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A CIDADE QUE DESEJAMOS POR UM CRESCIMENTO URBANO QUE GARANTA A QUALIDADE DE VIDA DOS MUNÍCIPES DE MAPUTO FUNDAMENTAÇÃO DA PETIÇÃO Março 2015

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Page 1: A Cidade Que Queremos_Fundamentação Final Março

A CIDADE QUE DESEJAMOS POR UM CRESCIMENTO URBANO QUE GARANTA A QUALIDADE

DE VIDA DOS MUNÍCIPES DE MAPUTO

FUNDAMENTAÇÃO DA PETIÇÃO

Março 2015

Page 2: A Cidade Que Queremos_Fundamentação Final Março

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INDICE

SUMÁRIO .................................................................................................................. 3

INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 4

ENQUADRAMENTO GERAL ..................................................................................... 5

A. CONSTRUÇÃO PLANIFICADA ....................................................................... 8

B. DISTRIBUIÇÃO EQUITATIVA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS NO TERRITÓRIO

DA CIDADE .............................................................................................................. 11

C. CRIAÇÃO E MELHOR DISTRIBUIÇÃO DE NOVOS ESPAÇOS VERDES ... 12

D. PRESERVAÇÃO DO PATRIMÓNIO HISTÓRICO, CULTURAL E

ECOLÓGICO ........................................................................................................... 15

E. LIMITAÇÃO DE HORÁRIOS E DIAS DE CONSTRUÇÃO ............................. 17

F. ACESSIBILIDADE E MOBILIDADE URBANA DE VEÍCULOS E PEDESTRES,

EM PARTICULAR COM MOBILIDADE CONDICIONADA ....................................... 18

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 21

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 21

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POR UM CRESCIMENTO URBANO QUE GARANTA A QUALIDADE DE VIDA DOS

MUNÍCIPES DE MAPUTO

SUMÁRIO

Constatando um decréscimo abrupto da qualidade de vida na Cidade de Maputo, um Grupo de Cidadãos promoveu uma carta dirigida às autoridades do Município e do Governo com o intuito de propor soluções para situações que requerem uma rápida intervenção e condutas de planificação e gestão urbanística adequadas.

Assinada por 9 812 (Nove mil oitocentos e doze) cidadãos, a carta solicita a atenção urgente das autoridades para os desacatos urbanísticos que se acumulam no dia-a-dia em Maputo, que os subscritores consideram comprometer o presente e o futuro da Cidade. Entre vários aspectos, destaca-se a inexistência de planos e acções que contrariem o aumento da poluição do ar e sonora, da ocupação indevida dos passeios, da inviabilidade de circulação, bem como a tendência de sobrecarregar áreas residenciais já superlotadas. A ocupação de espaços verdes e recreativos e o aumento de construções em altura sem o devido equilíbrio são considerados aspectos de grande preocupação. A carta alerta ainda para a perda de identidade da Cidade pela destruição massiva de casas com modelos arquitectónicos que lhe conferem características próprias. Perante o quadro presente, a carta propõe sete medidas urgentes, nomeadamente:

(a) a garantia de equilíbrio das zonas da Cidade para desconcentrar a poluição e o trânsito;

(b) a proibição da ocupação de qualquer jardim e espaço recreativo para outros fins;

(c) o fim da destruição de casas antigas com valor patrimonial; (d) a expansão da Cidade de forma equilibrada para outras zonas,

aproveitando o espaço existente; (e) o encorajamento da construção de edifícios públicos em zonas de

expansão e a proibição de novos prédios no centro da Cidade; (f) a proibição da realização de obras ao fim de semana e no período

nocturno; e (g) a requalificação dos assentamentos humanos informais a favor da própria

população. Para fundamentar a proposta do ponto de vista técnico e jurídico, e redigir um documento correspondente, foi constituído um grupo de trabalho com a participação de técnicos de diferentes áreas. O presente documento constitui um resumo dessa reflexão, que pretende ser um contributo para uma planificação e gestão urbanas centradas no bem-estar, na qualidade de vida dos cidadãos. Em cada proposta apresenta-se, em termos sumários, a situação actual e o que se julga ser necessário fazer.

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INTRODUÇÃO

Nos países como Moçambique, a migração do campo para a cidade ocorre de forma

exponencial, resultando num processo de urbanização espontâneo e desordenado,

o que acarreta múltiplas consequências adversas já visíveis no momento actual.

Tendo a vantagem de este fenómeno estar a decorrer num período em que a

acumulação de conhecimento técnico-científico é já elevada, e em que o

crescimento económico é uma realidade, seria de esperar que as cidades em

Moçambique pudessem, por um lado, evitar os erros cometidos por outras em

momentos históricos distintos, e, por outro lado, imitar os bons exemplos que

existem.

A elaboração de um plano de urbanização que acautele um crescimento urbano

harmonioso é, contudo, uma tarefa de enorme complexidade que exige uma

conjugação articulada de aspectos técnicos com o contexto sociocultural. Embora

possa, por isso, parecer um processo difícil, não deixa de ser um exercício possível

e indispensável quando se pretende um crescimento saudável e virado para o bem-

estar dos cidadãos.

Nos últimos anos, e como consequência do “boom” económico que se tem

registado, as cidades em Moçambique têm enfrentado novos desafios que estão a

pôr em causa a qualidade de vida dos seus cidadãos, a ponto de tornar a sua vida

quotidiana um drama, com perda de tempo que seria bem mais útil se aplicado em

actividades produtivas. Mobilidade, saneamento, poluição do ar e sonora são, entre

muitos outros, aspectos associados ao crescimento que exigem acções

programáticas, técnicas, jurídicas e administrativas de carácter aparentemente

complexo, mas, acima de tudo, indispensáveis para que o impacto do crescimento

se traduza num desenvolvimento harmonioso das cidades em prol da qualidade de

vida dos seus cidadãos.

