a discussão de gênero em meio as políticas públicas para a juventude rural no brasil
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Artigo a ser apresentado no Fazendo Gênero 10 - 2013 em Florianópolis - SC. Caso usar, citar a referência. Texto inicial, aliás, bem inicial, para o debate.TRANSCRIPT
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Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X
A DISCUSSÃO DE GÊNERO EM MEIO AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A
JUVENTUDE RURAL NO BRASIL
Sérgio Botton Barcellos1
Resumo: As desigualdades de gênero na zona rural brasileira se inscrevem junto com outras
desigualdades sociais nesse espaço social. Segundo o Censo (2010), são 14.133.184 mulheres que
residem no meio rural, no qual tem em sua maioria homens. No Brasil cerca de 2 milhões de
pessoas saíram do meio rural nos últimos 10 anos (IBGE, 2010). 1 milhão são pessoas em idade
considerada jovem, isto é, metade da emigração do campo para a cidade é desse grupo etário (18-29
anos), que em sua maioria são mulheres (25.000 migram por ano para as cidades). Entretanto, na
contramão disso, evidencia-se que a organização política dos grupos que se identificam como
juventude rural ou jovens do campo reivindicam viver no meio rural e ter políticas públicas. Desse
modo, a partir desse trabalho, propõe-se analisar como estão ocorrendo nesse campo político às
relações de interdependência entre os atores da sociedade civil e governo que atuam na formulação
das políticas públicas direcionadas para a juventude rural no governo federal e de que forma ocorre
a discussão de gênero nesse setor. Pretende-se realizar essa análise qualitativa e por meio das fontes
de pesquisa coletadas em observação participante e análise documental dos debates e formulações
do âmbito do governo federal.
Palavras-chave: Mulheres jovens rurais; gênero; participação social; políticas públicas.
Introdução
Nas últimas duas décadas, os formuladores2 de PPs para o meio rural brasileiro têm
mostrado uma preocupação mais evidente com a diversidade de grupos sociais presentes neste
universo. Neste sentido, foram formuladas políticas específicas para agricultores familiares,
populações quilombolas, extrativistas, pescadores artesanais, indígenas, etc., além de programas
para segmentos específicos destas categorias sociais, nomeadamente mulheres e jovens. Nesse
sentido, a criação de instituições, políticas e programas que fazem referência específica as jovens
mulheres situados no meio urbano e rural prospectam um marco institucional diferenciado no
âmbito das relações de acordo e disputa política do Estado no Brasil, em suas diferentes esferas de
governo.
A partir desse contexto no campo das políticas públicas para o meio rural, propõe-se a partir
desse trabalho descrever alguns apontamentos de como estão ocorrendo às relações entre os atores
da sociedade civil e governo na formulação das políticas públicas direcionadas para a juventude
1 Doutorando no CPDA/UFRRJ. E-mail: [email protected].
2 O termo formuladores seria relativo ao conjunto de agentes sociais que atuam no âmbito do governo em suas
diferentes esferas, nos espaços de discussão, formulação e decisão política acerca das PPs e junto aos Conselhos com a
participação da sociedade civil.
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rural no governo federal e algumas evidências de como está ocorrendo à discussão de gênero nessas
políticas. Além disso, objetiva-se dar visibilidade a alguns dados e a situação social da juventude
em específico das jovens no meio rural brasileiro. A análise será qualitativa e as fontes de pesquisa
foram coletadas em observação participante e análise documental nos debates e formulações do
âmbito do governo federal. Assim, nesse trabalho, devido à limitação de páginas, serão brevemente
problematizadas às propostas políticas elaboradas durante o 1.ª Seminário Nacional de Juventude
Rural e Políticas Públicas realizado em 2012.
1. Panorama geral da situação social da juventude rural no Brasil
Evidencia-se que no Brasil, os grupos sociais que se situam sócio-historicamente no âmbito
da agricultura familiar e camponesa ainda vivenciam grandes dificuldades de acesso a terra, de
efetivar a produção agropecuária e acessar as políticas públicas (reforma agrária, assistência técnica,
crédito rural e dentre outras). Essa condição se constituiu historicamente seja em função da alta
concentração fundiária no Brasil, que contribuiu para gerar em grande medida a desigualdade social
no meio rural, seja pela concentração do poder político e econômico, que define e classifica em
grande medida restritos grupos sociais (por exemplo, latifundiários e grandes corporações do ramo
do agronegócio) com essas políticas, e consequentemente, com a concentração dos recursos
públicos aplicados em infraestrutura, crédito, assistência técnica e pesquisa.
