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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014. ISBN: 978-85-7506-232-6 A DENDEICULTURA E A SUA EXPANSÃO NO ESTADO DO PARÁ: UMA INTERPRETAÇÃO GEOGRAFICA DO EVENTO 1 Ana Cláudia Alves de Carvalho Mestranda pelo PPGEO/ UFPA [email protected] Elvecia Noleto Nascimento Graduanda pela UFPA/Bolsista PIBIC [email protected] João Santos Nahum Prof. Dr. em UFGC/PPGEO/UFPA [email protected] INTRODUÇÃO A expansão da monocultura do dendê no Pará vem se desenvolvendo desde a década de 1970, há dois principais marcos que contribuíram para os avanços desta expansão, o primeiro deles é a implantação do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que almeja o uso dos produtos agrícolas para a produção de energia renovável, desenvolvendo e transferindo tecnologia para uma produção sustentável. O segundo marco é a instalação dos “Pólos de Produção de Biodiesel”, criados pela Secretaria de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário, com a intenção de favorecer a inclusão dos agricultores familiares na produção, no Pará o pólo 1 alcança 37 municípios. As paisagens rurais do estado são modificadas pelo emergir de técnicas modernas, que contam com o apoio de pesquisas de instituições publicas e privadas, grupos como Agropalma e Marborges Agroindústria S/A se destacam na produção 1 Este trabalho é resultado do projeto DENDEICULTURA, COMUNIDADES TRADICIONAIS E SEGURANÇA ALIMENTAR NA AMAZÔNIA PARAENSE , coordenado pelo professor Dr. João Santos Nahum e contando com o trabalho das bolsistas de iniciação cientifica. O projeto conta com auxílio financeiro do CNPQ. 3929

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A DENDEICULTURA E A SUA EXPANSÃO NOESTADO DO PARÁ: UMA INTERPRETAÇÃO

GEOGRAFICA DO EVENTO1

Ana Cláudia Alves de Carvalho

Mestranda pelo PPGEO/ UFPA

[email protected]

Elvecia Noleto Nascimento

Graduanda pela UFPA/Bolsista PIBIC

[email protected]

João Santos Nahum

Prof. Dr. em UFGC/PPGEO/UFPA

[email protected]

INTRODUÇÃO

A expansão da monocultura do dendê no Pará vem se desenvolvendo desde a

década de 1970, há dois principais marcos que contribuíram para os avanços desta

expansão, o primeiro deles é a implantação do Programa Nacional de Produção e Uso de

Biodiesel (PNPB) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que almeja o uso

dos produtos agrícolas para a produção de energia renovável, desenvolvendo e transferindo

tecnologia para uma produção sustentável.

O segundo marco é a instalação dos “Pólos de Produção de Biodiesel”, criados

pela Secretaria de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário, com a

intenção de favorecer a inclusão dos agricultores familiares na produção, no Pará o pólo 1

alcança 37 municípios. As paisagens rurais do estado são modificadas pelo emergir de

técnicas modernas, que contam com o apoio de pesquisas de instituições publicas e

privadas, grupos como Agropalma e Marborges Agroindústria S/A se destacam na produção

1 Este trabalho é resultado do projeto DENDEICULTURA, COMUNIDADES TRADICIONAIS E SEGURANÇA ALIMENTAR NAAMAZÔNIA PARAENSE , coordenado pelo professor Dr. João Santos Nahum e contando com o trabalho das bolsistasde iniciação cientifica. O projeto conta com auxílio financeiro do CNPQ.

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de óleo de palma, estabelecendo-se em diversos municípios do estado. Um dos motivos que

proporcionaram ao Pará tornar-se cenário de loção do dendê foi o Zoneamento

agroecológico, que identificou no Brasil quais áreas seriam mais aptas para o plantio do

dendê. Sendo alguns municípios de Pará ideais para tal cultura.

