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Departamento de Serviço Social
A COLETA SELETIVA NO MORRO DOS PRAZERES: UM
EXEMPLO DE PRÁTICA EDUCATIVA
Aluna: Maria Julia Batista de Oliveira Reis1
Orientadora: Valéria Pereira Bastos2
Introdução:
O presente relatório tem por finalidade descrever a nossa experiência como
aluna bolsista de Iniciação Científica no projeto intitulado: “Políticas urbanas,
mobilização política e a regulação das favelas cariocas” do Laboratório de Estudos
Urbanos e Socioambientais - LEUS do Departamento de Serviço Social, que vem sendo
fomentado pela FAPERJ através do edital 41/2013 – Grupos Emergentes de nº
26/2010.169/2014, cujo objetivo é analisar as políticas públicas nas favelas no contexto
de renovação urbana na cidade do Rio de Janeiro, nos remetendo a pensar sobre as
diversas mudanças que estão acontecendo na cidade e como às mesmas refletem na
sociedade.
A sociedade atual dentre outros aspectos, está voltada para o incentivo do
consumo desenfreado, portanto, tendo como consequência a excessiva geração de
resíduos como um dos fatores ocasionador de grande problema ambiental enfrentado
pelos brasileiros (BORGES e OLIVEIRA, 2011). Neste sentido, faz-se necessário o
desenvolvimento de políticas voltadas para o gerenciamento da destinação correta de
resíduos sólidos a fim de promover sua melhor gestão.
Isto porque, no decorrer de alguns anos se intensificou ainda mais o processo de
produção e consumo, fazendo com que muitos municípios no Brasil, começassem a
passar pelo processo de renovação urbana. E podemos afirmar que o século XX foi um
marco para esse desenvolvimento urbano, conforme afirma (SANTOS, 1994): “A
população aumentada à classe média ampliada, a sedução dos pobres por um consumo
diversificado e ajudado por sistemas extensivos de crédito, servem como impulsão à
expansão industrial”. Este processo é decorrente do momento histórico da expansão
industrial, pois além da mão de obra ser necessária nas indústrias, localizadas nas
cidades, foi fortemente sentida a presença de um grande número de pessoas que migrou
1 Bolsista PIBIC/FAPERJ e aluna do Departamento de Serviço Social PUC-Rio.
2 Professora do Departamento de Serviço Social PUC-Rio.
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do campo para vida na cidade na busca pelo trabalho e consequentemente na melhoria
das condições de vida.
Consideramos, contudo, que este fenômeno também provocou um grande aumento
das questões sociais, dentre eles a segregação sócio espacial, assim como problemas
socioambientais, consequência do inchaço da cidade, tendo em vista não somente a
questão do consumo desenfreado como também a ausência de políticas efetivas na área
de resíduos sólidos, principalmente no que diz respeito ao descarte adequado dos
rejeitos, pois onde tem pessoas tem naturalmente geração de resíduos sólidos.
As ações voltadas para a excessiva geração de resíduos e seu descarte indevido são
alguns fatores determinantes de grande problema ambiental enfrentado por toda
sociedade, devido ao seu caráter de poluição e tempo de duração no meio ambiente.
Sendo assim, faz-se necessário o desenvolvimento de políticas públicas com foco nos
elementos necessários para a destinação correta de resíduos sólidos a fim de promover
sua melhor gestão.
Com esta finalidade foi sancionada acerca de quase cinco anos atrás, a Política
Nacional de Resíduos Sólidos - PNRS - Lei 12.305/2010, que determina o
gerenciamento integrado dos resíduos sólidos, isto é, desde sua geração até a destinação
final ambientalmente adequada e preceitua no seu art. 15 inciso III, a importância de
redução, reutilização e reciclagem dos resíduos sólidos como uma possível solução para
o equilíbrio ambiental.