Em relação aos grupos sociais organizados politicamente que são reconhecidos ou
denominam-se como juventude rural tem sua questão social geralmente associada à ocorrência
histórica da sua “migração do meio rural para as cidades”, fato que representa tanto a diminuição
demográfica quanto territorial desse espaço (CASTRO, 2005). Sob essa perspectiva, parte-se do
princípio de que atualmente a questão da juventude no meio rural brasileiro perpassa pela vivência
em um espaço socialmente desigual com a falta de acesso a bens e serviços, tensionado de modo
geral por questões como a expansão indiscriminada do agronegócio, da concentração fundiária e da
exploração socioambiental3.
Demograficamente está ocorrendo uma inegável diminuição da porcentagem de jovens e de
adultos que vivem nas áreas rurais nas últimas décadas. Atualmente no Brasil, conforme IBGE
(2010), cerca de 8 milhões de pessoas em faixa etária considerada jovem (15 a 29 anos) estão no
que se denomina rural no Brasil, representando 27% de toda a população que vive nesse espaço.
3 O termo “socioambiental” ao qual me refiro, está relacionado às formas de produção e reprodução social,
econômica, política e cultural da sociedade em interação com os ecossistemas e biomas.
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No que tange questões como o êxodo e a sucessão rural no Brasil, no ano 2000 a população
rural era de 31.835.143 habitantes dos quais cerca de 9 milhões eram jovens. Em 2010 havia
29.830.007 habitantes com 8.060.454 jovens (IBGE, 2010). Evidencia-se que cerca de 2 milhões de
pessoas deixaram o meio rural, sendo que 1 milhão da população que emigrou estão situados em
outros grupos etários (crianças, adultos e idosos) e cerca de 1 milhão são os jovens rurais (18-29
anos), isto é, metade da emigração para a cidade é de jovens. Contudo, cabe uma discussão mais
aprofundada sobre isso em outro momento, pois segundo os dados do PNAD - 2011, recentemente
divulgados, estimou-se que no ano de 2011 apenas cerca de 7 milhões de pessoas entre 15 a 29 anos
estavam residindo no meio rural, sendo a maioria composta por homens. Ainda, segundo o IBGE
(2010), a taxa de êxodo rural no país caiu da tendência de 1,31% por ano da década anterior, para
0,65%. Mantendo-se esta tendência estima-se, para essa década, que aproximadamente 81.000
jovens emigrarão para as cidades anualmente4.
Em pesquisas recentes, como as de Ferreira e Alves (2009) e OIT (2010), há a indicação de
que os jovens que vivem no meio rural consideram as oportunidades de trabalho e construção de
uma autonomia para a vida como questões difíceis ou pouco viáveis, pois, além de estarem
inseridos em padrões culturais com a lógica orientada para a continuidade na atividade agrícola, há
também a relação disso com o tamanho da terra e a persistência da tutela aos padrões familiares e
comunitários. Articulada com essa realidade, para as/os jovens rurais há ainda a dimensão relativa
às incompreensões ao período de vida e as questões postas por isso, fora ser visto como alguém
“que poderá vir a ser”, como se já não estivesse sendo sujeito5.
Com o acesso ao CadUnico, da Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (Setembro,
2012), encontrou-se dados que mostram o alto índice de pobreza das pessoas em faixa etária jovem
no meio rural. Mais de 58%, ou seja, 4.691.131 de jovens vivem em situação de pobreza e extrema
pobreza no que tange as possibilidades de obter suas rendas mensais no contexto rural. Destes,
2.885.041 vivem no nordeste brasileiro, ou seja, 61,5%.
No estudo da OIT (2010) ainda consta que nos países da América Latina, como no caso do
Brasil, existe o chamado "eject" populacional. Isto configura-se pela questão dos/as jovens
migrarem não apenas para buscar outras oportunidades de trabalho ou educação formal, mas porque
4 Contudo, cabe destacar e deve ser um fluxo migratório a ser mais estudado é que nas regiões Norte (4,2 milhões) e
Centro-Oeste (1,6 milhão) ocorreram o aumento da população rural. A região Norte concentra os quatro Estados que
tiveram crescimento da população rural no período: Roraima, Amapá, Pará e Acre. 5 Evidencia-se que dentre os 16 milhões de habitantes da população que foram considerados em uma situação de
extrema pobreza, estima-se que 7,9 milhões destas, estão no rural, isto é, 1 (um) em cada 4 (quatro) dos habitantes estão nessa situação (IBGE, 2011).
