma
crescente desverticalização das empresas, que procuram se especializar na produção
dentro de rígidos padrões internacionais de produtividade, qualidade, tempo de entrega
e apoio aos clientes. Em termos de sua constituição, as empresas ajustadas a este novo
‘paradigma’ caracterizam-se por uma estrutura menos hierarquizada, mais flexível,
reduzindo a distância entre os profissionais da administração superior e o chão de
fábrica”. Com a desverticalização das empresas industriais, há uma promoção da
denominada onda da terceirização e as empresas tornam-se mais aptas para reduzir os
seus custos e enfrentar a concorrência interna e de produtores estrangeiros. Este
movimento de globalização, da acentuação da concorrência, teve repercussões intensas
no mercado de trabalho, no sentido de provocar um aumento do desemprego, sobretudo
na Europa, que foi agravado pela recessão internacional já no início da década de 1990.
Iniciou-se um processo de reorganização do capital e de seu sistema ideológico e
político. Seguiu-se um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho.
Essa fase de reestruturação produtiva do capital tem levado, em escala mundial, ao
desemprego estrutural, bem como à precarização do trabalho, de modo ampliado.
A classe trabalhadora participa diretamente do processo de valorização do
capital, por meio não apenas do trabalho produtivo, mas também daqueles tidos como
improdutivos, ou seja, cujas formas são utilizadas como serviço, não se constituindo
como elemento diretamente produtivo do processo de valorização do capital. O trabalho
improdutivo é consumido como valor de uso e não como trabalho que cria valor de
troca. Reconhecendo a existência de um elo constante e crescente entre estes dois tipos
65
de trabalho no capitalismo contemporâneo e que estes são fundamentais no estudo do
trabalho sob o capitalismo, uma noção ampliada dos trabalhadores deve considerá-los
no que hoje se entende como a classe trabalhadora.
Este processo, ocorrido em nível mundial, teve repercussões na economia
brasileira, com reflexos no mercado de trabalho. A abertura comercial, observada no
início da década de 1990, que coincidiu com o momento recessivo da economia do país,
trouxe mudanças na forma da produção das empresas e provocou determinados
fenômenos, como a terceirização, que passaram a ter um forte impulso, a partir de 1990.
No entanto, ao lado destas mudanças inegáveis que estão ocorrendo no mundo
do trabalho, levando a uma reorganização da vida econômica em escala mundial, com
reflexos em nível nacional, é importante destacar a posição de Silva (1998, p. 60), que
enfatiza as duas faces do trabalho e o desequilíbrio havido no tratamento destas para se
compreender o momento atual. Este autor ressalta que “é claro que o mundo do trabalho
está no olho do furacão destas mudanças e tem concentrado as atenções de todos,
especialistas e leigos. Entretanto, o interesse tem se mostrado fortemente unilateral,
enfocando a questão a partir dos resultados materiais do trabalho, isto é, da riqueza
produzida e sua distribuição. Aliás, talvez fosse melhor dizer ‘a pobreza produzida’,
relembrando Marx, dado que é incontestável o aumento da desigualdade e da pobreza
em todo o mundo. O peso do debate sobre esta dimensão tem limitado a consideração
sobre ‘o outro lado’ do trabalho, qual seja, sua característica de importante elemento de
integração social – e aqui o outro fundador da moderna ciência social a ser relembrado é
Durkheim que não se cansou de insistir sobre este ponto”.
Silva destaca a interligação existente entre este processo de reorganização do
trabalho e os aspectos da estrutura social. Neste sentido, indica que ao observamos a
“desconstrução” do assalariamento, este último termo significa não simplesmente uma
forma contratual das relações de trabalho, mas um regime de organização social da
produção. Salienta dois principais aspectos de suas transformações, significativos para a
questão da integração social: (a) o processo de terciarização e (b) a contrapartida social
das características dos empregos ofertados e a estrutura do mercado.
Em relação ao primeiro ponto, qual seja, a terciarização, talvez o mais
importante deles, Silva (p. 60) ressalta a sua contrapartida social, que “é um movimento
de ‘desobreirização’, na medida em que o trabalho fabril encontra cada vez mais
dificuldades para se manter como referência central na organização da existência de
66
crescentes contingentes de trabalhadores. Além disso, se autores como Claus Offe têm
razão, a semelhança formal das relações de trabalho na indústria e nos serviços –
contrato de trabalho assalariado – esconde diferenças substantivas nos conteúdos das
atividades realizadas, e dificulta o reconhecimento de que os serviços tornam-se cada
vez mais uma condição da produção industrial, não sendo mera conseqüência da
expansão desta, como se costumava pensar”.
No que diz respeito ao segundo ponto, considera-se ter havido, mesmo nos
países como o Brasil, que se caracteriza por uma mais fraca regulação estatal das
relações de trabalho, uma redução das relações de trabalho legalmente protegidas. “A
esta ‘informalização’ - que é, ao mesmo tempo, jurídica e política, pois reduz o poder de
barganha dos trabalhadores - corresponde também a uma ‘informalização’ de boa parte
da reprodução material, com a provisão não-mercantil da cesta de consumo expandindo-
se visivelmente” (p. 60). Ressalta que estes fatos repercutem na estrutura da família, que
é, na verdade, a principal mediação entre produção e consumo. Enfatiza que, hoje em
dia, “projeta-se a imagem do ‘novo trabalhador’ como um ser que substitui a carreira
em um emprego assalariado de longo prazo pelo desenvolvimento individual através da
venda de sua força de trabalho em uma série de ocupações contingentes, obtidas através
da demonstração pública da disposição e competência para atividades e condições de
trabalho em constante mudança, isto é, como empresário de si mesmo” (p. 65).
Em relação ainda ao perfil que se espera do trabalhador atual, Olímpia e Rolim
(2000, p. 26) destacam que este “deixa de estar relacionado ao clássico padrão da mão-
de-obra barata, caracterizada por operários sem formação, enclausurados em sua
atividade específica e alienados de todo o resto da produção. O novo paradigma
demanda um profissional que apresente sólida formação básica generalista e que tenha
capacidade de aprendizado e versatilidade para atuar conforme a velocidade das
mudanças tecnológicas”. As mudanças no mundo do trabalho geraram uma tendência de
terceirização e de precarização das relações de trabalho e, conforme apontam estes
autores (p. 25), “com a conseqüente superação da antiga expectativa de apenas um
emprego para toda a vida. Onde antes havia vínculo empregatício, hoje, para uma parte
considerável dos trabalhadores no primeiro mundo, encontramos contrato de prestação
de serviços, ou seja, o trabalhador autônomo”.
Na década de 1990, tem-se ainda o fato de que o informal demonstrou estar
crescendo mesmo em períodos de crescimento econômico, evidenciando que outros
67
fatores devem ser buscados como explicativos para este fenômeno. Conforme Valadão
(2000, p.1), por intermédio da análise da Pesquisa da Economia Informal Urbana
(ECINF), da Fundação IBGE, é justamente neste período de tempo que este setor tem
sido apontado como o segmento que mais cresce, sobretudo nos centros urbanos, o que
tem sido atribuído às crises pelas quais tem passado o denominado mercado formal de
trabalho. “Os resultados desta pesquisa mostraram que no Brasil, em outubro de 1997,
existiam 9.477.973 empresas informais, a maior parte na região sudeste, que ocupavam
12.870.421 pessoas entre as quais trabalhadores por conta própria, pequenos
empregadores, empregados com e sem carteira de trabalho assinada e trabalhadores não
remunerados”.
Valadão (p. 20) ressalta, por meio dos resultados da referida Pesquisa, que o
setor informal empregava cerca de 25% da população ocupada no setor urbano no Brasil
em 1997. Aponta que se, de início, os proprietários procuravam este setor pela
dificuldade de obter emprego, sobretudo no caso dos homens, 62% já estavam havia
mais de três anos neste e tinham como meta expandir sua atividade, em função do
rendimento aí obtido. As atividades preponderantes deste setor estavam situadas no
comércio (26%) e nos serviços de reparação, pessoais, domiciliares e de diversão
(20%), o que se corroborou nas grandes regiões brasileiras, sendo o comércio mais
significativo, chegando a representar 1/3 das atividades nas regiões Norte e Nordeste. O
setor informal absorve, em proporções expressivas, segmentos da sociedade menos
qualificados, com a maior parte dos proprietários possuindo apenas o primeiro grau
incompleto.
A importância desta área temática é constantemente percebida por estudiosos e
foi alvo de um seminário (WORKSHOP..., 1997), tendo originado várias pesquisas
empíricas a este respeito. Júnior e Fernandes (2000, p. 42), comentando a relevância
deste evento, destacam que “trata-se, evidentemente, de um processo contínuo de
amadurecimento em torno da compreensão do fenômeno e de sua ‘complexificação’ ao
longo do tempo, na medida em que ele se cristaliza como um dos principais eventos da
atual configuração do mercado de trabalho no Brasil”. Ao analisar os dados da PNADs
da década de 1980 e 1990, observaram, em linhas gerais, a tendência já mencionada de
que, na década de 1990, houve um crescimento relativamente independente do estágio
cíclico da economia dos trabalhadores classificados como integrantes do conjunto de
relações atípicas ou informais de trabalho. Neste estudo, foram assim classificados os
68
trabalhadores sem carteira, os por conta própria e os trabalhadores não-remunerados,
que foram denominados como núcleo pouco estruturado. Em relação ao período de
tempo anterior, de 1981 a 1990, o mais visível é um certo acompanhamento dos núcleos
estruturado (composto pelos empregados com carteira de trabalho assinada e pelos
funcionários públicos civis e militares) e pouco estruturado ao comportamento cíclico
da economia brasileira.
A tendência referida foi medida por meio da comparação das taxas de variação
do pessoal ocupado por posição na ocupação, das categorias que compõem os
respectivos núcleos, de 1981 a 1998 das PNADs/IBGE e das taxas de crescimento real
médio do PIB e destas em termos per capita da Fundação Getúlio Vargas neste mesmo
período de tempo.
Júnior e Fernandes (p. 46) apontam, entre outros, para dois fatores que podem
estar relacionados ao aparente descolamento do mercado de trabalho brasileiro aos
ciclos internos do produto desde 1992: (a) o processo de abertura comercial externa e
(b) a elevação das taxas de desemprego aberto e sua permanência em níveis elevados
por longos períodos na década de 1990. O primeiro deles levou a um processo de ajuste
e de racionalização produtiva, o que, associado com a ausência ou ineficácia de políticas
públicas para garantir a renda e a proteção social dos trabalhadores e dos
desempregados, fez com que a determinação do emprego fosse motivada mais pelo lado
da oferta excedente de força de trabalho. De tal fato resultou um aumento das atividades
do setor terciário da economia, em período recente, sobretudo o comércio e serviços
pessoais, “a ponto de se atribuir ao segmento terciário a importante função de colchão
absorvedor do excedente estrutural de mão-de-obra do país”. O segundo fator pode
indicar, segundo os autores, uma certa estagnação da demanda por trabalho, o que se
supõe estar impedindo que ocorram determinadas mudanças no emprego por posição na
ocupação, caso o crescimento econômico fosse estabelecido em patamares mais
elevados e sólidos do que os atuais.
Rivero (2000, p. 2), ao analisar os processos de informalização no Rio de
Janeiro, formula a hipótese “de que os indivíduos escolhem seu trabalho, levando em
conta as características do mercado e as possibilidades que este lhes oferece, assim
como fazendo uma auto-avaliação subjetiva das próprias características, ou seja, o que
eles têm para oferecer ao mercado. Iremos mais longe ainda supondo que as escolhas
69
não estão motivadas só pela razão econômica (a renda), mas também por fatores extra-
econômicos”.
Na Pesquisa da Economia Informal Urbana (ECINF), da Fundação IBGE,
realizada em 1997, a opção pela permanência no setor informal é declarada, mesmo que
os trabalhadores tenham de trabalhar um número maior de horas que os do mercado
formal e sem garantias trabalhistas. Na Constituição de 1988, ocorreram mudanças que
impuseram um aumento dos encargos das empresas com os seus trabalhadores. Neste
sentido, o processo de terceirização pode, muitas vezes, ser entendido pelo fato de
muitas empresas preferirem, para se desobrigarem desta exigência, optar pela
contratação de determinados serviços oferecidos por pequenas empresas, privilegiando,
sobretudo, o crescimento do setor informal.
Um aspecto importante em nosso estudo torna-se, mais do que somente verificar
a diversidade existente na conceituação do informal, desvendar os novos significados,
as categorizações e as articulações que estão presentes no debate sobre o tema, tendo
sempre em vista as transformações provocadas no mundo do trabalho pela globalização
do capital. No entanto, para se iniciar uma reflexão a este respeito, torna-se importante,
anteriormente, ressaltar as observações de Silva (2002) sobre a própria noção de
informalidade que vem sendo considerada como um “quase-conceito” e como, ao longo
do tempo, tem se tornado empiricamente tão confusa e analiticamente tão ambígua.
Considerações sobre as perspectivas teóricas da informalidade e sua
representação ao longo do tempo
A discussão da informalidade ao longo do tempo, sem pretender contemplar a
extensa bibliografia existente a este respeito, buscou associar as concepções teóricas
deste fenômeno às representações concretas que são realizadas em torno do mesmo.
Foram destacadas as perspectivas de investigações sobre o setor informal
urbano, nas economias em desenvolvimento, observando o conceito e as variáveis
utilizadas para defini-lo. O recorte de emprego e mercados de trabalho, cuja unidade de
análise é a da força de trabalho, é o utilizado na PNAD, sendo nosso objeto preferencial
de análise, o qual, juntamente com o do aparato produtivo, é dos mais recorrentes, até
hoje, na literatura sobre a informalidade.
70
A forma de mensuração, da época inicial dos estudos sobre a informalidade,
apresenta ainda alguns pontos em comum, envolvendo a questão conceitual e os
conceitos utilizados, quando comparada com a da realidade atual. Persiste até hoje a
divergência quanto à escolha da unidade de análise, que pode estar referida seja às
relações de trabalho das pessoas ocupadas, caso da PNAD, seja aos estabelecimentos
produtivos.
É necessário destacar que estes enfoques podem não ser estanques,
entremeando-se ou superpondo-se. Além deste fato, independentemente da perspectiva
adotada, muitas vezes, os critérios que definem a informalidade estão pouco
explicitados. Acrescente-se ainda que a coexistência dos setores formal e informal, as
inter-relações entre estes, a heterogeneidade interna de cada um e os limites pouco
nítidos entre os mesmos impõem desafios importantes para se obter, cada vez mais, uma
adequação da conceituação da informalidade a uma correspondente mensuração desta
questão.
A preocupação em se delimitar, de modo claro, os critérios definidores da
formalidade ou da informalidade, tais como - tamanho, mão-de-obra empregada,
tecnologia, qualificação da força de trabalho, estrutura organizacional e produtividade -
permanecem até hoje nos estudos que tentam estabelecer, em função das variáveis
mencionadas, um quadro nítido a este respeito.
O debate a respeito da informalidade sofre uma profunda transformação ao
longo dos anos 1980, pois havia uma evidência, baseada em uma tendência real, de que
o pleno emprego seria uma meta viável nos países desenvolvidos, o que não se
comprovou na realidade. Os problemas de absorção produtiva do trabalho cresceram
nos referidos países e a informalidade não constitui hoje somente uma especificidade
daqueles com um menor nível de desenvolvimento sócio-econômico. Nos países
denominados de “subdesenvolvidos”, o assalariamento já não se constituía como um
padrão de referência, tanto em termos de contingente de população trabalhadora
envolvida na atividade econômica como também do ponto de vista das relações de
trabalho reguladas e protegidas pelo Estado.
A partir desta ruptura no padrão estabelecido dos países desenvolvidos, com os
reflexos sentidos posteriormente também em nosso país, discute-se hoje a necessidade
de se repensar as mudanças processadas na noção da informalidade e em sua análise por
71
esta ter sido, sempre vista, de forma geral, como o contraponto das relações de trabalho
apresentadas pelo citado modelo de referência.
De um lado, grande parte das análises sobre o tema da informalidade, muitas
delas baseadas em dados estatísticos oficiais, ainda adota uma abordagem dualista das
relações de trabalho formal e informal, enfocando o informal em contraponto a um
padrão formal de trabalho, contrariando as observações produzidas sobre o mundo real,
que mostra, cada vez mais, a interação entre ambos. Por outro lado, é importante
observar até que ponto as evidências empíricas, produzidas pelas estatísticas, estariam
reforçando este tipo de enfoque ou teriam que procurar traduzir as novas questões no
mundo do trabalho, que sinalizam, neste campo, a existência de um novo paradigma
estabelecido.
72
CAPÍTULO III
NOVOS SIGNIFICADOS DA INFORMALIDADE OU RECONSTRUÇÃO
DE UM TEMA HISTÓRICO?
Na busca da compreensão dos novos significados da informalidade, em função
das complexas transformações provocadas pela globalização do capital no campo do
trabalho, torna-se necessário destacar a questão da reestruturação produtiva e a da
organização social. É preciso enfatizar que, mesmo se reconhecendo a realidade
diferenciada em nível mundial - sobretudo quando se confronta o caso brasileiro com os
dos países desenvolvidos -, as tendências encontradas neste universo mais amplo, de
forma geral, se encontram refletidas, em nosso espaço geográfico, sempre com uma
defasagem histórica e marcadas por diferenças de escala.
Na freqüentemente complexa análise deste tema, serão percebidas as
conseqüências e as semelhanças sociais e econômicas deste processo de transformação,
iniciado anteriormente em países desenvolvidos, encontradas, hoje, no Brasil,
acentuando as dificuldades crescentes, em termos nacionais, de absorção de mão-de-
obra. Reconhece-se que estas mudanças, embora possam não ser determinantes da
questão da informalidade, em nosso país, se encontram aí demonstradas, ressaltando,
muitas vezes, as novas formas de inserção deste contingente no mercado de trabalho.
Silva e Chinelli (1997, p. 25) enfatizam que a noção de informalidade ganha
novos significados, a partir dos anos 1980, em função das dificuldades de absorção do
trabalho nos países centrais e do reconhecimento da existência de outras formas de
inserção na estrutura produtiva não-vinculada, muitas vezes, ao status legal da atividade
e/ou dos atores. A partir deste fato, a referida noção “participa como elemento-chave de
interpretações fortemente contrastantes a respeito do impacto das tendências
mencionadas na estrutura do mercado de trabalho e suas conseqüências sociais”.
Acrescentam que “paralelamente ao amplo reconhecimento de uma forte tendência à
terciarização da atividade econômica, também se tem produzido consenso a respeito da
tendência mundial ao crescimento do desemprego e à precarização do emprego
assalariado (piores condições de trabalho; rebaixamento dos níveis salariais;
‘flexibilização’ das relações de trabalho, isto é, terceirização; maior facilidade de
rompimento dos contratos; etc.). Para descrever o impacto de todos estes processos
73
sobre a estrutura do mercado tem-se recorrido cada vez mais freqüentemente à idéia de
‘informalização’” (p. 24-25).
Silva (1996, p. 15) já destacava a referida questão observando, sobretudo a partir
da crise dos anos 1980, que “em linhas gerais, as mudanças no enquadramento analítico
da informalidade estão relacionadas à perda de confiança na viabilidade histórica do
pleno emprego, tanto como padrão abstrato de referência para entender as formas de uso
do trabalho, quanto como cimento ideológico da legitimidade política e como critério de
planejamento. De fato, à medida que os problemas de absorção produtiva do trabalho
avolumam-se nos países centrais, estes deixavam de representar parâmetros,
transformando-se, eles também em objeto de análise da ‘informalidade’ do trabalho.
Retomando a metáfora do jogo de espelhos, a noção de informalidade não se
determinaria mais como uma imagem invertida; trata-se, agora, de uma regressão de
reflexos sobre reflexos que desfoca seu conteúdo, ao mesmo tempo que generaliza seu
uso e multiplica as tematizações particulares nas quais ela aparece”.
Em linhas gerais, pode-se destacar, em relação às referidas mudanças, que se
iniciou um processo de reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político,
seguido de um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho. Essa fase
de reestruturação produtiva do capital tem levado, em escala mundial, ao desemprego
estrutural, bem como à precarização do trabalho de modo ampliado. A reestruturação
produtiva do capital, que se desenvolveu em escala mundial a partir dos anos 1970, teve
como conseqüência, para o Brasil, uma redefinição deste em relação à divisão
internacional do trabalho, bem como o estabelecimento de uma nova definição de
inserção no sistema produtivo global, afetando as relações de produção do país e, por
conseguinte, as de trabalho que vêm ocorrendo ultimamente.
De modo geral, verificou-se um aumento do desemprego e do trabalho por conta
própria, além da redução do emprego de forma geral, mas que afetou, em particular, o
emprego industrial. Destaca-se, ainda, uma mudança nos contratos de trabalho
assalariado, levando a um incremento do trabalho por tempo determinado ou em tempo
parcial, assim como perdas de garantias legais e de cobertura social. Estes eventos
provocaram um afastamento do modelo de emprego.
É justamente a mudança observada no paradigma do emprego que torna a
discussão da informalidade com acentuada importância no cenário atual dos estudos que
focalizam a inserção dos grupos de trabalhadores no mercado de trabalho. O
74
assalariamento, embora seja ainda uma referência importante na análise da inserção da
população no mercado de trabalho, tendo sempre sido visto como uma meta a ser
atingida, passa, cada vez mais, a não vigorar como um padrão absoluto, reconhecendo-
se a importância de outras atividades dos trabalhadores.
Cabe salientar, no entanto, que grande parte da literatura especializada sobre a
informalidade continua a estabelecer como parâmetro o assalariamento no estudo da
inserção da população no mercado de trabalho. Tal fato se reflete nas informações
estatísticas oficiais, tais como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD),
que teve sua origem, em 1967, baseada em padrão norte-americano de estatísticas, o
Projeto Atlântida, fundamentado em concepções de sociedade com base no trabalho
assalariado, traduzindo um modelo de emprego tipicamente capitalista.
A noção da informalidade não é uma tarefa fácil, mas a partir dos anos 1980
delineia-se uma mudança, não só de forma, pois a informalidade era percebida como
uma variação do padrão central, já referido, mas também de conteúdo, vista como
associada ao subdesenvolvimento, à pobreza e à periferia do capitalismo (Silva, 1996, p.
16). Este autor ressalta que “forte sintoma desse novo estatuto é a crescente tendência a
conceber a informalidade em termos de ‘práticas’ ou ‘atividades’, e não mais como
‘setores’”.
Tendo em vista este cenário, um primeiro aspecto importante, para o nosso
problema de investigação, é o de desvendar os novos significados, as categorizações e
as articulações no debate da informalidade, tendo sempre presentes as transformações
provocadas no mundo do trabalho pela globalização do capital. Reconhece-se a
diversidade ainda existente na conceituação do informal, mas é necessário ressaltar que
pode estar ocorrendo, nos estudos sobre a referida questão, não uma transformação total
da noção de informalidade anteriormente adotada, mas talvez uma ampliação de seu
campo semântico ou ambos os casos. É nesta linha de análise que Silva e Chinelli
(1997, p. 25) desenvolvem o seu raciocínio, ao se reportarem ao fato de que “mesmo
sem aprofundar a questão, é oportuno salientar que também acreditamos que o debate
aponta antes para uma ampliação do campo semântico da noção, do que propriamente
para um deslocamento de seu significado anterior e que, como veremos adiante, há
evidências que sustentam ambos os usos”.
Os referidos autores (p. 26) ressaltam que a “compreensão do campo semântico
mais amplo da noção da informalidade, ao mesmo tempo em que explica a necessidade
75
de seu uso, também torna claras as suas limitações”. Isto porque, conforme enfatizado
por estes, a idéia de informalidade, como indicadora de novas formas de inserção da
população no trabalho, será inevitavelmente considerada, na apreensão intelectual do
tema, em oposição ao padrão de assalariamento “enquanto não se definir, em termos
práticos e simbólicos, um padrão de integração societal alternativo ao regime salarial,
eticamente aceitável e economicamente eficiente”.
É necessário, mais uma vez, enfatizar que o assalariamento nos países
economicamente menos desenvolvidos ocorria de forma restrita, não se estabelecendo
nos moldes encontrados naqueles mais desenvolvidos. Assim, a tendência de
diminuição do assalariamento das economias com menor grau de desenvolvimento, a
partir da encontrada nas denominadas centrais, é intitulada por Silva (1996, p. 17) como
um “desassalariamento sem regime salarial”, pois não foi implantada tal como nos
países de industrialização avançada, o que, no entender do autor, “sugere que deve ser
dada muito maior atenção aos aspectos jurídico-institucionais da regulação social
característica de nossos países, isto é, aos conteúdos propriamente políticos do conflito
social. Seu tratamento como simples ‘variáveis institucionais’ influenciando as decisões
dos agentes econômicos é claramente insuficiente”.
Ao analisarem aspectos do processo de informalização do trabalho, Silva e
Chinelli (1997) ressaltam os debates em torno de duas interpretações existentes. Uma
delas refere-se aos efeitos da exclusão social, na qual a informalização é considerada, de
modo geral, extremamente associada a um processo de empobrecimento da população
trabalhadora, o qual se denota em vários matizes. Nesse sentido, na primeira
interpretação, são encontradas, por um lado, situações de pobreza, revelando estratégias
de sobrevivência indicativas da precariedade de sua incorporação no processo
produtivo. Por outro lado, existem exemplos que, embora possam não ser tidos como
tão dramáticos, se traduzem em uma diminuição dos direitos trabalhistas. A outra
interpretação associa-se ao fato de que a terciarização trouxe o benefício de encorajar o
surgimento de “novos empreendedores”. Ressalte-se o fato de que aí se encontram
inseridos segmentos de trabalhadores, pertencentes a camadas médias, em termos
sociais e econômicos, até então não atingidos pela crise econômica.
O argumento central da referida análise concentra-se no fato de que ambas
interpretações, embora estejam apontando para sub-processos que, de fato, estão
ocorrendo, são unilaterais. Ou seja, ao se procurar entender as mudanças que estão
76
ocorrendo na estrutura do mercado e os efeitos sociais gerados por estas, os pacotes
interpretativos, por serem muito abrangentes, acabam articulando as significativas
evidências e questões que produzem de maneira unilateral.
O pensamento dos citados autores segue evidenciando que “não se trata de
buscar uma injustificável neutralidade analítica, antes de reconhecer que, se os pacotes
interpretativos enquanto tais possuem comprometimentos políticos inconciliáveis,
diversos aspectos das análises empíricas nas quais se baseiam não o são, simplesmente
porque eles tratam de diferentes dimensões da vida econômica que põem em questão
diferentes categorias de trabalhadores” (p. 28). Assim sendo, “a característica central
das tendências em torno da informalização das relações produtivas é a ambigüidade,
derivando não somente de aspectos contraditórios da terciarização mas também de
como seus impactos diferem dentro de cada setor de trabalhadores” (p. 43).
Em linhas gerais, reforçando alguns pontos centrais em relação às referidas
mudanças, “a terciarização significa ao mesmo tempo, precarização e
desassalariamento” (p. 42) com a diminuição qualitativa e quantitativa das relações de
trabalho assalariadas.
Ao se discutir as mudanças no mercado de trabalho, é importante ressaltar que
estas se processam, de forma diferenciada, para os segmentos específicos de
trabalhadores. Diferentemente de períodos anteriores, nos quais as camadas médias
estavam mais protegidas dos efeitos da crise econômica, a referida parcela de
trabalhadores é, então, atingida de modo particular. “As mudanças nas chances de
trabalho para estas camadas parecem indicar, para a maioria, empobrecimento e perda
de segurança, mas não proletarização. Há um intenso movimento, em parte resultado de
pressões contextuais, em parte voluntário, de tentativa de ‘fuga para a frente’ em
direção às inúmeras variantes do ‘conta-proprismo’” (p. 43). Este é, em nosso entender,
um dos pontos cruciais e novos que deve ser levado em consideração, pois as
conseqüências das referidas alterações não se processam, de forma uniforme, para o
conjunto dos trabalhadores.
Na década de 1990, a valorização da idéia de segurança, que prevalecia em
contratos de trabalho em períodos anteriores, é substituída, através do discurso vigente
do espírito do capitalismo, por uma apologia da mudança, do risco e da mobilidade,
como apontado por Boltanski e Chiapello (1999, p. 139). Assim, a segurança obtida
através da vida profissional no desenvolvimento de uma carreira, sobretudo para os
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diplomados, é substituída, hoje, por uma necessidade de flexibilidade que passa a ser o
termo dominante, além de outros, como a criatividade, a iniciativa que traz, por
conseguinte, a liberdade e a autonomia.
As argumentações, na referida década, em defesa do capitalismo, dizem respeito
não só à importância da liberdade, como também ao fato de a empresa estar a serviço
dos que dela se utilizam. O foco principal é o atendimento às demandas do cliente com
novos dispositivos embutidos para o alcance deste objetivo. Pode ser ainda arrolada a
justificativa do progresso econômico que é rebatida, por autores mais atuais, vinculados
à gestão empresarial, em função do aumento crescente do desemprego.
É importante ressaltar a diferenciação do perfil esperado do trabalhador na
década de 1990 em contraposição a períodos anteriores, como o dos anos 1960, tendo
em vista que, atualmente, torna-se fundamental a questão da sua adaptabilidade. “Nos
anos 1960, considerava-se cada um de acordo com os seus resultados ou a sua eficácia.
Os anos 1990 valorizam em contrapartida os que sabem trabalhar em projeto, quer seja
líder ou simples contribuidor. As pessoas de valor são, nesta ótica, as que conseguem
trabalhar com aquelas muito diferentes, que se mostram abertas e flexíveis quando se
trata de mudar de projeto e que conseguem se adaptar permanentemente às novas
circunstâncias” (p. 142). Desta forma, a cidade por projetos é assim denominada, “em
referência ao mundo flexível constituído de projetos múltiplos trazidos por pessoas
autônomas” (BOLTANSKI; CHIAPELLO, p. 143).
A própria natureza humana teve mudanças em sua natureza: a razão, que
dominava nos anos 1960, contrapõe-se aos sentimentos, à emoção e à criatividade
presentes na década de 1990. A burocracia foi contestada, na medida em que se espera
que o trabalhador de hoje não esteja limitado a uma determinada tarefa e submetido
totalmente à autoridade de um chefe, visto que as fronteiras podem ser transgredidas
pelo desenvolvimento de projetos. As fronteiras são ultrapassadas, pois podem ser
estabelecidas relações pessoais e profissionais à longa distância, por meio da
comunicação em rede estabelecida de forma eletrônica.
As transformações econômicas processadas no final deste século e suas
conseqüências nas relações de trabalho são primordiais para a compreensão dos
desdobramentos provocados em termos da integração e da reprodução social, que se
constituem como importantes áreas do conhecimento sociológico. Entende-se que as
alterações que vêm ocorrendo, de várias ordens, atuam não só no sentido de provocar
78
um aumento das desigualdades econômicas e sociais, dificultando a integração social,
bem como podem aprofundar as diferenças já existentes entre as camadas da população.
As mudanças que vêm sendo processadas no mercado de trabalho revelam que
ocorre um processo de “informalização” das relações de trabalho, devendo ser
entendido, como ressaltam Silva e Chinelli (1997, p. 42), “ao mesmo tempo como
afastamento de aspectos particulares do assalariamento (enquanto regime produtivo e/ou
relação contratual) e como ‘informalidade’, no sentido de um espaço produtivo que não
participa organicamente do mercado de trabalho, embora dependa dele”.
A complexidade do entendimento da citada questão foi também destacada por
Oliveira (1990b, p. 43), ao constatar, entre outros determinantes, o fato de a realidade
apresentar situações que demonstram o inter-relacionamento entre estes campos (formal
e informal). Ao analisar a experiência recente da economia brasileira e, em especial, a
da economia fluminense, a autora enfatiza que “é preciso reconhecer que, ao mesmo
tempo em que aí se processa uma tendência de ‘formalização’ das relações de trabalho
nas unidades de produção não-capitalistas (que se explicita na extensão dos direitos e
garantias previstos, por lei, aos trabalhadores rurais e domésticos), se processa também
o movimento inverso de ‘informalização’ das relações de trabalho nas unidades de
produção capitalistas – que se evidencia no recurso ao trabalho a domicílio e na
contratação de trabalhadores clandestinos, acionados por um número cada vez maior de
empresas para se isentar dos encargos trabalhistas previstos na CLT e, com isso, manter
ou ampliar sua margem de lucros”.
A referida autora salienta, assim, que “o informal, afora se constituir num campo
específico de atividades econômicas, que teria como denominador comum o fato de não
se enquadrarem nos moldes da produção capitalista, passa a se configurar, também e de
forma crescente, como um aspecto de atividades econômicas que não pertencem a este
campo10, o que impõe novos e mais difíceis desafios à análise” (1990a p. 45-46).
Concomitantemente à questão conceitual envolvida na noção da informalidade,
transcorre, como segundo ponto importante para o desenvolvimento de nossa questão de
análise, o rebatimento desse sentido lógico-formal àquele concreto. Em termos
empíricos, em pesquisas como a PNAD, a configuração deste contingente de
trabalhadores aí envolvidos torna-se, muitas vezes, de difícil determinação, envolvendo
79
não só o trabalho não-assalariado como também o assalariado. É encontrada não só uma
variedade de trabalhadores por conta própria, entre os quais estão aqueles inseridos em
empresas familiares, como também outros que, como empregadores, tendo ou não
sócios, possuem necessariamente trabalhadores assalariados e, em determinados casos,
os não-remunerados. Nesse sentido, pode-se citar, nesta produção, também um
contingente importante de população trabalhadora relacionada à produção capitalista
sob a forma de regime de trabalho salarial.
O assalariamento, que abrange parte da população trabalhadora da produção
informal, é visto por Boltanski e Chiapello (1999, p. 40), na análise do capitalismo,
independentemente das formas jurídicas contratuais assumidas por este. Ressaltam que
“Marx e Weber inserem esta forma de organização do trabalho no centro de sua
definição do capitalismo”.
No Brasil, deve-se salientar a importância primordial de se considerar o estudo
das relações de trabalho, nas quais o assalariamento aparece ainda como um modelo
balizador do ponto de vista lógico e analítico, tendo em vista a configuração do quadro
político-institucional no qual estas se realizam.