Assim, entendemos que uma das alternativas para efetivação do que determina a lei,
seria a implantação em todo o país de um programa de coleta seletiva, que pudesse
viabilizar através de ação educativa a efetiva participação da sociedade na busca de
reduzir, reutilizar e reciclar os resíduos para garantir uma melhor qualidade de vida para
população e mais equilíbrio ambiental para o planeta.
Neste sentido, a pesquisa da qual participamos vem sendo realizada desde novembro
de 2014 no Morro dos Prazeres situado no Bairro de Santa Teresa, e a escolha do campo
de investigação se deu em razão da inovação da prática educativa que vendo sendo
desenvolvida através de um projeto de mobilização comunitária cujo foco central é a
coleta seletiva, e que se estruturou em decorrência do desastre socioambiental ocorrido
em 2010, culminando na morte de 34 pessoas, além de diversas famílias desabrigadas.
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Este desastre levou a população residente no Morro dos Prazeres a refletir sobre o lixo
produzido e as melhores formas de sua destinação, assim, o Grupo Prevenção Realizada
com Organização e Amor - PROA formado inicialmente pelos moradores, que
trabalhavam com temas relacionados à saúde, e apoiado pela Organização Não
Governamental CEDAPS, passaram também a refletir sobre temas transversais, e
puseram em pauta a importância da participação comunitária no processo de
desenvolvimento do projeto de coleta seletiva de lixo, como forma de mitigar os
problemas existentes nesta área na favela, visando ampliar a consciência dos moradores
no que tange não somente a ideia de favela limpa, mas também no seu contexto mais
amplo de preservação ambiental e qualidade de vida e o denominaram de Projeto
ReciclAção.
Metodologia
Iniciamos a pesquisa, efetuando um levantamento bibliográfico a respeito de
várias questões ligadas ao tema central do estudo, que não cessou, pois é permanente, e
os pontos mais relevantes estão centrados nas seguintes temáticas: Resíduos Sólidos
Urbanos, Educação Ambiental, Planejamento Urbano, Favela, Pobreza, Cidadania e
seus desdobramentos para nortear a investigação e assim dar início à pesquisa de
campo, que segundo (NETO, 1994), “se apresenta como uma possibilidade de
conseguirmos não só uma aproximação com aquilo que desejamos conhecer e estudar,
mas também de criar um conhecimento, partindo da realidade presente no campo”.
Utilizamos como técnica de pesquisa a observação participante, pois tem nos
permitido realizar uma efetiva interação com os sujeitos envolvidos diretamente no
projeto, em especial os moradores da localidade, pois participamos diretamente das
reuniões dos Grupos de Trabalho tanto do ReciclAção quanto dos parceiros do Projeto.
E ainda realizamos também entrevistas do tipo semiestruturada, pois consideramos que
somente através da fala dos sujeitos seja possível compreendermos o sentimento dos
envolvidos no projeto.
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Foto 1 – Reunião dos parceiros do Projeto ReciclAção na sede do CEDAPS.
Fonte: Equipe do ReciclAção
Para garantir o acompanhamento teórico metodológico na pesquisa, são
realizados encontros com a orientadora uma vez por semana que se revezam, pois ora
acontece no campo de estudo ora na Universidade para discutir sobre alguns artigos
acadêmicos a respeito do tema de estudo, sobre os avanços no trabalho e as atividades a
serem realizadas no desenvolvimento da pesquisa. E ainda, mensalmente, o grupo do
Laboratório de Estudos Urbanos e Socioambientais – LEUS, também se reúne para
compartilhar o andamento de cada linha de pesquisa que compõe o Projeto dos Grupos
Emergentes, permitindo que todos os orientadores, bem como todos os bolsistas de
iniciação científica, mestrado e doutorado tenham conhecimento sobre as demais
pesquisas.