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eles têm uma percepção considerada pouco atraente da vivência no rural em relação a outros
contextos, como o urbano, por exemplo, que oferece condições consideradas mais atrativas em
termos de educação, lazer, esportes, atividades culturais, os afasta da tutela intensiva (quando
ocorre) aos padrões familiares e comunitários, bem como oferece oportunidades de exercer funções
laborais diferenciadas das vinculadas exclusivamente a questão da cadeia agrícola.
Em relação à situação histórica dos/as jovens rurais, embora se considere que as políticas
desenvolvidas no âmbito da agricultura familiar possibilitam alternativas de ocupação e geração de
renda ou geram impacto sobre a qualidade de inserção juvenil neste contexto, constatou-se que os
atuais programas federais são considerados insuficientes para a produção de uma mudança social e
econômica significativa em relação à situação juvenil no meio rural (SNJ, 2010).
Contudo, mesmo frente a essa realidade e contexto socialmente adverso e desigual, observa-
se a ocorrência de muitos/as jovens e grupos de juventude que se mobilizam junto a organizações e
movimentos sociais no anseio de permanecer no rural e reivindicar acesso a terra. Frente a essa
realidade, os debates e as disputas políticas para o aprimoramento e a ampliação de um conjunto de
ações e políticas públicas estão em pauta, tanto nas esferas de governo, como para a sociedade no
Brasil.
1.1. Jovens mulheres no contexto rural e suas questões sociais
A saída das jovens mulheres do campo é um fenômeno crescente em todos os estados
brasileiros e está relacionado a um conjunto de fatores ligados as próprias condições de vida no
campo como também as novas expectativas de estudo e trabalho da sociedade brasileira para os/as
jovens. Evidencia-se também uma mudança nas últimas décadas nas configurações familiares
associadas a situações como o acréscimo de tempo investido nos estudos e profissionalização dos/as
jovens e a evidência de descentralização da conjugalidade e maternidade nos projetos de vida das
jovens mulheres.
Ao compararmos os dados do censo demográfico de 2000 e 2010 observou-se esta situação,
na medida em que indicam uma queda demasiadamente superior da população feminina jovem na
área rural em relação à masculina, sendo em média de 25% para elas e 8% para eles. Em alguns
casos a queda da população feminina jovem superou os 35%.6
6 No estado do Pará, por exemplo, chegou a 52%, ou seja, mais da metade das jovens mulheres deste estado decidiram
migrar do espaço rural para outros espaços.
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Se observamos os dados das jovens do campo em relação às jovens urbanas, observa-se que
há uma concentração maior de jovens na faixa etária de 15 a 17 no rural (24,1% contra 19,3%) e o
inverso entre as jovens de 25 a 29 anos de idade (29,9% rural e 34,3% urbano). No espaço rural
também há maior concentração de jovens negras - 63,3% - enquanto na zona urbana é de 51,0%,
entre as jovens mulheres. Há também um pouco mais de jovens mulheres casadas no rural do que
nas áreas urbanas (19,6% e 18%, respectivamente). Contudo, a proporção de jovens com filhos no
rural é bastante superior as jovens em regiões urbanas (45,5% e 35,9% respectivamente). O
percentual de jovens mulheres que são cônjuges do responsável pelo domicílio também é maior nas
áreas consideradas rurais, sendo igual a 35% e 24%, respectivamente (IBGE, 2010).
No âmbito do trabalho e renda a situação das jovens no meio rural é considerada mais
desigual ainda do que das jovens da zona urbana, pois apenas 28,8% delas trabalham enquanto que
no urbano esse número chega a 47,8% entre as jovens mulheres. Quanto à situação de ocupação das
jovens rurais apenas 18,5% delas têm carteira assinada contra 56,4% entre as jovens mulheres
urbanas, por outro lado, há cerca de 20% das jovens do campo que trabalham para o próprio
consumo. Em termo de renda quase 60% das jovens do campo não recebem remuneração via
mercado de trabalho, muito embora esteja no campo a maior proporção de jovens mulheres que
recebem bolsa família - cerca de 20% contra apenas 8% na zona urbana (IBGE, 2010).