Silva (1990, p. 3) ressalta que “as relações de trabalho que vivemos no Brasil,
em que dominantemente o trabalho é uma mercadoria que se compra e vende no
mercado, não são espontâneas ou naturais – têm que ser ‘produzidas’, isto é, impostas e
reguladas. Os modos específicos de imposição do assalariamento, assim como suas
conseqüências, sem dúvida não são independentes das atividades produtivas
propriamente ditas. Não obstante, trata-se de questões que, do ponto de vista lógico e
analítico, são exteriores e anteriores ao processo de produção, uma vez que apontam
para a matriz político-institucional em que este se realiza. Conseqüentemente, se tais
questões não forem incorporadas à análise do processo produtivo - que tem sido o
objeto central dos estudos sobre o setor informal - corre-se o risco de trabalhar com
supostos implícitos sobre a conformação do trabalho assalariado no Brasil, os quais não
necessariamente correspondem à realidade”.
Pretende-se observar, desta forma, como as estatísticas oficiais do país, que vêm
sendo muito utilizadas nos estudos que visam à captação e a interpretação deste
fenômeno, particularizam e determinam o objeto de análise. Cabe lembrar que as
10 A autora especifica que se baseia na mesma perspectiva de GODELIER, M. – Racionalidade e Irracionalidade na Economia, Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, s/d: 31.9, para definir o
80
estatísticas oficiais, como fonte de informações, representam um dispositivo político-
econômico, que visa fornecer, em sua produção, uma adequada evidência empírica do
objeto de análise estudado, trazendo embutida a referida matriz político-institucional no
momento de sua concepção e periódica atualização temporal.
Em relação à captação do tema informal, no campo das informações estatísticas
oficiais são estabelecidos desafios constantes, tendo em vista que estas tomam como
referência, de um modo geral, o modelo de emprego tipicamente capitalista, a exemplo
da criação da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD), em 1967.
A inserção da população no campo do informal aparece como oposição, ou, por
assim dizer, como contraponto. Silva e Chinelli (1997, p. 26) enfatizam que “no que diz
respeito à estrutura do mercado, em particular quando se adota o ponto de vista do
trabalho, ou seja, quando se privilegia a conexão entre a inserção produtiva e a
reprodução social dos trabalhadores, estas dificuldades têm sido apreendidas a partir dos
vários aspectos e dimensões da noção da informalidade, que captura ‘o outro lado’ das
relações salariais”.
No mundo atual, como já observamos, está se processando um afastamento do
modelo de emprego, que se constitui no parâmetro, em geral, utilizado para o estudo do
mercado de trabalho. Neste sentido, torna-se importante verificar em que medida as
novas questões, presentes no debate público sobre as dificuldades de absorção do
trabalho (que, embora não determinantes, estão sendo associadas na literatura
especializada como acentuando o aumento da informalidade), podem ser discutidas com
base nas variáveis consideradas nas estatísticas oficiais (que procuram seguir
parâmetros estabelecidos em classificações nacionais/internacionais).
Vale lembrar Silva (1990, p. 5), quando destaca que “não se pode continuar a
estudar o processo produtivo como se a própria produção do trabalho assalariado não
fosse um problema fundamental, cujos modos históricos de solução determinam a
estrutura do mercado de trabalho e, ao mesmo tempo, a legitimidade da autoridade
política”. Segue dizendo que “levada a sério, esta conclusão abre à reflexão um espaço
quase tão grande quanto virgem11, que não me atrevo a preencher. Trata-se da
econômico. 11 Cabe ressaltar que o referido autor, se na época citada elaborou a reflexão de que este era um campo virgem no qual não se atrevia a explorar, prossegue em seus trabalhos avançando, cada vez mais, na reflexão sobre este tema, desvendando as novas questões que se estabelecem, como a da empregabilidade/empreendedorismo, no mundo do trabalho, em função das transformações provocadas pela globalização do capital.
81
necessidade de revisitar nossas categorias de análise. Praticamente todas foram forjadas
a partir da experiência histórica de formações sociais muito diferentes das nossas –
experiência que está presente nos conceitos que utilizamos, na medida em que eles
expressam modelos de sociedade e, portanto, supõem uma consistência com a realidade
que, em nosso caso, não existe”.
Um desafio que se estabelece no desenvolvimento dessa tese, mostrando-se
instigante, porque se encontra em um campo pouco explorado, é a tentativa de interligar
os novos significados, as categorizações e as articulações no debate da informalidade,
em função das transformações provocadas no mundo do trabalho pela globalização do
capital, às categorias de análise, adotadas, por exemplo, nas fontes de informações
oficiais de estatísticas.
De um lado, pressupõe-se estar impregnada em fontes de informações
estatísticas oficiais, tais como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD),
a herança de padrões estabelecidos em outros países, com formações sociais distintas de
nossa sociedade, os quais estabelecem, como modelo vigente, a inserção da população
no trabalho assalariado. De outro lado, se tal realidade já se manifestava, de forma
diferenciada, em países como o Brasil, parecendo não estar tão adequada à nossa
experiência histórica, encontra-se atingida pelas mudanças, embutidas no espírito do
capitalismo, que estão provocando, cada vez mais, a diminuição da inserção da
população em um emprego tipicamente capitalista.
Cabe ressaltar que a noção do espírito do capitalismo, aqui explicitada, segue a
dos autores Boltanski e Chiapello (1999), que se constituem também em interlocutores
importantes no desvendamento de nosso objeto de análise. Isto porque, ao analisarem o
novo espírito do capitalismo, tomando como objeto de análise a França, procuram
indicar uma trajetória complexa e elaborada das transformações citadas, que
consideramos importantes para a compreensão atual da questão da informalidade
investigada na realidade brasileira.
A referida noção permite articular dois conceitos centrais na análise realizada,
ou seja, o do capitalismo e o da crítica em uma relação dinâmica. O espírito do
capitalismo é a ideologia que justifica o engajamento no capitalismo. O tipo de
engajamento depende não só dos argumentos presentes tanto nos benefícios que os
indivíduos têm em sua participação no processo capitalista quanto nas vantagens
82
coletivas, que são definidas em termos de bem comum. A crítica seria um projeto
alternativo à idéia do bem comum.
Poder-se-ia dizer, de forma simplificada, que o espírito do capitalismo é a
moralidade adequada do capitalismo, construída por capitalistas e não-capitalistas, sob
um processo de justificação. Existe sempre uma tensão latente, que leva à atualização
permanente do processo de argumentação utilizado.
Hoje, são anunciadas novas questões sobre o trabalho, que mostram as
dificuldades crescentes de absorção de mão-de-obra, em função das complexas
mudanças ocorridas no mercado de trabalho, provocadas pela globalização do capital.
Tal fato nos leva a repensar a adequação destas estatísticas ao problema de investigação
considerado – a informalidade -, que, embora não sejam determinantes do mesmo, como
já observado, acentuam esta questão e fazem surgir novas demandas ao trabalhador para
a sua inserção no mercado de trabalho.
Silva (2002, p. 81), ao analisar as mudanças ocorridas no mercado de trabalho e
suas conexões com o estudo da informalidade, destaca haver, nas últimas décadas,
conforme já observado, um esvaziamento de conteúdo da informalidade e a sua
substituição por outro conceito, qual seja, o da empregabilidade/empreendedorismo.
Estariam sendo indicados, desta forma, processos como a flexibilização ou a
desregulamentação, que anunciariam ”um novo modo de exploração capitalista e de
dominação no mundo do trabalho, que busca reconstruir uma cultura do trabalho
adaptada ao desemprego, ao risco e à insegurança”.
Boltanski e Chiapello (1999) destacam uma questão central, que é a constatação
do deslocamento existente entre a reorganização do capitalismo e a crítica social. Em
geral, a Sociologia, que sempre esteve próxima desta última, não conseguiu acompanhar
a situação mais recentemente estabelecida, ao contrário do que ocorreu no final dos anos
1960 e no início da década de 1970.
De modo geral, no referido período, de um lado, tem-se que o capitalismo
apresentava um crescimento, mesmo que se, por vezes, não tão expressivo e a crítica
apontava para reivindicações que, sendo inovadoras, voltavam-se para o apelo à
criatividade, ao prazer, ao poder da imaginação, a uma liberação referente às dimensões
da existência, à destruição da “sociedade de consumo”. Por outro lado, “quanto ao meio
macroeconômico, era o de uma sociedade de pleno emprego, na qual os dirigentes não
cessavam de lembrar que era ‘voltada para o progresso’, na qual as pessoas
83
conservavam a esperança de uma vida melhor para seus filhos e onde se desenvolvia a
reivindicação - sustentada pela denúncia das desigualdades face às chances de acesso ao
sistema escolar - de uma ascensão social aberta a todos através de uma escola
republicana democratizada” (p. 17-18).
Estes autores destacam a coexistência de uma degradação econômico-social,
envolvendo um grande número de pessoas, e de um capitalismo em plena expansão e
em constante mudança. Esta turbulência foi aumentada pelo estado da crítica social, seja
pela sua não-conivência com a complexa realidade apresentada, mas sem ter propostas
alternativas seja, não a denunciando - fato mais freqüente-, parecendo estar aceitando a
fatalidade da situação.
É justamente contra esta atitude de aceitação do que se poderia acreditar como
natural e com intuito de suscitar uma mudança de disposição, no sentido de se
considerar de outra forma, os eventos atuais que pode ser compreendida a análise
desenvolvida por Boltanski e Chiapello (p. 29-30). Estes enfatizam que “parece útil,
com efeito, abrir a caixa preta dos últimos trinta anos para olhar a maneira pela qual os
homens fazem sua história. Com efeito, porque ela constitui, voltando-se para o
momento onde as coisas se decidem e fazendo ver que estas poderiam ter tomado uma
direção diferente, um instrumento por excelência da desnaturalização do social que a
história tem relacionado com a crítica”.
Em relação à crítica, deve-se apontar que esta só se estabelece pela comparação
entre o mundo desejável e o real. Sua validade depende do esclarecimento dos pontos de
apoio normativos que a fundamentam, o que ocorre quando esta é confrontada com as
justificações dos que são objetos da crítica e com o sentido que estabelecem para as suas
ações.
Poder-se-ia dizer que, desta forma, “a crítica não cessa de fazer referência à
justiça - porque, se a justiça é um engodo, para que criticar (nota 41)12... Mas, por outro
12 A nota 41 refere-se a uma citação, que se segue, sobre este ponto, da posição de Bouveresse (Bouveresse, J., 1983, “La vengeance de Spengler”, Le temps de la réflexion, IV, Gallimard, pp. 371-402): “no sentido de que há uma dialética de ‘Aufklärung’, poder-se-ia falar igualmente de uma dialética do discurso democrático, em virtude da qual termina por denunciar ele mesmo como ilusórios e mentirosos seus próprios ideais. Quando os intelectuais que passam por democratas convictos proclamam abertamente que a única realidade que se pode constantemente constatar e com a qual se pode contar é a do poder e da dominação, o que se pode ainda objetar àqueles que decidem tirar definitivamente a máscara? [...] Quando os princípios de liberdade, de igualdade e de justiça não conseguem obter mais que uma aprovação e um engajamento de forma pura, repletos de todas as formas de reservas céticas, de subentendidos irônicos, de autocríticas, de auto-suspeitas e de auto-desmitificações, os ditadores potenciais só têm a simular junto à opinião pública o jogo de outra forma mais eficaz da franqueza e da
84
lado, a crítica ressalta um mundo no qual a exigência de justiça é continuamente
transgredida. Ela desvela a hipocrisia das pretensões morais que dissimulam a realidade
das relações de forças, de exploração e da dominação” (p. 70).
O contexto sócio-econômico, em nosso país, revela, como já indicado, as
dificuldades crescentes de absorção da mão-de-obra no mercado de trabalho,
demonstradas, em linhas gerais, por meio de diminuição do emprego, de aumento do
trabalho por conta própria, de mudanças observadas nos contratos de trabalho
assalariado e de perdas de garantias legais e de cobertura social. Há que procurar trazer
à tona os motivos explícitos ou subjacentes no espírito do capitalismo que são
apresentados para justificar as mudanças em pauta, que estão provocando, cada vez
mais, um afastamento do modelo de emprego.
As conseqüências da crítica sobre o espírito do capitalismo estão relacionadas,
primeiramente, a uma contestação da legitimidade dos espíritos anteriores. Em segundo
lugar, acarreta uma transformação das expectativas e aspirações dos trabalhadores,
gerando a sua desmobilização. Tal fato ocorre em função de que estes percebem o
desmantelamento da vida do trabalho e de formas de engajamento, as quais se
encontravam associadas a uma determinada forma do espírito do capitalismo, que se viu
parcialmente deslegitimada pela crítica.
Um segundo efeito da crítica, ao se opor ao processo capitalista, é o de fazer
com que os seus aliados o defendam, através das justificações que são comumente
apresentadas em termos de bem comum. A crítica terá assim um papel tão mais
contundente, em termos de alertar a um contingente expressivo da população, quanto
mais as justificações não estiverem associadas a dispositivos confiáveis.
De um lado, a sociedade será beneficiada na medida em que houver a
incorporação, pelo menos parcialmente, dos valores que foram mobilizados, pela crítica,
ao processo de acumulação. Por outro lado, a crítica ao ser atendida, mesmo não o
sendo de forma total, assiste à incorporação, na referida acumulação, de uma parte de
valores, mobilizados por ela para se opor à forma tomada pelo processo de acumulação.
É fundamental a compreensão de que o espírito do processo de acumulação, em
um dado momento histórico, contém produções culturais que são desenvolvidas, em
geral, para justificar o próprio capitalismo. Os citados autores acrescentam a dificuldade
coragem revelando claramente aquilo que sabem [e] que a maldosa consciência de seus adversários já tem amplamente admitido e implicitamente confessado “ (Bouveresse, 1983, p. 384).
85
de se separar, no caso das ideologias, as que são ditas puras, isentas de compromissos,
daquelas que estão comprometidas com o processo de acumulação capitalista, em
função do fato de que “freqüentemente os mesmos paradigmas encontram-se engajados
na denúncia e na justificação do que é denunciado” (p. 59).
A questão das justificativas morais do capitalismo assume crucial importância,
em vários sentidos, estando relacionada a uma adequada compreensão de sua origem ou
das modalidades adquiridas por este em países em desenvolvimento, nos antigos países
socialistas bem como nos países ocidentais. Estas justificativas devem estar apoiadas em
argumentações, suficientemente aceitas por todos, beneficiados ou não por estas,
perpetuando valores repassados através da educação. A ordem capitalista parece estar
apoiada, em grande parte, em dispositivos convenientes à mesma, que são manipulados
pelos atores.
Boltanski e Chiapello realizam uma análise do capital financeiro demonstrando
que, apesar da diminuição da economia mundial em um período de trinta anos (desde a
metade da década de 1960 até 1995), as empresas multinacionais controlam 2/3 do
comércio internacional. O desenvolvimento destas permaneceu assegurado, sobretudo
em função das fusões e de aquisições realizadas mundialmente, acelerando o processo
de concentração e de constituição de oligopólios mundiais.
A questão mais importante remete-se ao fato de que, a reestruturação do
capitalismo, no curso das décadas de 1980 e de 1990, realizada em torno dos mercados
financeiros e de movimentos de fusões ou aquisições de multinacionais em um contexto
de políticas governamentais favoráveis em matéria fiscal, social e salarial, foi
acompanhada de um crescimento da flexibilização do trabalho. Na verdade, foi
implantado um modelo completo de gestão empresarial da grande empresa que gerou
uma nova forma de obtenção de lucros.
De um lado, aumentou a possibilidade de contratos temporários, a utilização de
mão-de-obra temporária em horários flexíveis, a redução com os custos de licenças da
mão-de-obra. Por outro lado, os dispositivos de seguridade, alcançados após um longo
período de tempo através de conquistas sociais, ficaram cada vez mais ameaçados.
Acrescente-se a este fato, que as novas tecnologias de comunicação, proporcionaram
maior agilidade na interação mundial.
Os referidos autores destacam o contraponto existente entre o capitalismo e a
sociedade. Enquanto há um quadro favorável para o capitalismo mundial, entendido
86
como a possibilidade de fazer frutificar seu capital pelo investimento, o mesmo não
ocorre com a sociedade. Esta se encontra em uma situação desfavorável demonstrada
com o aumento regular do número de desempregados acompanhada de uma degradação
das condições de vida, que atinge sobremaneira este contingente, além de um
alinhamento por baixo das remunerações e de um emprego mais precário por parte dos
que continuam a exercer uma atividade, entre outros fatores.
No citado contexto, há um sentimento de insegurança de todos quantos se
sentem ameaçados de perder o seu emprego seja por eles mesmos seja pelos que lhe são
próximos e dependentes, como cônjuges e filhos. A pobreza atinge cada vez menos as
pessoas idosas e cada vez mais as pessoas em idade ativa e uma diminuição da
proporção de despesas relativas à proteção social, relativa os mínimos sociais básicos
que são normalmente pagos, que se constituem em dispositivos de auxílio à população,
tais como o seguro-desemprego e outras ajudas, digamos assim, sociais.
Um modelo estabelecido, desde pelo menos a década de 1980, que permitia,
sobretudo, garantir, aos detentores de um diploma de nível superior, a possibilidade de
desenvolver uma carreira, possibilitando-lhes uma aposentadoria no final de sua vida
produtiva, foi abalado. Os mais prejudicados inicialmente foram os mais frágeis das
camadas populares, tais como, as mulheres, os imigrantes, os jovens sem diploma,
incapazes de se adaptar ao endurecimento provocado pela concorrência internacional
reinante nos anos 1980, nos países mais desenvolvidos, com reflexos em período
posterior nos menos desenvolvidos.
Somente na década de 1990, esta situação foi considerada mais crítica, quando
afetou a burguesia com o aumento do desemprego para os diplomados e o conjunto de
pessoas pertencentes ao que se poderia denominar de quadros de gerência
intermediária13. No entanto, a intensidade do fenômeno não se compara àquela
registrada para os menos privilegiados que foi bem mais elevada. Além do mais se, de
um lado, as empresas continuam a oferecer perspectivas de carreira aos indivíduos, em
seu entender, mais talentosos, por outro lado, estas lhes são dadas sem garantia de que
sejam por um longo período de tempo.
As inquietações sobre o emprego passaram a ser acrescidas das que concernem
ao nível das aposentadorias, que passaram a se processar de forma antecipada assim
como houve um aumento do desemprego. Pode-se ressaltar que o denominado
13 “Cadres” no original.
87
“emprego para toda a vida” se viu ameaçado em sua continuidade e constituição. Este
era, em geral, fornecido aos que detinham o diploma de curso superior que detinham,
entre outros aspectos, as facilidades ao sistema de acesso ao crédito bem como de uma
quase garantia de emprego em grandes firmas, nas quais lhes era assegurado à inserção
em “planos de carreira”.
A desordem ideológica foi um traço marcante, nas últimas décadas, em função
da decomposição das representações associadas a um compromisso sócio-econômico
que dominou no período pós-guerra sem que ocorressem dispositivos críticos que
justificassem, de forma adequada, as mudanças processadas.
A intenção dos citados autores é a de observar as mudanças ideológicas que
acompanharam as transformações recentes do capitalismo. Na verdade tem-se que, até
hoje, os enfoques gerais atribuem uma importância fundamental aos fatores
explicativos, quais sejam, de ordem tecnológica, macroeconômica ou demográfica,
resultando que estes são tratados como se fossem forças exteriores submetidas aos
homens. Isto porque as tradições e as conjunturas políticas nacionais continuam a ter um
peso significativo sobre as orientações das práticas econômicas e das formas de
expressão ideológicas que as acompanham.
É preciso ter em mente que, como ressaltam Boltanski e Chiapello, são as
pessoas que se engajam na ação, com as suas justificações e o sentido que atribuem aos
seus atos, pois são os homens que, em seu cotidiano, realizam a sua história, através de
escolhas de valores institucionalizados.
Em nosso problema de investigação, as estatísticas podem ser consideradas
como um dispositivo de natureza político-econômica de representação do problema de
investigação considerado, qual seja, da informalidade. As estatísticas oficiais sobre
trabalho produzidas em uma pesquisa procuram explicitar, em seu discurso, explícito ou
não, como objetivos, de um lado, dar conta dos aspectos gerais do mesmo, buscando, de
um lado, aliá-los às recomendações internacionais, tendo em vista à comparabilidade
com as estatísticas dos diversos países. Por outro lado, estas estatísticas, em sua
finalidade, procuram realizar os ajustes necessários para fornecer um quadro
aproximado, embora parcial, de produção de evidência empírica da realidade nacional,
mas será sempre diferente do que se poderia considerar como “representação da
realidade”, pois só se constitui evidência desta realidade dentro do quadro de referência
88
que produziu os instrumentos de “medida”. Nesse sentido, uma medição adequada deve
garantir uma correspondente produção de evidência empírica.
Cabe o questionamento do alcance do referido aparelho de descrição estatística,
que se apoia em equivalências (como as variáveis selecionadas), no fornecimento de um
quadro parcial de produção de evidência empírica do problema de investigação da
informalidade, o qual se pretende contemplar. Supõe-se a dificuldade das estatísticas em
registrar as novas formas de inserção no mercado de trabalho, que estão se
estabelecendo, muitas vezes, através de mudanças, por vezes rápidas e difíceis de serem
traduzidas, em sua complexidade, em um dispositivo de representação que contemple,
através de seus instrumentos, o referido objeto de análise.
É preciso ter claro que a manutenção do capitalismo deve ser compreendida em
sua ideologia, que o justifica lhe atribuindo um sentido. Nos países capitalistas, a
ordem, segundo a qual a população está inserida, parece estar baseada nos dispositivos
que lhes são congruentes. Os dispositivos constituem um conjunto de objetos, de regras,
de convenções, de idéias, ordenando a sociedade, servindo de justificação para a
importância da persistência do capitalismo. O Direito pode ser considerado uma
expressão de dispositivo, em nível nacional.
Ao analisar o mercado não formalizado de emprego, uma das denominações
atribuída até hoje a este segmento do informal, Silva (1971) já salientava, na década de
1970, que por oposição ao mercado formalizado este sub-sistema é considerado
“invisível”, no sentido de que existe à revelia do aparato jurídico-institucional. No
entanto, embora esta legalização da atividade seja um elemento importante, na realidade
brasileira, identificando a formalização dos empreendimentos, significa uma menor
flexibilidade nos modos de conduta dos empregos ligados ao mercado formalizado e
não está ausente totalmente do denominado mercado não formalizado.
De um lado, a informalidade nas relações de trabalho pode significar para o
trabalhador a falta de acesso não só dos direitos trabalhistas garantidos pela CLT e do
seguro desemprego, principalmente, no caso da mão de obra de baixa renda como
também de benefícios previdenciários. Por outro lado, conforme já ressaltado, é
justamente esta característica de “invisibilidade” de grande parte da população aí
inserida bem como de suas atividades que aumenta a suas possibilidades de competição
no mercado e, por conseguinte, sua viabilidade econômica.
89
Em relação à política atual do governo federal do Brasil, um dos principais
objetivos da política econômica do Ministério da Fazenda é o de reduzir a
informalidade. É destacado que as empresas que operam na informalidade não emitem
nota fiscal e têm acesso precário ao crédito, entraves que resultam em uma
produtividade inferior às empresas formais e representam um obstáculo ao crescimento
econômico do País. No entanto, apesar de ocorrerem de fato os obstáculos ao sistema de
crédito, há que se considerar, muitas vezes, aqueles ainda existentes para esta
legalização bem como à competição a que estão submetidas neste mercado em relação
às empresas formais. Neste sentido, pode-se ressaltar que é justamente esta
característica, muitas vezes encontrada, de “invisibilidade” da informalidade que tende a
lhe garantir, em contrapartida, a possibilidade de sobrevivência.
É preciso enfatizar que o capitalista, seguindo a definição mínima do
capitalismo, conforme destacam Boltanski e Chiapello, é aquele que possui um
excedente e o investe para obter um lucro que irá aumentar o seu capital inicial. O
arquétipo do capitalista aplica seu dinheiro em uma empresa, visando obter uma
remuneração, mas o investimento não necessariamente toma a forma jurídica. Na
avaliação, contida nas estatísticas oficiais brasileiras bem como em informações a este
respeito, dos que se enquadram como trabalhando em uma atividade informal (em geral,
empregadores e trabalhadores por conta própria bem como pelos empregados sem
carteira e trabalhadores domésticos sem carteira), é, muitas vezes, indagada, entre outras
variáveis, a legalidade do exercício de sua atividade.
As referidas estatísticas oficiais brasileiras, ao serem elaboradas, procuram,
através de um quadro de evidência empírica, situar não só o engajamento da população
que pode ocorrer tanto em um contexto de legalização, com ocorrências de cobertura
trabalhista como o outro lado da questão, pois o que importa considerar é a diversidade
de relações de trabalho que são encontradas no país.
Acrescente-se, ainda, o fato de que não se pode perceber o problema de
investigação considerado, qual seja, o da informalidade, como dissociado do
denominado campo formal de trabalho. Conforme apontado, na origem do debate da
informalidade, por Silva (1971), que ressalta um imenso “turnover” 14 de mão-de-obra,
entre os tipos de emprego/ocupação no interior do mercado formalizado e do não
formalizado, excluindo-se apenas deste processo, os empregos públicos. Há ainda a
14 Expressão utilizada no texto original do autor.
90
possibilidade de concomitância existente entre ocupações/empregos que oscilam, de um
lado, na estabilidade de um determinado emprego e, por outro lado, na complementação
de renda fornecida por outro tipo de ocupação/emprego. Da mesma forma, o relatório
sobre o Quênia (EMPLOYMENT..., 1972) também enfatizava a interligação existente
entre as atividades informais e formais.
Hoje quando se tenta reconstituir a crítica, esta ainda que tênue, tem trazido à
tona uma contrapartida relevante, qual seja, a manifestação de diversas fontes de
indignação no domínio público contra as conseqüências trazidas com a evolução do
capitalismo.
No processo de desenvolvimento do capitalismo, houve uma acentuada mudança
do discurso de gestão empresarial e das justificações apresentadas desde a metade da
década de 1970 e de novas representações da sociedade, que podem resultar tanto em
novas maneiras de sobrevivência ou de fracasso das pessoas diante destas novas formas.
Um aspecto importante daqueles inseridos na vida do trabalho refere-se não só às suas
condições de vida e dos que lhes são próximos como também à perspectiva de assegurar
a conservação destes privilégios aos seus descendentes.
Entende-se que estas transformações mais amplas devem apresentar possíveis
mudanças e/ou adaptações, importantes de serem avaliadas, no engajamento da
população no mercado de trabalho inclusive daquelas que se enquadram em um
processo de trabalho informal, que é o nosso objeto de investigação.
Boltanski e Chiapello ressaltam que as mudanças ocorridas no espírito do
capitalismo não são certamente as primeiras. Citam que, além da obra de Weber, na
qual se realiza uma espécie de reconstituição arqueológica do ethos que inspirou o
capitalismo original, há pelos menos duas descrições tipificadas do espírito do
capitalismo que são diferentes combinações entre a autonomia, a segurança e o bem
comum. É necessário enfatizar a importância de Weber ao salientar um conjunto de
motivos éticos trazidos pelos empreendedores em suas ações na busca da acumulação
do capital.
Poder-se-ia ressaltar, de forma sucinta, que a primeira caracterização do espírito
do capitalismo, no final do século XIX, “está centrada na pessoa do empreendedor
burguês e na descrição dos valores burgueses” (p. 54). De um lado, encontra-se a figura
do empreendedor com traços como a inovação além do risco e da especulação e por
outro lado, a figura do burguês e da moral burguesa com elementos de segurança,
91
associando as disposições econômicas novas (como a avareza ou parcimônia, espírito de
poupança, etc.) àquelas domésticas tradicionais (importância da família, da linhagem,
do patrimônio, o caráter familiar ou patriarcal das relações estabelecidas com os
empregados, etc.). Nesse sentido, poder-se-ia destacar que essa discussão converge para
a denúncia do paternalismo cujas formas de subordinação permanecem pessoais e
presentes, sobretudo, nas empresas de pequeno porte. Nessa fase predominam formas de
capitalismo essencialmente familiares, nas quais, “os proprietários e os patrões eram
conhecidos em pessoas de seus empregados; o destino e a vida da empresa eram
fortemente associados aos de uma família” (p. 57).
É preciso destacar as semelhanças encontradas ainda hoje, em nosso país, quanto
às características descritas nesta primeira caracterização do espírito do capitalismo,
típicas, sobretudo, das empresas de porte reduzido. Nestas existe o entrelaçamento entre
os rumos da empresa e de seus empregados, tendo em vista o caráter familiar
encontrado nessas pequenas firmas. Assim, os modelos e os estilos de funcionamento
encontrados encontram-se respaldados na lógica do “mundo doméstico”.
As justificações adotadas, segundo esta primeira descrição do espírito do
capitalismo, possuem um discurso no qual está presente a importância da crença, no
progresso, no futuro, na técnica, na ciência e nos benefícios da indústria, visando ao
bem comum, mesmo a despeito dos obstáculos a serem superados para atingir este
objetivo.
Quanto à segunda descrição do espírito do capitalismo, a ênfase está situada
mais na organização do que na pessoa do empreendedor, tendo seu pleno
desenvolvimento, situado no século XX, sobretudo, no período que abrange da década
de 1930 até a de 1960. O eixo está localizado no desenvolvimento industrial, passando a
ser central a grande empresa industrial, na qual encontra-se, de um lado, a figura central
do diretor ou de um dirigente assalariado e de conjunto daqueles pertencentes aos
quadros de gerência intermediária. Por outro lado, “o corpo de acionistas se torna mais
anônimo, numerosas empresas encontram-se desatadas do nome e do destino de uma
família” (p. 57), ao contrário do observado na primeira descrição do espírito do
capitalismo.
Essa fase foi marcada por dispositivos sem os quais “ninguém teria podido
acreditar verdadeiramente nas promessas do segundo espírito” (BOLTANSKI;
CHIAPELLO, 1999, p. 66). Estes estavam relacionados, de um lado, à garantia
92
proporcionada, neste período, aos trabalhadores de uma forma jurídica de contrato de
trabalho assalariado além de determinadas vantagens decorrentes desta situação entre as
quais se destaca o direito a uma aposentadoria correspondente a um desenvolvimento de
uma carreira. Por outro lado, havia, em funcionamento, determinados dispositivos de
gestão de carreiras nas grandes empresas.
Atualmente, no cenário político-sócio-econômico, é observada uma ruptura das
garantias oferecidas de acordo com o segundo espírito do capitalismo, pois é
constantemente ameaçado o dispositivo securitário. Este não só pode ser considerado
como restrito a um contingente que dele era beneficiado como também este fato
compromete sobremaneira o contexto geral das expectativas proporcionadas ao
conjunto de trabalhadores.
Entende-se que atualmente, no caso da exclusão da população do mercado dito
formalizado, há uma limitação de seus anseios ao ver suas chances de reintegração
diminuídas, cada vez mais, nos moldes anteriormente estabelecidos. Acresce-se a este
fato o entendimento de que estes circuitos ou contextos de inserção dos trabalhadores,
dentro de um quadro formalizado ou não formalizado não se encontram totalmente
dissociados, havendo uma parcela de interação nos rumos e conseqüências sociais e
econômicas dos mesmos no mercado de trabalho.
Nesta segunda fase, vigora um capitalismo das grandes empresas, sendo que
somente uma minoria delas pode ser considerada como pertencente às multinacionais. A
burocratização e a formação de um quadro de pessoas engajadas cada vez mais
diplomadas são importantes no funcionamento deste espírito do capitalismo. O objetivo
é o de obter, sobretudo para os mais jovens, perspectivas de carreira consideradas
atraentes bem como outros benefícios que podem ser estendidos até a sua vida cotidiana
pelo fato de sua inserção neste tipo de organização.
Deve-se ressaltar que, no primeiro espírito do capitalismo, a legitimidade do
patrimônio era a referência presente que se opõe à competência referida no segundo
espírito do capitalismo. “A literatura dos anos 1960 acompanha assim a passagem de
uma burguesia patrimonial centrada na empresa pessoal a uma burguesia de dirigentes,
assalariados, diplomados e integrados a grandes administrações públicas ou privadas”
(p. 109).15
15 BOLTANSKI Luc, 1982, Les cadres. La formation d’un groupe social, Paris, Minuit in BOLTANSKI, Luc; CHIAPELLO, Ève. Le nouvel espirit du capitalisme. Paris: Gallimard, 1999. 843p.
93
Há que se acrescentar que as grandes empresas procuraram respeitar, durante um
longo período de tempo, os valores domésticos tradicionais do primeiro espírito do
capitalismo. De um lado, em um contrato de trabalho, é mantido o respeito ao nível
hierárquico na relação estabelecida entre patrão e o trabalhador. Por outro lado, vigora
uma preocupação em se respeitar à proteção de direitos do trabalhador. Tal fato
contrasta-se com a maneira de se encarar uma relação de trabalho como sendo somente
a troca de um salário por um trabalho realizado, “que expressa a maneira liberal anglo-
saxônica de se pensar uma relação de emprego” (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 1999, p.
61).
Em relação às justificações adotadas, visando a obtenção de um bem comum,
estão contidas referências comuns àquelas já destacadas na primeira caracterização do
espírito do capitalismo (tais como, a crença no progresso, na técnica, na ciência, na
produtividade e eficácia), mas reforçadas ainda mais nesta segunda descrição do espírito
do capitalismo. No entanto, a estas pode ser acrescido “um ideal que se pode qualificar
de cívico no sentido de que a ênfase é dada na solidariedade institucional, na
socialização da produção, da distribuição e do consumo e sobre a colaboração das
grandes firmas e do Estado com o objetivo de justiça social” (p. 56).
Atualmente, a segurança até então garantida aos diplomados foi abalada
afetando por sua vez a garantia de desenvolvimento da carreira e, por conseguinte, a
obtenção de uma aposentadoria, benéfica não só aos trabalhadores como também a seus
dependentes. “O poder de mobilização do ‘segundo espírito’ foi questionado enquanto
as formas de acumulação foram de novo profundamente transformadas (p.57)”. No
segundo espírito do capitalismo, é extremamente importante a atuação do Estado, no
qual se reconhece o papel de provedor, e de seus órgãos de planejamento.
Boltanski e Chiapello destacam a formação nos países desenvolvidos, de um
terceiro espírito de capitalismo, em formação, “mais mobilizador (e portanto também
mais orientado para a justiça e o bem-estar social) no objetivo de uma tentativa de
remobilização dos trabalhadores e, no mínimo, da classe média” (p. 57). Assim, esse
espírito deverá refletir um capitalismo “mundializado” com destaque para as novas
tecnologias.
Nos anos 1990, a crítica está fundamentada na contestação da burocracia
encontrada em períodos anteriores, baseada no fato de que uma vez que a hierarquia se
apoia na dominação, é preciso haver a liberação não só daqueles pertencentes aos
94
quadros de gerência intermediária como também de todos os assalariados. Ou seja, para
justificar este movimento contrário a hierarquia, os motivos são freqüentemente de
ordem moral, fundamentados em uma recusa mais geral das relações existentes entre
dominantes e dominados.