O presente documento pretende sistematizar preocupações de cidadãos que

pretendem, de forma construtiva, contribuir para uma reflexão sobre a situação

actual e o desenvolvimento futuro da Cidade de Maputo. Trata-se de dar um

contributo às autoridades competentes na expectativa de que estas levem a cabo

um conjunto de acções correctivas e preventivas que se entendem necessárias e

indispensáveis para a melhoria das condições de vida da Cidade.

O exercício que este Grupo de Cidadãos concretiza neste documento baseia-se nas

oportunidades garantidas pelo quadro legal nacional e constitui a materialização do

direito de petição constitucionalmente consagrado, que requer uma resposta por

parte das autoridades competentes. Pretende-se abordar questões que afectam a

Cidade e os munícipes, apresentando os problemas existentes e identificando

possíveis soluções.

É de realçar que de modo algum se pretende subestimar o trabalho que tem sido

desenvolvido pelas entidades municipais. Pelo contrário, pretende esta exposição

Page 5: A Cidade Que Queremos_Fundamentação Final Março

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constituir-se como mais um contributo para o difícil e complexo trabalho de gestão

municipal, tendo como premissa que o desenvolvimento urbano de uma cidade

implica mudanças que integrem harmoniosamente aspectos estéticos, sociais,

económicos, tecnológicos, ambientais, de forma que o que de novo vai havendo não

venha a comprometer a qualidade de vida, e que se promova uma continuidade

baseada em desenvolvimento sustentável.

O referido Grupo de Cidadãos manifesta a sua disposição para colaborar num

espírito voluntário para o melhoramento da situação actual e que já se antevê

perante o visível quadro das acções em curso no Município, não esquecendo que

Maputo não pode ser vista como um caso isolado do País, nem desarticulado das

políticas de desenvolvimento dos diversos sectores representados a nível do

Município e no País em geral.

Em última instância, esta intervenção pretende ser um contributo para uma Cidade

Próspera, Bela, Limpa, Segura e Solidária.

ENQUADRAMENTO GERAL

Um dos objectivos fundamentais do Estado Moçambicano, constitucionalmente

consagrado, é a edificação de uma sociedade de justiça social e a criação de bem-

estar material e espiritual e de qualidade de vida para os cidadãos - alínea c) do

artigo 11 da Constituição da República de Moçambique (CRM).

A Constituição consagra ainda:

– o dever do cidadão de defender e promover a saúde pública, defender e

conservar o ambiente bem como o bem público e comunitário (alíneas e), f),

g) do artigo 45)

– o direito do cidadão de viver em ambiente equilibrado (n.º 1 do artigo 90);

– a responsabilidade do Estado de promover iniciativas para garantir o

equilíbrio ecológico e a conservação e preservação do ambiente visando a

melhoria da qualidade de vida dos cidadãos (artigo 117), o que inclui a

prevenção e controlo da poluição e da erosão (alínea a) do n.º 2 do art. 117)

e o ordenamento do território com vista a uma correcta localização das

actividades e a um desenvolvimento socioeconómico equilibrado (alínea a)

do n.º 2 do art. 117).

A Lei do Ordenamento do Território, Lei n° 19/2007 de 18 de Julho, é um

instrumento igualmente fundamental para assegurar que os cidadãos vivam em

equilíbrio com o meio físico e os recursos naturais. Assim, a planificação territorial

(entendida como o processo de elaboração dos planos que definem as formas

espaciais da relação das pessoas com o seu meio físico e biológico), regulamenta

os direitos e formas de uso e ocupação do espaço físico e impõe a participação dos

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munícipes. Por essa razão, a referida Lei consagrou, no artigo 4, princípios a serem

observados no processo de ordenamento do território, nomeadamente os seguintes:

– o princípio da sustentabilidade e valorização do espaço físico, assegurando a

transmissão às futuras gerações de um território e espaço edificado, e

devidamente ordenado;

– o princípio da participação pública e consciencialização dos cidadãos, através

do acesso à informação, permitindo assim a sua intervenção nos

procedimentos de elaboração, execução, avaliação, bem como na revisão

dos instrumentos de ordenamento territorial;

– o princípio da igualdade no acesso à terra e aos recursos naturais,

infraestruturas, equipamentos sociais e serviços públicos por parte dos

cidadãos, quer nas zonas urbanas quer nas zonas rurais;

– o princípio da precaução, com base no qual a elaboração, execução e

alteração dos instrumentos de ordenamento territorial deve priorizar o

estabelecimento de sistemas de prevenção de actos lesivos ao ambiente, de

modo a evitar a ocorrência de impactos ambientais negativos, significativos

ou irreversíveis, independentemente da existência da certeza científica sobre

a ocorrência de tais impactos;

– o princípio da responsabilidade das entidades públicas ou privadas por

qualquer intervenção sobre o território que possa ter causado danos ou

afectado a qualidade do ambiente e assegurando a obrigação de reparação

desses mesmos danos e a compensação dos prejuízos causados à

qualidade de vida dos cidadãos;

– o princípio da segurança jurídica como garantia de que na elaboração,

alteração e execução dos instrumentos de ordenamento e de gestão

territorial sejam sempre respeitados os direitos fundamentais dos cidadãos e

as relações jurídicas validamente constituídas, promovendo-se a estabilidade

e a observância dos regimes legais instituídos;

– o princípio da publicidade dos instrumentos de ordenamento territorial,

através da sua publicação no Boletim da República, afixação nos locais de

estilo das administrações distritais e das autarquias e por outros meios de

publicidade, para amplo conhecimento dos cidadãos.

