a crítica de costumes -...

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PROFESSOR EL10: 14.2 a 14.4, 14.8 (e); 15.1 a 15.3 • Cantigas de escárnio e maldizer: dimensão satírica – a crítica dos costumes; linguagem, estilo e estrutura (caracterização temática) Educação literária 1.1 É criticado o «dono», v. 7, de «Un cavalo», v. 1, que não tratou devidamente da alimentação do animal, deixando-o num estado de grande prostração com a fome. 2. O animal é apresentado como tendo passado «seis meses», v. 2, sem comer: teria morrido se assim fosse… Com esta hipérbo- le o trovador trocista deforma a realidade, exagerando-a e pro- vocando o riso. 3. As exclamações ocorrem na sequência da deformação da realidade temporal: é espanto- so que o cavalo tenha arribado ao fim de seis meses sem co- mer; agora comeu «e já se le- va!», vv. 6, 12 e 18, porque choveu e a erva cresceu, não porque o dono tenha tratado dele. Naque- le tempo como hoje havia quem maltratasse os animais… Un cavalo non comeu Joan Garcia de Guilhade, in Mercedes Brea (coord.), Lírica profana galego-portuguesa, 1º vol., Santiago de Compostela, Xunta de Galicia, 1996, p. 463. Un cavalo non comeu á seis meses, nen s’ergeu 1 ; mais 2 prougu’ a Deus 3 que choveu, e creceu a erva, e per cabo 4 si paceu 5 , e já se leva 6 ! Seu dono non lhi buscou cevada neno 7 ferrou 8 ; mai-lo bon tempo tornou, e creceu a erva, e paceu, e arriçou 9 , e já se leva! Seu dono non lhi quis dar cevada, neno ferrar; mais, cabo dun lamaçal 10 , creceu a erva, e paceu, arriçou ar 11 , e já se leva! - - - - 5 - - - - 10 - - - - 15 - - - Vocabulário 1 se ergueu (subentende-se que permanecia deitado com a debilidade provocada por não comer); 2 mas; 3 prougu’ a Deus – foi vontade de Deus; 4 per cabo – finalmente; 5 pastou, comeu erva; 6 já se leva – já se levanta, já recuperou as forças; 7 nem o; 8 mandou colocar-lhe ferra- duras, isto é, abandonou-o; 9 recobrou forças; 10 cabo de um lamaçal – junto de um lameiro, campo com muita água; 11 novamente Educação literária 1. Nesta cantiga é também feita uma crítica velada. 1.1 Refere quem é criticado e o motivo da crítica. 2. Mostra como a sátira ocorre na primeira estrofe ou cobla através de uma deformação da realidade concretizada numa hipérbole. 3. Justifica a utilização de frases do tipo exclamativo no refrão. Gaston Phoebus, O Livro da Caça, 1387 (detalhe) Cantigas de escárnio e maldizer 79 2 PROFESSOR EL10: 14.2, 14.4; 15.1 a 15.3 • Cantigas de escárnio e maldizer: dimensão satírica – a crítica dos costumes; linguagem, estilo e estrutura (caracterização temática) Educação literária 1. A cantiga narra um episódio da vida do trovador / narrador: foi convidado para jantar por um «infançon» que pretendeu que o seu convidado gabasse o jantar; mas dada a fraca qualidade que o convidado viu nele, sentiu-se incapaz de o louvar, e justificou- -se com um juramento que tinha feito no passado, quando fora soldado numa campanha militar, em Jaen – nunca diria bem do que era mau. 2. 2.1 Critica-se um «infançon» que, sendo pobre, apresentou um pobre jantar pretendendo que se tratava de uma boa re- feição: por isso é ridicularizado. 3. 3.1 A censura do jantar só não é declarada porque o convidado está impedido, por juramento, de mentir. Pudera ele dizer a verdade e o dizer mal seria claro e não dissimulado. A crítica de costumes Cantigas de escárnio Un infançon mi á convidado Nunes, in Mercedes Brea (coord.), Lírica profana galego-portuguesa, 2º vol., Santiago de Compostela, Xunta de Galicia, 1996, p. 683. - - - - 5 - - - - 10 - - Vocabulário 1 infanção, nobre de segunda categoria; 2 convidou-me; 3 vv. 2-3: a louvar o jantar que me ofereceu; 4 v. 3: mas eu não acho justo fazê-lo; 5 porquê; 6 porque; 7 desde há muito que jurei; 8 localidade no sul de Espanha, na época na fronteira entre cristãos e muçulmanos, uma zona de guerra; Jaen foi conquistada aos muçulmanos, em 1246; 9 exército; 10 soldado na luta contra os muçulmanos, que ocupavam grande parte do sul da Península Ibérica. Educação literária 1. Comprova que esta cantiga concretiza uma pequena narrativa. 2. Nela faz-se uma crítica. 2.1 Refere quem é criticado e o motivo da crítica. 3. Nas cantigas de escárnio a crítica não é feita diretamente. 3.1 Mostra que assim sucede neste caso. Cantigas de Santa Maria, século XIII Un infançon 1 mi á convidado 2 que seja seu jantar loado par mi 3 , mais eu nono ei guisado 4 ; e direi-vos por que mi aven 5 : ca 6 já des antan’ei jurado 7 que nunca diga de mal ben. Diss’el, poi-lo jantar foi dado: – Load’este jantar onrado! Dix’eu: – Faria-o de grado, mais jurei antan’en Jaen 8 , na oste 9 , quando fui cruzado 10 , que nunca diga de mal ben. 2 Poesia trovadoresca 78