2. Os espaços de formulação das políticas públicas para a juventude rural e as reivindicações
das jovens rurais
Junto à descrição e discussão dos dados relativos à situação da juventude rural até aqui feita,
entende-se necessário contextualizar, mesmo que de forma breve, como o debate da juventude
atualmente passa a ser observado como um tema de interesse no Estado, nas organizações e dos
movimentos sociais e como a discussão sobre gênero feminino vem sendo realizada.
Percebe-se que esse processo vem ocorrendo em meio a intensas articulações, disputas e
mobilizações políticas principalmente nos anos de 2003 e 2004, no âmbito do governo federal.
Como desdobramento desse processo, no ano de 2005, ocorreu à formação da Secretaria Nacional
da Juventude (SNJ), órgão que compõe a Secretaria Geral da Presidência da República7. A SNJ tem
o objetivo de elaborar, propor e discutir as políticas públicas direcionadas para a população jovem
7 A Secretaria Nacional de Juventude ocupa um espaço que assessora a Secretaria Geral da Presidência da República na
temática da Juventude, ou seja, não tem status ministerial. Também possui o papel de integrar programas e ações do
governo federal.
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no Brasil, bem como representar esse grupo social em espaços internacionais que sejam de interesse
nacional (SNJ, 2011). Uma das iniciativas de destaque dessa Secretaria foi à institucionalização do
Conselho Nacional da Juventude (CONJUVE) composto por 2/3 de representantes da sociedade
civil (diversas entidades, organizações e movimentos sociais rurais e urbanos) e 1/3 de
representação. Também no mesmo ano ocorreu a criação do PRO-Jovem8 (Programa Nacional de
Inclusão de Jovens), que foi considerada uma das principais iniciativas para a juventude
constituídas nos últimos anos pelo governo federal (SNJ, 2010).
A emergência da categoria juventude rural junto às organizações e movimentos sociais, por
meio de reivindicações e processos de organização de representação política, tanto no âmbito
governamental, como não-governamental, além de por em evidência esse grupo social e esse debate
temático, abriu oportunidades e espaços de atuação política para esses jovens, inclusive nos espaços
de participação abertos pelo governo.
Em meio a essa conjuntura, no âmbito do governo federal – juntamente com os grupos da
sociedade civil que participam dos espaços de participação promovidos pelo governo –, ocorreu à
constituição de diversos espaços de discussão e formulação de ações políticas direcionadas para a
juventude rural, como o Grupo e atualmente Comitê Permanente de Juventude Rural (CPJR) do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF) e a seguir no ano de 2011
o Grupo de Trabalho em Juventude Rural da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) que contam
com a participação das organizações e movimentos sociais com juventude rural.
Durante esse período, conforme SNJ (2010), as únicas ações de governo identificadas e
efetivas com o recorte juvenil no espaço rural, do ano de 2003 a 2010, foram realizadas pelo MDA
e priorizaram a disponibilização de crédito para aquisição de terra ou para a realização de projetos
técnicos, de formação e de produção agropecuária.
Em dezembro de 20119, aconteceu a 2.ª Conferência Nacional de Juventude na qual teve a
participação expressiva dos grupos politicamente organizados em juventude rural para reivindicar
reconhecimento e direitos sociais. Evidenciou-se naquele espaço o anseio desses grupos pela
formulação de políticas públicas que trouxessem inovações e que abrangessem de maneira
apropriada as características do que é ser um/a jovem no contexto rural brasileiro. Ainda nesse ano,
8 O ProJovem foi instituído em fevereiro de 2005 pela Medida Provisória 238, já convertida na Lei nº 11.129, de 30 de
junho de 2005. 9 Ainda em 2011 ocorreu na Câmara dos Deputados, o Seminário Nacional da Juventude Rural intitulado “A
Permanência do Jovem no Campo e a Continuidade da Agricultura Familiar no Brasil”, onde se abordou temas como
sucessão nas propriedades familiares, agenda política e os desafios para a consolidação da Agricultura Familiar e o
Desenvolvimento Rural Sustentável.
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o Programa Autonomia e Emancipação da Juventude no Plano Plurianual do Governo Federal (PPA
2012-2015) contemplou a juventude rural em uma linha, com um orçamento anual disponibilizado
de R$ 5 milhões.