O objectivo principal do ordenamento do território é o de assegurar a organização

do espaço nacional e a utilização sustentável dos seus recursos naturais,

observando as condições legais, administrativas, culturais e materiais favoráveis ao

desenvolvimento social e económico do país, à promoção da qualidade de vida das

pessoas, à protecção e conservação do meio ambiente (n.º 1 do artigo 5 da Lei do

Ordenamento do Território).

Como se pode verificar, a participação é simultaneamente um direito e um dever do

cidadão, com vista à criação e ao desenvolvimento de uma sociedade harmoniosa,

ambiental e culturalmente sã.

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Do ponto de vista jurídico, a expansão e urbanização da Cidade de Maputo rege-se

pelo Plano de Estrutura Urbana do Município de Maputo (PEUMM), aprovado pela

Assembleia Municipal de Maputo a 30 de Setembro de 2008, que define os

princípios de planeamento espacial e gestão urbana da Cidade. O PEUMM é a

materialização da Lei do Ordenamento do Território e do seu Regulamento,

aprovado pelo Decreto n.º 23/2008 de 1 de Julho, que consagra, na alínea a) do

artigo 4, o Plano de Estrutura Urbana como um dos instrumentos do ordenamento

territorial ao nível autárquico.

Assim, no Artigo 6, o PEUMM define como princípios: (a) a sustentabilidade e

valorização do espaço físico garantindo um espaço ordenado; (b) a participação

pública nos destinos da Cidade; (c) a igualdade de acesso a terra e recursos; e (d) a

prevenção de actos lesivos ao ambiente.

Estes princípios nortearam a elaboração deste documento, que se baseia na

percepção dos cidadãos associada aos princípios técnicos, científicos e jurídicos

disponíveis. Assim, o documento procura fundamentar os 6 desejos que os

cidadãos signatários da Petição subscrevem, nomeadamente:

- construção planificada;

- distribuição equitativa dos serviços públicos no território da Cidade;

- criação e melhor distribuição de espaços verdes;

- preservação do património histórico, cultural e ecológico;

- limitação de horários e dias de construção;

- acessibilidade e mobilidade urbana de veículos e pedestres, em particular com

mobilidade condicionada;

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A. CONSTRUÇÃO PLANIFICADA

O que se deseja

A garantia de condições para uma Cidade sustentável carece de uma inevitável planificação que acautele a qualidade de vida dos seus Munícipes. De um modo geral, o planeamento urbano deve ter em conta os seguintes aspectos:

– redes de acesso à Cidade (comboios, barcos, etc.);

– espaços públicos ;

– estrutura ecológica da Cidade (mangal, zonas alagáveis, erosão, qualidade

do ar, qualidade da água da baía, cidade baixa e marginal da baía;

– zonas de protecção (aterro de Maxaquene, praia, mangal, zona mais antiga

com edifícios com importância histórico-cultural)

– infraestruturas para serviços urbanos básicos – (drenagem de águas pluviais,

abastecimento de água, saneamento e iluminação pública)

– princípios gerais de utilização do espaço público (educação cívica)

– vias de circulação pedonal condignas e transitáveis

– vias de circulação viária privadas e públicas transitáveis

O PEUUM estabelece os parâmetros que promovem e regem um desenvolvimento

sustentável e dinâmico, no que se refere a actividades económicas, sociais e

culturais.

Existem, tanto a nível nacional como regional, instrumentos que estabelecem

princípios e regras pelos quais as entidades competentes se devem regular e a que

devem obedecer no que se refere ao uso e aproveitamento do solo.

O PEUMM orienta a produção de instrumentos como Planos de Urbanização,

Planos de Pormenor, Regulamentos e Posturas, que estabelecem directrizes

estruturantes para os diferentes tipos de tecido urbano.

Estes instrumentos permitem prever em cada área de actuação o tipo de

infraestruturas necessárias, bem como os índices de ocupação para cada zona.

Todo o desenvolvimento sustentável e dinâmico pressupõe um planeamento prévio,

o que só é possível se as regras estabelecidas forem implementadas. Uma consulta

aos artigos nº 4, nº 6, nº 8 e nº 43 do PEUMM confirmou a existência de legislação

que expressa, por si só, os desejos desta Petição.

O que está a acontecer

A actual situação de Maputo é a de uma Cidade que está, de forma evidente,

desprovida de um plano harmonioso. Não obstante os princípios estarem

sobejamente definidos no PEUMM, é visível a enorme concentração de construção

e serviços num distrito municipal central, a construção desordenada e em áreas

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impróprias e a especulação imobiliária. Assim está bem patente que o processo de

crescimento urbano acontece à revelia do PEUMM.

Os índices de ocupação definidos pelo PEUMM estabelecem a distribuição

percentual entre habitação (plurifamiliar, unifamiliar e social), áreas verdes de

recreação e protecção, equipamentos privados, equipamentos publicos, estruturas

industriais e estacionamento. Neste momento, no entanto, estão a ser atribuídos

talhões em zonas de expansão sem nenhum tipo de infraestruturas básicas, como,

por exemplo, energia, água canalizada, saneamento público, áreas de lazer e

praças. São inúmeros os exemplos de áreas residenciais sem as infraestruturas

regulamentares disponíveis, sendo que, em muitos casos, não haverá mais

possibilidade de recuperação dadas as ocupações efectivas de todo o espaço.

