a borgia de victor hugo nas mãos de donizetti

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A Borgia de Victor Hugo nas mãos de Donizetti A recente produção de Les Misérables de Victor-Marie Hugo (1802-1885) para o cinema me motivou a trazer para o blog um exemplo de sua contribuição, ainda que indireta, ao mundo da ópera. Inspirada nas páginas do grande escritor francês nasceu Lucrezia Borgia, com prólogo e dois atos, de Domenico Gaetano Maria Donizetti (1797-1848). Donizetti, uma máquina de produzir óperas Quando Donizetti estreou no Teatro alla Scala (Milão, Itália), em 1830, com Anna Bolena, ele já tinha a metade de suas 70 óperas escritas – todas compostas antes do seu 46º aniversário. Com esse trabalho, o mestre ganhou mais autonomia dentro do dominante estilo rossiniano e seu nome se disseminou ao redor do mundo. No mesmo palco, L’Elisir d’Amore (1832) e Lucrezia Borgia (1833) logo nasceriam. Dois anos mais tarde, Donizetti concluiria a sua mais famosa ópera trágica: Lucia di Lammermoor. Victor Hugo, o inspirador

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Page 1: A Borgia de Victor Hugo nas mãos de Donizetti

A Borgia de Victor Hugo nas mãos deDonizetti

A recente produção de Les Misérables de Victor-Marie Hugo (1802-1885) para ocinema me motivou a trazer para o blog um exemplo de sua contribuição, aindaque indireta, ao mundo da ópera. Inspirada nas páginas do grande escritorfrancês nasceu Lucrezia Borgia, com prólogo e dois atos, de Domenico GaetanoMaria Donizetti (1797-1848).

Donizetti, uma máquinade produzir óperas

Quando Donizetti estreou no Teatro alla Scala (Milão, Itália), em 1830, comAnna Bolena, ele já tinha a metade de suas 70 óperas escritas – todascompostas antes do seu 46º aniversário. Com esse trabalho, o mestre ganhoumais autonomia dentro do dominante estilo rossiniano e seu nome se disseminouao redor do mundo. No mesmo palco, L’Elisir d’Amore (1832) e Lucrezia Borgia(1833) logo nasceriam. Dois anos mais tarde, Donizetti concluiria a sua maisfamosa ópera trágica: Lucia di Lammermoor.

Victor Hugo, oinspirador

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A tragédia Lucrèce Borgia de Victor Hugo tinha sido um sucesso em Parisapenas seis meses antes da estréia da obra homônima de Donizetti. A censuraitaliana ameaçou proibir a ópera, argumentando que a protagonista não apenasera a filha de um papa, mas também iria se apaixonar pelo seu próprio filho –que ao final ela iria matar por engano. No final das contas, a ópera foiautorizada, desde que as vítimas de Lucrécia morressem fora de cena e oscaixões não fossem colocados no palco, conforme o texto original.

Romani, o maior doslibretistas na primeirametade do séc. XIX

A crítica do jornal Gazzetta Privilegiata di Milano à ópera foi bastantesevera (“pouco mais do que medíocre”), logo após sua estréia, em 26 dedezembro de 1833. O público, por outro lado, não tinha essa opinião: Lucreziarecebeu 33 apresentações na primeira temporada. A obra tinha sido mais umadaquelas partituras escritas às pressas, pois o compositor tinha poucos diasentre o libreto ficar pronto e os ensaios.

Segundo alguns autores, o libretista Felice Romani (1788-1865) – parceiro deoutros mestres como Gioacchino Rossini (1792-1868), Vincenzo Bellini(1801-1835) e Giuseppe Verdi (1813-1901) – aceitou a contragosto a sugestãode Donizetti para adaptar a Lucrèce de Victor Hugo, temendo os problemas coma censura. Romani teria chegado, inclusive, a parar o trabalho para produziroutro libreto para o compositor Saverio Mercadante (1795-1870) – sobre apoetisa grega Safo de Lesbos. Essa idéia teria sido reprovada pela primadonna do Scala da época, Henriette Méric-Lalande (1798-1867), fazendo com queo libretista voltasse a escrever Lucrezia.

Mercadante e sua

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Safo foram trocadospor Donizetti e aBorgia

Outras fontes informam, porém, que, inicialmente, Mercadante tinha sidocontratado pelo Scala para compor com Romani a ópera sobre Safo para aberturada temporada, mas este projeto foi abortado por problemas na gestão doteatro. Somente a partir de então, Donizetti teria sido contratado paracompor uma nova ópera baseada na vida de Lucrécia Borgia, diante do sucessograndioso da peça de Victor Hugo em Paris, mantendo Romani como libretista.