Boltanski e Chiapello (p. 113) destacam que os autores da gestão empresarial
dos anos 199016, nos quais se percebe a mudança da ideologia econômica, imaginam
“quantidade de novas formas de organização que se distanciam ao máximo dos
princípios hierárquicos, e prometem a igualdade formal e o respeito às liberdades
individuais”. As organizações tornam-se flexíveis, inovadoras e altamente competentes,
com novos dispositivos presentes, ficando a hierarquia abalada.
Boltanski e Chiapello ressaltam que “o termo ‘manager’ é disseminado e adquire
na França o seu sentido atual no curso dos anos 1980. Inicialmente utilizado para
qualificar os gerentes17 das direções gerais de grandes empresas (por oposição à grande
maioria daqueles comuns), começou a ser empregado, em torno dos anos 1980-1990,
para designar todos aqueles que manifestam por excelência na motivação de uma
equipe, na administração dos homens, por oposição aos engenheiros voltados para a
técnica” (p. 121).
Na referida categoria estão enquadrados os mais ajustados ao estado atual do
capitalismo e ao meio complexo e incerto das empresas nos anos 90, podendo ser
denominados como os homens das redes. Estes impõem sua autoridade, que faz deles
líderes, não através de qualquer posição estatuária ocupada, mas por meio de uma rede
estabelecida com a sua equipe baseada na confiança e no poder de diálogo.
Poder-se-ia dizer que assim intitulados como os homens das redes, estabelecem
contato com outras pessoas, mesmo que estejam freqüentemente separados, seja em
16 “Enquanto ideologia dominante, o espírito do capitalismo tem em princípio a capacidade de penetrar o conjunto de representações mentais próprias a uma dada época, de infiltrar os discursos políticos e sindicais, de fornecer representações legítimas e esquemas de pensamento aos jornalistas e pesquisadores, se bem que sua presença é ao mesmo tempo difusa e geral. Entre todas suas manifestações possíveis, nós temos escolhido a literatura da gestão empresarial enquanto suporte oferecendo o acesso mais direto às representações associadas ao espírito do capitalismo de uma época”.... ). Esta literatura apresenta um forte conteúdo moral do que deve ou não deve ser. Nesse sentido pode-se questionar o realismo desta literatura e, por conseguinte, do crédito que se possa lhe atribuir para saber o que se passa ‘verdadeiramente’ nas empresas”. (BOLTANSKI e CHIAPELLO, 1999, p.94). A literatura é antes de tudo prescritiva do tipo que apresenta um modelo do que se deve fazer versus o que não se deve. É justamente neste ponto, na medida em que ela constitui, no mundo das empresas, “um dos principais veículos de difusão e de vulgarização de modelos normativos que pode nos interessar”. (Boltanski, Luc e Chiapello, Ève, 1999, p.95). 17 “Cadres” no original.
95
termos sociais ou espaciais. Neste sentido, a primeira qualidade destes é a da
mobilidade, deslocando-se independente das fronteiras existentes, sejam estas de ordem
geográfica, profissional ou cultural. O perfil destes homens é o de profissionais
“‘intuitivos’, ‘humanistas’, ‘inspirados’, visionários’, ‘generalistas’ (por oposição à
especialização strictu sensu), [e]‘criativos’” (BOLTANSKI; CHIPAELLO, p. 123).
Há uma outra figura importante da gestão empresarial dos anos 1990 que é a do
“expert”. ”Este é necessário porque detém a informação em matéria de inovação e de
saberes muito especializados que é preciso dominar para entrar na competição
tecnológica. Ele pode ser interno à empresa – pesquisador com tempo integral, por
exemplo, ou ainda especialista funcional dos sistemas informáticos ou de controle de
gestão. Ele pode também ser externo, pertencer a um escritório, a um centro de pesquisa
independente ou a uma universidade e ser consultado pontualmente. Não lhe é
demandado gerenciar equipes, porque este é o papel do ‘manager’” (p. 124).
Na análise da informalidade brasileira, a figura do “expert” poderia ser associada
a do denominado “consultor” que é registrada como tal na indagação sobre ocupação,
em nossas estatísticas oficiais, tais como a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD). Em princípio, este profissional deve ser classificado como um
trabalhador por conta própria, pois é, em geral, requisitado para determinados projetos
não possuindo laços mais diretos com os contratantes. No entanto, deve ser classificado
como empregado sem carteira se trabalhar como tal para uma empresa, utilizando seus
recursos e sem ter firma constituída, ou seja, com características condizentes à função
de empregado, apesar de ser denominado de “consultor”.
Este profissional tanto pode exercer sua atividade na empresa que lhe contrata
para a realização de determinados projetos ou mesmo em seu domicílio, sendo neste
caso sua presença no escritório apenas necessária em reuniões que envolvem o
acompanhamento das tarefas demandadas. No entanto, a sua remuneração pode ser
proveniente, muitas vezes, não necessariamente da empresa contratante de seus
serviços, mas intermediada por outros organismos ou mesmo por cooperativas que
repassam os recursos das atividades realizadas.
Para se obter um modelo de empresa em rede, “um outro traço marcante dos
anos 1990, o tema da concorrência e o da mudança permanente e sempre mais rápida
das tecnologias – já presentes nos anos 1960 – adquirem uma amplitude sem
precedente, e encontra-se praticamente em todos os textos dos conselhos [referentes à
96
gestão empresarial] para situar esta organização flexível e inventiva que saberá ‘surfar’
sobre todas as ‘ondas’, se adaptar a todas as transformações, ter constantemente um
pessoal com conhecimentos mais recentes e obter um avanço tecnológico permanente
sobre os concorrentes” (p. 113).
O trabalho é denominado em rede porque as fronteiras da empresa são
encobertas e a organização não parece estar mais fundamentada em laços contratuais
mais ou menos duráveis. No entanto, tal fato não significa que as empresas não mais
existam, mas que não são totalmente diluídas nesta rede. Elas desenvolvem estratégias
de luta concorrendo no mercado onde não haja atuação das multinacionais, que a elas se
opõem.
A partir dos anos 1990, torna-se visível o enfoque dado à adaptação, à mudança
bem como à flexibilidade que se encontram fundamentadas sobre uma série de
fenômenos que marcaram profundamente o espírito do capitalismo, encontrado a partir
do período de 1970, e que muitos autores analisaram sob o ponto de vista da
concorrência exacerbada. No caso dos países subdesenvolvidos, torna-se difícil adquirir
uma representação dominante mundialmente face à política de concorrência dos países
desenvolvidos e de exportação.
De um lado, amplia-se o número daqueles que participam do jogo capitalista da
concorrência bem como a quantidade dos que se encontram desempregados, tornando
cada vez mais difícil o desenvolvimento econômico. Por outro lado, ocorre o progresso
da informática, da imagem e do som (“virtual”). Assim, nos anos 1990, algumas idéias
chaves, apontadas pelos citados autores, são “as empresas enxutas18 trabalhando em
rede com uma variedade de fatores intervenientes, uma organização de trabalho em
equipe, ou por projetos, orientada para a satisfação do cliente e uma mobilização geral
dos trabalhadores graças às visões de seus líderes19” (p. 115-116).
Pode-se definir, na referida década, como empresa moderna a que trabalha em
rede, ou seja, sendo a sua imagem a de um organismo, constituído por um núcleo e
cercado de fornecedores, de subcontratados, de prestadores de serviços, de pessoal
intermediário, permitindo, desta forma, a variabilidade das pessoas que efetivamente
18 O termo "enxuta” (“maigre” no original) é utilizado para identificar a empresa (a qual apresenta entre outras características um conjunto de novos métodos de produção) que tenha eliminado a maior parte de seus escalões hierárquicos (mantendo apenas entre 3 a 5). Destaque-se ainda que este tipo de empresa utiliza prestadores de serviços externos à sua atividade principal, como forma não só de reduzir as equipes de direção como também uma maneira de diminuir os seus custos fixos. 19 “Leaders” no original.
97
nela estão inseridas, de acordo com a atividade, em empresas, poder-se-ia dizer,
interligadas.
Neste tipo de trabalho passa a imperar, conforme já mencionado, o atendimento
dos desejos do cliente que é considerado o “rei” (p. 126). “Os trabalhadores devem estar
organizados em pequenas equipes pluridisciplinares (porque são mais competentes,
mais flexíveis, mais inventivas e mais autônomas do que os serviços especializados dos
anos 1960) cujo verdadeiro patrão é o cliente” (p. 117). Poder-se-ia dizer que as equipes
seriam, por si mesmas, auto-reguladoras e o que vigora, nesse caso, não é mais a
atuação de um chefe, mas de um coordenador.
A informação e a inovação têm uma circulação mais rápida, no trabalho em rede,
favorecendo, de certa forma, a todos que se encontram nela envolvidos. A informação
aparece como tendo um papel importante na produtividade e no lucro. O conhecimento
genérico e diverso torna-se importante para o subcontratado que, muitas vezes, em
função de atender a demandas de diferentes clientes, é requisitado a solucionar
problemas variados.
A contrapartida do fato da satisfação do cliente, predominante no gerenciamento
presente nos anos 1990, é um dogma, que traz uma dupla vantagem: “de um lado, o de
orientar o autocontrole no sentido favorável de obtenção do lucro visto que em uma
economia concorrencial a capacidade diferencial de uma empresa para satisfazer seus
clientes é um fator essencial de sucesso e, por outro lado, o de transferir aos clientes
uma parte do controle exercido nos anos 1960 pela hierarquia” (BOLTANSKI;
CHIAPELLO, p. 126).
A questão central dentro da referida organização é o papel do gerente, que não
possui uma função hierárquica tal como a do chefe de outras décadas. É este novo líder,
que com a sua visão, torna fundamental, para os trabalhadores envolvidos no projeto, o
sentido do trabalho a ser desenvolvido, por cada um destes. Desta maneira, o
trabalhador adere ao projeto e o líder constitui-se o ponto central deste dispositivo, sem
necessidade de imposição de sua autoridade aos que nele estão envolvidos, os quais
permanecem ainda com a liberdade de se organizarem.
De um lado, a figura do trabalhador envolvido no projeto é, por assim dizer, não
só ideal como também, muitas vezes, utópica na medida em que traça o perfil deste
como uma pessoa que seja adaptável, apta a desempenhar várias tarefas, constantemente
atualizada, com organização própria e capaz de trabalhar com profissionais
98
extremamente diferenciados. Por outro lado, o gerente possui a função de permitir, com
liberdade, o desenvolvimento pleno do potencial de cada trabalhador aí envolvido.
Em uma cidade denominada por projetos, que é assim denominada por
Boltanski e Chiapello para designar o novo aparelho justificativo que parece estar em
formação, a atividade constitui o princípio superior comum, ou seja, o equivalente geral
de medição da grandeza das pessoas e das coisas. No entanto, diferentemente “do que se
constata na cidade industrial, onde a atividade se confunde com o trabalho e onde os
ativos são por excelência os que dispõem de um trabalho assalariado estável e
produtivo, a atividade, na cidade por projetos, supera as oposições do trabalho e do não-
trabalho, do estável e do instável, do assalariamento e do não assalariamento, do
interesse e da benevolência, do que é avaliável em termos de produtividade e do que,
não sendo mensurável, escapa de toda a avaliação contabilizada” (p. 165).
A atividade visa gerar projetos ou integrar projetos que podem ter sido iniciados
por outros, sendo uma acumulação de laços. É um elemento dinâmico correspondendo a
um projeto de rede e, por não ser pessoal não importa a identidade de cada indivíduo
nela inserido. A atividade insere-se nas redes e as explora, integrando pessoas para
propiciar a concepção de um projeto. A atividade se manifesta na multiplicidade de
projetos que podem se desenvolver, sucessivamente e de forma concorrente. “A vida é
concebida como uma sucessão de projetos, tanto mais válidos quanto mais diferentes
forem uns dos outros” (p. 166).
O termo projeto agrega diferentes realizações, tais como, desde o fato de se
inaugurar ou encerrar o funcionamento de uma usina, realizar um projeto de
reengenharia ou a produção de uma peça de teatro (p. 167). A extensão da rede é
considerada a própria vida ao passo que sua interrupção pode estar assimilada à morte,
no sentido da exclusão deste mundo reticular. Nesse sentido, o mundo conexionista
implica a necessidade de haver, entre as pessoas, entre outras condições, a comunicação,
a coordenação, a adaptação, a confiança que devem ser estabelecidas entre elas.
O projeto é considerado um dispositivo transitório, sendo justamente, este
caráter provisório que lhe é atribuído, que faz com que este esteja ajustado a um mundo
em rede: “a sucessão de projetos multiplicando as conexões e fazendo proliferar os
laços, tem por efeito estender as redes” (p. 167). O projeto é coordenação, esgotando-se
no compromisso.
99
Na verdade, a vida social, na concepção de um mundo reticular, “é uma
multiplicação de encontros e de conexões temporárias, mas reativáveis”, que reúnem
diversos grupos, independente das distâncias sociais, profissionais, geográficas e
culturais que podem existir entre estes. Nesse sentido, “o projeto é a ocasião e o
pretexto da conexão” (p. 156).
No mundo das redes, a flexibilidade e a adaptabilidade das pessoas são
qualidades importantes neste cenário. Em uma relação de grandeza, a pessoa
classificada em seu topo [denominada de grande] é valorizada por ter a capacidade de
ser flexível, adaptável, capaz de enfrentar diferentes de forma concomitante ajustando-
se a estas, enfim, sendo polivalente. Em um mundo conexionista, aquele que se
enquadra neste perfil é ativo e autônomo.
Boltanski e Chiapello destacam, de um lado, em relação ao grande que “é
precisamente esta adaptabilidade e esta polivalência que o tornam empregável, isto é, no
universo da empresa, ou mesmo se inserir em um novo projeto” (p. 169). Por outro
lado, o pequeno, nessa mesma escala, é o que se apresenta fechado às novas idéias,
sendo autoritário e rígido, além de não ter o poder da comunicação.
“A rigidez que, sendo contrário da flexibilidade, constitui neste mundo o defeito
principal dos pequenos, pode ter diferentes origens. Ela pode derivar da vinculação a
um só projeto que é impossível de abandonar quando um novo se apresenta ou ainda da
vinculação a um lugar que, tornando-o imóvel e enraizando-o no local, cerceia o
pequeno em um círculo de laços já estabelecidos e o impede de realizar novas conexões.
Ela pode enfim encontrar seu princípio em uma preferência pela segurança mesmo que
seja ao preço da autonomia” (p. 179). Nesse sentido, aquele que possui um status não
apresenta a capacidade da mobilidade considerada importante em um mundo em rede.
Em relação à mobilidade da força de trabalho, é fundamental ressaltar o
pensamento de Castells que salienta o fato desta estar relacionada tanto a trabalhadores
não-qualificados quanto a qualificados. “Embora uma força de trabalho permanente
ainda represente a norma na maior parte das empresas, a subcontratação e os serviços de
consultoria são uma forma de obtenção de trabalho profissional em rápido crescimento.
Não são apenas as empresas que se beneficiam da flexibilidade. Muitos profissionais
especializados acrescentam ao emprego principal (horário integral ou meio-expediente)
serviços de consultoria, o que ajuda a melhorar sua renda e poder de barganha. A lógica
desse sistema de trabalho altamente dinâmico interage com as instituições trabalhistas
100
de cada país: quanto maior as restrições a essa flexibilidade e quanto maior o poder de
barganha dos sindicatos de trabalhadores, menor será o impacto sobre salários e
benefícios e maior será a dificuldade de os novos trabalhadores serem incluídos na força
de trabalho permanente, com isso limitando a criação de emprego” (p. 287-288).
Um outro ponto importante, ressaltado pelo citado autor, é a intensa
transformação das relações sociais entre capital e trabalho. “Na essência, o capital é
global. Via de regra, o trabalho é local. O informacionalismo, em sua realidade
histórica, leva à concentração e globalização do capital exatamente pelo emprego do
poder descentralizador das redes. A mão-de-obra está desagregada em seu desempenho,
fragmentada em sua organização, diversificada em sua existência, dividida em sua ação
coletiva. As redes convergem para uma meta rede de capital que integra os interesses
capitalistas em âmbito global e por setores e esferas de atividades: não sem conflito,
mas sob a mesma lógica abrangente. Os trabalhadores perdem sua identidade coletiva,
tornam-se mais individualizados quanto às suas capacidades, condições de trabalho,
interesses e projetos. Distinguir quem são os proprietários, quem são os produtores,
quem são os administradores e quem são os empregados está ficando cada vez mais
difícil em um sistema produtivo de geometria variável, trabalho em equipe, atuação em
redes, terceirização e subcontratação” (p. 502-503).
Considerações sobre os significados da informalidade
O objeto central da reformulação da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) da década de 1990 foi, em relação ao tema trabalho, o de
contemplar a diversidade das relações de trabalho no Brasil, no que diz respeito ao
entendimento da informalidade. Em seu questionário, a produção de evidências
empíricas através de um elenco de quesitos destina-se a captar, de forma mais adequada,
a heterogeneidade das formas de organização da produção e do trabalho no Brasil,
através das diversas categorias de posição na ocupação.
Em nosso entender, parece propício estudar, em uma mesma fonte de dados
estatísticos, tal como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), os
campos formal e informal. De um lado, na literatura especializada, esta fronteira
existente entre os mesmos nos aparece, por vezes, sutil e entrelaçada. Por outro lado, é
confirmado o fato de que ambos são faces de um mesmo processo, registrando-se
101
movimentos de passagem da população trabalhadora tanto no mercado de trabalho
formal como no informal ou a sua permanência, de forma concomitante, em ambos.
Tendo em vista estas considerações, circunscrever o referido processo, de forma
geral, em uma mesma fonte de informação estatística, nos parece mais indicado para a
verificação da compreensão da informalidade e a percepção da adequação desta fonte de
informação estatística aos novos significados, categorizações e articulações que estão
presentes no debate em pauta.
Segundo os novos significados, a diferenciação por posição na ocupação,
proposta na PNAD, nas redes, torna-se complexa, pois depende dos fluxos nela
estabelecidos. A idéia de fluxo implica em uma situação dinâmica indicativa de
transitoriedade. Os trabalhadores incluídos hoje na rede podem alternar sua posição na
ocupação, sendo empregador, em um dado momento no tempo e posteriormente,
empregado. O estatuto jurídico é importante, mas sua concepção é alterada no sentido
de que esta deve estar associada à conexão de rede.
Além do mais, a determinação da posição na ocupação estabelece-se, muitas
vezes, de forma não tão imediata. Por exemplo, os “consultores”, assim denominados na
sua designação de ocupação, como já observado, podem ser na verdade empregados
sem carteira, ocultos por esta configuração.
As questões apontadas por Silva e Chinelli (1997, p.25), indicam que pode estar
ocorrendo, em primeiro lugar, “não uma transformação total da noção de informalidade
anteriormente adotada, mas talvez uma ampliação de seu campo semântico ou ambos os
casos”.
Em segundo lugar, um dos pontos-chave e novo, apontado pelos referidos
autores, é o referente às conseqüências diferenciadas das mudanças processadas no
mercado de trabalho para os segmentos específicos de trabalhadores. De um lado, as
camadas médias, até então mais protegidas dos efeitos da crise econômica são atingidas,
de modo particular, parecendo indicar, “para a maioria, empobrecimento e perda de
segurança, mas não proletarização” (p. 43), significando perdas de direitos trabalhistas
bem como diminuição quantitativa e qualitativa das relações assalariadas. Por outro
lado, cabe ressaltar, o movimento estabelecido, de forma voluntária ou não, no sentido
de estimular o surgimento de “novos empreendedores”, inserindo, neste caso, também
os segmentos de trabalhadores de camadas médias.
102
De um lado, foi visto um capitalismo, em expansão, acompanhado por
freqüentes mudanças, convivendo com uma situação econômico-social, envolvendo um
contingente expressivo de população, em condições desfavoráveis. Por outro lado,
assistiu-se a falta de atuação da crítica social, não apresentando propostas alternativas
para a população atingida ou não realizando denúncias a este respeito.
Visto que o espírito do capitalismo é a ideologia que justifica o engajamento no
capitalismo, é necessário destacar a tensão latente que ocasiona à permanente
atualização do processo de argumentação utilizado. Este procura revelar não só os
benefícios dos indivíduos em função de sua participação no processo capitalista como
também as vantagens coletivas definidas para a sociedade como um todo.
As justificativas apresentadas parecem ilustrar a demonstração que, na realidade,
a exigência de justiça é continuamente transgredida, revelando um jogo de interesses no
qual as relações de forças traduzem, mesmo que de forma velada, a dominação dos
interesses do capitalismo sobre os benefícios, produzidos por este, para os
trabalhadores.
Em que medida o perfil esboçado para o trabalhador que implique em um poder
de mobilidade, ultrapassando, por vezes, fronteiras geográficas, propicia a este a
possibilidade favorável para a sua empregabilidade ou o aprisiona, de certa forma, a
deter um preparo e conhecimento amplo que o torne apto face à concorrência acirrada
no mercado de trabalho? Além do mais, o discurso da formação de “novos
empreendedores” se de um lado, revela o desejo de muitos trabalhadores de gerir o seu
próprio empreendimento ou a sua força de trabalho, por outro indica uma cultura, que se
forma no mundo de trabalho, marcada pela incerteza de assegurar a estes trabalhadores
e a seus descendentes uma condição de trabalho para toda a vida, nas quais garantias e
direitos trabalhistas lhe eram mantidos.
Segundo as questões discutidas, que implicam mudanças no processo de
trabalho, ter-se-ia de fato uma produção de evidência empírica atual contemplando os
novos significados presentes no tema da informalidade?
É nosso objetivo analisar a adequação das estatísticas oficiais [como a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios], através de seus conceitos e variáveis, face às
novas questões apontadas que indicam, muitas vezes, a inserção do trabalhador no
mercado de trabalho, retratando uma situação de transitoriedade, que o tornam menos
103
ou mais empregável, provocando insegurança, em termos de sobrevivência, dos
trabalhadores nela envolvidos.
104
CAPÍTULO IV
A INVESTIGAÇÃO DA INFORMALIDADE: A ANÁLISE DA PRODUÇÃO
DE EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS
No desenvolvimento do objeto de análise, qual seja o problema de investigação
da informalidade, foram apresentados os enfoques teóricos adotados em seu estudo que
se refletem, em termos concretos, nas variáveis que são utilizadas para compor as
evidências empíricas a este respeito. Considera-se fundamental a busca da associação do
sentido lógico-formal, apresentado anteriormente, às tentativas de caracterização desta
questão que é vista, dentre as fontes de dados existentes a este respeito, por meio das
estatísticas oficiais do país.
A produção de evidência empírica, selecionada para o alcance dos objetivos
citados, é a da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) desenvolvida na
Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Fundação IBGE), pretendendo
ser esta avaliação de cunho teórico-analítico.
Esta é uma pesquisa domiciliar realizada anualmente, excetuando os anos
referentes à realização dos Censos Demográficos, que contém informações referentes às
características sociais e econômicas da população brasileira e é divulgada em nível de
Brasil, Grandes Regiões, Estados e Regiões Metropolitanas. Os temas abordados
referem-se, inicialmente, às características dos domicílios em termos de habitação,
saneamento básico e acesso aos bens de consumo. São investigados, em termos da
população, aspectos gerais da família, de educação, de trabalho, de rendimento bem
como outros componentes da estrutura e da dinâmica demográfica como a fecundidade,
mortalidade, nupcialidade e migração.
A qualidade de análise do problema de investigação da informalidade depende
das fontes de dados consideradas, atreladas ao enfoque teórico adotado, bem como das
informações tidas como relevantes em seu estudo.
O desafio reside na necessidade de interligar os novos significados, as
categorizações e as articulações no debate da informalidade, tendo sempre presente as
transformações provocadas no mundo do trabalho pela globalização do capital, às
categorias de análise, até então adotadas, que estão contidas nas fontes de informações
estatísticas.
105
Em relação à captação do tema informal, no campo das informações estatísticas,
são estabelecidos desafios constantes tendo em vista que estas tomam como referência,
de um modo geral, o modelo de emprego formal, qual seja, tipicamente capitalista,
aparecendo a inserção da população no campo do informal como oposição a este.
Conforme ressaltado em documento sobre a revisão da PNAD (Rinaldi et al,
1991, p. 10), “cabe fazer menção às origens dessa pesquisa que remontam ao Projeto
Atlântida, que forneceu as bases definidoras do escopo da pesquisa. O Projeto Atlântida,
viabilizado através da Agência Internacional para o Desenvolvimento (AID), e
implantado no país em 1967, visava, a grosso modo, a atender às necessidades de um
maior conhecimento sobre a realidade sócio-econômica brasileira, o que era, também
extensivo a outros contextos da América Latina. Por outro lado, a atividade de
planejamento orientadora da ação governamental naquela época requeria, igualmente, o
levantamento de informações que permitissem a elaboração de um diagnóstico da
situação econômica, social e demográfica do Brasil. Essas informações eram
demandadas para um período de tempo mais reduzido do que o intervalo censitário, e
para agregados espaciais diferenciados (nacional, regional e estadual)”.
A realidade é atingida pelas mudanças, embutidas no espírito do capitalismo,
que estão provocando, cada vez mais, a diminuição da inserção da população neste
modelo de emprego. Estas revelam as dificuldades crescentes de absorção de mão-de-
obra em função das complexas transformações ocorridas no mercado de trabalho
provocadas pela globalização do capital. Torna-se importante analisar o seu
entendimento por intermédio das estatísticas oficiais como a PNAD.
Como hipótese central desta tese aponta que as profundas mudanças no mundo
do trabalho afetam cada vez mais a absorção da mão-de-obra, acrescendo-se a estas o
ritmo no qual estão sendo processadas. Tal fato traz obstáculos nas evidências empíricas
das estatísticas oficiais, como a PNAD, para a compreensão e a captação adequada deste
fenômeno.
Tendo em vista os aspectos anteriormente apresentados, o problema,
desenvolvido nesta tese, está em verificar: em que medida as novas questões presentes
no debate público, sobre as dificuldades de absorção do trabalho, podem ser discutidas
com base nas classificações oficiais nacionais que buscam se adequar aos parâmetros
indicados em suas recomendações internacionais.
106
A análise e a interpretação, apresentadas nas mudanças de variáveis das
estatísticas oficiais, ao longo do tempo, bem como aquelas indicadas como
fundamentais na definição da informalidade aliadas às justificativas ou aos motivos,
explicitados ou subjacentes, por estarem inseridas nesta pesquisa constituem-se em
caminhos importantes nesta comprovação.
A pesquisa básica utilizada é a PNAD da década de 1990, a qual teve um amplo
processo de reformulação neste período, com o objetivo de apreender a diversidade das
relações de trabalho no país. Com essa finalidade, a partir de 1992, foi produzido um
questionário com um amplo conjunto de variáveis. A produção das estatísticas da
PNAD até a década de 1980 será utilizada comparativamente, quando for o caso, para
destacar os possíveis avanços apontados em relação à questão investigada.
1. A Produção do Questionário: Um Instrumento de Análise
De início, entende-se como necessário, para a elaboração do questionário,
demonstrar o caminho traçado em sua construção, na qual deve estar embutida a
concepção teórica adotada. Conforme já citado, esta produção poderá ser tanto mais
próxima de nossos intentos dependendo dos instrumentos de análise em pauta. Pretende-
se agregar, à compreensão da elaboração do questionário, a crítica, por assim dizer,
semântica desta realização (em analogia à busca do significado da produção do
questionário).
O questionário é elaborado com a participação de especialistas nos temas
constantes do mesmo. A intenção dos que o elaboram é o de transformá-lo em um
instrumento de análise destinado a realizar, de modo mais fidedigno possível, a captação
de uma adequada produção de evidência empírica sobre a realidade brasileira.
É bem verdade que a elaboração do questionário não pode ser considerada
liberta de julgamentos de valor, apesar da constante preocupação com a objetividade
que todo pesquisador procura imprimir. Embora o observador busque adotar uma
posição impessoal frente ao objeto estudado, esta não parece ser inteiramente destituída
destes julgamentos.
Como ensinaria Weber (in BOLTANSKI, p. 31) “sem o recurso de um ponto de
vista, tomando como referência os valores, como seria possível selecionar no fluxo
emaranhado do que acontece, o que merece ser destacado, analisado, descrito?”
107
1.1 - Processo de Reformulação da Pesquisa: histórico da sua construção
Entendemos ser importante destacar inicialmente, em caráter descritivo e de
forma sucinta, o processo de revisão da PNAD da década de 1990, em sua construção.
Compreende-se que desta resultaram dados estatísticos, concebidos para a compreensão,
entre outros aspectos, da informalidade, que refletiram uma intenção de atualizar a
pesquisa, em termos teóricos, adequando-a, na medida do possível, às recomendações
internacionais até então vigentes.
A reformulação da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) teve
como ponto de partida a elaboração de um projeto, do qual constava não só uma
reflexão crítica sobre a parte conceitual da mesma, tal como se apresentava na década
de 1980, como também uma proposta de reformulação do corpo básico da PNAD para
os anos 1990 (RINALDI; VIANNA; BRITO, 1990).
O referido projeto foi discutido internamente na Fundação IBGE como também
enviado, em janeiro de 1990, à comunidade científica externa à Instituição, abarcando
especialistas nos vários temas da PNAD. Em relação aos usuários externos, de um total
de 126, somente 10% responderam a esta demanda.20
Quanto aos usuários da Fundação IBGE, os profissionais da Coordenação
responsáveis pela realização da PNAD, na época Departamento e hoje Coordenação de
Emprego e Rendimento, contaram com a participação de pesquisadores das áreas do
Censo Agropecuário, da População e Indicadores Sociais, das Contas Nacionais e da
Geografia.21
Cabe ressaltar, também, que das reflexões sobre a necessidade de reformulação
da PNAD, resultaram textos elaborados (BRITO; MEYER, 1994a, 1994b;
20 Foram recebidas as contribuições por escrito dos pesquisadores externos à Fundação IBGE, pertencentes à época às seguintes instituições: Ademar Ribeiro Romeiro (UFF); Aldo Paviani (UNB); Anita Kon (FGV/USP); Godeardo Baquero Miguel (MEC- SEEC); Jorge Jatobá (PI-MÊS/UFPE); Leonardo Guimarães Neto (Fundação Joaquim Nabuco); Luís Carlos Eichenberg Silva (IEI/UFRJ); Ramonaval Augusto Costa (UNB) e Thomas Controt (UNB). 21 Foram recebidas as contribuições por escrito dos pesquisadores da Fundação IBGE, pertencentes à época aos seguintes Departamentos, hoje denominadas Coordenações: Antônio de Ponte Jardim (antigo Departamento de População, atual Coordenação de População e Indicadores Sociais); Celso Cardoso da Silva; Elisa Caillaux; Francisca Laíde de Oliveira; Helena Alvim Castello Branco; José Carmelo Braz de Carvalho; Lilian Maria Miller; Luiz Antônio Pinto de Oliveira; Maria das Graças Mangueira Este; Regina de Paula Santos Prado Simões (todos alocados no Departamento de Indicadores Sociais, atual Coordenação de População e Indicadores Sociais) além da contribuição realizada pelo então Departamento, atual Coordenação de Contas Nacionais.
108
GUIMARÃES, 1994; OLIVEIRA, 1994; VIANNA, 1994), em 1988, pelos
participantes da equipe de pesquisadores nela envolvidos. 22
Posteriormente, foi organizado, ainda em 1998, um seminário interno à
Fundação IBGE (SEMINÁRIO INTERNO PNAD, 1988) 23. O objetivo deste era o de
avaliar o formato atual da referida pesquisa tendo em vista à revisão dos temas
componentes de seu corpo básico 24.
O referido projeto foi apresentado, inicialmente, na Conferência Nacional De
Estatística (CONFEST), em 1989, e as sugestões, então realizadas (tais como as
relacionadas à necessidade de aprimoramento na captação da denominada economia
informal), foram incorporadas ao anteprojeto de revisão da PNAD (RINALDI;
VIANNA; BRITO, 1990) e fazem parte do documento “Síntese do Grupo Estatísticas
do Trabalho” (CONFERÊNCIA NACIONAL DE ESTATÍSTICA, 1991).
Senra (1991, p. 4)25 destacou a intensa reflexão realizada sobre a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios em função de sua reformulação para a década de
90: “nesse movimento temos nos guiado pela estrutura da atual pesquisa básica, onde se
destaca a investigação da força-de-trabalho. Desse ponto de partida, apoiados na
literatura especializada, nacional e internacional, decidimos reforçar a inserção dessa
pesquisa no Sistema de Estatísticas do Trabalho, antecipando-nos às recomendações
emanadas da IIIa Conferência Nacional de Estatísticas – CONFEST. (nos termos da
Síntese de Estatísticas do Trabalho, relatado por Jane Souto de Oliveira)”.
A intenção explicitada era de que “a nova pesquisa básica mais se aproxime do
fenômeno trabalho, em sua complexa realidade. Não obstante entendemos que essa
pesquisa deva gerar medidas de outros fenômenos populacionais, como quer a tradição.
Isto posto em face da complexidade dessa empresa, optamos por elaborar um
22 Inicialmente o projeto da revisão da PNAD teve a participação de Luís Sérgio Pires Guimarães e Zuleica Lopes Cavalcanti de Oliveira, então pertencentes ao quadro funcional do Departamento, atual Coordenação, de Emprego e Rendimento. 23 Realizado de 26/08/1988 a 02/09/1988, na Fundação IBGE, Rio de Janeiro, RJ. A comissão organizadora foi formada por Nelson de Castro Senra, Luiz Antonio Pinto de Oliveira, Paulo César de Santos Quinstlr e Zuleica Lopes Cavalcanti de Oliveira (pertencentes na época ao Departamento, hoje denominado de Coordenação, de Emprego e Rendimento). 24 O referido seminário foi estruturado em três módulos, a saber: 1) A ciência e as estatísticas estruturais: a problemática da mão-de-obra; 2) As estatísticas estruturais e sua dimensão territorial e 3) As áreas temáticas: histórico e propostas de estatísticas estruturais básicas para a PNAD. 25 SENRA, Nelson de Castro (chefe do então Departamento de Emprego e Rendimento e mentor da concepção do Projeto de Revisão da PNAD, tendo acompanhando e nos orientado, com extrema dedicação na elaboração do anteprojeto de revisão da PNAD, sobretudo na parte conceitual).
