a bruxa que não quis mais ser bruxa

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A bruxa que não quis mais ser bruxa O texto que se segue é um conto de As mais belas histórias Vol. 4. A lua cheia iluminava o céu , caminhando sobre os telhados escuros das casas. Era uma noite de sexta-feira, gelada e clara. Noite de morcegos, duendes, bruxas e fantasmas. A lua cheia iluminava o céu, caminhando sobre os telhados escuros das casas. De quando em quando, uma sombra rápida passava diante da cara redonda da lua Eram as bruxas que se dirigiam para os seus esconderijos. Passavam sós ou em grupos, ou em leiras, e, ao silvo do vento, misturavam o vassouras em que iam montadas e os rumores abafados de suas vozes. Em último lugar passou Tobe: ia fortemente agarrada em sua vassoura e, em su arqueadas, ia seu gato preto. Era impossível imaginar-se uma bruxa mais feia. Usava um grande chapéu pontiagudo. Seu nariz era adunco e quase tocava o queixo no, descarnado e curvo. A todo momento Tobe dizia com sua voz áspera: — Arre! Estou farta de ser bruxa! — Cuidado — disse-lhe o gato. Não que distraída e segure-se bem. Entretanto, Tobe estava tão entretida que quase se chocou com a lua. Abaixou o pau de vassoura e desceu como uma echa. — Deve ser tão bom ser querida de alguém! continuou Tobe. — Querida? — perguntou o gato assombrado. — Sim! gostaria de ser uma avòzinha com muitos netos, ser gorda, usar óculos tricô. — Porque tudo isso hoje? — ronronou o gato.

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Histórias infantis

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A bruxa que no quis mais ser bruxa

A bruxa que no quis mais ser bruxa

O texto que se segue um conto de As mais belas histrias Vol. 4.

A lua cheia iluminava o cu , caminhando sobre os telhados escuros das casas.

Era uma noite de sexta-feira, gelada e clara. Noite de morcegos, duendes, bruxas e fantasmas.

A lua cheia iluminava o cu, caminhando sobre os telhados escuros das casas.

De quando em quando, uma sombra rpida passava diante da cara redonda da lua. Eram as bruxas que se dirigiam para os seus esconderijos.

Passavam ss ou em grupos, ou em fileiras, e, ao silvo do vento, misturavam o rudo das vassouras em que iam montadas e os rumores abafados de suas vozes.

Em ltimo lugar passou Tobe: ia fortemente agarrada em sua vassoura e, em suas costas arqueadas, ia seu gato preto.

Era impossvel imaginar-se uma bruxa mais feia.

Usava um grande chapu pontiagudo. Seu nariz era adunco e quase tocava o queixo fino, descarnado e curvo. A todo momento Tobe dizia com sua voz spera:

Arre! Estou farta de ser bruxa!

Cuidado disse-lhe o gato. No fique distrada e segure-se bem.

Entretanto, Tobe estava to entretida que quase se chocou com a lua. Abaixou um pouco o pau de vassoura e desceu como uma flecha.

Deve ser to bom ser querida de algum! continuou Tobe.

Querida? perguntou o gato assombrado.

Sim! gostaria de ser uma avzinha com muitos netos, ser gorda, usar culos, fazer tric.

Porque tudo isso hoje? ronronou o gato.

Estou farta de ser bruxa e de assustar os meninos No quero continuar afazer bruxarias e outras coisas feias e ms.

Nessa hora o gato, malcriado, perguntou-lhe:

Ento, vai deixar de ser m?

nisso que ando pensando disse a bruxa.

Deu um suspiro to triste que fez o gato estremecer.

Ai! Se ao menos tivesse uma netinha bem bonita! Ah! trocaria todo o meu poder para ser uma avozinha como as outras!

Loucuras! disse o gato, soltando um miado a um cometa que passava perto deles, lanando chispas.

O pior de tudo que no mundo deve haver uma poro de meninos e meninas que desejam ter uma avozinha. Que contentes ficariam, se eu chegasse de mansinho e lhes dissesse:

-Sou a avozinha de vocs!

O gato lanou um miado de riso.

Cale a boca ordenou-lhe Tobe. Ento serei to feia que ningum h de querer-me?

- o que quero dizer. A sua figura para matar de medo o menino mais valente.