Este trabalho busca inicialmente uma breve discussão sobre os conceitos de

periodização e período geográfico trabalhados por Milton Santos (2006), que se utiliza do

conceito de evento para determinar as mudanças ocorridas em determinados períodos,

vemos a dendeicultura como um evento que ao acontecer em determinado território traz

mudanças, onde se instala cria novas relações. Destacamos aqui alguns dos eventos que

mais influenciaram e possibilitaram a entrada da cultura do dendê no Pará. Acreditamos

que seja necessário um olhar geográfico deste evento, pois a maioria dos trabalhos

analisados durante nossa revisão bibliografica apresenta a expansão da dendeicultura de

maneira técnica e cronológica, buscamos analisar as condições técnicas, políticas e

territoriais que permitiram a introdução do dendê em nosso Estado, almejando construir

uma analise geográfica.

OBJETIVOS

O trabalho consiste em apresentar as condições técnicas, políticas e territoriais

que permitiram a introdução do dendê no Pará, pontuando as políticas de estado e as

dinâmicas de mercado que contribuíram para sua expansão, bem como os grupos e

empresas que mais de destacam neste ramo. Partimos do conceito de período geográfico,

tal como trabalhado por Milton Santos e concebemos que a dendeicultura representa um

evento para o lugar, pois reorganiza a dinâmica territorial não só das comunidades

próximas aos empreendimentos, mas também influencia a criação de políticas de estado.

METODOLOGIAS

Metodologicamente realizamos investigação sobre a noção de evento, conceito

usado por Milton Santos, além da formação de referencial teórico sobre as políticas de

Estado para a agricultura familiar, o programa nacional de biodiesel e a dendeicultura. Além

de pesquisa de campo e entrevistas com representantes de grupos e empresas da atividade

da dendeicultura.

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RESULTADOS PRELIMINARES

Os caminhos da dendeicultura: a produção no Brasil

O cultivo em escala comercial no Pará iniciou-se em 1967, quando ainda esse

plantio era uma experiência feita pela SUDAM no município de Benevides. Os

empreendedores do agronegócio subsidiam-se em pesquisas sobre as vantagens

competitivas da dendeicultura na Amazônia. Estudo da SUFRAMA/FGV (2003), mostra o

cultivo do dendê como atividade produtiva em condições de preservar o meio ambiente sem

fortes agressões à floresta nativa porque pode ser plantado em áreas degradadas,

possibilitando um perfeito recobrimento dessas áreas quando adulto e, na fase jovem, pode

ser associado à leguminosas de cobertura de solo. Por isso, o dendê pode ser enquadrado

dentro do chamado desenvolvimento sustentável, sendo mais uma oportunidade de

negócios na Amazônia. Desse modo, por meio da integração da agricultora familiar à cadeia

do agronegócio do dendê, os empreendedores da dendeicultura buscam terra, mão de obra

e unidades produtivas familiares para desenvolver o cultivo dessa oleaginosa.

Vemos aqui parte da configuração em que a dendeicultura se insere, e ganha

força buscando sua expansão nos demais municípios do Pará, esse movimento quero

chamá-lo de “evento” desde já, um conceito usado por Santos que tratarei mais á frente.

Para entender melhor como essa expansão deu-se proponho aqui uma periodização da

dendeicultura no Pará, como forma de encontrar quais elementos possibilitaram tal cultura

se desenvolver ganhando cada vez mais eficácia.

Santos e Silveira (2001, p.23) fazem uma periodização para mostrar como se deu

a formação do território brasileiro, eles apontam que para se entender o processo de

formação do território brasileiro, apresenta-se a necessidade de se fazer uma periodização,

devido sua imensa diversidade, e suas historias regionais. O espaço possui diversas

superposições do trabalho, sendo estas sociais e territoriais criam a difícil tarefa de

entendê-las.