109
anteprojeto de revisão estruturado em módulos26. Por essa forma, acreditamos que
nossas oportunidades de bem discutir as dimensões teórico-conceitual e teórico-
processual, inerentes a toda e qualquer pesquisa, serão significativamente maiores”
(SENRA, 1991, p. 4).
O projeto de revisão da PNAD e a síntese das exposições referentes às
estatísticas do trabalho destacaram, em suas conclusões, que “reconhecendo que as
atividades agrícolas são o ‘grande ausente’ do sistema de estatísticas do trabalho,
embora absorvam cerca de 1/4 da PEA brasileira, considera-se prioritário o esforço de
investigação das relações de trabalho, na área rural” (CONFERÊNCIA NACIONAL DE
ESTATÍSTICA, 1991, p. 56). Foram apontados dois instrumentos que poderiam ser
utilizados para atingir este objetivo: a PNAD e o Censo Agropecuário.
Além este tema, foi ressaltado, na referida Conferência (CONFEST), no
relatório da síntese das exposições, a necessidade de um maior aprofundamento da
questão da economia informal. Foi sugerida a inclusão na PNAD de uma desagregação
maior das categorias de posição na ocupação, sobretudo no caso dos empregados,
distinguindo-se os empregados públicos, vinculados ou não às estatais, os domésticos e
os empregados particulares na produção e circulação de mercadorias. Aliada a este fato
foi apontada a importância da indagação sobre a posse de carteira de trabalho assinada e
a contribuição à Previdência Social, além da identificação do local de trabalho e da
mensuração do tamanho do “negócio” ou da “firma” para todas as pessoas ocupadas.
A equipe de pesquisadores envolvidos com a responsabilidade da revisão
conceitual da PNAD teve ainda a participação, em todo o processo de execução de sua
pesquisa, de técnicos pertencentes às Unidades Regionais da Fundação IBGE
(coordenadores regionais da Revisão da PNAD27), requisitados para este fim, dos
Estados do Pará, Maranhão, Piauí, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul.
26 Foram planejados quatros módulos seqüenciais relacionados em seus conteúdos: a 1) a questão conceitual (análise crítica das estatísticas do trabalho na atual pesquisa básica; a discussão internacional sobre as estatísticas do trabalho e o conceito de trabalho; a delimitação do fenômeno: o trabalho agrícola e o trabalho não-agrícola; propostas de investigação); 2) a questão cadastral (a lógica; o modelo de amostragem; as informações para a aleatorização; a atualização do cadastro; a técnica e os recursos; o cronograma de trabalho); 3) a questão processual (coleta; a lógica; a técnica do questionamento; a dupla coleta; os recursos; o cronograma de trabalho) e 4) a questão documental (as tabelas; os relatórios analíticos; os arquivos magnéticos; a matriz de covariância; os recursos; o cronograma de trabalho) (RINALDI et al, 1991, p. 4-5). 27 Coordenadores Regionais da Revisão da PNAD – João Machado (Pará); Nereu Aquiles de Souza Guedelha (Maranhão); Pedro Soares da Silva (Piauí); Eliana Maria Lisboa Garrão (RJ); Eliana Filomena da Silva (São Paulo); Renato Barbieri de Lima (Rio Grande do Sul).
110
Foram concebidos dois testes preliminares (denominados pré-testes)28, o
primeiro em1990 e o segundo em 1991, que se constituíram em atividades de campo
visando à construção bem como o aprimoramento da parte conceitual da pesquisa. O
objetivo era o de verificar os conceitos propostos e os temas considerados importantes
para a investigação das relações de trabalho no país.
A escolha dos municípios nas Unidades da Federação investigadas, nos referidos
testes, teve como colaboradores os pesquisadores do então Departamento, hoje
Coordenação, de Geografia29.
No 1o Pré-teste foram selecionados domicílios30 localizados nas capitais,
municípios circunvizinhos além de alguns municípios no interior (Pará, Piauí, Rio de
Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul)31.
No 2o Pré-teste, foram escolhidos 42 domicílios em cada Unidade da Federação
investigada (Pará, Maranhão, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul). 32
Nos dois pré-testes realizados, a seleção dos referidos municípios procurou
seguir critérios que estabeleciam a verificação de um conjunto de situações de trabalho
em áreas selecionadas, diferenciadas quanto ao desenvolvimento sócio-econômico. A
distribuição dos domicílios deveria feita de acordo com a atividade (agrícola e não-
agrícola), contemplando as categorias de posição na ocupação mais significativas de
cada área. No caso das atividades não-agrícolas, foi ressaltada a necessidade de
investigação das diversas categorias de posição, tendo em vista a inserção diferenciada
28 O 1o Pré-teste foi realizado em cinco Unidades da Federação: Pará, Piauí, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, de 20 a 24/08/90 e Rio de Janeiro de 27 a 31/08/90. O 2o Pré-teste foi aplicado nas mesmas áreas de 08/07/91 a 12/07/91, estendendo sua aplicação até 16/07/91, nos estados do Pará e Maranhão (este último incluído no 2o Pré-teste) . 29 Onorina Fátima Ferrari, Aluísio Capdeville Duarte, Lourdes M. Strauch, Maristela Brito e Olga Maria Buarque de Lima Fredrich, que trabalharam nos Projetos “Divisão Regional do Brasil em Meso e Microrregiões” e “Geografia do Brasil”. 30 O número de domicílios visitados foi superior àquele previsto no 1o Pré-teste, totalizando em termos de entrevistas realizadas no Estado do Pará, 56; no Estado do Piauí, 65; no Estado do Rio de Janeiro, 49; no Estado de São Paulo, 53 e no Estado do Rio de Janeiro, 53. 31 No trabalho de campo do 1o Pré-teste foram selecionados os municípios de: Tomé-Açu, Igarapé-Miri, São Miguel do Guamá e Paragominas (no Estado do Pará); Teresina, Pio IX, Água Branca e Piripiri (no estado do Piauí); Rio de Janeiro, Magé, Campos, Natividade, Bom Jardim e Rio Claro (no Estado do Rio de Janeiro); São José do Rio Preto, Ribeirão Preto, Sertãozinho e Catanduva (no Estado de São Paulo) e Porto Alegre, Novo Hamburgo, Canoas, São Leopoldo, Bento Gonçalves e Passo Fundo (no Estado do Rio Grande do Sul). 32 No trabalho de campo do 2o Pré-teste foram selecionados os municípios de: Belém, Ananindeua, Marabá e Soure (no Estado do Pará); São Luís, Paço do Lumiar, São José do Ribamar, Viana, Brejo e Imperatriz (no Estado do Maranhão); Rio de Janeiro, Nova Iguaçu, Cabo Frio, Piraí, São Sebastião do Alto e São João da Barra (no Estado do Rio de Janeiro); São Paulo, Santo André, Itapeva, Jaú e Mineiros do Tietê (no Estado de São Paulo) e Porto Alegre, Charqueadas, Pelotas, Santa Rosa e Santo Cristo (no Estado do Rio Grande do Sul).
111
da mão-de-obra nestas atividades econômicas (REVISÃO..., [1994], v.1, t.5, p.5). Em
relação às atividades agrícolas, procurou-se observar as características sócio-
econômicas nas referidas áreas para se obter uma representação mínima das diversas
situações de engajamento da população na atividade econômica.
O teste final para a implantação de um questionário da PNAD, reformulando a
parte conceitual da referida pesquisa, foi efetuado no Estado do Paraná, em maio de
1992, ano inicial da implantação da nova estrutura da PNAD da década de 1990. As
entrevistas foram realizadas nos municípios de Curitiba, Paranaguá, Paranavaí, Pato
Branco, Toledo, Maringá, Guarapuava, Umuarama e Cornélio Procópio (REVISÃO...,
[1994], v.1, t.7).
Cabe destacar então que o ponto central da revisão da PNAD, em termos
conceituais, apresenta como objetivo captar a diversidade das relações de trabalho no
Brasil, entre as quais encontra-se contemplada a investigação da informalidade.
Em linhas gerais, no referido período, que resultou na elaboração de conceitos e
de variáveis que estão embutidos no questionário produzido, a idéia dominante sobre a
informalidade era a de que esta seria formada a partir da exclusão de um determinado
contingente da população do mercado de trabalho formal. Ou seja, o processo informal
de trabalho associava-se, em sua dinâmica à do mercado de trabalho capitalista. Em
períodos de crise econômica, se por um lado havia a expulsão de uma parcela da
população das relações de trabalho denominadas formais, por outro lado, o segmento de
força de trabalho informal, crescente nesses momentos, era tido como marginalmente
inserido na economia capitalista bem como no processo de integração social.
De forma geral, o questionário buscou a observação do processo de relações de
trabalho como um todo, tentando associar não só as não-agrícolas como também
aquelas agrícolas. Em ambas podem estar inseridas as relações de trabalho
formal/informal, existindo muitas vezes o fato de que um trabalhador pode estar, ao
longo de sua vida produtiva, alternando sua inserção em ocupações formais ou
informais ou estar envolvido, concomitantemente, em ambas.
A questão fundamental reside em verificar até que ponto o questionário, produto
do pensamento da equipe de pesquisadores nele envolvidos e base de informação para o
debate sobre informalidade, reforça a construção do conceito de informalidade, à época
de sua elaboração.
112
Se o questionário, em sua concepção, procurou contemplar a heterogeneidade
das relações de trabalho, por outro lado, em que medida, na atualidade, estar-se-ia
verificando, por assim dizer, a necessidade da (des) construção de seus alicerces em
função das dificuldades de absorção da força de trabalho e das novas questões
apresentadas, em termos de trabalho (que impõem a discussão conceitual da noção de
informalidade)
A estrutura do questionário da PNAD tem como diretriz a distinção das pessoas
ocupadas em atividades agrícolas e não-agrícolas segundo as diversas categorias de
posição na ocupação. Um elenco de quesitos apresenta como propósito contemplar a
heterogeneidade das formas de organização da produção e do trabalho no Brasil.
As categorias de posição na ocupação traduziriam as relações de trabalho no
Brasil, em um determinado quadro institucional político-econômico, fazendo o
contraponto do assalariamento, visto como padrão e/ou modelo, com o trabalho
informal. As categorias de posição na ocupação e as variáveis são construções, do ponto
de vista lógico e analítico, que tentam retratar um quadro de evidências empíricas
atualizado das questões postas sobre o trabalho.
É nosso objetivo verificar a adequação das estatísticas oficiais, mais
especificamente a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, por meio de seus
conceitos e variáveis, face às novas questões apontadas, que revelam, muitas vezes,
situações de instabilidade ou de transitoriedade na inserção do trabalhador no mercado
de trabalho. Até que ponto as evidências empíricas estariam retratando estas questões
que estão surgindo, como “novas”, no mercado de trabalho?
As estatísticas oficiais brasileiras sobre trabalho e demais temas correlatos
constituem um dispositivo político-econômico de representação do fenômeno. Nestas
estão embutidos objetivos que, de um lado, pretendem abranger os aspectos gerais do
mesmo, buscando aliá-los às recomendações internacionais, para efeito de
comparabilidade com os dados de diversos países. Por outro lado, são necessários
ajustes para fornecer um retrato aproximado, embora parcial, da evidência empírica
sobre esta realidade nacional.
113
1.2 - As inovações da PNAD no tema “Trabalho” e suas contribuições para a
percepção da informalidade
Antecedendo a análise propriamente dita das variáveis importantes para a
compreensão da informalidade, é preciso ressaltar as inovações introduzidas na PNAD,
implantadas a partir de 1992 e que vigoram até hoje. O objetivo é apontar os reflexos
desses novos pontos na captação de um quadro mais adequado de produção da
evidência empírica, na qual está contemplada, de forma mais ampla, o nosso objeto de
análise, qual seja, o problema de investigação da informalidade.
Entre estas proposições, objeto do 1o Pré-Teste, algumas seguem recomendações
internacionais (itens c a f): (a) a inserção da população segundo o tipo de atividade
desenvolvida, ou seja, agrícola e não-agrícola; (b) um detalhamento das categorias de
posição na ocupação e, entre estas, o surgimento de outras, tais como a dos
trabalhadores domésticos; (c) a ampliação do limite de idade da investigação do tema
trabalho, considerando, além das pessoas de 10 anos ou mais, o conjunto das pessoas de
5 a 9 anos de idade; (d) a ampliação do conceito de trabalho através da inclusão das
atividades de auto consumo (e atualmente na PNAD, a captação da produção de ativos
fixos para o próprio uso, tais como construção de edifícios, estradas, etc.); (e) redução
do limite de horas trabalhadas para a atividade não remunerada (de 15 horas ou mais por
semana para pelo menos uma hora na semana); (f) captação das características do
trabalho da pessoa nos últimos doze meses além daquelas do trabalho exercido na
semana de referência.
O 1o Pré-Teste do Projeto de Revisão da PNAD teve como objetivo investigar
somente os aspectos conceituais relativos ao tema central da pesquisa, qual seja,
“Trabalho”, decorrentes da proposta de reformulação da PNAD (RINALDI; VIANNA;
BRITO, 1990).
Inicialmente é preciso destacar que o trabalho informal pode ser visto tanto nas
atividades agrícolas como naquelas não-agrícolas. Nesse sentido, o primeiro ponto
central de investigação na PNAD da década de 1990, em seu questionário, atende uma
captação mais adequada da diversidade das relações de trabalho no Brasil, entre elas da
informalidade, pois diferencia, em sua apreensão a inserção da população segundo o
tipo de atividade desenvolvida (agrícola e não-agrícola).
114
De um lado, é reconhecido, nessa produção de evidências empíricas, as
especificidades da inserção da população, em termos produtivos. Por outro lado, a
elaboração desta linha de captação, isolando as especificidades no sentido de serem
mais amplamente detalhadas, reconhece que estão articuladas a um todo, fazendo parte
de um processo mais amplo de desenvolvimento social e econômico.
O segundo item aprofunda a avaliação deste engajamento da população na
atividade econômica, agrícola e não-agrícola, através de um maior detalhamento das
categorias de posição na ocupação e o surgimento de outras, tais como a dos
trabalhadores domésticos. Ressalte-se que esta última categoria, quando possui
características de conta própria, é enquadrada em uma relação de trabalho informal, na
literatura especializada sobre este tema.
Tal como declarado nos objetivos do primeiro pré-teste: “a inserção da
população em atividades não agrícolas será investigada, segundo a posição na ocupação,
nas capitais e proximidades. Também serão pesquisadas, com este propósito, algumas
cidades de pequeno e médio porte. Neste sentido, serão discriminadas as categorias dos
empregados dos setores público e privado, dos trabalhadores por conta-própria e não-
remunerados, destacando-se, neste caso, também o setor informal, além de se pesquisar
os pequenos e grandes empregadores e os trabalhadores domésticos empregados e os
domésticos por conta-própria” (1. PRÉ-TESTE..., anexo 1, 1990, 1 v., p. 5). Os
trabalhadores engajados nas atividades agrícolas foram investigados em áreas
localizadas no interior.
A separação das atividades agrícola/não-agrícola e, dentro destas, a
discriminação das categorias de posições na ocupação, permitiu realizar avanços, em
relação às PNADs das décadas anteriores a 1990, no sentido de possibilitar a realização
de um conjunto de quesitos particulares, buscando o detalhamento das especificidades
bem como as diferentes formas de organização de trabalho existentes.
A diferenciação de atividades agrícola e não-agrícola bem como a desagregação
das categorias de posição na ocupação revelou-se muito oportuna, pois possibilita a
verificação da mencionada oscilação da inserção da população entre diferentes posições
na ocupação bem como formas de organização de trabalho distintas, incluindo-se no
bojo desta discussão a alternância da participação da população ocupada no mercado de
trabalho formal ou informal.
115
Conforme anteriormente destacado, no debate da origem da informalidade e
visto em um dos estudos pioneiros sobre este tema, qual seja, o informe da OIT sobre o
Quênia (EMPLOYMENT..., 1972), que uma grande parte dos estudos acadêmicos foi
pautada, durante décadas, na oposição existente entre as atividades formais e as
informais. No entanto, ao longo do tempo, não só a percepção da relação entre estas foi
sendo alterada como foi constatada, posteriormente, uma forte articulação entre estas,
que não significava necessariamente uma subordinação do informal ao segmento de
mercado formal de trabalho.
Em resultados de avaliação do 1o Pré-Teste, observou-se a inserção de uma
mesma pessoa tanto nas atividades agrícolas como naquelas não-agrícolas,
acompanhada ou não de membros da família em seu trabalho. Cabe ressaltar que esta
prática pode ser observada, por exemplo, não só para os empregados das atividades
agrícolas que, em alguns períodos, contam nas tarefas desenvolvidas com as suas
mulheres e filhos enquadrados como trabalhadores não remunerados, como também
para os trabalhadores por conta própria das atividades agrícolas e não-agrícolas. Estes
últimos constituem uma categoria representativa do trabalho informal, tendo ou não
sócios e/ou trabalhadores não remunerados.
Os objetivos da captação na PNAD da inserção da população nas atividades
agrícolas e não-agrícolas bem como a investigação das características de trabalho da
pessoa nos últimos doze meses, além do trabalho da semana, a ser verificada mais
adiante, visam contribuir: “para a melhor compreensão da divisão do trabalho, assim
como das diferentes estratégias de sobrevivência encontradas pelas famílias. Isto vem
reafirmar a importância de se ter, na investigação, seqüências distintas de perguntas para
os diferentes tipos de atividades, assim como períodos de referência diferentes, que
possibilitam a apreensão das várias formas de engajamento dos trabalhadores no
processo produtivo” (1. PRÉ-TESTE..., 1990, 1 v., p. 9).
O terceiro ponto é o da ampliação do limite de idade da investigação do tema
trabalho considerando todas as pessoas acima de 5 anos ou mais de idade, tendo para
isto sido incluído um bloco específico para o referido contingente etário. Anteriormente
à década de 90, era investigada na PNAD, em seu corpo básico de informações sobre
trabalho, somente a população de 10 anos ou mais de idade.
A captação das características de trabalho dos moradores de 5 a 9 anos de idade
teve como objetivo a investigação mais acurada do trabalho infantil tanto no campo
116
como na cidade. Sobretudo nas áreas rurais, desde a mais tenra idade, as crianças
participam das atividades produtivas, em geral, na condição de trabalhadores não
remunerados. Em geral, na família, o homem, responsável por esta, é contratado para a
realização das tarefas, incorporando as mulheres e as crianças para auxiliá-lo
principalmente nas tarefas relacionadas ao plantio e à colheita. Desta forma, a
socialização destas ocorre, de modo prematuro, através do trabalho, mesmo que este
seja realizado de forma intermitente.
A inclusão da investigação do trabalho dos menores de 5 a 9 anos muito
contribui para a compreensão da informalidade, tendo em vista que estes são
classificados, muitas vezes, como trabalhadores não remunerados, em ajuda a
trabalhadores por conta própria ou empregadores, tanto em atividades agrícolas como
não-agrícolas. A categoria de posição na ocupação dos não remunerados é constituída
principalmente por mulheres e crianças que fazem parte, muitas vezes, de uma relação
de trabalho informal de trabalho.
Um quarto item, que faz parte da PNAD atualmente, refere-se à ampliação do
conceito de trabalho através da inclusão das atividades para o próprio consumo. De
acordo com a Organização Internacional do Trabalho (CONFERENCIA
INTERNACIONAL DEL TRABAJO, 2002), as mulheres tendem a se concentrar, mais
do que os homens, nas atividades informais que não são, em geral, consideradas nas
estatísticas oficiais, tais como a referida produção para o próprio consumo, as atividades
domésticas remuneradas em domicílios e no trabalho a domicílio. O contingente
feminino caracteriza-se também, em relação ao masculino, por operar em unidades
econômicas de pequena escala, sendo sua contribuição econômica, por vezes, de difícil
mensuração. Além deste fato, as mulheres “com freqüência se dedicam às atividades
agrícolas que muitos países excluem, por razões práticas, do alcance de suas
estatísticas” (p. 13).
Hussmanns; Mehran; Verna (1990) apresentam uma importante discussão para a
compreensão de nossas fontes de estatísticas de trabalho atuais. De acordo com padrões
internacionais, a população economicamente ativa compreende todas as pessoas de
ambos os sexos que se constituem na oferta de trabalho para a produção de bens e
serviços como definido pelo sistema de contas (e balanços) nacionais das Nações
Unidas, durante um período de referência específico. Entende-se por produção de bens e
serviços toda a produção e processamento de produtos primários, seja para o mercado, a
117
troca ou para o próprio consumo, a produção de todos os outros bens e serviços para o
mercado e no caso de domicílios que produzem bens e serviços para o mercado, a
correspondente produção para o consumo próprio.
O conceito de atividade econômica, adotado pela 13ª Conferência internacional
das estatísticas do trabalho (ICLS) de 1982, para a mensuração da população
economicamente ativa cobre a produção de bens e serviços mercantis e não mercantis
(HUSSMANNS; MEHRAN; VERNA, 1990, 1990, p. 15-16).33
Em relação à produção não mercantil,34, destacam-se: a produção de produtos
primários para o próprio consumo35; produção de ativos fixos para o próprio uso (tais
como construção de edifícios, estradas, etc.) e também a produção de outros produtos ou
mercadorias não primários para consumo próprio que são também destinados ao
mercado (HUSSMANNS; MEHRAN; VERNA, 1990, p. 19).
Na prática verifica-se que a aplicabilidade do conceito de atividade econômica é,
muitas vezes, complexa e difícil em pesquisas domiciliares quando a situação de
trabalho envolve características de inserção não comuns no mercado de trabalho.
Na PNAD, a partir de 1992, de acordo com as recomendações internacionais, é
considerada como trabalhando a pessoa envolvida na produção para o próprio consumo
33 Estão excluídos alguns tipos de produção para o próprio consumo, que são: a) processamento de produtos (ou mercadorias) pelos moradores que não os produzem; b) a produção de produtos (ou mercadorias) pelos moradores que não vendem parte dos mesmos no mercado; c) o reparo e a manutenção de edifícios ou outras construções realizadas pelos moradores para si mesmos. Também estão excluídas as atividades domésticas não remuneradas, tais como a comida para o próprio consumo, costurar ou consertar roupas para o próprio uso, ensinar ou tomar conta de seus próprios filhos (p. 15). Na produção destinada ao mercado está incluída a produção de bens e serviços normalmente destinada à venda no mercado, tais como as atividades de trabalhadores em fábricas, lojas, fazendas, empresas domiciliares, empreendimento de serviços, etc. por outro lado, as atividades de empregados vinculados a instituições de governo e outras instituições sociais e culturais estão também inseridas neste caso, mesmo que a produção não seja vendida no mercado. Pode também ocorrer, nesta última situação, de que a produção, quando vendida, não necessariamente tenha a intenção de cobrir todo o custo da produção (p. 16). 34 O termo produção não mercantil está relacionado ao uso do produto (consumo próprio ou não) e não à base da natureza da produção remunerada ou não.Este tipo de produção não mercantil afeta as medidas de produção, de valor adicionado, de renda, mas não tem geralmente um impacto de medida da população economicamente ativa. Isto porque pessoas que produzem para o mercado e para si próprias serão incluídas como economicamente ativas com base na sua produção de mercado, independente da produção adicional para seu próprio consumo. A parte da produção não mercantil pode, entretanto, afetar a mensuração de horas trabalhadas e conceitos correlatos. 35 Os padrões internacionais destacam, ainda, a necessidade de se adotar uma medida específica no caso das pessoas que estão somente envolvidas na produção de bens e serviços para consumo próprio e domiciliar. Estas devem ser incluídas como economicamente ativas somente se a sua produção for considerada uma importante contribuição para o consumo total do domicílio.
118
e na produção para o próprio uso36, o que é importante para o entendimento mais
adequado da informalidade. Na citada pesquisa, é enquadrada nestas categorias aquela
pessoa que não tenha outro trabalho remunerado ou não, pois estes dois últimos tipos de
trabalho prevalecem na determinação da condição de ocupação.
Na avaliação do 1o Pré-Teste, foi visto que a inclusão das atividades para o
autoconsumo no conceito de trabalho resultou extremamente importante para o setor
agrícola, no sentido de uma compreensão mais adequada da informalidade.
Se de um lado foi verificado um destino da referida produção desenvolvida para
o mercado por uma grande parte de pequenos produtores, por outro lado constatou-se,
como expressiva, a parcela voltada para o autoconsumo que, em alguns casos,
representa a maior parte da produção. A prática desta atividade foi observada em
trabalhadores agrícolas não só dedicados somente a esta, mas também entre os
assalariados neste setor que também desenvolvem uma pequena agricultura para o
próprio consumo.
Um quinto item inovador é a implantação de um novo limite mínimo de horas
normalmente trabalhadas para a atividade não remunerada. Foi reduzido o limite de
horas trabalhadas de 15 horas ou mais por semana para pelo menos uma hora na
semana. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a noção de algum
trabalho é definida como “uma hora de trabalho pelo menos” para que as pessoas sejam
classificadas como correntemente ativas, ficando a tradicional exigência de um número
mínimo de horas trabalhadas, reduzida praticamente a zero.
Com esta alteração, quase simbólica, no limite mínimo de horas trabalhadas
requeridas para que um trabalhador seja considerado não remunerado (de pelo menos
uma hora de trabalho na semana) amplia-se a possibilidade de aumento do contingente
de ocupados inseridos nesta posição na ocupação, constituída, sobretudo, pelo
contingente feminino e pelos menores de idade.
A citada mudança possibilita, ainda, um crescimento dos que se encontram, por
vezes, em uma relação de trabalho informal, pelo fato do trabalho não remunerado ser
uma categoria extremamente associada aos trabalhadores por conta própria e a de
36 Ocupação desenvolvida, durante pelo menos uma hora na semana: a) na produção de bens, do ramo que compreende as atividades da agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura, destinados à própria alimentação de pelo menos um membro da unidade domiciliar; ou b) na construção de edificações, estradas privativas, poços e outras benfeitorias (exceto as obras destinadas unicamente à reforma) para o próprio uso de pelo menos um membro da unidade domiciliar.
119
pequenos empregadores, categorias normalmente consideradas em um quadro informal
de trabalho.
Um sexto item inserido na PNAD é a captação das características do trabalho da
pessoa nos últimos doze meses além do trabalho informado por esta no período da
semana de referência. Desde 1967 a 1973 e em 1979 prolongando-se até a década de 80,
sempre foi investigado apenas o trabalho que a pessoa ocupada teve em um período de
tempo, mais curto, como o da semana.
As PNADs de 1976, 1977 e de 1978 apresentam algumas semelhanças com as
PNADs a partir de 1992, sobretudo em 1977, pois incluem o ano como período de
referência além do da semana, o que poderá ser observado no Quadro II, a ser
posteriormente analisado. Em 1976, para a pessoa ocupada na semana ou nos últimos
doze meses são indagadas as características do trabalho que exerce ou exerceu durante
mais tempo. Em 1977, existem perguntas relativas ao trabalho: (a) da pessoa ocupada na
semana e (b) da pessoa cujo trabalho declarado na semana não é o mesmo que exerceu
durante a maior parte dos últimos doze meses e para as não ocupadas na semana, mas
que já trabalharam antes. Finalmente, em 1978 as perguntas abrangem, além das
características do trabalho para a pessoa ocupada na semana, as da pessoa ocupada na
semana e durante todos os meses do ano ou menos de 12 meses.
Na 13a Conferência Internacional de Estadísticos del Trabajo (1982), foram
discutidas questões relacionadas à população economicamente ativa. A investigação das
características da força de trabalho normalmente considerada nos países, inclusive no
Brasil, ou seja, “população correntemente ativa”, utiliza como referência o período da
semana (em alguns países o dia) como foi o caso da PNAD da década de 1980.
Foi proposto pela OIT, como alternativa, que se analisasse também a “população
habitualmente ativa” referida a um período de tempo mais amplo, como os 12 meses
que precedem a realização da pesquisa. Esta medida visa atender à realidade de países
nos quais domina as atividades agrícolas, que apresenta muitas vezes um caráter
sazonal, bem como outras intermitentes, entre as quais, em nosso entender estão
contempladas aquelas ligadas à informalidade.
A possibilidade de se obter a informação do trabalho dos últimos doze meses
resulta como extremamente eficaz no sentido de se adaptar a realidade, freqüentemente
observada, de mudanças de trabalho de uma pessoa ao longo de um período mais longo
no tempo, como o ano.
120
A referida mobilidade de trabalho pode ser acompanhada, por vezes, de
alterações da inserção da pessoa ocupada, segundo a posição na ocupação, estando esta,
por exemplo, ora na condição de empregado ora na de trabalhador por conta própria ou
mesmo na de empregador. Esta informação é importante no sentido de poder estar
indicando, por vezes, a passagem de um trabalho formal para outro informal ou vice-
versa, ao mesmo tempo revela, muitas vezes, uma situação de instabilidade de inserção
na atividade econômica enfrentada pelo trabalhador.
A captação das características de trabalho no período de doze meses permite que
se investigue casos em que a pessoa ativa no período de referência como a semana, pode
estar neste trabalho há somente um mês, tendo exercido durante o ano pelo menos um
outro trabalho. Existem também situações de inatividade da pessoa na semana, seja pelo
fato de estar desempregada ou mesmo por ter se aposentado, mas de atividade durante o
ano.
O exame desta informação, em suas possibilidades, torna-se muito importante no
sentido de propiciar um quadro de produção empírica parcial da realidade brasileira, em
termos da inserção da população no mercado de trabalho, que certamente reflete a
situação social e econômica do país.
Após a realização do 1o Pré-Teste, verificou-se que a utilização de dois períodos
de referência, qual seja a semana e os últimos doze meses revelou-se fundamental para a
captação da realidade do trabalho em sua complexidade. Conforme assinalado na
proposta de Reformulação da PNAD, o período da semana, por ser muito curto, se
mostra muitas vezes insuficiente para retratar um quadro mais adequado das
características da força-de-trabalho.
Foram confirmadas as vantagens, já mencionadas, da inclusão de um período de
tempo mais longo associado a um mais reduzido como o da semana: “de fato, muitas
pessoas que declararam uma ocupação na semana, ao longo do ano anterior estavam
engajadas em outras ocupações, ou mesmo tinham dois trabalhos naquele período. Além
disso, registraram-se vários casos em que a pessoa exercia um trabalho não-agrícola na
semana e um trabalho agrícola no ano ou vice-versa. Também em relação à condição de
atividade foi fundamental a introdução do período de 12 meses, pois o inativo na
semana muitas vezes havia trabalhado em grande parte do último ano. Assim a
utilização de dois períodos de referência permitiu perceber a conjugação de
modalidades distintas de trabalho, como também as mudanças na condição de atividade
121
que um só período, e curto como a semana não permite apreender” (1. PRÉ-TESTE...,
1990, 1 v., p. 10).
A realização do 2O Pré-Teste teve como objetivo não só aprimorar os conceitos e
as questões relativas ao tema Trabalho, investigadas também no 1O Pré-Teste, como
também contemplar outros a este articulados (REVISÃO..., [1994], v.1, t.5, p. 2-3).
Foram abordados os temas relacionados à investigação do outro trabalho; à procura de
trabalho e ao desemprego; à inatividade; aos outros aspectos do rendimento; ao trabalho
do menor; à associação ou filiação a sindicato ou órgão de classe e à contribuição para
a previdência.
Na PNAD, existem outros aspectos que têm como objetivo possibilitar a
verificação das condições de vida e de reprodução da força de trabalho, tais como as
características da estrutura familiar. Conforme destacado nos objetivos do 2O Pré-Teste:
“no caso dos trabalhadores por conta própria que utilizam mão-de-obra familiar, mas
também para os assalariados, a família se constitui em uma unidade importante de
análise, na medida em que tem uma função organizadora das estratégias de
sobrevivência da força de trabalho” (p. 2). A citada categoria de posição na ocupação
abrange grande parte do contingente ativo alocado na informalidade.
Um conjunto de variáveis, sobre os temas constantes do corpo básico de
informações da PNAD, relacionadas ao trabalho e demais temas constituem um ponto
importante na compreensão da diversidade das relações de trabalho no Brasil, entre as
quais se inserem aquelas vinculadas aos denominados mercados de trabalho formalizado
e não formalizado.
Devem ser ressaltados ainda pontos pertinentes ao nosso objeto de análise, como
a conjugação da análise da classificação do trabalho (principal, secundário e outros
trabalhos) aos períodos de referência, semana e ano. Com este procedimento, é possível
verificar a inserção da população: (a) no trabalho principal da semana; (b) no trabalho
secundário da semana; (c) no trabalho principal do ano e em outro trabalho que a pessoa
do referido período, mas que não foi considerado como principal.
A possibilidade de avaliação, seja do número de trabalhos de forma
concomitante, tais como o principal e o secundário, seja da oscilação de trabalhos na
semana e no ano associados à caracterização dos mesmos, pode propiciar uma adequada
análise da estabilidade/instabilidade dos trabalhadores no mercado de trabalho.
122
Na origem do debate da informalidade, já era visto que o engajamento da
população em atividades informais ocorre como um trabalho complementar a outras
formas de emprego, sendo denominado nas estatísticas oficiais como a PNAD de
trabalho secundário, em geral percebendo baixos salários. Deve-se ressaltar, no entanto,
que podem ocorrer situações nas quais os rendimentos das atividades informais sejam
elevados. Em geral, foi visto que estes são combinados com aqueles provenientes de um
outro trabalho formal.
É destacado o fato de muitos trabalhadores deterem fontes de rendimentos
diversos, através do desenvolvimento de atividades concomitantes, como uma estratégia
mais segura de sobrevivência. Em geral, estes, assim o fazendo, procuram associar à
estabilidade/segurança do emprego formal assalariado com a complementação de
rendimentos provenientes do trabalho informal, os quais podem ser mais elevados, mas
irregulares (HART, 1973; SILVA, 1971).
O informal, no entanto, pode ser não só um trabalho substituto ou complementar,
mas a fonte essencial de sobrevivência tanto para os que estão aí inseridos como para
aqueles que estão desempregados.
Para a pessoa classificada como tendo mais de um trabalho na semana de
referência, ou seja, para a que trabalhava em mais de um empreendimento (IBGE.