A exagerada concentração de prédios em determinadas zonas, como acontece, por

exemplo, na Polana, em substituição de moradias ou de zonas verdes,

essencialmente destinadas a habitação, está a trazer consequências a vários níveis,

diminuindo drasticamente a saúde e a qualidade de vida dos cidadãos. São

exemplos:

– o aumento do tráfego, tornando mais demorados os percursos e dificultando o estacionamento e a circulação dos vários tipos de meios de transporte, incluindo os transportes públicos;

– o crescimento das chamadas “ilhas de calor urbano” devido à presença aumentada de edificações com recurso a materiais com menor capacidade térmica, e o desaparecimento de áreas verdes, originando aumento da temperatura e redução da humidade relativa do ar;

– o desaparecimento dos jardins em volta de moradias, que contribuíam para a

diminuição do anidrido carbónico;

– alterações do albedo (reflexão das ondas curtas solares) devido às sombras

projectadas pelas construções e à impermeabilização de superfície do solo

que conduz ao aumento da velocidade do escoamento superficial da água da

chuva e maior risco de cheias e enxurradas, como se tem verificado com

frequência (LOMBARDO, M.A. Ilha de Calor nas Metrópoles: O exemplo de

São Paulo – São Paulo: HUCITEC, 1985).

– a criação de corredores de vento, com velocidades aumentadas, causando o

arrastamento de poeiras a grandes alturas e distâncias, aumentando a

poluição e causando o aumento das doenças respiratórias, porque a grande

concentração de utentes de prédios numa mesma zona aumenta a poluição e

a concentração de poluentes tóxicos decorrentes do uso de transportes

pessoais (LOMBARDO, M.A. Ilha de Calor nas Metrópoles: O exemplo de

São Paulo – São Paulo: HUCITEC, 1985). – os carros nos passeios, e equipamentos urbanos que dificultam a mobilidade

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– a diminuição dos espaços e das possibilidades para que as pessoas se desloquem a pé, aumentando o sedentarismo, um dos mais graves problemas de saúde das cidades (Prista e col, 2014).

Este aumento de construções exerce uma forte pressão sobre as infraestruturas enterradas e sobre as estradas e passeios, que não se coadunam com o ritmo de crescimento que se tem verificado, e que nem mesmo têm merecido uma manutenção de rotina eficaz. Os investimentos nesta área são deixados ao Município, que, pela limitação de fundos de que padece, não os faz em tempo oportuno, e que, se alguma vez os fizer, enfrentará sérias dificuldades por falta do espaço físico. Esta situação tem uma enorme repercussão no bem-estar e acaba provocando prejuízos com inundações, erosão, danos em pavimentos, cortes frequentes de energia, rebentamento de esgotos, falta de água potável. Esta falta de harmonia aumenta o stress do cidadão, incrementando o mal-estar e doenças.

Acredita-se, contudo, que as cidades possam ser “pensadas” à luz dos instrumentos disponíveis e das experiências de cidades harmoniosas de várias partes do mundo.

O stress de uma cidade mal planeada é um dos grandes responsáveis pelas doenças cardiovasculares e consequente morte por enfarte ou AVC (YUSUF, S. et al., 2001). Por outro lado, a Cidade vê elevar-se a taxa de recurso ao hospital por doenças respiratórias, com particular incidência nas crianças.

O que se propõe

Com base nos princípios do PEUMM acima citados, e conforme os artigos atrás

referidos que definem os índices percentuais de ocupação, tornam-se necessários,

num prazo imediato:

– a desconcentração imediata da construção ;

– a proibição de novos edifícios em zonas já com evidente sobrecarga;

– o planeamento da expansão da Cidade de forma harmoniosa evitando

densidades indesejáveis;

– a dotação das novas áreas de expansão da Cidade, e antes da atribuição dos

terrenos, de infraestruturas básicas tais como água canalizada, energia

Carros nos passeios – Av. Ahmed Sékou

Touré

Lenin

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eléctrica, saneamento, vias de circulação e espaços com os serviços públicos

diversos previstos no PEUMM.

– a conjugação e harmonização dos planos de saneamento, água,

electricidade, gás a cargo de entidades fora da alçada do Município, de modo

a garantir que os serviços estejam adequados ao crescimento que se deseja.

– a proibição de parqueamento nos passeios.

B. DISTRIBUIÇÃO EQUITATIVA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS NO

TERRITÓRIO DA CIDADE

O que se deseja

É importante promover-se a descentralização dos serviços públicos e/ou qualquer

outro serviço a favor dos munícipes, observando sempre uma distribuição

equilibrada dos meios e recursos em prol de um desenvolvimento de infraestruturas

socioeconómicas e habitacionais coerente.

Trata-se de proporcionar aos cidadãos os serviços básicos de forma que em cada

zona ou bairro não seja necessário percorrerem-se grandes distâncias para se

aceder a serviços como os de farmácia, supermercado, notário, jardim, parque

infantil, recinto de prática desportiva, café, centro de saúde, esquadra da polícia,

entre outros. Este preceituado está contemplado no Capítulo I, artigos 4, 5 e 6 do

PEUMM, constituindo a natureza dos princípios fundamentais daquele instrumento.