Segundo eles a questão é escolher a variável chave que, em cada pedaço de

tempo irá comandar o sistema de variáveis, esse sistema de eventos que denominamos

período. Eis o principio a partir do qual podemos valorizar os processos e reconhecer as

novidades da historia do território. É importante levar em consideração que os elementos

evoluem em um movimento global.

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A base das periodizações não são só as relações sociais, pois elas não ocorrem

no vácuo, deve-se dar atenção ao papel da técnica que são formas de regular a vida, que

cristaliza-se em objetos geográficos, pois estes também exercem seu papel de controle,

devido seu próprio tempo de modular os demais tempos Santos (2006, p.24).

Dessa forma, periodizar significa analisar as condições técnicas, políticas e

territoriais que permitem a introdução do dendê no Pará, ainda na década de 1950 quando

se iniciaram as pesquisas, pontuando as políticas de estado e as dinâmicas de mercado que

contribuíram para sua expansão, bem como os grupos e empresas que mais de destacam.

A partir disso, vemos que o desenvolvimento harmônico das cadeias produtiva e

industrial do dendê acontece baseado em um tripé de fatores, ação política somada ao

apoio da técnica, essa relação se dá sobre uma base territorial que influência e modela tais

relações. Com base nisso apresentaremos os período do dendê, faremos uma periodização

dividida em três períodos, para assim mostrar que fatores influenciaram na formação da

atual configuração de produção do dendê no Pará.

Período de especulação e implantação: da SPVEA à criação da SUDAM

Com base na discussão acima, entendemos que um período é produzido e

construído a partir da soma de determinados fatores, como a técnica, as ações políticas e o

território. Veremos passo a passo tal construção, que proporcionou a expansão da cultura

do dendê no Pará. A soma dessas ações reflete-se em um processo constante de

transformação do espaço, com momentos mais intensos que outros, pois a produção do

evento como um todo se dá período por período, ou seja cada período contribui para que o

evento expanda-se cada vez mais. A técnica neste primeiro período foi determinante, por

volta de 1950 um amplo programa de pesquisa foi desenvolvido pelo Institut de

RecherchesPour Lês Huiles et LesOleagineux– IRHO em parceria entre o governo brasileiro,

representado pelo Ministério da Agricultura, e o governo francês, representado pelo IRHO,

em todo o território brasileiro, procedeu-se a identificação e definição das áreas com as

melhores condições edafoclimáticas para o desenvolvimento do cultivo do dendê em escala

agroindustrial. A entrada dos estudos para implantação da técnica inicia-se aqui como fator

fundamental sem a qual os resultados não seriam os mesmos.

Do ponto de vista edafoclimático, no Brasil existiam algumas áreas dentro da

região amazônica e no sul da Bahia que ofereciam condições de solo e de clima semelhantes

ás da África e da Ásia, áreas em que o dendê é produzido, e que poderiam assim como na

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África e Ásia apresentar boa produtividade, caso fosse aplicado as mesmas técnicas de

manejo e adubação. Desse modo achou-se viável a implantação dos projetos de

dendeicultura no Brasil. Além disso, esses lugares possuíam maior acesso á mão-de-obra e

ao mercado consumidor, devido seus portos e rodovias, vantagens territoriais que não são

presentes em todas os lugares, sendo estas vantagens importantes para a implantação de

qualquer empreendimento econômico (CRUZ, B. E. 2006). Outro fator importante que

tornava o cultivo do dendê na Amazônia viável economicamente, era a demanda de

mercado que crescia a nível mundial, e o Brasil poderia prover seu próprio mercado interno,

nesse sentido representava uma alternativa socioeconômica, para o país e para a Amazônia.

O instituto também prestou assistência técnica ao projeto piloto implantada pela

Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia – SPVEA no Estado do Pará. Após

a extinção da SPVEA o projeto foi assumido pela Superintendência de Desenvolvimento da

Amazônia – SUDAM.