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004: manual de entrevista, 2004, 170-
172)37, a definição do principal, desde 1992 até hoje, é realizada segundo os seguintes
critérios, na ordem enumerada:
. “o trabalho que a pessoa teve maior tempo de permanência no período de
referência de 365 dias será o principal;
. em caso de igualdade no tempo de permanência no período de referência
de 365 dias, o trabalho remunerado terá, sempre, prioridade sobre o sem
remuneração na definição do principal;
37 “Entende-se por empreendimento a empresa, a instituição, a entidade, a firma, o negócio, etc., ou, ainda, o trabalho sem estabelecimento, desenvolvido, individualmente ou com a ajuda de outras pessoas (empregados, sócios ou trabalhadores não remunerados). O empreendimento pode ser constituído por: um ú nico estabelecimento;.dois ou mais estabelecimentos; ou não ter estabelecimento” (p. 170). Em um empreendimento pode ser desenvolvida: uma única atividade econômica ou duas ou mais atividades econômicas (p. 171). É importante notar, primeiramente, que uma pessoa com mais de um trabalho, ou seja, ocupada em mais de um empreendimento, pode exercer: a) a mesma ocupação em empreendimentos de atividades econômicas idênticas, ou não ou b)ocupações distintas em empreendimentos de atividades econômicas idênticas, ou não (p. 172).
123
. dentre os trabalhos remunerados com o mesmo tempo de permanência no
período de referência de 365 dias, o principal será aquele que a pessoa normalmente
dedicava maior número de horas semanais. Este mesmo critério será adotado quando a
pessoa só tiver trabalhos sem remuneração e houver coincidência nos tempos de
permanência nesses trabalhos no período de referência de 365 dias; e
. em caso de igualdade, também, no número de horas semanais trabalhadas,
o trabalho principal será aquele que proporcionava normalmente o maior rendimento”
(IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004: manual de entrevista,
2004, 178-179).
A análise desses trabalhos realizados por uma pessoa, constante na PNAD, em
sua totalidade ou em determinadas combinações, no mercado de trabalho formal ou
informal, ou em ambos, representa uma possibilidade de se obter um quadro de
evidências empíricas reveladores de estratégias de sobrevivência desenvolvidas pelos
trabalhadores.
De um lado, a concomitância de trabalhos, apontados na literatura especializada,
conforme já mencionado, mostra a busca da população que procura associar a
estabilidade em um trabalho e um rendimento mais favorável que pode ser obtido em
outro. Por outro lado, as evidências empíricas podem ilustrar, por meio da análise da
atividade econômica da população na semana, em um ou mais de um trabalho, bem
como no ano em diferenciados trabalhos, um quadro demonstrativo da conjuntura do
país.
A mobilidade de trabalho no ano é detectada, na PNAD, pela verificação dos
trabalhos por uma pessoa, não sendo possível a análise detalhada de todos os trabalhos
sucessivos neste período, pois apenas um destes é selecionado para a investigação.
Neste caso, para que este seja eleito, são aplicados critérios visando esta determinação, a
seguir, relacionados:
“Para a pessoa classificada como tendo saído de mais de um empreendimento no
período de captação de 358 dias, adote os seguintes critérios, na ordem enumerada, para
definir o principal dentre os que a pessoa saiu nesse período:
a) o trabalho que a pessoa teve maior tempo de permanência no período de
captação de 358 dias será o principal;
124
b) em caso de igualdade no tempo de permanência no período de captação de
358 dias, o trabalho remunerado terá, sempre, prioridade sobre o sem remuneração na
definição do principal;
c) dentre os trabalhos remunerados com mesmo tempo de permanência no
período de captação de 358 dias, o principal será aquele que a pessoa normalmente
dedicava maior número de horas semanais. Este mesmo critério será adotado quando a
pessoa só tiver saído de trabalhos sem remuneração e houver coincidência nos tempos
de permanência nesses trabalhos no período de captação de 358 dias; e
d) em caso de igualdade, também, no número de horas trabalhadas, o trabalho
principal será o último do qual a pessoa saiu” (IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios 2004: manual de entrevista, 2004, p. 258).
1.3 - A busca da captação de uma produção de evidência empírica mais
adequada da informalidade na estrutura da PNAD
O objetivo da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) é o de
contemplar uma produção de evidência empírica voltada para a captação das relações de
trabalho no país, tendo como unidade de análise a inserção da população no mercado de
trabalho, sendo sua perspectiva individual e não a da unidade de produção.
O propósito é o possibilitar a apreensão das estratégias da ocupação das pessoas
em termos de trabalho. Além de várias situações de trabalho observadas, podem ser
encontradas outras tais como: a) a população desocupada que pode ou não ter sido ativa
anteriormente; b) a população aposentada que continua alocada na atividade; c) a
população aposentada, pensionista, estudante ou dedicada aos afazeres domésticos; d) a
população procurando por trabalho (seja esta ocupada ou não).
Para um entendimento mais acurado dessas questões e inovações, segue-se um
quadro esquemático da definição dos trabalhos na PNAD, a partir de 1992, ano inicial
de implantação de sua revisão para a década de 1990. Espera-se que, com este, possa ser
compreendida a possibilidade de concomitância bem como da alternância de trabalhos
desenvolvidos formais ou informais desenvolvidos por uma pessoa ocupada e de
situações instáveis ilustrativas da atividade/inatividade dos trabalhadores no mercado de
trabalho.
125
ESQUEMA DA DEFINIÇÃO DOS TRABALHOS NA PNAD A PARTIR DE
1992
Trabalho principal da
semana
Além dos trabalhos principal e secundário são investigadas algumas
características de(s) outros trabalhos exercidos também na semana:
Trabalho secundário da semana
Outro (s) trabalho da semana
Total dos rendimentos e das horas trabalhadas e existência
de contribuição para instituto de previdência (esfera federal, estadual ou municipal).
Trabalho principal do ano
(para a pessoa ocupada no período de 358 dias, exceto para aquela que no
período da semana, mantinha este trabalho).
Outro trabalho no ano
Se houver mais de um trabalho no ano, é investigado apenas um deles, aplicando
os critérios indicados para quem saiu, ao longo do ano, de mais de um empreendimento.
Para este outro trabalho no ano é pesquisado se a pessoa era empregada com
carteira assinada e se houve recebimento do seguro-desemprego.
Para quem não trabalhou no período do ano (365 dias), mas pode ter trabalhado
nos últimos quatro anos anteriores ao período do ano, é investigado, quando houver,
este trabalho.
Trabalho nos últimos quatro anos anteriores ao
período do ano
126
Em cada conjunto destes trabalhos, as perguntas são realizadas segundo a
inserção da população ocupada por tipo de atividade, agrícola e não-agrícola, e a
posição na ocupação, na qual a pessoa se enquadra, tais como as de: empregado,
empregador, conta própria, trabalhador doméstico, trabalhador não remunerado, etc.
(Anexo I).38
Após a identificação da ocupação, da atividade principal do empreendimento
(negócio, firma, empresa, instituição, entidade, etc.) e da posição na ocupação no
trabalho tido como o principal da pessoa ocupada na semana, é iniciada a captação,
através das variáveis selecionadas, das questões específicas segundo as atividades
agrícolas e não-agrícolas bem como daquelas comuns a estas.
A forma estruturada no questionário da PNAD (Anexo II) tem como objetivo
permitir a apreensão da diversidade das relações de trabalho no Brasil, entre as quais
encontra-se o nosso objeto de análise, qual seja, a informalidade ao mesmo tempo em
que procura possibilitar a identificação de questões comuns ao mercado formalizado e
não formalizado de trabalho.
Ao se observar às mudanças ocorridas nas relações de trabalho na sociedade
contemporânea e suas conseqüências para o trabalhador, resultado das transformações
analisadas no espírito do capitalismo, são percebidas novas questões existentes sobre
trabalho, tornando-se importante verificar até que ponto é viável a sua representação,
por meio de estatísticas oficiais, como a PNAD.
38 Categorias de Posição na ocupação nas Atividades Agrícolas (definição mais detalhada no Anexo I): 1)
Empregado permanente nos serviços auxiliares; 2) Empregado permanente na agricultura, silvicultura ou
criação de ovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços;3) Empregado permanente em outra atividade; 4)
Empregado temporário; 5) Conta própria nos serviços auxiliares; 6) Conta própria na agricultura,
silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços; 8) Conta própria em outra
atividade; 9) Empregador nos serviços auxiliares; 10) Empregador na agricultura, silvicultura ou criação
de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços; 11) Empregador em outra atividade; 12) Trabalhador
não-remunerado membro da unidade domiciliar; 13) Outro trabalhador não-remunerado; 14) Trabalhador
na produção para o próprio consumo.
Categorias de Posição na ocupação nas Atividades Não-Agrícolas (definição mais detalhada no Anexo I:
1) Empregado; 2) Trabalhador doméstico; 3) Conta própria; 4) Empregador; 5) Trabalhador não-
remunerado membro da unidade domiciliar; 6) Outro trabalhador não-remunerado e 7) Trabalhador na
construção para o próprio uso.
127
As citadas mudanças apontam para o fato, conforme já visto, da “terciarização
significar ao mesmo tempo, precarização e desassalariamento” com a diminuição
qualitativa e quantitativa das relações de trabalho assalariadas. Ao mesmo tempo, estas
se processam, de forma diferenciada, para os segmentos específicos de trabalhadores,
alcançando, em função da crise econômica, as camadas médias da população, até então
protegidas, significando neste caso, empobrecimento e perda de segurança, mas não
proletarização (SILVA; CHINELLI, 1997).
Os referidos autores apontam a ambigüidade como a característica central das
tendências em torno da informalização das relações produtivas, sendo esta proveniente
tanto das conseqüências contraditórias da terciarização como também de seus reflexos
diferenciados nas distintas categorias de trabalhadores.
Ressalte-se ainda o surgimento de “novos empreendedores”, sobretudo das
camadas médias da população. Na década de 1990, a valorização da idéia de segurança,
dominante em períodos anteriores, é substituída em função do discurso vigente do
espírito do capitalismo, por uma apologia da mudança, do risco e da mobilidade
(BOLTANSKI;CHIAPELLO, 1999). Nesse sentido, esse empreendedorismo pode ser
tanto uma opção individual, na busca ser um trabalhador por conta própria, tendo o seu
próprio “negócio”, como também resultado de uma situação de um contexto sócio-
econômico que revela dificuldades de absorção da mão-de-obra no processo produtivo.
Na década de 1990, em contraposição a períodos anteriores, como o dos anos
1960, processa-se uma mudança no perfil esperado do trabalhador, tendo em vista que, é
fundamental a questão da sua adaptabilidade, estando em pauta, a necessidade de
flexibilidade, que passa a ser o termo dominante, além de outros como a criatividade, a
iniciativa e, por conseguinte, a liberdade e a autonomia.
É preciso ressaltar ainda que, nos estudos sobre a questão da informalidade,
pode estar ocorrendo, não uma transformação total da noção de informalidade
anteriormente adotada, mas talvez uma ampliação de seu campo semântico ou ambos os
casos (SILVA e CHINELLI, 1997).
A interpretação dos motivos ou das justificativas das variáveis, explicitados ou
subjacentes, (Anexo III), considerados importantes na definição do problema de
investigação e as variáveis selecionadas para tal fim, que implicam, muitas vezes, em
mudanças nas estatísticas oficiais, formam um caminho importante na referida
comprovação.
128
Nas estatísticas oficiais, acrescente-se que é fundamental também, conforme já
mencionado, a investigação do tipo de categoria que estaria representando o
funcionamento do conceito e retratando o desenvolvimento da conjuntura, estando
permeadas, nesta discussão, as classificações adotadas. É importante ressaltar que a
seleção de indicadores, na qual é essencial o elenco de variáveis consideradas, deve
também ser capaz de operacionalizar o conceito.
A necessidade de um maior aprimoramento na captação da denominada
economia informal foi ressaltada, na Conferência Nacional De Estatística (CONFEST),
constando da “Síntese do Grupo Estatísticas do Trabalho” da referida Conferência. As
recomendações acordadas no referido Grupo de trabalho visavam atingir o referido
objetivo, em PNADs futuras, qual seja, da década de 1990, sendo estas: a inclusão na
PNAD de uma desagregação maior das categorias de posição na ocupação, da
identificação do local de trabalho e da mensuração do tamanho do “negócio” ou da
“firma” para todas as pessoas ocupadas.
Estas sugestões procuravam, de certa forma, acrescentar determinadas variáveis
que estivessem relacionadas às características do empreendimento onde a população
ocupada no informal exerce a sua atividade, aperfeiçoando outras já existentes. O
propósito era o de associar observações de caráter econômico, importantes para uma
melhor caracterização do trabalho informal à perspectiva de análise das relações de
trabalho das pessoas, observadas em pesquisas domiciliares, tais como a PNAD.
Cabe destacar que, em estudo realizado em 1990, Oliveira confirma esta
necessidade apresentada, ao mencionar especificamente a produção da Fundação IBGE,
as lacunas existentes sobre a informação do tipo de organização produtiva, em que se
insere o trabalhador. Enfatiza que, na análise do setor informal, os desafios se estendem,
não só às definições deste setor como também ao campo das informações estatísticas.
A citada autora (1990a, p. 46-47) aponta a importância de melhor se conjugar às
fontes de informação domiciliares, como a PNAD, as não domiciliares, nas quais o
espaço destinado à investigação das relações de trabalho e das características dos
agentes nelas envolvidos é pequeno. Neste sentido, salienta a importância “de integrar
melhor as duas fontes de informação, ampliando o ‘espaço econômico’ nas pesquisas
domiciliares e o ‘espaço social’ nas pesquisas não domiciliares. É nessa direção que se
alinham as propostas de desagregação do quesito relacionado à ‘Posição na Ocupação’ e
da inclusão de quesitos sobre ‘Local de Trabalho’ e ‘Tamanho da Firma ou Negócio’,
129
incorporadas ao Censo de 90 e igualmente contempladas no projeto de reformulação da
PNAD para os anos 90” (cabe ressaltar que o Censo Demográfico previsto para ter sua
coleta em 1990, só foi realizado em 1991).
Corroborando a referida observação, houve uma proposição de inclusão dos
quesitos, posição na Ocupação, local de Trabalho e número de empregados no local de
trabalho (PROPOSTA..., 1989), no Censo Demográfico de 1990 para a integração dos
inquéritos estatísticos sobre a economia informal, elaborada pela Coordenação dos
Censos Econômicos de 1985 do Departamento (hoje, Coordenação) de Contas
Nacionais. A citada proposta apoiava-se também em outros documentos realizados na
Fundação IBGE e da Fundação SEADE/DIEESE39.
Para ilustrar a inclusão das variáveis, como sugeridas no grupo das “Estatísticas
do Trabalho” da CONFERÊNCIA NACIONAL DE ESTATÍSTICA (1991) e
contempladas, de forma sistemática, na PNAD a partir da década de 1990, segue um
quadro comparativo destas (Quadro II), desde a década de implantação da PNAD
(1967). Além de outras variáveis que caracterizam a inserção das pessoas na atividade
econômica, o objetivo é o de verificar se esta proposição, que procura contemplar o tipo
de organização produtiva, atingiu o objetivo de uma mais adequada captação de nosso
problema de investigação, qual seja, a informalidade.
39 OLIVEIRA, Jane Souto de. Sobre o Suplemento da PNAD-89. IBGE, 1989; JORGE, Ângela Filgueiras et alli. Proposta Preliminar para o Corpo Básico da PNAD-85. IBGE, 1985; SEADE/DIEESE. Questionário da Pesquisa de Emprego e Desemprego na Grande São Paulo.
130
Quadro II
Variáveis: Posição na Ocupação, Local de Trabalho e Tamanho do
Empreendimento, importantes para a captação da produção de evidências empíricas
sobre a informalidade na PNAD
Período da informação
Posição na ocupação Local de trabalho
Tamanho do empreendimento
Década de 1960
Para a pessoa ocupada na semana 1) Empregado de companhia ou negócio particular ou de indivíduo, por diária, salário, comissão ou pagamento em bens 2) Empregado público 3) Empregador ou trabalhador por conta própria 4) Trabalhador familiar sem remuneração
Não há Informação
Indagação se a pessoa emprega uma ou mais pessoas por diária, salário ou pagamento em bens (não há discriminação do número de pessoas empregadas)
Década de 1970
a) 1971 a 1973
b) 1976
Para a pessoa ocupada na semana a) Empregado particular b) Empregado público c) Empregador d) Trabalhador por conta própria e) Trabalhador familiar sem remuneração Para a pessoa ocupada na semana ou nos últimos doze meses (posição na ocupação declarada na ocupação, profissão, cargo, função, etc. que exerce ou exerceu durante mais tempo) a) Empregado b) Conta própria estabelecido c) Conta própria não estabelecido d) Parceiro empregado
Não há Informação Não há Informação
Indagação se o empregador ou trabalhador por conta própria emprega uma ou mais pessoas pagando em dinheiro ou bens (não há discriminação do número de pessoas empregadas) Não há Informação
131
c) 1977
d) 1978
e) Parceiro conta própria f) Parceiro empregador g) Empregador h) Membro da família não remunerado i) Membro de instituição não remunerado Para a pessoa ocupada na semana a) Empregado b) Conta própria estabelecido c) Conta própria não estabelecido d) Parceiro empregado e) Parceiro conta própria f) Parceiro empregador g) Empregador h) Não remunerado Para a pessoa cujo trabalho declarado na semana não é o mesmo que exerceu durante a maior parte dos últimos doze meses e para as não ocupadas na semana, mas já trabalharam antes a) Empregado b) Conta própria c) Empregador d) Não remunerado Para a pessoa ocupada na semana e durante todos os meses do ano ou menos de 12 meses a) Empregado b) Conta própria c) Empregador d) Não remunerado Para a pessoa ocupada na semana a) Empregado b) Conta própria c) Empregador d) Não remunerado
Não há Informação Não há Informação
Não há Informação Não há Informação
132
e) 1979
Para a pessoa ocupada na semana a) Empregado b) Conta própria c) Empregador d) Não remunerado
Não há Informação
Variável para o empregado (excluindo-se, neste caso, o empregado doméstico) a) classes de pessoas que trabalham na empresa ou negócio no trabalho da semana a.1 – até 5 a.2 – 6 ou mais Variável para o empregador b) classes de pessoas empregadas no trabalho da semana b.1 – até 2 b.2 – 3 a 5 b.3 – 6 ou mais Variável para o trabalhador conta própria e empregador c) classes de pessoas não remuneradas que ajudam no trabalho da semana c.1 – nenhuma c.2 – até 2 c.3 – 3 a 5 c.4 – 6 ou mais
Década de 1980
Para a pessoa ocupada na semana a) Empregado b) Parceiro empregado c) Trabalhador agrícola volante com intermediário d) Trabalhador agrícola volante sem intermediário e) Conta própria f) Parceiro conta própria g) Empregador h) Parceiro empregador i) Não remunerado
Não há Informação
Não há Informação
Década de 1990
Atividades agrícolas a) Empregado permanente nos serviços auxiliares (responde os quesitos das atividades não agrícolas)
Atividades agrícolas e não agrícolas Esse trabalho tinha estabelecimento em: a) loja, oficina, fábrica, escritório, escola, repartição
Atividades agrícolas Para quem era empregado permanente (opções b e c de posição na ocupação do quadro em questão), indaga-
133
b) Empregado permanente na agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos c) Empregado permanente em outra atividade d) Empregado temporário e) Conta própria nos serviços auxiliares f) Conta própria na agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos g) Conta própria em outra atividade h) Empregador nos serviços auxiliares i) Empregador na agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos j) Empregador em outra atividade k) Trabalhador não remunerado membro da unidade domiciliar l) Outro trabalhador não remunerado m) Trabalhador na produção para o próprio consumo
pública, galpão, etc. b) fazenda, sítio, granja, chácara, etc. ou era exercido: a) no domicílio em que morava b) em domicílio de empregador, patrão, sócio ou freguês c) em local designado pelo empregador, cliente ou freguês d) em veículo automotor e) em via ou área pública f) outro (especifique) Indagação se na semana de referência morava em domicílio que estava no mesmo terreno ou área do estabelecimento em que tinha esse trabalho a) sim b) não
se: a) se teve ajuda, nesse emprego, de pelo menos uma pessoa não remunerada, moradora no domicílio b) em caso afirmativo, quantas pessoas não remuneradas, moradoras no domicílio, ocupou, nesse emprego, no mês de referência: uma, duas, três a cinco, seis a dez, onze ou mais Para quem era empregador (opções i e j de posição na ocupação do quadro em questão), indaga-se: a) se, no mês de referência, tinha pelo menos um empregado temporário nesse trabalho b) em caso afirmativo, quantos empregados temporários no trabalho que tinha no mês de referência b.1 – um b.2 – dois b.3 – três a cinco b.4 – seis a dez b.5 – onze ou mais a) se, no mês de referência, tinha pelo menos um empregado permanente nesse trabalho b) em caso afirmativo, quantos empregados permanentes no trabalho que tinha no mês de referência b.1 – um b.2 – dois b.3 – três a cinco b.4 – seis a dez b.5 – onze ou mais
134
Atividades não agrícolas a) Empregado b) Trabalhador doméstico c) Conta própria d) Empregador e) Trabalhador não remunerado membro da unidade domiciliar f) Outro trabalhador não remunerado g) Trabalhador na construção para o próprio uso Perguntas específicas permitem a distinção dos que se enquadram como: a) setor privado b) setor público No setor público: a) federal b) estadual c) municipal Se federal, pode ser: a) militar b) civil – sendo funcionário público estatutário ou não
Para os empregadores em atividades não agrícolas e empregador nos serviços auxiliares das atividades agrícolas a) indagação, no mês de referencia, do número de empregados ocupados a.1 – um a.2 – dois a.3 – três a cinco a.4 – seis a dez a.5 – onze ou mais Para os empregadores e trabalhadores por conta própria em atividades não agrícolas e empregador nos serviços auxiliares das atividades agrícolas a) indagação, no mês de referencia, da existência de sócios ocupados b) em caso afirmativo, o número de sócios ocupados a.1 – um a.2 – dois a.3 – três a cinco a.4 – seis a mais Para os empregadores e os trabalhadores por conta própria em atividades não agrícolas e empregador nos serviços auxiliares das atividades agrícolas a) indagação, no mês de referencia, do número de trabalhadores não remunerados a.1 – um a.2 – dois a.3 – três a cinco a.4 – seis a dez a.5 – onze ou mais
Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD.
135
1.3.1 - Relevância do quesito Posição na Ocupação na apreensão da
informalidade
Inicialmente, é preciso reforçar o que já foi anunciado anteriormente, ou seja,
que a PNAD, estabelecida a partir de 1992, procurava contemplar demandas já sentidas
pelos pesquisadores, internos e externos à Fundação IBGE, usuários desta pesquisa.
Uma deles diz respeito ao fato de se procurar captar a diversidade das relações de
trabalho no Brasil, entre elas, destacando-se o trabalho informal, que é encontrado tanto
nas atividades agrícolas como daquelas não-agrícolas.
O questionário em uma pesquisa de estatísticas oficiais, como a PNAD, é um
instrumento de captação de uma produção de evidências empíricas que, em sua
construção, pode reforçar, no caso do nosso objeto de análise, a noção da informalidade
já estabelecida. Em sua elaboração, encontra-se permeada tanto a construção do
conceito “informalidade” que, nos indica, em princípio, o caminho a ser adotado para o
seu entendimento, quanto reflete as concepções teóricas e demandas sentidas, em um
determinado período de tempo não tendo, por assim dizer, a agilidade necessária, em
uma ação reflexiva conceito-instrumento, para acompanhar as rápidas transformações e
noções no mundo do trabalho.
O conhecimento da informalidade, no questionário, procurou ser percebido
através da apreensão da heterogeneidade das relações de trabalho no Brasil. Entende-se
a utilidade deste instrumento de pesquisa, que traz conceitos e variáveis nele embutidos,
no entendimento do problema de investigação da informalidade. No entanto, como a
característica central das tendências da informalidade é a ambigüidade e as mudanças
processadas em termos de trabalho afetam de forma diferenciada cada setor de
trabalhadores, há a necessidade de uma compreensão mais adequada deste fenômeno na
PNAD.
O caminho adotado na PNAD, da década de 1990, inicia-se com a observação da
inserção da população diferenciada segundo o tipo de atividade desenvolvida, ou seja,
agrícola e não-agrícola e, a partir desta, as especificidades encontradas segundo as
categorias de posição na ocupação. Considera-se importante, nesta análise, entre outras
questões, as especificidades do contexto agrícola e as variáveis consideradas,
procurando apreender aspectos diferenciados deste, importantes para os estudiosos no
estudo sobre este tema.
136
A este respeito, Oliveira (1989) já apontava imprecisões conceituais sobre a
diferenciação do mercado de trabalho formal e informal, agravadas pelo fato do
suplemento ter o mesmo âmbito de cobertura da PNAD e adotar um questionário-padrão
que não estabelece qualquer diferença entre trabalhadores agrícolas e não agrícolas.
Até a década de 1980, a estrutura da PNAD não contemplava as atividades
agrícolas e não-agrícolas com quesitos pertinentes a estas especificidades de trabalho. A
discriminação destas podia ser observada, em alguns períodos, em uma desagregação
maior das posições na ocupação das atividades agrícolas sem estarem, no entanto,
acompanhadas de variáveis adequadas à compreensão da diversidade destas relações de
trabalho.
Oliveira (1989, p. 3-4) segue dizendo que “seria desnecessário reproduzir aqui as
críticas dirigidas ao viés urbano ou precisando melhor, ao viés do emprego capitalista
que acompanha a PNAD. Quesitos como a jornada de trabalho, horas semanais
trabalhadas e rendimento médio mensal pouco têm a ver com economias como a
camponesa, regidas que são por um outro cálculo econômico e uma outra lógica social.
Em contrapartida, aspectos centrais como os que dizem respeito à posse ou propriedade
da terra ou à especificidade do emprego rural deixam de ser investigados. Com isso, fica
difícil estabelecer que medida o recurso ao trabalho assalariado, combinando-se ou
alternando-se com a produção familiar, responde ao caráter sazonal da produção
agrícola e pode representar (apesar da aparência em contrário) uma das formas de
resistência da identidade camponesa”.
Um outro aspecto, indicado pela referida autora, diz respeito ao fato de que uma
grande parte da literatura, a respeito da segmentação do mercado de trabalho no Brasil,
tem como referência um contorno que parte e, em geral, se circunscreve, ao lado urbano
e metropolitano deste.
A necessidade de aprimoramento na captação da denominada economia informal
e a investigação das relações de trabalho na área rural se constituem em demandas da
CONFERÊNCIA NACIONAL DE ESTATÍSTICA (1991) tendo sido apontados, neste
último caso, além do Censo Agropecuário, a PNAD como um instrumento capaz de
atingir este objetivo.
A PNAD da década de 1990 propõe, de certa forma, com a divisão das
atividades agrícolas e não agrícolas contemplar, de um lado, a necessidade sentida de
abrangência dos referidos contextos, nos quais se insere não só o trabalho denominado
137
formal como também o informal, que poderiam ser captados dentro de uma mesma
pesquisa.
Estar-se-ia buscando, por outro lado, discriminar tanto as especificidades das
relações de trabalho de cada um destes, como a demanda que diz respeito às
deficiências, até então existentes, em relação à captação de uma produção de evidências
empíricas adequadas das relações de trabalho agrícola. Conforme já ressaltado, estas
apresentam uma outra lógica social e econômica de entendimento.
No processo de revisão da PNAD, procurou-se seguir, conforme as
recomendações da CONFEST bem como daquelas propostas por Oliveira (1989, p. 4-5),
o fato de que a diversidade de formas de organização da produção e do trabalho pode
ser apreendida, visando a sua melhor captação, no caso do mercado urbano, a partir de
três esferas distintas de atividade: “a primeira estaria relacionada à produção e à
circulação de mercadorias propriamente ditas; a segunda, à produção doméstica de
valores de uso e a terceira à produção de bens e serviços coletivos, desenvolvida no
âmbito estatal. A cada uma destas esferas, podem corresponder uma ou mais formas de
organização da produção e de inserção do trabalhador no processo produtivo”.
Na primeira delas, estão não só os empregados do setor privado, com relações de
trabalho capitalistas com direitos trabalhistas garantidos, como também uma parcela dos
trabalhadores vinculados à pequena produção independente, tais como os trabalhadores
por conta própria, que podem apresentar ou não características de trabalho capitalistas.
Entre estes últimos, que constituem uma parcela importante relacionada à
informalidade, podem ser citados tanto os profissionais liberais como também as
categorias ligadas ao pequeno comércio, vendedores ambulantes.
Na segunda esfera, estão não só os trabalhadores domésticos, que serão
posteriormente analisados, como também o contingente de trabalhadores vinculado à
produção agrícola para o próprio consumo, incluído hoje na PNAD na categoria de
ocupados.
Na terceira esfera, são encontrados os empregados públicos vinculados a esfera
de produção de bens e serviços no âmbito estatal, apresentando uma especificidade
própria e produzindo valores de uso social, diferenciada do emprego capitalista voltado
à produção e circulação de mercadorias.
138
Atualmente, é possível estabelecer, através da PNAD, buscando maior
desagregação do quesito posição na ocupação, a distinção entre empregado do setor
público e do privado.
Há que se destacar, conforme já ressaltado no projeto de reformulação da PNAD
para a década de 1990, “que a preocupação em se distinguir o empregado público
daquele do setor privado não se constitui um fato novo na PNAD, que desde a sua
implantação (1967) até 1973 continha essa diferenciação no que se refere à posição na
ocupação. Há que se retomá-la, procurando-se aprofundar as características destes dois
tipos de emprego” (RINALDI et al, 1991, p. 32).
No Quadro II, é comprovada a existência de distinção entre empregado público e
privado na PNAD, quanto ao quesito posição na ocupação, no período referido. De 1967
a 1969, de um lado, distinguia-se o empregado público daquele empregado de
companhia ou negócio particular ou de indivíduo, por diária, salário, comissão ou
pagamento em bens. Por outro lado, os empregadores e os trabalhadores por conta
própria, considerados categorias importantes de posição na ocupação no âmbito da
informalidade, eram detectados em conjunto.
Na realização das PNADs do início da década de 1970, quais sejam, as de 1971
a 1973, a diferenciação entre os empregados da esfera pública e privada ainda era
observada, sendo, a partir deste período, realizada a separação dos empregadores
daqueles trabalhadores por conta própria. Na prática, a distinção entre as citadas
categorias é fornecida pelo fato de que o empregador tem pelo menos um empregado,
podendo ainda existir, nesse empreendimento, sócio e/ou trabalhador não remunerado
ao passo que o trabalhador por conta própria pode desempenhar sua atividade sozinho
ou com sócio e/ou o auxílio de um trabalhador não remunerado.
Efetivamente se o critério estabelecido, qual seja, a existência de empregados
possa parecer, de um lado, por vezes, tênue entre as categorias de trabalhadores por
conta própria e empregadores, em função de semelhanças encontradas em termos de
características e condições de trabalho que são encontradas entre estas categorias, pode,
por outro lado, permitir identificar especificidades encontradas nas mesmas. Entre
outras categorias, estão contemplados nestas situações de trabalho informal, conforme já
observado, tanto os profissionais liberais, artesões, vendedores ambulantes como os
pequenos comerciantes.
139
A diferenciação entre os que pertencem ao setor privado dos que estão alocados
no setor público é importante na questão do trabalho informal, pois, de um lado, o
primeiro detém uma parcela significativa de sua incorporação. Por outro lado, o
segundo pode alocar um contingente de população trabalhadora a este vinculado, tais
como a figura dos consultores, em pauta, sobretudo em função das complexas
transformações na questão do trabalho provocadas pela globalização do capital.
Em princípio, os consultores deveriam constituir uma firma prestando serviço às
empresas. Neste caso, seriam classificados como trabalhadores por conta própria, mas
muitas vezes, apresentam características mais visíveis de um empregado sem carteira de
trabalho assinada, mascarando a condição de consultor. Este enquadramento na
categoria de empregado irá se refletir, por sua vez, na dimensão da informalidade,
subestimando o trabalho informal nas estatísticas oficiais que adotam o estudo da
informalidade segundo a perspectiva da unidade de produção, pois neste caso, a
população estudada refere-se, mais comumente, aos trabalhadores por conta própria e
aos empregadores. De acordo com os critérios atuais da PNAD, a citada situação de
trabalho, que se assemelha às características de posição na ocupação de empregado,
pode ser objeto de estudo da PNAD que abrange todas as categorias de posição na
ocupação.
Na década de 1980, no quesito posição na ocupação não se distingue o
empregado público daquele alocado no setor privado. Deve ser registrado ainda que o
quesito posição na ocupação é visto nas PNADs de 1976 e 1977 mesclado com uma
indicação do local de trabalho, sem estar este último discriminado, mas captando-se
apenas se o trabalhador por conta própria é estabelecido ou não estabelecido (Quadro
II).
Na elaboração do questionário para a década de 1990, não foi contemplada a
proposta inicial de distinguir, entre os empregados no setor público, os que prestam
serviço à empresa estatal, verificando especificidades nas relações de trabalho na
produção de bens e serviços no âmbito do aparelho estatal. No entanto, das sugestões
propostas na CONFEST esta foi a única que não seguiu contemplada pela equipe do
então Departamento (hoje Coordenação) de Emprego e Rendimento que consolidou a
avaliação final do questionário atual da PNAD.
A intenção da referida proposta nos parece importante de ser reconsiderada, pois
com esta procurar-se-ia apreender a heterogeneidade interna da categoria empregado,
140
diferenciando a força-de-trabalho alocada na produção e circulação de mercadorias
daquela alocada na produção de bens e serviços no âmbito do aparelho estatal.
Dentre os empregados do setor público, poderia ser distinguido os que prestam
serviço a Governo Federal, Estadual ou Municipal (Servidor Público) daqueles que o
fazem à Empresa Pública Federal, Estadual ou Municipal (Empregados do Setor Público
de Empresa Estatal), conforme consta nas justificativas das variáveis do Anexo III.
Na atualidade, a PNAD consegue-se determinar, por exemplo, se a pessoa
pertence ao setor privado ou público (e dentro deste se pertence à esfera federal,
estadual ou municipal), por meio de perguntas específicas associadas ao quesito posição
na ocupação.
O quesito “Posição na Ocupação” cumpre um papel primordial na busca de se
procurar examinar, com mais exatidão, a relação de trabalho estabelecida e as conexões
com o estabelecimento, negócio ou instituição. No entanto, nas PNADs de 1976 e 1977
e sobretudo na década de 80, as várias opções de posição na ocupação existentes,
sobretudo para o universo das atividades agrícolas, não necessariamente alcançavam o
objetivo de se procurar estudar a diversidade das relações de trabalho no contexto
específico, em função da ausência de quesitos específicos para atingir tal intento.