O que está a acontecer

Em consequência do crescimento desordenado e sem harmonia, os serviços

públicos aparecem concentrados em zonas específicas, dificultando o acesso,

obrigando a uma concentração de fluxos para determinadas zonas e provocando

um tráfego incompatível com as vias, aumentando a poluição e a dificuldade de

estacionamento, que, por falta de um serviço de transportes públicos condigno,

obriga os cidadãos a resolverem por si os seus problemas de transporte, a ponto de

em algumas zonas o estacionamento se ter tornado verdadeiramente caótico.

O que se propõe:

– que a requalificação do património histórico-cultural não implique a entrega

do mesmo a privados sem que o interesse público seja garantido.

– que as instalações públicas que já não são úteis, como quartéis e outras que

deixaram ou deixem de funcionar, sejam reconvertidas em instalações de

utilidade pública actualmente escassas, como escolas, centros de saúde,

arquivos de identificação, correios, postos de cobrança de impostos,

esquadras, parques, museus, locais de desporto, centros de cultura, etc.

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– que a parceria público-privada tenha como base o interesse público e que se

pare de imediato com a venda de património do Estado.

– que seja obrigatório incluir, nas novas construções, espaços de utilidade

pública.

– que se incentive a construção em áreas desfavorecidas, contribuindo para

uma progressiva urbanização das zonas degradadas ou de elevada taxa de

ocupação em construção horizontal, agravando, por exemplo,

substancialmente as taxas de licença para novas construções em áreas já

saturadas.

– que se junte ao valor da licença de construção, um imposto proporcional

ao valor do investimento, destinado a cobrir a ampliação de estradas,

estacionamentos, redes de água e saneamento, rede eléctrica, etc., sendo

mais elevado nas regiões onde se pretende diminuir o índice de construção

e favorecendo novas regiões da Cidade para diminuir as assimetrias.

C. CRIAÇÃO E MELHOR DISTRIBUIÇÃO DE NOVOS ESPAÇOS

VERDES

O que se deseja

Todas as cidades bem planeadas estão a aumentar o número e a área de zonas

verdes recreativas e de equilíbrio ecológico que permitam aos cidadãos de todas as

idades passear, andar de bicicleta, descansar de forma recreativa e activa. As

zonas verdes, as pistas para patinagem, skate e bicicleta, os parques infantis e

campos desportivos constituem uma prioridade de uma cidade virada para os

cidadãos.

São inúmeros os benefícios de uma cidade que preserve os seus espaços verdes e de lazer activos, nomeadamente das actividades poluentes do dia-a-dia:

– impacto positivo no controle das temperaturas e velocidade dos ventos, reduzindo o efeito causado pelas já mencionadas “bolsas de calor” e pelo efeito de estufa na conservação da humidade, fertilidade e permeabilidade dos solos, permitindo um maior equilíbrio hídrico;

– redução da poluição através do processo de oxigenação, purificação do ar, fixação de poeiras e elementos residuais resultantes do escoamento de águas pluviais e diminuição do risco de inundações;

– impacto positivo na redução de ruídos, servindo como tampão sonoro, o que, sem dúvida, influencia de forma determinante o bem-estar dos cidadãos;

– quebra de monotonia e mais valor estético, físico e psicológico para a vida urbana dos seus habitantes. Permite o desenvolvimento de actividade de carácter social colectivo, e constitui, sem dúvida, um elemento activo na composição da urbe e na caracterização da imagem da cidade (Loboda e Angelis, Áreas verdes públicas urbanas: conceitos, usos e funções).

O PEUMM, no artigo 13 e nos artigos 53 a 56, menciona os critérios e regulamentos a serem adoptados no que se refere a importâncias e equipamentos sociais. Os

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artigos 77 e 78 abordam e caracterizam o tipo de espaços verdes, bem como os usos preferenciais consoante as características das zonas. Esses mesmos artigos referem o tipo de tratamento a ser adoptado para espaços verdes, relatando a importância de que estes se revestem no meio urbano.

O que está a acontecer

Em Maputo ocupam-se cada vez mais zonas verdes e recreativas com edifícios,

reduzindo a possibilidade de as crianças e os adultos, novos e idosos, se recrearam

de forma saudável.

Com base em estudos realizados, crê-se que a área recreativa por habitante esteja

a reduzir drasticamente. Num desses estudos, estimou-se que a área recreativa por

habitante da zona central de Maputo (Prista e col., 2014) atingiu 0,22m2/habitante,

número vinte vezes inferior ao mínimo recomendável. O mais grave é que este

número está a reduzir de forma exponencial, pois tem sido reportado, nos últimos

anos, o desaparecimento de várias instalações recreativas, desportivas e de lazer, e

a ocupação de várias áreas verdes da Cidade.

São exemplos as diversas construções no Circuito Repinga, as intensas

construções nas zonas ecologicamente frágeis e de protecção ambiental, como o

aterro de Maxaquene, as barreiras íngremes, o mangal da Costa do Sol, as

construções no Parque dos Continuadores e no vulgo Jardim dos Madjermanes,

entre muitas outras. Em vez de um equipamento de carácter social e de uso

colectivo, diversos parques de bairros estão a ganhar algum tipo de construção

apenas de carácter comercial.

Construções em locais públicos de lazer: no Parque dos Continuadores e ao lado do Clube Naval

Esta situação teve início há já alguns anos. Por exemplo, no ano 2007, numa carta

dirigida aos Membros da Assembleia Municipal e assinada por dezenas de

profissionais de educação física e desporto, era já manifestada a preocupação pela

ocupação dos espaços recreativos e desportivos da Cidade. De então para cá, não

apenas não se criaram mais espaços como os existentes continuam a reduzir.