A inter-relação entre o governo e as organizações e movimentos sociais com juventude rural
acentuou-se, em maio de 2012, com a realização do 1º Seminário Nacional de Políticas Públicas
para Juventude Rural, promovido pela SNJ em parceria com o MDA, no qual contou com a
participação de diversas organizações e movimentos sociais em juventude, pesquisadores e agentes
governamentais que atuam na temática. Os resultados obtidos neste 1º Seminário foram
considerados fruto de uma construção coletiva dos diferentes atores sociais que representaram as
principais forças que articularam a temática da juventude no rural no Brasil (jovens da agricultura
familiar camponesa, trabalhadores assalariados, povos das florestas e das águas, extrativista,
indígenas e quilombolas, as principais lideranças dos movimentos sindical, dos movimentos sociais
e pastorais). Nesse evento foram elaboradas 144 propostas e demandas pelos/as jovens presentes.
Ainda nesse mesmo ano, considerou-se que ocorreram uma série de importantes Seminários
Estaduais e Encontros regionais em juventude rural e no âmbito governamental um conjunto de
articulações técnicas e políticas em torno das pautas e demandas apresentadas pelos/as jovens
rurais. Um dos desdobramentos desse processo, é que em 2013 foram e ainda serão disponibilizados
e publicados editais de programas e projetos, com a participação da SNJ em conjunto com alguns
ministérios, nas áreas da cultura, inclusão digital, saúde, geração de trabalhão e renda, economia
solidária com foco em algumas das muitas reivindicações relacionadas à juventude rural.
Nesse ano evidenciou-se que algumas dessas iniciativas foram realizadas no âmbito do MDA,
quanto pela SNJ. No MDA foram realizados ajustes em alguns trâmites burocráticos e no percentual
de juros sobre o PRONAF-Jovem e o PNCF linha Jovem. Na SNJ foram lançadas até o momento
quatro iniciativas que são: O Projeto de Articulação e Fortalecimento de Redes de Grupos de
Economia Solidária – Edital SENAES/SNJ; Programa de Formação Agroecológica e Cidadã para a
Geração de Renda – SNJ/UNB/UNILAB – Piloto – em andamento – Centro Oeste e Ceará (600
jovens); e Estação Juventude Itinerante – 5 estações conveniadas- programa em expansão;
Programa inclusão digital da juventude Rural - MiniCom/SNJ - 41 projetos (2012-2013). Para
Agosto de 2013 está previsto o lançamento do Programa de Fortalecimento e Autonomia da
Juventude Rural. No MDA na Diretoria Política de Mulheres, observa-se que há as políticas com
recorte de gênero e com abrangência transversal para as jovens, sendo essas o Programa nacional de
documentação da trabalhadora rural e o Programa de Cadastro da Terra e Regularização Fundiária.
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2.1. As pautas das jovens rurais e as questões de gênero nas políticas públicas
Nos espaços que participei como pesquisador no 1.º Seminário Nacional de Juventude Rural
(2012), pude observar e escutar alguns relatos sobre a questão de gênero feminino e geracional
sobre o que é ser e estar jovem e mulher no contexto rural brasileiro junto a outros grupos
geracionais e do gênero masculino diante de questões socioambientais, econômicas e culturais.
Essas questões relativas às suas vivências vieram à tona entremeadas junto às discussões sobre as
políticas públicas individuais relacionadas à violência e tutela simbólica ou física, seja no âmbito
familiar, quanto privado, falta de acesso a serviços públicos considerados adequados e situados nas
áreas da saúde e da educação. Além disso, observou-se nos debates a presença de questões
referentes ao deslocamento esporádico ou frequente para os centros urbanos em busca de melhores
condições de vida ou acesso a serviços.
Nesses espaços as e os jovens rurais na presença de representantes de governo e
pesquisadores elencaram algumas questões em relação às políticas específicas para jovens mulheres
como: a ausência de políticas efetivas específicas para jovens mulheres no meio rural; falta de
informação e burocratização que impedem o acesso às políticas públicas que já existem; as políticas
públicas não consideram a discussão da sexualidade e da diversidade sexual; políticas
desarticuladas e que são focadas na maioria nas famílias e não na condição de ser e estar jovem e
mulher no meio rural; as políticas públicas não valorizam e não dão visibilidade ao trabalho das
mulheres no âmbito produtivo (SNJ, 2012).