Ao se propor a Reformulação da PNAD, para a década de 1990, realizou-se a
opção de eliminar as três categorias de parceiros constantes nas posições na ocupação
das atividades agrícolas nos períodos referidos de tempo (parceiro empregado, parceiro
conta própria e parceiro empregador). Percebia-se na época que, do ponto de vista
metodológico, seria mais adequado “captá-las nas categorias de posição na ocupação
nas quais os critérios de definição de seus conceitos possam expressar as relações
sociais de produção correspondente” (RINALDI et al, 1991, p. 45).
O parceiro-empregado foi captado na categoria de empregado. Ao empregado é
indagado, entre outras questões, se este recebe do empregador uma área para o
desenvolvimento de uma produção particular para o desenvolvimento de uma
agricultura de subsistência (vide anexo II). Da mesma forma, o parceiro conta própria
foi incluído na categoria conta própria, investigando-se a forma de relação com a terra
(tais como de posse, arrendamento, parceria ou propriedade) e o parceiro empregador,
agregado na categoria de empregador.
Fazia-se necessário que o quesito “Posição na Ocupação”, em sua discriminação,
fosse acompanhado por aqueles específicos para captar a lógica e o entendimento
141
peculiar das atividades não agrícolas e agrícolas nas quais se inserem o nosso objeto de
análise, o que ocorreu a partir da década de 1990. A deficiência nas estatísticas oficiais
das relações de trabalho agrícolas, como a PNAD, constituía-se em demanda requerida
por estudiosos no tema, pois até a década de 1980 não havia variáveis específicas que
contemplassem esse universo de análise.
A proposta de reformulação da PNAD da década de 1990 tentou contemplar,
nesse sentido, as lacunas apontadas por estudiosos na área de trabalho com o objetivo,
por vezes, extremamente difícil de atenuar a defasagem existente entre as questões
novas, que são constantemente estabelecidas, e a sua representação, nas estatísticas
oficiais, por intermédio de uma produção de evidências empíricas adequada.
No quesito “Posição na Ocupação”, foi proposto na CONFERÊNCIA
NACIONAL DE ESTATÍSTICA (1991), a necessidade de se discriminar além dos
empregados públicos, vinculados ou não às estatais, os domésticos daqueles
empregados particulares na produção e circulação de mercadorias. Oliveira (1989, p.
12) já ressaltava, no final da década de 1980, a referida necessidade de introduzir uma
separação entre o trabalhador doméstico assalariado dos demais trabalhadores
assalariados, com o intuito de se reconhecer “a especificidade de sua relação de
emprego e o peso que esta assume no mercado de trabalho”.
A partir da década de 1990, a PNAD contempla estas demandas introduzindo um
quesito de posição na ocupação referente aos trabalhadores domésticos. Foi entendida
na proposta de reformulação da pesquisa de que esta deve ser compreendida em seu
contexto específico, qual seja, relacionada à produção doméstica de valores de uso,
diferenciando assim daqueles empregados particulares na produção e circulação de
mercadorias. Até esta década estes trabalhadores domésticos eram incluídos ou na
categoria de empregados ou na conta própria conforme a relação de trabalho
apresentada.
Um exemplo dessa diferenciação pode ser visto, em um dos estudos pioneiros
sobre o tema da informalidade por Silva. No início da década de 1970, este segmento de
trabalhadores composto pelas atividades domésticas era um dos considerados como
pertencentes ao mercado não formalizado. Enquadrando-se como um tipo de serviços
pessoais foi desagregado em duas categorias de ocupações: a) “serviços domésticos” e
b) ”empregos domésticos” (SILVA, 1971, p. 44-45).
142
Na primeira destas, qual seja, os serviços domésticos, é destacado pelo autor o
fato deste segmento estar constituído basicamente pelas mulheres além de, muitas
vezes, poder exercer as tarefas no próprio domicílio. Existe um número limitado de
patrões e a duração das tarefas é indefinida, de modo que deixa a possibilidade de
ocorrer uma longa e contínua relação de trabalho, diferente das outras categorias
(limitadas à duração da tarefa) (p. 45).
Na segunda categoria, referente aos empregos domésticos, o trabalhador
(embora seja em maioria do sexo feminino, não o é exclusivamente) além de ter um
único patrão, é muito freqüente que tenha a obrigação de dormir no local de trabalho.
A parcela de trabalhadores domésticos, que engloba um contingente expressivo
de mão-de-obra feminina, faz parte do conjunto de informações estatísticas da PNAD,
constituindo hoje não só um quesito de posição na ocupação próprio, qual seja,
trabalhador doméstico (Quadro II) como também apresenta algumas variáveis
específicas, no sentido de melhor diferencia-la, tais como: (a) se a pessoa presta serviço
a mais de um patrão e (b) número de dias trabalhados por semana ou por mês (Anexo
II).
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (CONFERENCIA
INTERNACIONAL DEL TRABAJO, 2002, p. 11-12), as atividades domésticas
remuneradas estão entre as atividades informais que alocam um contingente expressivo
feminino, as quais, em geral, não são consideradas nas estatísticas oficias. Segundo a
definição deste organismo (CONFERENCIA INTERNACIONAL DE ESTADÍSTICOS
DEL TRABAJO, 1993), só se consideram, na categoria de trabalhadores informais,
aqueles pertencentes às empresas do setor informal. Além do mais, cabe a cada país
decidir a partir de que tamanho as unidades não registradas serão incluídas no setor
informal e ainda se o setor agrícola e os trabalhadores domésticos devem ser incluídos.
“Resultam especialmente pobres as estatísticas sobre o tamanho e a contribuição
de vários importantes subsetores da economia informal, como os trabalhadores a
domicílio, os vendedores ambulantes e os trabalhadores domésticos”, nos quais, em
geral costuma estar concentrada a participação feminina no mercado de trabalho
(CONFERENCIA INTERNACIONAL DEL TRABAJO, 2002, p. 12).
Em suma, em nosso entender, através da discriminação do quesito posição na
ocupação, a investigação da PNAD, implantada a partir da década de 1990 e que vigora
até a presente data, procurou contemplar as reivindicações que ocorriam à época, ou
143
seja, nos anos 1980, de uma produção de evidências empíricas voltada para a captação
da diversidade das relações de trabalho. Entre estas, encontra-se destacada a busca da
melhor apreensão de nosso objeto de análise, qual seja, o problema da informalidade,
procurando aprimorar as estatísticas oficiais a respeito deste tema.
O aperfeiçoamento da captação da informalidade era indicado por pesquisadores
voltados por este tema, tendo em vista a necessidade de associar as variáveis
representativas do espaço social, que é visto na PNAD, às do espaço econômico, para
uma mais adequada compreensão de nosso objeto de análise.
Na década de 1990, no entanto, tem-se o fato de que o informal demonstrou
estar crescendo mesmo em períodos de crescimento econômico, evidenciando que
outros fatores explicativos devem ser buscados para a sua compreensão. Atualmente há
um aumento das denominadas relações de trabalho parcial, por tempo determinado, sub-
contratadas ou terceirizadas, que nem sempre, mas muitas vezes, significam perdas de
direitos dos trabalhadores em relação às garantias legais e de cobertura social.
Em função de novos dispositivos capitalistas, ocorre hoje uma ameaça da
dimensão securitária, que constitui a identidade social das formas de acumulação
capitalistas, havendo uma permanente tensão na vida do trabalho entre a autonomia que
o trabalhador espera obter associada a uma expectativa de segurança.
Este questionário, uma das bases importantes de informação para o debate sobre
informalidade, ao procurar apreender as necessidades de captação sentidas na
investigação deste problema, de certa forma, reforça o conceito até então construído,
mas nos leva também a necessidade de sua (des) construção, em função das questões
novas de trabalho que implicam em um novo perfil esperado para o trabalhador.
1.3.2 - Relevância do quesito Local de Trabalho na apreensão da informalidade
O conceito sobre a economia informal utilizado pela OIT relaciona-se às
estatísticas sobre emprego nas empresas do setor informal e para o qual existe uma
definição acordada internacionalmente adotada pela 15a CIET (CONFERENCIA
INTERNACIONAL DE ESTADÍSTICOS DEL TRABAJO, 1993). Esta faz referência
às empresas e mão-de-obra, mas não à contribuição da economia informal no produto
interno bruto (PIB).
144
Os dados provenientes de 54 países demonstraram que a maior parte destes
mantêm uma definição própria do informal não necessariamente de acordo com a
definição estatística internacional adotada em 1993 pela 15a CIET e o Sistema de
Contas Nacionais de 1993. “Destes 54 países, 21 utilizam o critério de empresa não
registrada, em exclusividade ou combinando-o com outros critérios como o de empresa
de pequeno tamanho ou tipo de lugar de trabalho; os outros 33 países restantes usam
como critério o do tamanho pequeno, exclusivamente ou combinado com o de empresa
não registrada ou tipo de lugar de trabalho” (CONFERENCIA INTERNACIONAL
DEL TRABAJO, 2002, p. 11).
Segundo as recomendações internacionais, o conceito do informal está voltado
para considerar o empreendimento e a correspondente mão-de-obra utilizada. Neste
sentido, os trabalhadores por conta própria e os pequenos empregadores constituem-se a
base de estudo da informalidade. O trabalho passou a ser identificado como a unidade
de produção desde o informe da Organização Internacional do Trabalho sobre o Quênia
(EMPLOYMENT..., 1972) considerado como um dos primeiros documentos realizados
sobre o setor informal. As conclusões deste estudo apontavam que um conjunto
significativo de subempregados trabalhava em múltiplas atividades, conseguindo
sobreviver mesmo em condições desfavoráveis. Procurou-se examinar, então, não só o
tipo de trabalho realizado, mas também a sua constituição que ocorria, sobretudo, em
operações unipessoais.
Na PNAD, há a possibilidade de ser analisado, de um lado, o trabalho informal,
através dos trabalhadores por conta própria e dos pequenos empregadores considerados
pela OIT e da mão-de-obra nela empregada. A primeira categoria de posição na
ocupação contempla a existência de sócios e de trabalhadores não remunerados e a
segunda, de empregados e de trabalhadores não remunerados. A ótica da relação de
trabalho informal, na PNAD, pode ainda abranger a inclusão das categorias de posição
de per si (quando for o caso, empregado, conta própria, empregador, não remunerado,
trabalhador doméstico além das categorias novas incluídas a partir de 1992 - o
trabalhador na produção para o próprio consumo e o trabalhador na construção para o
próprio uso) das atividades agrícolas e não agrícolas, percebidas através das variáveis
indicativas de sua relação de trabalho.
A contrapartida da abrangência das categorias de posição na ocupação na PNAD
para a questão da informalidade no final da década de 1980 residia no fato de que: se
145
por um lado, são discriminadas as variáveis que tentam revelar o modo de inserção do
trabalhador no mercado de trabalho, por outro lado, o desafio situava-se na inclusão de
variáveis indicativas do espaço econômico da produção.
As propostas surgidas então no final da referida década, conforme já observado,
indicavam a inclusão de uma variável que se relacionasse ao local de trabalho como
importante para a captação da informalidade, além da discriminação da posição na
ocupação. Esta informação foi incluída na PNAD, na década de 1990, mais
precisamente em 1992, permanecendo até hoje para todas as categorias de posição na
ocupação das pessoas ocupadas tanto em atividades agrícolas como não agrícolas
(Quadro II).
Em documentação da Revisão da PNAD (REVISÃO..., O segundo pré-teste,
1994, p. 49), os objetivos descritos sobre o local de trabalho visam distinguir, na
população ocupada, os que trabalham no domicílio em que residem daqueles que
trabalham fora deste. Esta informação relacionada com outras permitiria, entre outros
aspectos: “a) perceber, inicialmente, a relação de formalidade/informalidade da relação
de trabalho não-agrícola, b) detectar a superposição, dentro de um mesmo espaço físico,
do local de moradia e do local de produção e comercialização de bens e serviços,
importantes sobretudo no setor informal; c) especificar a diversidade das relações de
trabalho tanto formais como informais nas atividades não-agrícolas; d) isolar o local de
trabalho para quem exerça atividade agrícola” (Anexo III).
A informação sobre o local de trabalho, a partir da década de 1990, procura
nesse sentido contemplar os propósitos já referidos na busca de um melhor
entendimento da diversidade das relações de trabalho formais e informais, sobretudo nas
atividades não-agrícolas, mas destacando o local de trabalho das atividades agrícolas.
É verificado se o trabalho tinha estabelecimento em: (a) loja, oficina, fábrica,
escritório, escola, repartição pública, galpão, etc. (b) fazenda, sítio, granja, chácara, etc.
ou era exercido: (a) no domicílio em que morava; (b) em domicílio de empregador,
patrão, sócio ou freguês; (c) em local designado pelo empregador, cliente ou freguês;
(d) em veículo automotor; e) em via ou área pública ou f) outro local. Busca também
determinar se há uma superposição do local de trabalho e de residência através da
indagação se, na semana de referência, a pessoa morava em domicílio que estava no
mesmo terreno ou área do estabelecimento em que tinha esse trabalho (Quadro II).
146
Em períodos anteriores à década de 1990, não havia informação sobre o local de
trabalho como um quesito específico. Em 1976 e 1977, no quesito posição na ocupação
era incluída a declaração de estabelecido e não estabelecido para o trabalhador por conta
própria, de certa forma, fornecendo um indício de local de trabalho somente para a
referida categoria.
Em 1978, não consta mais a informação sobre o fato do trabalhador por conta
própria estar ou não estabelecido, sendo acrescentada a pergunta, somente neste ano,
sobre o fato da ocupação declarada no trabalho da semana de referência ter sido
exercida em outros locais para todas as posições na ocupação (que se restringem às
categorias de empregado, conta própria, empregador e trabalhador não remunerado). No
entanto, as opções de resposta não servem para indicar o tipo do local de trabalho,
conforme é realizado na década de 1990, mas o número de trabalhos tidos por uma
pessoa nesta ocupação, que estão vinculados a partir de 1992, à definição de
empreendimento, já vista anteriormente.
Em relação ao fato da pessoa ter exercido a ocupação declarada no trabalho da
semana em outros locais, pode haver três situações, conforme indicado em manual da
PNAD de 1978: (a) a pessoa ter exercido esta ocupação para mais de um empregador;
(b) não remunerado que trabalha para mais de um conta própria e (c) em mais de uma
firma (própria ou de terceiros) ou instituição. Em alguns casos, seria uma informação,
que concomitante àquela da posição na ocupação declarada auxiliaria na indicação de
que este trabalho estaria vinculado à informalidade como no caso das alternativas b ou c
(nesta última situação, uma das situações encontrada é a de uma pessoa que, além de ter
uma firma - enquadrando-se como conta própria ou um pequeno empregador, estando
estas categorias vinculadas nas estatísticas à informalidade - trabalha para terceiros ou
para uma instituição, pode ser neste caso estar como empregada ou como conta própria).
Em suma, a inclusão da variável local de trabalho, a partir da década de 1990 até
hoje, para todas as pessoas ocupadas significa, em nosso entender, um avanço na
tentativa de melhor se caracterizar as várias possibilidades das relações de trabalho
ocorridas, sobretudo para as categorias de posições na ocupação situadas na
informalidade. Desta forma, atendeu a proposta, realizada no final da década de 1980,
de contemplar uma compreensão mais adequada das evidências empíricas deste tema.
Atualmente, no entanto, assiste-se às mudanças provocadas no mundo do
trabalho que provocaram uma maior flexibilidade e informalização da produção e das
147
relações de trabalho no contexto mundial, sofrendo a influência também da introdução
das novas tecnologias da informação e das comunicações. De um lado, as empresas têm
descentralizado a sua produção em unidades de unidades de produção mais flexíveis e
especializadas, por vezes não registradas, situadas na informalidade, ao invés de situá-
las em um só local de trabalho, tais como uma fábrica ou um local registrado.
Por outro lado, “uma variação mundial da especialização flexível é o rápido
crescimento das cadeias fronteiriças de bens e valores” (CONFERENCIA
INTERNACIONAL DEL TRABAJO, 2002, p. 2). É estabelecida, muitas vezes, uma
conexão entre empresas, de grande ou pequena escala, situadas em um país
industrializado avançado podendo o produtor final, em muitos casos, estar na economia
informal em países em desenvolvimento e, cada vez mais, em países em transição.
Visando não só reduzir os custos como também melhorar a competitividade, “as
empresas trabalham cada vez mais com um pequeno núcleo de trabalhadores
assalariados em condições regulares de emprego e uma periferia cada vez maior de
trabalhadores de trabalhadores ‘não regulares’ ou ‘atípicos’ em diferentes tipos de
lugares de trabalho dispersos em distintas localizações, e em algumas vezes em distintos
países. Estas medidas costumam incluir acordos de contratação externa ou
subcontratação e relações de trabalho mais flexíveis e informais” (p. 2).
Em função destas novas questões que são apontadas na caracterização da
informalidade, que podem estabelecer, por vezes, um intercâmbio da produção entre
países, torna-se necessário refletir sobre a informação relativa à captação do local de
trabalho, que se encontra associada também à questão da posição na ocupação. Fica
difícil, cada vez mais estabelecer a cadeia inicial de um contrato de trabalho, que se não
implica em uma relação internacional, envolve, muitas vezes, a subcontratação e a
desvinculação de, pelo menos, parte da mão-de-obra empregada em um
empreendimento de um quadro permanente de trabalhadores.
1.3.3 - Relevância do quesito Tamanho do Empreendimento na apreensão da
informalidade
Desde a implantação da PNAD, em 1967, até 1973, foi pesquisado nesta
pesquisa se a pessoa empregava uma ou mais pessoas por diária, salário ou pagamento
148
em bens. No entanto, não ocorria a discriminação do número de pessoas empregadas,
não se podendo avaliar o quesito referente ao tamanho do empreendimento.
A referida informação não constava da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios na década de 1980 e nos anos 1970, em 1979, registram-se perguntas de
tamanho da empresa para os empregados que servem para diferenciar se estes trabalham
uma pequena empresa (5 pessoas) ou não. Em relação aos empregadores, indaga-se a
respeito das pessoas empregadas discriminando-se o conjunto das pequenas empresas.
Tanto para os empregadores como para trabalhadores por conta própria é pesquisado o
montante de trabalhadores não remunerados (Quadro II).
A partir de 1992, um conjunto de perguntas sobre o tamanho de empreendimento
é realizado na PNAD, diferenciado para as atividades agrícolas e não agrícolas e, de
forma mais especificada, segundo as posições na ocupação. Em 1979, estas indagações
procuram investigar esta variável, por posição na ocupação, sem distinção do tipo de
atividade agrícola/não-agrícola realizado.
Na década de 1990 até hoje é pesquisada a mão-de-obra utilizada sendo esta, no
caso dos trabalhadores por conta própria, a existência de sócios e de trabalhadores não
remunerados e para os empregadores, além destes, o número de pessoas empregadas.
Para quem era empregador ocupado na agricultura, silvicultura, etc, é indagada a
existência de pelo menos um empregado temporário e pelo menos um empregado
permanente nesse trabalho e quando isto ocorrer o contingente destes.
Quanto aos empregados nas atividades agrícolas, existe a indagação se estes
contavam com a ajuda de trabalhadores não remunerados e de seu montante, pois é
comum que os membros da família, tais como as mulheres e crianças, participem das
tarefas realizadas, embora seja somente a pessoa de referência da família (denominação
atual na pesquisa para a figura do chefe), em geral o homem, a única contratada.
Para os empregadores e trabalhadores por conta própria em atividades não-
agrícolas e os empregadores nos serviços auxiliares das atividades agrícolas, indaga-se,
a existência de sócios ocupados e, em caso afirmativo, o número de sócios ocupados
bem como o dos trabalhadores não remunerados.
Devem ser ressaltados alguns pontos importantes salientados pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT). O primeiro deles diz respeito ao fato da definição
adotada para o informal, de acordo com as recomendações internacionais, situar-se em
relação à empresa e à mão-de-obra. Neste caso, são destacados como categorias-chave
149
do empreendimento, os trabalhadores por conta própria e os empregadores, em geral das
pequenas empresas. Outras categorias de posição na ocupação constituem a mão-de-
obra utilizada por estas, podendo ser formada não só pelos empregados, mas também
pela possibilidade da existência de trabalhadores não remunerados e/ou sócios, estes
últimos tanto para os empregadores quanto para os trabalhadores por conta própria.
A definição do informal que utiliza como critério o pequeno empreendimento
parte, em geral, do pressuposto que não há, muitas vezes, uma clara divisão entre o
capital e o trabalho. Quando isto ocorre, o fator trabalho prevalece em relação ao
capital, tecnologia nacional e relações de trabalho estabelecidas com base em laços
pessoais, familiares que se sobrepõem à busca de racionalidade econômica de uma
organização produtiva que vise maximizar a obtenção de lucros.
Apesar deste ser um critério empírico, Lautier (1991, p. 25) enfatiza que o fato
deste ter sido proposto pelas organizações regionais da Organização Internacional do
Trabalho (como o Programa Regional de Emprego para a América Latina e o Caribe –
PREALC), o que fez com que a maior parte dos institutos nacionais de estatísticas,
procurassem adotá-lo seguindo estas normas internacionais. De forma geral, o pequeno
empreendimento é considerado como tal quando formado por unidades produtivas de
menos de onze pessoas ocupadas e, às vezes, menos de seis.
Na origem do debate da informalidade, um outro ponto relaciona-se à
ambigüidade da noção de tamanho, conforme destacado por Silva (1971, nota 9 p. 25),
“pois não há relacionamento necessário entre, por exemplo, o valor da produção, a área
do estabelecimento e o volume de capital, ou entre este e o número de empregados, etc”.
A PNAD contempla, em uma mesma pesquisa, tanto as categorias de
trabalhadores por conta própria e de empregadores e sua mão-de-obra empregada,
consideradas na definição do conceito do informal pela OIT como também outras
importantes nesta caracterização, tais como, a dos empregados que estão relacionados à
informalidade, além a dos trabalhadores domésticos e a dos trabalhadores agrícolas.
Em suma, torna-se importante enfatizar que se, de um lado, a investigação da
variável tamanho do empreendimento, de forma sistemática, a partir da década de 1990,
pôde proporcionar uma melhor compreensão da caracterização do trabalho informal e,
certamente significou um avanço na tentativa de aprimorar o seu estudo, por outro lado,
deve ser relembrada a importância da divisão técnica e social do trabalho estabelecida
na caracterização da informalidade. Além do mais, a exigüidade do tamanho do
150
empreendimento informal demonstra, por vezes, ser este responsável por um
significativo volume de capital obtido, comprovando, até hoje, a ambigüidade já
observada, em seus primórdios, desta discussão.
1. 4 - Considerações sobre a atualidade da investigação da informalidade na
PNAD da década de 1990
O questionário em uma pesquisa de estatísticas oficiais, como a PNAD, é um
instrumento de captação de uma produção de evidências empíricas que, em sua
construção, pode reforçar, no caso do nosso objeto de análise, a noção da informalidade
estabelecida. De um lado, em sua elaboração, encontram-se permeados conceitos e
variáveis que buscam o entendimento do problema de investigação da informalidade.
Por outro lado, reflete as demandas sentidas, em um determinado período de tempo.
A inclusão das variáveis, relativas ao local de trabalho e do tamanho do
empreendimento, na PNAD, a partir de 1992, procuraram aperfeiçoar à época, a
captação do problema de investigação, qual seja, a informalidade, contemplando
variáveis indicativas do “espaço econômico” onde se realiza a produção (que pode
coincidir com o local de residência) além daquelas relacionadas ao “espaço social”40
(OLIVEIRA, 1990a).
A maior discriminação da variável posição na ocupação buscou captar a
diversidade das relações de trabalho, na qual estão inseridas aquelas voltadas aos
contextos formal e informal de trabalho que não devem ser vistos como dissociados.
Este fato já era observado na origem da discussão do debate da informalidade e
encontra-se acentuado diante das tendências atuais que mostram, com freqüência, o
entrelaçamento destes.
É necessário destacar a importância da PNAD na investigação desta questão,
pois como a informalidade envolve tanto as atividades agrícolas como as não-agrícolas,
através da maior desagregação da posição na ocupação, é possível verificar um amplo
contingente de pessoas ocupadas com diversas situações de trabalho e de produção.
A compreensão dos novos significados da informalidade, em função das
complexas transformações na questão do trabalho provocadas pela globalização do
151
capital, revelou como importante a análise da questão da reestruturação produtiva e da
organização social. De forma resumida, poder-se-ia dizer que, freqüentemente, a idéia
de informalização tem sido utilizada para explicar a flexibilização das relações de
trabalho, a qual significa, muitas vezes, uma acentuada situação de instabilidade e de
precariedade do trabalhador no mercado de trabalho.
Há ainda a possibilidade de verificação, na PNAD, das mudanças de trabalho de
uma pessoa ao longo do ano bem como da existência de mais de um trabalho, estas
últimas auxiliando na comprovação da instabilidade ou da transitoriedade à qual o
trabalhador está submetido em função das mudanças apresentadas no mercado de
trabalho.
O fato das mudanças atingirem os trabalhadores, de forma distinta, reforça
inicialmente a importância de se manter a posição na ocupação na PNAD, de forma
desagregada, como uma variável chave e definidora inicial da captação da produção de
evidências empíricas que retratariam as várias relações de trabalho, formais e informais,
nela contidas.
As referidas transformações no mundo do trabalho implicam, muitas vezes, em
subcontratação ou contratação de serviços externos às empresas ocasionando uma
diminuição das relações de emprego regulares e uma ampliação daquelas consideradas
mais flexíveis e informais.
A complexidade desta questão é evidente na cadeia de laços estabelecida
formando uma seqüência, muitas vezes, difícil de ser detectada nas estatísticas oficiais
do país. “Distinguir quem são os proprietários, quem são os produtores, quem são os
administradores e quem são os empregados está ficando cada vez mais difícil em um
sistema produtivo de geometria variável, trabalho em equipe, atuação em redes,
terceirização e subcontratação” (CASTELLS, 1999, p. 502-503).
A distinção por posição na ocupação, aparentemente de fácil determinação,
dentro das redes, resulta complexa, pois depende dos fluxos nela estabelecidos. A idéia
de fluxo implica em uma situação indicativa de transitoriedade por parte dos
trabalhadores que podem alternar sua posição na ocupação.
40 As denominações empregadas sobre o “espaço social” e o espaço “econômico” são encontradas in OLIVEIRA, Jane Souto de. O espaço econômico das pequenas unidades produtivas: uma tentativa de delimitação. Rio de Janeiro: IBGE, Diretoria de Pesquisas, 1990a. 67 p. (Textos para discussão, n.27).
152
Outras variáveis, tais como rendimento, posse de carteira de trabalho e
contribuição previdenciária, têm sido apontadas também como cruciais na
caracterização dos segmentos de trabalhadores, envolvidos em atividades formais ou
informais. No entanto, nem mesmo estas estariam representando já há algum tempo, um
exemplo claro e definidor das relações de trabalho formal e informal.
A partir dos anos 1990, tornou-se mais visível o enfoque dado à adaptação, à
mudança bem como à flexibilidade que se encontram fundamentadas sobre uma série de
fenômenos que marcaram profundamente o espírito do capitalismo. No mundo das redes
a flexibilidade e a adaptabilidade das pessoas são características primordiais que as
tornam polivalentes e, portanto, empregáveis, fazendo com que possam ser consideradas
como ativas e autônomas (BOLTANSKI; CHIAPELLO,1999).
Se de um lado, a proposta de reformulação da PNAD, implantada a partir de
1992, procurou atender às demandas que se faziam necessárias e as questões percebidas
no período realizado, por outro lado, deve-se procurar realizar a sua adequação ante os
novos significados da informalidade em função das complexas transformações
processadas no mundo do trabalho, tendo em vista a globalização do capital.
153
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta tese examina uma proposta de investigação do problema da informalidade,
com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), que se constitui,
sobretudo no tema trabalho, uma importante fonte de dados para as Ciências Sociais.
O interesse por este tema resultou não só no fato da crescente dimensão da
absorção de um conjunto de população ativa na denominada informalidade como
também pela sua continuidade, independente da conjuntura econômica do país.
Um intenso debate na literatura especializada mostra cada vez mais um grande
contingente de trabalhadores engajado na denominada informalidade, o que por si só
revestiria o objeto de estudo, em pauta, de acentuada importância no cenário de
investigação das formas de absorção da mão-de-obra no mercado de trabalho.
A dinâmica observada para este segmento da força de trabalho, visto como
marginalmente inserido na economia capitalista bem como no processo de integração
social, tem levado ao questionamento de pressupostos anteriormente formulados,
vigentes na década de 1980. Estes relacionavam o seu crescimento, sobretudo, aos
períodos de crise econômica, quando haveria a expulsão de determinados segmentos da
população do mercado denominado formal.
A tendência de contínuo crescimento da informalidade, observada na década de
1990, não só contrariou a citada hipótese como nos apontou a necessidade de buscar
outros fatores explicativos, repensando as teorias existentes e pesquisando sobre os
novos rumos adquiridos por este fenômeno.
O interesse pela economia informal atingiu a esfera pública, vinculada ao
planejamento bem como às políticas econômicas nacionais. Destaque-se a relevância
deste tema para a comunidade acadêmica bem como para os formuladores de políticas
publicas na área do trabalho. Surge então a questão da indagação sobre a adequação de
um sistema de informação estatística à representatividade do objeto em questão. “Daí
parece ter resultado a preocupação, crescente e generalizada, com os sistemas de
informação estatística: em que medida estariam eles aptos a captar as mudanças que
vêm se processando na base produtiva e na configuração dos mercados de trabalho?”
(OLIVEIRA, 1990a, p.16).
No referido campo das informações estatísticas, em relação à captação do tema
informal, são estabelecidos desafios constantes tendo em vista que estas tomam como
154
referência, de um modo geral, o modelo de emprego tipicamente capitalista. A inserção
da população no campo do informal aparece como oposição.
Uma modificação do paradigma produtivo, no entanto, provocou profundas
alterações no mundo do trabalho. A configuração de uma nova ordem político-
econômica internacional, a reestruturação produtiva e as inovações tecnológicas
traduziram-se em transformações nas relações e processos de trabalho. Tornou-se
importante analisar a sua representação e/ou viabilidade destas através de estatísticas
oficiais, como a PNAD, visando uma adequada produção de evidências empíricas.
A realidade é atingida pelas mudanças, embutidas no espírito do capitalismo
que, atualmente, estão provocando, cada vez mais, a diminuição da inserção da
população neste modelo de emprego tipicamente capitalista. Estas revelam as
dificuldades crescentes de absorção de mão-de-obra em função das complexas mutações
ocorridas no mercado de trabalho provocadas pela globalização do capital.
Foi visto que em um mundo macro-econômico, idealmente constituído por uma
sociedade de pleno emprego, a expectativa era, dentro de uma perspectiva de progresso,
de um futuro mais adequado para os trabalhadores e suas famílias. Tal fato não ocorreu,
em função de um descompasso entre o desenvolvimento do capitalismo, em expansão, e
o da sociedade. Entre outros fatores, esta última foi afetada por um quadro desfavorável,
em função do empobrecimento da população, do crescimento do desemprego e da
precariedade do trabalho com um aumento de mão-de-obra subcontratada ou
terceirizada, contratos temporários e horários flexíveis e diminuição de custos
despendidos com a proteção social.
A dimensão securitária, que se constitui a identidade social das formas
capitalistas de acumulação, está sendo ameaçada por meio do estabelecimento de novos
dispositivos capitalistas. Existem esquemas ideológicos que estão sendo mobilizados
para justificar as transformações no âmbito familiar e na adaptabilidade nas relações de
trabalho.
As conseqüências destas mudanças se refletiram nas diversas camadas da
população até então não atingidas como aquelas do segmento médio. Desde o início dos
anos 1980, houve não só uma redução do emprego nas grandes empresas como também
da parte estatutária destas, tendo sido afetados também os assalariados de micro-
empresas, os autônomos sem garantia de continuidade de sua atividade e os
desempregados.
155
Nos primórdios da discussão sobre este tema, a questão central era o nível de
pobreza grave, principalmente dos países subdesenvolvidos, e o papel desempenhado
pelo setor informal na sobrevivência desta população pobre. Neste sentido, encontram-
se os estudos produzidos no início da década de 1970, sobre Quênia
(EMPLOYMENT..., 1972) e sobre Gana (HART, 1973).
As oportunidades de sobrevivência para esta população mais carente eram
encontradas, sobretudo nas cidades, fazendo com este contingente populacional
deslocasse das áreas rurais, nas quais eram, em geral, residentes, em busca de trabalho.
Este era encontrado em ocupações específicas ou em determinadas atividades
econômicas que foram então denominadas de “informais”. Nesse sentido, estas se
constituíam em formas vitais de sustento de um expressivo número de famílias, que a
estas recorriam seja como atividade principal ou secundária de trabalho.
No cenário de hoje são observadas questões recorrentes, às destacadas na origem
do debate da informalidade, a seguir mencionadas, quando se constata a permanente
tensão na vida do trabalho entre a autonomia que se espera obter associada a uma
expectativa de segurança.
O trabalho informal já significava tanto o principal recurso de sobrevivência
para os nele engajados como também apresentava, muitas vezes, um grau de
regularidade no exercício desta atividade, o que se diferencia de uma relação de trabalho
casual com rendimentos ocasionais. O trabalhador procura criar os denominados laços
“de clientela”, sendo esta “personificação” da atividade econômica a característica
fundamental do mercado não formalizado, com intuito de assegurar uma posição segura
no mercado, evitando períodos de dificuldades de seu engajamento em trabalho
remunerado (SILVA, 1971).
O informal era visto também como substituto ou complementar das formas de
emprego de baixa remuneração. No entanto, havia situações nas quais os rendimentos
das atividades desenvolvidas no informal eram mais elevados, mas freqüentemente se
encontravam combinados com aqueles obtidos em um trabalho formal.
Era comum o recebimento de várias fontes de rendimentos como uma estratégia
mais segura de sobrevivência para os trabalhadores, por meio do desenvolvimento de
atividades combinadas, formais e informais. Se o emprego assalariado representava a
segurança desejada pelo trabalhador em sua atividade, o trabalho informal significava
rendimentos, por vezes, mais elevados. A concomitância ou a oscilação de atividades no
156
mercado formalizado e não formalizado, por parte dos componentes da família,
procurava garantir a sua reprodução, diminuindo possíveis riscos de algumas situações
de trabalho e auferindo ganhos maiores ou complementares proporcionados por outras.
Nas evidências empíricas da PNAD, é possível a compreensão da inserção da
mão-de-obra no mercado de trabalho na atividade principal e/ou secundária no
segmento formal ou informal de trabalho e a oscilação nos referidos contextos, na
semana ou no ano, já apontadas na origem do debate sobre a informalidade.