-Meu nico defeito ser muito magra, respondeu Tobe. Se engordasse um pouco, trocasse as minhas roupas pretas, to feias, por outras claras e mais elegantes, mudaria muito de aspecto. Sou uma bruxa por fora. Por dentro sou uma avozinha encantadora.

-Deixe de tolices, Tobe, e olhe bem para onde vamos, disse o gato. Neste passo vamos j bater no cho.

Tobe corrigiu a posio de sua vassoura e dirigiu-a para a terra. Passaram roando a copa das rvores.

As cabaas dependuradas em todas as janelas olhavam a bruxa passar com seus olhos de fogo. E piscavam.

Afinal Tobe passou roando nos trigais amarelecidos.

-Vamos para cima, Tobe. J lhe disse que nenhum menino quer ter uma av bruxa.

-A avozinha no nenhuma bruxa disse uma criana.

Ao ouvir aquela voz macia e suave o gato deu um salto to grande que fez a bruxa cair no cho.

Por sua vez, a bruxa estava surpreendida com o que acabara de ouvir.

Votou a cabea e descobriu, perto dela; mirando-a entre as espigas de trigo, uma menininha duns seis anos. Levantou-se depressa e aproximou-se dela.

Quem voc? - perguntou menininha. Como veio parar aqui? Quem voc? perguntou menininha. Como veio parar aqui?

A menina sentou-se entre os talos de trigo e disse sorrindo:

Estava esperando a senhora, avozinha. H tanto tempo que minha tia me dizia que a senhora havia ido para o cu. Hoje, resolvi sair de casa para procur-la; por isso, vim at aqui.

Mas no sou sua avozinha, menina! disse-lhe Tobe.

Nessa hora o gato arranhou-lhe fortemente a mo e a impediu de continuar a falar. A menininha continuou:

No diga isso. No me queira enganar. Sim, eu sei! A senhora a minha avzinha mesmo. A senhora no se lembra mais de mim, porque eu tinha s trs anos quando foi para o cu. Mas a senhora era to boa para mim que eu nunca a pude esquecer, A senhora mesrno a minha avozinha, a minha avozinha querida!

Vovzinha! Vovozinha!

Mas, ia Tobe dizendo.

De novo o gato deu-lhe outro arranho e miou alguma coisa que s as bruxas entendem. Mas deve ser isto:

No seja tola, Tobe, aproveite esta ocasio. Se quer ter uma neta, fique com esta. a nica que no lhe tem medo.

Tobe ficou um pouco pensativa, e depois disse:

verdade, no me esqueci de Voc Joaninha.

No me chamo Joaninha, avozinha, sou a Paquita.

Ah! verdade! disse a bruxa, perdoe-me, confundi Voc com sua irm.

No tenho nenhuma irm. Joaninha minha prima.

verdade! declarou Tobe, que, no podendo fazer suas feitiarias diante da menina, no acertava.

E seus pais? morreram?

No, avzinha. Eles se foram tambm para o cu, como a senhora, no se lembra? Eu fui morar com a Maria Coroa que me obrigava a pedir esmolas para ela o dia inteiro. Se no arranjasse muito dinheiro, apanhava.

Sim, sim, compreendo o que aconteceu com Voc, Paquita.

Mas, quando a senhora foi para o cu, no tinha este chapu feio, avzinha.

Tobe tirou o chapu e olhou bem para a menina.

Era pequena e muito magrinha. Tinha as duas tranas muito apertadas e o rosto cheio de sardas. No era bonita, mas muito simptica.

A bruxa sentia naquele momento alguma coisa diferente no seu corao. Estava calada, sem poder falar.

Como estou contente, avozinha! exclamou Paquita. Agora, eu nunca mais volto para a casa de Maria Coroa, no verdade?

No, no disse Tobe, montando na sua vassoura e voando com Paquita.

Passaram por sobre os trigais amadurecidos e os montes de feno, chegando ao Bosque das Amendoeiras.

Pararam porta da casinha de Tobe, que era bem no meio do bosque. Era feia, inteiramente cheia de teias de aranha. Os morcegos se aninhavam nos buracos das paredes enegrecidas pelo fogo. As janelas e as portas caam de velhas.

Que casa to feia! exclamou Paquita. Por que no compra uma nova, avzinha?

Sim, posso fazer uma num momento, respondeu Tobe.

Pegou de um grande caldeiro e o encheu de gua mgica, ervas de mil qualidades, peles de serpente, unhas de lince, espinhas de cobra e outras coisas mais.