As implicações da destinação inadequada dos resíduos sólidos urbanos em favelas
O processo histórico industrial intensificado por uma sociedade capitalista de
consumo, a formação das cidades estruturadas para atender a lógica de mercado e
intencionalmente criadas para reprodução da força de trabalho, o inchaço dos espaços
urbanos que é estudado por MARICATO (2015), acarretam consequências imediatas na
geração de resíduos sólidos. Segundo a autora: “o capital em geral busca moldar o
ambiente urbano às suas necessidades, mas interessa destacar aqui um conjunto dos
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capitais que tem interesse específico na produção do espaço urbano, por meio do qual
reproduzem obtendo lucros, juros e renda”. Com o passar do tempo e em meio aos
surtos de inovações tecnológicas, novos resíduos são gerados incentivados por uma
cultura de consumo da sociedade.
Evidenciamos que o processo de favelização acentuado ocorre em função em
grande parte pelo déficit habitacional nas grandes cidades, e que uma das consequências
que essas regiões sofrem, é a ausência de acesso a bens e serviços públicos. Neste
sentido, na pesquisa, nossa abordagem e atenção tem relação direta com essa
precariedade, e em especial, na questão relacionada a ausência de coleta ou destinação
inadequada do lixo, principalmente, nas favelas, seja por descaso do poder público, seja
pela forma em que a favela se configura no espaço urbano.
Entender todos esses conjuntos de fatores que contribuem para uma diferenciação
da qualidade de vida nas favelas, nos remete a lembrar que esses espaços são
historicamente marcados pela discriminação, falta de políticas públicas nas áreas:
educacional, saúde, ambiental, habitacional, entre outras eficazes para atender as
especificidades geográficas entre outras que as localidades de favelas necessitam, pois
desde suas primeiras formações na região central do município do Rio de Janeiro o
processo excludente se tornou evidente.
Esta segregação sócio espacial é visivelmente identificada no espaço urbano,
pois é vista como estratégia da elite urbana que ao mesmo tempo quer se apropriar dos
investimentos públicos e garantir a reprodução das classes, intenciona intensificar a
organização de um arranjo social que perpetue essa dominação de uma classe dominante
em cima de uma subalternizada historicamente por um modelo econômico, político,
social cultural capitalista. Este fato se configura quando Maricato (2001) afirma:
A segregação urbana é uma das faces mais importantes da exclusão social. Ela não é um
simples reflexo, mas também motor indutor da desigualdade. À dificuldade de acesso
aos serviços e infraestrutura urbanos (transporte precário, saneamento deficiente,
drenagem inexistente, dificuldade de abastecimento, difícil acesso aos serviços de
saúde, educação e creches, maior exposição à ocorrência de enchentes e
desmoronamentos, etc) somam-se menores oportunidades de emprego (particularmente
do emprego formal), menores oportunidades de profissionalização, maior exposição à
violência (marginal ou policial), discriminação racial, discriminação de gênero e idade,
difícil acesso à justiça oficial, difícil acesso ao lazer. A lista é interminável.
(MARICATO, 2001, p. 01)
O processo de formação das primeiras favelas cariocas retrata a própria história
do Brasil no que diz respeito à habitação. A formação de cortiços como local de
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moradia sem nenhum serviço de qualidade de vida, e sendo considerado caso de saúde
pública e com o passar do tempo sendo exterminados na lógica de fortalecimento da
ideologia do capital até a formação das primeiras favelas em casas irregulares, porém
em condições de moradias minimamente melhor das vividas nos cortiços já
caracterizavam o conjunto de violações de direitos sofridas por pessoas da classe
trabalhadora. Segundo o autor Kawahara (2015):
O espaço urbano capitalista, dessa forma, reproduz a dominação, ou seja, ele é
destinado a cumprir funções específicas que variam segundo a necessidade da classe
dominante. Ao mesmo tempo apresenta as contradições impostas pelo conflito da
sociedade de classes. Essas contradições, por sua vez, geram espaços de resistências
que hão de ser combatidos de tempos em tempos quando o sistema econômico exige
novas estruturas que negam esses espaços, ou quando a classe dominante tem condições
de segregar arbitrariamente exercendo sua hegemonia sobre o espaço.