Na análise apresentada, ao longo do tempo, sobre a investigação da
informalidade, o propósito foi o de verificar, em nosso caso específico, as concepções
teóricas deste fenômeno associadas às representações concretas realizadas. O termo
“informal” é encontrado nesta análise sob várias denominações, tais como, setor
informal, mercado não formalizado ou setor não estruturado.
Além das percepções diferentes que são atribuídas a este fenômeno no tempo,
entende-se que traços comuns que podem perpassar diversos períodos analisados, por
meio de valores e representações que, estando presentes, se agregam na passagem e/ou
transformação de novas formas capitalistas de acumulação.
Na PNAD é utilizado o recorte de emprego e de mercados de trabalho cuja
unidade de análise é a da força de trabalho. A partir da década de 1990, procurou-se
inserir, nesta pesquisa, variáveis relacionadas ao recorte do aparato produtivo,
contemplando informações relacionadas aos estabelecimentos produtivos, para o
entendimento mais amplo do problema de investigação da informalidade. Conforme foi
anteriormente observado, estes enfoques não necessariamente são estanques, podendo
entremear-se ou superpor-se.
Ressalte-se que aspectos similares, destacados em décadas anteriores, são
encontrados até hoje nos estudos sobre a informalidade, gerando algumas controvérsias
pela difícil determinação de seus limites ou pela não explicitação de seus critérios
definidores, independente da perspectiva adotada. Na análise das perspectivas de
investigações sobre o setor informal urbano, nas economias em desenvolvimento,
observando o conceito e as variáveis utilizadas para defini-lo, foram observados pontos
convergentes também aos da época inicial dos estudos sobre o problema da
informalidade.
Os critérios definidores da formalidade ou da informalidade, quais sejam,
tamanho, mão-de-obra empregada, tecnologia, qualificação da força de trabalho,
157
estrutura organizacional e produtividade, referentes aos da década de 1970, permanecem
presentes, atualmente, refletindo-se nas variáveis utilizadas nos estudos e nas estatísticas
estabelecidas a este respeito.
De um lado, persiste a preocupação em se delimitar as diferenças existentes
entre os contextos formal e informal. Por outro lado, a coexistência destes, as suas inter-
relações, a heterogeneidade interna de cada um destes e os limites pouco nítidos entre os
mesmos constituem ainda desafios constantes no sentido de se obter uma adequada
conceituação da informalidade aliada a uma correspondente mensuração a este respeito.
Nos países denominados “subdesenvolvidos”, o assalariamento não se constitui
um padrão de referência tanto em termos de contingente de população trabalhadora
envolvida na atividade econômica como também do ponto de vista das relações de
trabalho reguladas e protegidas pelo Estado.
Os problemas de absorção produtiva do trabalho cresceram, no entanto, ao longo
dos anos 1980, nos países desenvolvidos fazendo com que a informalidade não fosse
somente uma especificidade daqueles com um menor nível de desenvolvimento sócio-
econômico.
A ruptura no padrão de pleno emprego dos países desenvolvidos e seus reflexos
em nosso país levaram a necessidade de repensar as mudanças processadas na noção da
informalidade e em sua análise pois é encarada, de modo geral, como o contraponto das
relações de trabalho do citado e abalado modelo de referência.
Na percepção da informalidade, já era enfatizado que as várias formas de
organização de produção de situações de trabalho revelavam um denominador comum,
qual seja, o fato de não se enquadrarem nos moldes de produção capitalista. O
denominador comum das referidas atividades não é a proximidade que guardam entre si,
mas o afastamento que todas mantêm do modelo de organização capitalista, traduzindo-
se em termos das relações de trabalho pela não correspondência ao “modelo de emprego
total”. (OLIVEIRA,1990b, p.42).
Em uma grande parte das análises sobre o tema da informalidade, baseadas em
estatísticas oficiais, foi observado que ainda é adotada uma abordagem dualista das
relações de trabalho formal e informal, enfocando este último como contraponto do
primeiro, contrariando as observações sobre o mundo real que mostra, cada vez mais, a
tendência de interação entre entres.
158
Ao longo do desenvolvimento do problema de investigação da informalidade,
procurou-se apresentar diferentes enfoques adotados em seu estudo que se refletem, em
termos concretos, nas variáveis que são utilizadas para compor as evidências empíricas
utilizadas a este respeito. Nesse sentido, entendeu-se como importante buscar a
associação do sentido lógico-formal às tentativas de caracterização desta questão que é
vista, dentre as fontes de dados existentes a este respeito, por intermédio das estatísticas
oficiais do país.
Na verificação da produção de evidências empíricas da PNAD, foi considerado
fundamental comprovar até que ponto estas estariam traduzindo as mudanças, que
indicam um novo paradigma produtivo, ocorridas nas relações de trabalho na sociedade
contemporânea e suas conseqüências para o trabalhador.
A partir dos anos 1980, em função de mudanças mundiais, que se refletem em
nosso país, a noção de informalidade, que era percebida como um contraponto do
referido padrão estabelecido, adquire novos significados. Estes, por vezes, são
agregados na compreensão de seu conteúdo ao mesmo tempo em que pode demonstrar a
manutenção de antigas questões nesta discussão ou mesmo uma mescla de ambas as
situações.
As questões apontadas por Silva e Chinelli (1997, p.25), indicaram, nesse
sentido, que pode estar ocorrendo, de um lado, “não uma transformação total da noção
de informalidade anteriormente adotada, mas talvez uma ampliação de seu campo
semântico ou ambos os casos”. Por outro lado, ressaltam as conseqüências diferenciadas
das mudanças processadas no mercado de trabalho para os segmentos específicos de
trabalhadores, atingindo as camadas médias. Os resultados destas transformações
significam perdas de direitos trabalhistas bem como diminuição quantitativa e
qualitativa das relações assalariadas.
Cabe enfatizar, o movimento estabelecido, de forma voluntária ou não, no
sentido de estimular o surgimento de “novos empreendedores”, inserindo, neste caso,
também os segmentos de trabalhadores de camadas médias, até então mais protegidas
dos efeitos da crise econômica.
O discurso da formação de “novos empreendedores” se de um lado, revela o
desejo de muitos trabalhadores de gerir o seu próprio empreendimento ou a sua força de
trabalho, por outro indica uma cultura, que se forma no mundo de trabalho, marcada
159
pela incerteza de assegurar a estes trabalhadores e a seus descendentes uma condição de
trabalho para toda a vida, nas quais garantias e direitos trabalhistas lhes eram mantidos.
A noção do espírito do capitalismo permite articular dois conceitos centrais,
quais sejam, o do capitalismo e o da crítica em uma relação dinâmica. O espírito do
capitalismo é a ideologia que justifica o engajamento no capitalismo. As justificativas
apresentadas, na análise do mesmo, nos parecem ilustrar que a exigência de justiça é
continuamente transgredida. Tal fato é ressaltado pela crítica, revelando um jogo de
interesses no qual as relações de forças traduzem, mesmo que de forma velada, a
dominação dos interesses do capitalismo sobre os benefícios, produzidos por este, para
os trabalhadores.
Ao mesmo tempo em que foi visto um capitalismo, em expansão, convivendo
com uma situação econômico-social em condições desfavoráveis, assistiu-se a falta de
atuação da crítica social, não apresentando propostas alternativas para a população
atingida.
O objetivo de reunir os novos significados da informalidade foi o de verificar,
sobretudo diante das novas questões postas na discussão pública em termos de absorção
dos diversos segmentos de trabalhadores, a adequação atual e a possibilidade das
estatísticas oficiais, como a PNAD, por meio de seus conceitos e variáveis, na captação
do problema de investigação em pauta. As referidas questões têm retratado uma
situação provisória para os trabalhadores, que o tornam menos ou mais empregável,
provocando insegurança, em termos de sobrevivência, dos que estão nela envolvidos.
A questão fundamental residiu em verificar até que ponto o questionário,
produto do pensamento da equipe de pesquisadores nela envolvidos, base de informação
inclusive para o debate sobre informalidade, reforça a referida noção estabelecida no
período de sua realização. De um lado, sua concepção procurou atender em parte às
demandas da época. Por outro lado, em que medida hoje, em função das dificuldades de
absorção da força de trabalho e das novas questões apresentadas, em termos de trabalho
(que impõem a discussão conceitual da noção de informalidade) estar-se-ia verificando,
a necessidade de realizar, por assim dizer, sua (des) construção.
No questionário, encontram-se embutidos não só os conceitos e as variáveis que
buscam o entendimento do problema de investigação da informalidade como também as
demandas sentidas, em um determinado período de tempo.
160
De forma geral, o questionário elaborado da PNAD, na década de 1990, tentou
contemplar, por meio de um elenco de quesitos, a heterogeneidade das formas de
organização da produção e do trabalho no Brasil, segundo as diversas categorias de
posição na ocupação, tentando associar não só as não-agrícolas como também aquelas
agrícolas. Em ambas podem estar inseridas as relações de trabalho formal/informal,
existindo muitas vezes o fato de que um trabalhador pode estar, ao longo de sua vida
produtiva, alternando sua inserção em ocupações formais ou informais ou estar
envolvido, concomitantemente, em ambas.
As categorias de posição na ocupação traduziriam as relações de trabalho no
Brasil, fazendo o contraponto do assalariamento, visto sempre como padrão e/ou
modelo, com o do trabalho informal, enfocado como o outro lado da questão, em um
determinado quadro institucional político-econômico. As categorias de posição na
ocupação e as variáveis são construções, do ponto de vista lógico e analítico, que tentam
retratar um quadro de evidências empíricas atualizado das questões postas sobre o
trabalho.
O pressuposto foi o de que, em fontes de informações estatísticas oficiais, tais
como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), que se constitui um
dispositivo político-econômico de representação do fenômeno, ainda permaneçam
resquícios da herança de padrões estabelecidos em outros países, com formações sociais
distintas de nossa sociedade, os quais estabelecem, como modelo vigente, a inserção da
população no trabalho assalariado.
A hipótese central desta tese aponta que as profundas mudanças no mundo do
trabalho afetam cada vez mais a absorção da mão-de-obra, acrescendo a estas o ritmo no
qual estas estão sendo processadas. Tal fato traz obstáculos nas evidências empíricas
geradas das estatísticas oficiais, como a PNAD, destinadas ao entendimento do
crescimento/dinâmica da informalidade.
Tendo em vista os aspectos anteriormente discutidos, o problema, desenvolvido
nesta tese relacionou-se a investigar: em que medida as novas questões postas no debate
público, sobre as dificuldades de absorção do trabalho, podem ser abordadas com base
nas classificações oficiais nacionais, que buscam se adequar aos parâmetros indicados
nas recomendações internacionais?
Foi importante se apreender a forma pela qual é construída a investigação do
problema da informalidade, na PNAD, constituindo-se fundamental, nesta
161
comprovação, a análise e a interpretação das mudanças de variáveis consideradas
importantes para a sua compreensão, ao longo do tempo, e os motivos destas estarem
inseridas nesta pesquisa, explicitados ou subjacentes.
Têm sido apontadas como variáveis, entre outras, como indicadas para o estudo
das novas tendências do informal, aquelas relacionadas às mudanças no mercado de
trabalho, provocadas pelas alterações qualitativas da demanda por força de trabalho,
pela tendência de queda do emprego industrial e pelas formas de terceirização. As
transformações no processo de trabalho e no gerenciamento da força de trabalho
parecem ter como conseqüências, entre outras, o aumento do trabalho domiciliar, do
exercido em tempo parcial e da terceirização.
As questões discutidas, a partir dos anos 1990, têm um cenário diverso do que
prevalecia em períodos anteriores, reconhecendo-se a importância de se observar este
tema em suas mudanças de conteúdo. A produção das estatísticas da PNAD até a década
de 1980 foi utilizada comparativamente para destacar os possíveis avanços apontados
em relação à questão investigada.
A inclusão das variáveis relacionadas aos estabelecimentos produtivos, tais
como o local de trabalho e o tamanho do empreendimento, na PNAD, a partir de 1992,
procuraram aperfeiçoar à época o entendimento do problema de investigação da
informalidade, contemplando variáveis indicativas do “espaço econômico” onde se
realiza a produção (que pode coincidir com o local de residência) além daquelas
relacionadas ao “espaço social”41 (OLIVEIRA, 1990a).
A maior discriminação da variável posição na ocupação buscou captar a
diversidade das relações de trabalho, na qual estão inseridas aquelas voltadas aos
contextos formal e informal de trabalho que não devem ser vistos como dissociados.
Este fato já era observado na origem da discussão do debate sobre a informalidade e se
encontra acentuado diante das tendências atuais que mostram, com freqüência, o
entrelaçamento destes.
A importância da PNAD foi comprovada na investigação da informalidade, no
sentido de que como esta envolve tanto as atividades agrícolas como as não-agrícolas,
41 As denominações empregadas sobre o “espaço social” e o espaço “econômico” são encontradas in OLIVEIRA, Jane Souto de. O espaço econômico das pequenas unidades produtivas: uma tentativa de delimitação. Rio de Janeiro: IBGE, Diretoria de Pesquisas, 1990a. 67 p. (Textos para discussão, n.27).
162
por meio da maior desagregação da posição na ocupação, é possível verificar um amplo
contingente de pessoas ocupadas com diversas situações de trabalho e de produção.
O conhecimento da informalidade, no questionário, procurou ser percebido
através da apreensão da heterogeneidade das relações de trabalho no Brasil. Entende-se
a utilidade deste instrumento de pesquisa, que traz conceitos e variáveis nele embutidos,
no entendimento do problema de investigação da informalidade. No entanto, a
característica central das tendências da informalidade é a ambigüidade e as mudanças
processadas em termos de trabalho afetam de forma diferenciada cada setor de
trabalhadores, havendo a necessidade de um entendimento mais adequado deste
fenômeno na PNAD.
A compreensão dos novos significados da informalidade, em função das
complexas transformações na questão do trabalho provocadas pela globalização do
capital, revelou como importante a análise da questão da reestruturação produtiva e da
organização social. De forma resumida, poder-se-ia dizer que, freqüentemente, a idéia
de informalização tem sido utilizada para explicar a flexibilização das relações de
trabalho, a qual significa, muitas vezes, uma acentuada situação de instabilidade e de
precariedade do trabalhador no mercado de trabalho.
A possibilidade de apreensão das estratégias da ocupação das pessoas em termos
de trabalho, na PNAD, é observada por meio do número de trabalhos exercidos de
forma concomitante, tais como o principal e o secundário, ou a oscilação de trabalhos na
semana e no ano associados à caracterização dos mesmos.
As referidas informações são importantes no sentido de estar indicando, por
vezes, a passagem de um trabalho formal para outro informal ou vice-versa, ou o
exercício de ambos. A concomitância de trabalhos, apontados na literatura
especializada, mostra a busca da população que procura associar a estabilidade em um
trabalho com um rendimento mais favorável que pode ser obtido em outro. As
evidências empíricas podem ilustrar, por meio da análise da atividade econômica da
população na semana e no ano, em um ou mais trabalho, um quadro demonstrativo da
conjuntura do país, revelando a estabilidade/instabilidade dos ocupados no mercado de
trabalho.
O fato das mudanças atingirem os trabalhadores, de forma distinta, reforça
inicialmente a importância de se manter a posição na ocupação na PNAD, de forma
desagregada, como uma variável chave e definidora inicial da captação da produção de
163
evidências empíricas que retratariam as várias relações de trabalho, formais e informais,
nela contidas.
As categorias de posição na ocupação na PNAD, associadas à discriminação de
variáveis específicas, revelaram serem importantes no sentido da percepção da inserção
do trabalhador no mercado de trabalho e para a questão da informalidade. No entanto, o
desafio situava-se na inclusão, na referida pesquisa, de variáveis indicativas do espaço
econômico da produção, tais como, as referentes ao local de trabalho e ao tamanho do
empreendimento, implantadas a partir de 1992.
Outras variáveis, na parte de trabalho, têm sido apontadas também como cruciais
na caracterização dos segmentos de trabalhadores, envolvidos em atividades formais ou
informais, tais como rendimento, posse de carteira de trabalho e contribuição
previdenciária, captadas na PNAD. No entanto, nem mesmo estas estariam
representando já há algum tempo, um exemplo claro e definidor das relações de trabalho
formal e informal, pois as mudanças que implicaram em perdas de garantias e
determinados privilégios do setor organizado e a própria heterogeneidade deste fizeram
com que estas distinções não estejam se processando de forma tão nítida e direta.
As transformações ocorridas no mundo do trabalho implicam, muitas vezes, em
subcontratação ou contratação de serviços externos às empresas ocasionando uma
diminuição das relações de emprego regulares e uma ampliação daquelas consideradas
mais flexíveis e informais. No entanto, a complexidade desta cadeia de laços
estabelecida torna-se uma seqüência, muitas vezes, difícil de ser detectada nas
estatísticas oficiais do país.
A distinção por posição na ocupação para captar a diversidade das relações de
trabalho no país, proposta na PNAD, dentro das redes resulta, no entanto, complexa e
difícil, muitas vezes, de ser retratada, pois depende dos fluxos nela estabelecidos. A
idéia de fluxo implica em uma situação dinâmica indicativa de transitoriedade por parte
dos trabalhadores, que podem alternar sua posição na ocupação, em função de sua
atuação em redes, da terceirização e da subcontratação.
A partir dos anos 1990, tornou-se mais visível o enfoque dado à adaptação, à
mudança bem como à flexibilidade que se encontram fundamentadas sobre uma série de
fenômenos que marcaram profundamente o espírito do capitalismo. No mundo das
redes, a flexibilidade e a adaptabilidade das pessoas são características primordiais que
164
as tornam polivalentes e, portanto, empregáveis, fazendo com que possam ser
consideradas como ativas e autônomas (BOLTANSKI; CHIAPELLO,1999).
A proposta de reformulação da PNAD, a partir de 1992, procurou atender às
demandas que se faziam necessárias e as questões percebidas no período realizado. A
questão não respondida, pelas referentes estatísticas, refere-se à necessidade de sua
adequação ante os novos significados da informalidade em função das complexas
transformações processadas no mundo do trabalho. As citadas mudanças já vêm sendo
reconhecidas e indicadas, em nível mundial, pela Organização Internacional do
Trabalho.
Entende-se que a pesquisa através de seu questionário, não possui a agilidade
necessária, em uma ação reflexiva conceito-instrumento, para acompanhar as rápidas
transformações e noções existentes no mundo do trabalho.
O questionário, uma das bases importantes de informação para o debate sobre
informalidade, ao procurar apreender as necessidades sentidas na investigação deste
problema, de certa forma, reforça o conceito até então construído, mas nos leva também
a necessidade de sua (des) construção, em função das questões de trabalho, presentes no
debate público, que implicam em um novo perfil esperado para o trabalhador.
No mundo do trabalho, o afastamento de um modelo de emprego, que implicava
para os trabalhadores em segurança e manutenção de direitos trabalhistas, e as questões
referentes à terceirização, à subcontratação, ao trabalho em equipe e em redes,
demonstram o imperativo de refletir a noção de informalidade, até então construída, e a
sua representação, que aparece como contraponto do abalado modelo de referência,
embutido desde a origem das estatísticas oficiais da PNAD.
165
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México, DF, n. 215, p.513-536, jul./set. 1987.
VALADÃO, Lucília. O mercado de trabalho no setor informal. In: REUNIÃO
INTERNACIONAL DE ESTATÍSTICAS SOCIAIS DOS PAÍSES DE LÍNGUA
PORTUGUESA, 9., 2000, Rio de Janeiro. 9. Reunião... Rio de Janeiro: RIESLOP,
2000.
VIANNA, Marcia Coelho de Segadas. Documento preliminar sobre a análise estrutural
da PNAD (conceitos, características das pessoas e dos domicílios). In: REVISÃO da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD: Projeto de Reformulação e
Modernização - PMAR. [Rio de Janeiro]: IBGE, Departamento de Emprego e
Rendimento, [1994]. v.1, t.1: A problematização. p. 74-82.
VILLELA, André. Tendências da produtividade: panorama internacional e reflexos
no Brasil. Rio de Janeiro: BNDES, 1994. 18p. (Textos para discussão, n. 15).
WORKSHOP INTERNACIONAL O SETOR INFORMAL REVISITADO, 1997,
Brasília, DF. O setor informal revisitado: novas evidências e perspectivas de políticas
públicas. Brasília, DF: IPEA, 1997. 1 v.
172
ANEXO I
POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO E RAMOS DE ATIVIDADE
1) POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO42
Empregado - pessoa que trabalhava para um empregador (pessoa física ou
jurídica), geralmente obrigando-se ao cumprimento de uma jornada de trabalho e
recebendo em contrapartida uma remuneração em dinheiro, mercadorias, produtos ou
benefícios (moradia, comida, roupas, etc.).
Também foram considerados como empregados:
. a pessoa que estava prestando o serviço militar obrigatório remunerado; e
. o sacerdote, ministro de igreja, pastor, rabino, frade, freira e outros clérigos.
Trabalhador doméstico - pessoa que trabalhava prestando serviço doméstico
remunerado, em dinheiro ou benefícios, em uma ou mais unidades domiciliares. Estão
incluídas nesta categoria ocupações como a empregada doméstica, faxineira, motorista,
babá, mordomo, etc.;
Conta-própria - pessoa que trabalhava explorando o seu próprio
empreendimento, sozinha ou com sócio, sem ter empregado e contando, ou não, com a
ajuda de trabalhador não remunerado;
Empregador - pessoa que trabalhava explorando o seu próprio empreendimento,
com, pelo menos, um empregado;
42 Os conceitos de posição na ocupação estão contidos in IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004: manual de entrevista. Rio de Janeiro, RJ, 2004, p.185-187.
173
Trabalhador não remunerado membro da unidade domiciliar - pessoa que
trabalhava sem remuneração, durante pelo menos uma hora na semana, em ajuda a
membro da unidade domiciliar que era empregado na produção de bens primários (que
compreende as atividades da agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal ou
mineral, caça, pesca e piscicultura), conta-própria ou empregador;
Outro trabalhador não remunerado - pessoa que trabalhava sem remuneração,
durante pelo menos uma hora na semana:
. em ajuda a instituição religiosa, beneficente ou de cooperativismo; ou
. como aprendiz ou estagiário.
Nota:
Considera-se como aprendiz uma pessoa que esteja aprendendo qualquer oficio
ou profissão, como, por exemplo: aprendiz mecânico, eletricista, escriturário, lavrador,
balconista, pedreiro, etc., inclusive as pessoas que estão cumprindo o serviço militar
obrigatório não remunerado.
Trabalhador na produção para o próprio consumo - pessoa que trabalhava,
durante pelo menos uma hora na semana, na produção de bens, do ramo que
compreende as atividades da agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e
piscicultura, para a própria alimentação de pelo menos um membro da unidade
domiciliar; e
Trabalhador na construção para o próprio uso - pessoa que trabalhava, durante
pelo menos uma hora na semana, na construção de edificações, estradas privativas,
poços e outras benfeitorias (exceto as obras destinadas unicamente à reforma) para o
próprio uso de pelo menos um membro da unidade domiciliar.
As categorias de posição na ocupação das atividades agrícolas estão
discriminadas no questionário de acordo com os ramos de atividade, a seguir
relacionados, visando uma adequada captação das especificidades encontradas nas
relações de trabalho.
174
A categoria de trabalhador na produção para o próprio consumo integra as
atividades agrícolas e a de trabalhador na construção para o próprio uso, as não-
agrícolas.
Além destas definições de posição na ocupação deve-se considerar a
classificação estabelecida, no caso das atividades agrícolas, para o empregado (p. 193):
. Temporário - quando a duração do contrato ou acordo (verbal ou escrito) de
trabalho tinha um término estabelecido, que poderia ser, ou não, renovado. Ou seja, o
empregado que foi contratado:
. por tempo determinado; ou
. para executar um trabalho específico que, ao ser concluído, o contrato ou
acordo de trabalho estaria encerrado.
O trabalhador temporário pode, de acordo com a região, receber uma das
seguintes denominações: bóia-fria, volante, calunga, turmeiro, peão de trecho,
clandestino, etc.
. Permanente - quando a duração do contrato ou acordo (verbal ou escrito) de
trabalho não tinha um término estabelecido.
2) RAMOS DE ATIVIDADES
RELAÇÃO DE ATIVIDADES DO RAMO QUE COMPREENDE A
AGRICULTURA, SILVICULTURA, PECUÁRIA (GRUPOS 1 e 2), EXTRAÇÃO
VEGETAL, PESCA E PISCICULTURA E DOS SERVIÇOS AUXILIARES DESTE
RAMO43
1 – AGRICULTURA
Culturas e adubação, aração e preparação da terra
2 - SILVICULTURA
43 Esta relação encontra-se mais discriminada in IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004: manual de entrevista. Rio de Janeiro, RJ, 2004, p.188-193.
175
3 - PECUÁRIA
3.1 - PECUÁRIA - GRUPO 1
Criação de bovinos, bubalinos, ovinos, suínos e caprinos
3.2 - PECUÁRIA - GRUPO 2
Criação de abelhas, aves e de outros animais como cavalo, burro, jumento
além de animais de menor porte e da produção de casulos,cera de abelha, mel de abelha,
etc.
4 - EXTRAÇÃO VEGETAL
5 - PESCA
6 – AQUICULTURA E PISCICULTURA
7 – CAÇA
8 - SERVIÇOS AUXILIARES DA AGRICULTURA, SILVICULTURA,
PECUÁRIA, EXTRAÇÃO VEGETAL, PESCA E PISCICULTURA
Agenciação ou locação de mão-de-obra para atividade do ramo que compreende
a agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura (inclusive o
gato)
Agronomia (inclusive por conta-própria)
Aluguel ou locação de máquinas e equipamentos para atividade do ramo que
compreende a agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura
Assistência técnica rural
Combate às pragas
Companhia agrícola
Companhia agrícola de fomento econômico
Companhia de desenvolvimento agrícola
Companhia de colonização agrícola
Companhia de mecanização agrícola
176
Drenagem e irrigação para agropecuária
Empresa de assistência técnica e extensão rural
Empresa de pesquisas de atividade do ramo que compreende a agricultura,
silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura
Empresa de serviços e insumos básicos para a agropecuária
Inseminação artificial
Instituto de pesquisa de atividade do ramo que compreende a agricultura,
silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura
Planejamento de desenvolvimento agropecuário
Planejamento de reflorestamento
RELAÇÃO DE RAMOS DE ATIVIDADE (EXCLUSIVE O RAMO QUE
COMPREENDE A AGRICULTURA, SILVICULTURA, PECUÁRIA, EXTRAÇÃO
VEGETAL, PESCA E PISCICULTURA E OS SERVIÇOS AUXILIARES DESTE
RAMO)44
Extração mineral;
Indústria de transformação;
Indústria da construção;
Serviços industriais de utilidade pública;
Comércio de mercadorias;
Instituições de crédito, de seguros e de capitalização;
Comércio e administração de imóveis e valores mobiliários;
Transporte;
Comunicações;
Serviços de alojamento e alimentação;
Serviços pessoais;
Serviços domiciliares;
Serviços de diversões, radiodifusão e televisão;
Serviços técnico-profissionais;
44 Esta relação é a constante no Manual de Entrevista da PNAD de 2003, mas no Manual de Entrevista da PNAD de 2004, encontra-se um maior detalhamento destes ramos e também são incluídos entre outros itens, tais como pesquisa e desenvolvimento, atividades de informáticas e conexas, serviços domésticos. (p. 221-222).
177
Serviços auxiliares das atividades econômicas (exclusive os serviços auxiliares
do ramo agrícola);
Serviços comunitários e sociais;
Serviços médicos, odontológicos e veterinários;
Ensino;
Administração pública;
Defesa nacional e segurança pública;
Organizações internacionais e representações estrangeiras; e
Atividades não compreendidas nos demais ramos, atividades mal definidas ou
não declaradas.
178
ANEXO II
ESTRUTURA DO QUESTIONÁRIO DA PNAD
VARIÁVEIS DO TRABALHO PRINCIPAL DA SEMANA (POPULAÇÃO DE 10
ANOS E MAIS DE IDADE)
1) Ocupação
2) Atividade do empreendimento
A) ATIVIDADES AGRÍCOLAS
1) Posição na ocupação
2) Recebimento de área para produção particular (para empregado permanente na
agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços)
3) Existência de parceria com o empregador (para empregado permanente na
agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços e
empregado permanente em outra atividade)
4) Tipo de contratação efetuada (para o empregado temporário): a) somente pela pessoa
responsável pelo estabelecimento; somente por intermediário (empresa empreiteira,
empreiteiro, “gato”, etc.) e c) por pessoa responsável pelo estabelecimento e por
intermediário (empresa empreiteira, empreiteiro, “gato”, etc.).
5) Existência de ajuda obtida, nesse emprego, de pessoa não-remunerada, moradora no
domicílio e o montante dessas pessoas não-remuneradas (para empregado permanente
na agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços;
empregado permanente em outra atividade; empregado temporário)
6) Área total do empreendimento (para empregador na agricultura, silvicultura
ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos)
7) Existência e o montante de empregados temporários (para empregador na agricultura,
silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos e para
empregador em outra atividade)
179
8) Existência e o montante de empregados permanentes (para empregador na
agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos e
para empregador em outra atividade)
9) Área total do empreendimento (para conta própria na agricultura,silvicultura ou
criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos)
Variáveis pesquisadas tanto para conta própria e empregador na agricultura,
silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suínos e para
conta própria e empregador em outra atividade)
1) Relação de posse com a terra (identificação se parceiro, arrendatário, posseiro,
cessionário, proprietário ou outra condição)
2) Forma de parceria contratada – meia, terça, quarta, quinta, outra forma
3) Forma contratada de pagamento do arrendamento nesse trabalho – somente dinheiro,
somente produto, somente serviço, dinheiro e produto, dinheiro e serviço, produto e
serviço e dinheiro, produto e serviço
4) Existência de compromisso prévio da venda de alguma parte da produção principal
desse trabalho; efetivação dessa venda e tipo de comprador da referida produção
(empresa, cooperativa, governo, proprietário do bem utilizado para o empreendimento,
intermediário particular, consumidor direto e outro comprador)
5) Existência de algum tipo de produção consumida como alimentação por pessoas
moradoras no domicílio e montante desta parcela utilizada no consumo retirada da
produção.
B) ATIVIDADES NÃO-AGRÍCOLAS
1) Posição na ocupação
2) Período de trabalho do empregado (jornada de trabalho compreendida em período
diurno, noturno ou ambos)
3) Identificação se o emprego pertence ao setor privado ou ao público
4) Emprego público na esfera federal, estadual ou municipal
5) Identificação se no emprego a pessoa era militar ou funcionário público estatutário
180
6) Identificação se o trabalhador doméstico remunerado presta serviço em um ou mais
de um domicílio
7) Identificação do número de dias trabalhados por semana pelo trabalhador doméstico
remunerado (se este habitualmente trabalha pelo menos uma vez por semana)
8) Identificação do número de dias trabalhados por mês pelo trabalhador doméstico
remunerado (se este respondeu que habitualmente não trabalha pelo menos uma vez por
semana)
9) Tamanho do empreendimento (número de pessoas ocupadas) para quem se declara
ocupado em emprego no setor privado (duas; três a cinco; seis a dez e onze ou mais
pessoas ocupadas)
Variáveis pesquisadas para os empregados permanentes e temporários das
atividades não agrícolas e trabalhadores domésticos remunerados, empregados
do setor privado e do setor público (à exceção, nesta última esfera, dos militares
e dos funcionários públicos estatutários) das atividades não-agrícolas
1) Forma de contratação da remuneração no emprego do setor privado ou público (à
exceção, nesta última esfera, dos militares e dos funcionários públicos estatutários) -
somente por jornada de trabalho; somente por produção ou comissão; somente por
tarefa ou empreitada; por jornada de trabalho e produção ou comissão ou outra forma
2) Posse de carteira de trabalho assinada para empregado permanente e temporário das
atividades agrícolas e o trabalhador doméstico remunerado empregado no setor privado
e empregado no setor público (à exceção, nesta última esfera, dos militares e dos
funcionários públicos estatutários) das atividades não-agrícolas
3) Existência de recebimento de auxílio para moradia, auxílio para alimentação, auxílio
para transporte, auxílio para educação ou creche, auxílio para saúde ou reabilitação
(para o trabalhador doméstico remunerado, empregado no setor privado e no setor
público)
4) Número de empregados (um; dois; três a cinco; seis a dez e onze ou mais) para os
empregadores
5) Existência de sócios ocupados para os empregadores (que responderam terem até dez
empregados) e para os trabalhadores por conta própria e montante de sócios ocupados
(um; dois; três a cinco e seis e mais)
181
6) Existência de trabalhadores não-remunerados (para os empregadores e os
trabalhadores por conta própria) e montante de trabalhadores não-remunerados (um;
dois; três a cinco; seis a dez e onze ou mais)
VARIÁVEIS PESQUISADAS PARA AS CATEGORIAS DE POSIÇÃO NA
OCUPAÇÃO DAS ATIVIDADES AGRÍCOLAS E NÃO-AGRÍCOLAS
1) Rendimento mensal normalmente recebido (para os empregados, os trabalhadores
domésticos remunerados, os empregadores e os trabalhadores por conta própria)
Para os empregados, os trabalhadores domésticos remunerados, os empregadores
e os trabalhadores por conta própria e trabalhadores não remunerados (membro
da unidade domiciliar e outro trabalhador não remunerado)
1) Local do empreendimento em: a) loja, oficina, fábrica, escritório, escola, repartição
pública, galpão, etc. e b) fazenda, sítio, granja, chácara, etc. e se a pessoa morava em
domicílio que estava no mesmo terreno ou área do estabelecimento em que tinha esse
trabalho para quem respondeu estes dois itens ou c) no domicílio em que morava; d) em
domicílio de empregador, patrão, sócio ou freguês; e) em local designado pelo
empregador, cliente ou freguês; f) em veículo automotor; g) em via ou área pública ou
h) outro local
2) Tempo de deslocamento casa-trabalho se a pessoa ia direto de casa para o local de
trabalho
Para os empregados, os trabalhadores domésticos remunerados, os empregadores
e os trabalhadores por conta própria e trabalhadores não remunerados (membro
da unidade domiciliar e outro trabalhador não remunerado) e trabalhadores na
construção para o próprio uso
1) Horas normalmente trabalhadas por semana
2) Existência de contribuição de instituto de previdência por esse trabalho e se esta é
realizada na esfera federal, estadual ou municipal
3) Tempo de permanência no trabalho principal da semana
182
4) Identificação do número de trabalhos tidos no período de 358 dias (excetuando a
semana de referência) caso a pessoa seja ocupada no trabalho da semana há menos de 1
ano de permanência
5) Seleção de um dos trabalhos tidos no ano (com tempo de permanência menor do que
o do trabalho principal na semana), a partir de critérios anteriormente mencionados, e
indagações sobre se nesse trabalho era: a) empregado com carteira de trabalho assinada
e b) se recebeu por esse emprego anterior o seguro-desemprego.