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14

Esta situação constitui um dos factores responsáveis pelo aumento da frequência de

inundações na baixa da Cidade, com danos graves para os munícipes e o

deslizamento gradual da encosta já detectado há dois anos.

Os dados disponiveis relativos á Saúde Pública da Cidade de Maputo são já

preocupantes. A percentagem de habitantes de Maputo em idade escolar com peso

excessivo é já de 15,8%, e a taxa de tensão arterial elevada chega a atingir os 66%

(dos Santos e col, 2014a). Na população adulta, 25% dos homens e mais de 50%

das mulheres apresentam peso acima dos limites. As pesquisas cientificas

realizadas em Maputo revelam que 15 anos atrás nenhum destes problemas existia

com a dimensão que hoje apresentam (Gomes e col, 2010).

Tradicionalmente a população infantil e juvenil do nosso País, não obstante a

deficiência de condições higiénico-nutricionais, apresentava-se com elevados níveis

de desenvolvimento motor derivados da sua actividade física quotidiana, sendo,

neste aspecto, muito mais saudável que os seus parceiros de países desenvolvidos

(Prista e col 1997, Saranga e col 2008). Infelizmente, e de forma surpreendente, os

recentes estudos realizados em 2012 e 2013 (Dos Santos et al., 2014a; Dos Santos

et al., 2014b ) revelaram que a redução dos níveis de actividade e aptidão física e

desenvolvimento motor da população de Maputo em idade escolar foi de tal ordem

que ela se tornou menos apta que populações de idade idêntica daqueles países.

Na nossa Cidade é hoje difícil caminhar, respirar ar puro e ver o mar. As nossas

crianças não têm onde brincar e crescer saudavelmente. As zonas mais bem

urbanizadas estão muito pressionadas com arranha-céus constituindo verdadeiras

“paredes” de grande extensão, enquanto muitas áreas necessitadas de

requalificação permanecem sem sofrer melhorias.

O que se propõe

– que a planificação urbana e sua operacionalização adoptem critérios

urbanísticos que garantam o equilíbrio entre a densidade populacional e a

disponibilidade de locais de lazer activo e zonas verdes, incluindo

espaços de desporto, pistas para bicicletas e caminhadas, e jogos

recreativos.

– que nas praças, parques e jardins, os sistemas construtivos adoptados

sejam mais adequados e interfiram o menos possível na paisagem

urbana.

– que se pare imediatamente com a ocupação de espaços verdes e recintos

desportivos e se restituam os que forem possíveis, ou se encontrem

espaços alternativos de compensação.

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D. PRESERVAÇÃO DO PATRIMÓNIO HISTÓRICO, CULTURAL E

ECOLÓGICO

O que se deseja

A identidade de uma população faz-se de diferentes maneiras. Uma delas é através

das características físicas das cidades e vilas que testemunham e simultaneamente

lhes conferem a sua história e cultura. A modernização de uma cidade não pode ser

feita pela destruição do que é velho e colocação de edifícios supostamente

modernos mas que, não respeitando o contexto, descaracterizem a cidade. Embora

o novo seja inevitável e desejável, edifícios, restaurantes, cinemas, igrejas e muitos

outros edifícios que fazem parte da história e conferem características únicas a uma

cidade têm de ser preservados. Assim se respeita e valoriza a cultura e a história de

uma população.

Os edifícios antigos constituem uma riqueza que não deve ser destruída, mas sim

reabilitada. De outra forma, as cidades tornam-se locais sem identidade e sem

características próprias. Deseja-se o respeito, a preservação e a promoção do que

tem relevância histórico-cultural na Cidade de Maputo.

A Lei de Protecção do Património Cultural Moçambicano, Lei n.º 10/88 de 22 de

Dezembro, referente à classificação dos bens culturais imóveis, consagra alguns

bens patrimoniais a serem preservados, como abaixo se descreve:

– edifícios de valor histórico que testemunham a convivência no nosso espaço

territorial de diferentes culturas e civilizações, tais como as feitorias árabes,

templos indus, mesquitas, igrejas e capelas, antigas fortalezas e outras novas

obras de defesa, edifícios públicos e residências, do tempo de implantação

colonial e da época dos prazeiros ou das companhias majestáticas;

– edifícios de particular interesse arquitectónico;

– as zonas antigas das principais cidades.

Nos termos da referida lei, para além de o Estado impor a sua preservação, existe a possibilidade de se conceder apoio para conservação e restauro. O PEUMM - no artigo 1, ponto 17, e no artigo 15 -, faz menção aos cuidados com o património histórico-cultural, o que parece constituir um ponto de partida

O que está a acontecer

Dezenas destes edifícios já foram destruídos e muitos mais se preparam para o ser.

Esta ausência de cuidado tem-se manifestado na construção desregrada a que se

assiste um pouco por toda a Cidade. Dependendo da nacionalidade e do gosto do

empreiteiro ou proprietário, vão surgindo novos edifícios que não respeitam critérios

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de coerência arquitectónica contextual. Constroem-se edifícios de características

estéticas muito diferentes que tornam a Cidade literalmente inestética.

Outro fenómeno a que se tem assistido é a transformação de belas moradias em

escritórios, com a alteração das fachadas através da colocação de perfis metálicos

e vidros, o que cria uma paisagem “fria”, sem estética e desgarrada da restante

área. Sendo Maputo uma cidade enquadrada com o mar, o que lhe dá uma beleza

singular, assistimos já a um proliferar de construções que de forma desmedida

taparam o mar da vista da Cidade. Isto retirou beleza e qualidade de vida, que se

medem pela satisfação dos múltiplos sentidos do ser humano. A vista da zona mais

antiga da Cidade está agora a ser cortada com edifícios de exagerada altura,

prejudicando o turismo.