O cultivo em escala comercial foi iniciado em 1967, por meio desse convênio, o

projeto contemplou o plantio de 3.000 hectares, dos quais foram implantados, inicialmente,

1.500 hectares no município de Benevides, sendo os outros 1.500 hectares em núcleos

pilotos de pequenos produtores residentes em áreas próximas à sede do projeto, nos anos

seguintes. (SANTOS, M. A. 1999). Em 1974, o Projeto Dendê que antes era controlado pela

Sudam passou a formar o consórcio HVA International (Holanda), Cotia Trading e a Dendê

do Pará Ltda. nascendo assim a Denpal, que se transformou mais tarde em Dendê do Pará

S.A. Denpasa.

Como podemos notar até meados da década de 70, todos os projetos com a

cultura do dendê no Estado do Pará tinham participação ativa de órgãos governamentais,

neste caso a Sudam e com a criação da Denpasa a iniciativa privada se incorporou à

exploração econômica da cultura, atribuindo maior dinâmica à atividade.

Por volta de 1973, o Projeto de Plantações Satélites de Dendê foi implantado

pelo Governador Fernando Guilhon, com a finalidade de implantar 1.500 ha com pequenas

plantações no entorno da Denpasa. Em 1975, a Cooperativa Agrícola Mista Paraense

(Cooparaense), deu início à implantação desse projeto com a plantação de 50.000

dendezeiros, abrangendo os municípios de Santa Izabel do Pará, Santo Antônio do Tauá,

Benevides e Ananindeua. Ao entrarem na fase produtiva, os agricultores passaram a

entregar os cachos para a Denpasa. Em seguida a Cooparaense passa a se chamar de

Companhia Dendê Norte Paraense (Codenpa), possuindo uma usina de processamento de

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cachos, utilizando a matéria-prima produzida pelos seus agricultores familiares. (EMBRAPA,

2006)

Mesmo com a entrada da iniciativa privada o desenvolvimento do dendê na

Amazônia em escala agroindustrial se dá a partir de um projeto de Estado que como todos

os outros projetos econômicos implantados na Amazônia possuem uma matriz de

incentivos fiscais e de créditos, objetivando o investimento de empresas na região. A SUDAM

responsabilizava-se pela análise dos projetos e o BASA juntamente com o Banco do Brasil

tratavam do financiamento para a dendeicultura. Vemos aqui o Estado como incentivador e

agente transformador do território. Precisamos perceber que as pesquisas da Embrapa

criaram condições técnicas para a expansão do biodiesel, as políticas de estado criaram as

condições políticas para o biodiesel, a cultura do dendê, desenvolvida na nordeste paraense

desde a década de 1960, associada aos territórios rurais deprimidos onde ela se encontra,

criaram as condições territoriais para o biodiesel.

O resultado desse período é o inicio do cultivo da dendeicultura,

estabelecendo-se nos municípios de Benevides a Denpasa que era estatal, em Santa Izabel

do Pará, Santo Antônio do Tauá, Benevides e Ananindeua a Codenpa que também era

estatal, e em Tailândia a Agropalma, iniciando suas atividades já vinculadas aos pequenos

produtores. É importante também enfatizarmos a idéia de evento proposta por Santos,

outros autores o chamam de “momento”, ou de “instante”, para Eddington um evento é “um

instante do tempo dando-se em um ponto do espaço”. Os eventos ocorrem todos no

presente, acontecem em um instante, uma porção de tempo que eles qualificam, outra

característica é que eles não se repetem, as circunstâncias não são as mesmas duas vezes,

tornando os eventos todos novos, e ao surgirem propõe uma nova historia.

A eficácia do evento funda uma presença absoluta, onde ele se instala há

mudança, a cada novo acontecer as coisas preexistentes mudam o seu conteúdo e também

mudam a sua significação. C. Diano, 1994, citado por Santos, nos fala que os eventos

dissolvem as coisas, eles dissolvem as identidades, propondo-nos outras, mostrando que

não há fixas. Diz-nos também, que não há evento sem sujeito, assim temos que toda teoria

da ação é também uma teoria do evento e vice-versa.