VARIÁVEIS DO TRABALHO PRINCIPAL DO ANO (POPULAÇÃO DE 10 ANOS
E MAIS DE IDADE)
(para a pessoa sem trabalho na semana de referência, mas que teve trabalho no
período dos 358 dias e para a pessoa cujo trabalho que tinha na semana de
referência não era o principal do período do ano (365 dias)
1) Ocupação
2) Atividade do empreendimento
A) ATIVIDADES AGRÍCOLAS
1) Posição na ocupação
2) Recebimento de área para produção particular (para empregado permanente na
agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços)
3) Existência de parceria com o empregador (para empregado permanente na
agricultura, silvicultura ou criação de bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos ou suíços e
empregado permanente em outra atividade)
4) Relação de posse com a terra (identificação se parceiro, arrendatário, posseiro,
cessionário, proprietário ou outra condição)
B) ATIVIDADES NÃO-AGRÍCOLAS
1) Posição na ocupação
2) Identificação se o emprego pertence ao setor privado ou ao público
3) Emprego público na esfera federal, estadual ou municipal
183
4) Identificação se no emprego a pessoa era militar ou funcionário público estatutário
5) Identificação se o trabalhador doméstico remunerado presta serviço em um ou mais
de um domicílio
Variáveis pesquisadas para as atividades agrícolas e não-agrícolas
1) Posse de carteira de trabalho assinada para empregado permanente e temporário das
atividades agrícolas e o trabalhador doméstico remunerado empregado no setor privado
e empregado no setor público (à exceção, nesta última esfera, dos militares e dos
funcionários públicos estatutários) das atividades não-agrícolas
2) Recebimento de seguro-desemprego (para quem não tinha carteira de trabalho
assinada)
3)Existência de contribuição de instituto de previdência por esse trabalho
4) Tempo de permanência no trabalho principal do ano
VARIÁVEIS PARA A PESSOA OCUPADA NO PERÍODO DE REFERÊNCIA DE
365 DIAS
1) Associação a algum sindicato e designação do tipo de sindicato (empregados
urbanos, trabalhadores rurais, trabalhadores autônomos, trabalhadores avulsos,
profissionais liberais, outro sindicato)
2) Idade em que começou a trabalhar (até 9 anos de idade, 10 a 14 anos, 15 a 17 anos,
18 a 19 anos, 20 a 24 anos, 25 a 29 anos e 30 anos ou mais)
VARIÁVEIS PARA A PESSOA OCUPADA COM DOIS OU MAIS TRABALHOS
NA SEMANA DE REFERÊNCIA
TRABALHO SECUNDÁRIO
1) Ocupação
2) Atividade do empreendimento
3) Posição na ocupação (empregado, trabalhador doméstico, conta própria, empregador,
trabalhador não-remunerado membro da unidade domiciliar, outro trabalhador não-
remunerado)
184
4) Identificação se o emprego pertence ao setor privado ou ao público
5) Emprego público na esfera federal, estadual ou municipal
6) Identificação se no emprego a pessoa era militar ou funcionário público estatutário
7) Posse de carteira de trabalho assinada para empregado permanente e temporário das
atividades agrícolas e o trabalhador doméstico remunerado empregado no setor privado
e empregado no setor público (à exceção, nesta última esfera, dos militares e dos
funcionários públicos estatutários) das atividades não-agrícolas
8) Rendimento mensal normalmente recebido (para os empregados, os trabalhadores
domésticos remunerados, os empregadores e os trabalhadores por conta própria)
9) Existência de contribuição de instituto de previdência por esse trabalho e se esta é
realizada na esfera federal, estadual ou municipal
10) Horas normalmente trabalhadas por semana
VARIÁVEIS PARA OS OUTRO(S) TRABALHO(S) DA SEMANA
EXCLUINDO-SE OS TRABALHOS PRINCIPAL E SECUNDÁRIO
1) Rendimento mensal normalmente recebido no(s) outros trabalho(s) (para os
empregados, os trabalhadores domésticos remunerados, os empregadores e os
trabalhadores por conta própria)
2) Existência de contribuição de instituto de previdência por esse trabalho e se esta é
realizada na esfera federal, estadual ou municipal
3) Horas normalmente trabalhadas por semana
VARIÁVEIS PARA A PESSOA SEM TRABALHO NO PERÍODO DE
REFERÊNCIA DE 365 DIAS
1) Identificação se a pessoa teve algum trabalho no período anterior ao ano (seja este
remunerado ou não, na produção para o próprio consumo ou na construção para o
próprio uso)
185
VARIÁVEIS PARA A PESSOA QUE SOMENTE OCUPADA ANTES DO PERÍODO
DE REFERÊNCIA DE 365 DIAS
1) Tempo de permanência nesse trabalho
2) Ocupação
3) Atividade do empreendimento
4) Posição na ocupação (empregado, trabalhador doméstico, conta própria, empregador,
trabalhador não-remunerado membro da unidade domiciliar, outro trabalhador não-
remunerado, trabalhador na produção para o próprio consumo e na construção para o
próprio uso)
5) Identificação no emprego se a pessoa era militar ou funcionário público estatutário
6) Posse de carteira de trabalho assinada para empregado permanente e temporário das
atividades agrícolas e o trabalhador doméstico remunerado empregado no setor privado
e empregado no setor público (à exceção, nesta última esfera, dos militares e dos
funcionários públicos estatutários) das atividades não-agrícolas
VARIÁVEIS PARA A PESSOA DE 10 ANOS OU MAIS (OCUPADOS E
NÃO OCUPADOS)
1) Identificação se a pessoa tomou alguma providência para conseguir trabalho na
semana de referência
2) Identificação se a pessoa tomou alguma providência para conseguir trabalho nos 23
dias anteriores à semana de referência (para quem não tomou alguma providência no
período mencionado no item 1)
3) Identificação se a pessoa tomou alguma providência para conseguir trabalho no mês
anterior ao investigado nos itens 1 e 2 (para quem não tomou alguma providência nos
períodos mencionados nos itens 1 e 2)
4) Identificação se a pessoa tomou alguma providência para conseguir trabalho nos dez
meses anteriores aos dois meses investigados nos itens 1, 2 e 3, compondo assim um
ano de referência (para quem não tomou alguma providência nos períodos mencionados
nos itens 1, 2 e 3)
186
5) Última providência tomada até o último dia da semana de referência para conseguir
trabalho
6) Existência de contribuição para alguma entidade de previdência privada
7) Identificação se a pessoa cuidava dos afazeres domésticos
8) Identificação se a pessoa era aposentado de instituto de previdência federal (INSS),
estadual, municipal ou do governo federal ou
9) Identificação se a pessoa era pensionista de instituto de previdência federal (INSS),
estadual, municipal ou do governo federal ou
10) Identificação se a pessoa recebia normalmente rendimento de pensão alimentícia ou
de fundo de pensão, abono de permanência, aluguel, doação, juros de caderneta de
poupança, dividendos ou outro qualquer e valor recebido destes rendimentos
VARIÁVEIS DO TRABALHO PRINCIPAL DA SEMANA (POPULAÇÃO DE 5 A 9
ANOS DE IDADE)
A) VARIÁVEIS PARA QUEM TRABALHOU NA SEMANA DE
REFERÊNCIA
1) Ocupação
2) Atividade do empreendimento
3) Posição na ocupação (empregado, trabalhador doméstico, conta própria, empregador,
trabalhador não-remunerado membro da unidade domiciliar, outro trabalhador não-
remunerado, trabalhador na produção para o próprio consumo e na construção para o
próprio uso)
4) Rendimento mensal normalmente recebido no(s) trabalho(s) (para os empregados, os
trabalhadores domésticos remunerados, os empregadores e os trabalhadores por conta
própria)
5) Horas normalmente trabalhadas por semana no(s) trabalho(s) (para todas as
categorias de posições na ocupação)
187
B) VARIÁVEIS PARA QUEM TRABALHOU NOS 358 DIAS DE
REFERÊNCIA (E NÃO TRABALHOU NA SEMANA DE
REFERÊNCIA)
1) Ocupação
2) Atividade do empreendimento
3) Posição na ocupação (empregado, trabalhador doméstico, conta própria, empregador,
trabalhador não-remunerado membro da unidade domiciliar, outro trabalhador não-
remunerado, trabalhador na produção para o próprio consumo e na construção para o
próprio uso)
188
ANEXO III
JUSTIFICATIVAS DAS VARIÁVEIS DA PNAD45
Na realização dos dois Pré-Testes, foram explicitados os objetivos dos quesitos
que, de certa forma, compõem o que denominamos como as justificativas ou motivos
das variáveis que hoje fazem parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD).
A estruturação do questionário nos pré-testes bem como atualmente na atual
PNAD teve como propósito procurar contemplar a diversidade das relações de trabalho
no Brasil, entre as quais aquelas que se constituem em nosso objeto de análise. É
importante frisar que estas devem ser analisadas buscando as inter-relações existentes
no mercado de trabalho daquele denominado formalizado bem como do denominado
não formalizado.
Nos dois Pré-Testes, foi realizada a divisão do questionário segundo a semana e
o ano e, dentro destes períodos de referência, as seqüências específicas de perguntas
destinadas às pessoas ocupadas em atividades agrícolas e não agrícolas, o que, conforme
avaliação dos pesquisadores do grupo de revisão da PNAD “contribuiu para avançar,
em conteúdo e forma, na busca de um melhor entendimento sobre as questões relativas
ao trabalho” (REVISÃO..., [1994], v.1, t.3, p. 37)
Em segundo lugar, as perguntas foram organizadas para cada categoria de
posição na ocupação compreendendo que estas categorias configuram-se, dentro de um
quadro de evidência empírica, em uma aproximação das diversas formas de inserção
dos agentes sociais no processo produtivo. Nesse sentido, foi observado que “a
estruturação do questionário segundo as diversas posições na ocupação em atividades
agrícolas e não-agrícolas é mais uma subdivisão do mesmo, o que, junto com os
períodos de referência e o tipo de atividade, permite verificar entre outros aspectos: a)
as especificidades das relações de trabalho; b) mudanças na inserção do trabalhador no
processo produtivo; c) estratégias de sobrevivência, quando se verifica que um
empregado pode recorrer, muitas vezes, a uma outra atividade como conta própria ou,
até mesmo dentro da mesma posição na ocupação, a outro trabalho” (REVISÃO...,
[1994], v.1, t.3, p. 37-38).
45 REVISÃO..., [1994], v.1, t.3; REVISÃO..., [1994], v.1, t.5.
189
Relaciona-se, a seguir, uma descrição de objetivos de alguns quesitos do
questionário (REVISÃO..., [1994], v.1, t.3; REVISÃO..., [1994], v.1, t.5), que foram
considerados importantes para a nossa questão. Na preparação dos testes bem como
neste momento é importante ressaltar que, embora estes estejam discriminados
separadamente, fazem parte de um todo constituído por vários elementos e, a partir
desta perspectiva, devem ser analisados.
OCUPAÇÃO DA PESSOA E IDENTIFICAÇÃO DO EMPREENDIMENTO
EM QUE TRABALHA E DA PRINCIPAL ATIVIDADE DO EMPREENDIMENTO –
(2O Pré-Teste, pág.49)
Estes quesitos procuram caracterizar a inserção do trabalhador no processo
produtivo, através das informações básicas de ocupação e atividade. Além disso,
propiciam a identificação da atividade em que o trabalhador está inserido (agrícola e
não-agrícola) contempladas, em suas especificidades, no questionário da pesquisa.
PNAD ATUAL: mantida a investigação na PNAD.
POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO (2O Pré-Teste, pág. 60)
Objetiva complementar as informações anteriores, constituindo-se no quesito-
chave para dar cont da heterogeneidade de formas de organização do trabalho, tanto nas
atividades agropecuárias como nas demais.
PNAD ATUAL: mantida a investigação na PNAD.
LOCAL DE TRABALHO
Distinguir, na população ocupada, os que trabalham no domicílio em que
residem daqueles que trabalham fora; além disso discriminar, de forma mais detalhada,
estas duas situações. Ao buscar estas informações para todas as categorias de posição na
ocupação, procura-se obter dados que, relacionados com outros que serão levantados,
permitam caracterizar a relação de formalidade/informalidade da força-de-trabalho. (1 o
Pré-teste, pág. 39)
Na documentação do 2 o Pré-teste da Revisão da PNAD, os objetivos descritos
sobre o local de trabalho visam “distinguir, na população ocupada, os que trabalham no
domicílio em que residem daqueles que trabalham fora; além disso discriminar, de
forma mais detalhada, estas duas situações. Ao buscar estas informações para todas as
190
categorias de posição na ocupação, procura-se obter dados que, relacionados com outros
que serão levantados, permitam entre outros aspectos: a) perceber, inicialmente, a
relação de formalidade/informalidade da relação de trabalho não-agrícola, b) detectar a
superposição, dentro de um mesmo espaço físico, do local de moradia e do local de
produção e comercialização de bens e serviços, importantes sobretudo no setor
informal; c) especificar a diversidade das relações de trabalho tanto formais como
informais nas atividades não-agrícolas; d) isolar o local de trabalho para quem exerça
atividade agrícola”.(pág. 49)
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido tanto para os que exercem as
atividades agrícolas como as não-agrícolas.
EMPREGADOS
DISTINÇÃO ENTRE EMPREGADO DO SETOR PÚBLICO E DO PRIVADO
– ATIVIDADES NÃO-AGRÍCOLAS (1o Pré-teste, página 39) e (2 o Pré-teste, pág. 51)
Distinguir os empregados do setor privado daqueles do setor público e, dentre
estes, os que prestam serviço a Governo Federal, Estadual ou Municipal (Servidor
Público) daqueles que prestam serviço a Empresa Pública Federal, Estadual ou
Municipal (Empregados do Setor Público de Empresa Estatal). Toma-se como base esta
distinção para captar, em parte, a heterogeneidade interna que a categoria empregado
apresenta. Assim procura-se distinguir a força-de-trabalho alocada na produção e
circulação de mercadorias daquela alocada na produção de bens e serviços no âmbito do
aparelho estatal.
PNAD ATUAL: é possível a distinção dos empregados ligados ao setor público
e ao privado, mas não a dos empregados vinculados ao setor público de empresa estatal.
TAMANHO DO EMPREENDIMENTO (1 o Pré-teste, pág. 40 e 2o Pré-teste,
pág. 51)
Quanto aos empregados, a informação refere-se ao número de pessoas ocupadas
no empreendimento para que se tenha uma noção do seu tamanho. Tal informação
justifica-se na medida em que busca melhor caracterizar a heterogeneidade existente nas
relações de trabalho em função do tamanho das unidades de produção. Estes quesitos
deverão ser aplicados apenas para os empregados do setor privado. Isto porque os
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órgãos públicos podem ser mais facilmente caracterizados em sua organização, pois
possuem registros oficiais. Já para o setor privado torna-se necessária uma melhor
caracterização (2o Pré-Teste).
No 1 o Pré-teste, este quesito era denominado de tamanho de estabelecimento.
No entanto, foi verificado que um empreendimento pode ter vários estabelecimentos e
que o conceito de empreendimento estaria mais adequado na obtenção desta produção
de evidência empírica.
Levantar o número de pessoas ocupadas no estabelecimento ao qual o
empregado está vinculado. Esta informação também busca melhor caracterizar a
heterogeneidade da categoria empregado, pois podem ser encontradas diferenças na
relação de trabalho estabelecida – a de assalariamento – em função do tamanho das
unidades de produção (1o Pré-Teste).
PNAD ATUAL: O quesito tamanho do empreendimento é respondido tanto para
os que exercem as atividades agrícolas como as não-agrícolas.
.POSSE DE CARTEIRA DE TRABALHO ASSINADA E MOTIVOS DE SUA
AUSÊNCIA (1o Pré-teste, pág. 40) (2o Pré-teste, pág. 51)
Verificar a posse de carteira de trabalho assinada e, dentre os que não a
possuem, discriminar os motivos. Estas informações não só permitem levantar o acesso
a esse direito básico do empregado mas também melhor discriminar esta categoria
segundo os motivos pelos quais não possuem carteira assinada. Isto torna-se importante
na medida em que a ausência da carteira de trabalho assinada pode estar associada ao
fato de ser estatutário ou militar, o que não implica na perda de determinados direitos.
Caso contrário, esta ausência pode significar a falta de garantia de direitos do
empregado.
PNAD ATUAL: O quesito posse de carteira de trabalho assinada é respondido
tanto para os que exercem as atividades agrícolas como as não-agrícolas.
ACESSO A AUXÍLIOS OU BENEFÍCIOS (1o Pré-teste, pág. 41) (2o Pré-teste,
pág. 52) (para os empregados)
Estes visam levantar, dentre os empregados em geral, aqueles que recebem
algum tipo de auxílio ou benefício do empregador. Esta informação permite detectar
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possíveis melhorias nas condições de vida dos empregados, na medida que representam
uma complementação de sua remuneração (2o Pré-teste, pág. 52).
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido não só pelos empregados como
também para os trabalhadores domésticos das atividades agrícolas e das não-agrícolas.
RENDIMENTO – TIPO E FORMA DE PAGAMENTO (1o Pré-teste, pág. 41)
(para os empregados)
Identificar o tipo de rendimento (em dinheiro, em dinheiro e benefícios ou
somente em benefícios) e a forma de pagamento (por unidade de tempo de trabalho,
comissão ou produção) para todos os empregados. Estas informações, associadas a
outras, tornam-se importantes na caracterização e avaliação da relação de trabalho que
se estabelece entre o empregado e aquele que o contrata.
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido tanto para os que exercem as
atividades agrícolas como as não-agrícolas sendo aplicado a todas as categorias de
posição na ocupação que são remuneradas.
BASE DE CÁLCULO DO RENDIMENTO (2o Pré-teste, pág. 51) (para os
empregados)
Estes quesitos objetivam identificar qual a base utilizada para calcular o
rendimento se somente por tarefa, somente por comissão ou produção, somente por
tempo de trabalho e se por tempo de trabalho e comissão/produção. Este dado permite,
junto a outras informações, avaliar a relação de trabalho que se estabelece entre os
trabalhadores e aqueles que os contratam.
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido tanto para os que exercem as
atividades não-agrícolas discriminando-se se a remuneração era contratada somente por
jornada de trabalho, somente por produção ou comissão, somente por tarefa ou
empreitada, por jornada de trabalho e produção ou comissão ou outra forma.
EMPREGADORES
TAMANHO DO NEGÓCIO E COMPOSIÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO
NELE ALOCADA (1o Pré-teste, pág. 42)
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Levantar o número de pessoas normalmente ocupadas no negócio do
Empregador segundo diferentes características da relação de trabalho estabelecida –
Empregados Permanentes e Temporários e Trabalhadores Não Remunerados. Ao se
captar a composição da força-de-trabalho alocada no próprio negócio do Empregador e,
ao se conjugar esta informação aos dois períodos de referência (a semana e os doze
meses), será possível melhor caracterizar esta categoria e o tênue limite que a separa,
principalmente do Conta Própria. Pois, “alguns empregadores podem permanecer ‘uma
parte do ano como autônomos, recorrendo a empregados ou a ajudantes apenas nos
períodos de maior pique de atividade (produção ou venda)’” (Cf. Módulo I, 1989:28).
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido tanto para os que exercem as
atividades agrícolas como para os que exercem as atividades não-agrícolas.
NÚMERO DE EMPREGADOS (2o Pré-teste, pág. 52)
Estes quesitos visam investigar o número de empregados com o objetivo de
detectar a dimensão do contingente de assalariados que o empregador contrata para o
seu trabalho, qualificando assim o tipo de empregador.
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido pelos empregadores nas atividades
agrícolas (com a discriminação, neste caso, do montante de empregados permanentes e
o dos empregados temporários) como para os das atividades não-agrícolas.
TRABALHADORES POR CONTA PRÓPRIA
TAMANHO DO NEGÓCIO (1o Pré-teste, pág. 41)
Levantar o número de pessoas normalmente ocupadas (sem remuneração) no
negócio do conta própria. Esta informação permite detectar o tamanho do negócio e,
associada a outras, melhor caracterizar esse contingente. Além disso, na medida que a
categoria conta própria “... constitui-se em um dos elementos importantes do chamado
‘mercado informal de trabalho’” (Cf. Módulo I:26), conseqüentemente se estará
caracterizando a própria economia informal.
PNAD ATUAL: é mantida esta investigação na PNAD.
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CONTRATAÇÃO EVENTUAL DE TRABALHADORES REMUNERADOS
(1o Pré-teste, págs.41 e 42)
Detectar, dentre os conta própria, aqueles que eventualmente contratam
trabalhadores remunerados. Esta informação auxilia a distinção, muitas vezes de difícil
percepção, entre esta categoria de posição na ocupação e a dos Empregadores. A
inclusão deste quesito, para o conta própria, torna possível não descaracterizá-lo
enquanto um contingente específico da população ocupada, mesmo que tenha ocorrido
contratação eventual de algum trabalhador remunerado.
PNAD ATUAL: é mantida a investigação na PNAD.
TRABALHADORES POR CONTA PRÓPRIA E EMPREGADORES
EXISTÊNCIA E TIPO DE VÍNCULO COM EMPRESA E/OU PESSOA
FÍSICA (1o Pré-teste, págs. 42 e 43)
Captar a existência de algum vínculo, por parte do conta própria e do
empregador, com empresa e/ou pessoa física e identificar o tipo quando se verificar sua
presença. Estas informações permitem melhor caracterizar o limite entre Conta Própria
e pequenos Empregadores pois, a partir da identificação de vínculos pode-se chegar a
diferenças e/ou semelhanças nas suas relações de trabalho. Além disso, em alguns
casos, fornece indícios acerca do destino que é dado à produção do conta própria ou do
empregador. Desta forma, pode-se captar, em vez de uma relação caracterizada pela
autonomia do negócio (própria destas categorias de posição na ocupação), uma relação
de subordinação a determinadas pessoas ou empresas sem que isso venha acarretar
numa descaracterização destas categorias.
PNAD ATUAL: Este quesito é respondido, de certa forma, no caso das
atividades agrícolas, pelos empregadores e trabalhadores por conta própria aos quais é
indagado se havia um compromisso prévio de venda de alguma parte da produção
principal e o comprador total ou da maior quantidade desta referida produção.
RENDIMENTO: TIPO E PERIODICIDADE (1o Pré-teste, pág. 43)
Identificar o tipo de rendimento e a periodicidade com que o conta própria e o
empregador fazem retiradas de seu negócio. Dadas as especificidades das categorias de
posição na ocupação e a complexidade desta variável, estas informações tornam-se
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importantes no sentido de levantar elementos que subsidiem a formulação de quesitos
para a captação futura de informações sobre os rendimentos entre estes trabalhadores.
PNAD ATUAL: O quesito atual de rendimento não investiga a periodicidade de
rendimento de nenhuma das categorias de posição na ocupação.
NÚMERO DE SÓCIOS E DE NÃO REMUNERADOS (2o Pré-teste, pág. 52)
Estes quesitos visam levantar o número de pessoas não remuneradas ocupadas
como também de sócios. Esta informação permite qualificar, através da composição
interna do pessoal ocupado, se: a) a base do trabalho utilizada é familiar, o que
caracterizaria o trabalhador por conta própria; ou b) se a base do trabalho utilizada é
assalariada, o que identificaria o empregador (neste caso, deve-se associar a informação
sobre o número de pessoas não remuneradas e sócios àquela sobre o número de
empregados)
PNAD ATUAL: Este quesito permanece atualmente na PNAD tanto para os
trabalhadores por conta-própria como também para os empregadores.
TRABALHADORES DOMÉSTICOS ((1o Pré-teste, pág. 44 e 2o Pré-teste,
pág.52).
Tendo em vista a especificidade da inserção destes trabalhadores no processo
produtivo, a Revisão da PNAD procurou seguir, a exemplo das proposições para o
Censo Demográfico de 1990, a inclusão desta categoria de posição na ocupação dentre
aquelas vinculadas às atividades não agrícolas. Foi subdividida ainda, tal como no
Censo Demográfico de 1990, em duas outras categorias: trabalhador doméstico
empregado e trabalhador doméstico conta própria.
TRABALHADORES DOMÉSTICOS EMPREGADOS
COINCIDÊNCIA OU NÃO DO LOCAL DE RESIDÊNCIA COM O LOCAL
DE TRABALHO (1o Pré-teste, pág. 45)
Identificar se a moradia do trabalhador doméstico é no seu local de trabalho
pois, quando se estabelece esta situação, a relação de trabalho é certamente diferente.
Implica que haja maior possibilidade do empregado doméstico ser requisitado por seu
patrão sem obedecer a uma jornada de trabalho definida. Além deste fato, pode resultar
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também em descontos diferenciados para este trabalhador como, por exemplo, o de
moradia.
PNAD ATUAL: É possível a identificação se o trabalhador doméstico reside no
domicílio através da relação de moradores do domicílio.
AUXÍLIOS TRANSPORTE E ALIMENTAÇÃO (2o Pré-teste, pág. 53)
trabalhador doméstico conta própria
AUXÍLIO TRANSPORTE (1o Pré-teste, pág.45) trabalhador doméstico
empregado
Procura-se verificar a existência de ajuda para o transporte e para alimentação,
além do que lhe é pago pelo trabalho realizado. O objetivo destes quesitos é o de
perceber, inicialmente, a freqüência de uma prática comum hoje em dia. A existência
destes auxílios retrata uma relação de trabalho onde se quer valorizar o poder de compra
do salário do trabalhador. Isto porque estes gastos significam um percentual
significativo do salário do trabalhador. Em relação ao transporte, por exemplo, há
variações significativas entre os trabalhadores em função do acesso e/ou distância entre
os locais de residência e de trabalho.
DESCONTO DE MORADIA E/OU ALIMENTAÇÃO (1o Pré-teste, pág. 46)
Identificar, dentre os domésticos empregados que residem na casa do patrão, os
que são descontados em moradia. E, para todos os empregados domésticos, aqueles que
são descontados em alimentação. Estas indagações têm por objetivo avaliar o tipo de
relação de trabalho existente pois significa, conforme já visto, uma relação diferente
daquela onde não existe estes descontos.
PNAD ATUAL: o recebimento de auxílios de transporte e alimentação bem
como outros é detectado tanto para os empregados como para os trabalhadores
domésticos.
JORNADA DE TRABALHO SEMANAL (1o Pré-teste, pág. 46 e 2o Pré-teste,
pág. 53)
Procurando identificar o período normalmente trabalhado na semana, expresso
em dias tem-se em vista avaliar a carga de trabalho, que pode ser ainda melhor avaliada
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associando-se esta informação ao número de horas trabalhadas (2o Pré-teste).
Acrescente-se ainda que, no 1o Pré-teste, este quesito tem como objetivo também avaliar
a freqüência e a regularidade do trabalho.
PNAD ATUAL: é mantida a informação referente aos dias trabalhados para os
trabalhadores domésticos empregados ou por conta própria.
RENDIMENTO: TIPO (1o Pré-teste, pág. 46)
Identificar o tipo de rendimento tendo em vista que o trabalhador doméstico
empregado pode receber somente em dinheiro, em dinheiro e benefícios e somente em
benefícios. Esta diferenciação do tipo de rendimento torna-se importante para avaliar a
relação de trabalho que se estabelece entre o patrão e o doméstico empregado.
PNAD ATUAL: é possível a identificação deste item na PNAD atual.
TRABALHADORES DOMÉSTICOS POR CONTA PRÓPRIA
JORNADA DE TRABALHO SEMANAL (1o Pré-teste, pág. 46 e 2o Pré-teste,
pág. 53)
Vide discriminação anterior para os trabalhadores domésticos empregados
PNAD ATUAL: é mantida a informação referente aos dias trabalhados para os
trabalhadores domésticos empregados ou por conta própria.
POSSE DE CARTEIRA DE TRABALHO ASSINADA (2o Pré-teste, pág. 52)
Estes quesitos objetivam identificar em relação a esta categoria de posição na
ocupação a posse de carteira de trabalho assinada. Tem-se como objetivo verificar o
cumprimento de um direito básico do trabalhador.
PNAD ATUAL: é mantida esta investigação na PNAD.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO A MAIS DE UM PATRÃO (2o Pré-teste, pág. 53)
Procura-se diferenciar, entre os trabalhadores domésticos, os que prestam
serviços a um só patrão daqueles que o fazem a mais de um patrão. Este quesito visa
captar possíveis diversidades estabelecidas nas relações de trabalho em função desta
variável.
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PNAD ATUAL: é possível a identificação do trabalhador doméstico que presta
serviço a mais de um patrão.
ALGUNS OUTROS QUESITOS GERAIS PARA TODAS AS POSIÇÕES NA
OCUPAÇÃO (2O PRÉ-TESTE)
IDADE EM QUE COMEÇOU A TRABALHAR (2o Pré-teste, pág.49)
Este quesito visa estabelecer uma noção do ingresso do trabalhador na atividade
sócio-econômica que, se realizado precocemente, identifica, em geral trabalhadores
pertencentes a classes sócio-econômicas mais baixas. É um fenômeno comum de
determinados trabalhadores em sua estratégia de sobrevivência familiar.
PNAD ATUAL: é mantida esta investigação na PNAD.
EXISTÊNCIA DE MAIS DE UM TRABALHO NA SEMANA (2o Pré-teste,
pág. 49)
Este quesito visa identificar a existência de mais de um trabalho na semana,
importante, muitas vezes, na estratégia de sobrevivência dos trabalhadores, como forma
de complementação de rendimento.
PNAD ATUAL: mantém a investigação do trabalho secundário, a seguir
relacionada, bem como de algumas características no caso da pessoa estar ocupada em
mais de dois trabalhos na semana.
OUTRO TRABALHO (2O Pré-Teste, pág. 59)
O objetivo desses quesitos é a captação de informações sobre o trabalho
secundário exercido pelas pessoas, além daqueles trabalhos declarados para a semana e
os últimos doze meses. Considera-se relevante distinguir as ocupações principais e
secundárias dos indivíduos para melhor avaliar a condição de atividade ou inatividade
dos mesmos; e, além disso melhor compreender as condições de reprodução da força de
trabalho inserida em múltiplas atividades. Nesse sentido, investiga-se para as pessoas
que tinham mais de um trabalho, a ocupação que desempenhavam, o empreendimento
(estabelecimento, empresa, instituição ou negócio) onde estavam inseridas no trabalho
secundário, assim como a atividade principal do mesmo. Além disso, indaga-se a
posição na ocupação exercida, a existência ou não da carteira de trabalho assinada nesse
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trabalho secundário, distinguindo-se os segmentos de trabalhadores inseridos nas
atividades agrícolas e não-agrícolas.
CONTRIBUIÇÃO À PREVIDÊNCIA (2O Pré-Teste, pág.58 e 59)
Estes quesitos procuram investigar a contribuição das pessoas a instituições de
previdência, tendo em vista que estas informações servem para distinguir os segmentos
de trabalhadores que têm ou não garantias no que se refere à aposentadoria por velhice
ou invalidez. Nesta perspectiva indaga-se se a pessoa contribui para o IAPAS ou para o
Plano de Seguridade Social, ou para Instituto de Previdência Social, ou para Instituto de
Previdência Social Estadual ou Municipal; além disso, investiga-se a contribuição das
pessoas para previdência particular ou militar das forças armadas.
A investigação das contribuições à previdência no trabalho diz respeito tanto ao
trabalho principal da semana quanto ao declarado para o ano.
PNAD ATUAL: é mantida esta investigação na PNAD.
PROCURA DE TRABALHO (2O Pré-Teste, pág. 59)
Um conjunto de quesitos foi relacionado visando “investigar a procura de
trabalho para todas as pessoas que não estejam trabalhando como também para as que
estão trabalhando. O objetivo é o de perceber de forma mais ampla, a investigação da
procura de trabalho, não restringindo somente para os desocupados. Isto porque a
pessoa ocupada pode avaliar sua atividade menos como uma atividade propriamente
dita e mais como uma ocupação eventual. Desta forma obtêm-se uma aproximação do
desemprego disfarçado”.
PNAD ATUAL: é mantida esta investigação na PNAD através de um conjunto
de quesitos.
CONDIÇÃO DE ATIVIDADE EM ALGUM PERÍODO DE TEMPO (2O Pré-
Teste, pág. 60)
Visa identificar se os inativos já foram ocupados em algum período de tempo e a
partir desta identificação, nos quesitos subseqüentes, a situação anterior do último
trabalho.
200
PNAD ATUAL: para quem não trabalhou na semana e no ano, indaga-se se a
pessoa já foi ocupada nos quatro anos que antecedem ao período dos 365 dias de
referência.
FILIAÇÃO A SINDICATOS (2O Pré-Teste, pág. 61)
Estes quesitos têm como objetivo captar a filiação dos diferentes segmentos de
mão-de-obra a sindicatos de tipos diversos. A obtenção de informações sobre o número
de associados das entidades sindicais, discriminando o tipo de sindicato a que os
informantes estão filiados, é de grande relevância para a complementação de
conhecimentos sobre o fenômeno trabalho, especialmente quando relacionado ao tipo de
atividade por eles desempenhadas. Nesse sentido investiga-se a filiação dos informantes
a sindicatos de acordo com a seguinte categorização:
. Sindicatos de Empregados Urbanos
. Sindicato de Profissionais Liberais
. Sindicato de Trabalhadores Autônomos
. Sindicato de Trabalhadores Rurais
PNAD ATUAL: a investigação da filiação a sindicatos foi mantida para a pessoa
ocupada no período de referência de 365 dias, analisando além dos sindicatos
relacionados os de trabalhadores avulsos bem como outro tipo de sindicato.
AUTO-CONSUMO (2O Pré-Teste, pág. 58)
Tendo em vista o conceito de trabalho adotado, que nele inclui a atividade
produtiva para o auto-consumo, é de extrema importância captá-la na pesquisa sobre
trabalho. Principalmente no que concerne à unidade de produção camponesa que busca,
primordialmente, garantir a subsistência do grupo familiar, a produção para o auto-
consumo reveste-se de significado. O que interessa investigar é se empregadores e conta
própria destinam parte de sua produção para alimentação de sua família. Em caso
afirmativo procura-se avaliar a importância dessa produção em termos de subsistência
familiar.
PNAD ATUAL: foi mantida a investigação dos trabalhadores dedicados à
produção para o próprio consumo.
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