O que se propõe

– a suspensão imediata da autorização de demolição de casas antigas de arquitectura representativa duma certa época histórica, incluindo a demolição já autorizada;

– a suspensão imediata da autorização de ocupação da orla marítima com edifícios sem que haja um plano de urbanização aprovado que defina a finalidade do uso do espaço da marginal;

– a suspensão imediata da autorização de construções que vedem a vista para o mar;

– o cumprimento das recomendações em relação à zona histórica da Cidade conforme o Plano de Requalificação da Baixa, e a revisão das recentes autorizações, com o cancelamento das que sejam um atentado ao mesmo;

– a criação de zonas de lazer junto do mar, devidamente regradas; – uma planificação urbana que leve em conta o mar como riqueza estética e

cultural da Cidade.

Um crescente numero de casas são demolidas para dar lugar a prédios alterando a fisionomia da zona e/ou apagando a identidade da Cidade.

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E. LIMITAÇÃO DE HORÁRIOS E DIAS DE CONSTRUÇÃO

O que se deseja

As ciências de saúde há muito que identificaram uma relação entre poluição sonora

e saúde publica (Dzhambov e Dimitrova, 2014; Verbeek et al, 2014). Existem

consensos sobre o nível de intensidade tolerada pelo ser humano, que, variando

consoante os países e organizações, estão estabelecidos em 45/55 decibéis para

as zonas sensíveis e 55/65 decibéis para zonas mistas. Porque acima desse valor

se considera um atentado à saúde pública, a regulamentação do ruído é hoje

essencial em muitas cidades do mundo, obrigando a indústria a procurar soluções

de diminuição do ruído de toda a maquinaria envolvida nos transportes, na

construção e na indústria transformadora.

A agressão provocada pela poluição sonora tem diversas consequências. A

perturbação do sono e a irritação podem impedir a concentração e aprendizagem, e

criar um estado de cansaço e tensão que pode afectar significativamente o sistema

nervoso, o sistema endócrino e o sistema cardiovascular, tendo repercussões

crónicas de elevado impacto (Saris et al., 2014).

No caso da Cidade de Maputo, a Postura Municipal sobre a Poluição Sonora,

aprovada pela Resolução n.º 34/AM/2001 de 31 de Maio, estabelece restrições

diversas relativas à poluição sonora, reconhecendo-se que “o som, quando emitido

acima de certos limites de intensidade e frequência, transforma-se em ruído” bem

como que “é justo que o cidadão exija condições que lhe permitam a necessária

estabilidade emocional, equilíbrio e repouso para recuperação de energias”. O

equilíbrio sonoro no ambiente é, pois, um direito reconhecido ao cidadão da nossa

Cidade.

A referida Postura prevê horários, níveis sonoros e multas, definindo regras de

conduta para veículos, obras e actividades comerciais de lazer que defendem o

cidadão de agressão ruidosa.

O que está a acontecer

De forma súbita, a Cidade de Maputo viu crescer exponencialmente a poluição sonora. Se bem que tal situação seja, em parte, uma inevitável consequência do crescimento urbano, existem medidas que, a serem tomadas, a exemplo de outras cidades do mundo, reduzirão substancialmente o problema.

Não se conhecem estudos sobre a poluição sonora de Maputo, mas qualquer cidadão sente o impacto da mesma e conhece as suas fontes, nomeadamente:

– barracas com música a volumes elevados; – discotecas e tendas de eventos em locais residenciais e sem isolamento

acústico; – automóveis com níveis de ruído não permitidos

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– aparelhagens musicais em automóveis a níveis agressivos (incluindo carros escolares);

– obras que utilizam aparelhos com elevados níveis de ruído fora das horas normais de trabalho.

O recurso à Policia Municipal, entidade encarregue de controlar a poluição sonora, está disponível. Contudo, vezes sem conta, a própria Policia se declara impossibilitada de agir, pelo facto de serem emitidas por entidades competentes autorizações que atentam ao preceituado na lei, como, por exemplo autorizações para realização permanente de obras e espectáculos fora de horas consideradas normais, bem como discotecas ao ar livre em zonas residenciais.

Uma amostra ad hoc realizada recentemente (não documentada) mostrou que o ruído em algumas ruas oscilava entre 72 e 95 decibéis, de forma prolongada, o que constitui um nível muito acima do tolerável. No caso de algumas obras em zonas residenciais, este nível de ruído mantém-se no período nocturno, e aos sábados, domingos e feriados. Isto constitui um verdadeiro atentado à saúde pública.

O que se propõe

– A proibição da emissão de autorizações para trabalhos relacionados com construção fora das horas normais de trabalho de forma permanente.

– a fiscalização permanente do ruído provocado por veículos motorizados; – a proibição de discotecas e casas de eventos que não tenham isolamento

acústico; – o estabelecimento de um horário racional para autorização de obras e outras

actividades que produzam ruído em zonas residenciais (julga-se razoável um horário das 8 às 18 horas, de segunda a sexta-feira);

– a aplicação da legislação existente que, no geral, se mostra bastante actual.