(KAWAHARA, 2015. p.02)
O caos urbano gerado pelos assentamentos irregulares deu concretude aos
primeiros planos urbanísticos do município que visavam de forma higienista remover
essas localidades informais e de alguma forma impulsionar a realocação em espaços
distantes da cidade.
Resgatar a historicidade no que diz respeito às habitações populares do
município é fundamental para abordar a temática ambiental e para construção de uma
memória coletiva baseada na formação de identidade dos sujeitos políticos em busca de
efetivação de direitos já conquistados e mobilizar ações organizadas e independentes
para amenizar esse descaso do poder público de âmbito geral3 aos moradores de favelas.
Assim, ao nos aproximarmos do campo de pesquisa, evidenciamos que o
impacto negativo sobre o meio natural causado pelo descarte incorreto de lixo é um dos
maiores problemas ambientais enfrentados pelos brasileiros nos últimos tempos,
portanto, o descarte do lixo domiciliar integra essa temática ambiental e possui suas
especificidades devido ao seu caráter cultural, social e político-econômico. Como reflete
Esgolmin, (2010):
A questão do descarte de resíduos sólidos domiciliares agrava-se quando se trata de
regiões ou comunidades pobres, tanto pela carência de recursos disponíveis como pela
falta de informação quanto aos riscos produzidos. E é sobre as populações mais
carentes que recai a maior parte dos efeitos negativos da urbanização desenfreada, sem
mecanismos regulatórios e de controle, típica das áreas periféricas das grandes cidades
3 No que diz respeito à moradia digna, saúde, educação, coleta de lixo regular, agua própria para o
consumo, rede de esgoto entre outros serviços diretamente ligados a qualidade de vida.
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Tanto a pobreza, como a escassez de recursos, e a expansão populacional combinam-se
para criar círculos viciosos de degradação e colapso dos ecossistemas e das
comunidades locais. . (ESGOLMIN, 2010, p. 16)
Um fator bem enfatizado na pesquisa e que contribui diretamente para a
degradação do meio ambiente é o acúmulo de lixo, e tem relação direta com a sociedade
de consumo, pois vêm causando um aumento vertiginoso na geração de resíduos
sólidos, contribuindo para um intenso e continuo processo de deterioração ambiental,
com sérios danos a qualidade de vida da população. A questão associada ao lixo urbano
no Brasil está ligada ao descarte em condições inadequadas que provocam impactos
ambientais, bem como desequilíbrios ecológicos e prejuízos a saúde da sociedade. E são
esses comportamentos incorretos no que diz respeito à disposição de lixo de forma
inadequada que aumentam a condição de vulnerabilidade da sociedade.
“Prazer é estar nos Prazeres”
Foto 2: Grafite na Quadra Poliesportiva do Morro dos Prazeres
Fonte: Maria Julia Reis
A frase acima foi extraída da arte grafitada no posto de separação de material
reciclável instalado na Quadra Poliesportiva no Morro dos Prazeres e se configura como
um cartão postal de boas vindas para aqueles que chegam na localidade.
Situado no bairro de Santa Tereza, o Morro dos Prazeres entre as décadas de 40 e
50, começou a ser povoada, consequência também do movimento urbano decorrente da
expansão industrial que resulta no inchamento das cidades, principal elemento
impulsionador de formação das favelas, portanto, parte da encosta do bairro começou a
ser ocupada por pessoas que não possuíam renda para financiar sua moradia e pelos
moradores vindos de outros pontos da região do centro da cidade – como as primeiras
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remoções do Morro de Santo Antônio4 – quando se iniciou a década de 50 e viram na
ocupação informal um mecanismo de moradia. Como afirma Campos (2005): “Além
do Estado ter tentado impedir a existência de cortiços na área central da cidade, havia o
problema dos altos preços alcançados pelos terrenos disponibilizados que impediam
uma ocupação mais efetiva pelas classes populares”. Atualmente além do Morro dos
Prazeres o bairro de Santa Tereza é composto por outras favelas como Fallet,
Fogueteiro, Coroa, Escondidinho e outros pequenos conjuntos de moradias irregulares e
informais. Embora seja um bairro que desde seus primórdios abrigou famílias de alto
poder aquisitivo o que até os dias atuais pode ser comprovado pela estrutura
arquitetônica, observada, pois ainda é repleto de pequenas e grandes mansões.