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P R O F E S S O R

EL10: 14.2 a 14.4, 14.8 (e); 15.1 a 15.3

• Cantigas de escárnio e maldizer: dimensão satírica – a crítica dos costumes; linguagem, estilo e estrutura (caracterização temática)

Educação literária

1.1 É criticado o «dono», v. 7, de «Un cavalo», v. 1, que não tratou devidamente da alimentação do animal, deixando-o num estado de grande prostração com a fome.

2. O animal é apresentado como tendo passado «seis meses», v. 2, sem comer: teria morrido se assim fosse… Com esta hipérbo-le o trovador trocista deforma a realidade, exagerando-a e pro-vocando o riso.

3. As exclamações ocorrem na sequência da deformação da realidade temporal: é espanto-so que o cavalo tenha arribado ao fim de seis meses sem co-mer; agora comeu «e já se le-va!», vv. 6, 12 e 18, porque choveu e a erva cresceu, não porque o dono tenha tratado dele. Naque-le tempo como hoje havia quem maltratasse os animais…

Un cavalo non comeuJoan Garcia de Guilhade, in Mercedes Brea (coord.), Lírica profana galego-portuguesa, 1º vol., Santiago de Compostela, Xunta de Galicia, 1996, p. 463.

Un cavalo non comeuá seis meses, nen s’ergeu1;mais2 prougu’ a Deus3 que choveu,e creceu a erva,e per cabo4 si paceu5,e já se leva6!

Seu dono non lhi buscoucevada neno7 ferrou8;mai-lo bon tempo tornou,e creceu a erva,e paceu, e arriçou9,e já se leva!

Seu dono non lhi quis darcevada, neno ferrar;mais, cabo dun lamaçal10,creceu a erva, e paceu, arriçou ar11,e já se leva!

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Vocabulário1 se ergueu (subentende-se que permanecia deitado com a debilidade provocada por não comer); 2 mas; 3 prougu’ a Deus – foi vontade de Deus; 4 per cabo – finalmente; 5 pastou, comeu erva; 6 já se leva – já se levanta, já recuperou as forças; 7 nem o; 8 mandou colocar-lhe ferra-duras, isto é, abandonou-o; 9 recobrou forças; 10 cabo de um lamaçal – junto de um lameiro, campo com muita água; 11 novamente

Educação literária

1. Nesta cantiga é também feita uma crítica velada.

1.1 Refere quem é criticado e o motivo da crítica.

2. Mostra como a sátira ocorre na primeira estrofe ou cobla através de uma deformação da realidade concretizada numa hipérbole.

3. Justifica a utilização de frases do tipo exclamativo no refrão.

Gaston Phoebus, O Livro da Caça, 1387 (detalhe)

Cantigas de escárnio e maldizer

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P R O F E S S O R

EL10: 14.2, 14.4; 15.1 a 15.3

• Cantigas de escárnio e maldizer: dimensão satírica – a crítica dos costumes; linguagem, estilo e estrutura (caracterização temática)

Educação literária

1. A cantiga narra um episódio da vida do trovador / narrador: foi convidado para jantar por um «infançon» que pretendeu que o seu convidado gabasse o jantar; mas dada a fraca qualidade que o convidado viu nele, sentiu-se incapaz de o louvar, e justificou--se com um juramento que tinha feito no passado, quando fora soldado numa campanha militar, em Jaen – nunca diria bem do que era mau.