Com base nisto, este primeiro período pode ser caracterizado pelo papel

fundador dos sujeitos que influenciaram e deram o ponta pé inicial neste empreendimento,

desde que iniciou-se as pesquisas no ramo de melhoramento genético, a dendeicultura já se

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implantava como uma lógica de fora, que deu certo em outros países e que poderia vir a ser

bem sucedida também no Pará.

Período de transformações: da SUDAM até o lançamento do PNPB

O segundo período surge já estruturado pelo primeiro, as políticas públicas já

aparecem com mais destaque, e o evento (a dendeicultura) ganha força a cada ação. A partir

da década de 80, com o surgimento de anomalias em dendezeiros como a Guia Podre e em

seguida a AF nos plantios da empresa Dendê do Pará S.A. (Denpasa), foi criado o Programa

Nacional de Pesquisa do Dendê e o antes chamado de Centro Nacional de Pesquisa de

Seringueira passou a ser o Centro Nacional de Pesquisa de Seringueira e Dendê (CNPSD),

localizado no Amazonas. Em 1982, cria-se a Estação Experimental do Rio Urubu (EERU),

também no Amazonas.

O Brasil, por meio de um trabalho cooperativo com a França, recebeu material

dos tipos Pisifera (P) e Dura (D), possibilitou produzir sementes do tipo comercial Tenera

(híbrido intraespecífico entre D x P). Esse campo de produção de sementes foi instalado na

EERU, junto com o Banco de Germoplasma de Dendê, que possibilitou o desenvolvimento

de um programa de melhoramento genético dessa espécie, incorporando as melhores

linhagens no programa de produção de sementes. (EMBRAPA, 2006)

Através da Assessoria de Agro-energia do Ministério da Agricultura, o Programa

Nacional para o Dendê – PRONADEM. Em seguida o CNPSD implantou dois campos

experimentais de pesquisa, um com 3.000 hectares de plantio localizados às margens do rio

Urubu, no distrito Agropecuário da SUFRAMA, a 140 KM de Manaus; e outro em Tefé, com

uma área de 1.200 hectares. Em 1989 o CNPSD foi reestruturado e passou a se chamar

Centro de Pesquisa Agro-florestal da Amazônia Ocidental, e o PRONADEM estabeleceu

metas de ação para a cultura do dendê, como: o estabelecimento de campo de produção de

muda de alto valor genético; prospecção e coleta de germoplasma da Elaeisoleifra(Caiaurê)

na Amazônia e ElaeisGuineensisem dendezais da Bahia; o controle de pragas; a propagação

vegetativa através da reprodução de reprodução assexuada; levantamento edafoclimático

microrregional; definição de fórmulas de adubação e manejo; estudo de consorciação e/ou

intercalação de cultura; e a formação e capacitação de mão-de-obra (CRUZ, 2006). Tais

metas geraram grande expansão da cultura no Pará ano após ano.

Na gestão do governador Almir Gabriel de 1996 a 2003 houve a implantação do

projeto de agricultura familiar do dendê e o estímulo a verticalização desta cadeia produtiva

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que através dos PPA’s estaduais (1996/1999 e 2000/2003) passa a implementar reformas no

Estado objetivando a construção de um “Novo Pará”, assim como a expansão da base

produtiva. A partir desse momento uma serie de mudanças estruturais tomam forma,

visando a produtividade no setor extrativista mineral e vegetal. Na mesorregião do nordeste

paraense foram criadas obras que beneficiam os projetos instalados na área de abrangência

do pólo de dendê. Mais uma vez a ação do Estado tem sido de fundamental importância na

consolidação da cadeia produtiva do dendê, como justificativa para a implantação do

projeto de agricultura familiar, usa o discurso de que os projetos visam à recuperação de

áreas degradadas e a introdução dos agricultores numa atividade econômica que lhe

permita aumentar sua renda, além de ser uma atividade que demanda processo de

industrialização, possibilitando ao Estado incentivar sua política de verticalização produtiva.