Que vai fazer? perguntou Paquita, que comeava a assustar-se. Ser que a senhora uma bruxa?

No, no, estava preparando uma coisa. Mas talvez Voc no goste

De tudo de que a senhora gosta, eu gosto muito, avzinha disse Paquita, aproximando-se do caldeiro para ver o que havia dentro.

Muito assustada, Tobe a afastou, pois, se a menina provasse uma s gota daquele lquido mgico, transformar-se-ia imediatamente em um morcego.

Voc quer comer um pouco de mel, biscoitos e leite?

Sim, sim, exclamou Paquita. D-me po com mel e leite. E milho para fazer pipocas no fogo, a senhora tem, avozinha?

Tobe assobiou e seu gato saiu correndo, voltando logo com todas as coisas que a menina havia pedido. Deixou tudo num canto e veio ficar perto da menina que o acariciou. O gato ronronou muito satisfeito. Tambm a ele era simptica a menina.

Tobe arranjou logo a mesa, mas no tinha com que cobri-la.

A senhora muito pobre, avozinha? Agora, eu trabalharei para a senhora.

No, no sou pobre, respondeu Tobe, pensando nos sacos cheios de moedas de ouro. Amanh compraremos tudo quanto falta.

Paquita ps o leite numa canequinha e pediu uns biscoitos, po e mel, e foi assentar-se junto ao fogo. Comeu depois muitas pipocas de milho arrebentadas na manteiga.

Que feliz que eu sou! exclamou, acariciando o gato. Posso cham-lo de Ronrom?

Desde logo, miou o gato, muito contente.

Pois hei de cham-lo Ronrom, e, amanh, avozinha, limparemos bem a casa, arranjaremos tudo e poremos fora esses maus morcegos.

...os morcegos sairam voando com os seus filhotes e se meteram dentro dum tronco velho, bem longe dali.

Ao ouvirem isto, os morcegos saram voando com os seus filhotes e se meteram dentro dum tronco velho, bem longe dali.

Est bem, minha netinha, sorriu Tobe. Agora, vamos dormir.

Paquita deitou-se numa esteira, cobriu-se com uma toalha e dormiu.

Tobe aproveitou esses momentos e comeou a dar arranjo nas suas coisas de bruxa. Amontoou os caldeires, os objetos mgicos de toda espcie, guas maravilhosas, espinhelas de cobras, ps de cabra, etc.

Ronrom a ajudava muito contente, pois, afinal, tambm ele ia deixar de ser gato de bruxa.

Bem amontoadas as coisas, fizeram uma grande fogueira e queimaram tudo, at no restar sinal de coisa alguma de bruxaria.

Deitaram-se depois, mas Tobe no conseguiu dormir.

No outro dia, bem cedinho, saram os trs a caminho da cidade. Compraram cortinas, bateria de cozinha, mesas, camas, armrios, louas e um sem-fim de coisas que custaram mais de mil moedas de ouro. Compraram muitssimos brinquedos e vestidos para Paquita, uma

coleira preta com botes dourados e guizos para Ronrom e um vestido preto com bolinhas brancas para Tobe.

Depois, em trs carros carregados at em cima, dirigiram-se para a casinha do bosque.

Carpinteiros, bombeiros, pintores e jardineiros os acompanharam a casa, transformando-a inteiramente.

No dia seguinte, encomendaram uma vaquinha para dar leite, doze galinhas para pr ovos e criar pintinhos, um carneirinho e um cabritinho para brincar com Paquita.

Em uma semana, a antiga casa da bruxa se tornou a mais linda casa que se pode imaginar. Os morcegos, agora, passam de longe, olham invejosos para l e dizem:

Tudo por causa daquela menina, vejam s!

E os sapos decerto os sapos de outras bruxas passam por ali, do volta casa e dizem, piscando, piscando:

Como est tudo mudado, nem parece que era a casa de uma bruxa!

E Tobe?

Ah! Ningum a reconheceria. Anda sempre vestida de preto com pintinhas brancas, e, aonde vai a netinha, vai atrs.

Esqueceu-se por completo de que houve um tempo em que voava montada num cabo de vassoura.

Mas, quando chega uma certa noite do ano, Tobe pe uma cabaa na janela, com uma luz dentro, de forma que se vejam os olhos, o nariz e a boca bem abertos, bem abertos.

Por que ser?

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