2.2.1 Critica-se um «infançon» que, sendo pobre, apresentou um pobre jantar pretendendo que se tratava de uma boa re-feição: por isso é ridicularizado.

3. 3.1 A censura do jantar só não é declarada porque o convidado está impedido, por juramento, de mentir. Pudera ele dizer a verdade e o dizer mal seria claro e não dissimulado.

A crítica de costumesCantigas de escárnio

Un infançon mi á convidadoNunes, in Mercedes Brea (coord.), Lírica profana galego-portuguesa, 2º vol., Santiago de Compostela, Xunta de Galicia, 1996, p. 683.

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Vocabulário1 infanção, nobre de segunda categoria; 2 convidou-me; 3 vv. 2-3: a louvar o jantar que me ofereceu; 4 v. 3: mas eu não acho justo fazê-lo; 5 porquê; 6 porque; 7 desde há muito que jurei; 8 localidade no sul de Espanha, na época na fronteira entre cristãos e muçulmanos, uma zona de guerra; Jaen foi conquistada aos muçulmanos, em 1246; 9 exército; 10 soldado na luta contra os muçulmanos, que ocupavam grande parte do sul da Península Ibérica.

Educação literária

1. Comprova que esta cantiga concretiza uma pequena narrativa.

2. Nela faz-se uma crítica.

2.1 Refere quem é criticado e o motivo da crítica.

3. Nas cantigas de escárnio a crítica não é feita diretamente.

3.1 Mostra que assim sucede neste caso.

Cantigas de Santa Maria, século XIII

Un infançon1 mi á convidado2

que seja seu jantar loadopar mi3, mais eu nono ei guisado4;e direi-vos por que mi aven5:ca6 já des antan’ei jurado7

que nunca diga de mal ben.

Diss’el, poi-lo jantar foi dado:– Load’este jantar onrado!Dix’eu: – Faria-o de grado,mais jurei antan’en Jaen8,na oste9, quando fui cruzado10,que nunca diga de mal ben.

2 Poesia trovadoresca

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P R O F E S S O R

Escrita

NotaSobre a natureza da síntese foi especialmente consultada, de M. Olga Azeredo, M. Isabel Freitas M. Pinto e M. Carmo Azeredo Lopes, a Gramática prática de Português, Lisboa, Lisboa Editora, 2009, pp. 435 e seguintes.

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Texto 1

Pouco se conhece da vida de Fernão Lopes; mas esse pouco permite-nos afirmar que a sua vida teria sido extremamente simples. Era lisboeta e de origem vilã, segundo se depreende de algumas particularidades conhecidas da sua vida. (…)

Ignora-se a data do seu nascimento, mas supôs Braamcamp Freire que fosse pelos anos de 1378 a 1383. Teria aprendido o seu latim no Estudo Geral ou em alguma escola monástica, pois se revela na sua obra um homem culto, conhecedor de Aristóteles, Túlio, Ovídio e de Petrarca, embora não alardeie a sua erudição com o exibicionismo infantil que caracteriza Zurara.

Aparece pela primeira vez o seu nome num documento de 1418: era então guarda-mor das escrituras da Torre do Castelo de Lisboa. A data aproximativa do seu nascimento é precisamente deduzida deste facto; com efeito, não se confiaria cargo de tamanha responsabilidade a um rapaz inexperiente.

Em 1419, era escrivão dos livros de D. João I. Em 1422, aparece-nos como escrivão da puridade1 do Infante D. Fernando. Foi por esse tempo que, segundo ainda Braamcamp Freire, teria sido nomeado tabelião geral do reino, cargo que, na suposição daquele erudito, seria ine-rente à condição de guarda-mor da Torre do Tombo.

Por carta de 19 de março de 1434, D. Duarte arbitra a Fernão Lopes, seu escrivão, uma tença anual de 14 000 reais para escrever as crónicas dos reis antigos, até seu pai, inclusive.