Méric-Lalande, a primeiraLucrécia

Seja como for, a boa acolhida da ópera na Itália fez com que ela chegasse àFrança em 1840, mas já enfrentando um novo problema: o próprio Victor Hugo. Oescritor não era contrário à adaptação de sua obra, mas acusou o tradutorfrancês do libreto de ter plagiado o seu texto. Hugo venceu a causa nostribunais, assegurando os seus direitos autorais. Com isso, a ópera teve desofrer várias modificações na música e no libreto: estreou em Versalhes comoNizza de Grenade (1842) e novamente em Paris como La Rinnegata (1845), com aação passando na Turquia.

Sutherland, a maiorintérprete de Lucrécia dosúltimos tempos

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A censura italiana voltou à cena, dessa vez com a influência de descendentesda família Borgia no Vaticano para prejudicar a ópera em sua nova temporadana terra natal. Com isso, em Florença passou a se chamar Eustorgia da Romano;Alfonso, Duca di Ferrara, em Trieste; Giovanna I di Napoli, em Ferrara; eElisa da Fosco, em Roma.

Lucrezia teve poucas produções na primeira metade do século XX. Da década de1970 em diante, as sopranos Leyla Gencer (1928-2008), Beverly Sills(1929-2007) e, especialmente, Dame Joan Sutherland (1926-2010) resgataramdefinitivamente a ópera.

Lucrécia revelou Caballéinternacionalmente

Uma apresentação em forma de concerto no Carnegie Hall revelou o nome deMontserrat Caballé, que substituiu Sutherland com indisposição, trazendo acantora espanhola para o primeiro plano do estrelato lírico. Lamenta-se nãoter Maria Callas (1923-1977) gravado Lucrezia integralmente. Unindodeterminação, temperamento forte e fragilidade, trata-se de um dos papéisidealmente talhados para a personalidade cênica da soprano norte-americana.Certamente seria uma de suas glórias nos palcos, como bem lembrou o escritorLauro Machado Coelho em seu guia da ópera romântica italiana (Perspectiva,2000).

Callas teria sido aLucrécia perfeita, mas

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nunca a interpretou nopalco

O libreto é construído idealmente para culminar numa grande revelação aofinal da ópera. Desconfiado do interesse de sua mulher, Lucrécia, pelo jovemGennaro, o governante de Ferrara, duque Alfonso d’Este, aproveitou o pretextode ele ter ofendido a família da esposa, apagando o B do seu sobrenome nafachada do palácio (deixando a palavra ORGIA), para mandar prendê-lo. Naverdade, Gennaro é filho bastardo dela, e Lucrécia pede sua libertação. Loucode ciúmes, Alfonso finge concordar, após ameaças da esposa de que ele era seuterceiro marido e poderia receber o tratamento dos anteriores, ou seja: serassassinado. O duque, porém, induziu Gennaro a beber vinho envenenado.Sozinho com o filho, Lucrécia lhe dá um antídoto e ele parte (vídeo abaixo).Mais tarde, acreditando que Gennaro tinha se afastado de Ferrara para seproteger, ela serve vinho envenenado aos amigos dele, durante um banquete,para se vingar de antigos insultos (pertenciam a famílias inimigas). Mas ficahorrorizada ao perceber que seu filho ainda está entre eles. Quer lhe darnovamente o antídoto, mas ele recusa, pois a quantidade não é suficiente parasalvar também os seus amigos. Morre nos braços de Lucrécia, que antes lheconfessa ser sua mãe.

Lucrezia Borgia: “Infelice! Il veleno bevesti!” (Atto I)

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No libreto ficam bem definidas a personalidade ingênua de Gennaro e suaamizade com Maffio Orsini, além da natureza rancorosa e ciumenta do duque –esta é uma das qualidades do texto. De acordo com a tradição romântica,ressalta Lauro Coelho, Victor Hugo e Felice Romani dão livre tratamento àhistórica Lucrécia, associada às manipulações políticas e despida deescrúpulos, sendo capaz de recorrer à arte dos venenos para se livrar dosseus inimigos. A protagonista assume grande complexidade de caráter: é amulher fria e determinada, mas, ao mesmo tempo, a mãe carinhosa a quem odestino condena a destruir o filho reencontrado, que poderia ter sido a suavia de resgate.