Esta localidade além de oferecer para acesso ao bairro, o transporte coletivo
efetuado por ônibus, tem também acesso ofertado através do famoso “Bondinho de
Santa Tereza” como forma de transporte público, o que é muito atrativo,
principalmente, para os turistas, não somente pela configuração geográfica do bairro,
mas pelo charme do tipo de veículo.
Atualmente o Morro dos Prazeres se configurou como ponto turístico por contar
com uma das vistas mais privilegiadas do Rio de Janeiro, permitindo avistar o Cristo
Redentor, a Ponte Rio Niterói, entre outros pontos turísticos da cidade.
Porém, além da questão turística, o campo de pesquisa, como diversas áreas
favelizadas da cidade do Rio de Janeiro, sofreu durante muito tempo os conflitos
advindos da guerra urbana, onde as facções criminosas rivais travavam grande luta em
função do poder do tráfico de drogas, mas em decorrência da nova Política de
Segurança Pública do estado, o Morro dos Prazeres recebeu a instalação de uma
Unidade de Polícia Pacificadora (UPP)5, no entanto, ainda ocorrem pequenos conflitos
resultado dos desdobramentos dessa ocupação pelo Estado, que por vezes afetou
diretamente a pesquisa no que diz respeito à ida ao campo.
4 Localidade existente na década de 50 na região do centro da cidade e uma das primeiras a ser removida
e extinta (AMOROSO, 2009). 5 A UPP-Unidade de Policia Pacificadora configura o elemento de segurança pública do programa
multidisciplinar Rio + Social da Prefeitura do Rio de Janeiro e coordenado pelo Instituto Pereira Passos
em parceria com a ONU-Habitat – Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos.
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O ‘ReciclAção’ como instrumento de educação ambiental
A necessidade de implantar um trabalho de cunho educativo no âmbito ambiental
era visível no Morro dos Prazeres após ocorrido o desastre, então a ONG CEDAPS6 foi
procurada pelo Instituto Brasil Foods7 para desenvolver um projeto que pudesse ajudá-
los na perspectiva do cumprimento da legislação no que diz respeito a questão da
Logística Reversa, onde o gerador de resíduos, deve se comprometer diretamente com a
sua destinação final , ou seja, é um instrumento da Política Nacional de Resíduos
Sólidos, que procura responsabilizar e cobrar do gerador um compromisso com seu
produto poluidor, e com isto além do caráter disciplinador, tem também uma
perspectiva educativa.
Assim, foram realizados vários encontros até a formulação do projeto e primeiro
foram estabelecidos vários diálogos para construção de um Grupo de Trabalho - GT
com os moradores e outros órgãos presentes na localidade como a COMLURB e a UPP.
O Grupo de Trabalho deu corpo ao Projeto e em 2013 o Projeto ReciclAção foi
inaugurado com uma proposta educativa voltada para sustentabilidade e educação
ambiental desenvolvendo atividades educativas voltadas para o descarte de lixo
ambientalmente correto e a coleta seletiva consciente.
O trabalho do ReciclAção se iniciou com a intenção de articular a COMLURB,
como órgão público responsável pela gestão dos resíduos sólidos no município, e que
executa serviço na favela e os moradores que já estavam desacreditados com as ações
públicas na localidade. Primeiramente foram realizados cafés comunitários com os
moradores como uma estratégia de aproximação para explicar a proposta e como o
Projeto seria desenvolvido. Em segunda etapa foi realizado com a COMLURB o mesmo
tipo de encontro e oferecido um café para refletir as necessidades e os desafios do
Projeto.