M. Rodrigues Lapa, Lições de literatura portuguesa, Coimbra, Coimbra Editora, 1977, pp. 374-375.

Texto 2

(…) Fernão Lopes foi encarregado por D. Duarte, antes de 1434, de elaborar a Crónica Geral do Reino de Portugal, para o que lhe atribuiu uma tença anual de 14 000 reais brancos (a partir de 1 de janeiro de 1434), verba que foi aumentada por D. Afonso V para 20 000 reais. Para a elaboração desta obra, socorreu-se Fernão Lopes, principal-mente, de textos historiográficos anteriores, a partir dos quais elabora os textos referentes aos primeiros sete reis de Portugal. Destas crónicas, dadas como perdidas e apenas presentes no apro-veitamento que delas fizeram Duarte Galvão e Rui de Pina, foram encontradas cópias, primeiro na Biblioteca Pública Municipal do Porto, por Magalhães Basto, num códice incompleto (códice 886, com letra do século XVI, oriundo de Santa Cruz de Coimbra), e depois entre os manuscritos da Bi-blioteca da Casa Cadaval (códice nº 965), por Silva Tarouca, a chamada Crónica de 1419 ou dos Sete primeiros reis de Portugal, versão mais completa do manuscrito portuense. Este achado suscitou, e continua a suscitar, as mais desencontradas opi-niões acerca da autoria desta crónica (…). Não su-jeitas a qualquer polémica são, então, as crónicas referentes aos reinados de D. Pedro, D. Fernando e D. João I.

Pedro Ferré, «Lopes, Fernão», in Álvaro Manuel Machado (Org. e dir.), Dicionário de literatura portuguesa, Lisboa,

Presença, 1996, p. 277.

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Escrita

SínteseO que é…

É um texto que reduz ao essencial o conteúdo de um ou mais textos – o(s) texto(s)-fonte. A informação apresenta-se organizada através de conectores com funções variadas: identificar semelhanças, apontar contrastes, indicar causas, etc.

Deve apresentar três partes bem definidas:• introdução – indicação da temática e da autoria do texto ou textos a sintetizar; • desenvolvimento – apresentação das ideias consideradas essenciais devidamente

organizadas / relacionadas através de conectores adequados;• conclusão – referência breve ao que se considera fundamental.

A síntese não tem de apresentar a informação pela mesma ordem em que aparece nos texto(s)-fonte e deve ter uma dimensão que corresponda aproximadamente a um quarto desse(s) texto(s).

ExemplificaçãoEscreve uma síntese dos dois textos que se seguem com cerca de um quarto da sua dimensão.

Oficina de escrita

Anexo informativoCoesão e coerência textuaisPágs. 325-327

Vocabulário1 secretário particular

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P R O F E S S O R

Leitura

1.1.1 As cantigas de escárnio e as de maldizer.1.2 Trata-se de um jogral que pretendeu assumir o papel de trovador.1.3 Podia ser alvo de sátira por-que, sendo o motivo do louvor uma dama perfeita e única, fre-mosa, de alta condição social, alguém louvou uma mulher de baixa condição social, uma «ama».

2. b.

Textos de apoio

Cantigas de escárnio e maldizer

Texto 1A sátira trovadoresca

A sátira trovadoresca, nas suas duas modalidades, incidiu sobre assuntos varia-dos, muitas vezes agrupados em grandes temas ou ciclos, [como] a sátira que se fazia às infrações aos códigos trovadorescos e do amor cortês (por exemplo, ao fac-to de jograis se quererem «meter» a fazer versos, a ser trovadores, como sucedeu a um tal jogral Lourenço; ou ao facto de um outro trovador fazer cantigas [de amor] a uma pessoa de baixa condição, uma ama), à ironia sobre o facto de se morrer de amor nas cantigas… porque se podia ressuscitar ao terceiro dia…, ou sobre o facto de se endereçarem as cantigas só a damas bonitas (…).

Amélia Pinto Pais, História da literatura em Portugal – uma perspetiva didática, Volume I, Porto, Areal Editores, 2004, p. 45. (Texto adaptado)

Texto 2Valor documental

As cantigas de escárnio e maldizer ocupam grande espaço nos cancioneiros da Vaticana e da Biblioteca Nacional de Lisboa, mal se distinguindo entre si. (…)

Perpassam [nelas] o velho que desesperadamente se pinta e enroupa muito caro; a rapariga que a mãe antes ensina a saracotear-se do que a coser e fiar; um cavalo faminto abandonado (…), mas que se refaz com erva fresca depois das chu-vas; gabarolices de falsos romeiros à Terra Santa; fracassos imprevistos por um astrólogo; um juiz que se deixa peitar; agoiros e superstições; incidentes variados de viagem e hospitalidade; uma ex-soldadeira queixando-se, no confessionário, não dos antigos pecados, mas da velhice; raparigas casadas (o poeta considera que vendidas) à força, ou impunemente raptadas; abadessas cheias de condescendên-cias, etc.