F. ACESSIBILIDADE E MOBILIDADE URBANA DE VEÍCULOS E

PEDESTRES, EM PARTICULAR COM MOBILIDADE

CONDICIONADA

O que se deseja

A mobilidade numa cidade constitui um dos elementos essenciais das suas

características. Deseja-se um acesso facilitado aos diversos pontos da Cidade, bem

como mobilidade no seu interior, tanto para veículos como para pedestres, entre os

quais pessoas portadoras de necessidades especiais. Isso requer um sistema de

transportes públicos, vias de circulação automóvel e pedestre funcionais, racionais e

harmonizadas.

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O que está a acontecer

A mobilidade na Cidade de Maputo está a perder qualidade de forma abrupta. Fruto do acentuado aumento do número de viaturas e da densidade de algumas zonas, os passeios foram transformados em lugares de estacionamento, inviabilizando a circulação dos peões. A agravar esse quadro, assiste-se ainda à colocação de infraestruturas urbanas nos passeios, tais como quiosques construídos nos passeios junto às paragens de autocarros sem respeitar o espaço para a passagem de peões. São também muitos os casos de empresas que escavam os passeios, deixando buracos expostos por demasiado tempo após a conclusão das obras, muitas vezes em estado lastimável. Por outro lado, a Cidade neste momento não está preparada para aceitar pessoas portadoras de necessidades especiais, apesar de existir o Decreto nº 53/2008, de 30 de Dezembro, que fornece directrizes claras sobre como adaptar edifícios e vias públicas.

A aplicação das regras aprovadas em diversos regulamentos torna-se difícil pela forma desordenada como acontece o crescimento da Cidade e pelo comportamento dos munícipes que tendem a resolver as dificuldades de forma imediata.

Esses comportamentos pouco urbanos não têm sido tomados em conta de forma abrangente pelas autoridades municipais e instituições de educação cívica que inculquem respeito pelo bem público e contribuam para uma mudança de comportamento. Assim, são necessárias medidas educativas e de repressão que não são de fácil operacionalização, agravadas pelo facto de os referidos maus comportamentos se terem tornado hábitos que parecem aceitáveis pelas autoridades. Parquear no passeio, fechar cruzamentos, passar com sinal vermelho, não respeitar passadeiras e tantas outras são hoje práticas da maioria dos cidadãos, sem que haja, da parte das autoridades policiais, uma atitude educadora e normadora.

Viaturas no passeio, obras, lixo e outras construções ocupam os passeios e inviabilizam a mobilidade dos pedestres

Lixeira - obstruindo os passeios – Av. Vladimir

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O que se propõe

Não obstante a legislação, a Cidade viu o sistema de mobilidade inviabilizado. Seja

a pé, em carro particular ou em transporte público, piorou drasticamente a

mobilidade como resultado de um conjunto de factores de complexa interacção.

Assim propõe-se:

– a aplicação da lei e das posturas existentes, nas diversas áreas;

– o desenvolvimento de um programa efectivo de educação cívica que inclua

acções pedagógicas e administrativas envolvendo a Policia Municipal,

organizações da sociedade civil, escolas e universidades, que deverão ser

chamadas a educar e a dar o exemplo. Estes programas não se devem

resumir a campanhas, mas contemplar a inclusão de matérias no ensino

normal a todos os níveis, com maior incidência nos mais jovens.

– a exigência de padrão de qualidade nas obras realizadas em áreas de uso

público.

– a criação de transportes públicos cómodos e em consonância com o nível de

vida dos munícipes

– a criação de espaços apropriados para o estacionamento de veículos em

locais de concentração de serviços, respeitando-se as normas de

urbanização na atribuição de terrenos para construção.

– medidas de incentivo ao estabelecimento de escritórios, residências e

serviços públicos fora das zonas saturadas.

– a desobstrução dos passeios destinados à circulação de pedestres (retirada,

para local apropriado, de veículos estacionados, vendedores de rua e

infraestruturas construídas sobre os passeios).

– incentivo à criação de zonas de comércio (meio-informal) nos bairros mais

afastados, de modo a desconcentrar o enorme número de vendedores que

afluem ao centro da Cidade, por exemplo usando taxas diferenciadas

consoante as zonas, e bem elevadas onde se pretende diminuir a sua

presença.

– criação de dias de mercado para produtos específicos em ruas que até

podem ser encerradas ao trânsito em dias marcados;

– a exigência de uma largura mínima de 2,5 m para passeios pavimentados em

zonas urbanizadas, eventualmente sacrificando a dimensão dos talhões

atribuídos ou a serem atribuídos;

– maior fiscalização das condições em que são deixadas as áreas públicas

depois de obras realizadas por empresas terciarizadas.

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CONCLUSÃO

Fica evidente que o crescimento da Cidade de Maputo está a realizar-se sob uma

forte pressão de necessidades e interesses imediatos que não estão a ter em conta

as normas urbanisticas já existentes, o conhecimento relativo ao desenvolvimento

urbano harmonioso. Como consequência, a qualidade de vida da nossa Cidade está

a conhecer, em múltiplos aspectos, uma deteriorização que recái na saúde e bem

estar dos cidadãos. Reconhecendo a tarefa como de elevada complexidade, a

situação actual carece de uma intervenção urgente e corajosa cuja responsabilidade

recái sobre os cidadãos e instituições que tem contudo de ser liderados pelas

estruturas Municipais e Governamentais.

REFERÊNCIAS

Conselho de Ministros, Decreto Nº 53/2008 de 30 de Dezembro, I Série – Nº 52. Regulamento de Construção e Manutenção dos Dispositivos Técnicos de Acessibilidade, Circulação e Utilização dos Sistemas de Serviços e Lugares Públicos à Pessoa Portadora de Deficiência Física ou de Mobilidade Condicionada.

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