Um grande marco que vem impulsionar ainda mais é a criação do Programa

Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) lançado em 2004, este possuía como uma

de suas metas a integração da agricultura familiar em culturas como mamona e dendê na

produção de combustível, dando as empresas benefícios fiscais a partir da compra de

matéria-prima produzida por agricultores familiares.

Em analise ao programa nacional de Produção Uso e Biodiesel por parte dos

agricultores familiares mostra que o programa já rendeu avanços, porem ainda poucos,

seus principais desejos são maior autonomia e participação nas decisões e etapas da cadeia

produtiva, maior diversificação nas matérias-primas, maior diferenciação entre o modelo

adotado por eles e pelas grandes empresas e maior apoio do governo e da iniciativa privada

(ONG Repórter Brasil, 2010).

Como resultado deste período podemos notar que a associação das unidades

familiares ao agronegócio do biodiesel, por meio da produção de dendê, transformou os

camponeses em trabalhadores para o capital. Uma tática que contribuiu imensamente para

a expansão do dendê, pois utiliza-se do território moldando-o á lógica do agronegócio,

assim como estabelecendo novas relações, a cada novo acontecer as coisas preexistentes

mudam o seu conteúdo e também mudam a sua significação, a dendeicultura que é o

evento transformador chega e impõe uma presença absoluta. Destacamos a presença da

empresa Marboges nos municípios do Acará e Mojú, e a Agroindústria Palmasa S.A em

Igarapé-Açu.

Segundo Santos (2006) os eventos podem ser naturais ou históricos e sociais,

podem ser idéias e não só fatos, ao considerarmos o acontecer como um conjunto de

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numerosos eventos, cuja ordem e duração não são os mesmos, vemos que eles se

sobrepõe. Assim o conjunto de eventos também é um evento, não é apenas uma

sobreposição e sim uma combinação. É através do evento que podemos rever a constituição

atual de cada lugar e a evolução conjunta dos diversos lugares, num resultado da mudança

paralela da sociedade e do espaço.

Observamos que as mudanças na configuração espacial do Estado já são

facilmente percebidas, mudanças estruturais que são advindas da lógica do dendê, a

locação de agricultores familiares nesse empreendimento buscava dar um ar de

preocupação social ás empresas, porem o que acontece é o contrario, o agricultor familiar

deixa de ser agricultor, pois não produz mais alimentos e passa a ser apenas trabalhador

rural. Assim, assistimos as transformações causadas por este evento, não só no espaço,

mas também nas relações sociais que regem a sociedade. Por isso denominei este período

de “Período das transformações” pois nele ocorrem as transformações que servirão de base

para o futuro desenvolvimento da dendeicultura, sem elas os processos dar-se-iam em

outra velocidade.

Expansão da dendeicultura: do PNPB até os dias atuais

O projeto de agricultura familiar do dendê foi inicialmente implantado no

município de Concórdia do Pará, teve problemas relacionados à distância da usina

processadora, o que levou o governo a escolher outra área no município do Mojú para

implantação do projeto. Assim, os pequenos produtores passam a associar-se as grandes

empresas, como a Agropalma.

O grupo Agropalma iniciou suas atividades de produção e extração de óleo de

palma e óleo de palmiste em 1982 no município de Tailândia, a 150 km de Belém, e

tornou-se o maior produtor de óleo de palma da América Latina, dominando todo o ciclo de

produção, da semente ao óleo refinado, gorduras vegetais e margarina. O grupo Marborges,

outra grande empresa entrou em atividades em julho de 1991, sua indústria foi inaugurada

em 1992; está composto por duas empresas: Marborges Agroindústria S.A e a

Reflorestadora Mojú Acará Ltda.