O foco central foi centrado na perspectiva da educação ambiental e se
configurou como uma forma de integrar conhecimentos de diversos níveis e valores
acerca da questão ambiental. Embora não seja a solução rápida e mágica para os
6 CEDAPS – Centro de Promoção a Saúde – Instituição que presta serviços de consultoria e parceiro do
projeto. 7 O Instituto Brasil Foods foi criado para atender a responsabilidade corporativa da empresa Brasil Foods
(originário a partir da fusão entre as empresas Sadia e Perdigão) e financia projetos sociais.
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problemas ambientais, mas, sim um processo que deve ser gestado de forma contínua e
simultânea ao exercício da cidadania no espaço social (MEYER, 1991). Consideramos
que deve ser vista pela sociedade como um elemento de aprendizagem que tem por
finalidade a valorização de diferentes formas de conhecimentos para a construção de
cidadãos conscientes.
O Projeto ReciclAção realiza ações junto aos moradores, a partir do momento
que sua produção de lixo domiciliar é entregue voluntariamente para o projeto através
do depósito em um dos 50 grandes saco de lixo espalhados na comunidade para
facilitar a recepção e acondicionamento. Já o lixo orgânico e entulhos, os moradores os
depositam nas caçambas e contêineres da COMLURB em um dos pontos específicos da
favela.
Foto 3: Informativo para os Moradores
Fonte: Maria Julia Reis
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As etapas do trabalho do ReciclAção se expressam brevemente em:1- entrega
voluntária dos materiais por parte dos moradores nos Bags, 2-após a coleta e separação
feita pelos catadores do ReciclAção o material é transportado e vendido as cooperativas
de reciclagem parceiras do Projeto (anexo 5) concomitantemente, são realizadas
atividades educativas que norteiam as ações dos moradores, principais agentes do
Projeto.
Foto 4: Parte do material reciclável coletado nos Bag’s
Fonte: Maria Julia Reis
Foto 5: Separação do Material coletado nos Bag’s
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Fonte: Maria Julia Reis
Foto 6: Material Reciclável Coletado e Separado
Fonte: Maria Julia Reis
Atualmente o ReciclAção realiza suas ações educativas focalizando os
moradores como sujeitos da história, portanto, participativos, e estamos acompanhando
no momento atual da pesquisa, algumas ações de extensão do projeto, que envolve os
jovens na perspectiva da formação socioambiental, pois eles têm a possibilidade de
trabalharem em diversas áreas com foco ambiental, um exemplo deste movimento, eles
inventaram o “Camelô Educativo”, uma iniciativa diferente que ao invés vender algo,
transmite informações sobre a temática do lixo e educação entre outras estratégias para
arrecadar mais material reciclável em troca de outros objetos úteis ou de entretenimento.
veis por ingressos para festividades realizadas na comunidade.
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Foto 7: Convite para o “Arraiá Família ReciclAção”
Fonte: Maria Julia Reis
Avaliamos que as possibilidades de participação da sociedade em relação ao
processo de entendimento da questão socioambiental é que eleva a pessoa a sua
condição de sujeito histórico, portanto, o Projeto ReciclAção vem permitindo este
processo e tem nos possibilitado através da pesquisa, entender diversas categorias de
análises implícitas no processo educativo. Assim, consideramos que a capacidade do
projeto em desenvolver uma Educação Ambiental Crítica não é medida somente pela
quantidade de material coletado, mas sim pelo envolvimento deles no processo.