Partitura original de LucreziaBorgia, autografada por Donizetti

A primeira Lucrécia, a soprano Méric-Lalande, por sinal, não estava mais no

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seu auge vocal, embora tenha estreado vários papéis de Bellini e continuarmarcante o seu talento dramático. De temperamento difícil, a prima donna feza exigência de não entrar em cena com a máscara de carnaval que devia usar(conforme o libreto), apenas para ser reconhecida pelo público e serdevidamente aplaudida. Ela acabou entrando com a máscara na mão.

Méric-Lalande fez pior na cena final: exigiu de Donizetti uma grandecabaletta, como era tradição em óperas que envolvessem grandes estrelas dopalco. O compositor, que havia planejado encerrar a ópera com o comoventearioso “Madre, se ognor lontano” (áudio abaixo), em que Gennaro agonizantedespede-se da mãe, argumentou que era inadequado para uma mãe que tinhaacabado de perder seu filho, por sua própria culpa, explodir em cascatas decoloratura.

Lucrezia Borgia: “Madre, se ognor lontano” (Atto II)

[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2013/05/Madre-se-ognor-lontano-Aragall-Sutherland.mp3|titles=Sutherland / Aragall / Bonynge (Decca)]

Ainda assim, a cantora se recusou a ceder – e Romani teve que produzir asoito linhas finais. Dizem que, como vingança, Donizetti compôs a cabalettafinal (“Era desso il mio figlio”) intencionalmente tão difícil para acantora, considerando a sua abalada capacidade vocal naquela altura, que adiva não conseguiu cantar bem (vídeo abaixo). Somente em 1840, com a revisãoimposta pela censura italiana para uma nova produção no Scala, o compositorrestaurou a cena final, como ele sempre quis, ou seja: sem cabaletta final econcluída com a morte de Gennaro.

Lucrezia Borgia: “Era desso il mio figlio” (Atto II)

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O tema sombrio da ópera se reflete na cor geralmente escura da escrita vocal;há poucas vozes femininas no coro, e dos personagens principais apenasLucrécia é soprano. Orsini é contralto, e as demais vozes são tenores ebaixos. Essa ênfase nos timbres vocais mais graves coloca a voz de soprano deLucrécia em relevo por toda a ópera – e evoca o domínio psicológico que elaexerce sobre os outros personagens.

Victor Hugo escreveu que sua personagem Lucrécia é uma “deformidade moralpurificada pela maternidade”. Ela se mostra sempre como um monstro, mas ganhaalguma simpatia no final da ópera. Para retratar tal monstro, Donizetti lhedeu novos impactos para estremecer o público. Cada detalhe na partitura temesse objetivo, especialmente quando Lucrécia aparece de repente entre suasvítimas para anunciar que todos eles foram envenenados (vídeo abaixo). Odesespero de Gennaro e de seus amigos e o sombrio coro cantando músicafúnebre ao longe: tudo contribui para tal efeito.

Lucrezia Borgia: “La gioia de’profani è un fumo passagier” (Atto II)

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No momento mais tenso da ópera, exibido no vídeo acima, as cortinas se abrem

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em meio à correria das vítimas no salão de festa e aparece a triunfal eassustadora Lucrécia, anunciando, sob a potência orquestral, que todos seencontram sob o seu poder:

LUCREZIA

Presso Lucrezia Borgia! [Sob o poder de Lucrezia Borgia!]

Horrorizados, todos se sentem perdidos e a duquesa de Ferrara afirma que suaatitude é uma “retribuição” à “acolhida” que ela recebeu de suas vítimas emVeneza (prólogo da ópera), quando foi tratada como “A Borgia” ao serreconhecida por todos naquela cidade, mesmo tentando se manter anônima comuma máscara de carnaval:

LUCREZIA

Sì, son la Borgia! [Sim, sou a Borgia!]

Un ballo, un tristo ballo voi mi deste in Venezia. [Um baile, um triste bailevocês me deram em Veneza.]

Io rendo a voi una cena in Ferrara. [Eu vos ofereço um jantar aqui emFerrara.]

Lucrécia continua tripudiando de suas vítimas, comunicando que já estãopreparadas cinco urnas funerárias – não sabendo que uma sexta vítima estavaescondida no salão.