A partir de 2006 a Secretaria de Agricultura Familiar do Ministério do

Desenvolvimento Agrário adotou a instalação de “Pólos de Produção de Biodiesel” como

principal estratégia para contribuir em nível microrregional ou territorial com a organização

da base produtiva de oleaginosas na agricultura familiar, e, conseqüentemente promover a

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inclusão de agricultores familiares na cadeia de produção do biodiesel. No Pará o Pólo1

abrange 37 municípios.

A questão fundiária tem sido um dos principais problemas quanto as parcerias

com os agricultura familiar, a falta de documentação dos lotes dos pequenos agricultores

impede o acesso ao credito do Pronaf que é essencial para o financiamento da produção do

dendê. Com isso o MDA assim como o ITERPA e a SEMA vem cedendo titulação e

regularização fundiária e ambiental para regiões e áreas de potenciais parceiros.

Atualmente empresas já instaladas investem na sua ampliação, surgem novos

investidores estrangeiros, deixando movimentado o mercado imobiliário de aquisição de

áreas rurais nos pólos de produção tradicional, a Agropalma continua se destacando na

produção hoje faz parte do conglomerado financeiro Alfa, possuindo a maior parcela de

produção no estado, sendo seguida pela Biopalma, que é por sua vez parceira de um grupo

canadense com empresários brasileiros, e foi recentemente comprada pela Vale,

pretendendo expandir ainda mais.

Levando-se em consideração que o dendê deva ser plantado em áreas já

desmatadas ele aumenta a procura por parte das empresas, esgotando assim essas áreas.

Se atentarmos para a chegada das multinacionais, somado a expansão das empresas que

aqui já estavam, do lançamento do PNPB até os dias atuais, as áreas de cultivo do dendê

cresceram de maneira surpreendente, somado a esse processo aconteceram compras de

terras da agricultura familiar, outras áreas da pecuária já degradadas, todas elas passaram a

ser incorporadas na plantação de dendê. Sendo importante destacar nesse contexto a

dificuldade de se encontrar em números a quantidade real de hectares de cada empresa,

sendo esses dados quase que sigilosos. No mapa 1 é possível visualizarmos a expansão das

empresas, abrangendo demais municípios do nordeste paraense, destacando-se no ramo

da dendeicultura cerca de dez empresas que mais se destacam BIOPALMA, ADM,

AGROPALMA, DENPASA, PETROBRAS/GALP, DENTAUÁ, MARBORGES, PALMASA, YOSSAM e

PBIO.

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Mapa 1- Mapa de localização das empresas de dendeicultura no Pará até o ano de 2013.

Fonte: GDEA, 2013

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A DENDEICULTURA E A SUA EXPANSÃO NO ESTADO DO PARÁ: UMAINTERPRETAÇÃO GEOGRAFICA DO EVENTO

EIXO 2 – Dinâmicas e conflitos territoriais no campo e desenvolvimento rural

RESUMO

A expansão da monocultura de dendê no Pará vem ganhando força desde a década

de 60, grandes empresas aumentam a cada dia suas áreas de produção

transformando a espaço e a dinâmica territorial de determinados lugares. As

paisagens rurais do estado são modificadas pelo emergir de técnicas modernas, que

contam com o apoio de pesquisas de instituições publicas e privadas, grupos como

Agropalma e Marborges Agroindústria S/A se destacam na produção de óleo de

palma, estabelecendo-se em municípios do estado. O trabalho consiste em

apresentar as condições técnicas, políticas e territoriais que permitem a introdução do

dendê no Pará, pontuando as políticas de estado e as dinâmicas de mercado que

contribuíram para sua expansão, bem como os grupos e empresas que mais de

destacam. Partimos do conceito de período geográfico, tal como trabalhado por

Milton Santos e concebemos que a dendeicultura representa um evento para o lugar,

pois reorganiza a dinâmica territorial das comunidades próximas aos

empreendimentos.

Palavras-chave: Dendeicultura, empresa, território e Estado.

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