Considerações Finais
Vivemos em uma sociedade voltada para o consumo e cada vez mais com o
individualismo exacerbado que produz e destina incorretamente grande quantidade de
lixo, pois embora no Brasil há quase cinco anos tenha sido sancionada uma política
voltada para destinação final adequada dos resíduos sólidos, ela não se efetiva com a
mesma dinâmica preceituada, o que vem causando grandes danos ao meio ambiente,
portanto, fortalecer a ideia de que o processo de aprendizagem acerca da questão
ambiental deve ser contínuo é fundamental, pois o ser humano precisa se integrar a
natureza como parte dela e não como algo superior, assim ele poderá defendê-la como
seu espaço, tendo noção da importância da preservação do planeta e não somente
explorar seus recursos naturais em função do consumo e acúmulo do capital.
Assim, a partir de toda experiência que estamos vivenciando, consideramos que
a prática educativa voltada para coleta seletiva cujo um dos focos é a reciclagem, é uma
das soluções para resolver a problemática do acúmulo de lixo nas favelas e em outros
espaços, pois além de cumprir o que preceitua a legislação através do princípio dos 3R’s
(Reduzir, Reutilizar e Reciclar), pode também envolver as pessoas num processo de
responsabilidade socioambiental que garantirá melhores condições de vida no planeta.
Analisamos que a prática de Educação Ambiental crítica desenvolvida no
projeto é uma das bases que se caracteriza por sua ação constante e transformadora que
interfere diretamente nos hábitos dos agentes participantes envolvidos, portanto,
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questões referentes ao exercício de cidadania serviram de base para nossa análise do
projeto ReciclAção. Tendo em vista ter sido possível constatar que se desenvolve um
trabalho dinâmico e articulado a fim de incentivar e facilitar a coleta seletiva, como uma
ferramenta que promove a consciência crítica sobre a melhor forma de gestão dos
resíduos sólidos, pois a relação estabelecida pelo projeto ReciclAção com os moradores
vai além dá temática do lixo, pois permite que possam pensar sua comunidade não mais
como um espaço dormitório, mas, sim, como um lugar de moradia, pois o sentido de
pertencimento é efetivamente trabalhado, fazendo com que eles tenham prazer em
residir naquela localidade.
Como aluna de graduação em Serviço Social, enfocamos que nos tem sido
oportunizado através da pesquisa, identificar um espaço em que a Educação Ambiental
é uma ferramenta de transformação, e com isto, nos permitindo refletir sobre as ações
voltadas para a perspectiva de resgate histórico e valorização do sujeito nas ações
também voltadas para o meio ambiente. Foi possível ampliarmos a ideia de que meio
ambiente se configura na integração do ser humano mais meio natural (LEMES e
KAMIMURA, 2009), e nesta mesma linha de pensamento, a percepção de que as ações
nocivas causadas ao meio natural impacta diretamente a sociedade.
O processo de formação do profissional de Serviço Social, a estrutura curricular
do Curso e o acúmulo de conhecimento através da revisão bibliográfica no que diz
respeito às camadas excluídas e marginalizadas pelo sistema político-econômico, social
e cultural atual, vêm sendo fundamentais para pensar a metodologia e desenvolvimento
das ações no espaço de atuação, pois a nossa aproximação e realização da pesquisa no
campo, com base nos aprendizados acadêmicos, tem proporcionado uma grande
experiência com a temática socioambiental.
Enfim, como aluna de Iniciação Científica, enfocamos que a leitura de artigos
acadêmicos, as discussões em grupo, o processo de orientação, o olhar profissional no
campo embasado em toda fundamentação teórica, a construção e reconstrução de ideias,
a elaboração de um relatório baseado nesta experiência, foram bastante significativas
para minha formação. Desse modo, avaliamos que todo estudante de graduação deveria
passar por esta experiência de iniciação científica, que relaciona a teoria aprendida na
graduação com uma prática, especificamente, de pesquisa. Algo que vai além do campo
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de estágio, pois possibilita inserção em um grupo de pesquisa que estuda e teoriza sobre
uma temática de relevância para sociedade.
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