De forma transversal a discussão sobre as jovens rurais foi realizada em outros temas durante
o Seminário, como por exemplo, consta em SNJ (2012): “Política de assistência técnica que leve em
consideração questões como: desigualdade de gênero e geração; formação para jovens mulheres –
educação formal e não formal - que considere o direito ao corpo, sexualidade e à diversidade
sexual”; Reformulação das políticas de comercialização da produção rural que já existem,
chamando a atenção para a ampliação da participação das jovens mulheres; “fomento para
capacitação e infraestrutura que incluam todas as etapas produtivas (produção, industrialização e
comercialização) específicas para a geração de trabalho e renda para as mulheres jovens rurais, de
forma desburocratizada, enfocando a agricultura camponesa agroecológica"; “Garantir o acesso à
titularidade da terra às jovens do meio rural, como direito de permanecer no campo e na floresta e
exercer com dignidade a profissão de agricultora”; Políticas relacionadas a atividades não-agrícolas
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de capacitação à geração de renda na área da cultura e de valorização das manifestações culturais e
artísticas protagonizadas pelas jovens mulheres rurais; criação de creches nas comunidades rurais e
assegurar 6 meses de licença maternidade para as jovens rurais.
Além das pautas relativas ao trabalho, educação e a questão socioambiental percebem-se
também reivindicações que garantam as jovens rurais participação política e mesmo a presença em
espaços comuns de vivência nos diferentes contextos rurais seja sem preconceito, seja não
heterovinculados a presença quase que exclusiva de homens em espaços públicos de atuação e
participação política, cultura, esporte e lazer. Isto é, percebeu-se por parte das jovens rurais a
reivindicação e forma direta e indireta por políticas que auxiliem na promoção do questionamento
sobre o constrangimento de uma lógica restritiva a condição jovem e de ser mulher nos diversos
espaços rurais (SNJ, 2012).
As evidências sobre essas reivindicações podem ser captadas e forma mais direta nas
seguintes manifestações, como quando foram elaboradas as seguintes propostas: “a viabilização de
uma educação do campo não sexista, antiracista e contra a homofobia”; As políticas sobre saúde e
direitos sexuais devem trazer informações suficientes para que as jovens rurais e qualificar
profissionais da saúde para atenderem as jovens sem discriminação devido a sua orientação sexual;
“campanhas nos meios de comunicação que valorizem a vida no campo e na floresta, contribuindo
para superação de estereótipos, preconceitos, discriminações e mostrando a diversidade que existe
(gênero, raça/etnia, sexualidade, geração)”; garantir a inclusão digital na zona rural com paridade de
participação das jovens mulheres junto aos demais jovens; “Criação/ampliação dos espaços de
sociabilidade e lazer nas comunidades rurais, ribeirinhas e quilombolas, com alternativas e
garantias à participação das jovens mulheres rurais” (grifos do autor); e constituição de
fóruns/comitês para acompanhamento e controle social das políticas, constituídos com a
participação efetiva das jovens mulheres e criar cotas para que as jovens mulheres estejam nos
espaços de elaboração/articulação e controle das políticas de juventude (SNJ, 2012).
Em meio a esse conjunto de reivindicações e demandas elaboradas nesse Seminário por parte
das jovens rurais, evidencia-se que a luta das mulheres pelo reconhecimento de sua condição
feminina no meio rural é permeada por uma série de condicionantes e aspectos sociais. Segundo
Esmeraldo (2013) as dificuldades para reagir, enfrentar no plano individual, familiar e de forma
isolada modelos de sociabilidade, ordens sociais, sistemas patriarcais, estruturas objetivadas,
inscritas e instituídas nos corpos, objetos, tempos, espaços e nos trabalhos de homens e de
mulheres, levam muitas mulheres, inclusive as jovens, a buscar cada vez mais a articulação com as
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organizações e movimentos sociais para construir suas condições de autonomia e dignidade de vida
enquanto mulher e trabalhadora rural.
No que tange as categorias gênero- jovens rurais (geração e contexto) - políticas públicas- a
partir de Campos (2011), pode-se problematizar a ideia de que nos campos da pesquisa acadêmica,
das políticas públicas, nos debates e lutas sociais, temas como o gênero, são geralmente tratados de
forma separada, não se entrecruzam, dificultando a percepção e, por conseguinte, a análise das
múltiplas conexões que há entre eles, devido enfoque essencialmente agrícola e ter ainda muito essa
atividade associada ao masculino. Essas características de certa maneira são reforçadas pela
tendência demográfica do espaço rural brasileiro de ter a maioria da população reconhecida como
masculina e com a faixa etária adulta e em idade avançada (IBGE, 2010).