A. J. Saraiva e Óscar Lopes, História da literatura portuguesa, 17ª edição, Porto, Porto Editora, pp. 65-66.

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Leitura

1. Atenta no texto 1.

1.1 Especifica as «duas modalidades» referidas nas ll. 1-2.

1.2 Explicita o exemplo apresentado de «infrações» à poética trovadoresca, ll. 4-5.

1.3 Indica por que razão fazer uma cantiga de amor cujo motivo era uma «ama», l. 9, podia ser alvo de sátira.

2. Identifica a afirmação que o texto 2 não permite confirmar.

a. Estas cantigas refletem a vida quotidiana do tempo em que foram criadas. b. Nada nestas cantigas se pode relacionar com o mundo em que vivemos, porque a

sociedade evoluiu muito.

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2 Poesia trovadoresca

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P R O F E S S O R

Escrita

NotaSobre a natureza da síntese foi especialmente consultada, de M. Olga Azeredo, M. Isabel Freitas M. Pinto e M. Carmo Azeredo Lopes, a Gramática prática de Português, Lisboa, Lisboa Editora, 2009, pp. 435 e seguintes.

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Texto 1

Pouco se conhece da vida de Fernão Lopes; mas esse pouco permite-nos afirmar que a sua vida teria sido extremamente simples. Era lisboeta e de origem vilã, segundo se depreende de algumas particularidades conhecidas da sua vida. (…)

Ignora-se a data do seu nascimento, mas supôs Braamcamp Freire que fosse pelos anos de 1378 a 1383. Teria aprendido o seu latim no Estudo Geral ou em alguma escola monástica, pois se revela na sua obra um homem culto, conhecedor de Aristóteles, Túlio, Ovídio e de Petrarca, embora não alardeie a sua erudição com o exibicionismo infantil que caracteriza Zurara.

Aparece pela primeira vez o seu nome num documento de 1418: era então guarda-mor das escrituras da Torre do Castelo de Lisboa. A data aproximativa do seu nascimento é precisamente deduzida deste facto; com efeito, não se confiaria cargo de tamanha responsabilidade a um rapaz inexperiente.

Em 1419, era escrivão dos livros de D. João I. Em 1422, aparece-nos como escrivão da puridade1 do Infante D. Fernando. Foi por esse tempo que, segundo ainda Braamcamp Freire, teria sido nomeado tabelião geral do reino, cargo que, na suposição daquele erudito, seria ine-rente à condição de guarda-mor da Torre do Tombo.

Por carta de 19 de março de 1434, D. Duarte arbitra a Fernão Lopes, seu escrivão, uma tença anual de 14 000 reais para escrever as crónicas dos reis antigos, até seu pai, inclusive.

M. Rodrigues Lapa, Lições de literatura portuguesa, Coimbra, Coimbra Editora, 1977, pp. 374-375.

Texto 2

(…) Fernão Lopes foi encarregado por D. Duarte, antes de 1434, de elaborar a Crónica Geral do Reino de Portugal, para o que lhe atribuiu uma tença anual de 14 000 reais brancos (a partir de 1 de janeiro de 1434), verba que foi aumentada por D. Afonso V para 20 000 reais. Para a elaboração desta obra, socorreu-se Fernão Lopes, principal-mente, de textos historiográficos anteriores, a partir dos quais elabora os textos referentes aos primeiros sete reis de Portugal. Destas crónicas, dadas como perdidas e apenas presentes no apro-veitamento que delas fizeram Duarte Galvão e Rui de Pina, foram encontradas cópias, primeiro na Biblioteca Pública Municipal do Porto, por Magalhães Basto, num códice incompleto (códice 886, com letra do século XVI, oriundo de Santa Cruz de Coimbra), e depois entre os manuscritos da Bi-blioteca da Casa Cadaval (códice nº 965), por Silva Tarouca, a chamada Crónica de 1419 ou dos Sete primeiros reis de Portugal, versão mais completa do manuscrito portuense. Este achado suscitou, e continua a suscitar, as mais desencontradas opi-niões acerca da autoria desta crónica (…). Não su-jeitas a qualquer polémica são, então, as crónicas referentes aos reinados de D. Pedro, D. Fernando e D. João I.

Pedro Ferré, «Lopes, Fernão», in Álvaro Manuel Machado (Org. e dir.), Dicionário de literatura portuguesa, Lisboa,

Presença, 1996, p. 277.

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SínteseO que é…

É um texto que reduz ao essencial o conteúdo de um ou mais textos – o(s) texto(s)-fonte. A informação apresenta-se organizada através de conectores com funções variadas: identificar semelhanças, apontar contrastes, indicar causas, etc.