LUCREZIA

Voi salvi ed impuniti credeste invano: [Pensavam que estavam salvos eimpunes:]

Dell’ingiuria mia piena vendetta ho già: [Estou planamente vingada daquelainjúria:]

Cinque son pronti strati funebri [Estão prontas cinco urnas fúnebres]

Per coprirvi estinti, poichè il veleno a voi temprato è presto. [Para cobri-los mortos, pois logo o veneno fará efeito em vocês.]

De repente, aparece Gennaro pedindo para acrescentar mais um caixão, pois nãoeram apenas cinco convidados que estavam presentes naquele jantar. Lucréciase assombra com aquela terrível surpresa e ordena a saída de todos, deixando-os a sós. Inicia-se a cena da grande revelação, sob um pizzicato tenso.

LUCREZIA

Tu pur qui? non sei fuggito? [Você por aqui? Não fugiu?]

Qual ti tenne avverso fato? [O que te fez mudar o destino?]

A duquesa revela que Gennaro está novamente envenenado. Ele lembra que aindatem antídoto (usado no primeiro envenenamento), mas fica fora de si ao saber

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que não é suficiente para compartilhar com seus amigos. Desesperado, ameaçamatar Lucrécia ali mesmo.

GENNARO

Allor, signora, morrem tutti. [Então, senhora, morramos todos.]

LUCREZIA

Che mai dici? [O que disse?]

GENNARO

Túmulo de Lucrécia Borgia e deseu marido, Alfonso d’Este, emFerrara (Itália)

Voi primiera di mia mano preparatevi a morir. [Prepare-se para ser a primeiraa morrer por minhas mãos.]

Começa, então, uma perseguição em cena: Gennaro empunha uma faca contraLucrécia. Ela tenta detê-lo, mas ele se mostra determinado a matá-la. Até queGennaro topa com a revelação de que ele também é um Borgia, ao segurarLucrécia para assassiná-la. E sua faca cai no chão.

LUCREZIA

Ferma! Un Borgia sei… [Pare! Você é um Borgia…]

Mais do que nunca, aqui o acompanhamento genialmente aplicado por Donizettisob o registro grave da soprano faz toda a diferença.

LUCREZIA

Fur tuoi padri i padri miei… [Meus antecedentes são também seus…]

Ti risparmia un fallo orrendo… [Evite um crime terrível…]

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Il tuo sangue non versar. [Não derrame seu próprio sangue.]

GENNARO

Son un Borgia? Oh ciel! che intendo! [Sou um Borgia? Oh, céus! Que ouço?]

Ouvimos aqui os graves emudecedores dos contrabaixos e violoncelos (final dovídeo acima). Um silêncio fúnebre toma conta do palco. E Lucrécia nada tem adizer, a não ser pedir para que o filho não lhe pergunte mais sobre opassado.

LUCREZIA

Ah! Di più non domandar. [Ah! Nada mais pergunte.]

Retrato da Lucréciahistórica (artistadesconhecido), filha dopapa Alexandre VI

A partir de então, ambos lamentam o passado e o triste fim que teve aquelarelação. Em seguida, Gennaro não resiste e morre.

Os historiadores questionam o efetivo envolvimento de Lucrécia nos crimes doseu pai e seus irmãos, mas a ópera não se preocupa com o fato histórico.Lucrécia é uma assassina em série – vingativa, astuta e ambiciosa, com apenasum sopro de sentimento humano: o seu amor pelo seu filho, de quem ela tinhase afastado ao nascer, para sua própria segurança.

Lucrezia Borgia é uma das óperas sérias de Donizetti em que a criação dodrama se deve mais aos meios musicais do que ao libreto, com notável riquezamelódica em toda a partitura. Isso se sente desde o início. Em “Nella fataldi Rimini”, no Prólogo, Maffio Orsini revela que ele e Gennaro se encontraramcom um velho vestido de preto (a figura da morte), que recomendou cuidado comos Borgia. O contraste entre as vozes masculinas do coro e a voz de mezzo-soprano de Maffio (característica que remonta à música barroca, ressaltaLauro Coelho) anuncia a atmosfera trágica do libreto (vídeo abaixo).