Contudo, observa-se que dia após dia a hegemonia do homem no campo político e nos
espaços rurais de vivência e decisão começa a ser problematizada e questionada quando as mulheres
se opõem e revelam as leis orientadoras das regras que regem a entrada de sujeitos sociais nesse
espaço e reivindicam direitos e constroem estratégias em busca de autonomia social junto ao
Estado, ao exigirem o acesso as políticas públicas (CAMPOS, 2011).
Somado a isso para Ibarra et al. (2002), considera-se que os movimentos sociais buscam
marcar sua ação coletiva em torno de símbolos escolhidos seletivamente em diversas possibilidades
culturais (no caso das jovens rurais), no qual as representações políticas (do governo e da
sociedade) trabalham para convertê-las em marcos para a ação coletiva (debates, ações e políticas
públicas). Dessa maneira, junto aos movimentos sociais também emerge o discurso do gênero
feminino e da juventude, como um possível mobilizador e agregador de outras e até novas relações
de poder, mobilizando recursos de raiz simbólica, cultural e cognitiva em sua militância e nos
espaços públicos em geral.
Considerações Finais
A partir desse artigo, mesmo que de forma muito breve e descritiva, buscou-se dar
visibilidade e trazer alguns dados e questões sobre a condição social das jovens mulheres no meio
rural e ao mesmo tempo como suas demandas e questões geradas em meio as suas organizações e
movimentos sociais, estão contidas como reivindicação por direitos sociais em espaços de
participação promovidos pelo governo. Sob essa perspectiva, pode-se evidenciar que apesar dos
avanços das políticas públicas na última década para o fortalecimento da agricultura familiar e
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camponesa, as jovens não se percebem incluídas nesse processo e isso se manifesta, inclusive, pela
sua saída do meio rural para as cidades.
Longe de ser apenas uma constatação, a desigualdade nas relações de gênero é uma realidade
que se materializa na vida das mulheres no espaço rural, dentre outras formas, por meio dos seus
relatos e reivindicações em relação a sua reduzida participação política, do menor controle sobre
bens materiais, na menor remuneração do seu trabalho em todas as partes do mundo e nas diversas
formas de violência que marcam o cotidiano de milhares de mulheres (CAMPOS, 2011).
As condições de permanência para as jovens no campo dependem de um conjunto de ações
ligadas especialmente à esfera produtiva, para que elas possam dar conta de gerir recursos e ampliar
as condições para conquistar qualidade de vida e possibilitar as condições necessárias para a sua
permanência no meio rural com vida digna e com autonomia na condição de jovem e mulher.
As jovens do campo ao reivindicarem direitos e políticas públicas para garantir acesso e
participação nos espaços políticos, de trabalho e espaços públicos tencionam a unidade e as relações
de forças historicamente constituídas para e com o masculino e reconfiguram com diferentes
estratégias as relações de dominação social constituídas, a partir das suas iniciativas de organização
e reivindicação por direitos sociais com base em suas experiências enquanto jovens mulheres que
desejam desenvolver seus projetos de vida no meio rural.
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THE DISCUSSION ON GENDER IN PUBLIC POLICY FOR RURAL YOUTH IN BRAZIL
Abstract: Gender inequalities in rural Brazilian fall along with other social inequalities in social
space. According to the Census (2010), 14,133,184 are women who live in rural areas, which have
mostly men. In Brazil, about 2 million people have left the rural areas in the last 10 years (IBGE,
2010). 1 million people are considered young in age, ie half of the emigration from the countryside
to the city is this age group (18-29 years), who are mostly women (25,000 per year migrate to the
cities). However, against this, it is evident that the political organization of groups that identify
themselves as rural youth and claim to live in rural areas and have public policies. Thus, from this
study, proposes to examine as they are occurring in the political relations of interdependence
between the actors of civil society and government working in the formulation of public policies
aimed at rural youth in the federal government and how it occurs discussion of gender in this sector.
It is intended to accomplish this and qualitative analysis through research sources collected from
participant observation and documentary analysis of debates and formulations of the scope of the
federal government.
Key Words: Young rural women, gender, social participation, public policies.