Deve apresentar três partes bem definidas:• introdução – indicação da temática e da autoria do texto ou textos a sintetizar; • desenvolvimento – apresentação das ideias consideradas essenciais devidamente

organizadas / relacionadas através de conectores adequados;• conclusão – referência breve ao que se considera fundamental.

A síntese não tem de apresentar a informação pela mesma ordem em que aparece nos texto(s)-fonte e deve ter uma dimensão que corresponda aproximadamente a um quarto desse(s) texto(s).

ExemplificaçãoEscreve uma síntese dos dois textos que se seguem com cerca de um quarto da sua dimensão.

Oficina de escrita

Anexo informativoCoesão e coerência textuaisPágs. 325-327

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P R O F E S S O R

Leitura

1.1.1 As cantigas de escárnio e as de maldizer.1.2 Trata-se de um jogral que pretendeu assumir o papel de trovador.1.3 Podia ser alvo de sátira por-que, sendo o motivo do louvor uma dama perfeita e única, fre-mosa, de alta condição social, alguém louvou uma mulher de baixa condição social, uma «ama».

2. b.

Textos de apoio

Cantigas de escárnio e maldizer

Texto 1A sátira trovadoresca

A sátira trovadoresca, nas suas duas modalidades, incidiu sobre assuntos varia-dos, muitas vezes agrupados em grandes temas ou ciclos, [como] a sátira que se fazia às infrações aos códigos trovadorescos e do amor cortês (por exemplo, ao fac-to de jograis se quererem «meter» a fazer versos, a ser trovadores, como sucedeu a um tal jogral Lourenço; ou ao facto de um outro trovador fazer cantigas [de amor] a uma pessoa de baixa condição, uma ama), à ironia sobre o facto de se morrer de amor nas cantigas… porque se podia ressuscitar ao terceiro dia…, ou sobre o facto de se endereçarem as cantigas só a damas bonitas (…).

Amélia Pinto Pais, História da literatura em Portugal – uma perspetiva didática, Volume I, Porto, Areal Editores, 2004, p. 45. (Texto adaptado)

Texto 2Valor documental

As cantigas de escárnio e maldizer ocupam grande espaço nos cancioneiros da Vaticana e da Biblioteca Nacional de Lisboa, mal se distinguindo entre si. (…)

Perpassam [nelas] o velho que desesperadamente se pinta e enroupa muito caro; a rapariga que a mãe antes ensina a saracotear-se do que a coser e fiar; um cavalo faminto abandonado (…), mas que se refaz com erva fresca depois das chu-vas; gabarolices de falsos romeiros à Terra Santa; fracassos imprevistos por um astrólogo; um juiz que se deixa peitar; agoiros e superstições; incidentes variados de viagem e hospitalidade; uma ex-soldadeira queixando-se, no confessionário, não dos antigos pecados, mas da velhice; raparigas casadas (o poeta considera que vendidas) à força, ou impunemente raptadas; abadessas cheias de condescendên-cias, etc.

A. J. Saraiva e Óscar Lopes, História da literatura portuguesa, 17ª edição, Porto, Porto Editora, pp. 65-66.

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Leitura

1. Atenta no texto 1.

1.1 Especifica as «duas modalidades» referidas nas ll. 1-2.

1.2 Explicita o exemplo apresentado de «infrações» à poética trovadoresca, ll. 4-5.

1.3 Indica por que razão fazer uma cantiga de amor cujo motivo era uma «ama», l. 9, podia ser alvo de sátira.

2. Identifica a afirmação que o texto 2 não permite confirmar.

a. Estas cantigas refletem a vida quotidiana do tempo em que foram criadas. b. Nada nestas cantigas se pode relacionar com o mundo em que vivemos, porque a

sociedade evoluiu muito.

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2 Poesia trovadoresca

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Introdução

Conclusão

Desenvolvimento

TEXTO-MODELO

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2. Redação da síntese: proposta-modelo

Esta síntese aborda aspetos da vida e da obra de Fernão Lopes com base em dois textos críticos da autoria de M. Rodrigues Lapa e de Pedro Ferré.

Fernão Lopes nasceu numa família do povo, em Lisboa, por volta de 1380. Teve uma educa-ção de nível superior, já que o revela na sua obra.