Lucrezia Borgia: “Nella fatal di Rimini” (Prologo)

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Uma conexão interessante pode ser estabelecida entre Donizetti e um célebrediscípulo seu: Giuseppe Verdi (1813-1901). Prenúncios de Rigoletto podem serpercebidos no septeto do final do Prólogo de Lucrezia, quando os companheirosde Gennaro fazem acusações a Lucrécia (áudio abaixo); na cena de Alfonso,“Vieni, la mia vendeta… Qualunque sia l’evento” (áudio abaixo); ou no trio doduque com sua esposa e Gennaro, no final do primeiro ato (áudio abaixo).Nesses trechos exemplares, a música transmite muito bem a intensidade dossentimentos.

Lucrezia Borgia: “Maffio Orsini, signora, io sono” (Prologo)

[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2013/05/Maffio-Orsini-signora-io-sono-Horne-Sutherland-et-alli.mp3|titles=Horne / Sutherland / Aragall /Bonynge (Decca)]

Lucrezia Borgia: “Vieni, la mia vendeta” (Atto I)

[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2013/05/Vieni-la-mia-vendeta-Wixell.mp3|titles=Wixell / Bonynge (Decca)]

Lucrezia Borgia: “Guai se ti sfugge un moto” (Atto I)

[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2013/05/Guai-se-ti-sfugge-un-moto-Sutherland-Aragall-Wixell.mp3|titles=Sutherland / Aragall / Wixell /Bonynge (Decca)]

Tanto Rigoletto quanto a Lucrezia baseiam-se em peças de Victor Hugo,inseridas em clima sombrio e sentimentos puramente românticos. Lauro Coelho,de forma muito pertinente, ressalta que, em ambas, o ambiente cortesãocorrompido serve de moldura para um caso tortuoso e dissimulado de amor porum filho: na Lucrèce Borgia, o da mãe que reencontra e perde o filho; em Leroi s’amuse, o do pai que fracassa em impedir que a filha caia nas malhas dosedutor.

Verdi também se inspirouem Victor Hugo e estudoua ópera de Donizetti

O musicólogo americano William Ashbrook (1922-2009), biógrafo de Donizetti,

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lembra que o extenso diálogo entre Astolfo e Rustinghello sobre uma melodiaorquestral, que ocorre no ato I logo após o episódio da letra que Gennaroapaga no nome BORGIA inscrito na fachada do palácio, é o protótipo doepisódio entre Rigoletto e Sparafucile. Essa constatação já seria suficientepara frisar a importância histórica de Lucrezia para a consolidação domelodrama romântico italiano.

O número mais conhecido da ópera é “Il segreto per essere felice” (vídeoabaixo), cantado por Maffio no segundo ato, com duas estrofes separadas pelosom distante dos sinos, anunciando a tragédia que se aproxima. Segundo LauroCoelho, para que se tenha uma idéia da popularidade alcançada por essa ária,um dos maiores fenômenos da vendagem de discos nos primeiros anos do séculoXX foram as duas gravações feitas em 1903 (Columbia) e 1906 (Victor) pelocontralto Ernestine Schumann-Heink (1861-1936), da versão em alemão –intitulada Trinklied (Canção de beber).

Lucrezia Borgia: “Il segreto per essere felice” (Atto II)

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Vale a pena destacar ainda a presença da encantadora cabaletta da ária “Com’èbello”, outro momento de grande beleza e famoso da ópera, no Prólogo, escritaespecialmente para a prima donna Giulia Grisi (1811-1869) em Paris, nagravação de Caballé (RCA, 1966), em seu auge vocal (áudios abaixos).

Lucrezia Borgia: “Com’è bello” (Prologo)

[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2013/05/Com’è-bello-Caballe.mp3|titles=Caballé / Perlea (RCA)]

Lucrezia Borgia: “Si voli il primo a cogliere” (Prologo)

[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2013/05/Si-voli-il-primo-a-cogliere-Caballe.mp3|titles=Caballé / Perlea (RCA)]

Fleming é a mais novaLucrécia de grandeprojeção

Lucrezia é apresentada ao longo do tempo como um veículo para a grandes

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cantoras, como no caso da performance de 2008 na Washington National Operacom a soprano norte-americana Renée Fleming. Sua atuação ganhou inúmeroselogios, embora sua amplitude vocal não atinja a de Sutherland. Flemingtambém cantou o mesmo papel na San Francisco Opera em outubro de 2011.

Em Lucrezia Borgia, fica absolutamente evidente a habilidade de Donizetti decombinar o festivo e o macabro; o satírico e o sentimental. Certamente,estamos diante de uma obra-prima que sempre terá espaço nos grandes palcos deópera ao redor do mundo.