Entre 1418 e para além de 1434, Fernão Lopes ocupou vários cargos oficiais, tendo chegado a tabelião geral de Portugal. O rei D. Duarte incumbiu-o, em 1434, de escrever as crónicas dos primeiros reis de Portugal, designadas Crónica Geral do Reino de Portugal, para isso lhe tendo atribuído uma tença anual. Fernão Lopes fez as pesquisas necessárias e escreveu as crónicas, as quais, no entanto, embora se saiba que foram aproveitadas por cronistas posteriores a Fernão Lopes, não chegaram até nós; foram descobertas o que se pensa serem cópias dessas crónicas, mas é um achado envolto em grande polémica. Pelo contrário, sem qualquer polémica, são sem dúvida da sua autoria as crónicas relativas aos reinados de D. Pedro, de D. Fernando e de D. João I.

Entre certezas e incertezas, a importância de Fernão Lopes na literatura portuguesa é inquestionável.

Reconhecimento das características da síntese (comparando com os textos-fonte)

Na introdução:

• referiu-se a autoria e a natureza dos textos a sintetizar;

• anunciou-se, implicitamente, o modo como a síntese progrediria (em primeiro lugar infor-mações sobre a vida de Fernão Lopes, depois sobre a sua obra).

No desenvolvimento:

• apresentou-se e destacou-se o que se considerou mais significativo, com base na seleção crítica dos tópicos referidos na planificação;

• dividiu-se a informação em dois parágrafos, o primeiro relativo a aspetos biográficos de Fernão Lopes, o segundo à sua obra;

• utilizaram-se conetores adequados à organização da informação: já que, no entanto, em-bora, mas, pelo contrário…

Na conclusão:

• salientou-se o que se considerou fundamental.

O texto tem cerca de um quarto das palavras dos textos-fonte.

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1. Planificação da síntese: tópicos a considerar

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Introdução Textos-fonte: autores e tema.

. aumento da tença por D. Afonso V como pagamento da elaboração das crónicas – Crónica Geral do reino de Portugal;. pesquisas para a elaboração das crónicas;. aproveitadas por cronistas posteriores a Fernão Lopes;. atualmente desconhecem-se;. autoria polémica destas crónicas;. autoria certa das relativas aos reinados de D. Pedro, D. Fernando e D. João I.

Desenvolvimento – Tópicos – Texto 2

1.o parágrafo . origem social de Fernão Lopes. local de nascimento.

4.o parágrafo . 1419: segundo cargo oficial – escrivão dos livros de D. João I. 1422: terceiro cargo oficial – secretário particular do Infante D. Fernando. nomeado por esta altura para um novo cargo oficial – tabelião geral do reino

2.o parágrafo . ano de nascimento – por volta de 1380. educação3.o parágrafo . 1418: primeiro cargo oficial – guarda-mor das escrituras da Torre do Castelo de Lisboa

5.o parágrafo . 1434: incumbido por D. Duarte para escrever as crónicas dos reis de Portugal até seu pai, D. João I. atribuição de uma tença anual como pagamento desse trabalho

Desenvolvimento – Tópicos – Texto 1

Conclusão A obra possível de Fernão Lopes.

Nota: sempre que seja solicitada, neste Manual, a redação desta tipologia textual, deves consultar estas páginas.

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3 Fernão Lopes, Crónica de D. João I

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P R O F E S S O R

OralidadeExpressão oral

• Grelha de planificação 3, p. 62

• Grelha de avaliação 3, p. 94

LPP

Áudio«Crise de 1383-1385»

DocumentosGrelhas de planificação e de avaliação 3

PowerPoint®• Galeria de imagens 3• Síntese da sequência 3

CD áudio • faixa 11

Escreve e edita a sínteseEscreve agora o teu texto. Ao fazê-lo deves ter presente a grelha de avaliação que o teu

professor te facultará e que te permitirá, em colaboração ele, uma avaliação do que escreves com vista a eventuais operações de revisão / aperfeiçoamento do texto. Edita o teu texto atendendo à caligrafia, à ortografia, à divisão em parágrafos.

Divulga a sínteseLendo-a na sala de aula, publicando-a no jornal da escola, no blogue da turma, ou por outro meio.

Oralidade

EXPRESSÃO ORAL

SínteseApresenta uma síntese oral do documento áudio «Crise de 1383-1385», num breve discurso

que tenha entre um e três minutos.

Apreender ideias principais e perceber a estruturação do texto-fonte

Procede à audição do documento tomando notas, no teu caderno, através de tópicos, sobre

• título e autor; • acontecimentos mais importantes da «Crise»; • tema do texto; • como termina; • como se iniciou a «Crise»; • principais protagonistas desta «Crise».

Faz nova audição para confirmares e/ou acrescentares elementos que consideres importantes.

Planificação

Planifica a síntese: seleciona de entre a informação recolhida a que te parece mais relevante; ordena-a em função da estrutura do discurso que vais apresentar; reflete sobre o que pre-tenderá o autor com este texto (narrar uma sequência de acontecimentos, expor, persuadir, etc.); em função da intenção comunicativa do autor, seleciona os conectores que melhor se adequarão à estruturação da tua síntese; organiza-a em três partes lógicas.

Introdução Título, tema, autor

Desenvolvimento Apresentação das ideias-chave utilizando os conectores apropriados para as relacionar: sequenciar, contrastar, etc.

Conclusão Referência breve ao que se considera fundamental.

Apresentação e avaliaçãoApresenta a síntese de acordo com os aspetos verbais e não verbais presentes na grelha de avaliação projetada pelo teu professor. Em caso algum poderás ler ou decorar um texto previamente escrito. Avalia a síntese de acordo com os elementos presentes na grelha de avaliação.

Caderno de AtividadesPropostas de escritaPág. 70

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P R O F E S S O R

Escrita

NotaNo Caderno de Atividades, encontram-se outras propostas de elaboração de sínteses.

• Grelha de planificação 9, p. 75

• Grelha de avaliação 10, p. 103

LPP

DocumentosGrelhas de planificação e de avaliação 9 e 10

Proposta de redação de uma síntese

Elabora uma síntese que tenha aproximadamente um quarto das palavras do seguinte texto.

O ponto de vista de Fernão Lopes

Escrivão de D. João I, notário de profissão, guarda-mor da torre do Tombo desde 1418, Fernão Lopes é encarregado por D. Duarte, então príncipe e depois rei, de «pôr em cróni-cas» as histórias dos reis seus antepassados. Assim começou a redação de uma Crónica de Portugal que se prolongará por vários séculos. Foi aposentado em 1454, no reinado de D. Afonso V.

Como panegirista1 e partidário convicto da dinastia de Avis e do que ele chama a «casa de Portugal», é natural que Fernão Lopes tenha denegrido os seus adversários. Mas, sempre que tem sido possível comparar a sua narrativa com as respetivas fontes documentais e narrativas, o espírito crítico de Fernão Lopes tem saído engrandecido da prova. Além disso, ele não poupa a figura do rei D. João I, seu senhor, o que é extraordinário. A coerência da sua visão de conjunto é muito convincente do ponto de vista da veracidade.

O que há de mais notável em Fernão Lopes e que o torna inconfundível entre todos os cronistas da Idade Média é a humanidade que lhe permite irmanar-se com o povo e discernir, muito mais do que os feitos dos reis e cavaleiros, todo o processo que alterou nos séculos XIV e XV a sociedade portuguesa.

Fernão Lopes não é o cronista de D. João I ou de Nuno Álvares, mas o cronista da revolu-ção, tanto do ponto de vista objetivo (os factos) como subjetivo (os sentimentos). Esta visão de conjunto permite-lhe relativizar os protagonistas individuais dos acontecimentos.

D. João I, por exemplo, aparece como um homem hesitante, pusilânime mesmo, empur-rado para a frente por outros mais conscientes ou dedicados. (…)

Em compensação, Fernão Lopes dá grande relevo a outros aspetos que os cronistas medievais sistematicamente desconhecem. O grande ator e promotor da resistência, ao que se infere das suas crónicas, é o povo de Lisboa.

A. J. Saraiva, Iniciação na literatura portuguesa, Lisboa, Gradiva / Público, 1996, pp. 24-25.

bulário1 elogiado

Planifica a sínteseRelê o texto e assegura-te de que conheces todo o vocabulário.

• Sublinha a informação que te parece mais relevante.

• Reflete sobre a relação entre o título e o texto: a tua síntese deverá explicitar com clareza qual é o «ponto de vista de Fernão Lopes», qual a originalidade dele em rela-ção aos cronistas europeus do seu tempo.

• Escreve, para cada parágrafo, um ou mais tópicos que refiram informação essencial; por exemplo, para o primeiro: profissão / para quem trabalhou / obra;

• uma vez terminada a elaboração dos tópicos, verifica o modo como podes organizar a informação, como entenderes, associando-a ou contrapondo-a através dos conecto-res ou marcadores textuais adequados.

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Anexo informativoCoesão e coerência textuaisPágs. 325-328

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3 Fernão Lopes, Crónica de D. João I

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